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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 112

EM 27 DE JUNHO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Afonso de leio Pinto Veloso

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva

Sumário.— Abre a sessão com a presença de 45 Srs. Deputados. É lida a acta. É lido o expediente.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Tavares de Carvalho trata da falta de água em Lisboa e requere sôbre os termos da discussão dos projectos de lei n.ºs 686, 750 e 751.

O Sr. António Resende requere que se discutam as emendas do Senado referentes aos salários e emolumentos judiciários.

O Sr. Velhinho Correia interroga a Mesa, nos termos da letra do Regimento, sôbre a discussão do Orçamento. Responde o Sr. Presidente.

O Sr. Abílio Marçal requere que a comissão do Orçamento reúna durante a sessão.

Ó Sr. Francisco Cruz deseja saber se há número para deliberar, desejando conversar com o Sr. Nano Simões, quando presente.

O Sr. João Camoesas fala sôbre a ordem de trabalhos.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu ocupa-se dos roubos feitos nos edifícios do Lazareto.

O Sr. Hermano de Medeiros trata da fabricação do álcool nas fábricas açoreanas.

O Sr. Ferreira da Rocha censura o facto do embarque da prata nacional para o estrangeiro, que considera ilegal nos termos em que se realizou.

O Sr. Jaime de Sousa produz considerações acerca das fábricas de destilação de Ponta Delgada.

O Sr. Portugal Durão protesta contra a saída, da prata, e sôbre o mesmo assunto usam da palavra os Srs. Velhinho Correia e Ferreira da Rocha.

Para explicações, e ainda sôbre o mesmo assunto, falam os Srs. Portugal Durão e Cancela de Abreu, que requere uma inscrição especial.

O Sr. Abílio Marçal dá conta dos trabalhos da comissão do Orçamento.

Continuando o incidente, seguem-se no uso da palavra os Srs. Cunha Leal, Almeida Ribeiro, Carvalho da Silva, Velhinho Correia, Cunha Leal, Portugal Durão e António Maria da Silva.

O Sr. Velhinho Correia desiste da sua proposta.

É aprovada a acta.

É dada conta das diligências feitas perante o Sr. Barros Queiroz para reocupar o seu lugar na Câmara.

´W aprovado um voto de sentimento pela morte duma irmã do Sr. José Domingues dos Santos.

Sôbre a atitude do Sr. Barros Queiroz manifestam-se os Srs. António Maria da Silva, Cunha Leal, Carvalho da Silva, Viriato da Fonseca, Pinto Barriga e Ferreira de Mira, sendo por fim nomeada urna deputação para procurar demover da sua resolução o Sr. Deputado renunciante.

O Sr. Pina de Morais, em negócio urgente apresenta um projecto de lei referente à solução da greve dos correios. Aprovada a urgência e a dispensa do Regimento, entra em discussão na generalidade, sôbre que usam da palavra os Sr. Carvalho da Silva, Pedro Pita, Ferreira da Rocha e Velhinho Correia, sendo aprovada, bem como a especialidade, com uma emenda, sendo dispensada a leitura da última redacção.

É encerrada a sessão, marcando-se a imediata para o dia 30.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão.— Um parecer.— Declaração da comissão do Orçamento.

Abertura da sessão às 15 horas e 25 minutos.

Presentes à chamada 45 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 31 Srs. Deputados.

Srs. Deputados que responderam à chamada:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

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2 Diário da Câmara dos Debutados

Alberto Ferreira Vidal.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Albino Marques de Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Maria da Silva.

António de Mendonça.

António Pais da Silva Marques.

António Resende.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur Brandão.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Carlos Cândido Pereira.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Maldonado Freitas.

Custódio Martins de Paiva.

Francisco Cruz.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Hermano José de Medeiros.

Jaime Júlio de Sonsa.

João José da Conceição Camoesas.

João de Ornelas da Silva.

Joaquim Diais da Fonseca.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José Pedro Ferreira.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Manuel Ferreira da Rocha.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Paulo Cancela de Abreu.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Sebastião de Herédia.

Tomás de Sousa Rosa.

Vasco Borges.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Henriques Godinho.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Lelo Portela.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Abranches Ferrão.

António Ginestal Machado.

António Pinto Meireles Barriga.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.

Bernardo Ferreira de Matos.

Delfim Costa.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

João José Luís Damas.

João Pereira Bastos.

João Pina de Morais Júnior.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Brandão.

José Carvalho dos Santos.

José Cortês dos Santos.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Duarte.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Virgílio da Conceição Costa.

Vergílio Saque.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Marques Mourão.

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso Augusto da Costa.

Aires do Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alberto Xavier.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Álvaro Xavier de Castro.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Amaro Garcia Loureiro.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Américo da Silva Castro.

António Correia.

António Dias.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Lino Neto.

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Sessão de 27 de Junho de 1924 3

António de Paiva Gomes.

António de Sousa Maia.

António Vicente Ferreira.

Augusto Pereira Nobre.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

David Augusto Rodrigues.

Delfim do Araújo Moreira Lopes.

Domingos Leite Pereira.

Ernesto Carneiro Franco.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Germano José de Amorim.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Pires Cansado.

João Baptista da Silva.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João Estêvão Águas.

João Luís Ricardo.

João Salema.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge Barros Capinha.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José António de Magalhães.

José Domingues dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Marques Loureiro.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Oliveira Salvador.

José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.

Júlio Gonçalves.

Júlio Henrique do Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel Alegre.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso,

Manuel de Sousa da Câmara.

Manuel de Sousa Coutinho.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mariano Martins.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário de Magalhães Infante.

Maximino de Matos.

Nano Simões.

Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomé de Barros Queiroz.

Valentim Guerra.

Ventura Malheiro Reimão.

Às 15 horas principiou a fazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 45 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.

Eram 15 horas e 23 minutos.

Leu-se a acta.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Pedido de licença

Do Sr. João José Luís Damas, cinco dias.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Representação

Da comissão central das freguesias de S. José e Camões e outras, reclamando contra o regime tributário vigente, e especialmente contra o da contribuição industrial.

Para a comissão de finanças.

Ofícios

Do juiz de direito do 2.° juízo de investigação criminal, pedindo a comparência naquele juízo no dia 4 de Julho próximo, pelas 14 horas, do Sr. Manuel Duarte.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

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4 Diário da Câmara dos Deputados

Do Ministério da Guerra, pedindo a comparência no gabinete do general director da 1.ª Direcção Geral das Srs. Pereira Bastos, Sá Cardoso, Pinto da Fonseca, Brito Camacho, Pires Monteiro, António Maria da Silva, Nunes Loureiro, Jorge Nunes, Mário Infante, Moura Pinto, Carlos Olavo, Joaquim Ribeiro e Hermano de Medeiros, a fim de serem ouvidos num auto de corpo de delito.

Autorizado.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Do mesmo Ministério, pedindo a comparência no gabinete do director da 1.ª Direcção Geral, rio dia 2 de Julho, pelas 13 horas, dos Srs. Pedro de Castro e Vitorino Godinho.

Autorizado.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Do Ministério das Colónias, enviando ao Congresso da República o diploma legislativo colonial n.° 22, publicado no Diário do Govêrno, 1.ª série, de 24 do corrente.

Para a comissão de colónias.

Do Senado, comunicando ter rejeitado a proposta de lei n.° 281, que fixa os vencimentos dos professores de música e canto coral nas Faculdades de Letras.

Para a comissão de instrução superior.

Do Senado, comunicando a rejeição de proposta de lei n.°. 1470, que autorizava as Câmaras Municipais de Oliveira de Frades e S. Pedro do Sul a vender ou aforar os seus terrenos baldios.

Para a comissão de administração pública.

Do Senado, comunicando ter rejeitado a proposta de lei n.° 515, que autorizava o Govêrno a contrair um empréstimo até 600.000$ para construção da Escola Industrial do Infante D. Henrique, do Pôrto.

Para a comissão de instrução especial e técnica.

Requerimento

Do Sr. José António da Cunha Vale, tenente-coronel reformado, pedindo para ser ouvido em conselho de guerra sôbre castigos que julga injustos.

Para a comissão de guerra.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período «antes da ordem do dia».

O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: se estivesse presente qualquer membro de Govêrno preguntar-lhe-ia que providências haviam sido tomadas, relativamente à falta de água, que a Companhia anunciou que seria de 48 horas.

Porém, como não está presente nenhum, limito-me a registar o facto.

Aproveito a ocasião para requerer a V. Exa. a que se digne consultar a Câmara sôbre se consente que sejam incluídos na «ordem do dia» os pareceres n.ºs 750 e 751, e bem assim que o parecer n.° 686, que está marcado para «antes da ordem do dia», sem prejuízo dos oradores inscritos, passe a ser considerado com prejuízo dos oradores inscritos.

O orador não reviu.

O Sr. António Resende: — Requeiro a V. Exa. para ser submetida oportunamente à consideração da Câmara, que se discutam imediatamente as emendas vindas do Senado à proposta relativa à tabela dos salários e emolumentos judiciais.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — O requerimento de V. Exa. será submetido à votação quando houver número.

O Sr. Velhinho Correia (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejo fazer uma pregunta a V. Exa.

O artigo 4.° do Regimento, diz que ao Presidente incumbe dirigir os trabalhos da assemblea, e o título 3.° estabelece êsses trabalhos: as sessões, inscrição da palavra, sessões secretas, etc.

Nestas condições é a V. Exa. que o Regimento incumbe a direcção dos trabalhos da assemblea, no sentido mais largo em que esta palavra deve ser tomada; e, sendo assim, pregunto b que vai acontecer no que respeita à lei de meios, e no que respeita ao Orçamento Geral do Estado.

Sabe V. Exa. que o Orçamento deve entrar em vigor no dia 1 de Julho, sem o que não se poderão cobrar as receitas

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nem ordenar as despesas, e nestas circunstâncias pregunto o que tem V. Exa. a dizer acerca dêste problema tam gravo para a vida da Nação.

,;Cessa por completo a vida nacional em 30 de Junho, ou continuamos a discussão da lei de meios ?

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — V. Exa. fez uma pregunta à Mesa acerca da discussão do Orçamento Geral do Estado.

Citou V. Exa. várias disposições do Regimento, que dão à Presidência a faculdade de marcar e dirigir os trabalhos da Assemblea.

Sabe, todavia, V. Exa. que, por uma praxe de há muito estabelecida pela Câmara, foi adoptado o sistema de dispensar certas formalidades regimentais e de alterar a ordem dos trabalhos.

Dados êstes costumes, que não são fàcilmente modificáveis, V. Exa. compreende que a Mesa não pode fazer outra cousa senão acatar as deliberações da Câmara.

Emquanto a Câmara não tomar qualquer decisão em contrário, a Mesa continuará a pôr os orçamentos em discussão, como tem feito até aqui.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Abílio Marçal (em nome da comissão do Orçamento): — Acho de aceitar as considerações do Sr. Velhinho Correia, e exactamente para tratar do mesmo assunto peço a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se permite que a comissão do Orçamento reúna durante a sessão.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — O requerimento de V. Exa. será submetido à votação da Câmara quando houver número.

O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: desejando eu pôr uma questão ao Parlamento, e como sôbre ela terá de recair uma votação, peço a V. Exa. a fineza de me informar se há número.

