Página 1
REPUBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 104
EM 31 DE JULHO DE 1925
Presidência do Exmo. Sr. Afonso de Melo Pinto Veloso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. - Respondem à chamada 45 Srs. Deputados.
É lida a acta, que adiante se aprova com número regimental.
Dá-se tonta do expediente, e são admitidas proposições de lei, já publicadas no "Diário do Governo".
Antes da ordem do dia. - O Sr. Tavares de Carvalho refere-se às condições em que estão presos alguns oficiais revolucionários.
O Sr. Pires Monteiro requere a discussão imediata de dois pareceres.
O Sr. Morais Carvalho interroga a Mesa sôbre a hora da ordem do dia.
Responde o Sr. Presidente.
O Sr. Cortês dos Santos trata do parecer n.° 921, referente aos oficiais do exército.
É aprovado o requerimento do Sr. Pires Monteiro, entrando em discussão o parecer n.º 677 - emendas do Senado.
Entram em discussão as emendas do Senado sôbre o Montepio dos Sargentos.
Usa da palavra o Sr. Alberto Jordão.
O debate fica pendente.
Ordem do dia. - O Sr. Brito Camacho interroga a Mesa sôbre se o Senado está reunido para discutir o projecto dos duodécimos, caso seja aprovado na Câmara dos Deputados, respondendo o Sr. Presidente que o Senado encerrou a sua sessão.
O Sr. Morais Carvalho requere que, neste caso, a discussão seja adiada, falando sôbre o modo de votar os Srs. Jaime de Sousa, Cunha Leal e Morais Carvalho.
O requerimento é rejeitado.
São aprovadas as últimas actas pendentes de votação.
Continua a discussão do projecto do duodécimo para o mês de Agosto.
É aprovado com dispensa da última redacção.
Entra em discussão o projecto anulando os decretos n.ºs 10:734 e 10:771.
Usam da palavra os Srs. Cunha Leal e Morais Carvalho, sendo rejeitado um requerimento do Sr. Rodrigues Gaspar, para que se aguarde a presença do Sr. Ministro da Guerra.
Continua a discuto, falando o Sr. Almeida Ribeiro.
O Sr. João Camoesas requere que o projecto baixe à comissão de guerra, mas verificando-se não haver numero, encerra-se a sessão, tendo-se procedido à chamada.
Abertura da sessão às 15 horas e 37 minutos.
Presentes à chamada 45 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 24 Srs. Deputados.
Presentes à chamada:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Ginestal Machado.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Constâncio de Oliveira.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Cruz.
Página 2
2 Diário da Câmara aos Deputados
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João José da Conceição Camoosas.
João José Luís Damas,
João de Ornelas da Silva.
João Pina de Morais Júnior.
João do Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António do Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
José Cortês dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Correia.
António Lino Neto.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio do Vasconcelos.
Carlos Olavo Corroía de Azevedo.
Custódio Martins de Paiva.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Sebastião de Herédia.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Lelo Portela.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Pinto de Azevedo o Sousa.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Américo da Silva Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Resende.
António de Sousa Maia.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso,
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Carlos Cândido Pereiro.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo,
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves,
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
Página 3
Sessão de 31 de Julho de 1925 3
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Aguas.
João Salema.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Gosta.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo Carvalho Guimarães.
Às 15 horas e 25 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 45 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 37 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Do Senado, enviando uma proposta de lei que concede regalias aos donos de prédios sujeitos a usufruto.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Do Senado, enviando uma proposta de lei que altera o decreto n.° 9:445, de 25 de Fevereiro de 1924.
Para a comissão de guerra.
Do juízo de direito da comarca das Caldas da Rainha, pedindo a comparência no tribunal daquela comarca, no dia 4 de Agosto próximo, pelas onze, horas, do Sr. Deputado Maldonado de Freitas.
Concedido.
Comunique se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Requerimento
De António Luís Mendes Pais, ex-fiscal de 1.ª classe dos impostos, pedindo a sua reintegração.
Para a comissão de finanças.
Admissões
São admitidas as seguintes proposições de lei, já publicadas no "Diário do Govêrno".
Projecto de lei
Do Sr. Ribeiro de Carvalho, passando à situação de supranumerários os oficiais civis da Secretaria da Guerra e os oficiais milicianos contados no quadro do secretariado militar, por promoção, nos termos da lei n.° 1:312.
Para a comissão de guerra.
Propostas de lei
Do Sr. Ministro das Finanças, isentando de direitos de importação e de imposto de transacção o material que a Câmara Municipal de Lisboa importar para
Página 4
4 Diário da Câmara dos Deputados
instalar um forno crematório no cemitério do Alto de S. João.
Para a comissão de administração pública.
Do Sr. Ministro da Guerra, dando nova redacção ao artigo 21.° do decreto n.° 5:070, alterado pela lei n.° 1:039, de 28 de Agosto de 1920.
Para a comissão de guerra.
O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de "antes da ordem do dia".
Antes da ordem do dia
O Sr. Tavares de Carvalho: - Sr. Presidente: eu pedi a palavra, apesar de o Govêrno não estar presente, para protestar, com toda a veemência, contra o que se está passando com os oficiais que estão presos em Santarém, segundo relata o Diário de Lisboa de ontem.
Os factos que ali vêm narrados constituem uma violência, contra a qual eu me revolto.
No tempo do Sidónio também me foi dada alta, apesar de eu estar com a pneumónica, e, visto que agora se está cometendo a mesma violência contra os oficiais que estão no presídio de Santarém, eu não posso deixar de me insurgir contra tal maneira de proceder.
Se estivesse presente o Sr. Ministro da Guerra eu exigiria de S. Exa. que a êsses oficiais fôsse dado o tratamento que lhes é devido.
Antes de serem julgados, não há o direito de os condenar a um regime vexatório, nem de se cometer contra êles quaisquer violências.
Apoiados.
No tempo do Sidónio deram-me, para me deitar, apenas uma cama de soldado, com duas mantas, o mais nada.
Mas, isso passou-se no tempo nefasto do Sidónio, e não podemos consentir que agora se faça o mesmo.
Apoiados.
O que aqui, neste jornal, se relata, faz doer o coração, especialmente a quem, como eu, já sofreu igual tratamento.
Não há necessidade nenhuma de se praticarem violências desta ordem contra oficiais que ainda não foram julgados, porque êles, até ao seu julgamento, têm direito a ter o tratamento que lhes é devido.
Apoiados.
Quando nós saímos triunfantes do movimento monárquico do Pôrto, exigimos que aos oficiais que então foram presos, fôsse dado o tratamento e a consideração que lhes eram devidos, e, por isso, não podemos proceder agora de maneira diferente.
Apoiados.
Muito agradeço a V. Exa., Sr. Presidente, a fineza de transmitir ao Sr. Ministro da Guerra as minhas considerações e o meu pedido para que seja modificada imediatamente a situação dos oficiais a que aludi.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taguigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Pires Monteiro: - Sr. Presidente: eu desejo submeter à apreciação da Câmara dois requerimentos, referentes a assuntos que já estão inscritos no período de "antes da ordem do dia", e que dizem respeito a questões que, sendo do maior interêsse para colectividades, não devem provocar qualquer reparo da parte da Câmara.
Trata-se simplesmente de emendas vindas do Senado, uma referente a um assunto já tratado pormenorizadamente nesta Cansara, um projecto de lei antigo e que finalmente conseguiu ser aqui aprovado, e mais tarde enviado ao Senado.
Êsse projecto de lei refere-se ao montepio dos sargentos.
