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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 120

EM 9 DE JULHO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
José Marques Loureiro

Sumário.— Abre a sessão com a presença de 55 Srs. Deputados.

É lida a acta, que adiante se aprova com número regimental.

Dá-se conta do expediente.

É admitido um projecto de lei, já publicado no «Diário do Govêrno».

São aprovados diversos pareceres de «última redacção».

Antes da ordem do dia.—Continuo, a discussão sôbre o parecer n.° 736, de subsidio às instituições de assistência.

É interrompida a sessão à» 15 horas e 45 minutos, reabrindo às 17 horas e 15 minutos.

É lido o artigo 1.° do respectivo projecto de lei.

São admitidas propostas de emenda da autoria dos Srs. João Camoesas e Almeida Ribeiro.

Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Correia Gomes e Carlos Pereira.

Ordem do dia. — O Sr. Viriato da Fonseca manda para a Mesa dois pareceres da comissão de guerra.

Entra na sala o Ministério da presidência do Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar, que faz a leitura da respectiva declaração ministerial.

Usam da palavra os Srs. Vitorino Guimarães, Carlos Olavo, Cunha Leal, que apresenta uma moção de ordem, que é admitida.

Segue-se o Sr. Lino Neto.

O debate fica pendente.

Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Um projecto de lei.— Pareceres.— Um requerimento.

Abertura da sessão, às 16 horas e 28 minutos.

Presentes à chamada, 55 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 55 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à chamada:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Ferreira Vidal.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Américo da Silva Castro.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Maria da Silva.

António Mendonça.

António Pais da Silva Marques.

António Vicente Ferreira.

Artur Brandão.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pereira Nobre.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Carlos Cândido Pereira.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Custódio Martins de Paiva.

Domingos Leite Pereira.

Ernesto Carneiro Franco.

Feliz de Morais Barreira.

Francisco Cruz.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Hermano José de Medeiros.

Jaime Júlio de Sousa.

João José da Conceição Camoesas.

João de Ornelas da Silva.

Joaquim Serafim de Barros.

José Cortês dos Santos.

José Marques Loureiro.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José Pedro Ferreira.

José de Vasconcelos de Sousa Nápoles.

Júlio Gonçalves.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sousa da Câmara.

Mariano Martins.

Nuno Simões.

Paulo Cancela de Abreu.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Sebastião de Herédia.

Vergílio Saque.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a Sessão:

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Alberto Lelo Portela.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Álvaro Xavier de Castro.

Amaro Garcia Loureiro.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Abranches Ferrão.

António Albino Marques de Azevedo.

António Correia.

António Dias.

António Ginestal Machado.

António Lino Neto.

António de Paiva Gomes.

António Pinto de Meireles Barriga.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Maldonado de Freitas.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João José Luís Damas.

João Luís Ricardo.

Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.

Joaquim Dinis da Fonseca.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Jorge Barros Capinha.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José António de Magalhães.

José Carvalho dos Santos.

José Domingues dos Santos.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Oliveira Salvador.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Manuel Alegre.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel de Sousa Coutinho.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário de Magalhães Infante.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.

Tomás de Sousa Rosa.

Vasco Borges.

Ventura Malheiro Reimão.

Vitorino Henriques Godinho.

Faltaram à sessão:

Abílio Marques Mourão.

Afonso Augusto da Costa.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto Xavier.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Resende.

António de Sousa Maia.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.

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David Augusto Rodrigues.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Delfim Costa.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Manuel Somem Cristo.

Germano José de Amorim.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Pires Cansado.

João Baptista da Silva.

João Estêvão Águas.

João Pereira Bastos.

João Pina de Morais Júnior.

João Salema.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Brandão.

Joaquim José de Oliveira.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

Júlio Henrique de Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Duarte.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Maximino de Matos.

Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomé José de Barros Queiroz.

Valentim Guerra.

Vergílio da Conceição Costa.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 55 Srs. Debutados.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 43 minutos.

Leu-se a acta e deu-se conta do seguinte

Ofícios

Da Presidência do Ministério, comunicando que hoje se apresentará o Govêrno nesta Câmara.

Para a Secretaria.

Da Comissão Municipal do Partido Republicano de Castanheira de Pêra, pedindo a aprovação da proposta de lei do Sr. José Domingues dos Santos sôbre a Lei da Separação.

Para a Secretaria.

Admissão

É admitido, tendo sido já publicado no Diário do Govêrno, o projecto de lei do Sr. Marques de Azevedo, para que o produto da venda dos passais de Rendufe, Barreiros e S. Vicente do Bico, concelho de Amares, seja entregue ao Ministério da Instrução, para mandar construir um edifício escolar no lagar das Pontezinhas.

Para a comissão de instrução primária.

Últimas redacções

Projectos do lei

N.° 650, que concede às viúvas e órfãos de oficiais nas condições dos n.081.°, 2.° e 3.° da carta de lei de 28 de Junho de 1880, a pensão mensal de 3$, estabelecida nesta lei, assim como os benefícios estabelecidos nas leis n.ºs 880 e 1:311.

Aprovada a última redacção.

Remeta-se ao Senado.

N.° 733, que considera como, prisão maior a que é expiada na Cadeia das Mónicas de Lisboa.

Aprovada a última redacção.

Remeta-se ao Senado.

N.° 769, que autoriza o Govêrno a ceder gratuitamente o bronze e a fundição necessária, nas oficinas do Estado, da estátua a erigir ao grande poeta Guerra Junqueiro em S. Paulo (Brasil).

Aprovada a última redacção.

Remeta-se ao Senado.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: — Continua em discussão o projecto n.° 736, de subvenção às instituições de assistência.

O Sr. Presidente: — Está interrompida a sessão.

Eram 15 horas e 43 minutos.

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4 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se o artigo 1.° do parecer n.° 736.

Foi lido na Mesa.

Foi admitida a proposta do Sr. João Camoesas.

Proposta de substituição

Proponho que o § 2.° do artigo 1.° do parecer em discussão seja substituído pelo seguinte:

§ 2.° O produto dêste adicional será pelo tesoureiro de finanças do concelho depositado na delegação, filial ou agência da Caixa Económica Portuguesa, à ordem da comissão municipal de assistência a que se relerem os artigos 50.° e seguintes do decreto de 25 de Maio de 1911. A distribuição respectiva será feita pela referida comissão na proporção dos encargos a descoberto de cada um dos organismos ou institutos de assistência do concelho, ficando sujeita a fiscalização superior e susceptível de recurso para o Ministro do Trabalho.— João Camoesas.

O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr.Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma emenda à proposta do Sr. João Camoesas.

É lida e admitida a seguinte:

Emenda

Proponho que as palavras «com recurso para o Ministro do Trabalho» da proposta do Sr. João Camoesas sejam substituídas pelas seguintes: «com recurso para a comissão executiva do Conselho Nacional de Assistência».— Almeida Ribeiro.

O Sr. Carvalho da Silva:—Sr. Presidente: tem êste lado da Câmara o maior desejo de que se atenda à situação verdadeiramente desgraçada em que se encontram as Misericórdias; mas não é êste o melhor processo de conseguirmos êsse fim, o processo de lançamento de novos impostos.