O Sr. Presidente: — Não ha número para deliberações.

O Orador: — É que eu desejava a presença do Sr. Ministro do Comércio ou do

Sr. Nuno Simões, porque me consta que S. Exa. me quere prestar uma informação que eu tenho muito prazer em ouvir.

Nestas condições peço a V. Exa. que me reserve a palavra para quando S. Exa. estiver.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. João Camoesas: — Desejava pedir a V. Exa. para serem incluídos na ordem do dia os pareceres n.ºs 626 a 629.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: vi há dias nos jornais uma notícia que à primeira vista se me afigurou como sendo o anúncio de um leilão de móveis.

Dizia assim:

«32 aparadores, 12 armários, 1:078 mesas diversas, 1:669 cadeiras, 341 espelhos, 621 lavatórios, 1:078 leitos de ferro com colchoaria de arame, 611 mochos, 8 sofás, 14 fauteuils, 55 bancos de jardim, 1 riquíssimo serviço de cristófle composto de 313 colheres de chá e café, 102 de doce, 133 de sopa, 309 facas, 254 garfos, 21 açucareiros, 15 bandejas, 17 bules, 21 cafeteiras, 3 conchas, 9 galheteiros, 29 leiteiras, 6 talheres de trinchar, 8 de salada e 23 espetos, e mais 764 colheres, 949 garfos, 951 facas, bandejas, galheteiros, 347 tapetes, 1 rica bataria de cozinha, em cobre, 1 instalação completa de lavandaria com barreleiras, máquinas de espremer e de engomar, estufa, etc., 1:630 cobertores, milhares e milhares de lençóis e em colchoaria de lã, 396 almofadas, 103 colchões e 105 travesseiros, e de palha, 1:907 colchões, 940 enxergões e 1:008 travesseiros».

Mas, afinal, enganara-me.

Não se tratava de um leilão.

Tratava-se do saque ao Lazareto!

Sr. Presidente: já vagamente um Sr. Deputado da maioria se referiu a êste assunto; mas o Sr. Ministro do Trabalho, encarando-o como uma cousa vulgar, corrente, de mero expediente, disse que ia tomar e apurar responsabilidades.

Já na imprensa se tem feito referência a êste caso imputando culpas ao Instituto Nuno Álvares.

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6 Diário da Câmara das Deputados

Isto é uma falsidade, e ninguém tem o direito de lançar semelhante calúmnia sôbre esta benemérita instituição.

Não é fácil terem saído do Lazareto tantos artigos sem alguém ter visto, dado, de mais a mais, o tamanho de alguns, e as dificuldades de transporte.

O roubo foi no valor de cêrca de 20:000 contos!

O Sr. Tavares de Carvalho: — Fui eu o Deputado da maioria, que se referiu a êsse assunto e o Sr. Ministro do Trabalho disse-me que estava entregue à policia de Lisboa.

O Orador: — Trata-se de um assunto de alta importância, que tem de ser cuidadosamente tratado.

Não se pode admitir que de dentro de um edifício fôsse retirado todo o recheio, sem a cumplicidade de quem o tinha à sua guarda, ou pelo menos, sem que tenha havido o maior desmazelo na fiscalização,

O Sr. João Camoesas: — As irregularidades não se podem imputar ao Instituto Nuno Álvares, mas o facto é que ficámos obrigados internacionalmente a manter ali êsse edifício.

O Orador: — Era um edifício modelar, que nos honrava perante os estrangeiros.

O caso afigura-se-me muito grave, e mais grave se tornou quando, sendo chamados a depor, vários oficiais do exército, êles escusaram-se a comparecer, apesar de segundo creio, terem sido intimados pelas autoridades, competentes.

Estas considerações devem merecer a atenção do Govêrno, embora não esteja presente qualquer membro do Govêrno que sôbre o assunto se possa pronunciar.

O Sr. Hermano de Medeiros: — Sr. Presidente: tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Trabalho, que vem aqui poucas vezes, e essas poucas vezes foras de tempo, quando nós já não podemos ouvir de S. Exa. aquelas palavras de justiça e de conforta que precisamos transmitir àqueles que reclamam do Poder Executivo as providências que se devem dar.

Agora não reclamo a presença do Sr. Ministro do Trabalho, porque S. Exa. recebeu mandado de despejo; mas isto não impede que chame a atenção da Câmara para um projecto de lei que nesta casa foi apresentado.

Não tratarei da questão do Ministério do Trabalho, isto é, da atitude assumida pelo Govêrno em relação a determinados serviços de assistência; e já que não posso tratar dêste assunto, venho reforçar o requerimento do Sr. Tavares de Carvalho com uma explicação que acho necessária e indispensável, para que a Câmara dê o seu voto a êsse requerimento.

Há muito tempo que está na Câmara um projecto de lei da autoria do Deputado pelos Açores Sr. Vergílio Saque, permitindo às fábricas de álcool o levantamento do melaço que está na alfândega há imenso tempo e que se está deteriorando.

Êsse melaço foi requisitado em determinada altura, ao abrigo da lei em vigor, mas, por culpa de toda a gente, êsse melaço chegou quando o imposto que incidia sôbre êle tornava quási proibitiva a sua importação, e tanto assim, que as companhias das fábricas o não levantaram de facto.

Não podendo laborar as fábricas de álcool, estando muitos braços paralisados, porque a batata não tem chegado para êsse fim, precisam elas do melaço, para o fabrico do álcool desnaturado.

Nestes termos as companhias das fábricas não podem levantar o melaço que se está a deteriorar, e por isso precisam da aprovação do referido projecto de lei.

É necessário que êsse projecto de lei seja votado, porque o Estado nada lucra em não permitir a saída do melaço, visto que as fabricas não podem laborar, estando muitos braços sem trabalho.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: suponho que o Sr. Presidente do Ministério não virá hoje à Câmara. Entretanto, peço a V. Exa. que me informe a êsse respeito, porque, vindo S. Exa., aguardarei, para falar, a sua comparência.

O Sr. Presidente: — Não sei.

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O Orador: — Devo concluir, após as votações de ontem, que não posso aguardar a presença do Sr. Ministro das Finanças, mas como o assunto é suficientemente importante, desde já peço a atenção da Câmara, porque me vejo obrigado a tratar do caso mesmo na ausência de qualquer membro do Govêrno.

Consta-me que hoje de madrugada começou o embarque para o estrangeiro da prata que estava na Casa da Moeda.

Sabe-se, por várias afirmações que têm sido feitas ultimamente, quer na Câmara, quer em entrevistas de jornais, e por pessoas que têm responsabilidades ligadas ao assunto, que a prata não podia ser exportada nesta ocasião.

Portanto, estamos em face do facto consumado o no momento em que o Govêrno se encontra demissionário e de facto demissionário há mais de um mês.

Já que as circunstâncias do acto são bastante graves, quero salientar à Câmara a situação em que nos encontramos.

As leis n.ºs 1:424 e 1:923 determinaram que a prata proveniente de trocos feitos na Casa, da Moeda seria convertida em ouro, ficando o ouro em depósito no Banco de Portugal.

As leis n.ºs 1:521 e 1:923 permitiram ao Govêrno, excepcionalmente, que em representação dêsse ouro futuro ou representação da prata a recolher se emitissem, notas.

Mas uma e outra lei não determinam que o ouro proveniente dessa operação continuaria em depósito no Banco de Portugal.

Depois disso o Sr. Almeida. Ribeiro lembrou-se de conseguir da Câmara uma autorização para o Govêrno tratar de tudo que se referisse à situação cambial.

Todos nós sabemos como essa autorização foi pràticamente interpretada, com aquela, célebre opinião de que a ditadura não existe quando o Parlamento está aberto e o Govêrno pode vir à Câmara sujeitar os seus actos à discussão.

Foi assim que o Govêrno interpretou a referida autorização.

Foi mesmo até além de tudo aquilo que se pudesse conter no espírito do proponente.

A lei determina que a prata depositada no Banco ficasse à disposição do Govêrno
para livremente poder fazer cora ela o uso que entendesse, procedendo à venda dessa prata quando o julgasse oportuno.

Nós entendemos que o Congresso da República o que tem principalmente a fazer, como Poder Legislativo, é saber da forma como o Govêrno dispõe dos bens da nação, o que não pode lazer o Govêrno sem que o Congresso o autorize.

Pensamos assim e, portanto, o acto que o Govêrno praticou é inconstitucional.

Apoiados.

Reputamos êsse acto abertamente inconveniente.

Apoiados.

Num país que se encontra nas circunstâncias que nós nos encontramos, não se pode admitir que um Govêrno disponha duma garantia de circulação para livremente se desfazer dela.

Estamos talvez a tempo de impedir uma parte do atontado.

Já isso se não pode evitar com respeito à prata que hoje saiu, ô de madrugada, para que não houvesse perigo do público conhecimento do facto.

Mas o ouro resultante dessa prata, embora não possamos saber quanta e em que condições foi convertida a prata em ouro, êsse ouro, ao menos, deve ir para o Banco como depósito.

Apoiados.

Vários àpartes dos nacionalistas.

Protestos.

O discurso, será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviada.

O Sr. Jaime de Sousa — Sr. Presidente: desejava tratar de assunto - inteiramente diferente do assunto em Debate — a exportação da prata.

No distrito de. Ponta Delgada a indústria de destilação atravessa um período difícil por falta da matéria prima necessária para laboração.

O imposto do melaço é igual ao do açúcar e daqui resulta não haver forma de as fábricas poderem trabalhar em condições de eficácia.

Este é o estado da questão.

Do facto advêm grandes prejuízos para a economia do distrito, desde que o Parlamento não trate de resolver a questão.

O assunto é objecto de um projecto

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8 Diário da Câmara dos Deputados

que está incluído para ser discutido antes da ordem do dia. É o projecto n.° 1:786, que já aqui foi relatado e tem o «concordo» do Sr. Ministro das Finanças.

Portanto, queria pedir à Câmara que logo que haja ensejo seja pôsto no debate êste projecto. Em nome dos interêsses do meu distrito, muito agravados com a demora na votação do projecto, peço que V. Exa. o ponha à discussão, para que ràpidamente possa obter a votação da Câmara.

O orador não reviu.

O Sr. Portugal Durão: — Pedi a palavra para em meu nome pessoal, como Deputado da Nação, lavrar aqui o meu mais solene protesto contra a exportação da prata, o que constitui uma verdadeira vergonha para o país.

Demais, nas condições em que se fez o embarque de madrugada.

Isto não pode admitir-se.

Lavro o meu protesto, e com toda a veemência, contra semelhante acto, que é uma vergonha.

Apoiados.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: começo por pedir aos Srs. Deputados o favor de terem por mim o mesmo respeito que eu tenho por S. Exas.

Eu pedi a palavra para expor à Câmara a minha opinião sôbre o assunto como Deputado da Nação, e assim devo dizer a V. Exas., sob minha palavra de honra, que não tinha conhecimento da acta, nem tam pouco conheço as condições em que êle se realizou. Já vê portanto a Câmara a franqueza e a sinceridade com que estou emitindo a minha opinião.

Desconheço, repito, o facto, pois que só dele tive conhecimento quando entrei nesta Câmara; no entanto devo dizer que achava melhor que o assunto fôsse tratado quando naquelas cadeiras ou nestas estivesse a pessoa responsável pela falta.

