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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 156

«EXTRAORDINÁRIA»

EM 14 DE NOVEMBRO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
António Pais da Silva Marques

Sumário.— A sessão é aberta com a presença de 42 Srs. Deputados.

Procede-se à leitura da acta e, do expediente.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Pires do Vale ocupa-se de assuntos referentes às pastas da Instrução e do Comércio. Respondem, os Srs. Ministro da Instrução Pública (Abranches Ferrão) e do Comércio (Pires Monteiro) que também apresenta uma proposta de lei, para a qual requer a urgência.

O Sr. Leonardo Coimbra protesta contra a extinção das escolas primárias superiores e afirma também a sua discordância em relação a outras medidas adoptadas pela pasta da Instrução Pública. Responde o Sr. Ministro da Instrução Pública, usando depois da palavra, para explicações, o Sr. Alberto Jordão.

É aprovada a urgência para a proposta do Sr. Ministro do Comércio.

É aprovado um negócio urgente do Sr. Moura Pinto.

Ordem do dia.— Continua o debate acerca da proposta de lei autorizando o pagamento de 60:000 libras por conta da província de Angola.

O Sr. Morais Carvalho, que tinha ficado com a palavra reservada na sessão anterior, conclui as suas considerações, sendo lida e admitida a sua acção.

Usam ainda da palavra os Srs. Ministro das Colónias (Bulhão Pato), Pina de Morais e Lopes Cardoso, sendo admitidas as moções apresentadas pelos dois últimos oradores.

Antas de se encerrar a sessão.— Usam da palavra os Srs. Delfim Costa e Ministro das Colónias. A seguir, o Sr. Presidente encerra a sessão marcando a seguinte para a próxima segunda-feira, com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão às 15 horas e minutos.

António Pais da Silva Marques

Presentes à chamada 42 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 50 Srs. Deputados.

Presentes à chamada:

Alberto Ferreira Vidal.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Albino Pinto da Fonseca.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

António Albino Marques de Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Ginestal Machado.

António Pais da Silva Marques.

António Vicente Ferreira.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Brandão.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Carlos Cândido Pereira.

Ernesto Carneiro Franco.

Feliz de Morais Barreira.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Germano José de Amorim.

Jaime Júlio do Sousa.

João Baptista da Silva.

João Pina de Morais Júnior.

Joaquim Brandão.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Marques Loureiro.

José Mendes Nunes Loureiro.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José Pedro Ferreira.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Mariano Martins.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Paulo da Costa Menano.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Pedro Góis Pita.

Tomás de Sousa Rosa.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Abílio Marques Mourão.

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto de Moura Pinto.

Amaro Garcia Loureiro.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Abranches Ferrão.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Correia.

António Lino Neto.

António de Paiva Gomes.

António Pinto de Meireles Barriga.

António Resende.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Maldonado de Freitas.

Custódio Martins de Paiva.

Delfim Costa.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

Jaime Pires Cansado.

João José da Conceição Camoesas.

João Luís Ricardo.

João de Ornelas da Silva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.

Joaquim Dinis da Fonseca.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Carvalho dos Santos.

José Domingues dos Santos.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.

Júlio Gonçalves.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Manuel Alegre.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sousa Coutinho.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Nuno Simões.

Sebastião de Herédia.

Vasco Borges.

Vergílio Saque.

Vitorino Henriques Godinho.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Afonso Augusto da Costa.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Lelo Portela.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alberto Xavier.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Álvaro Xavier de Castro.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Américo da Silva Castro.

António Dias.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Maria da Silva.

António de Mendonça.

António de Sousa Maia.

Augusto Pereira Nobre.

Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

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David Augusto Rodrigues.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Domingos Leite Pereira.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Fernando Augusto Freiria:

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Cruz.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Hermano José de Medeiros.

Jaime Duarte Silva.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João Estêvão Águas.

João José Luís Damas.

João Pereira Bastos.

João Salema.

João de Sousa Uva.

João Vitorino Mealha.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Jorge Barros Capinha.

José António de Magalhães.

José Cortês dos Santos.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

Deu-se conta do seguinte

José de Oliveira Salvador.

Júlio Henrique de Abreu.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel Duarte.

Manuel de Sousa da Câmara.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mário de Magalhães Infante.

Maximino de Matos.

Paulo Cancela de Abreu.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomé José de Barros Queiroz.

Valentim Guerra.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio da Conceição Costa.

Às 15 horas principiou a fazer-se à chamada.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 42 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Eram 10 horas e 20 minutos.

Leu-se a acta.

Do Senado, devolvendo com alterações as propostas de lei n.° 493 que regula as penalidades a aplicar aos jogadores de jogos de azar o o n.° 583 que concede uma pensão à actriz Ângela Pinto.

A primeira, para a comissão de legislação comercial.

A segunda, para a comissão de finanças.

Do Ministério das Finanças, satisfazendo ao requerimento do Sr. Nuno Simões, transcrito no oficio n.° 487.

Para a Secretaria.

Do Ministério das Colónias, satisfazendo ao requerimento do Sr. Joaquim Dinis da Fonseca, comunicado em ofício n.° 526.

Para a Secretaria.

Do sindicante o Delegado do Procurador da República junto da 4.a vara cível, pedindo licença para o Sr. Paulo Cancela de Abreu depor como testemunha em um processo de sindicância a dois escrivães e dois oficiais de diligências da 3.ª vara.

Oficie-se comunicando que o Sr. Deputado se encontra licenciado por motivo de doença, constando que está bastante doente; por êsse motivo não pode a Mesa. submeter à Câmara o pedido dêste oficio.

Do ex-capitão José Esquivei, pedindo para o seu processo ser revisto. Para a Secretaria. Urgente. Para a comissão de guerra.

Do inspector escolar Manuel Domingos Godinho, de Tomar, pedindo a revogação da lei n.° 971.

Para a Secretaria.

Dos alunos do Instituto Superior do Comércio, do Pôrto, protestando contra a nomeação dos adidos das Escolas Primárias Superiores para professores das escolas técnicas.

Para a Secretaria.

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Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Têm a palavra o Sr. Pires do Vale.

O Sr. Pires do Vale: - Sr. Presidente, em vista da comparência do Sr. Ministro do Comércio, que eu muito agradeço, e de eu saber que S. Exa. já está informado das considerações que eu produzi, aqui, em relação à parte do assunto de que venho tratando, que corre pela sua pasta, tenho simplesmente que reatar o fio dessas considerações no ponto em que as interrompi.

Vinha eu demonstrando, Sr. Presidente, que o critério a seguir para a colocação das escolas comerciais e industriais que foram criadas não podia ser de forma nenhuma aquele que o Sr. Ministro da Instrução aqui insinuou na discussão entre nós travada na segunda feira passada, quando falou numa representação que, no entender de S. Exa. deveria ter sido dirigida ao Sr. Ministro do Comércio para esse fim. Então S. Exa. preguntava só do facto tinha sido dirigida de Gouveia alguma representação ao Sr. Ministro do Comércio para a colocação, ali, duma escola comercial, e industrial.

Se isso fôsse princípio do aceitar teríamos de concluir que o Sr. Ministro do Comércio, para escolher as localidades onde deveria criar uma escola comercial e industrial, faria uma bicha a que não deixaria de concorrer gente de todos os pontos do País. E mais: quando S. Exa. tivesse que limitar-se à colocação de um número certo dessas escolas, ver-se-ia em grandes embaraços para saber que ordem de preferências deveria seguir, a não ser - só digo isto - que as estabelecesse em relação às datas em que essas representações chegassem ao seu poder.

Isto não tem nenhuma espécie de senso comum, nem posso acreditar que o Sr. Ministro arvorasse este pseudo-critério em determinante para a escolha do localidades onde devem ser colocadas as escolas que tenha em mente criar.

Mas, Sr. Presidente, mesmo que fôsse de aceitar esse tal critério de ser recusaria uma representação; ainda o responsável de não se haver colocado em Gouveia a escola comercial o industrial, era o Sr. Ministro da Instrução que não indicou [...] quando [...] dirigidos [...] situação em [...] da extinção [...]

E porque não [...] Gouveia deveria [...] dos seus desejos, ou então, porque na falta dessa representação, [...] substituiu por uma indicação que poderia ter feito ao Sr. Ministro do Comércio?

Está a ver-se que foi!

Não pretende provocar declarações nêsse sentido, da parte do Sr. Ministro do Comércio, mas devo dizer que basta analisar as explicações do Sr. Ministro da Instrucção e considerar a [...], legalmente, se deveria prfoceder, para se verificar que as cousas se passariam assim. O Sr. Ministro do Comércio desejou - o louvável é êsse desejo - aproveitar logo [...] superiores, para criar [...] e industriais. [...] S. Exa. procurava [...] outras escolas.

Então o Sr. Ministro da [...] ao seu colega do [...] e o Sr. Ministro do Comércio estabelecendo [...] e industrial. Quero dizer, o Sr. Ministro da Instrução esqueceu a localidade de Gouveia e consequentemente não a indicou também. Praticou uma injustiça!

A conclusão a tirar é simples; e para isto é eu chamo o Sr. Ministro do Comércio a esta discussão. É que S. Exa., uma vez inteirado da situação de Gouveia, vai reparar essa injustiça e vai repará-la - que é fácil - criando já uma[...] comercial e industrial em Gouveia.

Qualquer diligência [...] sentido, [...], era descabida em [...] anterior àquele em que [...] S. Exa., por isso que [...] neste [...] na palavra que [...] da Instrução [...] ainda a dar-me uma resposta sôbre o caso

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[parágrafo ilegível]

[...] Instrução Pública [...] por inteiro, à palavra [...].

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

[...] justo do Sr. Ministro do Comércio para que fôsse [...] uma vez que exista [...] Escola [...] Superior que lá [...]

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

[...] por forma diversa daquela por que deveria de facto julgá-lo.

[...] em verdade que isso me magoa [...], pessoalmente, pois nunca poderia esperar que V. Exa. viesse aqui fazer cavalo de batalha de uma cousa simples de resolver.

O Orador: - O Sr. Ministro da Instrução Pública acha, como já aqui o disse, que foi uma exagerada susceptibilidade da minha parte, que me levou a levantar aqui esta questão.

Está S. Exa. completamente enganado.

A minha atitude corresponde em absoluto à impressão que produziu em Gouveia o acto que S. Exa. praticou.

O acto de S. Exa. produziu em Gouveia uma grande e justíssima indignação.

Aparte do Sr. Ministro da Instrução Pública que não foi ouvido.

O Orador: - O Sr. Ministro da Instrução Pública faltou às promessas que havia feito aos Srs. Nunes Loureiro e António Dias, como de resto já tinha faltado doutras vezes à sua palavra escrita.

Esperei até segunda-feira por uma resposta que não veio.

Alguém que andou em diligências junto do Sr. Ministro estava fiado também na palavra. do Sr. Ministro da Instrução Pública.

