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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 70
EM 27 E 28 DE ABRIL DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
PRIMEIRA PARTE
Sumário.- Respondem à chamada 73 Srs. Deputados.
Procede-se à leitura da acta, que é aprovada quando se verifica o número regimental.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Cancela de Abreu presunta se não vem à Câmara algum membro do Govêrno.
Responde o Sr. Presidente.
O Sr. Júlio Gonçalves requere que entre imediatamente em discussão uma emenda do Senado ao parecer n.º 350.
E aprovado, em prova e contraprova requerida pelo Sr. Alberto Jordão.
É lida na Mesa a emenda do Senado.
Usa da palavra o Sr. Alberto Jordão, que fica com a palavra reservada.
Ordem do dia. - O Sr. Carvalho da Silva pregunta quando são publicados no "Diário do Governo" os documentos relativos à sindicância realizada ao Ministro de Portugal em Berlim, Sr. Dr. Veiga Simões.
Responde o Sr. Presidente, que propõe depois que na acta se lance um voto de sentimento pelo falecimento do avô do Sr. Nuno Simões.
É aprovado
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães) faz a apresentação do novo Ministro da Guerra, Sr. coronel Mimoso Guerra
Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Álvaro de Castro, Dinis de Carvalho, António Maria da Silva, Lopes Cardoso, Lino Neto e Presidente do Ministério, voltando a usar da palavra o Sr. Carvalho da Silva
Ainda sôbre a apresentação do novo Ministro da Guerra pronuncia se o Sr José Domingues dos Santos, que manda para a Mesa uma proposta no sentido de a Câmara tomar a iniciativa do adiamento dos trabalhos parlamentares.
Estabelece se debate, sendo a proposta finalmente aprovada, com um aditamento do Sr. Vasco Borges.
Continua depois em discussão o pedido do Sr general comandante da lª divisão militar para continuarem presos os Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro.
Usam da palavra os Srs. Júlio de Abreu, Pedro Pita, Presidente do Ministério, Alberto Xavier, Álvaro de Castro e Amadeu de Vasconcelos
Seguidamente o Sr. Presidente interrompe, a sessão, marcando a continuação dos trabalhos para o dia imediato, à hora regimental.
SEGUNDA PARTE
Reaberta a sessão, é lido na Mesa um oficio do Sr. comandante da divisão, general Adriano de Sá, anunciando ter mandado pôr em liberdade dois Srs. Deputados detidos sob a presunção de implicados no movimento revolucionário.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães) declara que, em virtude dêste oficio, retira a questão de confiança que pudera na véspera.
O Sr. Presidente presta esclarecimentos ao Sr. Carvalho da Silva, a quem dá a palavra.
Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva e Pedro Pita.
O Sr. Presidente interrompe a sessão para se realizar a do Congresso.
Reaberta a sessão, depois de finda a do Congresso, o Sr. Presidente encerra a, marcando a imediata para o dia l de Junho.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão.- Projectos de lei - Pareceres.
Abertura da sessão, às 10 horas e 30 minutos.
Presentes à chamada, 63 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 57 Srs. Deputados.
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Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leito de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia do Azevedo.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virginio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira,
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
David Augusto Rodrigues.
Delfim Costa.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João de Ornelas da Silva.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.         f
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José Pedro Ferreira.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Lúcio de Campos Martins. 
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Martins.
Nnno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Abílio Marques Mourão. 
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho. 
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amaro Garcia Loureiro.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Lino Neto.
António de Mendonça.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Bernardo Ferreira do Matos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas,
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Leite Pereira.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Aguas.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
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Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Não compareceram os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Paiva Gomes.
António de Sousa Maia.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Carlos Olavo Correio de Azevedo.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João José Luís Damas.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge Barros Capinha.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
PRIMEIRA PARTE
Ás 15 horas e 10 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 73 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Leu-se a acta.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Não há nenhum expediente para ser lido.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente:-Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para interrogar a Mesa):- Sr. Presidente: como não vejo presente nenhum membro do Govêrno, peço a V. Exa. o obséquio de me informar sê êle vem hoje à Câmara ou se está demissionário.
O Sr. Presidente:- Devo dizer a V. Exa. que alguns membros do Govêrno estão no Senado.
Pausa.
O Sr. Presidente:-Tem a palavra o Sr. Delfim Costa.
O Sr. Delfim Costa: - Como não está presente nenhum membro do Govêrno, especialmente o Sr. Ministro das Colónias,
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peço a V. Exa. que me reserve a palavra para quando S. Exa. vier, tanto mais que estou informado de que êle deve estar a chegar.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.
Tenho a informar o Sr. Delfim Costa que o Sr. Ministro das Colónias me comunicou não poder comparecer nesta Câmara por estar no Senado tomando parte numa discussão.
O Sr. Júlio Gonçalves : - Sr. Presidente : requeiro a V. Exa. para que entre imediatamente em discussão uma emenda aprovada no Senado ao parecer n.° 350, que autoriza o Govêrno a contrair um empréstimo destinado à construção de uma escola industrial na Figueira da Foz.
Foi aprovado.
O Sr. Alberto Jordão:- Requeiro a contraprova o invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contraprova, verificou-se estarem de pé 12 Srs. Deputados e sentados 50, pelo que foi considerado aprovado o requerimento.
È lida na Mesa a emenda do Senado.
O Br. Alberto Jordão : - Depois do uma ausência algum tanto demorada, depois de um período durante o qual os trabalhos parlamentares foram decorrendo muito em família, depois que, Sr. Presidente. o Grupo Parlamentar Nacionalista entendeu dever deixar à vontade os donos da Nação. . .
Vozes:- Não apoiado!
O Sr. Tôrres Garcia (Interrompendo): - V. Exa. não tem o direito de produzir essas considerações.
O Orador: - . . .Volto a usar da palavra nesta casa do Parlamento. Dá-se o caso, Sr. Presidente, de eu ter sido eleito como tantos outros que aqui se encontram, a quási totalidade creio eu, e portanto, não obstante a série do heresias que tenho ouvido, desde a hora que entrei aqui de novo até agora, entre as quais avolumam os verdadeiros atentados aos direitos de todo e qualquer cidadão, tais, como exemplo, as afirmativas produzidas por um dos membros do Govêrno, o Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos, o ainda mais, depois do haver um outro membro do Govêrno que fez a afirmativa extraordinária- que eu posso, talvez, sem desprimor, taxar do extravagante.. .
O Sr. Carneiro Franco (interrompendo):- Mas que tem isto com o projecto? 
O orador está fora da ordem.
O Orador:-Eu provarei a V.. Exa. como não estou fora da ordem.
Sr. Presidente: dizia eu que depois de um membro do Govêrno ter sustentado a legitimidade com que determinados parlamentares aqui estariam - possivelmente pela forma como a cousa foi dita os parlamentares nacionalistas, no número dos quais tenho a honra de contar-me - eu volto a entrar na discussão dêsto assunto, que é hoje o primeiro que à Câmara foi apresentado.
Faço-o, Sr. Presidente, justamente porque entendo que, depois das afirmações aqui produzidas, que são do conhecimento de toda a Câmara e já agora do País, eu acho que mo não cabe o direito do deixar passar tudo e mais alguma cousa, carros e carrêtas, como sucedeu na última sessão da Câmara dos Deputados, em que, pondo-se de parte assuntos de alta importância, deu-se pressa e o previlégio à criação do uma freguesia que eleitoralmente interessava ao Sr. Abílio Marçal, homem da maioria.
Ora, Sr. Presidente, acho que procedo muito bem- e creio que estou absolutamente dentro do desempenho das minhas funções- intervindo nos assuntos que se discutem, muito embora indo um pouco de encontro àquelas intenções que determinaram o reingresso aqui dos nacionalistas.
Posto isto, e parecendo que isto não se liga ao assunto em discussão, tem, entretanto, justificação de sobejo, porquanto necessário era dizer à Câmara o motivo que me leva a intervir na discussão dêste parecer.
Agora, fazendo a vontade a alguns Srs. Deputados, vou referir-me de uma maneira precisa ao assunto que é pôsto à consideração da Câmara.
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Trata-se de uma escola a criar na Figueira da Foz.
O Sr. Júlio Gonçalves:-Não é criada. Já está a funcionar.
O Orador: - Não me serve a intervenção de V. Exa. Tenho aqui o papel e vou lê-lo.
O Sr. Júlio Gonçalves:-Se o tivesse lido antes de falar, escusava de estar a dizer o que disse.
O Orador:- Não podia estar a adivinhar o que V. Exa. trazia na cabeça.
O Sr. Júlio Gonçalves: - Antes de entrar na discussão devia ter lido o parecer.
O Orador:-Não sabia que V. Exa. ia requerer para entrar em discussão.
O Sr. Júlio Gonçalves:-Devia ler o parecer antes de começar a falar.
O Sr. Carneiro Franco: - Está distribuído há muito tempo.
Chegou agora vontade de trabalhar...
O Orador: - Mais vale tarde do que nunca.
Efectivamente tem certa razão o Sr. Júlio Gonçalves.
Confesso o meu êrro, quando disse que se tratava de uma escola a criar.
Com efeito a proposta de lei n.° 559 diz o seguinte:
Leu.
Êste assunto, já aqui tratado, foi tratado de determinada maneira.
Depois do transitar para a outra Câmara, o Senado introduziu algumas alterações:
O artigo 1.° diz o seguinte:
Leu.
No § 1.° diz-se o seguinte:
Leu.
Concordo com aquilo que consta do parecer em discussão, e estou de acordo com o critério que presidiu à elaboração da proposta de lei inicial.
Na realidade a maioria das escolas funciona em edifícios que não têm as condições pedagógicas para um regular aproveitamento.
Conheço muitas, não só no capítulo das escolas industriais e comerciais, como ainda noutros ramos do ensino que não preenchem o seu fim.
Não sou professor das escolas industriais e comerciais, mas tenho a honra de pertencer ao número dos homens que fazem a sua vida ensinando, transmitindo o pouco ou muito do que aprenderam aos seus discípulos, e eu sei com quantas dificuldades temos do lutar para ministrar o ensino.
Em todo o País, do norte ao sul, nas escolas há falta de material didáctico, como ainda muitas escolas funcionam em verdadeiros pardieiros, em casas que não tem condições do espécie alguma para as crianças gozarem algumas comodidades o regulares condições de higiene e receberem o ensino com aproveitamento.
O meu ilustre colega nesta Câmara e amigo Sr. João Carnoesas disse aqui que, havendo visitado a América do Norte, viu que determinadas escolas funcionavam em casas que na aparência não possuíam condições para funcionar.
Quero dizer que a grande América, apesar das suas enormes riquezas, ainda não está completa neste capítulo.
Quero dizer que lá, como no nosso País, o professor luta com falta do material didáctico para o regular funcionamento das aulas.
Não é um luxo o que se pretendo nas aulas, mas apenas que durante o tempo que as crianças frequentam as aulas não estejam sacrificadas.
Digo que não é luso, pois todo e qualquer indivíduo que se senta numa cadeira e vê as crianças com uma certa comodidade e êle próprio se encontra bem instalado, toma logo pelo lugar o maior amor, e é legítimo que assim suceda.
Quem assim não pensar começa por mostrar o seu desinteresse pela instrução, pelo ensino em geral.
Posso dizer a V. Exa. que percorrendo o País, de norte a sul, observamos por exemplo nas escolas de instrução primária, o aqui direi que lá há verdadeira miséria, e as crianças que em casa já têm pouca comodidade, aí nada tem, nessas escolas que lhes deviam dar o pão do espírito.
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As crianças estão nessas escolas sem abrigo, à chuva o ao vento, podendo ser vítimas de qualquer doença.
O que estou aqui a afirmar é uma verdade incontestável.
Ainda não há muito, por dever de ofício, eu visitei algumas escolas da minha região.
Vem aqui a talho de foice dizer que os Governos que ultimamente se têm sentado nas cadeiras do Poder têm descurado em absoluto o problema da instrução.
As câmaras consignam nos seus orçamentos dotações que vão para o sorvedouro, não sendo aplicadas na instrução, e se não fôsse a iniciativa particular ou, como dizem os crentes, por graça de Deus nada haveria, e o que resulta é que a cada passo se apontar a Republica como responsável.
E para isto se andou em propaganda, fazendo afirmações que não são cumpridas.
Mas ao mesmo tempo não prejudicar tantos outros serviços municipais, justamente porque as verbas empregadas na reparação das escolas revertem em favor de outras obras, ficando assim elas para trás.
Não quere isto dizer, Sr. Presidente, que essas câmaras não sejam dignas do maior elogio, antes pelo contrário ; mas, Sr Presidente, dá-se isto realmente na instrução primária, e se V, Exa. tiver ocasião de visitar os diferentes liceus do País terá ensejo do ver o que acabo de expor à Câmara, muito embora eu possa afirmar com o conhecimento que tenho do assunto, que no ensino secundário professores há com a noção mais completa do seu dever profissional e que tem o máximo desejo em realizar urna obra graúdo, mas que vêem inutilizada a sua acção pelos Governos que se encontram nas cadeiras do Terreiro do Paço.
Não só V. Exa., Sr. Presidente, como todos aqueles que me escutam, sabem isto perfeitamente.
Sr. Presidente: o que é um facto é que o Ministério de Instrução Pública não envia um centavo sequer para êstes estabelecimentos de ensino, o que quere dizer que continua a supor que os conselhos administrativos servem para administrar cousa nenhuma, ou que têm a obrigação do resolver as dificuldades de momento com dinheiro da sua algibeira.