É asado o momento de frisar a V. Exa. e à Câmara quanto é revoltante o sistema de dia a dia estarmos recorrendo às subscrições públicas, para obter da iniciativa particular aquilo que ao Estado compete.

Não sei para que servem êstes constantes agravamentos dos impostos, porquanto nós vemos que para todos os serviços é necessário criar novos adicionais, princípio contra o qual protestamos, entendendo que é das receitas gerais do Estado que devem sair as despesas gerais.

Demais a mais, ainda no ano passado aqui foi votada uma proposta do Sr. João Luís Ricardo, criando um agravamento de impostos aos Bancos para os serviços da assistência; e afinal de contas o Estado recebeu o dinheiro e não o aplicou naquilo a que êle estava destinado.

Sr. Presidente: não tem direito de lançar novos impostos um Estado que mantém despesas escandalosas, como aquela que se faz com o Instituto de Seguros Sociais Obrigatórios, sustentando um exército de pessoal sem nenhuma vantagem para os serviços.

Acabe-se com êsse escândalo e com a redução das despesas inúteis, socorramos as Misericórdias sem necessidade de agravarmos ainda mais os impostos que já existem.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Lourenço Correia Gomes: — Sr. Presidente: acabo de verificar mais uma vez que o Sr. Carvalho da Silva não se esquece de, diariamente, nesta Câmara, usar da palavra «escândalo».

Lamento êsse mau hábito de S. Exa. e confio em que o Sr. Carvalho da Silva acabará por moderar a sua linguagem, se atender à que o princípio que êle aqui defende viveu e morreu amarrado justamente aos maiores escândalos.

O Sr. Carvalho da Silva mais uma vez, na discussão desta proposta, demonstrou que freqüentemente entra nas discussões sem ter a noção daquilo que discute.

Falou S. Exa. no agravamento dos impostos sôbre os Bancos e declarou que era lamentável que as importâncias recebidas não tivessem tido o destino devido.

Desconhece S. Exa. que êsse imposto adicional foi criado com o fim de ocorrer à conclusão de diversas obras em vários estabelecimentos de assistência, destinando-se o seu produto a fazer face aos encargos dum empréstimo, para com o seu produto se concluírem vários edifícios de assistência pública que precisam ser acabados.

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Disse ainda o Sr. Carvalho da Silva que não se pode estar sucessivamente agravando os impostos para atender às instituições de beneficência, deixando perceber nas suas considerações que ao Estado compete, das suas receitas gerais, custear essas instituições; esquece-se S. Exa. do seguinte: é que, na maioria dos casos, aqueles que devem pagar não pagam absolutamente nada.

Não tendo o Estado o suficiente pára poder manter-se como nação, queria ainda S. Exa. que o Estado fôsse atender às instituições de beneficência com as verbas de que necessita para as suas despesas próprias.

O imposto adicional que se pretende criar por êste projecto destina-se a fazer face às necessidades dessas instituições, necessidades inadiáveis, necessidades a que, muitas vezes, a benemerência particular podia atender, mas que, devido e em grande parte à propaganda do Sr. Carvalho da Silva e daquelas pessoas que o acompanham, dos princípios políticos que S. Exa. defende, deixa de efectivar-se; resultando daí que muitas vezes o Estado republicano se tem visto absolutamente esmagado por uma propaganda feroz e nefasta, propaganda que atinge não só o regime, mas atinge os infelizes, os desgraçados que precisam de assistência e não a podem ter.

A falta de caridade que se tem vindo a notar demonstra que, se certas pessoas a praticavam antigamente, não era para prestarem aquela solidariedade que é devida a qualquer indivíduo, mas por ostentação o

Lamento pois que mais uma vez tivéssemos de ouvir palavras impróprias desta Câmara, proferidas pelo Sr. Carvalho da Silva, que reincidindo nelas, demonstra o pouco respeito que tem por esta casa.

Se S. Exa. se lembrasse que dentro da casa onde se encontra todos somos representantes do país, que todos temos os mesmos direitos, devendo-nos a mesma consideração e respeito que devemos a S. Exa., não teria proferido palavras como aquelas que acaba de pronunciar.

Tenho dito.

O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: interessa-me realmente pouco que a caridade se vista com foros de regime, e portanto se assista à falta daquilo que deve ser um alto sentimento de solidariedade, desde que os concelhos, para ocorrer às necessidades das misericórdias, lancem adicionais às contribuições do Estado.

Sr. Presidente: tive já ocasião de dizer a V. Exa. que entendia que essa tributação devia incidir em determinados concelhos, mas ser distribuída por aqueles concelhos sôbre os quais ela fôsse lançada.

Dar-se ia então êste caso: é que todos pagariam de bom grado êste adicional, sabendo que êle iria íntegro para as misericórdias do seu concelho.

Nesse sentido o Sr. João Camoesas enviou para a Mesa uma emenda; contudo quere-me parecer que é de atender a doutrina do § 3.°

Sr. Presidente: eu julgo que não há uma só misericórdia do país que feche a porta aos desgraçados dos outros concelhos diferentes da sede de essa misericórdia; como porém isso não está acautelado, na devida altura votarei contra êsse § 3.°, pedindo desde já a V. Exa., Sr. Presidente, para que na altura devida ponha à votação o meu requerimento, a fim de que se dê prioridade à proposta do Sr. João Camoesas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi aprovada, sem discussão, a acta da sessão anterior.

O Sr. Viriato da Fonseca: — Sr. Presidente: em nome da comissão de guerra envio para a Mesa dois projectos já relatados.

Entra na sala o Ministério.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar) (lendo):

«Exmo. Sr. Presidente e Srs. Deputados.— Sob as normas constitucionais, o tendo como base a conservação do bloco

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que vinha constituindo a maioria parlamentar, foi organizado o Ministério que, no cumprimento de um dever, tem a honra de se apresentar ao Parlamento.

Visando a realização de uma política deliberadamente nacional, os mais altos interêsses da Pátria e da República sobrepor-se hão a quaisquer outros, prosseguindo o Govêrno na obra instantemente reclamada de manutenção da ordem e disciplina, de honesta administração pública, de iniludível deminuição de despesas, de criação e mais rigorosa arrecadação das receitas, do forma a atingir ràpidamente, como é mester, o equilíbrio orçamental, recorrendo a todos os meios conducentes à valorização da nossa moeda, e procurando decididamente obstar aos desmandos de qualquer espécie que geram o mal-estar social.

Confia o Govêrno que o alto patriotismo do Poder Legislativo lhe facultará os meios indispensáveis à satisfação das necessidades mais instantes, aprovando os orçamentos e as propostas de lei já apresentadas e de inadiável resolução que o Govêrno perfilha, nomeadamente as que se referem à remodelação dos serviços públicos e redução de despesas, à actualização dos impostos e às estradas.

Também seria de grande utilidade a deliberação do Parlamento sôbre as propostas pendentes, relativas á contribuição de registo.