Passou-se um dia além do prazo que se havia marcado, passou-se um segundo dia, e nesse dia recebi um telegrama de Gouveia pedindo providências contra o facto que se vinha praticando.

Fui leal com o Sr. Ministro. Fui mostrar-lhe esse telegrama o limitei-me a dizer que já havia recebido outro telegrama concebido nos mesmos termos.

Não dei resposta alguma ao telegrama.

O Sr. Presidente: - Está esgotado o tempo durante o qual V. Exa. podia falar.

Vozes: - Fale! fale!

O Orador: - Agradece à Câmara [...] que continue no uso da palavra. É necessário acabar de esclarecer o assunto.

Faz as diligências junto do Sr. Ministro do Comércio e Comunicações.

Veio finalmente um terceiro dia que foi

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domingo, um quarto, em que esperei e continuei a esperar pela resposta do Sr. Ministro da Instrução Pública.

Tive o cuidado de dirigir-me ao Sr. Ministro, lembrando-lhe o compromisso que S. Exa. havia feito.

Porém, os factos deixaram-me mal colocado perante o eleitorado de Gouveia. Ao eleitorado de Gouveia afirmei que não havia má vontade contra Gouveia, pois tinha o compromisso de S. Exa. de que se empenhara junto do Sr. Ministro do Comércio e Comunicações para a criação duma escola comercial.

Já o Sr. Ministro vê a lealdade e isenção com que procedi. Porém S. Exa. não se importou com isso e colocou-me mal. E a prova disso é que num jornal de Gouveia se publicou domingo um artigo em que sou responsabilizado pelo procedimento do Sr. Ministro da Instrução Pública.

E na última hora veio publicado um extracto da carta que para lá escrevi, em que se diz constar que o Sr. Pires do Vale, não obtendo a escola primária de ensino superior, conseguia do Sr. Ministro da Instrução Pública a promessa da criação do ama escola comercial e industrial.

Porém, na segunda-feira, li num jornal que havia sido criada uma escola comercial, não em Gouveia, mas em Seia.

O Sr. Júlio Gonçalves: — E foi muito bem criada essa escola comercial em Seia.

O Orador: — Mas foi criada à custa de Gouveia.

Bem sei que Seia é um centro industrial importante susceptível de um maior desenvolvimento, onde convém difundir o ensino industrial.

Amanhã Seia será uma fôrça industrial de grande valor, visto ter uma empresa que hoje está explorando as quedas dó água, o que será no futuro uma origem de imenso desenvolvimento para todas as indústrias já existentes e para a criação de outras indústrias.

Mas a resolução do Sr. Ministro da Instrução Pública é atentatória do direito criado, atentatória da instrução e do sonso comum.

Devo dizer que em Gouveia toda a gente está indignada por causa do que se passou em relação us escolas.

Os meus amigos enviaram um telegrama ao Sr. Ministro pedindo a criação de uma escola comercial e industrial.

Veja o Sr. Ministro a isenção como andei nesta questão!

Como reparação de justiça só falta, que venha um telegrama agradecendo, ao Sr. Abranches Ferrão a criação da escola industrial.

Dou a minha palavra de honra que quando êle vier não proferirei uma palavra sequer que esclareça êsse formidável equívoco em que essa gente virá agradecer ao único responsável da lucta que venho aqui sustentando, ao único responsável dos prejuízos que sofreu Gouveia, ao único responsável da indignação de que essa gente está possuída e que a levou até o ponto de me telegrafar comunicando-me que a Câmara Municipal e todas as agremiações políticas republicanas iriam dissolver-se, pois todos reconhecem que se cometeu um verdadeiro atentado às necessidades da região, com a agravante, que nunca poderá justificar-se, e que é odiosíssima, de nem sequer haver em atenção que à frente dessa escola estava o nome de Pedro Boto Machado, velho republicano, que outra merco nunca recebeu do regime.

É assim é que essa gente diz: — Em nome da memória do nosso saudoso patrono, a quem a República em troca de toda a sua dedicação e carinho nunca deu outra demonstração de justiça senão a de pôr êste nome ilustre à escola que êle fundou, protestamos contra esta extinção.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações vê bem que nestas condições não posso de forma nenhuma responsabilizá-lo da mesma forma que ao Sr. Ministro da Instrução Pública no assunto dêste debate.

Não posso responsabilizá-lo senão pelo facto de não ter procurado, como lhe competiria, averiguar as necessidades dessa região de maneira a proceder consentâneamente com os interêsses da mesma.

S. Exa. não Criando uma escola comercial e industrial em Gouveia pode ter praticado êste pecadilho do não ponderar devidamente, com absoluto conhecimento de causa, as condições desta terra, e eu não quero levar S. Exa. s a uma declaração que seria até atentatória da boa câmara

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gem que deve existir entro membros do mesmo Ministério.

Todavia vê-se que o responsável dêsse pecadilho foi o Sr. Ministro da Instrução Pública que levou o seu colega do Comércio a isso no desejo do procurar criar uma escola comercial e industrial em Seia, desejo que não seria nada de condenável se os meios de que- se serviu não fossem, como são, absolutamente inaceitáveis.

Devo explicar que estou absolutamente convencido de que o Sr. Ministro do Comércio e Comunicações vai corroborar aqui certamente, na sua resposta, a declaração que já me fez pessoalmente e que não é particular de que está na disposição de criar imediatamente uma escola comercial e industrial em Gouveia.

É preciso, porém, que não haja confusões, porque eu não desejo que S. Exa. faça a transformação da escola primária superior em escola comercial e industrial. A escola primária superior está extinta e a sua transformação em estabelecimento comercial e industrial seria por mim recebida como um agravo.

Não se trata dum capricho da minha parte, como vou justificar.

Correspondendo a uma necessidade do ensino técnico a criação duma escola comercial e industrial em Gouveia, fica por suprir a necessidade que representava a escola primária superior.

Consulte S. Exa. a freqüência dessa escola, consulte as provas dadas pelos alunos de lá saídos, consulte a figura que essa escola tem feito em concursos, exposições, etc., e S. Exa. verá que essa escola desempenhava uma alta função, das mais brilhantes de que a República pode orgulhar-se.

Pois bem: como a Câmara sabe, estão em marcha projectos que inutilizam a medida do Sr. Ministro da Instrução a respeito das escolas primárias superiores e parece até que o próprio titular dessa pasta está resolvido a modificar o seu critério inclinando-se a fazer uma simples transformação dos cursos complementares das antigas escolas.

De qualquer forma, eu tenho uma crença absoluta de que êsse acto de justiça não se fará esperar, e que amanhã haverá novamente em Gouveia uma escola primária superior e, nesse caso, o meio simples de resolver a questão seria o de reabrir novamente a escola primária superior e criar a escola comercial e industrial.

E como da extinção da escola primária superior resultou a extinção, no seu frontispício, do nome de Pedro Boto Machado, que montou até a escola do seu bolso particular, sendo ainda hoje os seus herdeiros quem a sustenta, necessário ô que, emquanto estiver extinta a escola primária superior, seja dado à escola comercial e industrial o nome de Pedro Boto Machado.

É um acto de absoluta justiça mandar, o mais breve possível, à assinatura o decreto criando essa escola.

E amanhã dia de assinatura, e o Sr. Ministro do Comércio, se tiver a boa vontade que eu lhe presumo, pode bem liquidar êste incidente fazendo a reparação duma gravíssima injustiça.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Instrução (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: poucas palavras tenho a dizer em resposta às observações do ilustre Deputado Sr. Pires do Valo, já porque tive ocasião de dar à Câmara as necessárias explicações sôbre o assunto de que S. Exa. se ocupou, já porque eu não dou ao caso, como o ilustre Deputado, foros dum grave problema de administração pública que precise ser detalhadamente esclarecido.

Pode o Sr. Pires do Vale estar absolutamente tranqüilizado, porque da minha parte não houve, nem há, o propósito de ferir os legítimos interêsses de Gouveia, cujas necessidades eu conheço de perto. Simplesmente tenho a opinião de que, se é necessária a existência de uma escola comercial e industrial em Gouveia, essa necessidade não é menos real em relação a Seia, que é incontestavelmente um centro industrial muito mais importante que o de Gouveia...

O Sr. Pires do Vale: — Era mais elementar que V. Exa. fôsse, como alguns filhos que, preguntados sôbre só gostam mais do papá do que da mamã, respondem que gostam tanto dum como doutro.

A Câmara Municipal de Seia expôs ao Ministério do Comércio o

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conjunto de circunstâncias que impunham a necessidade de criar nessa vila uma escola comercial e industrial.

Em face das razões aduzidas, o Sr. Ministro do Comércio resolveu criá-la.

Quanto a Gouveia, o Sr. Ministro do Comércio aguarda o momento de transformar a sua escola primária superior em escola comercial e industrial...

O Sr. Pires do Vale: — É uma curiosa maneira de transformar, essa de extinguir em Gouveia e criar em Seia.

O Orador: — V. Exa. pode tirar as conclusões que quiser.

O que é lamentável é que a Câmara esteja perdendo tanto tempo com questões de tam reduzida importância.

O meu procedimento neste lugar não se amolda aos desejos ou interêsses dos meus eleitores, mas sim aos desejos e interêsses da Nação.

Que fique isto bem assente.

Falou o Sr. Pires do Vale na desconsideração que, no entender de S. Exa. a} houve com a memória do insigne republicano Sr. Pedro Boto Machado.

Não vale a pena desfazer a insinuação.

Sou republicano há muito tempo, do tempo em que para se ser republicano era preciso ter espírito de sacrifício.

Lutei com muitas dificuldades para manter através de tudo o meu credo político.

Não podia, por isso, ter qualquer gesto de desconsideração para republicanos, sobretudo pára republicanos da categoria do Sr. Pedro Boto Machado.

Termino, Sr. Presidente, absolutamente convencido de que nesta questão agi com imparcialidade e com justiça.

A melhor prova de que assim é, está no telegrama que me foi enviado pelos próprios patrícios do Sr. Pires do Vaie.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pires Monteiro): — Sr. Presidente: antes de responder às considerações há pouco feitas pelo Sr. Pires do Vale, mando para a Mesa uma proposta de abertura de crédito para a qual requeiro urgência.

Sr. Presidente: a questão do ensino técnico em Portugal tem-me merecido desde a primeira hora em que tive a honra do entrar no Ministério do Comércio a mais cuidada atenção.

Foi assim que, pela primeira vez no nosso País, os professores de todas as escolas técnicas de Lisboa, elementares, médias e superiores, se reuniram numa sessão sob a presidência do Chefe do Estado.

As escolas primárias superiores foram extintas e, em conseqüência dessa extinção, os professores dessas escolas ficaram adidos, e, segundo o sistema estabelecido, e que se chama o respeito pelos direitos adquiridos, ficaram recebendo os seus vencimentos, menos o exercício.

