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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 74
EM 4 DE JUNHO DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos Srs.
Baltasar do Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. - Respondem à chamada 44 Srs. Deputados.
É lida a acta, que adiante se aprova com número regimental
Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. - O Sr. João Camoesas requere a discussão imediata do parecer n.º 626, autonomia do Hospital Escolar.
O Sr. Pedro Pita fala sôbre o modo de votar, dando explicações o Sr. Presidente.
É aprovado o requerimento, entrando o parecer em discussão.
Leia o Sr. Alberto Jordão, que formula dois requerimentos.
É pôsto à votação o primeiro dos requerimentos, para que o parecer seja retirado da discussão.
Falam sôbre o modo de votar os Srs. João Camoesas e Hermano de Medeiros.
O requerimento é rejeitado.
O segundo requerimento, considerado como moção, para que aparecer baixe à comissão de finanças, é admitido.
Ordem do dia.- O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva} manda para a Mesa uma proposta de lei sôbre construções navais, pedindo que o seu relatório seja publicado no "Diário do Governo"
Continua o debate sôbre o negócio urgente do Sr. Rodrigo Rodrigues referente à sua demissão de governador de Macau.
O Sr. Ministro das Colónias (Correia da Silva) prosegue nas considerações que iniciara na sessão da véspera, concluindo-as.
Usa da palavra para explicações o Sr. Vicente Ferreira.
Segue-se o Sr. Rodrigo Rodrigues.
Fica com a palavra reservada.
Antes de se encerrar a sessão.- O Sr. Alarques Loureiro trata da distribuição de dinheiro para melhoramentos locais.
Respondem os Srs. Presidente do Ministério (Vitorino Guimarães) e Ministro do Trabalho (Sampaio e Maia).
O Sr. Carvalho da Silva trata da questão dos tabacos, respondendo o Sr. Presidente do Ministério.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão.- Um projecto de lei, uma proposta de lei e um parecer.
Abertura da sessão, às 15 horas e 30 minutos.
Presentes à chamada, 44 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 67 Srs. Deputados.
Presentes à chamada:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite do Vasconcelos.
António Albino Marques do Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Vicente Ferreira.
Artur Rodrigues do Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
David Augusto Rodrigues.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Dinis de Carvalho.
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Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José do Amorim.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José da Conceituo Camoesas.
João do Ornelas da Silva.
João Pina do Morais Júnior.
José Cortes dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
José do Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel do Sousa Dias Júnior.
Maximino de Matias.
Paulo Limpo do Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Abranches Ferrão.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António Mendonça.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constando de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gumes.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mariano Martins.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Albino Pinto da Fonseca.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo da Silva Castro.
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Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Resende.
António de Sousa Maia.
Artur de Morais Carvalho.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Ernesto Carneiro Franco.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Aguas.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Jorge Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião de Herédia.
Tomé José de Barros Queiroz.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Às 16 horas e 18 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 44 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 10 horas e 30 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
Dos funcionários da Câmara de Valongo, pedindo a aprovação do projecto que os equipara aos do Ministério do Interior.
Para a Secretaria.
Dos empregados da Câmara Municipal de Arraiolos, pedindo a aprovação do projecto de lei publicado 110 Diário do Govêrno n.° 105.
Para a Secretaria.
Do professorado dos concelhos de Pombal e de Sabugal, protestando contra o decreto n.° 10:776.
Para a Secretaria.
Antes da ordem do dia
O Sr. João Camoesas: - Sr. Presidente: pedi a palavra, porque está pendente da apreciação desta Câmara, há muito tempo, um projecto de lei que tem os pareceres das respectivas comissões, e que constitui o parecer n.° 626, que estabelece a autonomia do Hospital Escolar.
Trata-se de uma medida indispensável à melhor eficácia do ensino módico em Lisboa, e por isso requeiro a V. Exa. a discussão imediata do referido parecer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:-Vai votar-se.
O Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: eu creio que o parecer da comissão de finanças diz que êsse projecto traz aumento de despesa. Desejava, pois, que V. Exa. me dissesse se, nos termos da lei travão, êle poderá ser discutido.
Acresce ainda que não está presente o Sr. Ministro das Finanças, e? por isso,
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parece-me que tal parecer não poderá ser agora apreciado pela Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - As observações do Sr. Pedro Pita parece-me que não tem, nos to momento, inteira oportunidade, porque a proposta, alem do ser perfilhada pelos Srs. Ministro da Instrução o do Trabalho, tem a data de 5 de Junho do 1923, e, por conseguinte, é muito anterior à apresentação do Orçamento.
Nestas condições, o tendo a Mesa dúvidas sôbre a aplicação da lei travão à discussão dêste parecer, só pode resolver essa duvida pondo o requerimento à votação da Câmara.
S. Exa. não reviu.
O Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar): - Eu ainda chamei a atenção do V. Exa. para o facto de não estar presente o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente: - Regimentalmente, hasta que esteja presente um dos Srs. Ministros para que a proposta possa ser discutida.
Vai votar-se, portanto, o requerimento do Sr. João Camoesas.
S. Exa. não reviu.
Foi rejeitado.
O Sr. João Camoesas: - Requeiro a contraprova.
Feita, a contraprova, foi o requerimento aprovado.
Leu-se na Mesa e foi pôsto em discussão o parecer n.° 626 à proposta de lei n.° 577-B.
Parecer n.° 626
Senhores Deputados. - A vossa comissão de saúde e assistência pública, tendo examinado a proposta de lei n.° 577-B, é de parecer que ela merece a vossa aprovação.
Trata só nesta proposta de libertar o Hospital Escolar da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa da tutela da Direcção Geral dos Hospitais Civis, libertação esta que é justificada pela necessidade de uma administração que funcione em perfeita harmonia com a sua direcção técnica.
Por decreto de 13 de Setembro de 1910 foi o Hospital de Santa Marta cedido à
Faculdade de Medicina mas a respectiva regulamentação nunca chegou a ser publicada e o hospital, pertença da Faculdade, é administrado pela Direcção Geral dos Hospitais Civis.
Publicado o decreto de 27 do Março do 1911 que fixa o seu quadro do pessoal clínico, técnico e administrativo, a dependência administrativa mantém-se, se bem que a título provisório.
Posteriormente o decreto n,° 4:563, de 12 do Julho de 1918, em seus artigos 158,° e 159.° determina que o hospital se torno administrativamente autónomo logo que a Faculdade organize os respectivos serviços, mas impõe que o regime deve ser fixado em diploma legal. E essa providência que ora só toma com a presente proposta de lei.- João Camoesas - F. Dinis de Carvalho - Alberto Cruz - João José Luis Damas - José de Magalhães (com restrições).
Senhores Deputados. - À vossa comissão de instrução superior concorda inteiramente com a autonomia administrativa do Hospital Escolar. As vantagens, para o ensino, desta descentralização são de tal modo evidentes que não necessitam ser expostas e encarecidas. Por isso esta comissão vos recomenda a aprovação da respectiva proposta de lei.
Sala das sessões da comissão, 24 do Março de 1924,- Henrique Pires Monteiro - João Camoesas - Alberto da Rocha Saraiva - Manuel de Sousa Coutinho - Vitorino Guimarães, relator.
Senhores Deputados. - Veio à apreciação da comissão de finanças a proposta de lei concedendo autonomia administrativa ao Hospital Escolar de Lisboa, já acompanhada de pareceres elaborados pela comissão de saúde e assistência pública o pela comissão de instrução superior desta Câmara. A concordância destas duas comissões com a doutrina que servo do base à proposta dispensa a comissão do finanças de qualquer apreciação geral da matéria.
E, porém, seu dever manifestar-se sôbre as disposições propostas particularmente quando não se harmonizem inteiramente com a lei constitucional ou envolvam modificação, por mínima que seja, nas despesas do Estado.
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Seguindo os artigos da proposta por sua ordem, entendo esta comissão que o sub-director, a que se refere o artigo 7.°, devera ser um professor ordinário ou primeiro assistente, e não qualquer assistente. As leis vigentes sôbre constituição do pessoal docente universitário separam profundamente as duas categorias de assistentes, primeiros e segundos, aproximando aos primeiros, por categoria, funções e exigências no recrutamento, dos professores ordinários, e relegando os segundos assistentes para uma função do simples auxiliares do ensino. Basta pensar em que os segundos assistentes são nomeados anualmente, precedendo simples concurso documental.
A comissão julga ainda que devo adicionar um parágrafo ao artigo 7.° da proposta, estabelecendo o modo como podem ser substituídos o director e o subdirector, quando ambos tenham impedimento do exercício das respectivas funções. E isso possível, mesmo fora do caso de uma demissão a ambos concedida. Basta pensar em que, um e outro, podem ser simultaneamente afastados de Lisboa para comparecerem num congresso scientífico ou profissional.
Nestes casos, julga a comissão que o professor ordinário mais antigo, que seja director de serviço no Hospital Escolar, deverá assumir provisoriamente as funções de director do mesmo hospital.
Entende a comissão que deve ser alterada a redacção do artigo 9.° Não é necessário justificar o princípio de dever ser feita pelo Govêrno a nomeação do conselho administrativo do hospital, obrigando, no emtanto, essa nomeação a sancionar a escolha feita pelo Conselho da Faculdade de Medicina. Quanto a fiscalização e inspecção, pode o Govêrno fazê-la sempre que entenda, pelos meios gorais ao seu alcance, tornando-se, portanto, desnecessárias disposições constantes dos artigos 12.° e 15.°
Nota a comissão que se não arbitram vencimentos aos vogais do conselho administrativo.
Entende, porém, que devo manter-se, fazendo no projecto de lei a devida referência à gratificação que já aufere o director do hospital pelo disposto no decreto n.° 4:724, de 12 de Agosto de 1918, e que monta a 800$ anuais, sem subvenção,
pois que o mesmo funcionário recebe a que lho compete pela sua função de professor.
Quanto ao sub-director, atendendo a que o seu serviço se não resume a substituir o director nas suas faltas, mas trabalha permanentemente como vogal do conselho administrativo, pensa a comissão que lho pode ser atribuída uma gratificação anual de 500$, ou seja aproximadamente uma equivalência do dois terços em relação à gratificação que recebo o director.
Também nenhuma subvenção incidirá sôbre aquela quantia, visto que o sub-director, ou seja professor ordinário ou seja primeiro assistente, terá a subvenção que lhe compete pelo lugar que exerço entro o pessoal docente. Dos vencimentos do administrador tratar se há num outro artigo.
A comissão de finanças não pode concordar com várias disposições contidas no artigo 11.° o seus números. O n.° 2.° representaria, se fôsse aprovado, uma transferência do poderes do Parlamento para outra autoridade, transferência que ao mesmo Parlamento não é constitucionalmente permitida.
A fixação do quadros, vencimentos o regalias do pessoal só pode ser feita pelo Poder Legislativo e devo sê-lo na presente lei.
Também esta comissão propõe leves alterações aos n.ºs 3.° e 4.°, com o fim de tornar mais clara a sua redacção.
Também a comissão propõe uma pequena alteração à redacção do artigo 15.°, por forma a dar faculdade de admitir pessoal feminino, não só técnico e auxiliar, mas também administrativo.
A matéria do artigo 17.° não é acoita por esta comissão, em vista das razoes expostas na crítica feita ao artigo 11.°
É necessário que sejam fixados nesta proposta do lei os quadros, regalias e vencimentos de todo o pessoal.
Do pessoal médico, laboratorial o farmacêutico, já reza o artigo 11.°
Vejamos agora o restante.
Quanto a pessoal técnico, por informações colhidas na Direcção do Hospital Escolar, julga esta comissão que êle deve ser aumentado com quatro praticantes o seis serventes.
Vem esta necessidade, não de um ex-
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cesso de trabalhos que se preveja pela execução da organização que agora he propõe, mas da criação o desenvolvimento, já realizados, de vários serviços hospitalares.
A comissão não hesita em propor êsse pequeno aumento de despesa, para que possam ter regular funcionamento não só os serviços que mais particularmente interessam o ensino, mas foi principalmente os de saúde e assistência pública.
Praticantes e serventes tem actualmente o vencimento mensal de 308j$7G, compreendendo subvenções.
Quanto ao pessoal administrativo, não sofro dúvida de que é necessário reorganizar a secretaria, por forma a poderem efectuar-se os serviços de contabilidade e outros inerentes à autonomia que só concede.
Para que essa reorganização não pese nas contas do Estado entendo esta comissão que sejam chamados a prestar serviço no Hospital Escolar, funcionários do Estado, transferidos doutros serviços públicos que os tenham em excesso.
Deduzidos êstes pequenos aumentos, o pessoal técnico e administrativo do Hospital Escolar liça sendo o que já existe e foi lixado no citado decreto n.° 4:724, de 12 de Agosto de 1918.
Somente no projecto de lei que esta comissão apresenta se dão os títulos do primeiros, segundos e terceiros oficiais aos primeiros, segundos e terceiros escriturários, de que fala aquele decreto.
Também o escriturário fiscal passa a denominar-se simplesmente fiscal, e a ter os vencimentos do um primeiro oficial.
Quis-se por esta forma aproximar a organização do Hospital Escolar da que vigora nos hospitais civis, embora isso represente um aumento de despesa.
Mas separar um serviço de outro com que vivia ligado, concedendo-lhe autonomia, não pode na verdade fazer-se som aumento de despesa.
Pelo facto da autonomia, criam-se ou desenvolvem-se serviços.
A comissão de finanças julga porém que reduziu a um mínimo aquele aumento inevitável.
Entende também a comissão que devo alterar o artigo 18.° da proposta, tendo em vista as dificuldades financeiras com que luta a Direcção dos Hospitais Civis de Lisboa.
Assim, mantendo no Hospital Escolar a faculdade de utilizar vários serviços daqueles hospitais, emquanto não possua instalações próprias, estabelece que êsses serviços sejam pagos pelo seu valor sem atraso
Outras pequenas alterações e adicionamentos foram feitos que não merecem justificação especial.
Assim é o do começar a presente lei a vigorar, na parte referente a fornecimentos directos, no princípio do ano económico.
O contrário traria graves dificuldades de que se ressentiriam os serviços de assistência.
A comissão de finanças submete pois à aprovação da Câmara o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° O artigo 1.° da proposta.
Art. 2.° O artigo 2.° da proposta.
Art. 3.° O artigo 3.º da proposta.
Art. 4.° O artigo 4.º da proposta,
Art. 5.° O artigo 5.° da proposta.
Art. 6.° O artigo 6.° da proposta.
Art. 7.° A representação do Hospital Escolar - autónomo e com personalidade jurídica própria e independente - compete a um director (professor ordinário da Faculdade do Medicina de Lisboa) o nas suas faltas o impedimentos a um sub-director (professor ordinário ou primeiro assistente da mesma Faculdade).
§ único. Na falta simultânea do director o do sub-director, substituí-los há o professor ordinário mais antigo que seja director de serviço no Hospital Escolar.
Art. 8.° O artigo 8.° da proposta,
Art. 9.° O director, o sub-director e o administrador serão nomeados pelo Govêrno, sob proposta do Conselho da Faculdade de Medicina do Lisboa.
Art. 10.° O director receberá a gratificação que lhe é fixada no decreto n.º 4:724, de 12 de Agosto do 1918; o sub-director a gratificação anual de 500$.
Art. 11.° Na falta ou impedimento do administrador, substituí-lo há um funcionário do Hospital Escolar, escolhido pelo Conselho Administrativo.
