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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 14
EM 13 DE JANEIRO DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Aberta a sessão com a presença de 43 Srs. Deputados, lê-se a acta e dá se conta do expediente.
Antes da ordem do dia.— O Sr. Sousa da Câmara deseja sabes se o Sr. Ministro da Agricultura já se deu por habilitado sobre uma interpelação que há tempo anunciou.
O Sr. Presidente declara não ter comunicação alguma.
O Sr. Sousa da Câmara lembra a conveniência de se avisar o Sr. Ministro da Agricultura para que a interpelação, que versa sobre o preço do trigo, não perca a oportunidade.
O Sr. Tavares de Carvalho renova o seu requerimento para que entre imediatamente em discussão o parecer n.° 196 (projecto de lei sobre o Montepio dos Sargentos), marcado para ordem do dia.
É pôsto à votação o requerimento e aprovado.
O Sr. Alberto Jordão requere a contraprova, que confirma a aprovação.
Lê-se o parecer e entra em discussão.
Usa da palavra o Sr. Nuno Simões, que requere que se consulte a Câmara sôbre se consente que a discussão se suspenda até estar presente o Sr. Ministro da Guerra.
O Sr. Tavares de Carvalho concorda com este requerimento, que é em seguida aprovado.
O Sr. Tavares de Carvalho requere que, com a presença do Sr. Ministro da Guerrat seja também discutido o parecer n.º 24 na próxima sessão, antes da ordem do dia, e imediatamente ao parecer n ° 190
Aprovado.
Confirma-se a aprovação em contraprova requerida pelo Sr. Dinis de Carvalho.
O Sr. Nuno Simões requere que entre imediatamente em discussão um projecto de lei vindo do Senado, e pelo qual se concede o bronze para o busto de António Granjo, a erigir em Chaves.
Aprovado.
Lê-se o projecto, que é aprovado sem discussão.
É aprovada a dispensa da leitora da última redacção.
Ordem do dia. — É aprovada a acta.
Entra em discussão o parecer n.º 843 (sôbre o projecto de lei n.° 830-E, referente a substituições na tabela do imposto do sêlo).
Tem a palavra o Sr. Velhinho Correia, que, ao terminar o seu discurso, manda para a Mesa um projecto de lei, requerendo para ele urgência e dispensa do Regimento, afim de que se discuta juntamente com o parecer.
Aprovado.
Os Srs. Joaquim Ribeiro, Alfredo de Sousa, que manda para a Mesa uma proposta, Lourenço Correia Gomes, Portugal Durão, Velhinho Correia, Carvalho da Silva e Ferreira da Rocha usam da palavra sobre a ordem ou para explicações, bem como o Sr. Ferreira da Rocha, que fica com ela reservada.
Trocam-se explicações entre os Srs. Carvalho da Silva e Ferreira da Rocha.
Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Pinto Barriria chama a atenção do Sr. Ministro das Finanças para uma pretensão da polícia de investigação relativa ao pagamento de transportes.
O Sr Ministro das Finanças (Pestana Júnior) promete estudar o assunto.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem.
Abertura da sessão, às 15 horas e 39 minutos.
Presentes à chamada, 43 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 54 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Albano Augusto do Portugal Durão.
Alberto Jordão Marques da Costa.
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Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Pais da Silva Marques.
Artur Brandão.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Constâncio do Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Delfim do Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Germano José do Amorim.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio do Sousa.
João de Sousa Uva.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel do Sousa Dias Júnior.
Mariano Matinis.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Orneias e Vasconcelos.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto de Moura Pinto.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Xavier do Castro.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança,
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio do Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira do Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Maldonado do Freitas.
Delfim Costa.
Feliz do Morais Barreira.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Pires Cansado.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João do Orneias da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Carvalho dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Júlio Henrique do Abreu.
Leonardo José Coimbra.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel do Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Vasco Borges.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
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Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António de Abranches Ferrão.
António Alberto Torres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António de Mendonça.
António Resende.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Pereira Nobre.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Jaime Duarte Silva.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Rodrigo José Rodrigues.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
As 15 horas e 40 minutos principiou a fazer-se a chamada, à qual responderam 43 Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Foi lida a acta.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se o expediente.
Foi lido na Mesa o seguinte
Expediente
Ofícios
Do Senado, com uma proposta de lei que promove ao pôsto de general o coronel Augusto Rodolfo da Costa Malheiro.
Para a comissão de guerra.
Do Sr. Afonso Costa, agradecendo o voto de sentimento pela morte de seu filho Fernando.
Para a Secretaria.
Representações
Das Associações: Comercial de Lisboa, Comercial de Lojistas de Lisboa, Industrial Portuguesa, Comercial de Revendedores de Víveres, Proprietários dos Hotéis e Restaurantes e Proprietários de Leitarias e Vacarias, contra a aplicação da lei n.° 1:633, no que respeita a bebidas engarrafadas e perfumarias.
Para a comissão de finanças.
De uma comissão de militares, invalidados durante a guerra, pedindo lhes seja
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aplicada a alínea a) do artigo 6.° da lei n.° 1:170 e a lei n.° 1:464.
Para a comissão de guerra.
Telegramas
Das associações industriais de Tomar, S. João da Madeira c Porto; das associações comerciais de Lagos, Beja, Vila Real de Santo António, Braga o Barcelos; e da Associação dos Litógrafos do Porto, solicitando a urgente aprovação do projecto do lei sôbre selagem de perfumarias e bebidas, elaborado pela comissão de finanças.
Para a Secretaria.
Dos sargentos do infantaria n.° 14 e 24, artilharia n,° 2, guarda republicana de Coimbra, e da Escola de Condutores de Automóveis, pedindo que seja discutido o projecto de lei criando o Montepio dos Sargentos.
Para a Secretaria.
Carta
Do Sr. Mário Moniz Pamplona Ramos, pedindo que se participe ao Sr, Ministro da Guerra que não pode frequentar a escola de recrutas por só achar no exercício das suas funções de Deputado,
Comunique-se.
O Sr. Sousa da Câmara: — Sr. Presidente: peço a V. Exa. o obséquio de me dizer se sabe se o Sr. Ministro da Agricultura já se deu por habilitado a responder a uma interpelação que anunciei há corça de um mês.
O Sr. Presidente: — Ainda não tenho comunicação alguma a tal respeito.
O Sr. Sousa da Câmara: — Nosso caso, peço a V. Exa. o obséquio de instar com o Sr. Ministro, porque, não vindo S. Exa. em breve assistir aqui a essa interpolação, ela, necessàriamente, perde a oportunidade.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: pedi a palavra para renovar o requerimento que ontem aqui formulei, a fim de que entre imediatamente em discussão o projecto n.° 190, que está na ordem do dia.
O Sr. Alberto Jordão: — Sr. Presidente: desejava falar com a presença do Sr. Ministro da Agricultura; como, porém, S. Exa. não esteja, peço a V. Exa. o obséquio de me reservar a palavra para quando S. Exa. só encontro presente.
O Sr. Sousa da Câmara: — Sr. Presidente: desejava usar da palavra na presença do Sr. Ministro da Agricultura, visto que o assunto de que pretendo ocupar-me diz respeito à pasta de S. Exa.
Encontra-se presente o Sr. Ministro da Justiça, mas natural ó que sôbre a questão do pão, S. Exa. não esteja habilitado a responder-me.
Assim, peço a V. Exa. o obséquio do me reservar a palavra para quando esteja presente o Sr. Ministro da Agricultura.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam o requerimento feito pelo Sr. Tavares de Carvalho, para que entre imediatamente em discussão o projecto de lei n.° 196, que está na ordem do dia, queiram levantar-se.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Alberto Jordão: - Requeiro a contraprova.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que rejeitam queiram levantar-se. Pausa.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se na Mesa o projecto do lei n.° 196.
Foi lido e posto em discussão.
O Sr. Nuno Simões: — Sr. Presidente: a proposta de lei que vai discutir se é de 1922, não obstante ter parecer favorável de todas as comissões; trata-se de uma proposta que diz respeito ao exército.
Entendo, pois, que a proposta não deve ser discutida na ausência do Sr. Ministro
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da Guerra, principalmente, e também do Sr. Ministro das Finanças.
Tratando-se, Sr. Presidente, de uma proposta de lei de 1922, útil será que ela seja discutida com urgência e assim peço a V. Exa. o obséquio de mandar prevenir os Srs. Ministros da Guerra e das Finanças, aguardando-se a presença de S. Exa. para continuar a discussão do parecer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar a V. Exa. e à Câmara que não posso, na verdade, deixar de estar de acordo com as considerações feitas pelo Sr. Nuno Simões.
No emtanto, quero lembrar que se trata de uma proposta de que há cerca de dois meses eu ando a requerer, dia a dia, a discussão, e que é de 1922, como muito bom lembrou o Sr. Nuno Simões.
Espero, pois, que V. Exa. mande prevenir o Sr. Ministro da Guerra, a fim de que a discussão se possa fazer sem demora.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que estejam de acordo em que se aguarde a vinda do Sr. Ministro da Guerra para prosseguir a discussão desta proposta, queiram levantar-se.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Joaquim Ribeiro: — V. Exa. pode dizer-me se o Sr. Ministro do Comércio vem hoje a esta Câmara?
O Sr.- Presidente: — Não posso informar V. Exa.
O Sr. Joaquim Ribeiro: — Não atribuo a falta de S. Exa. senão a doença, ou a qualquer caso de força maior, porquanto o Sr. Ministro me prometeu aqui vir hoje.
O Sr. Tavares de Carvalho: — Em vista de se não poder discutir desde já a proposta n.° 196 e ter de se aguardar a presença do Sr. Ministro da Guerra, peço a V. Exa. o obséquio do, consultar a Câmara sôbre se permite que seja dado para ordem do dia o parecer n.° 124, a fim de se discutir logo a seguir ao n.° 196.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam o requerimento feito pelo Sr. Tavares de Carvalho queiram levantar-se.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Dínis de Carvalho: — Requeiro á contraprova.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que rejeitam o requerimento do Sr; Tavares de Carvalho queiram levantar-se.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Nuno Simões: — Peço a V. Exa. o obséquio de consultar a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o projecto vindo do Senado e que tem por fim conceder o bronze para o monumento a erguer em Chaves ao antigo Deputado António Granjo.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam o requerimento feito pelo Sr. Nuno Simões queiram levantar-se.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Está aprovado.
O Sr. Presidente: — Vai ler- se. Foi lido sendo em seguida aprovado sem discussão, tanto na generalidade como na especialidade.
