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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.° 94
EM 7 DE JULHO DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. - Respondem à chamada 47 Srs. Deputados. É aberta a sessão e procede-se à leitura da acta e do expediente.
Antes da ordem do dia.- Entra em discussão o parecer n.º 923, que é aprovado com várias emendas, depois de usarem da palavra os Srs. Morais Carvalho, Garcia Loureiro, Jaime de Sousa e Pires Monteiro. São aprovados, sem discussão, o projecto n.° 911-E, do Senado, e o projecto n.º 651-E.
É aprovada a acta.
Ordem do dia. - Continua em discussão a proposta do Sr. Sá Cardoso, introduzindo alterações ao Regimento. Usam da palavra o Sr. Carvalho da Silva, Cancela de Abreu, Morais Carvalho e novamente o Sr. Carvalho da Silva, que fica com a palavra reservada.
O Sr. Presidente encerra a sessão e marca a seguinte para o dia imediato, com a respectiva ordem de trabalhos.
Abertura da sessão às 15 horas e 28 minutos.
Presentes à chamada 47 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 57 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Francisco Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
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Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Albino Pinto da Fonseca.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Correia.
António Lino Neto.
António Mendonça.
António Pinto do Meireles Barriga.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Ferreira do Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado Freitas.
Delfim Costa.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João de Sousa Uva.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo Cancela de Abreu.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão Srs.:
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Felix de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Jaime Duarte Silva.
João Estêvão Aguas.
João de Ornelas da Silva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
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Joaquim Brandão.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Jorge Barros Capinha.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mário de Magalhães Infante.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Adusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Tomo José de Barros Queiroz.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Às 15 horas e 15 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 47 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Foram 16 horas e 28 minutos.
Leu-se a acta.
Dá-se conta do seguinte
Ofícios
Do Ministério das Colónias, satisfazendo ao requerido pelo Sr. Deputado Carneiro Franco, transmitido em ofício n.° 291.
Para a Secretaria.
Da redacção de A Liberdade, de Aldeia Galega, para que à pequena imprensa sejam mantidas as regalias concedidas pelo decreto n.° 10:882.
Para a Secretaria.
Dos presidentes das Comissões Executivas das Câmaras Municipais de Paredes de Coura, Caldas da Rainha e Abrantes, pedindo a revogação da lei n.° 1:717 e do decreto n.° 10:665.
Para a comissão de administração pública.
Representações
Dos funcionários do quadro geral do serviço interno aduaneiro em serviço na Alfândega do Pôrto, pedindo para ser pôsto à discussão o projecto de lei n.° 636-A.
Para a Secretaria.
Do presidente e secretário perpétuo da Sociedade de Geografia de Lisboa, Columbano Bordalo Pinheiro, Joaquim Ben-saúde, José de Figueiredo, Dr. Reinaldo dos Santos, Jaime Cortesão, Júlio Dantas, Luciano Pereira da Silva, António Sérgio, a propósito da convocação de uma assemblea geral dos povos ibéricos, feita pelo Grémio de Espanha, a realizar em Sevilha em Abril de 1927, dando a sua adesão e das instituições e classes que representam às iniciativas oficiais para a representação de Portugal nessa assemblea.
Para a Secretaria.
Dos comissionados da assemblea geral dos Sindicatos Agrícolas de Évora, Beja e Portalegre, expondo a súmula das moções na mesma aprovadas.
Para a comissão de agricultura.
Telegramas
Da comissão dos interêsses do concelho de Penam açor, protestando contra a lei que extinguiu a criação da comarca naquele concelho.
Para a Secretaria.
Da comissão delegada da assemblea dos jornalistas de Lisboa, agradecendo a revogação do decreto n.° 10:882.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Vouzela, protestando contra os decretos n.ºs 10:536, 10:665 e 10:776.
Para a Secretaria.
De Artur Lima, de Bragança, pedindo a discussão do projecto sôbre contadores judiciais.
Para a Secretaria.
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Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia.
Está em discussão o parecer n.° 923, que cria um sêlo comemorativo da independência de Portugal.
Foi lido. É o seguinte:
Parecer n.° 923
Senhores Deputados. - Pelo exame do projecto de lei n.° 917-0, respeitante à criação de um sêlo comemorativo da Independência de Portugal, verifica-se que se atendeu à celebração de duas datas notáveis e eminentemente patrióticas, sem qualquer encargo ou prejuízo paru o Estado.
Verifica-se ainda que o mesmo projecto também visa a auxiliar três colectividades, a Liga dos Combatentes da Grande Guerra, a Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha e a Comissão dos Padrões da Grande Guerra, as quais têm sempre pugnado pelo bom nome de Portugal, e contribuído as duas primeiras para minorar dores e sofrimentos de muitos portugueses que souberam prestigiar a sua Pátria.
Por todos estos motivos, é a vossa comissão de correios e telégrafos de parecer que o projecto de lei de que se ocupa é inteiramente merecedor da vossa aprovação.
Sala das Sessões, 3 de Junho de 1925. - Américo Olavo - Custódio de Paiva - Germano Amorim - F. Dinis de Carvalho - Luís da Costa Amorim.
Senhores Deputados. - Tendo estudado o presente projecto de lei n.° 917-C, criando um sêlo comemorativo da Independência de Portugal, a vossa comissão de guerra, atendendo ao fim altamente patriótico do referido projecto de lei e bem assim a que tem por fim dar maior amplitude à instalação do Museu da Grande Guerra, actualmente reduzido a uma simples sala no Museu de Artilharia, é de parecer que o projecto acima referido merece a vossa aprovação.
Sala das sessões da comissão de guerra, 4 de Junho de 1920. - João Pereira Bastos - Tomás de Sousa Rosa - F. Dinis de Carvalho - João Pina dç Morais- José Cortês dos Santos,
Senhores Deputados. - A vossa comissão de finanças, tomando conhecimento do projecto de lei n.° 917-C da autoria dó vários Srs. Deputados, que se destina a autorizar a Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640 a criar um sêlo comemorativo da Independência de Portugal, para ser usado como franquia obrigatória nos dias 10 e 1 de Abril, 30 de Novembro e 1 de Dezembro, desde o ano de 1925 até 1940 inclusive, verificou que o projecto em questão não consigna aumento de despesa nem redução de receita para o Estado.
Nestes termos e tratando-se do um acto de acção patriótica, a vossa comissão de finanças é de parecer que merece a vossa aprovação o projecto de lei aludido.
Sala das sessões da comissão de finanças, 5 de Junho de 1925. - Prazeres da Costa - Amadeu de Vasconcelos - Queiroz Vaz Guedes - Viriato da Fonseca - F. G. Velhinho Correia - Pinto Barriga - António Vicente, Ferreira (com restrições) - Lourenço Correia Gomes, relator.
Projecto de lei n.° 917-C
Senhores Deputados.- Considerando ser um dever patriótico promover a defesa e propaganda dos direitos de Portugal, fazendo sentir não só no país, mas no estrangeiro, o amor que os portugueses têm pela completa e absoluta independência e autonomia do seu país, cujo culto convém tornar sempre perene e constante;
Considerando que muito convém tornar conhecidos no estrangeiro os serviços prestados por Portugal à civilização, à sciência e à humanidade, celebrando em 1940 o oitavo centenário da Constituição e Independência de Portugal e o terceiro centenário da sua restauração, promovendo-se por essa ocasião uma exposição internacional o outros festejos, sem que o Estado contribua com qualquer donativo, atendendo à situação financeira actual;
Considerando que a Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640, legalmente constituída por decreto de 1 de Dezembro de 1869, é a colectividade que, pela natureza dos seus estatutos, melhor pode e deve preparar e organizar os festejos dessa comemoração nacional, para o que precisa dispor dos necessários fundos;
Considerando que também é justo auxiliar a missão altamente humanitária da
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Liga dos Combatentes da Grande Guerra e da Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha, de forma a continuarem a exercer a sua missão, sem sobrecarregar as finanças do Estado:
Temos a honra de apresentar à consideração de V. Exas. o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É criado um sêlo comemorativo da Independência de Portugal, impresso nas cores e nos valores correspondentes às franquias usuais empregadas diariamente nos correios da metrópole, ilhas adjacentes e províncias ultramarinas.
Art. 2.° A franquia com êste sêlo será obrigatória, como franquia ordinária, no serviço postal, nos dias 10 e 11 de Abril, 30 de Novembro e 1 de Dezembro, correspondentes à véspera e dias respeitantes à Independência de Portugal em 1140 e à sua Restauração em 1640.
§ único. A franquia será obrigatória nesses dias e durante os anos de 1925 a 1940, inclusive, tendo os selos, para cada ano, a sobrecarga correspondente ao ano em que são vendidos.
Art. 3.° A escolha dos tipos de selos e bem assim todas as despesas da emissão ficam a cargo da Comissão Central 1.° Dezembro de 1640, colectividade legalmente constituída por decreto de 1 de Dezembro de 1869, sendo essa Comissão a depositária de todas as colecções.
Art. 4.° A Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640 entregará anualmente, até 1940, à Administração Geral dos Correios e Telégrafos as colecções de selos calculadas como sendo necessárias à venda nos dias mencionados no artigo 2.°, além das colecções destinadas à Secretaria Internacional de Berna.
