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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 90
EM 30 DE JUNHO DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. - É aberta a sessão com a presença de 42 Srs. Deputados, procedendo-se à leitura da acta, que é aprovada quando se verifica o número regimental, e do expediente, que tem o devido destino.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Alfredo de Sousa apresenta um projecto de lei regulando o decreto n ° 10 809, de 29 de Maio de 1925, e parte do decreto n ° 10:883, de 27 de Junho do mesmo ano. Depois de se estabelecer discussão, em que tomam parte vários Srs. Deputados, é aprovado um projecto de lei do Sr. Pedro Pita revogando o decreto n.º 10.883. Seguidamente são aprovados o projecto do Sr. Alfredo de Sousa, na parte em que não tinha sido prejudicado peia aprovação do projecto do Sr. Pedro Pita, um aditamento do Sr. Tavares Ferreira, e, um artigo novo do Sr. Felix Barreira.
Continua depois em discussão a proposta de alteração* do Regimento, usando da palavra o Sr. Paulo Cancela de Abreu, que não termina as suas considerações.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte para o dia imediato, com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 16 horas e 26 minutos.
Presentes à chamada 44 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 34 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
António Albino Marques de Azevedo.
João de Ornelas da Silva
António Augusto Tavares Ferreira.
António Ginestal Machado.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Francisco da Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Jaime Júlio de Sousa.
João José da Conceição Camoesas.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
José Cortês dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
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Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Teófilo Maciel País Carneiro.
Valentim Guerra.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António de Abranches Ferrão.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Correia.
António Lino Neto.
António Mendonça.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Ernesto Carneiro Franco.
Feliz de Morais Barreira.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João Estêvão Águas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José Carvalho dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Alegre.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Resende.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Augusto Pereira Nobre.
Bartolomeu dos Mártires do Sousa Severino.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Réis.
Francisco da Cunha Rogo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José do Amorim.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
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José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José do Oliveira Salvador.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Pelas 15 horas e 26 minutos, com a presença de 42 Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta e o seguinte
Ofícios
Do Ministério da Justiça, comunicando ter autorizado o Sr. Agatão Lança a consultar os processos existentes no Tribunal de Defesa Social, como requereu, devendo ser enviada à Direcção Geral de Justiça nota das certidões que precisar.
Para a Secretaria.
Do Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal da Nazaré pedindo a revogação do decreto n.° 10:776.
Para a comissão de instrução primária.
Justificação de faltas
Do Sr. Bernardo de Matos, nos dias 25, 26 e 27 do corrente, por motivo do funeral do Sr. Abílio Marçal, em que representou esta Câmara.
Para a comissão de infracções e faltas.
Representações
Da Associação dos Lojistas Barbeiros de Lisboa, pedindo para serem considerados operários, para serem isentos de contribuição.
Para a comissão de finanças.
Dos Ministros búlgaros emigrados, fazendo um apelo à consciência humana, contra as torturas do povo búlgaro.
Para a comissão de negócios estrangeiros.
De Vergílio Ferreira Marques, pedindo novamente o seu reconhecimento como revolucionário civil.
Para a comissão de petições.
Telegramas
Da Câmara Municipal de Barrancos, pedindo para ser estabelecida a faculdade de as câmaras municipais arbitrarem aos seus tesoureiros as melhorias que entenderem.
Da corporação dos sargentos de infantaria n.° 16, pedindo a extensão das disposições do projecto n.° 907.
Para a Secretaria.
Admissões
Projectos de lei
Do Sr. Deputado Viriato da Fonseca, alterando a redacção do artigo 17.° da lei n.° 1:452, de 20 de Julho de 1923 (Trabalho extraordinário).
Para a comissão de administração pública.
Dos Srs. Deputados Carlos Olavo, Américo Olavo e Pedro Pita, criando selos de designados valores, que serão obrigatórios na correspondência expedida pelas estações de correio do arquipélago da Madeira, nos dias 1 de Janeiro, 3 de Maio, 5 de Junho, 1 de Julho e 1 e 25 de Dezembro de cada ano.
Para a comissão de correios e telégrafos.
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Antes da ordem do dia
O Sr. Alfredo de Sousa: - (Foi ontem apresentado um projecto do lei pelo Sr. Pedro Pita, a fim de ser revogado o decreto n.° 10:809 ...
O Sr. Pedro Pita: - Ontem negaram o voto ao meu pedido, hoje como é apresentado por V. Exa. votam.
O Orador: - O motivo que V. Exa. invocou é o mais inocento, êsse da criação das comarcas, pois o Estado não tem nada que despender. Tia, porém, outras disposições que Silo ofensivas desta Câmara e até do próprio Poder Executivo: é o que se refere aos júris.
Mando para a Mesa um projecto pedindo para êle urgência o dispensa do Regimento.
É o seguinte:
Artigo 1.° Ficam revogados o decreto n.º 10:809, de 29 de Maio do 1925, e as disposições constantes do decreto n.° 10:883, do 27 de Junho do mesmo ano, com excepção das estabelecidas nos artigos 16.°, 17.°, 18.°, 19.° e respectivos parágrafos dêste decreto, as quais são mantidas pela presente lei.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.- Alfredo de Sousa.
O Sr. Pinto Barriga: - Eu tinha mandado para a Mesa um negócio urgente que é interessante tratar com os to assunto.
V. Exa. não a põe à votação?
O Sr. Presidente: - Não há número para votações.
O Sr. Pedro Pita: -Pedia a V. Exa. para logo que houvesse número consultar a Câmara sôbre se permite que entre em discussão o projecto que ontem mandei para a Mesa, isto depois do parecer n.° 350.
O Sr. Lopes Cardoso: - V. Exa., Sr. Presidente, diz-me se o negócio do Sr. Pinto Barriga prefere a outro?
O Sr. Presidente: - Prefere, mas não o ponho à votação por não haver número.
O Sr. Francisco Cruz: - Desejava que V. Exa. submetesse à, apreciação da Câmara o projecto de lei que ontem enviei para a Mesa o que se me afigura que esta Câmara, querendo fazer obra honesta e digna, deve votar.
No tempo da Monarquia a soberania residia no rei absoluto, ou constitucional, mas a soberania, numa democracia, devo residir essencialmente no sufrágio. Infelizmente a obra da República neste ponto de vista não se impõe, porque, quando o indivíduo tem de intervir nos destinos da nação, negam-lhe o direito de se manifestar pelo voto. Nestas circunstâncias, o indivíduo ou pacificamente, cruza os braços ou revolta-se.
Sabe-se que os cadernos eleitorais tem sido viciados a tal ponto que eu fui êste ano cortado, Porém, como estava recenseado por vários concelhos, estou habilitado a poder continuar a exercer o meu direito do voto.
O projecto de lei que mandei para a Mesa confere ao Poder Judicial a faculdade tia criação de assebleas primárias, logo que estejam em condições legais. Assim, ou quero que os cadernos eleitorais sejam elaborados pelo Poder Judicial para haver maior garantias no sufrágio, onde resido a soberania, a mais sólida base da democracia.
Por isso peço a V. Exa., logo que haja número, submeta à Câmara a urgência e dispensa do Regimento para o projecto de lei que contem doutrina tam digna e honesta que não deve levantar o mínimo reparo de qualquer dos lados da Câmara
O orador não reviu.
O Sr. Pinto Barriga: - Ontem, antes de se encerrar a sessão, tive ocasião de exprimir o meu protesto contra o decreto n.° 10:887, sôbre o qual mandei para a Mesa um projecto de lei, revogando pura o simplesmente êsse decreto.
Êsse decreto é absolutamente inconstitucional, porque o Govêrno serve-se de uma autorização para reformar os serviços judiciais e a organização judiciária, quando a lei constitucional exige que seja feita por uma lei especial. Além disso fazem-se as mais fantásticas promoções. Reservo-mo, quando realizar o meu negócio urgente, para examinar êsse diploma. Peço que êsse projecto de lei seja
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imediatamente discutido. A Câmara há-de votar êsse projecto de lei, associando-se ao meu protesto.
Por êsse decreto a Relação de Coimbra fica uma Relação de trazer por casa, com um número de juízos insuficiente, não tendo razão de existir.
Nessa Relação o número de juizes não permitirá que funcione. Basta levantar-se qualquer incidente, qualquer embargo, para que seja necessário recorrer à Relação do Pôrto. Da maneira como fica não servirá para nada essa Relação.
Quando os crimes aumentam em Lisboa extingue-se um juízo de investigação criminal.
Um decreto feito nestas circunstâncias, não tendo as assinaturas suficientes dos Ministros, e contendo doutrina absolutamente inconstitucional, não pode permanecer em vigor.
Dou assim por concluídas as minhas considerações por agora, reservando-me para depois mais largamente apreciar êsse diploma.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Gonçalves: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. para serem postas em discussão as emendas do Senado ao parecer n.° 350.
O Sr. Presidente: - Quando houver número terá primeiramente de ser votado o negócio urgente do Sr. Pinto Barriga.
O Sr. Carneiro Franco: - Sr. Presidente: em primeiro lugar desejo preguntar a V. Exa. se já foi recebida na Mesa qualquer resposta ao requerimento que fiz, há já bastantes dias, para que me fôsse permitido consultar os documentos referentes ao acordo comercial com a França. Não me parece que isso seja um segredo do Estado, e por isso peço a V. Exa. para insistir junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros para que essa autorização me seja concedida cora a maior, brevidade.
Peco também a V. Exa. para que seja intérprete junto do Sr. Ministro das Colónias do desejo que a Câmara tem de que aqui seja trazida qualquer informação sôbre o inquérito ao Banco Nacional
Ultramarino, votado por esta Câmara. E lamentável que meses depois da votação dêste inquérito nem o Ministério das Colónias, nem ninguém, aqui tenha trazido qualquer informação a respeito dêsse inquérito.
Também ainda aqui não chegou qualquer trabalho, ou sequer qualquer esclarecimento, da comissão encarregada de estudar o regime bancário no Ultramar.
Parece que andamos aqui a brincar aos inquéritos e às comissões.
Eu espero que V. Exa., Sr. Presidente, fará o possível para que antes de finalizar a actual sessão legislativa alguma cousa se saiba acerca dos assuntos a que acabo de me referir.