É o seguinte.
Artigo 1.° É autorizado o Govêrno a gratuitamente, ceder o bronze necessário para o busto do malogrado estadista Dr. António Granjo, e a mandá-lo fundir no Arsenal do Exército pelo modelo que a Câmara Municipal de Chaves apresentar.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
O Sr. Nuno Simões: — Peço a V. Exa. o obséquio de consultar a Câmara sôbre se dispensa a leitura da última redacção.
Foi aprovado.
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O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia.
Os 8rs. Deputados que aprovam a acta da sessão anterior queiram levantar-se.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, pura entrar em discussão, o parecer n,° 843, sôbre o projecto de lei n.° 830.
Leu-se na Mesa o seguinte
Parecer n.° 843
Senhores Deputados. - Ao estudo e Considerarão da vossa comissão de finanças foi presente o projecto de lei n.° 83Q-E, da autoria do Sr, Ferreira da Rocha, destinado a substituir o imposto do sêlo sôbre perfumarias o bebidas engarrafadas por um outro, sobro as vendas que desses produtos façam os respectivos fabricantes ou produtores.
Votou a Câmara dos Deputados a urgência para esse projecto, o manifestou o desejo de que esta comissão ràpidamente se ocupasse do problema visado, em termos de se resolverem as dificuldades surgidas na cobrança do imposto do solo, atendendo, às reclamações que legitima e legalmente houvessem sido apresentadas, no que elas tivessem de justo e razoável sem prejuízo dos interêsses do Estado.
Cumprindo o voto da Câmara, dedicou a vossa comissão de finanças, em duas sessões para tal fim expressamente convocadas, todo o seu cuidado ao estudo e exame- do problema debatido.
Conhece a vossa comissão de finanças as dificuldades que a cobrança do imposto do sêlo sôbre perfumarias o bebidas engarrafadas levantou, talvez pela repugnância que por parte do contribuinte se tem evidenciado por um imposto alheio aos hábitos portugueses, que torna indispensável o exercício da acção fiscal dentro do estabelecimento ou da casa do comerciante, talvez polo receio de que, pouco a pouco, o imposto do solo vá atingir todos os artigos de consumo normal, não se improvisam impostos fàcilmente, não se transformam de um momento para o outro hábitos inveterados nas populações, nem a prática de países estrangeiros é garantia suficiente de que determinados processos fiscais possam ser aplicados integralmente no nosso meio.
São todas essas circunstâncias do conhecimento da vossa comissão de finanças, que nem a si própria pretendo ocultar que impostos deste género ou natureza contribuem pesadamente p.ira o encarecimento da vida, afectando artigos que, muito embora não sejam absolutamente indispensáveis às elementares necessidades do subsistência, entram, de lacte, no consumo geral do quási todas as classes, e, em verdade, incidem mais pesadamente sobro aqueles dos consumidores que de menor rendimento, vencimento ou salário dispõem.
Sabe, porém, esta comissão que o Estado, a não querer despenhar-se no abismo da derrocada financeira, tem o dever imperioso de reduzir as suas desposas e de não dispensar qualquer dos actuais receitas emquanto outras não forem criadas era sua substituição.
O reconhecimento dessa imperiosa necessidade manifesta-o o próprio Sr. Ferreira da Rocha no projecto que submeteu à sanção da Câmara, propondo que esto imposto do solo seja substituído pela tribulação das vendas realizadas pelos fabricantes ou produtores, transportando assim para a origem — fabricante ou produtor — a obrigatoriedade do pagamento do imposto.
Com êste último critério concordou inteiramente a vossa comissão, que aprovou unia proposta 110 sentido de que a cobrança do imposto do solo sôbre os artigos enunciados neste parecer seja feita na origem, por manifesto ou avença, sem prejuízo dos interesses gerais o fiscais do Estado.
Verificou porém, a vossa comissão que, precisamente para que não exista esse prejuízo do Estado, é indispensável uma base que dificilmente se encontra no imposto sôbre o valor das transacções, a não ser pela exibição obrigatória da escrita do fabricante — e êsse procedimento levantaria com certeza maior celeuma do que o próprio sistema do selo — ou pela verificação directa das saídas da fábrica ou depósito, e tal processo viria simplesmente renovar o caro e vexatório expediente das estações fiscais usadas no extinto imposto do fabricação e consumo.
A recusa da avença no imposto sôbre o valor das transacções deixaria os agentes fiscais sem outro meio de contrôle que
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não seja o exame do livro de vendas, sem forma prática de verificar as suas verbas e, sobretudo, sem processo eficaz do se assegurar da exacta distribuição dos artigos vendidos pelas duas classes, de taxas diferentes, que resultariam da aprovação do projecto Ferreira da Rocha.
É indispensável assentar o lançamento do imposto em mais sólida base, e em termos tais que o fabricante tenha do escolher o manifesto, e depois a avença, somente pelas facilidades que daí lhe resultarão, e não no intuito de pagar ao Estado menos do que a contribuição devida.
É indispensável fixar o quantum do imposto devido por cada artigo, para quo a avença, quando tenha de ser concedida, corresponda ao montante a pagar, exigindo-se em caso contrário e por extremo recurso, que o pagamento do imposto seja feito por meio de estampilhas do respectivo valor afixadas nos próprios artigos que o fabricante ou produtor vender, para revenda ou para consumo.
Estas considerações, que fundamentalmente se opõem ao critério orientador do projecto Ferreira da Rocha, levam a vossa comissão de finanças a rejeitar o referido projecto de lei, e a elaborar um contra projecto, dentro daquele espírito — já referido no início deste parecer — do procurar evitar as dificuldades surgidas na prática, pela correcção dos erros ou inconvenientes que do texto e da aplicação da lei têm resultado.
Assim a vossa comissão de finanças, tendo em vista atender tanto quanto possível as reclamações justas e legítimas dos contribuintes, sem descurar a defesa legítima também dos interêsses do Estado, aprovou que o imposto do sêlo sôbre perfumarias e bebidas engarrafadas passe a ser pago por manifesto ou por avença, pelo próprio fabricante ou produtor, salvo quando desse procedimento resulte prejuízo para os interêsses do Estado, satisfazendo portanto as reclamações baseadas na dificuldade da aposição de estampilha, e na impraticabilidade da exigência directa ao revendedor ou retalhista.
A consequência natural e lógica desta orientação traduz-se em outra proposta que a comissão aprovou: que o imposto só deve ser exigido sôbre artigos fabricados, isto é, sôbre artigos que tenham origem certa, lugar conhecido do preparação ou fabricação, onde a cobrança dêste tributo especial possa ser efectuada:
Sem a aplicação desta regra, a efectivação da primeira proposta não seria possível, e inutilizar-se-iam os benéficos efeitos que dela se esperam na resolução das dificuldades já suscitadas e no aumento de rendimento para o Estado, sem dúvida muito maior se todos os artigos tributados, sem evasão possível, forem alcançados no local da origem ou produção, em vez de só o poderem ser no momento da venda para consumo, do imprática o vexatória fiscalização.
Também do critério fundamentalmente adoptado deriva outro preceito, que a vossa comissão aprovou por unanimidade:
«O imposto, em relação aos artigos importados, deve ser cobrado com o bilhete do despacho aduaneiro».
Essa é, de facto, a «origem certa» para os artigos que não são fabricados no território nacional metropolitano.
São estas três as bases em que, na generalidade, assenta o projecto de lei que a vossa comissão de finanças resolveu submeter à sanção da Câmara.
Discutiu ainda a vossa comissão de finanças o sistema adoptado na lei vigente para tributar por maior taxa os artigos estrangeiros; e foi também examinada a modalidade que consta do regulamento actual, da diversa tributação de artigos cujos rótulos apresentem expressões em linguagem estrangeira.
Esta comissão não considera possível a aplicação deste imposto, em taxa mais elevada, aos artigos similares estrangeiros.
Os impostos de importação são pagos nas alfândegas quando os artigos são despachados para consumo no país.
Se o Estado os pretende elevar — e se em face dos tratados existentes o puder fazer— o instrumento próprio para esse procedimento é a pauta aduaneira.
Restava a solução de se distinguirem os artigos pela linguagem empregada nos rótulos, porventura na presunção de que o emprego da linguagem estrangeira na descrição de produtos nacionais devo ser combatida, ou mais caracteriza nesse produto o aspecto de artigo de luxo.
Há, porém, a ponderar que essa mais pesada tributação viria prejudicar a in-
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dústria, nacional do perfumaria, sem nos esquecermos também de que fácil seria a fabricantes estrangeiros expedir para Portugal artigos rotulados em linguagem portuguesa.
Passamos a fazer a exposição do projecto na especialidade, pela qual materialmente se justificam as taxas o isenções propostas:
Aguas medicinais e de mesa. — Justifica-se a tributação das águas medicinais, pelo mesmo critério que a torna possível nas especialidades farmacêuticas. Entende, porém, a vossa comissão de finanças que a taxa presente é muito elevada o propõe a sua redução para $01 por quarto de litro, que pela aplicação do coeficiente cinco, se transforma em $05 por quarto de litro. Parece também à vossa comissão que a mesma taxa deve ser imposta às águas do mesa que sejam águas minerais gasosas, sabido como é que na prática aquelas e estas tem a mesma aplicação corrente como águas do mesa, e injusto seria conceder a umas privilégios que resultassem em desfavor de outras.
Pretende também a vossa comissão isentar as restantes, aquelas que são verdadeiramente águas de mesa, e que, de maneira alguma podem ser consideradas como artigos do luxo, ou sequer artigos supérfluos, em um país cujo abastecimento do águas nos mais importantes centros de população sofre do inquinamentos que não podemos ignorar. A própria dificuldade no apuramento da «origem certa» das -s árias águas potáveis que aparecem engarrafadas como águas de mesa levar-nos-ia à mesma conclusão.
Limonadas, refrigerantes e xaropes. — Propõe esta comissão a simples eliminação do imposto sobro estes artigos.
O próprio critério da averiguação da «origem corta» nos forçada a essa proposta, se ela não derivasse naturalmente do conhecimento da situação da respectiva indústria, e do facto de êsses produtos só destinarem principalmente a uma classe de população que não pode nem deve pagar mais impostos de consumo.
Cerveja. — Esta comissão julga que a tributação das cervejas enganadas devo sor feita por cada têrço do litro o não por cada moio litro.
