Página 29
REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.° 59
(NOCTURNA)
EM 1 DE ABRIL DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Luís António da Silva Tavares de Carvalho
Sumário. - Responderam à chamada 53 Srs. Deputados.
É lida e aprovada, sem discussão, a acta da sessão diurna.
Ordem da noite. - O Sr. Presidente declara que vão entrarem discussão os propostas e projectos de lei que se encontram na Mesa, relativamente a estradas.
É dispensada a leitura a requerimento do Sr. Carlos Pereira.
O Sr. Nuno Simões entende que, havendo diversos projectos de lei, o Sr. Ministro do Comércio deve manifestar-se, em geral, sôbre êles.
O Sr. Ministro do Comercie (Ferreira de Simas) entende que se deve preferir x>ara a discussão imediata o projecto de lei do Sr. Plínio Silva, que por sua vez declara que devem ser discutidas todas as proposições de lei apresentadas.
Responde o Sr. Ministro, dando explicações sôbre a opinião que expusera, como sendo a mais urgente e fácil de realizar.
Una da palavra o Sr. Nuno Simões, seguindo-se o Sr. António Maria da Silva.
O Sr Américo Olavo, para interrogar a Mesa, deseja saber qual é, precisamente, o projecto ou proposta de lei que se discutir, prestando esclarecimentos o Sr. Presidente.
Neste incidente tomam parte os Srs. Nuno Simões e Plínio Silva,
Usa da palavra o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães).
O Sr. Plínio Silva diz haver divergência de critério entre os Srs. Ministro das Finanças e Ministro do Comércio, impugnando o primeiro esta opinião.
O Sr. Joaquim Ribeiro apresenta e justifica uma moção de ordem, que é admitida, depois de usar da palavra sôbre o modo de votar o Sr. Carvalho da Silva.
Segue-se o Sr. Velhinho Correia. É encerrada a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte, à hora regimental.
Abertura da sessão às 15 horas e 20 minutos.
Presentes à chamada 63 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 7 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Adolfo Augusto do Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Albino Pinto da Fonseca.
Amadeu Leito de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Resende.
Baltasar do Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio do Vasconcelos.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Página 30
2 Diário da Câmara dos Deputados
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Coelho do Amaral Réis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João José da Conceição Camoesas.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luis da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Nuno Simões.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Valentim Guerra.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo do Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
António Correia.
António de Mendonça.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
José Domingues dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Júlio Henrique de Abreu.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso do Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto do Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo da Silva Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso do Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Cruz.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Duarte Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estevão Aguas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
Página 31
Sessão de 1 de Abril de 1925 3
João Pina do Morais Júnior.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Cortês dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais do Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queirós.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Procedeu-se à chamada.
O Sr. Presidente (Às 22 horas e 13 minutos):- Responderam à chamada 53 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Foi lida e aprovada a acta da sessão diurna.
ORDEM DA NOITE
O Sr. Presidente: - Vão entrar em discussão as propostas e projectos de lei sôbre as estradas que se acham sôbre a Mesa.
Vai proceder-se à sua leitura.
O Sr. Carlos Pereira: - Requeiro a dispensa da leitura dos projectos e propostas de lei que vão entrar em discussão.
Consultada a Câmara, foi dispensada a leitura.
O Sr. Nuno Simões: - Sr. Presidente: havendo sobra a Mesa algumas propostas e projectos de lei relativos a estradas, parecia-me de toda a conveniência que, para orientarmos a nossa discussão, o Sr. Ministro do Comércio se pronunciasse sôbre o assunto.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Ferreira do Simas): - Sr. Presidente: conheço alguma cousa dos projectos de lei do Sr. António da Fonseca e do Sr. Lima Basto, e vejo agora um do Sr. Lúcio de Azevedo e outro do Sr. Plínio Silva. O que me parecia interessante era discutir o projecto de lei apresentado pelo Sr. Plínio Silva, porque êle é pelo menos um paliativo. Quanto aos outros, acho-os muito extensos e não os conheço suficientemente para poder emitir a minha opinião.
O orador não reviu.
O Sr. Plínio Silva: - Sr. Presidente: eu não posso deixar de agradecer ao Sr. Ministro do Comércio as referências imerecidas que me fez, mas se elas, pessoalmente, me podem ser muito gratas, não me bastam, no emtanto, pelo que respeita ao trabalho que a Câmara deve fazer.
A Câmara sabe que algumas pessoas se interessam por êste problema das estradas há muitíssimo tempo.
Página 32
4 Diário da Câmara dos Deputados
Não foi hoje nem ontem que nós começámos a estudar o problema das estradas. Tem sido um trabalho contínuo, que tem merecido vários alvitres, vários projectos o propostas do lei, vários pontos de vista e, até em homenagem a pessoas que aqui só não encontram, eu entendo que, uma voz que o Sr. Nuno Simões requereu que fossem considerados todos os projectos de lei que se encontram sôbre a Mesa, evidentemente a Câmara não deve deixar do os discutir.
Nestas condições, é-me extraordinariamente agradável que o Sr. Ministro de Comércio tivesse dito que o meu projecto de lei era o mais aceitável. Mas eu pregunto a S. Exa. se julga que, aprovado que seja êsse meu projecto do lei, o problema fica resolvido. £ Julga S. Exa. que com a apresentação do meu projecto de lei ficaria resolvido o problema? Eu respondo que não, porquanto isso seria deminuir a minha própria profissão. E se queremos fazer trabalho consciencioso e marcar a nossa posição, devo confessar que me não satisfaz que se vote apenas o meu projecto de lei, porque longe do mim pensar que êle só por si basta para dar solução ao assunto.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Ferreira de Simas): - Eu até disse que o projecto do lei apresentado por V. Exa. ora um paliativo para ajudar algumas reparações.
O Orador: - Mas também não é um paliativo. Tem um grande alcance, um grande objectivo.
Nestes termos, para que todos nos possamos entender, para que o País nos respeite o não se possa dizer que estamos a propor qualquer cousa que nos interessa, eu entendo que devemos estudar o problema em todos os seus detalhes, e por isso aceitei o requerimento feito pelo Sr. Nuno Simões, a fim do serem apreciados todos os projectos de lei que estão sôbre a Mesa, visto que todos êles têm objectivos diferentes.
O que é preciso é tratar do assunto a sério o conseguir maneira do se fazer alguma cousa de útil. Esta deve ser a preocupação do Sr. Ministro do Comércio o do Sr. Ministro das Finanças. Só não só proceder dessa forma, iludimos o País.
Assim, entendo que a minha posição nesta discussão é começar por ouvir, para depois fazer as minhas observações, uma vez que, mais ou menos, já tive ocasião de dizer o que penso sôbre o assunto, uma vez que, por homenagem, repito, a uma pessoa que não está presente, o Sr. António da Fonseca, o com quem eu tive bastantes discussões, só tem do fazer a apreciação do todos os projectos de lei referentes ao assunto.
Interessa me, portanto, conhecer a opinião do Sr. Ministro do Comércio, no sentido de saber se é, ou não, possível começar-se a fazer, desde já, alguma cousa de útil; se devo manter-se a orientação actual ou se haverá vantagem em a modificar; se é preferível discutir todos os projectos do lei referentes a esta questão ou limitarmo-nos a discutir aquele que eu apresentei.
E eu digo já que, mesmo que fôsse aprovado o meu projecto de lei, não mo daria por satisfeito.
S. Exa. o Sr. Ministro do Comércio já deve ter começado a receber trabalhos do várias comissões do estradas, que honram as pessoas que os produziram. Eu tenho responsabilidades nisso, porque incitei todos a trabalhar com o maior cuidado no assunto, afirmando-lhes que o seu, trabalho não seria feito debalde.
E portanto necessário ver como vamos valorizar êsse trabalho.
Eu tenho uns apontamentos para serem apreciados, sôbre estradas distritais; tenho um apontamento completo dos trabalhos apresentados o por êles verifiquei que já havia trabalhos que permitam abrir concurso para uma extensão do quatrocentos quilómetros.