O Govêrno acompanhará com o maior interêsse a discussão, que, considera urgente, da proposta de lei, vinda do Senado, sôbre o inquilinato, instando pela sua rápida aprovação, a fim de que fiquem solucionados, tanto quanto possível, pontos essenciais sôbre que versam as mais oportunas é justas reclamações de inquilinos e senhorios, não podendo igualmente perder de vista que é da maior utilidade compilar e reunir, num só diploma, todas, as disposições vigentes relativas -a arrendamento de prédios urbanos e rústicos, introduzindo-lhes sãs modificações ou alterações que as circunstâncias actuais realmente exigem.

Julga também o Govêrno que é indispensável acudir às precárias condições de vida do funcionalismo público civil e militar, pedindo a atenção do Parlamento para o estudo da respectiva proposta de lei.

Sendo necessário restabelecer a normalidade, dos serviços telégrafo-postais, o Govêrno prestará ao assunto a devida atenção, para que, com a máxima brevidade, seja atingido êsse objectivo.

Pelas diferentes pastas o Govêrno procurará realizar com brevidade uma obra harmónica e atinente não só à máxima economia sem prejuízo da eficiência dos serviços, mas também ao aperfeiçoamento dêstes mesmos serviços, não descurando o problema económico nos seus múltiplos e variados aspectos, coordenando a acção dos diferentes Ministérios para a resolução do problema fundamental do ressurgimento do País pela valorização dos recursos da metrópole e das colónias, não descurando, mas antes procurando resolver o problema da assistência pública que à República deve merecer o maior carinho.

Aguardando a solução das medidas instantes pendentes do Parlamento, pelos diferentes Ministérios serão submetidas à sua apreciação diversas propostas em estudo

O Govêrno, consciente das suas responsabilidades nas horas graves que passam, confia no patriotismo e o Parlamento para que, juntos, num trabalho harmónico, possamos alcançar o ressurgimento nacional. — O Presidente do Ministério e Ministro do Interior e interino da Agricultura, Alfredo Rodrigues Gaspar».

Q Sr. Vitorino Guimarães: — Sr. Presidente: falando em nome da representação, nesta Câmara, do Partido Republicano Português, devo dizer a V. Exa. e à Câmara, antes de mais nada, que o motivo fundamental do apoio e da cooperação que leal e sinceramente vimos oferecer ao Govêrno, é a circunstância de êle ter sido, como, consta das primeiras palavras da declaração ministerial que acaba do ser lida, constituído efectivamente em obediência às mais estritas normas constitucionais.

Sr. Presidente: antes de entrar pròpriamente na analiso da declaração ministerial, permitam-me V. Exa. e a Câmara que eu, em nome do Partido Republicano Português, dirija sinceras saudações ao Sr. Álvaro de Castro e aos seus companheiros no Ministério a que S. Exa. presidiu, saído, há pouco, das cadeiras do Poder.

Apoiados.

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São tanto mais insuspeitas estas minhas palavras, quanto é certo que eu, nesta Câmara, estive, por vezes, em questões de detalhe, em desacordo com aquele Govêrno, presidido pelo Sr. Álvaro de Castro, ilustre homem público e meu querido amigo pessoal; mas nunca deixei, e comigo deixaram os meus correligionários, de, prestarmos toda a justiça às intenções e propósitos de S. Exa., que sempre demonstrou um elevado patriotismo e uma dedicação inexcedível pela República.

Apoiados.

Assim, Sr. Presidente, mal nos ficava que, ao dirigir as nossas saudações ao Govêrno que hoje se apresenta, não disséssemos aos Ministros que saíram, que S. Exas. continuam a merecer toda a nossa estima e consideração, e que ninguém deixa de reconhecer os valiosos serviços que prestaram ao País.

Apoiados.

Ao Govêrno actual que palavras poderei eu pronunciar, para significar as saudações que lhe dirigimos, que não constituam um pleonasmo?

Na verdade todos sabem já quanto elevada é a estima e quanto inexcedível é a consideração que todos nós temos pelo Sr. Rodrigues Gaspar, Presidente do Ministério!

Muitos apoiados.

E justos são êsses nossos sentimentos para com S. Exa., porque êle tem sempre revelado, através duma já longa vida pública, os mais elevados dotes de inteligência e de carácter. No desempenho de várias funções oficiais, S. Exa. tem mostrado o elevado grau dessas suas qualidades, e em todos os momentos críticos da República tem-se evidenciado republicano dedicado e de grande espírito de sacrifício. E, Sr. Presidente, iguais referências podemos fazer a respeito de todos os homens que hoje fazem parte do Govêrno. Todos êles merecem a nossa estima e toda a nossa consideração.

Sr. Presidente: nesta hora grave que atravessamos não fica bem que se não diga, inteiramente, toda a verdade. É fora de dúvida que o Partido Republicano Português, se encarasse os problemas nacionais, considerando-se apenas como organismo partidário, pelo prisma dos seus princípios, veria com mais agrado a constituição dum Govêrno partidário que defendesse inteiramente, os pontos de vista do seu programa, promovendo a efectivação, duma política das esquerdas.

É na verdade essa política que hoje domina no mundo, e é fora de toda a dúvida que para ela, mais cedo ou mais tarde, conforme o consentirem as condições nacionais, teremos de ir.

O Sr. José Domingues dos Santos: — Apoiado.

O Orador: — Digo assim, porque está mais que provado que no estado actual da sociedade não haverá maneira de progredir sem a realização das aspirações que caracterizam as democracias.

O Sr. José Domingues dos Santos: — Apoiado!

O Orador: — Mas, Sr. Presidente, nós temos de olhar, antes de mais nada, aos supremos interêsses da República e ainda mais aos interêsses nacionais; e é por isso que nós mais uma vez abatemos a nossa bandeira partidária, deixando de fazer uma política estritamente partidária para nos juntarmos a elementos de outros agrupamentos parlamentares, cujas ideas se aproximam das nossas, para a realização da obra que neste momento se impõe.

Sr. Presidente: o Partido Republicano Português tem acima de tudo procurado sempre que se governe de acordo com o Parlamento, e assim não pode neste momento, na verdade, pensar em uma outra organização, que não seja aquela que representa o Govêrno que se senta naquelas cadeiras.

É por isso que o Partido Republicano Português defendeu, e defende, a idea de se formar um Govêrno saído do Bloco Parlamentar que deu o seu apoio, ao Govêrno anterior.

Sr. Presidente: passando propriamente à análise da declaração ministerial eu devo dizer que ela me satisfaz inteiramente, não só pela sua sinceridade como pela sua honestidade.

Na verdade a hora que estamos atravessando não é para grandes realizações, nem para grandes planos, pois, na verdade mal andaria o Govêrno senos viesse dizer que projectava a organização gran-

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des planos e de grandes obras de administração pública, cara trazer à apreciação do Parlamento.

O momento actual não admite grandes planos e grandes obras, repito, tanto mais quanto é certo que o Parlamento Português se encontra a poucos dias do seu encerramento.