Conhece a Câmara a justiça que há de garantir, de qualquer forma, a situação destes funcionários militares, que ao exército e à marinha prestam relevantes serviços, porque muitas vezes não é suficiente uma pensão para garantir o futuro de suas famílias.
Julgou-se necessário estabelecer o montepio dos sargentos. Entretanto êste assunto tem-se protelado durante muito tempo, e, embora seja há anos inscrita no Orçamento do Ministério da Guerra a verba com que o Estado contribui para o fundo dêste montepio, a verdade é que ainda não conseguiu ser lei do País
Página 5
Sessão de 31 de Julho de 1925 5
aquela disposição que deu a êsses homens as garantias devidas.
A emenda vinda do Senado é muito ligeira, e estou convencido de que a Câmara lhe não fará qualquer reparo, e aprovará o meu requerimento para que seja imediatamente discutido êste assunto.
O outro ponto, para que desejo chamar a atenção da Câmara, refere-se à ligeira alteração que foi introduzida pelo Senado ao parecer n.° 677.
O parecer n.° 677 refere-se à comemoração do centenário da Independência e Restauração de Portugal.
A Câmara sabe que só em 1940 se realiza esta comemoração; entretanto alguns dos ilustres membros que fazem parte da comissão central 1.º de Dezembro tomaram a iniciativa de um projecto de lei, destinado a criar o sêlo da Independência, para com o produto da venda dêsse solo obterem-se os meios indispensáveis para a aquisição do chamado palácio do Conde de Almada e promover uma grande exposição de carácter económico e artístico no ano de 1940.
Êsse parecer, submetido à discussão, sofreu várias emendas o foi enviado para o Senado. Esta Câmara julgou conveniente introduzir uma emenda ao artigo 8.° para evitar no futuro confusões. Resume-se essa emenda a declarar que, no caso de ser dissolvida a comissão 1.° de Dezembro, todos os direitos passam para o Estado, sem indemnização. Um distinto jurisconsulto da outra Câmara julgou essencial essa emenda, o que representa um sintoma da desconfiança que atravessa a sociedade portuguesa.
Entretanto receio que, estando finda esta sessão legislativa, o trabalho que tem havido para conseguir esta lei fique perdido completamente.
Peço, portanto, a V. Exa. para na aliara conveniente submete os meus requerimentos à apreciação da Câmara.
Estando no uso da palavra, aproveito o ensejo para chamar a atenção da Câmara para um assunto que interessa às instituições militares.
Como V. Exa. sabe, está em discussão "o parecer n.° 921, que estabelece os bons princípios que permitem regular a promoção dos alunos que concluem o curso da Escola Militar.
Julgo, depois de já ter sido ouvida a opinião do Sr. Ministro da Guerra demissionário, indispensável continuar a sua discussão, visto já ter sido aprovada na generalidade, e quatro artigos na especialidade estarem também votados.
Está em discussão o artigo 5.°, sôbre o qual estou com a palavra reservada.
Parece-me que a Câmara dos Deputados podia prestar êste grande serviço ao exército, pois êste projecto de lei vem normalizar as promoções nos postos menos elevados da hierarquia militar. Conseqúentemente, é um grande serviço que se presta às instituições militares.
Entretanto êste projecto de lei, fundado numa proposta de lei do então Ministro da Guerra, Sr. Vieira da Rocha, terá do ser discutido na outra Câmara, e possivelmente terá de voltar a esta Câmara, antes de ser transformado em lei.
A comissão de guerra, que tem apresentado à apreciação da Câmara dos Deputados muitos dos seus pareceres - nenhum foi tam completo como êste - folgo de prestar a minha homenagem.
Êste parecer trouxe êste benefício: os alunos que tenham concluído os cursos da Escola Militar, em vez de serem promovidos a alferes, permanecem um ano em aspirantes, pois não se lhe garante um pôsto para que ainda não deram todas as provas da sua competência. Já vê V. Exa. o que resulta de economia para o Estado.
Aproveitei esta oportunidade para chamar a atenção da Câmara para êste parecer, que vem normalizar uma situação que é anormal.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Requerimentos
Requeiro que sejam discutidas imediatamente as emendas do Senado ao parecer n.° 196 (Montepio dos Sargentos). - Henrique Pires Monteiro.
Requeiro que seja imediatamente apreciada a emenda introduzida no Senado ao artigo 8.° do parecer n.° 677 (Centenário da Independência). - Henrique Pires Monteiro.
O Sr. Morais Carvalho (para interrogar a Mesa): - V. Exa. pode dizer-me a que horas se entra na ordem do dia?
Página 6
6 Diário da Câmara dos Deputados
O Sr. Presidente: - Às 16 horas e 45 minutos!
O Sr. Cortês dos Santos (sobre o parecer n.° 921): - O parecer que só discute vem remediar uma situação criada pelo envio de oficiais para a guerra, o que deu lugar a várias promoções de alferes a capitão, e, como é necessário, estabelece uma fase de antiguidade para as promoções e resolvo o assunto.
A base fixada foi alterada da seguinte forma.
Leu.
Esta proposta veio trazer a perturbação que se tem feito sentir até êste momento.
Mais tarde a organização da Escola Militar, publicada pelo decreto com fôrça de lei n.° 5:787, modificando as categorias, veio contribuir ainda mais para tornar mais irregular a situação do momento, e assim, de alteração em alteração, chegou-se à situação em que nos encontramos, qual é a que diz respeito aos oficiais de cursos mais demorados, tais como os de engenharia militar e artilharia a pé, que se encontram numa situação de inferioridade em relação aos outros oficiais de cursos menos demorados, pois a verdade é que êsses oficiais de, engenharia e artilharia só obtêm o pôsto de tenente um ano depois dos das outras armas.
Sr. Presidente: a proposta apresentada a esta Câmara pelo Sr. Ministro da Guerra pretende remediar esta situação de desigualdade flagrante, deixando outras desigualdades que é necessário atender.
Torna se absolutamente necessário remediar êste inconveniente a que mo venho referindo, muito principalmente na parte que diz respeito ao pôsto de general, cujo quadro é abrangido, como a Câmara muito bem sabe, por todas as armas.
Sr. Presidente: tem do acabar, a fim do de que possa também acabar de urna voz para sempre o que só dá com a promoção do pôsto de general.
Muitas considerações se podiam fazer, muito principalmente na parte que diz respeito a reforma, contagem de tempo, comandos, etc. Toda a gente sabe o que sucede num País colonial como o nosso. Muitas vozes temos do mandar lá fora expedições, de forma que tem de se estabelecer a antiguidade para efeitos do comando, etc.
Mostra-se, por consequência, a necessidade do estabelecer esta base do comparação, e foi para que se resolva nos terrnos que têm até aqui sido aceitos que u comissão do guerra teve a honra de apresentar, relatando esta proposta de lei da autoria do Sr. Ministro da Guerra, um contra-projecto de lei, a cuja doutrina a Câmara ouviu o Sr. Piro" Monteiro que, além de pessoa estudiosa dêstes assuntos, é também um distinto lente da Escola Militar, tecer os maiores elogios.
Eu sei que se pretende introduzir uma alteração neste contra-projecto de lei, não tendente a melhorá-lo, mas a aproveitar a ocasião para se conseguir uma outra finalidade, que não se ligando aliás, pròpriamente com o assunto que êle versa, servia para melhorar a situação do alguns oficiais promovendo-os.
Creio que foi o Sr. Carvalho da Silva que há tempos, discutindo êste parecer, lembrou a necessidade de remediar uma situação que será muito para lamentar, mas que em presença dos altos interêsses militares não é de aceitar.