Eu entendo que temos de estudar, de pôr em praça, de abrir empreitadas o do estabelecer cadernos do encargos, para que, realmente, êste trabalho possa ser aproveitado.
Espero que o Sr. Ministro do Comércio se pronuncio sôbre o assunto.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comercio e Comunicações (Ferreira de Simas): - Sr. Presidente: longe do mim a idea de supor que o projecto apresentado pelo Sr. Plínio Silva resolvo o problema das estradas.
Assenta um princípio, é certo, e de só
Página 33
Sessuo de 1 de Abril de 1925 5
recolherem no Ministério do Comércio as receitas destinadas às reparações de estradas.
Assim, como podia supor que o projecto resolva o problema, se eu sei, pelas informações que me têm sido dadas, que o imposto do turismo não deu no primeiro trimestre mais de 1:600 contos, e no segundo também deve ter dado aproximadamente o mesmo, de modo que se calcula que não passará a 8:000 a 9:000 contos o dinheiro que só poderá receber por êsse meio!
Ora as empreitadas a que se refere o Sr. Plínio Silva, os troços já estudados e que são naturalmente da estrada que de Valença vem pelo Pôrto, Lisboa, Faro até Vila Real do Santo António, e as estradas que de Lisboa podem ir até à fronteira, na extensão de 4:690 quilómetros, importarão em 23:309 contos nas suas reparações.
Pelo estudo, que dá 57 contos por quilómetro, êsses 4:690 quilómetros do estrada, que precisam de reparação urgente, importarão em 269:000 contos, de forma que, segundo o cálculo feito na Administração Geral de Estradas, seria preciso nos primeiros cinco anos fazer incluir no Orçamento 55:000 contos a mais para êstes 4:690 quilómetros do estrada, te mais 41:000 contos durante cada ano, até perfazer 12 anos.
Tendo-me o Sr. administrador geral de estradas, a quem eu não posso deixar de prestar as minhas homenagens como engenheiro distintíssimo que é, e que com a maior competência tem estudado o dirigido o trabalho dos seus subordinados, proposto o reforço da verba para a reparação da estrada de Valença a Vila Real de Santo António, dentro dêste ano económico, com 46:000 contos, é de crer que, nestas condições, eu não pudesse supor que o projecto do Sr. Plínio Silva resolvia o problema.
Estabelece um princípio, que não é positivamente novo, do arrecadar as receitas destinadas à reparação de estradas, mas não chega. A minha insistência para ser discutido êsse projecto é porque vinha auxiliar a reparação urgente de vários troços de estrada, pelo menos daqueles que a Administração Geral de Estradas julgue mais urgentes, de harmonia com o plano que tem traçado.
Quanto aos projectos dos Srs. António Fonseca e Portugal Durão, as verbas com que contem não chegam para as reparações, com os salários de hoje, trinta vezes maiores do que eram antigamente.
Parece-me, portanto, conveniente que a Câmara estude, de preferência, o projecto do Sr. Plínio Silva.
O Sr. Plínio Silva: - V. Exa. dá-me licença?
Eu tenho o máximo interêsse e desejo que o meu projecto passe, mas pretendia que V. Exa. d apresentasse já o seu ponto de vista sôbre a forma como entendo que se deve considerar êsse trabalho e começar a fazer alguma cousa; a abertura de empreitadas; por exemplo.
Era isso que eu esperava de V. Exa., pois estou convencido do que, com qualquer alteração, o projecto que tive a honra de apresentar será aprovado.
O Orador: - Continuo a manter o meu ponto do vista, que é o de me parecer conveniente que a Câmara aprecie o projecto do Sr. Plínio Silva.
O Sr. Nuno Simões: - V. Exa. pode dizer à Câmara, concretamente, se é partidário ou não da autonomia das estradas?
O Orador: - Eu julgo-a vantajosa, porque, de mais a mais, não tem uma larga experiência a questão da autonomia das estradas.
Mas essa experiência não está feita de forma tal que essa autonomia não se deva adoptar.
O Sr. Nuno Simões: - V. Exa. é então partidário da autonomia das estradas?
V. Exa. condena, portanto, uma parte da proposta da autoria do Sr. Lima Bastos.
O Orador: - Certamente. E questão de a estudar.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes formos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Nuno Simões: - Sr. Presidente: afirmei há dias numa conferência pública
Página 34
6 Diário da Câmara dos Deputados
que o Estado há dez anos, pode assim dizer-se, que perdeu a sua função do cumpridor e propulsor do fomento económico do País.
Mantenho inteiramente essa afirmação, e se precisasse, Sr. Presidente, de mais perfeita demonstração do que afirmei, bastava-me realmente a indecisão do Sr. Ministro do Comércio para me convencer mais profundamente de que acertei numa verdade.
Sr. Presidente: sabe V. Exa. e sabe a Câmara que de 1914 para cá, com todas as indecisões que à nossa política administrativa trouxe a guerra, as enormes dificuldades que nos trouxe a situação da moeda, os desmazeles de toda a ordem em que a nossa política em certo momento começou a traduzir-se, e que deveria infelizmente vir por aí fora até aos nossos dias, traduzindo-se por desânimos de toda a ordem, pela confissão muitas vezes feita de que não é possível governar nas actuais condições parlamentares, por causa da instabilidade ministerial, a falta de continuidade nas cadeiras do Poder, a falta de um plano, nos conduziu a todos, republicanos, à situação a que chegamos.
O facto é que tendo o Sr. Velhinho Correia, com muita inteligência, com muita visão dos acontecimentos -eu falo Sr. Presidente, para prestar justiça a um dos parlamentares que dentro desta Câmara mais trabalham e a um dos Ministros que passando pela pasta do Comércio com mais opurtunidade viu o problema das estradas - em 1920 procurado dar autonomia a êsse serviço, procedendo assim evidenciou notáveis conhecimentos desta questão que se tem sido seguida e acompanhada de todos os esfôrços não teríamos chegado à situação em que nos encontramos.
Começo por dizer que a respeito de estradas, dentro do princípio da autonomia, o princípio das grandes empreitadas, o princípio dos concursos entre grandes emprêsas, a isenção de direitos para as máquinas destinadas às reparações, faça--se justiça a quem de direito, se deve ao Sr. Velhinho Correia quando Ministro do Comércio em 1920.
É de bom grado afirmo que o Sr. Velhinho Correia, de cujos actos como político bastas vezes tenho discordado, tem de ser reconhecido como uma das pessoas
que dentro do Ministério do Comércio mais se esforçou por fazer uma obra útil, não só para a Nação como para a República.
Tenho aqui à mão a reorganização do Ministério do Comércio na parte respeitante às estradas; tenho à mão todos os projectos e propostas que depois de 1920 foram apresentados, e que eu considero como causas principais da situação a que se chegou em matéria de viação ordinária.
Podem ser verificados por todos, examinando a história política dos últimos tempos.
Não há dúvida, Sr. Presidente, de que matéria de iniciativa naquilo que propriamente diz respeito ao pensamento sôbre estradas, o Sr. Velhinho Correia fez quanto nesse momento era possível, era útil e necessário fazer-se.
Mas, o Sr. Velhinho Correia não pôde no Ministério que fez parte dar realização ao capítulo da sua reforma que dizia respeito ao serviço de estradas, e só parcialmente, muito parcialmente no que diz suspeito propriamente a pessoal, a sua reforma se cumpriu.
Sucedeu, Sr. Presidente, que começaram depois as variadíssimas tentativas de dar efectividade à reforma do Sr. Velhinho Correia.
Outro ilustre parlamentar, a quem a política de fomento económico do País deve assinalados serviços, é o Sr. António Fonseca (Apoiados], que traduziu o seu superior pensamento político em algumas propostas de lei e algumas medidas de que já hoje estamos colhendo os benefícios: Apoiados.
E não me esqueço, Sr. Presidente, de citar a chamada lei de protecção à marinha mercante nacional, que o ilustre Deputado Sr. Vasco Borges no Ministério tam depreciativamente tratado, como o foi o que se seguiu ao 19 de Outubro, teve a felicíssima idea de pôr em vigor, e que o Sr. Lima Basto, depois pôde modificar, no sentido de a tornar mais útil, transformando-a numa lei de defesa económica, que permitiu todos os acordos comerciais que neste momento temos e que tambem. estão servindo a economia nacional.
