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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 58
EM 23 DE MARÇO DE 1926
Presidência do Exmo. Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Mariano de Melo Vieira
Sumário. - A sessão é alerta com a presença, de 41 Srs. Deputados.
Procede-se à leitura da acta, que é aprovada quando se verifica o número regimental, e do expediente, que tem o devido destino.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Oliveira Simões pede que seja prorrogado o prazo da pesca e apanha de moliço na ria de Aveiro.
O Sr. Sant'Ana Marques apresenta algumas reclamações pela pasta das Finanças.
É concedida a urgência a uma proposta de lei do Sr. Ministro das Colónias, relativa à reorganização do exército colonial.
O Sr. Rafael Ribeiro aprecia assuntos que correm pela pasta da Guerra.
Entra em discussão o parecer n.º 103, que é aprovado, com alterações, depois de usarem da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Delfim Costa, Soares Branco e Ministro das Colónias (Vieira da Rocha).
Ordem do dia. - Continua em discussão o orçamento do Ministério da Guerra. Usam da palavra os Srs. Tamagnini Barbosa, Francisco Cruz, Pina de Morais, Pires Monteiro, Ministro da Guerra (José Marcarenhas) e Manuel José da Silva.
A sessão é interrompida.
Reaberta às 22 horas, prossegue a discussão daquele orçamento até à votação final.
Entra depois em discussão o parecer relativo ao orçamento do Ministério da Justiça e dos Culto", usando da palavra os Srs. Henrique Cabral, Alberto Dinis da Fonseca, Ministro da Justiça (Catanho de Meneses), Dias Pereira e Pedro Pita.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte para o dia imediato, com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão, às 16 horas e 14 minutos.
Presentes à chamada, 41 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 64 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Adolfo de Sousa Brasão.
Adolfo Teixeira Leitão.
Alexandre Ferreira.
Alfredo Pedro Guisado.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amâncio do Alpoim.
Amilcar da Silva Ramada Curto.
António Augusto Rodrigues.
António Augusto Tavares Ferreira.
António ferreira Cabral Pais do Amaral.
António Ginestal Machado.
Artur da Cunha Araújo.
Artur Saraiva de Castilho.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Domingos José de Carvalho Araújo.
Filomeno da Câmara Melo Cabral.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
João da Cruz Filipe.
João Pina do Morais Júnior.
João Salema.
Joaquim Brandão.
Joaquim Maria de Oliveira Simões.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Carlos Trilho.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Moura Neves.
José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.
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José Vicente Barata.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel José da Silva.
Mariano de Melo Vieira.
Mariano Rocha Felgueiras.
Pedro Góis Pita.
Rafael Augusto de Sousa Ribeiro.
Rui de Andrade.
Severino Sant'Ana Marques.
Viriato Sertório dos Santos Lobo.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Zacarias da Fonseca Guerreiro.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Alberto Carlos da Silveira.
Alberto Diais da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Pinheiro Tôrres.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António José Pereira.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Marques Guedes.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bernardo Pais de Almeida.
Carlos de Barro s Soares Branco.
Carlos Fuseta.
Custódio Martins de Paiva.
Dagoberto Augusto Guedes.
Daniel José Rodrigues.
Delfim Costa.
Diogo Albino de Sá Vargas.
Domingos Augusto Reis Costa.
Eduardo Fernandes de Oliveira.
Eduardo Ferreira dos Santos Silva.
Elmano Morais da Cunha e Costa.
Filemon da Silveira Duarte de Almeida.
Francisco Cruz.
Francisco Godinho Cabral.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Henrique Maria Pais Cabral.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Herculano Amorim Ferreira.
João Bernardino de Sousa Carvalho.
João José da Conceição Camoesas.
João Lopes Soares.
João de Ornelas da Silva.
João Raimundo Alves.
João Tamagnini de Sousa Barbosa.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Nunes Mexia.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Domingues dos Santos.
José Maria Alvarez.
José Marques Loureiro.
José Rosado da Fonseca.
Lourenço Correia Gomes.
Luís Gonzaga da Fonseca Moreira.
Luís de Sousa Faísca.
Manuel da Costa Dias.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Manuel Homem de Melo da Câmara.
Manuel Serras.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Raul Lelo Portela.
Rodrigo Luciano de Abreu e Lima.
Sebastião de Herédia.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abel Teixeira Pinto.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto Nogueira Gonçalves.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo da Cruz Nordeste.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro da Cunha Ferreira Leite.
Álvaro Xavier de Castro.
Aníbal Pereira Peixoto Beleza.
António Alves Calem Júnior.
António Araújo Mimoso.
António Augusto Álvares Pereira Sampaio Forjaz Pimentel.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
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António José de Almeida.
António Lobo de Aboim Inglês.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Rebelo Arruda.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos de Moura Carvalho.
Custódio Lopes de Castro.
Domingos António de Lara.
Domingos Leite Pereira.
Felizardo António Saraiva.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Pereira de Oliveira.
Indalêncio Froilano de Melo.
Jaime António Palma Mira.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Águas.
João Luís Ricardo.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Toscano Sampaio.
José António de Magalhães.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José do Vale de Matos Cid.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho Júnior.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Raul Marques Caldeira.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Às 15 horas principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 41 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Do Ministério das Finanças, enviando um mapa das alterações julgadas necessárias na proposta orçamental do Ministério das Finanças para o ano económico de 1926-1927.
Para a comissão do Orçamento.
Da Associação Naval de Lisboa, convidando esta Câmara a assistir, no dia 6 de Abril próximo, a uma sessão comemorativa do seu 70.° ano de existência e pedindo lhe seja indicado o número de cartões de convite a enviar para os membros desta Câmara.
Para a Secretaria.
Da junta de freguesia do Castelo, protestando contra a aprovação do projecto que concede à Igreja personalidade jurídica.
Para a Secretaria.
De vários cidadãos de Castelo Branco contra o reconhecimento de personalidade jurídica à Igreja.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Agricultura, submetendo à apreciação do presidente da comissão do Orçamento, alterações à proposta orçamental do Fundo de Fomento Agrícola para 1926-1927.
Comunique-se que todo o expediente deve ser dirigido à Mesa da Câmara.
Do Ministro da Agricultura, enviando ao Sr. presidente da comissão do Orçamento Geral do Estado a proposta orçamental para o ano económico de 1926-1927, relativa à Bolsa Agrícola.
Comunique-se que todo o expediente deve ser dirigido à Mesa da Câmara, e que a proposta orçamental deve ser impressa para ser distribuída por todos os Srs. Deputados.
Pedido de licença
Do Sr. Ribeiro de Carvalho, para gozar no estrangeiro 90 dias. Concedido. Comunique-se. Para a comissão de infracções e faltas.
Representações
Da Comissão Executiva da Câmara Municipal do Cartaxo, pedindo para ser discutida a proposta de lei sôbre o empréstimo para as estradas.
Para a comissão de obras públicas.
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Da Associação Comercial dos Lojistas de Lisboa, expondo as suas reclamações sôbre a remodelação de todo o sistema tributário, taxas alfandegárias, imposto de rendimento e imposto de 2 por 1:000.
Para a comissão de finanças.
Da Associação do Registo Civil, protestando contra o projecto reconhecendo capacidade jurídica, à Igreja.
Para a comissão de negócios eclesiásticos.
Do aspirante de finanças Manuel Dias Chita, requerendo a sua promoção a secretário de finanças de 3.ª classe.
Para a comissão de petições.
Telegramas
Da Associação Comercial e Industrial de Tomar, pedindo para ser revogado o artigo 9.° do decreto de 7 de Janeiro de 1924.
Para a, Secretaria.
De Pires dos Santos, protestando contra o projecto concedendo capacidade jurídica à Igreja.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente: - Vai entrar-se no período de
Antes da ordem do dia
O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de reorganização do exército colonial, requerendo para ela urgência.
Tenho dito.
O Sr. Oliveira Simões: - Sr. Presidente: desejava que o Sr. Ministro da Marinha ouvisse as considerações que vou fazer; mas, na ausência de S. Exa. peço ao Sr. Ministro das Colónias o favor de transmitir-lhe as minhas palavras.
Fui procurado por uma comissão de pescadores e de representantes da junta de paróquia da Murtosa, que veio pedir-me para solicitar do Sr. Ministro da Marinha que prorrogasse a liberdade de pesca e apanha de moliço na ria do Aveiro por mais quarenta e cinco dias.
Como o defeso começa no dia 25 do corrente, se uma ordem telegráfica não
sustar o que está determinado, a classe piscatória na ria de Aveiro passará uma época aflitíssima.
Os pescadores não tem por hábito ser previdentes, e, assim, gastam dia a dia aquilo que vão ganhando, de modo que, quando lhes falta o trabalho, passam horas amarguradas.
Acresce que os pescadores, especialmente os da Murtosa, vão, em grandes grupos, tratar da pesca do sável no Sado, no Tejo e no Guadiana; porém, êste ano essa pesca foi paupérrima. Os desgraçados empenharam as suas casas para adquirirem as redes necessárias; mas, afinal, recolheram às suas terras com mais miséria ainda.
Se não se prorrogar a liberdade da pesca por mais quarenta o cinco dias êsses homens, que são numerosos, forão de mendigar para matar a forno a suas famílias. Daqui a quarenta e cinco dias já êles têm possibilidade de ganhar a sua vida na pesca da sardinha, desde a Costa Nova até Espinho.
Se o Sr. Ministro da Marinha não enviar um telegrama, desde já, estou certo de que os pescadores, impelidos pela fome, terão de pescar furtivamente; e, assim, teremos de lamentar desgraças provocadas pelas repressões, etc. Ser-lhes hão apreendidos os apetrechos de pesca, os barcos, etc., como tem acontecido em outros anos, quando êles viviam em melhores condições.
A apanha do moliço, além de constituir um ganha-pão para muita gente, representa também um benefício para os lavradores, porque lhes permite obter um adubo mais barato para as suas terras.
O Sr. Ministro da Marinha, atendendo ao que eu lhe peço, por intermédio do Sr. Ministro das Colónias, prestará um acto de justiça.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): - Sr. Presidente: devo informar o Sr. Oliveira Simões de que transmitirei as suas considerações as Sr. Ministro da Marinha.
Tenho dito.
O Sr. Sant'Ana Marques: - As considerações que vou produzir desejava fazê-
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-las estando presentes o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Presidente do Ministério. Porém, como nenhum deles aqui se encontra, peço ao Sr. Ministro das Colónias a fineza de lhes transmitir as minhas palavras.
Há dias, indo eu ao Ministério das Finanças para tratar dum assunto que interessa aos contribuintes, vi, com desprazer, que, só com muita dificuldade, congui o meu intento. Andando do repartição para repartição, não encontrei os empregados respectivo?, o, assim, perdi um tempo imenso, sem necessidade. Do segundo andar mandaram mo para o primeiro, do primeiro para o segundo, e assim andei durante muito tempo, até que por fim um dos empregados me disse que fôsse à 1 hora da tarde. A essa hora lá voltei, o, com mágua, verifiquei que ainda lá não estava a pessoa com quem eu queria falar.
E depois de novas contradanças, do primeiro para o segundo andar, o vice-versa, tive de invocar a minha qualidade de Deputado para ser atendido.
Ora, ou creio que os contribuintes, para serem atendidos, não devem precisar do ser Deputados, e por isso desejaria que o Sr. Ministro das Finanças tomasse providências para que tais factos se não tornassem a repetir.
Sou informado de que no concelho de Marvão o respectivo secretário do finanças se arroga no direito de interpretar as leis sôbre impostos duma forma curiosa. Assim, êsse funcionário exige, para veículos puxados por uma parelha, uma certa contribuição, que é alegai; mas quando os donos dêsses animais necessitam do os utilizar para carregar ou para cavalaria, êsse funcionário exige-lhes nova contribuição ; e quando um criado dum lavrador se serve do um dêsses animais para se transportar dum lado para outro, exige-se-lhe a respectiva licença.
Acho isto irregular, e por isso pedia ao Sr. Ministro das Finanças o favor de esclarecer êste assunto, para que se não doem êstes abusos.
Recebi também reclamações do concelho de Niza, no sentido de o correio, que é feito por um dos comboios, passar a ser feito por um outro, como sucedia antes da guerra.
Actualmente o correio, chegado ali à tarde, só pode ser respondido nossa noite, para sair de lá no dia seguinte.
Porque é que o correio se não distribui pelo comboio da manhã, para que os interessados respondam no próprio dia, como é justo o útil, por todos os motivos?
São estas as considerações que eu desejava formular, pedindo ao Sr. Ministro das Colónias a fineza de as transmitir aos Srs. Ministros das Finanças o do Comércio.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar ao ilustre Deputado Sr. Sant'Ana Marques que comunicarei as suas considerações aos meus colegas das Finanças o do Comércio, conforme os desejos do S. Exa.
Tenho dito.
Foi concedida a urgência, requerida pelo Sr. Ministro das Colónias para a sua proposta relativa à reorganização do exercito colonial.
O Sr. Rafael Ribeiro: - Sr. Presidente: em 20 de Janeiro último entreguei ao Sr. Ministro da Guerra uma participação contra um chefe de repartição do seu Ministério, oficial superior do exército, que para comigo se portou incorrectamente quando a essa Repartição fui tratar de um assunto oficial. Como vão passados dois meses sôbre essa participação o não sei como o assunto foi resolvido, desejava que o Sr. Ministro da Guerra pusesse a Câmara ao corrente do que se passa.
Desejava também que o Sr. Ministro da Guerra comunicasse à Câmara o motivo por que ainda não foi publicado o acórdão do Supremo Tribunal do Justiça que deu provimento a um recurso do primeiro sargento Adolfo Afonso, acórdão que deu entrada no Ministério em 16 de Dezembro último o que devia ser cumprido no prazo de 30 dias, como assim determina o § 4.° do artigo 19.° do decreto n.° 9:894.
Chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra para o facto do não se cumprir a disposição do artigo 32.° da lei n.° 1:668, do 24 de Setembro de 1924, que manda abonar a todos os sargentos do exército
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um subsídio para alimentação. Contra determinação desta disposição legal êsse subsídio só se está abonando aos sargentos do activo, porque assim o entende a Direcção Geral dos Serviços Administrativos que interpreta as leis como entende e quere.
Chamo a atenção ainda do titular da pasta da guerra para um comunicado, devidamente assinado, publicado num jornal da província, em que se fazem graves acusações contra o médico que fez parte da junta de recrutamento do distrito de reserva n.° 29. Ignoro se essas acusações têm fundamento; mas; como o comunicado está assinado, fácil será ao Sr. Ministro da Guerra mandar averiguar do que se passou, ouvindo, claro está. o signatário do comunicado.
Se são verdadeiras as acusações espero que o Sr. Ministro da Guerra, que tem sabido prestigiar o exército, proceda com a energia que todos nós lhe conhecemos; se não são, o Sr. Ministro da Guerra deve comunicar o facto ao seu colega da Justiça para que êste ordene ao delegado do Procurador da República da respectiva comarca que proceda contra o signatário do comunicado em conformidade com a lei de 28 de Outubro de 1910.
Chamo também a atenção do Sr. Ministro da Guerra para o que se está passando com os recrutas da 8.ª divisão, onde muitos dêstes estão dormindo no chão e dois numa cama.
Desejava ainda que o Sr. Ministro da Guerra averiguasse dos motivos que levaram o chefe do estado maior do exército a propor que o contrato de arrendamento do chamado Campo da Agonia de Viana do Castelo não fôsse prorrogado com o útil pretexto de o Campo, que fica na vizinhança do quartel do regimento de artilharia n.° 5, não ter nas suas proximidades outros terrenos próprios para a instrução de equitação e exercícios de bataria com gado engatado. É para admirar que só agora o Sr. chefe do estado maior do exército se lembrasse de que o Campo faz falta, e que nenhuma objecção tivesse feito, não digo já desde que se fez o primeiro contrato de arrendamento, mas quando se fez o último, que foi em 21 de Março de 1924. Há que ver que o terreno pertence ao regimento de infantaria n.° 3 e não a artilharia n.° 5.
Não se compreende que o regimento de artilharia n.° 5 só agora precise pio Campo quando é certo que deixou, sem protesto, que o Ministério da Guerra arrendasse, em 13 de Julho de 1925, uma parcela de terreno que lhe pertence, com uma área de 700 metros quadrados, terreno que, como diz o próprio contrato de arrendamento, fica junto do picadeiro do regimento.
Êste é um caso para o qual chamo muito especialmente a atenção do Sr. Ministro da Guerra, pois que me parece que se trata duma partidinha dum candidato a Deputado derrotado nas últimas eleições no círculo de Viana do Castelo, que, aliás, conforme confissão própria, sempre se tinha interessado pelo arrendamento do Campo. Isto, claro está, emquanto teve votos.