Não faria sentido que o Govêrno fôsse estudar nesta altura novos projectos ou propostas, razão por que eu digo que acho de todo o ponto justo o critério do Govêrno, de pedir apenas ao Parlamento a votação de vários diplomas que estão pendentes das suas decisões.

Fala-nos a declaração ministerial na lei do inquilinato, na situação do funcionalismo, nos orçamentos e outras medidas urgentes de carácter financeiro, e assim eu devo dizer que êsse pedido já é bastante para o pouco, tempo que o Parlamento tem para funcionar.

Sr. Presidente: se na verdade se não fizer obstrucionismo, é fora de dúvida que o pedido que o Govêrno vem fazer ao Parlamento é na realidade de mais fácil resolução, embora tenhamos, como já disse, pouco tempo para isso.

Mas se trabalharmos com patriotismo, com dedicação e boa vontade, fácil será votarem-se todas as medidas que o Govêrno pede na sua declaração ministerial.

Declaro que estou de acordo com a orientação do Govêrno, e assim espero que êle não deixará de cumprir o que nos promete, isto é, continuar a obra da realização do equilíbrio orçamental pela compressão das despesas e o aumento das receitas, mantendo a maior energia na administração pública.

Êste será, Sr. Presidente, não só o desejo do Partido Republicano Português, como também, estou certo, o desejo de toda a Câmara.

Termino, pois, dirigindo as minhas saudações ao Govêrno, oferecendo-lhe toda a nossa dedicada cooperação e todo o nosso apoio.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Carlos Olavo: — Sr. Presidente falando em nome do Grupo Parlamentar de Acção Republicana, eu dirijo as minhas saudações ao novo Govêrno, fazendo votos, para bem do País e prestígio dos seu membros, para que a sua acção seja útil e fecunda.

Sr. Presidente, a Câmara não estranhará de certo que nesta situação eu deseje, por um princípio de partidarismo, que essa acção útil possa recair muito principalmente sôbre aqueles membros do Govêrno que são nossos companheiros no Grupo de Acção Republicana, isto é, os Srs. Xavier da Silva e Pires Monteiro, dois velhos republicanos que têm prestado relevantes serviços à Pátria e à República.

Nestes termos eu espero que S. Exas., com as suas qualidades, poderão bem cumprir a missão de que foram incumbidos, empregando o seu esfôrço junto de todos os outros, de forma a que a acção do Govêrno possa ser de grande utilidade para o País.

Sr. Presidente: o Grupo Parlamentar de Acção Republicana oferece ao Govêrno o seu apoio decidido, sincero e leal nos precisos termos em que eu já tive ocasião de expor ao Sr. Presidente do Ministério.

Êste grupo tem os seus princípios, que formaram o programa do Govêrno anterior, princípios que desejamos ver seguidos pelo Govêrno actual.

É lógico que faça questão de lei, porque de contrário seria um Grupo sem finalidade, sem nenhuma razão de existir. São êsses princípios os fundamentos do bloco parlamentar, que é indispensável que se mantenha.

É necessário fazer o equilíbrio financeiro, devendo ser esta a principal preocupação do Govêrno, e neste sentido não poderá deixar de merecer o nosso aplauso.

A República tem sido excessivamente generosa, o que tem dado ocasião à impunidade.

É necessário que se estabeleça o equilíbrio entre a liberdade e a ordem, porque sem êsse equilíbrio não há regime que se mantenha, porque nele residem os direitos e garantias dos cidadãos.

Se o Govêrno está disposto a seguir por êste caminho, pode contar com êste punhado de republicanos.

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São estas as condições com que a Acção Republicana dá o seu apoio ao Govêrno.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: apresento, em nome da minoria nacionalista, os nossos cumprimentos ao Sr. Presidente do Ministério e a todos os seus companheiros, desejando que, apesar dos maus agouros de que foi revestida a formação do actual gabinete, a sua acção seja útil à Pátria e à República.

Em meu nome pessoal, desejo apresentar as minhas saudações ao Sr. Rodrigues Gaspar. S. Exa. é um velho parlamentar e não faço esfôrço algum em lhe reconhecer talento; lastimo, porém, que tam mal tivesse usado dessa qualidade, levando-o a disciplina partidária a transigências que levaram aventureiros ao estrangeiro para lá encontrarem o repouso que necessitavam para recuperarem a saúde física e moral.

Quero daqui a espaço referir-me ainda a esta questão, e tenho a certeza de que, na sua resposta, o Sr. Rodrigues Gaspar terá aquela clareza e aquela concisão que teve quando fez aqui as suas afirmações.

Quero mais adiante referir-me a uma entrevista, em que certamente a verdade está deturpada, que o Sr. Rodrigues Gaspar concedeu ao jornal Diário de Lisboa.

Mas como não desejo interromper a sequência das minhas afirmações, deixo êste facto para depois.

Também, especializando de entre todos os Ministros, quero apresentar, em meu nome, os cumprimentos mais afectuosos ao Sr. Ministro da Instrução, pessoa que me acostumei a conhecer como leal colaborador, através uns meses, que me pareceram anos, quando estive empenhado numa obra ministerial, e não esquecido dessa camaradagem, repito, apresento a S. Exa. os meus votos mais sinceros, votos que considero de irmão.

Mas, pregunto a mim próprio nesta hora: resolveu-se, porventura, uma crise política?

Sr. Presidente: por muito que se queira que o Parlamento seja o passa-culpas,
não podem deixar de ser estranhadas as condições em que se. produziu a crise. Importa, portanto, saber em que condições caiu o Govêrno do Sr. Álvaro de Castro, e em que condições chegou ao Poder o Govêrno do Sr. Rodrigues Gaspar.

Creio que, por esta análise, chegaremos a resultados que hão-de espantar a todos, porque acreditando na lealdade dos homens, e acreditando que êles se determinam sempre por intuitos generosos, chegaremos à conclusão que houve um acto de deslealdade política.

Porque caiu o Govêno de Sr. Álvaro de Castro?

Foram votadas duas moções: uma foi aprovada, a do Sr. Vitorino Guimarães, outra rejeitada, a do Sr. Carlos Olavo.

A Câmara, rejeitando totalmente a moção ao Sr. Olavo, não reconheceu que o Sr. Álvaro de Castro tenha cumprido o seu dever, demonstrando assim não concordar com a política financeira adoptada por S. Exa.

Não se pode tirar outra conclusão.

Por fôrça do acaso, a Câmara dos Deputados constituiu, nesse momento, dentro de si, um bloco que afirmou a sua rejeição pela política do Sr. Álvaro de Castro, afirmando que o Ministério presidido por S. Exa. tinha praticado actos que significavam o não cumprimento dum dever.

Tirando esta conclusão da rejeição, deixem-me V. Exas. manifestar a minha surpresa, até pelas próprias palavras do Sr. Vitorino Guimarães.

Apoiados.

O Sr. Vitorino Guimarães tomou com certeza o ar cumpungido em que nós o vemos desde a rejeição do célebre empréstimo «rácico», e os cumprimentos que S. Exa. dirigiu ao Sr. Álvaro de Castro não podem significar senão uma ironia que S. Exa. não poderia certamente aceitar.