Sem a lei de protecção à marinha mercante, não teríamos possibilidade de reatar os acordos com os países em condi-
Página 35
Sessão de 1 de Abril de 1925 7
coes vantajosas para os nossos interêsses económicos.
Como V. Exas. sabem muito bem, foi depois das modificações à lei da marinha mercante que se fizeram todos os acordos comerciais, utilizando-o principalmente o bónus de 25 por cento no imposto de comércio marítimo.
Devemos fazer justiça às pessoas que nesta falta de política de fomento económico, a que o Estado se condenou e foi condenado, e se condenou porque muitas pessoas se esqueceram da sua função nas cadeiras do Poder, e condenado foi pelas circunstâncias excepcionais em que êles tiveram do trabalhar, de justiça é, repito, que a essas pessoas se faça justiça, porque procuraram trabalhar com actividade.
E se o Sr. Velhinho Correia trabalhou, o Sr. António da Fonseca empregou também todos os seus esfôrços na proposta da marinha mercante.
Em 1920 reconheceu-se que era necessário olhar a sério para o problema das estradas, porque era um dos instrumentos da circulação da riqueza pública; que era necessário fazer um esfôrço para readquirir o perdido, seis anos de absoluta isenção em matéria de estradas" absolutamente ineficazes em matéria de fomento na nossa viação ordinária.
Toda a Câmara conhece as condições absolutamente desastrosas, absolutamente incomportáveis em que se encontram as estradas, e em que se encontravam já em 1920, e de então para cá têm sido contrariados todos os esfôrços, porque podendo êles contar com a boa vontade individual de cada um dos Srs. Deputados e Senadores, esbarram com a inércia colectiva que, em certo momento, podia ter resolvido a questão e que não a quis resolver.
Sr. Presidente: o Sr. Lima Basto, quando em 1922 sobraçou a pasta do Comércio, trouxe à Câmara, junto com o Sr, Portugal Durão, uma proposta de lei que foi apreciada em todas as comissões, que teve parecer de todas as comissões, que foi largamente discutida na imprensa, mas que, Sr. Presidente, não logrou ser discutida na Câmara em condições de poder ser aprovada.
Já então se discutia se o pensamento do Sr. Velhinho Correia era ou não de aceitar, referente à questão da autonomia das estradas, em face das provas desastradas que as autonomias estavam dando em todos os serviços públicos, se realmente deveria criar-se uma nova autonomia- que até então só tinha sido concedida aos quadros do pessoal.
Dêsse conflito entre partidários da autonomia e inimigos da autonomia, resultou que a proposta do Sr. Lima Basto não foi discutida nem aprovada.
Em Janeiro dêsse ano o Sr. António da Fonseca, como Ministro do Comércio, trouxe à Câmara uma nova proposta que procurava resolver o problema, e então já dentro do princípio da autonomia.
Presto, Sr. Presidente, homenagem justa e sincera ao entusiasmo, à sinceridade com que o Sr. António da Fonseca em certo momento da sua vida governativa chegou a fazer questão política da questão das estradas.
Quando um homem público se capacita de que a sua função é realizar alguma cousa de útil e vantajoso para o País, traduzir por factos indiscutivelmente úteis para a colectividade a sua acção no Govêrno, quando um homem público nessas condições faz questão política, põe a sua pasta em jôgo para que lhe deixem cumprir o seu dever, o País deve a êsse homem público a sua comovida e sincera homenagem.
Muitos apoiados.
Tanto mais que estamos habituados a ver os homens procurar passar pelo Poder com a intenção apenas de no Poder servirem as clientelas políticas.
Em questão de administração pública, sôbre o problema das estradas, não há nada feito desde 1913, quando foi do projecto de António Maria da Silva sôbre estradas, que tantas vantagens podia trazer para o País e poderia ter concorrido para que êsse problema em Portugal fôsse resolvido. Pois desde então nada se fez!
Apresentou o Sr. António da Fonseca a sua proposta ao Parlamento, iniciou-se a discussão dessa proposta, o Parlamento preconizou várias vezes a necessidade de se discutir e aprovar essa proposta, e já o Sr. Plínio Silva declarou, com o desassombro que o caracteriza, que não foi por mero capricho ou birra que em certo momento discutiu com o Sr. António da Fonseca aquilo que o antigo Ministro do
Página 36
8 Diário da Câmara aos Deputados
Comércio entendia que devia fazer, o que era uma justa aspiração de muitas regiões, nada conseguindo, chegando-se à conclusão de não haver estradas.
Mas, apesar de tudo isso, o Sr, António da Fonseca saiu da pasta do Comércio sem ver discutida a sua proposta.
Coube-me a honra de suceder ao Sr. António da Fonseca na pasta do Comércio, e, em certo momento, deixou-se do fazer o que eu reputava uma questão política.
Mal mo foi dado tempo para aplicar as exíguas verbas que podia, em corto momento, conseguir que o Parlamento me votasse, para acudir aos prejuízos enormes que a invernia tinha causado.
E, Sr. Presidente, já que o Sr. Plínio Silva se referiu, e muito bem, à estrada de Cascais, justo é dizer que, tendo o Sr. António da Fonseca apresentado à Câmara uma proposta para que se aplicasse do fundo da marinha mercante 5:000 contos para aperfeiçoamento das estradas do Lisboa a Sintra e Cascais, encontrei no Senado tais dificuldades em votar essa proposta, que tinha sido votada na Câmara dos Deputados quási sem discussão, que me vi forçado a transigir.
Sr. Presidente: é necessário que alguma cousa sôbre estradas se faça, através de todos os sacrifícios, porque a vida económica das regiões que se estão desenvolvendo, carece que haja de distrito para distrito de concelho para concelho, as ligações que são absolutamente indispensáveis.
Desde então em matéria de estradas o Sr. Plínio Silva propôs e de lêndea, com todo o calor, um empréstimo de 15:000 contos, o qual infelizmente não se traduziu numa verdadeira utilidade, porque, conforme o Sr. Ministro do Comércio acaba de confessar, não se pôde realizar. Portanto o esfôrço do Sr. Plínio Silva o da Câmara perdeu-se inteiramente, com excepção feita dos cantoneiros, os pobres servidores do Estado, que, tendo visto aumentar todos os vencimentos o salários dos servidores do Estado, ficará completamente esquecidos. E devo dizer que, apesar de estarem mal pagos, procuravam cumprir o seu dever o melhor que era possível, embora com fome ninguém possa prestar serviço, pois tom de pensar em auferir fora do serviço do Estado a remuneração que o Estado não lhe concede.
Agora mais uma vez, depois das declarações feitas pelo Sr. Ministro do Comércio, chegou-se até à campanha jornalística, em que o Sr. Plínio Silva encontrou um pretexto que não precisava para mais uma vez chamar a atenção da Câmara para a questão das estradas.
Sr. Presidente: O Sr. Plínio Silva, que aproveitou êsse pretexto, do que aliás não carecia o seu zêlo o dedicação pelo problema, propôs-se tratar esta questão.
Pela minha parto entendi não dever opor-mo à intenção de S. Exa. numa outra proposta, que visava acabar com a série de propostas e projectos do lei pendentes na Câmara, relativos a estradas, de modo a definir por uma vez uma política de estradas que está por definir, visto o Sr. Ministro do Comércio entender que não está suficientemente experimentada a autonomia dêsse serviço.
Sr. Presidente: eu fui já infelizmente para o País duas vezes Ministro do Comércio.
Vozes:-Não apoiado, não apoiado.
O Orador: - O que é um facto é que pouco tempo lá estivo, e assim mal tive tempo de estudar o assunto; porém alguma cousa procurei fazer nesse pouco tempo que lá estive, tendo deixado no Ministério do Comércio alguns elementos necessários sôbre o aproveitamento dos combustíveis nacionais, tendo até nomeado uma comissão para estudar o assunto.