Art. 12.° Compete ao Conselho Administrativo:
1) Exercer todos os actos de administração geral, inerentes ao objecto da ins-
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tituição, nos termos do Regulamento Geral do Hospital Escolar;
2) Nomear o pessoal dentro dos quadros fixados pelo decreto n.° 4:7:24, do 12 de Agosto de 1918, o artigos da presente lei, preenchendo imediatamente as vagas quando a continuação destas prejudique os serviços de ensino e de assistência hospitalar, exceptuando o que respeite ao pessoal médico, laboratorial e farmacêutico, que só poderá ser nomeado nos termos da lei do ensino médico e do Regulamento da Faculdade de Medicina de Lisboa;
3) Fixar anualmente os serviços, número do doentes para cada um deles, sua organização, classes de enfermos hospitalizados, pensões a sobrar de doentes, tabelas de preços da policlínica ou de quaisquer outros serviços que venham a ser remunerados;
4) Determinar por regulamento especial as regalias que devam ser concedidas aos protectores do Hospital Escolar;
5) Publicar anualmente as estatísticas médica e administrativa do Hospital Escolar.
Art. 13.° O artigo 14.° da proposta.
Art. 14.° O pessoal técnico, administrativo e auxiliar do Hospital Escolar, tanto ordinário, como extraordinário, será feminino e masculino, segundo fôr determinado pelo Conselho Administrativo.
Art. 15.° O artigo 16.° da proposta.
Art. 16.° O quadro do pessoal técnico e auxiliar de Hospital Escolar será o fixado no decreto n.° 4:724, de 12 de Agosto de 1918, aumentado de quatro praticantes e seis serventes.
Art. 17.° A secretaria do Hospital Escolar será constituída por um cheio de repartição, que será o administrador vogal do Conselho Administrativo o exercerá--também as funções de tesoureiro, e por um primeiro oficial, dois segundos oficiais, três terceiros oficiais o três dactilógrafas.
§ 1.° Os actuais primeiro, segundo e terceiro escriturários da administração do Hospital Escolar passarão respectivamente e segundo a sua categoria a primeiro, segundo e terceiro oficial.
§ 2 ° O preenchimento das primeiras vagas do pessoal de secretaria do Hospital Escolar será feito por transferencia de funcionários vindos de serviço público,
onde haja pessoal em excesso, tendo em couta as habilitações para serviços de contabilidade.
Art. 18.° O lugar de fiscal do Hospital Escolar será exercido em comissão por um enfermeiro chefe ou sub-chefe, que será equiparado, pelo que respeita a vencimentos e em quanto desempenho as funções, a primeiro oficial, e terá habitação no hospital.
Art. 19.° Emquanto o Hospital Escolar não possuir economato, lavandaria e serviço de transportes privativos, poderá recorrer ao economato, laboratório central de farmácia, lavandaria o serviços do transportes dos Hospitais Civis de Lisboa e da Provedoria Central na Assistência e estabelecimentos desta dependentes, devendo o pagamento dos objectos requisitados aos Hospitais Civis e serviços prestados por estos ser feito à Direcção dos mesmos Hospitais, seguidamente à entrega dos objectos ou prestação dos serviços.
Art. 20.° Ao pessoal de farmácia, de enfermagem e auxiliar pertencente aos quadros dos hospitais civis e que tenha optado pelo quadro privativo do Hospital Escolar, serão mantidos neste último quadro todos os direitos adquiridos como funcionários hospitaleiros.
Art. 21.° Os melhoramentos e obras de conservação e reparações nos edifícios hospitalares ou saa^ dependências, e bom assim quaisquer novas construções, serão orientados por uma cornbsfio nomeada pelo Ministro da Instrução, sob proposta do Conselho da Faculdade do Medicina de Lisboa, e presidida pelo director do Hospital.
Art. 22.° Os inválidos incuráveis que estejam ou venham do futuro a estar internados no Hospital Escolar serão transferidos para asilos a cargo da Provedoria Central da Assistência, a qual deverá admiti-los nesses estabelecimentos do preferência a quaisquer outros indigentes, a fim do que não estejam ocupando no Hospital Escolar camas a que só têm direito doentes curáveis.
Art. 23.° O artigo 23.° da proposta.
Art. 24.° O artigo 24.° da proposta.
Art. 25.° O artigo 25.° ria proposta.
Art. 26.° O artigo 26.° da proposta.
Art. 27.° Esta lei entra imediatamente em vigor, excepto no respeitante a forne-
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cimentes directos que principiarão a fazer-se no começo do ano económico, mantendo-se até essa data a situação actual.
Art. 28.° Fica revogada a legislação em contrário. - Vergílio finque - Constando de Oliveira - Jorge Nunes - Carlos Pereira (com restrições) - Amadeu Vasconcelos - Crispiniano da Fonseca - Lourenço Correia Gomes - Jaime de Sousa - M. Ferreira de Mira, relator.
Proposta de lei n.º 577-B
Senhores Deputados, - Considerando que o Hospital Escolar -Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade do Lisboa, correntemente designado por Hospital do Santa Marta - foi adaptado e em parte construído pela administração dos Hospitais Civis, sendo enfermeiro-mór o professor Curry Cabral;
Considerando que em 22 do Setembro do 1910 foi publicado o decreto de 13
do mesmo mês o ano, mandando entregar à Escola Médico-Cirurgica o hospital que, por êsse decreto, era designado como Hospital Hintze Ribeiro o destinado às clínicas escolares gerais e especiais. Publicado êsse decreto, o Hospital foi entregue pelo enfermeiro-mór ao director da Escola, o professor José Joaquim da Silva Amado o lavrado o termo de posso que ficou arquivado na administração dos Hospitais Civis;
Considerando que o decreto de 13 dá Setembro do 1910 determinava que o Govêrno publicasse os regulamentos necessários ao funcionamento do Hospital Escolar dada a reconhecida necessidade do independência em relação aos outros hospitais e o fim especial a que era destinado. Duas semanas depois era proclamada a República, e em poucos meses era reformado o ensino médico o criada a Faculdade de Medicina de Lisboa;
Considerando que, em 21 de Março de 1911, foi publicado o quadro provisório do pessoal clínico, técnico e administrativo do Hospital Escolar, mantendo-se a situação provisória do dependência administrativa em relação aos Hospitais Civis;
Considerando que, em 12 do Julho do 1918. foi publicado o decreto n.° 4:563, reorganizando os serviços nos Hospitais Civis de Lisboa e o artigo 108.° do referido decreto consigna as seguintes disposições:
"Artigo 158.° O Hospital Escolar e ...
....ficarão, provisòriamente, no mesmo regime fim que se encontra o Manicómio Bombarda, mantendo com os Hospitais Civis de Lisboa as mesmas relações que esto tem mantido até agora. Logo, porém, que para a Faculdade do Medicina só organizem serviços administrativos autonomos, e Manicómio Bombarda, o Hospital Escolar .......
.... e qualquer outro instituto clínico da Faculdade, considerar-se hão, para todos os efeitos, submetidos à nova organização criada.
Art. 159.° Pura a execução do regime a que só refere o artigo anterior deverá ser fixado, em diploma legal, o quadro de todo o pessoal do Hospital Escolar, o qual só considerará privativo do mesmo instituto o subordinado ao respectivo director":
Tenho a honra de apresentar à vossa apreciação a seguinte proposta do lei:
Artigo 1.° É concedida autonomia administrativa ao Hospital Escolar (Hospital das clínicas gerais o especiais da Faculdade do Medicina da Universidade do Lisboa).
Art. 2.° O Hospital Escolar é instalado no Hospital do Santa Marta o suas dependências presentes ou futuras.
Art. 3.° O Hospital Escolar, que se regerá pelo presente diploma e pelos seus regulamentos especiais, é uma instituição de assistência, destinada:
1.° A centro de ensino o produção scientífica;
2.° A hospitalização do doentes indigentes o pensionistas.
Art. 4.° No Hospital Escolar haverá, além das clíninas gerais o especiais, determinadas pelo regulamento da Faculdade do Medicina:
1.° O pressectorado do anatomia patológica;
2.° O serviço de raios X;
3.° O serviço de agentes físicos;
4.° As clínicas escolares centrais.
§ único. Sob proposta do director do Hospital Escolar, ou por sua iniciativa,
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poderá o Conselho da Faculdade de Medicina suprimir ou criar clínicas gerais çu especiais, consoante as necessidades do ensino e da assistência hospitalar.
Art. 5.° O Hospital Escolar manterá um internato para alunas enfermeiras e organizará um curso do enfermagem para os dois sexos.
Art. 6.° Constituem receita do Hospital Escolar:
1.° A verba consignada no orçamento do Ministério do Trabalho e correspondente aos serviços de assistência prestados;
2.° A verba consignada no orçamento do Ministério da Instrução Pública o destinada aos serviços docentes;
3.° As pensões dos doentes hospitalizados:
4.° Os rendimentos da policlínica, dos laboratórios e de quaisquer publicações;
5.° As subvenções, donativos, cotas de protectores, heranças ou legados o quaisquer outras receitas que lho sejam criadas.
§ único. As doações, heranças ou legados, a favor do Hospital Escolar, terão a aplicação determinada pelos respectivos bemfeitores, desde que não contrariem as disposições regulamentares e legais.
Art. 7.° A representação do Hospital Escolar autónomo o como personalidade jurídica própria o independente, compete a um director (professor da Faculdade de Medicina), e nas suas faltas o impedimento, a um sub-director (professor ou assistente da Faculdade de Medicina).
Art. 8.° A administração do Hospital Escolar é confiada a um conselho administrativo, composto:
a) Do director, a quem compete o governo técnico sanitário do Hospital;
b) Do sub-director, que substituirá o director nos seus impedimentos;
c) Do administrador, que será o delegado do conselho para a representação e gerência administrativa, consoante as deliberações do conselho administrativo.
Art. 9.° A nomeação do director, do sub-director e do administrador compete ao Conselho da Faculdade de Medicina.
Art. 10.° Nos seus impedimentos serão os vogais do conselho administrativo substituídos por outros funcionários do Hospital Escolar, escolhidos pelo próprio conselho.
Art. 11.° Compete ao conselho administrativo:
1.° Exercer todos os actos de administração geral inerentes ao objecto da instituição, nos termos do regulamento geral do Hospital Escolar;
2.° Nomear ou despedir o pessoal, fixando-lho os quadros, regalias e vencimentos, com excepção do pessoal médico, laboratorial e farmacêutico, que só poderá ser nomeado nos termos da lei do ensino médico o do regulamento da Faculdade de Medicina de Lisboa;
3.° Fixar anualmente os serviços, sua população, organização e número, e as classes dos enfermos hospitalizados, as pensões a cobrar dos hospitalizados e as tabelas de preços da policlínica ou quaisquer outros serviços que venham a ser remunerados;
4.° Determinar os direitos dos protectores do Hospital Escolar, que fixarão em regulamento especial;
5.° Publicar anualmente as estatísticas médica e administrativa do Hospital Escolar.
Art. 12.° A fiscalização do Hospital Escolar é confiada à comissão administrativa da Faculdade de Medicina.
Art. 13.° A inspecção superior do Hospital Escolar é exercida pelo Govêrno, por intermédio do reitor da Universidade.
Art. 14.° O pessoal do Hospital Escolar é composto de:
a) Pessoal médico nomeado nos termos da lei do ensino médico e regulamentos da Faculdade de Medicina de Lisboa e do Hospital Escolar;
b) Pessoal técnico, administrativo o auxiliar, ordinário e extraordinário.
Art. 15.° O pessoal técnico e auxiliar do Hospital Escolar ordinário o extraordinário será feminino e masculino, segundo fôr determinado pelo conselho administrativo.
§ 1.° O pessoal extraordinário tem funções temporárias e não adquire o direito de ficar pertencendo aos quadros permanentes do pessoal ordinário e não tem direito à reforma.
§ 2.° O pessoal ordinário tem direito à reforma.
Art. 16.° O conselho administrativo do Hospital Escolar instituirá missões de estudo no estrangeiro para o pessoal mó-
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dico e promoverá estágios em hospitais estrangeiros.
Art. 17.° O Govêrno, pelo Ministro aã Instrução Pública e ouvido o Ministro do Trabalho, publicará anualmente, no mês de Dezembro para o ano económico seguinte, sob proposta da Faculdade do Medicina, elaborada pelo conselho administrativo do Hospital Escolar:
1.° O quadro dos serviços do Hospital Esfolar;
2.° O quadro do pessoal ordinário, técnico, administrativo e auxiliar;
3.° A tabela dos vencimentos do pessoal ordinário;
4.° A verba destinada ao pessoal extraordinário.
Art. 18.° Até que os serviços do Hospital Escolar adquiram desenvolvimento que justifique a criação de economato, lavandaria e serviço de transportes privativos, tem o conselho administrativo do Hospital Escolar o direito de utilizar os economatos, o laboratório central da farmácia e lavandarias dos Hospitais Civis 6 da Provedoria Central da Assistência, o também os serviços de transportes das mesmas instituições, mediante o pagamento das verbas prèviamente fixadas por acordo com as direcções respectivas.
Art. 19.° Ao pessoal de farmácia, de enfermagem e auxiliar pertencente aos quadros dos hospitais civis e que opte pelo quadro privativo do Hospital Escolar serão mantidos todos os direitos adquiridos como funcionários hospitalares.
Art. 20.º Provisoriamente e até publicação da tabela indicada no artigo 17.°, n.º 3.°, o pessoal do Hospital Escolar tem os vencimentos e subvenções do pessoal da mesma categoria dos quadros dos hospitais civis.
Art. 21.° Os melhoramentos e obras de conservação e reparações nos edifícios hospitalares ou suas dependências, e bem assim quaisquer novas construções que se tornem necessárias, serão de rígidos por uma comissão nomeada pelo Ministro da Instrução, sob proposta da Faculdade de Medicina, tendo como presidente o director do Hospital.
Art. 22.° Os inválidos incuráveis que estejam ou venham do futuro a estar internados no Hospital Escolar serão transferidos para asilos A cargo da Provedoria Central da Assistência de Lisboa, a qual
deverá admiti-los nesses estabelecimentos de proterência a quaisquer outros indigentes, a fim de que não estejam ocupando no Hospital Escolar camas a que só têm direito doentes próprios para ensino.
Art. 23.° Se qualquer funcionário dos serviços módicos, empregados de enfermagem ou auxiliar incluídos nesta organização, fôr, no exercício das suas funções hospitalares, vítima de acidente de que resulte incapacidade ou a morte, dará êsse facto lugar às pensões estabelecidas no artigo 5.° da lei n.° 83, de 24 do Julho de 1913, tendo-se em conta as domais disposições em vigor sôbre esta matéria.
Art. 24.° Todos os empregados de serventia vitalícia do Hospital Escolar terão direito à sua aposentação nos termos do decreto n.° 1 de 17 de Julho de 1886 e da lei n.° 403, de 31 de Agosto de 1915.
Art. 25.° O Hospital Escolar é - como os hospitais civis - dispensado dos encargos fixados no artigo 21.º do decreto-lei de 25 de Maio de 1911.
Art. 26.° O Hospital Escolar é - como os hospitais chis - isento de preparos, custas e selos nos processos em que intervier ou fôr parte.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 5 de Junho de 1923. - João José da Conceição Camoesas - Alberto da Cunha Rocha Saraiva.
O Sr. Alberto Jordão: - Sr. Presidente: requereu o Sr. João Camoesas que se discutisse antes da ordem do dia de hoje o parecer n.° 620.
Este parecer, Sr. Presidente, foi dado a propósito da proposta de lei n.º 577-B, da autoria dos Srs. João Camoesas e Rocha Saraiva.
Vem ousa proposta de lei de 5 de Junho de 1923.
E, Sr. Presidente, uma proposta já antiga, e que, quási pode dizer-se, estava em condições do se encontrar poeirenta e até bolorenta.
Trata-se de uma proposta de alcance, de importância e de valor, encarada ela nas suas linhas gerais, e, até mesmo, no seu dessous. Mas, mesmo porque assim é, e porque não só trata, afinal, do uma questão simples e banalíssima, como tantas outras que, antes da ordem do dia, os
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Srs. Deputados da maioria costumam para aí fazer passar ou, melhor, impingir, justamente, por isso, repito, é que me parece que o Sr. João Camoesas não fez bem em apresentar o sou requerimento.