Art. 5.° A Administração Geral dos Correios e Telégrafos entregará à Comissão a que se refere o artigo anterior, em Janeiro de cada um dos anos indicados no § único do artigo 2.°, a diferença entre o produto da venda dos selos indicados e a média de venda do ano anterior. Essa diferença constituirá receita da subscrição nacional promovida pela Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640 e que é destinada a:
a) Promover e efectuar em 1940, em Lisboa, uma exposição internacional de carácter económico, scientífico e histórico;
b) Adquirir, por contrato directo com os actuais proprietários ou expropriando por utilidade pública ordenada pelo Govêrno, no caso de não haver acordo de venda, o histórico Palácio dos Condes de Almada, incluindo o terreno do antigo jardim dêsse palácio, já considerado, para todos os efeitos, monumento nacional, e situado no Largo de S. Domingos, 11, da cidade de Lisboa, do qual é directa senhoria a Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640;
c) Promover em 1940, em Lisboa, em todas as capitais de distrito da metrópole e ilhas adjacentes e nas capitais das províncias ultramarinas, a comemoração do 8.° centenário da primeira independência de Portugal e do 3.° centenário da Restauração de Portugal, sendo os respectivos programas submetidos à sanção do Govêrno.
Art. 6.° O palácio a que se refere a alínea a) do artigo 5.°, depois de adquirido, será denominado Palácio da Independência Nacional, continuando a ter nesse edifício a sua sede a Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640, em nome da qual será feito o registo na respectiva conservatória. Nesse palácio serão instalados os museus das Guerras da Restauração, da Guerra Peninsular e o da Grande Guerra, ficando a instalação é a manutenção dêsses museus a cargo exclusivo daquela Comissão, sem nenhum encargo para o Estado.
Art. 7.° A Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640, desde que tome plena posse do Palácio dos Condes de Almada e terreno, outrora ocupado pelo jardim do mesmo palácio, poderá conceder nesse edifício sede adequada ao núcleo central director da Liga dos Combatentes da Grande Guerra, legalmente constituída pela portaria n.° 3:888, de 29 de Janeiro de 1924, do Ministério da Guerra, ficando então a cargo dessa Liga a manutenção e conservação do Museu da Grande Guerra.
Art. 8.° No caso de dissolução da Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640, o Govêrno tomará posse plena do edifício e de todo o seu conteúdo, sem nenhuma indemnização.
Art. 9.° Do produto líquido da venda anual de selos, a que se refere o artigo 5.°, entregará aquela Comissão 10 por
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cento, sendo 5 por cento à Liga dos Combatentes da Grande Guerra, para pagamento dos auxílios e pensões que essa colectividade distribui aos mutilados o estropiados da Grande Guerra, 5 por cento à Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha, para o fundo permanente da mesma Sociedade, e 2 por cento à Comissão dos Padrões da Grande Guerra, nos anos de 1925 e 1926, devendo essas colectividades auxiliar aquela Comissão nas despesas da emissão dos selos.
Art. 10.° A Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640 dará anualmente, até 31 de Dezembro dos anos de 1925 a 1940, contas detalhadas e documentadas da venda de selos e das despesas efectuadas à Direcção Geral da Fazenda Pública.
Art. 11.° Fica revogada a legislação em contrário.
Em 27 de Abril de 1925.- Sá Cardoso - António Maria da Silva - Henrique Pires Monteiro - Álvaro de Castro - A. Lino Neto.
O Sr. Morais Carvalho: - Sr. Presidente: o fim que o projecto n.° 917 tem em vista, qual seja o de promover a defesa e propaganda dos direitos do Portugal, é por certo muito simpático e altamente patriótico.
Mas, Sr. Presidente, não podemos esquecer que neste projecto se propõe, para serem alcançados os fins que a comissão tem em vista, a criação de um sêlo comemorativo, que será aposto em toda a correspondência na metrópole, ilhas adjacentes e províncias ultramarinas, em quatro dias, em cada um dos anos que decorrem desde 1925 a 1940 inclusive.
Já temos, Sr. Presidente, selos especiais para angariar receitas para a assistência pública, selos especiais para o monumento ao Marquês de Pombal, selos especiais para isto e para aquilo, de modo que pelo projecto em discussão êste sistema, na verdade condenável, de criar receitas, vai ainda ser ampliado, de modo que a correspondência usual do continente, ilhas adjacentes e províncias ultramarinas vai ser onerada em cada quatro dias, em cada um dos anos que decorrem de 1925 a 1940-
O Sr. Pires Monteiro (interrompendo): - Não se cria uma taxa adicional. A comissão dá garantia à Administração dos Correios, porque não lhe leva nada pelos selos e as vantagens da comissão estão no filatélico que vai comprar novas colecções.
O Orador: - Agradeço ao Sr. Pires Monteiro os esclarecimentos que acaba de me prestar, dizendo que não há duplicação de verba.
O Sr. Pires Monteiro (interrompendo): - Se V. Exa. propuser algumas emendas, estou convencido de que a Câmara as aceitará.
O Orador: - Mas o artigo 5.° diz o seguinte: Leu.
O Sr. Pires Monteiro (interrompendo): - Eu suponho que o cálculo está feito para 300 contos, mas, se a venda render 400 contos, a diferença é entregue à comissão.
O Orador: - Com a interrupção do Sr. Pires Monteiro cessaram as observações que eu vinha formulando, sôbre o projecto de lei, em consequência de se obrigar aqueles que têm de recorrer aos serviços postais ao pagamento do duas taxas, a taxa ordinária e a outra. Esclarece o Sr. Pires Monteiro que assim não é. Do facto o contribuinte não tem a pagar, senão as mesmas verbas que paga usualmente.
A receita será exclusivamente a que resulta da diferença entre o produto normal da venda de selos nos anos em que êstes selos são empregados e aquela que de freto se produzir pelo interêsse filatélico que poderá levar os colecionadores a adquirir os selos, aumentando por consequência nesses dias a receita.
A receita poderá realmente ser maior, visto que em cada ano o sêlo terá uma sobrecarga especial.
Afastada a primeira observação que eu queria apresentar contra a economia do projecto de lei, fica de pé uma outra, que me parece não deve também deixar de ser atendida é que os indivíduos que têm o seu tempo muito ocupado não podem ter bem presentes os quatro dias de cada
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ano em que a correspondência deve ser taxada com selos de uma natureza especial.
Assim é natural que o contribuinte desprevenido veja a sua correspondência sujeita a multa, pelo facto de se não ter lembrado de que nos dias tais e tais os selos a apor na correspondência não são os normais, mas os de natureza especial. Ao inconveniente que eu aponto, derivado da criação dêste sêlo, acrescem aqueles que são consequência da existência já de vários selos especiais criados por esta casa do Parlamento.
O Sr. Garcia Loureiro: - Há o sêlo da aviação, o sêlo para o monumento ao Marquês de Pombal, etc.
O Orador:-Há uma verdadeira confusão de selos como em àparte lembra o Sr. Garcia Loureiro, com a agravante de êste sêlo não ser durante um ou dois anos, mas num período de quinze anos.
As receitas provenientes da aplicação dêste sêlo destinam-se a quatro objectivos.
Não quero alongar as minhas considerações, tanto mais que considero os intuitos patrióticos do projecto de lei. Acho até que se deve louvar uma comissão que, neste país de improvisação, em que tudo se deixa para o dia seguinte, com quinze anos de antecedência, lança as bases e trata de promover a realização de uma exposição internacional em Lisboa, em 1940, e a comemoração do 8.° centenário da primeira independência de Portugal e do 3.° centenário da Restauração de Portugal.
Tenho que censurar a comissão por não ter obtido outra forma, senão aquela que infelizmente já está muito empregada, do abuso do sêlo especial, para se obter receita. Mas não poderei deixar de elogiar a comissão pela antecedência com que se propõe tratar da comemoração dos centenários da independência de Portugal o da Restauração.
E praza a Deus que todos sejamos ainda vivos em 1940, para podermos felicitar o Sr. Pires Monteiro pela obra que, com tanta antecedência, pretende realizar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Amaro Garcia Loureiro: - Sr. Presidente: em meu nome pessoal tenho a declarar a V. Exa. *1 que, na realidade, não concordo com êste projecto de lei, porque êle visa a estabelecer mais um imposto, durante um largo período de tempo.
Eu não quero deprimir os altos objectivos da Comissão, mas, com franqueza, o Govêrno que a auxilie, porque nós já temos muitíssimos selos comemorativos.
Isto é nada mais nada menos do que um novo imposto.
Creio que a Comissão pensa em comprar o edifício onde se reuniram em 1640 os conspiradores. Há quem diga que êsse palácio já não parece o mesmo, porque está completamente renovado. E, então, pregunto eu: a que vem agora a sua compra?
E, na realidade, lamentável que a Comissão não pretendesse angariar por outra forma os meios "necessários para essa compra.
Diz-se também no projecto que o produto do sêlo se destina também à Cruz Vermelha, Liga dos Combatentes da Grande Guerra e Padrões. Mas, então, eu pregunto: porque é que se não aplicou a êste caso aquela célebre moralidade do sapateiro de Braga? Não há outras instituições, como a Cruz de Malta, Cruz Verde, etc., tam dignas de ser auxiliadas como as que são contempladas com o bodo inserto neste projecto?
Não é pois com o meu voto, repito, que êste projecto se aprovará.
Acho que já estamos fartos de pagar contribuições e impostos. Estamos decidamente no país dos selos.
E não me admiro que assim seja, porque o Sr. Velhinho Correia dizia há dias que até os pastéis deviam ser selados.
Há também quem diga, à boca calada, que a compra do prédio é um grande negócio.
Se é ou não é, não sei. No jornal A Tarde já vem desvendado um pouco êste misterioso caso.
Já vê V. Exa. que pela minha parte não voto o projecto e lavro o meu mais veemente protesto e faço-o porque entendo que é uma prepotência e um abuso ficarem as cartas retidas quando não tenha selos especiais ...
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O Sr. Paiva Gomes: - A culpa é do Sr. António Maria Silva ...