Houve provavelmente lapso na elaboração da lei quando adoptou esta última medida para base do imposto, visto que, como é do conhecimento geral, a cerveja aparece sempre no mercado em garrafas do um terço de litro. Para fazer a proporcional redução da taxa, e sem esquecer que a cerveja entra no consumo usual de uma classe do cidadãos, para quem difícil é suportar qualquer novo imposto, a comissão indica a taxa de $02 por cada uma dessas garrafas, taxa esta que, multiplicada pelo coeficiente da lei do sêlo, representa o imposto de $10.
Aguardentes. — Está esta comissão convencida do que a presente taxa sôbre aguardentes engarrafadas é demasiadamente leve, correspondendo porventura a outro lapso na elaboração da lei. Por êsse motivo a eleva a $10, ou sejam, com o coeficiente, $50 por cada quarto do litro.
Fiel ao critério de só tributar artigos do origem corta, a comissão só pretendo sujeitar ao imposto as aguardentes que venham para a venda com designação do marca especial ou indicação do nónio do fabricante, produtor ou vendedor. Doutra sorte, sabido que por todo o país se produz e engarrafa aguardente, êste tributo transformar-se-ia em um imposto do produção que não está na mento do quem o propõe.
Licores e aperitivos. — Na orientação que a comissão vem seguindo devem estes artigos suportar maior imposto do que as aguardentes. Dentro dos hábitos portugueses, elos correspondem, de facto, a um maior grau do consumo supérfluo, só é possível a distinção nesta matéria. Som se esquecer do que as taxas em demasia elevadas não são as melhores para a eficiência da cobrança, a comissão sugere um aumento de 50 por cento em relação às taxas da aguardente, isto é, fazer pagar aos licores o aperitivos $15, ou sejam, cora o coeficiente, $75 por quarto de litro.
Vinhos espumosos. — Artigo considerado de luxo dentro dos costumes nacionais, devia, no parecer desta comissão, supor-
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tar mais elevado imposto. Porém, vai incluído no seu projecto com o imposto de $30, ou seja com o coeficiente do selo, 1$50 por cada meio litro ou fracção, como na legislação existente.
Vinhos finos.— O critério da origem conhecida e o próprio embaraço da classificação tornam muito difícil à comissão propor a tributação dos vários vinhos, que não são vinhos de pasto.
Hesitou, no emtanto, a comissão em não sujeitar a especial tributo géneros que só não consideram essenciais à alimentação, quando as circunstâncias do Tesouro não permitem o desagravamento de géneros de consumo indispensáveis às classes pobres. Não esquece a comissão o carácter de justiça social que se contém nos impostos de luxo. Pesando, porém, os prós e os contras dêste imposto, a comissão é de parecer que só a solução preconizada para as aguardentes — a marca especial — seria possível para êste caso, e não quere a comissão, pelo menos neste momento, marchar para o caminho do imposto de produção sôbre os vinhos nacionais, que resultaria dêsse sistema, sem elementos de informação, para o estudo ponderado dêste assunto.
Perfumarias. — Aceita esta comissão o critério da lei existente quanto à taxa; mas julga injusto que sejam tributados sabonetes vulgares e outros artigos que elementares noções de higiene tornam de consumo geral, como produtos de «fantasia, ou de luxo».
Para obviar a êsse êrro, sugere a vossa comissão que os artigos desta espécie, cujo preço de venda na origem seja inferior a 3$ por unidade, fiquem isentos do novo imposto.
Quanto aos restantes, para evitar no caso possível estampilhagem, os inconvenientes derivados da mudança de sêlo em função de variações mínimas de preço, a comissão alvitra que até 10$ a percentagem incida sôbre o número inteiro de escudos contidos no preço e que para além dessa soma a percentagem recaia sôbre o número inteiro de dezenas de escudos que no preço se contiverem.
Continha ainda o projecto de lei do Deputado Ferreira da Rocha a redução da taxa de imposto de transacções sôbre artigos de luxo, com a sua aplicação uma só vez e não em todas as transacções feitas sôbre êsses artigos.
A vossa comissão de finanças sabe que a taxa actual e a sua multiplicação pelo número de transacções, elevando porventura a 60 ou 80 por cento êsse imposto, tornam impossível, por insuportável, a aplicação e regulamentação, nessa parte, da lei n.° 1:368.
Supondo, porém, que tal imposto virá a ser aplicado, parece a esta comissão que o assunto deverá ser considerado, não juntamente com o caso presente, mas em especial projecto de lei, cuja iniciativa será provavelmente tomada pelo Govêrno, se se convencer de que é possível e desejável enveredar por esse caminho.
Ficam assim expostas as razões que fundamentam o seguinte projecto de lei que a vossa comissão de finanças submeto à esclarecida e autorizada apreciação da Câmara.
Projecto de lei
Artigo 1.° Os artigos, rubricas o verbas adicionados à tabela do imposto do sêlo pelo n.° 3.° do artigo 4.° e, pelo artigo 5.° da lei n.° 1:633, de 17 de Julho de 1924, são substituídos pelos seguintes:
[Ver tabela na imagem]
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2.° Produtos de perfumaria (incluindo-se nesta designação artigos de toilette) cujo preço de venda por. unidade seja superior a 3$:
A) Sê o preço do venda não for superior a 10$:
Sobre a maior importância em escudos contida no preço de venda .... 5%
B) Se o preço fie venda for superior a 10$:
Sôbre a maior importância em dezenas de escudos, contida no preço de venda .... 5 %
Art. 2.° O imposto instituído por esta lei relativamente aos artigos importados, é cobrado nas Alfândegas na ocasião do despacho aduaneiro da importação.
Art. 3.° O imposto instituído por esta lei será cobrado no local da origem por manifesto do fabricante ou produtor, ou por meio de avença, sempre que os meios de verificação facultados às autoridades incumbidas do respectivo lançamento forem bastantes para garantir que desta última forma de cobrança não resulta prejuízo na produtividade do imposto.
§ 1.° O imposto é devido desde que o artigo a êle sujeito saída fábrica ou depósito do fabricante ou produtor para ser entregue a qualquer consumidor ou vendedor.
§ 2.° Quando o imposto for cobrado em face de manifesto, cada um dos artigos a ele sujeito deve designar o número do manifesto em que fôr incluído.
§ 3.° Considera-se fabricante ou produtor aquele que em suas fábricas ou depósitos fabricar, preparar, engarrafar ou acondicionar, e expedir para revenda ou venda directa, os artigos submetidos a êste imposto.
Art. 4.° As sanções aplicáveis na falta de pagamento dêste imposto, bem como o respectivo processo, são as estabelecidas na lei em vigor sôbre imposto do sêlo.
Art. 5.° São isentos dêste imposto os produtos destinados à exportação.
Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da comissão de finanças da Câmara dos Deputados, 16 de Dezembro de 1924. — A. Portugal Durão - Mariano Martins — António de Paiva Gomes — Prazeres da Costa — Viriato Gomes da Fonseca (com declarações) — F. O. Velhinho Correia (vencido) — M. Ferreira de Mira (vencido em parte) — Pinto Barriga (vencido em parte) — Lourenço Correia Gomas (relator) — Manuel Ferreira da Rocha (vencido na rejeição do projecto que apresentou) — Artur Carvalho da Silva. (vencido).
Projecto de lei n.º 830-C
Artigo 1.° A taxa do imposto sôbre o valor das transacções estabelecida no n.° 5'.° do artigo 4.° da lei n.° 1:368, de 1922, é substituída pela seguinte:
«de 3 por cento sôbre o valor das vendas feitas pelos fabricantes, quer para revenda quer para consumo, dos artigos enumerados em lei especial para o efeito da aplicação desta taxa».
§ único. São desde já submetidos ao regime designado nesta lei os produtos do perfumaria classificados para êsse fim em regulamento especial, e as seguintes bebidas engarrafadas: vinhos espumosos, licores, aperitivos e cervejas.
Art. 2.° A taxa do imposto suplementar instituído no artigo 7.° da lei n.° 1:368, de 1922, é elevada a 6 por cento quando as mercadorias importadas forem artigos submetidos ao regime, especial estabelecido nesta lei.
Art. 3.° São eliminados da tabela do imposto do sêlo em vigor os artigos, rubricas e verbas que lhes foram adicionados pelo n.° 3.° do artigo 4.° e pelo artigo 5,° da lei n.° 1:633, de 17 de Julho de 1924.
Art. 4.° Pica revogada a legislação em contrário.
9 de Dezembro de 1924. — Manuel Ferreira da Rocha.
O Sr. Velhinho Correia: — Vou mandar para a Mesa um projecto de lei, para o qual peço a urgência e dispensa do Regimento, a fim de poder entrar em discussão, conjuntamente com o projecto de lei da comissão de finanças.
V. Exa. e a Câmara sabem que a comissão de finanças elaborou um contra-projecto a propósito da questão da selagem, em oposição ao projecto de lei que para a Mesa tinha sido mandado pelo Sr. Ferreira da Rocha.
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Está, portanto, em discussão o contra--projecto de lei da comissão de finanças e sabe V. Exa. e sabe a Câmara que eu fui um dos Deputados que assinaram vencidos êsse contra-projecto de lei.
Dai resultou que mandei para a Mesa um projecto de lei que exprime o meu modo de pensar, o meu ponto de vista sôbre a questão da selagem.
Antes de propriamente entrar na análise do projecto de lei tenho de bordar algumas considerações sôbre o problema da selagem.
É o caso que sempre que reúnem em Lisboa os indíviduos da classe comercial, sempre que reúnem em Lisboa as chamadas fôrças económicas, aparece o meu nome como sendo o de inimigo do comércio. Quero afirmar a V. Exa. e à Câmara que nada menos verdadeiro, nada menos exacto.
Não sou inimigo do comércio, não sou inimigo de qualquer classe, não tenho razão para isso, nem há algum acto da minha vida política que possa explicar uma tal afirmação a meu respeito.
Não sou inimigo do comércio, como não sou inimigo da indústria ou do operariado.
Não sou inimigo de nenhuma classe organizada,.
Neste lugar pretendo servir o melhor que posso os interêsses do País, estando acima dos estreitos interêsses de classes.
Exponho as minhas ideas claramente, como sinto e sei, com clareza e lealdade, sem subterfúgios, sem habilidades.
Desde a primeira hora me declarei partidário da selagem.
Entendo que a lei deve manter-se, que o imposto deve continuar a ser cobrado. Entendo que infelizmente a hora não é para começarmos uma política de alivio de tributos e, quando essa política se começar, não será certamente pelos artigos de luxo que terá de iniciar-se.