Mas, Sr. Presidente, eu devo dizer com toda a franqueza que me não repugna êsse acto.

Sussurro,

O Orador: — Não sei francamente as condições em que' essa operação se fez, no entanto devo dizer que estou convencido, segundo informações que acabo de ter, que ela foi feita em boas condições, muito preferível a ter de se aumentar a circulação fiduciária.

Não sei francamente o que é que querem que se faça, quando é certo que o Parlamento não tem dado aos Governos os meios necessários para êles enfrentarem a gravíssima situação em que nos encontramos, com prejuízos de toda a ordem.

Não há muito que o Banco Nacional Ultramarino fez a transferência de uma grande quantidade de prata, contra a lei, e não me consta que lá fora ou aqui, se tivessem levantado protestos contra o facto.

Digo isto para mostrar à Câmara a diferença que há entre o procedimento de então e o de hoje.

Vou terminar, lamentando mais uma vez que assuntos desta ordem sejam tratados na ausência da pessoa que por êles possa responder.

Eram estas as considerações que eu tinha a fazer a V. Exa. e à Câmara..

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: pedi a palavra para explicações, por isso que não desejo entrar em diálogo com S. Exa. o Sr. Velhinho Correia.

Fez S. Exa. umas afirmações que na verdade me obrigam a usar da palavra.

Disse em primeiro lugar que nós fazemos o mal e a caramunha.

Em segundo lugar disse que é triste que assuntos desta natureza sejam tratados não estando presente a pessoa que por êles possa assumir a responsabilidade.

E em terceiro lugar, disse que nós desejamos que em vez da venda da prata se façam notas, isto é, que desejamos aumentar a circulação fiduciária.

Eu devo dizer em primeiro lugar ao Sr. Velhinho Correia que antes de iniciar as minhas considerações tive o cuidado de preguntar se o Sr. Ministro das Finanças vinha à Câmara, tendo tido mais o cuidado de afirmar que tratando-se de um assunto gravíssimo, necessário era a imediata intervenção do Parlamento em

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vista do facto de o Govêrno estar demissionário, o não poder vir à Câmara responder pelo acto que praticou.

Diz o Sr. Velhinho Correia que nós fazemos o mal e a caramunha, pois a verdade é que o Poder Legislativo não tem dado ao Executivo os meios necessários para que êle possa viver, evitando-se a venda da prata.

É êste um êrro profundo do Sr. Velhinho Correia, que de há muito se arvorou em defensor do Govêrno que estava nas cadeiras do poder, pois a verdade é que num regime parlamentar todos sabem que são as maiorias que governam.

Parece que se vê que o Sr. Velhinho Correia desconhece isto.

Um governo, quando não pode governar em virtude de não encontrar da parte da maioria as facilidades de que necessita, o que tem a fazer é sair do Poder e não empenhar a prata, o ouro ou a última camisa que o país tem, se é que ainda tem essa camisa.

Apoiados.

Disse mais o Sr. Velhinho Correia que aqueles que tanto gritam contra a venda da prata desejam o aumento da circulação fiduciária, isto é, mais notas para sacrificar ainda mais a vida dos pequenos.

Não se vá supor que é somente o maior ou menor número de notas que modifica o preço da carne e do bacalhau. Pois há alguém que não saiba que os géneros sofrem da influência cambial?

Então um acto do Govêrno, que tenha uma influência no câmbio, não é tam grave como qualquer aumento de notas?

Falei da primeira vez com a maior serenidade, como normalmente costumo ter, e mostrei que uma vez que se praticou o acto da saída da prata, era indispensável que o Parlamento impedisse a segunda: o do emprego livre do ouro em vez de o colocar no Banco de Portugal para garantia das notas em circulação; mas o Sr. Velhinho Correia lembrou-se de empregar palavras que a essa serenidade não correspondiam, e isso me levou a falar em termos que S. Exa. bem merecia.

Tenho dito.

O orador foi muito cumprimentado.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Presidente: — Pediram a palavra para explicações os Srs. Portugal Durão e Cancela de Abreu, mas como já deu a hora de se passar à ordem do dia nEo posso conceder a palavra a S. Exas. sem que a Câmara o consinta.

Vozes: — Fale, fale.

O Sr. Portugal Durão: — Eu não discuto se o Govêrno tinha ou não autorização para vender a prata.

O Sr. Almeida Ribeiro (interrompendo): — V. Exa. sabe se foi vendida a prata?

O Sr. Pedro Pita (em àparte): — O que eu sei é que ela embarcou e foi para o estrangeiro.

O Sr. Nunes Loureiro (em àparte}: — Foi tomar ares!

O Orador: — Eu não discuto se o Govêrno tinha ou não autorização para vender a prata.

O Sr. Cunha Leal (interrompendo): — V. Exa. podia preguntar ao Sr. Almeida Ribeiro se êle sabe se a prata, foi ou não vendida?

O Sr. Almeida Ribeiro (interrompendo): — Eu não sei se a prata foi ou não vendida, o que eu estranho é que depois da demissão do Ministério se levante tam grande celeuma.

O Orador: — O Govêrno acabou, mas o País fica.

O que me interessa é o aspecto moral da questão.

Dizia-se que o crédito do País era completo lá fora. Que a prata não ia para fora. Mas a prata foi embarcada esta madrugada.

Foi embarcada às escuras!

Foi vendida?

Foi empenhada?

Não sei!

Se o Govêrno aqui estivesse, eu lhe pediria os esclarecimentos precisos.

Se foi vendida, por o Govêrno estar autorizado a vendê-la, porque não veio o Govêrno dizer como isso se fazia?

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10 Diário da Câmara dos Deputados

Eu não tencionava falar visto não haver Govêrno, mas fui forçado a dizer estas palavras por efeito da fala do Sr. Velhinho Correia e pela interrupção do Sr. Almeida Ribeiro.

Contra o que eu protesto, é contra o aspecto moral da questão, que é tremendo.

Apoiados.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Os «àpartes» não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Êste assunto relativo à venda da prata já foi tratado aqui, por mim, há cêrca de um mês.

Preguntei então ao Sr. Ministro das Finanças qual o fim para que estavam sendo construídos, na Casa da Moeda, 7:000 caixotes.

E preguntei-o porque me constava que êsses caixotes se destinavam ao transporte da prata para. Inglaterra.

O Sr. Álvaro de Castro respondeu-me que efectivamente o Govêrno pensava em fazer seguir para Inglaterra a prata, e que os caixotes que estavam sendo feitos eram para a transportar.

É de lamentar que está tempestade levantada hoje nesta Câmara — e muito justificadamente levantada — a propósito de tal assunto, não se tivesse desencadeado então, quando o assunto aqui foi versado por mim.

Agora que a prata já está embarcada e a caminho da Inglaterra, e só agora, é que aparece a indignação dos Srs. republicanos!

Mas o que é ainda mais assombroso é o que o Sr. Director Geral da Fazenda Pública disse numa entrevista que deu ao Diário de Lisboa.

Apoiados.

Nesta entrevista, S. Exa., declarando que se tratava de uma especulação política dos monárquicos, acrescentou que a prata hão ia sair, nem estava a ser encaixotada, mas sim apenas a ser mudada, devido a os sacos que a continham só tornarem necessários para o transporte das novas moedas que vão ser cunhadas.

Veio, pois, o Sr. Director Geral da Fazenda Pública desmentir o que fora aqui dito pelo Sr. Álvaro de Castro!

O Sr. Álvaro de Castro declarou nesta Câmara que os caixotes se destinavam ao transporte dos 14:000 contos de prata, ou sejam cêrca de 180:000.000$.

Quem disse a verdade?

Vê-se que foi o Sr. Ministro das Finanças.

Depois de uma tal contradição, são legítimas todas as suposições, são justificadas todas as reservas.

Apoiados.

Depois — note-se — o Sr. Álvaro de Castro, pôr um decreto seu, dispensou-se de fazer a venda da prata, em concurso, e autorizou-se a si próprio a vendê-la quando e como quisesse.

Eu pregunto o que será pior: aumentar a circulação fiduciária, mesmo pela maneira ilegal e escandalosa como o Sr. Velhinho Correia a aumentou, ou o Govêrno vender a prata, tendo, de mais a mais, publicado um decreto em que se autoriza a si próprio a fazer a venda da prata como e quando entenda, sem obediência às formalidades legais?

Apoiados.

Disse aqui também o Sr. Álvaro de Castro que a prata era convertida em ouro.

Será também interessante saber-se em que condições se fará esta conversão.

Porque se faz à sucapa, de madrugada, por entro baionetas, o embarque da prata?

Apoiados.

O Sr. Cunha Leal: — E que o Sr. Alberto Xavier gosta de lazer tudo às escuras.

O Orador: — Vou concluir, visto que apenas pedi n, palavra especialmente para fazer referência à entrevista do Sr. Alberto Xavier, publicada no Diário de Lisboa.

Mas quero aproveitar a ocasião para fazer um requerimento.

Requeiro que se abra uma inscrição especial sôbre o assunto, pois é indispensável que saia hoje desta Câmara uma deliberação para que se evite ainda que a venda da prata tenha lugar.

Apoiados.

Tenho dito.

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O Sr.. Abílio Marçal (por parte da comissão do Orçamento): — A comissão reunida para apreciar a situação criada em face da falta de aprovação do Orçamento, agravada pela circunstância de o Govêrno estar demitido, deliberou tomar a iniciativa da apresentação de duodécimos.

Adoptou para isso a proposta apresentada em 23 do corrente pelo. Sr. Ministro das Finanças, e escolheu para relator dêsse parecer o Sr. Velhinho Correia.

Nestas condições requeiro que essa proposta entre imediatamente em discussão, ainda que se não encontre presente o Sr. Ministro das Finanças, visto tratar-se duma proposta que a referida comissão adoptou como sua.

O orador não reviu.

O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: caminhamos de surpresa em surpresa.

Ainda não há muitos dias que o Sr. Director Geral da Fazenda Pública — por cujos actos infelizmente não está aqui para responder o Sr. Ministro das Finanças — declarou e garantiu que a prata não sairia de Portugal, mas da forma do que já havia sucedido em relação aos juros da dívida externa, cuja redução o Sr. Ministro das Finanças desmentira para daí a pouco se confirmar, assim a prata que o Sr. Director Geral da Fazenda Pública garantia não sair do País, acaba de ser embarcada com destino a Londres.

Porque é que nós levantamos aqui uma questão desta natureza sem a presença do Sr. Ministro das Finanças?

Disse-o já, e magistralmente, o Sr. Portugal Durão: porque os governos vão-se, mas a Nação fica.

Nós compreendíamos perfeitamente que sendo a prata um valor mais flutuante que o ouro, houvesse por parte do Estado o desejo do transformar as suas reservas prata em reservas ouro. Assim como também compreendíamos essa transformação, desde que houvesse o propósito de atingir um fim útil, como, por exemplo, seria o de estabilizar o valor da nossa moeda.

Não compreendo, porém, que a Câmara, arrastada pela cegueira de dar ao Govêrno um apoio desordenado, fique impassível perante, uma medida do Sr. Ministro das Finanças que certamente irá fazer tremer toda a gente pelo futuro de Portugal.

