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RPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.° 80

EM 16 DE JUNHO DE 1925

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva

Sumário. - A sessão é aberta com a presença de 38 Srs. Deputados.

Procede-se a leitura da acta e do expediente.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Carlos Pereira justifica um projecto de lei que manda para a Mesa.

O Sr. Tavares de Carvalho protesta contra o jôgo de azar, respondendo o Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho), que depois apresenta uma proposta de lei sôbre as operações do recenseamento eleitoral em vários concelhos.

O Sr. Jaime de Sousa refere-se a noticias propaladas acerca dos oficiais presos em Elvas.

O Sr. Alberto Cruz requere a discussão dos projectos de lei n.ºs 840 e 847.

O Sr. Sousa da Câmara refere-se ao exercício da indústria do guano, prometendo o Sr. Ministro do Interior transmitir as suas considerações ao Sr. Ministro do Trabalho.

Os Srs. Carvalho da Silva, Pedro Pita e Cancela de Abreu apreciam a situação em que se encontram os oficiais presos em Elvas, respondendo o Sr. Ministro do Interior.

São aprovados requerimentos para a discussão de vários pareceres.

É aprovada a acta.

Ordem do dia. - Continua em discussão o negócio urgente do Sr. Rodrigo Rodrigues sôbre a provinda de Macau, usando da palavra os Srs. Velhinho Correia, Américo Olavo, Rodrigo Rodrigues, Ferreira da Rocha, Ministro das Colónias (Correia da Silva), Rodrigues Gaspar, Uno Neto, Jaime de Sousa, Pedro Pita, António Maria da Silva e Carvalho da Silva.

É rejeitada a moção do Sr. Rodrigo Rodrigues.

São aprovadas as moções dos Srs. Ferreira da Rocha, Velhinho Correia e Lino Neto.

O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte para o dia imediato, com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão, às 15 horas e 30 minutos.

Presentes à chamada, 38 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 53 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Ferreira Vidal.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
Armando Pereira de Lança.
Castro Agatão.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Custódio Martins de Paiva.
Francisco da Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Jaime Júlio de Sousa.
João José da Conceição Camoesas.
João de Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João de Sousa Uva.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Cortês dos Santos.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.

Entraram durante a sessão os Srs.:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Correia.
António Lino Neto.
António de Mendonça.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Delfim Costa.
Ernesto Carneiro Franco.
Feliz de Morais Barreira.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Rodrigo José Rodrigues.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Não compareceram os Srs.:

Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier do Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

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Sessão de 16 de Junho de 1925 3

Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João Vitorino Mealha.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Jorge Barros Capinha.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mariano Bocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.

Às 15 horas e 15 minutos principiou a fazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 38 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Leu-se a acta.

Deu-se conta do seguinte Expediente

Carta

Do Sr. José de Oliveira da Costa Gonçalves, apresentando o pedido de escusa do cargo de vogal substituto do conselho fiscal da Caixa Geral de Depósitos, para que foi eleito em 12 do corrente.

Comunique-se.

Representações

Do professorado primário do ensino geral e infantil, pedindo a revogação dos decretos n.ºs 10:729 e 10:776.

Para as comissões de instrução primária.

Dos gerentes contratados do Comissariado Geral dos Abastecimentos, pedindo para serem admitidos como funcionários de qualquer quadro especial.

Para a comissão de petições.

De José Antunes Marreiros, primeiro cabo de infantaria da guarda republicana, pedindo para ser considerado benemérito da Pátria.

Para a comissão de petições.

Telegramas

Dos empregados da Câmara Municipal da Feira, pedindo a aprovação do projecto de equiparação de vencimentos.

Para a Secretaria.

Dos advogados dos povos de Alares, Cegonhas e Condeixa (Castelo Branco), protestando contra as devastações, roubos e violências de que estão sendo vítimas pelo povo do Rosmaninhal.

Para a Secretaria.

Projecto de lei

Do Sr. Vergílio Saque, modificando â nomenclatura e classificação de categoria dos actuais aspirantes do quadro das Repartições Centrais e - Fiscalização Superior das Contribuições e Impostos.

Para a comissão de finanças.

O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de "antes da ordem do dia".

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Antes da ordem do dia

O Sr. Carlos Pereira: - Sr. Presidente: encontra-se prorrogada a sessão, ao que se diz, para votação dos orçamentos, porque o fetichismo orçamental é tanto nesta Câmara, que é possível nesta altura da sessão ainda não ter discutido p Orçamento Geral do Estado.

Também se quere aproveitar o tempo por tal forma que se diria que uma grande pressa, uma enorme vontade de trabalhar, invadiu a Câmara.

Estamos nós, Sr. Presidente, habituados a ver que êsse trabalho se inicia pelo aparecimento de vários requerimentos, atropelando-se na ânsia, todos, do fazer votar uma assemblea eleitoral ou qualquer outro projecto que, interessando muitas vezes à região, que sendo de atender por significar um progresso, muitas vezes não interessam ao país, Eu penso que se poderia roubar a êsse período, a essa febre, uns minutos para votar alguma cousa que interêsse à Nação.

E foi por isso que pedi a palavra para enviar para a Mesa um projecto do lei, que se resume apenas em cinco bases, mas que não tenho dúvida em dizer a V. Exa., Sr. Presidente, e afirmar à Câmara, que é daqueles que interessam mais profundamente à economia nacional.

Por êste projecto, pretende-se resolver de alguma forma o problema dos carvões em Portugal.

Quem compulso as estatísticas, verifica que os números de importação dos carvões em Portugal são qualquer cousa de aterrador, qualquer cousa que já de há muito devia ter chamado a atenção dos nossos homens públicos; mas êles encontram-se alheados dêsse problema, e quando acontece que um Ministro sobrenada por cima dêste quási aviltamento em que estamos mergulhados, os estudos feitos são relegados para campo secundário.

E o caso do Sr. Nuno Simões, que quando Ministro do Comercio nomeou várias comissões gratuitas para estudar assuntos que interessam à economia do país.

Nomeou-se uma comissão para estudar o problema dos carvões, e essa comissão desempenhou-se, em pouco tempo, dêsse encargo; pois os outros Ministros que se lhe seguiram, entendendo que isso não interessa ao país, fecharam os trabalhos feitos a sete chaves, para que o país nem sequer os conhecesse.

Nomeou-se também uma comissão para estudar o problema do crédito industrial, e nem sequer houve o agradecimento fácil" pelo trabalho não remunerado.

Em matéria de portos, tentou-se fazer o mesmo, e nós hoje sentimos que o Govêrno entendo que êste problema deve ser resolvido por essa forma episódica das juntas, que torna possíveis contratos como os do Funchal, que torna possíveis contratos que, se o Govêrno não lhes lançar imediatamente a mão, em vez de desenvolver a nação, atrofiá-la há.

Sr. Presidente: o projecto que tenho a honra de mandar para a Mesa visa a solução do parte do problema dos carvões"

Sabem V. Exa. e a Câmara que os capitais dificilmente acorrerão a auxiliar a indústria dos carvões, por uma razão elementar o simples: é que assentando toda a legislação no princípio do domínio do Estado, não é possível que as minas sirvam de garantia a qualquer cousa. Além disso, nos primeiros anos êsses trabalhos não são remuneradores, e por êste motivo não há capitais que se abalancem a fomentar essa riqueza nacional.

Por esto projecto, pretende-se que o Govêrno garanta o juro a título de empréstimo, para o que se criam certas receitas compensadoras e se dão facilidades às entidades exploradoras.

Sr. Presidente: tudo isto se fará sem trazer aumento de pessoas nem de despesa, criando-se um fundo de receita constituído pelo imposto de 6 por cento sôbre todos os combustíves sólidos ou líquidos entrados em Portugal.

Se á Câmara pensar que pode, mesmo no período de "antes da ordem do dia", dedicar-se ao estudo de um assunto desta natureza, suponho que presta um grande serviço ao país, e se não aprovar o célebre orçamento, votando isto, vota alguma cousa que vale tanto como êle.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Tavares de Carvalho: - Sr. Presidente: o Sr. Ministro do Interior chegou exactamente no momento em que eu desejava falar, e aproveito o ensejo para

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novamente protestar contra o jôgo que se está exercendo em Lisboa.

S. Exa. devia ter recebido um jornal em que se denunciam as casas em que se joga constantemente.

Eu peço para que só proceda com os jogadores nos termos da lei, e o Govêrno, que no meu entender tem procurado limpar a sociedade de alguns membros que ela não podia permitir no seu seio, deve fazer o mesmo aos jogadores, que constituem outra legião, que não quero classificar, mas que se torna necessário exterminar.

Espero que o Sr. Ministro do Interior, que tem usado de toda a energia para limpar a cidade de criminosos e vadios, use da mesma energia com as casas de jôgo, encerrando-as. De contrário protestarei contra a desigualdade de tratamento com os vadios que têm sido postos a ferros e deportados em relação a outros que frequentam as casas de jôgo e que nos termos da lei devem ser julgados como criminosos.

É necessário que contra as casas de jôgo se proceda, nos termos da lei.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho): - Ouvi as reclamações que mais uma vez o Sr. Tavares de Carvalho faz acerca das casas de jôgo.

Já por mais de uma vez chamei a atenção das autoridades competentes para que se cumpra a lei, em relação às casas de jôgo.

Sabe-se que apesar de todos os esfôrços, não se consegue evitar a prática de certos abusos. Se assim fôsse, não se praticariam os crimes. Mas a repressão contra o jôgo tem de fazer-se com a máxima energia.

Nisto estou de acordo com o Sr. Tavares de Carvalho. E nesse sentido tenho dado instruções ao Sr. governador civil.

V. Exa. falou-me num jornal, em que se denunciam casos. Também tenho recebido denúncias de que se joga, e por isso ordenei ao Sr. governador civil que procedesse nos termos da lei.

O orador não reviu.

O Sr. Tavares de Carvalho (para explicações): - O que eu desejo é que V. Exa. que tem tido energia para fazer cumprir as ordens dadas, para limpar a cidade de vadios, use da mesma energia nas ordens dadas às autoridades contra o jôgo, não consentindo que o Sr. governador civil receba dinheiro das casas de jôgo, a pretexto de assistência às casas de caridade.

Estimarei não ter necessidade de voltar a êste assunto. De contrário protestarei mais energicamente contra o abuso das autoridades receberem importâncias das casas de jôgo, a pretexto de assistência pública, dinheiro que muitas vezes não é aplicado convenientemente.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho): - Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de lei que tem por fim regular umas dificuldades que surgiram com relação ao recenseamento eleitoral do concelho de Beja e de três concelhos do distrito de Horta.

Pelo relatório que precede a proposta, vê-se que o concelho de Beja não tem o recenseamento eleitoral feito com aquela regularidade e aquela legalidade que são devidas, em virtude da falta do funcionário recenseador.

Portanto, os eleitores não podem ser prejudicados, em virtude da falta do funcionário que devia proceder ao recenseamento.

Também por outro lado em três concelhos do distrito da Horta se deram umas irregularidades provenientes de menos diligência da parte dos funcionários de justiça do tribunal, e não podem também aí os eleitores ser prejudicados por essa circunstância.

