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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.° 15

EM 14 DE JANEIRO DE 1925

Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva

Sumário. — Abre a sessão com a presença, de 62 Srs. Deputados,

É lida a acta, que adiante se aprova com número regimental.

Dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Sebastião Herédia insta pela discussão do parecer referente a estradas.

O Sr. Hermano de Medeiros troca explicações com a Mesa acerca de documentos que há muito requereu pelo Ministério da Instrução.

O Sr. Sousa da Câmara trata da discussão do projecto das estradas.

É interrompida a sessão por não estarem presentes os Ministros por cujas pastas correm os assuntos mareados para antes da ordem do dia.

Reaberta a sessão, o Sr. Ministro do Trabalho (João de Deus Ramos) apresenta uma proposta de lei, para que pede a urgência e dispensa do Regimento, de empréstimo para as obras do Manicómio Miguel Bombarda.

É aprovada, com dispensa da última redacção, depois de usarem da palavra os Srs. Nuno Simões, Carvalho da Silva e Ministro.

É aprovado o parecer n.° 729 — integrando na Direcção Geral dos Hospitais Civis e Militares os serviços de reconstituição dos mutilados, estropiados e sinistrados.

Ordem do dia. — É aprovada a acta.

Prossegue a discussão do parecer n.° 843 — selagem.

O Sr. Ferreira da Rocha, que ficara com a palavra reservada, conclui o seu discurso, seguindo-se o Sr. Carvalho da Silva, que não conclui o seu discurso.

Antes de se encerrar a sessão — O Sr. António Correia produz considerações sôbre a situação de funcionário. do Comissariado dos Abastecimentos.

Responde o Sr. Ministro das Finanças (Pestana Júnior).

Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Instalação da comissão de agricultura.— Ultima redacção.— Projectos de lei. — Um parecer.— Um requerimento do Sr. Daniel Rodrigues.

Abertura da sessão, às 15 lioraa e 38 minutos.

Presentes à chamada, 52 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 64 Srs. Deputados.

Presentes à chamada:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Torres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Artur Brandão.
Artur Rodrigues do Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Domingos Leite Pereira.
Ernesto Carneiro Franco.

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2 Diário da Câmara aos Deputados

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Germano José de Amorim.
Hermano José do Medeiros.
Jaime Júlio de Sousa.
João do Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João de Sousa Uva.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Júlio Henrique de Abreu.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Pedro Gois Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Heródia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Orneias e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Alfredo Ernesto do Sá Cardoso.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo do Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínia do Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugênio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constando de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim Costa.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro;
Jaime Pires Cansado.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira Salvador.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirílo Lopes Leitão.
Mário Moniz Pamplona liamos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nuno Simões.
Vasco Borges.
Viriato Gomes da Fonseca.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Leio Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Rodrigues Gaspar.

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Amaro Garcia Loureiro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Mendonça.
António de Sousa Maia.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugênio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Jaime Duarte Silva.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João Vitorino Mealha.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.

Leu-se a acta e o seguinte

Pelas 15 horas e 35 minutos, com a presença de 52 Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.

Representação

Da Associação dos Lojistas Barbeiros o Cabeleireiros de Lisboa, pedindo a imediata discussão do parecer n.° 598.

Para a comissão de finanças.

Ofícios

Do Ministério do Interior, para ser incluída no orçamento dêste Ministério a verba de 6.343$, sob a rubrica «Exercícios findos», para pagamento da publicação do relatório sôbre emigração e administração policial, elaborado pelo Sr. João Lopes Carneiro de Moura, por ocasião do Congresso de Viena de Áustria.

Para a comissão do Orçamento.

Do Centro Comercial do Pôrto, para que seja submetido ràpidamente à apreciação da Câmara o parecer da comissão de finanças sôbre selagem de bebidas engarrafadas e perfumarias.

Para a Secretaria.

Telegramas

Das Associações Comerciais da Póvoa de Varzim, Torres Vedras, Santarém, Leiria, Vila do Conde, Évora, Figueira da Foz, o Associação dos Revendedores de Víveres da Póvoa de Varzim, perfilhando a representação da Associação Comercial de Lisboa sôbre a lei do sêlo nas bebidas o perfumarias.

Para a Secretaria.

Do presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal do Pôrto e de uma comissão de munícipes, protestando contra o telegrama da Companhia Carris de Ferro do Pôrto, ontem lido na Câmara.

Para a Secretaria.

Dos sargentos do cavalaria n.° 8, pedindo a discussão do parecer sôbre Montepio dos Sargentos.

Para a Secretaria.

Requerimento

De João Rodrigues Donato, tenente--coronel médico, reformado, pedindo a substituição do § único do artigo 32.° da lei n.° 1:039.

Para a comissão de guerra.

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4 Diário da Câmara dos Deputados

Antes da ordem do dia

O Sr. Sebastião Herédia: - Eu desejava falar na presença do Sr. Ministro do Comércio, mas pelo que vou dizer entendo que posso falar sem S. Exa. estar presente.

Eu tenho por S. Exa. a maior consideração, e sei a muita competência de S. Exa. para o alto cargo que exerço, mas o facto ó que S. Exa. até hoje nada tem produzido.

É preciso pensar a sério na construção e reparação do estradas, Todos os Ministros que têm passado por êsse lugar, e desde há muitos anos, têm prometido grandes obras, mas nem sequer reparações se tom feito.

Depois fala-se em alienação da propriedade.

O Sr. Nano Simões (interrompendo) : — Eu já passei por êsse lugar, e a que a Câmara nada se importa com o assunto. Cada um, isolado, mostra muito boa ventado, mas em conjunto nada fazemos; a Câmara não quere.

O Orador: — Eu roqueiro a V. Exa. para entrar imediatamente em discussão o projecto referente às estradas.

Apoiados.

O orador não reviu, nem o Sr. Nuno Simões fez a revisão do seu «àparte».

O Sr. Presidente: — O requerimento de V. Exa. será apreciado na devida altura.

O Sr. Hermano de Medeiros:- Sr. Presidente: há meses, muitos, já lho perdi a couta, requeri pelo Ministério da Instrução documentos que até hoje não mo foram enviados. Desejava que V. Exa. mo informasse o que há a tal respeito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — O primeiro requerimento de V. Exa. foi expedido em 19 do Fevereiro do ano passado, e o segundo em 9 de Dezembro, mas não veio resposta.

O Sr. Hermano de Medeiros: — Peço a V. Exa. para renovar a minha instância.

O Sr. Presidente: — Peço a V. Exa. para, mandar para a Mesa por escrito, a sua insistência, por êsses documentos.

O Sr. Sousa da Câmara: - Parece-me que há um requerimento do Sr. Sebastião Herédia, para votar sôbre o projecto das estradas.

Não sei se V. Exa. ouviu.

O Sr. Presidente: — Eu já disse que êsse requerimento seria apreciado na devida altura.

Pausa.

O Sr, Presidente: — Como não está presente nenhum Ministro para só entrar na discussão do projectos que lho dizem respeito, interrompo a sessão.

Eram 16 horas.

Reabertura da sessão, ás 16 horas e 30 minutos.

O Sr. Ministro do Trabalho e Previdência Social (João de Deus Ramos): — Vou mandar para a Mesa uma proposta do lei, autorizando o levantamento duna empréstimo de 4:000 contos, destinado a continuar a construção do Manicómio Miguel Bombarda. Com êsse fim será inscrita a verba respectiva no Orçamento.

Inscrevendo-se no Orçamento do Ministério do Trabalho essa verba, vai concluir-se com a maior urgência o edifício, que é de muita conveniência B açodo-se pelas respectivas obras à crise do trabalho, que, no que diz respeito a construção civil, precisa ser imediatamente debelada por uma forma prática.

Peço urgência o dispensa do Regimento para a proposta de lei.

O Sr. Presidente:— O Sr. Ministro do Trabalho mandou para a Mesa uma proposta do lei, pedindo autorização para o Govêrno contrair um empréstimo de 4:000.000$, destinado à construção do Manicómio Miguel Bombarda, o pede a urgência o «dispensa do Regimento. Consulto a, Câmara sôbre a urgência e dispensa do Regimento.

A Câmara, aprovou a urgência e dispensa do Regimento.

A proposta é a seguinte:

Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a contrair, pelo Ministério do Trabalho, um

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empréstimo até a quantia do 4:000.000$, destinado à conclusão do novo Manicómio do Lisboa, amortizável no prazo de cinco anos, não podendo a anuidade da amortização e o respectivo juro exceder a quantia de 1:055.190$, que substituirá no orçamento da desposa cio Ministério do Trabalho a verba inscrita para despesas de pessoal, material e outras relativas à construção do aludido estabelecimento hospitalar.

Ar t. 2.° A comissão administrativa da construção do novo Manicómio do Lisboa levantará o empréstimo em conta corrente e prestará contas directamente ao Conselho Superior de Finanças das importâncias que receber, bem como das despesas que realizar com o produto do empréstimo nas obras, sua direcção e fiscalização.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das sessões da Câmara dos Deputados, em 14 de Janeiro de 1925.— O Ministro das Finanças, Manuel Gregário Pestana Júnior — O Ministro do Trabalho, João de Deus fiamos.

O Sr. Presidente: — Está em discussão na generalidade.

O Sr. Nuno Simões: — Sr. Presidente: a proposta do lei do Sr. Ministro do Trabalho, a que acabo de dar o meu voto, para ser discutida com urgência e dispensa do Regimento, destina-se a atenuar a crise de trabalho, mas o Sr. Ministro propõe-se resolver êsse objectivo, procurando concluir uma obra reputada do utilidade absoluta, reforçando uma verba do Orçamento e não aumentando de um modo considerável os encargos do Tesouro.

Simplesmente o Sr. Ministro do Trabalha poderá ter do vir a reconhecer que os seus bons propósitos e a sua bela intenção não corresponderam aos factos o que a crise do trabalho melhor seria atenuada procurando abrir na província trabalhos públicos, sobretudo caminhos do ferro o estradas, de que o País tanto precisa, porque êsses trabalhos e obras serão o melhor meio de descongestionar e dispensar aqueles que, a pretexto de crise de trabalho, muitas vezes o que procuram, é disfarçar a sua pouca vontade de trabalhar.

Dando o meu voto à proposta do lei do Sr. Ministro, desejo que se não verifique o meu receio.

Entendo que o problema da crise do trabalho não podo ser encarado parcelarmente, isoladamente. O Govêrno tem de o encarar como sondo uma manifestação da formidável crise económica que o País atravessa (Apoiados), e por isso o Govêrno tem de preocupar-se com o problema em toda a sua complexidade.

Há semanas o Sr. Ministro do Comércio, interrogado na Câmara, declarou-se embaraçado, por si o pelo Govêrno, para definir o critério ministerial perante a crise de trabalho e, declarando-se embaraçado, o Sr. Plínio Silva afirmou que seria prejudicial o ruinoso empregarem-se em determinadas obras operários cuja capacidade, cuja técnica profissional indicam que nessas obras se não utilizam e cujo rendimento do trabalho em caso nenhum pode corresponder às necessidades o encargos que essas obras podem representar.

Apoiados.

Entendo que o Govêrno não podo deixar de interessar-se por êste assunto. A crise de trabalho é apenas um aspecto da crise que a indústria está atravessando.