Peço ainda para entrarem imediatamente em discussão, com prejuízo dos oradores inscritos, os pareceres n.ºs 911 e 6õl, que já estão marcados para antes da ordem do dia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: - Em tempos tive a honra de apresentar à Câmara um projecto de lei referente à tabela dos emolumentos judiciais, tabela esta que mais tarde veio a ser modificada, mais ou menos, conforme eu tinha proposto. Mas verifica-se agora que parece ter havido o propósito de excluir dela os contadores. Não lhes foi feita a justiça devida, e foram lhes por isso cerceados os seus emolumentos.
Eu tenho a honra de enviar para a Mesa um projecto de lei para que essas desigualdades e injustiças desapareçam, pedindo a V. Exa. para que na altura devida, e quando haja número, se digne consultar a Câmara sôbre se lhe concede a urgência.
Aproveito estar no uso da palavra para preguntar a V. Exa. quando é que me são entregues os documentos que pedi me fossem remetidos pelos Ministérios do Comércio e das Colónias.
Eu tenho a certeza de que êsses documentos já foram passados há muito tempo, mas parece que há o propósito de não os deixar chegar às minhas mãos.
E lamentável que assim seja, tanto mais que eu queria saber por êles como são aplicados os dinheiros públicos.
Eu não posso ficar assim eternamente
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e por isso todos os dias pedirei a V. Exa. providências no sentido de que êsses documentos me sejam fornecidos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Os ofícios pedindo os documentos a que V. Exa. se referiu foram daqui expedidos em 11 do Março, mas até hoje não veio qualquer resposta,
O Sr. Nuno Simões: - Sr. Presidente1: eu desejava usar da palavra quando estivesse presente o Sr. Ministro do Interior, Dias não quero, contudo, deixar passar esta ocasião sem formular algumas considerações acerca do decreto do Sr. Ministro do Interior demissionário, sôbre a carteira do jornalista.
Eu sou Jornalista, o faço parto da Associação dos Jornalistas. Sou, portanto, absolutamente insuspeito ao tratar do assunto.
O que desejo, porém, é que, com a boa intenção do ser agradável aos trabalhadores dos jornais, se não estejam dando abusos? o que dá lugar, sobretudo, a circunstancia de nos estatutos de várias agremiações não haver o cuidado e o devido escrúpulo no recrutamento dos seus sócios.
Entendo que o Govêrno foz bem dando realmente facilidades a pessoas que, trabalhando pela cultura nacional, encontram aquela série de dificuldades materiais derivadas das actuais circunstancias económicas e financeiras o m que vivemos, mas entendo que é absolutamente necessário que essas facilidades não sejam dadas a pessoas que não as mereçam e justifiquem.
Parece-mo que Mo tendo havido o preciso cuidado no recrutamento dos sócios da Associação do Escritores e Jornalistas, não se tendo exigido rigorosamente a qualidade de jornalista profissional para a entrada para essa Associação, necessário se torna que às pessoas a quem essa exigência não foi feita não sejam dadas as faculdades inerentes a essa qualidade.
Tratarei do assunto quando houver Ministro do Interior, na certeza de que não desejava de qualquer modo prejudicar quem tenha direitos à beneficiação dessa carteira, a única vantagem dada aos jornalistas.
Não quero que sejam consideradas jornalistas pessoas que não tem as condições necessárias, como os que fazem vida pelo jornalismo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Brito Camacho: - Desejava preguntar a V. Exa. por que foi retirada da lista dos vários assuntos a tratar na- ordem do dia e antes da ordem do dia. a nota de interpelação que há três meses iniciei nesta Câmara.
Apoiados.
Preciso saber se foi julgada inconveniente essa interpelação, ou se o Sr. Ministro das Colónias entende por conveniente não dar resposta a essa interpelação e é considerada finda.
O Sr. Presidente: - Eu não a mandei retirar.
O Sr. Brito Camacho: - Então caiu.
Risos.
Peço a V. Exa. o favor de a mandar lá colocar.
O orador não reviu.
O Sr. Vergílio Saque: - Pedi a palavra para pedir a V. Exa. a fineza de consultar a Câmara sôbre se permito que, som prejuízo dos oradores inscritos, se inscrevi para antes da ordem do dia o parecer n.º 893.
O Sr. Júlio Gonçalves: - Sr. Presidente: julgo que o Sr. Pinto Barriga poderá concordar comigo no seguinte:
Está na Mesa um projecto de lei vindo do Senado, e ainda um projecto aqui votado sôbre a construção de uma escola na Figueira da Foz.
O Senado introduziu lhe uma emenda. Todos os lados da Câmara concordam com ela.
Portanto, o Sr. Pinto Barriga pode concordar comigo neste ponto.
O Sr. Pinto Barriga: - Concordo inteiramente.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Pedia a V. Exa. para me informar do número de Deputados presentes.
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O Sr. Presidente: - Estão 57 Srs. Deputados.
São lidas na Mesa e aprovadas as emendas do Senado ao parecer n.° 350 da Câmara dos Deputados.
Essas emendas são as seguintes:
Artigo 1.° É autorizado o Govêrno a contrair com a Caixa Geral de Depósitos um empréstimo até a importância de 18.000$, ouro, amortizável no prazo máximo de quinze anos, a orna taxa de juro não superior a 10 por cento, destinado à construção ou aquisição do edifício para a Escola industrial de Bernardino Machado, da Figueira da Foz, e aquisição do respectivo mobiliário e material escolar.
§ 1.° (novo). O levantamento da importância global do empréstimo, ou de quaisquer quantias por conta, bem como o pagamento dos juros e mais encargos do empréstimo, poderão ser efectuados em escudos, moeda corrente, ao câmbio do dia, mas com a limitação a que se refere o parágrafo seguinte.
§ 2 ° (novo). O Govêrno fica autorizado a inscrever no orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações a verba necessária para o serviço do empréstimo, não podendo esta verba, em caso algum, exceder a importância de 55.000$, moeda corrente.
Artigo 2.° Rejeitado.
Artigo 3.° O artigo 2.° da proposta.
Aprovado.
Palácio do Congresso da República, 31 de Março de 1925. - António Xavier Correia Barreto - Luís Inocêncio Ramos Pereira - João Manuel Pessanha Vaz das Neves. Para a Presidência da República.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se o negócio urgente requerido pelo Sr. Pinto Barriga.
É o seguinte:
Desejo tratar, em negócio urgente, da constitucionalidade do decreto n.° 10:883, em face do artigo ,49.° e outros da Constituição. - Pinto Barriga.
O Sr. Joaquim Ribeiro:-Parece-me que o negócio urgente do Sr. Pinto Barriga é semelhante àquele que ontem o nosso colega Pedro Pita desejou tratar.
Deve, portanto, êste ser rejeitado, visto que ontem o outro o foi.
Trata-se da inconstitucionalidade do decreto. Ontem tratava-se do mesmo assunto.
O Sr. Presidente: - O assunto do negócio urgente do Sr. Pinto Barriga não é o mesmo do Sr. Pedro Pita.
Desejava êste senhor ocupar-se da criação de novas comarcas.
Hoje o Sr. Pinto Barriga deseja ocupar-se da constitucionalidade do decreto sôbre as comarcas.
Foi rejeitado o negócio urgente do Sr. Pinto Barriga.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
feita a contraprova, verifica-se estarem de pé 59 Srs. Deputados e sentados 26, sendo, portanto, rejeitado.
O Sr. Sá Pereira (sobre o modo de votar):- Acho absurdo o sistema que a Câmara pretende seguir de discutir a revogação de decretos sem que da parte do Poder Executivo possa alguém estar presente para nos elucidar sôbre a conveniência ou inconveniência dessa revogação.
Nestas condições eu votarei contra.
Tenho dito.
O Sr. Nuno Simões (para interrogar a Mesa): - Peço a V. Exa. o obséquio de me informar se o projecto apresentado pelo Sr. Alfredo de Sousa é relativo à revogação de todo o decreto das comarcas, ou se exceptua a criação que se fez de comarcas novas.
O Sr. Presidente: - Eu informo já V. Exa.
Leu.
O Orador: - Em face disso julgo que o dever da Câmara é votar a urgência e dispensa do Regimento para a discussão do projecto que o Sr. Pedro Pita, ontem, enviou para a Mesa, visto que êle trata do mesmo assunto sôbre que versa o projecto do Sr. Alfredo de Sousa, è dá
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plena satisfação à opinião republicana justamente indignada contra o que foi feito pelo Sr. Ministro da Justiça e que é inaceitável.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita (sobre o modo de votar): - Quando, ontem, a Câmara rejeitou
O pedido que fiz para, em negócio urgente, tratar do assunto relativo ao decreto das comarcas, apressei me a enviar imediatamente para a Mesa o meu projecto do lei sôbre o assunto.
Porque não quis atropelar a ordem dos trabalhos, não requeri para êle a urgência, o dispensa do Regimento, mas fiz-me inscrever para antes da ordem do dia da sessão do hoje a fim de solicitar que êsse meu projecto entrasse em discussão com urgência e dispensa do Regimento,
Depois de ter sido apresentado o meu projecto, outros dois projectos idênticos foram apresentados: um da autoria do Sr. Alfredo de Sousa, outro da autoria do Sr. Pinto Barriga.
Se os projectos trazidos à Câmara valem pela importância dos assuntos a que se referem e não pelas pessoas que os apresentam, parece-me que o projecto que deve ser discutido é o meu, visto ser o primeiro apresentado.
Para terminar devo dizer ainda que o assunto é do tal natureza que além de dar origem aos clamores levantados nesta Câmara, motivou a indignação do Senado que acaba, por unanimidade, de revogar êsse celibérrimo decreto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Sá Cardoso: Sr. Presidente: eu considero esto assunto como uma questão de moralidade.
Apoiados.
Quando no seio do Govêrno que se encontra demissionário só suscitou a criação das novas comarcas a que se refere o decreto do Sr. Ministro da Justiça, o Grupo Parlamentar da Acção Republicana, que nesse Govêrno tinha dois Ministros seus representantes, fez saber, por intermédio dolos, ao Sr. Presidente do Ministério, Sr. Vitorino Guimarães, que não concordava com a criação de novas comarcas.
A Acção Republicana em caso algum transigiria com a criação de novos lugares.
Apoiados.
O Sr. Presidente do Ministério, tendo em atenção o que lhe era ponderado pela Acção Republicana, susteve a publicação do respectivo decreto.