Não se tratando duma dessas questões banais, a que já fiz referência, nas quais nós nos damos por habilitados para fazer considerações e comentários, sem que se chegue a qualquer conclusão; não se tratando de uma das tais questões, mas dêm assunto momentoso, o caso é absolutamente diverso e exigia que o Sr. João Camoesas, que demonstrou afinal uma boa vontade, pelo que é digno de aplauso, para se discutir êste assunto, empregando os esfôrços necessários para que a discussão do projecto de lei fôsse marcada para qualquer dia, que não hoje. Para amanhã, por exemplo.
Então os Srs. Deputados, e entre êles eu, que somos leigos em determinados assuntos que constam do parecer, viriam habilitados com certos conhecimentos, para sôbre esta questão momentosa poderem apresentar os seus pontos de vista, que, embora divergissem do critério que consta do parecer, entretanto seriam elementos de discussão para se chegar possivelmente ao aperfeiçoamento ou a conclusões diversas.
Trata-se de conceder autonomia administrativa ao Hospital Escolar de Santa Marta.
Basta o simples enunciado do artigo 1.° do parecer para se ver imediatamente como estamos em face dam assunto de gravidade.
Trata-se, dentro de moldes absolutamente diversos daqueles que existem, do modificar o modus vivendi dum estabelecimento hospitalar importante.
Por isso não se deve discutir sôbre o joelho um assunto desta natureza, assunto que contende com organizações vigentes, organizações que têm a sua tradição no nosso meio social.
O Sr. Carlos Olavo: - Mas êste parecer está incluído na ordem do dia há muito tempo.
O Orador:-Devo dizer, em resposta ao àparte do Sr. Carlos Olavo, que na ordem do dia não encontrei êsse projecto de lei.
De maneira que eu não estou em condições de discutir com conhecimento perfeito êste assunto.
Vamos a ver se na próxima sessão estamos habilitados a examinar o assunto com consciência, em vez de o fazer de afogadilho, como sucederia agora. Isto é um mau sistema, quando se trata, não de uma questão simples, mas momentosa.
Nem à face dos princípios apresentados pela Presidência nós podemos continuar a discutir o assunto.
O próprio Sr. Ministro do Trabalho, o único representante do Ministério que se encontra presente, votou contra, o que até certo ponto mostra não estar habilitado a acompanhar a discussão.
O Sr. Carlos Olavo: - O Sr. Ministro do Trabalho tem de estar habilitado.
O Orador: - Eu não faço essa injúria ao Sr. Ministro, mas S. Exa. votou contrariamente, o que indica até certo ponto que entende que não deve discutir-se agora, não considera oportuno.
O Sr. Carlos Olavo: - V. Exa. não pode sustentar êsse princípio, pois o projecto tem parecer das comissões e há muito tempo que tem toda a oportunidade.
O Orador: - Eu já há pouco respondi a V. Exa. que os Deputados têm de ler e estudar os assuntos dados para ordem do dia.
O Sr. Carlos Olavo: - Se V. Exa. não tem outros argumentos, francamente ...
O Orador : - O que é indispensável é que haja algum Ministro que acompanhe a discussão.
Êste projecto vem já de 1923, e até hoje já muitas alterações tem havido, e mesmo portas a dentro da Faculdade a orientação se tem modificado.
E preciso saber o que pensa o Sr. Ministro da Justiça.
Não é injúria nenhuma para qualquer membro do Poder Executivo o precisar estudar qualquer assunto, isso não significa senão que o Ministro não deseja entrar em qualquer debate sem o estudar bem, isto é, em todas as minúcias.
As razões que apresento são de pró-
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testo, pois êle traz aumento de despesa, mas como V. Exa. teve dúvidas, foi o caso submetido à aprovação da Câmara, que pelos votos da maioria entendeu que podia ser discutido, deliberação esta com que não concordo, e nesses termos marido para o Mesa dois requerimentos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Requerimentos
Requeiro que o projecto seja retirado da discussão até que estejam presentes os Srs. Ministros das Finanças o da instrução.
4 de Junho de 1925. - Alberto Jordão,
Rejeitado.
Requeiro que o projecto em discussão baixe novamente à comissão do finanças.
4 de Junho de 3920.- Alberto Jordão.
Admitido.
O Sr. Presidente: - O Sr. Alberto Jordão mostrou estranheza pelo facto de a Mesa ter dado para discussão a proposta assinada pelo Sr. Ministro da Instrução.
A sua estranheza provém do Sr. Ministro do Trabalho ter votado contra o requerimento para ser imediatamente discutida essa proposto.
A Mesa nesta matéria não toro senão que cumprir o artigo 35.° do Regimento.
Foi isto que fez.
O parecer foi dado para discussão; e eu só tenho que acatar a resolução da Câmara.
Desde que foi aprovado o requerimento, a Mesa não podia deixar de pôr à discussão a proposta.
S. Exa. mandou para a Mesa dois requerimentos.
Vou pôr o primeiro requerimento do Sr. Alberto Jordão à votação da Câmara.
S. Exa. não reviu.
O Sr. João Camoesas: - Peço a palavra sôbre o modo de votar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. João Camoesas.
O Sr. João Camoesas: - Sr. Presidente: entendo que a Câmara não devo votar o requerimccto do Sr. Alberto Jordão, salvo o devido respeito por S. Exa., porque o requerimento é, apenas, um expediente dilatório da discussão.
Apoiados.
Não tem explicação possível (Apoiados} porquanto o próprio Sr. Alberto Jordão confessa que essa proposta, que data do-1923, já devia estar carregada do pó, até, bolorenta.
Foram estas as expressões de S. Exa.
Por outro lado o parecer tem mais de um ano, tendo estado já inscrito para, ordem do dia antes do interregno parlamentar, não devendo, por consequência... nenhum Sr. Deputado alegar falta do tempo para o conhecimento indispensável para a completa discussão do assunto.
Quanto à não comparência do Sr. Ministro das Finanças, estando presente o Sr. Ministro do Trabalho, por cuja pasta corro êste assunto, ela não ter razão de ser.
Por êstes motivos, repito, não pode ser votado o, requerimento do Sr. Alberto Jordão. E apenas uma maneira de dilatar a discussão, que não devo ser demorada por mais tempo, visto tratar-se dum serviço que interessa ao ensino da Faculdade de Medicina do Lisboa, o que suponho ser assunto importante para o País.
O Sr. Alberto Jordão: - Era para ver se me hábil, cava para amanhã poder fazer a discussão.
O Orador: - V. Exa. não se habilitou, durante um ano, quanto mais num dia.
O orador não reviu.
O Sr. Hermano de Medeiros: - Uma das razões determinantes do meu voto é uma razão do lei.
A lei n.° 4:563 deve ser do conhecimento do Sr. João Camoesas.
Concordo com a desanexação do Hospital Escolar, mas não assim.
É preciso que seja completa; assim não a voto.
É bom terminante o § 2.° do artigo 1.° dêsse decreto.
Esta proposta tem de baixar, do facto, à comissão, o eu reforço o requerimento do meu ilustre colega Alberto Jordão.
V. Exa. é possível que desconheça o artigo 70.° dêsse mesmo diploma. Não levo isso a mal, porque V. Exa. é estu-
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dioso e presto-lhe a devida homenagem, mas não conhece esta lei. Mas há mais e melhor.
O Sr. João Camoesas: - Afinal V. Exa. está a discutir a proposta.
O Orador: - Estou apenas a justificar o meu modo de ver.
São todos os serviços.
E da lei. É lei do País, que não foi "derrogada.
Tenho dito.
O orador não reviu.
É pôsto à votação o requerimento do Sr. Alberto Jordão.
É rejeitado.
O Sr. Alberto Jordão: - Requeiro a contraprova, o invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contraprova, verificou-se estarem de pé 41 Sr s. Deputados e sentados 19, sendo, portanto, confirmada a rejeição.
O segundo requerimento, considerado como moção, é admitido.
ORDEM DO DIA
É aprovada a acta.
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): - Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de lei sôbre novas construções navais.
Esta proposta tem um relatório extenso, que a antecede.
Não farei portanto considerações sôbre ela; o relatório explica a proposta, dando-se ainda o facto de todos os ilustres membros desta Câmara terem dele conhecimento.
Limito-me, portanto, a mandar para a Mesa a proposta, e a pedir que o relatório seja publicado no Diário do Govêrno.
É aprovaria o requerimento.
Lida na Mesa, foi admitida e aprovada sem discussão.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão o negócio urgente do Sr. Rodrigo Rodrigues.
O Sr. Ministro das Colónias (Correia da Silva): - Sr. Presidente: eu tive ontem de interromper as minhas considerações estou procurar hoje terminá-las, sem abusar do tempo de que a Câmara tanto precisa para o debate que deseja iniciar.
Entre os assuntos vários de administração que me levaram a considerar indicado o exonerar o Sr. governador de Macau e que eu classifiquei como excessos de autoridade, erros de administração financeira e erros de ordem internacional, não posso deixar de referir um que ontem o meu cansaço não me permitiu citar.
É o referente à concessão do um exclusivo para corridas de cavalos, com a abertura de um crédito extraordinário e urgente na importância de 558:000 patacas, assunto êste que mereceu ao conselho colonial, no seu parecer, entre outras a seguinte consideração:
"... créditos extraordinários de aplicação imediata só podem ser utilizados para despesas não previstas de carácter excepcional o urgente (base citada, secção 2.a); e não há forma de só compreender que gastar 551:000 patacas - mais de 9:300 contos ao câmbio do dia - para expropriar prédios a fim de se obterem terrenos para futuras corridas do cavalos, seja uma despesa de tam excepcional e urgente carácter, que nem sequer haja tempo para o Govêrno central a aprovar ou rejeitar."
Êste acto foi reprovado pelo Govêrno da Metrópole.
Encontrou-se, porém, o Govêrno da metrópole com uma situação criada extremamente inconveniente.
Há no processo telegramas verdadeiramente severos do Ministro, que então era outro correligionário de S. Exa.: o Sr. Mariano Martins.
S. Exa. tem nesta Câmara um lugar e dirá, portanto, o que sôbre o assunto entender.
Estão também nesta casa do Parlamento representantes do conselho colonial e, se assim o entenderem, evidentemente que estão no seu pleníssimo direito de dizerem o que quiserem sôbre a questão.
Por mim, limito-me por agora a mencionar os numerosos factos, pelos quais cheguei à conclusão de que o Govêrno de Macau não estava nas mãos de que carecia.
Assuntos graves, tratados sem o suficiente estudo, também os posso mencionar.
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Pedidos para a Casa da Moeda para se reservarem 46 toneladas do prata e 16 de cobre para se fazer cunhagem de moeda no valor de 900 contos-ouro, que a província se comprometia a pagar imediatamente, isto som o estudo suficiente.
Isto é fácil de verificar pelo processo que ponho à disposição do V. Exas.
Ainda recentemente S. Exa. me comunicou que enviava ao Ministério do Comércio-o eu, por simples atenção pessoal anuí a que S. Exa. o enviasse - um ofício, não tendo eu deixado, todavia, de fazer-lhe notar a falta de elementos que havia para tal, em que pedia que quatro dos vapores dos Transportes Marítimos fôssem postos à disposição de Macau, à sombra de urna quantia de que a província se considerava credora.
E eu vi mais tardo que êsse crédito era apenas de 102.000$!
Há, com efeito, necessidade do uma carreira regular para o Oriente.
Mas era necessário atender primeiro que o fabrico de navios havia de exigir milhares de contos que a província não possui; segundo que não havia preparação alguma nem o estudo devido e somente conversas com oficiais da marinha mercante que serviam apenas para se julgar que o Ministro das Colónias procurava entravar o progresso da marinha mercante nacional e o estabelecimento do uma carreira normal para o Oriente quando o Ministro queria apenas que não houvesse irreflexões nem desperdícios.
O Sr. ex-governador de Macau é um patriota.
Estou certo disso.
E muitos dos seus erros não derivam senão do ter sonhos de patriota.
Mas com sonhos não se governa.
Governa-se é com a meticulosa observação dos problemas e com o absoluto respeito à lei.
Apoiados.
Sr. Presidente: não me alongarei em considerações sôbre outros, assuntos e entrarei na análise dos pontos capitais que respeitam ao problema do Pôrto e o internacional da colónia.
Permita a Câmara que eu faça um pouco de história, resumidamente de história antiga e mais detidamente de história contemporânea.
Ocupamos Macau desde meados do século XVI e Macau foi secularmente nos tempos antigos um porto de comércio aproveitado por nós para a penetração na China, porto que, durante muito tempo, até meados do século passado, teve, como exclusivo, esta função utilíssima.
Essa nossa ocupação em Macau - para que não confessá-lo? - afastou-se muito doutros processos de ocupação que nós usamos por êsse mundo.
Ao passo que por quási todo o mundo nós nos fizemos respeitar, nós dominámos, os portugueses em Macau viveram até meados do século passado numa situação verdadeiramente humilhante, mercadejando, por assim dizer, dia a dia, com submissões e atitudes de verdadeira miséria do carácter, os seus alimentos, sujeitando se a que, volta e meia, nos privassem de direitos, até que no regime constitucional se resolveu fazer sair a colónia desta situação verdadeiramente indigna e firmar nela a soberania pela forma como era própria de Portugal.
E foi para lá enviado um grande homem já herói, porque por ocasião da independência do Brasil se batera num combate em Itaparica em que uma bala lhe levara um braço e em que êle o atirara ao ar com um viva a Portugal!
Era Ferreira do Amaral, pai do almirante há poucos anos falecido.
Foi para Macau, o com a energia patriótica e com a verdadeira dignidade portuguesa, expulsou o que restava da autoridade chinesa e firmou a submissão de Macau a Portugal soberano.
Desde então, a posso de Macau, do facto, tem existido para Portugal.
Sob o ponto do vista diplomático aconteceu porém que a China nunca quis reconhecer o direito soberano a Portugal, até que em 1887 por uma convenção de negociações motivadas pela repressão do ópio, nós obtivemos um tratado com a China, em que, num dos seus artigos, a China reconhecia a posse do Macau o suas dependências por Portugal como qualquer outra possessão portuguesa.
Infelizmente porém não foi a nossa vitória diplomática até ao ponto, que tam conveniente seria, de se definirem as dependências de Macau, ficando êsse assunto para ser resolvido numa conferência de delimitações entre delegados de dois países.
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Portugal, Sr. Presidente, tem feito esfôrços tenazes para obter a realização dessa delimitação, porém a China, o país da diplomacia mais difícil de combater, tem resistido com uma tenacidade talvez ainda maior à nossa a que essa delimitação se faça.
Ao passo que nós, Sr. Presidente, afirmamos a nossa soberania sôbre determinados domínios, terrestres e marítimos, a China, por sua vez, contesta-nos êsse direito, o que tem dado lugar a conflitos, continuando por não se acordar, em vista de haver divergência de opiniões, sôbre quais os terrenos em que cada um dos países é soberano.
Não vejo inconveniente em dizer, embora eu seja um Ministro da República, e não o Vejo, porque em o dizer eu não perfilho de maneira alguma o errado critério dessa afirmação, quê a China declara que Portugal não tem direito a mais do que a uma pequena parcela dos territórios que são nossos, tendo chegado a sustentar que Macau, propriamente, é uma pequena porção da península que foi envolta outrora por uma muralha.
Na verdade, Sr. Presidente, essa opinião da China é mais do que inadmissível, pois a verdade é que Portugal tem direitos incontestáveis, provados pelo exercício da sua autoridade, pelos documentos dos seus arquivos, pelas construções dos seus edifícios, pelas suas obras em territórios mesmo fora da península, muito além dessa parcela a que a China se refere.
Esta, sim, esta é que é a opinião do Ministro!
Apoiados.
V. Exas. compreendem que com esta situação a situação de Macau torna-se por vezes difícil, e a sua administração por vezes de uma grande responsabilidade.