E entretanto - embora sôbre o assunto tivesse feito os convenientes estudos e ouvido mesmo a Procuradoria Geral da República - entendo ser mais curial trazer ao Parlamento uma proposta de lei para o mesmo se pronunciar sôbre o assunto com toda a liberdade.

Não me julgo habilitado a publicar pelo Ministério do Interior qualquer decreto muito embora o parecer da Procuradoria Geral da República assim o aconselhe.

O orador não reviu.

O Sr. Jaime de Sousa: - O motivo que me levou ontem a pedir a palavra cessou já, mas um outro assunto apareceu que eu entendo que deve ser esclarecido com

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6 Diário da Câmara dos Deputados

urgência por parte do Govêrno. Corre pela pasta da Guerra.

Disseram ontem os jornais que os prisioneiros que se encontram no forte de Elvas fizeram requerimentos ao Ministério da Guerra a propósito da alimentação.

Os jornais bordam considerações sôbre êsse facto. Como sucede ser um tema que é costume ser explorado com frequência e, porventura, se presta a especulações políticas que não convêm no actual momento, julgo conveniente que o Sr. Ministro da Guerra, que nesta altura deve ter o conhecimento exacto do que se passa, diga à Câmara o que realmente sucedeu no forte do Elvas, para que as especulações se não produzam.

Como o Sr. Ministro da Guerra não está presente, e eu julgo que é necessário esclarecer êste caso de pronto, peço ao Sr. Ministro do Interior a fineza de comunicar ao seu colega da Guerra o meu desejo de que a Câmara e o País sejam esclarecidos ràpidamente sôbre o assunto, a fim de evitar que se façam especulações políticas sôbre um caso que, estou absolutamente certo, não tem fundamento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho): - Cumpre-me dizer ao Sr. Jaime de Sousa que satisfarei os desejos de S. Exa., isto é, que comunicarei ao meu colega da Guerra as suas considerações.

Tenho dito.

O Sr. Alberto Cruz: - Peço a V. Exa. Sr. Presidente, se digne consultar a Câmara sôbre se permite que os projectos de lei n.ºs 846 e 847 sejam discutidos antes da ordem do dia, mas, com prejuízo dos oradores inscritos, visto que, se assim não suceder, e êles continuarem incluídos no período de "antes da ordem do dia", sem prejuízo dos oradores, certamente nunca mais serão discutidos.

O Sr. Sousa da Câmara: - Sr. Presidente: eu peço ao Sr. Ministro do Interior a fineza de, em resumo, transmitir ao seu colega do Trabalho as considerações que eu vou fazer.

Em Lisboa, sobretudo nos bairros de Alcântara e Ajuda estão-se fazendo umas explorações de guano, que são tudo quanto há de mais grave para a saúde pública. Aquela indústria está ali sendo explorada como se estivéssemos no tempo do pai Adão.

Fazem apodrecer o guano por meio da água, e, assim empestam aquelas duas regiões.

Apesar de várias entidades oficiais e de alguns dos habitantes daqueles bairros terem já reclamado providências contra o facto, continua ainda tudo na mesma, isto é, quando continua a explorar-se de uma maneira irregularíssima.

Na Inglaterra, na Noruega e na Suécia há uma exploração enormíssima de guano.

E ela faz-se sem as emanações deletérias prejudicarem seja quem fôr, porque se empregam autoclaves onde se faz a redução a soco, e, onde o guano é preferível, visto que chega a aparecer no mercado com 8 por cento, ao passo que os nossos guanos não têm mais de 1 por cento, indo o rosto para as pituitárias dos habitantes.

Nestas condições, eu peço providências ao Sr. Ministro do Trabalho, porque quem não tem capitais para explorar qualquer indústria, não a explora, e especialmente esta que, pela maneira como está sendo exercida, bastante incomodativa e prejudicial está sendo a muitas pessoas.

Se êsses indivíduos desejam realmente fazer essa exploração, que consigam os capitais necessários para adquirir os materiais precisos, como de resto se faz em todos os países cultos.

Quem não pode não se mete a explorar estas indústrias.

Peço a V. Exa. para transmitir ao Sr. Ministro do Trabalho estas minhas considerações.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior, (Vitorino Godinho): - Ouvi a exposição do Sr. Sousa da Câmara e vou apressar-me a transmitir ao Sr. Ministro do Trabalho as suas considerações que me parecem de todo o ponto justas.

Com a maior urgência vou transmitir ao Sr. Ministro do Trabalho as considerações de S. Exa.

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O Sr. Sousa da Câmara: - Agradeço a V. Exa.

O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: nesta horta que para o Sr. Ministro do Interior é o País, em que S. Exa. dispõe da liberdade de toda a gente, o Sr. Ministro do Interior tem presas pessoas por supostas acusações de terem entrado no movimento de 18 de Abril e que nenhuma responsabilidade têm nesse movimento, porque provam onde estiveram.

Estão dezenas de pessoas presas nos fortes, impedidas de ganhar a sua vida para sustentarem as suas famílias.

Chamo a atenção do Sr. Ministro do Interior apelando para os seus sentimentos democráticos e liberais para êste caso.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho): - Cumpre-me dizer a V. Exa. a que ninguém mais que o Govêrno tem desejo que se façam êsses julgamentos o mais ràpidamente possível.

Naturalmente encontram-se presas pessoas que estão indiciadas e oportunamente hão-de fazer a prova se estavam ou não estavam implicadas no movimento.

Como V. Exa., ea lamento também que se encontrem presas, porventura, pessoas inocentes.

Transmitirei aos meus colegas das pastas por onde correm êsses assuntos os desejos de V. Exa., que acredite V. Exa. são também os desejos do Govêrno.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita: - Sr. Presidente: falou agora o Sr. Ministro do Interior no desejo que S. Exa. tem, e o Govêrno, de que, ràpidamente, se ultimem os processos para apurar as responsabilidade? daqueles indivíduos que estão presos.

Ontem os jornais trouxeram a notícia de que alguns dos oficiais presos tinham requerido autorização para serem passados para prisões de criminosos comuns para o efeito de poderem trabalhar é consequentemente poderem auferir os proventos necessários para o seu alimento.

Acho grave que êste facto se dê.

Apoiados.

Presos políticos a sofrerem necessidades e privações, pertençam êles a que grei pertençam, é grave.

Mas o que é certo é que são presos políticos que em toda a parte, e sempre, tiveram determinadas vantagens sôbre os presos de delito comum, vantagens que a própria Constituição lhes assegura.

Êste assunto portanto, repito, é de grande gravidade.

Apoiados.

Vi hoje nos jornais que alguns oficiais baixaram ao hospital com sintomas de envenenamento.

O facto já sucedeu na Escola de Guerra um dia, podendo atribuir-se, como foi dito, a uma bataria de cobre da cozinha, que estivesse mal limpa.

Não pretendo fazer uma especulação política sôbre isto; entendam-se bem as minhas palavras que nem sequer têm o intuito de vir para aqui armar em protector de presos, nem servir-me desta circunstância para atacar o Govêrno.

Venho apenas lembrar ao Govêrno que êsses indivíduos são presos políticos, que, em face da própria Constituição, devem ter um regime prisional especial diverso e melhor que os presos de direito comum.

Apoiados.

Não é justo nem humano que se coloquem êsses indivíduos em situação de virem pedir para serem tratados como os presos do delito comum (Apoiados) o que prova que a situação dêsses oficiais é pior que a dêstes.

Apoiados.

É necessário ter cautela com êsses indivíduos que estão presos, para que o simples sintoma de envenenamento, ligeiros sintomas como se diz, se não traduzam em manifestações que dêem a característica de que êsses envenenamentos façam vítimas.

O Govêrno seria absolutamente responsável por êsses envenenamentos.

Apoiados.

Sr. Presidente: não quero, como há pouco disse, fazer outra cousa que não seja chamar a atenção do Govêrno para o facto.

Não posso evidentemente acusar o Govêrno, porque estou convencido que não seria justo acusar o Govêrno da responsabilidade de tais sintomas de envenenamento dos presos.

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Em todo o caso, o Govêrno tem a responsabilidade se êsses presos Mo forem tratados devidamente pelo que respeita à sua alimentação e ao regime prisional em que estão, de não observar um preceito que além de ser de natureza constitucional, é um preceito que cada político deve ter bem presente, lembrando-se, ainda que por outra razão não seja, de que "hoje por mim, amanhã por ti".

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho): - Sr. Presidente: o Sr. Pedro Pita reeditou as considerações feitas pelo Sr. Jaime de Sousa.

Ao Sr. Jaime de Sousa eu disse que transmitiria as suas palavras ao Sr. Ministro da Guerra e, do mesmo modo...

O Sr. Artur Brandão (interrompendo): -V. Exa. dá-me licença? ... Consta que o Sr. Ministro da Guerra se demite. V. Exa. poderia informar-me se tem fundamento essa notícia?

O Orador: - Não, porque não sou o Presidente do Ministério!

Sr. Presidente: transmitirei ao Sr. Ministro da Guerra as considerações feitas pelo, Sr. Pedro Pita, que, como disse, são, por assim dizer, as mesmas que fez o Sr. Jaime de Sousa2 excepto quanto a sintomas de envenenamento a que S. Exa. se referiu. Desconheço que qualquer facto anormal se tenha produzido. Por isso não posso dar uma resposta cabal a S. Exa. e a única, por agora, é esta: que vou informar-me janto do Sr. Ministro da Guerra, que não deixará, por certo, de dar uma resposta clara às preguntas de S. Exa. â

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Pita (para explicações): - Sr. Presidente: eu tive a cautela, quando falei em sintomas de envenenamento, de frisar que o tinha lido nos jornais e que não acusava o Governo...

O Sr. Nuno Simões: - Já vinha nos jornais de ontem.

O Orador: -... de ter feito tais envenenamentos. Citei até o caso de na Escola de Guerra só terem dado, uma vez, idênticos sintomas, que se atribuíam a uma vasilha de cobre.

O Sr. Ministro do Interior, quando me respondeu, falou em termos tais, que parece que eu tinha procurado, com êsses sintomas, fazer acusações a alguém ou um ataque ao Govêrno ...

O Sr. Ministro do Interior (Vitorino Godinho): - V. Exa. dá-me licença?... V. Exa. não pode supor isso. Não pode entrever-se nas minhas palavras qualquer juizo dessa natureza.

Eu disse apenas que desconhecia inteiramente o facto dos sintomas de envenenamento. Vi, todavia, nos jornais que alguns presos tinham pedido para mudar de regime prisional.

O Orador: - O que eu quero bem frisar é isto: que o meu carácter não me permitia fazer especulações políticas desta natureza.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu:-Sr. Presidente: eu desejava que, sôbre êste assunto, as explicações do Govêrno fossem mais concretas.

Não ouvi o Sr. Ministro do Interior declarar que se ia proceder a um rigoroso inquérito sôbre o caso.

Quere-me parecer que S. Exa. não tem de consultar o Sr. Ministro da Guerra, nem de pôr em dúvida as afirmações feitas acêrca do envenenamento de que foram vítimas alguns oficiais presos em Elvas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o requerimento do Sr. Tavares de Carvalho, relativo ao parecer n.° 860, cuja votação tinha ficado suspensa,

É rejeitado.