Posso dizer que S. Exa. assinou êsse decreto ser isto de fonte segura - mas só consentiria a sua publicação após aviso dado à Acção Republicana, com a devida antecedência a fim de os Ministros representantes dela deixar no Govêrno antes dessa publicação ser feita.
Sr. Presidente: as autorizações que se dão ao Govêrno são para ser usadas em nome do Govêrno e não 110 de qualquer dos Ministros.
Apoiados.
É lastimável que não houvesse hesitação em publicar o decreto com a data de 27 do corrente.
Nem sequer se guardou aquele natural decoro de se fazer supor que se tratava, de um acto praticado anteriormente à queda do Govêrno.
A Acção Republicana de maneira nenhuma aceita essa publicação.
Vota contra ela e, portanto, aprova a questão prévia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pinto Barriga: - Quando ontem pedi a palavra, não tinha conhecimento de que o Sr. Pedro Pita havia apresentado já um projecto de teor aproximado ao do meu.
Como os termos do meu projecto coincidem com os do projecto daquele Sr. Deputado u como o meu projecto ainda não foi pôsto à admissão da Câmara, peço a V. Exa. que o considere como não apresentado, e requeiro que o projecto do Sr. Pedro Pita seja discutido juntamente com o do Sr. Alfredo de Sousa.
Tenho dito.
O Sr. Tavares de Carvalho: - Sr. Presidente: não compreendo a atitude da Câmara.
Já por várias vezes se tem afirmado nesta Câmara como princípio jurídico, que não é de aceitar a discussão de qualquer revogação de leis ou decretos sem a presença do Govêrno.
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Ora a verdade é que neste momento não há Govêrno e por isso ...
O Sr. Nuno Simões (interrompendo): - Não. se pretendo discutir nenhuma proposta do Govêrno.
Trata-se do revogar um decreto que é inconstitucional.
Mais: trata-se de um decreto que foi publicado pelo Sr. Adolfo Continho depois de S. Exa. já se encontrar demissionário.
E bom que V. Exa. não se esqueça disto.
O Orador: - Tenho toda a razão porque tenho visto que não se votam outros assuntos que são importantes porque não há Ministros.
O Sr. Carlos Pereira (em àparte): - Ainda no outro dia só votaram os duodécimos sem haver ministério!
O Sr. Francisco Cruz (interrompendo):- O Sr. Tavares de Carvalho deve lembrar-se que não tem competência jurídica para tratar dêste assunto.
O Orador: - Não preciso ter conhecimentos jurídicos para salientar um facto que se tem aqui passado, nem para pugnar por urna terra que tem o direito de ter uma comarca, pois está afastada da sede da comarca 38 quilómetros.
Defendo com todo o calor essa terra o parece-me estranho que os Deputados pelo círculo não se levantem defendendo-a como eu!
Estou falando com o coração, e digo a V. Exa. que não será sem o meu protesto que a Câmara anulará o decreto do Sr. Ministro da Justiça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Sr. Presidente: protesto contra quem afirma que êste decreto é uma imoralidade; protesto porque eu nunca defendi imoralidades!
Apoiados.
Já tenho visto criar-se comarcas sem levantar tam grandes protestos e em condições muito diferentes desta, porque neste caso são os habitantes da comarca que pagam todas as despesas sujeitando se
ao imposto. O que se pede é justo e é um melhoramento a que êsses povos têm direito em igualdade do circunstâncias de outros que gozam igual garantia.
No Govêrno de que eu fiz parte resolveu-se eliminar 50 comarcas; pois eu não me importaria que eliminassem 60, mas que não estivessem nas condições desta.
Repito, protesto contra a classificação do imoralidade que se deu a êste decreto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Lopes Cardoso: - Sr. Presidente: eu não quero dizer que os oradores que defendem esto decreto não tratem de uma questão justa; mas o caso não é êsse.
Esta Câmara tem o dever de anular o diploma do Sr. Ministro da Justiça, seguindo o exemplo do que já fez o Senado.
O Parlamento foi ofendido, visto que se legislou sôbre matéria que era da sua única e exclusiva competência.
Para prestígio do Poder e da Câmara, o decreto deve ser imediatamente revogado.
Não quere dizer que mais tarde, tendo em atenção os interêsses dos povos beneficiados por esto diploma, não se resolva criar essas mesmas comarcas, com sacrifício de algumas das existentes, mas, neste momento, trata-se dum abuso que nos envergonha e que repugna ao meu critério de parlamentar e de juiz.
Não tenho pelo Sr. Ministro da Justiça senão simpatia, respeito e as mais cordiais relações; mas não posso deixar de dizer que o acto que S. Exa. praticou foi um abuso que é preciso remediar imediatamente, para que amanhã ninguém suponha que um condenável abuso pode criar situações novas injustificáveis.
Tenho dito.
Foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento para o projecto de lei- do Sr. Alfredo de Sousa.
Foi igualmente aprovado o requerimento do Sr. Pinto Barriga.
O Sr. Pedro Pita: - Requeiro que continue a discussão do assunto de que estamos tratando, com prejuízo da ordem do dia.
O Sr. Jaime de Sousa (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: lembro a V.
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Exa. e à Câmara que o assunto do que trata a ordem do dia é da maior importância para o funcionamento desta casa do Parlamento.
Não há nenhuma questão que possa preterir esta.
O decreto relativo às comarcas morreu já por si próprio, porque não pode acontecer que o Govêrno que tomar agora conta do Poder deixe de o revogar,
Nestas condições entendo que não é de receber o requerimento que acaba de ser apresentado prejudicando a ordem do dia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita (sob) e o modo da votar): - Sr. Presidente: ou não chego a compreender que haja alguma cousa mais importante do que o assunto que estamos discutindo, principalmente depois das palavras do Sr. Sá Cardoso.
Este bdecreto foi publicado no Diário do (governo depois de o Ministério estar demissário, o por uma deslealdade para com o chefe dêsse Govêrno.
Sucede, porém, que até já há gente nomeada por virtude do decreto, pessoas que hão-de querer lazer valer os seus direitos adquiridos.
É aprovado o requerimento do Sr. Pedro Pita.
E aprovada a acta.
São lidou os projectos postos à discussão.
O projecto do Sr. Pedro Pita é o seguinte:
Artigo único. É declarado nulo o sem eleito o decreto n.º 10:883, de 27 de Junho de 1925.
Sala das Sessões, 27 do Junho de 1925. - Pedro Pita.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: é lamentável que a paixão regionalista de alguns Srs. Deputados os leve até o ponto de pôr em dúvida a imoralidade do decreto.
O Sr. Joaquim Kibeiro considera o decreto moral; eu considera-o imoral.
O País inteiro, porém, considera o decreto imoralíssimo.
Qual é a razão da proposta do Sr. Alfredo de Sousa?
Como é, que sendo o decreto inconstitucional, e Exa. quere fazer uma distinção, mantendo uma parte dolo?
Reconhecido o abuso do poder cometido pelo Sr. Adolfo Coutinho e o abuso que S. Exa. cometeu para com o próprio Sr. Presidente do Ministério, o que há a fazer é revogar pura o simplesmente o decreto.
Mais nada.
Sr. Presidente: é agora que se vem dizer aqui que há localidades a 40 quilómetros da sede da comarca. Mas pregunto só isto não esibte há séculos.
É preciso agora que o Ministro salte por cima da Constituição e da opinião do chefe do Govêrno para publicar a doutrina do decreto?
Se os artigos que o Sr. Alfredo de Sousa propõe sejam suprimidos são inconstitucionais não o é o relativo às comarcas?
Como é que o Ministro da Justiça, que é magistrado, vai publicar; uma lei infringindo a Constituirão?
Suponho que os Deputados da Nação devem cumprir o preceito constitucional que diz que são Deputados da Nação, e não Deputados das terras que os elegeram.
É lamentável que os Srs. Deputados, e entre êles o Sr. Joaquim Ribeiro, diplomado em direito, não conheçam o artigo da Constituirão que citei.
Os Deputados são no da Nação, e não do Ferreira de Zézoro.
É lamentável que o desconheçam.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: - Devem por isso abandonar as suas regiões?
O Orador: - Eu bem sei que o Sr. Carlos de Vasconcelos quero uma comarca para a Ilha Brava. Muito bom; e eu sei que há muitos monárquicos que desejam a criação de comarcas.
É uma aspiração legítima, mas eu aqui não sou representante dos monárquicos, mas da Nação; não posso concordar, nem abdicar dos meus princípios e defender êsses monárquicos.
Não quero uma monarquia para criar comarcas. Que me importa a mim que haja monárquicos que querem comarcas?
Os interêsses da Nação estão acima dos interêsses regionais.
Não podia deixar de tomar esta atitude
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condenando o decreto contra todas as leis e disposição expressas do Parlamento.
Então o Sr. Adolfo Coutinho declara à Câmara que se não justificava a criação da comarca do Cadaval e manda publicar um decreto no Diário do Govêrno criando essa comarca?
Isto sem ouvir o Sr. Vitorino Guimarães! E êste homem tem dentro desta Câmara alguns Deputados que defendem o seu acto!
Saltou por cima da lei e do prestígio do Parlamento, e do próprio prestígio pessoal!
Isto é demais! Se fôsse preciso mais algum espectáculo para mostrar ao público o que tem sido a República bastaria êste dado ontem e hoje.
Ontem o dos revolucionários civis dando o espectáculo que ontem se viu nesta Câmara. Hoje o das comarcas.
O espectáculo da República em Portugal criando comarcas em Sabroso o Ferreira de Zêzere, o demonstra. Quem é que manda aqui?
Somos nós ou são estas localidades?
Uma voz: - Já houve votação?
O Orador: - Já. Ontem foi rejeitado o negócio urgente do Sr. Pedro Pita, hoje o do Sr. Pinto Barriga.
Isto quere dizer que a proposta para a qual foi podida a urgência e dispensa do Regimento, do Sr. Alfredo de Sousa é que deveria ter sido rejeitada.
Tenho pelo Sr. Joaquim Ribeiro muita consideração. Acho á sua aspiração legítima, o seu ponto de vista legítimo.
Mas se S. Exa. ocupasse as cadeiras do poder vinha aqui, defender o projecto ...
Interrupção do Sr. Joaquim Ribeiro.