O que é um facto, Sr. Presidente, é que não tendo sido possível nessa ocasião resolver o problema das estradas, que eu considero fundamental, devido a haver então outros assuntos importantíssimos a tratar do ordem financeira, entendi por bem que nada mais tinha a fazer no Ministério do Comércio, se bem que na verdade eu entendesse, como entendo ainda hoje, que o assunto necessita do uma urgente resolução.
De então para cá apenas tenho falado o escrito sôbre o assunto, colocando-me inteiramente ao lado de todas as pessoas que se têm interessado por elo, muito principalmente o Sr. Plínio Silva, pois, a verdade é que só trata de um problema do interesso público, de uma questão do
Página 37
Sessão de 1 de Abril de 1925 9
reconhecida importância para a economia do País.
Torna-se na verdade, Sr. Presidente, urgentíssimo reparar as estradas que temos, que na verdade se encontram num estado verdadeiramente deplorável, e construir as que são necessárias, dando assim uma- satisfação ao País sôbre as reclamações que de há muito êle vem fazendo sôbre o assunto.
Tenho a certeza de que a Câmara será a primeira a reconhecer que chegou a hora de nortear-se a acção do Govêrno pelo caminho decidido forte, firme e seguro - fomentar a economia do País.
Apoiados.
Sr. Prosidente: requeri a V. Exa., quando o Sr. Plínio Silva se propôs tratar em negócio urgente dêste problema, que se consultasse a Câmara sôbre se concordava em que se fizesse a discussão, apreciando todos os projectos e propostas de lei sôbre o assunto.
Quando V. Exa. abriu a sessão, fiz uma pregunta ao Sr. Ministro do Comércio, sôbre qual a sua orientação, o seu ponto de vista em relação a propostas e projectos. S. Exa. não devia nem podia desconhecer, pelo estudo certamente que fez do assunto, porque não lhe faltam elementos de informação, colaboração e estudo, o estado da questão, para assim formar uma opinião de qual o projecto ou proposta a adoptar, para que possamos orientar a discussão, produzindo trabalho útil.
Doutra forma necessàriamente se cairia num debate em que cada um de nós tem a sua reclamação a fazer, tem o seu caso a pôr, a sua justiça a invocar, mas em que nós todos nos não entenderemos, nada, de útil poderemos produzir.
Apoiados.
O Sr. Ministro do Comércio declarou que entendia se deveria aprovar desde já o projecto recentemente apresentado pelo Sr. Plínio Silva, que colocava à disposição da Administração Geral das Estradas e do Ministério do Comércio as receitas provenientes do imposto de viação e turismo, como V. Exas. sabem modificado pelo regulamento do Sr. Queiroz Vaz Guedes.
Talvez o Sr. Ministro do Comércio tenha razão, talvez S. Exa., com a moção que nos deu da sua confiança restrita nas
vantagens e utilidade do projecto do Sr. Plínio Silva, veja bem o problema de momento, mas o que não parece bem é que tendo o Sr. Ministro do Comércio dito palavras de homenagem ao administrador geral das estradas, citado informações, referencias e estudas realizados, o se julgue que sôbre o problema tem determinados pontos de vista, não exponha claramente à Câmara qual êsse ponto de vista.
Talvez o Sr. Ministro do Comércio julgue que não vale a pena discutir as propostas, e nos traga outra dentro da sua orientação.
Não valo a pena acreditarmos que o problema das estradas se resolve unicamente porque num jornal, aliás dos de maior tiragem e que largas iniciativas, muito úteis e louváveis, tem tido, com vantagens para o Pais, se fala com entusiasmo o chama a atenção da população portuguesa para o caso.
Infelizmente o País todo sabe qual é a situação das estradas, e não há nenhum parlamentar - creio eu - que não tenha informações a dar, episódios a contar, sôbre o estado das estradas, que é lastimável, lastimável sempre, no círculo a que pertencera.
Sr. Presidente: êste problema é sobretudo financeiro.
Ora desde que o Ministro do Comércio vem declarar à Câmara que lhe não foi possível obter um empréstimo de 15:000 contos na Caixa Geral dos Depósitos, votado há quási um ano, pregunto a V. Exa. e à Câmara como vamos nós pensar em resolver o problema?
Para mais, o Sr. Ministro do Comércio rectificou alguns números que o Sr. Plínio Silva, quando Ministro do Comércio trouxe à Câmara.
A crença, a viva fé que o Sr. Plínio Silva então tinha em que, ainda êste ano, excedesse 12:000 contos a receita proveniente do fundo de viação e turismo, foi e é inteiramente prejudicada pelos números e pelo desânimo que o actual Ministro dessa pasta tem e apresenta perante a Câmara.
Sr. Presidente: quando há dias. o Sr. Plínio Silva, a respeito de caminhos de ferro, requereu que se discutisse também um projecto da sua autoria, que fizesse voltar ao statu quo ante as receitas pro-
Página 38
10 Diário da Câmara dos Deputados
venientes do imposto de solo, pertencentes ao fundo especial dos caminhos de ferro, o Ministro das Finanças não teve de declarar se estava ou não de acordo com essa transferência de receitas do Orçamento Geral do Estado para o fundo dos caminhos de ferro.
A Mesa declarou então, interpretando uma disposição legal, que não podia aceitar e ser discutido, portanto, o projecto de S. Exa., visto que cerceava as receitas gerais do Estado.
Sr. Presidente: sucede o mesmo exactamente com as estradas, mas longe de mim querer que o fundo de viação e turismo seja mais uma vez durante o ano económico corrente afastado das despesas gerais das estradas.
A criação do fundo privativo tem um objectivo que exige sacrifícios aos contribuintes.
Assim compreende-se que efectivamente essas receitas devem ser aplicadas ao objectivo para que foram criadas.
V. Exa. não ignora, toda a Câmara sabe, que em vários pontos do País se deram actos de rebeldia contra a cobrança do imposto de viação e turismo, mas eu quero crer que êsses actos não são de recusa, mas pelo contrário uma indicação ao Govêrno e ao Parlamento, para que êsse fundo seja aplicado como deve.
Apoiados.
Eu não quero preguntar ao Sr. Ministro das Finanças se concorda ou não com o projecto do Sr. Plínio Silva.
O Sr. Ministro das Finanças não pode ter apenas o critério fiscal, o Deputado Vitorino Guimarães pensa exactamente como todos nós nesta questão das estradas.
Não obstante o projecto do Sr. Plínio Silva não ter parecer das comissões, o que vejo é que estão todos de acordo, e portanto deve necessàriamente ser aprovado (Apoiados), mas, tal como está, não creio.
Eu presto também a minha homenagem ao administrador geral das estradas, mas não concordo de nenhum modo com o regulamento ultimamente elaborado.
Não por fazer projectos, não por mandar fazer estudos, mas por atribuir a numerosos conselhos caiados sem qualquer remuneração pelo Sr. Velhinho Correia cédulas de presença de uma centena e meia de escudos, o em que se começou
por aplicar as verbas de estradas não às estradas, mas às pessoas que, tendo de dirigir a política das estradas, começavam por ter não só essas cédulas de presença, mas também passes em todos os caminhos de ferro.
O Sr. administrador geral das estradas pode ser uma pessoa muito competente, nenhuma dúvida tenho em aceitar as afirmações produzidas pelo Sr. Ministro do Comércio, e não me passaram despercebidos os aplausos que a essas declarações deram, tanto o Sr. António Maria da Silva, como o Sr. Plínio Silva, mas não me dispenso de mostrar à Câmara a minha estranheza por ter sido o primeiro acto importante da administração geral das estradas, desde que lá está o engenheiro Sr. Francisco Maria Henriques, a publicação de um regulamento que começa por distribuir o dinheiro das estradas, em algumas centenas de escudos que podem ir a alguns contos de reis se as reuniões forem muitas, para pessoas que forem chamadas a fazer parte dos conselhos de administração.
Êste meu reparo tem de ir um pouco mais longe. Suponho que nas modificações feitas ao estabelecido na reorganização do Sr. Velhinho Correia, e a que não vejo nenhum a vantagem, e será difícil provar que a tenha, se estabelece uma contabilidade privativa das estradas.