Isto, Sr. Presidente, não pode ser, e contra isto eu não posso deixar de lavrar aqui o meu protesto.
Mas, Sr. Presidente, ainda mesmo quando depois de grandes esfôrços se consegue que a pequena verba destinada a reparações seja entregue ao conselho administrativo dos liceus, ficam por atender 30:000 reclamações absolutamente necessárias para o regular andamento dos estabelecimentos de ensino.
Sr. Presidente: não se atendem na verdade pedidos que não venham por intermédio de quem tem lâmpada acesa em Mace, ou por intermédio das secretarias do Terreiro do Paço.
Na verdade, Sr. Presidente, êsse dinheiro só é distribuído aos estabelecimentos do ensino segundo as conveniências eleitorais do Ministro, ou então do chefe do Gabinete aos seus amigos políticos.
Mas, Sr. Presidente, dizia eu que, de facto, o que se pretende por intermédio dêste documento que eu tenho aqui presente, é de atender, como de atender são tantas outras idênticas reclamações, pois na verdade os actuais estabelecimentos de ensino não têm onde ministrar êsse ensino, visto que muitos estabelecimentos há onde as aulas começam às 8 horas e terminam as 5 da tarde, não sendo possível organizar um horário de forma a que os alunos possam ter um intervalo para descansar, como seria para desejar, visto que estabelecimentos há que têm 18 a 20 turnos, apenas com 12 compartimentos onde podem funcionar as aulas.
É portanto necessário, Sr. Presidente, que para estabelecimentos dêsses, que funcionam em prédios nestas condições, se tomem também providências. Não é o suficiente atendermos a Figueira da Foz e deixarmos em esquecimento tantas outras terras onde há estabelecimentos de ensino em que se nota a flagrante necessidade de o Estado intervir para remediar uma situação verdadeiramente lastimável. Isto que ou digo, poderia ser, com certeza, confirmado por todos aqueles que se dedicam ao ensino.
Nos últimos tempos, devido à boa vontade de alguns dos parlamentares desta Câmara, e, designadamente, do meu ilustre colega e amigo, o Sr. Sousa Coutinho, conseguiu-se melhorar um pouco a situação, no que respeita à aquisição de
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material didáctico. E, assim, pôs-se em prática o sistema de cobrar, por intermédio dos conselhos administrativos, as receitas destinadas à aquisição daquele material, pagando-se também, por intermédio daqueles organismos, o que só ia adquirindo.
Não basta apenas que nós tenhamos no papel interessantes disposições; o que é preciso é aplicá-las realmente.
É interessante, por muitos aspectos, uma proposta da autoria do Sr. João Camoesas, trazida a esta Câmara.
Mas, Sr. Presidente, um dos motivos por que essa proposta não foi logo aceita residiu precisamente no facto de muitos dos homens que se interessam pelas questões de ensino terem a convicção de que no papel aquilo não estava mal, mas que daí à sua efectivação ia um passo extraordinariamente grande.
Assim teremos como resultado que não seremos capazes de pôr em prática aquilo que no papel se concebeu. E, então, uma maior barafunda, uma maior confusão se iria estabelecer nas cousas da instrução pública.
Isto, Sr. Presidente, dá-se não só no capítulo restrito a que me tenho estado a referir, como ainda noutros, como, por exemplo, o da educação física.
Eu sei que no Congresso da República há vários parlamentares que tem quebrado lanças pelo desenvolvimento da educação física nos estabelecimentos escolares.
No entretanto, êles devem estar pouco satisfeitos, por verem que a sua acção, sendo ditada pelos melhores intuitos, não tem uma repercursão tam larga e tam intensa como seria para desejar.
A culpa não é dos profissionais de ensino, nem dos dirigentes dos estabelecimentos, nem é mesmo, Sr. Presidente, das pessoas que, directa ou indirectamente, embora numa condição de particulares, contribuem para o desenvolvimento e para o progresso da educação física nos nossos estabelecimentos escolares.
Esbarra-se com dificuldades intransponíveis, e, assim, calculem V. Exas. que dificuldades não terá qualquer dirigente dêste ou daquele estabelecimento de ensino quando, perante um certo número de classes a quem se deve ministrar educação física, elo não disponha de nenhum gimnásio, mas apenas tenha uma pequena casa a que se dá, às vezes, apenas por ironia, o pomposo nome de gimnásio.
Todas estas cousas têm sido apresentadas uma e mais vezes às pessoas que se têm sentado nas cadeiras do Poder, e, nomeadamente, às que têm passado pela pasta da Instrução Pública.
E não quero eu, Sr. Presidente, de modo algum, apontar êstes ou aqueles dos Ministros da Instrução como sendo os únicos causadores dos males que apontei, mas o que ou digo é que o ambiente em que êles têm desenvolvido a sua acção tem sido de molde a determinar-se uma inacção.
E, porque assim é, por via de regra, as reclamações e as solicitações são mais significativas do desejo de que aos alunos se ministro melhor ensino.
Porém, Sr. Presidente, isso fica no número das cousas esquecidas, e, por isso, é preciso que, de uma vez para sempre, acabemos com esta maneira de enfrentar assuntos momentosos, como são os da Instrução Pública.
Em geral, olha-se de esguelha para êles, e, usualmente, entra-se nos gabinetes para assinar determinado expediente ou para pôr em prática uma ou outra medida de intencional alcance e de que muito bem se poderia prescindir.
Sr. Presidente: parece que os nossos governantes, neste capítulo da instrução, todos êles têm estado positivamente na lua,
Se formos percorrer as páginas do Orçamento, referentes à instrução pública, nós encontramos aí quantias insignificantíssimas para o pagamento de dispêndios enormes.
Há pouco, referindo-me à adquisição de material didáctico, eu disse que ultimamente, devido aos esfôrços de um ilustre Deputado, o Sr. Sousa Coutinho já alguma cousa se tinha conseguido: o pagamento de uma propina suplementar, exigida aos alunos, revertendo o produto dessa propina em favor do material didáctico.
Mas, Sr. Presidente, sendo, como são, dispendiosos, de subido preço, os materiais necessários para o regular ensinamento, designadamente o material que é
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indispensável para os gabinetes em que se ministra o ensino das sciências naturais, da química, da física e das sciências geográficas, essas propinas são, positivamente, como que uma gota de água. . .
O Sr. Presidente: - Deu a hora do se passar à ordem do dia.
V. Exa. deseja ficar com a palavra reservada?
O Orador: - Desejo ficar com a palavra reservada.
O orador não revia.
O Sr. Presidente: - Vai entrar-se na ordem do dia.
Está a acta em discussão.
Se ninguém pede a palavra sôbre ela, considero-a aprovada.
Foi aprovada a acta, sem discussão.
Últimas redacções
Do projecto do lei n.º 721, que autoriza o Govêrno a ceder à comissão dos padrões o bronze e fundição para os padrões-monumentos de la Couture, Loanda e Lourenço Marques.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
Do projecto de lei n.° 766, que autoriza a Junta de Freguesia de Rio de Moinhos, concelho do Castelo Branco, a alienar o prédio denominado Malhada de Santa Àgueda.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
Do projecto de lei n.° 883, que estabelece providencias sôbre marinha mercante.
Dispensada a leitura da última redacção. >
Remeta-se ao Senado.
Do projecto de lei n.° 907-F, que abre um crédito de 1:000.000$ a favor do Ministério do Comércio, para refôrço da verba do capítulo 5.° do artigo 25.° do Orçamento do actual ano económico, sob a epigrafe "Construção, reparação, melhoramentos e conservação dos edifícios públicos".
Dispensada a leitura da última redacção .
Remeta-se ao Senado.
ORDEM DO DIA
O Sr. Carvalho da Silva (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: eu pedia a V, Exa. o favor de me informar o que há acerca dos documentos relativos à sindicância ao Ministro de Portugal em Berlim.
Sabe V. Exa. que há já um mês a Câmara resolveu que fossem publicados no Diário do Govêrno, além do relatório do sindicante, o parecer do concelho disciplinar e o despacho ministerial lançado sôbre êsse parecer.
Como ainda o Diário do Govêrno não publicou nenhum dêsses documentos, eu pedia, repito, a V. Exa. o favor de me informar o que há sôbre êles: se o Ministério doa Estrangeiros lhos enviou já o qual a razão por que não foram ainda publicados no Diário do Govêrno, como a Câmara resolveu há já mais do um mês.
O Sr. Presidente: - Chegaram na quinta-feira última, e foram imediatamente para a Imprensa Nacional.
O Sr. Presidente: -Tendo falecido o avô do ilustre Deputado Sr. Nuno Simões, proponho que na acta se lançe um voto de sentimento.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O Sr. Presidente: - Considero-o aprovado.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): - Sr. Presidente: como é do conhecimento da Câmara, levantou-se uma divergência entre os membros do Govêrno e o ex-Ministro da Guerra, que fazia parto dêste Gabinete, o Sr. general Vieira da Rocha.
Quero acentuar mais uma vez que essa divergência foi apenas de carácter político e que nenhuma ligação teve com a forma como foram dirigidas as opera-
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ções para sufocar o último movimento insurreccional.
Tendo-se aberto a crise pela saída do Sr. general Vieira da Rocha, convidei para assumir a gerência da pasta da Guerra o Sr. coronel Mimoso Guerra, ilustre oficial do exército o dedicado cidadão à causa da República, com um passado cheio do altos serviços prestados ao Regime e ao País.
S. Exa., pois, que eu hoje tenho a honra de apresentar à Câmara, não é um desconhecido, quer para o País, quer para a maior parte de V. Exas.
O Sr. coronel Mimoso Guerra demonstrou mais uma vez as suas óptimas qualidades de militar e de cidadão republicano, vindos assumir a pasta da Guerra num momento grave, como aquele que atravessamos.
E com a máxima satisfação que faço esta apresentação ao Parlamento, porque tenho a certeza absoluta que, do seu proceder adentro daquele departamento do Estado, só vão resultar motivos de elogio e de apoio da parte do Poder Legislativo e do País em geral, porque conheço bem quais as qualidades e merecimentos que exornam a pessoa de S. Exa.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: seria um facto vulgar na vida política do País, principalmente na vida política da República, a apresentação de um novo Ministro a esta Câmara, visto que sabemos que na República os Ministros têm sido aos centos.
No emtanto, a crise parcial do Govêrno, que o Sr. Presidente do Ministério acaba do declarar, reveste uma importância fundamental para a vida do País, o reveste-a, Sr. Presidente, pelas condições especiais em que saiu o Sr. general Vieira da Rocha, depois de vencido um movimento militar e depois do ter sido S. Exa. quem superiormente dirigiu as operações militares contra as unidades que foram acampar-se na Rotunda.
Está logicamente indicado que, quando um Govêrno consegue vencer um movimento de revolta, tenha ficado ainda mais forte na sua unidade política, não se compreendendo, portanto, a saída de qualquer dos seus membros.
Mas, sobretudo, tratando-se de um movimento militar como o do dia 18 dêste mês, e sendo o Ministro da Guerra quem superiormente dirigiu as fôrças dos vencedores, S. Exa. devia aparecer aqui como um vencedor!
Infelizmente não é assim.
O Sr. Ministro da Guerra, general Vieira da Rocha, pessoa altamente colocada na hierarquia militar e a pessoa que dirigiu o movimento contra os revoltosos, desapareceu.
Quere dizer que alguém se apresenta aqui como sendo o vencedor dessa luta e dêsse movimento.
Quem é êsse vencedor, que não temos maneira do alguém nos declarar qual seja aqui nesta Câmara?
Quem é êle, que só diz que o foi em nome da ordem?
Quem é que aqui aparece a dizer que foi o vencedor?
Parece-me êste ponto de gravidade. Parece-me que é preciso se esclareça êste ponto.
Aparecem as esquerdas, os extremistas, a dizer que foram os vencedores do movimento; e até apareçe uma entrevista publicada nos jornais com o Sr. Dr. Amando do Alpoim, chefe socialista, a declarar que os socialistas foram quem organizaram um comité das esquerdas republicanas, da Confederação Geral do Trabalho, do Partido Comunista, etc.; e então eu pregunto : com que direito é que vêm êsses elementos dizer-se vencedores do movimento, quando, sem dúvida, foram as forças militares que combateram sob a direcção do Sr. general Vieira da Rocha as vencedoras?
Saiu o Sr. general Vieira da Rocha da pasta da Guerra e até se diz que sairá do comando da guarda republicana para seguir para a índia.
Pretendem os elementos extremistas, com êsse comité das esquerdas, ir tomando conta das posições; e agora mais se impõe que estejam nessas cadeiras pessoas que mereçam confiança pelas suas qualidades militares.
O Sr. Joaquim Ribeiro (interrompendo): - O extremismo não faz parte do Partido a que pertenço.
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O Orador:- O Sr. Amâncio de Alpoim na sua entrevista diz:
Leu.
O Sr. Joaquim Ribeiro (interrompendo).- Mas o Partido Democrático repudia essa aliança, porque não faz parte dela.
O Sr. Cancela de Abreu: - Repudia-a V. Exa.
O Orador: - V. Exa. está talvez absolutamente de acordo, Sr. Joaquim Ribeiro, com o que eu estou dizendo.
É indispensável para a vida do País que esta situação seja claramente definida.
É indispensável saber-se se estamos, realmente num período transitório para a entrega do Poder a elementos extremistas.
É indispensável que se saiba se foram ou não as fôrças militares as fôrças que venceram.
Tenho a certeza que as torças militares não consentem de nenhuma maneira que o comité esquerdista se apresente como vencedor do movimento.