O Orador: - V. Exa. não precisa que eu lhe diga o que deve ir dizer aos seus conterrâneos.
O Sr. Américo Olavo (interrompendo):- V. Exa. deve concordar em que os povos da Ferreira de Zêzere têm tanto direito à justiça gratuita como os demais povos das outras regiões.
O Orador: - Sr. Presidente: o Sr. Joaquim Ribeiro deve chegar a Ferreira de Zêzere e deve dizer aos seus conterrâneos:
"Vocês têm toda a razão e eu fiz o possível para satisfazer as vossas aspirações. O que não posso é sancionar um acto escandaloso dum Ministro. E se vocês me quisessem obrigar a isto, eu não queria ser mais o vosso Deputado!"
E creia S. Exa., Sr. Presidente, que não havia de perder um voto sequer por isso e ganharia muitos até, porque todos os homens de bem teriam, mais uma vez, a confirmação do seu valor.
O Sr. Joaquim Ribeiro (em aparte): - Eu não ando à caça de votos. Não sou como V. Exas. que fazem discursos exquisitos, extraordinários unicamente para isso!
O Orador:- E é assim, por certo, que o Sr. Joaquim Ribeiro fará se quiser ler êste decreto o analisar bem os argumentos que o Sr. Ministro invoca. Ainda mesmo quando as autorizações permitissem isto, era preciso, como muito bem disse o Sr. Sá Cardoso, não esquecermos que as autorizações foram dadas ao Govêrno e não a um Ministro dêsse Governo. Ainda mais imoral é o saber que no Gabinete havia, com efeito, quem o não quisesse.
V. Exa., Sr. Presidente, falou há pouco em precedentes. Na República tem havido precedentes de todas as espécies; como êste, parece-me que nunca houve. Nunca houve efectivamente um Ministro da Justiça que tivesse o arrojo do Sr. Adolfo Coutinho, mandando para o Diário do Govêrno um decreto nestas condições! Eu lamento de ter de proferir estas palavras. Se se tratasse duma pessoa que me fôsse inteiramente indiferente não me custaria pronunciá-las; mas o Sr. Adolfo Coutinho é um magistrado e eu habituei-me a considerá-lo. Pessoalmente, portanto, o caso magoa-me, embora politicamente elo me mereça interêsse, porque vem munir-me de mais um argumento esmagador contra a República, emquanto êste decreto não fôr revogado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Lopes Cardoso: - Sr. Presidente: a Câmara deve estar suficientemente elucidada já sôbre a generalidade dêste projecto, visto que muitos e bons argumentos se invocaram do todos os lados da Câmara, quando se discutia a sua admissão o a do negócio urgente.
Necessário é contudo, Sr. Presidente, que saliento ainda mais uma voz o motivo por que o decreto, produzido nas circunstâncias excepcionais reveladas pelo ilustre sub-leader do grupo da Acção Republicana, Sr. Sá Cardoso, com desprimor para alguns dos ilustres membros do Poder Executivo, agora demissionários, deve ser analisado o revogado sem demora.
Êste decreto, está suficientemente demonstrado, não pode do forma alguma ser mantido na organização judiciária portuguesa.
O Senado a esta hora resolveu já anular tal monstruosidade e necessário é que nesta Câmara da mesma forma se proceda.
Não pode negar-se em absoluto aos povos das comarcas criadas o direito a terem comarcas próprias; mas são assuntos, como disse, para serem considerados em processo especial e ouvidas as comissões competentes nós temos do Regimento.
O decreto em si, pela forma como foi publicado, excedeu as atribuições que tinham sido conferidas ao Poder Executivo; o, mesmo adentro do próprio Govêrno, verificou-se já que muitos dos seus membros foram com êle ludibriados. Os dignos parlamentares que votaram as autorizações ao Govêrno - entre êles os da Acção Republicana - declararam já pela voz do Sr. Sá Cardoso que nunca autorizaram cousa que com isto se parecesse. Disso também S. Exa. que alguns dos Ministros, pertencentes ao Gabinete a que pertenceu o Sr. Adolfo Continuo, tinham sempre negado, e até à última hora o fizeram, a sua assinatura a um decreto desta ordem, fazendo até depender de tal atitude a continuação da sua estada no poder,
Nestas condições, estamos agora o m plena liberdade para resolver.
O Sr. Adolfo Coutinho abusou, usando de autorizações que não lhe foram conferidas. Mas fez mais ainda, como salientou
o Sr. Sá Cardoso: abusou da própria confiança do Sr. Presidente do Ministério demissionário, que lhe entregara assinado o original dêste diploma mas condicionam de a sua publicação à aprovação pelo Conselho de Ministros. Factos dêstes nau podem deixar do ter a sanção devida da parto da Câmara e é preciso, pois, que êste decreto seja revogado para que o abuso se não repita.
Além disso, é bom que só veja que mesmo que êste decreto tivesse sido publicado regularmente, não satisfazia absolutamente em nada a boa organização judiciária. Pelo contrário nele se alteia tudo. E uma lei imperfeita que vem complicar cada vez mais a organização do Poder Judicial, que há muito devia constar do um só diploma. Extinguem-se lugares, criam-se lagares e tudo isto se faz igual, em prejuízo de um serviço que é de interêsse o ordem públicos.
Ora vejamos o artigo 7.° onde se diz:
"É extinto um lugar do curador gera dos órfãos na comarca de Lisboa, logo que vagar".
Sr. Presidente; temos actualmente três curadores correspondendo cada um a duas varas. O serviço tem-se feito sempre regularmente e nem mesmo podia deixar do ser assim, visto que os magistrados que ocupam êstes lugares são distintíssimos, e com pequena despesa porque tais magistrados vivem principalmente do emolumentos e têm um pequeníssimo ordenado, o que não obsta a que aufiram proventos superiores aos dos juizes de 1.ª classe que em Lisboa exercem funções estranhas ao cível e comercial.
O tirar um curador para ficarem dois mormente quando a tais magistrados se confiam novos e difíceis atribuições (artigo 13.° e 14.° do decreto) não traz vantagens.
O Sr. Ministro da Justiça não podia ignorar isso porque, em primeiro lugar, o juiz o em segundo, embora não tivesse servido nunca na comarca de Lisboa, teve a seu lado como chefe de Gabinete o Sr. Dr. Anacleto do Matos Silva, curador geral dos órfãos, que certamente lhe faria ver que o acabar com o lugar de curador dos órfãos traria consigo apenas o tornar morosos os processos, sem van-
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tagem apreciável para a Fazenda Pública. O único resultado que poderia obter-se era o do dividir o bolo dos emolumentos em vez de três por dois.
E tanto assim é que, emquanto se extingue um lugar de curador, criam-se pelo artigo 10.° sub-curadores gerais dos órfãos, o que equivale a confessar que tal providência provocou a criação de novos magistrados auxiliares dos dois curadores que ficam.
E então o artigo 13.° bem revela o propósito, de aumentar os proventos dos lugares já rendosos, quando passa dos delegados de Procurador da República para os curadores gerais funções remuneradas com bons emolumentos e então, Sr. Presidente, sem discutir, por agora, o que no artigo 14.° se encontra de atentório do pátrio poder, das tutorias e curadorias legalmente deferidas, temos de considerar que o aumento de serviço resultante das atribuições conferidas aos curadores por êste artigo bastaria para convencer-nos de que, se não houvesse o propósito de aumentar o rendimento dos actuais serventuários, necessário se tornava criar novos lugares para que a acção do Ministério Público se tornasse eficaz. Deixo o caso à apreciação da Câmara; por mim, tenho o juízo formado.
É interessante que no artigo 8.° diz-se o seguinte:
"Os subdelegados do Procurador da República auxiliam os respectivos delegados nos serviços de secretaria, mas não podem intervir nos processos senão no impedimento legal ou estando êsses ausentes do seu lugar por doença, licença ou comissão de serviço".
Sr. Presidente: desde que se criaram os lugares de subdelegados de Procurador da República, tais magistrados exercem cumulativamente com os seus superiores hierárquicos as funções de promoverem nos diferentes processos, do que resulta grande conveniência para o serviço público, porque os processos têm mais rápido andamento.
Os subdelegados, homens diplomados, com vontade de saber o preparando-se para um concurso, sob a direcção dos delegados, promovem sempre de forma a que o serviço seja beneficiado. Não deixando intervir ao subdelegado senão em serviços de secretaria, não se lhes faculta meio de obter a necessária prática que os habilito para o concurso e os torne aptos para o serviço das funções do Ministério Público, em qualquer comarca do País. Mas, ao mesmo tempo que isto se determina, lê-se mais abaixo o seguinte:
"Para a admissão ao concurso de delegado é necessário juntar certificado passado pelo respectivo Procurador da República de onde conste que o subdelegado durante, pelo menos, seis meses depois da formatura ou licenciatura em direito, frequentou assiduamente o tribunal, assistindo às audiências e aos outros actos judiciais nele praticados".
E, em que condições assiste?
Simplesmente como mero espectador, ou exercendo funções que o habilitem a desempenhar depois o seu lugar? Não compreendo.
Mas, Sr. Presidente, ao mesmo tempo que proíbe aos subdelegados que exerçam, cumulativamente com os delegados do Procurador da República, todas as funções de promoção, criam-se dois delegados auxiliares em Lisboa e Pôrto, destinados a substituir os delegados das varas cíveis nos seus legítimos impedimentos.
Isto é, funções que até agora eram exercidas por funcionários que não recebiam vencimentos orçamentados, passam a ser exercidas por magistrados a quem o Estado vai pagar!. ..
Isto se depreende do artigo 11.° § único, onde se lê o seguinte:
"Estes lugares são providos de entre os delegados do Procurador da República e terão o vencimento da sua categoria e diuturnidade que as leis concedem aos delegados que servem perante os tribunais das transgressões."
Mas para ostes lugares serão providas pessoas que tenham suficiente conhecimento do foro, aptas para desempenharem funções que competem a magistrados de 1.ª classe?
Pelo decreto qualquer delegado serve seja qual fôr a classe e o acto do Sr. Ministro da Justiça, despachando apressa-
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damente para Lisboa o delegado Oliveira Guimarães que dêste lugar tem pouco mais de um mês, desmonto por completo o apregoado propósito do Sr. Ministro da Justiça de melhorar o exercício do magistratura do Ministério Público.