O Orador: - Temos selos para tudo, falta só o sêlo de 1755.
Eu acho que isto não está bem.
Desejava que estivesse presente o Sr. Presidente do Ministério e Ministro da Guerra, visto que S. Exa. acumula, para nos dizer se está de acordo com êste projecto. Se S. Exa. estivesse aqui com o seu sorriso amável, cativante, talvez me dispusesse a aprovar o projecto; sem isso pela minha parte não o aprovo.
O orador não reviu.
Foi aprovado na generalidade.
O Sr. Sá Pereira: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Peita a contraprova e contagem deu o seguinte:
De pé 8 Srs. Deputados.
Sentados 52.
Foi aprovado.
Leu-se o artigo 1.°
O Sr. Jaime de Sousa: - Mando para a Mesa um artigo novo que V. Exa. para em discussão no momento oportuno.
Foi aprovado o artigo 1.°
Foram aprovados os artigos 2° e 4.°
Leu-se o artigo 5.°
O Sr. Pires Monteiro: - Mando para a Mesa uma emenda à alínea B.
Leu-se e foi admitida.
Foi aprovado o artigo 5.° e alínea A.
Foi rejeitada a alínea B.
Foi aprovada a proposta do Sr. Pires Monteiro.
Foi aprovada a alínea C.
Leu-se o artigo 6.°
O Sr. Pires Monteiro: - Mando para a Mesa uma emenda.
Leu-se, foi admitida e aprovada.
Foi aprovado o artigo 6.°, salvo a emenda.
Leu-se o artigo 7.°
O Sr. Pires Monteiro: - Mando para a Mesa uma proposta de eliminação.
Leu-se, foi admitida e aprovada.
Foi aprovado o artigo 7.° sôbre a emenda.
Foi aprovado o artigo 8.°
Leu-se o artigo 9.°
O Sr. Pires Monteiro: - Mando para a Mesa uma proposta de aditamento.
Foi admitida e aprovada.
Foi aprovado o artigo 9°, salvo a emenda.
Leu-se e foi aprovado o artigo 10.° e bem assim o artigo do Sr. Jaime de Sousa.
Leu-se outro artigo novo.
Foi admitido e aprovado.
Foi aprovado o artigo 11.°
As emendas apresentadas e aprovadas foram as seguintes:
Artigo 5.° Substituir a alínea b) por: b) Adquirir o histórico Palácio dos Condes Almada, sito no Largo de S. Domingos, n.ºs 10, 11, 12 e 13, o Rua Eugénio dos Santos, n.ºs 2 a 2-F, da cidade de Lisboa. - E. Pires Monteiro.
Artigo 6.° Emendar a alínea a) da 2.a linha por alínea b).- Pires Monteiro.
Artigo 7.° Eliminar as palavras: "e terreno outrora ocupado pelo jardim do mesmo palácio". - Pires Monteiro.
Artigo 8.° Os actuais inquilinos do palácio, a que se refere a alínea b) do artigo 5.°, em qualquer época em que tiverem de ser despedidos para realização dos fins a que se refere o artigo 6.°, ou quando tenham possibilidade de sair do referido edifício, receberão a indemnização máxima que arbitra o § 2.° do artigo 53.° do decreto n.° 5:411 (lei do inquilinato), acrescida da indemnização pelas obras e feitorias realizadas e em via de realização até seu completo acabamento.
§ 1.° O prazo para saída dos inquilinos, independentemente do tempo de duração do actual arrendamento, será até o fim do ano de 1935 para os inquilinos com serventia pelas portas n.ºs 11, 12 e 13 do Largo de S. Domingos, podendo êstes inquilinos antecipar a sua saída logo que obtenham local para onde possam transferir os seus estabelecimentos. Terminará no fim do ano de 1944 o prazo para saída dos inquilinos das lojas da Rua Eugénio dos Santos, n.ºs 2 a 2-F, sendo permitido a êstes actuais inquilinos o uso das obras e modificações que tenham em execução na presente data, conforme os projectos existentes na Câmara Municipal de Lisboa.
§ 2.° O preço das indemnizações a que
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se refere êste artigo será resolvido por arbitragem entre a Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640 e a Associação Comercial dos Lojistas de Lisboa, que nomearão os respectivos árbitros, sendo, em caso de empate, nomeado um outro árbitro pelo juiz presidente da 1.ª vara do Tribunal do Comércio do Lisboa.
§ 3.° Os actuais inquilinos do Palácio, emquanto ocuparem as dependências dêste edifício, gozarão todos os direitos que lhes são conferidos pela actual lei do inquilinato e leis que se lhos refiram, actualmente em vigor.-Jaime de Sousa.
Artigo novo. Aos proprietários do Palácio dos Condes de Almada fica assegurado como preço de aquisição uma quantia nunca inferior à que, à taxa do juro sôbre o valor nominal das inscrições de assentamento, produza o rendimento anual por êles declarado na última participação apresentada na repartição de finanças.
§ 1.° A importância, que fôr satisfeita aos proprietários daquele Palácio, quando sejam ainda os representantes da família Almada, não servirá de- base às liquidações de contribuição de registo pendentes pelos óbitos dos ante-possuidores dêsse edifício, as quais em qualquer tempo se deverão efectuar pelos valores que constavam da matriz à data dos óbitos.
§ 2.° Prestado pelos interessados maiores no Palácio o seu consentimento para a alienação amigável, e resolvido também êste pelos conselhos de família, em relação aos menores, o contrato de transmissão efectuar-se há directamente com a Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640, com estipulação das condições de forma e garantia de pagamento que ajustarem e independentemente de quaisquer formalidades processuais.- Pires Monteiro.
Artigo 9.° Na impossibilidade de fazer a missão do sêlo em 1925, fica autorizada a emissão em 1941, sendo então entregue em 1926 e 1927 a percentagem de 2 por cento à Comissão dos Padrões da Grande Guerra, e as contas a que se refere o artigo respeitarão aos anos de 1926 a 1941. - Pires Monteiro.
O Sr. Pires Monteiro: - Requeira a dispensa da lei tara da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o projecto n.° 911-E, do Senado.
Lido na Mesa, foi aprovado, quer na generalidade, quer na especialidade, sem discussão.
É o seguinte:
Artigo 1.° São desanexadas das freguesias de Arcossó e Santo Estêvão, do concelho de Chaves, as povoações, respectivamente, do Vidago e Faiões, que, sob as suas designações, passarão ambas a constituir freguesias.
Art. 2.° É elevada à categoria de vila a povoação de Vidago, por esta lei constituída em freguesia.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 21 de Abril de 1925. - António Xavier Correia Barreto - Luis Inozêncio Ramos Pereira - Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o projecto de lei n.° 651-E.
Lido na Mesa, foi aprovado igualmente, quer na generalidade, quer na especialidade, sem discussão.
É o seguinte :
Artigo 1.° É dada a categoria de cidade, a partir da data da presente lei, à capital do distrito administrativo dê Vila Real de Trás-os-Montes.
Art. 2 ° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 8 de Fevereiro de 1924. - António Xavier Correia Barreto - Luis Inocêncio Ramos Pereira.
O Sr. Presidente: - Vai entrar-se aã ordem do dia. Está em discussão a acta.
O S r. José Pedro Ferreira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar a V. Exa. e à Câmara que se estivesse presente na sessão desta madrugada aprovaria a moção do Sr. Sá Cardoso.
Tenho dito.
foi aprovada a acta.
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ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Tendo falecido o antigo Deputado Sr. Barroso Dias, proponho que se lance na acta una voto de sentimento.
Tendo falecido também um filho do Sr. Ministro da Marinha, proponho igualmente um, voto de posar por êsse infausto acontecimento.
São aprovados.
Entra em discussão o n.° 2.° da proposta do Sr. Sá Cardoso sôbre alterações ao Regimento
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: se até ontem havia razão para combater essa proposta, o resultado da votação que teve lugar ontem nesta Câmara, mais razão nos dá para condená-la.
Ontem houve um Governo que teve o desplante - que outro nome não tem - de se julgar nas condições constitucionais precisar para continuar naquelas cadeiras, com um voto apenas de maioria e nas condições que todos nós conhecemos. Acabam de as informar agora que êsse Govêrno que ontem venceu em tam gloriosas circunstâncias, tem agora na Mesa várias declarações de voto de alguns Srs. Deputados, em que afirmam: que, se estivessem presentes à sessão de ontem, teriam votado a moção do Sr. Sá Cardoso. Êsse Govêrno não tem, portanto, a maioria parlamentar; senta-se, pois, naquelas cadeiras contra a vontade do Poder Legislativo.
O Sr. Francisco Cruz: - V. Exa. pode preguntar à Mesa quantas declarações de voto foram enviadas para a Mesa?
O Orador: - V. Exa., Sr. Presidente, pode informar-me de quantas declarações de voto estão s na Mesa, acerca da votação de ontem?
O Sr. Presidente: - Veio uma para a por escrito.
O Orador: - Com outra verbal do Sr. Pedro Ferreira são duas. Vemos, por isso, que a moção foi votada com um voto de maioria, e assim o Govêrno, que a esta hora está a apresentar-se no Senado, parte do princípio de que não tem que dar satisfações, à Câmara dos Deputados, e que deve manter-se no Poder, mesmo contra a vontade dela.
O certo é que o Govêrno diz que continua nas cadeiras do Poder, mas como o Sr. Presidente do Ministério há dias, ao enviar para a Mesa a emenda que fez cair o Govêrno do Sr. Vitorino Guimarães, defendeu a necessidade de no Parlamento serem discutidos largamente os Orçamentos, considerando mesmo a falta dêsse preceito como uma ignomínia, requeiro que esta proposta pela retirada da discussão até estar presente o Sr. Presidente do Ministério.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se o requerimento.