Quando me ocupei dêste assunto tive ensejo do afirmar que era difícil ao Govêrno, como anunciara, ocorrer e obviar aos encargos, desvantagens e dificuldades do toda a ordem provenientes da crise que se está revelando.

Faço justiça às boas intenções, não só do Sr. Ministro do Trabalho como do todo o Govêrno.

Entendo, porém, que tudo quanto seja adiar a solução do problema que o Sr. Ministro do Trabalho se propõe resolver em parte, supondo que a melhoria cambial tem só os aspectos que se1 prestam ao elogio dos amigos o não aqueles que conduzem às censuras justificáveis das pessoas serenas e imparciais, será agravar o problema e não resolvê-lo.

Estou por isso certo de que o Govêrno, se quiser considerar devidamente êste problema, há-de pronunciar-se sobro êle por factos que não definam apenas soluções parcelares, mas sim examinando de perto a crise de trabalho nos núcleos industriais, som exibições desnecessárias,

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mas com aquele, desejo do acertar, que é sou timbre.

Que não passe esta oportunidade sem que se façam as afirmações que são necessárias lazer para que o Govêrno tomo as providencias indispensáveis, não só para assistir .10 operário som trabalho, mas ainda para atacar a questão nos seus aspectos mais fundamentais, quais sejam o industrial e o da produção agrícola que estão neste momento atravessando uma crise gravíssima.

Votando esta lei do Sr. Ministro do Trabalho, estou convencido do que a Câmara afirmará o sou desejo de que o Govêrno encare a questão económica que o problema comporta e que tem de ser resolvida sem platonismos nem mirabulân; das, mas sim conforme as realidades.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as natas taquigráficas que lha foram enviadas.

O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: começam a aparecer as consequêcias da vida de expedientes que caracterizam a administração republicana, consequências que derivam do facto de os Governos da República se alhearem por completo da situação económica do país.

O Sr. Nuno Simões acabou há pouco de apreciar, e muito bem, as cansas da nossa situação actual. Todos nós reconhecemos efectivam ente que um dos primeiros factores da normalizarão da nossa vida resido na melhoria cambial, Mas não podemos deixar do «conhecer tambem, que uma melhoria cambial realizada precipitadamente, sem ter havido a precaução de combater as origens da depreciação da moeda, só pode dar lugar a flutuações cambiais momentaneamente ilusórias, e que são ainda piores do que a estabilizarão do câmbio numa divisa embora agravada.

Aparte do Sr. Velhinho Correia que não se ouviu.

O Orador: — O Sr. Velhinho Correia ainda ontem preconizou que o único processo prático e eficaz de melhorar o câmbio e embaratecer a vida era o agravamento dos impostos. Todos nós conhecemos a atitude que o Sr. Velhinho Correia tem tido nesta Câmara, bom como o facto de S. Exa. fàcilmente bo sugestionar pelas virtudes do agravamento tributário, que tem caro está custando ao País. A melhoria cambial, absolutamente alheia aos fenómenos económicos, há-de acarretar para o Estado um formidável aumento do sou déficit.

Já começámos a sentir-lhe os efeitos, e lamentável é que, quer êste Govêrno, quer o anterior, não tivessem enfrentado como deviam o magno problema da crise do trabalho.

Não seremos nós, pois, dêste lado da Câmara, quem vá embaraçar a rápida aprovação das medidas indispensáveis para arrancar algumas dezenas de milhares de operários à forno que os ameaça. Temos, porém, o direito de exigir que o dinheiro que o Estado vai gastar na solução dêste problema seja aplicado proveitosamente, devendo começar-se, como muito bom acentuou o ilustro Deputado Sr. Nuno Simões, por acudir ao estado em que se encontram as estradas, nalguns pontos verdadeiramente intransitáveis.

No que diz respeito à crise da construção civil, também é muito de lamentar que o Govêrno não tenha um plano próprio, que não copie, pelo menos, o que na legislação estrangeira se encontra em todos ou quási todos os países, O problema da habitação vai-se dia a dia agravando.

É indispensável estudarmos medidas que acudam à situação aflitiva em que se encontra a população do pais pela falta de casas.

Impunha-se e impõe-se, pois, Sr. Presidente, que o Sr. Ministro do Trabalho, de acordo com o Sr. Ministro do Comercio, aqui trouxessem qualquer proposta no sentido de que o dinheiro, as verbas que vão despender-se para acudir à crise de trabalho fossem empregadas, como lá fora se faz, em prémios de construção, o que tiraria ao Estado a missão, que êle não deve ter do maneira alguma, de mandar construir casas por sua conta, o evitaria alguma repetição vergonhosa do caso dos Bairros Sociais.

Isso daria simultaneamente à iniciativa particular o incentivo necessário e viria, porventura, remediar a crise de habitação com que luta a população do país. Não quero alongar-me em mais considerações.

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Não deixo de reconhecer a existência da crise de trabalho. Mas, antes de terminar, eu chamo novamente a atenção do Sr. Ministro do Trabalho para as minhas palavras, convencido de que S. Exa. não deixará de trazer a esta Câmara quaisquer medidas tendentes a solver a situação.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Trabalho (João de Deus Ramos): — Sr. Presidente: quero apenas dizer duas palavras para responder aos Srs. Nuno Simões o Carvalho da Silva.

Ao primeiro devo dizer que estou de acordo em que a crise de trabalho é consequência da crise de indústria e que o problema tem, pois, de ser encarado segundo êste princípio. Porém, a crise de indústria tem de ser encarada de maneira especial, porque, como S. Exa. sabe, cada uma tem a sua modalidade. E também de harmonia com esta base que eu tenho realizado os meus estudos.

Pelo que respeita à construção civil, eu julgo poder atenuar, pelo menos, a crise que lavra em Lisboa sobretudo, problema que de facto é da maior urgência. Além disso, eu sei que a Caixa Geral de Depósitos tem aberto um crédito destinado ao acabamento de edificações, e os particulares poderão recorrer a êsse crédito.

Em relação a cada uma das indústrias, não é oportuno fazer agora exposição do que penso e do que constitui ainda o esboço dum estudo que eu estou fazendo e diligenciando por que seja eficaz.

Em resposta ao Sr. Carvalho da Silva, devo dizer que a República não utililizou esta solução como um expediente, mas que unicamente quere a conclusão duma obra que ó urgente se acabe. Já no orçamento figuraram creio que uns 720 contos destinados a esta obra, mas que eram insuficientes para a sua conclusão e para o aproveitamento de mais braços.

Parece-me, Sr. Presidente, que a minha proposta merece a atenção da Câmara, e por isso tive a audácia, permita-se-me o termo, de pedir para ela a urgência e dispensa do Regimento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi aprovada a proposta em discussão, na generalidade, quer na especialidade.

O Sr. Maldonado de Freitas: — Requeira a dispensa da leitura da última redacção.

Foi aprovado.

O Sr. João Luís Ricardo (para um requerimento) — Requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o parecer n.° 729, que está marcado na ordem do dia.

Submetido à apreciação da Câmara, foi aprovado.

Seguidamente foi lido e aprovado na generalidade.

Parecer n.° 729

Senhores Deputados. — A proposta n.° 723-A procura integrar na Direcção Geral dos Hospitais Civis de Lisboa os serviços de assistência e do reconstituição funcional e profissional dos mutilados e estropiados de guerra e dos sinistrados do trabalho, que a lei n.° 1:516, de 18 de Dezembro de 1923, colocara no Instituto de Seguros Sociais Obrigatórios e de Previdência Geral.

Como claramente assinalam os considerandos da referida proposta, a colocação dêstes serviços nos hospitais civis, sem prejudicar a sua finalidade, evita a criação dentro deles de outros serviços da mesma natureza.

Trata-se, pois, da aplicação do princípio de concentração dos recursos da mesma ordem de actividade que, em nosso entender, devia ser intensamente realizada em todos os ramos da nossa administração pública.

A sua adopção evita em primeiro lugar uma duplicação de despesa, para manter o exercício duma mesma função.

Doutra parte previne uma dispersão de esfôrços e de capacidades que por aí esteriliza e incapacita tantos dos mais essenciais ramos dos serviços públicos.

Por isso a vossa comissão de saúde pública e assistência, vos recomenda a sua rápida aprovação.

Lisboa, 21 de Maio de 1924. — Joaquim Serafim de Barros — João Damas — F. Dinis de Carvalho — Alberto Jordão — João Camoesas, relator.

Proposta de lei n.º 723 - A

Senhores Deputados. — Considerando que o artigo 72.° do decreto com fôrça de

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lei n.º 4:563, do 9 do Julho do 1918, prevê a criação nos Hospitais, Civis de Lisboa de serviços do fisioterapia, a saber: electroterapia e electrodiagnóstico, fotograpia e finsentorapia, constituindo uma secção de serviços; do hidroterapia, hélio terapia, mecanoterapia, maçngens, gimnâstica módica e ortopedia, constituindo outra secção;

Considerando que, paralelamente, a lei n.° 1:516, do 18 de Dezembro do 1923, dispõe quanto ao funcionamento do serviços da mesma natureza destinados à assistência e reconstituição funcional o profissional dos mutilados e estropiados de guerra t; sinistrados do trabalho, sob a direcção e administração do Instituto do Seguros Sociais Obrigatórios o de Previdência Geral;

Considerando que, uma vez criados os serviços a que se refere o citado artigo 72.º, a reeducação funcional o profissional dos mutilados e estropiados do guerra o sinistrados do trabalho pode ser feita nos hospitais civis;

Considerando que há urgente necessidade da criação de tais serviços, não só para aquelas duas classes de acidentados, mas ainda para aqueles que, não sondo mutilados do guerra, nem acidentados do trabalho, carecem de tratamento para a sua reconstituição funcional e profissional;

Considerando que a execução simultânea daquele decreto e da lei n.º 1:516 importa uma duplicação de serviços o consequentemente de despesas;

Considerando ainda que tais serviços tom um aspecto técnico e de assistência o que dentro do Instituto não funciona qualquer organismo a que se possa confiar a direcção técnica dos mesmos serviços, emquanto que a Direcção dos Hospitais, a par da competência técnica que possui, exerce funções do assistência;

Considerando que, nos termos expostos, o que se impõe ó a integração dos serviços o funções, previstos na lei n.° 1:516, na direcção dos hospitais civis:

Tenho a honra de propor à esclarecida, apreciação de V. Exas. a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° Os serviços de assistência e de reconstituição funcional e profissional dos mutilados o estropiados de guerra e dos sinistrados de trabalho com o respectivo material, que pela lei n.° 1:516, de 18 do Dezembro de 1923, transitaram para o Instituto de Seguros Sociais Obrigatórios e de Providencia Geral, ficam integrados na Direcção Geral dos Hospitais Civis de Lisboa, nos termos previstos na referida lei.

Art. 2.° O Govêrno promulgará os regulamentos necessários para a execução da presente lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 12 de Maio de 1924. — Júlio Ernesto da Lima Duque, Ministro do Trabalho.

Foram aprovados os artigos 1,°, 2.° e 3,° (na especialidade).

O Sr. João Luís Ricardo: — Requeiro a V. Exa. a dispensa da leitura da última redacção.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia.

Foi aprovada a acta.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer N.º 843 (selagem)

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Ferreira da Rocha.