Estou certo que era êsse o pensamento de 1920, mas não há dúvida que pode tornar-se singular a circunstância de, querendo-se essa contabilidade privativa, passarem a fazer-se os pagamentos por êsse País fora pelas próprias pessoas que elaboram as folhas.
Não é de aceitar êste princípio em administração pública; em administração republicana será muito de condenar.
Apoiados.
Não é agora, evidentemente, ocasião de fazer o exame dêsse regulamento, mas êstes simples factos demonstram que não houve ao elaborá-lo o cuidado que deveria haver para se demonstrar ao País que mais uma vez se não reincidia na política de certos serviços feita para servir o pessoal deles.
Sr. Presidente: o Sr. Velhinho Correia quando estabeleceu o conselho de administração das estradas, deu representação nele a várias entidades que podiam ter,
Página 39
Sensão de 1 de Abril de 1925 11
digamos, interêsses e que podiam dar pelo seu saber elementos úteis para a resolução do problema.
O que é um facto é que algumas pessoas se chegaram a alarmar com o alvitre apresentado para se utilizar na reparação e construção das estradas algum dinheiro do fundo destinado à marinha mercante.
Nada se tom feito até hoje, a não ser a criação da Administração Geral das Estradas,, para onde se tem levado algum pessoal, que na verdade nada produz, mas que não deixa de receber os seus vencimentos.
Nestes termos, Sr. Presidente, eu tenciono mandar para a Mesa uma proposta de emenda, com a qual não sei se o Sr. Plínio Silva estará de acordo, mas que tem por fim única e exclusivamente tirar da Administração Geral das Estradas todos os serviços respeitantes a contabilidade, visto que da forma como ela está organizada não dá os resultados que seria para desejar.
Estou até certo ponto certo de que o Sr. Plínio Silva não deixará de concordar com essa emenda, que vou mandar para a Mesa, visto que ela é de todo o ponto justa.
Desta forma estou certo de que as receitas serão devidamente escrituradas, e assim devidamente aproveitadas para o fim que só tem em vista, qual seja a reparação e construção das estradas do nosso País.
Sr. Presidente: feitas estas rápidas declarações, a respeito dêste assunto, reservo-me para sôbre elas me pronunciar quando o Sr. Ministro do Comércio tiver dado à Câmara as explicações que a Câmara lhe pediu e eu peço.
Precisamos colocar-nos na situação de não estarmos a fazer um debate estéril, desordenado, sem vantagem para ninguém; pelo contrário, devemos fazer um debate útil.
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. António Maria da Silva: - Pedi a palavra pelo facto de ter sido chamado ao debate pelo tom amistoso das palavras
do Sr. Nuno Simões, por ter tomado a iniciativa dum projecto de lei em 1912 sôbre estradas. Tive o prazer de ver toda a Câmara interessada, todo o Parlamento, e ver o projecto aprovado tal qual tinha saído, na sessão última antes dó Natal.
Votou-se, quando eu já era Ministro num Ministério do Sr. Afonso Costa.
Não teve uma única emenda.
Mais ainda: um meu antagonista político, já falecido, pediu mais de uma vez que ficasse registado na acta que os meus projectos tinham sido aprovados por unanimidade.
Isto dá-me a convicção de que êste assunto será tratado como é necessário que o seja, e que antes de esta Câmara encerrar os seus trabalhos, antes de completar esta legislatura, de facto o meu colega e amigo Plínio Silva verá transformado em lei o seu projecto, porque é indispensável se subordinem a um piano os trabalhos da Câmara.
Assim teremos ensejo de dizer que nesta sessão legislativa vimos terem resolução vários problemas, porque não fazia sentido que esta Câmara, que tantos serviços tem prestado ao País, não prestasse êste outro.
Embora não constitua uma originalidade, porque já em Espanha representou a melhor maneira de levar à prática o problema hidráulico, tam inteligentemente pôsto por um homem ilustre, que se chamou Joaquim Costa, e pelo notável Ministro do Fomento do tempo, poderá dar os melhores resultados o exemplo agora seguido por um jornal português.
Folgo muito com a união dêsses três organismos - Parlamento, imprensa e técnicos- e estou convencido de que dela há-de resultar tanto proveito para Portugal como em Espanha resultou para a solução de um problema de capital importância que, infelizmente, nem sequer está iniciado no País.
Disse o Sr. Plínio Silva que, embora isso lhe possa ser muito agradável por representar o reconhecimento do seu trabalho, não basta que apenas se aprove o seu projecto de lei, e o Sr. Ministro do Comércio mostrou que já se contentava com que, ao que pode render o imposto de viação e turismo, se adicionem as verbas que estão incluídas no Orçamento para o ano futuro. Eu direi: independemente do
Página 40
12 Diário da Câmara dos Deputados
plano geral sôbre o problema, desejaria que esta Câmara votasse um crédito extraordinário para se iniciar desde já tudo que é absolutamente essencial sub o ponto de vista burocrático, de modo a no princípio do ano se poder começar a trabalhar.
Em 1912 tive a honra de, para elucidação d Câmara, apresentar o meu relatório, em que expunha os meus pontos de vista.
Sr. Presidente: a única maneira de tratar do problema das estradas é estabelecer um plano.
Somos nós que temos do o fazer.
Sr. Presidente: não é êste o processo de se tratarem assuntos desta natureza, e o único caminho é dar as verbas necessárias para se poder iniciar os trabalhos.
Tenho pena de neste momento não poder dispor, por os não ter trazido, os números que me foram fornecidos pelo engenheiro Sr. Francisco Maria Henriques, pessoa de elevada cultura e com grandes faculdades de trabalho, porque por êles a Câmara verificaria quanto razão tenho no que digo.
Sr. Presidente: seria o mesmo que dizer ao administrador geral das estradas que tratasse delas, sem lhe dar dinheiro.
O problema é êste: quanto é necessário para consertar as estradas?
É preciso a importância de a?, e o caminho a seguir é arranjar êsse dinheiro, para depois se exigir que as estradas sejam transitáveis. Êste é que é o caminho.
Nestas condições, o que há a fazer é obter o devido rendimento do imposto de viação e turismo, incluindo no orçamento a verba necessária para a reparação das estradas.
Emquanto assim não fizermos, havemos de continuar no caciquismo, que era feito no tempo da Monarquia. E necessário que se não faça politiquice, porque acima de nós está o regime, e nós não devemos dar aos nossos adversários instrumentos de crítica.
Em regra o público indigna-se quando lhe pedem mais sacrifícios, mas o que é verdade é que, uma vez que o dinheiro seja destinado àquilo que deve ser, o público arrepia caminho.
Sabe a Câmara porque é que a verba não entra por completo?
E porque não há maneira de sair do Ministério das Finanças sem o visto do respectivo Ministro.
É portanto, nós, que estamos a exigir ao País o imposto de viação, temos que dizer a todos os Ministros das Finanças: "o senhor não tem o direito de tinir meio centavo que seja dessa proveniência, porque, do contrário, o senhor é um criminoso".
E esta a doutrina, única compatível com o regime republicano e a única defensável na República.
E, como é também uma dos nossas prorrogam as incluir essa. verba no Orçamento, ou estou convencido do que, quer o Sr. Ministro do Comércio, quer o Sr. Ministro das Finanças, se não servirão desta lei para instrumento de politiquice e darão ao País a noção do seu espírito patriótico fazendo inscrever no Orçamento a respectiva verba, a fim de que, de uma vez para sempre, se acabe com êsse cancro e se resolvam depois todos os problemas económicos com a mesma elevação.
Quere a Câmara resolver o problema das estradas?
Tom que fazer inserir no Orçamento do Estado, em cada ano económico, a verba absolutamente necessária para acorrer às despesas que elas trazem. Se assim não fizer, ludibriará eternamente o País, porque as estradas, que ainda hoje se encontram em estado regular, passam a ficar intransitáveis.
Acabemos de vez com esta situação, e respeitemos a Câmara do 191J, que deu um grande exemplo ao País.