O Sr. Jaime de Sousa - (sôbre o moda de votar): - Sr. Presidente: creio que não é de, aprovar o requerimento do Sr. Carvalho da Silva, V. Exa. sabe quais foram, os intuitos que levaram o Sr. Sá Cardoso a enviar a sua proposta pára a Mesa; trata-se de simplificar a discussão dos Orçamentos, de forma, que ràpidamente essa peça basilar da administração pública possa ser votada no Parlamento.
Reconheço que é legítimo, por parte da oposição parlamentar, que é feita contra o regime, que se pretenda embaraçar ao máximo os trabalhos parlamentares, inutilizando-os mesmo; mas entendo que a Câmara, na sua maioria, não pode votar o requerimento porque a proposta, do Sr. Sá Cardoso deve continuar em debate até ser votada completamente.
O Sr. Carvalho da Silva (sobre o modo de votar): -- Sr. Presidente: as considerações apresentadas pelo Sr. Jaime de Sousa não têm nada: que as justifique. O andamento dos trabalhos parlamentares baseia-se na harmonia entre o Poder Legislativo e o Executivo, por isso não é injusto que se queira saber, a opinião do Governo a respeito desta proposta. Mantenho, por consequência, o meu requerimento.
Posto à votação, o requerimento é rejeitado.
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O Sr. Carvalho da Silva: - Requeiro a contraprova, e- invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: - Estão de pé 49 Srs. Deputados e sentados 26.
Está rejeitado.
Não há mais ninguém inscrito. Vai votar-se o n.º 2.º da proposta.
O Sr. Cancela de Abreu (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: não há uma emenda a êste artigo?
O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. razão. Vai votar-se a emenda.
É aprovada.
O Sr. Jaime de Sousa: - Requeiro a contraprova.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à contraprova..
O Sr. Jaime de Sousa: - Desisto do requerimento.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: - Faço meu o requerimento.
Procedendo-se à contraprova, dá o mesmo resultado a votação.
É depois aprovado o artigo salva a emenda, em prova e contraprova, requerida pelo Sr. Carvalho da Silva.
Foi lido na Mesa o n.° 3.° que ficou em discussão.
O Sr Paulo Cancela de Abreu: - O Sr. Carvalho da Silva, pediu para que fôsse adiada a discussão emquanto não estivesse, presenteio, Sr. Ministro das Finanças, pois não se compreende, que a Câmara se pronuncie acêrca, desta proposta sem que o Govêrno manifeste a sua opinião e, acresce a circunstância, que tendo sido o apresentante dessa proposta o Sr. Sá Cardoso foi também S. Exa. quem ontem mandou para a Mesa uma moção de desconfiança ao Govêrno, e como vivemos num regime de vinganças, talvez o Govêrno queira tirar o desforço daquele facto.
A proposta, Sá Cardoso, que era uma proposta política, caducou porque perdeu a sua oportunidade.
S. Exa. modificou a sua proposta, portanto o seu requerimento de dispensa de Regimento não se justifica; mas ainda há mais há quatro ou cinco sessões que se discute esta proposta, e nesse tempo já poderíamos ter discutido alguns Orçamentos. Bastava êsse: facto para justificar o requerimento do Sr. Carvalho da Silva, pois tinha-se aproveitado melhor o tempo.
Mas se não foi pedida a dispensa do Regimento, porque não foi ouvida a comissão do Orçamento?
O artigo 176.° do Regimento não está revogado, e determina que as alterações têm de ser remetidas à comissão.
É lamentável que a Mesa deixe infringir o Regimento.
Está demonstrado que é mais rápida a discussão do Orçamento, dentro das regras aqui estabelecidas, do que com as restrições que se têm experimentado.
Sob o regime da proposta do Sr. António da Fonseca, que originou um grave conflito com o Partido Nacionalista, tendo o Sr. Moura Pinto apelado para todos a fim de que não se criasse uma situação que porventura seria irredutível, também a discussão do Orçamento não foi levada a cabo, não obstante terem sido feitas votações sem número, na ausência da maioria monárquica que havia resolvido não tomar parte nos trabalhos da Câmara, quando não houvesse na sala número de Deputados suficiente para votações.
Decerto que o Sr. Moura Pinto vai de novo protestar indignadamente por se pretender criar uma situação análoga à que mereceu as suas invectivas na famosa sessão nocturna em que o Sr. Cunha Real renunciou ao seu mandato, o que motivou a saída dos seus correligionários que só voltaram à Câmara passados uns dois meses.
Mas o Partido Nacionalista, tão aquela atitude, acaba de aprovar o artigo 2.º que estabelece o período destinado à discussão do Orçamento.
Prova-se bem que, no decurso já longo da actual legislatura, apenas um lado da Câmara, e refiro-me aos que mantêm uma feição mais acentuadamente política, tem conservado a mesma linha de coerência cumprindo tudo aquilo que promete e afirma, sem contradições e sem preocupações sôbre as vantagens de ordem pessoal ou política que lhe possam advir dessa atitude.
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Devo V. Exa. reconhecer, Sr. Presidente, que para nós, homens que vivemos do nosso trabalho, nada mais agradável haveria do que o encerramento breve das Câmaras, e portanto só poderemos desejar a imediata discussão do Orçamento, para depois podermos tratar da nossa, vida particular e da nossa saúde, sem nos preocuparmos, é claro, com aquela disposição que permite que os parlamentares recebam o seu subsídio quando a Câmara está fechada, visto que não guardamos para nós êsse subsídio, pois se o guardássemos veríamos esta cousa interessante: é que nos meses em que gozamos férias parlamentares, recebemos o subsídio por inteiro, ao passo que nos meses em que trabalhamos, há o desconto pelas faltas que sejam dadas.
Quere dizer: os parlamentares recebem mais, quando não trabalham.
É esta a maravilha quê se dá no tocante ao subsídio, porque a Câmara não quis aprovar a minha proposta, para o subsídio .ser restrito ao período normal da legislatura, embora êsse subsídio fôsse aumentado.
Era mais moral.
O Sr. Presidente: sei que o Sr. António Maria da Silva está deveras comprometido.
O Sr. Presidente do Ministério está na impossibilidade de consentir que o Ministro das finanças venha, solicitar da Câmara a aprovação de qualquer duodécimo, porque isso iria em contrário da proposta de emenda que apresentou quando se discutia o pedido de duodécimos do Govêrno transacto.
O actual Govêrno não pode pedir nenhum duodécimo.
Se tal pedido fizesse, o Sr. Vitorino Guimarães teria todo o direito em inutilizar politicamente o Sr. António Maria da Silva, dizendo-lhe que na verdade era necessário ter uma grande coragem para vir pedir uma cousa contrária ao que disse na sua proposta.
Aqui esta a razão por que o Sr. António Maria da Silva na sua declaração ministerial faz questão da discussão do Orçamento.
Á uma questão de vida ou deporte, para o seu Govêrno.
Mesmo sob o regime da proposta do Sr. Sá Cardoso é impossível discutir os orçamentos até ao fim do mês.
Nestas condições o Govêrno, quer tenha um voto, quer tenha vinte ou mesmo cem votos de maioria, está condenado a abandonar o Poder.
Tem de ir-se embora, não nos deixando saudades, embora se intitule conservador, mas como já aqui foi demonstrado, o Pr. António Maria da Silva só sabe ser conservador para o efeito de conservar-se no Govêrno, usando do, todas as tricas que estão no seu feitio e que já pôs em prática durante dois anos em que parasitou nas cadeiras do Poder, deixando que o pais chegasse à mais desgraçada das desgraçadas situações.
Já ouvi dizer que o Sr; António Maria da Silva ,tinha na sua pasta uma proposta interessante e que a apresentaria, porventura, na próxima sessão, não sei se para agradar aos "canhotos". Parece que S. Exa. pretendo obter a aprovação de uma lei que declara em vigor o Orçamento anterior com as alterações propostas pelo Sr. Pestana Júnior, mas que não chegaram a ser discutidas pela Câmara.
Evidentemente que a Câmara não poderá aprovar semelhante lei, que constitui uma maneira grosseira de sofismar inteiramente os preceitos da Constituição e de deturpar a função do Poder Legislativo.
Então, melhor do que isso, ainda são os duodécimos. Antes 24 duodécimos do que uma proposta que determina que se declare em vigor em Orçamento sem que êste tenha sido discutido convenientemente.
Nós já sabemos que o Sr. António Maria da Silva virá aqui exigir a votação dos Orçamentos, terá um daqueles rompantes que lhe são peculiares, baterá o pé à Câmara para vêr-se consegue dominar o Parlamento inteiramente, sujeitando-nos a uma escravatura que é incompatível com os nossos brios.
Sr. Presidente: eu sei muito bem que uma grande parte da maioria tem empenho em que a proposta leve muito tempo a discutir e não chegue até a ser votada. Mas nós procedemos assim, não é porque a maioria manifeste ou deixe de manifestar êste ou qualquer outro desejo; de resto, nós estamos aqui para contrariar justamente os desejos da maioria, visto que os consideramos em absoluto prejudiciais aos interêsses do País. Se isto
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assim não fôsse, o Sr. Velhinho Correia, permanente candidato a secretário geral do Banco de Portugal, não teria mandado para a Mesa a fantástica proposta que enviou e para a qual eu chamo a atenção do ilustre jurisconsulto que é o Sr. Almeida Ribeiro. Esta idea do querer, como diz o artigo 3.°, discutir o Orçamento por capítulos, limitando as verbas a discutir e dando poderes ao Presidente para dizer: amanha, a tantas horas, o Orçamento de tal ou tal Ministério deve estar discutido, é um cúmulo! S. Exa. quis apenas mostrar que sabe o que se faz na Inglaterra ...