O País vibra neste momento inquieto perante as possíveis conseqüências da decisão governamental.

É claro que para certas ervas daninhas, que abundam no prado da vida pública portuguesa, corroendo-a, estas cousas não têm importância. E aqueles que hoje assistem, sem um gesto de repulsa e de espanto, à venda da prata serão os mesmos que amanhã assistirão impassíveis à alienação dos últimos pertences do nosso património, porque, por êste caminho havemos de chegar a vender tudo, a prata, o ouro, as nossas riquezas artísticas, tudo e tudo; até a Bíblia e a custódia de Belém.

Sr. Presidente: o Partido Nacionalista protesta contra a alienação do património nacional.

O Partido Nacionalista, colocado em face duma triste realidade, entende que isto da venda da prata é um negócio escuro, tam escuro que almas bem lavadas o não poderiam conceber.

Apoiados.

Tam pouco é o nosso crédito, que a prata não possa continuar em penhor nos cofres da Casa da Moeda ou do Banco de Portugal?

Que mistificação foi esta?

Então isto não fere a sensibilidade moral da maioria?

Porque se fez esta venda à porta fechada?

Bom era que o Sr. Alberto Xavier aqui estivesse para se lavar das suspeitas que recaem sôbre si mesmo.

Vendida a prata, e confirmada a venda, esta venda fui uma manobra à porta fechada. Isto só se justificaria se houvesse um prazo para entregar essa prata.

Não é segrêdo para ninguém que uma das razões determinantes do decreto reduzindo os juros da dívida externa foi a falta de dinheiro para pagar êsses juros.

Se isto é assim, onde é que estava o crédito alcançado pelo Sr. Alberto Xavier?

Isto é um negócio suspeito, e porque assim o sinto, tenho a necessidade de o dizer perante a Nação, o que as responsabilidades fiquem a quem couberem.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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O Sr. Almeida Ribeiro: — Há pouco fui visado directamente por estranhar, que logo após a demissão inesperada de um Govêrno, se tivesse discutido um assunto a que faltavam todos os elementos de informação.

Não pedi a palavra para explicar o assunto da prata, porque o desconheço, mas para protestar contraia demolição que se está fazendo dos homens da República, principalmente daqueles com que a República pode contar nas horas difíceis da sua vida.

Então não é demolir o chamar-se a êste facto, da saída da prata, um negócio escuro?

Falou-se que a prata tinha sido embarcada altas horas da madrugada, pelo escuro, mas não se quis verificar que isto podia ter sido derivado pelas exigências do embarque?

Quem não vê isto!?

O que nós criamos com uma imprevidência — não quero ofender ninguém — que há-de ser absolutamente funesta para todos nós!

É do elementar conhecimento de qualquer que tenha praticado, pouco ou muito dentro da administração pública, que as ordens de um Ministro levam dias, por vezes semanas, a executar.

Quem pode imaginar, por isso, que o Sr. Ministro das Finanças demissionário, ou qualquer outro Ministro sem ser o Sr. Álvaro de Castro, fôsse, depois de demitido, êle mesmo ordenar ou executar o embarque furtivo da prata?

Quem pôde admitir isto?!

É preciso que nós suponhamos dos outros as últimas misérias, as piores abjecções, para poder, sequer, levantar esta suspeita.

Apoiados.

Oxalá que as minhas palavras tenham o condão de provocar um momento de reflexão sôbre nós próprios, para que, fazendo todos a defesa dos interêsses da Nação e ao mesmo tempo a defesa dos interêsses do partido em que militamos, todavia nós, a parte republicana da Câmara, tenhamos a fácil previdência de não nos inutilizarmos assim uns aos outros, sem base e sem motivo, unicamente com a preocupação do momento que passa para tirar efeitos políticos.

Apoiados.

Eu já disse que foi sobretudo uma questão de sentimento que me levou a pedir a palavra, para explicações. Não conheço, já disse, o caso da prata; quis apenas salientar que é preciso não levarmos a nossa paixão política até o ponto de supor monstruosidades de carácter moral até como estas que se vinham formulando, embora com palavras veladas, a respeito do carácter de um homem que podia ter sido um mau Ministro, mas que é um homem honrado e de carácter.

Apoiados.

Disseram-se também aqui, já por mais de uma vez, palavras diversas a respeito de um alto funcionário do Ministério das Finanças, o Sr. director geral da Fazenda Pública.

Um Sr. Deputado monárquico disse que êle mentira em determinada entrevista, e o Sr. Cunha Leal fez referências também ao mesmo funcionário a respeito da sua Conduta profissional.

Se estas referências ao Sr. director geral da Fazenda Pública podem ter uma explicação de momento, pela circunstância de não termos presente um Ministro que responda pelos actos dêsse funcionário, elas não podem deixar de ter a minha discordância completa sem saber se êsse funcionário procedeu dentro das ordens que recebeu. Não temos o direito de supor por emquanto cousa diversa.

O Sr. Cancela de Abreu: — Nós referimo-nos à entrevista do Diário de Lisboa.

O Orador: - Não discuto entrevistas, porque muitas vezes elas são inexactas. A vida jornalística é muito diferente da nossa.

Sr. Presidente: já quê estou no uso da palavra, quero fazer mais algumas considerações.

Eu sei que tanto pela lei de Maio de 1923, que autorizou o empréstimo de 6 1/2 por cento ouro, como depois por uma lei de Novembro dêsse ano, referendada pelo Sr. Cunha Leal, então Ministro das Finanças, se autorizou a venda da prata para a converter em ouro.

Simplesmente, eu também sei, não por conhecer actos reservados da administração do Estado, mas por aquilo que veio a público depois disso, que essa prata era considerada pelo Banco de Portugal como pertença sua.

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Sessão de 27 de Junho de 1924 17

Ce modo que ainda que o Govêrno agora demissionário não tivesse neste assunto outra acção que aquela que realmente teve, a de definir dê uma maneira clara com o Banco a situação da prata, parece que alguma cousa havia para aproveitar na sua acção.

O Sr. Cunha Leal : — Essa dúvida estava posta de parte, mesmo pela confissão do Banco.

Lembra-se V. Exa. que êle pedia para aplicar à sua prata, que importava em 3:000 contos, parece, a mesma doutrina que se queria aplicar à prata do Estado.

O Sr. Portugal Durão: — No tempo em que eu foi Ministro essa questão foi liquidada com o Banco, e devem existir ofícios pelos quais se demonstra que a prata pertence ao Estado.

De resto não podia haver confusão a êsse respeito; era uma questão intuitiva; nós éramos devedores na conta escudos, e credores na conta prata. Não liquidei então a questão porque não tinha escudos para isso.

O Sr. Velhinho Correia: — Mas depois de V. Exa. passar pela pasta das finanças, votou-se aqui a lei do empréstimo, e nela se diz que a prata, embora fôsse do Estado, ficava em poder do Banco, como cativa; até que descesse ao valor de 1914.

O Sr. Portugal Durão: — Ficava em poder do Banco como uma garantia; logo não se podia alienar.

Apoiados.

O Orador: — Não me esqueço da observação que o Sr. Cunha Leal lembrou, mas também, me lembro que tendo sido um dos parlamentares a quem o Banco se dirigiu no momento, o Banco não me disse o montante da prata que tinha para converter.

Disse o Sr. Portugal Durão que era intuitivo que á prata pertencia ao Estado. O que é facto, é que o Banco mandou para a Mesa da Câmara uma representação em que afirmava, com argumentos, que a praia era sua.

As cousas intuitivas são acenas o resultado das nossas paixões, e mais nada.

Sr. Presidente: ainda que o Govêrno, que ontem se demitiu, não tivesse tido outro merecimento na sua acção; senão êste de ter conquistado para o Estado a posse dessa praia, alguma cousa de útil praticou.

Confesso que a minha susceptibilidade não é tanta, que me sinta magoado, como português, pelo facto de a prata ir para o estrangeiro.

O Sr. Morais Carvalho (interrompendo}: — O que é mais grave é que a prata é vendida sem ser de harmonia com as leis, visto que o Govêrno publicou um decreto autorizando-se a si próprio a promover essa venda como entendesse.

O Orador: — Seja como fôr o que é certo, repito-o, é que o facto de a prata ir para o estrangeiro não fere os meus brios de português.

Quando há bastantes anos se quis caucionar um aumento da circulação fiduciária com 70 e tantas mil obrigações dos caminhos de ferro, obrigações que estavam no estrangeiro, o Banco não fez a emissão sem que essas obrigações entrassem nas suas caixas.

Ora se isto acontece há muitos anos, com contratantes nacionais, não vejo que seja para admirar que os nossos credores estrangeiros exigam caução aos seus empréstimos.

Sr. Presidente: nada mais tenho á dizer, repetindo a Câmara que o meu propósito, ao pedir a palavra para explicações, foi simplesmente o de defender a nossa própria moralidade, é a dos nossos homens públicos.

Não nos anavalhemos, porque tudo o que fizermos contraditòriamente ao nosso prestígio vai reflectir-se na República.

Tenho dito.

O orador não reviu, nem os «apartes» foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: não conheço condenação maior do que aquela que a Câmara está a fazer a si própria.

As responsabilidades do actual Parlamento são enormes; por consentir que os Govêrnos tenham vindo a fazer a alienação do património nacional.

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Esta questão da prata começou a ser ventilada no tempo do Sr. Vitorino Guimarães.

Pela lei n.° 1:424 dizia-se que o Govêrno deveria proceder à venda da prata, trocando-a por valores que ficariam em depósito no Banco de Portugal.

Foi esta a lei que alterou profundamente a doutrina da lei n.° 1:501, da autoria do Sr. Cunha Leal, autorizando o Govêrno a vender, como e quando quisesse, essa prata que estava a caucionar as notas emitidas à sombra da lei n.° 1:424.

Eu sou adversário político, e intransigente, do Sr. Cunha Leal, mas não posso deixar de atribuir à lei 1:501, da autoria de, S. Exa., propósitos absolutamente diversos do escandaloso decreto do Sr. Álvaro de Castro.

Sr. Presidente: o Sr. Almeida Ribeiro, que é uma pessoa de larga competência, e cujas qualidades de trabalho todos reconhecemos, é, todavia, eivado dum facciosismo tal, que chegou a dizer quê o pagamento dos encargos do Estado era uma despesa supérflua.

É êste facciosismo da maioria o responsável máximo da alienação que se está fazendo do património nacional.

Eu quis tratar dêste assunto em negócio urgente, mas a Câmara inibiu-me de o fazer.

Mandei depois uma nota de interpelação para a Mesa, mas o Sr. Almeida Ribeiro levantou-se para declarar que não era êsse o momento próprio para discutir o assunto.

Mas, Sr. Presidente, como se isto ainda fôsse pouco, também a lei n.° 1:424 se refere ao fundo de amortização e reserva, que está no Banco de Portugal, e, posteriormente a isso, já o Sr. Vitorino Guimarães apresentou a esta casa do Parlamento um projecto, que ainda não está transformado em lei, mas que em face do uso ou abuso que se tem feito da lei n.° 1:545, me leva a concluir que um Govêrno, com os escrúpulos constitucionais dos do Govêrno do Sr. Álvaro de Castro, há-de aproveitar-se dela para trocar os fundos de amortização e reserva por títulos de 6,5 por cento, vendendo-os, livremente, quando êles hoje andam num valor efectivo de novecentas e tal mil libras.