O Sr. Ferreira da Rocha: - Sr. Presidente: ontem, antes de se encerrar a sessão, o Sr. Carvalho da Silva, pedindo a palavra para se referir a considerações que ou tinha feito, creio que sobro uma publicação inserta no jornal O Correio da Manha, afirmou que eu tinha sido injusto, e a tal ponto se mostrou emocionado que foi rememorar a idea de um morto ilustro e querido, que naquele jornal trabalhara para, porventura, sob a impressão de um sentimento lançado na Câmara, querer mostrar haver incorrecção no meu procedimento anterior.

Devo dizer ao Sr. Carvalho da Silva que não tenho de ter conhecimento de quem escreve nos jornais para me referir aos artigos que neles são publicados.

É bom relembrar que eu não tenho

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procurado discutir propositadamente o jornal O Correio da Manhã.

Tenho, a título de incidente, somente feito referência às palavras que o Sr. Joaquim Ribeiro ontem aqui pronunciou para afirmar que nenhum eputado tinha o dever de se considerar obrigado a tal ou qual procedimento em face dos ataques que os jornais lhe dirigem sôbre a sua atitude e quando afirmara que tam acusados e atacados eram os Srs. Álvaro de Castro e Joaquim Ribeiro, que combatiam as reclamações apresentadas pelas associações comerciais, como eu, que as havia defendido na Câmara, mas que nem por êsse motivo me sentia levado a mudar de atitude perante o problema que estava sendo debatido no Parlamento.

Para o afirmar citei uma entrevista em o jornal A Tarde, em que um dos dirigentes das fôrças económicas afirmara que os operários deviam saber que o único Deputado que tratara dos seus interêsses nesta Câmara havia sido o Sr. Carvalho da Silva, e, sendo assim, mostrei a injustiça do procedimento, dizendo que o Sr. Carvalho da Silva somente havia falado em apartes, se bem que os seus apartes sejam suficientemente suculentos e compridos, constituindo discursos, porque de facto S. Exa., não tendo podido intervir no debate, porque êste não fôr generalizado, se limitara a mandar para a Mesa um contra projecto da lei que nem sequer pudera ser admitido.

Eu mostrei ainda que jornais, porventura inspirados pelos mesmos indivíduos que com o movimento das fôrças económicas tinham relações, diziam o que vou ler.

Mostrava eu, pelos trechos dêste artigo, que tam atacado, pelo menos, era eu, como S. Exas., mas não me sentindo obrigado a mudar de atitude.

O Sr. Carvalho da Silva afirmou que no jornal O Correio da Manhã, de que S. Exa. assumiu a paternidade, afirmando-se redactor das notícias em questão, nunca eu havia sido acusado de ser ou haver sido o causador intencional do decreto que o Sr. Ministro das Finanças havia publicado.

Ora o que eu disse ó que o Correio da Manhã me atribuíra a paternidade de um aborto que o Sr. Ministro das Finanças havia dado a luz, chamando-lhe decreto--burla, mistificação, etc., e, como eu não pudesse encontrar imediatamente o recorte do aludido jornal, não tendo na memória tudo o que nele estava escrito, reservei-me para o ler hoje aqui, o que vou fazer.

Quere dizer, O Correio da Manhã não me atribui um êrro de tática parlamentar, de que resultara um decreto inconveniente.

O Correio da Manhã afirmou que a minha acção tivera evidentemente o intuito, porque não podia ser outro, de organizar o decreto aborto, o decreto burla, o decreto mistificação, efectivado pelo Sr. Ministro das Finanças.

Pondo agora de parte o Correio da Manhã e o Sr. Carvalho da Silva, direi no emtanto a S. Exa. que nem sequer pretendo a amizade política de monárquicos, porque os tenho como adversários, não só pela herança que nos deixaram, como pela atitude que têm tomado e pelo mal que nos têm feito, embaraçando a administração pública.

Há ainda a tomar em consideração o seu procedimento, impedindo que se forme uma regular fôrça conservadora na República, o procurando dividir os portugueses e os republicanos. Eu tenho-os como sendo os maiores responsáveis da situação presente, tanto como os próprios extremistas, a quem S. Exa., pelos seus processos, tanto e tanto se assemelham.

Tenho-os como adversários, e por isso não pretendo a sua amizade política.

Mas pretendo e desejo afirmar que a República tem aquela probidade intelectual que lhe dava o direito a ser respeitada de quem quer que faça parte da Câmara ou parte de um jornal.

Apoiados.

Sr. Presidente: já que tive de me referir ao aborto ou ao decreto burla ou decreto de mistificação, que o Sr. Ministro das Finanças publicou, quero mostrar os motivos por que discordo dêsse regulamento, e à minha indicação que o Sr. Ministro das Finanças não respeitou, nem sequer, seguindo a orientação que a própria Câmara lhe havia indicado.

Estava-se na véspera do encerramento de sessão, porque iam começar as férias. Sabia-se que era completamente impossível discutir-se a lei de selagem no curto prazo de três ou quatro dias, apesar de o

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Sr. Carvalho da Silva querer mostrar o contrário aos seus eleitores.

Não podia pasmar na Câmara dos Deputados e no Senado ràpidamente esta lei no curto prazo de quatro dias.

Era impossível. Os representantes das associações económicas mostraram o inconveniente de a venda do artigos de que tinham stock não poder ser feita numa época em que era, natural que os interessados os procurassem vender.

Era natural que a Câmara aconselhasse, portanto, o Sr. Ministro das Finanças a procurar durante as férias modificar as disposições do regulamento, porventura inconvenientes, deixando ao Parlamento a modificação daquelas disposições que só pelo Parlamento pudessem sor votadas.

Apoiados.

Isto se procurou fazer de acôrdo com os grupos republicanos apresentados na Câmara. Não foi procurado o acordo dos monárquicos, nem tinha de ser procurado.

Apoiados.

S. Exa., naturalmente, entenderiam que o seu papel é do demolir, e então não podiam colaborar.

Pretendia-se revogar uma lei virtualmente suspensa, isto que os artigos cuja selagem êle mandava fazer não eram solados.

Pretendia-se que o Sr. Ministro das Finanças — era claro o evidente isto — pudesse encontrar um solução possível, pelo menos na parte regulamentar, o S. Exa. fizesse isso, porventura usando daquela benevolência que tantas vezes nas questões fiscais se tem usado.

O que fez S. Exa.? Fez o que não podia fazer; não fez o que devia fazer.

Apoiados.

O que se pretendia? Acima de tudo pretendia-se dar facilidades ao contribuinte, pretendia se que essa disposição regulamentar fôsse feita com a prévia discussão do homens que tivessem conhecimento do assunto pelo seu directo interesso na matéria, e sêbre ela pudessem falar pela sua prática e técnica.

Nada disso fez o Sr. Ministro das Finanças, quando tam fácil seria recorrer àquele expediente português da nomeação de comissões para esporem a sua opinião.

Teria sido fácil; mas o Sr. Ministro nada disso fez.

Tratou de chamar a preguntas alguns comerciantes do Lisboa.

Não fiz nenhum projecto; o S. Exa., sem preparação, que não tem, o sem a competência financeira, que não tem, resolveu publicar um regulamento que veio agravar a situação ainda mais do que já estava naquele momento!

Por meio de rótulos que os comerciantes ou industriais afixavam, criou a avença uma nova forma.

Assim os comerciantes o industriais teriam de levar à Repartição do Finanças os rótulos a afixar nas garrafas, e toda a gente sabe a dificuldade enorme de expediente que há em quási todas as Repartições de Finanças, principalmente para comprar selos.

Esperava assim o Sr. Velhinho Correia 80:000 contos, venda correspondente em cervejas, segundo S. Exa. de 40:000 garrafas.

O Govêrno podia pôr-lhe um solo em vez do rótulo. Era mais fácil afixar um solo do que pôr rótulos na cerveja.

Esta era uma das faculdades que o Sr. Ministro das Finanças pretendia dar no género de comodidades para o contribuinte.

O regulamento tal como fora publicado torna a utilização dos créditos tam difícil, que a Câmara tinha sugerido ao Sr. Ministro das Finanças a modificação do regulamento na parte que se refere à simplificação dos créditos.

O Sr. Ministro das Finanças nada fez a êste respeito, mas fez o que não devia ter feito.

A Câmara autorizou o Sr. Ministro das Finanças a modificar aparte regulamentar o S. Exa. não fez nada disso, e praticou actos que não lhe competiam, como por exemplo deminuir a matéria tributária.

S. Exa. teve a pretensão de matar a questão pelo seu regulamento e fez modificações da lei que só competiam à Câmara.

Vejamos a primeira modificação,

O Sr. Ministro das Finanças definiu os vinhos finos pela sua graduação alcoólica e pelo preço.

Ora eu creio que, na significação da lei, vinhos finos não poderiam ser senão as marcas regionais, como por exemplo

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Pôrto e Madeira, mas S. Exa. resolveu que os vinhos do pasto fiquem sujeitos a selagem, pois não pode garantir que o seu preço de venda seja de 6$ o litro.

Eu afirmei que o Sr. Ministro das Finanças não fizera aquilo para que tinha competência e pretendeu sobrepor-se ao Parlamento, para introduzir uma modificação que não estava na competência do Govêrno e era verdade, como se prova quando tratou da selagem dos artigos de perfumaria.

Como ouviu dizer na Câmara que os sabões e sabonetes não deviam ser selados fez o seguinte, que vou ler.

Eu pregunto qual é a lei que dava competência ao Sr. Ministro das Finanças para fazer esta redução de matéria colectável.

S. Exa. não tinha competência para excluir qualquer artigo da selagem.

Através do Regulamento vê-se o desejo de proceder em termos agradáveis ao Sr. Velhinho Correia, e nisso S. Exa. seguiu a esteira dos seus correligionários e antecessores, que sempre atenderam os conselhos do Sr. Velhinho Correia em matéria de contribuições e impostos.

O Sr. Velhinho Correia, embora seja um homem de competência e trabalhador, não tem, no emtanto, aquela doso de senso comum que seria necessária para politicamente equilibrar os conhecimentos adquiridos polo estudo. Mas, porque o Partido Democrático está completamente falhado do pessoas que saibam ocupar a pasta das Finanças, em termos de exercerem o cargo com aquela competência que se adquire pelo facto de se ter trabalhado anteriormente nos assuntos em que se hão-de prestar provas posteriormente, o como o Sr. Velhinho Correia é o único Ministro das Finanças da política activa, o Partido Democrático colocou S. Exa. como mentor do todos os Ministros das Finanças democráticos.

Assim se justifica que o Sr. Pestana Júnior, tendo ouvido tudo o que nesta Câmara foi dito acerca desta questão, só assimile o que lhe diz o Sr. Velhinho Correia.

O Sr. Velhinho Correia, mentor em finanças do Partido Democrático, falou dos pirolitos e das águas de mesa, o logo o Sr. Ministro das Finanças teve o cuidado de dizer que modificava o Regulamento

na parte que aos pirolitos e águas de mesa se refere.

As outras modificações que eram necessárias e que racionalmente se impunham, como a abertura de créditos para, aquisição de selos, não foram escutadas nem atendidas, porque S. Exa., não tendo ido para a sua pasta com aquela preparação precisa para dispensar a opinião dos mentores do seu partido, se sentiu obrigado ainda a seguir o Sr. Velhinho Correia, não fôsse o jornal das comissões políticas ou a maioria impedir-lhe que continuasse no lugar que ocupa.