Até meados do século passado, como disse, a nossa colónia de Macau tinha o exclusivo de ser o porto comercial aberto à civilização ocidental; porém, em meados dêsse século, como V. Exas. sabem, a Inglaterra ocupou Hong-Kong, ilha servida por um magnífico porto, que estava destinado a ser, nas mãos dessa nação modelar em colonização e em comércio, um porto florescentíssimo, que em alguns anos, pelo seu movimento, se tem colocado no segundo lugar dos portos do mundo.
O Govêrno portuguêz viu desde logo o perigo que vinha para nós dêsse estabelecimento, razão por que um Ministro da Marinha e Ultramar, no tempo de D. Maria II, Joaquim José Falcão, ligou o seu nome a um decreto determinando o porto-franco de Macau, em três fundadores o interior, o da Taipa e o da Rada,
Era uma medida inteligente, com que se projectava dar condições de resistência à colónia, ante o perigo que surgia, porém não tendo o Govêrno português simultaneamente procurado atender às deficiências materiais do porto, ao pioramento até das suas condições naturais, não lhe foi possível resistir na luta, e o que é facto é que o porto de Macau foi decaindo sucessivamente, embora toda essa decadência, não fizesse morrer totalmente um comércio que tinha sido enorme e que, exclusivamente por motivo da situação geográfica da nossa colónia, foi até há pouco ainda de números avultadíssimos.
Portugal pensou já de há muito tempo em dar melhores condições a êsse porto, e por isso o problema das obras do porto de Macau é um problema bastante velho.
Já em 1884 foram realizados estudos, pelo engenheiro então mais proficiente da engenharia portuguesa, em matéria de portos, que era Adolfo Loureiro, que foi expressamente ao oriente estudar as obras do porto.
Infelizmente fizeram-se os estudos e nada mais; surgiram vários embaraços: o embaraço financeiro - porque a colónia não tinha dinheiro e a metrópole não podia dá-lo - e outros embaraços muitíssimo importantes de ordem diplomática,, porque, em virtude daquela falta de delimitação a que eu me referi há pouco, a China opunha sistematicamente o seu veto a qualquer empreendimento que Portugal tentasse.
E V. Exas. compreendem que não é das soluções mais fáceis um Govêrno duma nação fraca como é Portugal empreender um trabalho dessa ordem, quando outra nação de recursos grandes, cercando a nossa colónia, lá tam longe, teimava na sua oposição sistemática!
Alguns anos depois, novos estudos foram mandados fazer e foi a Macau outro engenheiro, o Sr. Castelo Branco, fazer êsses estudos, que realizou e que foram
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aprovados por decreto da Metrópole e mandados executar.
Por vezos, uma ou outra tentativa de qualquer obra, uma dragagem para facilitar o acesso ao porto, etc., se tentava fazer, às vezes com maior ou menor conflito só conseguia empreender, mas sempre através dêsse obstáculo terminante da oposição chinesa.
Mais outros estudos foram feitos, uns maiores, outros menores, mas nunca executados.
Na vigência da República, um governador, êsse grande patriota, êsse grande português, que foi José Carlos da Maia, (Apoiados) dou um grande impulso inicial às obras do porto.
A única lei, pode dizer-se, era a sua vontade!
Realmente Carlos da Maia não obedeceu bem a planos, exorbitou dos regulamentos, é verdade, o disso resultou-lho, e aqui está um exemplo que convém recordar, a sua demissão.
Tratava-se do um grande vulto da República, tratava-se de alguém que tinha distintos o valiosíssimos serviços à República, e apesar disso foi exonerado José Carlos da Maia pelo Ministro democrático que era Ernesto de Vilhena.
Mas o que é facto é que o impulso de José Carlos da Maia, mandando adquirir algum material, mandando começar uns aterros e dragagens, foi o impulso inicial e do que se não mais parou, foi o começo das obras que hoje estão constituindo o futuro daquela colónia.
Eu fui tomar conta do Govêrno de Macau fim 1919. O assunto do prosseguimento das Obras e da, falta de delimitação não podia deixar evidentemente de ser estudado, antes da minha partida, com o Govêrno da República. Assim, por ordem do Govêrno, fui a Paris, onde então se encontrava reunida a Conferência da Paz, para me avistar com a Delegação Portuguesa a essa Conferência, a fim de lá, naquele moio, que era então o centro magno de reunião dos diplomatas do todos os países interessados na guerra, em que entravam também a China e a nossa aliada, a Inglaterra, tratar dos casos de Macau. Parecia, realmente, dar-se o momento excepcional para tratar do problema. Presidia, como V. Exas. sabem, à nossa Delegação o Sr. Afonso Costa, e
com êle é que foi principalmente o meu contacto sôbre o assunto. S. Ex. reconheceu, infelizmente, que a delegação chinesa se esquivara mais uma vez e terminantemente a que se resolvesse o assunto de delimitação; e com respeito a obras do porto, ao fim de algumas conferências, disseram-me os representantes da Delegação Portuguesa à Conferência da Paz: "há uma única solução: ir para diante haja o que houver; ou nós queremos fazer realmente do Macau alguma cousa, ou nós desistimos então das obras do porto o não pensamos mais naquela colónia".
Voltei a Lisboa, o as instruções que daqui levei foram nesse sentido.
Ao chegar a Macau encontrei as obras iniciadas por Carlos da Maia e prosseguidas pelo Sr. Artur Tamagnini Barbosa, meu antecessor imediato, e mandei prossegui-las, - outra cousa não tinha a fazer em virtude do meu dever de português e das instruções que levara.
A China reclamou, a China protestou, a China moveu campanhas de imprensa e campanhas de associações decretas; a China mobilizou contra a decisão do Portugal todos os seus esfôrços, e ninguém pode fazer idea, senão quem viveu na China, do que são êsses esfôrços, porque a China é realmente sob êsse ponto do vista, excepcionalmente minada de associações secretas, como se encontra dominada por paixões e por um a chauvinismos extraordinário.
É realmente um país com grandes fôrças, quando se decide a hostilizar qualquer povo diferente da sua raça.
Mas eu tinha instruções, linha os meus deveres de português, e prossegui, devendo dizer que de Lisboa não recebi senão instruções para prosseguir
Um belo dia, deslocam-se as reclamações para Lisboa.
Em Lisboa responderam firmemente e o Govêrno, de que era Ministro dos Negócios Estrangeiros o Sr. Melo Barreto e das Colónias...
Um Sr. Deputado: - O Sr. José Barbosa.
O Orador: - Mandou-mo avisar de que estivesse preparado para qualquer eventualidade, para qualquer tentativa de
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opressão por parte da China, e de que, se fôsse necessário, recorresse até ao Govêrno de Hong-Kong que sôbre o assunto tinha instruções.
Em contacto com o Govêrno de Hong-Kong, procurei saber o que eram essas instruções.
Não tinha nenhumas. Disse-me o governador de Hong-Kong que as pediria para Londres, mas nunca chegaram. Tratava-se, evidentemente, de um equívoco qualquer, mas as ordens mantinham-se e a situação foi-se agravando.
Começaram a aparecer tropas chinesas perto de Macau; começaram as indicações de que, de facto, Macau ia ser atacado.
Em meados de Janeiro de 1920, Macau estava cercada por 12:000 homens de tropas chinesas. Em frente de Macau cruzavam navios de guerra chineses e nas ilhas ao redor estacionavam bandos numerosos de piratas, prontos a associar-se ao ataque que a Macau ia ser feito, e eu tinha informações do que pela população chinesa estava preparado um levantamento contra a autoridade portuguesa.
Foi nessas condições que eu recebi no palácio do Govêrno de Macau a visita de um general chinos, comandante das fôrças que cercavam Macau, que foi apresentar um ultimatum para suspender determinadas obras de aterro e dragagem ao norte da Ilha Verde.
Eu tinha o meu dever de português e de militar a cumprir; tinha as instruções do meu Govêrno - e o general chinos saiu do palácio com a informação de que as obras cuja execução pretendia embargar não se suspenderiam, a não ser que eu recebesse a comunicação de que o Govêrno chinês tinha nomeado e mandara apresentar uma comissão para tratar da delimitação de acordo com o Govêrno de Lisboa, ao qual eu comunicaria.
Nesse momento, dava-se uma prolongada crise ministerial em Lisboa e o governador de Macau nem sabia a que Ministro se dirigir.
Num dia seguinte ao da entrevista com o general chinês, recebi um telegrama do cônsul geral de Portugal em Cantão, transmitindo-me, em nome do cônsul geral inglês, uma comunicação do Ministro de Inglaterra em Pequim.
Era o terceiro aviso que o Ministro de Inglaterra em Pequim me mandava e dizia que, se o governador de Macau não suspendesse imediatamente os trabalhos que eu já referi ao norte da Ilha Verde, era inevitável o ataque da China a Macau.
Dar-se-ia, portanto, o conflito armado, e das suas consequências, cujos limites ninguém podia prever, como ninguém pôde prever a extensão que havia de tornar o conflito surgido com a Sérvia, cabia a responsabilidade ao Govêrno Português e a mim que ali estava agindo em seu nome.
Era o dia seguinte o marcado para êsse ataque. Cometi então um abuso de autoridade e venho confessá-lo ao Parlamento do meu País.
Tendo 300 soldados em Macau, tendo munições apenas para meia hora de fogo, sabendo a pavorosa calamidade que ia cair sôbre a colónia, tomei a responsabilidade de mandar suspender aqueles trabalhos, sendo autorizado, pelo telégrafo, a tornar público que o fazia por pedido do Govêrno britânico. Suponho que è esta uma das humilhações feitas a Portugal que o ex-governador de Macau ontem atribuiu â minha responsabilidade.
Eu posso com ela, posso com a responsabilidade dessa humilhação ao meu País.
A Câmara está ainda a tempo de me condenar, visto que o Govêrno de então, a quem eu telegrafei dizendo que submetia o meu acto ao julgamento que entendesse, o aplaudiu e me manteve no meu pôsto com toda a sua confiança.
Mais tarde, em 1921, estava convocada para se reunir em Washington uma conferência das potências, à qual Portugal também foi admitido como interessado nas questões do Oriente, para se resolver sôbre a situação da China. A China tinha, como V. Exas. sabem, vários governos, mas dois principais: um em Pequim, reconhecido pelas nações, outro em Cantão, funcionando com o seu Parlamento, funcionando com uma constituição, funcionando com relações de facto com as potências, mas não reconhecido oficialmente por elas. Êsse governo de Cantão é aquele com que a nossa colónia de Macau está em contacto permanente.
O governo de Cantão desejou, dêsse
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por onde dêsse, ir a Washington como nação, o para isso quis forçar outras nações a tratar diplomaticamente com êle. Que lhe ocorreu então? Na resposta a esta pregunta está a explicação, que se reconhece a única que pode ver-se, para os incidentes que só deram em Macau. Ao govêrno do Cantão ocorreu provocar um conflito sôbre Macau com Portugal, que nos levasse ou a capitular, satisfazendo assim as ambições chinesas, ou a provocar a intervenção da Inglaterra o outras nações, que pudessem impor depois o govêrno de Cantão em Washington, como uma nação a admitir. Esta é a explicação que se vê para os incidentes ocorridos no porto do Macau em Setembro do 1921, incidentes que vou relatar à Câmara.
Um dia apareceu nas águas do porto interior do Macau, águas que nós temos sempre afirmado serem unicamente portuguesas, um grande barco a remos com uma fôrça militar dentro o um oficial chinos a comandá-lo, tendo à popa a bandeira chinesa e à prôa um distintivo do dignidade militar.
Êsse barco começou a fazer muito afoitamente polícia no porto do Macau. E claro que não havia autoridade alguma portuguesa que consentisse semelhante cousa.
Uma embarcação da polícia do porto dirigia-se a êsse barco, a fim de intimá-lo a cessar com êsse procedimento.
Do barco responderam incorrectamente. Então a embarcação portuguesa, que não tinha armamento, apitou, pedindo socorro, o qual lho foi dado por um molor-bote devidamente animado. O barco chinês dirigiu-se para a praia da Ilha da Lapa, onde a sua tripulação se entrincheirou, e rompeu fogo sôbre a embarcação portuguesa.
Mataram alguns dos nossos homens.
Nestas condições, a embarcação portuguesa fez o sou dever: respondeu também com fogo.
Não o fez por minha ordem, mas se me houvesse sido solicitada essa ordem, decerto que eu não teria dado outra.
Apoiados.
Era a soberania portuguesa que ali se representava. Não se podia consentir em tal desacordo.
Apoiados.
Ante a atitude dos nossos homens, e apôs terem sido feitos cinco tiros da nossa parte, cessou o fogo da parto dos chinas.
Contra o que se passava eu protestei imediatamente. O govêrno de Cantão também protestou.
Quando ainda estávamos no embaraça daquela situação, entra no porto de Macau um navio do guerra chinos, um torpedeiro, êsse célebre torpedeiro de que ontem falou o Sr. Rodrigo Rodrigues. Foi fundear num sítio que não constitui, segundo os regulamentos do porto de Macau, fundeadouro para êsses navios, pois no porto do Macau existe, como em muitos outros portos, uma parto destinada a, quadro dos navios de guerra estrangeiros.
Isso, porém, era um incidente, aliás vulgar. Várias vezes se dava o caso de navios chineses entrados no porto do Macau, fundearem fora do quadro dos navios do guerra, desobedecendo por essa forma ao regulamento do porto. O que sucedia em tais casos?
A nossa autoridade intervinha o convidava-os a rectificar o seu fundeadouro. Com mais ou menos embaraços lá só solucionava o assunto.
Desta voz, porém, o torpedeiro resistiu mais, o do facto marcou-se-lhe uma determinada hora para Cie cumprir a indicação que lhe era feita.
Compreendem V. Exa. que ou então já percebia que aquele caso do torpedeiro não ora o caso vulgar doutros barcos. Não!
Havia um espírito de provocação, havia um desejo de conflito, e quanto mais submisso eu fôsse pior ficaria colocado Portugal.
O facto é que no prazo indicado o torpedeiro obedeceu.
Foi o único ultimatum que se mandou, e foi cumprido.
Neste ponto eu desfaço a afirmação do Sr. Rodrigo Rodrigues.
Dois dias depois o torpedeiro voltou ao mesmo lugar.
Vai de novo a autoridade a bordo.
Então o comandante do torpedeiro mostrou uma ordem escrita do govêrno de Cantão, para que não respeitasse as autoridades portuguesas.
Então o caso atingiu proporções muito graves.
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Havia só que fazer uma de duas cousas. Ou eu aceitava como boa aquela ordem do governo de Cantão dada ao sou navio, e Portugal abdicava do direito exclusivo sôbre o seu porto interior de Macau, ou eu impunha a autoridade portuguesa.
Foi então que, na previsão de conflito com quatro barcos, que tantos eram os navios de ,guerra chineses surtos no porto, e com as fôrças da Lapa, se mobilizou tudo e se ocuparam posições, pois que eu estava decidido a manter a honra da bandeira de Portugal.
Apoiados.
Foi nessa altura que o comandante de um monitor inglês, o Tarântula, se apresentou no palácio do Govêrno, dizendo que em nome do Govêrno Britânico pedia ao governador de Macau que não procedesse imediatamente, que permitisse que o assunto fôsse tratado por intervenção da Inglaterra, pelas vias diplomáticas.
Ouvi êsse pedido e para aceitá-lo impus o seguinte:
Eu mando chamar, aqui, ao palácio do Govêrno, o comandante do torpedeiro e o alto funcionário chinês que se encontra em Macau a tratar do assunto, e é V. Exa. quem há de dizer isso diante dêsses homens.
Assim se fez.
Consta tudo isto do documentos que o Sr. Rodrigo Rodrigues conhece, porque os leu;
É essa a tal intervenção em que S. Exa. falou.
Como se vê, o nome de Portugal não foi enxovalhado.
Apoiados.
Referiu S. Exa. que entrara em Macau, achando ali tudo desolado,
Maior desolação encontraria se houvesse entrado em Macau em data alguns meses anterior àquela em que para lá foi.
Eu explico.
Eu tivera autorização para vir à Metrópole tratar de assuntos graves da colónia, que estavam pendentes.