Realmente o Sr. Dr. Amâncio de Alpoim nesta entrevista diz que esteve em relações com o Govêrno, que teve com o Govêrno conferências, o eu pregunto se é admissível que o Govêrno, seja em que circunstâncias fôr, esteja em contacto com tais elementos.
Diz o Sr. Dr. Amâncio de Alpoim que êsse comité esteve em contacto com o Govêrno, que, exerceu uma acção fiscalizadora sôbre a maneira como os elementos militares exerceram a sua acção.
Protesto indignadamente contra esta afirmação do Sr. Dr. Amâncio de Alpoim.
Devo dizer que a realização dêste serviço primacial, que tem uma importância capital para a vida do País, não pode ser encarado por uma forma regular que se impõe à consideração dos conservadores para que todos, sejam quais forem, se unam num forte bloco para impedir êsse verdadeiro assalto à situação dominante na governação do País.
Sr. Presidente: o Sr. Presidente do Ministério declarou que por discordância política o Sr. general Vieira da Rocha tinha sido levado a demitir-se.
Mas então o Govêrno, quando surgiu o movimento, entregou ao Sr. general Vieira da Rocha, que ocupava a mais alta posição no exército, como Ministro da Guerra, a repressão do movimento, êle vence, é a fôrça pública quem vence o movimento, e é o Governo que vence o movimento que não mantém ali o Sr. general Vieira da Rocha?!
Quem devia estar ali era o vencedor dêsse movimento, era o Sr. general Vieira da Rocha.
Apoiados.
Eu, que nesta hora acho indispensável a união de todos os conservadores, eu, adversário intransigente do Govêrno, faço justiça ao Sr. Vitorino Guimarães de que não é por sua vontade que procedo assim; é porque o empurram.
Pense V. Exa. bem nas responsabilidades enormes que, nesta hora de gravidade extrema para a vida do País, pesam sôbre si.
Unamo-nos todos os conservadores, sem retaliações, esquecendo todas as lutas, para que a causa da ordem, os fundamentos da organização social se mantenham.
Não se deixe V. Exa. arrastar pelos elementos avançados, pelo tal comité das esquerdas.
Todavia, porque não queremos fugir ao cumprimento duma velha praxe parlamentar sempre respeitada, os membros da minoria monárquica cumprimentam o novo Ministro da Guerra.
O Sr. Mimoso Guerra é um oficial do nosso exército e, por isso, certamente não se esquecerá de que um dos primeiros deveres da instituição militar é o do defender a ordem social. Fazemos votos por que S. Exa. no alto lugar que agora ocupa, saiba ser apenas militar e não político no sentido estreito da palavra e, assim, não permita que, à sombra de qualquer partidarismo, os inimigos da sociedade; vão afastando das posições que ocupam aqueles que tam precisos são para a manutenção e defesa da ordem.
O Sr. Ministro da Guerra que, dada a sua posição, deve ser um conservador, no sentido social, vê, sem dúvida, que o momento não é propício a perseguições, nem tam pouco a imposições esquerdistas.
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Coloque-se S. Exa. nesse campo, porque se não tiver o apoio dos seus partidários terá o apoio dêste lado da Câmara e o aplauso da Nação. De contrário, a nossa oposição será enérgica e intransigente.
Sr. Presidente: entendeu êste lado da Câmara que era absolutamente indispensável, ao discutir-se a solução duma crise que tam graves aspectos revelou, proferir estas palavras. Proferindo-as, demonstramos que, mais uma vez, estamos ao lado da ordem.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: - Sr. Presidente: o Grupo da Acção Republicana cumprimenta o novo Ministro da Guerra, colonial distinto e oficial ilustre, que nós vemos com prazer ocupar aquela cadeira em circunstâncias difíceis.
Êste lado da Câmara deseja a S. Exa. uma larga e desafogada vida ministerial, certo de que terá, muitas vezes, de aplaudir os seus actos de oficial disciplinador.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Dinis de Carvalho:-Sr. Presidente: felicito o Govêrno pela acertada escolha que fez, nomeando para o cargo de Ministro da Guerra o Sr. Mimoso Guerra, de cujas altas qualidades muito temos a esporar, quer consolidando a disciplina militar, quer sob o ponto de vista da administração interna do exército.
Assim, pode S. Exa. contar com o nosso apoio.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Maria da Silva:-Sr. Presidente: o Sr. Presidente do Ministério acaba de nos apresentar o novo Ministro da Guerra, Sr. Mimoso Guerra, oficial distintíssimo do nosso exército, que tam relevantes serviços tem prestado ao País, quer nas colónias, quer como sub-secretário da Guerra a quando do Ministério da União Sagrada.
Em nome, pois, do Partido Republicano Português que conta S. Exa. no número dos seus correligionários, ou endereço ao ilustre militar as nossas saudações. Independentemente disso, e como velho amigo de S. Exa., eu apresento,
pessoalmente,  ao Sr. Mimoso Guerra os meus cumprimentos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Lopes Cardoso:-A Câmara conhece já os motivos por que êste lado da Câmara abandonou os trabalhos parlamentares e aqueles que o levaram ao seu regresso. Julgo, por isso, desnecessário voltar novamente ao assunto em presença da solução da crise ministerial e das razões que a motivaram.
O Partido Nacionalista, cumprindo uma velha praxe parlamentar, cumprimenta, pessoalmente, o novo Ministro da Guerra, militar e patriota que certamente saberá honrar a República e a Pátria. Saudando S. Exa., nós não podemos deixar do saudar, igualmente, o anterior Ministro Sr. Vieira da Rocha.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Lino Neto: - Sr. Presidente: a atitude da minoria católica, perante a resolução da crise parcial do Gabinete que o Sr. Presidente do Ministério nos veio anunciar é, como sempre, a mesma. Aguarda actos para por êles pautar o seu procedimento.
Nestas condições, limito-me, em nome da minoria católica, a dar as boas vindas ao titular da pasta da Guerra, esporando os seus actos para lhe poder manifestar confiança ou desconfiança.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Sr. Presidente: pedi a palavra para agradecer à Câmara as palavras de saudação e de carinho com que recebeu o novo Ministro da Guerra por mim escolhido.
Nem outra cousa era de esperar, porque a Câmara procedendo assim não faz mais que praticar um acto do sã justiça, dadas, como disse, as qualidades de S. Exa.
Mas, a propósito da apresentação do Sr. Ministro da Guerra, foram aqui feitas apreciações que ou reputo, neste momento e em nome do Govêrno, absolutamente inconvenientes. Assim, o Sr. Car-
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valho da Silva veio efectivamente fazer afirmações, quási que ameaças, que no momento que corre só podem servir para aumentar a perturbação social.
Apoiados.
Já outro dia tive ensejo do dizer à Câmara que era preciso que definisse claramente se sim ou, não o Govêrno a que tenho a honra do presidir tem dela a necessária confiança, para que o Govêrno se encha de prestígio e de autoridade de modo a conseguir que a calma e a tranquilidade se estabeleçam de vez no País. E não é vindo falar em união ou concentração do conservadores neste momento que podemos ir para essa calma ou tranquilidade!
Apoiados.
E falando na união e na concórdia do todos os portugueses, porque ou, como Presidente do Ministério, não sei distinguir entre êles. Neste ponto do vista, é que só o Govêrno pode actuar e trabalhar!
Apoiados.
Já tive ensejo de dizer a esta Câmara, mas novamente o afirmo com toda a solenidade, que a única causa da saída do Sr. general Vieira da Rocha do Ministério foi a divergência que se levantou com os seus colegas do gabinete a propósito da atitude do Sr. general Sinel de Cordes.
Não houve outro qualquer motivo, nem o podia haver.
Já também outro dia tive ensejo do prestar a minha homenagem, mas novamente a presto, do respeito, do veneração e estima pelo Sr. Vieira da Rocha, que em todas as circunstâncias da. sua vida tem sabido ser um bom militar, um bom cidadão e um dedicado republicano; o ainda o demonstrou pedindo a demissão de Ministro da Guerra, quando reconheceu que efectivamente da sua estada no Ministério algumas dificuldades, embora ligeiras, podiam nascer ao Govêrno.
Mas o Sr. Carvalho da Silva ameaçou, ou atemorizou para melhor dizer, a Câmara, com as expressões do comité das esquerdas, etc. Tais expressões não correspondem à realidade dos factos, e são filhas apenas da sua fantasia ou do cérebro assustadiço de S. Exa.
Todos os homens que constituem o actual Govêrno não estão habituados a 
agir nem por meio de pressões, nem por meio de ameaças, e parece-me que ainda há bem pouco tempo assim o demonstraram.
Apoiados.
Guardam sempre em todos os actos da sua vida a serenidade e calma necessárias para poderem julgar dos casos com toda a justiça.
Sr. Presidente: não falei, nem tratei pessoalmente, com o Sr. Amâncio de Alpoim, mas com êle falaram alguns dos meus colegas do gabinete e o Sr. general da divisão. E porque não haviam do faiar! Pois S. Exa. Não representa um partido que em todos os países é considerado constitucional?
Que havia também do inconveniente que o Presidente do Ministério tratasse com o representante do Partido Socialista?
Não é só no estrangeiro, onde há pouco houve um Govêrno socialista inglês, que os socialistas têm tido muitas vezes interferência nos Governos, mas entre nós, porque a dentro da República, e até em Governos de concentração, os socialistas já tiveram representação no Poder Legislativo.
Porque é, então, que se traz aqui uma afirmação dessas?! É ou não o desejo de motivar o descontentamento o a má vontade em certas classes?
E é só com isso que querem viver os homens da ordem, que eu estou convencido que querem apenas viver com a desordem!
Apoiados.
Efectivamente, as palavras do Sr. Carvalho da Silva é que podem concorrer para a desordem, e não os actos do Govêrno!
Dadas as responsabilidades que neste momento impendem sôbre o Govêrno, êle tem de julgar os factos com toda a calma e serenidade; tem de dizer ao País quais são os meios que precisa para poder exercer a sua acção.
Êste, estado de cousas não se pode prolongar. O Govêrno precisa de saber se lhe dão todos os meios para que possa agir.
Da realização das sessões parlamentares só tem resultado dificuldades para o Govêrno. Nisto põe o Govêrno a questão de confiança, porque não pode continuar
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a exercer a sua acção com as Câmaras a funcionar. A Câmara resolverá e o Govêrno sabe qual é o caminho que tem de seguir.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: causaram-me a maior surpresa as declarações do Sr. Presidente do Ministério, pois não esperava que S. Exa. em contraposição às minhas palavras de concordância, e de união do todos os defensores da ordem, pusesse palavras de censura que denotam bem quais os propósitos do Sr. Vitorino Guimarães.
Disse S. Exa. que a hora não é de ameaças, mas de paz. Também eu quero a união do todos que defendem a actual organização social, e como a missão principal do Govêrno era defender a sociedade, é que eu estranhei a imposição que a êle foi feita pelos elementos extremistas.
Eu como representante do uma fôrça conservadora cumpri, o meu dever, chamando o Govêrno à consciência das responsabilidades que sôbre êle impendem. Eu, longo de ser um inimigo das classes proletárias, sei distinguir entre as reclamações justas e aquelas que são atentatórias da organização social.
Cumpri o meu dever e prestei ao Govêrno um serviço, e por agora abstenho-me de fazer mais considerações reservando-me para quando se discutir a suspensão dos trabalhos parlamentares.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. José Domingues dos Santos: - Sr. Presidente: não quero eu nesta hora apresentar em nome dêste lado da Câmara os nossos cumprimentos ao Sr. Ministro da Guerra, mas não me escuso ao dever de apresentar a S. Exa. as minhas calorosas saudações, porque S. Exa., tendo aceitado aquele encargo neste momento particularmente difícil para o Govêrno e sobretudo para o titular da pasta da Guerra, demonstrou de uma forma clara e iniludível o sou entranhado amor à República e à Pátria.
Muitos apoiados.
Mas, Sr. Presidente, não foi para isso que pedi a palavra; ao fazer uso da mesma, pretendo, continuando as considerações que fiz no Congresso passado, dizer a V. Exa. e à Câmara que é já tempo de pormos situações bem claras.
Apoiados.
O Govêrno conseguiu sufocar uma rebelião armada por meios inteiramente militares, sem quebra de disciplina e sem ofensa para o brio militar de ninguém.
Fê-lo com toda a serenidade, com todo o aprumo e por forma a merecer o respeito e consideração de todos os homens para os quais a ordem não é apenas uma palavra para fins inconfessáveis.
Apoiados.
Que vimos nós em seguida à derrota dos revolucionários?
Foi o Govêrno saudado pela Câmara nos termos em que seria natural esperar-se ?
Em circunstâncias análogas, em ocasiões de outras revoltas militares mais ou menos desordeiras, eu vi que todos os lados da Câmara, desde a extrema direita à extrema esquerda, que todos os Deputados se associaram aos Governos que conseguiram debelar a desordem. Eu fui um dos que sempre assim procedi.
Pois eu vi agora, com estranheza, que, tratando-se de uma desordem mais gravo do que as outras pelo seu significado e alcance, houve nesta Câmara quem se levantasse para saudar os desordeiros da Rotunda, e que um partido que se diz constitucional não teve uma palavra de censura para com os revoltosos.
Que significa isto?
Têm os desordeiros da Rotunda representantes cá dentro?
Reconheceu-lhes a Câmara fôrça bastante para derrubar o Govêrno?
Mas então é preferível irmo-nos embora, porque são êles que devem governar.
Mas se, na verdade, somos nós que devemos governar, se o respeito pela Constituição não é uma palavra vã, se a ordem devo ser mantida contra todas aã rebeliões, quer da extrema esquerda quer da extrema direita, é indispensável que demos ao Govêrno todos os meios indispensáveis.