De resto, o próprio Sr. Álvaro de Castro teve o cuidado de dizer que o Sr. Vasco Borges tinha sido mais cruel do que eu.

Leu.

A moção, aprovada do Sr. Vitorino Guimarães, moção que derribou o gabinete do Sr. Álvaro de Castro, está na memória recente de toda a Câmara, interpretá-la?

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Não é preciso forçar o modo de ver para só dar a essa moção o seu sentido verdadeiro.

Só se pode dar uma significação à moção do Sr. Vitorino Guimarães da era a condenação do Govêrno Álvaro de Castro, e mais ainda a falta de homogeneidade e de organização dos seus membros.

Era a própria condenação do bloco parlamentar.

Serei eu uma pessoa que não veja bem a interpretação a dar às moções? Creio que não.

O que eu vi foi uma rajada de moções.

O Sr. Álvaro de Castro fluis manifestar, em documento apresentado ao Sr. Presidente da República, a interpretação das moções que tinham sido apresentadas, umas aprovadas e outras rejeitadas.

É o que se vê da carta do Presidente do Ministério ao Sr. Presidente da República.

Eu e o Sr. Álvaro de Castro estamos do acordo quanto à interpretação a dar às moções. Estamos de acordo quanto ao seu significado político. Agora vemos que o actual Govêrno é a continuação servil da política económica e financeira do anterior Govêrno. Mas então para que saiu o Govêrno que estava para se sentarem naquelas cadeiras outros homens?

Trata-se apenas duma questão de ambição?

O que se vê é que a política em vez de girar à volta de princípios, gira à volta de homens, de aspirações pessoais injustificáveis.

Tirado das moções p significado que elas têm, vejamos como se conduziram as cousas para solucionar a crise aberta pela demissão do Govêrno presidido pelo Sr. Álvaro de Castro, e tiremos também da serena análise dos factos as conseqüências que é mester tirar para que se veja até onde vão os desvarios duma política que não gira à volta de princípios, de ideas e de programas, e à qual êstes importam tanto, que a pouco o pouco os reduzem a uma pequenez tal que êste documento que aqui se encontra quási só contém a idea de que o Sr. Rodrigues Gaspar é uma, espécie de caixeiro viajante do Sr. Álvaro de Castro, que só tem a missão de fazer aprovar as medidas do Sr. Presidente do Ministério cessante.

Apoiados.

Do certa forma o Sr. Presidente do Ministério cessante teve culpa da evolução que a crise política assumiu, pois que S. Exa., não se contentando com a simples análise das moções que tinham sido aprovadas ou rejeitadas, foi mais além, e aconselhou a que se formassem determinados blocos, a que se indicassem determinados Presidentes de Ministério.

Leu.

Permita-se-me cortar nesta altura a narração do Sr. Álvaro do Castro, para preguntar sinceramente à consciência dos que me escutam: Porque é então que o Sr. Álvaro de Castro, se a sua política económica e financeira continua de pé, não poderia ter sido o homem que continuasse a ocupar aquele lugar de Presidente do Ministério, por uma espécie da reconsideração da maioria? Não acreditava, porventura, S. Exa. na, sinceridade do apelo prometido. Mas então como é possível constituir blocos políticos com pessoas que tam fundamentalmente desconfiam umas das outras e que até contestam aos grupos com que se vão ligar a homogeneidade suficiente para poderem garantir a vida de qualquer entidade que esteja na Presidência do Ministério? Sou levado assim a concluir que o apoio que o Sr. Álvaro de Castro está dando á êste Govêrno é um apoio de vingança, dizendo S. Exa. de si para si: «Vocês hão-de morrer da mesma forma por que eu morri, e não me admira absolutamente nada que qualquer dia uma nova saraivada de moções caia sôbre o Govêrno actual, obrigando-o a demitir-se, e nessa altura eu vou para os corredores do Parlamento esfregar as mãos de contente, porque estarei vingado».

«Quem com ferro mata, com ferro morre» diz um velho ditado e cantava uma cançonetista muito conhecida. Mas continuemos.

Continua a leitura.

Em certa altura da epístola do Sr. Álvaro de Castro eu chego a não perceber. Desde que os blocos eram de independentes e democráticos, por que razão misteriosa o Sr. Álvaro do Castro excluía os independentes da Presidência do Ministério? Porque não haveria de a ocupar,

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por exemplo, o meu ilustre amigo Sr. Abranches Ferrão? Que pensamento reservado tinha o Sr. Álvaro de Castro a êste respeito? Seria porventura a convicção de que desde que não fôsse um democrático ninguém agüentaria o Govêrno? Seria isto?

Não sei, mas merece a pena continuar a esmiuçar a carta tam significativa do Sr. Presidente do Ministério cessante para o Sr. Presidente da República.

A parte referente ao Sr. Afonso Costa merecia desde já um pequeno comentário, mas S. Exa. é uma personagem de tanto relevo que merece também um capítulo especial. Continuemos, portanto, a nossa análise, e, não nos ocupando muito por agora do Sr. Afonso Costa, vejamos o que isto queria dizer. Naquele partido ninguém se entende. Cada cabeça, cada sentença, e cada moção cada chefe. Nestas condições, quem haverá dentro do Partido Democrático, senão o Sr. Afonso Costa, para ser Presidente do Ministério? Eis o que afirmava o Sr. Álvaro de Castro.

Ora bem.

O Sr. Álvaro de Castro afirmava portanto ao Partido Democrático o seguinte:

Com qualquer chefe que não seja o Sr. Afonso Costa, êsse partido não terá coesão, não terá disciplina, e assim nenhum Govêrno terá a certeza de poder governar.

Mas então, Sr. Presidente, estamos todos a colaborar num bluff.

Êste Govêrno existe pela formação de um bloco, cujos elementos não acreditam uns aos outros, e a nação que espera dos homens uma acção enérgica e decidida, uma acção de salvação, esta pobre nação que quere sair da situação de miséria em que se encontra e que a gente sente querer respirar e viver, é vítima de um bluff!

É esta a política de que saiu o Ministério presidido pelo Sr. Rodrigues Gaspar.

É esta a política que preconizam os homens que neste momento apoiam o Govêrno.

Continuemos, porém, analizando o desenrolar dos factos.

Vejamos como nesta miséria da nossa vida política os homens se mexem, movidos não por um pensamento, não por ideas, mas por idolatrias, não por sentimentos de salvação nacional, mas por sentimentos de salvação partidária e até, segundo se diz, pelo próprio medo do papão como se fossem crianças.

O Sr. Afonso Costa, o inevitável, foi chamado e S. Exa., como de costume, marchou para Paris.

Eu não sei se o Sr. Afonso Costa é aquele que os jornais dizem que anda num vai-vem, ou vem a ser o homem misterioso criado por Arsene Lupin!

E extraordinário que o Sr. Afonso Costa, que tem representado um papel que pode ser discutido, em que tem responsabilidades na vida da República, ande a enganar os seus correligionários e a República.