O Ministério da Instrução procurou aproveitar alguns dêsses professores, e para isso criou os cursos complementares.

Sr. Presidente: eu julgo que o ensino técnico elementar não tem tido no nosso País aquele desenvolvimento que as condições do nosso meio exigem e justificam.

Eu estou convencido de que um dos grandes males da nossa indústria, um dos grandes defeitos do nosso comércio e um dos grandes prejuízos que sofre a nossa agricultura, são devidos ao pouco desenvolvimento do ensino técnico.

Assim, Sr. Presidente, nós vemos que as nossas escolas de artes e ofícios, que são ais escolas técnicas mais elementares, devem estar ligadas às escolas primárias superiores.

Em seguida temos as escolas comerciais e industriais, com secções variadas, conforme as exigências de cada região, e depois os institutos médios e superiores, como o instituto, superior do comércio e o instituto superior técnico, do Pôrto, todos sob a dependência do Ministério do Comércio.

Conseqüentemente, Sr., Presidente, verifica-se que a República realizou uma obra importantíssima, sob o ponto de vista da rede geral do ensino técnico.

Sr. Presidente: eu estou absolutamente convencido de que poderia prestar um grande serviço ao meu País, aproveitando os professores das escolas primárias superiores que foram extintas, na regência de várias disciplinas das escolas comerciais e industriais.

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Foi o que fiz, devendo acentuar que não foi desordenadamente.

Infelizmente, Sr. Presidente, o tempo não me permitiu que realizasse aquela obra que desejava efectivar, mas a esta questão dediquei o melhor do meu cuidado, procurando sempre bem servir o meu País.

Foi esta a obra que realizei, e creio que a Câmara dos Deputados, que representa o País, me relevará de qualquer falta que tenha cometido, pois não foi mal intencionada,

O Sr. Pires do Vale (em àparte): - V. Exa. dá-me licença?

V. Exa. esqueceu-se de dizer se sim ou não cria a escola do Gouveia.

Devo dizer a V. Exa. que a escola industrial de Gouveia vai ser criada, sob a égide de Boto Machado.

O Sr. Pires do Vale: — Muito obrigado a V. Exa.

O orador não reviu.

O Sr. Leonardo Coimbra: — Sr. Presidente: tinha-me inscrito no debate sôbre as escolas primárias superiores, porque reputo êsse problema da mais alta importância para a vida da República e da Nação.

São vários e de urgência os assuntos que desejo tratar, e para começar, devo dizer que têm causado uma má impressão no meu espírito todos os diplomas ultimamente publicados pelo Ministério da Instrução de sociedade com o Ministério do Comércio, acerca de tam momentoso assunto.

Sr. Presidente: a má impressão a que venho de referir-me provém principalmente do desprêzo absoluto a que se tem votado a província, o que é demonstrado no projecto de reforma das escolas primárias superiores, parecendo ignorar-se que a capital recebe as suas energias, — não só fisiológicas, como mentais — da província. A província, se me permitem esta figura, dá a lenha para ser queimada nesta grande fogueira, que é a capital.

Se não respeitarmos a província, se não olharmos por ela, chegaremos a uma vida artificial, cheia de abstracções e partidarismos.

Sr. Presidente: a criação dos cursos complementares é lamentável.

Nós não podemos concordar com ela; nós os republicanos, os homens da democracia, temos de olhar atentamente para a província.

Pregunto se é querer servir a República centralizar tudo na capital,

E contra isto que protesto.

Mas mais: com & centralização do ensino primário superior na capital pretende-se fazer com que o ensino seja centralizado na escola de Bemfica.

A êste Ministério pode chamar-se o Bemficatense, que leva tudo para Bemfica.

No Diário do Govêrno só vêm insultos e ofensas aos professores honrados que cumprem o seu dever.

É contra isto que protesto; e mais ainda contra a maneira como se desrespeitam completamente interêsses criados.

Tenho aqui um documento curiosíssimo acerca da escola primária superior de Matozinhos, transformada em escola comercial e industrial.

Não podemos ter a preocupação quási exclusiva do estudo das sciências físico-naturais.

Sôbre nomeações de professores, direi que para um liceu de Lisboa foi nomeado determinado candidato, velho republicano e professor competente. Pois foi demitido, pouco tempo depois, para ser nomeado um outro concorrente, que não tinha legalizado no devido tempo os seus documentos e. que é monárquico-integralista, adversário intransigente da República, autor dum artigo em que os republicanos são acusados de todos os crimes. Este facto não impediu que se fizesse a sua nomeação.

Depois disto, Sr. Presidente, eu desejaria muito que o Sr. Ministro da Instrução explicasse se êstes factos podem de alguma maneira estar de acordo com as palavras aqui proferidas ontem por S. Exa., tanto mais quanto é certo que eu tenho aqui a cópia do despacho de S. Exa. o Sr. Ministro da Instrução.

Isto, Sr. Presidente, não se compreende, nem se pode admitir, pois a verdade é que nem sequer foram respeitados os sagrados princípios das leis da República.

Um outro caso eu desejo também tratar e êsse muito especialmente, pois a verdade é que depois da violência das minhas

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palavras, relativamente aos assuntos a que me acabo de referir, o meu desejo é que o Sr. Ministro da Instrução tenha ocasião de mostrar à Câmara que as informações dadas por alguns jornais são absolutamente destituídas de fundamento.

Refiro-me, Sr. Presidente, às noticias que tem vindo nos jornais, relativamente aos exames da segunda época, feitos nos liceus, muito principalmente a respeito de uma pessoa de família do Sr. Ministro da Instrução.

Eu creio que essas notícias devem ser absolutamente falsas; no emtanto, eu vou dar conta delas à Câmara, a fim de que o Sr. Ministro da Instrução tenha depois ocasião de as desmentir.

Diz-se, Sr. Presidente, que o filho do Ministro da Instrução foi admitido ilegalmente a exame na segunda época, não tendo pago as propinas que a lei estabelece.

Não creio que isto seja verdadeiro, e, assim, o meu maior desejo é que o Sr. Ministro da Instrução possa, aproveitar êste ensejo para mostrar à Câmara que tal notícia não tem fundamento algum.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: pedi a palavra para responder às observações feitas pelo ilustre Deputado o Sr. Leonardo, Coimbra.

$0 que respeita às escolas primárias superiores, eu já tive ocasião de dizer à Câmara que a situação em que nos encontramos foi criada, em parte, pelo Sr. Leonardo Coimbra.

Não fui eu quem criou esta situação, pois a verdade é que tenho cumprido a lei, seguindo o que se acha decretado, não só pelo Sr. António Sérgio como pelo Sr. Helder Ribeiro.

Eu limitei-me a reorganizar as escolas em harmonia com o que se achava estabelecido, e nem outra cousa podia fazer.

Trocam-se àpartes.

O que eu desejaria era que V. Exa. me dissesse se não concorda com o que eu fiz.

O Sr. Leonardo Coimbra (interrompendo): — Não concordo.

O Orador: — Será essa a sua opinião; porém, eu entendo que não podia proceder de forma diversa daquela que procedi.

Quanto às considerações que V. Exa. fez relativamente à Escola de Bemfica, não posso de maneira nenhuma estar de acordo também com S. Exa., pois a ver-dado é que o que se pretende é preparar professores, e é justamente êsse o fim que se tem em vista, criando-se a Escola Normal Primária de Bemfica.

Trocam-se novos apartes.

O Orador: — Não vinha, Sr. Presidente, habilitado para responder a todas as observações de S. Exa.; porém, como S. Exa. diz que mais tarde há-de tratar do assunto mais desenvolvidamente, eu terei então ocasião de lhe mostrar o que há sôbre essas nomeações a que S. Exa. se referiu.

Eu devia pôr ainda mais adidos e fazer mais nomeações?

Interrupção do Sr. Leonardo Coimbra que não se ouviu.

O Orador: — Então V. Exa. concorda em que êsses indivíduos deviam ser nomeados?

O Sr. Leonardo Coimbra (interrompendo): — Com o que eu não concordo é que indivíduos habilitados com o curso sejam postos em outros lugares.

O Orador: — V. Exa. é muito inteligente, mas às vezes erra extraordinariamente. Eu não nomeei ninguém.

O Sr. Leonardo Coimbra (em aparte): — Mas as nomeações feitas pelo Ministério do Comércio levam as indicações da selecção feita no Ministério da Instrução!

O Orador: — Está V. Exa. enganado.

O Sr. Leonardo Coimbra (em àparte): — É êsse o êrro.

O Orador: — Eu não fiz nenhuma nomeação, e, portanto, vê V. Exa. que não tinha razão nas considerações que fez.

Mas V. Exa. acusou-me ainda de certos factos, êsses realmente mais graves.

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porque dizem respeito à minha dignidade como Ministro da República.

Sr. Presidente: eu devo dizer que ninguém tem o direito de me acusar de não cumprir rigidamente as disposições legais, e S. Exa. é uma daquelas pessoas que o não podem fazer, porque sabe, por experiência própria, como eu sou cumpridor da lei.

O Sr. Leonardo Coimbra (em àparte): — Acho de muito mau gosto que V. Exa.
venha com isso para aqui.

O Orador: — Disse e repito: V. Exa. sabe bem como eu sou fiel cumpridor da lei.

O Sr. Leonardo Coimbra (em àparte): — Não sei.

O Orador: — Se V. Exa. não sabe, eu lembro-lhe os factos.

Relativamente ao artigo 6.°, que V. Exa. achou um grande escândalo, vou explicar à Câmara, em poucas palavras, o que êle representa*

O Sr. Helder Ribeiro, no Govêrno do Sr. Álvaro de Castro, entendeu que devia reduzir vários liceus de centrais a nacionais, e terminar em outros com o curso de letras. Por esta forma alguns professores não tinham que fazer, e ficaram adidos.

Ora, o que era natural era que se fossem buscar êsses professores para as primeiras vagas, o que não fiz, e vou explicar a razão porquê.

Muitos dêsses professores estavam há longos anos nessas localidades, e V. Exas. compreendem que dada a dificuldade do arranjar habitação e ainda outras circunstâncias, o Sr. Helder Ribeiro atendeu a êsse ponto, tanto mais que em muitos dêsses liceus se estavam contratando professores provisórios para fazer face às exigências do serviço. Eu conformei-me com êste ponto de vista, mas podia não conformar-me, e nem por isso deixava de estar dentro da lei e de a cumprir rigorosamente.

Mas entre êsses professores que estavam na situação de adidos alguns havia que exerciam já outras funções docentes em outros liceus. Nestas condições, ordenei que todos êles regressassem aos liceus onde exerciam essas funções.

Suponhamos que o Liceu de Setúbal passou de central a nacional, e que ficaram uns professores além do quadro. Êstes professores, na situação de adidos, podia-os colocar onde quisesse, mas suponham V. Exas. que havia um professor adido que não tendo que fazer em Setúbal era ao mesmo tempo professor em Lisboa numa escola industrial, e assim eu dizia-lhe: «você vai para Lisboa porque disso redundará um benefício para o Estado.»