Em contraprova, requerida pelo Sr. Agatão Lança, é aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o requerimento do Sr. Tavares de Carvalho, para que seja incluído no período de antes da ordem do dia o parecer n.° 896,

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O Sr. Tavares de Carvalho: - Peço licença a V. Exa., Sr. Presidente, para modificar o meu requerimento no sentido de que o parecer n.° 896 seja discutido imediatamente.

O Sr. Presidente: - Não posso aceitar a modificação que V. Exa. pede o requerimento tem de ser votado tal como foi formulado.

Posto à votação, é aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se outro requerimento do Sr. Tavares de Carvalho para que seja igualmente incluído no período antes da ordem do dia o parecer n.° 871.

O Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar): - O Sr. Tavares de Carvalho já conseguiu fazer aprovar um requerimento em que pedia para entrar imediatamente em discussão determinado parecer.

Porque se não entra já nessa discussão em vez de estarmos a ocupar a sessão na votação de outros requerimentos igualmente apresentados por S. Exa.?

O Sr. Jaime de Sousa (sobre o modo de votar): - Eu sou dos que entendem que o parecer relativo ao estatuto do Tânger devia ser submetido à apreciação da Câmara isoladamente para poder ser votado com a necessária urgência.

Não se fez assim, e êsse parecer foi votado juntamente com outros, de forma que nos é impossível separá-lo agora.

Entre êsses outros está um que se refere à reorganização administrativa de Setúbal que não pode, evidentemente, ser discutido escalando a ordem do dia.

Êste parecer pode ser incluído no período antes da ordem, mas só sem prejuízo dos oradores inscritos e dos restantes pareceres que estão para ser discutidos nesse período.

O Sr. Almeida Ribeiro: - Sr. Presidente: V. Exa. pode dizer-me se o parecer de que trata o requerimento em questão se refere a alguma proposta do Govêrno e, não sendo, se tem o placet do Sr. Ministro das Finanças de forma a poder caminhar sem ir de encontro à lei travão?

O Sr. Presidente: - Este projecto de lei é da iniciativa do Sr. Joaquim Brandão e tem parecer impresso.

O Sr. Almeida Ribeiro: - Mas projectos de lei dessa natureza parece que vão contra as disposições da lei-travão.

O Sr. Presidente: - Já está admitido, visto que já tem parecer impresso.

O Sr. Almeida Ribeiro: - Mas mesmo assim não pode ter seguimento.

O Sr. Presidente: - O projecto de lei já está admitido, e a Mesa agora não sabe se êle traz ou não aumento de despesa.

O Sr. Almeida Ribeiro: - Mas eu poço à Mesa para averiguar isso.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Do parecer da comissão de finanças consta que o projecto de lei traz algum aumento de despesa.

O Sr. Almeida Ribeiro: - É indispensável então, em face da lei, a concordância do Sr. Ministro das Finanças, porque, embora a comissão de finanças não se oponha, reconhece, contudo, que há um pequeno aumento de despesa.

O Sr. Presidente:-Em virtude das disposições da lei-travão, invocadas pelo Sr. Almeida Ribeiro, não dou andamento ao requerimento do Sr. Tavares de Carvalho.

O Sr. Nuno Simões (para interroga)- a Mesa): - Sr. Presidente: desejava pedir a V. Exa. que me informasse sôbre a latitude e o sentido de urgência que a Mesa liga ao "imediatamente" usado nos últimos requerimentos feitos pelo Sr. Tavares de Carvalho; se, realmente, a discussão dos projectos de lei a que se referem os requerimentos de S, Exa. pretere mesmo a discussão já requerida anteriormente de outros projectos de lei.

O Sr. Presidente: - Não pretere, visto que os projectos de lei são inscritos no antes da ordem do dia a seguir aos que já lá estão.

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O Sr. Francisco Cruz (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: pedia, a V. Exa. para mo informar a que horas se entra na ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Faltam três minutos.

Há ainda na Mesa outro requerimento do Sr. Tavares de Carvalho para serem discutidos o parecer n.° 33j9 e os projectos de lei n.ºs 306-A e 900-A.

O Sr. Jaime de Sousa (para interrogar a Mesa):--Sr. Presidente: caímos definitivamente na confusão. Se eu bem compreendi as votações" que acabam de ser feitas, li á requerimentos para se discutirem imediatamente uns determinados pareceras, e há também um requerimento do Sr. Tavares do Carvalho para se discutir uma série do pareceres sem prejuízo dos oradores que só inscreveram ...

O Sr. Presidente: - Vou ler à Câmara os precisos termos do requerimento:

Para ser discutido imediatamente o parecer n.° 860, que torna extensiva aos alunos da Escola Naval a doutrina o garantias da lei n.° 1:679;

Para ser incluído no período "antes da ordem do dia" o parecer n.º 890, referente à "adesão do estatuto de Tânger";

Para ser discutido imediatamente o parecer n.º 241, sôbre a constituição do distrito administrativo de Setúbal.

O Orador: - Eu protesto contra isso, porque não é séria essa forma de escalar o uso da palavra.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi aprovada a acta.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Continua no uso da palavra, acêrca da questão de Macau, o Sr. Velhinho Correia.

O Sr. Velhinho Correia: - Sr. Presidente: entrei neste debate pelo muito amor que tenho à colónia de Macau, pois tive a honra de ser seu representante nesta casa do Parlamento, e a favor dessa colónia tenho empregado grande actividade.

O problema de Macau circula à volta do sou porto; falar de Macau é falar do seu pôrto; mas o que prendo mais a minha predilecção é um outro aspecto de Macau que é o problema económico o comercial.

Quando em Macau ou ataquei do frente êste problema fui recebido com sorrisos de descrença; mas hoje vejo que alguns anos depois essas pessoas levantaram a sua voz defendendo o trazendo justiça a Sanches do Miranda.

Falou-se ontem em manifestação de génio; para mim a construção do um porto exterior foi uma manifestação de génio, talvez um acto que nunca será bastante elogiado.

Sr. Presidente: referi-me ao problema dos caminhes de ferro, problema que tratei em dezenas de artigos e de que eu devia fazer um livro.

Os caminhos do ferro não se limitam só a Macau mas a toda a China. E um problema que precisa ser estudado com toda a atenção, pois prendo-se a questões do ordem económica, financeira e diplomática. Mas não, é só o problema dos caminhos de ferro, é o problema dos portos, da propriedade e da instrução.

O problema da instrução é dos mais interessantes, pois Macau não é uma colónia como as outras, podendo até dizer-se que é a capital do Extremo Oriente e aí devia ser estabelecida a Universidade do catolicismo do Extremo Oriente.

Sr. Presidente: eu vivi largo tempo em Macau o fui por lá eleito, não o tornando a ser por estar na guerra e até por adversários meus lá dizerem que ou tinha morrido.

Nesta Câmara em sessões sucessivas e até nocturnas eu patenteei o meu esfôrço pelo problema da navegação (Apoiados) e tinha aqui a meu lado o Sr. Rodrigo Rodrigues que me escutava com a maior indiferença, mas hoje reconhece que eu tinha razão.

O Sr. Ferreira da Rocha, meu amigo, também achou justas as minhas considerações.

Eu não pedi a palavra só para êste preâmbulo, mas sim para me referir a pontos a que só referiu o antigo governador do Macau.

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Macau tem todas as condições para poder viver sem auxílio estranho, embora deva dizer que se podia lazer uma cooperação entre portugueses, chineses e ingleses.

Argumenta-se com a questão de Mormugão, mas evidentemente que Mormugão não é a mesma cousa.

Sob o ponto de vista político Mormugão é absolutamente diferente de Macau; são dois portos destinados a servirem hinterlands diversos, cada um de sua nacionalidade.

Recear, portanto, para Macau o insucesso de Mormugão, é ignorar as condições geográficas, as condições económicas e as condições políticas dum e doutro porto, condições que são diametralmente opostas.

E fácil, às companhias de caminhos de ferro da índia isolarem e fazerem guerra ao nosso porto de Mormugão, porque todas elas estão sob a administração superior de Bombaim; mas em Macau não pode suceder o mesmo.

Sr. Presidente: eu sustento que as possibilidades de Macau são tam grandes que, uma vez construído o seu porto, o sucesso dessa colónia irá gradualmente sendo maior.

Receou o Sr. Rodrigo Rodrigues que em Macau acontecesse o mesmo que sucedeu em Mormugão e por isso aconselhou para Macau um entendimento com os vizinhos.

Como já demonstrei, o caso de Macau não é idêntico ao de Mormugão; mas ainda que assim fôsse não era aconselhável para Macau o regime que adoptámos para Mormugão o que tam maus resultados deu.

Mormugão serve um hinterland dum País que não é aberto ao comércio como a China, ao passo que o porto de Macau está em condições completamente diversas.

O caso de Lourenço Marques também não tem comparação com Macau; concorre com os outros portos para o hinterland e da África do Sul.

Não tenho dúvidas sôbre o êxito do porto de Macau.

Mas querem V. Exas. ver o que vale o pôrto de Macau, apesar do abandono a que foi votado e do seu açoreamento?

Em Lourenço Marques havia um movimento de 1:414 embarcações antes da guerra, mas em Macau êsse movimento era de 11 ou 12 vezes mais.

Os passageiros que durante o ano se servem do porto de Macau podem computar se em 500:000.

Assim, vê V. Exa., Sr. Presidente, o que valia o pôrto de Macau, abandonado e assoreado, no tempo em que êstes números foram colhidos, em comparação com um porto que tem custado tanto dinheiro à nossa administração colonial. E se compararmos também Macau com Mormugão, então a diferença é enorme.

O que prova isto, Sr. Presidente?

Isto prova o seguinte:

E que há possibilidades reais na exploração do porto de Macau, e que esta colónia tem condições de vida própria, sendo, quanto a mim, para lamentar a grande falta de fé - se é que a houve do antigo governador, supondo que Macau não podia viver e vingar por si mesma.

Reparem ainda V. Exa. as nestes números, que são interessantes:

Leu.

Ora imaginem V. Exas.: 47 milhões de patacas, ao valor médio da pataca nesse ano, ou sejam 12$, são uma cousa parecida com 600:000 contos. Quere dizer, é a sexta parto do movimento comercial de Portugal, visto que esto foi de 2.785:000 contos nos primeiros nove meses do ano de 1924, o que equivale a um total anual do 3.713:000 contos. E isto havendo ainda a atender que Macau tem apenas um comércio especial, visto que não é um porto de trasbordo do passageiros ou de mercadorias. E isto, repito, com um pôrto quási completamente abandonado e açoreado.

Quando eu estive em Macau, e uma vez ali foi o Adamastor, nós sabíamos que êle ali estava, mas não havia maneira de o vermos, tam longe êle teve de ficar, devido ao porto não ter fundo suficiente para elo se poder aproximar.

Quere dizer, o porto, apesar de apenas poder trabalhar com barcos de pequena tonelagem, tem êste movimento que V. Exas. acabam de ver.