O Sr. Almeida Ribeiro: - E eu assinei essa proposta também.
O Orador: - Pois fez V. Exa. mal. Eu estava habituado a ver em V. Exa. um democrata sincero e um estrénuo defensor das prerrogativas parlamentares. E eu pregunto a V. Exa. se num meio como o nosso, com as nossas tradições, os nossos costumes, V. Exa. pode enxertar uma regra dessas, que pode ser aplicável na Inglaterra, mas que entre nós não tem aceitação.
A apresentação de semelhante artigo, o mesmo é que a manifestação de se querer gastar tempo inutilmente, visto que toda a gente devia saber que nós havíamos de empregar todos os meios para a sua não aprovação.
Qual é o critério que o Presidente teria, sem prática do assunto, para estabelecer que a discussão acabasse no dia seguinte às 10 e não às 11 horas ou meio dia?
Estaríamos a discutir por doses, por quilos, ou aos litros.
O Sr. Velhinho Correia: - Desde que o Orçamento tem de ser apresentado, segundo a Constituição, num dia certo, entrando em vigor também num dia determinado, porque não há de estabelecer-se que êle seja aprovado num número certo de dias?
O Orador: - Mas como V. Exa. não consegue, nem ninguém, que o Orçamento seja publicado no Diário do Govêrno em 1 de Julho de 1925, o seu argumento não tem razão de ser.
O Sr. Velhinho Correia: - Se é certo que as câmaras municipais podem ser dissolvidas quando não votam os seus orçamentos a tempo e horas, porque não se hão-de estabelecer sanções para os parlamentares que não votam o Orçamento Geral do Estado?
O Orador: - Então o Sr. Velhinho Correia está a advogar a dissolução do Parlamento?
S. Exa. parece querer sugestionar o Sr. Presidente da República a dissolver o Parlamento, por êste não ter votado os Orçamentos, e como a maioria, por comodismo, costuma arrastar-se pela opinião do Sr. Velhinho Correia, haverá naturalmente uma manifestação do Partido Democrático no sentido de dissolução.
Em matéria de sanções ao Parlamento, não deixaria do ser natural o desconto de subsídio aos parlamentares que não votassem o Orçamento até 30 de Junho, com a perda do mandato, se no ano seguinte repetissem a mesma falta.
O Sr. Velhinho Correia: - Transforme V. Exa. êsse seu alvitre numa proposta, e eu dar-lhe hei o meu voto.
O Orador: - Tudo menos a discussão aos quilos, às doses.
O Sr. António Maria da Silva não pode apresentar mais duodécimos, e se até ao fim do mós o Orçamento não fôr discutido S. Exa. terá de sair do Govêrno.
E o Sr. Velhinho Correia, mandando a sua proposta para a Mesa, está a fazer o jôgo dos canhotos, embora diga que apoia o Govêrno.
Qual é, pois, o nosso propósito?
O de que se não discuta esta proposta emquanto o Sr. Presidente do Ministério, que é o responsável pela política geral do Govêrno, se não manifeste acerca da sua oportunidade.
O Sr. Sá Cardoso andaria muito melhor, visto ter conseguido já o seu objectivo político, desistindo da sua proposta, ou fazendo com que ela baixasse às respectivas comissões. Parece-me que assim tudo ficaria bem e não perderíamos um tempo que melhor seria utilizado com a discussão do problema das estradas, por exemplo ...
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O Sr. Velhinho Correia: - Mas o que lucra o País com essa, discussão, libido como é de todos que o problema das estradas é essencialmente um problema financeiro?
O Sr. Carvalho da Silva: - Mas V. Exa. julga que a verba orçamental para estradas é destinada a êsse fim?
O Sr. Velhinho Correia: - Não julgo; tenho a certeza.
O Sr. Carvalho da Silva: - Pois eu tenho a certeza do contrário.
O Sr. Velhinho Correia: - As dotações fazem-se absorvendo, toda a verba orçamental. O que tem acontecido é algumas estradas não aproveitarem essas dotações na sua totalidade. Em todo o caso isso é apenas uma excepção.
O problema das estradas tal como o proclamam não passa duma bloque.
Faça-se um empréstimo de um ou dois milhões de libras e o problema está resolvido.
O Orador: - Existe realmente, ao contrário do que afirma o Sr. Velhinho Correia, o problema das estradas no nosso País. Mas, no meu entender, não basta separar as estradas, algumas das quais nem do aeroplano se podem percorrer, como ontem afirmou o Sr. Nuno Simões.
Devem apurar-se as responsabilidades dos que deixaram criar um tal estado de cousas.
Depois não só trata apenas de autorizar os Govêrnos, a gastar dinheiro; os Govêrnos, já o gastam mesmo sem autorização. É indispensável fazer com que o importo de trânsito e turismo tenha a aplicação que a lei lhe marca e não seja desviado para fins absolutamente diversos, como até agora tem sucedido. Estou convencido de que o contribuinte, souber que êsse imposto é integralmente aplicado na repartição das estradas se furtará, a pagar aquilo que lhe pedirem.
Portanto é lamentável que a Camara teime em perder tempo inutilmente, na discussão da proposta do Sr. Sá Cardoso, visto o caminho estar já naturalmente indicado. Demais, afigura-se-me que se não deu cumprimento ao artigo 176.º do Regimento que determina que a Comissão permanente seja ouvida antes da Câmara se pronunciai.
Pregunto a V. Exa., Sr. Presidente, se êsse artigo do Regimento foi observado e, sé o não foi, eu invoco o Regimento para que êle se cumpra.
Sr. Presidente: o artigo 3.°, em cuja apreciação vou entrar, diz que o Orçamento será discutido por capítulos. Suponho não se tratar duma disposição nova. Já na proposta do Sr. Alberto Xavier vigora uma disposição semelhante a esta discussão dos orçamentos, isto é, por capítulos, fazendo-se portanto a sua votação por artigos, quero dizer, por verbas.
Sr. Presidente: se se tratasse realmente de uma alteração apenas nos termos daquela que, se está discutindo, nós, embora mantendo o nosso ponto de vista, não faríamos um reparo tam importante a semelhante pretensão.
Sr. Presidente: adentro do Regimento normal, com toda a liberdade de discussão e de apreciação, poderia admitir-se que a discussão dos orçamentos se fizesse por capítulos; agora discutir-se os orçamentos apenas por verbas, é o que se não compreende.
Sr. Presidente: isto representa uma restrição tam grande feita sôbre a fiscalização das contas do Estado, que senão pode admitir, nem pode de maneira nenhuma ser aprovado por esta Câmara.
Já por mais de uma vez o Sr. Presidente, tenho citado o que preceitua o artigo 26.° da Constituição.
Sr. Presidente: eu não posso deixar de considerar a proposta do Sr. Sá Cardoso como inconstitucional em face desta disposição do artigo 26.° da Constituição.
Não posso, repito, deixar de considerar inconstitucional está proposta, tanto mais quanto é certo que os orçamentos têm de ser votados anualmente.
Não se votando os orçamentos, como se não tem votado, os contribuintes têm o direito de reclamar e de não pagar os impostos.
Sr. Presidente: em face da lei n.° 1:368 essa disposição pode deixar de sei cumpridas pelos contribuintes e realmente, se os contribuintes não estivessem dispostos a sacrificar-se a contribuir para o Tesouro Público, bastava que todos se com-
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binassem e se abstivessem de pagar os seus tributos, à face da letra expressa da Constituição.
Isto não é uma disposição nova, porque já estava também inscrita na Carta Constitucional.
Dir-me há o Sr. Velhinho Corroía que isto é o que se chama votar o orçamento das receitas. Não concordo. Isso é apenas fixar verbas, e nada mais.
É pela lei de meios que a Câmara há-de autorizar o Govêrno a cobrar as receitas do ano económico a que o Orçamento se refere;
Já várias vezes, aqui se tem dito que é preciso que os ricos paguem, como se êles até agora o não tenham já feito.
É claro que aqueles que atacam os ricos sabem muito bem que o seu patriotismo é suficiente para não fazerem uma greve geral dos contribuintes, à sombra da Constituição, como há pouco provei, e deixando assim o Govêrno em graves embaraços e sem poder, de qualquer modo, obviar à situação, porque não tinha meio de o poder fazer.
Quem tem de pagar os impostos são os ricos e os remediados. Eu, que não pertenço à categoria dos ricos, nem talvez mesmo à dos remediados, entendo que devo contribuir para o Estado, mas que tenho também o direito de fiscalizar as suas coutas como deve ser. E não é cotando esta; proposta que isso se poderá fazer.
Reservando-me para nos seguintes artigos, e nomeadamente no artigo novo apresentado pelo Sr. Velhinho Correia, alargar mais as minhas considerações, eu vou terminar, mas faço-o interrogando a Mesa e pedindo a V. Exa. Sr. Presidente, me diga se, com relação à proposta do Sr. Sá Cardoso, foi cumprido o artigo 176.° do Regimento. E no caso negativo, qual o motivo porque essa comissão não foi ouvida, ou se, porventura, há qualquer deliberação da Câmara dispensando o cumprimento dêsse Artigo. E reservo-me para, depois da resposta de V. Exa., invocar o Regimento se verificar que êle não foi cumprido.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Foi resolvido peia Câmara que essa proposta se discutisse
conjuntamente com a proposta dos duodécimos que então estava em discussão.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para invocar o Regimento): - Sr. Presidente: para que não possa haver dúvidas, lembro a V. Exa. o art. n.º 176.° do Regimento.