Mas a emenda não está apresentada e, portanto, não quero antecipar mo a dizer qualquer cousa sôbre ela. Apenas para que ela não seja apresentada, direi que vem aumentar em muito as desposas e trazer uma abundância de oficiais num determinado pôsto excedendo em muito os quadros que já neste momento se encontram excedidos, com prejuízo do quadro imediatamente inferior, e dos oficiais subalternos.
Realmente, pretendo-se com essa aparente e inocente emenda, realizar a promoção, numa simples contagem de antiguidade, de duzentos e tantos tenentes a capitães, do todas as armas e serviços.
Essas emendas, uma voz apresentadas, deviam merecer da parte da Câmara um sério exame, exactamente para evitar uma cousa destas; a não ser que, do facto, a Câmara reconhecesse na sua alta justiça e soberania que não era justo atender a essa situação.
No emtanto, ou devo frisar que uma tentativa análoga já aqui foi feita por meio de um projecto de lei, o qual baixou à comissão de guerra. E tendo-lhe esta
Página 7
Sessão de 31 de Julho de 1925 7
dado parecer contrário, não chegou a ser apreciado.
Diz-se que neste contra-projecto há uma modificação nas regalias concedidas pela última organização da Escola Militar, aos alunos desta Escola.
Ora, pela última organização, feita em 1919, e pelo decreto n.° 5:787, com fôrça de lei, os alunos da Escola Militar são considerados aspirantes oficiais; ao passo que, por êste contra-projecto, se lhes mantêm as mesmas regalias, mas são considerados aspirantes-alunos, emquanto frequentarem a Escola.
De facto, esta denominação está bem, e a meu ver é preferível à outra. A comissão de guerra, ponderando o assunto, concordou também com esta nova denominação, tanto mais que mantêm todas as regalias e todas as vantagens actualmente em vigor para aqueles alunos, não sendo êles, por isso, prejudicados com a modificação.
Para aqueles que vão completar a sua educação militar jias escolas de aplicação das diferentes armas, mantem-se a denominação de aspirantes-oficíais.
Por consequência, Sr. Presidente, estou convencido de que êste projecto deverá ser aprovado pela Câmara, porque, assim, ela prestará um alto serviço ao exército. E, parece-me que assim sucederá, porquanto todos os Srs. Deputados que já usaram da palavra sôbre o assunto lhe foram favoráveis.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Pires Monteiro para entrarem imediatamente em discussão as emendas- do Senado aos pareceres n.° 677, e sôbre o Montepio dos Sardentos.
Em seguida foram aprovadas, sem discussão, as emendas do Senado ao parecer n.° 677 e ao parecer sôbre o Montepio dos Sargentos até ao artigo 5.° inclusive.
Lida na Mesa a emenda do Senado ao artigo 6.°, é admitida e posta à discussão.
O Sr. Alberto Jordão: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. a fineza de me informar se falta muito tempo para entrar na ordem do dia.
O Sr. Presidente: - Faltam cinco minutos.
O Orador: - Muito obrigado a V. Exa.
Sr. Presidente: quere-me parecer que a doutrina constante do artigo 6.°, que acabou de ser lido, tem matéria mais que suficiente para merecer reparo. Parece-me que se dá uma latitude exagerada ao princípio que neste artigo se procura defender.
É certo, Sr. Presidente, que me falta aqui um elemento para que eu convenientemente, com conhecimento pleno de causa, portanto, possa determinar, formar o meu juízo sôbre o artigo em discussão.
Êsse elemento é o artigo 5.° cuja redacção, verdade, verdade - e isso não é de estranhar - eu muito presente não tenho. Não se encontra, de facto, êsse artigo aqui transcrito, e apenas vejo a indicação de que foi aprovado. Ora, como o artigo 6.° se liga intimamente com o anterior, imprescindível se me tornava o conhecimento dêste último artigo para fazer uma apreciação acomodada à doutrina que agora se discute.
Em todo o caso, disse e repito que creio que é lata em demasia a doutrina do artigo 6.°, porque não estabelece qualquer restrição, e parece-me que bem razoável seria estabelece-la.
Qualquer que seja o motivo que obrigue um sargento a passar à classe civil-isto diz o artigo 6.° - não impede que a êsse militar, embora eliminado do número de sócios, sem direito, é certo, a indemnização alguma, se lhe reconheça o direito de continuar a contribuir com a cota que pagava.
Mas eu quero crer que há circunstâncias de carácter especial que fazem com que esta doutrina não seja aceitável.
Assim, veja V. Exa., Sr. Presidente, que se acaso um sargento transitasse para a classe civil (e isto mesmo há pouco comentava um Deputado) por motivos que o tornassem incompatível com o prestígio da classe a que, embora não pertencendo já, continuava, contudo ainda mais ou menos ligado, por motivos que até mesmo o lançassem no número daqueles que são apontados como escalrachos da sociedade, em tais condições, veja V. Exa., repito, se não é pouco razoável permitir-se que se lhe reconheçam os direitos que neste artigo 6.° se consignam.
Deveria, julgo eu ter-se atentado bem nesta hipótese. E assim, teríamos uma
Página 8
8 Diário da Câmara dos Deputados
doutrina que era muito mais de louvar, muito mais defensável, e que significaria, além de tudo, que as pessoas que legislam ainda se preocupam com motivos de ordem moral, que numa sociedade bem constituída, sobrelevam todos os outros...
O Sr. Presidente: - V. Exa. dá-me licença?... É a hora de passarmos à ordem do dia...
O Orador: - Então peço a V. Exa. o favor de me reservar a palavra.
Alterações introduzidas pelo Senado à proposta de lei n.° 923, vinda da Câmara dos Deputados.
Artigo 1.° - Aprovado.
Art. 2.° - Aprovado.
§ único - Aprovado.
Art. 3.° - Aprovado.
Art. 4.° - Aprovado.
Art. 5.° - Aprovado.
Alínea a) - Aprovada.
Alínea b) - Aprovada.
Alínea c) - Aprovada.
Art. 6.° - Aprovado.
Art. 7.° - Aprovado.
Artigo 8.° No caso do dissolução da Comissão Central 1.° de Dezembro de 1640, o Govêrno tomará posse plena do edifício e de todo o seu conteúdo, satisfazendo as indemnizações a que se refere o artigo 11.°
Art. 9.° - Aprovado.
§ único - Aprovado.
Art. 10.° - Aprovado.
Art. 11.° - Aprovado.
§ 1.° - Aprovado.
§ 2.° - Aprovada.
§ 3.° - Aprovado.
Art. 12.° - Aprovado.
§ 1.° - Aprovado.
§ 2.° - Aprovado.
Art. 13.° - Aprovado.
Palácio do Congresso da República, em 31 de Julho de 1925. - António Xavier Correia Barreto - Luís Inocêncio Ramos Pereira - José António da Costa Júnior.
O Sr. Brito Camacho (para interrogar a Mesa): - Sr. Presidente: pedi a V. Exa. a fineza de me dizer se está informado sôbre se o Senado ainda hoje, no caso de a Câmara dos Deputados votar o duodécimo pedido, funcionará para apreciar a resolução desta Câmara.
O Sr. Presidente: - A afirmação que chegou à Mesa é de que o Senado não volta hoje a funcionar.
O Sr. Morais Carvalho (interrompendo): - V. Exa. dá me licença?... Eu sei ainda que no Senado se marcou a próxima sessão para 4.a feira da semana que vem.