Quanto à interpretação do artigo 6.° a que o Sr. Leonardo Coimbra se referiu, devo dizer que ela não pode ser feita como S. Exa. quere, mas como eu a fiz, para evitar todo e qualquer equívoco.

Referiu-se ainda S. Exa. a um caso ocorrido com um professor do Liceu Gil Vicente. Também vou explicar à Câmara como os factos se passaram. Até à altura em que fui para o Ministério da Instrução, os professores provisórios eram nomeados ao arbítrio do Ministro da Instrução.

O Sr. Alberto Jordão: — Não era bem assim. O Conselho Escolar fazia uma proposta e o Ministro nomeava-os.

O Sr. Pinto Barriga: — Era a mesma cousa, porque no fim o Ministro é que escolhia o professor.

O Orador: — Em todo o caso, se não estou em êrro, o Ministro tinha ampla liberdade para escolher qualquer indivíduo cujo nome estivesse na lista que lho era, apresentada. Ora eu entendi que devia lançar uma certa ordem nesta maneira de proceder, e assim mandei publicar uma portaria com a classificação dos possíveis concorrentes, dando ordens pura que as nomeações só fizessem em harmonia com essa classificação. Esta portaria só deixou de se cumprir em dois casos, porque os respectivos Conselhos Escolares me apontaram a conveniência de manter nos seus liceus dois professores já muito antigos lá, e um deles até com serviços à República.

Mas, no Liceu Gil Vicente, a certa altura, concorreram também professores

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provisórios, sendo um deles aquele a que o Sr. Leonardo Coimbra se referia e que primitivamente foi nomeado. Um outro professor, porém, reclamou, dizendo que se não tinha sido nomeado era porque a um seu documento lhe faltava um sêlo e á certidão de vacina não estava em ordem. Relativamente à questão do sêlo havia até divergências quanto ao seu quantitativo, e dessa forma mandei buscar o processo do aludido professor para o compulsar, mas o processo não aparecia. Preguntei, então, ao Sr. Director Geral qual a situação era que o indivíduo se encontrava, isto é, se devia ter sido classificado em primeiro lugar se os seus documentos estivessem em ordem. Afirmou-me S. Exa. que sim, e nestas condições eu nomeei-o.

O Sr. Leonardo Coimbra: — Isso não é legal! V. Exa. deixou completar documentos depois do prazo.

O Orador: — Mas há um prazo para reclamar e foi nele que o interessado reclamou.

O Sr. Leonardo Coimbra: — Mas a reclamação não foi ao Conselho Escolar.

O Orador: — Eu mandei cumprir à risca todos os trâmites legais.

Mas diz-me o Sr. Leonardo Coimbra que o nomeado ainda por cima é monárquico e ataca os republicanos nos jornais. Ora que culpa tenho eu disso?! Eu posso saber a opinião de cada um?! A responsabilidade é daqueles chefes republicanos que passam certidões de bons republicanos a toda a gente. Se o Sr. Leonardo Coimbra me tivesse apontado êsses factos, eu tê-lo-ia certamente atendido.

Acusou-me ainda o Sr. Leonardo Coimbra do facto de ter consentido que uma pessoa da minha intimidado, que é meu filho, fizesse exame sem que a isso tivesse direito. Já me tinham chegado aos ouvidos boatos de que eu era acusado disso, e por isso estimei até que V. Exa. tratasse da questão para eu poder ter ensejo de expor, à Câmara como os factos se passaram. E V. Exas. vão ver que se eu não tivesse procedido como procedi apenas por cobardia moral o teria feito.

A pessoa de que se trata requereu o exame de 7.ª classe no Liceu Gil Vicente, e para isso foi preciso conseguir duas portarias que eu não passei, nem sequer pedi a ninguém para que fossem passadas. Uma dispensava-o da idade e a outra mandava-o fazer exame segando a legislação de 1905. Essas portarias foram passadas pelo Sr. Helder Ribeiro, quando Ministro da Instrução, que aliás passou muitas outras nas mesmas condições. Ora o. rapaz tinha freqüentado o Liceu Camões na 6.ª classe e tinha ficado mal rio respectivo exame. O reitor do Liceu Gil Vicente não lhe indeferiu o requerimento para fazer exame, mas apenas lhe pôs a nota de «impedido.»

Como tenho muita cousa em que pensar não me preocupei mais com o caso.

O Sr. Alberto Jordão: - O que não admite dúvidas é que o reitor procedeu muito bem. Eu no lagar dele faria o mesmo.

O Orador: — Em certa altura o interessado apresentou um requerimento alegando as razões que entendeu convenientes para lhe ser consentido ir a exame.

Sôbre tal requerimento, a repartição competente deu um parecer favorável, e eu despachei nesse sentido.

Aqui têm V. Exas. o grande escândalo!

Estava e ainda estou convencido de que o aluno de que se trata tinha todo o direito de ser admitido a exame de 7.° ano, na segunda época, isto é, em Outubro. E também assim o entendeu o reitor, tanto que os próprios selos apostos sôbre o requerimento ficaram inutilizados. Em face das disposições legais, o rapaz podia fazer o seu exame em Outubro e por isso eu despachei nesse sentido.

Temos agora o caso do pagamento de novas propinas.

Devo dizer que não era a exigência do pagamento de 100 ou 200 escudos a mais do que aquilo que o aluno já havia despendido que faria com que êle deixasse de sujeitar-se ao exame em Outubro. Eu podia ter imposto a condição de ser feito êsse novo pagamento, mas como reconhecera, e com toda a justiça, que o aluno não deixara de fazer o seu exame em Julho por sua culpa, entendi que representaria uma cobardia moral da minha

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parte ordenar um novo pagamento de propinas...

Nesta altura, vários Srs. Deputados interrompem o orador, trocando-se com êle, simultaneamente, algumas explicações.

O Orador: — Sr. Presidente: tem-se também feito correr o boato de que eu, em interêsse de uma pessoa íntima, havia publicado um decreto dispensando-a do exame da disciplina em que não fora aprovada.

Embora não se tivesse feito, aqui, referência nenhuma a tal respeito, eu não quero deixar de esclarecer o caso.

Os alunos sujeitos ao regime estabelecido pela reforma de 1905 que tenham obtido no seu exame de ano nota inferior a dez, numa disciplina, repetem em Outubro o exame dessa disciplina. Os alunos sujeitos ao regime actual que obtenham numa disciplina nota inferior a dez não repetem o exame.

Em certa altura apareceu-me o pai de um aluno — o Sr. Marinha de Campos — dizendo que isto assim era uma flagrante injustiça porque não se procedia do mesmo modo em todos os estabelecimentos oficiais de ensino secundário.

Eu disse-lhe que não podia fazer nada porque á lei determinava isso, mas o Sr. Marinha de Campos provou-me que no Colégio Militar se dispensava êsse exame. Por outro lado a Direcção Geral de Ensino Secundário informou que muitos reitores dos liceus assim interpretavam a lei. Nestas condições pregunto a V. Exas. o que faziam. £ Então uns são filhos de Deus, outros são filhos do Diabo?

O Sr. Alberto Jordão: — V. Exa. dá-me licença? Quanto à primeira parte do assunto, não concordo em nada com o que V. Exa. disse.

O Orador: — Mas porquê?

O Sr. Alberto Jordão: — O aluno referido não provou que não tinha perdido o ano até 31 de Maio, e o encarregado da educação veio sofisticamente dizer que êle não tinha freqüentado qualquer liceu até 31 de Maio. Quanto à segunda parte das considerações de V. Exa. devo dizer que foi um perdão de acto o que V. Exa. fez. Alguns dos alunos do meu liceu teriam ficado reprovados se tivessem repetido o exame em Outubro.

O Orador: — Mas porque é que V. Exa. não reclamou contra o que se estava a fazer no Colégio Militar?

O Sr. Alberto Jordão: — Não sabia que lá assim se procedia. De resto um êrro não justifica outro.

O Orador: — Mas isso não era justo. Não é natural que um aluno do 5.° ano do liceu, porque se rege pela lei actual, não fique reprovado, e outro, porque se rege pela lei antiga, tenha nas mesmas condições de ficar reprovado. Demais, tendo-se procedido assim no Colégio Militar e em alguns liceus, e sendo um acto absolutamente justo equiparar alunos nas mesmas condições, não hesitei em mandar fazer essa equiparação.

Ora aqui tem V. Exa. a razão do meu procedimento.

Achava, porém, conveniente que V. Exa. dissesse as razões por que acha ilegal o meu procedimento. V. Exa. dirá as razões em que se baseia essa ilegalidade.

Tinha muito prazer em ouvir dizer essas razões.

O orador não reviu.

O Sr. Alberto Jordão: — V. Exa. pede-me para dizer us razões por que entendo o procedimento ilegal.

Não tinha intenção de falar, mais no assunto pendente, a não ser nos termos em que falei dizendo que discordava inteiramente da forma como V. Exa. encarou as questões levantadas pelo Sr. Leonardo Coimbra.

Há certo melindre nesta questão. Tratou-a o Sr. Leonardo Coimbra duma maneira a não ferir as susceptibilidades do Sr. Ministro da Instrução.

Êsse assunto podia talvez passar assim.

Antes tratarei da parte que me interessa como professor, por fazer parte de determinado júri dos liceus de ensino secundário.

Creio que S. Exa. tem razão: há muitos alunos que fizeram os seus exames ao abrigo da deliberação parlamentar. Mas muitos tinham os cinco anos e transitaram, sem ter aberto os livros, sabendo muito menos que em Julho.

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Foram para o curso superior, e depois vêm as culpas para os professores que os deixaram transitar.

Quanto ao outro caso creio melhor não falar mais nele.

Já disse V. Exa. o que entendia...

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Abranches Ferrão): — Mas desejava que V. Exa. me dissesse as razões...

O Orador: — Eu digo.

O aluno não devia ter feito o que fez, nos termos do regulamento.

Não apresentando a informação nos termos do regulamento, «sob palavra de honra», o encarregado não quis inscrevê-lo e o reitor, cauteloso, também não.

Disse que ia arranjar uma autorização de harmonia com o regulamento.

Para Outubro o aluno tinha que pagar 50$: e só assim é que transitaria para Outubro.

Do contrário não.

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Abranches Ferrão) (interrompendo): — Um aluno nessas condições não é um aluno do regime de 1905.

Eu gosto que o meu procedimento seja discutido para se ver como procedi, e já disse as razões por que o aluno referido tinha direito a fazer exame.

Pode V. Exa. não concordar, mas é assim.

Àpartes.

O Orador: — Apesar das razões que S. Exa. apresentou eu não posso concordar com o facto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia.

Foi aprovada a acta.