Estando também presente o Sr. Ministro do Interior, chamo a sua atenção para a maneira pouco humana como se está, procedendo à extinção dos cães vadios, isto para evitar casos como um que sucedeu em Monção, em que um zelador municipal envenenou um cão perdigueiro que foi encontrado na via pública fugido ao dono. Sôbre êste assunto reclamo o cumprimento da portaria n.° 3:012, de 22 de Março de 1923, da autoria do Sr. Ministro do Interior, o peço para que o Sr. Ministro da Justiça ordene aos delegados dos Procuradores da República nas comarcas que querelem os indivíduos que propositadamente, muitas vezes por rancor, transgridem a disposição do artigo 478.° do Código Penal.
Seria bom que o Sr. Ministro da Agricultura trouxesse à Câmara uma proposta de lei dando validade legal ao decreto n.° 11:242, de 29 de Outubro de 1925, que obriga à construção e manutenção de canis, pois que tal decreto não obriga, por contrariar o disposto no n.° 1.° do artigo 66.° da Constituição.
Tenho dito.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - O ilustre Deputado Sr. Rafael Ribeiro referiu-se à forma desumana como estão sendo abatidos cães mim concelho do norte.
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Chamarei a atenção do governador civil para o caso passado na via pública; o resto diz respeito às comissões municipais.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): - Desejava que V. Exa. consultasse a Câmara a fim de entrar imediatamente em discussão o parecer n.° 103.
Foi aprovado.
Lê-se na Mesa. É o seguinte:
Parecer n.° 103
Senhores Deputados. - A vossa comissão de colónias, estudando a proposta de lei n.° 72-F, criando um Comissariado Geral do Govêrno para organizar a representação das nossas colónias na 7.a Exposição Internacional de Produtos Coloniais, a realizar em Paris, de 21 de Janeiro a 6 de Fevereiro de 1927, e abrindo um crédito de £ 3:640-0-0 para ocorrer às despesas a fazer, reconhece que Portugal, como grande nação colonial, não pode deixar de procurar demonstrar perante o mundo civilizado o que tem sido e está sendo a sua administração e a grandiosidade da sua obra colonizadora. Reconhece também o alcance político e económico para o país de fazer representar as nossas colónias em exposições, preferindo as que tenham, como a de que se trata, uma feição de propaganda de carácter comercial, orientando os mostruários de forma a mostrar das suas riquezas naturais, das possibilidades do seu aproveitamento, do desenvolvimento do seu comércio, da sua agricultura e da sua indústria, da excelência da qualidade e quantidade de produtos a exportar, possibilidades e facilidades de transacções, acompanhadas de informações para o seu comercio.
Mas se é êste o modo de ver da vossa comissão, não podia esta deixar de ter em consideração as críticas que por vezes têm sido feitas aos resultados obtidos em algumas exposições em que Portugal se fez representar, às exageradas importâncias nelas despendidas, pelo que procurou estudar cuidadosamente o respectivo processo organizado pelas repartições competentes.
Esta exposição é a sétima da mesma natureza, realizadas as cinco primeiras
em Londres e a sexta em Bruxelas, organizadas por um comité inglês, ao qual os Governos inglês e doutras nações têm dado todo o apoio e facilidades. A elas têm concorrido as nações coloniais tropicais e as que possuem colónias tropicais. Para êste certame, que se realiza no Grand Palais, em Paris, já todo o espaço se encontra reservado para a representação colonial francesa, inglesa, belga, holandesa, brasileira, mexicana, columbia na e egípcia.
As nações coloniais têm de facto dado uma especial preferência a êstes certames, a tal ponto que nações que não concorrem a outras exposições muito maiores o fazem a estas. Assim, o Brasil, que até êste momento não resolveu fazer-se representar na exposição que se realiza em Sevilha, apesar das instâncias recebidas e da campanha da imprensa feita nesse sentido, concorre à sétima Exposição Internacional de Produtos Tropicais, como o fez às anteriormente realizadas.
Portugal fez representar a colónia de Angola em 1914 e todas as colónias em 1921.
A representação das nossas colónias nas últimas exposições a que oficialmente concorreu tem sido brilhante e os resultados obtidos, pode-se afirmar, honram--nos como nação colonial e honram a administração colonial republicana.
Em 1914 os expositores da província de Angola que concorreram à segunda Exposição Internacional de Produtos Tropicais foram larga e excepcionalmente premiados, tendo alguns obtido em concursos especiais a primeira classificação para algodões, agaves, rícinos e cafés. Àquela província foi dada medalha de ouro e igual recompensa aos Serviços Agrícolas oficiais.
Na quinta Exposição de Produtos Tropicais, realizada em 1921, a representação colonial portuguesa obteve o primeiro prémio, destinado à nação colonial que melhor se fizesse representar, tendo os expositores obtido os maiores prémios e classificações para os produtos que expuseram.
A nossa representação na parte colonial na Exposição Universal dó Rio de Janeiro não só foi brilhantemente galardoada com os maiores prémios e distin-
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coes, mas mereceu de toda a imprensa do Brasil que a ela se referiu menção especial e os maiores e mais calorosos elogios.
No que respeita às despesas a fazer com a nossa representação colonial, procurou a vossa comissão conhecer os elementos que poderiam ter levado o Sr. Ministro das Colónias a fixar, na proposta de lei de que estamos dando parecer, a verba de £ 3:640-0-0 para a custear.
No processo sôbre a exposição de que estamos tratando, consta a informação seguinte: "Custaram estas exposições coloniais importâncias relativamente modestas. A representação da colónia de Angola, em 1914, foi organizada dentro das exíguas verbas orçamentais dos serviços de agricultura daquela província, sendo dado para despesas de pessoal, seu transporte e dos mostruários, sua instalação em Londres, isto e, para todas as desposas feitas fora daquela colónia, a verba única de 5.000$. Realizada a exposição, desta verba foi entregue na Contabilidade do Ministério das Colónias o saldo do £ 150-0-0.
A representação de todas as nossas colónias à exposição realizada em Londres em 1921, foi organizada com mostruários vindos das colónias e com os mostruários cedidos pela Sociedade de Geografia de Lisboa e Museu Colonial, importando as despesas feitas em Londres o Lisboa e transportes de pessoal e material em £ 4:894-8-9 e 26.217$.
A nossa secção colonial - na Exposição Universal do Rio de Janeiro em 1923, na qual se afirma terem-se gasto para cima de 25:000 contos - importou em vencimentos do pessoal, durante 12 meses que esto só demorou no Brasil, cêrca de £ 3:060-0-0, nada recebendo o mesmo pessoal emquanto trabalhou em Lisboa. A organização em Lisboa e sua instalação no Brasil importaram em cêrca de 5.000-5. Não conheço as despesas com o transporte do pessoal e dos mostruários por ter estado a cargo do outras secções.
No que respeita à estimativa que junto, das despesas a fazer com a representação das nossas colónias na Exposição Internacional a fazer em 1927, refere-se ela aos serviços de organização em Lisboa e sua instalação em Paris, partindo da convicção que as colónias, como o têm feito, organizem os seus mostruários e os enviem para aqui e contando principalmente com a colaboração da Sociedade do Geografia de Lisboa o do Museu Colonial, como nas exposições já realizadas, apresentando uma representação brilhante das nossas colónias e permitindo que com os seus mostruários se suprissem as deficiências dos vindos das colónias.
Dura esta exposição apenas 15 dias, tempo julgado suficiente para que o público que a visitar, na maior parte composto de comerciantes, de industriais e do técnicos, possa estudar as matérias primas e os produtos manufacturados do que precisa o comércio o a indústria dos vários países.
Realizada no sumptuoso palácio destinado a exposições, denominado o Grand Falais, situado nos Campos Elíscos, em Paris, dispensa aos países que se fazem representar a construção de pavilhões privativos, sempre muito despendiosa.
A estimativa que o Govêrno aprovou, afigura-se-nos ter sido feita com acentuada economia no que respeita ao número do funcionários a servir no Comissariado: um Comissário Geral, um adjunto, um empregado para a escrituração e contabilidade e um guarda; as ajudas de custo que lhes são atribuídas e o tempo da sua estada em Paris.
Reconhecendo a vossa comissão que a apresentação da proposta de lei n.° 72-F obedece à necessidade patriótica de Portugal mostrar o cuidado que lho tem merecido e está merecendo a sua missão administrativa e civilizadora que lhe impende como grande nação colonial, o que como informaram as repartições competentes é de aconselhar a representação das nossas colónias na 7.a Exposição de Produtos Tropicais, pelos resultados não só de alcanço político e económico que para nós advirão do nosso concurso a tal certame e ainda de que êle será feito com uma despesa que cremos estar ao alcance das nossas finanças, é de parecer que lhe deveis dar a vossa aprovação com as pequenas alterações que completem o que lhe propomos.
Eis a redacção que a vossa comissão entende dever ser dada à proposta do lei:
Artigo 1.° É criado um Comissariado
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geral, serviço autónomo, a cargo do qual fica a organização da representação portuguesa na 7.ª Exposição Internacional de Cauchu e outros produtos tropicais e industriais, que se realiza em Paris de 21 de Janeiro a 6 de Fevereiro de 1927, por êle correndo tudo o que à mesma exposição se refira.
§ 1.° O Govêrno nomeará pessoa idónea para, em comissão, exercer o cargo de comissário geral.
§ 2.° O Comissário Geral do Govêrno proporá ao Ministério das Colónias os funcionários, em número não superior a três, incluindo um guarda, para o auxiliarem; as ajudas de custo que perceberão em cada dia quando no estrangeiro em serviço da exposição serão de £ 6 o comissário, £ 3 os dois funcionários e £ 1 o guarda:
§ 3.° Os funcionários públicos em serviço no Comissariado Geral da Exposição, consideram-se em comissão e perceberão, além das ajudas de custo que lhes forem fixadas, quando no estrangeiro, pagas pelo crédito autorizado pelo artigo 2.° desta lei, todos os seus vencimentos, subsídios, remunerações e melhorias, certos, que lhos continuarão a ser abonados pelos Ministérios ou serviços a que pertencem, como se na efectividade deles estivessem, e reocuparão os lugares e comissões que anteriormente estavam desempenhando logo que seja extinto o Comissariado Geral.
Art. 2.° É aberto1 no Ministério das Finanças a favor do das Colónias o crédito de £ 3:640-0-0, para custear as despesas a fazer com a Exposição a que esta lei se refere.
§ único Esta importância será posta à disposição do Comissariado Geral na Caixa Geral de Depósitos.
Art. 3.° As despesas com salários, gratificações, ajudas de custo, transportes do pessoal ao serviço da Exposição, frete de produtos o seu acondicionamento, mobiliário, frasearia, etc., aluguer do local para a nossa instalação na Exposição, despesas de representação, expediente, impressos, publicações e reclamos serão pagas pelo crédito a que se refere o artigo anterior.
§ único. O Comissário Geral do Govêrno poderá admitir o pessoal assalariado, jornaleiro, sem carácter permanente, que fôr necessário aos servidos da Exposição.
Art. 4.° O Comissário Geral do Govêrno poderá corresponder-se directamente com todas as repartições públicas sôbre os assuntos referentes à Exposição, devendo porém todo o expediente e processo ficar arquivado no Ministério das Colónias, quando esta terminar.
Art. 5.° O Comissário Geral do Govêrno apresentará ao Govêrno um relatório sôbre os serviços da Exposição o entregará a conta do todas as despesas para ser submetida ao julgamento do Conselho Superior do Finanças.
Art. 6.° Todos os produtos e material que tenham figurado na Exposição e que não tenham sido cedidos por simples empréstimo darão entrada no Ministério das Colónias afim de poderem figurar em futuras exposições similares.
Art. 7.° O Comissariado Geral considera-se extinto quando terminaram os serviços da entrega dos mostruários que tenham figurado na nossa representação, o qual não poderá ir além do cinquenta dias depois de terminada a Exposição em Paris.
Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, era 5 do Março de 1926. - António de Paiva Gomes - António José Pereira - Francisco Coelho do Amaral Reis - Rodrigo Luciano de Abreu e Lima - Manuel Serras - F. O. Velhinho Correia - Filemon de Almeida - Alberto Dinis da Fonseca - Delfim Costa - Alexandre J. B. de Vasconcelos e Sá - Filomeno da Câmara Melo Cabral.
Senhores Deputados. - A vossa comissão de finanças, a quem foi presente o projecto de lei n.° 725, julga de conveniência e oportunidade a sua conversão em lei.
A estimativa que vem junto prevê um dispêndio de £ 3:640, o que ao câmbio de 955 perfaz a quantia do 345 800$.
Em matéria de despesas há que classifica Ias em susceptíveis do produtividade ou não susceptíveis dêsse efeito.
Não podemos perder de vista que somos um país colonial e que é indispensável ao saneamento da nossa moeda a colocação no estrangeiro dos produtos do nosso domínio ultramarino.
As crises de exportação dessa proce-
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dência podem derivar, como realmente sucede, da falta de meios de transporte no interior, da adaptação de portos de saída e da insuficiência de carreiras de navegação, mas pode também derivar, e em grande parte assim deverá ser, do pouco crédito que a qualidade dessas mercadorias tem nas diferentes praças.
Êsse pouco crédito é consequência do tratamento defeituoso do produto e da 3aã má selecção.
É dever do Estado nos seus governos provinciais levar a empresa ao aperfeiçoamento da sua mercadoria, inclusivamente, pela tributação, bónus alfandegário, ou até pela proibição da exportação para as de inferior qualidade.
E dever da metrópole fomentar pela exposição de bons produtos o crédito das suas exportações coloniais.
É com a sua reexportação juntamente com a da metrópole que o Estado tem arrecadado sucessivamente de 1923 a 1925 cêrca de £ 63 7 e 8 milhões com que tem regulado a situação monetária.
Quanto melhores colocação e cotação tiverem os géneros coloniais melhor serão também os valores arrecadados em favor do Estado e da importação.
Quanto a receios derivados dos dispêndios feitos com exposições anteriores, julgamos que a administração vale o que vale quem a dirija, e que se nem o contágio de 1923 pôde estender o mal à secção colonial da Exposição Universal de 1923 - é de crer que só haja, no caso presente, motivo para louvar e não para censuras. - Daniel Rodrigues - Manuel da Costa Dias - João Tamgnini (com declarações) - Lourenco Correia Gomes - António de Paiva Gomes - José da Cruz Filipe - Artur Carvalho da Silva (com declarações) - Guilhermino Nunes (com declarações)- C. Soares Branco, relator.
Proposta de lei n.° 72-F
Senhores Deputados.-Tenda Portugal sido convidado a fazer-se representar na 7.ª Exposição Internacional de Produtos Tropicais, que deve realizar-se no Grand Falais, em Paris, de 21 de Janeiro a 6 de Fevereiro de 1927;
Considerando que foi coroada dos mais lisonjeiros e brilhantes resultados a maneira como fizemos representar as nossas colónias nas exposições a que Portugal
tem concorrido e em especial na 5.a Exposição de Produtos Tropicais, que em 1921 se realizou em Londres, tendo obtido, entre 125 prémios, um trofeu como primeiro prémio conferido à nação que melhor se fez representar;
Considerando que se torna indispensável, dada a nossa situação internacional como grande potência colonial, comparecer quanto possível em todos os certames dêste género, de maneira a mais uma vez afirmarmos perante o mundo civilizado a grandiosidade da nossa obra de colonizadores e excelência dos nossos processos de colonização;
Considerando que, embora a nossa representação à Exposição de 1921 tenha importado em cêrca de £ 7:800-0-0, as despesas a fazer com a exposição de Paris estão computadas em menos de metade daquela importância;
Considerando que, embora o diploma legislativo colonial n.° 43, de 30 de Setembro de 1924, cometa êste serviço à Agência Geral das Colónias, o seu estado ainda incipiente não permite a êste organismo que com os seus actuais recursos materiais e de pessoal os possa desempenhar cabalmente:
Tenho a honra de submeter, à vossa apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Da organização da representação portuguesa na 7.a Exposição Internacional do Cauchu, e outros produtos tropicais, será encarregado um Comissário Geral do Govêrno, na exposição, que, para êsse fim, trabalhará junto da Agência Geral das Colónias.
§ 1.° O Govêrno convidará pessoa idónea para, em comissão, exercer êste cargo, fixando-lhe a respectiva ajuda de custo quando no estrangeiro.
§ 2.° O Comissário Geral do Govêrno proporá ao Ministro das Colónias as medidas que julgar necessárias sôbre a escolha e remuneração dos funcionários para o auxiliarem e do pessoal assalariado para o serviço da Exposição, assim como tudo o mais que julgue conveniente para o bom e cabal desempenho da sua missão.
§ 3.° O pessoal que fôr funcionário público continuará a perceber todos os vencimentos e remunerações legais que recebem no exercício dos seus cargos, dura".
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te o tempo que estiverem ao serviço da Exposição, pagos pelas dotações dêstes serviços, recebendo apenas por conta do crédito a que se refere esta lei as ajudas de custo que lhe forem fixadas.
Art. 2.° É aberto no Ministério das Finanças, a favor do das Colónias, o crédito de £ 3:640-0-0 para custear as despesas a fazer com a Exposição a que esta lei se refere.
Art. 3.° As despesas com salários, gratificações, ajudas de custo, transportes do pessoal ao serviço da Exposição, frete de produtos e seu acondicionamento, mobiliário, frasearia, etc., aluguer do local para a nossa instalação na Exposição, despesas de representação, expediente, impressos, publicações e reclamos serão pagas pelo crédito a que se refere o artigo anterior.