O Sr. Alfredo de Sousa: - Sôbre êsse ponto toda a Câmara está de acordo.
O Orador: - Perfeitamente, mas é conveniente dizer sempre qualquer cousa, para que não seja alegada ignorância.
Sr. Presidente: em minha opinião, salvo O devido respeito por todos os meus ilustres colegas, um delegado com um mês de exercício tem tantos conhecimentos do foro como os sub-delegados que do fôro praticam e menos perigosos são êstes trabalhando debaixo da direcção dos seus superiores do que os delegados auxiliares com um mês do exercício a quem o Sr. Adolfo Coutinho quis entregar toda. a responsabilidade das mais difíceis funções do promoção.
No artigo 12.° cria-se uma situação que ninguém nesta Câmara pode aprovar.
Diz:
"Os curadores dos órfãos o delegados do Procurador da República que renunciaram legalmente à promoção podem optar, no prazo de trinta elas pela sua promoção à magistratura judicial, sendo colocados nesta magistratura logo que haja vaga e na classe o lugar que lhos competiria se tivessem sido promovidos na sua altura, sendo a sua antiguidade, para esto efeito fixada pelo Conselho Superior Judiciário."
Sr. Presidente: êste artigo nem se quer-se compreende.
Durante alguns anos permitiu-se que os magistrados do Ministério Público pudessem renunciar à sua promoção a magistrados judiciais por só entender que era conveniente manter em Lisboa e Pôrto, e em outras comarcas de responsabilidade, agentes do Ministério Púbico especializados nas suas funções.
Assim, alguns à A, que durante muitos anos outra cousa não têm feito, senão apreciar um corpo de delito, dar uma queixa, oferecer uma querela, e outros outra cousa não têm feito senão dar libelos e assistir a julgamentos.
Acontece também, que não é permitido tios delegados do Lisboa e Pôrto, o noutras comarcas os não há hoje que renunciassem à promoção, o exercício da advocacia, e desta forma só a sua especialidade conhecem o portanto temos de concluir que o artigo 12.° nos priva de bons agentes do Ministério Público, dando-nos em troca juizes sem experiência mas com direito a colocação em qualquer das instancias.
Não se rei oro aos secretários do Tribunal do Comércio o aludido artigo, e o relatório que, precede o decreto não explica o motivo, porque sendo êstes como os delegados e curadores, agentes do Ministério Publico, não se regula a sua situação pela mesma forma.
Nos artigos 13.° o 14.° e seus parágrafos, regulam-se assuntos de natureza civil, assuntos que me pareço deviam estar arredados dêste diploma, que mais parece de desorganização judiciária.
No artigo 16.°, criam-se as comarcas e o § 3.° coloca como escrivães e contadores quem não tem concurso e até porventura não Tom habilitações scientificas para fazê-lo, dando só aos improvisados oficiais de justiça, porque ninguém lho restringiu, o direito de partilhar do cofre de emolumentos para que não contribuiram!
Sr. Presidente: com sinceridade o afirmo, foi com verdadeira tristeza que vi, apresentar, daquele lado da Câmara, por um ilustre Deputado e ao mesmo tempo distinto jurisconsulto, um projecto do lei pelo qual, revogando muito do que Cisto decreto tem de odioso, mantém, todavia, a criação dás célebres comarcas.
Nestas minhas palavras não vai de forma alguma a indicação do que em ocasião oportuna não possa considerar-se tal projecto, a elas significam apenas o meu desgosto ao reconhecer que ainda alguém, dentro desta Câmara, não está convencido da ilegalidade dêste decreto.
Não há nada mais abusivo e irregular do que esto acto da parto do Ministro da Justiça que chega a ser uma disposição vexatória.
Apoiados.
Todos tem manifestado a sua repulsa e chega a ser inacreditável que a consciên-
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da e a inteligência de alguns Srs. Deputados assim o não vejam.
Êste decreto é falso (Apoiados), foi falsa a sua publicação.
Apoiados.
Isto repugna com certeza até aos povos das próprias comarcas se forem republicanos o democráticos.
Não passa de um papel falso (Apoiados) semelhante decreto.
O Govêrno não pode impor às Câmaras a obrigação do pagar, quem paga é o Estado (Apoiados), as câmaras são autónomas.
Apoiados.
Já da mesma forma, com a prometida responsabilidade financeira dos corpos administrativos, se criaram vários liceus e quem paga hoje é o Estado.
Vozes: - Tudo isto é uma burla.
O Orador: - Não quero fatigar a Câmara, pois o assunto de todos é compreendido, e ã todos repugna.
Só me resta protestar indignado contra esto facto, e, em nome do grupo parlamentar a que pertenço, dizer à Câmara que deve revogar pura e simplesmente êste decreto.
Apoiados.
O facto de eu ter analisado alguns dos seus artigos não indica que se impõe a sua discussão e entendo que não devia mesmo ser aprovado em detalhe, tal é a sua ilegalidade. A Câmara só tem que fazer como o Senado, isto é, revogá-lo.
O Sr. Joaquim Ribeiro: - Sr. Presidente; requeiro que, juntamente com os dois projectos que estão em discussão, se discuta o parecer n.° 352.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: discutir a proposta do Sr. Alfredo do Sousa ou esta é a mesma cousa.
Vê-se claramente que o propósito do Sr. Joaquim Ribeiro é fazer chicana, é embaraçar a questão e mais nada.
Realmente acho que isto já vai passando aquele limite que permite podermo-nos conter com paciência.
A proposta do Sr. Alfredo de Sousa mantém as comarcas que se contêm neste projecto.
Evidentemente que não podemos deixar passar de modo algum êste projecto e porque o sabem é que pretendem fazer chicana, enxertando esta discussão. Parece-me que a Câmara não pode, de maneira alguma, votar o requerimento do Sr. Joaquim Ribeiro, pelo menos não será sem o nosso protesto que isso se fará.
A homens como o Sr. Brito Camacho e outros que aqui vejo, que são republicanos de sempre, deve causar muita tristeza ver êste espectáculo degradante que se está dando aqui, o necessàriamente êsses republicanos, entre os quais considero o Sr. Joaquim Ribeiro, não deixarão de dizer que para isto não valia a pena ter-se proclamado a República, não valia a pena que tanta gente tivesse morrido dignamente em defesa do seu ideal.
Srs. republicanos, pregunto a V. Exas. se realmente foi para isto que lutaram. pela República e se esforçaram pela sua proclamação.
Façam isto, façam muito mais, porque mais completo será o nosso triunfo, mais breve êle virá, e, porventura, melhor o abençoará o País.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Lopes Cardoso (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: quando ontem o Sr. Pedro Pita enviou para a Mesa um negócio urgente sôbre êsse monstruoso decreto, um ilustre Deputado da maioria disse nessa ocasião que o projecto não podia ser discutido sem a presença do lar. Ministro da Justiça. Ontem tratava-se de um negócio urgente do Sr. Pedro Pita para tratar do um acto praticado pelo Sr. Ministro da Justiça e a quem é preciso opor pronto e imediato remédio, dar-lhe um correctivo imediato; hoje trata-se de um caso inteiramente diverso, propondo-se que conjuntamente se discuta um projecto novo, que contem mataria de organização judiciária.
Sr. Presidente: há que atender que êsse projecto vem aumentar a despesa pública.
O Sr. Tavares de Carvalho: - Não aumenta.
O Orador: - Como tenho muito prazer em ouvir o Sr. Tavares do Carvalho, a
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quem muito aprecio e admiro pela grande dedicação que tem a Sabrosa, sua terra natal, deu licença a S. Exa. para que mo interrompa a fim de dizer o que pousa sôbre o assunto.
O Sr. Tavares de Carvalho: - Só o que digo a V. Exa. é que êsse projecto não aumenta as despesas públicas.
O Orador: - Muito bem.
Sr. Presidente: está na memória de todos que, quando só criaram as quarenta comarcas, em 1890, como agora, ficaram as câmaras municipais com os encargos respectivos, mas passado pouco tempo já êsse encargo não ora conhecido dos seus orçamentos o destas passaram para o do Estado.
O Estado herdou êsse encargo o era justo que o herdasse.
Pois então compreendo-se que quem julga em nome da Nação, que quem promove por mandato do Estado, que os oficiais da justiça da Nação estejam dependente das câmaras municipais?!
Consentiu-se isso então mas consentiu-se muito mal, o tanto assim que a breve trecho, Sr. Presidente, o Estado se responsabilizou poio pagamento das despesas das novas comarcas, libertando as administrações locais do encargos que em boa doutrina lho não cabiam.
É necessário fazer-se a ventado ao Sr. Tavares de Carvalho?
Faça-se, mas faça-se como deve fazer-se para honra do País e da República.
Sobrecarregar transitoriamente, as câmaras municipais com novos encargos o meses depois sobrecarregar o Orçamento do Estado, aliviando os dos municípios, nem é novo, nora é docente,
Diz o Sr. Joaquim .Ribeiro que só impõe criar a comarca do Ferreira do Zézere, porque o respectivo concelho tem tanto direito a ter uma comarca como outra qualquer terra.
Nem todos os concelhos são sede de comarca, mas se injustiça é não o ser Ferreira do Zézere, nova injustiça surge quando criada a comarca, o seu município fique com o respectivo encargo emquanto o Estado paga as despesas das comarcas que já existem.
Sr. Presidente: é necessário terminar com esta cousa que não merecia metade das palavras que só tem pronunciado, que não merecia sequer que pensássemos nela tanto como o Sr. Ministro da Justiça e os seus colaboradores pensaram; é necessário acabar com o decreto o com o vergonhoso espectáculo a que deu causa.
Não se pode admitir que o Parlamento da República pouco tempo em apreciar uma disposição destinada apenas a servir meia dúzia do influentes políticos.
Êste lado da Câmara, rejeitará a requerida discussão do projecto criando novas comarcas, porque autorizá-l a corresponderia a demorar inconvenientemente a discussão do negócio urgente.
Votaremos assim, o, em melhor ocasião, estando presentes os Srs. Ministros da Justiça e das Finanças, e, voltando o assunto A, discussão, usaremos da palavra não para procurar saber se o Sr. Tavares do Carvalho fica satisfeito com a sua comarca ou se o povo de Sabrosa fica descontente comigo, mas para discutir móis detalhadamente o assunto.