É isto o regulamento do Sr. Ministro das Finanças, ao qual não quero dar a classificação, que vários adversários de S. Exa. lhe têm dado, de decreto--burla, mistificador ou aborto, havendo pronunciado ontem, a palavra aborto para empregar um dos termos, o menos ofensivo, com que a obra de S. Exa. tem sido classificada.

Repito, Sr. Presidente, que o regulamento não concede as facilidades que podia conceder; e já que estou a referir-me a facilidades, quero neste momento reportar-me a um exemplo recente.

Refiro-me ao exemplo da selagem do tabaco no Govêrno do Sr. Álvaro de Castro.

Houve dificuldades — como há sempre dificuldades quando se lança um novo imposto — e o Ministro das Finanças de então procurou encontrar com os interessados uma maneira do selar os stocks existentes, de forma a não produzir um grande empate do capital. E como há sempre modo de encontrar solução quando existe boa vontade, o Sr. Álvaro de Castro encontrou fàcilmente essa solução.

O sêlo era pago ao mesmo tempo que a mercadoria se vendia, indo-se procurar ao manifesto a porção de tabaco sôbre o qual incidia a selagem. Não houve nenhuma dificuldade o tudo se resolveu.

No emtanto o actual Sr. Ministro das Finanças nem dêste caso quis aperceber-se para se aproximar, na sua acção, desta fórmula do tornar exequível uma medida.

Sr. Presidente: acabando por agora as referências ao regulamento, referências a que fui forçado pelas palavras do Sr. Carvalho da Silva, vou simplesmente procurar responder ao Sr. Velhinho Correia

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quanto aos argumentos que S. Exa. ontem apresentou sôbre esta matéria.

De entrada desejo referir-me às considerações de S. Exa. sôbre política tributária, para que nos julguemos uns aos outros com as mesmas culpas o responsabilidades, nem pretendermos arremessar pedras aos vizinhos que, como nós, tem telhados de vidro.

Falou S. Exa. na política de equilíbrio financeiro.

É preciso não somente nos reportarmos aos nomes com que as contribuições são inscritas no Orçamento, mas à forma como elas incidem e se repercutem nos contribuintes.

Devo dizer ao Sr. Velhinho Corroía que erra quando supõe que as contribuições da República no momento presente são, principalmente ou em porcentagem, as contribuições directas,

Desde que a contribuição é lançada sôbre a percentagem do lucros, a contribuição industrial não tem o carácter de imposto directo, porque fica perfeitamente indicada ao contribuinte a forma de a fazer reflectir e repercutir sôbre os indivíduos a quem vende os seus produtos.

O imposto de transacção, embora cobrado directamente, é de facto um imposto indirecto.

A contribuição industrial, embora cobrada directamente do comerciante, desde que ela se pode traduzir numericamente numa percentagem das vendas realizadas, é transformada pela mais simples das reproduções em aumento de preços da mercadoria que se vende.

O Sr. Velhinho Correia: - O que é edificante, o que é honroso para a República, ó que a percentagem das contribuições indirectas, incluindo o imposto do transacções, é inferior à percentagem das contribuições indirectas do tempo da monarquia.

Isto servia ato para a propaganda republicana numa campanha eleitoral.

O Orador: — Eu sei; eu estava a afirmar ao Sr. Velhinho Correm que àquelas contribuições indirectas que Be encontram nas estatísticas, há-de S. Exa. juntar aquelas contribuições directas de nome, mas que são, de facto, indirectas, e afirmava eu que a contribuição industrial, como

estava lançada, é de facto uma contribuição indirecta que vai incidir sôbre o prego dos géneros que o comerciante vende.

Mas o Sr. Velhinho Correia afirmou mais uma voz que a política das notas foi e aquela política que o Govêrno do Sr. Álvaro de Castro, que o Govêrno do Sr. Daniel Rodrigues e que o Govêrno, actual combateram e têm combatido contra os seus adversários políticos, procurando conseguir o equilíbrio orçamental e a melhoria cambial que são indispensáveis para o barateamento do custa da vida.

Ora, Sr. Presidente, em todos os tempos da República, doado que a guerra nos lançou em dificuldades financeiras, desde que a multiplicação dos empregos, feita após 1915, lançou o Estado à beira dum precipício financeiro, todos os Governos, todos, tiveram de recorrer à emissão de notas, sem excluir qualquer Govêrno, mesmo aquele de que o Sr. Velhinho Correia fez parte.

Realmente, a actualização do receitas, mesmo pelos impostos, não era possível desde logo.

A par e passo, com o extraordinário aumenta de despesas, que não oram exclusivamente derivados de uma actualização de numerário, mas principalmente de financiados, não teria sido possível a qualquer Govêrno deixar de recorrer á omissão de notas, para recorrer ao aumento de impostos.

Em regra, por isso, todos os Governos recorreram ao aumento de notas, e em regra também todos os partidos na oposição combateram êsse aumento.

Sempre assim foi: aqueles que governavam recorriam à emissão do notas, emissão feita às claras ou ocultamente; aqueles que eram da oposição, combatiam essa omissão.

Ainda mo recordo que aqui na Câmara, no tempo em que os liberais se encontravam no Poder, um Deputado liberal, muito antes de o Sr. Velhinho Correia valorizar o escudo e fazer a «semana do escudo», protestava contra o aumento da circulação fiduciária que o Govêrno pretendia fazer, mas lembro-me também que em resposta quem se levantava para combater êsse Deputado, dizendo que aquele aumento não contribuía para o aumento do custo da vida, era precisamente o Sr. Álvaro de Castro.

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Não procuremos, portanto, atribuir aos outros situações que não têm, ou procurar para nós situações que não nos pertencem.

O Sr. Velhinho Correia, o homem da «semana do escudo», foi comigo Ministro num Ministério que encontrou na sua subida ao Poder uma portaria ainda feita pejo Ministro das Finanças anterior para aumento da circulação fiduciária, e S. Exa. não protestou contra ela, e teve de á empatar como eu, porque não havia outra cousa a fazer.

S. Exa. foi depois Ministro das Finanças e serviu-se de tudo o que pôde para aumentar a circulação fiduciária.

Contudo, houve de facto uma altura em que os Governos puderam dispensar a continuação da emissão do papel-moeda.

Veio êsse momento quando as próprias consequências dos aumentos anteriores começavam a atemorizar os políticos e o próprio País.

Êsse momento deu aos políticos a fôrça que até ali não tinham para se oporem aos aumentos de circulação fiduciária.

Outro momento depois surgiu para essa oposição, quando se deu a valorização do escudo e quando surgiram as receitas provenientes dos aumentos dos impostos. Então, todos os políticos e todos os portugueses se juntaram para que alguma cousa se fizesse de forma a opor-se um dique perpétuo contra novos aumentos de notas, e assim Governos e oposição puderam dei terminar que não se fizessem mais aumentos de circulação fiduciária, mas antes a elevação dós impostos, de forma a fazerem face com as suas receitas às despesas do Estado.

Não quero contestar o valor dos homens que, pela sua persistência, pela sua capacidade, de trabalho, pelo seu amora publicidade, sejam capazes de levar às multidões a propaganda e vulgarização daquelas noções que não devem estar exclusivamente nas mãos de políticos e de financeiros.

Não quero negar o valor do trabalho dêsses homens, mas não consinto ,que qualquer político ou qualquer partido queira lançar sôbre outros a culpa duma situação em,que todos malharam a sopa, querendo assim largar as responsabilidades para o vizinho e deixar somente, as virtudes sôbre os seus próprios ombros.

Se bem que eu saiba que o Sr. Ministro das Finanças não ouvirá as minhas palavras senão através do crivo Velhinho Correia (Não apoiado do Sr. Velhinho Correia), eu não quero deixar de dizer a S. Exa. que há várias maneiras de contribuir, para o agravamento do custo da vida é que, se o agravamento cambial é, evidentemente, aquele que nós sentimos em primeiro lugar, pelo confronto natural de preços entre o custo dos artigos importados e o dos que no território nacional se produzem, não é menos certo que os impostos que recaem sôbre os produtos essenciais à vida contribuem tanto para o encarecimento do custo da vida como o pior dos agravamentos cambiais.

A política do Sr. Velhinho Correia, tendente ao agravamento do impostos, quer sob a forma de impostos directos, quer sob a forma de impostos indirectos, contribui fortemente para o agravamento do custo de vida em termos de a tornar insuportável e de impossibilitar o funcionamento dos ramos de comércio e de industria que se ocupem dos artigos agravados com êsses impôstos.

Já tive ocasião de mostrar, aqui, na Câmara, que os impostos presentemente lançados, directa ou indirectamente, vão, a muito perto, em média, porque em alguns casos vão a mais, de 6 1/2 por cento sôbre o montante das vendas, e afirmo, com a certeza de que estou afirmando uma verdade, se é que existe a verdade absoluta em qualquer ramo de conhecimentos humanos, que é impossível manter-se qualquer comércio, desde que tenha de pagar 6 1/2 por cento do montante das vendas, ao Estado, somente a título de contribuição.

Afirmo mais: se a isso se juntar o que é indispensável de despesas gerais, os géneros são agravados em cada transacção em termos que o se a custo será absoluta--mente insuportável, qualquer que seja a melhoria cambial.

E quanto à melhoria cambial não se liga, que uma melhoria de câmbio, súbita e violenta, é um bem para o Pais que a suporta, é um bem para o Estado que a tem de sustentar. Não é.

Ela é sempre inconveniente em tais condições.

Traz o chômage, o desemprego de braços.

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As consequências são mais perturbadoras do que as derivadas do agravamento do custo da vida.

Vamos agora ao projecto.

Afirmou o Sr. Velhinho Correia que tanto o meu projecto como o da comissão de finanças determinam uma redução de receita, mas eu já disse, ontem, que o Sr. Velhinho Correia é que apresentou um projecto que do facto faz cobrar uma receita inferior à que presumivelmente se obteria pela aplicação da lei existente.

Mas eu não posso compreender que haja diminuição do receitas senão em relação às que de facto se estejam cobrando. Mas ainda quando fôsse assim, eu desejaria dizer que o próprio Regimento da Câmara impediria a aplicação da doutrina do Sr. Velhinho Correia.

O Regimento é categórico. Desde que um parecer é apresentado por uma das comissões da Câmara, êle não tem nem deve ser sujeito à nova admissão. Os pareceres das comissões estão admitidos, assinatura dos seus membros.

Não podia, portanto, V. Exa.. Sr. Presidente, deixar de pôr à votação o parecer da comissão de finanças.

Mus, Sr. Presidente, o Sr, Velhinho Correia fez várias considerações sôbre a produtividade do imposto.

S. Exa. não vai até ao número de 80:000 contos, importância preconizada pela Direcção Geral das Contribuições e Impostos, mas contenta-se com 40:000 a 50:000 contos, conforme diz no Rebate, ou com 60:000 conforme declarou nesta Câmara.

Não faço uma pequena idea, nem a aponho que a Câmara o fará também, da forma por que S. Exa. chegou a esta conclusão,

Espero que o Sr. Ministro das Finanças ratifique êstes números, se não tiver, certamente, de os rectificar.