Portanto, a Câmara, com o seu silêncio, com a maneira intransigente porque impedido que nos ocupemos dêsse assunto, está a permitir que se venda todo p património nacional; está a permitir que se venda tudo que ao País pertence. E assim, as responsabilidades de V. Exa., Sr. Almeida Ribeiro, são tremendíssimas neste descalabro a que assistimos.

Mas, Sr. Presidente, êste é o lado legal da questão, e se olharmos à forma como a operação foi feita, quere dizer, à venda da prata à porta fechada, sem concurso, pelo Govêrno do Sr. Álvaro de Castro, e desde que falo em S. Exa. devo dizer que não é só o Sr. Almeida Ribeiro que faz justiça às qualidades de honestidade do Sr. Álvaro de Castro. Mas é que S. Exa., perfeitamente dominado por elementos que o cercam, tem feito obras e negócios que não são de admitir numa -administração moral.

O Sr. Almeida Ribeiro: — V. Exa. dá-me licença?

O Sr. Álvaro de Castro é pessoa com qualidades suficientemente morais e mentais para não se deixar dominar por ninguém.

O Orador: — Também V. Exa. tem qualidades morais e mentais para não se deixar dominar por casos prejudiciais ao país, e no emtanto o facciosismo político de V. Exa. está a demonstrar que se deixa levar por um caminho prejudicialíssimo ao país.

O Sr. Almeida Ribeiro: — É o que V. Exa. pensa.

O Orador: — É o que os factos demonstram.

Mas, Sr. Presidente; além dessa operação feita à porta fechada, há, outra, a compra do ouro em barra, operação que se vai fazer à poria fechada, também.

Mas há mais; vende-se a prata e compra-se o ouro. São duas operações, e como por uma falsa interpretação se pode fazer mais uma emissão de notas, à sombra dêsse ouro, êle pode ser novamente vendido, sem que o Govêrno dê contas ao país; e aqui tem V. Exa. como isto se resume a três operações feitas à porta fechada, três operações que dão, por vezes, margem a largas comissões. Nestes

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termos, eu pregunto: com que proveito para o país?

Com o proveito de uma nova emissão de notas?

Para que é que se vende a prata? Para que é que se vende o ouro? Para que se torna a vender o ouro?

Não há nada que justifique estas operações, e a ilação a tirar de factos desta ordem é que já não há preocupações na venda do património nacional, sendo de lamentar que V. Exa., Sr. Almeida Ribeiro, ponha acima dos interêsses nacionais os interêsses mesquinhos da política.

Sr. Presidente: verificada assim a questão, eu entendo que ela deve, ao menos, servir de lição à maioria parlamentar para que não continue a permitir essa desenfreada ditadura que se tem vindo a fazer nesta Câmara, desbaratando-se o património nacional sem que o Parlamento tome conta dêsses actos, sem que a maioria parlamentar deixe de acusar de obstrucionismo aqueles que estão a defender os interêsses nacionais.

É tempo de reparar a política dos negócios.

Não percebo nem posso perceber que a política republicana dependa da vontade de um homem que mais ligações tem com a finança do país.

Onde estão a coerência e a moralidade do um regime que vai buscar para seu super-homem aquele que representa precisamente o traço de ligação da política com os negócios?

Estou a ver o Sr. Rodrigues Gaspar, que há dias se referiu nesta casa do Parlamento aos aventureiros políticos e que numa sessão posterior declarou que não costumava cruzar os braços. Estou a ver os gestos que S. Exa. terá feito quando, como membro do directório, tem de intervir nesta questão. Se S. Exa. não cruza os braços, eu não quero quebrar as normas parlamentares para dizei quais os movimentos que S. Exa. terá feito.

Não quero alongar as minhas considerações e por êste motivo vou terminar. No emtanto chamo a atenção da maioria para o que vou dizer. A continuação do actual estado de cousas; a teimosia em não se verificarem as contas do Estado, a teimosia da Câmara em não querer apreciar largamente as contas do Estado é um crime de alta traição para com o país.

É por isso que chamo principalmente a atenção da maioria, para que procure, sem perda de tempo, revogar essa autorização, rever prontamente a legislação que tem sido promulgada ditatorialmente à sombra dela, para que então a Câmara possa ter autoridade para dizer ao país que não assiste de braços cruzados à venda daquilo que representa o património nacional.

Tenho dito.

O orador não reviu nem o Sr. Almeida Ribeiro fez a revisão dos seus àpartes.

O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: não posso deixar de começar as minhas considerações por dar uma resposta a alguns apartes de carácter pessoal que me foram dirigidos pelo Sr. Cunha Leal.

S. Exa., censurando a minha conduta política, bem como o Sr. Ferreira da Rocha, disseram que eu freqüento as assembleas populares.

Devo dizer ao Sr. Cunha Leal que tenho muita honra nisso. Foi no tablado popular que S. Exa. começou e em que eu comecei também. Contudo há uma diferença entre nós; é que eu ainda hoje freqüento êsses tablados, e S. Exa. já os não freqüenta.

Devo dizer mais o seguinte: as palavras de S. Exa. penalizaram-se profundamente.

Pode ser que realmente eu seja «um espírito daninho», mas não se esqueça V. Exa. que eu era republicano antes dela se proclamar, e tenho-a servido sempre com o maior interêsse.

É possível, repito, que eu seja «espírito daninho», mas tenho grande orgulho em o dizer: nunca as minhas atitudes políticas e conduta política serviram para melhorar as minhas condições pessoais.

Mais; tenho hoje o prazer e à guelque chose malheur est bon, de me voltar para os adversários, e de lhes dizer que é ocasião agora de me confundirem se puderem.

Em resposta falarei assim; não são bravatas, mas sim umas palavras de defesa legítima, da parte de quem quere ter o direito de expandir livremente a sua opinião, respeitando a opinião dos outros.

É simplesmente uma atitude de legítima defesa.

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Entrando propriamente no assunto, devo dizer que, salvo o devido respeito, me parece que esta discussão é absolutamente inoportuna; contém matéria propriamente política a seguir à demissão do Ministério.

1 Parece que o que se pretende é; anular a figura de Álvaro de Castro para o inutilizar de continuar naquelas cadeiras; eu considero o facto com uma certa estranheza, por me parecer que se trata de uma espécie de interpelação na ausência das pessoas que podem responder a essa interpelação.

Uma voz: — São os altos interêsses do Estado.

O Orador: — Da operação da prata só dela tive conhecimento aqui; do que dou a minha palavra de honra.

Interrupções.

Protestos.

O Orador: — Eu não interrompi nenhum orador, e, se me dão licença, continuo.

Em quanto a essa questão, abusa-se da palavra património.

O Govêrno não alienou uma parcela, sequer, do património nacional.

O Govêrno não procedeu senão dentro da lei.

Por isso não deve ser censurado; nem há razão, para quem conheça o A B C da economia política, para se fazerem tais observações.

Eu pregunto: O que fazem os países em nome da defesa da balança económica?

Não empenharam os seus valores prata ou ouro?

O que fez a França? Não exportou prata è ouro para a Inglaterra?

E a própria Inglaterra, não exportou enormes quantidades de ouro?

É uma operação corrente, que fazem os vários Estados quando precisam de créditos.

Mas então não é uma operação corrente feita já por diversos Estados, o caucionar créditos externos com o numerário de que o Estado devedor dispõe?

O que tem isso com o património?

Quando se deu a crise de 1892, não se verificou acaso o facto de ir para o estrangeiro grande quantidade de prata e ouro para satisfazer as imperiosas necessidades da Nação?

Então isto tem alguma cousa com o património nacional?

Afirmou o Sr. Cunha Leal que neste caso da prata havia qualquer cousa de escuro.

É preciso, pois, que tudo se esclareça, e assim mando para a Mesa uma proposta ordenando um inquérito.

Temos a base 2.ª da lei n.° 1:501, da autoria do Sr. Cunha Leal.

O que significa essa base?

Significa o seguinte:

Que o Parlamento autorizava o Poder Executivo a vender a prata.

O Sr. Ministro das Finanças entendeu que não havia grande necessidade de esta prata estar imobilizada, e levantou-a. A prata estava caucionando uma dívida, e eu pregunto: que diferença há em que o mesmo valor prata seja levantado para caucionar outra dívida?

Gostava de saber como é que V. Exas. responderiam a isto.

Por agora termino as minhas considerações.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Cunha Leal: — Pedi a palavra para responder ao ilustre Deputado Sr. Almeida Ribeiro, que me parece querer dar-me conselhos.

O Sr. Almeida Ribeiro: — Eu não pretendo dar conselhos a ninguém!

O Orador: — Conselhos que eu poderia aceitar quando as minhas opiniões estivessem de acordo com êles.

Vou precisar bem os termos de que me servi: eu não acusei ninguém de desonesto.

Dou estas explicações, antes que outras pessoas mas peçam, e em termos tais, que me impossibilitem de as dar como eu as estou dando.

Mas classifiquei de escuro o negócio da prata, e vou dizer porquê: não é clara a forma por que se está procedendo a respeito da alienação ou, emfim, do transporte para Inglaterra da prata para servir de caução.

Não é clara, porque foi feito um mistério grande, e porque dias antes da prata embarcar se escondeu o facto, como se fôsse um crime!

Apoiados.

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É uma cousa que não tem aquela clareza com que se deve proceder sempre nas operações do Estado, e não se compreende que se fôsse esconder o transporte da prata para bordo de um navio numa determinada madrugada, quando ainda na véspera o Sr. Alberto Xavier negava que êsse transporte se fizesse.

Apoiados.

Quere V. Exa. dizer-me se nestas condições acha isto claro?

Eu acho isto escuro!

Fique V. Exa. com a sua opinião, que ou fico com a minha!

Apoiados.

A minha opinião é que tamanha subtileza nos negócios do Estado prejudica sempre quem a emprega. E tantos são os mistérios em que a prata tem andado envolvida, que ainda se suspeita que a prata foi alienada.

Também o Sr. Almeida Ribeiro não tem razão, quanto a mim, a respeito do conceito, que faz desta operação.

O transformar um valor prata em valor ouro já aqui declarei que é sob certos aspectos uma medida de prudência. Ninguém ignora as flutuações que depois da guerra o valor da prata tem tido.

Subtrair um depósito de prata, portanto, da posse de um particular, é um acto de boa prudência; mas com o que não estamos de acordo, é com o destino a dar aos valores ouro provenientes da troca da prata.

Alguém disse aqui que todos os Estados, em determinada época, transferem, para pagar os débitos da sua balança económica, as suas reservas ouro para o estrangeiro.

No actual momento, eu creio que somos o único povo da Europa que fornece o exemplo de transferir as reservas dos seus Bancos Emissores sem as ligar por qualquer forma ao próprio valor da moeda.

O que eu tenho visto fazer noutros países é procurar aumentar, quanto possível, os seus valores ouro e prata.

É certo que durante a guerra se deram grandes transferências da Itália e Inglaterra para a América.

Mas eu pregunto: quais foram as diminuições de reservas que os Bancos Emissores dêsses países sofreram?

Nenhuma diminuição.