A República não quere servir-se das estradas para fazer política. A República quere fazer uma dívida àqueles que regaram com o seu sangue o solo da Pátria, para ajudarem a sua implantação.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Américo Olavo (para interrogar a Mesa):- Sr. Presidente: eu desejava saber qual é a proposta ou projecto de lei que se discute, visto que, tendo sido enviados para a Mesa vários projectos e propostas de lei, precisava saber qual deles estamos a discutir.
Página 41
Sessão de 1 de Abril de 1925 13
Todos os oradores que tom entrado neste assunto têm afirmado que, de facto, estradas só se fazem com dinheiro, e por isso eu necessitava de saber qual dêsses projectos ou propostas de lei inclui & verba suficiente para se proceder à reparação das estradas existentes e abertura de novas.
O Sr. Presidente: - Na sessão diurna de ontem foi apresentado um requerimento, no sentido de serem discutidos todos os projectos e propostas do lei sôbre estradas.
O Orador: - Todos, Sr. Presidente! Mas isso é o caos!
O Sr. Presidente: - Êsse requerimento foi aprovado. Desta sorte foi marcada sessão nocturna para hoje.
Ao iniciar-se a sessão desta noite, foram êsses projectos e propostas de lei postos em discussão. A dificuldade que V. Exa. parece ter encontrado, encontrei-a também ao dirigir os trabalhos da Câmara, o então entendi que, como só ia fazer a discussão dêsses projectos na generalidade, podiam êles ser discutidos.
O Sr. Américo Olavo: - Mas V. Exa., Sr. Presidente, vai pôr à votação todos êsses projectos o propostas do lei ao mesmo tempo?
O Sr. Presidente: - Todos na generalidade, porque na especialidade se procurará a maneira de estabelecer a concordância de todos êles.
O Sr. Américo Olavo:-Agradeço muito as explicações de V. Exa., mas se me permite dir-lhe hei que me encontro agora na mesma situação em que estava.
O Sr. Nuno Simões: - Sr. Presidente: quando V. Exa. anunciou à Câmara que se ia entrar na discussão dos projectos e propostas de lei que se encontravam na Mesa sôbre estradas, eu tive o cuidado do preguntar ao Sr. Ministro do Comércio, exactamente para dar ordem aos nossos trabalhos, qual deles S. Exa. perfilhava. Por várias vezes o mesmo tem acontecido, simplesmente se sabe qual
deles o Govêrno perfilhava. E o que nós agora não sabemos.
O Sr. Américo Olavo deve saber que eu fiz essa pregunta ao Sr. Ministro do Comércio antes do começar a discussão, mas até agora S. Exa. limitou-se a dizer que o projecto de lei que entendia que se devia votar era o do Sr. Plínio Silva.
O orador não reviu.
O Sr. Plínio Silva: - Sr. Presidente: efectivamente V. Exa. disse há pouco que se via um pouco embaraçado com tantos projectos e propostas de lei que tinham sido enviados para a Mesa, sôbre estradas, e pouco depois eu pedi ao Sr. Ministro do Comércio que emitisse, duma maneira precisa, a sua directiva, para que a Câmara conhecesse a orientação do Sr. Ministro.
Do forma que o que me parecia indispensável, era que S. Exa. nos indicasse o caminho mais útil o proveitoso para a nossa discussão e que possivelmente, de acordo com o Sr. Ministro das Finanças, nos fosso, marcado aquilo sôbre que nos devíamos pronunciar e assim se facilitaria a missão de todos nós.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Sr. Presidente: pedi a palavra porque entendo que o problema das estradas tem na verdade uma grande importância económica, tendo ao mesmo tempo uma não menor importância financeira.
Não é de admirar, dado o pouco tempo que o Govêrno da minha presidência ocupa as cadeiras do Poder e os assuntos múltiplos, do grande importância e de reconhecida urgência que lho têm absorvido a atenção e a actividade, que ainda se não ocupasse com todo o cuidado, como era seu desejo e como é necessário, do problema das estradas; mas isso não quere dizer que o tenha descurado.
Efectivamente o problema tem-nos preocupado desde o primeiro momento, como eu já tive ocasião de o afirmar numa das posses, não me lembro bem se da Presidência do Ministério, se do Ministério das Finanças, e essa afirmação tenho feito a várias entidades interessadas que sôbre o assunto me têm procurado.
Mas eu entendo que para resolver o
Página 42
14 Diário da Câmara dos Deputados
problema, temos de fazer alguma cousa de grande e de realizável, e que não é com paliativos que o vamos resolver.
Assim devo dizer que, não fazendo disso, da sua aprovação ou reprovação, uma questão fechada, não me agrada o projecto apresentado pelo ilustre Deputado e meu querido amigo, Sr. Plínio Silva.
Por êste andar, o que me resta daqui a pouco, Sr. Presidente, é vir dizer à Câmara: indiquem me os Senhores quaisquer receitas que o Ministério da, Marinha cobre, outras que o Ministério da Ghierra possa cobrar, e assim para os diversos Ministérios.
Não percebo esta orientação, única no mundo. Seguia-se até há pouco na Turquia, mas já terminou.
O que estou a ver é uma desorientação financeira perniciosíssima, de irem para vários cofres as receitas do Estado, e daqui a pouco, não sei quantos milhares de cidadãos são precisos para as contas privativas.
O Sr. António Maria da Silva (interrompendo): - O imposto de viação e turismo não é da minha autoria.
Eu sou o primeiro a dizer que não posso admitir a existência de organismos vários como receita própria.
Mas quando realmente se não preceitua o que num plano de conjunto se deve fazer, e desde que se pede ao País uma verba X, destinada a um determinado fim, não há o direito de a utilizar para outro.
Arrecade o Estado essas receitas, avolume-as, pagando as que são para estradas.
Foi o que eu disse, que mantenho e que me parece que não pode ser contestado.
O Orador: - Muito agradeço a interrupção do Sr. António Maria da Silva, mas parece-me que estamos de acordo.
O dinheiro cobrado para as estradas deve ser aplicado, mas se nós vamos dar para as estradas apenas o dinheiro cobrado até agora, proveniente do imposto de turismo, as estradas continuarão como até agora, porque até êste momento êsse dinheiro não chega a 5:000 contos.
Quere-me parecer que merece a pena encarar o assunto de vez e estudá-lo cuidadosamente.
Perante um problema de tal magnitude, sejam quais forem os homens que aqui se sentem, prestar-lhe hão toda a atenção, porque na verdade, não podemos continuar na situarão em que estamos.
Devo informar o Sr. Joaquim Ribeiro, que tive ensejo de dizer à Câmara, há poucos dias, que tencionava vir aqui expor qual a situação financeira do País e quais os remédios que se me apresentam como mais necessários e úteis a aplicar, para consolidarmos e melhorarmos o nosso crédito, de maneira a entrarmos, no futuro ano económico, mais desafogados e tranquilos.
Não realizei êsse meu intento por o meu estado de saúde não me permitir trabalhar com aquela persistência que é necessária em problema de tam grande importância ; mas muito brevemente virei fazer essa exposição à Câmara e nela, entre outros problemas, tratarei dos recursos necessários para acudir às estradas.
Isto, não obsta a que efectivamente a Câmara resolva.
Mas, Sr. Presidente, a Câmara tem vários projectos na sua frente; por exemplo, um apresentado pelo Sr. António Fonseca, que eu julgo digno de ser submetido ao estudo das comissões, porque efectivamente define uma orientação que eu julgo boa para o Govêrno seguir.
Quanto propriamente ao projecto do Sr. Plínio Silva, devo dizer, como aliás já disse ao princípio, que o Ministro das finanças pode aceitar o compromisso de em três ou quatro mensalidades entregar à Administração Geral das Estradas as importâncias já cobradas por meio do imposto de viação e turismo.
Mas eu chamo a atenção do Sr. Plínio Silva, que tem estudado com tanto entusiasmo, com tanto carinho, a questão das estradas, para lhe dizer que não é com a entrega dos 4:800 ou 5:000 contos, que êsse imposto possa produzir, que se vai resolver o problema complicado das estradas, não esquecendo que essa entrega vem trazer mais uma perturbação à regularidade da nossa administração financeira, que já não é aquilo que devia ser, sendo daqui a pouco inumeráveis as autonomias estabelecidas.