Apoiados e não apoiados dos diversos lados da Câmara.

O Orador: — O Sr. Álvaro de Castro falou com sinceridade, e pôs o dedo na ferida.

A chegada do Sr. Afonso Costa era necessária para resolver a crise do um partido e não a crise de uma nação!

Mas a continuarem as cousas assim, acabam os devotos do Sr. Afonso Costa por terem razão de que a crise de um partido porá em crise a República!

O Sr. Joaquim Ribeiro: — Não apoiado!

O Orador: — Ouvi o não apoiado do Sr. Joaquim Ribeiro, e compreendo a razão do seu não apoiado, desde que li a sua entrevista no Diário de Lisboa.

O Sr. Joaquim Ribeiro (interrompendo): — V. Exa. ainda fica muito alto para que ninguém lhe faça sombra.

O Orador: — Tenho muito prazer em acolher-me à sombra de qualquer pessoa.

Já tive as minhas vaidades, mas o que eu quero é que o Sr. Afonso Costa venha para aqui sofrer o mesmo que nós sofremos, e não ande da Serra para Lisboa, de Lisboa para a Serra, da Serra para Paris, de Paris para a Serra e da Serra para Lisboa...

Risos.

O que eu quero é que êle venha sofrer o mesmo que todos nós sofremos, e sujeitar-se às mesmas contingências.

Apoiados.

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O Sr. Afonso Costa, é claro, segundo o costume, deu a resposta que todos conhecem.

Então foi chamado o Sr. Álvaro de Castro para de novo constituir Ministério.

Sou das pessoas que têm discutido muito o Sr. Álvaro de Castro, por vezes com decisão e desassombradamente.

Em todo o caso os ataques ficavam muito aquém dos que me fizeram; e eu enjeito a honra de ter derrubado o Sr. Álvaro de Castro, pela sua política financeira, pois que essa honra pertence intacta à maioria.

Apoiados.

Como se compreende que êsse partido convidasse o Sr. Álvaro de Castro para de novo formar Ministério?

Pois então a farçada que começou há uns tempos para cá, continua?

Mas o, Sr. Álvaro de Castro o que quere dizer na sua carta?

Não havendo maneira de constituir um Ministério democrático, só havia a dissolução.

Se S. Exa. não tinha êste intuito a verdade é que nós não queremos saber das intenções de quem quer que seja. O que aqui está, é quê a dissolução seria a única solução para a crise política.

Isto tudo resulta em uma cousa desprestigiante. São brincadeiras de criança. Isto não se chama solução de crises. Chama-se enredar crises; chama-se complicar acontecimentos. Procura-se dar a aparência de vida a uma cousa morta.

No momento em que todo êste artifício se revela pelo movimento das figuras da República, aparece colado nas paredes de Lisboa um papelinho das juntas de freguesia, dizendo que é necessário dissolver o Parlamento.

E vamos lá com Deus!

Nós próprios reconhecemos que isto é verdade.

Reconhecemos que o outro Parlamento que vier, saído das mesmas inspirações políticas, do mesmo embate de paixões, sem a situação política estar esclarecida, será ainda pior que êste. Ainda se hão-de acentuar mais as divergências entre a província e Lisboa, prevalecendo as mesquinhas paixões locais; porque os Deputados serão impostos não pela sua capacidade mas pelo que souberem dizer dos interêsses locais. O Parlamento sairá da mesma política de que saiu a constituição dêste: os partidos a fingirem de fortes sem o serem, porque não são um agregado homogéneo de homens, mas elementos dispersos duma política de caciquismo;

O Parlamento a dominar, sujeito às mesmas paixões, repito, tenho a convicção de que será ainda pior que êste. Mas a verdade é que, pelos seus actos, êste Parlamento condena-se a si próprio constantemente.

Não apoiados.

O Sr. Álvaro de Castro não deixava a porta aberta para nenhuma solução da presidência de democráticos, esgotado o recurso do Sr. Afonso Costa, Abriu, porém, por fim outra porá: aquela por onde saiu o Sr. Rodrigues Gaspar. S. Exa., o Sr. Presidente do Ministério, teve todavia de lutar com concorrentes.

Eu sou das pessoas que acreditam piamente que o Sr. Rodrigues Gaspar não desejava que lhe entregassem a constituição do Ministério, e que não ,andou com intrigas para ocupar agora aquele lugar; fê-lo talvez mais por sacrifício e assistência ao Partido Democrático 4o que por outra cousa. Mas, moviam-se ambições; lutavam os galos.

Ouvia-se o clarim de guerra do Sr. José Domingues dos Santos, a quem, sentindo aproximar se o Poder, já tremiam as pestanas.

Risos.

Ouvia-se ainda gemidinho no Diário dê Notícias os sons da guitarra do Sr. António Maria da Silva, e ao faduncho gemido, de S. Exa. respondia num tem surdo, com os bordões da sua viola, o Sr. Rodrigues Gaspar.

Risos.

O que triunfou?...

Sempre acreditei que na vida triunfam os homens persistentes, e que não fazem muito barulho, os homens que andam, caminhando com segurança, sobretudo quando os não move uma grande ambição pessoal.

Pregunto eu agora: O Sr. Rodrigues Gaspar julga estar a cumprir um dever, o de servir o País?...

Dizem os jornais e não sei o que haverá 4.e certo nisso, que quando se dividiam os votos entre o Sr. Rodrigues Gaspar e o Sr. José Domingues dos Santos, de re-

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pente, uma voz aflita se levantou, dizendo:

«Aí vem o Cunha Leal com a dissolução».

Já toda a gente sabe que eu não sou ambicioso, que não freqüento o Palácio de Belém, que não faço mesuras a quem quer que seja e que não sou a pessoa própria para presidir um Ministério desde que me condenei a mim próprio a um voluntário ostracismo.

Êste grito tem a sua significação, interpretado, não como os jornais dizem que êle se proferiu, mas desta maneira:

«Aí vem o Partido Nacionalista com a dissolução», grito que aterrou o Partido Democrático. Porquê?...

Porque o Partido Democrático ainda não acha que tenha feito sofrer bastante êste País; ainda não entende que a sua hora de oposição chegou.

Êste pobre País que tanto tem descido já, é preciso que desça ainda mais!

É assim, o que, levou o Sr. Rodrigues Gaspar ao Poder foi a solidariedade alcançada à custa da voracidade do Poder.

E os democráticos diziam: o Poder é nosso, ligando-nos com os homens da Acção Republicana como o Sr. Abranches Ferrão, e indo arrancar à sua vida sossegada o Sr. Xavier da Silva, trazendo-o para a vida política, porque é necessário que o Partido Democrático continue governando, porque republicanos somente são os homens do Partido Democrático, que são históricos, historiquíssimos, havendo sempre o cuidado de escolher para os lugares aqueles que são anualmente republicanos.

Confesso que o Sr. Rodrigues Gaspar me deu um momento de alegria, quando foi encarregado de constituir Ministério, porque nós, nacionalistas, gente de ordem, se por um acaso extraordinário formássemos Govêrno, quereríamos meter a todos dentro da Constituição e da lei, para exercermos a nossa acção.