Apoiados.
Sou de há muito tempo apologista do que é o Govêrno que devo mandar. . Apoiados.
E se essa fórmula é sempre necessária, mais indispensável ela se torna neste mo-
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mento, quando estão ainda quentes as cinzas de uma revolução que fez correr muito sangue.
O Govêrno, saído vitorioso de uma revolução, devia sair vitorioso dentro desta Câmara, porque para nós todos, Deputados, a ordem deve ser qualquer cousa que represente um sentimento digno.
Nestas circunstâncias não basta que prenunciemos palavras inúteis; é necessário agir.
O Sr. Presidente do Ministério quere agir; mas vê-se impedido de o fazer, porque dentro desta Câmara se levantam vozes a saudar os revoltosos, porque há quem queira atear novas fogueiras revolucionárias.
Apoiados.
S. Exa. disse, e muito bem, que assim não pode governar, nem manter a ordem, nem estabelecer a união de todos os portugueses para uma obra de ressurgimento nacional.
Apoiados.
Pode o Sr. Presidente do Ministério contar com o meu apoio.
E porque desejo que assim o Parlamento proceda, vou mandar para a Mesa a seguinte proposta:
Propomos que se reúna o Congresso da República a fim de, nos termos da alínea f) do artigo 23.° da Constituição, se tratar do adiamento dos trabalhos da actual sessão legislativa. - José Domingues dos Santos - António Maria da Silva -Júlio Gonçalves-Nunes Loureiro- Teófilo Carneiro.
Tenho dito.
Vozes : - Muito bem! Muito bem! O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva:- Peço a palavra sôbre o modo de votar a admissão dessa proposta.
O Sr. Presidente:-A proposta considera-se admitida, visto que é assinada por três Srs. Deputados.
O Sr. Tavares de Carvalho (para um requerimento) : - Requeiro a urgência e dispensa do Regimento para a proposta do Sr. José Domingues dos Santos.
O Sr. Pedro Pita (nobre o modo de votar):- Sr. Presidente; entrando imediatamente em discussão a proposta para que acaba de ser requerida a urgência o dispensa do Regimento, é natural que se discuta logo em seguida o adiamento das Câmaras; e, sendo assim, ficará por discutir o pedido do Sr. comandante da l.ª divisão militar para conservar presos os Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro.
Parecia-me conveniente que a Câmara resolvesse sôbre êsse pedido do Sr. general comandante da divisão e depois resolvesse sôbre a proposta de adiamento.
Tratando-se de dois colegas nossos, que estão presos, era natural que a Câmara considerasse êsse assunto como de magna importância.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva :- Sr. Presidente; pouco tenho a acrescentar às considerações feitas pelo Sr. Pedro Pita.
A proposta do Sr. José Domingues dos Santos, sendo uma proposta de adiamento dos trabalhos parlamentares, vai impedir, naturalmente, que o Parlamento se ocupe da prisão de dois colegas nossos, que devo ser uma questão importante para o Parlamento, visto tratar-se das suas imunidades.
De nenhuma forma entendo que pode ser adiada a questão em discussão, até porque eu entendo que desde que o Sr. General da l.ª divisão enviou êsse ofício, é uma falta de consideração para S. Exa. não se pronunciar a Câmara sôbre o pedido que faz.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ferreira da Rocha (para invocar o Regimento): - Sr. Presidente, invoco o artigo 34.° do Regimento.
Desde que se esteja na ordem do dia, essa ordem do dia não pode ser alterada senão nos termos do artigo 34.°. É o seu cumprimento que peço a V. Exa.
O Sr. Presidente: - A proposta enviada para a Mesa pelo Sr. José Domingues dos Santos foi apresentada durante o debate, que se estava realizando sôbre a apresentação do Sr. Ministro da Guerra e em virtude de declarações produzidas
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pelo Sr. Presidente do Ministério. Foi ainda dentro dêsse debate que o Sr. Tavares de Carvalho apresentou o seu requerimento que vou submeter à votação da Câmara.
O Sr. Ferreira da Rocha:-V. Exa. não é Presidente para submeter à votação da Câmara aquilo que entender, mas tudo que lhe fôr apresentado dentro dos termos regimentais.
Tive o cuidado de preguntar a V. Exa. se já estávamos no período da ordem do dia. V. Exa. disse que sim, e foi só depois de ouvir a resposta de V. Exa. que eu pedi a palavra para invocar o Regimento.
O Sr. José Domingues dos Santos: - A ordem do dia foi interrompida para efeito da apresentação do Sr. Ministro da Guerra, abriu-se sôbre o assunto um debate, dentro dêsse debate o Sr. Presidente do Ministério fez declarações e em harmonia com essas declarações enviei para a Mesa uma proposta. Tudo isto é absolutamente regimental.
Não será regimental a discussão imediata dessa proposta se porventura a Câmara não votar a urgência o disponha do Regimento, mas, se se der o contrário, imediatamente se interromperá o assunto dado para ordem do dia para se fazer a discussão dessa proposta.
Sempre assim se tem feito.
O orador não reviu.
O Sr. Ferreira da Rocha: - Sr. Presidente : a ordem do dia pode ser interrompida para qualquer comunicação urgente do Sr. Presidente do Ministério ou, de qualquer dos Srs. Ministros; assim o determina o Regimento.
Sôbre a comunicação feita pelo Sr. Presidente do Ministério abriu-se uma inscrição especial, ainda nos termos do Regimento, e desde que assim aconteceu passou êsse assunto a ocupar o lugar da ordem do dia, sendo-lhe aplicadas todas as regras que o Regimento determina.
Sôbre êsse assunto e durante o seu debate qualquer proposta pode ser apresentada, que ao debate diga respeito, e se êsse debate se referia à apresentação do Sr. Ministro da Guerra nenhuma proposta do adiamento pode ser adstrita a êsse debate.
Sr. Presidente: não é a primeira vez que dêste lugar sou o defensor acérrimo das prescrições regimentais. Homem de ordem e de legalidade, porventura mais homem de ordem e de legalidade que aqueles que pretendem agora revolucionar a discussão, entrei no meu papel, apelando para V. Exa. para que os direitos que o Regimento nos confere sejam respeitados, que é o dever de V. Exa. nesse lugar.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Gonçalves: -Sr. Presidente: peço a V. Exa. que me diga se, quando o Sr. José Domingues dos Santos apresentou a sua proposta, já estava em discussão o assunto dado para ordem do dia.
O Sr. Presidente: Ainda não se tinha entrado na ordem do dia.
O Orador:-Nesses termos, permita-me V. Exa. que invoque o artigo 34.° do Regimento que diz:
Leu.
Ora como ainda não tinha sido começada a discussão do assunto dado para ordem do dia, não podia ela ser interrompida, e que o tivesse sido por já se ter entrado na ordem do dia, ainda assim o n.° 2.° do artigo 34.° diz:
Leu.
Invoco o Regimento para que V. Exa. ponha à votação o requerimento do Sr. Tavares de Carvalho.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Sr. Presidente: faço minha a proposta apresentada pelo Sr. José Domingues dos Santos.
Trocam-se apartes e levanta-se grande sussurro.
() Sr. Vasco Borges: - Sr. Presidente: creio que a Câmara dos Deputados, que acaba de se manifestar tam ruidosamente, está num equívoco, pois não posso convencer-mo de que houvesse o intuito de não levar até o fim o caso que se debate da prisão dos Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro.
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Não me posso convencer disso, porque além de um atropelo representaria uma falta do consideração e cortesia não só pelas pessoas mas também pela Constituição.
A proposta em discussão necessita de um esclarecimento e nesso sentido eu mandarei um aditamento para que depois do ultimada a questão, o Congresso discuta o pedido do Sr. general da divisão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O aditamento é o seguinte:
Proponho que o Congresso reúna depois do ultimada a discussão sôbre o pedido do Exmo. general da divisão para continuarem presos os Deputados Cunha Leal e Garcia Loureiro.- Vasco Borges.
O Sr. Marques Loureiro: -Sr. Presidente: não posso deixar de me congratular com as considerações que acaba de fazer o Sr. Vasco Borges; as suas palavras foram bem recebidas pela Câmara já pela pessoa que as produziu, já pelo lado de onde vieram.
O Regimento não foi cumprido porque V. Exa. tinha dito que se estava no período da ordem do dia, mas não foi só o Regimento que foi atropelado, mas a própria Constituição, quando o Govêrno quis chamar a si a proposta do Sr. José Domingues dos Santos, Só isso é que não consentimos porque a Constituição é bem expressa no artigo 23.°, alínea f):
Leu.
Então o Govêrno quere meter no bolso a Câmara dos Deputados?
Quere o Govêrno meter-se numa ditadura sem honra nem glória?
Não; para honra desta Câmara digamos ao Sr. Presidente do Ministério que por em quanto ainda somos o Poder Legislativo, e a Câmara dos Deputados é soberana!
Se o Govêrno quero cometer violências que o faça, mas assuma a fácil responsabilidade dos seus actos, mas não queira dar pruridos de legalidade àquilo que não a tem.
Tenho dito.
Apoiados.
O orador não reviu.
Foi lido e admitido na Mesa o aditamento do Sr. Vasco Borges.
O Sr. Cancela de Abreu (para interrogar a Mesa): - Desejo que V. Exa. me diga se considera estranha no assunto em debate a proposta apresentada pelo Sr. José Domiugues dos Santos e só em faço da Constituição aceita que o Sr. Presidente do Ministério possa perfilhar essa mesma proposta.
Aguardo a resposta do V. Exa. para depois invocar o Regimento.
O Sr. Presidente: - Só tenho do repetir o que, há pouco disse.
Entendo que a proposta em questão se relaciona com o assunto em debate; ela resulta de palavras proferidas pelo Sr. Presidente do Ministério no lazer o sou discurso de apresentação á Câmara do Sr. Ministro da Guerra.
O Sr. Cancela de Abreu: - Aceita V. Exa. a perfilhação feita pelo Sr. Presidente do Ministério dessa proposta?
O Sr. Jaime de Sousa; - Está no seu direito.
O Sr. Cancela de Abreu: - Tem graça! Então já de nada serve a Constituição?
O Sr. Presidente ao Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): - Em faço do consignado no artigo 23.º da Constituição, estou no meu direito para perfilhar a proposta do Sr. José Domingues dos Santos.
Muitos apoiados da maioria.
O Sr. Cancela de Abreu: - Mais uma infracção do Regimento acaba de ser feita pelo Sr. Presidente do Ministério.
S. Exa. interrompeu-me sem que previamente me solicitasse autorização para o fazer.
Se ma tivesse pedido eu dava-lha. O que não posso é consentir, sem o meu protesto, que passem por cima dos meus direitos.
Sr. Presidente: apesar do aditamento feito pelo Sr. Vasco Borges, nós continuamos a considerar a proposta do Sr. José Domingues dos Santos anti-regimental.
Lamentamos que V. Exa. chegue a uma conclusão que vai contra o que se acha disposto na Constituição.
O orador não reviu.
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O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Tenho sempre o maior desejo em ser correcto o por isso apresso-me a declarar que quando usei da palavra estava na convicção do que o Sr. Cancela do Abreu já havia concluído as suas considerações. Se assim não fora, eu teria tido o cuidado de pedir ao Sr. Cancela do Abreu autorização para interrompê-lo.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Agradeço as explicações do Sr. Presidente do Ministério.
O Sr. Presidente:-Vai votar-se o requerimento do Sr. Tavares de Carvalho para que seja discutida a proposta do Sr. José Domingues dos Santos, com urgência o dispensa do Regimento.
Procede se à votação.
O Sr. Presidente: - Está aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva:-Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à contraprova e contagem.
Procede-se à contraprova e contagem.
O Sr. Presidente:-Estão sentados 52 Srs. Deputados e em pé 35. Está aprovado.
O Sr. Tavares de Carvalho: - Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se ela consente que a sessão seja prorrogada até final discussão do assunto em debate.
O Sr. "Presidente: - Vai votar-se o requerimento do Sr. Tavares de Carvalho
O Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar):- Pedi a palavra sôbre o modo de votar para requerer que a prorrogação da sessão seja também para se resolver sôbre o pedido do Sr. comandante da divisão.
Vota se o requerimento do Sr. Tavares de Carvalho.
O Sr. Presidente : - Vai votar-se o requerimento do Sr. Pedro Pita. Procede-se à votação.
O Sr. Presidente: - Está aprovado.
O Sr. Júlio Gonçalves: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à contraprova e contagem.
Procede-se à contraprova e faz-se a contagem.
O Sr. Presidente: - Estão em pé 40 Srs. Deputados e sentados 55. Está aprovado. Tem a palavra o Sr. Carvalho da Silva.
O Sr. Carvalho da Silva: -Sr. Presidente: ha muito que a Câmara não discute uma proposta de tam larga importância para a vida do País, como o é a do que estamos tratando.
Não venho proferir um discurso violento, porque entendo que quem tem, neste momento, a consciência das suas responsabilidades deve procurar todos os meios de evitar provocações e ódios.
Desejo, pelo contrário, provocar a união de todos os que tendo responsabilidades, como todos nós temos, na marcha da administração pública, devem ponderar n m assunto da magnitude do que estamos discutindo.
Basta, Sr. Presidente, a leitura da imprensa que, dizendo-se defensora da ordem, não quero outra cousa senão o estabelecimento do direito revolucionário, em que há 14 anos se vive em Portugal, para que nós possamos ver o alcanço da proposta do Sr. José Domingues dos Santos, proposta também assinada pelo Sr. António Maria da Silva.