Respondendo às considerações feitas pelo Sr. António Maria da Silva, eu já tive ocasião de expor a S. Exa. qual era o meu modo de ver sôbre o assunto.
Página 43
Sessão de 1 de Abril de 1925 15
Temos de estudá-lo com todo o cuidado.
Efectivamente a necessidade de incluir no Orçamento Geral do Estado uma verba para acudir a esto estado de cousas é urgente, mas não podemos esquecer que não é só incluindo essa verba no Orçamento da despesa que êsse assunto se resolvo. É preciso que também contemos onde havemos de ir buscar as receitas, a não ser que, segundo proposta do Parlamento, se efectue uma operação de crédito destinada a êsse fim.
O Sr. António Maria da Silva: - Tenha V. Exa. a certeza de que, consoante a opinião de V. Exa., a Câmara dará o seu voto para aumentar a verba no Orçamento até o ponto que fôr necessário.
Àparte do Sr. António Maria da Silva.
O Orador: - O que se devia pensar . em obter era uma operação de crédito, porque os encargos resultantes, quer da amortização, quer dos juros, estarão adentro dos limites do razoável.
Será mais em sacrifício que nós vamos pedir ao País, e, como V. Exa. muito bem disse, sabendo o fim a que é destinado, com certeza que ninguém deixará de o satisfazer.
Sr. Presidente: era êste o ponto de vista que queria apresentar.
A Câmara resolverá.
O Sr. António Maria da Silva (em àparte): - Actualizando a lei actual, e com quatro ou cinco artigos novos, V. Exa. resolve o problema.
O Orador: - Se a Câmara quere discutir qualquer dos projectos pendentes, e se quere dar ao Govêrno uns dias para estudar o assunto, eu, depois de férias, como tenciono e como é minha obrigação, direi ao País alguma cousa sôbre a situação financeira e quais os remédios que o Ministro das Finanças entende que devem ser tomados, e a Câmara pode ter a certeza de que quando versar êsse assunto será também tratado o problema das estradas.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taguigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Plínio Silva: - Sr. Presidente: a Câmara acaba de verificar que não há uma concordância de pontos de vista entre o Sr. Ministro do Comércio e o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro do Comércio aceitava a discussão do projecto que tive a honra de apresentar, e considerava até que êle tinha um certo e determinado alcance.
O Sr. Ministro das Finanças não julga oportuna, não julga necessária a discussão dêsse projecto.
Como V. Exa. e a Câmara têm verificado, eu tenho-me limitado a procurar saber qual é a directiva e a orientação do Govêrno neste assunto.
E, uma vez marcada essa orientação, nós iríamos discutir o problema pela forma que nos parecesse mais conveniente.
O problema das estradas, Sr. Presidente, tem já vários aspectos, o um muito importante, que eu classificarei de essencialmente psicológico, e que consiste em garantir ao contribuinte que o imposto de viação e turismo que está pagando é de facto destinado ao fim que presidiu à sua criação, isto é, à reparação de estradas.
O Sr. Ministro das Finanças e Presidente do Ministério sabe muito bem que êste imposto foi essencialmente votado e criado porque no Ministério do Comércio não havia verbas para fazer face a estas despesas, como se criou também o fundo de protecção à marinha mercante, o fundo de melhoramentos de ensino e outros mais.
O Sr. Ministro do Comércio precisava de verba para desempenhar as suas funções, o Sr. Ministro da Agricultura, idem,, e o Sr. Ministro das Finanças dizia: "Não tenho recursos para acudir às necessidades dos nossos Ministérios para que possam desempenhar cabalmente as suas funções".
Foi para isso que se estabeleceu êste imposto, para que essas faltas se não tornem a dar.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dai Finanças (Vitorino Guimarães): - Falou o Sr. Plínio Silva na divergência existente entre o Sr. Ministro do Comércio e o Sr. Ministro das Finanças.
Não existe divergência nenhuma entre mim e o Sr. Ministro do Comércio; "que existe" e mal iria se isso não sucedesse, é
Página 44
16 Diário da Câmara dos Deputados
uma divergência constante entre o Ministro das Finanças e os restantes Ministros.
Sr. Presidente: podia até para o caso citar a opinião do grande político francês Thiers, que dizia que a grande qualidade do Ministro das Finanças era encontrar-se sempre em divergência com os restantes Ministros, seus colegas de gabinete.
Mas eu não quero dizer com isto que faço uma questão fechada do assunto que se está tratando. Só com uma reforma da contabilidade é que eu acabaria cora todos êstes sistemas, que se estendem a dentro da administração.
A não ser os serviços industriais, que é de admitir que efectivamente tenham uma administração própria, mas nunca fora da orientação o do critério da contabilidade pública nem da unidade orçamental.
Já temos bastantes serviços autónomos sem orçamentos e se me derem tempo para isso, eu elaborarei um trabalho que trarei depois ao Parlamento, para terminarem essas autonomias; e estou corto que prestarei assim um grande serviço não só ao regime como até ao País.
Fora disso eu acho também um êrro grande que se adopte mais uma fórmula diversa para a guarda dos dinheiros do Estado.
Efectivamente em todos os outros países há na verdade receitas com consignação especial, mas o que não há é efectivamente dinheiro nenhum cobrado pelo Estado que não passe por assim dizer pela fieira do Ministro das Finanças, porque o Ministério das Finanças é efectivamente, em todos os países, que não em Portugal, o Ministério das receitas e das despesas.
E o nosso País são já hoje tantas as contas, que não entram no Orçamento Geral do Estado, que me parece que em breve a maior parle das quantias que são entregues que são receitas do Estado não passam pelo Ministério das Finanças.
Era êste sistema a que eu me queria referir e assentar esto ponto de doutrina; mas, como disse os erros são tam grandes, que, se a Câmara quiser votar êsse projecto do Govêrno não tomará isso por minha consideração ou menos deferência.
Acho efectivamente ser isso um êrro, e como disse acho que para o momento
actual, para uma questão desta importância, que esta verba é um paliativo que não chega senão para construir mais uns 40 ou 50 quilómetros, ficando sem resolução o problema.
E devo dizer também, como Deputado que defende o prestígio do Parlamento, que não se prestigia êsse organismo votando uma medida dessa ordem.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Sr. Presidente: a esta hora da noite não posso alongar-me muito no uso da palavra, estando para mais, como estou, bastante rouco.
Mas não quero deixar do fazer algumas considerações, porque se trata do momentoso assunto das estradas, que é o maior descrédito da República, visto que há muitos anos se vêm apresentando propostas e projectos para resolver o assunto e até hoje ainda nada se fez.
Todos os outros problemas poderão ter alguma atenção, mas as estradas protelam-se sempre e cada vez estão piores.
Qualquer partido ou qualquer governo, que queira ter a seu lado a opinião pública, tem do cuidar a sério o problema das estradas.
Resolveu o Congresso da República criar o serviço autónomo das estradas. Eu tenho a declarar que tais serviços têm provado o contrário que se esperava, prejudicando os interêsses do País, porque são péssimos todos êsses serviços desde que se tornaram autónomos, incluindo até os do ensino.
Antigamente dizia-se que as estradas só serviam para política, mas consertavam-se; hoje não se faz nada, o quando era Ministro do Comércio o Sr. Plínio Silva fiz uma interpelação sôbre o assunto. As promessas do S. Exa. de nada serviram porque não solucionou nada. Outro Ministro está naquele lugar cuja opinião não conhecemos ainda hoje, porque ainda não se manifestou.
Sr. Presidente: é necessário que a Câmara trate dêste assunto com todo o cuidado e urgência, porque hoje fala-se constantemente sôbre estradas, em que o Sr. Presidente do Ministério, como acabou
Página 45
Sessão de 1 de Abril de 1925 17
há pouco de declarar; tem todo o interêsse de ver resolvido.
Por isso envio para a Mesa uma moção que é pouco mais ou menos o que disse o Sr. Presidente do Ministério e que a Câmara certamente aceitará.