E como não havia de ser assim se o delta do Sikiang é das regiões mais populosas do mundo?

Como não havia de ser assim, sabendo nós que, das povoações do delta, Cau-

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tão é um dos centros mais populosos do Oriente, havendo depois uma sério de pequenas cidades, todas elas, com 80:000, 90:000, 100:000 habitantes, e ligadas umas às outras?

Como se pode então conceber a falta de fé, a falta do crença, se houve falta do fé o de crença da parte do ex-governador, supondo que Macau não podia viver por si?

Sustento o seguinte: que tanto Hong-Kong como Macau podem viver no delta pelas razoes que acabei de apontar.

Sr. Presidente: repare V. Exa. e repare a Câmara que tanto Hong-Kong como Macau hão-de viver como portos livres; ha-de ir a Macau quem quiser ir a Macau, assim como há-de ir a Hong-Kong quem quiser ir a Hong-Kong.

É ver o movimento comercial de Hong-Kon, onde coustantemento há um grande número de navios ingleses, mas toda a gente sabe que no Extremo Oriente o movimento comercial americano, alemão o italiano é igual ao movimento comei ciai de Inglaterra.

Ainda que Hong-Kong consiga garantir para si a maior parte do comércio inglês não há razão para que o comércio que não seja inglês não vá a Macau.

Sr. Presidente: eram estas as considerações que tinha a fazer no que respeita ao porto; pelo que diz respeito ao caminho do ferro não posso também deixar de fazer alguns reparos à nota que foi aqui tornada pública, enviada pelo ex-governador de Macau à colónia vizinha do Hong-Kong.

Nessa nota sugestionava se a construção do caminho de ferro de Macau, não .para. Cantão, como era a aspiração da nossa colónia, mas para noroeste.

Pretendia ou alvitrava o Sr. ex-governador que o caminho de forro do Macau não se dirigisse para o norte, para Cantão.

Sr. Presidente: ou não sou capaz do compreender a razão dêste traçado, e muito gostava que o Sr. Ministro das Colónias me explicasse. Tanto mais que o traçado primitivo constituía afinal o objectivo da colónia.

Acresce ainda que êste traçado é feito com a preocupação constante do não fazer concorrência ao caminho de ferro de Hong-Kong a Cantão.

Mas pregunto: então não temos o direito à, vida no Extremo Oriente?

Para que semelhante preocupação?

Então vamos fazer um caminho de ferro, não para uma região rica, mas para uma região afastada dos centros comerciais, e, consequentemente, destinada a um insucesso sob o ponte de vista comercial?

Repare V. Exa., Sr. Presidente, e a Câmara, neste ponto de capital importância, tanto mais que esta questão não pode ser vista isoladamente do problema dos caminhos do forro da China, por isso que no dia em que o caminho de ferro de Hong-Kong a Macau fôr orientado para o norte, deve ter um formidável movimento.

Sr. Presidente: existem ainda razões de ordem local que são muito para ponderar na questão do traçado de caminho de ferro ser isto para o norte ou noroeste.

V. Exas. compreendem que é um grande absurdo económico ligar dois portos por em caminho de forro, apenas para servir um deles, o no caso presente é a essa conclusão que se chega.

Toda a gente sabe que José de Azevedo, no tratado que fez com a China, mas que não chegou a ter efectivação, reconhecia o direito a Portugal de explorar o caminho de forro de Macau a Cantão, política esta que deve ser seguida, porque, se nos integrarmos no caminho do ferro central chinês, valorizaremos o porto do Macau.

Sendo assim, como se explica esta variante para noroeste?

Sr. Presidente: eram estas pequenas considerações que desejava fazer, simplesmente anotações ao plano económico do antigo governador, uma das quais diz respeito à exploração do porto e a outra ao traçado do caminho de ferro.

Ainda sôbre a questão de delimitação, eu quero proferir breves palavras, a propósito de algumas referências feitas ontem pelo Sr. Ferreira da Rocha.

Sr. Presidente: sôbre esta importante questão é preciso não esquecer que devíamos fazer girar toda a nossa política em volta da nossa posse secular do porto interior de Macau.

Eu bem sei que não temos nenhumas probabilidades de convencer os chineses, mas como êste problema, mais tarde ou

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mais cedo, deverá ser resolvido por arbitragem, é aos árbitros que os nossos argumentos têm. de ser apresentados.

Sr. Presidente: a questão como foi colocada pelo Sr. Ferreira da Rocha é, sem dúvida, detestável para nós.

De um lado terra chinesa, do outro terra portuguesa, e nós queremos que as águas que separam estas duas terras sejam portuguesas.

Ora, salvo o devido respeito, suponho que a questão deve ser assim colocada: do um lado terra portuguesa, de outra terra contestada, e, no meio delas; águas que sempre foram portuguesas. E assim que, em minha opinião, o problema devo ser pôsto.

Dir-me hão, Sr. Presidente, que actualmente a situação não ô esta, mas o que é verdade é que, pelo tratado de 1887, emquanto não fossem feitos os limites, a situação da colónia seria a que era naquela data.

Eu quis frisar êste ponto, exactamente para marcar a minha discordância com o Sr. Ferreira da Rocha, a quem, aliás, presto a homenagem do meu muito respeito e consideração.

Antes do terminar quero declarar que me causa uma grande satisfação o verificar que o porto do Macau se constrói naquele local em que êle poderá ficar nas condições de ser um grande porto do abastecimento.

Como a Câmara vê, as ligeiras anotações que tenho feito não representam uma intervenção na questão que se levantou entre o antigo governador de Macau e o Sr. Ministro das Colónias. Subordinei as minhas considerações ao seguinte, que posso concretizar nestas preguntas:

Tem o porto de Macau condições de êxito?

São justificadas as obras dêsse porto?

Pode Macau viver por si só, uma vez que seja construído o seu porto?

Tanto quanto conheço do problema do Macau, posso afirmar que aquela nossa colónia terá assegurado o seu êxito logo que as obras do seu porto se levem ao fim como é necessário que suceda.

Havendo o porto de Macau nada explicará que a navegação vá para Hong-Kong, dadas as condições de situação dêsse porto de Macau.

Eram estas as considerações que eu tinha a fazer, todas de natureza económica e comercial, manifestando mais uma vez a satisfação que tenho em ver que as obras do porto de Macau são uma realidade.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi lida na Mesa e admitida a moção apresentada pelo Sr. Velhinho Correia.

É a seguinte:

A Câmara, reconhecendo que toda a vida de Macau se liga à vida e destinos do seu porto, afirma o propósito de lugar a cabo as respectivas obras que testemunham o nosso esfôrço para o ressurgimento daquela colónia, tornando efectiva a exploração do mesmo dentro do respeito devido pela nossa soberania e direitos seculares, sob a superintendência e orientação superior da Metrópole, como se preceitua nas leis orgânicas da administração colonial, e passa à ordem do dia. - O Deputado, Velhinho Correia.

O Sr. Américo Olavo: - Sr. Presidente: por parte da Acção Republicana, venho definir a atitude dêste agrupamento político em faço da questão de Macau e felicito-me por ter ocasião de render as minhas homenagens ao velho republicano, ao ilustre oficial e ao muito ilustre Ministro das Colónias, Sr. Correia da Silva.

A Acção Republicana entende que o Parlamento é um Poder do Estado, destinado a elaborar, interpretar e revogar leis, correndo-lho o dever de exigir as responsabilidades aos Ministros que não cumpram as leis nos termos em que elas hajam sido votadas.

Nestas condições a Acção Republicana não pode aceitar sem o seu protesto que o Parlamento - a Câmara dos Deputados - seja o local escolhido para se deprimirem desavenças entre superiores e inferiores.

Não tem a Câmara dos Deputados que resolver.

A questão de que se trata deve ser resolvida no Ministério das Colónias. São atribuições que competem privativamente ao Poder Executivo.

A Acção Republicana também lamenta que venham trazer para aqui a ascendência aristocrática do Sr. Ministro das Co-

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lónias, ou o plebeísmo do Sr. Rodrigo Rodrigues.

As democracias não conhecem privilégios de nobreza nem de plebeísmo.

Sr. Presidente: quem conhece o decreto n.° 7:008 de 9 de Outubro do 1920, sabe perfeitamente que o Sr. governador de Macau foi muito bem demitido.

Desde o momento que o governador duma província não quero subordinar-se à orientação do Poder Executivo, e consequentemente do Ministro das Colónias, não há outra cousa a fazer senão demiti-lo.

Quanto ao memorandum aqui lido, e que, deveria ter sido, a meu ver, a base de toda a discussão dêste caso nesta Câmara, não compreendo como o governador duma colónia pode negociar em nome do Govêrno Português sem que êste para isso o tivesse autorizado em condições absolutamente rigorosas e precisas.

Apoiados.

Eu faço esta declaração à Câmara para terminar as minhas considerações: Se eu fôsse governador duma colónia e um Ministro ousasse dirigir-me uma ordem para negociar nos termos de subserviência em que êste diploma está redigido, declaro que eu mandaria pelo telégrafo não o pedido da minha demissão, mas a notícia de que me tinha demitido imediatamente.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Rodrigo Rodrigues: - Sr. Presidente: antes do mais nada, devo agradecer a V. Exa. e à Câmara a atenção que tiveram para comigo suspendendo a discussão dêste assunto emquanto, por motivo de luto, estive ausente.

Compreendo que a atenção da Câmara esteja fatigada ao tratar-se dum assunto que é de ordem administrativa, quando assuntos de ordem política há mais interessantes e que mais a preocupam.

É esta uma assemblea Diais caracteristicamente política que administrativa, de forma que não é de estranhar essa fadiga e impaciência que notamos.

Se eu pudesse abreviar todas as respostas que tenho do dar, não só por atenção com aqueles que no debate intervieram, mas até por dever, se pudesse fazê-lo, com uma palavra só eu fá-lo-ia.

Não pode infelizmente ser assim, mas, no emtanto, eu vou, o mais ràpidamente que é possível, fazer referência a alguns pontos versados, afirmando mais uma vez o que desde o princípio tenho dito: que um assunto desta natureza precisa de ser estudado, ponderado devidamente no meio próprio para isso, que se pode ter lugar, sob o ponto do vista político, nesta assemblea, tem mais cabimento em qualquer das suas comissões.

Começarei, Sr. Presidente, por responder às considerações que foram feitas pelo Sr. Ministro das Colónias. Disse S. Exa. que, na minha resposta às afirmações por S. Exa. feitas, eu apenas procurei justificar, mas não fiz mais que confessar as acusações que por S. Exa. me foram lançadas. Não é, por certo, sôbre qualquer das nossas afirmações que a Câmara julgará.

A Câmara tem o seu critério, a sua inteligência, a ponderação suficiente para as apreciar, e só o estudo meticuloso da questão a esclarecerá devidamente.

Não houve um só facto por S. Exa. aqui apontado - alguns com um carácter tal, que não era evidentemente esta a assemblea onde devessem ser tratados - que não tivesse tido da minha parte a resposta precisa para demonstrar que S. Exa. não tinha razão.

S. Exa. aditou às anteriores mais duas considerações: uma a respeito do contrato do ópio, a outra referente e memorandum.