O Orador: - Quere dizer, Sr. Presidente, que a urgência da Câmara dos Deputados votar o duodécimo pedido desapareceu, visto que êle não será admitido ou executado emquanto não fôr aprovado pela outra Câmara. E como o Senado só reúne na próxima quarta-feira, inútil me parece êste simulacro de trabalho que vamos dar ao país e êste espectáculo boémio, com que não ganha nem a Pátria nem a República, embora ganhem algumas pessoas. *
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - A proposta dum duodécimo está dada para a ordem do dia o há número para votações. Pode a discussão nesta Câmara demorar até quarta-feira.
O Sr. Morais Carvalho (para um requerimento): - Sr. Presidente: desaparecida a urgência de votar um duodécimo, visto que o Senado só reúne na próxima quarta-feira, e parecendo inconveniente que a discussão do assunto se faça na ausência do Sr. Ministro das Finanças, eu requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se ela permito que a discussão prossiga, na altura em que houver Ministro.
O Sr. Jaime de Sousa (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: sôbre o modo de votar, oferece-se-me dizer a V. Exa. e à Câmara que julgo que, por igual, não devem ser recebidas as considerações do Sr. Brito Camacho nem tam pouco que seja de aceitar o sentido do requerimento do Sr. Morais Carvalho.
Nada tem que ver o funcionamento da outra Câmara com os trabalhos desta.
Apoiados.
Página 9
Sessão de 31 de Julho de 1925 9
Pelo contrário, o que é necessário é que a Câmara dos Deputados dê expediente à matéria dada para a ordem do dia, para depois a outra Câmara se poder pronunciar sôbre a matéria sem demora. Estar a condicionar o trabalho, desta Câmara às possibilidades de funcionamento da outra, não faz sentido e só demonstra que há vontade de confundir o que já está bastante confundido. O que é lamentável ainda, Sr. Presidente, é que & exiguidade do número de parlamentares presentes, numa véspera de feriado, de monstro a falta de vontade que há em trabalhar.
O que é certo, porém, é que há número e as condições necessárias para que a Câmara cumpra o seu dever, e não é, portanto, para receber o podido de protelamento dos trabalhos parlamentares.
Vamos cumprir o nosso dever: votar a proposta de lei e remetê-la ao Senado.
O orador não reviu.
O Sr. Cunha Leal (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: não concordo com o requerimento do Sr. Morais Carvalho, porque realmente não quero dar pretexto a que se pratiquem actos inconstuticionais. Se eu fôsse Ministro das Finanças amanhã, e não estivesse aprovada uma lei que permitisse fazer cobranças, mandava cessar todos os pagamentos nas Tesourarias de Finanças, e nestas condições ia causar uma perturbação grande na vida económica do país.
Pregunto a mim mesmo se o desinteresse que se manifesta pela aprovação do duodécimo para o mês que vem corresponderá ao desejo de o publicar em ditadura, dando como pretexto o facto de a Câmara não o ter votado.
Nestas condições, não me importo de saber se o Senado cumpre ou não o seu dever. Cumpramos nós o nosso, e não nos importemos com o procedimento do Senado.
Assim a minoria nacionalista não pode dar aprovação ao requerimento do Sr. Morais Carvalho, não porque queira fazer um simulacro de discussão, mas para tirar ao Poder Executivo mais um pretexto para atacar a Câmara dos Deputados.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: não me alongarei em considerações, nem contava sequer voltar a usar da palavra se os Srs. Jaime de Sousa e Cunha Leal não se tivessem referido as palavras que há pouco pronunciei.
A discussão do duodécimo relativo ao mês de Agosto iniciou-se nesta casa do Parlamento, o assim continuará em condições anormais, visto não se encontrar presente o Sr. Ministro das Finanças, nem qualquer outro membro Ho Poder Executivo. Compreendia-se ainda, e era o motivo alegado ontem, que a discussão assim se fizesse, com o fundamento de que era urgente e possível votar-se o duodécimo antes do fim do mês; mas desde que há a certeza de que êle não se poderá votar até hoje, à meia noite, visto que o Senado encerrou já os seus trabalhos, nada há que justifique aquela violência.
Diz o Sr. Cunha Leal que não nos devemos importar com a atitude do Senado.
O Sr. Cunha Leal: - Eu não tenho culpa de que o Senado tenha tomado unia. atitude diferente daquela que seria para desejar!
O Orador: - Mas nós estamos perante uma questão de facto. Não há dúvida de que o Senado só tem sessão marcada para a próxima quarta-feira; de forma que me parece inútil a urgência da discussão.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se o requerimento do Sr. Morais Carvalho.
Procedeu-se à votação, sendo rejeitada em prova e contraprova requerida pelo Sr. Morais Carvalho.
ORDEM DO DIA
Continua a discussão da proposta do duodécimo para o mês de Agosto.
É posta à votação a emenda do Sr. José Pedro Ferreira.
O Sr. Brito Camacho (sobre o modo de votar): - Sr. Presidente: pela primeira vez me sirvo de um artifício para dizer nesta altura o que deveria ter dito em
Página 10
10 Diário da Câmara dos Deputados
outra ocasião, e por isso uso da palavra sôbre o modo de votar.
Esta emenda não devia, ter sido recebida na Mesa porque é um aditamento.
O Sr. Presidente: - E um parágrafo ao artigo.
O Orador: - Porque assim o querem chamar!
Se bem me recordo, a lei travão impedia que a Mesa aceitasse essa emenda; como a Mesa a aceitasse, eu limito-me a preguntar ao autor da emenda em quanto computa o aumento de despesa.
É lamentável que num país quási em falência, sem se saber onde é que se há-de ir buscar mais dinheiro, só apresente uma proposta dêste género sem se dizer em quanto aumenta a despesa.
Digo isto nesta sessão legislativa que está a findar e com ela finda a minha vida política - digo o pára desmentir certos canards (eu disse canards) da imprensa!
Limito-me a fazer a minha afirmação de que não é com a minha aquiescência que se vai dar mais um empurrão na Republica.
O Sr. Carlos de Vasconcelos (interrompendo): - É preciso saber só o princípio das diuturnidades já foi aplicado a alguma repartição do Estado.
O Orador: - Eu sou de Aljustrel e não de Braga; só o autor da proposta resolver dizer quanto importa o aumento dá despesa, eu dou-me por satisfeito.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. José Pedro Ferreira: - Devo dizer em primeiro lugar que não tenho empenho algum em que esta proposta seja aprovada.
O que me revoltou foi a injustiça que se pratica de haver funcionários públicos que têm diuturnidades e não as terem outros.
Foi para desfazer essa iniquidade que e a mandei para a Mesa essa emenda.
A Câmara votará, como entender.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paiva Gomes: - O dever da Câmara neste momento é habilitar o Govêrno a poder cobrar as receitas e pagar as despesas.
Se esta emenda é justa faça-se uma lei em separado e não se enxerte isso no duodécimo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Em referência às considerações feitas pelo Sr. Brito Camacho, devo dizer que a Mesa recebeu a emenda porque o seu autor disse que se tratava apenas de regularizar uma situação que estava criada.
Procedeu-se à votação da emenda, que foi rejeitada.
Foi lido e aprovado o artigo 2.°
Entrou em discussão o artigo 3.º
O Sr. Presidente: - Vai votar-se.
Foi aprovado, em contraprova requerida pelo Sr. Morais Carvalho, por 57 Srs. Deputados contra 1.
Foi lido na Mesa o artigo 4.° (novo) do Sr. Viriato da Fonseca.