Os foros, em todos os tempos, foram requeridos o concedidos por diplomas legais.
Quando o assunto voltar à discussão, preguntarmos ao Sr. Ministro da Justiça qual e o seu plano de conjunto de reforma judiciária e, elucidados, votar-mos.
Tenho dito.
O Sr. Sá Cardoso: - Fiquei surpreendido com o pedido todo para entrar também em discussão o projecto que cria as comarcas.
Eu não sou contrário a que isso só faça; sòmente acho que a Câmara se nobilita não misturando as questões.
Nós agora o que temos é de dar um exemplo, anulando o decreto leito pelo Sr. Ministro da Justiça.
A seguir pode então ser feito o podido para entrar em discussão o projecto.
Eu não neguei o meu voto a êsse podido, embora depois não aprove o projecto, por não concordar com a criação das comarcas.
Ligar, porem, as duas questões é tirar a nobreza ao nosso gesto de rejeitar em absoluto o procedimento do Sr. Ministro da Justiça, que é inconstitucional.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Joaquim Ribeiro (para um requerimento): - Sr. Presidente: eu não tenho dúvida em retirar o meu requerimento.
O Sr. Almeida Ribeiro: - Eu estou inteiramente de acordo com os Sr s. Deputados que me precederam, o que afirmaram que a Câmara tem o dever - visto que é um alto organismo constitucional - de defender o seu próprio prestígio e o do Poder Executivo, e só o pode fazer anulando imediatamente, sem nenhumas misturas, o decreto das comarcas.
E esta a única maneira como a Câmara pode proceder.
Apoiados.
A simples leitura, do decreto mostra que a autorização invocada para o publicar não permitia que tal se fizesse.
Desde que assim se fez, desde que êste decreto apareceu no Diário do Govêrno, de sábado, à tarde, e, segundo se afirma sem o conhecimento da maior parte dos membros do Govêrno, é também o prestígio do Poder Executivo que está em jôgo, e que é preciso defender.
Apoiados.
O Sr. Ginestal Machado (interrompendo): - É o próprio prestígio do Estado que é necessário defender.
O Orador: - Repelimos, pois, toda a nossa solidariedade com tais actos, de mais a mais êste decreto tem o referendum do Sr. Ministro da Justiça e do Sr. Ministro das Finanças, mas não tem o referendum do Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior.
Parece-me, portanto, Sr. Presidente, que a Câmara só se prestigiará, fazendo desde já a anulação pura e simples dêsse decreto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Sá Cardoso: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se concede a prioridade na votação para a proposta apresentada pelo Sr. Pedro Pita.
O Sr. Tavares Ferreira: - Sr. Presidente: vários oradores se referiram já a êsse decreto das comarcas e não serei eu que o vá defender, porque realmente há razão para o combater.
Mas, Sr. Presidente, se êsse decreto, como se tem demonstrado, é inconstitucional, inconstitucional é, como já há dias o demonstrei, outro decreto também publicado em Maio último, quero referir-me ao decreto n.° 10:776, que modificou os serviços do ensino primário.
Há dias, quando se discutiu a proposta dos duodécimos, mostrei a inconstitucionalidade dêsse decreto, porque também criou lugares novos, com a agravante de fixar novos vencimentos, atribuição exclusiva do Congresso.
O Sr. Sá Cardoso: - Não se criaram vencimentos novos, o que se fixou foi vencimentos correspondentes aos lugares que se criaram, e V. Exa. sabe a economia que resulta dêsse decreto.
O Orador: - Diz S. Exa. que não se criaram vencimentos novos, eu afirmo que sim.
Suprimiram-se lugares de professores com o ordenado de 840$ e criaram-se lugares de chefes do secretária, equiparando-os a primeiros oficiais, com o vencimento de 1.080$.
Portanto suprimiram se vencimentos de 840$ e criaram-se vencimentos de 1.080$.
Não há possibilidade de destruir esta afirmação.
Mas, Sr. Presidente, diz ainda o Sr. Sá Cardoso que êsse decreto traz economia; não traz economia imediata e a autorização de que se serviram para publicar êsse decreto, visava unicamente a uma economia imediata, tendente ao equilíbrio orçamental.
O Sr. Sá Cardoso: - Mas V. Exa. está a alterar os factos.
Não se discute propriamente o decreto, o que se discute, é a forma como êle foi apresentado.
Foi um acto abusivo do Poder Executivo.
O Orador: - Está-se discutindo se êsse decreto é ou não constitucional.
Eu posso discutir como entender.
Sr. Presidente: já quando se discutiu a proposta dos duodécimos, demonstrei que êsse decreto trazia um aumento de despesa imediato, estando, portanto, fora das autorizações; ainda mesmo que se li-
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mitasse a suprimir lugares; e, Sr. Presidente, se outra disposição não houvesse que o invalidasse, que o tornasse absolutamente inconstitucional, pastava aquela que determina que essas nomeações ficassem incluídas nas disposições da lei n.º 771.
Então o Poder Legislativo dá uma autorização com restrições, nessa autorização apenas fixa determinadas excepções, ou sejam as excepções para a magistratura o estabelecimentos de ensino, e vem depois o Poder Executivo alargar essas excepções, isto é, fazendo o inverso da autorização que lhe foi dada?
E, como já há nomeações feitas, é absolutamente indispensável que êste decreto seja anulado como inconstitucional, para que amanhã se não venham invocar direitos adquiridos.
Creio, Sr. Presidente, ser inteiramente desnecessário alongar-me em considerações acerca da conveniência do a Câmara se pronunciar sôbre o referido decreto, o, assim, termino enviando para a Mesa uma proposta de aditamento,
É lida, admitida e entra em discussão,
É a seguinte:
Proponho que ao projecto de lei em. discussão se adicione o seguinte artigo novo:
Artigo. É igualmente nulo o do nenhum efeito o decreto n.° 10:776, de 19 de Maio de 1925, que reorganiza os serviços de instrução primária. - Tavares Ferreira.
O Sr. Júlio Gonçalves: - Sr. Presidente: não me interessa a maior parte das disposições do decreto cuja revogação se pretendo fazer.
Devo, entretanto, dizer que algumas das considerações que ouvi fazer a sou respeito não são inteiramente exactas, pôsto que eu não vá agora apreciá-las.
O Sr. Sá Cardoso, que apareceu agora combatendo o decreto publicado pela pasta da Justiça, afirmou há pouco que não combatia o decreto pela doutrina que êle contém, mas sim pela forma por que foi publicado.
Mas, se assim é, então estamos todos de acordo.
O que queremos nós?
Prestigiar o Parlamento e tornar constitucional uma doutrina que o não é, pelo facto de não ter sido publicada nos termos da Constituição.
Revoguemos, pois, o decreto e validemos,, por meio do um projecto, a sua doutrina.
E isso que nós queremos; é isso que quere o Sr. Alfredo do Sousa com o projecto que mandou para a Mesa.
Ouvi, também, combater o decreto em questão, com o fundamento de que elo é imoral, e, com franqueza, pasmei de uma tal afirmação - digo-o sem acrimónia para ninguém.
A doutrina dêste decreto é precisamente a mesma que se contém num projecto que está para entrar em discussão vai em dois anos, projecto que tem os pareceres favoráveis das comissões respectivas, o que são assinados por elementos de todos os lados da Câmara.
Como se pode agora dizer com verdade, e com coerência que êste decreto é imoral?
Eu não resisto ao desejo de ler à Câmara os nomes das pessoas que assinaram êsses pareceres.
Leu.
Sr. Presidente: aprovando apenas os artigos 16.° e 17.° do decreto do Sr. Ministro da Justiça, nós não cometeremos nenhuma imoralidade1 e não ofenderemos em nada o prestígio do Poder Legislativo.
Termino, enviando para a Mesa uma proposta de aditamento ao artigo 1.° do projecto do Sr. Alfredo de Sousa.
Tenho dito.
O orador não reviu.
A proposta ê a seguinte:
Proponho que ao artigo 1.° do projecto Alfredo de Sousa só acrescento "o seguinte", suprimindo-se no final do corpo do referido artigo 17.° as palavras "o no seguinte". - Júlio Gonçalves.
O Sr. Sá Cardoso: - Vê-se bem que a Câmara não tem muito que fazer, senão não estaria a perder tanto tempo com esta discussão.
Quanto às referências que foram feitas ao decreto do Sr. Ministro da Instrução, eu devo dizer que tal decreto se não publicou à sombra das autorizações que ultimamente foram dadas ao Poder Exe-
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cutivo, mas sim de uma autorização anterior, que lhe permitia fazer a reorganização que fez.
De resto, a reorganização a que procedeu o Sr. Ministro da Instrução é altamente moral; deitando abaixo as juntas escolares, S. Exa. prestou ao País um grande serviço.
Em todo o caso, ainda se poderá discutir se o decreto é bom ou mau; o que se não pode fazer é estabelecer qualquer espécie do confronto entre êle e aquele que foi publicado pelo Sr. Ministro da Justiça.
Sr. Presidente: afirmou o Sr. Júlio Gonçalves que só agora eu aparecera a combater o decreto da criação das comarcas.
Não é exacto.
Decerto S. Exa. não estava na Câmara quando eu disse que há cêrca de um mês me ocupei do assunto e afirmei ao Sr. Presidente do Ministério que a Acção Republicana faria questão política da criação dessas comarcas.
Como é que apareci agora?
O Sr. Júlio Gonçalves: - E que eu fiquei surpreso com as declarações feitas há pouco por V. Exa. em nome do seu Partido, onde eu encontrei o melhor apoio quando apresentei o projecto da criação das comarcas.
O Orador: - Não se trata presentemente de um projecto para criação de novas comarcas; trata-se, sim, de um decreto inconstitucional, que o Parlamento, para ressalvar o seu prestígio, quero revogar.
";Como se pretende agora tirar do que é mau alguma cousa de bom?
O público não o compreenderia.
O Sr. Presidente: - Não há mais ninguém inscrito. Vai votar-se o requerimento do Sr. Sá Cardoso.
O Sr. Júlio Gonçalves (sobre o modo de xotar) - Sr. Presidente: quere-me parecer que uma parte do projecto de lei do Sr. Alfredo de Sousa não fica prejudicada pela votação do projecto de lei do Sr. Pedro Pita, mas a parte que se refere às comarcas, fica prejudicada.