Pelo contrário, aumentaram-nas.

Várias pessoas confundem as reservas ouro de uma nação com as reservas dos seus Bancos Emissores, que os Estados procuram afanosamente guardar.

Porquê?

Porque o valor da moeda cresça, porque aumentam, as reservas ouro?

Não.

No dia em que quisermos passar para um regime de estabilização de moeda, conforme nos foi aconselhado na Conferência de Génova, teremos em primeiro lugar a preocupação de manter exactas as nossas reservas ouro para a efectivação desta política. É foi em obediência a esta, que alguns homens públicos resolveram alienar a prata, tornando-a adstrita à própria dívida do Estado ao Banco de Portugal, até que o valor dessa dívida chegue a um certo limite. Foi o pensamento da Câmara; mas o Sr. Álvaro de Castro, servindo-se de uma autorização que lhe foi dada pelo Parlamento, foi contra o pensamento da Câmara, que, antes de mais nada, procurava impedir a alienação das reservas ouro e prata.

Apoiados.

É possível que, se tivéssemos fixado uma política de estabilização, a alienação da prata fôsse medida de certo modo defensável.

Contudo, o que fez o Sr. Ministro das Finanças?

S. Exa. disse para consigo:

«— De que me serve a garantia dê 140 ou 150:000 contos que foram lançados no mercado, esteja na própria prata ou seja representada pelos títulos equivalentes aos outros que servem de caução ao débito do Estado? E não me servindo de nada, eu saco os valores ouro em reservas inalienáveis, substituindo-os pela caução de 3 por cento, que custa apenas à importância do papel, e disponho dos títulos. Disponho para que? Pará evitar aumentos de papel e para pagar débitos orçamentais.

É assim que se procede às claras e não como o Govêrno fez com uma autorização desta Câmara.

A mim repugna-me, Sr. Almeida Ribeiro, essa medida, pois vamos assim depreciando cada vez mais essa moeda, em vez de a estabilizar. O que estamos fazendo é canalização da moeda,

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Hoje vai a prata, amanhã vai o ouro.

Dir-me hão: porque é que eu me não revoltei na ocasião em que se publicou o decreto? Eu nessa ocasião não estava na Câmara, porque se estivesse, e quisesse falar, aconteceria o mesmo que a outros oradores que não lhes permitiram falar sôbre o assunto em negócio urgente.

Isto é uma política de muito pouca prudência, e pode dizer-se que é a política do desespero, a política da miséria. Foi dispor-se da prata que pertence ao Estado, que é o sangue do País.

Do País que não pode sujeitar-se a muitas sangrias; e a entrarmos assim nessa política de alienação, vendendo ou empenhando toda a riqueza nacional, não podemos deixar de chegar à conclusão de que o País está evidentemente à beira do abismo, quando na verdade ainda temos muitos outros recursos para o salvar.

Apoiados.

Tenho tido a,maior consideração e respeito pelo Sr. Álvaro de Castro, porém os seus processos administrativos não podem deixar de ferir o nos s Q sentimento de portugueses.

Repugnam-me os negócios escuros, pois a verdade é que êles prejudicam a dignidade nacional, e apenas servem para os adversários do regime tirarem efeitos políticos.

Como homem de bem, Sr. Presidente, não me pode deixar de repugnar o mistério do embarque da prata, que é na verdade um negócio escuro, porém a responsabilidade vai a quem tenha a coragem de a assumir;

A saída da prata significa que o sangue português está saindo do País, e uma nacionalidade que entra nessa política demonstra que está evidentemente à beira do abismo.

Repugnam-me, repito, êstes processos, que nada dignificam a República, e que só servem para os adversários do regime atacarem os homens e os seus processos.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Portugal Durão: — Sr. Presidente: pedi a palavra para me referir a uma frase proferida pelo Sr. Almeida Ribeiro; mas, antes disso, torna-se necessário responder a uma pregunta feita pelo Sr. Velhinho Correia.

Preguntou S. Exa. a que qual é a diferença que há entre vender cambiais em Londres e vender a prata.

Devo dizer a V. Exa. que a diferença é apenas a seguinte: é a mesma que dá entre pagar uma dívida endossando uma letra, e vender uma propriedade para pagar uma dívida.

A prata, Sr. Presidente, pertencia ao Estado, e assim não podia nem devia ser alienada sem autorização desta Câmara.

Contra essa alienação é que eu protesto, e bem assim pela maneira como ela foi feita, não podendo, também, de neste momento deixar de chamar a atenção da Câmara para o ouro que se encontra depositado no Banco de Portugal, o qual não pertence ao Banco, mas sim única e exclusivamente aos portadores das notas.

Dito isto, vejo-me obrigado a fazer notar ao Sr. Almeida Ribeiro, que teve uma frase que evidentemente lhe escapou, e que certamente se não pode referir a ninguém, mas que eu, no emtanto, não posso deixar de levantar.

Disse S. Exa. que se anavalham aqui os homens públicos.

O que se fez aqui não foi anavalhar ninguém; e se bem que a frase implique qualquer cousa de traiçoeiro, eu devo dizer que nos ataques que fiz não tive O' intuito de agravar ninguém, tanto mais quanto é certo que tenho dado o meu apoio ao Govêrno, sempre que estive em concordância com êle.

Sempre que estive em discordância com. êsse Govêrno, talvez mesmo indisciplinadamente, foi no emtanto cara a cara, na 'frente do Sr. Presidente do Ministério. O homem que assim procede não anavalha ninguém.

Se falei neste momento, em que o Govêrno não está presente, usei do meu direito de Deputado, de cidadão, de português, para não deixar passar despercebido um facto que lá fora suscitou condenação.

Não, Sr. Presidente, não houve da minha parte, não houve da parte de ninguém o desejo de deminuir o carácter, as qualidades de republicano e de estadista do homem que se sentou naquela cadeira.

Tratou-se de factos; não se tratou de homens.

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Não se deminui a República procedendo-se desta maneira. A República tem de agir, tem de proceder às claras, à luz do dia. Foi em nome dêsses princípios, de maneira que todo o País conheça como essa administração é feita, que nós implantámos a República, e eu prezo-me, como tantos outros, de estar há muitos anos na República.

Sr. Presidente: levantando esta questão, que interessa ao País, que interessa à dignidade nacional, não se deminui ninguém, mas afirma-se a vontade enérgica que todos temos de que a administração pública se faça às claras à luz do dia, para prestígio dos homens, para prestígio da República.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. António Maria da Silva: — Sr. Presidente: no debate travado a propósito, da alienação da prata, do seu transporte para a Inglaterra ou qualquer acto semelhante a êste, praticado pelo Poder Executivo, tomaram parte vários oradores, alguns dos quais eu tive a honra da sua colaboração em Gabinetes a que presidi. Não queria, pois, deixar de dizer também da minha justiça neste caso.

No final do último Govêrno da minha presidência, recorda-se V. Exa. vi-me colocado numa situação difícil por não ter sido votada pela Câmara a prorrogação das sessões, a fim de habilitar êsse Govêrno com os meios, indispensáveis à vida da Nação. Tive, mercê de circunstâncias políticas, de ficar contrariadamente no Poder.

Teve êsse Govêrno de proceder pela pasta das Finanças, por forma que não se afectasse o crédito duma das instituições do Estado, inteiramente do Estado, e ao mesmo tempo para não deixar de satisfazer os pagamentos em dívida e que. o Estado tinha de cumprir na data do seu vencimento.

Serviu-se o Ministro das Finanças de então, bem ou mal, foi aqui discutido, do aumento de circulação fiduciária, mas, por êsse facto, foi o Govêrno da minha presidência desalmadamente tratado por gregos e troianos.

Também anteriormente tinha o Sr. Vitorino Guimarães apresentado ao Parlamento uma proposta que veio a ser transformada em lei, a lei n.° 1:424, de 18 de Maio de 1923.

Pela alínea e) do artigo 6.° dessa lei o Govêrno poderia proceder à troca da prata.

Ficou expresso nesta disposição legal que a prata era considerada do Estado e simplesmente se obrigava o Govêrno a dar contra-partida para qualquer operação efectuada. Não podia efectuar-se a venda da prata sem haver contra partida em qualquer valor ouro.

Pela lei de 1918 o aumento da circulação fiduciária tinha uma contra-partida.

Sr. Presidente: eu deploro mais uma vez que continue afastado dos trabalhos desta Câmara o Sr. Barros Queiroz, velho republicano, homem de bem, que à República tem dado todo o seu esfôrço e prestado relevantes serviços.

Se S. Exa. aqui estivesse, eu demonstrar-lhe-ia que esta questão, sob o ponto de vista jurídico, é defensável.

A intenção do meu Govêrno era o de, não alienando nada do nosso património nacional, encontrar um valor ouro correspondente para poder em seguida emitir as notas.

Não se quis adoptar êste critério, e a verdade é que estamos bem vingados, por isso que se aumentou a circulação fiduciária sem contra-partida.

O Sr. Carvalho da Silva: — V. Exa., em face do contrato de 1918, não podia emitir mais notas do que a importância em escudos correspondente ao valor ao par do fundo ouro, e o Sr. Cunha Leal alterou essa interpretação pela lei n.° 1:501.

O Orador: — Devo fazer justiça à forma como a minoria monárquica entrou nessa questão, auxiliando-a no sentido do evitar um descrédito para o Estado.

Tanto a lei n.° 1:541 como a lei n.° 1:501 estabeleciam o princípio de que a prata não era alienável sem ter o valor ouro correspondente.

Mas, seja como fôr, o que é verdade é que as leis n.ºs 1:545 e 1:541 estabelecem o princípio de que a prata não

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era alienável sem um valor correspondente.

Pejo decreto de 12 de Fevereiro de 1924 nós verificamos que por esta medida, a dos 6,5 por cento e outras, nós marcámos a nossa posição, e embora, para muitas pessoas, ela não fôsse muito explícita, indicava contudo, claramente, que não aceitava muitas das medidas de carácter financeiro, adoptadas pelo Govêrno passada.

Mas eu não tenho culpa que tivessem julgado constitucional êste decreto, permitindo a alienação da prata.

Eu não reconheço nenhuma vantagem na venda.

Bani sei que ela é para acudir às necessidades do Estado, mas se tivéssemos uma forma indirecta de conseguir o mesmo objectivo, melhor procederíamos para a vida do Estado.

Sr. Presidente: ao usar da palavra não tive qualquer intuito de ofender a honestidade de quem quer que seja, meu amigo, inimigo ou antagonista político, mas tam somente definir a minha posição.

Mas o que não faz sentido é negar-se um facto que depois se verifica que êle é verdadeiro.

Contra isto é que eu me revolta; é aqui que está a chaga que precisa ser cauterizada.

Na história, realmente, repetem-se os mesmos factos Q circunstâncias, e hoje posso dizê-lo, aliás sem prazer, fui mais uma vez profeta na minha terra, porque as pessoas que se me seguiram foram piores do que eu.

Apoiados.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Chamo a atenção do Sr. Velhinho Correia.

V. Exa. disse que tinha uma proposta para mandar para a Mesa.

O Sr. Velhinho Correia: — Efectivamente, mas aguardei as explicações do Sr. Cunha Leal para o fazer, e devo dizer que, tenda elas, bem como as palavras do Sr. Portugal Durão, satisfeito inteiramente as dúvidas que podiam subsistir, tranqüilizando ò meu espírito republicano, desisti de o fazer.