O Sr. Francisco Cruz: - Sr. Presidente: eu devo chamar a atenção da Câmara para êste artigo novo, pois é lamentável que nesta hora grave se venha pedir 10 contos para uma passeata à Itália1
Bastavam 100$ para comprar um livra para que a estatística soubesse o que se passou no congresso.
Lamento que o Sr. Viriato da Fonseca tivesse tam mau pensamento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paiva Gomes: - Já disse que nesta proposta não se devia enxertar mais nenhum outro assunto, esta ver ha, por todos os motivos e até pela sua parte moral, não deve ser aceita.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Viriato da Fonseca: - Não compreendo o motivo de tam grande celeuma como se tratasse de uma pessoa que tivesse sido esbanjador do Estado!
Eu, por motivo das funções do meu cargo; já trouxe para o Estado de uma vez 15:000 contos e de outra 20:000!
Sr. Presidente: eu vou contar à Câmara como estou metido nesta questão.
Página 11
Sessão de 31 de Julho de 1925 11
Infelizmente, nestes últimos tempos, temos vivido em regime de duodécimos, e a pessoa que tem sido escolhida para os relatar, na comissão do Orçamento, tenho sido eu.
Desta vez não aconteceu assim, porque o projecto não foi à comissão do Orçamento, mas o Sr. director geral da estatística, supondo que eu era o relator, telefonou-me pedindo que apresentasse a emenda e a fizesse passar por qualquer forma.
Interrupção da Sr. Paiva Gomes, que não se ouviu.
O Orador: - Sr. Presidente: tenho visto muita vez vários Srs. Deputados apresentarem emendas, e por isso não. compreendo qual seja o meu crime apresentando igualmente uma emenda.
Se a Câmara, que eu muito respeito, entende que ela não é de aprovar, rejeita-a.
O Sr. José de Magalhães (interrompendo): - Mas o que não é regimental é meterem-se emendas dessa natureza em propostas de duodécimos.
O Orador: - Isso não é comigo, mas sim com a Mesa.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foram rejeitadas as emenda? apresentadas pelo Sr. Viriato da Fonseca.
Foi aprovada a dispensa da última redacção, a requerimento do Sr. Paiva Gomes.
O projecto aprovado é assim redigido:
Artigo 1.° E o Govêrno autorizado a executar durante o mês de Agosto de 1925, de conformidade com os preceitos legais vigentes, a proposta- orçamental das despesas dos diversos Ministérios para o ano económico de 1925-1926; com as alterações que nela devam ser introduzidas em harmonia com as leis e decretos publicados posteriormente à sua apresentação ao Congresso da República.
§ único. A verba inscrita no artigo 20.° do Orçamento do Ministério da Guerra do ano económico de 1925-1926, para despesas do recrutamento e revistas de inspecção, poderá ser utilizada até a sua totalidade conforme as necessidades dos respectivos serviços.
Art. 2.° Os serviços autónomos constantes do mapa anexo à lei n.° 1:794, de 30 de Junho de 1925, aplicarão, em conformidade com os preceitos legais vigentes e durante o período fixado no artigo anterior, as suas receitas próprias ao pagamento das respectivas despesas, cujos quantitativos totais, com exclusão dos do serviço autónomo dos correios e telégrafos, são os descritos no referido mapa.
§ único. As receitas dos correios e telégrafos no ano económico de 1925-1925 são avaliadas em 76:060.000$, sendo 75:360.000$ do produto das receitas de exploração eléctrica postal e 700.000$ da receita do fundo de reserva. As despesas do mesmo serviço previstas para o citado período somam 76:060.000$, sendo 75:360.000$ de despesas de exploração dos correios, telégrafos, telefones e fiscalização das indústrias eléctricas, e 700.000$ de encargos a custear pelo fundo de reserva.
Art. 3.° Continua em vigor no ano económico de 1925-1926 o disposto no artigo 4.° e sou § único da lei n.° 1:611, de 30 de Junho de 1924.
O Presidente da Comissão do Orçamento, António Paiva Gomes.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara.
Segue-se, na ordem do dia, a discussão dos orçamentos.
Mas, como a Câmara deliberou que essa discussão se não faça, sem estarem presentes os respectivos Ministros, devia passar-se à segunda parte, que é o negócio urgente do Sr. Cunha Leal, para a anulação dos decretos n.ºs 10:734 e 10:761.
Não sei se S. Exa. deseja usar da palavra, na ausência do Govêrno.
O Sr. Cunha Leal (para explicações): - Quando eu, há pouco disse que não desejava usar da palavra, como quere que tivesse dois negócios urgentes, Um relativo à questão dos 240.000 francos quê pertenciam ao Estado, e outro relativo a dois decretos que foram publicados em termos lesivos da dignidade do exército português, eu julguei que V. Exa. se referia ao primeiro negócio urgente.
Página 12
12 Diário da Câmara dos Deputados
Por mim, quanto ao segundo, não posso deixar do me ocupar dêle. A Câmara é que será o juiz sôbre só posso ou não usar da palavra, na ausência do Sr. Ministro da Guerra. Todavia, não quero forçar a Câmara a uma resolução.
O Sr. Presidente: - Seguidamente ao negócio urgente de V. Exa. está para ser discutido o parecer n.° 967.°, que declara nulo os decretos n.ºs 10:734 e 10:761.
Nestas condições, se V. Exa. concordasse, entraria em discussão o parecer n.° 967.°
O Orador: - Concordo com a opinião de V. Exa., porque a minha intenção é chegar a um resultado prático.
O Sr. Presidente: - Vai discutir-se o parecer n.° 967.
O Sr. Rodrigues Gaspar: - Sr. Presidente: tratando-se de uma questão de certa importância para o exército, parece-me que a discussão devia fazer-se com a presença do Sr. Ministro da Guerra.
Requeiro, por consequência, que a discussão dêste parecer n.° 967, seja adiada, até haver Ministro da Guerra.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Cunha Leal: - Sr. Presidente: já anularam aqui decretos na ausência dos Ministros que os tinham promulgado, durante o Govêrno do Sr. Vitoriao Guimarães.
Todos nós colaborámos na destruição do uma célebre reforma de instrução, na destruição da reforma da polícia, que havia sido feita à sombra de autorizações, e na destruição da reforma sôbre o júri, som que estivessem, presentes os respetivos Ministros.
Eu entendo que, normalmente, estas discussões devem ser feitas na presença do Ministro respectivo, mas o que não compreendo é que a Câmara se resolva a anular essas reformas sem a presença do Govêrno, e agora não tenha o mesmo critério.
Sr. Presidente: não vamos alterar a nossa opinião, com a presença do Sr. Ministro da Guerra, pois o nosso intuito é de acalmação, mima hora em que as paixões são tam bravias.
Mas querem V. Exas. protelar isto?
Eu não desejo criar conflitos nem quero colocar o futuro Ministro da Guerra numa situação com que êle não concorde. Mas, como não tive escrúpulos em rejeitar determinadas medidas, não me preocupando com a discordância do Sr. António Maria da Silva, não posso deixar de ter agora procedimento análogo.
Sr. Presidente: praticaríamos um acto de justiça, que serviria para dignificar a República, e que mostraria que os vencedores não tem o prazer de infamar os vencidos tirando ao mesmo tempo o futuro Ministro da Guerra, de dificuldades, porque em lugar de ter de dar explicações largas a qualquer correligionário, a Câmara chama sôbre si a responsabilidade de praticar êsse acto de justiça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho: - Sr. Presidente: dou o meu voto para que se discuta imediatamente o parecer n.° 967, no sentido de serem revogados os decretos a que êsse parecer respeita, e que mandaram desligar do serviço vários oficiais do exército, pelas mesmas razões que foram apresentadas pelo Sr. Cunha Leal.