O Sr. Presidente: — O Sr. Moura Pinto requereu para em seguida ao negócio urgente do Sr. Ferreira da Bocha tratar do seguinte negócio urgente:

Desejo tratar em negócio urgente logo após o negócio urgente do Sr. Ferreira da Rocha, da publicação do decreto n.° 10:223, que abusiva e inconstitucionalmente revogou a lei n.° 1:368, criando novos tribunais de contencioso para as contribuições e impostos.

13 de Novembro de 1924.— Alberto de Moura Pinto».

Consultada a Câmara fui aprovado.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Morais Carvalho, sôbre a ordem.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: vou rematar e terminar em tam breves palavras quanto possível as considerações que iniciei na sessão do ontem acerca da proposta que o Sr. Ministro das Finanças, e não o Sr. Ministro das Colónias, mandou para a Mesa pedindo autorização para pagar 60:000 libras, ou sejam 15 por cento do crédito, diz a proposta, aberto por conta dos três milhões de libras.

Sr. Presidente: as revelações extraordinárias vindas já a público, graças à intervenção da minoria monárquica, acerca da situação pavorosa e alarmante em que se encontra a província de Angola e os números precisos aqui apresentados durante o debate pelo ilustre Deputado Sr. Rêgo Chaves, que é hoje o Alto Comissário daquela província, são mais uma demonstração, aliás desnecessária, da incapacidade administrativa da República.

São mais, são marcos desta estrada da República, que indicam o caminho resvalador que ela vai seguindo.

Sr. Presidente: dizia eu ontem que nesta malfadada questão todos ficaram mal colocados.

Em que situação se encontra o Govêrno, um Govêrno que numa questão desta natureza não apresenta a sua proposta com os elementos necessários para a Câmara fazer um juízo seguro?

Em que situação se encontra um Govêrno que quando em Angola as aí vidas já montam, no dizer do Sr. Rêgo Chaves, à elevada soma de 3.400:000 libras, vem aqui apresentar uma proposta para pagar 60:000 libras, sem se referir ao restante?

Em que situação se encontra um Govêrno que assim procura iludir a Câmara

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e o País dando a impressão que o descalabro não é tam grande como realmente é?

Tudo isto mostra que o resultado da administração do Sr. Norton de Matos na província de Angola é tam grave que o Govêrno teve medo de pedir ao País o montante das dívidas e só pede 60:000 libras.

A proposta ministerial, repito, pede só 60:000 libras, sem dizer mais nada, mas
o Sr. Ministro das Colónias, apertado no torniquete das preguntas do Sr. Carlos de Vasconcelos, deixou escapar uma frase dizendo que importava que houvesse dívidas na importância dum milhão de libras, para uma província tam grande como a província de Angola, e assim já S. Exa. deixava antever que as dividas não fossem só 60:000 libras, mas um milhão.

Ia-se já sabendo a verdade, mas na sessão de ontem o Sr. Rêgo Chaves, Alto Comissário da província, começa a apresentar parcelas de centenas de libras para aqui e para acolá, para isto e para aquilo, e mostra que a dívida se aproximava de 1 milhão, como dissera o Sr. Ministro das Colónias, quando afirmava que nada importava que fôsse 1 milhão.

Sr. Presidente: eu não deixo de prestar homenagem às altas qualidades do Sr. Rêgo Chaves, mas admira que na sua qualidade de Alto Comissário não tivesse dito ainda ao Sr. Ministro das Colónias a quanto subiam as dívidas, visto que êle afirma que não pode dizer qual o montante dêsses débitos.

O Sr. Rêgo Chames (interrompendo):— Se V. Exa. me permite eu digo-lhe que está equivocado.

A Câmara tem todos os elementos, quanto às dívidas de Angola, que eu ontem apresentei e que podem ser consultados.

O Orador: — Agradeço a explicação que V. Exa. acaba de dar, tanto mais, que, contra minha vontade, tive do sair ontem da Câmara e não ouvi todo o seu discurso, mas permita-me que lhe diga que as suas explicações, em nada destroem as considerações que vinha formulando .

Quando o Govêrno vem pedir nina autorização de 60:000 libras, para pagar
dívidas de Angola, dá a entender que o montante das dívidas é êsse, e faz a Câmara cair em êrro, pois que o montante das dívidas eleva-se a muito mais»

Mas, Sr. Presidente, já se vê a situação lastimável, permitam-me o termo, em que o Govêrno se encontra nesta questão, não trazendo à Câmara os elementos, os dados necessários, para se poder discutir convenientemente o assunto.

Sr. Presidente: para bem se poder ver a situação em que o Govêrno se encontra, basta dizer que desde Agosto até agora tem deixado passar meses e meses sem lhe dar solução.

Mas, para todos estarem mal colocados, vejam V. Exas. a situação em que se encontra e antigo Alto Comissário de Angola, o Sr. Norton de Matos, perante esta questão.

A situação desgraçada em que o Govêrno se encontra acha-se apontada, creio eu, na primeira conclusão da minha moção, em que se salienta a nossa desconfiança ao mesmo Govêrno.

Sr. Presidente: a segunda conclusão da minha moção, que manifesta claramente o nosso modo de ver acerca dêste assunto, vem a ser a necessidade absoluta que há de se fazer um inquérito a toda a administração da província de Angola durante o «reinado» do Sr. Norton de Matos.

Sr. Presidente: eu já tive ocasião de ler alguns documentos encontrados no Ministério das Colónias, fornecidos por funcionários dêsse Ministério, devidamente autorizados para isso pelo Sr. Ministro das Colónias, junto de quem instara para êsse fim êste lado da Câmara.

Disse eu ontem e repito hoje que, julgando-me na obrigação de revelar à Câmara o que encontrei no Ministério das Colónias, me julgo no dever que ontem cumpri e hoje cumprirei também de não fazer, por emquanto, quaisquer comentários ao que dêsse documento ressalta.

Sr. Presidente: há um inquérito aberto aos actos da Agência Geral de Angola. Mas a administração do Sr. Norton de Matos não só resumo exclusivamente aos actos praticados pela. Agência Geral do Angola, a administração do S. Exa. produziu efeitos naturalmente em maior escala na própria colónia, e é necessário, por isso, que o inquérito a fazer se estenda a essas administrações, isto é, quer

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aos actos praticados na metrópole, quer aos actos praticados na província.

Sr. Presidente: disse eu ontem a V. Exa. e à Câmara que na visita rápida que, com o meu ilustre colega Sr. Carvalho da Silva, fiz ao Ministério das Colónias, apenas tivera podido examinar alguns documentos e que hoje ali voltaríamos para examinar os restantes. De facto, ali fomos é um documento encontrámos, que me parece importante e que deve real-, mente levar a Câmara a decretar um inquérito aos actos da administração do Sr. Norton de Matos para que depois se possa pronunciar quem de direito sôbre as sanções a aplicar.

O Sr. Carvalho da Silva: — Ouçam, ouçam o documento!

O Sr. Velhinho Correia: - É alguma lista de adiantamentos?...

O Orador: — Sr. Presidente: o documento de que eu vou dar conhecimento à Câmara — e a resposta neste ponto é mais directa para o Sr. Velhinho Correia que me fez uma pregunta — é para uns adiantamentos de 1:050 libras ao Sr. Norton de Matos, no decurso dum mês.

Repito a V. Exa., Sr. Presidente, o que disse ontem; colocado entre o dever que entendo se me impõe, desde que tenho conhecimento oficial de qualquer incorrecção colhida por intermédio das repartições públicas, de o revelar ao país, e colocado, por outro lado, na situação de não desejar influir com as minhas palavras, por qualquer forma, sôbre quem quer que haja de inquirir a propósito dos actos da administração do Sr. Norton de Matos, limito-me, Sr., Presidente, a dar conta do documento a que aludi e abstenho-me de fazer-lhe os meus comentários.

Hoje encontrámos, ainda, na mesma repartição do Ministério das Colónias, um outro ofício.

O Sr. Rêgo Chaves: — 4V. Exa., que leu o processo, pode dizer-me a que se destinavam essas quantias?

O Orador: — Não consta do processo e creio mesmo que é isso que a comissão deseja saber...

O Sr. Velhinho Correia: — Todos os funcionários que partem para o estrangeiro recebem os seus adiantamentos em ouro.

O Sr. Carvalho da Silva: — Então de Abril até agora não houve tempo de fechar essas contas?

O Sr. Velhinho Correia: — Se V. Exa. fôr ao Ministério dos Estrangeiros encontra isso em milhares de processos e absolutamente dentro da lei.

O Sr. Carvalho da Silva: — Da lei republicana.

O Orador: — As interrupções dos ilustres Deputados que me cercam não fazem com que eu me afaste do caminho que a mim próprio tracei nesta questão. Já ontem o disse, mas julgo necessário repeti-lo hoje: os documentos que trago à Câmara apresento-os sem quaisquer espécies de comentários. Simples, leitura e nada mais; assim tenho feito e,assim continuarei fazendo, tanto mais que, havendo uma comissão de inquérito a parte dos actos de administração do Sr. Norton de Matos e da Agência do Angola em Lisboa, natural é aguardar os resultados dêsse inquérito.

Há, ainda, um outro documento de que tenho cópia e que diz respeito a uma conta de 16.726$00 que a mesma comissão liquidatária entendeu que devia ser paga pela empresa de publicidade Angola Limitada visto ela a ter recebido a mais pela assinatura duma revista.

Sr. Presidente: os factos revelados no decorrer desta discussão juntos àqueles que foram revelados na interpelação do Sr. Cunha Leal são, creio eu, de molde a justificar inteiramente a segunda conclusão da moção que tive a honra de enviar para a Mesa, no sentido de que deve ser feito um inquérito geral a todos os actos de administração do Sr. Norton de Matos e não um inquérito restrito aos actos da Agência de Angola em Lisboa.

A outra conclusão da minha moção é a de que convém que se definam cabalmente as relações financeiras entre as colónias e a mãe-pátria.

Não me parece curial que tenhamos de ouvir sem protesto declarações como as que das bancadas ministeriais o Sr. Bulhão Pato proferiu anteontem.

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A questão é difícil de tratar em público, numa assemblea, embora tam ilustre como esta, porque, naturalmente, há melindres que um Deputado da Nação deve acautelar e, por conseqüência, lhe devem aconselhar a que pese bem as palavras que profere. Mas não me parece curial — repito — que só aceite como boa a doutrina que parece depreender-se das palavras do Sr. Ministro das Colónias do que as colónias têm inteira liberdade para gastar e que à mãe-pátria fica a absoluta responsabilidade de pagar as despesas que as colónias tenham feito. Esta distinção de patrimónios — se assim me posso exprimir — entre as colónias e a mãe-pátria, existe também, como já disse ontem, até entre vários estados que fazem parte da mesma união, como nos Estados Unidos da América do Norte, ou da mesma federação, como da República Federal Brasileira, e existe até, na prática e creio que na doutrina, nas relações entre a Inglaterra e as suas colónias, tanto que durante muitos anos, ao tempo em que, por exemplo, a Inglaterra, a mãe-pátria, lançava empréstimos a um juro de 2 e meio ou 3 por cento, as suas colónias não conseguiam obter dinheiro senão a uma taxa de juro mais elevada.