Um e o principal era o incidente do torpedeiro.
Era o nosso Ministro em Pequim que em pessoa viera daquela cidade para Cantão, a fim do tratar do assunto. A Inglaterra auxiliava-nos, outros cônsules em Cantão também, mas o que é facto ê que não havia maneira de resolver o caso.
E, eu que havia muito - talvez estejam alguns ex-Ministros das Colónias que o saibam - instava que me deixassem vir a Portugal, para ver minha mãe, que eu sabia ia morrer; eu, que estava cansado daqueles três anos de responsabilidades tremendas, queria vir entender-me com o Govêrno, e expor-lhe pessoalmente a situação de ordem diplomática, para ver se era possível encontrar uma solução para aquele difícil problema.
Depois de muitas outras dificuldades vencidas, consegui em 22 de Maio, ou cousa que o valha, sair de Macau.
Por um acaso, o vapor em que eu devia embarcar encalhou, teve várias avarias e estava demorado. Eu, que tinha feito entrega do governo de Macau - e que considero essa entrega alguma cousa de importante e grave, que não devia repetir-se, um dia sim outro não, dando-lhe mais valor que o Sr. Rodrigo Rodrigues, que depois de sair clandestinamente de Macau é que escreveu uma carta ao governador interino dizendo que tomasse conta do governo da colónia, porque è esta a noção que S. Exa. tem dêstes deveres, que considera talvez protocolares, mas que são mais alguma cousa do que isso - fiquei instalado no palácio de Hong-Kong, hóspede do governador daquela colónia.
Havia 12 ou 14 dias que aguardava o transporte para Lisboa, quando me chegou a notícia de que em Macau havia acontecimentos muito graves.
Pedi ao governador de Hong-Kong que me dêsse um transporte, e êle cedeu-me o seu yacht de recreio.
Reentrei em Macau, mas então ia assumir as responsabilidades da colónia, porque era o homem que havia sido escolhido pelo Govêrno.
O que se dora em Macau fora um incidente de rua, umas prisões o seguidamente a exigência dos chineses para que fossem soltos determinados presos. A autoridade não anuiu a êsse desejo, os chineses agruparam-se em torno da esquadra de polícia, a autoridade prudente e calmamente aconselhava-os a que retirassem, etc.
Isto durava havia 18 longas horas.
A esquadra de polícia, ocupada por
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uma fôrça do infantaria europeia e meia dúzia de soldados pretos, estava positivamente bloqueada. Em frente uma multidão dalguns milhares de homens desvairados, com pendões içados, que eram os distintivos das associações secretas que vinham à luz do dia, serviços da Cruz Vermelha montados, barricadas nas ruas, comunicações cortadas para o porto, etc. A certa altura a multidão avançou, matou um soldado preto e quis assaltar a esquadra.
Era a perfeita subversão da autoridade da colónia, era a anarquia, e a fôrça fez fogo, matando muitos homens, ferindo outros, mas cumpriu o seu dever de fôrça portuguesa.
Apoiados.
Mas, como consequência imediata do acto, dou-se o êxodo de 50:000 ou 60:000 chineses de Macau, deu-se n greve geral- a única do que tenho conhecimento que vingasse -, deu-se a paralização completa da vida da colónia, o quando lá cheguei o aspecto da cidade era tudo quanto havia de mais triste.
Quem conhece a risonha terra de Macau o via as suas ruas desertas, as casas fechadas, emfim, o aspecto fúnebre, não podia deixar de se confranger. Eu talvez tenha responsabilidade no prolongamento dêsse aspecto fúnebre, sobretudo se se comparar o procedimento que então tive com o procedimento que havia sido seguido, semanas antes, numa sublevação em Hong-Kong.
Nossa colónia arrastava-se, havia meses, uma greve de marítimos que prejudicava altamente o comércio da colónia, e degenerando essa greve numa greve geral contra os europeus, o govêrno de Hong-Kong capitulou, submetendo-se às exigências feitas.
Ora ou entendi que a nossa situação ora muito diferente, porque a Inglaterra é poderosíssima, e ainda porque em Hong-Kong está enraizada a vida inglesa. Porém, se nós transigíssemos, se aceitássemos a humilhação, perdia-se por completo o nosso prestígio na colónia, e, portanto, tinha-se de resistir.
Assim, a população portuguesa de Macau sujeitou-se, desde o mais alto até ao último, a todas as privações. Foram as donas das casas que fizeram os serviços dos criados, os soldados que se fizeram padeiros, mas não se capitulou, tendo-se os chineses convencido de que os portugueses, para serem donos de Macau, não precisavam dos seus trabalhos.
Foi o resto desta situação que o Sr. Rodrigo Rodrigues encontrou, e encontrou também de pé algumas das medidas que eu me vi forçado a tomar, entre outras a da dissolução de todas as associações que se tinham sublevado contra a autoridade portuguesa.
Eu não levo a mal que o ex-governador de Macau, Sr. Rodrigo Rodrigues, se tivesse permitido a reabertura dessas associações. Eu, que as havia mandado encerrar é que o não podia fazer. Isto consta duma carta minha que dirigi a S. Exa.
Eu não tenho dúvida, meus senhores, eu não tenho dúvida de que o espírito pacifista do Sr. Rodrigo Rodrigues muito contribuíu para que durante vinte meses vivesse em paz como governador de Macau. Mas também do que eu não tenho dúvida é do que o que mais contribuiu para essa paz foi a atitude da China, Eu não quero com esta afirmação negar reconhecimento à acção do Sr. Rodrigo Rodrigues no que ela teve de esfôrço no sentido de viver pacificamente em Macau, Simplesmente o que eu não posso aceitar é que S. Exa. procure enaltecer êsse esfôrço até o ponto de nos querer lazer acreditar - fazendo assim uma flagrante injustiça a muitos governadores que lá estiveram antes de S. Exa. a - que só um homem conseguiu viver em paz em Macau: o Sr. Rodrigo Rodrigues,
Procurou-o, as circunstâncias permitiram-o; felicito-o, mas não acuse os outros.
Sr. Presidente: quando o Sr. Rodrigo Rodrigues partiu para Macau, no final da nossa última entrevista no Gabinete do Ministério das Colónias, onde nos reuníamos, eu disse a S. Exa.: "V. Exa. vai ter um problema muito interessante para resolver, e êsse problema é o da exploração do porto. Eu não tive ensejo de me ocupar dele com largueza, porque não tive tempo para isso. Seria necessário que a minha capacidade de trabalho fôsse incomensurável para eu poder ter trabalhado mais do que trabalhei em Macau".
O Sr. Rodrigo Rodrigues teve a boa fortuna do ver o problema da construção
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do porto resolvido. A oposição tenaz da China, que me levou à suspensão de determinados trabalhos, acabou por ser vencida, e eu invoco o testemunho do Sr. Ferreira da Rocha, que certamente deve estar lembrado dos formidáveis esfôrços que se fizeram para só obter um acordo que permitisse dar realização às ambicionadas obras do porto de Macau.
Foram novo meses seguidos do lutas, ao cabo dos quais os dois delegados do Govêrno Português, Srs. primeiro tenente Cunha Gomos o José Vicente Gomes, sob a direcção do governo de Macau, obtiveram a vitória de realizar o acordo depois de o delegado do Govêrno Britânico, que inicialmente os havia acompanhado, ter desistido por julgar inúteis os seus esfôrços.
O acordo realizado procurou resolver três importantes assuntos que originaram conflitos entro Macau e Cantão: a extradição do criminosos, a passagem de barcos, fôrças e material de guerra chinesas pelas águas do porto e a construção do porto, esta última, já só vê, pendente da delimitação, como não podia deixar de ser e como sucedo de facto com qualquer obra que na colónia façamos. É, porém, tam cuidado o acordo, sob êsse ponto de vista da nossa soberania, que em num trabalho que no meu governo se elaborou para documentação dos nossos direitos são os argumentos extraídos dêsse acordo dos mais valiosos que empregamos.
Uma vez celebrado mereceu às autoridades britânicas uma profunda apreciação: nunca julgaram que Portugal viesse a realizá-lo, porque é preciso que se saiba que há muito tempo era inviável qualquer acordo com o Govêrno Chinês.
E à sombra, pois, dêsse acordo que se estão fazendo, na mais absoluta paz com a China, as obras do porto de Macau.
Referiu S. Exa. ontem que numa conferência realizada dias antes da sua partida em que esteve o Sr. Ministro dos Estrangeiros e outros funcionários recebera instruções no sentido do documento que enviou ao govêrno de Hong Kong.
Eu apresento a essa declaração de S. Exa. uma absoluta negativa; compareci a essa conferência, estavam presentes o Sr. Rodrigues Gaspar, então Ministro das Colónias, Sr. Barbosa de Magalhães, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sr. Gonçalves Teixeira, director do gabinete do Ministério dês Estrangeiros, o Sr. Domingos Frias, director das colónias do oriente, o Sr. governador de Macau e eu.
O Sr. Deputado esqueceu-se naturalmente quando ontem não me mencionou; naturalmente não foi por deprêzo pela minha pessoa, embora o facto da minha ascendência, que tanto mo honra, pareça que só merece a S. Exa. deprêzo.
O Sr. governador do Macia esqueceu-se da minha presença, pois estive lá, e afirma que nem uma única afirmação surgiu nessa conferência que habilitasse S. Exa. a dar o passo que deu.
O acto de S. Exa. é da sua exclusiva o pessoal responsabilidade, acto que não representa um atentado contra os seus deveres do português, porque se o representasse outro seria o meu procedimento que não o convite ao simples pedido de demissão, mas que representa um êrro, um gravo êrro, exclusivamente da sua responsabilidade.
Parece-mo que a Câmara não carece que eu analise êsse documento, êle demais a mais foi lido aqui em voz alta, tornou-se público, está impresso e naturalmente V. Exas. puderam analisá-lo.
Nesse documento há evidentemente uma submissão do Govêrno Português a um governo estrangeiro que não é de aceitar, trate-se de que governo fôr, seja um governo com quem não mantenhamos relações de amizade, seja êle da nossa secular aliada, e então, digo, procedimentos dêstes só são contraproducentes.
Eu na minha carreira, difícil carreira, cheia de obstáculos, tenho, por vezes, tido contacto com autoridades britânicas.
Está presente o Sr. Carlos de Vasconcelos e sabe o que comigo aconteceu nas ilhas de Cabo Verde quando eu ali estava exercendo um comando ainda com uma pequena patente de oficial de marinha.
Tinha a meu lado uma poderosa esquadra britânica comandada pelas mais elevadas patentes.
Um dos almirantes que a comandava ia pouco mais tarde comandar toda a armada britânica que se reunia em Scapa-Flow.
Simples primeiro tenente, comandando uma pequena fôrça de duas canhoneiras e um rebocador, exerci êsse dificílimo papel de representante da soberania portuguesa
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e por forma que êsse homem quando eu ia a bordo do navio almirante, ou, que tinha apenas direito pela minha patente a ser acompanhado por oficial de igual patente, era acompanhado ao portaló pelo próprio almirante.
Foi sempre do cabeça erguida que eu falei porque quanto mais alto alguém se coloca mais respeito merece.
Se o meu procedimento foi útil ou inútil para Portugal, tenho documentos que o demonstram e o lacto do no fim da guerra, mal ela terminou, eu ter recebido do Govêrno Britânico uma das mais altas condecorações que deu pela guerra, parece que só demonstra que a Inglaterra estima que quem lhe fala se ponha no seu lugar.
Apoiados.
Uma vez conhecido em Lisboa êste documento, êle não mereceu a aprovação de ninguém.
O primeiro Ministro que sôbre êle tem despacho é o Sr. Rodrigues Gaspar. Não teve oportunidade de o ler, porque nem sempre um Ministro tem oportunidade do ler documentos tam volumosos como a acta em que se figura; lançou um despacho confidencial mandando estudar o assunto.
Seguidamente é estudado pelo almirante Sr. Ernesto do Vasconcelos, e tem um parecer inteiramente desfavorável.
Depois é analisado por uma comissão de três membros, os Srs. Ernesto de Vasconcelos, Lisboa do Lima e Craveiro Lopes, que o condenam também.
Vai seguidamente ao Conselho Superior de Obras Públicas o Minas que perfilha, por unanimidade, o parecer dessa comissão.
Vai em seguida para o Conselho Colonial, e o Sr. Rodrigo Rodrigues, que disse que êle ali teve aprovação, deve ler o parecer do seu relator. E, se o Conselho conclui indicando a formação de uma junta autónoma experimentalmente por três anos, eu tenho razões suficientes para crer que só por delicadeza para com o governador proponente se indicava essa solução como experimental.
Lancei sôbre o processo o meu despacho, e fiz o meu dever, condenando-o em absoluto a proposta de S. Exa.
Em seguida oficiei ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, a fim de que desse instruções para Londres para que os compromissos contraídos pelo Sr. Rodrigo Rodrigues não se efectivassem.
Cumpri assim o meu dever, como o cumpri exonerando-o de governador de Macau, para que Portugal possa confirmar claramente por essa forma que se desliga de qualquer compromisso tomado por S. Exa.
Tenho dito.
O orador não reviu,.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O Sr. Vicente Ferreira (para explicações): - Não me foi dado assistir à sessão de ontem, o, por isso, não rebati uma afirmação extemporânea do Sr. Rodrigo Rodrigues.
Sr. Presidente: se é exacto o relato dos jornais, disse S. Exa. que, dos rápidos Ministros que se tem sucedido na pasta das Colónias durante três anos, nenhum se lembrou de censurar a S. Exa. e como dêste memoradum ao Govêrno de Hong Kong.
Eu desejo afirmar à Câmara que S. Exa. está profundamente enganado ou esquerdo.
Poucos dias estive no Ministério das Colónias, mas foram os bastantes para me darem conhecimento dêste documento que vejo agora tornar público o que foi impresso com o título de "Actas de uma sessão secreta".
É tam estranha me pareceu a doutrina dêsse famoso memorandam e o procedimento do governador de Macau, apesar de eu estar habituado a ver certas subserviências perante autoridades estrangeiras, que, para mo certificar se o acto tinha sido feito por sua espontaneidade ou por instruções daqui recebidas, expedi a S. Exa. um telegrama, do qual aqui tenho uma cópia, por amável cedência do Sr. Ministro das Colónias, e que passo a ler à Câmara.
Sabem V. Exas. o que o Sr. governador de Macau respondeu?
Isto que eu recebi poucos dias antes da queda do Govêrno, a qual, é bom lembrar, foi precedida de um movimento revolucionário.
Leu.
A uma pregunta concreta e terminante S. Exa. respondeu em chinês, que é uma
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língua que nós, portugueses, não conhecemos.
Porque isto que aqui está é chinês.
S. Exa., com aquele seu habitual feitio de romanciar sôbre assuntos de administração, e do devanear sôbre cousas sérias, mandou, julgando, sem dúvida, ter cometido um grande acto administrativo, patriótico, político e diplomático, esta triste nota ao Govêrno de Hong-Kong.
Eu chamo, mais uma vez, a atenção da Câmara para esto documento e para o facto do o Govêrno de Hong Kong ter mandado estudar o assunto por dois caixeiros bancários.
E, irrisão e cousa curiosa, e que mostra a precipitação e a falta de tato com que certos negócios se tratam, é que êstes funcionários, com muito mais sciéncia administrativa e compreensão das cousas, mandaram preguntar ao Govêrno de Macau o seguinte:
Leu.
Quere dizer que êles pediram aqueles elementos que o Govêrno de Macau devia ter e mandar prontamente, se êste problema tivesse sido seriamente encarado.
Sr. Presidente: eram estas simples explicações que eu desejava dar a S. Exa.
O que valeu a S. Exa. não ser demitido foi o movimento que derrubou o Govêrno do Sr. Ginestal Machado.
O Sr. Cunha Leal: - Quem o derrubou foi a Câmara.
O Orador:-Fomos derrubados, e êsse movimento já foi até amnistiado.