O Sr. Velhinho Correia afirmou que na segunda quinzena do Novembro a Casa da Moeda vendeu 2:000 contos de estampilhas, destinadas a perfumarias e bebidas engarrafadas.

Afirma o Sr. Velhinho Correia que a Casa da Moeda tinha vendido essas estampilhas ao público, ou afirma apenas que elas foram vendidas?

O Sr. Velhinho Correia (interrompendo) — É um indico muito fraco. É, apenas, um elemento de informação.

O Orador: — Verificamos, Sr. Presidente, que o indico do Sr. Velhinho Correia e tara fraco que S. Exa. se não apoiou a êle, naquela propaganda que vem fazendo.

Êle é demasiadamente fraco.

O facto do a Casa da Moeda ter vendido significa que forneceu às tesourarias, de finanças estampilhas dêsse imposto, na totalidade a que o Sr, Velhinho Correia se referiu.

Mas qual é, dessa importância, a parte que se vendeu ao público?

Qual é? dessa importância, a parto que as tesourarias de finanças requisitavam, para estarem, naturalmente, habilitadas a fornecer o público?

O número é absolutamente fraco.

No emtanto, eu já ouvi dizer, embora não fôsse ao Sr. Velhinho Correia, que a verba de estampilhas vendidas ao público foi cerca de 1:000 contos. O indico um fraco, como é, talvez só avigore em relação à verdade.

Mas, Sr. Presidente, é preciso não esquecer que, estando-se no período da selagem de stocks existentes, e supondo que alguns comerciantes e industriais houvessem selado os seus stocks, não pode a compra de estampilhas efectuada na segunda quinzena do Novembro servir como base de cálculo.

Porém, o Sr. Velhinho Correia falou de cadeira no debate, e afirmou que só a contribuição sôbre a cerveja podia render cêrca de 6:000 contos.

O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): — V. Exa. dá mo licença?

Eu recebi essa informação de um fiscal idos impostos, que foi incumbido de averiguar a produção da cerveja em Lisboa, e foi sôbre esta informação que ou tive ocas, são de escrever no Rebate.

Trata se, pois, de um elemento de informação, muito susceptível de correcção.

O Orador: — Sr. Presidente: também o segundo elemento de informação do Sr. Velhinho Correia vem a ser um índice fraco, e S. Exa. também não se apoia nele.

O número que êle apresentou no Rebate corresponde ao preço fixado actualmente para as estampilhas, a 30.000:000 de garrafas por ano.

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Conclui daqui naturalmente S. Exa. que, pelo facto de no verão se vender maior quantidade de cerveja, devido a haver mais sede, o consumo deve andar por umas 100:000 garrafas por dia.

Está então o Sr. Velhinho Correia, a meu ver, absolutamente enganado neste ponto.

Eu devo dizer que os meus cálculos dão aproximadamente 2.600:000 garrafas por ano, referindo-me à produção de uma das maiores fábricas, aquela que maior venda tom em Portugal, visto que as restantes duas ou três que existem pouco valor têm.

Assim eu continuo a dizer o a afirmar que o importo não poderá nunca ir além da quantia que eu indiquei quando da minha interpelação.

Na verdade a produção que indiquei não me dá, de facto, o rendimento a que se referiu o Sr. Velhinho Correia.

Os cálculos que S. Exa. fez não estão certos, devido, manifestamente, a êrro de informação, dados que já serviram até para os monárquicos dizerem que os republicanos pretendem extorquir ao comércio e à indústria mais de 60:000 contos por ano.

Os cálculos de S. Exa., repito, estão muito longe da verdade sôbre esta matéria.

Outros argumentos têm sido apresentados, tendo-nos o Sr. Velhinho Correia dito aqui que havia muitos comerciantes zelosos que tinham cumprido a lei.

Não sei, Sr. Presidente, francamente qual a razão por que, tendo já havido comerciantes que cumpriram a lei, se vai agora conceder um prémio àqueles que a não cumpriram.

Êste argumento vem então confirmar o procedimento desta Câmara, que, se não tem sido desastroso, tem pelo menos sido precipitado, pois a verdade ó que já por mais de uma vez a Câmara se tem visto forçada a modificar a sua legislação tributária, e haja em vista o que aconteceu com a cédula pessoal, a qual foi suspensa depois de a maior parte das pessoas a terem tirado e pago, suspensão essa que apeias aproveitou àqueles que não cumpriram a lei.

O mesmo só deu também no que diz respeito ao imposto sôbre o valor de transacções, o qual teve de ser modificado, como a Câmara muito bem sabe, na parte que dizia respeito aos advogados e aos módicos.

Os módicos e advogados também protestaram, não pagaram e não deixaram de exercer a sua profissão.

O argumento de S. Exa. não serve, não pode ser invocado como autoridade.

Temos grande responsabilidade na política tributária e na forma atrabiliária como ela tem sido feita, o que tem dado lugar a situações dêste natureza.

O Sr. Velhinho Correia emprega amiudadas vezes o argumento «actualização».

A actualização tem servido para tudo: até serviu para ir às cadeiras do Poder o Sr. Pestana Júnior.

Toda a gente em Portugal fala de cadeira em assuntos de actualização.

O Sr. Velhinho Correia tem como elixir para tudo a actualização.

Os funcionários civis e militares, embora recebam pouco, custam muito ao Estado, custam mais de 25 vezes que em 1913, e no emtanto não recebem 25 vezes mais.

O Sr. Velhinho Correia:— Eu concordo com V. Exa. mas não pode servir, como argumento geral o que diz.

O Orador: — Se a V. Exa. não serve o argumento geral, vejamos então o argumento especial.

Vamos ao imposto sôbre a cerveja, que tem sido a teima tantas vezes apresentada pelo Sr. Velhinho Correia.

Se lançarmos um imposto que representa menos do que essa quantia, nós vamos, de facto, sobrecarregar a cerveja com um imposto menor do que aquele que resultaria da manutenção do imposto anterior à guerra, multiplicado pelo coeficiente da desvalorização da moeda. Ora o imposto que se lançava sôbre a cerveja, e que o Sr. Velhinho Correia procurava actualizar, é precisamente um imposto que foi suprimido pela lei n.° 1:368, porque entendeu que o devia substituir polo imposto geral sôbre o valor das transacções.

E então veja se como é absurdo que, tendo-se suprimido um imposto para o substituir por outro, se venha agora lançar uma nova tributação idêntica à que havia sido substituída.

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Disse o Sr. Velhinho Correia que o imposto de transacção é aplicável a todos os géneros e não apenas à, cerveja o que, portanto, não se tratando do um imposto especial sôbre a cerveja, não tinha de o considerar como tal. O argumento abona muito pouco aquele senso comum que eu disso faltar a S. Exa.

Então para o homem que fabrica a cerveja não é indiferente sabor que paga um imposto porque os outros o pagam também?

Êsse fabricante não tem apenas que considerar que ao valor da cervo]a tem somente do acrescentar o imposto que sôbre ela recair.

Porventura deixa êle de pagar em virtude dessa consideração?

Não pode o Sr. Velhinho Correia, portanto, fazer o confronto entre um dos impostos lançados hoje o um lançado anteriormente à guerra, mas sim com a soma dos impostos que hoje se lançam.

Além disso, não ó próprio dum país que pretende modificar a sua legislação tributária afirmar a certa altura que vai entrar num novo regime tributário, caracterizado por um imposto geral sôbre todas as vendas realizadas, substituindo o sistema tributário anterior por um mecanismo do impostos a lançar sôbre todas as transacções, para daí a pouco tempo procurar lançar novos impostos sôbre os mofamos artigo B; invocando a razão do que se deixaram de pagar êsses impostos em cuja substituição se organizou precisamente o novo sistema fiscal.

Tendo nós acabado com as barreiras do Lisboa, aqui, em 1922, e quando indicamos como título do glória para o Parlamento da República o acabar com essas barreiras, que só eram inconvenientes, vexatórias e apenas serviam para contribuir para o maior custo da vida; tendo nós em 1922 iniciado essa política fiscal caminhando paru o imposto sôbre o valor das transacções, é lá lógico que a dois anos de prazo se pretenda lançar um imposto igual àquele que condenamos!?

Sr. Presidente: outro argumento que o Sr. Velhinho Correia invocou, como poso de ordem moral o até de ordem financeira, foi o da isensão dos stocks. Mas então — diz S. Exa. — os stocks existentes não vão ser tributados?

Ora eu pregunto se isso não é precisamente o que sucede em todos os novos impostos, principalmente naqueles que recaem sôbre os géneros importados.

Quando se aumentam as pautas aduaneiras, não é só para os artigos importados daí por diante?

Não se vai lançar, realmente, a nova pauta sôbre os artigos já existentes em armazém? De resto, ignora alguém que os comerciantes não são banqueiros, para poderem ter largos capitais empatados na tributação dos stocks existentes?

Ignora alguém que os comerciantes não podem ter capitais empatados?

O Sr. Ministro das Finanças 118.0 tem, nem pode ter, a missão de êlle à porta do cofre. Deixe-se essa função aos funcionários que têm de a exercer por dever dos seus cargo?.

O político, pensando na forma de conquistar rendimentos para o Estado, procurando as receitas necessárias, não deve descer aos mínimos detalhes, que não lhe ficam bem na sua elevada situação. Deixemos a cada um a função própria, e não vamos — até por uma pequena evasão que saibamos poder dar-se — fazer uma luta com c asses, trazendo perturbações à vida social, a fim do procurarmos uma cousa que, sendo óptimo, já não será inimiga do bom, mas das próprias conveniências públicas.

Apoiados.

Quero também lembrar aos Srs. Parlamentares que, sem procurar defender reclamações de fôrças vivas, será justo que não tenham, a respeito da função do comerciante, aquela impressão que, por vezes, tenho visto desenhar-se na Câmara.

Já aqui ouvi um ilustre Deputado dizer que o comerciante era ura homem que se sentava comodamente numa cadeira, sem preocupações, sem cuidados, a ganhar dinheiro pela exploração do consumidor.

A definição é demasiadamente simplista.

Evidentemente o comerciante ganha dinheiro quando pode.

A sua função é procurar, pelos seus lucros, obter meios de vida, mas, Sr. Presidente, a qual é o homem que não procura ganhar dinheiro?

Porventura os médicos não se fazem pagar pelos seus serviços, fazendo-se pagar melhor quando melhor o cliente podo pagar?

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Não procuram os homens de todas as profissões liberais obter a máxima remuneração possível pelo exercício da sua profissão?

Onde ó que há o delito de procurar ganhar?

Pela mera consideração de alguns abusos, não se vá ter da função do comerciante uma idea que, não contribuindo senão para agravar as relações entre políticos e os homens do certas profissões, nem sequer tem a vantagem de dar à Câmara a noção exacta dos acontecimentos para a solução dos problemas que nos são submetidos para debato.

O Sr. Velhinho Correia fez uma larga dissertação sobro o que seriam os vexames do sêlo e do manifesto.

Falou em várias cousas, falou na «revolução da realite», para afirmar que o manifesto era muito pior do que o sêlo em matéria de reclamações.

Afirmou S. Exa. que o vexame do sêlo é muito preferível ao do manifesto; afirmou mesmo que não há vexame no sêlo.