Art. 4.° Finda a Exposição, todos os produtos e material que nela tenham figurado, e que não tenham sido cedidos por simples empréstimo, darão entrada na Agência Geral das Colónias a fim de poderem figurar em futuras exposições similares.
Art. 5.° O Comissário Geral do Govêrno poderá corresponder-se directamente com todas as repartições públicas sôbre os assuntos referentes à Exposição, devendo porém todo o expediente e processo ficar arquivado na Agência Geral das Colónias.
Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 1 de Março de 1926. - O Ministro das Colónias, Ernesto Maria Vieira da Rocha - O Ministro das Finanças, Armando Marquês Guedes.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: refere-se o parecer n.° 103 a um assunto de grande utilidade para a economia das nossas colónias, pois não é de ninguém desconhecida a vantagem de concorrer às exposições internacionais.
Aprovamos o projecto, em princípio, mas não podemos deixar de lembrar a desastrada administração da exposição do Rio do Janeiro, que custou ao País uma soma fabulosa.
É indispensável que o Govêrno procure fazer a maior economia nas despesas que vai realizar agora.
No tempo da monarquia também houve uma exposição em Paris, em 1907, com a qual apenas se gastaram 215 contos, devendo notar-se que parte dessa verba foi paga por industriais e comerciantes. Hoje não se podia fazer o mesmo, em face da crise que atravessam as indústrias e o comércio.
Não recusamos o nosso voto ao projecto, dada a sua utilidade para a riqueza das nossas colónias.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Delfim Costa: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que êste lado da Câmara dá, como não pode deixar de dar, o seu voto ao projecto em discussão, tanto mais quanto é certo que, sendo Portugal a quarta potência colonial, não pode de maneira alguma deixar de se representar num certâmen desta natureza.
Sr. Presidente: devo dizer a V. Exa. e à Câmara que não pode haver receios quanto ao aproveitamento das verbas indicadas, pode, na verdade, a comissão de colónias teve o cuidado de fazer ao projecto de lei apresentado pelo Sr. Ministro das Colónias as emendas que julgou necessárias, de forma a que seja absolutamente acautelada a fazenda nacional.
Assim, acham-se devidamente acauteladas as ajudas de custo e bem assim o número de empregados que deverão ir a essa exposição.
Portanto, Sr. Presidente, tratando-se de uma medida de alto interêsse para a Nação, êste lado da Câmara não pode deixar de dar o seu voto ao projecto em discussão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Não há mais ninguém inscrito, vai votar-se.
Os Srs. Deputados que aprovam o projecto na generalidade, queiram levantar-se.
Está aprovado.
O Sr. Presidente:-Vai ler-se o artigo 1.°
Foi lido e pôsto em discussão.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: vivemos num regime que, apesar
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de ser democrático* segundo dizem, mantém uma grande disparidade entre o funcionalismo público, pois a verdade e que se alguns funcionários recebem unicamente o suficiente para a sua sustentação, outros recebem gratificações que são excessivas.
Acho; Sr. Presidente, excessiva averba aqui designada para o Comissário Geral, e que é de 6 libras por dia.
Hoje, ao contrário do que sucedia dantes, quem quero fazer uma pequena fortuna arranja uma comissão do serviço no estrangeiro, e se estiver nas boas graças do Govêrno, consegue um vencimento suficiente para juntar um bom pecúlio ao fim de algum tempo.
Considero excessiva, repito, a verba de 6 libras por dia, assim como não estou de acordo com o que se acha estabelecido no § 3.° do mesmo artigo 1.°
Espero, portanto, que o Sr. Ministro das Colónias apresente uma proposta de emenda no sentido de esta verba de 6 libras ser reduzida.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Soares Branco: - Sr. Presidente: devo dizer à Câmara que eu sou na verdade, daqueles que entendem que se não deve desperdiçar dinheiro, mas sim gastar somente aquele que seja produtivo o indispensável.
S. Exa. o Sr. Carvalho da Silva achou excessiva a verba de 6 libras, porém, para ser justo, devia ter observado aqueles processos de economia que são necessários em assuntos desta natureza.
Sr. Presidente: 6 libras isto é excessivo, é absolutamente o indispensável, e, tendo tido o cuidado de fazer uma comparação com o que tem sido apresentado nesta Câmara, eu cheguei à conclusão de que a verba indicada representa uma economia avultada.
Acho na verdade que, gastando se na exposição 3.600 libras, conforme se acha indicado no artigo 2.°, só temos que nos felicitar e pedir somente ao Govêrno que nomeie quem esteja à altura de condignamente poder representar o País.
Acho, portanto, repito, que a verba de 6 libras não é excessiva, como o disse o Sr. Carvalho da Silva, o qual, certamente, apenas pretendeu aproveitar a
oportunidade para chamar a atenção do Govêrno para outras gratificações que são mais avultadas do que aquela que está em discussão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Sr. Presidente: não me convenceram os argumentos apresentados pelo Sr. Soares Branco.
S. Exa. acha que as 6 libras não são demasiadas, porque há outros funcionários que recebem 10. Julgo não ser isso argumento, e, por isso, insisto com o Sr. Ministro das Colónias, para que as 6 libras sejam reduzidas, porque as circunstâncias do País não são de molde a suportarem vencimentos desta natureza.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovado o artigo 1.° e seus parágrafos.
É lido o artigo 2.°
O Sr. Carvalho da Silva: - Desejava que o Sr. Ministro ou o Sr. relator fizesse o favor de mo informar, só tem a certeza de que a verba indicada é suficiente para ocorrer às despesas.
O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): - Posso afirmar a V. Exa. que a verba está bem calculada e deve chegar.
O Sr. Carvalho da Silva: - É porque quando se tratou da exposição do Rio de Janeiro, disse-se que a verba era suficiente, e depois vieram pedir reforços.
O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): - Nessa exposição havia pavilhões a fazer, e nesta não há.
O Sr. Carvalho da Silva: - O pavilhão dos escândalos é que foi o maior.
Foi aprovado o artigo 2.° e seus parágrafos.
Foi lido o artigo 5.°
O Sr. Carvalho da Silva: - No artigo 1.° diz se que não pode haver mais do que três funcionários; neste artigo diz se que se poderá contratar o pessoal assalariado que fôr necessário. Desejava que o Sr. Ministro me elucidasse sôbre êste ponto,
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O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): - Sr. Presidente: as considerações que o Sr. Carvalho da Silva acaba de fazer não têm razão do ser, porque êste artigo refere-se ao pessoal operário. Espero que o comissário nomeado terá o bom senso de só admitir o que fôr indispensável.
O Sr. Carvalho da Silva: - Não seria mau, se V. Exa. concordasse, que fôsse intercalada a palavra "operário".
O Sr. Soares Branco: - Sr. Presidente: a verba de 3:640 libras não se fixou sem que primeiro se tivesse feito uma estimativa, por onde se previsse qual o montante da importância a gastar, estimativa que mereceu a aprovação do Sr. Ministro das Colónias.
Quanto ao pessoal, devo dizer que êste artigo não se refere a funcionários públicos, mas tam somente ao pessoal operário, e nestas condições não tenho dúvida em mandar para a Mesa a respectiva emenda.
Foi lida e admitida.
E a seguinte:
Artigo 3.° - § único. O Comissário Geral do Govêrno poderá admitir o pessoal operário jornaleiro sem carácter... - C. Soares Branco.
Foi aprovada a emenda e o artigo 3.°, salva a emenda.
Foram aprovados os artigos 4.º, 5.° e 6.° e lido o artigo 7.°
O Sr. Soares Branco: - Sr. Presidente: mando para a Mesa a seguinte emenda:
Artigo 7.° ... tenham figurado na nossa representação "não podendo o mesmo serviço durar mais de cinquenta dias". - C. Soares Branco.
Foi aprovada a emenda apresentada pelo Sr. Soares Branco e o artigo 7.°
Foi aprovado o artigo 8.°
O Sr. Delfim Costa: - Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Está em discussão a acta.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como ninguém usa da palavra, considera-se aprovada.
O Sr. Manuel José da Silva (para interrogar a Mesa):- Desejava que V. Exa. me informasse se o Sr. Ministro das Finanças vem amanhã à Câmara, no período de antes da ordem do dia, espaço de tempo que, segundo o Regimento, é destinado para os Deputados poderem tratar com o Govêrno assuntos de interêsse nacional. O assunto que desejava tratar hoje. o que fiquei inibido de o fazer, é da maior importância,, e diz respeito a uma nota oficiosa vinda hoje nos jornais, e relativa a uma reunião realizada ontem no Ministério das Finanças.
O orador não reviu.
O Sr. Sant'Ana Marques: - Sr. Presidente: por mais de uma vez, tenho pedido documentos que julgo necessários, para entrar na discussão do orçamento. Deles, apenas recebi dois, pelo que peço a V. Exa. a fineza do insistir para que me sejam enviados os restantes com urgência.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente:- Vai entrar em discussão o capítulo 2.° do orçamento do Ministério da Guerra
O Sr. Tamagnini Barbosa: - Sr. Presidente: continuando a discutir o orçamento do Ministério da Guerra, breves considerações tenho a fazer sôbre o seu capítulo 2.° Peço para elas, no emtanto, a atenção do Sr. relator e de S. Exa. o Ministro da Guerra.
Nas alterações propostas pela comissão do Orçamento à proposta orçamental do Ministério da Guerra, vejo referências quanto a determinadas verbas, que eu creio ser de interesso esclarecerem --se devidamente. E assim, quanto ao artigo 25.°, propõe o Sr. relator a redução da verba de 225 contos para 180 destinados aos postos de telegrafia som fios, serviço que está entregue à arma de engenharia.
Ora ou suponho que a verba de 225 contos foi calculada como sendo a estritamente indispensável para a manutenção dêsse serviço. Ora, se assim é, julgo que
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a redução proposta pelo Exmo. relator não deverá ser aprovada pela Câmara, a menos que ela queira, no decorrer do ano económico, em vocações suplementares, conceder a quantia que faltar.
Sucede também, que, por proposta da comissão do Orçamento, é feita a redução das verbas respeitantes a construções de novos campos para o serviço da aeronáutica, militar. Em obediência ao espírito de economia que deve caracterizar os orçamentos, concordo, em princípio, com reduções; não compreendo, porém, que se suprimam verbas - e é isto que eu desejo frisar ao Sr. relator - advindo daí um prejuízo maior do que se porventura tais verbas fossem concedidas. Assim, por exemplo, acho que as dotações para a continuação das construções a que aludi são absolutamente indispensáveis, porque é muito mais pernicioso deixá-las ao abandono. Sou, portanto, de opinião que, neste caso, as verbas não devem ser eliminadas.
Há outra circunstância ainda a ponderar, para a qual chamo a atenção do relator do parecer em discussão. Fixa o artigo 29.° uma dotação de 65 contos para o campo internacional de aterragem.
Creio que a inscrição desta verba no Orçamento depende dum acordo estabelecido entre as nações para a execução dêsse serviço o para a preparação de campos internacionais de aterragem. Ora, desde que assim é a eliminação de tal verba, quanto a mim, não se deve fazer. No emtanto, espero que o Sr. relator esclarecerá a Câmara a êste respeito.
Sr. Presidente: quanto às verbas do capitulo 2.° nada mais tenho a acrescentar. Desejo fazer apenas mais algumas considerações de ordem geral pelo que respeita a escolas militares, e especialmente quanto ao Colégio Militar. É pelo que respeita a estabelecimentos fabris e industriais visando também especialmente o Parque Automóvel Militar.
Sr. Presidente: não ignora V. Exa., não ignora a Câmara, as dificuldades com que vivem todos os elementos que constituem a oficialidade do exército, dificuldades que, em parte, podiam ser atenuadas com a adopção de certas medidas que permitissem a êsses oficiais determinadas facilidades quanto à educação de seus filhas. As escolas militares, e sobretudo o Colégio Militar, o Instituto dos Pupilos do Exército e alguns outros estabelecimentos merecem todo o nosso carinho, não só pela maneira como estão sendo dirigidos, mas ainda pelos bons resultados que produzem na educação dos filhos dos oficiais, alargando mesmo a esfera da sua acção educadora, como sucede com o Colégio Militar, aos filhos dos civis.
Quero definir aqui uma atitude, na qual encontro o apoio de uma grande maioria dos meus camaradas que vivem, neste momento, com grandes dificuldades, solicitando, por isso, da parte do Estado o auxílio que lhes possa ser dado. Embora com sacrifício do quantitativo que recebem como vencimento, êles pedem que lhes seja permitido obter a educação de seus filhos naqueles estabelecimentos modernos de ensino militar. Assim - e quanto ao Colégio Militar-eles propõem-se dar ao Estado o quantitativo que êle tenha de gastar com a ampliação das construções do Colégio Militar, mas divergem quanto ao modo de obter essa concessão. Uns entendem que as ampliações se devem fazer no próprio edifício do Colégio Militar e outros querem que elas se obtenham à custa dos edifícios vizinhos do Colégio.
Há estabelecimentos de instrução que estão hoje sendo aproveitados para o aquartelamento de tropas. Posso referir, por exemplo, o Instituto Moderno, no Pôrto, que poderia ser modelar como estabelecimento de instrução e que hoje está desprovido de todos os elementos que tinha. Neste folheto que diz respeito a êsse Instituto podem V. Exas. admirar como eram primorosas essas instalações e como elas deviam merecer o carinho que não recebem.
Entendo que as instalações do Colégio Militar serão de grande utilidade para todos. Seria um acto de humanidade a atender.
Apelo para os sentimentos de camaradagem do Sr. Ministro da Guerra, e também para os sentimentos de humanidade do Sr. Ministro das Finanças, que não deixarão de atender ao assunto, para que êle se resolva.
Eu não sei qual a forma por que se deve resolver. Encontro-me em embaraços para o fazer: não tenho autoridade para fazer uma proposta nesse sentido.
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mas tenho a autoridade precisa para chamar à realidade o Sr. Ministro das Finanças e também o Sr. Ministro da Guerra, e dizer-lhes que dentro do que seja possível, segundo as disposições legais, S. Exas. tragam uma proposta de alteração a êsse respeito.
Isto permitiria a pouco e pouco o reembolso da importância que o Estado nesta ocasião entendesse dever despender seja para a aquisição de um novo edifício, seja para a ampliação do actual, seja para adoptação de outro edifício que ao Estado possa servir.
Não me compete fazer neste sentido uma proposta de emenda. Não me repugna que essa proposta não seja admitida nesta ocasião, mas quero chamar a atenção do Sr. relator e do Sr. Ministro da Guerra para que S. Exas. avaliem a vantagem do que acabo de expor e julguem da necessidade de trazer a esta Câmara uma proposta, quando não seja de outra forma, a fim de resolver êste assunto, em condições de no próximo ano o Colégio Militar poder dar guarida aos filhos de oficiais, não me repugnando também que isto se torne extensivo aos filhos dos civis. Êste critério já foi aqui expendido, e não querendo ser mais papista do que o Papa, defendo para a classe civil o mesmo que para a militar, pois todas as classes têm êsse direito, que julgo pode ser extensivo aos civis.
Eu julgo que a verba aproximada para a solução do assunto será de 1:200 a 1:500 contos.
Deixo, porém, à observação, ao critério do Sr. Ministro da Guerra, o caso.
Chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças para o assunto que estou tratando.
Interrupção do Sr. Soares Branco que se não pôde ouvir.
O Orador: - A opinião do Sr. Soares Branco vem reforçar a minha opinião.
Os oficiais que vivem exclusivamente da sua profissão têm uma situação de verdadeira miséria.
Não pertenço a êsse número porque, sendo militar, tenho a profissão de engenheiro. Ela me traz, a par da minha profissão militar, qualquer retribuição a mais. Outros haverá que exercem outras profissões.
Mas eu apelo para V. Exa. para que atenda aos oficiais que vivem exclusivamente do seu vencimento, absolutamente insuficiente.
Sr. Presidente: estas minhas considerações levarão, por certo, os Srs. Ministros das Finanças e da Guerra, e bem assim o Sr. relator, à conclusão de que qualquer cousa se deverá fazer neste sentido.
Não me cabe a mim, neste momento, enviar para a Mesa uma proposta de emenda a introduzir no orçamento. Não podia mesmo fazê-lo sem o prévio consentimento do Sr. Ministro das Finanças. Em conformidade com a lei não posso introduzir qualquer modificação no orçamento, que de momento acarreta una aumento de despesa, embora eu diga que ela possa encontrar compensação no que os oficiais estão dispostos a pagar, desde que se estabeleça uma nova classe de pensionistas, para o Estado ser reembolsado do dinheiro que haja de se gastar na compra de um novo edifício no intuito de dividir o colégio e fazer o seu funcionamento em dois edifícios, ou então no intuito de criar outro colégio, para que possa funcionar um no norte do País e outro no sul, a fim de se dar satisfação às necessidades dos elementos de um e outro lado.
Outras considerações ainda tenho a fazer e são elas respeitantes ao Parque Automóvel Militar.