Como a êstes pontos se referiu também o Sr. Ferreira da Rocha, eu vou referir-me às considerações de S. Exa., respondendo ao Sr. Ministro das Colónias na altura devida.

No discurso eloquente e inteligente que o Sr. Ferreira da Rocha fez aqui sôbre
a questão que se debato, desejou S. Exa. afastar o facto da demissão do governador.

Evidentemente ela não tem importância alguma sob o pôrto de vista partidário, pessoal o até político, excepto naquilo em que pode interessar ao cumprimento da lei. Ora, sob êste último ponto de vista, eu, com a lei na mão, lendo-a com a boa fé com que eu julgo que se devem ler todas as leis, não posso estar de acordo com S. Exa.

S. Exa., sempre coerente nas suas afirmações, aqui, no Conselho Colonial, em

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todas as ocasiões, tem afirmado o princípio da centralização máxima do Poder nas mãos do Ministro das Colónias. A verdade, porém, é que não estão nestes termos as disposições legais, e S. Exa. mesmo o reconheceu dizendo que as bases tinham sido feitas no tempo em que predominava o espírito presidencialista na factura da Constituição de maneira a encontrarem-se disposições que se contrapunham umas às outras.

Assim, S. Exa. disse que os governadores das colónias devem estudar, combinar com os Ministros as providências que vão pôr em execução nas colónias, e sendo representantes do Poder Executivo devem estar integrados no modo de ver dos Ministros.

Mas não é êste o critério da lei.

Pelo contrário, marcando-se um tempo de governo aos governadores por essa forma se lhe indica que a sua função é independente da função política.

Quanto à competência de cada um dêstes organismos (Ministro, Poder Executivo, governadores, Conselho Legislativo o Executivo) as bases dizem terminantemente aquilo que podem e devem fazer, marcando de maneira nítida até onde vai a competência de cada um.

Julgo eu que, dentro dum regime que se regula pelas leis, que as põe acima de tudo, é a lei que nos deve servir de norma para podermos dar à sociedade a harmonia de que carece, o sem a qual não há administração possível.

Os governadores das colónias são sempre uns executantes da vontade do Sr. Ministro das Colónias?

Não é êste de maneira nenhuma o espírito a que obedeceu o Congresso da República fazendo a lei que fez.

S. Exa. ao terminar ontem a sua discussão definiu melhor ainda o seu pensamento referindo-se à desorganização administrativa.

Atribuiu todas as responsabilidades a esta administração.

Mal vamos, disse S. Exa., se não arranjarmos forma de voltar ao tempo em que os governadores eram homens feitos com as colónias, dedicados às colónias, encanecidos com o tempo.

Mal iria se não voltarmos àquilo que a República encontrou feito, o tem desorganizado.

Sr. Presidente: isto é suficiente para definir qual o critério que S. Exa. tem, que não é de maneira nenhuma o critério da legislação republicana.

Isto é suficiente para definir o ponto de vista que, aliás os factos contestam, porque temos para as nossas colónias, desde o advento da República, e devemos reconhecê-lo, tido algum progresso, realizado alguma cousa na administração das colónias, como em tanta outra cousa.

Haverá certa excitação, acção mal conduzida, como sempre sucede com todas as cousas em que os indivíduos têm que utilizar uma organização como - esta das colónias.

Compreendo que haja dificuldades, que elas só possam fazer sentir nestas relações entro o Ministério e as funções das colónias.

Mas não é isto motivo para condenar-se o sistema para todas as colónias.

A administração das colónias esteve durante anos concentrada no Ministério da Marinha.

A legislação republicana tem, portanto, disposições absolutamente contrárias àquelas que S. Exa. aqui disse; o muito particularmente à que acabei de ouvir ao Sr. Américo Olavo.

Diz o artigo 7.° da lei n.° 1:005:

Leu.

O Parlamento tem pois que intervir em assuntos desta natureza, entro o Conselho Legislativo, o Govêrno e o Ministro.

Como é que o Sr. Américo Olavo vem dizer que em assuntos desta natureza a Câmara não tem que intervir? Mais:

Leu.

"Obrigatoriamente" diz-se aqui:

Leu.

Então isto não vale nada.

E mau trazer o assunto aqui?

Interrupção do Sr. Almeida Ribeiro que não se ouviu.

O Orador: - Estou a dizer que tanto para êste caso como para outros não é possível haver uma disposição legislativa, visto que o Ministério das Colónias...

Leu.

Desde que os conselhos legislativos sabem que não podem publicar as suas resoluções, ainda mesmo nestas condições, não há possibilidade de transformar essas resoluções em diplomas definitivos ...

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O Sr. Almeida Ribeiro (interrompendo): - V. Exa. está inteiramente equivocado.

Eu conheço resoluções de conselhos legislativos que têm todo o aspecto próprio dum diploma legislativo.

Sôbre diplomas desta ordem é que os Ministros têm de pronunciar-se, submetendo-os à apreciação do Congresso sempre que deles discordem.

Não é, porém, desta natureza o caso presente: uma cousa é a lei o outra um simples parecer.

O Orador: - O que quis provar à Câmara foi que só há quem não cumpra a lei e procuro viver na confusão, não são os governadores mas sim o Ministério das Colónias que não só não define com exactidão a competência, de cada um dos organismos a que se refere a lei, como pratica verdadeiras monstruosidades que tiram ao respectivo Ministro toda a autoridade para interferir na vida administrativa das colónias.

Sr. Presidente: o Sr. Ferreira da Rocha afirmou que eu tinha um ponto do vista errado quanto à intervenção do Senado na escolha dos governadores.

Eu bem sei e nesse ponto eu estou de acordo com S. Exa. - que o Senado não elege porque sanciona apenas uma escolha.

Mas, se assim é, não se compreende que o Ministro, querendo usar das Mias atribuições de demissão, não tenha para com o Senado a atenção que deveria ter.

Não há, eu sei, qualquer disposição legal a êsse respeito, mas nem por isso se devia deixar de ter para com o alto Corpo Legislativo, que é o Senado, essa atenção.

De maneira que, neste caso concreto da demissão de um governador por divergência de critério com o Ministro, parece-me que êste não devia ser o único árbitro.

O governador tem as suas obrigações e os seus direitas, como o Ministro tem os seus.

Acho, porém, que nem um nem outro devem saltar por cima deles.

Sr. Presidente: o Sr. Ferreira da Rocha antes de produzir as suas considerações sôbre a acção do governador demitido, em relação à vida administrativa de Macau, fez três afirmações.

A primeira quando disse que o argumento de verosimilhança que aqui apresentei relativamente à acção do governador, e do que foram reflexo não só as negociações com Cantão, mas principalmente o célebre memorandum, o não convencia, antes pelo contrário, visto que oposto tinha todos os recursos para se construir, e não era, portanto, antes da sua construção, que não devia tratar da sua administração.

E, sendo assim, não era natural que na reunião que, se efectuou no Ministério das Colónias se falasse em tal assunto.

Ora S. Exa. leu, certamente, as actas das sessões do Conselho Colonial, e, sendo assim, deve ter visto lá que, precisamente, eu frisara que se devia tratar da administração antes de se pensar na construção. E, isto é o que usualmente se foz, pois que quem pensa na construção do uma fábrica, por exemplo, pensa primeiro na sua exploração.

Por isso mesmo, eu propunha que, antes de mais nada, nós nos preocupássemos com o problema da administração, a fim de se dar comparticipação nas despesas da construção aos que, mais tarde, entrassem na sua, exploração.

Eu afirmei sempre, repito, que ora absolutamente necessário tratar primeiro do problema da administração do porto de Macau, e, depois dêste resolvido, pensar então no da sua construção.

Quando cheguei àquela colónia enviei ao Sr. Ministro das Colónias um relatório, dizendo que o eixo da política de Macau e, o futuro daquela colónia estavam exactamente no problema da administração de seu porto.

E, para o demonstrar, procurei retinir todos os elementos de informação relativos às relações em que a colónia estava com os seus vizinhos, e, nos recursos financeiros dela.

Vejam V. Exa. como isto é lógico e consequente.

Portanto, vejam V. Exas. como eu estou, absolutamente convencido de que a garantia da segurança da colónia estará, principalmente, ligada ao seu porto. E, assim, aqui têm também a principal razão por que eu entendia que ora disso que devíamos tratar primeiramente.

Afirmou o Sr. Ministro das Colónias, no primeiro dia que tratou do assunto,

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que eu tinha, com uma grande falta de observância pelas leis, criado o exclusivo do ópio cru e da telegrafia sem fios.

Ora, é preciso que eu diga à Câmara o que são êsses exclusivos, para que ela melhor possa apreciar o caso.

V. Exa. sabe o que isto é, mas a Câmara é que precisa saber o que são êstes exclusivos.

Vejamos, por exemplo, o que é o exclusivo da telegrafia sem fios. A sombra de uma lei publicada em 1914 que permite a concessão de exclusivos durante alguns anos, lei que está em vigor em todas as nossas colónias, determinada companhia requereu que lhe fôsse concedido o exclusivo da exploração da telegrafia sem fios durante três anos, ou melhor, o exclusivo durante êsse período, da venda de aparelhos e acessórios destinados à montagem dessas instalações telefónicas, dando ao Govêrno uma participação nessa venda. Êsse exclusivo foi concedido pelo Govêrno de Macau.

Eis aqui o grande exclusivo da telegrafia sem fios que pela forma como foi apontado, poderá ter-se afigurado a muitos cousa tam importante como o dos fósforos, ou o dos tabacos em Portugal!

Outro monopólio a que S. Exa. se referiu é o do ópio cru. Eu já tive ocasião de expor à Câmara o que é o monopólio do ópio cru.

A colónia recebia um determinado número de caixas de ópio para preparar e consumir, sendo-lhe, ao mesmo tempo, permitida a entrada do ópio cru em trânsito.

Na ultima arrematação, anterior ao meu Govêrno, foi concedido a determinado indivíduo o exclusivo do ópio cozido. Mais tarde êsse indivíduo constituiu com outros uma companhia que começou a explorar o exclusivo da reexportação do ópio cru. Depois como não houvesse indicação do Ministério das colónias acerca do número de caixas que se podiam pôr em hasta pública, foi o contrato prorrogado por mais um ano, com a condição de pagarem mais 100:000 patacas. É isto um monopólio? São estas as ilegalidades cometidas pelo governador?

Tudo isto foi feito dentro das fórmulas legais, procurando sempre melhorar os interêsses do Estado.

Se essa é a acusação que podem dirigir ao governador demitido, creia V. Exa. que isso é melhor elogio do que aquele que V. Exa. me dirigiu tam benevolamente nas suas palavras.

Disse S. Exa. ontem no seu discurso que eu tinha confundido os três problemas mais importantes de Macau e daí a anulação das minhas boas intenções. Não sei onde é que S. Exa. encontra essa confusão.

Eu tenho a noção que o porto de Macau é a própria vida da colónia e que a política a fazer é uma política económica. Todos os esfôrços que se não façam neste sentido resultarão estéreis.