O que valeu ao Sr. Rodrigo Rodrigues, apesar da muita estima que tenho por S. Exa., foi êsse movimento; senão, teria sido demitido imediatamente de governador de Macau.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestestermos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Rodrigo Rodrigues: -Sr. Presidente: não é por menos consideração para com o Sr. Ministro das Colónias, mas apenas para dar uma explicação ao Sr. Vicente Ferreira, que respondo primeiro a S. Exa.
Disse S. Exa. que ia corrigir uma afirmação minha, que vinha nos jornais, isto
é, de que eu não tinha recebido comunicação, censura ou qualquer reparo dos Ministros.
Se eu precisasse justificação, bastar-me-iam as palavras de S. Exa.
Am minha pregunta foi precisamente uma afirmação de que não existia nenhum acordo, e a minha nota não passou de uma sondagem que não dou resultado.
Disse S. Exa. que eu respondi em chinês, quando afinal S. Exa. de que falou em chinos, de forma que eu não compreendi nada.
O Sr. Carlos Olavo: - Foi por isso que V. Exa. respondeu em chinês.
O Orador: - Todos os argumentos que se apresentam contra mim vão recair em actos praticados anteriormente ao meu Govêrno.
Apoiados.
O Sr. Carlos Pereira: - Foi como o empréstimo de Moçambique, que se fez às escondidas.
Apoiados.
O Orador: - Agora vou responderás considerações do Sr. Ministro das Colónias. Eu segui pouco a pouco as afirmações por S. Exa. feitas.
Parece que fui infeliz na minha exposição.
Eu agradeço à população republicana de Lisboa o poder vir a êste lugar defender-me do labéu que mo foi dirigido pelas tantas da noite no gabinete do Sr. Ministro das Colónias.
Tudo isto são factos característicos da sociedade em que vivemos.
S. Exa. agora andou rebuscando em todos os caixotes do Ministério das Colónias, procurando outra corda, pois esta com que procurou atar-me os pulsos não foi suficiente.
É claro que todas as questões são objecto de estudo, análise e sanção suficiente, que os homens habituados a proceder com ponderação devem e precisam fazer.
Da maneira como os assuntos aqui são tratados e, sobretudo, como são expostos, mostrando-se apenas uma parte da questão, não incidindo, pois, sôbre êles a análise devida, é fácil cairmos em erros; e eu
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posso levar a mal que algumas das pessoas que mo escutam estejam, de lacto, debaixo do uma impressão tam desagradável neste momento, que olhem para mim quási como quem olha para um condenado.
Eu não peço mais nada do que atenção, porque os sentimentos do justiça estão latentes o hão-de despertar no coração do V. Exa.
Sei bom, e todos nós que somos políticos o sabemos, que numa assemblea desta natureza não se desvia o significado de um voto; mas também sei que, apesar disso, êsse voto se conquista, apelando para os sentimentos do justiça, quando a gente tem a razão por si.
Duvidar disto e duvidar quási que da razão de ser moral o social da sociedade portuguesa,
Eu vou, pois, apresentar uma exposição dos factos, tanto quanto possível rápida e precisa.
Eu não tenho, Sr. Presidente, receio algum de chamar o Sr. Ministro para esta discussão, que ou considero o meu triunfo e até o galardão do lugar que aqui tenho.
Se me arreceasse de ser julgado, demonstrava, além de tudo, uma perfeita inconsciência.
Não só aqui, como em qualquer das comissões que existem, ou mesmo numa qualquer organizada pelos meus adversários, sujeito-me ao julgamento.
Aqui poderá julgar-se e examinar-se melhor talvez do que nesta atmosfera apaixonada, em que os assuntos não podem ser tratados com aquela calma com que dentro do um gabinete podem ser tratados.
Começou S. Exa. o Sr. Ministro das colónias por tratar primeiramente da questão política e partidária.
Não é aqui o seu campo, Sr. Presidente.
Apoiados.
Se S. Exa. tem algumas censuras a fazer-me no lugar próprio, lá estaremos.
Não se trata do função que pertença à Câmara.
Apoiados,
V. Exas. já têm bem no espírito a noção de quanto esta questão é séria, vendo a situação diplomática e a gravidade do problema colonial no extremo oriente.
Ah! não será preciso ser profeta num assunto dêstes.
Nós veremos dentro em breve quem tinha razão; nós veremos dentro em breve como há-de ser difícil a nossa situação, senão humilhante, por causa do problema do Macau.
Sr. Presidente: tinha-me referido à solidariedade1 que o Sr. Ministro das Colónias disse possuir da parte dos seus colegas pertencentes ao partido a que tenho a honra do pertencer, e a êsse respeito afirmei, não que estranhava êsse facto, mas que a minha estranheza servia se não se tivesse dado essa solidariedade, porque estava cerro que a questão não tinha sido posta com toda a minúcia o clareza como tia já está a ser colocada, porque, pelo menos, e ofensa faria a Ossos meus correligionários, no espírito deles devia nascer a idea do que era necessário ouvir-me.
Pois com isso eu lhes merecia, desde que se reconhecia a gravidade de todo êste problema, o que êle está fundamentado na convicção em que cada um de nós está do melhor bem servir o País?
Ah! não.
Fossem as consciências transparentes e os pensamentos visíveis, que ou tenho a certeza de que os que deram essa solidariedade, o muito bem, a S. Exa. se conhecessem a questão tal como está sendo posta aqui, não procederiam, dando lhe a sua solidariedade, som me ouvirem ao monos! - o é isto uma mágoa e uma razão de queixa que tenho!
Mas S. Exa. foi buscar um caso parecido que se passou com o grande republicano Carlos da Maia.
Se eu precisasse de argumentos que pusessem em destaque a diferença do procedimento, S. Exa. vinha-mos indicar.
O ilustre republicano Carlos da Maia teve um determinado procedimento e critério em relação ao problema de Macau.
^O que lho sucedeu?
Estava no Ministério de então um seu adversário político, que aqui o chamou, e o assunto foi tratado na Câmara.
Êle foi ouvido, foi arguido e depois é que foi demitido.
Isto compreende-se, e isto faz-se não apenas nos regimes que se fundamentam na igualdade dos direitos, mas até nas autocracias.
Foi o que quis frisar ontem, quando
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aqui mo apresentava como um plebeu, que se orgulha de o ser, mas que é fiel às normas legais e jurídicas, ao passo que S Exa., que tem um nome, que nasceu num regime que eu não quis ofender, o monárquico, mas que vem do um sistema mais recuado, o feudalismo, não respeita essas normas.
Contudo, nos tempos feudais, os senhores mandavam ficar à porta os criados quando queriam, mandavam açoita-los mesmo quando queriam, mas respeitavam a sua dignidade.
Foi o que V. Exa. não fez.
Foi o que quis frisar nas palavras que disse. Nunca me dirigi a V. Exa. pessoalmente o muito menos aos seus antecedentes.
Se V. Exa. não compreendeu o meu símile, foi porque fui infeliz na exposição.
E por isso veio a intervenção do Sr. Américo Olavo, que disse que V. Exa. é republicano de há muito.
O Sr. Carlos Olavo: - Em democracia não há nobres nem plebeus.
Apoiados.
O Orador: - Eu sei que a palavra republicano já está do tal maneira sujeita a distinções e adaptações, que cada qual lhe dá o significado que quere.
V. Exa. tem um significado o eu tenho outro.
O Sr. Américo Olavo: - Mas nós conhecemos o Sr. Correia da Silva do há muito tempo.
O Orador: - Não estou a dizer que S. Exa. não tenha prestado serviços à República.
Aqui mesmo ouvi as palavras candentes do justiça com que Machado dos Santos foi julgado pelo Sr. Dr. Alexandre Braga.
O que disse: que o ser republicano varia do pessoa para pessoa.
Não vale a pena falar mais nisto.
Disso S. Exa. o Sr. Ministro das Colónias, como justificação do não intervenção dos outros Srs. Ministros no assunto, apesar de ter sido estudado em conselho, e haver apenas divergência sôbre a forma de administração do porto; disse S. Exa. que isso foi devido à vertigem com que os Ministros das Colónias se sucedem nas cadeiras do Poder.
Não há dúvida. O que é interessante, porém, é que S. Exa. teve a vertigem quando foi necessário proceder como procedeu.
Repito mais uma vez: não me referir do maneira nenhuma, ao facto do ser dada a demissão ao governador de Macau. Refiro-me à forma como isso foi feito.
Apoiados.
O Sr. Ministro das Colónias tem a teoria, que aqui expendeu ontem, e, honra lhe seja, com toda a franqueza, de que os governadores devem obedecer a ordens expressas e escritas, Citou o Sr. Alto Comissário de Angola, para exemplo.
Neste ponto estamos em desacordo realmente.
Creio que os governadores das colónias vivem dentro da lei. Obedecem à lei, têm de cumprir a lei, os seus deveres dentro da lei e ò que lhos é imposto.
A personalidade que está como Ministro ou como governador pouco importa. O que importa, dentro do uma questão, em democracia, é a lei.
A confiança de S. Exa. o Ministro é um assunto a tratar.
Eu sou o pior dos interpretadores das leis, mas o que não compreendo é que se marque o prazo do 5 anos de duração de Govêrno, o se coloque o governador na dependência da confiança política, pessoal ou partidária dos Ministros; e não compreendo, porque na Administração Financeira das Colónias, estatui-se as funções, isto é, os direitos e obrigações dos governadores.
Mas, Sr. Presidente, temos mais ainda, na base 30.ª, secção 3.ª
Um assunto desta importância não pode ser tratado superficialmente.
Êste assunto é um dos que eu desejava tratar nesta Câmara, ao mesmo tempo que se expusesse o que era o problema português nas colónias do Oriente, as necessidades que êle implicava, a definição dos direitos de autonomia, para sabermos como só devia actuar.
Eu desejava tratar esta questão, com a isenção e elevação com que deve ser tratada, e de maneira nenhuma num debate que parece do interesse pessoal para mim ou para o Sr. Ministro.
A mim pelo facto do ter sido o gover-
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nador demitido; a S. Exa. porque pretende justificar a atitude que tomou.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Colónias entende que os governadores são seus delegados.
Ora, eu creio que nem os próprios governadores civis são delegados exclusivos do Ministro do Interior, e, com referência aos governadores coloniais, êstes têm os seus direitos o obrigações consignados na respectiva lei.
O Sr. Américo Olavo (interrompendo): - Nem se podem exercer funções públicas do outra maneira.
O Orador: - Mas V. Exa. não ouviu isso ao Sr. Ministro das Colónias.
Sr. Presidente: vamos agora aos factos de que foi arguido o falecido governador de Macau.
O Sr. Ministro das Colónias dividiu em três grupos essas arguições: abuso de Poder, falta de senso administrativo em relação à vida interna da colónia, e falta do senso para se conduzir relativamente às nossas relações internacionais.
Quanto ao primeiro grupo, falou S. Exa. do abuso cometido pelo governador de Macau, deportando um professor do liceu para a ilha da Taipa, e porque êle desobedeceu no fim dêsses sete meses, o tinha mandado autoar.
Isto dito assim, Sr. Presidente, constitui realmente arbitrariedade sem nome.
Tudo isto, Sr. Presidente, está documentado, podendo ser estudado por quem quiser.
O que é uma verdade é que questões desta natureza não ô assim que se apresentara, razão por que mo vejo obrigado a tratar delas do igual forma, sendo o primeiro a lamentar que assuntos sérios só não tratem como o devem ser.
Havia de facto em Macau, Sr. Presidente, professores do liceu que foram para lá mandados numa leva, que se achavam nas seguintes condições:
Um professor havia de alemão, que na verdade não conhecia uma única palavra do alemão, e outro de sciências naturais, que tinha apenas o primeiro ano do seminário.
Na verdade o escândalo foi tam grande, Sr. Presidente, que foi levantada uma grande campanha em Macau.
Por aqui a Câmara está vendo a maneira como as colónias são tratadas, isto num regime republicano e com Ministros que são republicanos.
Na verdade as colónias são uma espécie de vazadouro para onde se manda tudo aquilo que aqui não serve, o que é um verdadeiro crime, razão por que elas não são aquilo que deviam ser.
Não é assim que se procedo, mandando gente desta para uma colónia, como Macau, que convive com a civilização inglesa e chinesa, perante as quais nós passamos, não porque não tenhamos qualidades morais e intelectuais para nos podermos impor, por um País som senso comum.
Por assim não pensar, Sr. Presidente, por assim não proceder, é que ou sou alcunhado de idealista!
Ainda bem que assim sou considerado, tendo fé o a certeza de que assim continuarei a ser até morrer.
Poderá ser que eu seja menos vigoroso, mas é fácil fazer o côntrole de tudo, porque tudo está escrito o documentado no Ministério das Colónias.
O reitor do liceu procurou-me, pedindo-me que conseguisse a sua transferencia para um liceu do Cabo Verde, porque os outros seus colegas não consentiriam jamais que êle entrasse no liceu.
Eu respondi que não concordava com tal procedimento, porque se nós vivemos numa época de fraqueza moral e de corrupção, eu por ora não estou disposto a proceder de tal maneira; disse, portanto, que informasse o respectivo processo, que assumisse a responsabilidade, processo que me viesse justificar a razão pela qual deve ser, não transferido, mas demitido, e então eu enviaria tudo ao Govêrno da Metrópole para proceder como entendesse.
Em face desta minha obstinação, fez-se um processo, e o processo era de tal natureza que apesar de todas as boas vontades que se moveram em volta do homem, apesar do todos os entraves que aqui pelo Ministério das Colónias, e por toda a parte, se levantaram, o homem veio mais tarde a ser demitido.
Entretanto o homem, que tinha sido acusado por um certo número de testemunhas, começou a persegui-las, a ameaçá-las, a vexá-las, e entro essas pessoas estava o nome duma pessoa que nos deve merecer todo o respeito, Camilo Pessanha.
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Camilo Pessanha foi ameaçado e enxovalhado no meio da rua por êsse desgraçado degenerado, facto êste que chegou ao meu conhecimento por intermédio da polícia.
Vi que era impossível haver um procedimento disciplinar e administrativo numa terra tam pequena como Macau, e em face da ameaça contra a vida do ilustre poeta Camilo Pessanha e em face até da ameaça que representava para a ordem pública a permanência dêste homem ali naquela pequena cidade de Macau, eu usei das atribuições que a lei me confere, que a lei me impunha, e mesmo que a lei não mas impusesse eu tinha obrigação de proceder assim.
O que não se diria se eu - avisado como estava oficialmente de que êsse homem queria atentar contra a vida do ilustre poeta e digno representante do génio português, Camilo Pessanha, e contra a vida de outras pessoas - não tivesse tomado quaisquer providencias; mas a lei existe e eu vou lê-la.
Julgo que não necessitava de mais disposições legais para fazer o que fiz.
E o que é que eu fiz?
Eu não deportei o professor. É preciso que estas cousas sejam apreciadas em relação ao local em que se passam.
Dizer, aqui, perante a Câmara dos Deputados, que eu mandei um homem para uma ilha, dava a idea de eu ter feito uma deportação idêntica a qualquer outra que se possa fazer daqui do Lisboa para os Açores e para a África. Nada disso.
Em face de Macau, a uma distância não superior a uns mil metros, se tanto, existe a risonha ilha da Taipa, onde S. Exa., o Sr. Ministro das Colónias, então governador do Macau, mandou construir algumas habitações modernas para funcionários públicos.
Não tendo eu qualquer lugar no hospital para ali internar êsse degenerado, e não devendo metê-lo na cadeia, transferi-lhe a residência para aquela ilha, aguardando o resultado da sindicância que eu tinha enviado para Lisboa.
Ali esteve numa casa que era do listado, recebendo o seu vencimento para se poder manter.
E êste o acto grave que cometi o que S. Exa. o Sr. Ministro das Colónias classificou de deportação, para mo garrotar!