Antes do mais nada e não só em cumprimento de um dever de camaradagem, como também por um dever de justiça, eu quero, Sr. Presidente, fazer salientar perante a Câmara que é absolutamente destituído de fundamento o que corre num papel impresso, que foi distribuído aos Srs. Deputados, em que se atribuem actos desonestos à administração do Parque Automóvel Militar. Essa administração é hoje exercida por um camarada meu, da arma de engenharia, por cuja honestidade eu fico de fiador, aqui e em toda a parte.
Isto não quere dizer que eu possa de uma maneira completa concordar com tudo quanto hoje se passa adentro do Parque Automóvel Militar.
Sob o ponto de vista de critério de administração, admito a possibilidade de discussão sôbre o que se passa ali actual-
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mente, mas sob o ponto de vista do honestidade não lia possibilidade de se fazer a mais leve acusação contra a pessoa que está administrando o Parque.
Faço justiça aos homens e desejo neste momento que fiquem registadas as minhas palavras, que proclamam bem alto que está acima de todas as suspeitas a pessoa que está administrando o Parque.
Quanto ao funcionamento do Parque eu devo dizer que sou daqueles que não compreendem como é que um estabelecimento de tal natureza, entrando em concorrência com estabelecimentos similares particulares, para viver sob um redime de prelecção. E uma cousa inadmissível. Para que o Parque possa concorrer com os estabelecimentos seus similares em condições aceitáveis. É necessário que êle tenha do contar, para a organizarão dos orçamentos do trabalhos que se proponha fazer, com o pêso das contribuições que aos estabelecimentos da indústria particular são exigidos. Quando assim não seja verificar-se há uma grande desigualdade, o do preferência para o Parque, em manifesto prejuízo da indústria particular. Ora o Parque Automóvel Militar não foi criado para estrangular a indústria particular.
A mão do obra do Parque, segundo as informações que tenho, e constituída actualmente por 20 por cento de militares; os 80 por cento restantes é pessoal civil.
O Sr. Presidente: - V. Exa. á esgotou a meia hora.
O Orador: - Se V. Exa. me permitir eu concluirei em cinco minutos.
Sr. Presidente: eu sou daqueles que pensam que a mão do obra militar posta em concorrência com a civil não pode ser paga de forma diferente, Não há possibilidade de ter um bom serralheiro militar o um bom serralheiro civil, pagando àquele o pró e a esto o salário do operário civil.
Pela classificação dos operários feita no Parque, vemos que êsses operários são divididos era diferentes categorias.
Conta-se também contratar engenheiros civis, o que também vai estabelecer desigualdade. São muitas as desigualdades e grandes as irregularidades, e eu peço ao
Sr. Ministro da Guerra que com urgência resolva êste estado de cousas.
Se o Parque não pode continuar, se é preciso fazer-se uma remodelação profunda, entre-se nesse caminho, mas abertamente.
Agradeço a V. Exa., Sr. Presidente, o ter permitido que eu falasse além da meia hora.
O orador não reviu.
É lido na Mesa um ofício do Senado comunicando ter sido designado o dia de amanhã, 2í, pelas 17 horas, para reunião do Congresso, sendo a ordem do dia, além do assunto indicado no oficio n.° 42 desta Câmara, sôbre prorrogação da sessão legislativa, mais o seguinte:
Alterações à proposta de lei que dá nova redacção ao artigo 11.° da lei de 31 de Agosto de 1916, que regula a promoção dos sargentos dos serviços de saúde-
Alterações à proposta de lei que determina a forma de serem preenchidas as vá. gás de tesoureiros da Fazenda Pública.
O Sr. Francisco Cruz: - Sr. Presidente: há muito que se faz sentir a necessidade de um Colégio Militar no norte do país.
Todos sabem as dificuldades que há na educação dos filhos, para que da seja feita em estabelecimentos de confiança.
Todos sabem quanto pesa nos orçamentos de uma família a educação dos filhos, feita lá fora.
O Colégio Militar é um estabelecimento que imprime carácter, e os rapazes que de lá saem sabem mandar, mas também sabem obedecer.
Nesta hora, em que toda a gente manda, é preciso que haja quem saiba também obedecer.
A criação de um Colégio Militar no norte podia também servir para mais: para ajudar a pagar uma parte dos encargos do Estado.
Prestava se assim um grande serviço à educação e instrução da mocidade.
O Sr. Ministro da Guerra, junto com o seu colega das Finanças, poderiam fazer o desdobramento do Colégio Militar.
Permita V. Exa. que eu chame a atenção do Sr. Ministro da Guerra e do Sr. relator para o cumprimento do decreto n.° 11:270, que cria o subsídio de guarnição.
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Não compreendo que a tabela 2 não abranja os oficiais, sargentos e praças dos hospitais militares.
Hão se compreende que o director do grupo ganhe mais do que o director do Hospital da Estrela.
O orador não reviu.
O Sr. Pina de Morais: - Sr. Presidente: reconheço que o capítulo 1.°, votado no resto da sessão do quinta feira à noite, ora o capítulo mais importante do orçamento da Guerra.
Êsse capítulo, referente ao pessoal, era o capítulo que eu esperava que mereceria da parte da Câmara uma mais larga atenção, e é êsse, sobretudo, que devo merecer a atenção do Poder Executivo, porque é essa parte móvel do orçamento que permite da parto do Poder Executivo e da comissão do Orçamento uma intervenção no sentido do economia.
Mas essa discussão foi apenas vagamente tocada por meu lado, e com muita proficiência da parto do Sr. Tamagnini Barbosa, e passou despercebida.
Ora, se eu nessa ocasião não temesse impedir á discussão do Orçamento, teria usado largamente da palavra sôbre o assunto.
Quanto à reorganização do exército, reorganização a que vários titulares têm prestado pouca atenção, mas que é urgente que só faça o que lá fora só tem feito com largueza, ao passo que no nosso País ainda estamos no capítulo dos estudos, acho que ela devia servir de base para a discussão do Orçamento.
Na moção que enviei para a Mesa, preconizava-se essa doutrina exactamente na sua última alínea.
Realmente, é triste o nosso modo de vida administrativo, e creio que dentro da pasta da Guerra as cousas se passam melhor que em qualquer das outras; triste é na verdade verificar o modo de inútil trabalho, perda absoluta de todas as iniciativas, para quaisquer modificações que se queiram fazer nos orçamentos.
Aparece taxativamente aqui uma série de verbas que temos de aprovar; a respeito delas não há que fugir.
A atitude de um parlamentar que resolve aumentar ou deminuir 100$ numa verba é muito de louvar, mas de nada servo fundamentalmente.
Não foi, porém possível, creio, à comissão do guerra, fazer ainda essa reorganização; vem portanto o orçamento ainda nos moldes antigos, o que é de lamentar.
Também entendo, Sr. Presidente, que a comissão de guerra devia avistar-se com a do Orçamento e do marinha, para nos dar uma noção exacta do que são as despesas militares da República.
Com efeito, as verbas globais deviam ser fixadas por nós; os serviços é que depois as dividiriam como melhor entendessem.
É assim que eu compreendo que o Poder Legislativo podia ter uma interferência administrativa; do outro modo, somos compelidos a examinar aqui como funcionários administrativos se esta ou aquela verba chega ou não, o apontar um ou outro êrro.
O sistema actual tem mais como inconveniente o seguinte facto: é eu não saber quanto me custa cada arma do exército.
O Sr. Ministro da Guerra (José Mascarenhas): - E que isso não interessava grandemente.
Não é em razão do custo dela, que eu tenho mais ou menos artilharia; tenho mais ou menos artilharia, conforme manda a organização militar.
O Orador: - Eu tenho uma discordância com o Sr. Ministro da Guerra, nosso ponto: é que, sabendo quanto custa o exército, sabemos ao certo quanto gastamos, não precisando talvez despender mais dinheiro em reforços de verbas, porque os serviços, poupando porventura numas vezes, compensariam outras mais necessita.
Assim se faz, por exemplo, uma administração de uma casa, olhando para despesas supérfluas, comezinhas, mas que somadas, às vezes, dão economias importantes.
Há, por exemplo, certas unidades que precisam de ter uma perfeição de vida e uma actividade mais próxima de entrar em campanha, como a aviação e a cavalaria; outras armas porém, como a infantaria, permitem uma demora maior para entrarem em campanha, e, por conseguinte, eu, numa distribuição de dinheiros, sabia que primeiro devia atender a uma arma, antes do que a outra.
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O Sr. Pires Monteiro: - V. Exa. tem o mapa n.° 5 que lhe dá essa indicação. Sou, aliás, da opinião do V. Exa.
O Orador: - Muito bem, mas há ainda outro inconveniente neste modo de apresentação do orçamento. E que se verifica nos serviços uma concentração exagerada que chega a ser muito prejudicial. Certos organismos do Estado, como o Depósito de Fardamentos, têm um funcionamento que é contrário a todos os sistemas administrativos. Devia haver um organismo de fiscalização de toda esta vida económica. Assim não teríamos emprêsas que redundam em prejuízo das instituições. Eu sei que é muito difícil hoje a fiscalização, mas tenho êste critério.
É que as verbas consignadas no orçamento, calculadas pelo Sr. Pires Monteiro, sôbre despesas de fardamentos e alimentação, se fossem entregues a um conselho administrativo que tivesse consciência e que fôsse cuidadoso, estou convencido de que se conseguiriam bons resultados.
Em nenhuma democracia económica é o fabricante ou o vendedor que indica a duração do seu artigo; deve dar-se o inverso.
No capítulo "material" quero referir-me ao assunto do Colégio Militar, que aqui tem sido debatido.
Como V. Exas. sabem, eu sou Deputado pelo Pôrto, e já por várias ocasiões me tenho referido à necessidade que haveria, no caso de se poder desdobrar o Colégio Militar, de êsse desdobramento ir para o Pôrto.
Faz-me pena ver ocupada por um reduzido número de soldados da guarda republicana uma casa que se destinava a um colégio.
Todos sabem a luta que é necessário sustentar com um soldado para que êle não estrague por completo o edifício onde está aquartelado.
Sei as dificuldades em que a República vive e em que vivem também os oficiais do exército; e, conquanto eu não simpatize muito com a educação do Colégio Militar- e não digo isto porque não reconheça que todos os seus professores são competentissimos - entendo que vale mais ter a educação do que ali se ministra, do que não ter nenhuma.
Ficarei de atalaia, perfeitamente vigilante e sempre atento, para que, quando se faça êsse desdobramento, êle vá para o Pôrto, porque isso representará apenas uma simples transferência.
O Pôrto é uma das terras mais abandonadas em instrução; os seus liceus têm tam más condições higiénicas que, se fossem estabelecimentos particulares, certamente nEo seriam autorizados a funcionar"
A sua situação é desgraçada, é miserável quási. Êste colégio seria realmente maravilhoso, de instalações tam boas como as do Colégio da Luz, se lhe dessem alguns meios de vida de que êle carece.
Essa oferta da parte dalguns oficiais, desejando contribuir, na medida dos seus soldos, com uma certa percentagem para se ampliarem as instalações do Colégio Militar, é uma atitude bonita da sua parte. Mas há que fazer um estudo cuidadoso do assunto, há que atender a que a percentagem com que os oficiais pretendem contribuir dará um produto mínimo que não chegará. Essa oferta dos oficiais é, todavia, uma denúncia de boa vontade e uma cooperação que teremos ensejo de agradecer.
Resta-me agora, Sr. Presidente, referir-me ao Parque Automóvel Militar. Tenho a impressão de que êle goza duma antipatia geral no nosso público, antipatia que é, de certo modo, justificável, êle é um foco de indisciplina e de despesa. Não pode sancionar a pasta da Guerra que dois indivíduos com o mesmo curso tenham adentro do Parque Automóvel Militar tratamentos diversos. Se houvesse diferença nas suas aptidões, estaria bem; assim, não!
Há camaradas meus que me vieram pedir para ver se conseguia que êles fossem contratados para lá, abandonando a vida militar. A razão dêste pedido é fácil de explicar. Um engenheiro civil é contratado pelo Parque Automóvel Militar e vai ganhar, com as mesmas possibilidades de trabalho que eu, 10 vezes mais talvez o que eu levanto.
Portanto a questão é esta: Daquele organismo consegue viver adentro dos seus recursos, não perturbando a disciplina militar e a vida industrial? ... Que viva! Não pode viver assim V... Anulem-no!
Isto, Sr. Presidente, não quere dizer
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que não sejam muito honestas as pessoas que administram o Parque Automóvel Militar. Mas aquele organismo tem vivido tam afastado da pasta da Guerra que chega a ter verdadeiras incongruências na sua vida administrativa.
O Sr. relator confessa no seu relato que admite como não constitucionais certas verbas que são lançadas no orçamento, como a destinada a serviços gráficos. Se essa não constitucionalidade é reconhecida pela comissão, só tem a cumprir um dever: a extinção pura e simples dessas verbas. Ou é legal e vantajoso êsse serviço, ou não. Devo dizer, sem desprimor para ninguém, que tenho uma má impressão dêsses serviços. Se a sua existência é justificável ou não, compete verificá-lo ao Sr. Ministro da Guerra e de S. Exa. eu espero uma opinião concreta sôbre o assunto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pires Monteiro: - Sr. Presidente: antes de iniciar as minhas considerações, mando para a Mesa várias propostas de emenda, em nome da comissão do Orçamento.
Sr. Presidente: a propósito do artigo 2.°, usaram da palavra os Srs. Deputados Tamagnini Barbosa, Francisco Cruz e Pina de Morais. Vou referir-me às dúvidas que êsses Srs. Deputados apresentaram. Esto capítulo é, porventura, um dos mais importantes para a eficiência das instituições militares, pois refere-se à questão do material, visto que a deficiência das instituições militares provém da insuficiência das verbas a êsse fim destinadas.
O Sr. Deputado Tamagnini Barbosa referiu-se à questão dos postos da telegrafia sem fios.
Não tenho dúvida, em nome da comissão, de declarar que aceito a manutenção dessa verba, devendo, todavia, acentuar que a redução, que se havia proposto, tinha sido fundamentada em informações chegadas a essa comissão.
Porém, o Sr. Ministro da Guerra é de opinião que essa redução não se deve efectivar, pelo que não tenho dúvida nenhuma em aceitar a respectiva emenda.
Pelo que diz respeito à construção para o serviço aeronáutico, devo chamar a atenção da Câmara, e especialmente do Sr. Tamagnini Barbosa, para a inscrição, no capítulo Despesas extraordinárias D da verba de 300 contos que vem substituir as que se encontram disseminadas pelas várias unidades do serviço da Aeronáutica Militar.
Pelo que se refere ao campo internacional de aterragem, devo- chamar para êste caso a atenção da Câmara, porque o reputo importante, devendo indicar qual o critério que levou a comissão a reduzir essa despesa.
Entendeu a comissão que êsse campo não é de característica militar, porque é destinado à realização das grandes linhas aéreas, que infelizmente ainda não vieram até ao nosso País, pelo que deve ficar subordinado ao Ministério do Comércio. Êste ponto de vista, já eu tive a honra de defender quando sobracei a pasta do Comércio, procurando pô-lo em execução, para o que nomeei uma comissão composta de cinco militares indicados pelos Ministérios da Guerra e Marinha.
Era ainda aceitável que o Ministério da Guerra concorresse com determinada verba para auxiliar a sua manutenção, mas êle deveria ficar subordinado ao Ministério do Comércio e Comunicações, para cujo orçamento as devidas verbas seriam transferidas. Consequentemente, vêem V. Exas. que essa redução não corresponde de nenhum modo a uma deminuição de despesas no orçamento geral.
Creio, Sr. Presidente, ter justificado a razão por que a comissão cortou a verba destinada ao campo internacional da aterragem em Alverca.
Referiu-se também o Sr. Tamagnini Barbosa ao Colégio Militar. Devo dizer que a comissão do orçamento tratou do assunto, como se pode verificar a pp. 14 e 15 do respectivo parecer.
E de crer que o Sr. Ministro da Guerra, que dedica a maior atenção a êstes assuntos, traga a esta Câmara uma proposta de lei pela qual o Colégio Militar possa ser desdobrado.
Estou convencido de que o Parlamento não recusará as verbas necessárias para êste desdobramento que corresponde a uma necessidade.
Sr. Presidente: chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra no sentido de pôr cobro a determinados abusos que se cometem
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pela chamada obra social do exército de torra e mar, obra que é constituída pelo Colégio Militar. Instituto Feminino de Educação e Trabalho e Pupilos do Exército.
Na ocasião da guerra compreendia-se o privilégio dado a determinados alunos que eram destinados aos quadros milicianos; mas depois da guerra é inadmissível que os alunos do Colégio Militar u do Instituto dos Papílos do Exército que não concluem os seus cursos, por serem deficientes no seu trabalho, obtenham, a recompensa de promoção a segundos sargentos, com um vencimento mensal de 600 escudos. Trata-se de uma imoralidade que certamente o Sr. Ministro da Guerra vai fazer cessar.
Sr. Presidente: às considerações apresentadas pelo Sr. Tamagnini Barbosa responderá o Sr. Ministro da Guerra,
São considerações muito interessantes, embora não seja êste o momento oportuno, quanto a mim, para serem atendidas.