Sr. Presidente: quanto as conveniências partidárias levam os homens a esquecer os seus deveres para com o País!
Preconiza a imprensa que só diz defensora do Govêrno a adopção imediata do um determinado número de medidas violentas, absolutamente contrárias à Constituição, e, assim, Sr. Presidente, quando há pouco ouvimos o Sr. José Domingues dos Santos dizer que a Constituição não é uma palavra vã, nós concluí-
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mos que S. Exa. quere, como ninguém, que se saia do caminho do Constituição, para alegar um direito revolucionário por parte daqueles que dizem ter defendido a ordem por parte daqueles que dizem que venceu a ordem na luta há poucos dias travada.
Assim, Sr. Presidente, não é possível continuar as minhas considerações. Só as reatarei depois de na Câmara haver o devido silêncio.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara, rogando aos Srs. Deputados se dignem ocupar os seus lugares.
O Orador:-Parece-me até, Sr. Presidente, que o silêncio que haja na Câmara será a melhor maneira de demonstrar que quem venceu foi a ordem.
Eu creio que a sessão do Congresso, há dias realizada, não pode ter deixado a ninguém dúvidas de que quem venceu foi a ordem, tal foi a ordem que na Câmara e nas galerias reinou durante toda a sessão.
Reuniu ontem o Govêrno, em conselho de Ministros, e forneceu à imprensa a seguinte nota oficiosa:
Leu.
Quere dizer, Sr. Presidente que o Govêrno se propõe fazer uma larga ditadura.
O Govêrno que diz que venceu ora nome da ordem, o Govêrno que diz que venceu em nome da Constituição, não pretende outra cousa senão saltar por cima da Constituição, e, por mais que o Sr. Vitorino Guimarães tenha vindo, há pouco, dizer à Câmara que não queria, de nenhuma maneira, fazer violências, e se tenha manifestado contra as minhas palavras, S. Exa. d, com urna fraqueza absolutamente imperdoável porque eu não sou como o Sr. Vitorino Guimarães, o sei fazer justiça às pessoas - não queria entrar no caminho das violências, mas, repito, com uma fraqueza absolutamente imperdoável, S. Exa. está nas mil os dos elementos desordeiros.
V. Exa. quero fazer a desordem, dêsse lugar; e é para isso, não é para outra cousa, que V. Exa. perfilha a proposta dos Srs. José Domingues dos Santos e António Maria da Silva.
A nota oficiosa mandada para os jornais pelo Govêrno da sua reunião de Conselho de Ministros, é a demonstração de que o Govêrno quere entrar na revolução, quero fazer revolução daqueles lugares, em vez de manter a ordem.
Mas quais são as autorizações que o Sr. Presidente do Ministério tem?
O Sr. Presidente do Ministério tem as seguintes autorizações votadas ultimamente pela Câmara:
Leu.
Quere dizer: as autorizações que o Govêrno tem são apenas para decretar sôbre matéria do ordem pública e social.
Como é que, então, o Govêrno trocou impressões sôbre os assuntos que há-de legislar por todas as pastas no interregno parlamentar?
Evidentemente o Govêrno quero fazer ditadura, quere continuar tora da Constituição, quere fazer a desordem, quere fazer perseguições, obedecendo, nas mãos dos quais está, e como o provou, repito, a saída do Sr. Vieira da Rocha do Ministério, aos elementos da estrema esquerda.
Não quere perseguições a ninguém, sejam da estrema esquerda, sejam da extrema direita, quero, apenas, a ordem; mas a ordem não consiste em saltar por cima da lei, a ordem não consiste em desrespeitar o direito de propriedade, nem em fazer expropriações como aquelas que têm sido aconselhadas na imprensa esquerdista ao Sr. Presidente do Ministério.
Se o Sr. Presidente do Ministério quere a suspensão dos trabalhos parlamentares, é porque está disposto a ser o maior desordeiro do País, é porque S. Exa. está disposto a, ser o Govêrno da desordem em vez do ser o Govêrno da ordem!
Não apoiados.
Mas há mais! É preciso que o Sr. Presidente do Ministério saiba que a suspensão de garantias constitucionais é só para os números estabelecidos no artigo 1.° da lei há pouco votada, e não para cavar mais funda a divisão entre todos aqueles que têm por dever, e querem cumpri-lo, defender a ordem, porque S. Exa., certamente, em vez de atender aos interêsses nacionais, vai atender às imposições dos elementos que até são contrários aos fundamentos da sociedade actual. E é um Presidente do Ministério,
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que diz ter vencido um movimento de desordem, que pretende fazer uma obra destas!
Somos nós adversários do regime, mas entendemos que neste momento toda a união entre os defensores da ordem é pouca.
Não se pode, nem se deve fazer o jôgo dos elementos estremixtas, provocando a divisão entre os conservadores.
Ora outra cousa não é o que o Sr. Presidente do Ministério pretende fazer, ou antes o que pretendem obrigá-lo a fazer e que S. Exa., com a fraqueza de que está dando provas, vai certamente praticar.
Com que fundamento quere o Sr. Presidente do Ministério, que ainda há dias afirmava nesta casa que a ordem estava assegurada e que não havia o menor indício de alteração da ordem que os trabalhos parlamentares sejam encenados? É porque não convém aos elementos, de quem S. Exa. está sendo um delegado pela sua fraqueza, a fiscalização parlamentar; é porque não lhes convém que haja oposição a impedir que se leve o País para o caminho da anarquia.
A ordem não se resume, evidentemente, à questão de não haver todos os dias revolução.
A ordem, nos seus diversos aspectos, não pode de forma alguma existir desde que haja ódios entre os portugueses, desde que não se respeitem os direitos de cada um e continue a actual situação económica e financeira do País.
Quem quere ser um elemento de ordem, a primeira cousa que tem a fazer é levar a ordem até a administração pública nos seus diferentes ramos. Ora pregunto: estando nós a 21 de Abril, e sabendo-se que a falta dum orçamento cuidado é um dos principais males da nossa administração, pode, porventura, o Parlamento suspender os seus trabalhos antes de cuidar de discutir as contas do Estado?!
O Sr. Vitorino Guimarães, que aqui tem tantas vezes protestado contra o facto de não serem discutidos a tempo os orçamentos, quere defender agora uma proposta que é o contrário das afirmações que, aqui sempre tem feito?
É por isso que eu digo que S. Exa. está a obedecer a imposições de pessoas que só querem lançar a desordem na sociedade portuguesa, a fim do destruírem os fundamentos da actual organização social. E assim S. Exa. vai às cegas, como vão o Sr. António Maria da Silva e todos aqueles que acima de tudo põem as conveniências partidárias, para um caminho perigoso, esquecendo-se da obra ruinosa que vão praticar e tomando irremediável, uma situação de que depois hão-de arrepender-se, mas já tardiamente.
Falou S. Exa. há pouco em governos de concentração, houve-os, é certo, em que se cometeu o êrro gravíssimo de se entrar numa ditadura, como foi aquela em que se publicaram os 30 suplementos ao Diário do Govêrno, em que se fizeram leis que são hoje um prejuízo irreparável para a Nação, em que se atentou contra os fundamentos da sociedade, em que os extremistas chegaram até a ter pastas na governação pública.
E o Sr. Presidente do Ministério não tem, ao menos, a atenuante que muitos outros tem, do desconhecimento completo das mais elementares cousas da administração pública.
S. Exa., que não está nessas condições e que sabe muito bem quantas dificuldades tem tido para resolver determinadas questões de carácter financeiro, não tem desculpa alguma.
A V. Exa., Sr. Vitorino Guimarães, nada há que o possa absolver de pôr os interêsses do seu Partido acima dos interêsses do seu País, e V. Exa. está-o fazendo por uma paixão política e por uma fraqueza absolutamente indesculpáveis!
Mas vem o Sr. José Domingues dos Santos dizer:
"Apresentei esta proposta, no decorrer desta discussão, porque as circunstâncias me provaram a sua necessidade"!
Como se nós não soubéssemos já, não estivéssemos mesmo fartos do saber pela imprensa, pela tal imprensa que está mandando no Govêrno, que esta era já uma medida premeditada, que se pensava assim, porque não se quere a incómoda fiscalização do Parlamento, porque se quere levar mais longe a anarquia, de que tantas manifestações temos dia a dia, até adentro dos próprios serviços públicos!
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S. Exa. devia agradecer-me até o serviço que lhe estou a prestar; devia reconhecer que uma oposição que ponha os interêsses do País acima de tudo tem o dever do só opor tenazmente a que se entro no caminho em que S. Exa. quero entrar, não saindo das normas revolucionárias em que se vive.
Esta oposição demonstra bem que afinal é ela que está a defender a ordem, contra um Govêrno que quero estabelecer a desordem e levar a revolução a todos os ramos da administração pública.
Tantos problemas, Sr. Presidente!
O Parlamento tinha tanta pressa em se ocupar, por exemplo, do problema das estradas.
Mas tudo isso o Sr. Presidente do Ministério o a maioria esquecem ante as conveniências partidárias, por mais que, neste momento, eu lhes queira abrir os olhos, para S. Exa. verem bem a situação que estão a preparar.
Mas não!
Tanto o Sr. Vitorino Guimarães, como o Sr. António Maria da Silva, como vários outros, supõem que, assim procedendo, salvam as suas situações políticas.
Enganam-se, porém, redondamente!
Não as salvam!
E, quando em determinada altura, quando já não houver remédio para os males que estão fazendo ao País, êles hão-de necessàriamente ser vítimas, como infelizmente todos nós, da situação por elos próprios preparada.
Não é o espírito de a oposição que mo faz estar aqui a proferir estas, palavras, mas sim com a consciência de que cumpro o dever servindo a Nação.
Dentro de todos os meios regimentais eu farei todo o possível para que não só siga o caminho do 1919, porque ou vejo o Govêrno a reincidir numa ditadura inspirada por elementos os mais audaciosos e da mais comprovada incompetência.
Sr. Presidente: vote a Câmara como entender; por agora está cumprido o nosso dever. Acompanharemos esta discussão no Congresso, e por todos os meios ao nosso alcance evitaremos que se vote esta medida.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada a proposta.
O Sr. Cancela de Abreu: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contagem deu o seguinte resultado.
De pé 31 Srs. Deputados.
Sentados 53.
Foi aprovado.
Leu-se o aditamento do Sr. Vasco Borges e foi aprovado.
O Sr. José Domingues dos Santos: - Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, foi aprovado.
O Sr. Júlio de Abreu: - Sr. Presidente: em obediência ao Regimento começo por ler a minha moção, que vou ter a honra de mandar para a Mesa.
Moção
A Câmara considerando que em matéria do prerrogativas parlamentares a interpretação devo ser do carácter restritivo, visto tratar-se de matéria odiosa, reconheço que cessam as prerrogativa s consignadas no artigo 17.° da Constituição em todos os casos de flagrante delito a que corresponda pena maior ou equivalente da escala penal, tendo por isso inteira aplicação o direito comum, o passa à ordem do dia. - Júlio de Abreu.
Sr. Presidente: serei breve nas minhas considerações e se hoje pedi a palavra foi por na sessão de sexta feira não poder usar dela, visto não estar casualmente presente.
Sr. Presidente: esto incidente levantou-se em volta de um ofício do Sr. general da divisão, pedindo para só manter a prisão dos nossos colegas Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro.
Sou daqueles que entendem que o Sr. general da divisão não tinha que pedir licença à Cãmara para manter a prisão daqueles nossos colegas, desde que tenham, sido presos em flagrante delito a que corresponda pena maior ou equivalente da escala penal, porque em matéria do prerrogativas a interpretação tem de ser restrita, por isso que é de excepção, embora aquelas de que se trata tenham por fim garantir a liberdade da função legislativa, que é a mais nobre manifestação da soberania do Estado, mas que sem por
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isso deixem tais prerrogativas de representar matéria de excepção o portanto odiosa no sentido jurídico do tal palavra. Tem-se, Sr. Presidente, falado aqui por mais duma vez no artigo 17.° da Constituição, dando-lhe sentidos os mais variados, quando, a meu ver, êsse artigo não se presta a duas interpretações.
Diz, Sr. Presidente, êsse artigo, que vou ler à Câmara, o seguinte:
Leu.
Ora, era minha humilde opinião, quero isto significar que nonhum Deputado pode ser preso durante o período das sessões sem prévia licença da Câmara, desde que não seja preso em flagrante delito a que corresponda pena maior na escala penal.
Portanto desde que o Parlamentar tenha sido preso em flagrante delito, a que corresponda pena maior ou equivalente na escala penal, trate-se de crimes comuns ou políticos, visto no artigo em causa se não fazer distinção, e assim creio que não deve restar dúvida de que nenhuma licença é necessária da respectiva Câmara para prender ou manter a prisão.
E isto pelo menos o que bem claramente prescreve o artigo 17.° da Constituição.
É assim que eu a interpreto, reconhecendo no emtanto ao Parlamento o direito de discutir e decidir se haveria ou não o flagrante delito exigido para haver quebra das imunidades parlamentares.
Entendida assim a lei, vou referir-me ao assunto em causa.
Veio, Sr. Presidente, em primeiro lugar um ofício do Sr. comandante da divisão, dizendo que tinham sido presos em flagrante delito os Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro, e depois um outro do mesmo comandante pedindo para continuarem presos os mesmos ilustre Deputados.
Sr. Presidente: se é facto que existe um ofício do comandante da divisão dizendo que os Srs. Deputados em questão tinham sido presos em flagrante delito, não é menos exacto que existem dois depoimentos feitos sob declaração de honra pelos nossos ilustres colegas Srs. Rocha Saraiva e António da Fonseca, declarando que aqueles nossos colegas não estiveram na Rotunda, nem estavam envolvidos nos tristes acontecimentos que há dias se deram.