Pregunto a V. Exa. se, desde que não foi, como não foi, pedida a dispensa do Regimento para a questão prévia ou proposta do Sr. Sá Cardoso, pelo facto de se pedir apenas que ela se discutisse juntamente cora a proposta dos duodécimos, V. Exa.dia deixar de cumprir o artigo 116.°. do Regimento.
Pois eu, invocando o Regimento, peço que seja cumprido êsse artigo porque é indispensável que seja cumprido.
S há o direito de saltar por cima do Regimento e V. Exa. não o podia fazer desde que não foi pedida a dispensa do Regimento para determinado fim.
O Sr. Presidente: - Tenho de dizer a V. Exa., em primeiro lugar, que o Regimento foi cumprido; em segundo lugar que, tendo entrado em discussão a proposta, dos duodécimos com urgência e dispensa do Regimento e tendo sido também resolvido que esta proposta se discutisse juntamente com aquela, implícita mente a dispensa do Regimento não podia deixar de a abranger.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: desde que já está votada a proposta dos duodécimos, não há razão para subsistir o critério de V. Exa.; mas, desde que V. Exa. manifesta dúvidas, requeiro que a proposta baixe à comissão permanente voltando à discussão logo que seja possível.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se o requerimento de Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Jaime de Sousa - (sôbre o modo de votar): - Sr. Presidente: se a proposta que está em discussão tende a abreviar a discussão do Orçamento, havendo a intenção manifesta de ganhar tempo, não se compreende, que ela ainda tenha de baixar a comissão para estado.
Posto à votação o requerimento, do Sr. Cancela de Abreu, foi rejeitado.
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O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Fez-se a contraprova,
O Sr. Presidente: - Estão de pé 54 Srs. Deputados e sentados 3.
Está, portanto, rejeitado o requerimento do Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Morais Carvalho: - Sr. Presidente: desde que a maioria não desiste do seu propósito de impor para a discussão do Orçamento Geral do Estado, e mais importante de todos os problemas de que o Parlamento se pode ocupar, um regime especial de verdadeira guilhotina, é obrigação das oposições oporem-se por todas as formas, dentro do Regimento, a que êsse propósito vá por diante, e assim, Sr. Presidente, nós vemo-nos forçados a gastar na discussão desta proposta do alteração do Regimento tempo que seria mais proveitosamente aplicado na discussão dos próprios orçamentos.
Sr. Presidente: já o meu ilustre colega Sr. Cancela de Abreu, falando sôbre o artigo 3.°, ora em discussão, fez ver a V. Exa. como um procedimento similar da parte da maioria do actual Parlamento provocou há dois anos uma atitude de hostilidade manifesta da minoria nacionalista.
Sr. Presidente: manda o Regimento, no artigo 103.°, que todo o projecto de lei que contenha mais de um artigo passará por duas discussões distintas: a primeira discussão, denominada "discussão na generalidade", versará principalmente sôbre a conveniência e oportunidade de se legislar sôbre a matéria de que trata o projecto de lei e sôbre o complexo das suas disposições e tendências, etc., e haverá ainda uma segunda discussão na especialidade que incidirá sôbre cada orna das disposições, especiais do mesmo projecto de lei, e assim é que, a cumprir-se esta salutar disposição do Regimento, desta Câmara, deveria sôbre cada artigo do Orçamento Geral do Estado incidir na especialidade uma discussão especial também.
Pela proposta do Sr. Sá Cardoso" e designadamente pelo. artigo 3.°, que V. Exa. há pouco pôs em discussão, êsse preceito do Regimento, tam salutar e tam intuitivamente compreensível, desaparece para a discussão deixar de fazer-se por artigos, como séria, necessário para a boa elucidação dos assuntos, mas por capítulos.
Para que V. Exa. veja quanto tem de atrabiliária e contraproducente para a elucidação dos assuntos a proposta do Sr. Sá. Cardoso, eu mostrarei a V. Exa. em face da proposta orçamental para o ano económico de 1925-1926, relativa ao Ministério das Finanças, as matérias várias de que trata cada capítulo, e como há, na realidade, inconveniência manifesta em fazer incidir não uma discussão sôbre cada um dos artigos* mas apenas uma discussão sôbre cada capítulo que de vários artigos se compõe, Assim, por exemplo, no capítulo 1.°, do Ministério das Finanças, era que se trata dos encargos da dívida pública, V. Exa. encontrará oito artigos distintos cuja matéria, da mais alta importância, inteiramente justificava a discussão especial que as normas regimentais ordinárias impõem.
Por exemplo, no artigo 1.° trata-se dos juros, discriminada a importância da dívida consolidada, e também da importância e juros da divida interna amortizável a, cargo da Junta, e ainda muitos outros, que não pretendo enumerar discriminadamente, porque não quero prolongar demasiadamente as minhas considerações.
Ainda neste artigo ,o orçamento trata dos juros da dívida amortizável.
Veja V. Exa. a quantidade enorme de assuntos de que trata tam somente o artigo 1.° do capítulo 1.º do orçamento do Ministério das Finanças.
Mas êsse capítulo compreende ainda, como disse há pouco, mais sete artigos,, e cada um deles se ocupa também de assuntos que, pela sua importância, bem merecem que sôbre êles recaia uma discussão especial. • Apoiados.
A proposta do Sr. Sá Cardoso pretende que em vez de sôbre cada um dêstes artigos recair uma discussão especial e V. Exas. acabam de ver quantos são e quantos assuntos estão aqui abrangidos, bastante diversos - pretende essa proposta que a discussão se faça por capítulos.
Sem razão, pois, sem motivo justificado, não foi que no Regimento se incluiu o
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preceito, que mais uma vez classifico de salutar, de fazer incidir em cada proposta de lei duas discussões, uma na generalidade, outra na especialidade, sôbre cada artigo que nessas propostas se contém.
Êste preceito do Regimento é uma vaga, que continua de pé, para os assuntos de somenos importância, para projectículos.
O assunto mais importante, como êste do Orçamento, é, pela proposta do Sr. Sá Cardoso, pôsto da parte.
A proposta do Sr. Sá Cardoso contém, consequentemente, uma violência; é um atentado aos direitos dos Deputados, nos termos do Regimento, porque os Deputados têm de, com a ponderação necessária, tratar dos assuntos trazidos à sua apreciação.
Essa violência sobe de ponto. quando nós atentemos em que ela não vem isolada nesta proposta. Há mais violências, todas elas tendentes a cercear legítimos direitos dos Deputados, porque em todos os tempos os representantes da nação têm de discutir pormenorizadamente a aplicação rigorosa dos dinheiros públicos.
Com efeito, como a Câmara já viu pela discussão anterior que desta proposta aqui se tem feito, nela se contém também o preceito, que violência também é, de que não haverá discussão na generalidade.
Já tive ocasião de dizer aqui que na proposta orçamental para o ano económico, que se iniciou no dia primeiro dêste mês, a indicação das verbas que, pelos diversos Ministérios são atribuídas a todo o funcionalismo do Estado civil e militar, é feita por forma que, quem quere que compulse o Orçamento Geral do Estado, por mais que examine o mesmo Orçamento, por mais que descrimine as verbas, não consegue saber quanto percebe um primeiro, um segundo oficial ou um chefe.
O Orçamento Geral do Estado, que se publica precisamente para que os cidadãos numa democracia exerçam um dos mais elementares dos seus direitos, qual é o de verificarem a exacta aplicação dos dinheiros dos cofres públicos, é feito por forma tal que nem um perito, com os dados que do mesmo Orçamento constam, apesar de formarem um volume muito grande, consegue perceber, lendo e examinando êsse mesmo Orçamento, quanto é que percebe qualquer dos funcionários públicos, porque a proposta orçamental, seguindo neste ponto a prática perniciosíssima dos anos anteriores, prática que já foi verberada asperamente nesta casa do Parlamento, adoptou o sistema de pôr adiante de cada categoria de funcionário uma verba que nem de longe corresponde àquilo que êsse funcionário recebe actualmente. Reporto-me ainda à proposta orçamental relativa ao Ministério das Finanças. Vou ler a V. Exa. algumas das rubricas de alguns artigos por onde se vê o bem fundamentado da minha afirmação.
Assim, a fl. 45 dêsse Orçamento nós encontramos o seguinte:
Leu.
Pregunto se Isto é forma de organizar o Orçamento Geral do Estado, se isto é uma cousa séria e se não carecia uma proposta orçamental organizada nesta conformidade de uma discussão larga na generalidade, para se fazer ver que tal como está ela não pode ser sujeita, sequer, à discussão.
Apoiados.
Ainda vamos encontrar no final do Orçamento, nas despesas extraordinárias, numa única rubrica do capítulo 22.°, referente a todos os funcionários do Ministério das Finanças, um artigo, o 94.°, que diz assim:
Leu.
E aqui tem V. Exa., Sr. Presidente, a forma como é organizado o Orçamento Geral do Estado. E pondo adiante da categoria de cada funcionário uma verba irrisória, e no final, numa rubrica, a quantia de 100:000 contos, para serem distribuídos por êsses milhares de funcionários a que atraz se fez referência.
Eu pregunto se um Orçamento organizado nestes termos é cousa que possa ser discutido, apenas, na especialidade, abolindo-se a generalidade, onde se poderiam pôr a nu todos êstes inconvenientes, todos êstes defeitos.
No emtanto, a proposta de alteração do Sr. Sá Cardoso suprimiu precisamente a discussão na generalidade, coloca a discussão na especialidade em determinadas condições, condições essas que não permitem à Câmara fazer uma discussão conscienciosa e proveitosa.