Como já disse, simplesmente me parece que o Sr. Ministro da Guerra poderá trazer a esta Câmara uma proposta de lei para o desdobramento do Colégio Militar; mas para isso é necessário realizar démarches que não podem fazer-se num momento. Não se trata apenas de inscrever uma verba no orçamento. É preciso criar novos lugares de professores e criar novo pessoal administrativo, o que não pode efectivar-se com uma simples inscrição de verba.
Referiram-se, os Srs. Deputados Pita de Morais e Tamagnini Barbosa à questão do Panno Automóvel Militar.
O Sr. Pina de Morais manifestou-se pelo desaparecimento do Parque Automóvel Militar, e o Sr. Tamagnini Barbosa defendeu a manutenção dêsse estabelecimento do Estado.
Não tem o Sr. Pina do Morais razão no seu ponto de vista.
Só S. Exa. tivesse lido um relatório que foi feito em 31 de Dezembro de 1925 por uma comissão incumbida do estudar as condições em que se encontra o Parque Automóvel Militar, relatório que tenho presente o que posso facultar a qualquer Sr. Deputado que o desejo, S. Exa. verificaria fàcilmente que as dificuldades com que luta êsse organismo provêm do êle não ter os fundos necessários para o seu regular funcionamento, não sobrecarregando o orçamento com mais do que uma ligeira verba destinada ao pagamento ao pessoal militar que lá faz serviço.
Os principais clientes do Parque Automóvel Militar são os particulares, não concorrendo as estações oficiais, como seria natural que o fizessem, com os seus trabalhos de reparação a êsse estabelecimento.
No parecer que tive a honra de apresentar à Câmara em nome da comissão do orçamento, inclui-se a verba de 1:000 contos destinada a pagar despesas feitas pelo Parque Automóvel Militar.
Esta quantia permitiria ao Parque Automóvel Militar o seu conveniente funcionamento.
Disse o Sr. Pina de Morais, e muito bem, que nem todas as armas têm a mesma capacidade de mobilização, umas têm maior facilidade em se adestrar para a guerra, outras necessitam ter melhor preparação.
Tanto isso é assim que estando eu incumbido de relatar as bases da reorganização do exército, no quadro n.° 5 apresento já como preparatório para êsse trabalho a distribuição das verbas do Ministério da Guerra pelas diferentes armas. Visto que estou falando em reorganização do exército, aproveito a ocasião para pedir ao Sr. Ministro da Guerra que a reorganização do exército do ultramar que, segundo informações de jornais, foi hoje para a Mesa, vá à comissão de guerra antes do ir à comissão de colónias.
Como já tive ocasião de dizer, em minha opinião a parte militar do Ministério das Colónias deve passar para o Ministério da Guerra. ÀS duas reorganizações devem ser estudadas conjuntamente.
Vivemos ainda com um exército antigo, quási destinado simplesmente á manutenção da ordem pública.
Vamos que a infantaria que é a arma que mais ràpidamente se mobiliza é a que despende maior verba, 61.000 contos com os sons diferentes serviços; pelo contrário a aeronáutica que só diz que despende muito consome uma verba que é irrisória, comparada com a verba que todos os países destinam às tropas aéreas, apenas 7:080 contos. E absolutamente indispensável que caldeiros da nossa aeronáutica. É necessário cuidar dêsse problema, mas, com
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as devidas cautelas que sempre nos faltam quando pretendemos resolver qualquer problema.
Sr. Presidente: vou concluir as minhas considerações, mesmo porque o Regimento não mo permito alongá-las, mas não o quero lazer sem mo referir também a uma orientação interessante que o ilustre Deputado Sr. Pina de Morais referiu quando fez as suas considerações sôbre o orçamento do Ministério da Guerra.
Disse S. Exa., e muito bem, que representa uma ficção estarmos a discutir esta distribuição de verbas, parecendo lhe mais conveniente que fixássemos as verbas globais. Para isso, porém, era necessário que no Ministério da Guerra existissem aqueles serviços de fiscalização superior que desde 1922 venho preconizando nesta Câmara e que nunca existiram.
É absolutamente indispensável que o Sr. Ministro da Guerra adopte as medidas necessárias para remediar êste caso.
O Sr. Ministro da Guerra não tem só que executar as leis: deve ver o que respeita a determinada lei o adoptar as medidas para prestígio do departamento que lhe está entregue. Não pode ser, apenas, uma pessoa que se compraz em trazer a esta Câmara e assinar decretos mais ou menos brilhantes.
Não tenho visto administrar no Ministério da Guerra.
O Sr. Pina de Morais referiu-se ao Depósito Central do Fardamentos. Não concordo com a orientação de S. Exa.
A comissão de guerra referiu-se a êsse assunto.
Quanto aos Serviços Gráficos do Exército, entendo que precisam material o pessoal.
Deve funcionar como em França e em Espanha.
A secção cinematográfica e fotográfica não é uma secção artística.
Essa instalação deve voltar para o estado maior do exército.
S. Exa. conhece os serviços importantes que essa secção pode prestar ao País, para a instrução do exército.
Na Bélgica êsses serviços servem para a instrução do exército, que é em parte feita por êsse meio.
S. Exa. conhece perfeitamente o assunto; e dentro das suas atribuições constitucionais pode trazer à Câmara um decreto entregando ao estado maior do exército êste serviço.
É preciso acentuar êste facto: o Parque Automóvel tem tido um grande desenvolvimento.
Chamo a atenção de S. Exa. para os serviços da Farmácia Central do Exército, que não correspondem às necessidades do exército.
O orador não reviu.
Leram-se as propostas e foram admitidas.
O Sr. Ministro da Guerra (José de Mascarenhas): - Sr. Presidente: aproveito a ocasião para responder a algumas considerações feitas pelo Sr. Rafael Ribeiro.
Pelo que diz respeito ao primeiro assunto tratado por S. Exa. eu devo dizer que o oficial sindicante chegou à conclusão do que não tinham sido proferidas palavras ofensivas para S. Exa.
O oficial proferiu uma frase um pouco mais viva por estar aborrecido e fatigado com excesso de trabalho.
Em vista das conclusões do sindicante, mandei arquivar o processo, chamando a atenção do oficial para, de futuro, se lembrar que as pessoas que o procuram nada tem com os aborrecimentos ou fadigas derivadas do excesso de trabalho; sôbre os outros assuntos tratados pelo Sr. Rafael Ribeiro, vou informar-me para trazer à Câmara as elucidações necessárias.
Entrando propriamente no assunto que está marcado na ordem do dia, a discussão do capítulo 2.°, eu vou responder aos ilustres Deputados que usaram da palavra.
O Sr. Tamagnini Barbosa fez referências com que eu estou perfeitamente de acordo.
Quanto ao Colégio Militar entendo que deve ser ampliado, mas não dividido.
Estou até certo ponto do acordo com as considerações feitas pelo Sr. Pina de Morais, que afirmou haver no Pôrto um edifício muito apropriado para êsse fim, tanto mais quanto é certo que o edifício da Luz não se encontra nas condições que seria para desejar; porém, S Exa. deve compreender muito bom que a sua divisão, além de ir quebrar uma tradição muito antiga, acarretaria para o Estado uma despesa enorme, visto que ter-se-ia de nomear para lá um director o todo o
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pessoal necessário para o seu bom funcionamento.
A Câmara resolverá como entender, sendo o meu intuito unicamente mostrar à Câmara os inconvenientes que daí resultem.
Talvez fôsse preferível criar no Pôrto uma instituição como os Pupilos do Exército, onde a entrada de alunos se não limita aos filhos dos oficiais, instituição tam boa como o colégio da Luz, visto que ali se aprende tudo quanto é necessário para a vida prática.
Interrupção do Sr. Pina de Morais que não foi ouvida.
O Orador: - Estou plenamente de acordo com V. Exa., pois a verdade é que o Pôrto parece que foi votado ao abandono.
Entendo que na mesma ocasião em que se possa fazer o alargamento do Colégio Militar seria conveniente votar uma verba para se criar um novo Instituto de Pupilos, no Pôrto, no edifício da Guarda Republicana, que existe na Bela Vista.
Relativamente ao Parque Automóvel Militar, já o ilustre relator, Sr. Pires Monteiro, indicou a causa originária do estado em que se encontra hoje aquele estabelecimento. Foi instituído com um desenvolvimento grande demais para os recursos do nosso exército.
Vem daí o estado deficitário em que hoje se encontra.
Devo confessar, porém, que o caso relativo ao Parque tem merecido a minha especial atenção, e tanto assim é que já tenho procurado reduzir as despesas que ali se fazem.
Já ordenei que aos engenheiros que lá estão fossem dados por terminados os seus contratos para se irem embora. No lugar dêles serão colocados oficiais devidamente habilitados.
Mandei também reduzir de um têrço o pessoal civil, e disposto estou a ordenar uma maior redução se assim fôr preciso.
Também mandei que fossem tiradas as gratificações extraordinárias que o pessoal militar recebia.
Havia pessoal militar que, usufruindo as regalias de se vestir pelo exército e ter rancho, auferia vencimentos iguais aos dos operários civis.
Isto não é admissível.
Tenho estado a procurar pôr todas estas cousas na ordem para ver se consigo equilibrar a receita com a despesa, a fim de tomar depois uma decisão definitiva no sentido de manter o Parque ou de trazer ao Parlamento uma proposta de lei pela qual se permita entregar aquele estabelecimento a uma entidade particular.
Devo ainda, dizer que concorreu muito para a vida difícil do Parque o agravamento dos câmbios.
As matérias primas que estavam encomendadas tiveram de ser pagas por um preço maior do que o previsto. O Parque, não tendo fundos próprios, encontrou-se a braços com uma dívida de 1:200 contos. Tem passado a vida a reformar letras.
Êstes 1:000 contos servem para colocar o Parque em condições de não se preocupar com a dívida que tem.
Na arma de engenharia a comissão do Orçamento reduziu a verba destinada aos quinze postos de telegrafia sem fios. Não posso concordar com esta redução, visto que esta verba foi incluída como um mínimo para que êstes postos possam, dia a dia, receber a hora, transmitir a hora e todos aqueles telegramas indispensáveis ao serviço.
Serviço de recenseamento de viaturas e automóveis. - Foi também reduzida esta verba. Êste serviço tem por fim ter em dia os quadros estatísticos donde constem todos os automóveis, camiões e restantes viaturas existentes em todo o País, mas especialmente em Lisboa e Pôrto.
A redução desta verba, que é insignificante, dará em resultado a supressão destas comissões.
Sôbre o campo internacional de aterragem o Sr. Pires Monteiro disse que esta verba não está. no seu lugar, devendo ser transferida para o Ministério do Comércio.
Mas em todos os países se começou pela aviação militar e só depois da aviação militar criada é que se criou a aviação civil.
A Câmara fará o que entender; por mim entendo que deve ser mantida esta verba.
O Sr. Pina de Morais referiu se também à conveniência de o Orçamento ser discutido por outra forma, visto que a discussão actual é uma cousa fictícia, por isso que estando a tratar-se da reorgani-
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zação do exército só depois de ela estar feita é que com justeza se pode verificar quais as verbas que serão precisas. Plenamente de acordo, mas S. Exa. sabe que eu fiz aquilo que podia fazer: agarrei numas bases e trouxe-as ao Parlamento. Fiz mesmo mais; ao abrigo duma autorização concedida pelo Parlamento para remodelar os serviços públicos, remodelei os serviços do meu Ministério, mas o Parlamento quis estudar o assunto e daí a apresentação das bases por minha parte.
Quanto à fiscalização superior de que o mesmo Sr. Deputado tratou, também estou do acordo, e tanto que nas bases que apresentei lá vem um organismo que fará a fiscalização superior da administração do exército. Êsse caso, de resto, preocupa-me tanto no meu lugar que fui ressuscitar agora, umas inspecções extraordinárias que deixaram de se realizar desde a proclamação da República. Foi exactamente por sentir que havia despesas extraordinárias, nas quais se notava que havia desbarato e desmazelo nas cousas que pertencem ao exército, que eu fiz nomear aqui há uns quinze ou vinte dias quatro inspecções extraordinárias que já a esta hora se encontram em contacto com os regimentos.
Vê, por isto, S. Exa. o cuidado que na parte administrativa também me merece o exército.
Apoiados.
Relativamente aos serviços gráficos, devo dizer que estou de acordo inteiramente com a sua supressão e a distribuição deles pela organização onde estavam perfeitamente colocados, que é o nosso estado maior.
A comissão de Orçamento resolveu suprimi-los e eu voto com ela.
Desde que isso fique estabelecido no Orçamento, eu distribuirei êsses serviços pelo organismo onde devem estar.
Respondendo ao Sr. Pires Monteiro, devo dizer mais, sôbre a parte burocrática, que o Ministro da Guerra não se deve limitar a assinar expediente. Eu tenho a certeza de que todos aqueles que têm exercido êste lugar não se têm limitado a isso, mas S. Exa. sabe muito bem que o papel do Ministro, tal como está determinado na Constituição, não passa de um papel administrativo.
O Sr. Pires Monteiro: - V. Exa. dá-me licença para esclarecer a minha idea?
Os Ministros devem ver qual é a economia de uma determinada lei e propor a sua eliminação quando ela não traga vantagens ou acarrete encargos enormes.
O Orador: - Eu tenho nesse sentido apresentado ao Parlamento as medidas que tenho julgado necessárias.
O Sr. Pires Monteiro: - Presto essa homenagem a V. Exa.
O Orador: - Eu procurei remediar todo o caos em que o exército estava com as bases que apresentei à comissão de guerra. Sôbre a aviação, por exemplo, eu reconheci todos os inconvenientes em que ela se encontra, que não podem continuar para bem da disciplina. Assim, hoje um tenente é comandante de uma esquadrilha e tem lá outro tenente, mas mais antigo, que lhe está subordinado; amanhã, porém, êste é promovido e dêsse modo deve passar a comandar a esquadrilha? Isto é disciplinar? Creio que não.
E foi esta a razão por que eu publiquei aquele decreto que foi visto e estudado pelo estado maior, julgando que estava autorizado a fazer essa publicação A Câmara, porém, entendeu que assim não era; têm V. Exa. agora um meio de resolver o assunto: é fazer com que as conclusões a que a comissão de guerra chegar aqui sejam discutidas com urgência.
Eu vou estudando as cousas dentro das atribuições que me competem e vou-as reduzindo a propostas de lei que mando para a Mesa a fim de V. Exas. as estudarem.
O meu papel não se tem limitado, pois, a dar expediente, como há pouco afirmou o ilustre relator, que, desculpe-me S. Exa., não foi justo nas suas apreciações.
Resta, por último, referir-me à redução de 10 por cento nos termos do decreto n.° 11:054.
As verbas constantes do Orçamento passado foram calculadas em relação ao câmbio, e, por isso, se lhes abateram 10 por cento, porque os géneros realmente baixaram alguma cousa. Mas as dêste Orçamento foram calculadas em face do
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câmbio actual e por consequência do custo real das cousas.
Como se quere, pois, abater 10 por cento a estas verbas?
O Sr. Pires Monteiro (interrompendo}:- As verbas são exactamente as mesmas do ano passado.
O Orador: - Perdão a V. Exa., mas essa afirmação não é exacta, pois que eu modifiquei muitas verbas. Não é possível fazer-se o abatimento proposto pela comissão, porque então o Orçamento passaria a ser uma ficção e teríamos, pelo me fora, de recorrer aos créditos extraordinários devido à insuficiência de algumas verbas.
Concordando com muitas das reduções que a comissão propôs, com as que apontei à Câmara é que eu não posso de maneira nenhuma concordar.
Tenho dito,
O orador não reviu.
Seguidamente procedeu-se à votação das emendas da comissão e de outras propostas adiante mencionadas.
É aprovado o capítulo 2.°, salvas as emendas.
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 3.°
O Sr. Ministro da Guerra (José de Mascarenhas): - Sr. Presidente: concordando com todas as rectificações feitas pela comissão do Orçamento ao capítulo 3.°, não posso concordar, porém, com aquela que diz respeito a forragens. Ainda hoje me foi dito por um representante da Manutenção Militar que não podia dar forragens por preço inferior a 6$. Mas ainda mesmo que se pudesse fazer qualquer economia, ela teria do ser aplicada na alimentação do cavalos o muares, que existem agora em número maior do que o previsto.
Espero que a comissão do Orçamento tenha em consideração o que acabo de expor.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pires Monteiro: - Em nome da comissão do Orçamento declaro que aceito a rectificação feita pelo Sr. Ministro da Guerra.
É aprovado o capitulo 3.°, salvas as emendas.
O Sr. Pinto Barriga: - Peço a V. Exa. consulte a Câmara sôbre se autoriza a comissão de legislação civil e criminal a reunir da próxima sessão de quinta-feira, durante a sessão.
Autorizado.
É aprovado o capítulo 4.°, sem discussão.
É aprovado o capitulo 5.°, salvas as emendas.