Sr. Presidente: não estamos num tribunal, mas sim numa assemblea pública, e assim a matéria de prova que pode não servir para aquele pode servir para aqui.
Eu, Sr. Presidente, sou um homem de honra, o como tal não posso pôr em dúvida a honra do ninguém.
O Sr. Cunha Leal deu-nos a sua palavra do honra de que não estava envolvido nos últimos acontecimentos, e assim não posso pôr em dúvida a sua palavra.
Também, Sr. Presidente, os Srs. Rocha Saraiva aqui na Câmara e António da Fonseca, em carta, garantem, sob sua honra, que realmente o Sr. Cunha Leal não estava envolvido nos acontecimentos.
Por outro lado, Sr. Presidente, alguns membros do Govêrno afirmaram nesta Câmara que os nossos colegas foram presos em flagrante delito do rebelião.
Também os pareceres das comissões nada definem e alguns dos seus ilustres membros já aqui declararam que, dos elementos enviados a esta Câmara sôbre o assunto, não existem sequer indícios de que a prisão se realizou em flagrante delito.
Ora, Sr. Presidente, sendo tudo isto confuso, e respeitando a palavra do todos, eu digo francamente que não sei como é que deverei votar.
Repito, tendo para mim como doutrina assento o única defensável perante as normas constitucionais do que cessam as prerrogativas a que se refere o artigo 17.° da Constituição no caso do flagrante delito a que corresponde pena maior ou equivalente na escala penal, trata se ou não de crimes infamantes, pois tal disposição legal não faz excepções, tendo por isso inteira aplicação o direito comum, e não compreendendo por isso que os parlamentares pudessem ser presos no caso excepcional abrangido pelo artigo 17.° citado o fôsse depois precisa qualquer licença para continuarem presos e seguir o processo até final, mas isto não significa que eu no caso especial de que se trata e vistas as circunstâncias verdadeiramente especiais que à discussão tem vindo, que eu não vote pela libertação dos nossos colegas presos, pois que no meu espírito está bem vincado que se não deve brincar com a liberdade de quem quer que seja.
Sr. Presidente: sinto-me pois perplexo, e só se o Govêrno daquelas cadeiras me
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disser peremptória monte que faz questão política do caso, por ter provas seguras de que os ilustres Deputados em causa fórum presos em flagrante delito de rebelião, ou que periga a ordem social com a sua libertação, é que deixarei de votar no sentido que disse.
Sr. Presidente: em casos de honra é sempre muito melindroso tocar, mas maior deve ser o escrúpulo quando a liberdade individual dependa dum dêsses casos.
Convenço-me por isso que o Govêrno, composto por republicanos duma só fé e pessoas honradas, se tiver de pôr a questão política sôbre o caso, o que diga-se de passagem me parece inoportuno, e fará só com os olhos pontos nos superiores interêsses da República e bem sciente das responsabilidades que sôbre êle impendem, e, portanto, era tal caso terá o meu voto, embora contrariadamente.
Tenho dito.
Foi lida e admitida a moção do Sr. Júlio de Abreu.
O Sr. Pedro Pita: - Sr. Presidente: quando usei da palavra ao iniciar-se esto debate, eu fiz à Câmara a seguinte declaração:
"Eu sei, Sr. Presidente, que o Sr. António da Fonseca não terá dúvida, em qualquer ocasião, em afirmar que, sendo hóspede do Sr. Cunha Leal, sabe que êle não saiu, e, não tendo saído, não podia, ipso facto, ter ido à Rotunda".
Fiz esta afirmação em virtude de informações que não foram dadas.
Porém, desejando-o saber directamente de S. Exa. escrevi ao Sr. António da Fonseca uma carta, a que me respondeu com outra, e que peço licença para ler, não o tendo feito mais cedo por não ter tido oportunidade durante o debate.
Peço também a V. Exa., Sr. Presidente, que taça juntar esta carta ao processo, ou que a conservo na Mesa, para que qualquer Deputado a possa ler.
A carta é a seguinte:
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Viperino Guimarães): - Sr. Presidente: porei toda a serenidade o calma nas minhas palavras. Mas, antes de dizer à Câmara qual o modo de ver do Govêrno sôbre o assunto em discussão, manda a minha lealdade o consciência que diga que não tenho a méis leve má vontade contra os dois ilustres Deputados que estão presos.
A um deles ligam-me mesmo aqueles laços do estima que resultam de ter servido num gabinete da sua presidência, sem que entre nós só dêsse o mais ligeiro conflito.
Não tive com o Sr. Cunha Leal qualquer questão, e apenas aquelas divergências de ordem política que resultam de indivíduos que ocupam campos políticos diferentes, sem que nunca tivessem tido qualquer quebra as relações pessoais que mantinhamos.
Sr. Presidente: precisava de fazer esta declaração para levantar a afirmação feita na carta enviada por S. Exa. à Câmara, em que se atribui a prisão a uma cabala política.
Sabem todos, pelas notícias constantes da imprenso, que o nome de S. Exa. andava continuadamente indicado como envolvido no movimento.
Ainda no dia da revolução a sua prisão foi feita porque as autoridades competentes chegaram informações de várias fontes segundo as quais S. Exa. estava em relações com os revoltosos.
Depois disso um facto novo se produziu, que foi, realmente, e de, numa carta enviada a esta casa do Parlamento, o Sr. Cunha Leal dar a sua palavra de honra de que não estava envolvido nos últimos acontecimentos.
De maneira nenhuma eu duvido da afirmação do Sr Cunha Leal, mas entendo que, para bem de S. Exa., para bem do seu prestígio, lhe conviria mais sair pela porta aberta, bem larga, das investigações.
Não duvidando de modo nenhum da palavra do honra do Sr. Cunha Leal, não posso contudo, admitir que o precedente fique para a solução de questões de carácter jurídico no futuro, porque, então, quem tivesse as responsabilidades do Poder, quando lhe fôsse dada a palavra de honra, teria imediatamente de mandar libertar os indivíduos que estivessem prisioneiros.
O procedente seria, realmente, perigoso e, torno a repeti-lo, fique bem as-
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sente que isto não representa qualquer desprimor ou menos consideração para com o Sr. Cunha Leal ou que sequer me pudesse passar pela idea que S. Exa. faltava à verdade.
Quero mo parecer, Sr. Presidente, que o Parlamento não tem, verdadeiramente, funções de tribunal e que, portanto, deve deixar às autoridades competentes o apuramento das responsabilidades.
Apoiados.
Não tem o Govêrno desejos de perseguir ou de violentar quem quer que seja, e assim é que as instruções que estão dadas suo no sentido de que as investigações sejam feiras com a maior celeridade, de modo a serem libertados no menor espaço de tempo todos aqueles que culpas não tenham, assim como a serem julgados com a maior brevidade possível aqueles sôbre quem recaiam responsabilidades.
Mas, no caso presente, o que há é um pedido feito pela pessoa que está encarregada da, manutenção da ordem em todo o distrito de Lisboa.
Independente do prestígio que resulta dos grandes serviços que êsse militar tem prestado à ordem e ao País, nós temos de atender que pela função de que está investido êle precisa estar armada de toda a fôrça e de todo o prestígio e de toda a autoridade.
É por isso que o Govêrno entende que na hora presente, não é de aconselhar que se recuse o pedido que fez o Sr. general comandante da divisão. Encarando o assunto sob êste aspecto, o Govêrno entende dever pedir à Câmara, e sôbre isso faz questão do confiança, que seja satisfeito o pedido do Sr. general da 1.ª divisão militar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Alberto Xavier (para uma questão prévia): - Sr. Presidente: a questão prévia que desejo levantar é simples.
A questão das imunidades parlamentares, como ficou por mim exposta, é uma defesa do regime parlamentar contra as investidas do Poder Executivo.
As imunidades parlamentares foram consideradas como defesa do Parlamento, estabelecidas no interêsse do País e das funções que o Parlamento é destinado a desempenhar, porque o Parlamento não dispõe de nenhuma fôrça senão aquela que dentro dêste edifício obedece ao seu Presidente.
Nestas circunstâncias, eu entendo que o Poder Executivo não pode pôr a questão de confiança, porque exerce um acto de coacção.
Pregunto: é de receber a questão de confiança posta pelo Govêrno?
Tal é a questão provia.
Tenho dito.
Apoiados.
A questão prévia é a seguinte:
A Câmara dos Deputados, considerando que as imunidades parlamentares não constituem um privilégio pessoal concedido a favor dos Deputados, mas uma prerrogativa consignada para garantir o completo exercício da soberania nacional e a independência do funcionamento da Assemblea Legislativa:
Resolve, em questão prévia, que não é de receber a questão de confiança que o Chefe do Govêrno acaba de pôr sôbre o problema em discussão. - Alberto Xavier.
Admitida.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se a questão prévia posta pelo Sr. Alberto Xavier. Foi admitida e entrou em discussão.
O Sr. Pedro Pita: - Sr. Presidente: durante os anos, e já não são poucos, em que tenho exercido a minha função de Deputado, tem-se criado um pouco à minha roda a impressão de que há cousas capazes de porem os meus nervos em movimento; e há momentos em que não sou capaz de os conter.
Tenho, porém, provado o contrário, e ainda neste momento nem as palavras que o Sr. Presidente do Ministério acaba de proferir conseguiram fazer-me sair da calma que a mim próprio me impus e que com esfôrço tenho mantido.
Não se trata senão, neste momento, de saber se os dois Deputados presos o foram em flagrante delito ou não.
O Sr. Presidente do Ministério já não foi por esto caminho.
Depois de afirmar de uma maneira clara e categórica que, nem por momentos, lhe passou pela cabeça pôr em dúvida a palavra de honra do Sr. Cunha Leal, acentuando que já não tem duvidas de que a
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acusação é caluniosa, afirma em seguida que é necessário que êle continue preso, o põe sôbre esta prisão urna questão de confiança.
Não é já ter-se preso um Deputado encontrado em flagrante delito.
É ter presa uma pessoa em que se reconhece e sôbre a qual se declara que está inocente!
Apoiados.
Sr. Presidente: o País tem do nos julgar a todos.
É possível lazer uma atmosfera suficientemente pesada sôbre o caso; mas a declararão do Sr. Presidente do Ministério tem de ser apreciada pelo País inteiro, que comparará o procedimento dos que, sendo companheiros dêstes dois Deputados, aqui vêm sem que qualquer outro fim aqui os trouxesse, sem lhes terem sido dadas quaisquer explicações, apenas porque tem do cumprir um dever, nada podendo tolhê-los na sua passagem (Apoiados) com outros procedimentos.
Há muito ainda que ver, Sr. Presidente. Temos muito ainda que ver, mas nunca esperei, confesso-o, o V. Exas. por certo nunca esporaram, ouvir um discurso como o do Sr. Presidente do Ministério.
Apoiados.
Ninguém o podia esperar, mas como já temos visto tanta cousa, havíamos do ver mais esta, e muito mais.
Nunca me passaria pela cabeça ouvir semelhantes cousas.
Apoiados.
Num regime republicano, homens que são republicanos, mio têm o direito do exigir a prisão de um inocente.
Apoiados.
Sr. Presidente: ouvi uma vez o Sr. Álvaro de Castro dizer que não é republicano quem quere.
Apoiados.
É republicano, não quem traz só na boca a República, mas quem traz e põe no procedimento o princípio republicano.
Apoiados.
Todos nós sabemos que o Sr. Cunha Leal pelo sen brio, pelo seu orgulho, seria incapaz de cometer uma baixeza para alcançar a liberdade.
Os seus próprios inimigos nunca deixaram de lhe reconhecer a sua grande coragem.
Temos ainda a afirmação clara, feita com toda a nobreza, pelo nosso colega nesta Câmara, o Sr. Rocha Saraiva, e temos também a declaração do Sr. António da Fonseca, feita a várias pessoas e confirmada na carta de S. Exa. que há pouco tive a honra de ler à Câmara, sendo necessário não esquecer que o Sr. António da Fonseca vivia como hóspede em casa do Sr. Cunha Leal.
Ninguém tem o direito de duvidar da veracidade das afirmações feitas pelo Sr. Cunha Leal.
As próprias palavras do Sr. Presidente do Ministério o confirmam, que não deixou de declarar que é amigo do Sr. Cunha Leal.
Mas, Sr. Presidente, só ser amigo do Sr. Cunha Leal é querer mantê-lo sob prisão, sendo inocente, eu direi que do tais amigos nos livro o diabo.
Era natural que o Sr. Vitorino Guimarães, tendo sorvido nuin Ministério presidido pelo Sr. Cunha Leal, conservasse de facto aquelas ligações que prendem todos os homens que uma vez serviram juntos.
Já experimentei, por desgraça minha, ser Ministro neste País, e sei, por isso, como as horas de amargura e essas sobretudo, são capazes de ligar por laços indestrutíveis aqueles que juntos vivem uma mesma hora do angústia.
Estranho, pois, que o Sr. Presidente do Ministério, que se diz amigo do Sr. Cunha Leal, aquele que já foi seu Presidente de Ministério, o queira manter numa prisão do Estado, quando se diz convencido de que S. Exa. está inocente.
Apoiados.
Falei de facto com a voz mais elevada, mas mais uma vez não deixei que os nervos tomassem conta de mim.
Ainda agora não disse uma palavra que possa servir a alguém para nela encontrar uma provocação.