Se Macau fôsse uma praça de guerra, ou uma ocupação agrícola, evidentemente que devia ter uma função militar ou agrícola; mas, como é um porto de política económica, eu entendo que deve ser essa a sua política de orientação, porque é através do comércio que se tem feito a melhor política com a China, e esta não significa política de fraqueza, mas de interêsses económicos.

Acerca da questão do ópio fez S. Exa. uma erudita exposição, mas com a qual eu não concordo, porque entendo que devemos ligar os nossos interêsses aos dos nossos vizinhos.

Acerca da questão de os navios não ancorarem no quadro, pode V. Exa. ter a certeza de que desconhecia por completo o caso a que S. Exa. se referiu.

A questão do ópio é uma questão que se pega a muita gente - como se diz em Macau - e eu estava tam confiado que tinha procedido de harmonia com os altos interêsses do Estado que não tenho documentos no meu dossier.

Qual era a situação da questão do ópio em Macau?

Havia uma convenção com a Inglaterra que garantia um certo número de caixas até Janeiro de 1923. Daí para diante não podíamos garantir nada, porque não tínhamos direito a receber nenhum ópio. As negociações estavam correndo aqui, em Lisboa, e estavam-se fazendo por uma maneira que os ingleses nunca poderiam compreender que se fizesse senão para efeito de nos reduzir à expressão mais simples.

Quere dizer, convenção com a Inglaterra é uma convenção consequente da

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Conferencia Geral. Sendo essa Conferência marcada para 1922, como é que se fazia uma convenção com a Inglaterra para além dêsse prazo?

Nós tínhamos um acordo com a Inglaterra só até 1923. Daí para diante não podíamos garantir nenhuma quantidade de caixas de ópio para se fazer a praça. Nessas condições, foi prorrogado o prazo por mais um ano.

Em Janeiro de 1924 fez-se uma praça nas condições do acordo anterior.

Eu encaro o problema não só em relação a Macau, mas em relação ao seu todo.

O que posso afirmar por intuição, aliás clara, é que o porto do Macau é uma grande riqueza, mas é preciso que tenhamos mercados para os seus produtos.

Êle é bom, não só pela situação em que se encontra...

O Sr. Velhinho Correia: -Eu concordo com o que V. Exa. diz, o também sou da opinião que o problema deve ser apreciado em conjunto

O Orador: - Dirigindo-me ao Sr. Ferreira da Rocha, dír-lhe hei que foi muito amável para com o governador de Macau chamando genial ao meu parecer, e se fôsse homem de me envaidecer, com essa palavra ficada vaidoso; mas não, apenas fica o meu agradecimento. Mas, juntamenfo, S. Exa. foi injusto, excessivamente injusto e rigoroso.

Sr. Presidente: houve em tempos idos n aventura, a fé; hoje temos o génio comercial. Isso sim, é que é verdadeiramente genial.

Qual será o futuro para a colocação das nossas conservas, das nossas cortiças, dos nossos artefactos, do nosso vinho, se continuarmos a ser uma colónia dos ingleses e dos alemães, que levam os nossos produtos pura os falsificarem e os venderem depois?

É realmente digno de apaixonar um português êste problema, o foi isso que me absorveu completam ente, como já o confessei à Câmara.

Nunca supus que o problema de Macau, dêsse insignificante território sob o ponto do vista do seu tamanho, embora formosíssimo, rico e tentador, tivesse tanto reflexo na nossa vida nacional, ao ponto do poder garantir-nos a independência económica completa.

Pois não temos nós lá um mercado constituído por milhões de indivíduos que podem consumir os produtos que aqui nos sobejam, em compensação do que nos falta e que em Macau se produz?

O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): - V. Exa. dá-me licença?

A Espanha durante a guerra suspendeu quási todas as suas carreiras de navegação, mas deixou particular e especialmente a sua carreira para o Oriente, porqno essa sustentava a indústria de Barcelona.

O Orador:-De facto o problema do oriente impõe-se duma forma especial. E duma visão elementar para toda a gente, e, se o não é para nós, isso se devo ao facto de vivermos limitados ao prazer doentio de nos ferirmos uns aos outros.

Eu consegui libertar o meu espírito o ver alguma cousa do que pode ser o futuro administrativo e económico do Portugal.

Esta visão poderá ser genial, mas não representa mais do que a de regressar ao espírito da nossa raça, pondo em acção aquilo que foi o esfôrço dos primeiros homens que lançaram as lanchas portuguesas ao mar para o descobrimento dessas terras do Oriente.

Êste problema é verdadeiramente típico e não se compara nada com o problema das colónias do África.

O que se está fazendo?

Criou-se um porto. Não sei se tem ou, não condições para viver só por si. Há muitas dúvidas nisso.

A Câmara acabou de ouvir o Sr. Velhinho Correia garantir com números que o porto de Macau tem enormes condições de vida, e por outro lado o Sr. Ferreira da Rocha, com a sua voz autorizada, apresentou a êsse respeito um ponto de interrogação, dizendo:

"O porto de Macau não tem futuro marcado".

Estou convencido de que ou fazemos uma boa política económica em relação àquele porto o temos garantida a vida

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das nossas colónias da índia, ou nos desinteressamos e continuamos a administração que se está fazendo e não podemos ir buscar recursos à navegação que por lá passa, não tendo nem sequer receitas suficientes para o desassoreamento que é necessário.

Quem não tem fó no futuro de Macau? Sou eu, que o encaro com toda a largueza, ou são os que encaram o assunto apenas em relação à colónia?

É êste talvez um dos muitos romantismos de que sou acusado.

Eu vou provar com factos como o meu romantismo era prático, procurando ter a meu lado homens competentes para nortearem o problema, e vou expor as dificuldades que encontrei da parte do Ministério das Colónias.

Disse o Sr. Ferreira da Rocha que não há estudos sôbre o porto de Macau, como não há estatísticas.

É um facto. Pois bem.

Antes de ir para Macau, o governador demitido, logo nas primeiras conversas que teve com o Sr. Rodrigues Gaspar, lhe disse que entendia ser condição indispensável, para uma colónia que era acima de tudo um entreposto comercial, que houvesse um organismo que fizesse os estudos convenientes em relação à colónia e às suas ligações com a metrópole, e que tendo visto toda a organização da colónia não encontrava lá ninguém competente para êsses estudos.

E então eu propunha que fizéssemos alguma cousa, que era novo, mas que devia ir ao encontro do sentimento das classes industriais e comerciais portuguesas.

O nosso comércio e a nossa indústria esperam pouco do Govêrno. Desconhecem na sua maior parte a existência das riquezas que temos nas colónias e têm uma certa desconfiança em todos os relatórios oficiais.

Por isso eu solicitei que se nomeasse uma pessoa indicada pelas associações comerciais e industriais de Lisboa e Pôrto, que essa pessoa fôsse à colónia e ali observasse os diversos problemas, especialmente o do estabelecimento de uma carreira marítima e comercial entre a metrópole e Macau, enviando ao mesmo tempo um relatório sôbre o assunto às entidades por quem tinha sido nomeada.

Numa palavra, que se pusessse alguém competente ao lado do Governador, para com êle tratar de assuntos desta natureza.

Fiz a proposta ao Conselho Legislativo e fui às associações de Lisboa e Pôrto.

A Associação Comercial de Lisboa não compreendeu bem o problema, mas as Associações Comercial e Industrial do Pôrto reuniram e ficaram admiradas que houvesse uma tal parcela de bom senso. Não acreditaram; mas dizendo-lhes eu que ia com assentimento do Sr. Ministro, ficaram convencidos de que isso seria uma realidade e escolheram êsse homem, que julgaram ser o mais competente.

Como já disse, fiz a proposta ao Conselho Legislativo, e ela foi aprovada, ainda que com uma certa desconfiança de que se tratasse de um nicho para alguém. Veio para a metrópole, demorou por cá meses sucessivos, e, por fim, o Conselho Colonial deu-lhe o seguinte parecer:

Leu.

Procurei também criar um Conselho Económico, composto pelas seguintes pessoas:

Leu.

Pois bem, sôbre esta criação, que se me afigurara em extremo vantajosa, o Conselho Colonial disse o seguinte:

Leu.

E perante êste parecer, S. Exa., o Ministro, deixou suspensa a sua resolução, preguntando ao governador se da efectivação da sua idea resultaria êle ficar mal colocado perante qualquer compromisso que já houvesse tomado.

Aqui tem V. Exa., Sr. Presidente, e como esto caso podia trazer quási todos, como foi que o Conselho Colonial procedeu, a quem aliás não nego a ponderação que costuma pôr nas suas resoluções, mas sabendo-se que é a maneira como se apresentam as cousas que actua na maioria para ser tomada qualquer resolução.

Foi por isso que, como disse, me senti ilaqueado.

De todas as providências apresentadas só uma deixou de ser rejeitada.

Vou terminar, Sr. Presidente, deixando, evidentemente, de me referir a muitos assuntos; não quero, porém, deixar de frisar a questão do memorandum.

O memorandum só quem o não quiser ler, só quem não quiser conhecer os seus antecedentes é que não reconhece as in-

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tenções com que estava o Govêrno Inglês em relação a nós.

Êstes casos - mais uma voz o acentuo - discutem-se em face de números e de documentos, com a ponderação e estudo devidos. Serão V. Exas. que aqui tomaram um conhecimento muito rápido do assunto que virão considerar romântico, imponderado, insensato, tudo o que um homem que ali esteve com uma dedicação máxima, a estudar os assuntos, a ouvir todos os que nêles se interessavam, a procurar conhecer o que em relação a nós, portugueses, havia de ambições e de desejos? Não! É preciso que dêmos aos outros a parcela de justiça que queremos que se faça a nós! Eu não quero elogios. Magoam-me até os elogios que me dirijam os que vêm dizer-me que me consideram honesto e bem intencionado, porque honestos o bem intencionados somos todos nós! O que eu quero é quê me façam, pelo menos, a elementar justiça de me considerarem tam honesto, tam bem intencionado, tam patriota e tam republicano como V. Exas.! (Muitos apoiados).

Sr. Presidente: eu vou terminar o mais breve possível neste discutir desarrazoado dum assunto que era tam interessante, mas que não deve prolongar-se. Fica para a Câmara a impressão de que o caso da demissão do governador não tem importância, a não ser talvez' pela forma como foi feita, mas há um problema que frisei aqui e que não pode deixar de apaixonar profundamente todos os que se interessam pela nossa terra: é o internacional. É êste um grande problema, que reveste a maior magnitude. Não podemos viver isolados e aproveito agora o ensejo de responder à arguição do Sr. Ferreira da Bocha, quando S. Exa. disse que ou tinha a mania do estrangeirismo. Não a tinha; o que quis o quero sempre é evitar cousas futuras que desagradáveis nos possam ser.

Andei a negociar um acordo para a uniformidade de armamento com Hong-Kong. Aprroveitei a ocasião de lá estar o Sr. Gomes da Costa e pedi-lhe para saber se era possível fazer a uniformidade dêsse armamento.

Conhecia a situação delicada que o meu antecessor tinha lá encontrado. Compra-se material de guerra e não temos navios para o transportar, E um verdadeiro

museu ali. Cada governador compra lá o que quere. Mas é um museu que ninguém se entende nele.