Quando começarmos uma política de alívio de impostos, lógico é que os géneros ou artigos de primeira necessidade sejam aqueles que deixem de pagar imposto e não os géneros ou artigos de luxo.
Como é então que apareço, para muitos indivíduos, como inimigo do comércio, ou inimigo da indústria, eu, que não tenho feito outra cousa, no limite das minhas fôrças, senão servir o meu País o melhor que sei e posso?
Será por ter contribuído, como contribuí, para a chamada política de valorização do escudo, e ter contribuído, como realmente contribuí, com o meu esfôrço e a minha propaganda, para que uma melhor divisa cambiai fôsse um facto, como hoje realmente é?
Mas essa política era uma política absolutamente, necessária, até para as conveniências daqueles que hoje me atacam.
Era uma política absolutamente necessária, para as chamadas forças económicas, sem a qual todos sofreriam.
Se não enveredássemos por êsse caminho, o valor da nossa moeda deminuiria até aquelas proporções que se viram na Alemanha, na Rússia e na Polónia.
Há, de facto, na nossa tributação fiscal desigualdades e defeitos, mas é preciso corrigir êsses defeitos por forma que êles desapareçam o mais ràpidamente possível.
A política tributária da República aproxima-se da política tributária da Europa e ato do mundo.
Na monarquia os impostos indirectos eram representados por 43 por cento; no regime actual esses impostos não vão além de 30 por cento.
Isto prova o seguinte: que a política tributária da República é muito diferente da política tributária da monarquia.
Na monarquia recorria-se principalmente aos impostos indirectos; hoje procura-se tributar mais por uma forma directa, isto é, tributar aqueles que nada produzem e têm riqueza.
Sr. Presidente: é preciso não esquecer que a nossa terra, Portugal, produz pouco e por isso devemos começar por aqueles que nada produzem.
Sr. Presidente: eu tinha de fazer estas considerações antes de iniciar a análise do projecto da comissão de finanças.
Em toda a parte quando se fala em impostos, apareço eu sempre não só com a responsabilidade dos meus actos e das minhas ideas, mas também respondendo pelos actos e ideas dos outros.
Sr. Presidente: a verdade é esta: a melhoria cambial foi devida aos novos impostos e o próprio custo da vida não se tem ressentido disso.
Apoiado do Sr. Ferreira da Rocha.
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Não tenha V. Exa. duvida. Se temos continuado com o papel-moeda, muito pior estaria a carestia da vida.
Os factos provam bem o que eu digo e que a razão está do meu lado,
Sr. Presidente: vou analisar o projecto da comissão que por mim foi assinado como vencido e quási todos assinaram com restrições ou declarações.
O projecto não podo ser aprovado pela Câmara c mesmo porque a êle se opõe a lei-travão.
Justificam-se do alguma maneira as isenções para as aguardentes?
Reparem V, Exa. e a Camara que as aguardentes eram tributadas pelo antigo imposto do consumo em Lisboa e Pôrto, e pelo imposto do real do água. Em Lisboa o Pôrto pagavam $04(5) por litro, quantia essa que, actualizada, daria hoje 180 por litro,
Pois a comissão de finanças não tributaaAs aguardentes, excepto quando sejam apresentadas com designação do marca especial ou indicação do nome do fabricante, produtor ou vendedor.
Não vejo razão para esta isenção, e por isso não concordo com o
projecto do lei da comissão de finanças neste ponto.
No que respeita a águas medicinais, que pela lei em vigor são tributadas à razão de $02 por quarto do litro, o projecto de lei reduz a metade esta taxa.
Ora Portugal é um país de águas, — assim só diz e tanta vez se diz que sou levado a acreditar que assim seja — mas em Portugal o preço das águas 6 dos mais caros.
Infelizmente tenho viajado muito o por isso posso dizer que as águas engarrafadas num país do águas como o nosso têm um preço exageradíssimo. Logo, a lei em vigor tem uma razão de ser: é como que uma comparticipação do Estado nos grandes lucros das empresas.
Os preços das águas em Portugal, como daqueles artigos que em Portugal se produzem o que não receiam a concorrência estrangeira, não são preços estabelecidos em relação ao custo da produção, mas em relação ao custo dos produtos estrangeiros em Portugal. Portanto a aposição do sêlo não vinha onerar mais o seu custo, mas realmente evitar que êsse custo se agravasse.
No que diz respeito a águas minerais de mesa, também a comissão de finanças deita abaixo parte do texto da lei em vigor.
Não posso compreender a razão por que as águas minerais gasosas são tributadas e as águas minerais que não são gasosas o não são.
Não compreendo esto horror aos gases e esta protecção aos sais!
Não concordo, por isso, com a opinião da comissão de finanças a êste respeito.
Com relação às cervejas, evidentemente que a tributação por garrafas do meio litro não é uma tributação de recomendar num pais em que a maior parte das cervejas engarrafadas é vendida em garrafas de têrço de litro.
Mas não vejo razão para a campanha que só fez no País por êste motivo, porque os industriais que quisessem beneficiar das disposições da lei podiam gradualmente ir substituindo a actual forma de envasilhar por outra que se adaptasse à lei. Não era a primeira vez que isso sucedia.
De resto, sabem V. Exas. que no estrangeiro é frequente venderem-se garrafas do cerveja de meio litro e até do sete decilitros.
Entretanto, eu não tinha dúvida alguma em aceitar que a tributação se fizesse com referência a garrafas de um têrço do litro, e até propus essa modificação, que a meu ver bastaria para que o imposto se reduzisse.
Não era exagerada a tributação da lei n.º 1:633, e portanto não se compreende a redução de 50 por cento que a comissão de finanças propõe.
A cerveja pagava em Portugal um imposto de produção que equivaleria hoje a $52 por litro se fôsse actualizado.
Ora, assim, vêem V. Exas. que o imposto de $52 por litro seria o da monarquia, se só actualizasse.
O imposto consignado na proposta que tive a honra de mandar para a Mesa é apenas de $45 por litro para a cerveja engarrafada, ao passo que o antigo imposto incidia sôbre toda a cerveja produzida.
Vêem, portanto, V. Exas. que não há razão absolutamente nenhuma para os protestos que se têm levantado, visto que êste imposto substitui o antigo imposto do real de água e o de consumo.
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Sr. Presidente: a comissão de finanças entendeu que devia exceptuar os vinhos licorosos. Em minha opinião isto é uma verdadeira injustiça, porque uma garrafa dêste vinho, que custa 20$ e 30$, pode bem ser tributada numa pequena taxa, tanto mais que no nosso país todos os outros vinhos estão isentos de imposto especial.
Sr. Presidente: no tempo da monarquia o imposto de consumo sôbre os vinhos rendia qualquer cousa como 1:500 contos, quantia esta que actualizada dava uma verba importantíssima.
O Sr. Alfredo de Sousa (em àparte): — Mas hoje tem um imposto geral, que é bastante violento.
O Orador: — Sr. Presidente: aquilo que não é pago por uns há-de ser pago por outros. Aquilo que deixa de ser pago pelo consumidor há-de ser pago pelos contribuintes da contribuição predial rústica e urbana, e por todos aqueles que estão sujeitos às outras contribuições gerais, isto emquanto o Estado não puder reduzir as suas despesas.
Trata-se, portanto, Sr. Presidente, de saber qual é o imposto que convém mais, pedindo a V. Exa. licença para sustentar o critério de que devemos começar pelos artigos de luxo.
Não ignoram V. Exas. que em França e Itália incide sôbre os vinhos uma tributação especial, tributação que igualmente existia em Portugal.
O Sr. Portugal Durão (interrompendo): — Mas existe o imposto sôbre o valor das transacções.
O Orador: — Simplesmente o imposto sôbre o valor das transacções não tem o carácter que tinha o antigo imposto de consumo. Êste antigo imposto era especializado, ao passo que aquele que incide sôbre o valor das transacções é de carácter genérico.
O Sr. Alfredo de Sousa (em àparte): — Mas de eleitos muito mais profícuos.
O Orador: — Se o Sr. Ministro das Finanças me dissesse que não precisava da receita da selagem para equilibrar o Orçamento, eu, mesmo assim, discordaria de S. Exa. e mandaria para a Mesa uma proposta concebida, mais ou menos, nos seguintes termos:
«Considerando que o Estado pode realmente dispensar 40:000 ou 50:000 contos, que ó a importância que se calcula resultar da selagem;
Considerando que a política de desagravamento de impostos deve começar pelos artigos e géneros de primeira necessidade:
Tenho a honra de propor que essa isenção se aplique a esses artigos, antes de chegarmos aos vinhos licorosos».
Sr. Presidente: já em tempos fiz esta proposta, mas a comissão de finanças não concordou com ela.
E porque assim entendo é que me encontro na esquerda da Câmara.
Sr. Presidente: voltando a referir-me à cerveja, devo dizer à Câmara que mesmo nos países em que ela é uma bebida como em Portugal é o vinho, a cerveja é fortemente tributada, como, por exemplo, na Alemanha e na Suíça.
Ora em Portugal a cerveja não é sujeita a qualquer tributo especial, e pela proposta que tive a honra de mandar para a Mesa ela apenas fica sujeita à taxa de $45 por litro.
Sr. Presidente; a minha proposta cifra-se apenas na manutenção da lei actual, com duplicação da taxa da aguardente, e a aplicação da taxa, à cerveja, como acabei de dizer.
A comissão de finanças entendeu que só devia tributar os artigos de origem conhecida, porque pretende substituir o imposto pago por estampilha por um imposto pago por manifesto.
Eu vou referir-me a êsse ponto mais adiante.
Sr. Presidente: devo repetir que não concordo com a isenção dos vinhos finos. No que respeita a vinhos espumosos, não alterou a comissão de finanças o disposto na lei n.° 1:633. No que respeita a perfumarias, não posso concordar também com o parecer da comissão de finanças, porque esta, com a sua nova redacção, contribui para que uma grande parte da matéria tributável desapareça.
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Não posso compreender a protecção dada ao sabão. A lei actual não tributa o sabão nem considera um simples sabonete como sabão de luso.
Não é a lei actual tam rigorosa como a lei francesa que considera sabão de luxo tado o sabão que se vende a partir de determinado prego. Pois, apesar disso, uma grande parto da matéria tributável foi pela comissão de finanças anulada o distraída.