Entra em discussão o capitulo 6.°
O Sr. Pires Monteiro: - Os Srs. Ministros da Guerra e Finanças propõem a inclusão de duas verbas, e a comissão do Orçamento julga que devem ser aceitas, pois são a legalização de uma desposa feita, verba levantada pelo Ministério do Comércio e Comunicações nos termos de uma lei.
Nestas condições a comissão do Orçamento considera que a proposta deve ser aprovada.
O orador não reviu.
O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: uma proposta dessas, do uma importância tam avultada, coloca-nos numa situação difícil.
Sei dos que entendem que o Estado tem por dever respeitar os contratos das pessoas que o representam.
Mas o que é conveniente é que as pessoas que representam o Poder tenham em todos os momentos presente que há assinaturas de contrato e leis de contabilidade a respeitar.
Infelizmente tenho visto invocar frequentemente essa lei de contabilidade e, no emtanto, nós vemos, como não há muito tempo na discussão da proposta de duodécimos, fazer-se a afirmação, e a propósito dessa discussão, pelo Sr. Paiva Gomes, presidente da comissão do Orçamento, e pelo Sr. João Camoesas, de que não tinham dúvida de, pessoalmente, assumir a responsabilidade da autorização concedida pelo Sr. Ministro da Instrução de uma verba de 120.000$.
Nessa ocasião tinham S. Exas. razão.
A nossa 5.ª arma para existir precisa
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de ter os elementos necessários para a sua eficiência.
Defendendo êste princípio entendo também que os Ministros da Guerra não podem abusivamente ultrapassar a capacidade orçamental, saltando por cima de todas as leis, praticando actos nocivos aos interêsses do Estado.
O Sr. Ministro das Finanças com a responsabilidade do lugar que ocupa e do seu nome não pode sancionar êsse despacho, que é contrário a todas as normas de contabilidade.
É bom que haja alguém que aponte êstes casos de um Ministro se servir da sua situação política para assinar um despacho dessa ordem.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente : - A sessão fica interrompida, para recomeçar às 21 horas e 30 minuto.
Eram 19 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente (às 22 horas e 5 minutos): - Está reaberta a sessão.
O Sr. Ministro da Guerra (José de Mascarenhas): - Permita o Sr. Manuel José da Silva que seja eu quem responda às suas considerações.
Um dos contratos, aquele que deu origem a uma resposta favorável do Conselho de Ministros em 1925, foi realizado ao abrigo do crédito de 3.000:000 de libras e dizia respeito a material aeronáutico para que foi destinada a importância de 200:000 libras.
Em virtude dessa autorização várias casas contrataram com a Inspecção de Aeronáutica o fornecimento de aeroplanos, motores e outro material e, entre elas, apareceu a firma Roxo, Limitada.
Mais tarde, já quando se encontrava firmado o respectivo contrato, a Inspecção de Aeronáutica, tendo conhecimento que os aeroplanos encomendados tinham já sido aperfeiçoados, que os seus motores estavam já modificados para melhor, resolveu mandar sustar a remessa dessa encomenda e introduzir nos aeroplanos e motores a comprar as modificações de harmonia com o que a prática tinha aconselhado.
Isto deu em resultado que a citada firma não pudesse, por consequência, fazer o embarque do material já feito nas condições estipuladas no respectivo contrato.
Sucedendo assim e como êsse material não chegou até 31 de Dezembro, ficou implicitamente êsse contrato fora das autorizações concedidas pelo crédito de 3.000:000 de libras.
Como a firma contratante não tinha responsabilidade em que êsse material não chegasse até 31 de Dezembro, não pode, portanto, ser prejudicada e ficar sem receber a importância correspondente- a um contrato legalmente estabelecido.
O Sr. Manuel José da Silva: - V. Exa. dá mo licença? Independentemente da parte técnica, e essa daria margem a comentários que V. Exa. é o primeiro a fazer e eu o primeiro a escutar com o acatamento que V. Exa. me merece, não podendo a respectiva importância ser coberta pelo crédito de 3.000:000 de libras, pregunto se no Orçamento do Ministério da Guerra havia qualquer verba que permitisse essa compra.
O Sr. Ministro das Finanças (Marques Guedes): - Eu tenho conhecimento da existência dêsse contrato. Se êle chegou dentro do prazo ou não, isso é que não sei.
O Orador: - Em virtude do facto por mim apontado, foi presente ao Parlamento uma proposta de lei, que foi transformada na lei n.° 1:764, pela qual foi permitido o pagamento à firma Roxo, Limitada, da importância de 12:065 libras de que o Estado lhe estava em débito. Como se arranjou êsse dinheiro?
Foi-se às anuidades do orçamento anterior e tiraram-se essas 12:065 libras com que se pagou à firma Roxo.
É preciso restituir essa anuidade e pagar o que fôr devido.
O Sr. Manuel José da Silva: - Veja V. Exa. como tudo isso é ambíguo.
Não havia verba no Ministério da Guerra e a verdade é que não era à conta do crédito em questão que ela se poderia arranjar.
Têm estado tudo ao arbítrio do Ministro e nós parlamentares temos de passar
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aqui o tempo a discutir verbas de $50 e 1$.
O Ministro o que vem apenas demonstrar é que se vive numa situação intolerável.
O Orador: - A meu ver, a questão deve assim ser posta: há um contrato que custa 44:260 libras, estando metade já satisfeita. Por consequência, resta pagar ao Ministério do Comércio aquelas que se não sacaram dos 6:000 contos; e em segundo lugar, é dar satisfação ao contrato.
A minha proposta visa a dar cumprimento à lei n.° 1:784, sem prejudicar o Ministério do Comércio, e depois pagar da forma que estabeleceu o contrato, porque ninguém tem culpa nenhuma das modificações que a Inspecção da Aeronáutica foi fazer.
O Sr. Soares Branco (interrompendo): - Vou fazer uma observação a V. Exa. na melhor das intenções. Não é uma pregunta, porque em questões de carácter técnico podia V. Exa. entender não dever responder.
Votada a proposta de V. Exa. - e eu sou dos que daqui a momentos tencionam votá-la - o que eu pedia a V. Exa. era que tomasse o compromisso de que as verbas e duodécimos para aviação, respeitantes ao cumprimento do empréstimo externo, tivessem a devida aplicação (Apoiados) e não fossem desviados para outro fim.
O Orador: - Eu tomo na devida atenção o pedido de V. Exa.
O Sr. Manuel José da Silva: - O que é preciso evitar é que, com base na aquisição de cambiais, se consignem verbas no Orçamento que depois são aplicadas para outro fim.
O Orador: - Ainda com relação às observações apresentadas pelo Sr. Manuel José da Silva, a quem ouço sempre com agrado, devo dizer que nenhuma culpa tenho no que S. Exa. apontou.
O Sr. Manuel José da Silva: - Apoiado! V. Exa. não tem culpa nenhuma.
O Orador: - Quando se tratou da aviação, não se seguiram as normas que sempre se seguem; não se obedeceu a critério absolutamente algum.
Compraram-se aparelhos sem projecto, nem plano, nem termos nenhuns.
Apoiados.
O que é certo, porém, é que no fim de tantos projectos gastaram-se rios de dinheiro.
Está tudo a cair, não temos hangars e não temos uma unidade completa; têm-se comprado aeroplanos ao acaso...
O Sr. Pina de Morais- (interrompendo): - Em França, o Govêrno, numa encomenda de 100 aeroplanos, rejeitou 62; entre nós não se faz caso disso, aceita-se o material que nos querem impingir, hão se rejeita nenhum aeroplano.
O Orador: - Para que isto não continue a suceder é que por um decreto passou para uma comissão militar, que é presidida pelo quartel-mestre do exército, a aquisição de material, a fim de verificar o estado em que o material está.
De maneira que, daqui para o futuro, ninguém poderá fazer aquisições senão por intermédio das entidades que estão incumbidas disso.
O orador não reviu.
O Sr. Viriato Lobo: - Sr. Presidente: no parecer da comissão de guerra chama o Sr. relator a atenção para o que se tem feito sôbre cemitérios em países estrangeiros.
Todos os países estrangeiros que em França se bateram em prol dos princípios da liberdade e do direito, após a guerra, construíram cemitérios onde ficaram todos os mortos que se bateram. Portugal quis fazer o mesmo, desejou prestar essa homenagem sincera àqueles que na Flandres deixaram o seu sangue.
Contudo, êste assunto tem-se arrastado e ainda não está liquidado: êsses cemitérios ainda não têm essas lápides. Contudo, essas lápides já estão embaladas e não está paga a mão de obra e matéria prima.
Procura o Sr. Ministro da Guerra na proposta orçamental remediar êste estado de cousas, a que urge pôr termo.
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Uma voz: - As lápides já estão prontas, o que falta apenas é dinheiro para o transporte.
O Orador: - O que eu entendo é que é necessário liquidar êste caso com honra para todos.
O orador não reviu.
É aprovado o capítulo 6.° do orçamento, salvas as emendas.
O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: requeiro a V. Exa. o favor de consultar a Câmara sôbre se permite a discussão das despesas extraordinárias como um só capítulo.
É aprovado o requerimento.
O Sr. Manuel José da Silva: - Sr. Presidente: fez bem a Câmara em votar o meu requerimento, porque, na verdade, da sua votação resulta simplificar a discussão da despesa extraordinária.
Dentro das várias verbas que figuram na despesa extraordinárias há uma para a qual eu desejo chamar a atenção da Câmara. E aquela que diz respeito a dar o numerário suficiente para cobrir a anuidade necessária para fazer face aos encargos com a aquisição de material aeronáutico por conta do empréstimo de três milhões de libras.
Pela proposta orçamental, organizada decerto com todo o escrúpulo -não o quero pôr em dúvida - é pedida a verba de 4:000 contos. Segundo o parecer da comissão do Orçamento, essa verba reduzida a 3:000 contos será suficiente.
Ocorre preguntar: era exagerada a verba de 4:000 contos solicitada?
É deficiente a verba agora proposta?
Confesso que nem no parecer nem no decorrer da discussão eu vi formular qualquer raciocínio relativamente a essa minha dúvida.
Não compreendo que, tendo-se verificado desde Dezembro até agora uma estabilidade nas divisas cambiais, os encargos com essa anuidade possam ter uma tamanha amplitude de oscilação.
É a verba exagerada?
Que pudor mental é êsse dos senhores da contabilidade e do Govêrno que nos trazem ao Parlamento esta verba com uma margem de 1:000 contos?
E deficiente a verba proposta pela comissão?
Não sei, mas quási que estou convencido de que ela será suficiente para fazer face a êsse encargo.
Não se compreende que, tendo-se feito compras de material aeronáutico na importância de libras X, não se saiba, em qualquer ocasião, qual a> anuidade.
Êste facto pode deixar margem a supor, a leigos como eu, que as verbas que deviam ser consignadas a um fim justo podem ser destinadas a um fim menos justo.
Não tive, dentro do Regimento, ensejo de responder às considerações do Sr. Ministro da Guerra, considerações essas que eram as únicas que podia fazer uma pessoa que deparou com uma situação de facto dentro da qual não tem nenhuma responsabilidade.
No emtanto, quero agora, e a pretexto disto, chamar de novo a atenção do Sr. Ministro da Guerra com a mesma intenção que levou o ilustre Deputado Sr. Soares Branco a, num àparte, pô-lo de sobreaviso para os processos de administração da aviação militar, que está absolutamente à margem das leis da contabilidade, e os seus atropelos constantes, lesivos dos interêsses do Estado, são quási sempre sancionados primeiro, pela Inspecção de Aeronáutica; segundo, pelo Poder Executivo.
Estou convencido de que o Sr. Ministro da Guerra vai abrir um parêntesis neste estado de cousas.
Porque estamos chegados quási ao fim da discussão do orçamento do Ministério da Guerra, é da maior oportunidade chamar agora a atenção da Câmara para as consequências que resultam da maneira como tem sido discutido e votado êste orçamento.
Quando esta proposta orçamental veio ao Parlamento, e depois das palavras do Sr. Ministro das Finanças, toda a Câmara esperou, toda a imprensa propagandeou, e todo o País confiou, em que se ia aproveitar o ensejo da discussão do orçamento para de facto se fazer a imperativa redução de despesas.
Apoiados.
Toda a gente confiava em que o orçamento do Ministério da Guerra fôsse reduzido, senão naquele montante que seria
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para desejar, pelo menos no montante possível o que o Parlamento da República iria iniciar emfim uma era de economia e sã administração dos dinheiros públicos.
Há pouco votou-se o capítulo 2.°, que consigna a verba de 136:OUO e tantos contos só com melhorias de vencimentos, isto é, quási seis vezes quanto gasta em globo o orçamento do Ministério da Agricultura.
É o confronto dêstes números que precisamos pôr em destaque.
Apoiados.
Nós, país que precisa valorizar os seus recursos e que precisa desenvolver o seu fomento, temos um Ministério da Agricultura que gasta um sexto menos do que gasta o Ministério da Guerra só em melhorias de vencimentos.
Pois, Sr. Presidente, a despeito da confiança que todos nós tínhamos que se ia aproveitar o ensejo para de facto fazer-se uma redução do despesas, no conjunto de propostas que têm sido mandadas para a Mesa essas despesas foram aumentadas no montante aproximado de 6:593 contos!
Quero dizer, o Parlamento da República teria lucrado em não ter discutido o orçamento do Ministério da Guerra, quere dizer, a comissão do Orçamento, que com um trabalho extenuante, metódico, sério sob todos os pontas de vista tinha reduzido a despesa em 8:500 contos, vê o seu trabalho todo deitado por terra e absorvido por um aumento de 6:593 contos!
Êste número é que precisa de ser pôsto em destaque.
Eu, depois disto, não me atrevo a discutir nem o orçamento do Ministério da Instrução, nem do Ministério do Comércio, nem do Ministério da Justiça, nem do Ministério da Agricultura.
E porquê?
Porque eu, que procurei estudá-los conscienciosamente, verifico que todos êles estão pessimamente dotados, e nós não vamos encontrar dentro da Câmara em relação a êsses orçamentos o ambiente necessário para os modificar nos termos em que foi modificado o do Ministério da Guerra.
A nossa política parlamentar continua a não ser nenhuma. A Câmara dos Deputados depois de terminar a discussão do orçamento do Ministério da Guerra, e nos termos em que a fez só tinha realmente um único caminho a seguir, e a bem dos trabalhos parlamentares, era pegar em todas as propostas orçamentais que tenham sido estudadas peias comissões, e votar pura e simplesmente, sem mais perda de tempo, essas propostas.
Apoiados.
A administração pública não perdia nada com isso, e os trabalhos parlamentares lucravam enormemente.
Apoiados.
Lembremo-nos de que estamos quási no terminus da sessão legislativa normal, ordinária, que termina em 2 de Abril, e o conjunto de leis que o Parlamento tem de encarar é tamanho, que, se não adoptarmos medidas talvez um pouco violentas, um pouco novas, nada de útil faremos, e a descrença que é já grande, e a desconfiança no Parlamento que é tremenda, serão então muito maiores, e justificadamente.
Depois desta discussão do orçamento do Ministério da Guerra não tenho dúvida em votar os orçamentos em globo.
Dentro da despesa extraordinária figuram verbas para a construção de edifícios.
Fez bem o Sr. tenente-coronel Mascarenhas; mas, se êste critério fôsse a adoptar-se em relação a todos os orçamentos, eu proporia que, ao menos uma vez por mês, houvesse um Ministro por cada pasta e por cada distrito do País.
Esto ponto de vista pôsto por mim já não é novo; lembro-me que o pus uma vez que um Ministro do Trabalho que tinha cerzido um plano na sua aldeia, ao chegar a Lisboa e depois de tomar conta da sua pasta, a sua primeira ocupação foi levar para o Diário do Govêrno umas verbas de dotações para chafarizes e cemitérios da sua aldeia.
É claro, aproveitei o ensejo para alvitrar que êsse Ministro fôsse substituído por outro e até um por cada terra, porque talvez assim se chegasse a encontrar aquela justa acção do Govêrno para todo o País.
A acção do Sr. Ministro da Guerra no pedido de verba para a conclusão de edifícios no Pôrto fez-me relembrar êsse velho alvitre,
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A comissão do Orçamento, no emtanto, Sr. Presidente, fez alguns cortes que não sei se foram suficientes, se foram exagerados, mas seria de maior utilidade que, de facto, aqui se consignasse um princípio. Um país que atravessa a crise que o nosso atravessa não tem o direito de fazer figurar nos seus orçamentos verbas para construções novas, quando é certo que, para manter as que possui, nos próprios orçamentos não faz, consignar as verbas necessárias.
Sou, Sr. Presidente, pela redução de tudo quanto seja construção de edifícios e aquisição de terrenos.
A comissão do Orçamento, a meu ver muito bem, fez cortar do orçamento a verba destinada a "contratos em marcha".
O Sr. Pires Monteiro (interrompendo): - Trata-se de aquisições feitas, mas que se encontram dependentes da decisão dos tribunais.
O Orador: - Nesse caso só há uma cousa a fazer: é aguardaria decisão dos tribunais.