Moção
A Câmara reconhecendo a urgência de resolver o problema das estradas, espera que o Govêrno cumpra a sua promessa do fazer em breves dias uma exposição sôbre êle e os meios com que conta para o solucionar o passa à ordem do dia. - Joaquim Ribeiro.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para declarar a V. Exa. que reconhecendo a inadiável necessidade de se atender à situação verdadeiramente pavorosa em que se encontram as estradas do País, demonstrando assim ao contribuinte que ossos espantosos impostos que paga são não se sabe para quê, porque dentro da República todas as receitas do Estado são aplicadas em tudo menos para o fim a que elas foram destinadas.
Para serviços do utilidade, de justiça tem o contribuinte do pagar, e não é das receitas do Estado que saem quando deviam estar incluídas nos impostos.
É que a República faz da justiça uma indústria, que ainda vai tirar o saldo.
O mesmo sucedo com as estradas, em que foi criado o imposto do viação e turismo, que pesa sôbre o contribuinte além do toda a série do impostos que a República lança; mas no em tanto as estradas continuam na mesma.
Há sítios verdadeiramente inacessíveis, o aquele carinho o cuidado com que há pouco o Sr. António Maria da Silva se referiu às dificuldades em que se encontra a lavoura, o comércio e indústria para exercerem a sua vida económica, tudo isso tem esquecido aos homens da República, que só quando pretendem fazer política só lembram que é necessário construir estradas.
Bom se vê que estamos no dia 1 de Abril!
Esta promessa e o melhor poisson d'Abril que podia oferecer-se ao País por parte dos políticos da República.
Eu não tenho o menor confiança nas medidas que o Sr. Ministro das Finanças apresentará ao Parlamento.
Disso S. Exa. que iria fazer uma exposição financeira ao País, para mostrar o que era necessário para atender ao problema das estradas.
Já sabemos que, a par de uma quantidade de novos impostos, a par dessa misturada, virá uma promessa do reparação das estradas por todo o País, que as estradas vão ficar consertadas, o que, emfim todos vão ter meios do comunicação; dir-se há que se vai restabelecer tudo quanto havia do bom na monarquia o que a República tem estragado.
Declarou hoje aqui o Sr. Ministro do Comércio - e eu ouvi S. Exa. com a maior atenção - que desde 1914 a U920 se tinha inscrito no Orçamento a mesma verba dos anos anteriores, para reparação de estradas.
Do 1920 até há pouco manteve-se o dôbro da verba, o só muito recentemente se elevou a verba ao quíntuplo.
Isso só por si defino o cuidado que a República tem tido na aplicação a dar aos impostos que tom lançado.
E essa a confissão mais clara de que foi a República que deixou estragar o arruinar completamente as estradas do País.
O Sr. Brito Camacho: - Não apoiado! Já no tempo do Sr. João Franco só avaliava em 4:000 contos ouro a importância necessária para a reparação das estradas.
Hoje, com a desvalorização da moeda, essa verba deve ir muito além.
O Orador: - Quere dizer, essa verba actualizada daria 400.000$.
Ainda bem que foi o Sr. Brito Camacho, pessoa insuspeita do monarquismo, que me deu ensejo a mostrar quanto a República tem prejudicado o País.
Portanto aqui tem V. Exa. a confirmação do Sr. Brito Camacho, do que a República tem deixado simplesmente que a riqueza do País se desvalorize, o que em matéria de estradas já atingiu 320:000 contos.
Sr. Presidente: não quero do maneira nenhuma alongar as minhas considerações, porque são já bem sugestivas as que V.
Página 46
18 Diário da Câmara dos Deputados
Exa. tem ouvido hoje aos Srs. Deputados republicanos.
Admito, Sr. Presidente, a moção do Sr. Joaquim Ribeiro, como sendo o reconhecimento da necessidade inadiável de olhar o problema das estrada, na certeza porém de que absolutamente nada se fará, como até agora nada se tem feito.
Sr. Presidente: esta sessão parlamentar tem sido um verdadeiro comício eleitoral, em que os Deputados republicanos têm prometido mil cousas ao País; fizeram bem em escolher o dia 1 de Abril.
O orador não reviu.
É admitida a proposta do Sr. Joaquim Ribeiro.
O Sr. Velhinho Correia: - Começo por agradecer ao Sr. Nunes Simões as referências elogiosas que me fez. Não fiz, como Ministro do Comércio, mais do que o meu dever. Encontrei-me na presença de um grande problema que era o das estradas.
Pretendi preparar um organismo que estivesse à altura do assunto.
Sr. Presidente: o problema das estradas é hoje essencialmente um problema financeiro.
Não há absolutamente dúvida alguma de que é necessário alargar a reconstrução das nossas estradas, o que é um problema nacional, em que o principal são os meios financeiros.
Não basta porém que o Orçamento tenha inscrita a verba necessária, porque nada há mais fácil do que isso. Mas infelizmente a inscrição dessa verba no Orçamento não é tornar possível a realização da receita correspondente. O facto dessa inscrição não representa senão um elemento de desordem da nossa vida económica e financeira. Pôr a verba no Orçamento, sem habilitar o Estado com a receita precisa, nada é.
Sr. Presidente: também se trouxe aqui a questão do fundo especial.
Eu sou contrário a esta pulverização de receitas, mas também não posso deixar de concordar com o Sr. Plínio Silva.
Eu, Sr. Presidente, vejo sempre as questões pelo seu aspecto prático, e não tenho dúvida em votar o projecto do Sr. Plínio Silva. Mandarei para a Mesa um artigo novo para a hipótese de o mesmo projecto ser aprovado.
A minha proposta nada complica.
Não é complicado por uma razão simples. Diz-se no projecto c^ue seriam destinadas à reparação das estradas as verbas obtidas por meio do imposto de viação e turismo.
No artigo 2.° é já fixada no mínimo de 12:000 contos anuais a verba destinada a êsse fim, ficando o Govêrno autorizado a realizar todas as operações de crédito necessárias, dentro dessas possibilidades.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - V. Exa. disse há pouco que havia um organismo apto para levar a cabo a obra da reparação das estradas, mas V. Exa. sabe que êsse organismo é de tal ordem que tem deixado de aplicar as poucas verbas que têm sido inscritas no Orçamento para reparações, e posso exemplificar a V. Exa.: no meu distrito ainda no ano passado se deixou de utilizar uma verba de 160 contos.
O Sr. Presidente: - Lembro a Y. Exa. que tem apenas dois minutos para terminar.
O Orador: - Vou terminar, dizendo que êste problema das estradas é muito importante e que não devemos reincidir na questão da autonomia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã à hora regimental, com a seguinte ordem dos trabalhos:
Antes da ordem do dia (com prejuízos dos oradores que se inscrevam).
A de hoje.
(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam).
A de hoje é:
Parecer n.° 904, que autoriza o Govêrno a pagar a importância do material aeronáutico desembarcado em Lisboa.
Parecer n.° 721, que autoriza o Govêrno a ceder à comissão de padrões o bronze e trabalhos de fundições necessárias para os padrões monumentos de la Couture, Loanda e Lourenço Marques.
Página 47
Sessão de 1 de Abril de 1925 19
Parecer n.° 896, que autoriza o Govêrno a aderir à Convenção relativa à organização do estatuto de Tânger.
Parecer n.° 851, que estabelece que o produto do imposto a que se refere o artigo 4.° da lei n.° 1:656, arrecadado em cada um dos distritos do Funchal, Ponta Delgada e Angra do Heroísmo, constitui receita das respectivas juntas gerais.
Parecer, n.° 879, que revoga o § único do n.° 29.° do artigo 2.° da lei n.° 1:633.
Ordem do dia:
A de hoje, menos a interpelação do Sr. Carvalho da Silva, e mais, em segundo lugar:
Parecer n.° 903, que estabelece, desde 26 de Abril de 1925, a liberdade do fabrico e venda de acendalhas, pavios e palitos fosfóricos.
Está encerrada a sessão.
Era 1 hora e 15 minutos.
O REDACTOR - Sérgio de Castro.