Depois não diz a comissão do finanças só o projecto que mandou para a Mesa envolve ou não deminuição do receitas. Devia dizê-lo e o facto do o não ter dito o que prova? Prova que êle na verdade envolve deminuições de receitas e nestas condições não deve a Câmara aprová-lo, não só porque a isso se opõe uma disposição do lei, mas ainda porque essas receitas são indispensáveis para o equilíbrio das contas do Estado, equilíbrio que põe em jôgo a vida financeira futura da República.
Todos sabem, — porque os factos são de todos conhecidos — o que é a política do papel-moeda e os prejuízos que ela acarreta não só do ordem económica, mas também de ordem social, para mais num país como o nosso, sujeito a perturbações do toda a espécie.
Uma política do desvalorização da nossa moeda não é para tentar e por isso não ó do aconselhar uma política de excessos de despesa, e, no que diz respeito propriamente a impostos, uma política que não seja de rigorosa aplicação das receitas tributárias, do forma que o Tesouro venha a receber aquilo do que carece para se manter.
Além disso, uma das disposições do projecto da comissão de finanças, o artigo 2.°, envolve, nem mais nem menos, a isenção de todos os atoles de perfumaria existentes em Portugal.
Que os artigos existentes não paguem impostos, visto que só os pagariam aqueles que de futuro fossem importados, não é, certamente, o propósito da comissão, embora seja o que só infere do artigo citado.
Um dos pontos mais importantes desta questão diz respeito à maneira de se fazer a cobrança dos impostos.
Deve fazer-se a cobrança por estampilha, como ou preconizo, ou por manifesto, como sustenta a comissão do finanças?
Não posso compreender como é que as chamadas fôrças vivas preferem a cobrança do imposto por meio cio manifesto.
Haverá maneira mais vexatória e violenta de cobrança que o da cobrança por manifesto?
Porventura a comissão de finanças ignora que êle já dou origem a que em várias províncias do norte só tivesse dado uma revolta?
Em que consisto a fiscalização feita por um funcionário dos impostos no caso de cobrança por estampilhagem?
Em sabor só determinada mercadoria está ou não estampilhada. Não tem que ver mais nada.
Bem sei que só diz que o manifesto preconizado pela comissão de finanças, como é simplesmente para os artigos fabricados, não tem, quanto à sua fiscalização, uma grande generalidade, não existindo, portanto, os riscos que aqui estou apontando. Mas esqueço-se a comissão do que esta forma do cobrança também se aplica às perfumarias.
Para mim, o imposto por manifesto aplicado aos vinhos e aguardentes era uma forma do cobrança, dando mais origem a vexames do que a cobrança por meio do estampilhagem.
Tenho aqui o Código do Real de Agua para os Srs. Deputados verem, se quiserem, que não exagero relativamente à maneira como só realizava a cobrança dêste imposto, tendo por base uma declaração do contribuinte que ficava sujeito ao varejo do pessoal da fiscalização, fórmula sempre mais vexatória do que a da estampilhagem.
Só para os comerciantes desonestos a forma de cobrança for manifesto podo ser recomendável, porque o manifesto, com a avença correspondente, ó uma declaração que não tem publicidade e tudo só passa entre três ou quatro pessoas.
Em boa verdade não pode dizer-se que há qualquer dificuldade na execução da da lei da selagem.
Pois então numa garrafa de vinho ou do licor, que tem vários papéis de diversas cores, é impossível ou sequer difícil a aposição duma estampilha fiscal?
No Brasil, cujas tradições não são diferentes das nossas, cujo sistema tributa-
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rio não é essencialmente diverso do nosso, a estampilhagem tem uma aplicação enorme, sekfndo-se tudo o que tenha qualquer invólucro.
Sr. Presidente: entendo que a lei actual não prevê a selagem na origem, porque diz quais são os artigos sujeitos à estampilhagem. Só não dissesse que o imposto do sêlo sôbre as bebidas engarrafadas só ora exigido às que se encontrem nas casas do venda, poderia concluir-se que a lei tributasse todas as bebidas engarrafadas, estivessem elas onde estivessem.
Esta disposição não pode desaparecer, sob pena do só interpretar a lei como impondo a estampilhagem a todas essas bebidas, mesmo quando qualquer particular as tenha em sua casa. Não é essa a amplitude da lei.
Esta disposição é absolutamente precisa para delimitar a matéria tributável.
Portanto, tudo quanto ô lei do sêlo subsiste.
A lei básica do sêlo, num dos seus artigos, diz que só é matéria legislativa a taxa do imposto, o que o restante ó regulamentar.
O Sr. Ministro, quanto a ruim, podia regulamentar a lei do maneira a que o pagamento se fizesse na origem. É esta a interpretação que é reforçada pela base 7.ª da lei de 14 de Maio do 1921.
Nestas condições, entendo que, até hoje, as disposições em vigor habilitam o Sr. Ministro das Finanças a poder tributar na origem aqueles géneros e artigos que convém tributar.
A interpretação da lei n.° 1:633, assim como a interpretação que forçosamente terá de se dar ao parecer da comissão de finanças, é errada.
Qual ó a origem das perfumarias que se fabricam em Portugal?
Em Portugal há mais fabricantes do que vendedores de perfumarias.
Uns fazem pastas, outros sabonetes, etc. E, por assim dizer, uma indústria pulverizada.
Portanto, estabelecer-se um manifesto que compreenda cada um dêstes fabricantes é prejudicial, além de ser pueril.
Portanto, ó absolutamente impraticável um imposto por manifesto cobrado na origem.
Entendo, Sr. Presidente, que, quanto à forma de cobrar, devemos manter as antigas tradições o que o Parlamento deve definir qual ó a matéria tributável e qual é a taxa a aplicar.
Não quero dizer, de maneira nenhuma, que na regulamentação não tenha havido excessos, que ela não tenha sido defeituosa o que o não seja ainda. Foi defeituosa desde o início e ainda hoje o é, apesar das sucessivas modificações.
O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo): — Ainda hoje é mais defeituosa do que era.
O Orador: — Eu sou partidário da avença para cervejas, gasosas e limonadas, etc., porque a acho, neste caso, a forma mais prática.
Não compreendo a substituição da estampilha por um rótulo selado, porque é mais fácil estampilhar do que mandar os rótulos a selar à administração de finanças.
Repito, a regulamentação é defeituosa, o aqui aconselho o Sr. Ministro das Finanças a que faça uma regulamentação desta lei, ouvindo as pessoas interessadas na sua execução, não para lazer 'o que elas desejam, mas para da sua opinião colhêr os ensinamentos precisos.
Sr. Presidente: é de todo o ponto justo que se facilite a abertura de créditos para os indivíduos que tom de selar uma grande quantidade de mercadorias. No Brasil isso é corrente. Entro nós já foi experimentado sem resultados práticos.
Sr. Presidente: não posso deixar de fazer algumas referências à economia desta lei.
Eu não tenho dúvida alguma de que, desde que ela seja mantida, como convém que seja, desde que ela entre nos nossos hábitos fiscais, esta lei, sob o ponto de vista fiscal, se recomenda pela sua produtibilidade.
Isto se provou pelo aumento da venda de estampilhas na última semana do Novembro, num momento em que já se fazia sabotage da lei, mas quando ainda essa campanha não tinha tomado o aspecto que depois tomou.
Venderam-se, em 15 dias, mais de 2:000 contos de estampilhas.
Veja V. Exa.: a cerveja dá um aumento de ano para ano. Hoje já dá 6:000 contos anuais, e não sou ou que faço esta afirmação, mas sim os números.
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Está o Tesouro em condições de abandonar êste imposto?
O que ó que resultaria?
Resultava ter de se recorrer ao papel-moeda ou recorrer-se ao aumento da circulação fiduciária, que não se fará sem o meu mais veemente protesto.
Sr. Presidente: vou terminar as minhas considerações, mas antes apreciarei também o aspecto moral da questão,
Na maior parte, todos cumpriram a lei; mas alguns houve que aconselharam os seus colegas a não a cumprirem.
Se vamos agora aprovar Cate projecto,e£ que autoridade temos nós para fazer respeitar o que aqui se aprova?
Os reclamantes não têm razão, quando reclamam contra a lei, eximindo-se ao pagamento do imposto que, de mais a mais, não é pago por aqueles que reclamam, e sim pelos consumidores.
Não vejo, Sr. Presidente, que se possam pôr de parte as receitas provenientes da lei n.° 1:633, quando há produtos em Portugal e que são de primeira necessidade e estão sujeitos ao imposto.
Entendo que a lei se deve manter e assim mando para a Mesa o seguinte projecto:
Artigo 1.° São introduzidas as seguintes alterações no n.° 3.° do artigo 4.° da lei n.° 1.-633, de 17 de Julho do 1924:
a) É referida a 1/4 de litro a taxa de $04 das aguardentes;
b) É referida a 1/3 de litro a taxa das cervejas a qual passa a ser de $03.
Art. 2.° O disposto na primeira parto do § único do n.° 3.° do mesmo artigo não impede a selagem na origem.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário. — F. G. Velhinho Correia.
Propondo o aumento da taxa das aguardentes para o dôbro do que são actualmente, quero atingir todas as aguardentes.
Terminando, peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que o meu projecto entre desde já em discussão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi lido na Mesa e admitido o projecto, entrando em discussão simultaneamente com o parecer.
O Sr. Joaquim Ribeiro: — Sr. Presidente: tenho esperança de que o Sr. Ministro das Finanças não concordará com o projecto que está em discussão e de que a Câmara não lho dará o seu voto.
O que mo revolta, Sr. Presidente, ó a atitude das fôrças vivas insultando o Parlamento só porque êste lhos pediu aquilo que deviam dar para o equilíbrio orçamental!
Eu tenho autoridade para falar porque, como industrial, exploro uma indústria das que mais pagam.
Todos temos de fazer sacrifícios para que o País prospere.
Os que se constituem mandões do comércio e da indústria é que estão obrigando todos aqueles que se encontram dispostos a cumprir a lei a não pagarem o imposto de selagem.
Invoca-se uma camaradagem que é mal entendida, visto que se procura colocar o interêsse da classe acima do interêsse do País.
Não será com o meu voto que o Parlamento irá resolver qualquer cousa que signifique transigência com a atitude insólita das fôrças vivas.
O que se pretende é, nem mais nem menos, uma fuga ao imposto, mas tenho esperança de que o Parlamento não deixará de manter a lei e o regulamento feito pelo Sr. Ministro das Finanças para que todos paguem o que devem.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Alfredo de Sousa: — Sr. Presidente: diz o Sr. Velhinho Correia que ainda não ó tempo de eliminar impostos. Terá S. Exa. razão, mas também é verdade que, em qualquer momento, é tempo de corrigir os impostos naquilo que tenham de violento.