Apoiados.

O Sr. Presidente: — Está em discussão a acta.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Como -ninguém pede a palavra, considera-a aprovada.

Dá-se conta do expediente que dependia da resolução da Câmara.

O Sr. Presidente: — Tendo a Mesa desempenhado junto do Sr. Barros Queiroz a missão de que foi incumbida pela Câmara para convencer aquele ilustre Deputado a reocupar o seu lugar nesta Câmara, obteve textualmente a seguinte resposta que vou ler à Câmara:

O Sr. Barros Queiroz declarou à Mesa que está convencido que a política financeira do Govêrno, em matéria de divido, pública, é prejudicial à República, e que mais prejudicial é para a Nação, no futuro, a aprovação que a essa política deu o Parlamento.

Não pode negar aos outros o direito de seguirem a orientação que melhor lhes pareça, mas o simples facto da sua intervenção nas discussões doa assuntos financeiros, dado o sou modo de agir no Parlamento, importa colaboração nas providências adoptadas, e, conseqüentemente, co-responsabilidade que não quere assumir por estar antecipadamente convencido dos seus efeitos perniciosos para a Nação o para a República.

Por esta razão abstém-se de tomar parte nos trabalhos parlamentares emquanto se não adoptar uma orientação diferente.

S. Exa. agradeceu reconhecido à Mesa e à Câmara as provas de consideração pessoal que lhe dispensaram, e pediu-me que transmitisse a V. Exas. a sua gratidão pela honrosa manifestação, de que foi alvo por parte da Câmara, acrescentando que o abandono dos trabalhos parlamentares não significa de modo algum o Abandono da actividade política em defesa da República e dos princípios defendidos pelo seu Partido, e que, onde quer que a Nação ou a República corram risca, êle lá estará para cumprir com o seu dever de português e de republicano.

Para a acta.

Devo ainda comunicar à Câmara o falecimento duma irmã do Sr. Ministro da

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tiça, Domingues dos Santos, que é ao mesmo tempo nosso ilustre colega nesta Câmara; proponho, por isso, um voto de sentimento.

Apoiados.

O Sr. António Maria da Silva: — Sr. Presidente: associo-me, em meu nome e em nome dêste lado da Câmara, ao voto de sentimento proposto por S. Exa. pela grande dor que acaba de sofrer o ilustre Ministro da Justiça.

Relativamente à resposta do Sr. Barros Queiroz, devo dizer que da parte dos parlamentares, dêste ludo da Câmara só há um desejo, independente dos Govêrnos e das suas políticas: é que S. Exa. venha para o nosso seio, tanto mais que êle pode ser indicado com justo orgulho como um dos parlamentares mais brilhantes que temos, e com uma vida mais larga, de Deputada, além de muito ter contribuído para o advento da República,

Apoiados.

Desgostos tenho eu tido, e também muitos dos meus camaradas dêste lado da Câmara; muitas vezes o sofrimento vai além dos limites naturais, mas entendemos que nesta hora difícil — e basta pensar no que se tem passado aqui nos últimos dias — a ninguém é dado estabelecer a política de renúncia.

Eu podia não apoiar o Govêrno, como não apoiei, em muitos dos seus actos, mas não abandonei a Câmara, estando às vezes contra o meu Partido, porque entendo que acima de tudo estão os interêsses da República.

Apoiados.

Ora o Sr. Barros Queiroz teve sempre o seu Partido a seu lado, e viu que muitas vezes até as suas brilhantes considerações eram aprovadas por todos os lados da Câmara, prestando-se assim homenagem às suas brilhantes qualidades.

O que nós desejamos é que S. Exa. regresse ao seio desta casa do Parlamento, onde a sua falta é notada com pezar, por todos nós, o mais ràpidamente possível,

Apoiados.

Proponho, por isso, que a Mesa volte a insistir com o ilustre parlamentar, de forma a que S. Exa. fique com a íntima convicção de que todo o Partido Republicano Português deseja ardentemente que êsse nosso ilustre colega nos continue a honrar com a sua camaradagem.

Apoiados.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: se todos os republicanos, como muito bem acaba de dizer o Sr. António Maria da Silva, sentem com profundo desgosto a circunstância do Sr. Barros Queiroz se ter afastado do convívio de todos nós, o Partido Nacionalista, mais do que qualquer outro agrupamento político, sente e deplora a falta, do S. Exa.

Apoiados.

O Sr. Barros Queiroz é uma figura que se impõe à consideração do todos nós (Apoiados), e não é pessoa para mendigar homenagens.

Apoiados.

S. Exa. obedeceu a razões de ordem íntima, que todos nós compreendemos, embora lamentando u sua resolução.

É bom, porém, que haja um pouco de de reflexão sôbre as causas determinantes do seu afastamento dos trabalhos parlamentares.

O Sr. Barros Queiroz tem procurado sempre, através toda a sua vida parlamentar, engrandecer e prestigiar o Parlamento.

É nesse propósito S. Exa. esforçou-se, quer pessoalmente, quer pelo seu partido, a dar os Governos toda a colaboração para êles poderem levar a bom termo a sua missão.

Nestas condições, e dada a mentalidade do Sr. Barros Queiroz; o seu carácter e Q seu republicanismo, não é para Admirar que S. Exa. sentisse grande desgosto pela marcha da administração pública, negando-se a colaborar numa obra nefasta para o crédito da República.

A maioria, não querendo secundar o Sr. Barros Queiroz, encheu-o de desgôsto. Cora o seu procedimento, porém, adoptando uma política de tolerância, ajude-nos a maioria a convencer o Sr. Barros Queiroz do que não tem razão de ser o seu exílio.

Todos aqui o desejamos, e é preciso que todos criemos as condições dentro das
quais todos se sintam honrados por pertencer à nossa grei, por fazer parte do
Parlamento Português.

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A minoria nacionalista, saudando mais uma vez o Sr. Barros Queiroz, não perde a esperança de que se realize uma política de concórdia.

Se não se realizar, as responsabilidades que caibam a quem devam caber.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: é com muito desgosto que vemos afastado dos trabalhos parlamentares o Sr. Barros Queiroz, pessoa que pelo seu carácter, pela sua inteligência, pelas suas qualidades de homem de trabalho, sempre se impôs à consideração dêste lado da Câmara.

Elemento de incontestável valor em qualquer Parlamento, é dos que mais merecem ser ouvidos pólo prestígio que justificadamente alcançou.

Fazemos votos por que o ilustre Deputado volte prontamente aos trabalhos da Câmara, onde tam preciso é, mas, uma vez que em volta dêste caso algumas considerações foram formuladas pelos Srs. António Maria da Silva e Cunha Leal, permita-me V. Exa. que também eu algumas considerações faça em nome dês-te lado da Câmara.

Como V. Exa. acaba de ouvir ao Sr. Cunha Leal, o Sr. Barros Queiroz era uma daquelas pessoas que ardentemente desejavam uma política de colaboração com a maioria parlamentar, por entender que assim poderia ter uma acção útil na directriz das cousas públicas, mas S. Exa. convenceu-se de que eram inteiramente improfícuas todas as suas diligências nesse sentido, e êstes factos não vêm senão confirmar o que nós pensamos.

Quem se mantenha na defesa da República, ainda que seja o mais bem intencionado dos homens, como é o Sr. Barros Queiroz, não será mais do que uma fôrça inteiramente perdida e dominada por aqueles que têm conduzido a República e o país à situação em que se encontram.

Não apoiados.

Assim se prova que ainda mesmo uma figura com o prestígio do Sr. Barros Queiroz não consegue de nenhuma maneira alterar a marcha da República.

Trocam-se vários àpartes.

O Orador: — Sem querer alongar as minhas considerações, não posso deixar de pôr em destaque o nosso ponto de vista, o nosso desejo de que todos os republicanos bem intencionados, que assim se desiludam da possibilidade de qualquer acção útil dentro da República, sigam o caminho que a si próprios devem traçar.

Não pode' manter-se em abstenção quem veja o seu país caminhar para o abismo.

Nós, que não somos sectários, que desejamos a união de todos os bons portugueses, fazemos votos por que aqueles que cheguem à conclusão a que o Sr. Barros Queiroz chegou venham para o lado dos que têm como ideal o único regime capaz de bem servir a Nação, a monarquia.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Viriato da Fonseca — Sr. Presidente: por exclusão de partes, porquanto da Acção Republicana só eu estou presente, permita-me V. Exa. que eu preste a minha homenagem, a mais sincera, a mais sentida, perante essa alta e típica figura, quer do Parlamento, quer da República, quer da Pátria, que é o Sr. Barros Queiroz.

Como disse a V. Exa., só por exclusão de partes o faço, dada a pequenez da minha situação política; no emtanto, cheio daquela coragem que me dá a minha sinceridade e a minha honestidade, no que tenho o maior orgulho, juntarei também as minhas saudações a êsse homem que politicamente tem sempre usado da maior correcção e que, tecnicamente, sempre tem entrado na apreciação dos mais altos problemas com profundo conhecimento, bem merecendo o nome de Mestre que todos certamente lhe reconhecem.

A êste homem temos o dever de prestar todas as homenagens do nosso respeito e o nosso sentimento por o ver afastado dos trabalhos desta Câmara.

Aproveito a oportunidade para me associar ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pela morte da irmã do Sr. Ministro da Justiça.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

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O Sr. Santos Barriga : — A saída desta casa do Parlamento dum dos seus melhores representantes tem neste momento uma especial importância, porque representa o desânimo dum homem que sempre soube harmonizar os interêsses do seu partido com os superiores interêsses do país.

Tive ocasião de colaborar com o Sr. Tomo de Barros Queiroz em algumas comissões, e verifiquei que sempre um alto patriotismo ditava a sua maneira de proceder.

Em meu nome pessoal e dalguns Deputados independentes, faço a proposta para que todos os lados da Câmara se façam representar junto da Mesa e a acompanhem, para assim dar mais realce ao acto que tem por fim demover S. Exa. dos seus propósitos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira de Mira: — Ainda ontem, numa reunião de correligionários meus, tive a honra de representar o Sr. Barros Queiroz, agradecendo as homenagens que lhe foram prestadas. Considero-me neste momento no uso da mesma procuração, para que tenho alguns direitos, que são os duma velha amizade pessoal e política.

Agradecendo a todos os oradores que me antecederam, eu tenho de dizer que o acto do Sr. Barros Queiroz não representa desânimo, nem quanto aos destinos da República, nem quanto aos destinos do seu partido, onde continua a militar.

O seu acto representa apenas um protesto político contra uma das machadadas que se quis dar no regime parlamentar, mas não significa o abandono da política republicana.

S. Exa., sempre que a República dele precise para qualquer pôsto, e sejam quais forem os incómodos que de tal lhe possam resultar, estará pronto a assumi-lo com o mesmo leal carácter, com a mesma energia de sempre. Tinha que dizer estas palavras em referência, principalmente, ao ilustre Deputado monárquico Carvalho da Silva, que em má hora pretendeu ver no gesto do Sr. Barros Queiroz qualquer descrença de S. Exa. no futuro, nas prosperidades da República.