Outro acto grave, também classificado como tal pelo Sr. Ministro, é o caso de eu, governador de Macau, ter dirigido certa correspondência ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, sem ser por intermédio do Ministério das Colónias.
Ninguém mais do que eu sente a necessidade de que haja toda a disciplina em todos os ramos da vida social, mas não compreendo que possa constituir êrro grave aquele meu procedimento, para ser apontado aqui.
Na base 24 da lei diz se: "Governo da Metrópole".
Não é só Ministério das Colónias.
Se o legislador quisesse indicar simplesmente Ministério das Colónias, taxativamente o indicaria, em vez de usar da expressão genérica: "Governo da Metrópole".
Mas que não fôsse assim!
Que grave falta era essa para ser apontada como um dos grandes erros administrativos do governador!
Quando são apontados actos dêstes como erros graves do administração, é porque outros não existem de maior monta.
Se S. Exa. preguntasse quais as razões por que eu tive tal procedimento, eu diria que S. Exa. já dera a resposta quando ontem declarou que o Ministério das Colónias, na maior parte das vezes, não respondo às solicitações mais instantes que por vezes lhes são feitas.
Quanto à razão que me levou a proceder assim, S. Exa. foi o primeiro a apontá-la, quando ontem afirmou que no Ministério das Colónias a maior parte das vezes não respondem às solicitações mais instantes.
O Sr. Correia da Silva ainda há pouco justificou um acto da sua administração com igual fundamento, porque entendeu, como eu entendi, que se não podem sacrificar às fórmulas os interêsses do País.
De resto, eu procedi como tantos outros governadores têm procedido: mandei um ofício para o Ministério das Colónias e uma cópia para o Ministério dos Estrangeiros. A lei foi, assim, respeitada, e, se o assunto se não resolveu, a responsabilidade pertence a todos, menos ao governador.
Outra afirmação fez o Sr. Ministro das Colónias, justificando o romantismo do
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ex-governador do Macau: a de que ou tinha mandado guardar uma porção do prata no Ministério das Finanças, e, no Ministério do Comércio, uns poucos de navios. Veja a Câmara que insensatez!
Quando eu li nos jornais o caso da hipoteca da prata existente no Banco de Portugal, pensei que um dos actos afirmativos da soberania dura país é precisamente a cunhagem o circulação da moeda, o, ao mesmo tempo, que essa prata poderia constituir para a colónia uma grande fonte de receita, por isso que a absorpção da prata no mercado chinês, para a confecção de artefactos, é enorme, e além disso me permitiria pôr em circulação moeda portuguesa.
E eu então apresentei um projecto ao Conselho Colonial para que se cunhasse a moeda.
Ao mesmo tempo que mandava êsse projecto, oficiava, de facto, ao Ministério das Colónias, visto que estava anunciada essa operação da prata, para que a sustivesse até que o Conselho Colonial resolvesse.
V. Exas. sabem-me dizer só o Ministério das Colónias ou o Conselho Colonial já resolveram alguma cousa sôbre êste assunto?
Isto são fantasias, são questões do lana caprina, daquele romântico que estava a delirar no Oriente, e que até servem para a sua acusação!
Quanto aos navios, a questão é semelhante. Pois V. Exas. não sabem que estava anunciada a praga dos navios?
Pedi do Macau que se estudasse a dívida da Metrópole àquela colónia, porque eu não a conhecia bom, e se realmente se podia receber contra essa dívida qualquer dos navios.
A desorganização do Ministério das Colónias é tam formidável que, por um simples telegrama mandado para um governador, se fazem transferir quantias importantíssimas, de uma colónia para outra, sem tomar em conta a sua situação financeira, a sua autonomia e os seus compromissos, o sem se querer saber do estado das contas entre elas, porque nunca só acertam as contas entre as nossas diversas colónias, nem as contas entre elas o a Metrópole.
Eu, que não conhecia a situação da dívida de Macau, nunca podia supor que aquela colónia tivesse de pagar 40:000 libras pelo transporte de meia dúzia de soldados e de munições. Cometi, pois, mais essa falta.
Sabendo aqui, há pouco tempo, que os navios iam à praça, pedi para só sustar essa praça o estudar o assunto.
Aqui têm V. Exa. as mais uma fantasiar mais um romantismo dêsse governador a quem se pegaram os sonhos do fumo do ópio do Oriente.
Ah! Sr. Presidente, é que eu, noite e dia, penso nos assuntos que me são entregues, vivendo para elos numa absorpção completa.
Se é essa a minha falta, só, apesar detratar das cousas abaixo de um ponto de vista moral e prático ao mesmo tempo-mo ligo intimamente a elas, se isso constitui um crime, ou tenho-o praticado e continuarei a praticá-lo.
Acusou-me S. Exa. também, lendo o parecer dum chefe de repartição - vejam V. Exas. quanto isto tem do disciplinar e interessante! - de tomar resoluções irreparáveis, e fundamentou esta acusação com tudo aquilo que se passou em relação à aquisição das casas para Xangai, Cantão e Pequim.
É um assunto que V. Exas. vão poder apreciar no que êle tem do essência o intenção.
Eu, quanto a tomar resoluções irreparáveis, já li à Câmara uma disposição de lei que diz que o processo que entrenó Ministério das Colónias e não tenha resposta dentro de três meses, deve considerar-se aprovado.
Mas V. Exas. sabem como se procede no Ministério?
No Ministério procede-se de uma forma que envergonharia um procurador do causas perdidas.
Primeiro recusaram-se a marcar o dia de entrada, e, porque os governadores começaram a adoptar o sistema de mandar os documentos com os avisos de recepção, passou-se a dizer depois que o contínuo que recebia os documentos e assinava não era competente, ou que o processo não vinha com os documentos todos, não se podendo assim tomar como um processo.
Êste sofisma não sei só é digno de repartições públicas; o que posso afirmar a V. Exas. é que o homem que o prati-
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casse não ficava com a s aã moral muito íntegra.
E por estas o por outras que os governadores vão daqui escolhidos pelas pessoas competentes, sujeitos às instruções e às leis, com vontade de fazer qualquer cousa, mas ai deles só tentam fazê-lo!
O verdadeiro papel dum governador, como aliás de todos os lugares da sociedade portuguesa, é ser bom, é transigir; cuidar dos interêsses portugueses, para quê?
São desta fôrça os românticos que ainda acreditam que é possível fazer-se qualquer cousa!
Felizmente que no pouco tempo que lá estive tudo correu tranquilamente: - eu bem sei que foi sorte, a China é que quis que aquilo mudasse da tempestade para a tranquilidade.
Eu não sou super-homem, mas tenho aquilo de que me estão a acusar que me falta: é bom senso; e muitas vezes para administrar não é preciso mais do que bom senso.
De resto, já tenho dado provas dêsse bom senso; não foi preciso ir a Macau, que fica lá tam longo o cuja administração não pode ser julgada senão pelo que se expõe, que é sempre incompleto.
Eu já tenho desempenhado vários cargos na Metrópole, e por isso os documentos estão à prova, e neles se vê a minha vontade e o meu bom senso servindo a causa pública.
Apoiados.
Vamos à análise dessas compras em Changai, Cantão o Pequim.
Creio que a Câmara deve ter uma impressão exacta, do resto, do que êste governo do Macau é um govêrno sui generis pelo que respeita às suas relações de ordem diplomática, estendendo-se muito além daquele admirável rincão que é aquela nossa colónia.
A Câmara já tem assistido aqui a vários debates sôbre assuntos desta natureza.
E, tanto pela exposição do Sr. Ministro das Colónias como pela minha, reconheceu já que os assuntos diplomáticos estão de tal forma entrelaçados com a vida administrativa da colónia, que a sobrelevam até às vezes.
Do facto assim é. Macau não vale pela sua extensão territorial. Vale pelo seu significado de ordem política e internacional.
Continua a ser uma capital do lusitanismo do Extremo Oriente. E tanto que o governador do Macau era como que um Ministro de Portugal na China.
Os portugueses espalhados pelo Extremo Oriente, quando há um desastre, um motivo de grande alegria, qualquer cousa emfim que os agite profundamente, a quem se dirigem é ao governo de Macau.
Nada tem que se compare a Macau, e daí o ser Macau também que se preocupa com a nossa representação no Extremo Oriente e procura honrar-se a si própria para honrar o nome português.
Aqui tem V. Exas. justificada a raz3o por que a colónia se mete em assuntos desta ordem, que, à primeira vista, parecem dependentes apenas do Ministério dos Estrangeiros.
Não me dirigiu o Sr. Ministro acusações por isso; mas apenas disso que eu tratei do assunto sem querer saber do Ministro das Colónias e do Ministro dos Estrangeiros.
Relativamente a Xangai, direi a V. Exas. que adquiri lá um edifício para a comunidade portuguesa. Fui arguido de ter entregue por êle algumas centenas de contos.
Pois quando eu cheguei à colónia encontrei o orçamento de 1922, da lavra, da autoria do governador Sr. Correia da Silva.
Abro-o e encontro devidamente aprovada pelo Govêrno da Metrópole a quantia seguinte:
Leu.
O que fiz? Mandei cumprir a lei. Isto é lei! É de S. Exa! Nem sequer mo posso enfeitar com tais penas.
Mas há mais ainda. Porque não concordo com êste sistema de distribuição do dinheiro, não pela forma que é altamente patriótica mas porque sei muito bem o que são associações que hoje estão bem, reunidas no mesmo sentimento patriótico, o amanhã se tresmalhara, mandei comprar em nome da província e cedi-a à colónia para se usufruto.
Tal a minha falta.
O Sr. Ministro das Colónias (Correia da Silva): - V. Exa. dá-me licença? V. Exa.
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esqueço-se do dizer que, desde que essa proposta veio de Lisboa até o acto do V. Exas., as receitas da colónia decresceram fabulosamente...
O Orador: - Lá vamos, Sr. Ministro! E um assunto que, como os outros, V. Exas. terão ensejo de apreciar, e já que V. Exa. diz isso, eu lembro-lhe e lembro à Câmara que já aqui se passou uma cousa semelhante a esta em relação a outros governos coloniais.
Em tudo fica a impressão do que realmente as colónias são um loco do intrigas como a vida pequena o apertada do moio provinciano.
Pároco que de facto casos desta natureza não se deviam tratar aqui no Parlamento, pois não resulta prestígio vir aqui acusar um funcionário do erros graves, o muito feliz fui eu em trazer na minha bagagem mais papel e documentos do que propriamente roupa.
Não é próprio vir para aqui discutir o homem, mas sem discutir o caso em si e tratar do problema perante o Parlamento, como êle devia ser tratado.
Toda a argumentação de S. Exa. caiu pela base, pois eu, com documentos como uma tenaz em brasa, esmaguei todas as acusações.
Eu esperava que me fossem feitas acusações legítimas, razoáveis; mas não, foram feitas as mais ilógicas acusações.
Vejamos a questão de Pequim.
Isto é da iniciativa e autoria de S. Exa.
O Sr. Ministro das Colónias (Correia da Silva): - Como eu próprio o confessei à Câmara.
O Orador: - Só lamento não ter sido de minha iniciativa.
Não soube disto senão depois de o Sr. Gomes da Costa ter regressado da sua visita.
A própria Legação de Pequim seria a própria a voltar para onde estava.
A instalação era numa garage.
Existe dentro da cidade de Pequim um trato de terreno a que chamam o bairro das legações.
Nesse bairro, infelizmente, Portugal não tem nenhum lugar, por causa da política que temos seguido sempre no Extremo Oriente.
Não há maneira de pedir responsabilidades aos indivíduos que, por comodismo, se não mexem.
É esta a situação moral que impedia de se tratar do coitas cousas na ocasião da guerra, dos boxers.
Não temos dentro do bairro das legações uma casa.
Procurei documentos relativos a esta casa e não os encontrei.
Houve negociações com o Ministro de Portugal em Pequim.
Nestas condições, foi aprovado pelo Conselho Legislativo o crédito respectivo, adquiriu-se o prédio, o foi disto dado conhecimento aos Ministério dos Estrangeiros e Ministério das Colónias.
Ficamos a pagar um capital que estava previsto.
Disse S. Exa. que isto constituiu um grave êrro, que o governador de Macau foi imprevidente fazendo a compra de uma propriedade a prazo limitado.
Não posso acreditar que o Sr. Ministro tivesse dito isto na plena consciência do que afirmou.
Toda a gente que conhece o regime do propriedade no Oriente sabe que na índia, por exemplo, há o que se chamam as terras da coroa. As terras nâo são dos indivíduos que as possuem, porque tem que dar um foro.
No Extremo Oriento, e neste bairro das legações, existe exactamente a mesma cousa. E uma espécie de foro, e a China não deixa, sequer, a posse permanente das torras.
Mas basta que se requeira para o prazo ser prorrogado durante um certo número do anos para que seja concedida a posse do prédio.
Tendo que fazer a compra, e sabendo que o prazo do aforamento, digamos assim, estava a terminar insisti com o Sr. Ministro para que antes disso se habilitasse com prazo maior.
Assim se fez.
Quem conheça o modo de ser da propriedade no Extremo Oriente, verifica que isto nada tem do extraordinário, para que se pudesse vir perante o Parlamento acusar-me de imprevidência o de falta de critério.
O consulado de Cantão!
Sobre êste caso, disso o Sr. Ministro que não foi oportuna a ocasião da compra,
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visto que a situação financeira da colónia era embaraçosa.
Havemos do ver, à faço do Orçamento, quem deixou de fazer aquelas justas despesas, que realizadas fora do tempo devido, representam um maior prejuízo de ordem moral.
Existo em Cantão um trato de terreno concedido ao Govêrno Português para construção de um edifício destinado à sua representação.
Todas as representações estrangeiras têm ali os seus edifícios.
Só Portugal é que os não tinha.
Era uma situação vexatória para nós.
Nestes termos, pedi autorização ao Ministério dos Negócios Estrangeiros para utilizar aqueles terrenos - que nossa ocasião foram avaliados para cima de 150.000 patacas - podendo o Govêrno da colónia mandar construir ali o consulado, recebendo como renda a importância que, para êsse efeito estava consignada no respectivo orçamento.
Foi isto autorizado, e ainda há dias tratei esta questão no Ministério dos Negócios Estrangeiros.
A propósito devo dizer que em nenhum Ministério encontrei dificuldades para o exercício do meu mandato, senão no das colónias.
Aí sim, quando lá entro, sou tratado como lobo que entrasse num redil de ovelhas.
Mas, obtida a devida autorização, e depois do ser aprovado o respectivo projecto, começou a construir-se o edifício, que é uma verdadeira jóia.
É um edifício do tipo português, o primeiro que se levanta no Oriento, lembrando que nós temos, uma individualidade artística étnica.
Nesse edifício, o arquitecto quis colocar uma capela para que os 100 portugueses que lá estão, na sua maioria católicos, tivessem a assistência do seu missionário.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Colónias, comunicando ontem à Câmara que essa obra estava em execução, quis dar-lhe a grata notícia de que a capela já estava em andamento, e que a iniciativa tinha sido minha.
V. Exa., Sr. Ministro, argúi-me do um pensamento delicado, qual foi o de mandar construir junto da casa que vai servir, em Cantão, para o consulado português, uma pequenina cousa que nos lembra lá fora a nossa terra: é a capela.
Sr. Presidente: se não possuo o título dessa lembrança, tão querida para os que lá fora se encontram, devo dizer a V. Exa. que, se lá, n um conflito de raças, fosse necessário para que nós prestássemos, construir não uma capeia, mas um templo, o se isso dependesse da minha autorização, eu não tinha a menor dúvida em a subscrever, desde que isso concorresse para a comunhão da nossa raça, em face dos estrangeiros.
Apoiados.
Não tenho dúvida em subscrever essa autorização, o até de carrear pedras, se isso fôr necessário; eu que sou um irreligioso, eu que em 1904, na índia, fiz abrir o primeiro livro do registo civil, duma foi ma encapotada, para ter o direito de registar a minha filha.
Apoiados.