A selagem exigida pela lei n.° 1:633 representa um imposto novo sôbre transacções comerciais de certos géneros. Havendo já uma lei que estabelece um imposto sôbre essas transacções, conhecido pelo nome de imposto de transacção, a exigência daquela selagem não tem uma legitimidade em bases jurídicas. Trata-se de uma duplicação do imposto de transacção.
Se o Estado carece da receita dessa selagem, então o caminho a seguir seria
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o de agravar o imposto de transacção, critério êste já aqui defendido pelo Sr. Ferreira da Rocha.
Que se mantenha a selagem, mas só até . o ponto em que possa ser equitativa. Nunca com a violência que ela, tal como é exigida, encerra.
Eu fui um dos que votaram o projecto de lei da selagem, mas fi-lo convencido de que as taxas não passavam do que constava do mesmo projecto.
Se a Câmara tivesse conhecimento de que as taxas seriam as que são exigidas, não teria, decerto, aprovado muitas delas.
Uma garrafa de um quarto de litro não ó paga na origem por $30.
V. Exas. estão vendo que, exigindo-se um sêlo de $10 por cada garrafa, temos um imposto quási de 40 por cento.
Isto, Sr. Presidente, pelo que diz respeito às águas, não falando nos vinhos espumosos.
Não estou aqui a defender os interêsses de quem quer que seja, nem tam pouco sou comerciante ou industrial; entendo, porém, que isto ó inadmissível.
No que diz respeito aos vinhos espumosos, vai exigir se uma taxa de $30 por cada garrafa de litro, o que na verdade também considero exagerado, visto que uma garrafa dêsse vinho, na origem, casta o máximo 10$, não contando com a garrafa, rótulos, etc.
Eu bem sei, Sr. Presidente, que me vão dizer que se trata de uma bebida de luxo; creio, no emtanto, que o imposto que se vai exigir, superior a 50 por cento, é, na verdade, exagerado, e que vai prejudicar senão esmagar as emprêsas industriais do nosso País.
É um imposto, como disse, exagerado que se vai impor por cada garrafa de litro e tanto mais quanto é certo que elas não têm essa capacidade.
De resto, Sr. Presidente, no que diz respeito ao vinho estrangeiro, êsse imposto desaparece, segundo o projecto da comissão, e senão veja-se o que diz o artigo 2.°
Segundo êle, o imposto relativamente aos artigos importados é cobrado nas alfândegas na ocasião do despacho aduaneiro da importação.
Em todo o caso a ser aprovado o que a comissão pretende, o que aconteceria?
Aconteceria haver garrafas seladas porque eram nacionais e não soladas porque eram estrangeiras.
Portanto, sem contraditar o que afirmei quanto à legitimidade jurídica do imposto da selagem, que representa, repito, uma duplicação do imposto sôbre o valor das transacções, aceito, por já ser lei, a existência dêsse imposto.
É simples corrigir os excessos, as iniquidades e as violências, na parte em que os há, salvaguardando quer os interêsses do Estado, quer os dos particulares. Porque se há empresas às quais se podem exigir grandes impostos, a receita dêsses impostos pode ser aparente, pois pode dar-se o caso de se atingir com êles a prosperidade dessas empresas.
Eu bem sei que há uma certa impressão e má, bem traduzida até em palavras brilhantes do Sr. Joaquim Ribeiro, a respeito daquilo que se supõe ser uma luta entro o Parlamento e as chamadas fôrças vivas.
Essa luta, porém, não existe; mas, mesmo que existisse, era ao Poder Legislativo que cabia ponderar, desfazendo conflitos e não agravando.
Sr. Presidente: termino, mandando para a Mesa uma proposta que diz respeito aos vinhos espumosos. Eu espero que ela obtenha o beneplácito do Sr. Ministro das Finanças. É concebida nos seguintes termos:
Proponho que o imposto do sêlo para os vinhos espumosos seja de $20 para cada garrafa que não contenha mais de um litro e de $10 para cada garrafa que contenha mais de meio litro, com o coeficiente de 5 para ambos os casos.- Alfredo de Sousa.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta do Sr. Alfredo de Sousa. É lida e admitida.
O Sr. Correia Gomes: — Sr. Presidente: infelizmente esta questão, que tem. apaixonado multas pessoas, não teve dentro desta casa do Parlamento aquela atmosfera que deveria ter, quando surgiram as primeiras reclamações dos contribuintes.
Apoiados.
Infelizmente, também, as pessoas que dirigem os negócios do Estado não tive-
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ram neste assunto a noção de que exerciam essa direcção por determinação do outros; esqueceram-se do que eram, do facto, apenas, e são delegados dos contribuintes para exercerem a sua acção do administradores dos dinheiros do Estado.
Igualmente, nem sempre doutro desta Câmara os nossos colegas tom tido a noção verídica da acção que aqui tom a desempenhar, o nem sempre, digo, porque se esquecem sucessivamente de que são delegados daqueles que pagam o que, como delegados do público, a defesa que aqui tem a desempenhar é a defesa dos interêsses dêsse mesmo público.
Apoiados.
Sr, Presidente: falou o Sr. Joaquim Ribeiro em conflitos e actos do revolta; mas o que é certo é que não pode haver conflitos, nem actos do revolta, entre eleitos e eleitores, porque, no dia em que êsse facto só produzir, os eleitos não podem continuar a representar aqueles que os elegeram.
Não teve, nem tem, o Parlamento que saber ou atender aos pequeninos actos que se praticam, dentro do qualquer colectividade, dentro de qualquer organismo, económico ou não, porque a sua função é mais elevada.
A sua função própria ó recolher todas as reclamações, atender as que forem justas, e adoptando procedimento contrário para as que o não forem.
Mas, Sr. Presidente, nem sempre assim tem acontecido. Os eleitos no dia seguinte ao da sua eleição esquecem-se imediatamente das razões e motivos por que foram eleitos, dos direitos e obrigações que lhos foram confiados.
Se o facto se não dá na generalidade, todavia, dentro desta casa, êle tem-se dado muitíssimas vezes, para poder servir de base às afirmações que acabo do produzir.
A nossa missão é defender os interêsses do Estado, é defender os interêsses da Nação.
Mas os interêsses do Estado não são simplesmente os interêsses do erário público, mas os interêsses do público que constitui a Nação, e ó para isso que somos seus representantes.
Tem-se abusado nestes últimos tempos da palavra «imposto». Esta palavra tem servido para tudo.
Precisamos pensar que, de facto, aqueles que pagam tem o direito do saber para que é que pagam.
Sr. Presidente; a muitos legisladores tem parecido, polo facto de existir uma mina, que poderá ser de água, que essa mina pode satisfazer e abastecer todas as fontes que só lhe adaptarem. Porem, esquecem-se de que a água é sempre a mesma, o que da distribuição dela por várias bicas resulta que algumas delas hão-de ficar socas.
Estamos precisamente na situação do imposto, como na mina de água, Por tantas bicas queremos fazer a sua distribuição, que terminaremos por ficar com a maior parto delas absolutamente sêcas.
Não podo haver produtividade quando, do facto, não existem os meios necessários para ela.
Eu tenho ouvido nesta Câmara variadíssimas vexes, aos homens que só sentam nestas bancadas e àqueles que ocupam as cadeiras do Poder, que é absolutamente indispensável que o País pague o necessário para fazer face às despesas públicas. Estou plenamente do acordo com isso, mas a verdade também é que só torna absolutamente indispensável que os impostos sejam lançados com a maior equidade e justiça, do forma a que não continue sucedendo, como tem acontecido ato aqui, que só um certo número de cidadãos pague, e que os restantes, numa maioria enorme, nada paguem.
Sr. Presidente: adoptou-se — pelo menos assim o tenho observado — nesta casa do Parlamento, gritar contra as fôrças vivas. Devo dizer que não sei o motivo por que foram classificados de fôrças vivas os elementos que exercem no País uma acção importante de trabalho, quer na indústria, quer no comércio, quer na agricultura.
Chamou-se-lhes fôrças vivas, como se podia ter-lhes chamado qualquer outra causa; mas o que é certo é que são êsses os elementos de produção o de trabalho, e não vejo razão, por isso, para que estejamos todos os dias gritando contra êles.
O Sr. Manuel Fragoso: — É a lei das compensações. Também êles estão constantemente gritando contra nós.
O Orador: — Sr. Presidente: não vejo nas associações económicas todos os ele-
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mentos que fazem parte dessa classe; vejo apenas uma minoria dêsses elementos e a maioria não está lá por diversas circunstâncias; portanto êsses protestos não significam que se tivesse estabelecido um princípio do revolta entre os elementos que tinham sido atingidos pela colecta.
É lamentável que os elementos chamados contribuintes tivessem estabelecido uma acção de revolta contra o Parlamento. Nada há que impeça que o comerciante venda ou não queira vender os géneros do seu negócio, mas quem sofre é o público que tem as suas necessidades e não as pode satisfazer porque não pode adquirir os géneros de que precisa; quem sofre é o Estado que, podendo ter determinadas receitas, as não recebe.
O que se vê é que não é possível aplicar a lei quando os indivíduos procuram pelos meios que têm ao seu alcance fugir ao cumprimento da lei e, nesse caso, a lei é nula porque não produz efeito.
O que, deve, nestas condições, fazer o Estado? E conduzir a legislação para um certo e determinado caminho, de forma que o Estado arrecade as receitas do que necessita.
O projecto do Sr. Ferreira da Rocha teve por fim substituir a lei da selagem por um aumento de imposto de transacção. O imposto de transacção é um imposto anti-económico e nocivo; em lodo o caso, seria preferível isso ao que se fez, que é uma baralhada na vida económica do País.
A comissão de finanças procurou uma plataforma de maneira que o Estado pudesse fazer a cobrança do imposto, pelo menos aquele que lograsse obter.
Não teve a comissão de finanças parti pris contra ninguém nesta questão, pois apenas os seus membros exerceram a sua função de legisladores e como tais procuraram servir o País o melhor que souberam, sem o intuito do que essa proposta não fôsse para ser largamente apreciada pela Câmara.
De maneira que, atendendo-se às reclamações das classes interessadas e procurando manter-se a par, o Estado não perdesse de facto os elementos do receita indispensáveis para fazer face às suas necessidades.