Sr. Presidente: se a Câmara adoptar
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esta proposta do alteração do Regimento, e se aprovar as emendas já anunciadas da autoria do Sr. Velhinho Correia, uma das quais encerra poderes discricionários para o Sr. Presidente, pregunto se valerá a pena colaborar na discussão de uma proposta desta natureza.
Fiz a promessa de me não alongar nas mintas considerações, já pára não fatigar a Câmara, já porque o meu estado de saúde não permite que continue por muito tempo no uso da palavra.
Esta proposta contém além do artigo em discussão dois outros artigos, um dos quais mantém a disposição verdadeiramente extraordinária de que a discussão versaria apenas sôbre as alterações introduzidas no Orçamento. Ora pode bem suceder que as alterações introduzidas não careçam de grande discussão, porque se imponham pela sua própria natureza, e outros capítulos do Orçamento podem carecer de ama discussão detalhada apesar de não terem sofrido alterações.
Ainda a mesma proposta contém um artigo final que diz o seguinte.
Leu.
Isto é a confirmação do que já se tinha dito no preâmbulo da proposta de as três primeiras horas da ordem do dia serem exclusivamente destinadas à discussão dos orçamentos, não podendo ocupar se a Câmara, nesse tempo, de quaisquer outros assuntos por mais graves e importantes que sejam.
Eram estas as observações mais importantes que tinha a fazer e que corroboram inteiramente aquelas que foram produzidas pelo meu ilustre amigo Sr. Cancela de Abreu.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente : é obrigação das oposições oporem--se às violências das maiorias, principalmente quando querem levar à prática qualquer assunto importante, como êste da discussão do Orçamento.
Pois tem sido a minoria monárquica a única que tem obstado que se leve para diante esta comédia de fingir que se discutem os orçamentos.
Quando há dois anos igual procedimento se tentou, a minoria nacionalista abandonou os trabalhos parlamentares, porque não queria colaborar nessa comédia, e só voltou à Câmara, quando, a maioria se comprometeu a emendar a violência que se tinha praticado; mas hoje vê-se que a minoria nacionalista votou o n.° 2.° da proposta do Sr. Sá Cardoso, o que prova que á política republicana não é norteada pelo respeito aos princípios, mas por uma política de entendimentos, o que dá em resultado - como agora - que um Govêrno que não tem maioria parlamentar ocupo as cadeiras do Poder, havendo parlamentares que abandonaram a sala porque não querem votar, pois que devem favores políticos aos Governos!
Eu oiço a toda a hora protestar contra o facto do Partido Democrático ter monopolizado o Poder.
Não é bem assim, pois eu tenho visto todos os partidos da República sentarem--se naquelas cadeiras em Governos de concentração.
O Partido Democrático não pode deixar de monopolizar o Poder, porque os outros grupos não têm a independência precisa para poderem governar.
A votação de ontem vem demonstrar clara e terminantemente que a continuar por êste caminho só o Partido Democrático governará; pois chegou-se ao ponto de invocar favores que se fizeram a Deputados da oposição.
Não conheço cousa mais imoral politicamente, nada mais contrário ao regime parlamentar.
Um Parlamento assim tem todos os defeitos o nenhuma das vantagens próprias destas instituições.
Ainda há dias nós vimos um Deputado aceitar um lugar remunerado & assim vejo que não se cumprem os artigos 20.° e 21.° da Constituição.
Isto não pode ser.
Não largarei êste assunto de mão.
Pouco antes, um dos actuais Ministros, o Sr. Tôrres Garcia, por quem tenho até estima pessoal, acoitou do Govêrno um lugar remunerado, que não podia, de nenhuma maneira, aceitar nos termos da Constituição.
Anunciam os jornais que o Sr. Velhinho Correia vai ser nomeado secretário geral do Banco de Portugal.
S. Exa. não pode aceitar êsse lugar, porque lho proíbe a Constituição.
S. Exa. não pode ser nomeado para os-
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se lugar, porque perderia o seu mandato e anularia o decreto que o nomeasse.
Pouco antes, outros Srs. Deputados tinham sido nomeados para lugares remunerados, e isto é que faz com que os favores feitos pelos Governos aos Deputados os impeçam de exercer livremente a sua acção de voto.
Não me surpreende, pois, Sr. Presidente, que nós nos vejamos sozinhos a discutir esta proposta.
Nós somos a única oposição, mas a todas as bancadas republicanas, porque elas são cúmplices da ilegalidade e da imoralidade política a que temos assistido, e que constituem a fundamental razão do estado a que chegaram as finanças nacionais e da constante sangria de que é vítima o contribuinte pelo aumento escandaloso das despesas públicas, o que impõe uma larga discussão orçamental.
Lamento que a minoria nacionalista não esteja ao nosso lado, protestando contra esta proposta.
Lamento também que o Sr. Sá Cardoso, quando ainda se julgava Deputado governamental, apresentasse uma proposta julgando assim servir o Govêrno de que faziam parte dois correligionários seus, e que hoje, fazendo parte de um grupo que está em oposição com o Govêrno actual, seja forçado e esteja acorrentado a votar contra aquilo que uma fiscalização parlamentar séria impunha ao grupo a que S. Exa. pertence.
Sr. Presidente: já os meus queridos amigos Cancela de Abreu e Morais Carvalho mostraram os inconvenientes e até a impossibilidade de se fazer uma discussão séria do Orçamento, por capítulos, e não por artigos, como estabelece o Regimento desta Câmara, para todas as propostas.
Se nos lembrarmos de que na proposta Sá Cardoso está consignado o princípio não só de que a discussão se faça por capítulos, mas ainda de que não haja discussão na generalidade, nós temos de constatar que o que se quere é que não se discutam os orçamentos .
Porque é que se discutem os orçamentos?
Qual é a vantagem de êles se discutirem?
Evidentemente que é a de limitarmos as despesas ao quantitativo das receitas, ou pelo menos levá-las tam próximo dês-se quantitativo, que fàcilmente, nos anos seguintes, possamos chegar a um equilíbrio orçamental.
Portanto, ao discutir-se cada um dos capítulos, cada um dos artigos do orçamento, não podemos de maneira nenhuma deixar de nos referir a cada um deles, visto que êles fazem parte de um todo.
Se eu me convencer, ou qualquer de V. Exas., na sua vida particular, que me convém comprar qualquer cousa isoladamente, eu posso dizer sem dúvida, que me é conveniente efectuar essa compra, porém, para o fazer, necessito primeiro saber se o posso fazer dentro das possibilidades do que recebo, ou do que tenho.
Pretender, portanto, abstrair a discussão na generalidade, do orçamento pretender representar uma comédia, e pretender que tudo continue perfeitamente à toa, impedindo assim que eu, ou qualquer outro Deputado, na discussão década capítulo, ou do cada artigo, possamos apresentar os argumentos indispensáveis para mostrar que as despesas resultantes dêsse capítulo ou dêsse artigo não cabem dentro das possibilidades das receitas do Estado.
Sr. Presidente: um dos grandes males dêste Parlamento é os Srs. Deputados virem para aqui para conversar e votar já num determinado sentido, isto é, segundo as conveniências do partido a que pertencem.
De resto, Sr. Presidente, êstes são casos mínimos para os Srs. Deputados, conforme se tem manifestado largamente nos três anos e meio de vida que o Parlamento já tem.
Quantas vezes, Sr. Presidente, ao discutir-se aqui assuntos da mais alta importância a Câmara os tem votado de afogadilho, fazendo para isso logo um requerimento a fim de serem dispensadas as praxes parlamentares, votando-se assim sem se saber o que se vota; haja vista, Sr. Presidente, o empréstimo rácico, o crédito dos três milhões de libras, a questão dos fósforos, não esquecendo também a questão da selagem e o regime tributário.
Eu pasmo, Sr. Presidente, como o actual Parlamento procede sem se lembrar de quanto o País tem sofrido e sofre!
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Se juntarmos a questão de Angola, que custou ao Pais corça de 500:000 contos, o empréstimo rácico que custou dezenas de milhares de contos por ano, a Exposição do Rio de Janeiro, o crédito dos 3 milhões, em que dezenas do milhares de contos foram deitados pela janela fora, isto sem falar no pão político, que custou corça de 500:000 contos, e noutras questões de igual jaez, a obra do actual Parlamento, a obra desta Câmara, sobretudo com a orientação que tem seguido, não querendo saber dos assuntos mais importantes ou votando-os de afogadilho, como querem agora fazer com o Orçamento, essa obra tem deitado pela janela fora mais de um milhão de contos do País!
Mas depois lá está o contribuinte para pagar!
Lá está o povo para sofrer, o povo de quem se dizem tam amigos, o povo que vê a vida cada vez mais cara, o povo, que se encontra dia a dia mais empobrecido!
Cá estamos nós? os que não temos nem queremos ter isso que para muitos é uma felicidade, mas que eu considero uma infelicidade, do comer à custa do Orçamento. Cá estão todos êstes para pagar, para ver em casa as suas mulheres e os seus filhos a sofrer as maiores privações, porque os Srs. parlamentares não estão para maçadas e querem votar as questões de afogadilho, sem se preocupar com o flagelo em que vão transformar a vida de cada família.
Mas, Sr. Presidente, trata-se agora de uma proposta do Sr. Sá Cardoso. Uma simples proposta do alterações ao Regimento - dir-se há. E há um lado da Câmara que faz um escarcéu desta ordem para que a proposta não seja aprovada! ...
Há, porque essa proposta refere-se ao mais importante assunto da administração de um Estado; porque essa proposta pode levar o País a uma situação sem saída, acarretando ainda mais privações à população e com ela só beneficiarão as pessoas que estão explorando esta terra como a uma roça. E eu não me quero referir apenas a exploradores que têm a sua influência ria vida política, mas também àqueles que, numa confusão perigosíssima, são enfileirados entro as fôrças económicas, fazendo com que sôbre estas - o comércio, a indústria e a agricultura - recaia o odioso de terríveis inimigos.