Só Exa. compreende - quanto êste facto é significativo, porque êle representa a maior ou menor confiança dos credores na solvabilidade de devedor, e, por conseqüência, envolve, naturalmente, a existência de patrimónios distintos.

Já ontem tive ocasião de referir à Câmara que a política colonial não deve revestir em todos os países a mesma forma e que, realmente, a política de uma nação poderosa, como é a Inglaterra, pode ser e tem de ser uma política diferente daquela política, mais cautelosa, mais prudente, porventura mais ciosa da sua soberania, a exercer por Portugal em relação às suas colónias. Tudo isto veto a propósito da proposta em discussão, que visa a que a mãe-pátria faça o pagamento de 60:000 libras, gastas pela sua colónia do Angola.

Nós, dêste lado da Câmara? não sustentemos que Portugal, a mãe-pátria, não deva, de facto, honrar os compromissos assumidos pela sua colónia, mas entendemos que uma deliberação dessa natureza, que porventura pode importar desde já a responsabilidade da mãe-pátria em relação a todos os outros créditos em suspenso, carece de ser meditada, de ser ponderada, de ser pesada nos seus prós e nos seus contras, e, por conseqüência, se não estivesse habituado ao trabalho pouco cuidadoso — devo dizê-lo, infelizmente — das comissões desta casa de Parlamento, eu proporia que o projecto ministerial baixasse à comissão de colónias para ela se pronunciar, para analisar todas as circunstâncias e para nos dizer, também, de que maneira é que a Metrópole conta pagar as dívidas de Angola.

Não basta fazer esta cómoda afirmação que já vi constar de algumas moções enviadas para a Mesa. Pague-se!

Mas — pregunto eu — pague-se com quê? Onde estão os créditos? Onde estão as libras precisas para satisfazer a dívida de Angola?

Era necessário que o Sr. Ministro das Finanças se dignasse informar a Câmara sôbre os meios financeiros com que S. Exa. conta para fazer face a êste encargo.

Eu bem sei que o ilustre Deputado, Sr. Rogo Chaves, na exposição que ontem fez à Câmara sôbre a situação de Angola — situação que não é tam brilhante que não leve S. Exa. a muito desejar ver-se livro da espiga que lhe caiu em casa — declarou que quanto à dívida de ordem externa, tem ainda esperanças de que umas negociações que se haviam perturbado um pouco venham ainda a encaminhar-se pôr forma a poder levantar um empréstimo para o seu pagamento.

Mas, Sr. Presidente, isto é tudo ainda muito incerto, muito problemático.

O Sr. Rêgo Chaves: — Era óptimo que fôsse certo. Estava o problema resolvido.

O Orador: — Resolvido quanto a uma parte, quanto ao milhão da dívida que V. Exa. ontem classificou de externa. Quanto aos outros dois milhões, o Sr. Rêgo Chaves, de uma forma muita cómoda para não explicar cousa nenhuma, mas que não satisfaz ninguém, declarou:

Isso há-de ser objecto de uma proposta especial que o Govêrno por certo há-de trazer à Câmara.

O Sr. Rêgo Chaves: — Roma e Pavia não se fizeram num dia.

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O Orador: — Por conseqüência, até agora temos apenas boas palavras e a certeza das boas intenções do actual Alto Comissário para resolver a questão, se se conservar no cargo; mas, também, S. Exa. já ontem foi dizendo que nele só não conservará se não obtiver o empréstimo para o pagamento da dívida externa.

Fico, portanto, a minha pregunta:

- Pague-se! Mas pague-se com quê?

Era tudo isto que eu desejava que tivesse sido maduramente pensado pelo Govêrno.

Era tudo isto que o Govêrno, num relatório circunstanciado, deveria ter trazido à Câmara.

Era para tudo isto que o Govêrno imediatamente deveria ter proposto as necessárias soluções, soluções que nós discutiríamos.

Mas nada disto se fez.

Há 60:000 libras a pagar, mas não se sabe por onde, a não ser por conta do déficit orçamental.

Sr. Presidente: não quero alongar mais as minhas considerações, pois não quero abusar mais da paciência da Câmara.

A morai que resulta de tudo quanto apresentei é que a República é incompatível com o bem e a prosperidade dêste país (não apoiados) e que o desejo ardente de quási todos os nossos colegas é que a República progrida, mas infelizmente para o nosso país assim não é.

Sr. Presidente: eu sou daqueles que têm assistido, como espectador, meramente, e em silêncio às últimas oscilações cambiais, que muito desejaria que viessem melhorar e tornar definitivo o barateamento da vida; mas nada disso vejo e muito receio as suas conseqüências funestas e graves, não só de ordem económica e financeira, como até de ordem pública em vista do sport a que se dedicam os Governos da República, brincando aos câmbios.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Leu-se e foi admitida a moção do Sr. Morais Carvalho.

É a seguinte:

Considerando que o Govêrno, na sua declaração-relatório lida à Câmara pelo seu chefe em 4 do corrente ocultou a anormal e alarmante situação financeira da província de Angola;

Considerando que os factos vindos a público no decorrer desta discussão confirmam a urgente necessidade de se proceder a um inquérito rigoroso à administração colonial e nomeadamente à da província de Angola durante o tempo em que ali foi Alto Comissário o Sr. Norton de Matos, que ainda continua a ser, contra todas as conveniências, Embaixador da República em Londres;

Considerando que os factos de extrema gravidade já anunciados não poderiam ter sido praticados sem o assentimento, ao menos tácito, dos Ministros que geriram a pasta das colónias, por isso que, por lei, lhes cabe uma função de superintendência e fiscalização;

Considerando que entre todos aqueles Ministros se destaca grandemente, pa.ra efeito das responsabilidades, o Sr. Rodrigues Gaspar, actual Presidente do Ministério, que foi Ministro da referida pasta durante quási todo o período da administração do Sr. Norton de Matos;

Considerando que a autonomia dada às colónias não pode ser interpretada no sentido de ser reconhecida a êstes plena liberdade para gastar e à Metrópole inteira responsabilidade para pagar os gastos respectivos;

Considerando que devem tornar-se cada vez mais estreitas as relações entre as colónias e a mãe-pátria, e que, para tanto, convém que sejam de inteira clareza e destrinçada responsabilidade as contas existentes entre aquelas e esta.

A Câmara resolve:

1.° Significar ao Govêrno a sua desconfiança.

2.° Lembrar a conveniência inadiável de um inquérito à administração colonial, que se iniciará pela da província de Angola durante o tempo em que ali esteve como Alto Comissário o Sr. Norton de Matos.

3.º Proclamar a necessidade de se assentar claramente em que a metrópole não será responsável pelas dívidas contraídas pelas colónias sem a sua garantia, ou pelo menos sem o seu assentimento.— Moraes Carvalho.

O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato): — Sr. Presidente: pedi a palavra

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para umas breves explicações que devo dar ao Sr. Morais Carvalho. S. Exa. disse que esta proposta tinha sido apresentada sem os documentos a que o Sr. Ministro das Finanças se referiu.

Os documentos são três e não estão juntos à proposta, mas o Sr. Ministro das Finanças já declarou que estavam à disposição da Câmara.

S. Exa. disse também que seria melhor apresentar-se ama proposta mais larga.

Não se trata de pagar a dívida de Angola, mas apenas 15 por cento do montante de várias letras em que Portugal é avalista.

Nem se trata de dar êsse dinheiro, mas apenas de o adiantar.

Angola tem a sua autonomia financeira e o Alto Comissário tem as mesmas funções que o Ministro aqui, e o Ministro só pode intervir se êle ultrapassar as leis que lhe foram conferidas pelo Parlamento.

S. Exa. insistiu na minha falta em dizer ao certo qual era a divida de Angola.

Realmente, no Ministério das Colónias não existe essa informação e só ontem tive ocasião de ouvir a tal respeito o Sr. Rêgo Chaves.

Logo que os documentos cheguem, eu transmiti-los hei à Câmara.

Depois do que o Sr. Rêgo Chaves disse mais nada tenho a dizer.

O Sr. Norton de Matos se justificará plenamente acêrca do dinheiro que levantou.

Eu estou a juntar as peças para formar o processo e acho absurdo estar neste momento a fazer acusações contra o Sr. Norton de Matos e até contra a República dizendo-se que há escândalos, quando não os há.

Há apenas uma crise bancária, crise financeira que se há-de resolver, pois a província tem recursos para isso.

Não há nenhum escândalo, mas simplesmente uma operação clara.

Sr. Presidente: é sempre com tristeza, é — permita-me V. Exa. dizê-lo — com revolta que ouço fazer acusações a República.

Não sei se no lugar em que estou tenho o direito de atacar, mas tenho com certeza o direito de defender a Republica, porque sou seu Ministro, e na defesa vai às vezes o ataque.

Srs. monárquicos: perante a República e quando se trata do colónias, de joelhos!

Não se sorriam V. Exas.!

De joelhos!

Onde está a Zambeze?

Quem a deu aos ingleses?

Foram os senhores!

<_0nde p='p' vergonhosamente='vergonhosamente' por='por' depois='depois' alemães='alemães' estava='estava' e='e' dos='dos' conquistada='conquistada' quionga='quionga' nós='nós'>

Onde está o Sul de Angola, desde o paralelo de Cabo Frio, que já estava marcado até o Cunene — mais do que Portugal inteiro — entregue à Alemanha?

Quem o entregou?

A monarquia!

Onde está a margem direita do Zaire, entregue ao Estado Livre do Congo?

Onde estaria Lourenço Marques, se a nação se não tivesse levantado em pêso contra o escândalo da sua entrega ao estrangeiro?

Quem queria fazer a sua entrega?

A monarquia!

Esta é a obra da monarquia.

Qual é a obra da República?

A República, vendo em perigo a integridade da Pátria, pegou em armas, deu o sangue dos seus filhos, esgotou os seus cofres, por isso está hoje pobre.

A República não deixou perder nem um só palmo de território nacional e ainda conseguiu reaver Quionga.

Curvem a cabeça, Srs. monárquicos, e rezem, se bem que as suas orações não bastem, talvez, para os fazer perdoar pela Nação!

Apoiados.

Perdoem-me V. Exas. esta exaltação de um velho que é tam português como V. Exas. e que não quere menos do que V. Exas. às nossas colónias.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Pina de Morais: — Sr. Presidente: é talvez de estranhar que eu vá interessar-me por um problema colonial, que eu tenha podido a palavra neste debate, depois de nele terem intervindo, com muito brilho, com um conhecimento que eu não possuo sôbre êstes assuntos, os ilustres coloniais que fazem parte desta Câmara,

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Pesar-me-ia, porém, na consciência, se acaso não informasse a Câmara o o País de factos que muito me incomodaram e que dizem respeito às nossas colónias o se não expusesse, com o desassombro que eu uso sempre, com a clareza que eu entendo necessária aos actos públicos, o meu modo de ver sôbre êste assunto.