Não me parece, pois, que o acto da comissão de finanças possa ser condenável.
A comissão cumpriu apenas um dever, uma vez que se limitou a desempenhar-se de um encargo do que se havia incumbido por determinação da Câmara. Felizmente não se podo dizer desta vez que a comissão de finanças, fugindo ao cumprimento do seu dever, foi negligente. Se a questão da selagem ainda se encontra por resolver, não podem as culpas do facto atribuir-se a essa comissão, mas sim à Câmara que naturalmente não teve o tempo necessário para a apreciar.
O Sr. Velhinho Correia que, digamos do passagem, é o único responsável por que esta questão se tenha levantado, defendeu com calor, é certo, na comissão do finanças, os seus pontos do vista, mas essa comissão entendeu e muito bem que os não devia perfilhar visto que, existindo já no imposto sôbre as transacções uma maior percentagem sôbre os artigos de luxo, nada justificava a sua inclusão num imposto de sêlo.
Mas depois, no Senado, osso princípio foi introduzido e no Congresso, por circunstâncias que se deram no momento, a emenda do Senado foi aprovada. A Câmara deve lembrar-se de que êsse facto levou, o Sr. Barros Queiroz a abandonar esta casa, sem vontade do aqui voltar.
Aproveito esto momento para, como amigo pessoal do Sr. Barros Queiroz, apresentar a S. Exa. as minhas homenagens e manifestar-lho, como membro da comissão de finanças, a minha tristeza pela resolução de S. Exa.
O Sr. Barros Queiroz foi, de facto, na comissão de finanças, uma pessoa que se manteve sempre numa linha inalterável, sendo de uma acção e dedicação extraordinárias.
S. Exa. na comissão de finanças esquecia-se sempre de que era partidário, para pensar que era um Deputado.
Apoiados.
A Câmara ouviu o discurso do Sr. Velhinho Correia e por certo recorda-se de que S. Exa. calculou a produtividade dêste imposto em 48:000 contos. Ora ou discordo dêste número.
Êste imposto, tal como está na lei, não sei se irá muito além dos 10 por cento da verba que S. Exa. indicou.
O orador é interrompido pelos Srs. Velhinho Correia e Portugal Durão que, simultaneamente, trocam explicações.
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O Orador: — Não sei que elementos S. Exa. tem para chegar àquele numero de 48:000 contos.
O Sr. Velhinho Correia: — Só a venda de estampilhas com a sobrecarga «Perfumarias», na Casa da Moeda, atingiu na segunda quinzena de Novembro a quantia de 2:000 contos.
O Orador: — Mas essas estampilhas não saíram directamente paru o consumidor. A Casa da Moeda não vende directamente ao público.
Se V. Exa. fôsse verificar à Casa da Moeda, indicar-lhe-iam lá que saíram tantos milhares do selos.
Êsses selos, porém, foram devolvidos para a Casa da Moeda e tomaram um caminho que V. Exa. sabe...
Partamos do principio do que à Casa da Moeda foram, com Afeito, requisitados êstes selos... Mas as Tesourarias em Lisboa não os requisitaram,
A maior parte dêles foi para fora.
Nunca se pode, portanto, fazer cálculo por êste número, porque, se êle representa a quantidade dos solos que saíram, de modo algum corresponde à quantidade consumida.
Quanto à questão das cervejas, S. Exa. citou números também e por elos teríamos um consumo anual, no país, de 90 milhões de garrafas de cervejas. Com esta base, se ela pudesse ser aceita, se os 90 milhões de garrafas fossem, com efeito, consumidos, teríamos que, mesmo incluindo as crianças, cada habitante consumiria em média 5 garrafas.
A cerveja consome-se em Lisboa, no Pôrto, nas praias e nas termas. Mas o número de pessoas que a consomem é muito limitado. Além disso, a cerveja tem hoje um preço tal que nem toda a gente se julga habilitada a matar a sêde com ela.
Julgo que o Sr. Velhinho Correia se referiu também aos vinhos do Pôrto. No próprio projecto S. Exa. encontra as razões que levaram a maior parte da comissão de finanças a pôr de lado os vinhos do Pôrto.
Na verdade, quando nós procuramos por toda a parte lá fora acreditar os nossos vinhos, não nos ficaria bem, vendendo-se no país apenas uma meia dúzia de garrafas de vinho do Pôrto, não seria lógico que fôssemos aplicar-lhe novos impostos, dando ao estrangeiro a ilusão de que procurávamos dificultar a sua produção. Quanto à questão que S. Exa. levantou, o projecto de S. Exa. visava apenas ao caso das aguardentes...
O Sr. Velhinho Correia (interrompendo):— E a reduzir a um têrço do litro o tipo das garrafas de cervejas, de harmonia com a tributação.
O Orador: — A base que V. Exa. apresentou era precisamente a mesma da comissão de finanças.
O que V. Exa. queria em aplicar isso à aguardente, é acoitar o princípio da cerveja e não tocar em mais nada, Mas creio que sôbre êstes pontos não houve verdadeiramente reclamações.
Sr. Presidente: o Sr. Alfredo de Sousa referiu-se ao imposto sobro os vinhos espumosos.
A comissão manteve a taxa que existia na lei; entendeu que a devia manter. No emtanto, S. Exa. produziu considerações que são de atender, o a Câmara resolverá dentro do melhor critério.
S. Exa. realmente, citou uns certos e determinados factos que demonstram, uma certa e determinada razão.
Não discuto, de facto, que a verba a aplicar aos vinhos espumosos não seja reduzida; êsse caso, porém, já não é com a comissão do finanças, mas com a Câmara e, por consequência, ela resolverá como melhor entender.
Sr. Presidente: feitas estas considerações, verifica-se que não se produziu ainda nesta Câmara até agora um ataque concreto, nem definido, ao projecto de lei apresentado pela comissão de finanças.
Apenas se produziram considerações que não podem colhêr, visto que são considerações gerais.
Conclui-se assim que a comissão de finanças, tendo procurado pelos meios ao seu alcance e satisfazendo às indicações da Câmara atender as reclamações das classes interessadas, ou seja daqueles contribuintes que entendiam que não podiam aceitar os princípios consignados na lei da selagem, cumpriu o seu dever.
Apoiados.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Portugal Durão: — Sr. Presidente: chamo a atenção do Sr. Velhinho Correia, a quem me quero referir.
O Sr. Velhinho Correia, referindo-se ao parecer da comissão de finanças, declarou que a maioria dos seus membros tinha assinado vencida o respectivo parecer, quando na verdade assim não é.
O assunto foi devidamente estudado, artigo por artigo, em três longas sessões, e devo dizer, em abono da verdade, que há muito tempo que não é apresentado nesta Câmara um parecer, sôbre assunto desta natureza, com unanimidade de vistas; sendo a comissão composta do onze membros, apenas seis assinaram com declarações, conforme posso demonstrar.
O Sr. Viriato da Fonseca assinou o parecer com declarações; o Sr. Velhinho Correia vencido, o Sr. Ferreira de Mira vencido em parto, o Sr. Pinto Barriga vencido em parte, o Sr. Ferreira da Rocha vencido na rejeição do projecto que apresentou e o Sr. Carvalho da Silva vencido. Quere dizer que, de onze membros de que se compõe a comissão do finanças, apenas dois assinaram o parecer vencidos: sendo um o Sr. Velhinho Correia, que já deu à Câmara explicações sôbre o assunto, e o outro o Sr. Carvalho da Silva, que naturalmente não deixará de dar também explicações à Câmara.
Eram estas, Sr. Presidente, as explicações que eu desejava dar à Câmara para mostrar a sem razão do Sr. Velhinho Correia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: desejo confirmar absolutamente o que acaba de ser dito pelo Sr. Portugal Durão, o que aliás não é para admirar, lamentando apenas que V. Exa. interpretasse de maneira diferente as palavras que pronunciei.
Sinto apenas que o projecto não corresponda às necessidades respeitantes à questão da selagem.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: reservava-me para explicar o meu voto quando usasse da palavra sôbre a matéria em discussão.
Mas, como o Sr. Portugal Durão, ilustre presidente da comissão de finanças, disse que eu era um dos membros dessa comissão que tinham assinado vencido, vou explicar-me.
Sr. Presidente: assinei vencido porque de forma nenhuma posso concordar com a doutrina seguida pela Câmara, de que se não deve atender à capacidade tributária do contribuinte.
O Sr. Presidente (interrompendo). — Devo dizer a V. Exa. que estava inscrito para usar da palavra a seguir ao Sr. Ferreira da Rocha.
V. Exa., agora, tem apenas a palavra para explicações.
O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo):— Peco a V. Exa., Sr. Presidente, a prioridade das explicações, porque vários Srs. Deputados se referiram a mim. Ou há Regimento ou não há Regimento!
O Sr. Presidente: — Dei a palavra ao Sr. Carvalho da Silva, no cumprimento do Regimento.
O Orador: — Sr. Presidente: eu não quis escalar a palavra.
O Sr. Ferreira da Rocha não tem razão nenhuma e, se assim fala, é porque, certamente, não ouviu o Sr. Portugal Durão.
O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo): — Não pedi a palavra para explicações, porque sei que estas ó de uso referirem-se unicamente a actos ocorridos durante a discussão e V. Exa. ainda não usou da palavra.
Verifica-se, pois, que o Sr. Carvalho da Silva está falando por meio de uma habilidade. Registo.
O Orador: — Lamento que o Sr. Ferreira da Rocha me considere capaz de usar de processos dessa natureza.
Eu fui chamado a dar explicações, pelo Sr. Portugal Durão, e neste momento apenas quero dizer a razão por que assine vencido.
Fi-lo porque entendo que o contribuinte já paga mais do que devia pagar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. Presidente; desejo justificar, em primeiro lugar, a interrupção que fiz ao Sr. Carvalho da Silva, e a foi mu como mo referi a V. Exa. por virtude da marcha dos trabalhos.
Não o fiz, por ser V. Exa. o Prosidente, e por ser o Sr. Carvalho da Silva o Deputado em questão.
Sempre nesta Câmara tenho protestado contra a forma de escalar a inscrição, por meio do pedido da palavra para explicações.
O Regimento é categórico.
Diz que a palavra para explicações pode ser pedida no decurso do qualquer debate, e os Deputados que dela usarem apenas se poderão referir a incidentes ocorridos durante a discussão.
Não encontro no Regimento nenhuma prioridade no pedido do palavra para explicações, e agradecerei qualquer informação do V. Exa.