Ora, Sr. Presidente, os interessados, homens que têm de sofrer o vexame, qualquer que êle seja, afirmam que o vexame do sêlo é dos piores.

E eu pregunto: que autoridade tem o Sr. Velhinho Correia para, nesta questão, que é absolutamente subjectiva, afirmar que êsse vexame — que êle não tora do suportar — é pequeno ou menor, quando a comunidade dos interessados, quando todos aqueles que são atingidos, nos dizem que é exactamente êsse o vexame que êles não podem suportar?

Depois de ter dado ao Sr. Velhinho Correia aquela competência que lhe reconheci, em matéria financeira e como mentor do Sr. Ministro das Finanças, não posso dar-lhe também aquela competência de psicólogo de multidões, que seria necessária para supor que S. Exa. tinha em psicologia uma competência tam grande, que lho seria permitido afirmar existir vexame onde os interessados entendem não o haver e que êsse vexame não existe precisamente onde os mesmos interessados afirmam que o há.

O Sr. Velhinho Correia, pela precipitação de escrever ou de falar, disse que os comerciantes preferiam todos os vexames do manifesto aos da lei do sêlo, e disse que o parecer da comissão de finanças era exactamente o diploma que ia fazer aparecer todos êsses vexamos.

Não é assim.

Precisamente por se entender que o manifesto ou avença para o vendedor seria tam inconveniente como o solo, propôs-se o manifesto ou avença para o fabricante, e fácil ó sentir que, além do número de fabricantes ser muito menor do que o número de vendedores, torna-se muito mais fácil verificar as saídas de uma fábrica do que de qualquer estabelecimento de venda, que há muito mais elementos do fiscalização em relação ao produtor que ao vendedor.

O Sr. Velhinho Correia saiu com o exemplo brasileiro, e afirma que no Brasil tudo se podo selar, e que o sêlo constitui o principal rendimento brasileiro.

A seguir falou S. Exa. na lei francesa, deixando ao público, leigo na matéria, a impressão de que a lei brasileira era a que mais inconvenientes podia trazer à República.

O Brasil aceitou o sistema de sêlo como um meio do cobrança dos seus impostos, a França adoptou o sistema de cobrar os seus impostos indirectos sôbre géneros, e nós, que tínhamos de escolher uma política tributária, escolhemos a política francesa que era o imposto.

Assim o fizemos em 1922 e hoje vem dizer-se que devemos ir para a política brasileira.

Ora, pregunto eu: se depois de termos escolhido a primeira forma, é razoável que se vá agora para aquela que o Brasil adoptou?

Como pudemos nós atender a estas duas formas tam diversas entre si?

Se não pudermos atender os dois regimes, não seria lógico, útil e muito conveniente seguir o nosso sistema tributário, segundo as nossas necessidades e tradições?

Pela fórmula do Sr. Velhinho Correia teríamos uma torre de Babel em que ninguém se entenderia.

Êsse motivo que o Sr. Velhinho Correia encontra é que êsses artigos são de importação, e, como artigos de importação, têm o seu invólucro especial.

Além disso o facto é que o inconveniente existe em que para o sistema do sêlo torna indispensável a existência dum invólucro, o que faz com que êste imposto não pos-

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sa ter a produtividade do imposto de consumo e de transacções.

O Sr. Velhinho Correia o confessa, êle próprio, quando diz que êsse imposto não pode ser aplicado às pipas,

Mas o que ó curioso é ter-se estado a procurar o sistema tributário de cada país para fazer-se uma salada russa de sistemas tributários,

É preciso sor abalizado em direito fincai especializado para entender tudo isto, e nem todos os comerciantes têm a possibilidade de ter um advogado da especialidade para consultarem as repartições fiscais, o dizer a longa série de impostos que todos os comerciantes têm do pagar.

Comerciante que não tenha um advogado especial terá constantemente de pagar multas.

Os impostos que existem chegam de sobra para as necessidades do Estado.

O Sr. Velhinho Correia defende a selagem, e é bom ver quanto a matéria tributária e quanto a s6lo o que diz a actual lei do sêlo no § único.

Não há nenhum Ministro das Finanças que, servindo-se da disposição que afirma que tudo o que não é matéria colectável é da competência do Executivo, possa dizer que a matéria colectável aqui está definida somente pelo artigo que se tributa. Está descuida pelo artigo que se tributa o pelas condições em que êle se deve encontrar, porque pelo facto de o artigo ser tributado ninguém pode concluir que a selagem seja obrigatória, na origem.

Nada há que impeça o Sr. Ministro das Finanças de exigir a avença; o que podo ó permitir que a avença seja facultativa.

Mas o Sr. Velhinho Correia apresentou uma proposta suprimindo completamente êste parágrafo.

O Br. Velhinho Correia (interrompendo): — Eu apresentei apenas uma proposta interpretativa dêsse parágrafo.

O Orador: — Acho pouco. A proposta de V. Exa. não impede a selagem na origem. Tanto se pode interpretar que não impede a faculdade de o contribuinte ter avenca, como pode interpretar-se dando ao Sr. Ministro das Finanças o direito de exigir a selagem na origem.

Emquanto só não modificar a lei em termos de as avenças serem facultativas, ou, não creio que a disposição que o Sr. Velhinho Correia apresentou seja bastante para que a selagem na origem possa interpretar-se como facultativa.

Eu não aprovei o parecer da comissão de finanças no que respeitava à rejeição do projecto.

Não discuto mesmo agora — porque a hora vai muito adiantada e eu sinto-me naturalmente fatigado — as várias verbas da comissão de finanças, deixando essa discussão para os que as aprovam.

Refiro-me apenas aos argumentos que o Sr, Velhinho Correia apresentou e que, duma forma geral, podem ser aplicados, quer ao parecer da comissão, quer ao meu próprio projecto.

Mantenho a minha opinião de que o projecto que apresentei ó o único que resolve o problema em termos acoitáveis.

O parecer da comissão de finanças vai deixar a questão nas mesmas dificuldades que presentemente ela tem, salvo quanto ao aligeiramento das taxas, que colocam o contribuinte em melhores condições.

Aprovar o parecer da comissão de finanças será apenas repetir a situação presente, com todos os seus inconvenientes, som resolver nenhuma das suas dificuldades o agravando todos os conflitos que a República vem encontrando nesta matéria, e que eu me dispenso de reproduzir por supor que os políticos tem obrigação de conhecendo a sua missão política, saber também quais são os devores que dêsse conhecimento devem derivar.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem Muito bem!

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviarias.

O Sr. Velhinho Correia não fez a revisão dos seus àpartes.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: quatro meses depois de apresentadas as reclamações justíssimas das fôrças económicas é quando a Câmara, demonstrando os seus sentimentos democráticos, se resolve a começar a discutir êste assunto.

Sr. Presidente: responderei em primeiro lugar às considerações do Sr. Ferrei-

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ra da Rocha, que directamente se referiu à minha pessoa.

S. Exa. sustentou que eu não tinha tido intervenção nesta discussão senão em apartes, apartes suculentos, na frase de S. Exa., quando alguém dizia que tinha sido eu o único Deputado a defender as reclamações das fôrças económicas.

Sr. Presidente: o Sr. Ferreira da Rocha, com aquele brilho que põe sempre nos seus discursos, com aquele brilho que é próprio das pessoas que têm o talento de S. Exa., pronunciou, é certo, um discurso admirável na interpelação que formulou ao Sr. Ministro das Finanças. Mas o Sr. Ferreira da Rocha, depois de ter feito êsse discurso, veio, na última sessão antes das férias do Natal, apresentar uma moção que consistiu em indicar ao Sr. Ministro das Finanças que devia fazer um novo regulamento à lei n.° 1:633, relativa à lei do sêlo.

A verdade é que o Sr. Ministro das Finanças, para obedecer às indicações do Parlamento, não podia deixar de fazer um novo regulamento da lei em questão.

Sendo as reclamações das fôrças económicas no sentido de se modificarem determinadas rubricas da lei, como se compreende que para atendê-las se indicasse ao Sr. Ministro das Finanças que publicasse no intervalo das sessões do Parlamento um novo regulamento? Evidentemente que S. Exa. não podia no regulamento atender as aludidas reclamações.

Um regulamento nunca pode alterar as disposições da lei.

A moção do Sr. Ferreira da Rocha nunca poderia trazer como consequência o atenderem-se as reclamações das fôrças económicas. Ela só serviu para levar o Sr. Ministro das Finanças a fazer o novo regulamento da lei.

Assim, eu devo dizer que a moção de S. Exa. teve em vista, evidentemente, manter êste. imposto.

De resto, não se compreende outra atitude da minoria nacionalista, e haja vista a lei do sêlo, a lei n.° 1:633, cuja responsabilidade lhe pertence e à maioria da Câmara, e tanto assim, Sr. Presidente, que o próprio Sr. Ferreira da Rocha, no seu discurso, e em resposta ao Sr. Velhinho Correia, declarou que todos por igual tinham responsabilidades na política tributária da República, tendo até recorrido a êste termo: «Todos nós temos molhado a nossa sopa».

O que posso garantir é que nós não temos responsabilidade alguma; a nossa sopa não está molhada. Pelo contrário, está absolutamente seca, pois a verdade ó que somos os únicos que não temos molhado a sopa em matéria tributária.

O Sr. Ferreira da Rocha (interrompendo): — Estava a lembrar-me da lei do inquilinato.

Essa está, na verdade, molhada por cima, por dentro e por fora.

O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): — Essa não só tem molho, como recheio.

O Orador: — Nós o que temos é procurado fazer justiça, e tem sido essa a nossa orientação, pois a verdade é que, se sou o primeiro a revoltar-me contra certos senhorios, não é menos verdade que, como conservador, não desejo que muitos se vejam na miséria.

O que se torna necessário ó que os interêsses de todos sejam respeitados.

Disse o Sr. Ferreira da Rocha que nós estamos no nosso papel fazendo uma política demolidora, uma política que impede a República, que impede as fôrças chamadas conservadoras da República, a porem um travão às exigências dos elementos da esquerda republicana.

Sr. Presidente: nós não somos demolidores; antes, pelo contrário, temos procurado sempre exercer uma acção de equilíbrio dentro dêste Parlamento, e a prova está em que S. Exa. foi o primeiro a confessar que, tratando-se da questão da selagem, se tinha feito um acordo com todos os elementos republicanos da Câmara, tendo excluído o elemento monárquico.

Ainda bem que o Sr. Ferreira da Rocha o declarou, porque dêste lado da Câmara entende-se que o regime parlamentar, desde que entra em combinações, passa a dar resultados desastrados. A função basilar das oposições é discutir.

Nós, dêste lado da Câmara, temo-nos mantido sempre dentro dêste princípio, e o Sr. Ferreira da Rocha foi quem veio

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confirmar com as suas declarações que a minoria nacionalista não tem seguido o mesmo caminho.

Diz S. Exa. que somos um elemento de desordem, que somos um elemento que impede a organização das fôrças conservadoras. Mas, pregunto:

Quem impede a organização das fôrças conservadoras?

É quem está neste lugar com a consciência do que representa a maior parte da opinião do País, ou, pelo contrário, são aqueles que, pactuando a toda a hora e a todo o instante com os elementos mais esquerdistas, vêm lançar a desorientação em muitos conservadores?