Repetindo, em nome do Sr. Barros Queiroz, os agradecimentos com que iniciei estas breves palavras, e só espero que todos nós, nesta Câmara, e nisto não ofendo ninguém, tenhamos sempre para tratar, os assuntos submetidos à nossa discussão, a mesma proficiência não posso dizer, mas, pelo menos, o mesmo carácter de lealdade que tem tido S. Exa.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestas condições, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Ferreira de Mira, pessoa por quem tenho a maior consideração e o maior respeito, aludiu às minhas palavras sôbre a carta do Sr. Barros Queiroz, dizendo que as proferi em má hora. Fi-las, sem duvida em má hora, mas para o país; em tam má hora que é o próprio Sr. Barros Queiroz quem o reconhece. Não quis de modo algum ser desagradável para com o Sr. Barros Queiroz, a quem êste lado da Câmara sempre tem prestado as homenagens da sua consideração, mas factos são factos.

É dentro desta casa que se estabelece u caminho da administração pública; é dentro desta casa que se resolvem os problemas nacionais.

O Sr. Barros Queiroz, reconhecendo que a sua acção era improfícua dentro desta casa, reconheceu implicitamente que a República aqui representada não pode enveredar por um caminho diferente daquele por que tem enveredado. Foi esta a única conclusão que tirei, porque os factos me levaram a tirá-la.

Tenho dito.

O orador não reviu.

É aprovada a proposta do Sr. Santos Barriga.

O Sr. Presidente: — Para acompanharem a Mesa nas suas novas diligências junto do Sr. Barros Queiroz, o Grupo Democrático indicou já os Srs. António Maria da Silva e Rodrigues Gaspar. Agradeço, pois, a indicação dos restantes partidos representados nesta Câmara,

O Sr. Pina de Morais: — Sr. Presidente: há cêrca de um mês tive a honra

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de enviar para a Mesa uma moção, que depois foi aprovada, que dava ao Govêrno do Sr. Álvaro de Castro, hoje demissionário, toda a latitude necessária para resolver com inteira justiça a greve dos telégrafo-postais.

O Govêrno não tomou nenhuma resolução em conformidade com o teor dessa moção, que com o mais completo respeito pelo prestígio do Poder Executivo impunha a normalização dos serviços dos correios e telégrafos.

Depois de apresentar esta moção, eu fiquei implicitamente ligado à questão, e assim tive que fazer várias démarches junto do Poder Executivo, actuando sempre por forma a deixar em pleno brilho o prestígio da lei.

Nada, porém, consegui, embora as plataformas sugeridas mo parecessem aceitáveis.

Tendo os grevistas desistido de todas as suas pretensões para solicitarem apenas justiça, entendo que se colocavam em posição de merecerem a nossa atenção.

A justiça seria castigar os que houvessem prevaricado, quer fossem do pessoal menor, quer fossem do pessoal maior, mas não vejo possibilidade de se proceder assim, pois já vão passados uns quarenta dias e não há nenhuns processos organizados.

No Pôrto ainda está ao serviço o empregado menor que, de pistola em punho, expulsou das repartições os seus superiores.

Contra os que em Lisboa praticaram actos de sabotage, não houve procedimento nenhum.

Nestas condições, como fazer justiça? Só perdoando. Só não castigando ninguém.

Assim, pois, tenho a honra de apresentar um projecto de lei.

Creio que ficará desta forma arrumada a questão, normalizando-se imediatamente os serviços. E como se torna indispensável que os serviços fiquem normalizados sem mais delongas, peço a Câmara que conceda para êste meu projecto a urgência e dispensa do Regimento.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O requerimento foi aprovado e entrou, em discussão o seguinte:

Projecto de lei

Artigo 1.° É facultado aos indivíduos que em 15 de Maio passado eram funcionários dos correios e telégrafos, a sua apresentação ao serviço na Administração Geral, no prazo de três dias, a contar da data da publicação desta lei, reassumindo imediatamente o exercício das suas funções.

§ único. Os funcionários a que êste artigo se refere e os que fazem parte do pessoal menor, são relevados da responsabilidade em que incorreram por faltas disciplinares praticadas e pelos delitos cometidos desde o movimento que deu lugar à entrega dos serviços à Direcção Geral dos Transportes.

Sala das Sessões, 17 de Junho de 1924.— O Deputado, Pina de Morais.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: oxalá que a aprovação do projecto do Sr. Pina de Morais possa finalmente ver normalizar os serviços telégrafo-postais do país.

Não compreendo como durante dois meses o Govêrno se tenha mantido perfeitamente alheado dum serviço cuja falta é prejudicial ao país, por representar um dos serviços mais necessários à vida nacional. Êsse modo de encarar as questões, é também o modo por que há pouco o Sr. António Maria da Silva declarou que não concordava com a obra financeira do Govêrno, depois de êle ter caído.

Não há dúvida que esta é uma maneira cómoda de fugir às responsabilidades que a maioria tem por ter apoiado o Govêrno; maioria de que faz parte o Sr. António Maria da Silva, que não quis que aqui se levantasse a questão, e que hoje, depois da queda do Govêrno, vem declarar que não concordava com a obra financeira do Govêrno.

Afinal, a solução é de que ninguém teve a responsabilidade nesta falta de. solução do conflito telégrafo-postal.

É cómodo êste processo, mas não lhe podemos dar apoio.

Não queremos demorar mais a aprovação do projecto, porque compreendemos que é necessário que a questão se resolva a bem da disciplina.

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Sou dos que pensam que as questões desta natureza se resolvem pretendendo fazer reduzir pela fome qualquer classe, quer se trate do funcionalismo, quer se trate doutra classe.

Num país de sentimentos como o nosso, a disciplina sofreu muito, mais ainda por se não ter o Parlamento pronunciado há mais tempo, pondo de lado questões de política mesquinha.

Damos, pois, o nosso voto ao projecto do Sr. Pina de Morais, fazendo votos por que a maioria desta Casa do Parlamento mio continue a seguir os processos que tem seguido até aqui. Essa situação é devida única e exclusivamente ao Govêrno, e bem assim à maioria, o que tem amparado em todos os seus actos.

Não quero, Sr. Presidente, alargar-me em mais considerações, razão por que termino por aqui o que tenho a dizer sôbre o assunto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: dada a atitude que eu tomei nesta Câmara quando foi votada a moção aqui apresentada sôbre o conflicto telégrafo-postal. eu não posso, ao discutir-se um projecto dêstes, deixar de dizer à Câmara, para mostrar bem a minha coerência, que estou de acordo com êle, por isso que êsse projecto encerra, de facto, os mesmos pontos de vista que eu apresentei na minha moção, pois a verdade é que, com a sua aprovação, nem o prestígio do Poder fica deminuído, nem os funcionários ficam numa situação que não seja boa para êles.

Acha, portanto, que o projecto apresentado pelo Sr. Pina de Morais apresenta uma solução que pode de facto aprovar-se, razão por que eu lhe dou o meu voto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente: o projecto apresentado pelo Sr. Pina de Morais tem duas partes: uma que diz respeito à forma como os funcionários dos correios e telégrafos se devem apresentar ao serviço, e a outra que se refere a uma amnistia.

Quanto à primeira parte, isto é, ao seu artigo 1.°, estou plenamente de acordo; porém, quanto ao seu § único, não concordo, nem posso de maneira alguma concordar com êle, visto que sou contrário a todas as espécies de amnistias.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer a V. Exa. e à Câmara que não concordo com o projecto em discussão, pois a verdade é que êle está redigido em termos que não pode nem deve ser aprovado pela Câmara.

Entendo que o conflito chamado «dos correios e telégrafos» deve ser resolvido, e.quanto antes, tanto mais quanto é certo que são êsses os desejos da maioria do país; porém, um facto há para o qual eu não posso deixar de chamar a atenção de V. Exa. e da Câmara.

Não posso compreender que êsses, funcionários, que estiveram ausentes do serviço durante tanto tempo, fiquem com o direito de receber todos os seus vencimentos. Seria um precedente terrível, que deminuída o prestígio da autoridade e o prestígio do Poder Legislativo. Se se consentisse que um tal facto se dêsse ninguém mais teria fôrça para reprimir actos da natureza daquele que está em discussão.

Entendo, pois, que a Câmara deve apenas aprovar a primeira parte dêsse, projecto de lei, não devendo aprovar a parte que diz respeito aos funcionários receberem os seus vencimentos do período em que não prestaram serviço. Mesmo V. Exa. não podia aceitar o projecto de lei nessa parte, porque é centra a lei-travão; é ilegal.

Sabe-se que emquanto se discute o Orçamento todos os projectos de lei tendentes a aumentar as despesas ou a deminuir a receita, não podem ser admitidos pela Mesa sem o «concordo» do Sr. Ministro das Finanças e das comissões de finanças e do Orçamento.

A verba orçamental destinada a êsse pessoal foi utilizada pela Direcção. Geral de Transportes. Portanto, êste parágrafo implicaria um grande aumento de despesa.

Chamo, portanto, a atenção da Câmara para o facto que acabo de apontar.

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26 Diário da Câmara dos Deputados

Aceito o artigo 1.°, mas não posso aceitar o restante, o que seria imoral.

Quanto aos delitos, faço minhas as considerações do Sr. Ferreira da Rocha, desejando que se faça um esquecimento sôbre êles.

O orador não reviu.

O Sr. Pina de Morais: — O projecto de lei permitia que os funcionários dos correios e telégrafos recebessem os seus vencimentos durante o interregno em que não prestaram serviço. Porém, o Sr. Velhinho Correia fez alguns reparos, e eu concordo com êsses reparos. Por isso envio desde já para a Mesa um artigo novo, que tencionava apresentar quando se discutisse na especialidade, isto para não tomar mais tempo à Câmara.

Foi admitida a proposta do Sr. Pina de Morais, que é a seguinte:

Artigo... Nenhuma das disposições dêste projecto permitirá o pagamento dos dias em que os funcionários não trabalharam.— Pina de Morais.

Foi aprovado na generalidade e entrou em discussão o artigo 1.°

O Sr. Velhinho Correia: — Chamo a atenção da Câmara para o seguinte facto:

O dizer-se no artigo 2.° que a apresentação se deve fazer na Administração Geral sugere-me dúvidas sôbre se poderão causar-se despesas ao Estado com transportes.

Trocam-se explicações entre o orador e o Sr. António Maria da Silva.

O Orador: — Então não há despesas de transportes. Está bem.

O orador não reviu.

Seguidamente são lidos na Mesa os artigos 1.° e 2.°, que obtiveram a aprovação da Câmara.

Em seguida é também aprovado o seguinte artigo da iniciativa do Sr. Pedro Pita:

Artigo... Fica revogada a legislação em contrário.— Pedro Pita.

O Sr. Pedro Pita: —Roqueiro a dispensa da leitura da última redacção. Foi aprovado.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é na segunda-feira, com a mesma ordem de trabalhos marcados para hoje.

Está aberta a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Parecer

Da comissão do Orçamento, sôbre o orçamento do Ministério da Marinha para 1924-1925.

Imprima-se com urgência.

Declaração

Da comissão do Orçamento, fazendo sua a proposta governamental sôbre alei de meios.

Para a acta.

O REDACTOR—Sérgio de Castro.

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