Ora V. Exa. HS compreendem que à palavra dever andam ligadas as de ponderação e inteligência. Era aquela uma das negociações que eu trazia para apresentar ao Govêrno Português e não descansarei um momento. O Sr. Ferreira da Bocha acusou-me da minha vertiginosa acção o disse que foi ela que me prejudicou. Se assim foi, bem haja a afirmação que eu fiz de querer trabalhar num meio em que não há, por vezes, a coragem das responsabilidades!

Sr. Presidente: quando a gente lê a nossa História o procura inspirar-se no passado para nortear a sua acção no futuro, vemos em cada página casos desta natureza, em que indivíduos que trabalham e se dedicam a urna causa são mal compreendidos e às vezes anulados. A dificuldade está só em escolher nomes, porque êles são aos centos, infelizmente!

Mas ainda recentemente, quando os propagandistas da idea republicana vieram dizer ao povo que raiava uma era nova e quando esta idea apaixonou a gente do povo, alguns rotos e expoliados, houve alguém que cercou êsses homens, formando como que uma barricada...

O Sr. Brito Camacho (interrompendo): - A mim era para me matarem... V. Exa. bem sabe. Isto é uma simples anotação à História...

O Orador: - Na ocasião duma eleição houve um homem da natureza dêstes, que, procurando defender o direito do sufrágio, foi morto por uma bala da guarda republicana e pôde ainda escrever com o seu sangue numa parede um viva à República. E a República vive, viverá, creio-o firmemente! Mas é preciso que os exemplos nos sirvam!

Apoiados.

Eu considero-me em política um morto (Não apoiados). Fui chamado a exercer funções na República por três vezes. Duma dessas vezes, quando tratava de organizar a Penitenciária como um estabelecimento de produção fabril para os presos, com uma colónia agrícola em Alcácer do Sal e promovendo as levas para irem trabalhar para as estradas, foi en-

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tão que fui metido numa cela, onde tinha estado o assassino duma autoridade. Conservaram-me aí algum tempo, e senti que tinha morrido para aquele problema. Mais tarde, o homem que foi um grande republicano, o Dr. António Granjo, procurou galvanizar-me para pôr em resolução êsse problema; tentei, mas vi que não era possível, porque o homem que tinha superiormente orientado os degenerados, desde a sua prisão, ficara igualado a êles, e, portanto, sem autoridade para novamente os dirigir.

A terceira vez que o caso se dá é agora. Tomei realmente o problema de Macau a sério, e dediquei-me a êle com amor e entusiasmo, especialmente por ver, em face das nações estrangeiras, a nossa decadência nas colónias. Possuí-me do problema com paixão, mas recebi a paga que V. Exas. sabem - e não daqueles que estão do lado de lá da barricada, mas daqueles que estão a meu lado, ou, porventura, atrás de mim. Reconheço, também, que estou morto para êste problema.

Pois bem: garanto a V. Exas. que nem mais um cargo da Republica que tenha carácter político procurarei desempenhar! Mas não esmorecerá em mim, apesar de tudo, a fé republicana.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem. O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: - Sr. Presidente: não quero cansar mais a Câmara com o negócio sôbre o porto de Macau - temos cinco sessões sôbre a questão de Macau e a Câmara está cansadíssima - não porque não pudesse rebater, caso a caso, os argumentos apresentados pelo Sr. Rodrigo Rodrigues - mantenho a minha opinião afirmativa-mas porque julgo que a Câmara está já completamente elucidada.

Tenho sincera mágoa, Sr. Presidente, por ver que se trata de um homem que se apaixona pelas obras a que se dedica, mas, homem de Estado e não de paixões, tenho que apreciar a administração do Sr. Rodrigo Rodrigues apenas sob o ponto de vista das disposições legais.

E foi pena que S. Exa. não tivesse aliado às suas qualidades de homem apaixonado e de trabalho as necessárias qualidades de respeitador da lei.

Recuso-me, por consequência, a discutir os casos a que S. Exa. se referiu não o quero fazer, mesmo porque em alguns S. Exa. não tem documentos para me responder à letra, e eu não quero abusar da minha situação, e ainda porque outros não podem ser discutidos sem preparação prévia.

Em todo o caso, quero dizer que não posso dar o meu voto à moção apresentada pelo Deputado interpelante, porque nela se confunde o caso da exoneração do governador com a questão do porto de Macau.

O Sr. Rodrigo Rodrigues: - Não foi essa a minha intenção; quero os dois assuntos separados, porque mesmo que seja a Câmara toda e o próprio País - o que seria um milagre - a pedir-me, eu não voltarei a governar Macau.

O Orador: - Mas eu tenho que cingir-me à letra da moção e, repito, veja nela confundidos os dois casos, não podendo, por isso votá-la, e ainda porque entendo que a demissão do governador foi absolutamente legal.

De resto, a questão do porto de Macau pode ser estudada aqui; S. Exa. é Deputado e pode apresentar um projecto de lei nesse sentido.

Apoiados.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Colónias (Correia da Silva): - Sr. Presidente: não quero eu, por forma alguma, ocupar a atenção da Câmara além do tempo que me é devido nesta altura dum debate já tam prolongado; tenho, porém, obrigação de me pronunciar, não para rebater argumentos, porque toda a Câmara presenciou que ao passo que o Ministro das Colónias citou factos e apareceu na Câmara com todos os documentos, lendo os bastantes para confirmar as suas afirmações e pondo todos, como continuam, à disposição da Câmara, o Sr. Rodrigo Rodrigues, negando factos, alegou não possuir documentos, quando foi S. Exa., aliás, quem trouxe, para a Câmara a questão - todos os factos que eu citei estão, pois, plenamente

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documentados no Ministério das Colónias, vim para a Câmara com as devidas provas do que afirmei e pô-las à disposição de toda a Câmara!

Tenho porém ainda que me pronunciar sôbre as moções que estão pendentes,

Neste ponto, não posso deixar de reconhecer que, embora vindo dam campo que não acompanha o Governo., a moção do Sr. Ferreira da Rocha, em que se fazem apenas afirmações de respeito pela soberania nacional, de respeito pelo Govêrno da República o de respeito pela lei, merece a aprovação do Govêrno, Igualmente a moção do Sr. Velhinho Correia, semelhante em parte à primeira e tendo palavras de confiança no futuro de uma colónia, não pode deixar de ser aceito pelo Govêrno.

Mas a moção do Sr. Rodrigo Rodrigues, embora S. Exa. tenha pelas suas últimas palavras afirmado que ela não significa qualquer ligação do caso da sua exoneração com o problema do porto de Macau, não pode significar perante a Câmara senão aquilo que nela está escrito, e isso é a reprovação do acto do Ministro das Colónias que exonerou o governador de Macau por todos os factos graves de que se deu conhecimento à Câmara, envolvendo, é certo, a questão da exploração do porto, mas não exclusivamente por ela; portanto o Govêrno não a aceita.

Além disso, o caso do porto de Macau está resolvido legalmente pela consulta das entidades competentes, pelos despachos de quem tinha direito de os dar e, por último, pela resolução do Conselho Legislativo da colónia.

Mas, como muito bem disso o Sr. Ferreira da Rocha, se a Câmara pela iniciativa de qualquer dos seus membros, quiser ocupar-se dêle, o por um projecto de lei quiser opor-se ao que está feito, poderá fazê-lo; na fase presente, porém, o assunto está resolvido por quem de direito.

Apoiados.

Tenho dito.

O Sr. Agatão Lança (para um requerimento):- Sr. Presidente: requeiro que V. Exa. consulte a Câmara sôbre se permite a prorrogação da sessão até liquidação do debate,

Consultada a Câmara, é aprovado o requerimento.

O Sr. Rodrigues Gaspar: - Sr. Presidente: não tomarei muito tempo à Câmara, nem, propriamente, entrarei na discussão. Simplesmente, tendo sido citado o meu nome a propósito do assunto em debate, julgo-me no dever de dar algumas explicações.

A propósito da demissão do Sr. governador de Macau, quis o ilustre Deputado Rodrigo Rodrigues expor à Câmara o que pensava sôbre a administração daquela colónia.

Não se pode dizer que as sessões empregadas neste assunto tenham sido perdidas, porque, ao menos, verificou-se como na Republica se presta realmente atenção aos problemas coloniais.

Apoiados.

Àparte quaisquer manifestações, mais ou, menos apaixonadas, temos todos que reconhecer, quem atentamente tiver reparado na discussão, que o grande republicano que tem prestado muitos e valiosos serviços à República, que por ela se tem sacrificado, tem realmente uma grande alma de patriota.

Apoiados.

É realmente homem com uma dedicação extraordinária à causa pública; e se em muitos problemas não acertou precisamente na fórmula que mais conveniente seria pôr em execução, o que se não pode negar é a fé que elo tem demonstrado na sua exposição e o grande empenho que tinha de desempenhar o seu cargo de modo a que o nome português fôsse respeitado no Oriente.

Apoiados.

Sr. Presidente: foi S. Exa. realmente infeliz por não ter ao seu lado elementos indispensáveis, por vezes, para que fôsse empregada a devida fórmula aos actos de administração colonial; e é por isso que eu não posso deixar de reconhecer que se o modus faciendi não agradou ao Conselho Colonial, também não posso deixar de reconhecer a sua dedicação e fé republicana.

Estava contudo dentro da lei; e não podemos deixar de reconhecer que, desde que há divergências importantes, sob o ponto de vista de administração colonial, entro o governador e o Ministro das Colónias, tem o Ministro o direito de promover a sua exoneração, sem que daqui se possa concluir que nesse facto há qual-

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quer cousa que possa melindrar um homem que empregou todo o seu esfôrço nos assuntos da sua colónia.

Foi-lhe feita justiça; a Câmara viu bem a forma como êle tratou de justificar-se dessas acusações.

É um homem honesto, nada podendo dizer-se da sua probidade.

Que sinceridade elo aqui pôs na sua defesa!

O Sr. Rodrigo Rodrigues foi exonerado por divergência de fórmulas.

Ninguém pode negar a sua boa intenção de governar a colónia.

Reconheço o decreto do Sr. Ministro das Colónias de promover a sua exoneração.

Sr. Presidente: ouvi uma referência à minha pessoa quando Ministro das Colónias na ocasião em que partiu para governador de Macau o Sr. Rodrigo Rodrigues.

Devo dizer que estou perfeitamente de acordo com a declaração que foi feita por S. Exa. de que não recebera instruções de transmitir a qualquer governo estrangeiro qualquer cousa, relativamente à administração do porto de Macau.

E eu não precisava mesmo demonstrar à Câmara qual o meu ponto de vista sôbre o comércio com Moçambique e a União Sul-Africana.

S. Exa. explicou o que pretendia. Podemos divergir da fórmula, mas temos de reconhecer que S. Exa. estava animado de muito boas intenções, ao pretender estabelecer acordo, com o fim elevado de fazer progredir Macau.

Êste ponto de vista não pode deixar de merecer todo o nosso apoio, assim como êste outro de querer estabelecer carreiras daqui para Macau. Isto era, incontestavelmente, uma * grande obra que se pretendia realizar.