Mas ao que parece, tudo vai bem. Não são necessários quaisquer protestos.
Basta notar a boa disposição da Câmara para se tirar a conclusão de que o País está cheio de felicidade.
Conservador como sou, por convicção cada vez mais arreigada, compreendo que haja quem na extrema esquerda da Câmara defenda princípios absolutamente esquerdistas. E uma atitude. Combato-a porque é contrária aos princípios que eu defendo. O que não compreendo é um Govêrno que não representa princípios conservadores nem princípios esquerdistas. Um Govêrno assim só pode apoiar-se nos pescadores de águas turvas e há--de ser um Govêrno de esploração do País.
O Sr. Velhinho Correia (interrompendo).- assim que V. Exa. quere discutir o Orçamento?
É assim.
O Orador: - Sim, Sr. Secretário Geral.
O Sr. Velhinho Correia: - Isso é que é estar com espírito.
O Orador: - Eu estarei com espírito, o V. Exa. está contra os artigos 20.° e 21.° da Constituição.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - É bom mau! São 50 contos por ano, fora o resto.
O Orador: - Sr. Presidente: V. Exa., faz favor, dizem. a que horas se deverá entrar no período de antes de encerrar a sessão?
O Sr. Presidente: - Ás 19 horas e 20 minutos.
O Orador: - Ainda não concluí, mas peço a V. Exa. que me inscreva para antes de se encerrar a sessão, estando presentes os Srs. Ministros do Interior e das Finanças.
O Sr. Carvalho da Silva: - Diz-se que nós estamos a impedir a votação desta proposta.
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Como V. Exa. vê, e vê toda a Câmara, há muito que dizer.
Nunca qualquer assunto que diga respeito à administração do Estado pode ser considerado isoladamente, porque só numa larga idea de conjunto podem ser apreciados os bens ou males que à vida do país resultem de qualquer dos assuntos que a interessam, e se há algum a que tudo esteja ligado, principalmente nas nossas condições actuais, que possa dizer-se que é basilar, êsse é, sem dúvida, a discussão do Orçamento.
Mas então, Sr. Presidente, se a discussão do Orçamento é basilar, se ela constitui propriamente a razão de ser da instituição parlamentar, porque é que nós, ao discutirmos um simples projecto de criação duma freguesia ou duma assemblea eleitoral, havemos de o discutir largamente, artigo por artigo, e ao tratarmos do Orçamento havemos de admitir o princípio estabelecido na proposta do Sr. Sá Cardoso, princípio que consiste em restringir, em limitar mais para êsse assunto do que para qualquer outro, a discussão da proposta orçamental?
Se nós dêste lado da Câmara, em vez de sermos o número reduzido que somos, tivéssemos uma mais larga representação, pelo menos aquela a que nos davam direito os votos que tivemos nos círculos eleitorais em que disputámos as eleições sem que se tivessem efectuado aquelas operações não só nas assembleas eleitorais, mas ainda nos cadernos de recenseamento, e até, Sr. Presidente, nas comissões de verificação de poderes, as cousas não correriam como têm corrido.
Eu preferia, confesso, .que todos os Srs. Deputados, a partir destas bancadas para lá, fossem Deputados da maioria democrática; ao menos, Sr. Presidente, não haveria êste artifício de supor-se que estava aqui uma oposição parlamentar intransigente.
Nas condições em que funciona esta Câmara nós vemos que se há um momento em que dali se faz oposição, ela não se mantém, não constitui nenhuma garantia, porque, chegado qualquer momento, as combinações políticas de bastidores fazem com que a minoria nacionalista, numa reviravolta completa de opinião, assuma uma atitude bem oposta àquela que assumiu há dois anos, quando se tratava dêste mesmo assunto.
Mas, infelizmente, as cousas são o que são, e eu creio bem que na República não é possível que elas mudem. Efectivamente, diante de tantas reclamações, protestos e manifestações do país, o que é que nós vemos? De um lado nós a procurarmos que essas reclamações sejam atendidas, pugnando pelos interêsses nacionais e diligenciando que as cousas mudem; mas daqui para lá uma barreira enorme a separar-nos, de forma que, todos juntos, os Deputados republicanos lutem pela continuação das cousas tal como elas têm motivado os protestos do país.
Nós desejaríamos que o futuro Parlamento fôsse bem diverso do actual; daqui para lá todos lutam de acordo para que o Parlamento seja o mesmo que é agora, isto é, todos lutam não na defesa de princípios, mas na defesa da falta de princípios em que a República se tem arrastado numa existência bem pouco invejável, e que levanta os protestos de todos os sinceros republicanos que nos tempos da propaganda defendiam os princípios que julgavam ser os que mais convinham à vida do seu país. Ah! se êles pudessem estar no Parlamento, vendo a maneira como os princípios aqui são desprezados, seriam os primeiros a dar-nos razão quando combatêssemos propostas como a do Sr. Sá Cardoso.
Eu bem dizia outro dia a S. Exa. que ainda se havia de arrepender de ter apresentado essa proposta, porque, se era na ocasião Deputado governamental, podia vir ainda a sê-lo oposicionista. Na verdade, foi o qoe sucedeu; mas, como disse há pouco, tive o desgosto dever que as oposições parlamentares, pelos favores recebidos dos Governos, não podem ser oposição enérgica.
Realmente, chegado o momento em que poderiam até ter a possibilidade de governar, de entre os seus elementos desertam alguns do campo da batalha, para facilitarem a vida do Govêrno do qual dizem ser oposição.
Eu gostava, a êste respeito, de ouvir a opinião do Sr. José Domingues dos Santos. S. Exa., quando apresentou a sua declaração ministerial a esta Câmara, sendo Presidente de Govêrno, dizia que necessitava pôr as cousas diferentemente
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daquilo que a República tem sido até agora.
O Sr. José Domingues dos Santos, na sua declaração ministerial, dizia:
"É preciso acabar com os escândalos, é preciso que todos nós procuremos a maneira de regularizar as contas públicas".
Mas S. Exa., que dizia isso quando se apresentou à Câmara com o seu Govêrno, esqueceu completamente êsses princípios, e parece-me que hoje já está disposto a ajudar a continuação das cousas, tal como até aqui só têm passado.
Ainda ontem, nós ouvimos S. Exa. falar aqui, e verificámos que S. Exa. deu uma prova irrefutável de que não deseja ser indisciplinado, porque, se o quisesse ser, revoltar-se-ia contra a proposta que está em discussão, não consentindo que fôsse transformada em lei.
Mas nada. No fim do seu discurso disso que não obedecia, mas, afinal, está a obedecer em tudo, como soldado disciplinado do Partido Republicano Português.
Mas, não sei se o argumento apresentado ontem pelo Sr. José Domingues dos Santos, de não ter sido ouvido o Grupo Parlamentar Democrático, acêrca da atitude a tomar perante o actual Govêrno, será também o que levou S. Exa. pela hipótese contrária, a não usar da palavra, nem os seus amigos, para discutirem esta proposta.
Em todo o caso, gosto que as cousas fiquem claramente postas, que cada um fique com as suas responsabilidades perfeitamente marcadas.
Nós, Sr. Presidente, defendendo aqui a moral administrativa e política da monarquia, orgulhamo-nos de representar aqui uma instituição cujos processos administrativos são tam modelarmente honestos.
Lembrar-se a gente, Sr. Presidente, de que em 1910 a proposta orçamental apresentava um montante de despesa de 72:000 contos, e que hoje, sem estarem incluídos os serviços autónomos, eleva-se a 1.800:000 contos.
Se nós confrontarmos essas desposas com as que se faziam no tempo da monarquia chegaremos à conclusão - ainda tomando em conta a desvalorização da moeda - que elas foram muito inferiores.
Mas o que se há-de fazer se estamos em vésperas do eleições e é preciso tratar delas e dos amigos da Sérvia!
O Sr. Presidente: - Deu a hora de se passar ao período de "antes de se encerrar a sessão".
O Orador: - Nesse caso ficarei com a palavra reservada.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:-A próxima sessão é amanhã, com a seguinte ordem do trabalhos:
Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscrevam):
A de hoje, menos os pareceres n.ºs 923, 911-E e 651-E.
(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):
A de hoje.
Ordem do dia:
A de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 20 minutos.
Documentos enviados para durante a sessão
Projecto de lei
Do Sr. José Marques Loureiro, prorrogando por seis meses o prazo marcado no artigo 20.° do decreto n.° 5:787-P, de 10 de Maio de 1919.
Para o "Diário do Govêrno".
Declarações de Voto
Declaro que se estivesse presente na sessão de ontem teria aprovado a moção do ilustre Deputado Sr. Sá Cardoso, muito embora tenha toda a consideração pelos republicanos que fazem parte do Govêrno, entre os quais conto amigos velhos e dedicados companheiros de luta pela República nos saudosos tempos da propaganda.
Lisboa e Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 7 de Julho de 1925. - Américo da Silva Castro.
Para a Secretaria.
Para a acta.
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Declaro que se estivesse presente na sessão que terminou na madrugada de hoje, aprovaria a moção apresentada pelo Sr. Sá Cardoso.
7 de Julho de 1925.- José Pedro Ferreira.
Para a acta.
Parecer
Da comissão, de instrução especial e técnica, sôbre o n.° 952-A, que isenta de
adicionais sôbre as contribuições do Estado a indústria e comércio de livros de autores portugueses.
Para a comissão de finanças.
O REDACTOR - Herculano Nunes.