Sr. Presidente: se um Govêrno de um partido a que eu pertencesse afirmasse ter preso um inocente e pusesse a questão de confiança sôbre a manutenção dessa prisão, eu dou a minha palavra de honra de que não apoiaria mais tal Govêrno.
Apoiados.
Sr. Presidente: eu não sei se já me incluíram também no número dos "talassas", porque parece que republicanos são
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só aqueles que apanharam o banho lustral de determinado partido.
Eu, porém, não preciso de pedir licença, seja a quem fôr, para ser republicano.
Estão dentro do meu partido muitos indivíduos que bastante concorreram para a implantação da República e que pela República muito tem combatido e trabalhado.
Mas não valo a pena estar a levantar as afirmações que aqui ainda hoje se fizeram pelo que respeita ao movimento.
Todos sabem qual a nossa atitude perante, êste Govêrno.
Quereriam V. Exas. que, sôbre a prisão injusta do dois correligionários nossos, um deles nosso leader, nós juntássemos braçadas de palmas e quilogramas de incenso às toneladas de elogios e louvores que V. Exas. lhes têm dispensado?
Mas quem imaginam V. Exas. que nós somos?
V. Exas. podem, porque governam, praticar os maiores atropelos à lei; podem porque mandam praticar realmente actos que nos vexem o nos choquem; mas o que V. Exas. não podem fazer de gente como a nossa é passar sôbre nós sem ouvirem os nossos protestos.
Apoiados.
Não os nossos lamentos, mas os nossos protestos.
Sr. Presidente: era preciso vincar bem nesta hora as responsabilidades de todos.
O Sr. Presidente do Ministério, já sem alegar a existência de qualquer flagrante delito, não duvidando nem por um momento da palavra de honra do Sr. Cunha Leal, convencido absolutamente de que Cie está inocente, põe sôbre a manutenção da sua prisão a questão de confiança.
A Câmara vai resolver, o País vai julgar.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Álvaro de Castro: - Sr. Presidente: não posso dizer que fiquei surpreendido com as palavras do Sr. Presidente do Ministério.
Parte delas derivaram da atitude já assumida por S. Exa. e, e especialmente, da atitude do Sr. Ministro do Interior.
O que me surpreende, e vivamente, é o facto de o Sr. Presidente ao Ministério fazer questão de confiança, da votação sôbre um pedido do Sr. general comandante da divisão, e essa minha surpresa é tanto maior quanto é certo ser S. Exa. um velho parlamentar que, por isso mesmo, já devia ter notado quanto a Câmara sistematicamente se tem recusado a aceitar a questão política no assunto em debate.
Apoiados.
Não deixarei de dizer que a prática da Câmara dos Deputados não é talvez a mais conforme com o direito constitucional.
A verdade porém, é que esta legislatura - que ao que parece vai terminar - não pode alterar por meras razões de circunstância ou por paixão de momento uma doutrina que constante e uniformemente se tem mantido.
Apoiados.
Creio que o Sr. Presidente do Ministério ponderará as suas palavras o deixará a Câmara num à vontade que lhe permita tomar livremente uma deliberação sôbre o assunto, tirando assim, de uma situação confusa aqueles que, como ou, desejando apoiar o Govêrno, todavia se não prestam a acompanhá-lo pelo atalho através do qual o Sr. Presidente do Ministério pretende conduzi-lo.
Apoiados.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro do Interior fez declarações nesta Câmara que eu não posso deixar passar sem algumas observações. S. Exa. confundindo os actos processuais de perseguição do quaisquer indivíduos compreendidos na acção penal em relação a determinados acontecimentos, com a deliberação da Câmara como se esta tivesse responsabilidades sôbre o andamento dêsses processos (Apoiados), afirmou a necessidade de nos pronunciarmos ou a favor dos perturbadores ou contra êles.
Ora a Câmara não tem que estar a favor nem contra.
Apoiados.
Eu penso que, nesta questão, há duas cousas diferentes: uma, o momento em que as autoridades e o Govêrno actuaram; o outra, o momento em que estamos criticando os acontecimentos.
Com respeito ao momento em que o Govêrno teve de actuar e as autoridades
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tiveram de empregar os meios para dominar a revolta, eu estou inteiramente resolvido a concordar que tudo se fez dentro da lei.
Eu explico. As investigações realizadas levaram o Govêrno e as autoridades à conclusão de que dois Srs. Deputados estavam envolvidos no movimento revolucionário.
Na verdade nós não podemos esquecer as responsabilidades revolucionarias do Partido Nacionalista, a sua propaganda e a atmosfera de que se rodeou que levaram toda a gente a convencer-se do que êsse partido estava dentro da conjura. Ainda aguardámos que êsse partido ao regressar aos trabalhos parlamentares fizesse declarações categóricas sôbre a sua não comparticipação no movimento. O facto, é, porém, que essas declarações só não fizeram.
O Partido Nacionalista não pode, pois, queixar-se das dúvidas que resultam da sua falta de palavras.
Sr. Presidente: concluído assim que, efectivamente, se tinha dado o flagrante delito, eu aqui não linha de apreciar o pedido do Sr. general comandante da divisão, porque êsse pedido para continuarem presos dois Deputados envolvia, por qualquer circunstância, a impossibilidade da organização do processo criminal.
Eu não sou juiz, sou Deputado, Não tenho de apreciar nem os documentos que estão na Mesa, e que já estiveram em poder da comissão de legislação criminal, referentes a investigações e depoimentos, nem a carta que o Sr. Cunha Leal dirigiu ao Sr. Presidente, porque tudo isso são documentos para figurar no processo.
Não careço portanto deles.
O que sei é que o Sr. general comandante da divisão fez um pedido para continuarem presos dois Deputados, o ou, usando de um direito que tenho, ou lhes conservo as imunidades parlamentares, ou lhas retiro.
Vejamos qual devo ser a atitude da Câmara.
De uma maneira geral, entendo que, em crimes políticos, de natureza política, a Câmara deve sempre pronunciar-se, a não ser que haja circunstâncias determinadas que nos levem, a proceder do maneira diferente, pela conservação das imunidades dos Deputados. Podia ainda dar se o caso do Sr. Presidente do Ministério nos vir aqui dizer que, com a liberdade dêsses dois Deputados, perigava a ordem pública, e que ora possível ver-se novamente na rua um outro movimento. Mas tal aqui não foi dito, antes pelo contrário.
E como tudo isso que me podia determinar, num crime político, a retirar as imunidades, só não deu, eu entendo que devem ser mantidas.
Com relação a crimes comuns, votarei sempre do maneira diferente, mas, mesmo para êles, a Câmara não tem procedido assim.
Apoiados.
O Sr. Agatão Lança (interrompendo): - Até para um crime comum esta Câmara já manteve as imunidades parlamentares.
Apoiados.
O Orador: - Creio que esta mesma Câmara já tratou de 5 ou 6 casos idênticos; mas há um que é o mais característico e que deu lugar a votação.
Era eu então Presidente do Ministério, e vou recordar a V. Exas. as palavras que nessa ocasião proferi, para demonstrar quanto elas estão conformo com o meu ponto do vista aqui expendido hoje.
Vem precisamente também à Câmara um pedido do Sr. general comandante da divisão.
O Govêrno não se lembrou, nem. só poderia lembrar, do pôr a questão política de confiança, sendo certo que o Sr. Ministro da Guerra veio à Câmara o votou contra o facto de serem, mantidas as imunidades aos parlamentares presos.
Mais tarde foi proposta na Câmara uma amnistia- e devo já dizer, paru não parecer que adianto uma opinião, que soa absolutamente contrário à amnistia na hipótese em que nos encontramos - mas, nessa ocasião disso que era favorável à amnistia porque na revolta militar da Aviação se tinha envolvido a política de tal maneira que não era justo que, efectivamente, não se atendesse a essa circunstância para a Câmara apreciar o projecto em discussão.
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Nessa ocasião o Sr. general do divisão enviou à Câmara o seguinte pedido:
Leu.
Neste caso, não só b general de divisão afirmava que tinham sido presos os Deputados em flagrante delito a que correspondia pena maior, mas, mais ainda, a Câmara tinha conhecimento perlei to, completo de que êstes Deputados tinham sido presos pela referida circunstância, e sabia mais, que êsses Deputados em plena Câmara ameaçaram o Govêrno com a revolução que ia sair para a rua. Sabia ainda, que os Srs. António Maia e Lelo Portela, ao ser-lhes afirmado de que a fôrça pública estava ao lado da ordem, o Sr. Lelo Portela disse que haviam de ter a resposta breve porque o Govêrno devia ser escorraçado pela revolução.
Tudo isto eram circunstâncias de flagrante delito, e que além do mais representava a confissão dos próprios feita nesta Câmara.
A resolução da Câmara não HO fez esperar e a votação da Câmara foi no sentido de só manterem as imunidades para o facto de serem imediatamente soltos, sendo aprovada por 47 votos contra 7 a moção que então foi enviada para a Mesa.
Os outros casos tratados na Câmara, e que não merece a pena explaná-los, foram resolvidos de igual maneira.
Pregunto: quais são os fundamentos em que agora se há-de assentar o voto consciente da Câmara, sendo certo que até o Sr. Presidente do Ministério afirmou que estava convencido da inocência dos dois Deputados presos?
Se não estamos em face dum absurdo, estamos, pelo menos, em face dum problema que nos vai surgir em breves horas, mas que lamento que seja esto facto que o determine.
A Câmara faz muitíssimo bem nesta hora de dificuldades, nesta hora grave, em defender, como se fosso o canto do cisne, as suas imunidades parlamentares, principalmente dando-se as circunstâncias que salientei, e que o Sr. Presidente do Ministério salientou, que nos deixou absortos, pasmados, porque parece já não haver lógica, porque parece já não haver mesmo senso comum.
Condensando as minhas palavras, para não fatigar a atenção da Câmara, e mesmo porque pouco mais há a dizer, envio para a Mesa a seguinte moção:
Considerando que o Govêrno, ordenando a prisão de dois Deputados que as informações oficiais e investigações policiais mostraram estarem agindo em ligação com os revoltosos, procedeu dentro da lei e segundo as necessidades de defesa da ordem pública;
Considerando que sai para fora do âmbito das atribuições e faculdades da Câmara entrar na apreciação e muito menos julgar do valor jurídico dos elementos que se encontram à disposição dos Srs. Deputados na Mesa da. Presidência, pois essa apreciação conduziria ao julgamento dum processo crime que só aos tribunais pertence;
Considerando que à Câmara só cabe o resolver sôbre a suspensão ou manutenção das imunidades parlamentares, estabelecidas para garantia do livre exercício da representação popular;
Consideram o que a Câmara uniformemente só tem manifestado pela manutenção das imunidades, sendo característica a votação do dia 17 de Junho de 1924, em que a Câmara, por 54 votos contra 7, recusou a suspensão das imunidades, apesar de o comando da 1.ª divisão dar comprovado o flagrante delito em crime a que correspondia pena maior;
Considerando que a investigação criminal contra os dois referidos Deputados seguirá os seus termos, qualquer que seja a resolução da Câmara no tocante a imunidades;
Considerando que, pelos elementos e informações conhecidos, não se mostra necessário ao regular o bom andamento do processo a suspensão das imunidades:
A Câmara resolve manter aos dois Deputados em causa as imunidades parlamentares, devendo continuar as investigações criminais em curso. - Álvaro de Castro.
Foi admitida.
O Sr. Amadeu de Vasconcelos (para explicações): - Sr. Presidente: pedi a palavra para dar um esclarecimento à Câmara.
Apesar de muito me interessarem as questões sôbre direito constitucional, eu tinha - e nesse propósito me mantenho -
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tomado para comigo mesmo o compromisso de não entrar nesta discussão, discussão que é melindrosíssima, não, Sr. Presidente, pela hora em que nos encontramos, tendo ainda, a bem dizer, há dois dias apenas sido sufocado um movimento revolucionário, mas porque se trata duma situação desagradável para dois colegas nossos.
E apesar, Sr. Presidente, do por várias vezes, sôbre assuntos semelhantes, ou ter emitido sempre a mesma opinião, mio queria, nem quero, que alguém pensasse que, do qualquer maneira, eu procurava influir para que a Câmara só do terminasse num ou noutro sentido. Mas quando o Sr. Álvaro de Castro, usando da palavra, afirmava que sempre que se tratava de prisões por motivos políticos S. Exa. só pronunciava em favor da manutenção das imunidades parlamentares, alguém, lembrou que esta Câmara já tinha mantido ou votado em favor dessa manutenção até em casos em que Deputados tinham sido acusados de delitos comuns.
Sr. Presidente: creio que o caso a que se refere êsse alguém é o dum ilustre colega meu o prezado amigo, o Sr. Delfim do Araújo. Ora eu vejo-mo assim forçado a intervir no debate, porque fui o relator dêste parecer. E ainda nele. Sr. Presidente, apesar de não se tratar dum delito comum, porque se trotava dum delito de documentos eleitorais, e, portanto, evidentemente de natureza política, eu sustentei na comissão, centra a maioria dos seus membros e contra os meus correligionários, e invoco mesmo testemunhas de representantes do Partido Nacionalista que assistiram à discussão nesta comissão, e, entre outros, o Sr. Moura Pinto, sustentei - dizia eu - quando a comissão queria que se votasse a suspensão das garantias constitucionais até o fim da legislatura, teimei mesmo que apenas se mantivesse o Deputado com as imunidades parlamentares até o fim da sessão legislativa, que terminava vinte o tantos dias depois disso. E nessa altura S. Exa. era pronunciado na Relação, para onde recorrera.