Sr. Presidente: não sou o que se pode chamar um sportman, mas há um jôgo que eu sobretudo aprecio, não pela destreza física que nos dá, para nos defendermos de agressões, mas pela linha moral com que nos leva a tratar todas as questões, e ao mesmo tempo porque há nesse desporto a regra elementar de se responder com o ataque.
O Sr. Ministro das Colónias, a quem a Câmara acaba de ouvir, e que já tem elementos para apreciar o assunto, não quis dizer que, quando esteve em Macau, deu 100:000 dólares ou patacas, devidamente autorizado, para o Clube Português, em Hong-Kong, e que, não sendo suficiente essa quantia, lhe prometeu mais um empréstimo de 20.000 patacas, garantido por meio de uma hipoteca do prédio a construir no território inglês, onde Portugal não podia construir prédio algum, a não ser para a legação, de maneira que a hipoteca, que era feita por intermédio do Banco Nacional Ultramarino, representava de facto uma hipoteca nula, e tanto assim, Sr. Presidente, que, continuando o clube a administrar-se mal, teve que fazer outra hipoteca, visto que aquela que tinha sido feita com a garantia do Govêrno de Macau ora completamente nula, por o Govêrno Português não poder ter propriedades em Hong-Kong.
Procurei evitar que isso se fizesse, sem
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comunicar nada para o Ministério das Colónias, sem fazer alarido, como outras tantas cousas; porém, repito mais uma vez êste acto que pareço de ma administração, mas do uma boa intenção, deve merecer por isso uma certa indulgência por parte daqueles que tem de o julgar, o eu mio fiz mais do que apontar à Câmara para, ela bem apreciar a forma como eu procedi.
O Sr. Presidente: - Devo prevenir V. Exa. do que já são horas do se passar ao período ao antes de se encerrar a sessão.
O Orador: - Nesse caso, peço a V. Exa. o obséquio de me reservar a palavra para a sessão de amanhã.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes temias, restituir as notas taquiyráficas que lhe foram enviadas.
Os "àpartes" não foram revistos pelos oradores que os fizeram
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Marques Loureiro: - Sr. Presidente: no Diário de Noticias de hoje vem, sob a epígrafe "Interesses do Mirandela", um telegrama em que se comunica o regosijo que ali lavra em virtude do uma oferta feita pelo Sr. Presidente do Ministério do 2:000$, para obras urgentes a efectuar nessa região.
Sr. Presidente: numa época de penúria, como é aquela em que nos encontramos, uma oferta do 2.000$, em vésperas de eleições, à alguma cousa, pois não é para acreditar que o telegrama seja falso, ou menos verdadeira a notícia dada por êsse jornal.
É claro que um vigário a mais ou a menos a diferença é pequena; mas êsses escudos não poderiam, em caso algum, ser motivo para grande júbilo, porquanto não se trata de obras urgentes a efectuar naquela região, e, ainda, porque o fim que se lho atribuí é para cemitério ou fonte.
Isto daria motivo a um comentário alegro se a ocasião só compadecesse com isso, porque não se compreendo que aos eleitores só fosso dar agora uma fonte.
quando ao que êles estão acostumados é a vinho.
Eu represento o círculo de Silves, e como quem não tem padrinhos morro mouro, e como eu os não possuo, o círculo do Silves não teve um centavo neste bodo.
Eu sei também que o Sr. Ministro do Trabalho, seguindo aquele aforismo popular, de que quem parto e reparte e não fica com a melhor parte é tolo, o porque S. Exa. não é tolo, conseguiu que para o se a distrito de Aveiro se arredondasse a importância para GO contos, isto é, cinco dúzias perfeitas e completas.
Por tudo isto, Sr. Presidente, ou desejaria que o Sr. Presidente do Ministério esclarecesse o representante dêsse eficulo de Silves, que aqui quere esquecer se que é Deputado da Nação, dizendo que não PO trata de 2,000$, que é uma ironia pungente, ou que só trata apenas de um conto do vigário.
Esta distribuição, Sr. Presidente, não é apenas imprópria da hora que passa; excede ainda o motivo que provocou o despedimento, caso inédito, do nosso ilustre colega, Sr. Alfredo de Sousa, do Ministro do Trabalho, pelo facto do ter feito uma modesta distribuição de 70 contos.
Estou certo, Sr. Presidente do Ministério, que V. Exa., como Ministro das Finanças, não deixará, de animo leve, que por aí fora se murmure sôbre esta distribuição de 274 contos.
Creio que V. Exa. não sancionará estas generosidades.
Eu queria referir-me largamente a êste assunto, o por isso pedi a palavra para antes da ordem do dia, mas, como êsse período foi gasto com a discussão de uma proposta de lei, não me foi possível falar então, motivo por que uso agora da palavra, no período destinado para antes de se encerrar a sessão.
Não é, porém, esta a ocasião de poder alongar-mo nas considerações que tinha a fazer.
Limitar-me-hei, por isso, a estas breves palavras que estou pronunciando.
Mas não ficará aqui esta questão, que é de uma alta moralidade.
Tenho de reconhecer que razão tínhamos nós, Deputados do Partido Nacionalista, quando, na discussão dos duodécimos, pela boca do Sr. Pedro Pita, que
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levantou a questão do reforço destas verbas, nos insurgíamos contra o facto de essa discussão ser feita de afogadilho, e prevíamos que nos havia de causar arrependimentos a circunstância de não fazermos obstrucionismo.
Vemos que mais uma vez fomos ludribiados.
Não digo que as povoações contempladas não necessitem dos melhoramentos que se lhes quere dar, mas sei que outras há que mais necessitadas estão dêsses melhoramentos.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): - Sr. Presidente: as considerações produzidas pelo Sr. Marques Loureiro relativas, propriamente, à distribuição de verbas destinadas a fontes e cemitérios.
O Sr. Ministro do Trabalho responderá a S. Exa., expondo, certamente, a orientação que presidiu a essa distribuição.
Sôbre a parte das considerações de S. Exa., para-a qual chamou a minha atenção, fazendo referência a uma notícia de jornais, tenho a dizer que o Ministro das Finanças não dispõe de verbas para distribuir.
Talvez que o telegrama que S. Exa. leu, se refira a uma pequena verba de 12 contos.
Eu explico o caso.
Os dedicados e zelosos funcionários da Inspecção de Câmbios têm direito a receber o produto de multas aplicadas, mas tendo sido atacados de perceberem grandes Vencimentos por virtude daquele seu direito, resolveram não se utilizar dele, e tendo recebido há pouco tempo uma quantia - 12 contos - proveniente de multas, puseram-na à minha disposição, como consta duma portaria publicada no Diário do Govêrno, para ser distribuída como o foi, em verbas de 1 e de 2 contos por vários hospitais.
Uma das entidades beneficiadas foi efectivamente o hospital de Mirandela, que obteve o subsídio do 2.000$00.
Falou S. Exa. em malbaratação dos dinheiros públicos, mas não me parece que as verbas destinadas a ampliação de reparações de cemitérios seja um dinheiro mal gasto, sabido como é que a maior parte deles, não correspondendo já às exigências do momento, constituem, por vezes, um perigo para a saúdo pública.
Tratando-se duma verba relativamente pequena o Ministério do Trabalho, não poderia atender todas as freguesias do País, o, por isso, o Sr. Ministro se limitou a auxiliar aquelas que haviam reclamado mais instantemente.
Tenho dito.
O Sr. Ministro do Trabalho (Sampaio Maia): - Pedi a palavra simplesmente para dar uma explicação ao Sr. Marques Loureiro.
Ao Ministério do Trabalho por intermédio da Direcção Geral de Saúde constantemente vêm chegando notícias de que em vários cemitérios do País se fazem enterramentos ao fim do dois e três anos. Não só pelo que o facto reveste de atentado à moral, mas ainda pelo perigo que dele resulta para a saúde pública, o Ministério do Trabalho procurou intervir dentro das suas possibilidades, não sendo possível acudir a todas as freguesias porque da verba disponível apenas caberia a cada uma 19$. Segui, assim, outro critério o procurei auxiliar apenas aquelas que mais insistentemente vinham reclamando êsse auxílio.
Não vi que lá estivesse o requerimento da freguesia do Sr. Marques Loureiro.
O Sr. Marques Loureiro (interrompendo): - Eu falei rio meu círculo, e não em qualquer freguesia em especial.
O Orador: - Todos os requerimentos foram atendidos, quer da extrema esquerda, quer da direita.
Se V. Exa. pode afirmar aqui que a sua freguesia tinha lá o seu requerimento e eu o não atendi, então o caso é diferente, mas não me parece que o possa dizer.
Repito, o critério que eu adoptei na distribuição da insignificante verba de 274 contos, para fontes e cemitérios, foi o de atender todos os requerimentos que tinha em meu poder, partissem de onde partissem.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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34 Diário da Câmara dos Deputados
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: não era a esta hora em que eu desejava fazer esta pregunta ao Sr. Presidente do Ministério, mas, já que no período de antes da ordem do dia começaram a ser Introduzidos projectos que v9o ter larga discussão, eu, pedindo desculpa à Câmara o ao Sr. Presidente do Ministério, entendo que. como representante da Nação, não posso deixar do fazer esta pregunta.
Sabem todos, Sr. Presidente, que a questão dos fósforos, devido à maneira apressada como decorreu a sua apreciação, deu o bonito resultado que todos estamos vendo.
Pois bem. No dia 30 de Abril do próximo ano termina o contrato com a Companhia dos Tabacos, e eu pregunta ao Sr. Presidente do Ministério se o Govêrno pensa em deixar em errar o Parlamento sem, com a antecedência devida, aqui trazer uma proposta que sirva de base a um estudo que é indispensável fazer se antes do Parlamento se encerrar.
Podem as conveniências partidárias querer encerrar o Parlamento, mas é um crime não se discutir a questão dos tabacos.
Em tais condições, eu, chamando a atenção do Sr. Presidente do Ministério para esto assunto, quero marcar bem a nenhuma responsabilidade que nós, dêste lado da Câmara, temos se, porventura, êtse assunto não se tratar antes do Parlamento se encerrar.
Imagine V. Exa. que a Câmara resolve entrar no regime da liberdade de fabrico ou que se abra um concurso público para a exploração da indústria dos tabacos.
O novo Parlamento abre em Dezembro, leva largos dias a rever a Constituição, vêm as férias do Natal, estamos depois em Fevereiro, e eu pregunto se há tempo para se discutir o tratar largamente o assunto.
Se o Govêrno não trouxer uma proposta bem fundamentada sôbre êste assunto, para ser ainda apreciada por êste Parlamento, é um crime muito maior do que o dos fósforos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães):- Sr. Presidente: acho deveras extraordinária a pregunta do Sr. Carvalho da Silva.
S. Exa. vem repetindo já há dois ou três dias que o Govêrno está moribundo, que já não é o Govêrno que tem de responder aos casos da mais ligeira importância, o agora aparece com opinião diferente. Agora já é S. Exa. que quere que eu preparo um assunto que é o Parlamento que tem de resolver.
V. Exa. sabe essas cousas perfeitamente, mas está a confundi-las propositadamente.
Não há dúvida de que, sob o ponto de vista financeiro, o problema dos tabacos tem uma importância que não é comparável à dos fósforos, nas, para a sua realização, não tem a mesma dificuldade que esta porque todos os edifícios, maquinismos etc., emfim, tudo o que constitue a indústria dos tabacos em Portugal, é propriedade do Estaco, emquanto que a propriedade que constitue a dos fósforos é propriedade particular. Passar da régie para outro sistema ou vice-versa trabalhos grandes dificuldades. Não se dá o mesmo com os tabacos. Podemos ir pura qualquer dos sistemas.
Já tive ocasião de dizer - e não é porque eu entenda que não se deva, no emtanto, ir pensando no assunto - que achava perigoso vir estabelecer bases ou apresentar proposta.
O novo Parlamento abro em 2 de Dezembro e podia ter uma opinião oposta. Dado um caso desta magnitude, eu até acho que seria interessante que os vários partidos políticos fossem para as eleições levando como um dos pontos a resolver a questão dos tabacos.
Entendo que a minha opinião pessoal do nada é preciso para nada sei vê agora.
Não vejo que seja êste o momento de se apresentar qualquer proposta sôbre os tabacos, embora eu entenda que o problema tem, pelo menos, tanta importância como o dos fósforos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Marques Loureiro: - Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para agradecer ao Sr. Presidente do Ministério o favor das suas considerações, lamentando, todavia, que S. Exa. não informasse suficientemente sôbre o assunto os pou-
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Sessão de 4 de Junho de 1925 35
cos que aqui estão, por assim dizer, por simples amor à arte.
Quanto às informações do Sr. Ministro do Trabalho, tenho somente a dizer a S. Exa. que não nasci ontem...
O Sr. Ministro do Trabalho (Sampaio e Maia): - ... Felizmente!
O Orador: - ... Felizmente! Vejo que a maior verba de todas é a destinada ao lavadouro em Tavira, 16 contos.
Os assuntos a que V. Exa. se referiu envolvem uma questão de alta higiene.
Eu conheço a terra, as condições higiénicas de Tavira. Ora V. Exa. não está, repito, falando para criancinhas, que não tenham - permita-me V. Exa. a expressão - olhos de ver.
Quanto ao restante, esporo que V. Exa. terá a gentileza de mós ceder, para que eu examine no seu Ministério os documentos.
Ora eu vejo que se inclui uma verba para o cemitério de Vila de Moinhos, verba que não é precisa. O cemitério está novo, espaçoso e tem, portanto, condições suficientes, mesmo que a cifra da mortalidade seja grande. Para S. Salvador, porém, que não tem dinheiro para fazer sequer a vedação, V. Exa. dispôs apenas de 500a. Ora eu creio que V. Exa. foi enganado, porque não conhece a localidade. O critério de V. Exa. não pode ser êste. V. Exa. põe: "para cemitérios ou fontes". V. Exa. está equivocado.
Esta moeda de 500 já celebrizada, que é do nosso tempo ainda, a moeda da Sr. D. Maria Pia, também V. Exa. a utilizou.
Mas eu acho que V. Exa. nos podia poupar a que lêssemos: "para cemitérios ou fontes". Não se sabe o que estas populações querem e o que V. Exa. deseja.
Eu bem sei que V. Exa. está aí para fazer uma política; mas política na mais nobre acepção da palavra. Favores aos amigos, mas justiça a todos - este é que é o grande critério!
Justiça a todos, porque não pode negar-se, e favores aos amigos, que é para isso que êles são amigos.
V. Exas. distribuam pelos distritos do País, aos governadores civis, um inquérito, e verificarão que quando as condições de justiça se igualam servem- se sempre os amigos, e é para isso que êles ali estão.
Mas não foi nada disto que S. Exa. fez; não atendeu à justiça. Como Sampaio Maia andou bem, como Ministro do Trabalho andou mal, e tam mal que lhe cabem as palavras que em tempos, conforme o que se lê no Diário das Sessões distribuído hoje, êsse meu correligionário disse a um antecessor de V. Exa.: "favores, se V. Exa. os quere fazer, faça-os da sua algibeira".
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, às 14 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores inscritos):
Parecer n.° 626, autonomia ao Hospital Escolar.
Ordem do dia:
A de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 23 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Projecto de lei
Do Sr. Correia Gomes, abrangendo nas disposições da lei n.° 1:158 os militares louvados no artigo 6.° do decreto de 22 de Outubro de 1910.
Para o "Diário do Governo".
Proposta de lei
Dos Srs. Ministros das Finanças e Marinha, autorizando o Govêrno a mandar construir, nos estaleiros nacionais, dois cruzadores-torpedeiros e quatro contra-torpedeiros; a encomendar no estrangeiro, e por concurso, um cruzador ligeiro e a montar três centros de aviação naval.
Para o "Diário de Governo" com o relatório.
Parecer
Da comissão de guerra, sôbre o n.° 917-C, que cria um sêlo comemorativo da Independência de Portugal.
Para a comissão de finanças.
O REDACTOR - Sérgio de Castro.