Também devo proferir algumas palavras sôbre o que se passou durante o Govêrno da minha presidência em relação à administração do porto de Macau.

O Sr. Ministro das Colónias, de então, pediu para êsse problema ser tratado em Conselho de Ministro, mas como o Sr. governador de Macau vinha a caminho da metrópole eu fui de opinião que se esperasse pelo seu regresso.

Porém, como S. Exa. logo que aqui chegou teve de ir, conforme já foi dito, para Genebra assistir à Conferência do ópio, como representante de Portugal, não se pôde tratar do assunto.

Por fim, devo ainda dizer à Câmara, com toda a lealdade, que- é pena que, quando se tratam questões desta natureza, que são verdadeiramente nacionais, por vezes a nota partidária venha introduzir-se no assunto. E, assim, eu ouvi uma referência a esta família democrática, que foi a seguinte: "dá-se a circunstância de que nem todos se dão".

E que aqui, quando se tratam assuntos de interêsse nacional, não há que tratar do embate entre correligionários.

É assim que a família democrática costuma proceder.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: - Sr. Presidente: a moção que eu apresentei foi uma moção em que deixei registados os princípios de doutrina que determinaram as minhas palavras.

Não considerei, nem considero êste debate como um debate político.

O que se tem discutido tem sido os problemas de Macau e a exoneração de um seu governador. Nada mais.

Os debates políticos são postos pelos leaders dos partidos ou pelos Ministros, e, especialmente pelos presidentes dos Ministérios.

Como ponto doutrinário apresentei a minha moção, e, suponho que é, nesses precisos termos, que o Sr. Ministro das Colónias disse que a aceitava.

E, se da aceitação dela se pudesse inferir qualquer nota política, eu imediatamente a retiraria.

Apoiados.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Lino Neto: - Como a hora vai bastante adiantada, eu limitar-me hei a mandar para a Mesa uma moção formulando o voto dêste lado da Câmara, porque sinto absoluta necessidade de fazê-lo.

Moção

A Câmara dos Deputados tendo-se inteirado da forma como tem sido ultimamente exercida a administração de Macau, afirma a necessidade de que, para

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esta como para todas as demais colónias, se mantenha a devida fiscalização por parte da metrópole e se aproveitem na conservação e desenvolvimento do nosso domínio ultramarino todos os elementos que para tal fim se mostrem eficazes, independentemente do preocupações anti-religiosas. - A. Lino Neto.

Lida na Mesa, foi admitida,

O Sr. Cancela de Abreu: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.

Feita a contraprova, confirmou-se a votação anterior, sendo a moção admitida por 67 votos contra 1.

Leu-se a moção do Sr. Rodrigo Rodrigues.

Foi rejeitada.

É a seguinte:

A Câmara dos Deputados, tendo tomado conhecimento das razões que motivaram a demissão do governador de Macau;

Considerando o assunto ligado a um alto problema da política colonial portuguesa de que a Câmara precisa ter perfeito conhecimento:

Convida a sua comissão de colónias a estudar devidamente o assunto da administração do porto de Macau para ser resolvido pela Câmara e passa à ordem do dia.

Sala das sessões, 4 de Junho de 1925. - Rodrigo J. Rodrigues.

Leu-se a moção do Sr. Ferreira da Rocha.

foi aprovada.

É a seguinte:

A Câmara dos Deputados, afirmando o propósito de não permitir que a exploração do porto de Macau seja subordinada a interêsses prejudiciais à soberania portuguesa; e repetindo que considera indispensável o integral cumprimento das disposições das leis orgânicas que regulam a superintendência da metrópole no governo das colónias e determinam a fiscalização dos actos da administração financeira colonial, passa à ordem do dia.- Ferreira da Rocha.

Leu-se a moção do Sr. Velhinho Correia.

Foi aprovada.

Leu-se a moção do Sr. Lino Neto.

O Sr. Jaime de Sousa (sobre o modo de votar). - É apenas uma declaração de voto em virtude da moção do Sr. Lino Neto, pois nesta' questão de Macau não foi posta a questão religiosa, não se tratando do Padroado do Oriente, e vejo agora, no final da moção do Sr. Lino Neto, referências a ataques a sentimentos religiosos e, como não compreendo, não voto a moção.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Lino Neto: - Não justifiquei a minha moção mais detalhadamente para não tomar tempo à Câmara, mas, desde que se levantam dúvidas da parte de um Sr. Deputado, tenho que a justificar.

O Sr. Ministro das Colónias acusou o Sr. Rodrigo Rodrigues de ter defendido a acção religiosa no Extremo Oriente, quando S. Exa., e muito bem, procedendo patriòticamente, permitiu a transferência de uma escola.

Se não são suficientes êstes factos, ainda poderei acrescentar que um dos primeiros actos do Sr. Ministro foi revogar o regulamento do Padroado do Oriente, na colónia da índia, dizendo que o assunto viria ao Parlamento.

O que apareceu aqui?

Apenas um projecto renovado pelo Sr. Almeida Ribeiro abolindo o Padroado do Oriente.

Trocam-se vários apartes e estabelece-se sussurro na sala.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.

O Orador: - É preciso respeitar as tradições do País.

Vi-me forçado a .estas considerações por virtude da declaração há pouco feita por um ilustre Deputado da maioria.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Pedro Pita.

O Sr. Pedro Pita: - Sr. Presidente: nenhuma dúvida teria em votar a moção do Sr. Lino Neto e ia votá-la sem quaisquer explicações.

A moção apresentada pelo Sr. Lino Neto é absolutamente doutrinária e a sua,

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doutrina não contende com a consciência de qualquer pessoa, católicos ou ateus.

Depois das declarações que essa moção provocou por parte do Sr. Jaime de Sousa e por parte do Sr. Deputado apresentante que a quis defender, eu carecia de dar estas explicações para poder votá-la à vontade.

Para nós, repito, a moção continua apenas a ser doutrinária e é nesse sentido que a votamos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Maria da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: não ouvi o Sr. Ministro das Colónias fazer qualquer declaração relativamente aos factos a que o Sr. Lino Neto acabou de referir se.

O Sr. Ministro das Colónias, com efeito, apenas tratou a questão sob o ponto de vista da mecânica das leis de pontabilidade pública, independentemente de preocupações anti-religiosas.

Evidentemente que a República Portuguesa não tem religião oficial.

Nunca teve preocupações anti-religiosas, porque se as tivesse não respeitava o seu estatuto fundamental.

O Sr. Almeida Ribeiro (em àparte): - Salvo no tocante a congregações religiosas.

O Orador (continuando): - Nestas condições êste lado da Câmara votará a moção do Sr. Lino Neto, única e simplesmente no sentido que acaba de ser /referido.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: eu desejava saber se V. Exa. abriu um debate especial sôbre êste assunto visto que me repugna discutir uma moção apresentada depois da discussão encerrada.

O Sr. Américo Olavo (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: o Grupo de Acção Republicana, que tem dado sempre as mais largas demonstrações de tolerância religiosa, não está, no emtanto, neste momento a moção do Sr. Lino Neto, não pelos termos em que ela está escrita, mas pelas considerações que o Sr. Deputado interpelante formulou depois e que demonstram uma intenção diversa.

O Sr. Ministro das Colónias (Correia da Silva): - Sr. Presidente: não posso deixar, em primeiro lugar, de agradecer ao Sr. Américo Olavo a sua atitude. Encontrando-se em frente de uma moção de carácter doutrinário, como era a do Sr. Lino Neto, S. Exa. votava-a; mas em presença das palavras desnecessárias do seu autor, fazendo acusações infundadas a um membro do Govêrno, aquele ilustre Deputado declarou não a poder votar.

Em, segundo lugar quero dar algumas explicações.

A manifestação feita pela Câmara ao Sr. Rodrigo Rodrigues,, quando S. Exa. teve aquela inspirada eloquência de dizer que iria carrear pedras para uma catedral só para fazer a pacificação da família portuguesa, e o silêncio que entendi manter não querendo interromper S. Exa., estabeleceu, porventura, na Câmara a idea de que o homem respeitador das crenças era o Sr. Rodrigo Rodrigues, embora irreligioso como S. Exa. se apresentou, e de que o homem opressor das crenças, embora também não viesse fazer profissão de religião alguma, era o Ministro das Colónias. Ora o Sr. António Maria da Silva já apresentou a questão como ela deve ser posta; eu apreciei o assunto sob o ponto de vista legal e financeiro.

Apoiados.

De resto, exerci já também o cargo de governador de Macau, e longe de ser um opressor, soube respeitar as crenças de todos, como sempre tenho feito; isso não tem impedido, porém, de ser sempre um cumpridor das leis.

Apoiados.

Referiu-se o Sr. Lino Neto, contudo, ao facto de se ter mandado suspender o Regulamento do Padroado do Oriente. Devo responder que fiz o meu dever, porque queria primeiro conhecê-lo.

Apoiados.

Se o Conselho Colonial, a cujo estudo o submeti, der o seu parecer afirmando que o regulamento se encontra feito legalmente, continuará em vigor; de contrário, não.

Não têm razão de ser, portanto, as palavras do Sr. Lino Neto, e eu, em nome

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do Govêrno, devo dizer à Câmara que vote livremente, porque se trata apenas duma moção doutrinária. As palavras de S. Exa. são inteiramente descabidas, e verdadeiramente me surpreenderam visto S. Exa. se ter mantido silencioso durante o debate, quando tudo se poderia ter esclarecido.

Apoiados.

Tenho dito.

O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: vendo em primeiro lugar que a moção do Sr. Lino Neto consigna princípios que aqui sempre temos defendido, e em segundo lugar que as considerações que O Sr. Américo Olavo entendeu formular vieram reforçar os motivos que nós tínhamos para a aprovar, declaro a V. Exa. que votamos a moção da minoria católica.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Posta ò votação, é aprovada a moção.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanha, à hora regimental, com a seguinte ordem de trabalhos:

Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscrevam): A que estava marcada. Parecei n.° 860, que torna extensivas aos alunos da Escola Naval e da Escola Militar a doutrina e garantias da lei n.° 1:679.

(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam): A que estava marcada. Parecer n.° 896, que autoriza o Governo a aderir à Convenção relativa à organização do Estatuto de Tânger.

Ordem do dia

A que estava marcada., menos o debate sôbre Macau.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 15 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Proposta de lei

Do Sr. Ministro do Interior, determinando que as operações do recenseamento eleitoral do concelho do Beja, a partir da afixação dos recenseamentos de 1925, sejam iniciadas após a publicação desta lei e a duração dos prazos reduzida a metade da fixada no quadro anexo à lei n.° 3, de 3 de Julho de 1913.

Para o "Diário do Governo".

Projectos de lei

Do Sr. Carlos Pereira, autorizando o Govêrno a impor aos concessionários de jazigos de combustíveis minerais uma produção anual mínima, fixada de acordo com as condições dos jazigos, possibilidade de transporte e consumo dos seus produtos.

Para o "Diário do Governo".

Do Sr. Pina de Morais, extinguindo o quadro dos actuais escriturários de 1.ª e 2.a classe do Ministério do Comércio e Comunicações.

Para o "Diário do Governo".

O REDACTOR - Herculano Nunes.

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