O Partido Nacionalista entre dois males, o Sr. Rodrigues Gaspar e o Sr. Domingues dos Santos, prefere o Sr. Rodrigues Gaspar, porque o Sr. Domingues dos Santos, neste momento de tantas dificuldades, viria atear a guerra religiosa, querendo matar os padres.

Esteve para vir de Paris o inevitável Afonso Costa, que tem o pensamento de matar o déficit e de matar os padres.

O Sr. Álvaro de Castro já declarou que matou o deficit, e o Sr. Domingues dos Santos, apresentando um papel, declara que tem o seu plano para matar os padres.

Deixem os padres, que são homens dignos, quando à solta estão os profissionais da desordem, que deitam bombas, e que cultivam as revoltas.

Entre êstes dois males, prefiro o mal Rodrigues Gaspar.

Em todo o caso, devo dizer que o Sr. Rodrigues Gaspar, organizando Ministério, tem a vantagem de não poder dizer que para governar não estava preparado; porque não admito que um homem público, ao assumir um tal lugar, diga que não estava preparado para essa missão.

O primeiro dever do homem público é estar preparado para desempenhar êsses cargos, e ao ocupar as cadeiras do Poder não deve começar por dizer que não sabe os assuntos, que não estava preparado, que vai estudar, ou que fará o que estava a fazer o seu antecessor.

Êste Ministério tem em linguagem popular, a característica, a linguagem de cauteleiro no seu conhecido pregão:

«Quem me acaba o resto!».

Mas o extraordinário, é que apesar dos votos que teve o Sr. Rodrigues Gaspar para organizar Ministério, ainda apresenta o seu Govêrno incompleto, não conseguindo na coelheira do Partido Democrático um Ministro da Agricultura.

Sr. Presidente: o Sr. Rodrigues Gaspar começou por se meter numa colisão.

Referi-me há pouco ao caso da embaixada de Londres; e todos se lembram que assistimos aqui a uma violenta tempestade, levantada por efeito da respectiva nomeação do Sr. Norton de Matos.

A respeito dêsse caso, ouvimos o Sr. Rodrigues Gaspar dizer que não admitia ver premiar aventureiros políticos, e afirmar que Londres não era um sanatório.

S. Exa. condenou o procedimento do Alto Comissário de Angola por ter abandonado o seu pôsto de honra, depois deter declarado que não abandonaria êsse lugar»

Nós tirámos das palavras do Sr. Rodrigues Gaspar conclusões tremendas para o Sr. Norton de Matos.

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O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros de então respondeu a S. Exa. que achava péssimo colocar tam mal o nosso embaixador em Londres.

E eu pregunto: £0 nosso embaixador em Londres é, porventura, um funcionário que não pode ser demitido em virtude dos regulamentos?

S. Exa. só pode ingressar no respectivo quadro ao fim de cinco anos de exercício do seu cargo.

Nestas condições está sujeito a ser demitido por uma penada ministerial.

Então o que é que o Sr. Rodrigues Gaspar quere dizer com estas palavras «de que o caso está liquidado»?

Quere dizer, permita-se-me a expressão, de que a pouca vergonha está feita e que êle a deixa correr.

Mas então é assim que o Govêrno vai iniciar a sua vida com uma transigência desta ordem?

Confesso que esta foi a minha primeira desilusão a respeito do Sr. Rodrigues Gaspar.

A minha segunda desilusão resultou das afirmações de S. Exa. quanto à política económica e financeira que vai seguir.

O Sr. Rodrigues Gaspar, por todas as considerações já apontadas, não tinha o direito de afirmar aquilo que afirmou, e só posso interpretar as suas palavras e a atitude revelada neste estranho documento, como o desejo que S. Exa. tem de constituir uma maioria, ;que não teria sem a boa vontade do Sr. Álvaro de Castro.

E então passa sob as forças caudinas e passa a achar bom aquilo que como membro da maioria achava mau.

Não, Sr. Presidente, não gosto de afirmações longas; gosto, sim, de afirmações, claras.

Pairou por cima dêste diploma o espírito imortal do conselheiro Acácio, e o Pacheco também nele colaborou.

Há frases que são um poema.

Imaginemos, por exemplo, que existia uma greve telégrafo-postal.

Não sei se existe ou não porque ela prolonga-se há tanto tempo e o Sr. Freiria há tanto tempo nos vem dizendo nas suas notas oficiosas que os serviços estão normalizados, que eu chego a duvidar que exista ainda hoje uma greve, que o pessoal dos correios e telégrafos não tenha já, procurado outras ocupações e que o Sr. Freiria não tenha já substituído muito amavelmente o Sr. António Maria da Silva.

Não valia talvez a pena falar no caso, mas o Sr. Rodrigues Gaspar entendeu dever falar nele na sua declaração ministerial.

Isto é de primeira ordem.

Para nada faltar nesta redacção acaciana, nem sequer faltam as palavras clássicas: «os meios conducentes aos fins que se tem em vista».

Quais serão os meios conducentes?

Isso é que representa um segredo, e simplesmente era isso que nós queríamos saber.

Depois, como os «meios conducentes» já era pouco, o improvisado redactor desta mensagem, parlamentar, continua inspirado pela alma do conselheiro Acácio.

Há meia dúzia de medidas neste Parlamento que o Govêrno não sabe quais sejam, obedecendo a pensamentos diversos, por diversos governos apresentados, mas, diz-se aqui: aprovem os Senhores isso que nós nos contentamos.

Eu bem sei que as ideas, segundo é voz corrente, não servem para nada, mas, sabe V. Exa., Sr. Presidente, quem afirma isto?

São aqueles que não têm ideas.

Êsses é que julgam que as ideas são perfeitamente dispensáveis, afirmando que o que se torna preciso são actos, como se os actos não obedecessem a ideas, não obedecessem a um plano definido!

E qual é o plano do Govêrno?

O que pensa o Govêrno sôbre compressão de despesas?

Até onde julga possível que vá o efeito dessa compressão de despesas?

O que julga o Govêrno necessário pedir ainda de aumentos de receita?

O que pensa o Govêrno sôbre a lei do inquilinato?

Não sabemos nada.

Nem ao menos nos diz o pensamento do Govêrno sôbre a lei do inquilinato.

Eu não sei se o Sr. Catanho de Meneses aceita o filho.

O Govêrno apresentou o programa, mas não diz qual é o seu pensamento. Tudo o que diz já nós o sabemos. Muito obrigado pela novidade.

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O que pensa o Govêrno sôbre política religiosa?

O Govêrno perfilha a política do Sr. Domingues dos Santos?

O Sr. Rodrigues Gaspar apresentou êste papel por uma questão de praxe. Mas, Sr. António Maria da Silva, muito cuidado, muita cautela, que o Sr. Rodrigues Gaspar quere ocupar o seu lugar. Veja V. Exa. que é tanto assim, que a sua declaração ministerial não diz nada.

Sr. Presidente, vou terminar.