Em segundo lugar, eu compreenderia ainda que a Câmara tivesse algum escrúpulo em discutir êsse parecer na ausência do Sr. Ministro da Guerra, se se tratasse, na realidade, de decretos constitucionais.
Mas como, em minha opinião, os decretos em questão são inconstitucionais, não tenho dúvida nenhuma em dar o meu voto no sentido de se discutir imediatamente o parecer n.° 967.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Posto à votação o requerimento formulado pelo Sr. Rodrigues Gaspar, foi rejeitado.
O Sr. Pires Monteiro: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°
Feita a contraprova, verificou-se estarem de pé 32 Srs. Deputados, e sentados 29, pelo que foi considerado rejeitado.
Página 13
Sessão de 31 de Julho de 1925 13
O Sr. Almeida Ribeiro: - Sr. Presidente: votei para que se discutisse desde já o projecto do Sr. Cunha Leal no sentido de serem anulados os decretos n.ºs 10:734 e 10:761 porque tendo eu reconhecido, ainda não há muito tempo, nesta Câmara, a necessidade de se proceder identicamente com outro decreto publicado pelo Ministro da Justiça, não via razão alguma para se proceder agora diversamente com o projecto do Sr. Cunha Leal.
Sr. Presidente: dada esta explicação, devo dizer a V. Exa. e à Câmara, que não concordo com o projecto, e que me parece que se êle visa ao fim que alguns jornais indicaram quando êsse projecto foi apresentado, isto é, anular a separação de 8 oficiais do serviço do exército e da armada, de que faziam parte. Parece-me, repito, que a aprovação dêsse projecto não dará tal resultado, e não dará êsse resultado porque a separação foi decretada pelo Govêrno sem invocação dêsses decretos. A separação, segundo se lê no decreto que a ordenou, foi feita com o fundamento na autorização dada por uma lei aqui votada.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): - Eu creio que V. Exa. está em equívoco.
Creio que,, em virtude da autorização por nós dada por decreto, foi permitida a separação, e em virtude de um decreto foram depois separados êsses oficiais.
De maneira que. anulando nós êsses decretos, e todos os outros emergentes, fica implicitamente anulada essa separação.
O Orador: - A separação dos oficiais foi feita pela lei de 6 de Maio de 1925 e êsse decreto para ordenar a separação dum general, dum capitão de fragata, dum tenente-coronel, dum major, de três capitães e dum tenente, não invoca outra disposição que não seja a contida na lei n.° 1:773, de 30 de Abril.
Leu.
Êsse decreto de separação seria uma medida desacertada, impolítica. V. Exas. podem discuti-la, porque cada um tem o seu ponto de vista; mas eu, sob o ponto de vista legal, continuo a afirmar que a aprovação do projecto em discussão não pode dar como resultado a anulação do decreto da separação.
Uma voz: - Êsse decreto não tem número.
O Orador: - Nem precisava de ter, porque é um despacho.
Uma voz: - Mas que se chama decreto.
O Orador: - Como quási todos os despachos que são publicados no Diário do Govêrno, 2.ª série.
A questão, está perfeitamente regular sob êsse aspecto.
Já li, creio que num artigo de imprensa, que o artigo 2.° da lei n.° 1:763 não autorizava essa medida, mas isso parece-me que é forçar absolutamente a interpretação coerente e clara sem subterfúgios nem sofismas que o artigo 2.° pode ter. Êste artigo 2.° autorizou o Govêrno a tomar todas as medidas que julgasse convenientes para assegurar a ordem e a tranquilidade pública; depois veio a autorização de que podia abrir créditos e publicar decretos, mas êste final do artigo não limitou em nada a amplidão que a parte inicial do artigo tem.
Em face do texto, tal como foi aprovado e é lei, o Govêrno procedeu dentro dele decretando a separação nos termos em que o fez.
Isto quanto ao fim a que visa, segundo as notícias da imprensa, .o projecto que se discute; quanto a deverem ou não deverem ser revogados os dois decretos a que o projecto respeita, n.ºs 10:734 e 10:761, devo dizer que me parece não haver motivo bastante para se decretar a anulação, parecendo-me até que a anulação de um deles será inconveniente para o processo criminal de justiça militar organizado contra os oficiais que fizeram parte do movimento de 18 de Abril, pois, segundo me consta, êsse processo já foi entregue no tribunal, estando pronto para o julgamento, julgamento êsse que desta forma não se fará, contra a vontade, creio eu, dos próprios militares que se encontram presos.
Sr. Presidente: o decreto n.º 10:734, de 2 de Abril de 1925, foi organizado com o intuito de criar uma acção disciplinar contra os funcionários civis e militares implicados em movimentos de carácter político.
Página 14
14 Diário da Câmara dos Deputados
De resto, Sr. Presidente, êste decreto tem disposições análogas àquele que foi publicado em Abril de 1919, em seguida ao movimento monárquico.
Eu fiz o confronto de todas as disposições dêste decreto de 2 de Abril de 1925 com as do decreto a que acabo de me referir, não vendo razoes pura o que se tem dito sôbre êle, pois a verdade é que o decreto do Abril de 1919 foi publicado quando já não havia dúvidas nenhumas sôbre a segurança da Republica, decreto êsse que foi assinado por todo o Govêrno de então, do qual faziam parte os Srs. José Relvas, Couceiro da Costa, Jorge Nunes, Júlio Martins, etc.
Reconheceu-se então a necessidade absoluta da publicação dessas medidas para salvação do país, não me constando que só tivesse publicado nenhum despacho, nem se ter aplicado qualquer sanção disciplinar, nos termos do decreto dêste ano.
Sr. Presidente apodemos ainda relembrar, porque isso é uma característica nossa, que o largo uso que foi feito dos poderes disciplinares conferidos pelo decreto de 1919 foi mais tarde atenuado. E talvez que muitos daqueles sôbre que êle incidiu foram beneficiados por resoluções tomadas em Conselho de Ministros, outros recompensados com empregos, e não sei só ainda outros com indemnizações pecuniárias.
Como V. Exas. voem, os resultados práticos são sempre quási nulos.
Sr. Presidente: apesar das considerações que acabo de fazer, entendo que não foi inútil nem é condenável o decreto de 1919, bem como o de agora. Elas representam uma reacção legítima da parte dos republicanos que sentem, como eu, que cada movimento revolucionário a mais, depois do de 5 do Outubro, é o desprestígio dessa gloriosa data.
Apoiados.
Êsse movimento quereria eu que fôsse relembrado com respeito, admiração e carinho por todos nós, em vez de o amesquinharmos dia a dia com novos movimentos revolucionários.
Sr. Presidente: há um dito popular que diz: "Quem não se sente não é filho do boa gente".
Ora, Sr. Presidente, nós, republicanos, precisamos de nos sentir com os actos praticados por aqueles que desconhecem que a República é um regime de opinião o que a sua política deve ser profundamente democrática.
Ainda me recordo dama entrevista dada por um oficial que se encontra preso, em que se dizia que os tiros paru o Poço do Borratém tinham sido feitos propositadamente.
Quando apareceram nos jornais acusações contra os oficiais implicados no movimento, de que se tinham servido do armas das quais mio tinham perfeito conhecimento, um oficial veio logo desmentidas, dizendo que se tinham dado aqueles tiros é porque tinham querido.
Quando se fazem movimentos que não são determinados por altas finalidades ou por amor a princípios que a todos se imponham pela soa magnitude, êles devem ser condenados, porque não podemos permitir que, a torto e a direito, se produzam movimentos políticos sem resultado algum.