Concretizando, numa moção que vou ler, o meu ponto de vista, procurarei depois explicar ràpidamente o que me levou a escreve Ia.

Moção

Considerando que o problema colonial é hoje o problema de maior interêsse para a vida da República;

Considerando que numa verdadeira democracia as liberdades são igualadas pelas responsabilidades;

Considerando que casos como o que está na ordem do dia só desprestigiam as instituições;

Considerando que casos assim denunciam uma organização deficiente e inadequada do Ministério das Colónias e do sistema de administração financeira das colónias:

A Câmara manifesta o desejo duma organização nova do Ministério das Colónias e, dada a importância extrema do problema de Angola, mantêm-se atenta até a sua completa resolução. — João Pina de Morais.

Sr. Presidente: as razões que me impressionaram sôbre o nosso problema colonial são razões de ordem externa. Na leitura a que procedo habitualmente das revistas que me chegam de fora, encontro às vezes referências ao nosso País, umas muito agradáveis, outras desagradabilíssimas.

As nossas colónias têm estado, ultimamente, numa actividade constante de variadíssimas publicações e de variadíssima diplomada. Entre essas publicações, citarei uma italiana, a Revista Marítima, na qual não é um quidam ignorado, mas um colonial muito conceituado em Itália, o Dr. Parul, que, referindo-se a Angola, diz que o solo não está cultivado, que o sub-solo não é explorado, e que não compreende que o domínio de posse hoje se mantenha numa colónia exclusivamente por a havermos descoberto.

Outro aspecto grave do nosso problema colonial resulta, em minha opinião, da política, que a Alemanha tem desenvolvido depois da guerra, e a Câmara sabe como a diplomacia dêsse país tem conseguido vencer sucessivamente depois da grande derrota das suas armas.

Temos todos assistido ao triunfo seguro, certo, metódico, tam cronométrico como era o avanço dos seus exércitos, dos pontos de vista da diplomacia alemã. Um grande agente que a Alemanha possui, o plenipotenciário Kenber, servindo-se até de jornais dos países aliados, tem feito a propaganda de que todas as nossas colónias devem entrar para o mandato da Sociedade das Nações. Esta doutrina é apregoada de uma maneira convincente, fazendo-a deduzir da nossa falta de navegação, de portos, etc.

De modo que, realmente, as nossas colónias, que foram sempre — e não vai muito longe o ultimatum — um motivo de cobiça europeia e que sempre temos mantido com um patriotismo que é digno de todas as gerações passadas, estão de novo sendo cobiçadas.

A Itália chega a êste ponto: nomeou uma comissão encarregada do estudar onde deve colocar o débordement da sua população.

Há uma entidade que tudo conhece e tem feito uma propaganda admirável por meio de publicações maravilhosas.

Todos temos responsabilidade neste desleixo, mas há pessoas cuja responsabilidade é maior de todas.

Outro ponto há a considerar, é que a Alemanha age sempre em conjunto, e sabe sempre aquilo que faz e não há meio de as suas cousas falharem. Vê-se também, como o próprio Alto Comissário disse, que não há de facto soberania.

O Sr. Rêgo Chaves: —Dentro das fronteiras há toda a soberania.

O Orador: — Muito bem.

A influência do alemão dá-se por uma maneira hábil, chegando a pontos que parecem inverosímeis, como êste dê resolver o problema das transferências.

Nós ainda não resolvemos êsse problema e êles já o conseguiram.

Todos êstes factos que apresento mostram como lá se administra. Não com-

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preendo a psicologia do Alto Comissário que lá esteve, Sr. Norton d© Matos, pois teve energia para levar um exército à guerra e não teve a mesma energia para varrer da Rotunda os calcinhas.

Eu estou convencido que o Sr. Norton de Matos foi bem intencionado e que a sua obra devia ser boa, mas que não foi aproveitada com rigor.

A um outro ponto desejo também referir-me: é à supressão da Escola Primária Superior do planalto da Huila.

Não compreendo como isso se faça, pois, além de difundir a instrução, era também um meio de propaganda. Os meios de propaganda das colónias na Metrópole são: canalizar para lá a emigração, impor a sua cultura e a franca propaganda de todas as grandes fontes de riqueza a que todos podem aspirar.

Seria também bom elevar a nossa cultura.

Apartes.

Nas minhas considerações não vai crítica ao Govêrno, e devo dizer que, militando há pouco na vida-política, vejo que todos êstes grandes problemas se apresentam mas que ninguém os resolve.

A minha crítica não vai pois contra os Governos para os fazer cair, mas contra os factos, como os que apresentei.

Sr. Presidente: vou ràpidamente frisar a minha opinião sôbre a questão que se debato.

Entendo que se devo pagar, venha de onde vier o dinheiro, pois quem deve paga, e depois aplicar as sanções necessárias.

Deve-se pagar o mais depressa possível e para isso eu mesmo, se possível fôsse, diminuiria as minhas palavras para tomar menos tempo à Câmara e o assunto se resolver com mais brevidade.

Tenho dito.

Foi lida e admitida a moção apresentada pelo orador.

O Sr. Lopes Cardoso (sobre a ordem): — Sr. Presidente: falando sôbre a ordem, mando para a Mesa a minha.

A Câmara dos Deputados:

Considerando que é indispensável, para honra e dignidade da Nação, satisfazer compromissos tomados em nome da Província de Angola, pelo Alto Comissário da República nessa colónia, em termos que envolvem a responsabilidade da metrópole;

Mas reconhecendo que o Govêrno não tomou providências para evitar o descrédito que resulta da demora na satisfação dos seus compromissos, nem apresentou ao Parlamento os elementos necessários ao conhecimento e estudo da questão;

Verificando que tanto na utilizarão do crédito do três milhões de libras, como na administração da Colónia de Angola, se passaram factos que demonstram, da parte das autoridades que em uma o outra superintendiam, completo desrespeito pelas disposições legais e pelo cuidado e economia essenciais na aplicação dos dinheiros públicos o constatando ainda que não tem sido exercida sôbre a administração da Colónia de Angola a fiscalização, principalmente a fiscalização financeira, que as leis confiam e impõem ao Govêrno Central;

Afirma a necessidade:

1.° De se suspender imediatamente a concessão de novos créditos pela garantia dos três milhões de libras;

2,° De só exigir do Govêrno que preste ao Parlamento, contas de utilização dêsse crédito, como lhe impõe o artigo 3.° da lei n.° 1:272, dê 1922; 3.° De ser dado integral cumprimento às disposições das leis orgânicas da administração colonial, que determinam e regulam a fiscalização da administração financeira das colónias;

4.° Do se reduzirem imediatamente todas as despesas não necessárias na colónia de Angola, restringindo-se-lhe, nos termos da base 92.ª das leis orgânicas da administração colonial, as faculdades cujo abuso deu lugar à presente situação;

5.° E finalmente de se proceder a uma rigorosa investigação sôbre os actos acima referidos, com o imediato afastamento das funções públicas do todos os que nos erros praticados têm directa responsabilidade, o passa à ordem do dia.

14 de Novembro de 1924.— Lopes Cardoso.

Sr. Presidente: serei breve para não fatigar a Câmara e mesmo porque os oradores que já falaram esgotaram o assunto, excepção feita aos membros do Go-

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vêrno, quer o Sr. Ministro das Colónias, quer o Sr. Ministro das Finanças, apresentante da proposta, que até agora nada disseram que esclarecesse a Câmara.

Eu quero mostrar que numa questão tam grave, que interessa ao crédito do país, do que disse o Sr. Ministro das Finanças, ao apresentar a sua proposta, só algumas palavras se aproveitam.

Sr. Presidente: quando S. Exa. me procurou particularmente, dando-me a honra de me preguntar o que pensava pobre a proposta que tencionava apresentar, eu tive ocasião de lhe fazer sentir o modo de pensar dos meus correligionários, dizendo-lhe que estavam resolvidos a não pôr dificuldades à satisfação dos nossos débitos, para garantia do nosso crédito aliás muito abalado, como disse o próprio Sr. Ministro das Finanças.

Realmente dias depois S. Exa. apresentou a proposta em discussão, e eu, usando da palavra sobre o modo de votar, fiz a mesma afirmação que tinha feito na conversa particular de não criarmos dificuldades, e assim tem sido.

Sr. Presidente: tanto o Sr. Ministro das Colónias como o Sr. Ministro das Finanças não fizeram acompanhar a proposta de esclarecimentos sôbre as dívidas a pagar e sobre as letras protestadas.

Nem um nem outro se referiram a irregularidades graves que tenham sido praticadas, porventura, e êste receio de não confessar toda a verdade envolvo uma cumplicidade manifesta.

Sr. Presidente: não foi só dêste lado da Câmara que se usou da palavra, pela boca do ilustre parlamentar e grande estadista, que o é, o Sr. Ferreira da Rocha, que tratou a questão com uma elevação e uma minúcia tam rigorosa que bastava a qualquer dos membros do Governo saber a décima milionésima parte do que êle disse, para ter proferido algumas palavras que não deixassem o Poder Executivo na situação lamentável em que se encontra, por virtude da moção do Sr. Carlos de Vasconcelos.

Depois de S. Exa. usou-se da palavra por parte dos dois grupos parlamentares que apoiam o Govêrno.

Em seguida, falou um ilustre parlamentar da minoria católica, e de tudo o que êles disseram, se apurou, porque abordaram êste ponto, que esta questão foi trazida até à Câmara sem o mais leve [...].

[...] da Câmara [...] do crédito.

De resto, antes de chegarmos a esta conclusão, já o Sr. Ministro das [...] tinha afirmado [...] que êsse descrédito existe e continua.

Sr. Presidente: deve dizer a V. Exa. que, por parte dêste lado da Câmara, êsse descrédito [...] estudado e apreciado a questão em todos os seus detalhes, o que não aconteceu por parte do Govêrno, que revelou um absoluto desconhecimento e um comodismo que só se justificam, pelo desejo que êle tem de continuar nas cadeiras do Poder.

O Sr. Ministro [...]?

Eu creio que V. Exa. [...].

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

V. Exa. sabe que o facto [...] não ter satisfeito [...] bastante para se estabelecer qualquer descrédito.

Isto tem acontecido várias vezes [...] colónias inglesas.

Peço também a V. Exa. que não se esqueça de que êsse Govêrno tem quatro meses de [...] e não revelou nunca qualquer apêgo às cadeiras do Poder.

Está apenas [...]

[parágrafo ilegível]

[...] comigo, em procurar, para interpretação

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[parágrafo ilegível]

O Sr. Ministro das Finanças [...]: - Falei duas vezes sôbre o [...] Câmara os esclarecimentos [...].