Conservadores somos nós. Não estamos aqui para defender esta ou aquela classe, mas procuramos defender o País, não precisando, ao apresentar as nossas opiniões sobro esto ou aquele assunto, de dizer, como alguns Srs. Deputados republicanos, que não queremos aqui um delegado das fôrças económicas.

Porventura as fôrças económicas são constituídas por criminosos que não mereçam a defesa dos representantes da Nação? Não, Sr. Presidente.

Nós defendemos todas as classes, quando atacadas nos seus legítimos interêsses.

Sr. Presidente: a prova da minha imparcialidade vou dá-la a V. Exa., dizendo que foi com o maior prazer que ontem ouvi nesta Câmara o discurso do Sr. Correia Gomes, que defendeu os bons princípios,

S. Exa. ontem, defendeu os princípios que nós sempre temos defendido.

Não é o País que tem de dar contas ao Parlamento, mas sim nós que temos do dar contas ao País da maneira como exercemos o nosso mandato.

Apoiados da direita.

Querer julgar que o Parlamento pode fazer o que quiser e entender, e que toda a gente se tem de sujeitar às suas resoluções, sem protestar, ainda quando elas sejam atentatórias de interêsses legítimos, é negar os mais fundamentais princípios de qualquer democracia, é negar aqueles princípios que os Srs. Deputados republicanos dizem defender, quando vêm para esta Câmara.

Sr. Presidente: tendo respondido assim ao Deputado Sr. Velhinho Correia, direi ao Sr, Ministro das Finanças que S. Exa. não podia alterar a lei; tinha apenas de publicar um regulamento no seu sentido.

Não fez isso; o que fez foi ditadura clara no seu regulamento, porquanto alterou a matéria colectável.

Sr. Presidente: também o Deputado Sr. Ferreira da Bocha tinha razão quando nos acusou de nós fazermos política demolidora dentro, ó claro, do sentido, no ponto de vista de S. Exa.

É certo.

Era matéria tributária, a República esqueceu por completo os mais fundamentais princípios que respeitam à maioria tributária. A República esqueceu que não é com a criação de matéria colectável nova que melhoram as finanças públicas; que não é com o aniquilamento da riqueza que isso se obtém.

São êstes princípios que temos combatido e que têm sido adoptados pela República.

O imposto é lançado por forma que esgota a capacidade tributária.

Parte-se do princípio, nesta Câmara, de que o contribuinte ó obrigado a pagar tudo quanto o Estado lhe quere exigir, sem atender-se que é preciso restringir as despesas do Estado.

A única orientação que os Deputados republicanos entendem dever tomar é a do lançamento de novos impostos.

Somos absolutamente contrários a esta orientação; havemos de combatê-la constantemente, e se somos em reduzido número, e não como a minoria nacionalista, é por isso que não procedemos de forma a evitar, com a nossa ausência, a votação de certas medidas.

Quando disso dependa a não votação de medidas perniciosas para o País, fá-lo hemos. Havemos de impedir a votação de leis nefastas à economia da Nação, e sem hesitarmos.

Sr. Presidente: seguindo tam errada orientação, os Deputados republicanos têm adoptado leis de tal ordem, que a capacidade do contribuinte não só está esgotada, mas até o contribuinte já não pode pagar os impostos que lhe são exigidos à sombra e em nome da República.

Apoiados.

Em matéria de multas aplicadas ao contribuinte, o que se está fazendo é uma extorsão.

Havemos de protestar contra êste facto.

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É extraordinário que num Parlamento que se diz a representação nacional, não se atenda às extorsões verdadeiramente revoltantes que nesta matéria se estão fazendo.

Nesta casa do Parlamento votou-se, por exemplo, há meses uma amnistia em que todos reconheceram que estavam abrangidas as multas lançadas pelas faltas de cumprimento de quaisquer preceitos da lei n.° 1:368.

Pois, desrespeitando a decisão desta casa, o Sr. Ministro das Finanças de então, o Sr. Daniel Rodrigues, com consulta prévia à Procuradoria Geral da República, continuou a cobrar essas multas.

E porquê?

Porque S. Exa. apresentou em defesa dessa doutrina precisamente um argumento que devia demonstrar que ela não deveria ser posta em prática: dizia S. Exa. que só na cidade de Lisboa essas multas atingiam mais de 4:000 contos!

Eu pregunto se há alguém que sustente, com a complexidade de exigências que se fazem na lei n.° 1:368, que a simples falta do cumprimento duma formalidade, que muitas vezes é propositadamente criada pelos funcionários que têm percentagem nas multas, armando assim um laço ao contribuinte, é suficiente para se exigir a um desgraçado, que paga já tanto de contribuições, multas que chegam a atingir contos de réis.

Isto é revoltante e não representa uma sombra de respeito pelos contribuintes!

Sr. Presidente: o Sr. Velhinho Correia, defendendo aqueles princípios que constantemente prega nesta Câmara, ainda hoje sustentou que as contribuições não estavam actualizadas.

Referiu-se, talvez, S. Exa., ao montante geral das contribuições do Estado em relação a 1914, mas esqueceu-se S. Exa. que há nossas contribuições verbas que não podem entrar para o respectivo cálculo.

Por exemplo, os juros da dívida pública, o imposto ad valorem, etc.

S. Exa. também sã esquece que a importância em ouro resultante das exportações de vários géneros nacionais, é um sintoma da pobresa do País e com a qual se não pode entrar em couta. Sabem todos que o aumento das nossas exportações representa uma deminuição dos nossos consumos.

Todos nós, por exemplo, que não tivemos a felicidade de enriquecer de repente, deminuímos os nossos consumos: quando comprávamos dois fatos, hoje compramos só um; quando tínhamos três chapéus, hoje só temos um, etc.

Quando tínhamos três pratos a uma refeição, hoje temos apenas dois. Isto sucede à quási totalidade da população portuguesa.

Não se pode, portanto, entrar em linha de conta com essas importâncias para tal confronto.

Um àparte do Sr. Velhinho Correia.

O Orador: — V. Exa. sabe muito bem que o caso muda por completo de aspecto, se for confrontar verba por verba, no Orçamento das Receitas, o que rendem, por exemplo, os impostos indirectos.

O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): — O que eu salientei foi a característica da política tributária da República, pela qual os chamados impostos indirectos figuram hoje numa percentagem inferior à que existia no antigo regime.

Então, os impostos indirectos orçavam, por 43 por cento da tributação geral, quando hoje, incluindo já o imposto sôbre o valor das transacções, não vão além de trinta e tantos por cento.

O Orador: — V. Exa. inclui o imposto ad valorem, os adicionais municipais, os adicionais para melhorias ao funcionalismo?

O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): — Também não inclui os adicionais do tempo da monarquia.

Estabelece-se discussão entre o orador, o Sr. Velhinho Correia e outros Srs. Deputados.

O Orador: — Que se importa o contribuinte que lhe chamem adicionais; o que lhe importa é que paga 150 vezes mais.

Um hotel entre vários impostos chega a pagar 18 por cento sôbre a receita bruta. Agora vem a lei do sêlo e o regulamento do Sr. Ministro das Finanças e vai tributar os vinhos do consumo. O Sr. Ministro das Finanças salta por cima da lei

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e chama vinhos finos aos vinhos comuns, e assim temos que uma meia garrafa que custa 2ê paga 1$ de sêlo.

Vários àpartes.

O Orador. — Num modesto restaurante da Rua do Mundo, disse-mo o dono que pagava trinta e tantos mil réis o agora com todos os impostos paga 22 contos, e, a continuar assim, tem de fechar a porta,

O orador não reviu, nem o Sr. Velhinho Cobreia fez a revisão dos seus àpartes.

O Sr, Presidente: — É a hora do se passar ao período de antes de se encerrar a sessão. Só V. Exa. quere, fica com a palavra reservada paia a sessão do amanha,

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período do antes de se encerrar a sessão.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: desejava fazer algumas considerações estando presente o Sr, Ministro da Agricultura, mas, como S. Exa. não só encontra presente, peço ao Sr. Ministro das Finanças a fineza do transmitir ao seu colega o que vou expor.

Tendo sido revogado polo actual Ministro da Agricultura o decreto n.º 10:028, de 8 de Dezembro findo, do ex-antigo Ministro Sr. Torres Garcia, que extinguiu o Comissariado dos Abastecimentos, eu desejava saber por que motivo o Sr. comissário dos Abastecimentos está neste momento afastando do serviço do Comissariado funcionários que manda para o Ministério da Agricultura, onde nada têm que fazer, e está admitindo por contrato pessoal que não pertenço nos serviços do Estado, com grave prejuízo dêste e ao contrário da política do compressão de despesas que o Govêrno quero seguir.

Declaro a V, Exa. que não deixarei êste assunto emquanto providências enérgicas não forem dadas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Finanças (Pestana Júnior): — Devo dizer ao ilustre Deputado que não tinha conhecimento do assunto, mas podo V. Exa. ficar certo que transmitirei ao Sr. Ministro da Agricultura as suas considerações.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão ó amanhã, às 14 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:

Antes da ordem do dia:

Parecer n.° 842, sôbre a execução do decreto n.° 6:754, de 15 de Julho de 1920.

Parecer n.º 196, que cria o Montepio dos Sargentos de Terra e Mar.

Parecer n.° 124, que regala a admissão a empregos públicos.

Ordem do dia:

Parecer n.° 843, que substitui a tabela do imposto do sêlo.

Parecer n.° 783, que anula os decretos n.ºs 9:354 e (5:763 e suspende a execução do decreto n,° 9:667.

Parecer n.° 639, sôbre construção e exploração de um arsenal naval na Margueira.

Parecer n.° 645-O, orçamento do Ministério da Instrução.

Parecer n.° 743, sobro o recrutamento de amanuenses da Direcção Geral Militar do Ministério das Colónias.

Parecer n.° 760, que senta do direitos os materiais para caminhos de forro eléctricos.

Parecer n.° 696, que cria a freguesia de Moitas-Venda, concelho de Alcanena.

Parecer n.º 633, que autoriza a Junta de Freguesia de Alpendurada e Matos a vender certos bons.

Parecer n.° 729, que integra os noviços de assistência na Direcção Geral dos Hospitais Civis do Lisboa.

Parecer n.° 799, que cria na freguesia de Barcarena uma assemblea eleitoral.

Está encerrada a sessão.

Eram 10 horas e 43 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Última redacção

Do projecto de lei n.° 647, que autoriza o Govêrno a ceder o bronze para o

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busto do Dr. António Granjo e a mandá-lo fundir no Arsenal do Exército.

Dispensada a leitura da última redacção.

Para a Presidência da República.

Projectos de lei

Dos Srs. Vitorinho Godinho e Custódio de Paiva, concedendo à Câmara Municipal de Marinha Grande, em determinadas condições, o terreno e arvoredo entre a estação do caminho do ferro e a vila.

Para o «Diário do Govêrno».

Do Sr. Maldonado Freitas, criando uma freguesia em Olho Marinho, concelho de Óbidos, constituída pelos Casais da Arruda, Perna de Pau, Casal das Figueiras, Quinta de Baixo e Olho Marinho.

Para o «Diário do Govêrno».

Do mesmo, criando uma nova assemblea eleitoral com sede na freguesia de Carvalhal Bemfeito.