Eu quero que as condenações se façam procedendo a um julgamento sereno e com todas as garantias que os tribunais podem conceder. Mas o que é necessário é que êsses julgamentos não deixem de se fazer, porque são absolutamente necessários.
Trocam-se àpartes entre os Srs. Francisco Crus, João Luís Damas, Lúcio de Campos Martins e o oradora.
O Orador: - Eu sei que há muitos republicanos implicados nos últimos movimentos revolucionários, mas não posso aceitar a doutrina de que, por se ser republicano, se pode entrar em todos os movimentos políticos que entendermos.
A separação dos oficiais é um caso que não implica nada com o seu julgamento.
Os separados são do mesmo modo sujeitos a julgamento.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): - E, uma vez julgados, se forem absolvidos, a pena da separação termina?
O Orador: - É um caso para decidir então. A separação, tal como está, não impede o julgamento.
Página 15
Sessão de 31 de Julho de 1925 15
O Sr. Francisco Cruz (interrompendo): - E não querem que nos revoltemos contra a obra que se tem feito e querem continuar a fazer.
O Orador: - V. Exa. tem maneira e direito de se revoltar legalmente dentro do seu âmbito parlamentar.
O Sr. Francisco Cruz (interrompendo): - Quantas vezes o tenho feito, e V. Exa. não me tem aprovado.
O Orador: - E muito mais fácil, mas é muito menos nobre dominar pela violência do que pela convicção. E com a razão do nosso lado e com factos concretos que ela se impõe.
Numa República assim é que se faz.
O Sr. Francisco Cruz: - Quando os bandidos não obedecem à razão nem à consciência não tenho outro caminho a seguir senão exercer a violência para os castigar.
Farto de pregar ando eu há muitos anos.
O Orador: - Dizia eu, Sr. Presidente, a propósito do decreto disciplinar de Maio dêste ano, que não via razões, ao tratar-se agora de oficiais republicanos, de adoptar-se em relação a êles atitude diversa da que se adoptou, em 1919.
O dever de todos os republicanos é agir dentro da ordem estabelecida, agir pelos meios legais, prestigiar quanto possível o regime.
Eu reconheço e respeito os bons republicanos que se sacrificaram pela implantação da República e se têm sacrificado depois pela sua manutenção, mas não posso reconhecer a êles, como não reconheci aos monárquicos, o direito de saltarem para fora do campo legal, do campo legítimo de acção, para recorrerem a meios atrabiliários, a meios que, porventura, êles podem julgar do toda a justiça, mas de cuja justiça não conseguem convencer os seus concidadãos.
É a necessidade que há em fazer a defesa do regime, pois êste não se prestigiará se continuarmos na situação de contarmos movimentos revolucionários pelo namoro de trimestres.
E se êsses movimentos são feitos por oficiais do exército, nós temos, então, que pensar se valerá a pena manter um exército no pé em que o mantemos, deficiente, é certo, sob o ponto de vista da defesa nacional, mas caro para os efeitos orçamentais, para termos uma revolução em cada trimestre.
Sr. Presidente: o outro decreto respeita propriamente aos processos, perante os tribunais militares.
O Sr. Morais de Carvalho: - E V. Exa. também não reputa inconstitucional êsse decreto?
O Orador: - Não o reputo inconstitucional.
Êste decreto tem, sob o ponto de vista da oportunidade, para mim a mesma justificação que tem o decreto relativo ao regime disciplinar.
A República, desde 1911, tem sentido a necessidade de legislarão tem legislado abundantemente sôbre matéria de processo criminal parn o efeito de apurar responsabilidades por actos considerados como criminosos, anteriores às leis e aos decretos que alteram o processo respectivo.
Desde 23 de Outubro de 1911, data da lei que criou o tribunal - chamado o tribunal das Trinas - para julgar os monárquicos que faziam as incursões, até 1918 têm-se legislado abundantemente - nas condições em que se fez agora - no sentido de tornar fácil e rápido o andamento dos processos contra os acusados dêsses movimentos, sem todavia privar êsses processos daquele conjunto de formalidades indispensáveis à garantia da defesa.
Já me referi à lei de 23 de Outubro de 1911.
Essa lei foi modificada em 29 do Novembro do mesmo ano por uma outra lei, em que se declarava que uma e outra seriam aplicadas aos processos pendentes, que eram os instaurados aos monárquicos envolvidos nas incursões.
Em Janeiro de 1912 deu se em Lisboa um movimento operário, perturbador da ordem publica, e que, assumindo carácter grave, determinou a suspensão de garantias em 30 do referido mês.
Em 3 de Fevereiro dêsse ano uma lei sujeitava ao foro militar, com diversas
Página 16
16 Diário da Câmara dos Deputados
alterações na forma do processo, todos os implicados nesse movimento.
Não pode dizer-se com verdade que o Parlamento de então tivesse monos respeito pela justiça e pela Constituição, nem pode dizer-se também que o Govêrno dessa época, em que figuravam os Srs. Augusto de Vasconcelos, Silvestre Falcão e Celestino de Almeida, tivesse pouco nítida noção do que devia ao regime e à Constituição da República.
No intuito de ama mais eficaz defesa do regime, a cada movimento revolucionário sucedia a publicação de novas leis.
Uma delas foi a de 8 de Julho de 1912, atribuindo ao foro militar o julgamento do todos os crimes de rebelião.
Dias depois publicava-se um decreto que estabelecia em Braga, Coimbra e Lisboa os tribunais para julgar os processos pendentes.
Sr. Presidente: tem-se dito ultimamente que esta alteração de processo aplicado a factos anteriores ofende o n.° 21.° do artigo 3.° da Constituição.
Ora, Sr. Presidente, esta disposição que é, aliás, a cópia literal do artigo 145.°, n.° 10.°, da Carta Constitucional, nunca se entendeu no sentido do que as leis de processo se aplicassem a processos já pendentes ou a factos anteriores.
Para não citar senão um facto, que todos os bacharéis em direito, presentes nesta Câmara, certamente conhecem, basta dizer que o Código do Processo Civil, ao ser publicado em 1876, inseria, nas disposições transitórias, um preceito, secundo o qual se aplicaria a processos já pendentes o, portanto, a factos anteriores. Mas mantinha-se o preceito da não retroactividade da lei penal.
O preceito da Constituição que há pouco citei, artigo 3.°, n.° 21.°, cópia literal do artigo 145.°, n.° 10,°, da Carta Constitucional, nunca se entendeu que quisesse dizer que o processo tinha de ser o prescrito numa lei anterior.
A palavra "forma" a que no n.° 21.° do artigo 3.° da Constituição se alude, é impropriamente chamada "forma". Refere-se êsse têrmo à qualidade das penas, às disposições e sanções aplicáveis e não à "forma" de processo por que tais sanções seriam aplicadas. Lembra-me o célebre decreto, que sendo ostensivamente e por declarações feitas aqui na Câmara, contra anarquistas, abrangeu muitos dos republicanos do tempo; a lei de 13 de Fevereiro do 1896, Esta lei era manifestamente inconstitucional, porque continha preceitos que iam ferir o artigo 145.°, n.º 10.°, da Carta a que há pouco fiz referência.
Quanto ao processo é que eu insisto.
Nesta, altura estabelece-se diálogo entre o orador e o Sr. Morais Carvalho, no qual intervêm, simultaneamente, alguns Srs. Deputados que rodeiam o orador.