O Sr. Sá Cardoso diz não ter dúvida em discutir depois o projecto de lei das comarcas, mas há mais de um ano que êle esteve aqui em discussão e nunca conseguiu ser aprovado. Assim, o requerimento do Sr. Sá Cardoso importa um enterro de 1.ª classe para êsse projecto de lei das comarcas, e por isso o rejeito.
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que aprovam a prioridade para a votação do projecto de lei do Sr. Pedro Pita, queiram levantar-se.
É aprovada.
O Sr. Júlio Gonçalves: - Eequeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: - Estão sentados 36 Srs. Deputados e do pé 23.
Está aprovado.
Vai votar-se o projecto de lei do Sr. Pedro Pita.
É aprovado.
O Sr. Júlio Gonçalves: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: - Estão sentados 37 Srs. Deputados o de pé 23. Está aprovado.
O Sr. Júlio Gonçalves (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: V. Exa. diz-me se não se vota o projecto de lei do Sr. Pedro Pita na especialidade?
O Sr. Presidente: - Êle tem um só artigo e por isso considera-se já votado na especialidade.
O Sr. Pedro Pita (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: tendo sido aprovado o meu projecto de lei, afigura-se-me que, continuando embora a discussão dos outros, a êsse projecto que tem um só artigo, deve ser dado o destino que é costume dar a todos os projectos de lei votados.
O Sr. Presidente: - O projecto de lei de V. Exa. está votado.
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O Sr. Alfredo de Sousa (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: pregunto a V. Exa. se a votação do projecto de lei do Sr. Pedro Pita, implica com rejeição total do meu projecto de lei.
O Sr. Presidente: - Não senhor; há uma parte do projecto de V. Exa. que não está prejudicada...
O Sr. Pedro Pita (interrompendo): - Mas isso não implica que o meu projecto de lei seja considerado já votado separadamente dos outros?
O Sr. Presidente: - Vou pôr à votação a parte do projecto de lei do Sr. Alfredo de Sonsa que não está prejudicada ...
O Sr. Pedro Pita: - Perdão, mas V. Exa. não considera votado já o meu projecto?...
O Sr. Presidente: - Já respondi a V. Exa.
O Sr. Pedro Pita: - Temos ambos razão, mas parece que V. Exa. ainda não percebeu a minha pregunta. Está equivocado. Desejo que V. Exa. mo ouça mais uma voz ...
O Sr. Presidente: - Não é preciso ouvir V. Exa. pela terceira vez. Já compreendi a sua pregunta, e já lho respondi pela melhor forma, dizendo que considero votado o projecto do lei de V. Exa.
O Sr. Júlio Gonçalves (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: quando estava em discussão o projecto de lei do Sr. Pedro Pita e todos os outros que tinham sido enviados para a Mesa, visto que em conjunto foram discutidos na generalidade, foi enviado para a Mesa um artigo novo do Sr. Tavares Ferreira com aditamento ao projecto de lei do Sr. Pedro Pita...
O Sr. Presidente: - Perdão, mas foi ao projecto de lei do Sr. Alfredo Sousa.
O Orador: - Quero crer que não, e invoco o testemunho do Sr. Tavares Ferreira. Quando êste Deputado mandou para a Mesa o seu requerimento recordo-me perfeitamente que êle disse que era um artigo novo do projecto do lei do Sr. Pedro Pita. Fiquei, portanto, surpreendido quando V. Exa. me disse que não havia discussão na especialidade daquele projecto de lei, porque êle continha só um. artigo. Parece-me que elo deve ter discussão na especialidade, visto que, pelo menos, dois artigos contém.
O Sr. Tavares Ferreira (para explicações): - Sr. Presidente: efectivamente quando mandei o meu aditamento para a Mesa, destinava-se ao projecto de lei do Sr. Pedro Pita; isso mesmo se deduz da sua redacção.
O Sr. Júlio Gonçalves (para explicações): - Sr. Presidente: é para dizer que tanto é lógica a minha doutrina que. V. Exa. vai mandar para o Senado o projecto de lei do Sr. Pedro Pita com dois artigos: um revogando determinado decreto, outro, o do Sr. Tavares Ferreira, revogando outro decreto. Não percebo, pois, como é que V. Exa. encerrou a discussão sôbre aquele projecto do lei.
O Sr. Almeida Ribeiro (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: quere-me parecer que a doutrina a seguir, em face do nosso regimento, nesta questão, é a de que o projecto de lei do Sr. Pedro Pita, tendo um só artigo, desde que incidiu sôbre êle uma votação da Câmara, está votado na generalidade o na especialidade. Isto, porém, não quero dizer que não haja para qualquer Deputado a faculdade de poder mandar artigos novos em aditamento a êsse projecto. Em todo o caso, o artigo que constitui o projecto de lei do Sr. Pedro Pita, está votado integralmente.
Está ainda pendente da resolução da Câmara o projecto de lei do Sr. Alfredo de Sousa que se compõe de dois artigos. Pelo nosso Regimento êsse projecto tem de ser objecto de duas votações distintas. Houve já uma votação que o prejudicou em parte, mas no restante, tem de ser votado na generalidade e na especialidade, podendo a êle propor-se qualquer alteração ou aditamento.
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Parece-me ser esta a doutrina que serenamente devemos observar.
Apoiados.
O Sr. Presidente: - V. Exa. tem inteira razão. A doutrina que V. Exa. citou é a doutrina do artigo 107.° Só Regimento. Quanto ao projecto de lei do Sr. Alfredo do Sousa tem que ter realmente duas votações.
É lido na Mesa e aprovado, em prova e em contraprova requerida pelo Sr. Almeida Ribeiro, o artigo 1.° do projecto de lei do Sr. Alfredo de Sousa.
É lida na Mesa e aprovada a proposta do artigo novo do Sr. Tavares Ferreira.
O Sr. Pinto Barriga: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: - Estão 36 Srs. Deputados sentados e 26 de pé.
Está aprovada a proposta.
É lida na Mesa e aprovada a proposta de artigo novo do Sr. Feliz Barreira.
É a seguinte:
Proponho o seguinte artigo novo:
É declarado nulo e de nenhum efeito o decreto n.° 10:790, de 25 de Maio de 1925. - Feliz Barreira.
O Sr. Pedro Pita (para um requerimento): - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara, sôbre se dispensa a leitura da última redacção do meu projecto de lei e do que foi apresentado pelo Sr. Alfredo de Sousa, com as respectivas alterações.
É aprovado.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão a proposta de alteração do Regimento, prosseguindo no uso da palavra o Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: continuando as considerações que ontem iniciei, vou entrar, propriamente, na apreciação da matéria do artigo em discussão, e hoje, que está presente o Sr. Sá Cardoso, é ocasião de alvitrar a S. Exa. a modificação do texto do seu artigo, a fim de se evitarem confusões que nós não queremos.
Tenho tenção de, no final, apresentar um artigo novo, que porventura remediará o inconveniente que já apontei, visto que o artigo 21.° do Regimento diz:
Leu.
Por consequência, se há três horas destinadas à ordem do dia, é evidente que a redacção do texto do Sr. Sá Cardoso não pode ficar como está.
Há que dizer que toda a ordem do dia é destinada à discussão dos orçamentos ou, então, que um determinado número de horas, mas não as três, isto é, que uma ou duas horas terão essa aplicação.
Se fôsse aprovado o artigo tal como está redigido, depois só com uma nova proposta assinada por cinco Deputados se poderia alterar et sã disposição no sentido de no período da ordem do dia a Câmara se poder ocupar de outros quaisquer assuntos que não fossem os orçamentos.
É essa a intenção da Câmara?
Foi êsse o propósito do Sr. Sá Cardoso?
Com certeza que não, porque, votado o artigo como está redigido, ficaríamos impossibilitados de discutir, no período da ordem do dia, a questão política e a solução dada à crise ministerial, isto é, o Govêrno, em vez de fazer a sua apresentação na hora a que a costuma fazer, que é no momento de se entrar na ordem do dia, teria de fazer essa apresentação antes, visto que no decurso dêsse período só poderíamos tratar de orçamentos.
Além disso, independentemente do debate político, outros assuntos importantes há a discutir, e porventura até êste lado da Câmara requererá ou, pelo menos, alvitrará que a ordem do dia seja dividida em duas partes, sendo uma delas destinada à discussão da proposta sôbre as estradas, que é aquela que mais importa discutir e votar antes de encerrados os trabalhos parlamentares, visto que sem estradas ô impossível a vida normal do País.
Sem estradas não se pode ter o fomento económico do País e por causa das estradas a vida económica do País ressente-se pela dificuldade que resulta para os meios de transportes encarecendo os produtos.
Aqui tem V. Exa. que ao lado da dis-
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cussão do Orçamento é necessário que só faça a discussão do projecto das estradas.
Nós não somos contra a discussão do Orçamento, o que queremos é que ela se faça como devo ser, ainda que demore dois ou três meses.
O ano económico de 1925-1926 principia amanhã com o regime do duodécimos, por isso pouco importa que a discussão do Orçamento se faça em oito ou trinta dias.
Por estas razões eu suponho que não resultará vantagem da discussão e aprovação da proposta Sá Cardoso.
Estas restrições não conseguem acelerar a marcha da discussão, como sucedeu com o Sr. António Maria da Silva em 1923, que só depois de passado o ano económico é que conseguiu ver aprovado o Orçamento.
Orçamentos sem os serviços autónomos são 11, e até hoje só estão publicados 5 pareceres, isto é, menos de metade.
Nessas condições como é que nós podemos assentir os orçamentos? De quem é a culpa desta demora? Evidentemente que é dos Srs. relatores que não apresentam os seus pareceres.
Aplique-se à discussão do Orçamento uma, duas ou três horas ou sessões nocturnas, nunca haverá possibilidade material, no período do dez sessões que tal tam, de discutir os orçamentos.
Só as emendas propostas pelas comissões que deram os pareceres para os votos levariam mais tempo do que dez sessões.
A verdade é esta; ou se discute a sério ou então não se discute.
É bom ver que o País não se deixa fàcilmente iludir com estas supostas discussões do Orçamento.
No Gabinete presidido pelo Sr. António Maria da Silva, o Sr. Ministro das Finanças afirmava que, discutido e votado dentro do período legal o Orçamento, essa circunstância devia reflectir-se no câmbio e que êle melhoraria.