Tinha, pois, Sr. Presidente, autoridade para esclarecer êste facto, para que êle não possa também, de qualquer maneira, influir na decisão da Câmara.
De rosto, uma vez que estou no uso da palavra, em di.s minutos justificarei o meu voto.
A minha opinião é que, nos precisos termos do artigo 17.° da Constituição, a Câmara não tem de intervir nesta questão. Êsse artigo estabelece a excepção de que durante o funcionamento do Parlamento qualquer membro pode ser preso, quando em flagrante delito, se a êsse delito correspondo pena maior.
Quanto à prisão, a Câmara não tem de intervir, se quem prendeu tinha competência o autoridade para prender.
Se quando cometido o delito estavam suspensas as imunidades parlamentares o parlamentar é considerado como um simples cidadão, o, para defesa dos seus direitos, para adquirir a liberdade, tem na lei os mesmos recursos que a lei faculta a qualquer outro cidadão.
Já aqui ouvi sustentar a necessidade da defesa das imunidades parlamentares, porque elas tem por objectivo assegurar o livro exercício do Poder Legislativo, mas não é o Parlamento o úníco Poder dentro do Estado, e tam necessário é à vida do Estado o livre exercício do Poder Legislativo como do Poder Executivo.
E se só estabelece o princípio do que as imunidades parlamentares dão direito a colocarmo-nos acima do Poder Executivo, vamos cair no absurdo de os parlamentares poderem conspirar abertamente contra o Poder Executivo, poderem destruir um Poder do Estado e contribuir não só para o perigo das instituições como do próprio Estado.
Estamos evidentemente numa hora fortemente emocionante, e por isso, em absoluto, nenhum de nós pode afirmar que dentro de nós não vibra a paixão política; porém, devemos ter um pouco de serenidade para encarar as questões tais como elas são.
O meu voto não será por que a Câmara não tenha de intervir no caso presente.
S. Exa. o Sr. general da divisão não tinha do solicitar à Câmara o pedido para continuarem, presos os Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro.
Quero afirmar que no meu voto não há qualquer outro intuito do que proceder em harmonia com a Constituição.
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Por aqui e fora daqui tenho discutido e tenho contrariado a acção e os processos políticos do Sr. Cunha Leal, mas aqui e fora daqui, sem ter as mínimas relações pessoais com S. Exa., tenho-lho feito justiça; tenho afirmado que S. Exa. hoje, como sempre, faz falta no Parlamento, onde é uma figura de destaque, pelo seu talento o excepcionais qualidades de parlamentar.
Mas isso não basta para fazer mudar a minha opinião.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Tenho de interromper a sessão para continuar amanhei à hora regimental.
Está interrompida a sessão.
Eram 20 horas e 8 minutos.
SEGUNDA PARTE
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.
Acaba de ser recebido na Mesa um ofício do Sr. general comandante da 1.ª divisão, relativo à prisão dos Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro.
Vai ler-se.
Foi lido na Mesa.
É do teor seguinte:
Exmo. Sr. - Quando assumi o comando militar encontrei presos os Srs. Deputados Cunha Leal o Garcia Loureiro, como implicados nos últimos acontecimentos. Entendendo que não podia conservá-los presos sem autorização da Câmara, a que V. Exa. tam dignamente preside, dirigi a V. Exa. o meu ofício n.° 181, de 21 do corrente.
Tendo preguntado ao oficial de polícia judiciária, encarregado do respectivo auto, sôbre as provas ou indícios de culpabilidade até agora encontrados contra os presumidos delinquentes, Cunha Leal e Garcia Loureiro, fui informado, por nota n.° l, de hoje, de que, até a presente data, não constam do auto do corpo de delito quaisquer provas ou indícios de culpabilidade contra os dois presumidos delinquentes.
Mais informa não haver motivo para ser mantida a sua prisão.
Nestes termos, não há razão para manter o pedido anteriormente feito que agora retiro, pois mandei que fossem postos em liberdade, renovando tal pedido se porventura as investigações vierem a tornar necessário êsse procedimento.
Saúde e Fraternidade.
Ao Exmo. Sr. Presidente da Câmara dos Deputados - Lisboa.
Quartel General da 1.ª Divisão do Exército, em Lisboa, 28 de Abril de 1925. - O Comandante da Divisão, Adriano de Sá, general.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que, em vista do ofício que V. Exa. acabou de mandar ler, enviado pelo Sr. general comandante da divisão, o Govêrno retira a questão de confiança, que sôbre o assunto ontem tinha pôsto o que visava unicamente a prestigiar a autoridade militar que tinha apresentado êsse pedido.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Trocam-se muitos àpartes.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.
O Sr. Carvalho da Silva pediu a palavra após a leitura do documento que foi enviado pelo Sr. comandante da divisão.
Êste documento não está pôsto em discussão, e em minha opinião, a fazer-se qualquer discussão sôbre êle, seria naturalmente a continuação do debate sôbre o primeiro pedido apresentado.
Entendo, pois, que a discussão está terminada.
Apoiados.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - V. Exa. dá-me licença?
V. Exa., após a leitura do ofício, deu a palavra ao Sr. Presidente do Ministério.
E eu desejava que a palavra me fôsse concedida, nos mesmos termos em que foi dada a S. Exa.
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O Sr. Presidente: - O Sr. Presidente do Ministério pediu a palavra para lazer declarações em nome do Govêrno, sôbre o documento que foi lido.
O Sr. Carvalho da Silva (interrompendo): - Pois é exactamente sôbre o documento que foi lido que eu pedi a palavra.
Então V. Exa. dá a palavra ao Sr. Presidente do Ministério e não me dá a mim a palavra?
O Sr. Presidente: - Eu não ponho em discussão o ofício que foi lido, sem que previamente a Câmara se pronuncie. Dou a palavra a V. Exa. mas para um requerimento.
O Sr. Carvalho da Silva: - Eu sei que a maioria quere abafar esta questão.
O Sr. Presidente: - Eu não sei o que a maioria quere ou deixa do querer.
Para ter esta opinião, não procurei saber o que a maioria pensa.
O Sr. Carvalho da Silva: - Mas, Sr. Presidente, quando eu pedi a palavra, foi exactamente nos mesmos termos em que o fez o Sr. Presidente do Ministério.
S. Exa. fez declarações políticas, e é sôbre essas declarações que eu desejo falar.
O Sr. Presidente: - Eu vou dar a palavra a V. Exa., para que não imagine que procedo com qualquer parcialismo.
Para ter esta opinião, repito, não consultei a maioria.
Tem V. Exa. a palavra.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: eu primeiro lugar devo dizer que era incapaz de proferir qualquer palavra que, porventura, fôsse tendente a manifestar menos consideração por V. Exa.
Tanto isto assim é que começo por dizer que, nesta questão, foi V. Exa. quem salvou ou procurou salvar o prestígio da Câmara, fazendo logo de entrada a declaração de que tinha procurado o Govêrno, com a certeza em que estava de que os Sra. Cunha Leal e Garcia Loureiro tinham sido mal presos.
Apoiados da direita.
Vê V. Exa., portanto, a minha imparcialidade.
Sr. Presidente: o Sr. general comandante da divisão no sou ofício declara duas cousas:
A primeira que, quando S. Exa. tomou conta do comando militar do distrito de Lisboa, já estavam presos, à ordem do Govêrno, os Srs. Cunha Leal e Garcia Loureiro; a segunda, que nenhuma razão, absolutamente nenhuma, encontrou para manter presos êstes Deputados e por isso os mandava libertar.
O Govêrno afirmou à Câmara dos Deputados que Gsscs Deputados tinham sido presos em flagrante delito o agora o Sr. general de divisão vem declarar que não houve flagrante delito.
Apoiados.
O Govêrno, portanto, veio enganar a Câmara (Apoiados); o Govêrno procurou coagir a Câmara o veio pôr a questão nos termos que nos vimos, dizendo que era uma desconsiderarão ao general Adriano do Sá se a Câmara não votasse a continuação da prisão dêsses Deputados. Hoje vem o Sr. general Adriano de Sá pela maneira mais formal desmentir as afirmações do Govêrno.
Mais ainda. Há dias o Sr. Ministro do Interior, usando da palavra numa altura em que o não podia fazer, pois estava com a palavra reservada o Sr. Vasco Borges, procurou mais uma vez coagir a Câmara.
O Govêrno procura acobertar-se com o general de divisão, que nenhuma responsabilidade tem.
O Govêrno quis enganar a Câmara.
Apoiados.
Um Govêrno assim não se pode manter no Poder (Apoiados) nem mais um minuto.
Apoiados.
Um Govêrno que vem enganar a Câmara não pode continuar a gerir os negócios públicos (Apoiados), não pode ter a confiança da Câmara.
Apoiados.
Não apoiados.
Um Govêrno assim passa a ser um tolerado.
Não apoiados.
Apoiados.
Não sei o que pensará a maioria, mas individualmente cada Deputado certa-
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mente pensará que um Govêrno assim não lhe merece confiança.
Não apoiado do Sr. José Domingues dos Santos.
Eu gostava que V. Exa., Sr. José Domingues dos Santos, justificasse o seu "não apoiado". Não o faz porque não pode.
O Govêrno diz que foram presos em flagrante delito e o general de divisão manda-os pôr em liberdade. Um Govêrno assim é um Govêrno tolerado.
Não apoiados.
Apoiados
Um Govêrno assim o que tem a fazer é abandonar as cadeiras do Poder, pois a sua acção só é prejudicial.
Não apoiados.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita: - Sr. Presidente: no momento em que êste incidente desagradável (Apoiados) chegou ao seu termo, nós não cumpriríamos o nosso dever não apresentando a V. Exa. as nossa saudações (Apoiados) pela atitude briosa e digna (Muitos apoiados) como mais uma vez V. Exa. provou que é Presidente de toda a Câmara (Muitos apoiados) e que respeitava e pugnava pelas imunidades parlamentares.
Muitos apoiados.
Sr. Presidente: se é verdade que V. Exa. cumpriu o seu dever, nem por isso nós devemos deixar do apresentar os nossos agradecimentos (Apoiados), pois muita gente deixou de o cumprir (Apoiados), ou cumpriram às avessas.
Apoiados.
Mais uma vez se provou que V. Exa. é Presidente da Câmara, de nós todos e não duma parte da Câmara.
Apoiados.
Numa palavra, V. Exa. cumpriu o seu dever, quanto ao resto é uma cousa a que todos nós já estamos habituados (Apoiados), mas neste momento não podíamos ficar calados, e os mais que façam a comparação.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Vou suspender a sessão para se realizar a reunião do Congresso, que foi pelo Presidente do Senado marcada para as 16 horas e meia.
Está interrompida a sessão.
Eram 15 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
A próxima sessão será no dia 1 de Junho de 1926, com a seguinte ordem de trabalhos:
Proposta de lei n.° 854, que autoriza o Govêrno de acordo com o Banco de Portugal, a transferir da conta sob a rubrica "Suprimentos ao Govêrno (convenção de 29 de Dezembro de 1922)" para a conta sob a rubrica "Empréstimos ao Govêrno (contrato de 29 de Abril de 1918)" a importância do saldo dos aludidos suprimentos à data da entrada em vigor desta lei.
Parecer n.° 865-A, orçamento do Ministério das Finanças.
Parecer n.° 865-B, orçamento do Ministério da Instrução Pública.
Interpelação do Sr. Deputado Joaquim Ribeiro ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros sôbre a situação do ex-Ministro de Portugal em Berlim.
Interpelação do Sr. Deputado Brito Camacho ao Sr. Ministro das Colónias sôbre a portaria do 21 de Fevereiro de 1925, que nomeia um agente para ir a Moçambique e Angola para obter trabalhadores para S. Tomé e Príncipe.
Está encerrada a sessão.
Era meia noite e 25 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Proposta de lei
Do Sr. Ministro dos Estrangeiros, aprovando, para ser ratificado, o acordo internacional para a criação em Paris, duma Repartição Internacional das Epizootias, assinado em 25 de Janeiro de 1924, entre Portugal e outras nações.
Para o "Diário do Governo".
Projectos de lei
Do Sr. Deputado Viriato da Fonseca, elevando o limite de idade, para o pôsto de general, dos coronéis das diferentes armas e do corpo do estado maior.
Para o "Diário do Governo".
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Dos Srs. Deputados Sá Cardoso, António Maria da Silva, Henrique Pires Monteiro, Álvaro de Castro e Lino Neto, criando um sêlo comemorativo da Independência de Portugal, cuja franquia será obrigatória com a ordinária em 10 e 11 de Abril, 30 do Novembro e 1 de Dezembro, nos anos do 1925 a 1940, inclusive.
Para o "Diário do Governo".
Pareceres
Da comissão de finanças, sôbre o n.° 562-A que autoriza a construção o exploração duma ponto que ligue as duas margens do rio Tejo, em frente de Lisboa.
Imprima-se.
Da comissão de colónias, sôbre o n.° 709-F, que autoriza o Govêrno a realizar um acordo com a Companhia Nacional de Navegação para o restabelecimento das carreiras regulares entre a metrópole o a província de Moçambique.
Para a comissão de finanças.
Da comissão do legislação civil e comercial, sôbre o n.° 539-A, que permite às associações do socorros mútuos o Misericórdias a adquirir os bons imóveis que caucionem os soas créditos, quando judicialmente se faça a sua venda.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de providência social, sôbre o n.º 539-A, permitindo às associações de socorros mútuos e Misericórdias a adquirir os boas imóveis que caucionem os seus créditos, quando judicialmente se faça a sua venda.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
OS REDACTORES:
Avelino de Almeida.
João Saraiva.