O Orador:- E foi por isso que em 1884 foi reformado o sistema do penas. Mas como a lei penal anterior se tinha aplicado e se estavam até cumprindo muitas das suas disposições, entendeu-se necessário publicar depois, em 1886, salvo êrro, um decreto longo e complicado, em que sob a aparência do perdão o comutação de penas se alterava o regime por que estavam passando os condenados pela lei anterior para o regime da lei posterior.
Sr. Presidente: como já disse, a propósito do tal decreto disciplinar dêste ano, não entendo que processos usados para combater revoluções de carácter monárquico não sirvam para combater revoluções do carácter republicano, porque julgo, como também já disse, que republicanos não têm o direito só pelo facto de serem republicanos e por melhores que sejam as suas intenções, o que não discuto, de envolverem-se em toda a casta de movimentos, de modo a porem em risco a ordem da República e a paz social.
Apoiados.
O Sr. Brito Camacho: - Mas o direito revolucionário?!
O Orador: - Não estou de acordo com V. Exa. a êsse respeito. Lembra-me do ter lido, com muito prazer e muita curiosidade, um artigo de V. Exa. sôbre o direito revolucionário, mas não pude concordar com êle. Sei muito bem que as revoluções quando triunfam criam direitos, mas para que êsses direitos saiam dum movimento revolucionário é preciso que êste tenha tido o assentimento da grande maioria da Nação.
Página 17
Sessão de 31 de Julho de 1925 17
Não sendo assim, não há o direito de fazer êsses movimentos que apenas criam a desordem.
Sintetizando as minhas considerações, eu devo dizer que a revogação dos dois decretos abrangidos pelo projecto que se discute não resulta a anulação da medida de separação dos oficiais, e também não seria útil a êsses oficiais, porque iria protelar um processo-crime que já está muito adiantado e em que êsses oficiais têm naturalmente interêsse em ver concluído.
Tenho dito.
O orador não reviu, nem os "àpartes" tiveram a revisão dos seus autores.
O Sr. João Camoesas (para um requerimento): - Requeiro que o projecto baixe à comissão de guerra para dar o mais breve possível parecer.
Procedeu-se à votação.
O Sr. Presidente: - Está aprovado.
O Sr. Francisco Cruz: - Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.
Procedeu-se à contagem.
O Sr. Presidente: - Estão de pé 20 Srs. Deputados e sentados 23. Não há número. Vai fazer se a chamada.
Fez-se a chamada.
Disseram "aprovo" os Srs. Deputados:
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Martins de Paiva.
Ernesto Carneiro Franco.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
José Cortês dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Disseram "rejeito" os Srs. Deputados:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto da Rocha Saraiva.
Amaro Garcia Loureiro.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Bernardo Ferreira de Matos.
Constâncio de Oliveira.
Francisco Cruz.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
João de Ornelas da Silva.
João de Sonsa Uva.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José de Vasconcelos do Sousa e Nápoles.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel de Brito Camacho.
O Sr. Presidente: - Disseram "aprovo" 30 Srs. Deputados e "rejeito" 25; está aprovado.
Não havendo mais nenhum projecto que possa ser discutido sem a presença dos Srs. Ministros, está esgotada a ordem do dia.
Por indicação do Sr. Dinis de Carvalho, indico para substituir o Sr. Abran-
Página 18
18 Diário da Câmara dos Deputados
ches Ferrão na comissão de contas públicas o Sr. Pinto Barriga.
A próxima sessão é terça-feira, 4, às 14 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores que se inscrevam):
Parecer n.° 196, emendas do Sanado, que cria o Montepio dos Sargentos.
Parecer n.° 921, que estabelece as condições do promoção de designados pontos do exército.
Parecer n.° 872, que altera as secções de voto de Lisboa e Pôrto.
Parecer n.° 581, que suspende temporàriamente as disposições constantes do § 3.° do artigo 30.° e do artigo 21.° das leis, respectivamente, do 20 do Março de 1907 e 11 de Abril de 1911.
(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):
Parecer n.° 846, que autoriza a Junta de Freguesia do Freamunde a contrair um empréstimo até a quantia de 60.000$ para a exploração e canalização de água potável.
Parecer n.° 847, que autoriza a cadência à Junta de Freguesia de Freamunde do passal da mesma freguesia.
Parecer n.° 896, que autoriza o Govêrno a aderir à Convenção relativa à organização do Estatuto de Tânger.
Parecer n.° 935, que fixa a pensão de aposentação dos funcionários com mais de 35 anos de serviço.
Parecer n.° 739, que concede um novo prazo de trinta dias para os funcionários a que se refere o artigo 1.° da lei n.° 1:141 poderem requerer a sua aposentação.
Parecer n.° 516, que abrange, pelo preceituado no decreto de 8 de Julho de 1913, os alunos externos do Colégio Militar em determinadas condições.
Parecer n.° 737, que reintegra, no seu lugar de agente de fiscalização de 1.ª classe do Ministério da Agricultura, José Augusto de Sousa Campos.
Parecer n.° 797, que autoriza o Govêrno a ceder à comissão promotora do monumento ao patrão Joaquim Lopes, a erigir em Paço de Arcos, o bronze necessário para o mesmo e a permitir a sua fundição no Arsenal do Exército.
Projecto de lei n.° 951-B, que estabelece a forma de criação de assembléas eleitorais primárias.
Parecer n.° 893, que autoriza, a Câmara Municipal do concelho do Vila do Pôrto a vender em hasta pública os seus baldios julgados dispensáveis.
Parecer n.° 902, que torna extensivo às Juntas Gerais dos distritos de Lisboa e Beja o disposto no § 1.° do artigo 1.° da lei n.° 1:453, de 26 de Julho do 1923,
Parecer n.° 352, que cria a comarca do Cadaval.
Projecto de lei n.° 958, que prorroga por géis meses o prazo marcado no artigo 20.° do decreto n.° 5:787-F, de 10 de Maio de 1919.
Ordem do dia - 1.ª parte:
Parecer n.° 865-(b), orçamento do Ministério da Instrução Pública.
Parecer n.° 865-(c), orçamento do Ministério da Justiça.
Parecer n.° 865-(d), orçamento do Ministério do Trabalho e do Instituto Seguros Sociais.
Parecer n.° 865, orçamento da receita.
2.ª parte:
Negócio urgente do Sr. Cunha Leal sôbre a necessidade de serem anulados os decretos n.ºs 10:734 e 10:761, de Maio último.
Projecto de lei n.° 967, que declara nulos os decretos n.ºs 10:734 e 10:761, de 2 e 14 de Maio último.
Interpelação do Sr. Brito Camacho ao Sr. Ministro das Colónias.
Proposta de lei n.° 854, que passa o fundo-ouro, representado pelas cambiais creditadas, ao Estado, a constituir depósito do Estado.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 40 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Substituição
Substituir na comissão do contas públicas o Sr. Abranches Ferrão pelo Sr. Meireles Barriga.
Para a Secretaria.
Página 19
Sessão de 31 de Julho de 1925 19
Projectos de lei
Do Sr. Tavares de Carvalho, considerando promovido, por distinção, a alferes, desde 5 de Outubro de 1910, o ex-segundo sargento, Domingos Maria de Carvalho, actualmente tenente do quadro auxiliar dos serviços de artilharia.
Para o "Diário do Governo".
Parecer
Da comissão de finanças, sôbre o n.° 893-B, que reconhece ao tenente miliciano António Inocêncio Moreira de Carvalho o direito de ingressar como oficial no quadro permanente da firma de cavalaria.
Imprima-se.
O REDACTOR - Herculano Nunes.