O Sr. António Maria da Silva obteve a possibilidade de publicar o Orçamento no Diário do Govêrno logo aos primeiros dias do Julho, e não obstante isso o câmbio agravou-se em seguida.
Daqui se conclui que o País não se deixa iludir com aparências, não tomando
a sério as verbas constantes do Orçamento.
Nestas condições tem razão aqueles que sustentam que a única solução era começar a discutir o Orçamento na devida altura.
Se o Sr. Vitormo Guimarães, para fazer uma ditadura desgraçada, não tivesse encerrado o Parlamento durante um mês, Asses trinta dias poderiam ter sido aplicados à discussão dos orçamentos, o hoje viveríamos num período normal sob o ponto de vista financeiro.
Ainda não vi ninguém afirmar que dêsse encerramento das Câmaras tivesse resultado qualquer benefício.
Pelo contrário,
O Govêrno fugiu na ocasião própria os responsabilidades que lho iam ser tomadas pelos actos que praticou a quando do movimento revolucionário do 18 de Abril.
Mas com isto eu quero dizer que o mós de Maio tinha sido mais bem aproveitado a discutir os orçamentos do que a sancionar o acto do fuga praticado pelo Govêrno do Sr. Vitorino Guimarães.
Hoje a Câmara passou a êsse Govêrno e especialmente a três dos seus Ministros o atestado que êles mereciam.
Lembra-me agora o caso passado com o Govêrno do Sr. Álvaro do Castro. No dia em que saiu na imprensa o estalou como uma bomba a notícia da venda da inata, a indignação foi tal, que até se manifestou no Sr. Almeida Ribeiro. Se se nesse dia uma medida tem sido apresentada, como agora, anulando o acto ruinoso do Govêrno, nada teria sucedido do que alo agora nos tem afligido.
Acho a proposta do Sr. Sá Cardoso muito mais violenta e restritiva do que a do Sr. Alberto Xavier e até do que a do Sr. António da Fonseca, que originou o grave conflito com a minoria nacionalista que acarretou o pedido de renúncia do ilustre Deputado Sr. Cunha Leal.
A proposta António da Fonseca dizia que as discussões se fariam com qualquer número e as votações só teriam lugar com o quorum indispensável para realizá-las. Recordam-se V. Exa. e a Câmara qual foi a nossa atitude de então.
Para não deixarmos a maioria à vontade, interviemos nas discussões, mas apenas emquanto na sala houve número.
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Fora disso, abandonávamos os trabalhos.
Como quedem que se discuta e vote o Orçamento Gorai do Estado, quando o ano económico termina hoje?...
O Sr. António Maria da Silva, se conseguir formar o seu gabinete virá, dentro em breve, fazer a sua apresentação à Câmara e com o ar imperativo que todos lhe conhecemos dirá: Votem os orçamentos! É uma vergonha! É preciso acabar com o sistema dos duodécimos. Fui eu o único que até agora consegui obter a votação do Orçamento em prazo legai!
A maioria apoia, mas esfôrços, vontade de discutir, com efeito, o Orçamento, estão-se vendo pelo número de Deputados presentes.
Entre o discutir o Orçamento nas condições em que se pretende fazê-lo e não o discutir, opto pela segunda hipótese.
O Sr. Ferreira da Rocha (em àparte): - É mais moral!
O Orador: - É mais moral, porque é mais honesto e mesmo talvez mais proveitoso.
É preciso que o País não seja iludido.
O País deve ficar sabendo quais as condições em que a discussão vai ser feita.
O Sr. Velhinho Correia: - O que é mais útil é votar o Orçamento, ainda mesmo que mio seja discutido.
O Orador: - Vá então V. Exa. ter com o Sr. Adolfo Coutinho, Ministro da Justiça, demissionário, e veja se consegue que êle a exemplo do que praticou com o decreto da criação das novas comarcas, está disposto a publicar também um decreto em que se dêem por aprovados todos os orçamentos.
O Sr. Velhinho Correia: - Antes isso do que fazer-se como no tempo da monarquia.
Era na Câmara dos Pares: o Presidente apontava para um monte de impressos que estavam sôbre a Mesa e dizia: quem aprova "isto" queira levantar-se.
"Isto" era o Orçamento Geral do Estado!
O Orador: - Isso não passa de uma anedota, como todos sabem.
Conta-se isso a propósito da votação de vários projectos - não era nada o Orçamento - sendo Presidente da Câmara, Visconde do Rio Sado.
É fácil provar que na monarquia houve sempre todo o cuidado em votar os orçamentos.
O exemplo da Inglaterra aqui citado pelo Sr. Velhinho Correia, não colhe. É preciso olhar ao meio, às circunstâncias e às pessoas.
O meu antigo professor de economia política Sr. Marnoco e Sousa, quando tratava de apreciar as várias escolas económicas para depois pôr o seu ponto de vista, dizia o seguinte: O grande princípio é êste - tratar desigualmente os que se encontram em situações desiguais.
Era essa a crítica que êle opunha àqueles que se deixavam arrastar por utopias semelhantes às que orientam o Sr. Velhinho Correia.
Como é que nós, um país latino, tendo um temperamento diferente dos ingleses, vamos querer adoptar as suas normas e invocar o exemplo do que lá se faz?
Sr. Presidente: é preciso tratar desigualmente aquilo que se encontra em circunstâncias desiguais.
O que nos importa a nós que na Inglaterra o Presidente diga que no dia tantos, às tantas horas, deve estar votado o orçamento tal?
É preciso ter o método o a disciplina mental daquele povo, para que uma determinação dessa ordem seja cumprida e acatada. Nós temos a mania de invocar o que se faz lá fora, sem querer saber se é asneira ou não.
Sr. Presidente: em França, também o regime de funcionamento das Câmaras é diferente, razão porque podem ser acatadas certas determinações.
Como V. Exa. vê, à volta destas teses podia usar largamente da palavra, sem me faltar o assunto para apreciar a proposta do Sr. Sá Cardoso.
A maioria há-de convencer-se do que a melhor maneira de discutir o Orçamento é entrar imediatamente nessa discussão.
No tempo da Monarquia, cada Deputado podia falar uma hora e um quarto, sendo avisado após a hora, de que tinha
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um quarto do hora para concluir as suas considerações.
E, a propósito, eu quero lembrar à Câmara que O Sr. Afonso Costa, nossa ocasião, pi crestou a favor da liberdade do falar, como o quando entendesse, e houve até uma sessão em que o Sr. Brito Camacho Be pronunciou também a êste respeito.
Mas eu suponho que S, Exa. dizia pouco mais ou menos o seguinte:
"Falar não é trabalhar".
Ora eu pregunto se para produzir bom trabalho não será preciso, porventura, falar.
A idea era pouco mais ou menos esta, mas eu creio que tenho aqui reproduzidas as considerações de S. Exa. B
O Sr. Brito Camacho, que me está a ouvir, dirá só foi ou não isto que êle disse em 25 de Março de 1908.
Leu.
Portanto, aqui tem V. Exas. uma opinião autorizada, protestando contra tal facto, e dizendo que não sabe se o trabalho em silêncio será ou não mais útil.
Estamos, por isso, muito bem acompanhados, e não precisamos mais do que ir buscar o que disseram os precursores da República.
Sr. Presidente: nós queremos uma discussão ampla do Orçamento, mas não com o intuito de fazermos obstrucionismo, porque nunca o fazemos, usando da palavra apenas durante o tempo necessário para bem justificarmos o nosso voto em qualquer assunto.
Eu sei que a maioria e os Govêrnos adoptam o sistema de não responder aos oradores, mas, mesmo assim, não têm sido mais felizes, porque a Câmara nada tem produzido de útil para o País.
Os orçamentos ainda não foram discutidos, e, por isso, querem agora realizar êsse trabalho de uma maneira absolutamente contrária a todas as praxes, e que é condenável dentro de um regime parlamentar.
Eu ouço dizer aos parlamentaristas incondicionais que aceitam o Parlamento, porque, até agora, ainda não descobriram outra cousa melhor.
Um regime parlamentar é mau quando os homens não são bons.
Sr. Presidente: quero terminar hoje as minhas considerações, e, por isso, resumidamente, vou dizer a V. Exa. e à Câmara, o motivo porque negamos o nosso voto à proposta do Sr. Sá Cardoso.
Em primeiro lugar, o Sr. Sá Cardoso apareceu com a sua proposta na ocasião em que se deu a reunião do seu partido, com fins meramente políticos, e não teve tempo de consultar o Regimento que no seu artigo 86.° expressamente diz...
O Sr. Presidente: - E a hora de encerrar a sessão. V. Exa. deseja terminar as suas considerações, ou ficar com a palavra reservada?
O Orador: - Peço a V. Exa. 11 que me reserve a palavra.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, 1 de Julho, à hora regimental, e a ordem dos trabalhos é a seguinte:
Antes da ordem do dia (com prejuízo
dos oradores que se inscrevam):
A de hoje, menos o parecer n.° 300.
(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):
A de hoje.
Ordem do dia:
A de hoje o interpelações do Sr. Brito Camacho ao Sr. Ministro das Colónias. Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 30 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Projecto de lei
Do Sr. Carlos Pereira, acrescentando uma alínea ao n.° 1.° do artigo 29,° da tabela de emolumentos judiciais, aprovada pelo decreto n.° 10:291, de 13 de Novembro de 1924.
Para o "Diário do Govêrno".
Pareceres
Da comissão de guerra, sôbre o n.° 945-C, que altera o prazo fixado no artigo 2.° da lei n.° 1:653, de 25 de Agosto de 1924, que torna obrigatória a afixação do sêlo comemorativo da Grande Guerra.
Para a comissão de marinha.
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Da comissão do Orçamento, sôbre o orçamento das receitas.
Imprima-se com a máxima urgência.
Requerimento
Requeiro que, pelo Ministério da Instrução Pública, me seja fornecida, com urgência, cópia do contrato de arrenda-
mento feito entre o Estado e o proprietário do edifício onde funcionam as escolas primárias do logar de Feiteira, freguesia do Pôrto Judeu, concelho e distrito de angra do Heroísmo, círculo escolar do mesmo nome. Devo declarar que é a segunda vez que faço êste requerimento." - João de Ornelas da Silva.
O REDACTOR - Herculano Nunes.