O Sr. Presidente: — O Regimento diz «a seu tempo».
O Orador: — Desculpe-me V. Exa., mas «a seu tempo» é na altura em que pela inscrição lhe competir a palavra.
Somente o Regimento, referindo-se ao libo da palavra para explicações, permite que o Deputado, tendo falado já todas as vozes, use ainda da palavra para explicações. Mais, nada.
Sr. Presidente: como o tempo que mo resta no decurso desta, sessão é bem pouco para responder a todas as considerações do Sr. Velhinho Correia e até mesmo para justificar a minha assinatura de «vencido em parte» no parecer que a comissão do finanças apresentou, quero reservar-me para, somente tratar da questão no ponto de vista em que foi colocada polo Sr. Joaquim Ribeiro e em que parcialmente ela foi apresentada á Câmara pelo Sr. Velhinho Correia.
Trata-se, segundo o primeiro dêstes parlamentares, em parte, na opinião do segundo, de uma questão em que aparecem as fôrças vivas do um lado e o Parlamento do outro, numa luta que é preciso resolver pela vitória de urna parte ou da outra.
Sr. Presidente: como Deputado, recuso-me a encarar a questão nesses termos.
Apoiados.
Não aceito, como Deputado, que eu tenha de estar colocado na posição de vencer ou ser vencido pelas fôrças vivas. É-me absolutamente indiferente que as fôrças económicas dêste país aplaudam ou reprovem o m ou procedimento quando eu estiver convencido de que cumpro o meu dever de parlamentar, quando eu estiver convencido de, que cumpro o meu dever do representante da Nação. Quando se desenha um conflito de interêsses, porventura entre a forma como uma lei pode e devo ser executada o a maneira como os interessados entendem que à prática deve ser levada, o meu dever é procurar evitar Osso conflito, vendo onde assiste razão suficiente para que eu seja levado a modificar ou não os termos da lei em vigor, objecto do reclamações. É êsse o meu dever.
Ninguém podo legislar contra direito, nem contra as conveniências da Nação.
Se em qualquer altura eu entender que unia lei contém preceitos cuja aplicação é inconveniente, Cuja execução origina dificuldades, quer para, o País, quer para o regime político que sirvo, julgar-mo, hei no dever de procurar conseguir a modificação dessa lei, quer soja ou não exigida por quaisquer classes.
De forma nenhuma, porém, eu aceitarei o critério de que ou vencem aqueles ou vencemos nós. Não somos pugilistas em luta. Não acoito desafios do fôrças económicas e não há ninguém que mo possa colocar na posição de desafiado nesta matéria.
Referiu-se ainda o Sr. Joaquim Ribeiro a ataques do jornais a parlamentares pelo facto de terem omitido tal ou tal opinião. Julgo absolutamente censuráveis êsses ataques, porque entendo que cada Deputado está no direito e no dever do defender perante o Parlamento a opinião de que se convença ser a melhor, mas também não entendo que êsses ataques possam constituir razão para modificar a minha atitude para com o problema ou para com os interessados na questão. Jornais? Santo Deus!
Também a mim me têm atacado barbaramente nesta questão. Ainda há pouco tempo li no jornal A Verdade uma entre-
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vista em que o Sr. Carlos de Oliveira, um dos magnates das fôrças económicas, afirmava que o problema no Parlamento, sob o ponto do vista dos interêsses dos operários em causa, havia sido defendido exclusivamente pelo Sr. Carvalho da Silva, o qual ato então não tinha usado da palavra senão por apartes.
Eram assim apontados todos os Deputados à indignação, às iras, à revolta das classes populares que estavam sem trabalho em virtude da existência desta lei ou da forma da sua aplicação.
Nem por êsse motivo, apesar da forma injusta de apreciar os factos, eu mo sinto obrigado a concordar monos do que até então com as reclamações então publicadas pelo Sr. Carlos de Oliveira.
Mais ainda. Êsse papel que se publica em Lisboa com o título Correio da Manhã atribui-me, diariamente, a paternidade daquele abôrto que o Sr. Ministro das Finanças deu à luz da publicidade o que ô o novo regulamento da lei da selagem.
Apesar disso, apesar de êsse papel todos os dias mo atribuir tal responsabilidade e o fazer com a mais evidente má fé, achando-se ligado às fôrças económicas, que para si procura captar uma repugnante propaganda eleitoral, eu não mo sinto na obrigação de concordar menos ou mais com as reclamações que os interessados vinham apresentando.
Fiz estas declarações para que, de uma. vez para sempre, a Câmara se convença de que ninguém tem aqui o direito de tomar tal ou tal atitude pelo facto de outrem, em qualquer outro lugar, desafiar os Deputados a que vençam ou sejam vencidos.
O nosso dever de Deputados é encarar o problema, tomando .conhecimento das reclamações apresentadas e da razão que a uns ou a outros pode assistir.
Como políticos, porque políticos somos, devemos proceder, nesta matéria, indo até onde os interêsses da República que servimos reclamar a nossa intervenção.
E isto que eu faço, indiferente me sendo que qualquer jornal entenda que do meu procedimento podo tirar conclusões para me atacar ou aplaudir.
Sr. Presidente: referiu-se ainda o Sr. Velhinho Correia à produtividade do impôsto, para dês do logo pôr a claro a impossibilidade da continuação da inspecção,
visto que não se criava receita compensadora para a deminuição que da atitude da Câmara resultasse no produto do imposto.
Sr. Presidente: o Sr. Velhinho Correia contradisse-se logo a seguir, mandando para a Mesa um projecto em que êle próprio propôs a redução da taxa na tributação das garrafas de cerveja.
Efectivamente, não sendo as cervejas engarrafadas senão em garrafas do um têrço do litro e tributando-as pela taxa das garrafas do meio litro, resulta necessàriamente da aprovação do projecto de S. Exa. uma deminuição de receita; e no emtanto S. Exa. havia afirmado aqui que um projecto que trouxesse deminuição de receita não podia sequer ser admitido na Mesa.
O Sr. Presidente (interrompendo): — Lembro a V. Exa. que tem apenas cinco minutos na sessão de hoje para terminar as suas considerações, a não sor que prefira ficar com a palavra reservada.
O Orador:—Nesse caso peço a V. Exa. que me reserve a palavra para a próxima sessão)]
Tenho dito por agora.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Não ó verdade o que o ilustre Deputado que acaba de usar da palavra afirmou.
Em primeiro lugar, há muito tempo que não encontro o Sr. Carlos de Oliveira, e em segundo lugar, quando usei da palavra sôbre êste assunto, enviei para a Mesa uma proposta suspendendo certas disposições da lei n.° 1:633, proposta que foi contrariada por todos os lados da Câmara.
Referiu-se depois S. Exa. a um jornal que classificou de nojento papel...
O Sr. Ferreira da Rocha: — Eu não lhe pus o nojento; se V. Exa., no emtanto, acha que está bem...
O Orador: — Porque nesse momento figurava na cabeça dêsse jornal o nome de uma pessoa para mim muito querida, eu quero declarar que tudo quanto nesse jornal se disse a respeito desta questão
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foi escrito por mim, e não polo morto querido, cuja memória ou hei-de sempre respeitar.
Nunca nosso jornal se disse que o Sr. Ferreira da Rocha havia sido o autor do regulamento mandado publicar pelo Sr. Ministro das Finanças.
O que ali se disse foi que o Sr. Ferreira de Rocha havia cometido um êrro de tática, êrro que havia permitido ao Sr. Ministro das Finanças a publicação dêsse regulamento.
O Sr. Ferreira da Rocha: Só foi V. Exa. o autor de tudo quanto se escreveu nosso jornal, ou V. Exa. não se lembra já do que escreveu, ou alguém mais escreveu som V. Exa. saber.
O Orador: — V. Exa. está com certeza equivocado.
V. Exa., por um êrro de argumentação, colocou o Sr. Ministro das Finanças na obrigação do publicar aquele diploma, pois que o Sr. Ministro declarou numa entrevista, vinda a lume na imprensa, se a memória mo hão falha, que tinha publicado o regulamento por uma imposição parlamentar, em consequência da moção que tinha aqui sido votada.
O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo): - Para mostrar a V. Exa. que não estou equivocado, vou ler à Câmara algumas passagens de uns artigos que aqui tenho.
Leu trechos vários do «Correio da Manhã».
O Orador: - Sr. Presidente: o que se vê é que o Sr. Ferreira da Rocha, se bem que já aqui tivesse dito que não era leitor do Correio da Manhã, e é ao ponto de guardar os artigos que nele se publicam, com o que muito folgo.
De resto, Sr. Presidente, S. Exa. não veio senão demonstrar que aquilo que eu disse é puramente a verdade.
O Sr. Ministro das Finanças foi colocado na situação de publicar o regulamento por uma imposição parlamentar, conforme S. Exa. foi o próprio a declarar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Pinto Barriga: — Sr. Presidente: desejava chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para um requerimento, feito pela polícia do informação, sôbre o pagamento de transportes em carros.
Em quanto as outras policias se fazem transportar gratuitamente, esta não tom semelhante regalia; e, porque me parece do todo o ponto justa a reclamação formulada, peço para ela a atenção de V. Exa.
Tenho dito.
O Orador não reviu.
O Sr, Ministro das Finanças (Pestana Júnior): — Ouvi as considerações do Sr. Pinto Barriga, e devo dizer que, quando a reclamação dêsses serventuários do Estado me fôr apresentada, estudá-la hei com atenção e procederei conforme fôr do justiça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão, é amanhã, às 14 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia:
A do hoje.
Parecer n.° 190, que cria o Montepio dos Sargentos de Terra e Mar.
Parecer n.° 124, que estabelece a antiguidade dos sargentos nomeados para empregos públicos.
Ordem do dia:
A de hoje menos o parecer n.° 196.
Parecer n.° 799,. que cria na freguesia de Barcarena uma assemblea eleitoral.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 40 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Projecto do lei
Do Sr. Deputado Pinto Barriga, concedendo aposentação extraordinária, com os vencimentos o melhorias correspondentes,
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ao fiscal das oficinas e depósitos da Cadeia Nacional de Lisboa, Joaquim Quaresma de Moura, e ao guarda de 1.ª classe, Joaquim Baú.
Para o «Diário do Governo».
Instalação de comissão
Instrução especial e técnica:
Presidente o Sr. Augusto Pereira Nobre.
Secretário o Sr. Luís da Costa Amorim.
Para a Secretaria.
O REDACTOR — Avelino de Almeida.