Para o «Diário do Govêrno».

Parecer

Da comissão de instrução especial e técnica, sôbre o n.° 690-B, que cede à Câmara Municipal de Estromoz a parte restante de designados prédios militares.

Para a comissão de finanças.

Requerimento

Requeiro, pelo Ministério da Guerra, 3.ª Repartição da 1.ª Direcção Geral, nota dos cabos, soldados e seus equiparados que nos diferentes meses e referida ao último dia de cada mês dos anos de 1903, 1910, 1913 e 1923 existiam no exército activo como praças com vencimento.

Sala das Sessões, 14 de Janeiro de 1925. — O Deputado, David Rodrigues.

Expeça-se.

Instalação de comissão

Agricultura:

Presidente, o Sr. João Luís Ricardo.

Secretário, o Sr. José Joaquim Gomes de Vilhena.

Para a Secretaria,

O REDACTOR — Sérgio de Castro.

Discurso proferido na sessão n.° 9, de 16 de Dezembro de 1924, e agora integralmente publicado

O Sr. Júlio de Abreu: — Sr. Presidente: sendo esta a primeira vez que uso da palavra nesta Câmara depois do meu regresso do ultramar, permita V. Exa., Sr. Presidente, que lhe apresente os meus cumprimentos, e na pessoa de V. Exa. saúde a Câmara.

Sr. Presidente: tendo eu assento nesta Câmara, e vindo de uma colónia onde sou governador, entendo da minha obrigação vir aqui dizer o que vi e fiz.

Muita gente tem procurado a razão por que lá me demorei pouco tempo, e neste momento, devo dizer que foi a falta do cumprimento da lei, no que se refere à entrega das receitas máximas da colónia, ou sejam as taxas de trânsito dos cabos submarinos, que no ano de 1924 orçam por 1.200:000 francos ouro.

Há mais de dois anos que, nos jornais e no Parlamento, se afirma que àquela colónia foram entregues aos 50 por cento dessas taxas, o que aliás não representaria mais do que cumprir o disposto na secção 3.ª da base 62.ª das leis orgânicas de administração civil e financeira das colónias.

Mas apesar de isto ser lei, até hoje a colónia não recebeu nem um centavo de tal proveniência.

Bem sei que em Dezembro de 1923 foram entregues 1:800 contos ao Ministério das Colónias, por conta dessas receitas, mas aí se gastaram 500 contos sem conhecimento de Cabo Verde e os restantes 1:300 foram por ilegalíssimas operações de Tesouraria desviados para Moçambique.

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No emtanto vejo na imprensa e no Parlamento fazer vergonhosas lamúrias sôbre a fome do Cabo Verde, pintando a tintas carregadas a sua situação miserável, mas Mo vejo qualquer interêsse em lho querer minorar o mal? pois não vejo senão alguma voz isolada lembrar que se pague à colónia o que legitimamente se lho devo.

Vejo bem que estas cousas não interessam a Câmara, e na sua atitude observo que se sento aborrecida de ouvir as minhas palavras sôbre tal assunto, mas por certo me perdoará a insistência por considerar que no cumprimento das nossas obrigações devemos empregar todos os esfôrços o boa vontade. Peço, pois desculpa à Câmara, porém vou continuar.

Parti para a colónia em Abril do 1924 e ainda a bordo, declararam-me que havia uma greve no porto do S. Vicente.

Para que V. Exa. faça urna levo idea do que isso representa de mal para aquela colónia, basta que V. Exa. saiba que perto de dois terços das suas receitas são produzidas pelo porto. Pode assim fazer idea do que representa uma greve dos trabalhadores carvoeiros. Emfim, o melhor que pode e soube, resolvi essa greve, e, resolvida ela, vi que a maioria da colónia me tinha recebido bem, e até hoje tenho feito tudo para administrar o melhor possível, segredando-me a consciência de que tenho cumprido.

Assim é que quando cheguei e observei a grande desordem financeira da colónia por virtude da compra do cambiais vi que se comprava uma libra por 180$ e o dólar por 40$, isto é, por mais de 30$ do que em Lisboa e o dólar por mais 4$ ou 6$ do que em Lisboa.

As medidas tomadas por mim, boas ou más, produziram resultado. Passou-se a comprar a libra e o dólar abaixo do câmbio de Lisboa sobro Londres, perto do 2 por cento. Expulsei a nota de Angola e saniei o meio legal circulante.

Sabe muito bem o Sr. Ministro e sabem todos os Ministros das Colónias que de todos os meus actos dei contas pormenorizadas ao Ministério das Colónias. Olhei um pouco para os serviços administrativos da colónia e fui encontrar o seguinte:

Há muitos anos talvez que se dizia que Cabo Verde precisava dum porto; há muitos anos que Cabo Verde precisa olhar um pouco para as duas crises famíneas e desenvolver serviços e gastar dinheiro em melhoramentos que se reproduzam. Então pedi ao Sr. Ministro das Colónias as receitas das taxas telegráficas, mas apesar das boas palavras, apesar de mesmo quererem mandar para lá empregados, funcionários de toda a espécie, de que a colónia já tinha bastante, o que ó certo ó que o dinheiro nunca lá apareceu, e nunca 3á aparecendo, o que acontece?

Acontece que o porto está como a natureza o deixou, uma ponte da alfândega em mau estado e as pequenas pontes das empresas carvoeiras melhor cuidadas, mas que de nada servem para a colónia, relativamente, visto que os grandes portos de Dukar e Lãs Palmas absorvem toda a navegação.

Assim é que em 1916 os navios que visitavam o porto orçavam por 10 ou 11 e hoje é admiração quando são 3 ou 4. E preciso notar que dos vários vapores do passageiros que por lá faziam escala, nunca menos de 8 por mós, só 1 da Companhia Nacional de Navegação lá toca mensalmente.

Ora veja V. Exa., Sr. Presidente, quantos prejuízos para a colónia isto não representa, sabendo-se que o Estado recebe dois xelins por cada tonelada de carvão, e calcule-se quantas libras deixam de entrar na economia da colónia, com a ausência de navegação de passageiros e com a redução ao mínimo dos de carga que hoje demandam S. Vicente?!

Porque ó que a navegação foge?

Foge exactamente porque as condições do porto o tornam pior que os portos de Dakar e Lãs Palmas.

Nos portos de Dakar e Lãs Palmas o carrão o a água custam muito menos, do que no pôrto de S. Vicente e a navegação tem neles todas as comodidades dos bons portos modernos.

Nestes termos parecia-me natural que se dotasse o porto do S. Vicente com os melhoramentos indispensáveis que o colocassem em condições, senão de superioridade, pelo menos do igualdade aos portos de Dakar e Lãs Palmas.

Devemos por isso pôr o porto de S. Vicente em circunstâncias favoráveis à navegação, o que só pode favorecer a co-

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lónia, e tanto que a porá a coberto das suas crises periódicas de fome.

Todos sabem que hoje duas ou três horas de avanço é reclame bastante para uma companhia de navegação, além da economia que naturalmente resulta da menor distância.

E, como se consegue isto?

Consegue-se, fazendo reverter para a colónia as taxas de trânsito.

Êste ano, por exemplo, que o franco era pago a 70 deve dar 9:000 a 10:000 contos, isto é só dos 50 por cento pertencentes a Cabo Verde.

Gastando durante 5 ou 6 anos essas receitas na construção de um porto, faremos uma obra que se imponha e que com certeza atrairá a S. Vicente a sua antiga navegação, treplicando automaticamente as suas receitas e colocando assim a província, nas condições de se bastar a. si mesma.

Serão despesas que se reproduzirão e imediatamente, além de que, serão feitos à custa da própria Ilha de S. Vicente.

Para o Sr. Ministro das Colónias apelo hoje, para ver, se é possível que de vez se resolva o assunto das taxas de trânsito, vital para Cabo Verde e com tanto mais entusiasmo quanto é certo ser V. Exa. um ilustre caboverdeano e com certeza desejar os progressos da sua terra natal.

Ainda se tais receitas fossem arrecadadas pelo Estado Português para fazer face a alguma necessidade urgente, ou em proveito de toda a colectividade, vá, que se deixasse passar, mas para ser entregue à voracidade vertiginosa da Administração Geral dos Correios e Telégrafos, é um absurdo, para não empregar têrmo pior.

Por isso deve entrar na colónia, onde servirá que mais não seja para debelar a crise dos famintos.

Portanto peço ao Sr. Ministro, em nome dos habitantes de Cabo Verde, que faça com que essa receita que pertence a Cabo Verde, lhe seja entregue pois que a ela tem iniludíveis direitos.

Apoiados.

Sr. Ministro das Colónias: sabe V. Exa. muito bem que um dos grandes males da Ilha do Fogo é a falta de água, na cidade de S. Filipe e freguesia de Santa Catarina.

Há lá propriedades do Estado e que para mais lho não servem do que para pomo de discórdia e que vendidas poderiam render 2:500 contos ou mais, o que bem chegaria para aproveitar a importante nascente de Praia Ladrão, conduzindo as suas águas para onde houvesse falta. Com tal importância ainda se concluiria o porto de Vale de Cavaleiros e se fariam as reparações de que tanto necessita a estrada que rodeia a ilha.

Porque se não hão-de vender aos emigrantes vindos da América pequenos talhões de terra, onde construam as suas casas e tenham uns palmos de terra para semearem, se êles nisso empregam gostosamente os seus dólares e nós temos a vantagem de os fixar à terra e tornar êsses terrenos produtivos?

Além disso receita bastante para dotar a Ilha do Fogo, dos melhoramentos de que mais necessita.

Também S. Vicente não tem água.

V. Exa. sabe que há lá uma Companhia das águas, que cumpre o seu contrato, porque feito há muitas dezenas de anos, apenas tinha de fornecer água para 3:000 a 4:000 habitantes, mas hoje que a população da cidade orça por 16:000 não fornece mais água e nem a isso é obrigada e portanto porque é que se não há-de obrigar a reformar o seu contrato, melhorando os serviços de captação e aproveitamento das nascentes e canalização?

Devo confessar que tenho fundadas esperanças que na própria ilha de S. Vicente, se pode aproveitar muita água potável e experiências se tentarão para êsse fim, mas se isto não der resultados práticos, poderemos voltar-nos para a nascente da Água de Mesa que o Estado não deve vender (Apoiados), mas sim o Estado deve entrar com ela como representativa do capital, numa empresa que ofereça boas condições de exploração da sua deliciosa água.

Vai a hora adiantada e não querendo importunar a Câmara por mais tempo, vou resumir e terminar as muitas considerações que ainda tinha para fazer.

Bem verdade que elas constam já de propostas apresentadas no Ministério e portanto não lhes farei referência especial.

V. Exa. sabe que em Cabo Verde as pontes estão a cair e os cais estão arrui-

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26 Diário da Câmara dos Deputados

nados e o quadro do funcionalismo está desmembrado.

Isto assim não pode continuar.

Portanto termino exortando S. Exa. o Sr. Ministro das Colónias, pedindo-lhe os seus bons ofícios para a recepção das taxas de trânsito que à colónia pertecem e que tantos benefícios acarretariam para a sua situação económica o financeira, na certeza de que o seu nome desde que isso consiga será inscrito a letras de ouro nos mais da história moderna da sua terra natal,

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