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

Primeiro paga-se, e depois é que poderá discutir.

O Orador: - Quando ouvi apregoar as [...] vantagens que o país [...] de crédito dos 3 [...] que êsse crédito [...] , e que, portanto, se ía [...].

[...] e demora do Estado, [...], quando no Govêrno de [...], a que eu pertenci, aqui veio pedir [...] do crédito para fornecimento [...]. Então vi eu fazer dêsse assunto, [...] administrativo, uma [...] lançando-se até sôbre [...] as maiores suspeitas.

[parágrafo ilegível]

[parágrafo ilegível]

[...] que alguma cousa se fizesse sôbre [...] uma rigorosa, não digo [...] devassa, se fizesse sôbre os [...] financeiros de Angola, querendo [...] de uma vez para sempre - [...] a discussão sôbre essa perdulária forma de administrar.

Não me dirijo a ninguém, mas deve estar ainda na memória de todos quais forem os ilustres signatários da moção com que se quis acabar de uma vez para sempre com todos os meios que levassem a fazer-se faz sobre uma administração que podia ter tido, em alguns momentos, elevação, mas que enferma de erros absolutamente condenáveis.

Apoiados.

Mas ninguém quis saber da forma como o Sr. Alto Comissário de Angola dispunha do crédito de que abusava. A doutrina, pelo visto, que se estabeleceu no Ministério das Colónias sobre a intangibilidade - que eu supunha que só existia no Ministério da Justiça - levou-os a não quererem saber da forma como esses dinheiros eram aplicados.

Apoiados.

Mas, estando nas cadeiras do Poder o actual Govêrno, surge a exigência das letras vencidas, faz-se o protesto em princípios de Agosto, e o Sr. Ministro das Colónias, com os olhos fitos na intangibilidade do ex-Alto Comissário de Angola, convencido de que tinha uma ligeira fiscalização sobre os seus actos, entendeu que nada tinha com as letras e que por si nada podia resolver.

Supôs S. Exa. que levando o caso a Conselho do Ministros o caso se resolvia - S. Exa. o disse. Efectivamente dias depois o caso foi levado a Conselho de Ministros, e este, tal como o Sr. Ministro das Colónias, manto vê-se inteiramente alheio ao ajunto, e não consta, nem das palavras do Sr. Ministro das Colónias, nem de qualquer dos seus colegas, que nessa ocasião alguém pedisse os relatórios, que devem existir no Ministério, do Auditor de Fazenda das Colónias, para saber como esta magna carrapata só formou.

Apoiados.

O Sr. Ministro das Colónias disse que em Agosto estava o Govêrno inteirado do caso; não o resolveu porque julgava que o Govêrno não tinha competência para

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24 Diário da Câmara dos Deputados

isso. Ora, sendo assim, porque não convocou imediatamente o Parlamento?

Apoiados.

Dizem-me do lado que o Parlamento estava aberto. Nestas condições, porque não trouxe imediatamente o caso ao Parlamento, que ainda está acima de todos os Ministérios das Colónias e Altos Comissários, para o resolver sem perda de tempo?

Apoiados.

Porque queria continuar êste pagode. Queria continuar o Govêrno, exercendo apenas uma acção política de campanário, servindo alguns grupos em detrimento das forcas conservadoras.

É que também se não fazia, como se fez, a vontade aos elementos do bloco.

Na imprensa, em entrevistas, dizia-se ao Govêrno que abrisse o Parlamento, mas o Sr. Rodrigues Gaspar não queria, não porque lhe pudessem preguntar por actos de administração, mas porque lhe podiam dar uma ordem de despejo.

O Govêrno tinha o convite dos comerciantes para vir ao Parlamento; e tinha problemas que só o Parlamento podia resolver.

Porque não vinha?

Só tardiamente aqui veio, não por uma questão de administração, não para resolver os problemas que a República reclama, mas unicamente para Dão discordar dos seus correlegionários, dos que impunham a sua vinda aqui.

Assim é que foi convocado o Parlamento para 4 de Novembro de 1924.

Entrou o Govêrno no Parlamento, dizendo numa extensa declaração ministerial o seu programa.

Ninguém o apoia. Ninguém lhe dá uma palavra de ligeira aprovação que lhe indique que pode continuar à frente nos negócios públicos.

Desde êsse momento o Govêrno sabe que não pode contar com a confiança na Câmara. Da minha parte não a tem desde se constituiu.

Sr. Presidente: o Govêrno veio unicamente com o pretexto da aprovação dos orçamentos; mas verdadeiramente o seu único fim é de que a Câmara lhe aprove mais duodécimos para continuar neste verdadeiro pagode, em que tem vivido até hoje.

O que na verdade é para admirar, Sr. Presidente, é que até hoje, sôbre o triste

caso da proposta que o Sr. Ministro das Finanças quere remediar, o Govêrno não tivesse dito uma palavra sôbre o assunto do não pagamento dessas letras, talvez por entender que se tratava de uma questão de pequena monta, não sendo monos para admirar o facto de, tendo-se levantado a questão política nesta Câmara, nenhum dos leaders dos grupos que apoiam o Govêrno ter dito uma palavra sôbre o assunto, assistindo nós pelo contrário quási todos os dias a estas scenas que se estão dando no Parlamento, de os próprios representantes dêsses grupos que apoiam o Govêrno virem para o Parlamento atacar e até enxovalhar os Ministros, dirigindo-lhes palavras que não só os ofendem, como põem sem dúvida em cheque a sua situação de portugueses.

Não vejo esclarecer os pontos das acusações que foram feitas e não vejo alguém, por parte dêsse partido, dar qualquer esclrocimento sôbre o debate.

Isto mostra que o Govêrno não sabe como deve tratar dos interêsses nacionais e não recebe demonstrações de confiança na Câmara.

Todos os dias recebe demonstrações de não haver harmonia no bloco que o sustenta.

O Govêrno não se formou, de resto, para tratar dos problemas da vida nacional, mas para sustentar a vida dêsse bloco.

Então a República não pode viver sem êsse bloco?

Então a República não pode viver sem um Govêrno desta ordem?

Àpartes.

Sr. Presidente: é preciso ver que confiança inspira o Govêrno nesta questão de. Angola, e porque se sustenta o Govêrno no poder.

Eu pregunto, como já preguntei, se o Govêrno se fez para sustentar o bloco.

Eu pregunto se há conveniência em manter êsse bloco, que circunstâncias de momento formaram.

Sr. Presidente: afinal que utilidade resultou do bloco?

Àpartes.

O bloco constituiu um Govêrno que não manteve os nossos créditos, porque reduziu os juros do empréstimo que esta Câmara tinha aprovado meses antes.

Quem foi que depois praticou um acto ainda mais grave, que foi dividir os toma-

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dores' dos títulos em duas castas, uma dos nacionais que podiam ser esmagados, e outra dos estrangeiros, em quem se não podia bulir?

Sr. Presidente: nós, na nossa moção, significámos aquilo que achamos essencial fazer-se neste momento, usando de palavras e termos que só a muita benevolência evita de as substituirmos por outros mais sangrentos.

Nós exigimos que se suspenda imediatamente a utilização de um crédito que só serve para fazer o nosso descrédito ainda maior, e que se efectue um rigoroso inquérito, para não dizer uma completa devassa, àquilo que a administração da província de Angola constituiu de ruinoso para o País.

Igualmente, Sr. Presidente, exigimos a imediata suspensão dos funcionários que motivaram tal situação, tenham êles a categoria que tiverem, e alguns têm uma situação que chega a atingir o próprio sol, porque, acima de tudo, temos de olhar constantemente para o bem da Pátria e da República.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se a moção do Sr. Lopes Cardoso.

Lê-se e é admitida.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Delfim Costa: — Sr. Presidente: pedi a palavra para solicitar do Sr. Ministro das Colónias informações precisas sôbre graves acontecimentos que se passam neste momento nos territórios de Manica e Sofala, soberanamente administrados pela Companhia de Moçambique.

Esta, dispondo, usando e abusando, da soberania que lhe dá a carta de lei por que se rege, tem espezinhado um grande número de colonos, porventura os melhores que existem na África Oriental. Uma série de leis suas tem merecido as censuras de toda a gente, mas ela chega a ponto de mandar dissolver as reuniões onde as suas leis se criticam, por indígenas e soldados.

Se não fôsse a prudência dós portugueses que na Beira trabalham, teríamos talvez já que registar factos duma gravidade extrema, porque o soldado indígena ao serviço da Companhia de Moçambique e porventura cumprindo ordens emanadas d© europeus, podia ter usado da fôrça para inutilizar a acção de cidadãos portugueses ao abrigo de todas as leis da República que lhes dão o direito de reunião.

Não pode continuar êste estado de cousas!

Há muito tempo que uma população enorme vem protestando contra a atitude da Companhia, pedindo que os seus territórios passem para o Estado, porque ela, como de resto todas as outras companhias majestáticas de África, não tem cumprido as disposições da carta de lei de 1891.

Portanto, desejava saber do Sr. Ministro das Colónias quais as providências que tem tomado sôbre êste assunto, para responder às reclamações que me têm chegado de Moçambique constantemente.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato): — Sr. Presidente: em resposta ao ilustre Deputado quê acaba de falar, devo dizer o seguinte: recebi não há muito tempo — talvez há um mês — uma comunicação da Companhia de Moçambique, dizendo que nos territórios do Manica e Sofala uma parte da população, principalmente agrária, protestava contra as suas determinações.

Não liguei muita importância a êste facto, embora êle tenha alguma importância, porque há lá justiça para resolver o caso. Entretanto, mandei logo, como era meu dever, preguntar ao Sr. governador de Moçambique o que havia a tal respeito.

Não recebi ainda resposta, mas esteja o ilustre Deputado seguro que procederei dentro dos rigores da lei, se houve alguém que saísse dela.

A Companhia de Moçambique, como V. Exas. sabem, tem a sua carta de lei por que se rege; não está sujeita ao governador da colónia senão para efeitos de soberania, mas tem que respeitar a lei.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é na segunda-feira, à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:

A de hoje, mas após o negócio urgente do Sr. Ferreira da Rocha.

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Negócio urgente do Sr. Moura Pinto sôbre a publicação do decreto n.° 10:223, que cria novos tribunais de contencioso para as contribuições e impostos.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Proposta de lei

Dos Srs. Ministros das Finanças e Comércio, abrindo um crédito especial de
490.000$, a inscrever no orçamento no capítulo 6.° e artigo 29.°-F.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de finanças.

Para o «Diário do Govêrno».

Parecer

Da comissão de administração pública, sôbre o n.° 614-D, que dá a denominação de a chefe dos serviços administrativos da colónia agrícola correccional de Vila Fernando», ao actual ecónomo, fixando-lhe os vencimentos.

Para a comissão de finanças.

O REDACTOR—Herculano Nunes.

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