A mecânica seguida nestas operações de aquisições de terrenos não é a mais consentânea com os interêsses do País. Oxalá, Sr. Presidente, que os Governos, neste capítulo, se disponham a modificar o sistema seguido até aqui. São êstes os desejos de alguém que tem todo o empenho de ver moralizada a administração do Estado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Guerra (José Mascarenhas): - Sr. Presidente: ouvi com a maior atenção as considerações produzidas pelo ilustre Deputado Sr. Manuel José da Silva relativamente à inclusão, no orçamento do meu Ministério, da verba para despesas extraordinárias.
Sobro êste assunto devo dizer a S. Exa. e à Câmara que, quando de acordo com o Sr. Ministro das Finanças elaborei o referido orçamento, fazendo nele um corte de 18:000 contos, procedi com a intenção de que o mesmo aqui viesse já com as reduções máximas que se lho podiam fazer e não tivesse, por consequência, de sofrer as maiores emendas. O ideal seria até que, quando um orçamento aqui fôsse apresentado, nenhumas emendas tivessem de lhe ser introduzidas, sinal de que as verbas estavam bem calculadas.
A comissão do Orçamento entendeu, no emtanto, que havia de rever e cortar algumas das verbas dispostas.
E fez isso porquê? Porque estavam mal aplicadas aquelas que figuravam no orçamento?
Não: única e simplesmente por uma questão de diferenças de critério, diferenças de critério que algumas me atingem e outras não, porque não fiz mais do que inscrever no orçamento verbas que estavam nos orçamentos anteriores.
No orçamento anterior estava incluída esta verba destinada a pagamento de várias casas, expropriação e compras de terrenos. A comissão do Orçamento tem a opinião, com que concordo plenamente, do que não devem vir aqui consignadas verbas para esto fim senão quando as sentenças houverem sido proferidas pelos tribunais. Concordei com isso, repito, e foram eliminadas as verbas.
Apesar de todo, êsses cortes foram até a quantia de 8:000 contos.
Se se aprovam as propostas que estão na Mesa, evidentemente que os cortes da comissão do Orçamento são deminuídos; se não se aprovam, ficam de pó.
Não vejo motivo, como já foi dito, para só não discutirem os orçamentos dos outros Ministérios.
Suponha-se que êste orçamento está bem elaborado, e que a comissão do Orçamento não tinha nele nada que fazer.
Era condição para se não discutirem os dos outros Ministérios?
Não me parece.
O orçamento do Ministério da Guerra é colossal. Tem despesas que provêm do muitas causas. Algumas são derivadas da Grande Guerra.
Há o pagamento do melhorias ao pessoal, que não se pode dispensar.
Os quadros estão em muito excedidos, e um problema era êsse pessoal em demasia ter uma melhor aplicação noutros Ministérios.
Há uma outra verba que sobrecarrega, que é a dos inválidos e mutilados da guerra.
Outra verba é a que trata da instrução, porque o Ministério da Guerra tem
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vários estabelecimentos de ensino a seu cargo.
Vemos a educação física a cargo dêsse Ministério, e compreende-se porque essa instrução é uma das bases do serviço militar.
Em quási todos os países a aviação não sobrecarrega o orçamento do Ministério da Guerra, e, todavia, a despesa da nossa aviação sobrecarrega o orçamento do meu Ministério. Haverá realmente necessidade de reduzir as despesas do Ministério da Guerra, mas o que se inscreve no respectivo orçamento é absolutamente indispensável para manter o que está.
Uma das grandes despesas do Ministério da Guerra deriva da introdução dos milicianos no exército. Só para êles são 5:000 contos.
O Sr. Manuel José da Silva: - A lei que a êsse respeito foi votado pelo Parlamento, e em que eu intervim, não era nada daquilo que foi depois decretado em ditadura. O exército não ficou só com os elementos milicianos de valor; ficou com tudo, o trigo e o joio.
O Orador: - A verba de reparações de quartéis está muito reduzida, e, no emtanto, o quartel do Bom Pastor está sem telhado e em tais condições de higiene que fácil é ser atacado por qualquer epidemia.
Ha um outro, que é o Quartel General do Pôrto. Está instalado numa parte dum edifício acanhadíssimo, onde também se encontra o governo civil daquele distrito. Estabeleceu-se assim uma luta entre um o outro, cada qual precisando da parte do edifício que o outro ocupa.
A única forma de acabar com tal situação é arranjar uma pequena verba. Um àparte do Sr. Viriato Lobo.
O Orador: - Há no Pôrto um regimento de cavalaria que não tem picadeiro, facto que, na verdade, de modo nenhum se compreende.
Um àparte.
O Orador: - No resto do país os quartéis que existem encontram-se também em muito mau estado.
O meu desejo seria pô-los todos em perfeitas condições. Estou certo de que, seja qual fôr a organização do exército que saia da comissão de guerra, não se manterá a quantidade de unidades que hoje se encontram dispersas pelo País.
Apoiados.
Assim, é natural que se escolham os melhores edifícios para as unidades que ficarem existindo, procedendo-se às necessárias reparações com o produto da alienação das que não forem precisas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
São aprovadas as emendas da comissão aos capítulos 3.°, 5.°, 10.°, 12.°, 16.°, 18.°, 19.°, 20.°, 2l.°, 23.º, 24.°, 25.°, 26.°, 27.° e 28.° da despesa extraordinárias.
São aprovadas as propostas dos capítulos A, B, C e D da comissão.
As propostas aprovadas e apresentadas são as seguintes:
Capítulo 2.°:
Propomos que a verba global para melhorias de vencimentos ao pessoal militar e civil dependente do Ministério da Guerra, inscrita no capítulo 2.° da despesa extraordinária da proposta orçamental do Ministério da Guerra para 1926-1927, seja aumentado de 403.424$28, importância esta que, por lapso do Instituto dos Pupilos do Exército de Terra e Mar, foi descrita a menos nas melhorias do pessoal do mesmo Instituto, devendo fazer-se â respectiva rectificação no artigo 27.° do capítulo 1.°. - José Esteves da C. Mascarenhas - Armando Marques Guedes.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Capítulo 6.° - Art. 57:
Propomos que no artigo 57.° do capítulo 6.° da despesa, ordinária da proposta orçamental do Ministério da Guerra para o ano económico de 1926-1927 sejam inscritas as rubricas e verbas que seguem:
Para integral pagamento à firma Roxo Limitada, do fornecimento de material aeronáutico, nos termos do contrato de 19 de Janeiro de 1925, £ 22:130 -2:102$350.
Para reposição no Ministério do Comércio e Comunicações de £ 11:065, nos termos da lei n.° 1:784, de 16 de Junho de
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1925 - 1:051.175$. - José Esteves da C. Mascarenhas - Armando Marques Guedes.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Capítulo 2.° - Artigo 20.° (pág. 73): Não se tendo, por lapso, inscrito na proposta orçamental do Ministério da Guerra para 1926-1927 verba alguma para "Diversas desposas do campeonato do cavalo de guerra", como determina o artigo 36.° do regulamento do mesmo campeonato, publicado na Ordem do Exercito, 1.ª série, n.° 12, de 1925, tenho a honra de submeter à vossa aprovação a seguinte proposta:
Proponho que na dotação da Escola de Aplicação de Cavalaria, consignada no fim do artigo 27.° do capítulo 2.° da despesa ordinária da proposta orçamental do Ministério da Guerra para o ano económico de 1926-1927 seja inscrita a seguinte verba:
Diversas despesas do campeonato de cavalo de guerra, 300$.- O Ministro da guerra, José Esteves da Conceição Mascarenhas - O Ministro das Finanças, Armando Marques Guedes.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Artigo 30,° (pág. 76):
Farmácia Central do Exército (desinfectantes e vacinas) - reduzir a 50.000$.- Pela comissão, H. Pires Monteiro.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
Artigo 32.° (pág. 77):
Secretaria da Guerra - Impressão das Ordens do Exército, Almanaque, regulamentos, etc. - inscrever 125.000$.-Pela comissão, o Deputado, H. Pires Monteiro.
Aprovado.
Paro a comissão de redacção.
Artigo 32.° (pág. 77):
Secretaria da Guerra - Artigos de expediente para a Repartição de Contabilidade - Reduzir a 10.000$.- Pela comissão, o Deputado, H. Pires Monteiro.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
Artigo 33.° (pág. 77):
Estado Maior do Exército - Onde está: "Aquisição, conservação e reparação de aparelhos topográficos", acrescentar: "levantamento e rectificação de cartas". - Pela comissão, o Deputado, H. Pires Monteiro.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
Artigo 39.° (pág. 83):
[Ver tabela na imagem]
Pela comissão - o Deputado, H. Pires Monteiro.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
Capítulo 2.°:
Na melhoria do pessoal reformado e de reserva abater 403.424$28, o que reduz a verba a 33:770.408$68. - Pela comissão, o Deputado, H. Pires Monteiro.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
"B - Trabalhos de execução e instalação das Salas da Grande Guerra, no Museu de Artilharia", substituir por: "Trabalhos de execução e instalação das Salas da Grande Guerra e aquisição de obras de arte para o Museu de Artilharia", 150.000$. -Pela comissão, H. Pires Monteiro - Armando Marques Guedes.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
Capítulo novo:
Propomos para que na "Despesa extraordinária" do Ministério da Guerraw
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para 1926-1927 seja incluída a seguinte verba:
Para construção do monumento aos Mortos da Grande Guerra, em Lisboa, por uma só vez (parte que corresponde ao Ministério da Guerra, 50.000$). - José Esteves da Conceição Mascarenhas - Armando Marques Guedes.
Aprovada.
Para a comissão de redacção.
O Sr. Pires Monteiro (para um requerimento): - Sr. Presidente: requeiro a dispensa da leitura da última redacção para o orçamento que acaba de se votar.
É aprovado.
Entra em discussão o orçamento do Ministério da Justiça e dos Cultos - Parecer n.° 45 (d).
É o seguinte:
Parecer n.° 45-(d)
Senhores Deputados. - Tendo, nos últimos anos, o Poder Executivo cumprido com regularidade a disposição constitucional que o obriga à apresentação do Orçamento Geral do Estado até o dia 15 de Janeiro, o Poder Legislativo tem, no emtanto, salvo casos que podem considerar-se excepcionais, substituído a aprovação do Orçamento pela de duodécimos, regime sem dúvida superior ao consignado no artigo 7.° do Acto Adicional de 3 de Abril de 1896, que regulava a vida financeira da Monarquia, quando o Orçamento não estava aprovado ao iniciar-se o novo período financeiro, mas sempre inconveniente por não permitir um exame amplo e sério da vida financeira, do Estado.
Seria admissível, em circunstâncias excepcionais, se o Parlamento satisfizesse o compromisso que implicitamente toma de ter aprovada a lei de meios antes de terminar o período para o qual vota os duodécimos.
Acontece, porém, que a propostas de duodécimos se sucedem propostas de duodécimos, condenando, embora, todos os parlamentares tal abuso, sempre, e em termos tam enérgicos, por vezes, que a reincidência nesse êrro administrativo afecta, assim, gravemente o prestígio da instituição parlamentar, dando um exemplo de incapacidade para corrigir os defeitos que todos reconhecem.
Tam melindrosa atribuição parlamentar exige aturado estudo e larga discussão, como garantia para o País, do cuja administração teria por êste modo perfeito conhecimento, não se compadecendo com a rápida aprovação global de qualquer proposta de duodécimos, onde não são discriminados suficientemente os serviços, não podendo assim conhecer-se da sua necessidade e utilidade.
Têm, é certo, as comissões parlamentares quási sempre relatado as diversas propostas orçamentais em prazos que permitem a sua discussão; e agora, dados á tempo os diversos pareceres, justo é esperar que se entre em vida nova na administração financeira do país.
A opinião simplista do povo julga, ainda que erradamente, responsável a própria instituição parlamentar, o que convém evitar.
Senhores Deputados: A proposta orçamental para o ano económico de 1926-1927, na parte relativa ao orçamento das despesas do Ministério da Justiça e dos Cultos, submetida ao vosso exame, inclui, com a designação de despegas ordinárias e extraordinárias, de harmonia com as leis vigentes, as despesas com os serviços da
Direcção Geral da Justiça e dos Cultos;
Serviços do Registo Civil;
Serviços de Justiça;
Serviços prisionais;
Serviços jurisdicionais e tutelares de menores;
Serviços médico-legais, incluindo ainda despesas de anos económicos findos e com pessoal além do quadro.
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Consigna esta proposta de encargos do Ministério da Justiça e dos Cultos, em relação ao ano económico de 1920-1926, um aumento na despesa ordinária de 40.184$47, que, descontando o aumento de 40 contos, inscrito no capítulo 3.°, artigo 8.° (Serviços do Registo Civil) fica reduzido a 184$87. Tal desconto deve, de facto, efectuar-se porque a despesa não é autorizada, dada a compensação na respectiva receita (rendimento dos emolumentos do Registo Civil), porque esta é previamente cobrada.
Há na despesa extraordinária uma diferença para menos, em relação à proposta de encargos para o ano económico de 1920-1926, de 755.200$, que está devidamente justificada no desenvolvimento comparado das despesas dos dois anos económicos, e que, em resumo, vem publicado a p. 15 da proposta.
Tais são os resultados da comparação com a proposta de orçamento para 1925-1926, sendo no actual ano económico a:
Despesa ordinária de 3:372.617$67.
Despesa extraordinária de 21:296.800$.
Não julga esta comissão que o Orçamento, muito embora tenha a designação de lei de meios, deva ser considerado como uma lei, no seu sentido geral, mas sim como um acto de administração, resultante da aplicação das leis, relativas não só às receitas como às despesas públicas.
Com êste critério limitou-se a vossa comissão de Orçamento a analisar devidamente se as verbas inscritas para pagamento aos funcionários do Ministério da Justiça e dos Cultos em todos os serviços, que taxativamente estão designados na lei, isto é, dentro do respeito pelas situações jurídicas de natureza subjectiva, que o Parlamento em leis de meios tem de acatar, correspondem, de facto, ao seu verdadeiro quantitativo.
Em relação às verbas de material pronunciar-se há a vossa comissão por uma equitativa distribuição, que se harmonize com as necessidades do serviço e o seu progressivo desenvolvimento, dentro de um critério de rigorosa economia, único que se compadece com a situação do Tesouro.
Embora o eminente economista Anselmo de Andrade afirmasse no seu Portugal Económico que "de toda a parte se pedem melhoramentos, benefícios, subvenções, favores pessoais, etc.", para provar a tendência a evitar a redução de despesas, de novo se nota, no entanto, que a opinião pública iniludivelmente se manifesta por uma política de economias, com a visão nítida de defesa dos melhores interêsses do Estado.
Formulará a vossa comissão votos no sentido de serem devidamente instalados alguns importantes serviços dependentes do Ministério da Justiça, de incontestável utilidade pública, esperando da acção combinada dos Ministérios da Justiça e das Finanças os meios necessários à sua efectivação em propostas especiais a submeter à consideração do Poder Legislativo.
No orçamento do Ministério da Justiça e dos Cultos tem de se ocorrer ao custeio de importantes serviços que dizem respeito à manutenção da ordem social por meio dos tribunais.
A disciplina, para se manter, exige na sociedade actual, embebida de um espírito áspero de utilitarismo, quási sem ideal, uma forte acção educativa e uma equitativa administração de justiça.
Corresponde a organização dos serviços judiciais do Ministério da Justiça, na sua eficiência, ao que deles há a esperar?
No seu aspecto restrito, mas profundamente doloroso, assistimos, por vezes, à impunidade de crimes os mais graves.
Garantia séria da administração da justiça é obra que colocaria a República inteiramente ao serviço da Nação.
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Examinando em especial cada um dos capítulos e artigos da proposta orçamental do Ministério da Justiça e dos Cultos, os respectivos servidos sugerem-nos as seguintes considerações.
CAPÍTULOS 2.° E 3.°
Direcção Geral da Justiça e Cultos Serviços do Registo Civil
Estão devidamente orçados os serviços da Direcção Geral da Justiça e dos Cultos e do Registo Civil e respectiva inspecção, com a restrição posta já quanto à desposa que tem compensação no rendimento proveniente dos emolumentos do Registo Civil.
Pelo que diz respeito aos Cultos, a vossa comissão, reconhecendo que a situação actual do Estado para com a Igreja se apresenta de molde a garantir o prestígio e a autoridade do Poder Civil, dentro da fórmula da separação, afirma a sua convicção de que se é útil "à República a paz com a Igreja, na parto em que esta pode pela acção moral de respeito à lei" o ao princípio da autoridade fortalecer a disciplina social, também é útil à Igreja a paz com o Estado pelo livre exercício da sua acção espiritual.
CAPÍTULO 4.° Serviços de Justiça
Tendo o Exmo. Ministro da Justiça pretendido que fôsse inscrita nesta proposta uma verba para elaboração de um Código do Processo Criminal e reforma do Código do Processo Civil, o Exmo. Ministro das Finanças preferiu fazê-la inscrever na última proposta de duodécimos, que viria a ser apresentada à Câmara e por ela convertida em lei, reconhecendo assim em seu critério a necessidade e urgência da elaboração dêsses importantes diplomas.
A vossa comissão, achando tal iniciativa digna de aplauso, formula votos no sentido de se resolver esta justa aspiração.