O Govêrno actual não nos agrada, porque já condenámos o Govêrno anterior, não pelas pessoas, mas pelas ideas.

O Govêrno anterior não nos satisfazia e o Govêrno actual, que é a continuação do anterior, não nos satisfaz também; não temos confiança nele.

Sôbre a política religiosa nós não queremos a guerra e o Govêrno quere a guerra.

Não podemos por forma alguma ter confiança no actual Govêrno.

Mal vai ao País com as transigências que temos tido. O País tem sido a vítima.

Os Governos pretendem apenas perpetuar nas cadeiras do Poder; é a obra do sectarismo-intransigente do Partido Democrático.

Nós representamos uma outra corrente no País. Entendemos que êste Govêrno não hasteia a bandeira do Partido, procurando envolvê-la em crepes, que parecem ser os crepes dá própria Nação.

Êstes homens não representam senão uma parte do pensamento dos democráticos.

O Sr. Vitorino Guimarães, protestando, ser o portador, como chefe dessa corrente partidária, de ideas claras, foi somente o portador da política dum Govêrno que é perfeitamente um amontoado de elementos heterogéneos.

Veio aqui para salvar o seu partido, mas nós estamos aqui para salvar a Nação.

Por isso não podemos dar apoio a êste Govêrno.

Para que as cousas fiquem inteiramente esclarecidas, tenho a honra de mandar para a Mesa a moção que representa o sentir do Partido Nacionalista:

A Câmara dos Deputados, reconhecendo que o Govêrno, tal como está constituído, não satisfaz as legítimas exigências do País, passa à ordem do dia.— Cunha Leal.

Foi lida e admitida.

O orador foi muito cumprimentado. O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Lino Neto: — Sr. Presidente: cada um dos lados da Câmara indistintamente apresentou ao Govêrno os seus cumprimentos de boas vindas.

Esta praxe não representa uma subserviência, mas uma afirmação de boa convivência, que muito vem contribuir para atenuar o peso da atmosfera política em que respiramos.

A minoria católica, que tem por função especial nesta Câmara a conciliação e a harmonia entre as várias correntes sociais, gostosamente corresponde a essa praxe, e faz os seus cumprimentos de boas vindas ao Govêrno, especialmente ao seu Presidente, o Sr. Rodrigues Gaspar, que nesta Câmara se tem evidenciado sempre como homem de Govêrno, procedendo com carácter, inteligência e dedicação patriótica»

Não me esqueço também de saudar os outros membros do Govêrno, aos quais me ligam laços de especial amizade e de particular apreço, como o meu antigo condiscípulo nos bancos da Universidade Sr. Daniel Rodrigues, os meus distintos colegas no foro Abranches Ferrão e Catanho de Meneses e os Srs. Pires Monteiro e Vitorino Godihho.

A todos, pois, eu saúdo e faço os meus cumprimentos.

Relativamente à atitude da minoria católica, devo declarar à Câmara que não acompanhamos, nem o apoio sistemático da maioria, nem a oposição sistemática das minorias. Também não vou para o lado da expectativa benévola, que é inaplicável na política. A nossa atitude definir-se há apenas pelos actos que o Govêrno fôr praticando.

Êsses actos são bons? Terão a nossa aprovação.

Êsses actos são maus? Serão por nós reprovados.

Esta atitude explica-se porque a minoria católica não aspira ao Poder. Não se

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importa que caiam os Governos ou que surjam outros, o que queremos é que os negócios públicos corram bem, e dentro desta orientação o Governo pode contar com a colaboração dêste lado da Câmara até onde fôr possível. Eu chamo especialmente a atenção do Govêrno para dois pontos: a moralização dos serviços públicos e - a redução dos mesmos.

Diz o Govêrno na sua representação que o preocupou principalmente o problema económico; é bom também que não esqueça o problema moral, e a liberdade religiosa é uma condição indispensável para a boa resolução dêste problema.

É necessário também que o exército seja reduzido não só porque isso importa uma deminuição sensível nas despesas públicas, mas também porque é preciso dar braços à agricultura e aumentar a produção nacional.

Dito isto, Sr. Presidente, eu quero referir-me a duas afirmações feitas pelo ilustre Deputado Sr. Vitorino Guimarães.

Disse S. Exa. que tinha pena da queda do Govêrno do Sr. Álvaro de Castro.

Não o acompanho nesses sentimentos.

O Govêrno transacto assinalou-se em medidas que são um verdadeiro atentado contra a ordem pública do País e evidenciou-se dessa forma especialmente pelas pastas da Justiça, Instrução e Interior.

Outra frase do ilustre leader da maioria com á qual não concordo é de que se caminha para as esquerdas.

Sob o ponto de vista económico não há dúvida dê que a Humanidade caminha para profundas alterações; mas sob o ponto de vista religioso mais uma vez se demonstra nos tempos que vão correndo que êsse fenómeno é à base da moralização dos serviços públicos, e é a demagogia na religião que se opõe à resolução dos grandes problemas que estão atormentando a vida nacional.

Êste facto é tanto mais lamentável, quanto é certo que a igreja, que traduz os fenómenos religiosos na sua forma mais perfeita, não tem hoje nenhuma função do Estado.

Tiraram-lhe todos os bens. Esta agindo independente.

Não necessita do Estado.

Quere apenas que lhe respeitem as liberdades fundamentais que se concedem a todas as instituições do País.

Não quere situação privilegiada.

Quere que lhe respeitem os direitos comuns.

Fixado êste ponto de vista, é esperando que o Sr. Presidente do Ministério e todos os outros membros do Govêrno se orientem por êle, ,eu concluo por onde comecei.

Dou as boas vindas ao Govêrno e faço votos pelas prosperidades do seu Presidente e de cada um dos seus Ministros, certo, porém, de que essas prosperidades coincidirão com as prosperidades nacionais.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Presidente: — São horas de encerrar a sessão.

A próxima sessão é amanhã, com a seguinte ordem dos trabalhos:

Antes da ordem:

A de hoje.

Ordem do dia:

Debate político e a de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 20 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Projecto de lei

Do Sr. Amadeu de Vasconcelos è mais quatro Srs. Deputados, autorizando o Govêrno a nomear segundo secretário de legação, o terceiro oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros, bacharel Luís António Ferreira de Sousa.

Para o «Diário do Governo».

Pareceres

Da comissão de guerra, sôbre o n.° 686-A, que abre um crédito de 1:200.000$ a favor do Ministério da Guerra para compra de medicamentos para a Farmácia Central do Exército.

Para a comissão de finanças.

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Da comissão de guerra, sôbre o n.° 754-H, que abre um crédito de 200.000$ a favor do Ministério da Guerra para despesas com a cobertura dos hangars do aquartelamento do Grupo de Esquadrilhas da Aviação República.

Para a comissão de finanças.

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja fornecido um exemplar da Estatística do Ensino Primário Oficial dos anos lectivos de 1915-1916 a 1918-1919.— Baltasar Teixeira.

Expeça-se.

O REDACTOR—Sérgio de Castro.

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