A nossa legislação de processo criminal oferece o aspecto deplorável de um amontoado caótico de leis e decretos avulsos; é uma legislação feita de retalhos, sem sistema nem unidade. Urge pôr têrmo a semelhante situação.
O Processo Civil carece também de uma larga reforma.
Há cinquenta anos que o Código do Processo Civil foi promulgado; e neste período de tempo ocorreram tais e tantas transformações que nenhuma admiração deve causar que êsse Código não corresponda já às necessidades da época actual.
Com efeito, o Processo Civil Português está longe de oferecer as garantias de simplicidade, rapidez e flexibilidade que a vida moderna reclama.
As questões mais simples protelam-se nos tribunais anos e anos seguidos, tendo as cousas chegado a ponto de se considerar uma temeridade e uma loucura ou gesto daquele que se dirija ao tribunal para obter o reconhecimento de direitos, quando o valor da causa não atinge somas elevadas.
Há que olhar a sério para o problema da reforma do processo civil no sentido da simplificação e da celeridade. E todas as quantias que se gastem na consecução dêsse desideratum, longe de constituírem um desperdício, representam pelo contrário uma despesa da mais alta utilidade.
Convém também encarar com urgência em diploma especial um importante problema, o inquilinato, porque diz respeito à administração da justiça e ao próprio Orçamento do Estado, pelo maior rendimento que pode trazer.
Acoitando as restrições ao direito de propriedade impostas por um incontestável bem público ou ainda pelo desleixo ou incúria dos proprietários, não há, no emtanto,
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o direito de manter uma situação que possa ser considerada de espoliação, menosprezando simultaneamente os interêsses do Tesouro. A necessária uma proposta de lei de inquilinato que melhor acautele todos os direitos legítimos, tanto em relação à propriedade rústica, como urbana, considerada esta nos seus diversos aspectos.-
Paralelamente, com a reforma do processo, há necessidade de empreender a reforma da organização judicial, atrasada de mais de 30 anos nas suas linhas estruturais.
Dois problemas dominam na série de questões que a reorganização judiciária traz à tola da discussão: o problema da divisão judicial e o problema do recrutamento dos magistrados.
A nossa divisão judicial é defeituosa, achando uns que há excessos de comarcas e ainda uma distribuição pelos ti és distritos judiciais que poderia ser revista e modificada, tornando-se em consideração os verdadeiros interêsses da administração da justiça e pondo se de parto critérios estreitos de chauvinismo local.
Sôbre tal problema a vossa comissão limita-se a apresentá-lo no sentido de justificar a necessidade, já reconhecida pela Assemblea Nacional Constituinte, de uma nova organização judiciária, não se pronunciando sôbre qualquer solução, visto exigir ponderado estudo.
A Relação de Lisboa tem actualmente 16 juizes, além do presidente, a do Pôrto 15 e a de Coimbra 11.
As duas primeiras, na opinião de alguns magistrados, parecem estar sobrecarregadas de serviço.
Como remediar esta situação?
Reduzindo ainda mais o quadro da Relação de Coimbra?
De modo nenhum. Tal solução deixaria a Relação de Coimbra em circunstâncias de não poder funcionar num grande número de casos, no julgamento dos embargos a, acórdãos, quando houvesse divergências, e no julgamento de processos em que fôsse concedida a revista. Quere dizer a Relação de Coimbra ficaria em piores condições e as outras não melhorariam.
Têm-se alvitrado várias soluções, como descongestionar o serviço das Relações de Lisboa e Pôrto, sem sobrecarregar demasiado a Relação de Coimbra, chegando até a indicar-se as comarcas que deveriam passar para o distrito judicial de Coimbra.
E êste ainda um dos aspectos do problema da organização judiciária que a vossa comissão julga dever ser considerado e devidamente analisado na elaboração dos trabalhos para que na proposta de duodécimos foram autorizadas as necessárias verbas.
Relativamente ao recrutamento da magistratura, há que pensar a sério numa reforma que garanta a selecção de pessoas idóneas para o exercício da delicada função de julgar.
Tem-se julgado conveniente que os lugares de juizes de 1.ª instância sejam providos mediante concurso por provas púbicas, concurso aberto para vagas determinadas. Ao concurso seriam admitidos além dos delegados do Procurador da República, os advogados que tivessem o exercício da profissão durante um certo número de anos.
Possivelmente uma conveniente organização judiciária poderia permitir, sem aumento de despesa para o Estado, uma melhor remuneração da magistratura judicial, o que daria a esperança de que concorressem aos referidos lugares alguns jurisconsultos de valor.
Já que abordamos o problema da divisão judicial, pronunciando-nos pela manutenção dos três distritos judiciais convém dizer que as verbas do capítulo 4.°, artigo 12.°, relativas às Relações de Lisboa, Pôrto e Coimbra, devendo embora conservar
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a actual designação, deviam ter uma mais equitativa distribuição e, assim, a vossa comissão propõe que, sem aumento da despesa total, se consigne, em substituição, a que consta da proposta.
Para Lisboa:
[Ver tabela na imagem]
Para o Pôrto:
[Ver tabela na imagem]
Para Coimbra:
[Ver tabela na imagem]
Para renda da casa em que funciona a relação de Coimbra fica a quantia consignada na proposta orçamental - 900$00.
Não se aumenta, assim, a verba total mas justifica a vossa comissão de Orçamento a alteração proposta porque na relação de Coimbra, por exemplo, as verbas que tem sido consideradas obrigatórias (telefone, Diário do Govêrno, Boletim Oficial, Colecção Oficial de Acórdãos, limpeza) absorviam a totalidade da verba, não ficando qualquer quantia pára expediente.
No quadro da Secretaria da Relação de Coimbra foram extintos três lugares de terceiros oficiais pelos decretos n.ºs 6:544, 8:681, 7:863, com plena justificação os dois primeiros, mas a supressão do terceiro parece corresponder, de facto, a uma excessiva acumulação de serviço para os que ficam.
Imposta, no emtanto, a redução destas despesas, à vossa comissão foi sugerido, para ocorrer ainda à deficiência de pessoal menor dêste distrito judicial, que, por acordo entre a Procuradoria da República junto da Relação de Coimbra e a respectiva Presidência, se deveria aproveitar o correio da Presidência nas funções de contínuo da mesma Secretaria e o correio da Secretaria da Procuradoria ser aproveitado como correio das duas, conforme foi alvitrado à vossa comissão.
Instalação dos tribunais. - Tam evidente se apresenta a construção em Lisboa do Palácio da Justiça que a vossa comissão considera absolutamente inconveniente o actual estado de cousas por todos os motivos, entre os quais destaca o que importa ao respeito de que devem, ser cercados aqueles a quem cumpre administrar a justiça.
As salas de audiência do Tribunal da Boa Hora e as instalações doutros serviços judiciais não são melhores do que as de qualquer comarca sertaneja.
Do mesmo modo em relação aos restantes tribunais do país, porque, embora incumba às câmaras custear a respectiva despesa, nem sempre são solícitas em atender
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as reclamações dos juizes, convindo adoptar providências estabelecendo e definindo o processo coercivo a seguir quando as câmaras deixem de atender as reclamações dos juizes que forem reconhecidas como indispensáveis e urgentes.
Para um outro facto julga esta comissão do seu dever chamar a vossa atenção, e que corresponde a uma situação menos regular.
Trata-se da instalação da Procuradoria da República junto da Relação de Coimbra.
Quando foi instalado o tribunal não foi concedida verba para mobiliário da Procuradoria, que tem funcionado servindo-se de móveis emprestados alguns e outros provisoriamente cedidos por um falecido negociante.
Como êstes móveis não tivessem sido incluídos no respectivo inventário daquele comerciante, a Procuradoria, tomando êsse pretexto, tem-se recusado a entregá-los aos herdeiros!
Esta situação é vexatória e deprimente, como tem sido acentuado superiormente pela própria Procuradoria.
Outro problema de resolução necessária é o que diz respeito às casas para os juizes e magistrados do Ministério Público.
Poderiam ser adquiridas casas apropriadas para os juizes e magistrados do Ministério Público, considerando uns que esta atribuição deveria pertencer às câmaras, dentro das suas receitas ou mediante empréstimo com garantia de juro e amortização em renda a descontar nos próprios vencimentos dos magistrados, outros entendendo que ao Estado cumpre também dar execução a esta justa aspiração.
Julga esta comissão que existindo nas comissões um projecto a êste respeito, da autoria do distinto Deputado Sr. Moura Pinto, deve merecer a atenção da Câmara.
Serviços judiciais de Braga e Coimbra. - O juízo cível e comercial de cada uma das referidas comarcas, segundo informações que foram dadas a esta comissão, tem excesso de serviço que não lhe permite satisfazer regular e convenientemente ao seu movimento judicial.
Poderia criar-se uma outra vara cível para obviar a êsse inconveniente; não cabe, porém, propô-lo à vossa comissão, visto trazer aumento de despesa, entendendo, no emtanto, que o assunto merece imediato estudo, devendo as entidades competentes promover que se evite um tal estado de cousas, salvaguardando os interêsses do Estado e da Justiça.
CAPÍTULO V
Serviços prisionais
A maioria as nossas cadeias, tais como existem, não são remédio, mas um factor da criminalidade.
A sua falta de condições higiénicas, a promiscuidade dos preços, a sua ociosidade, são causas de desmoralização profunda e, por vezes, irremediável.
Seria necessário criar prisões com isolamento para os detidos preventivamente e ainda para aqueles que devessem sofrer penas curtas.
Além disso tornam-se necessárias colónias agrícolas ou industriais, em número suficiente, para reincidentes, vadios, bem como estabelecimentos especiais para alcoólicos e criminosos loucos.
A conveniente organização dêstes serviços julga a a vossa comissão digna de estudo e apreciação do Poder Legislativo em diploma especial.
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CAPÍTULO VI
Serviços jurisdicionais e tutelares de menores
Não há país algum, que seriamente se preocupe com o problema capital da criminalidade dos menores, que não tenha modificado profundamente as velhas normas que no direito penal as regiam e as velhas instituições que as punham em prática.
Ao antigo direito que distinguia menores responsáveis e irresponsáveis, e aos primeiros aplicava penas substituiu-se um novo direito que para todos é preventivo, tutelar, educativo.
Ficou se, de facto, em face dum dos aspectos do problema da educação.
Aos tribunais que os julgavam solenes, intimidantes, repressivos, substituíram-se os novos tribunais - se tribunais se podem chamar - que procuram sobretudo conhecer o menor, ampará-lo, protegê-lo, salvá-lo, por medidas adaptadas à sua individualidade, ao seu estado de abandono, de corrupção moral ou de tendência para o crime.
Para isto têm êstes tribunais de ser auxiliados por um conjunto de funcionários e estabelecimentos, que lhes permitam realizar plenamente os seus fins; observar o menor para o conhecer, conhecê-lo para lhe aplicar a medida educativa que exige, e vigiá-lo ou proceder à sua reeducação para o tornar um elemento moralmente são e socialmente útil.
É certo que um quadro completo de empregados e estabelecimentos, que êste serviço exige, é difícil de organizar e dispendioso na sua montagem e sustentação.
Mas vale bem a pena êsse esfôrço e essa despesa.
Menores em perigo moral ou criminosos que se salvam são futuros criminosos que se evitam, que à sociedade produziriam danos irreparáveis e ao Estado causariam despesas maiores.
Todos os países - e são a maior parte dos da Europa e da América - que têm ensaiado os tribunais da infância e o novo regime de tratamento penal dos menores, não têm tido senão que louvar-se dos esfôrços feitos para essa transformação.
Criados nos Estados Unidos em 1899, no estado de Illinois, êstes tribunais ràpidamente se espalharam por toda a Confederação, existindo hoje em todos os seus Estados.
Da América passaram para a Europa. O primeiro é o de Birmingham em 1905, e é tal o seu êxito que, logo em 1908, se generalizam os tribunais a toda a Inglaterra.
Depois dêste país quási todos os outros os adoptam, alguns antes de nós, como a Hungria em 1908, a Alemanha no mesmo ano, a Rússia em 1910; muitos depois de nós: a França e a Bélgica em 1912, o cantão de Genebra em 1913, o Neuchatel em 1917, a Espanha em 1918, o cantão de Zúrich em 1919 e, recentemente, o Brasil em 1923.
Os resultados são em toda a parte seguros, a quantidade dos seus crimes, em geral, decresce.
Entre nós, depois do decreto de 27 de Maio de 1911, fez-se o ensaio do novo direito e dos novos tribunais infantis, as "Tutorias da Infância".
É indubitável que se realizou um grande progresso no tratamento dos menores - muitos deles se subtraíram ao abandono ou corrupção em que se viciavam, muitos deixaram de passar pelas prisões que os corrompiam.
Se a êsse notável diploma do Govêrno Provisório muito deve a nossa infância, muito há ainda a esperar do recente decreto n.° 10:767, de 15 de Maio de 1925, que generaliza a todo o país o novo direito e as novas instituições jurisdicionais e tutelares de menores, criando as tutorias comarcas.
Há ainda lacunas a preencher e defeitos a remediar.
Para se conhecerem os menores é necessário observá-los e para observar, sobretudo certos menores difíceis de estudar, são necessários estabelecimentos especiais de observação, como existem nos países em que êstes serviços se encontram mais bem orga-
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nizados: nos Estados Unidos (clínicas junto dos tribunais); na Bélgica estabelecimentos de observação de Moll e Namur); na Suíça (estabelecimentos de observação em Stefanoburg) e ainda na Inglaterra e Alemanha.
Nós não possuímos um único estabelecimento de observação devidamente apetrechado!
Não podem satisfazer êsse fim os Refúgios existentes, que são e devem ser simples estabelecimentos de detenção, guarda e observação, que não exige cuidados especiais.
Seria necessário, desde já, pelo menos, um estabelecimento de observação.
Não temos Refúgios bastantes sobretudo para o sexo feminino. Funciona o de Lisboa e em breve o do Pôrto, mas não começou ainda a construção do de Coimbra e não há verba para êle. Com a construção dêste Refúgio, por um lado satisfaríamos uma exigência imprescindível da sua Tutoria Central, e por outro poderia ensaiar-se nele a montagem de um serviço completo de observação com as suas secções independentes, a sua escola sondagem, as suas oficinas experiência, o seu laboratório de psico-fisiologia. Um dos membros do tribunal, professor distinto de fisiologia, teria toda a competência para o dirigir. Foi avaliada em 300 contos a verba para construir o primeiro pavilhão, entendendo a vossa comissão que, exposto o estado do problema, se lhe deverá dar pronto remédio logo que as condições do Tesouro o permitam, tendo-se, assim, na devida conta o interêsse que êste problema merece e as vantagens incontestáveis que da sua resolução advêm.
São necessários ainda:
a) Estabelecimentos para anormais;
b) Estabelecimentos de tipo familiar qae são os que melhor provam no tratamento de menores e que na Suíça dão admiráveis resultados (Bachtien, Sonnenberg, Bulach).
Seria da maior utilidade que a título de ensaio se instalasse um estabelecimento dêste género entre nós - uma casa para 20 a 25 alunos, modesta como qualquer instalação de aldeia, em que se vivesse uma vida íntima de família, com bons exemplos de moralidade, trabalho sadio, um home acolhedor. Valeria mais do que grandes e aparatosos internatos onde a acção distante dos guardas e educadores é quási nula para o melhoramento moral do menor.
Já em 1861, no projecto do Código Penal, se preconizava o sistema suíço de pequenos internatos, como sendo o melhor, o mesmo sucedendo no decreto que criou a Escola Agrícola de Vila Fernando.
Os reformatórios e colónias correccionais foram, porém, criados noutros moldes, são grandes estabelecimentos, como casernas, que podem disciplinar exteriormente mas não transformam nem a mentalidade nem a moralidade do menor.
É necessário ensaiar o sistema do projecto de 1861.
Na proposta orçamental figuram dois refúgios para o sexo masculino de Lisboa e Pôrto e um em via de construção em Coimbra, um para o sexo feminino em Lisboa, outro no Pôrto prestes a funcionar.
Figuram na proposta os reformatórios de Caxias, Vila do Conde, S. Fiel e um em Lisboa para o sexo masculino.
Está criado também o reformatório da Guarda.
Como colónias correccionais, Vila Fernando e Izeda.
Tais são os votos que a vossa comissão de Orçamento formula: os de que se dê imediata execução a um mais vasto plano de protecção a menores, certa de que cumpre assim o seu dever, na discussão dêste importante aspecto de problema educativo.
CAPÍTULO VII
Serviços médico-legais
Os importantes serviços médico-forenses tiveram nos últimos tempos um notável desenvolvimento, mercê da competência comprovada dos distintos professores, que
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foram colocados à frente dos serviços dos três Institutos de Medicina Legal, e da acertada organização de serviços que lhes foi atribuída.
Na secção técnica dos referidos institutos realizam-se exames e estudos visando a instrução, o ensino e a investigação scientífica; tanto pelo que diz respeito aos trabalhos de química forense, antropologia criminal, antropometria, dactiloscopia, etc.
Na sua secção burocrática destinam-se a assegurar os serviços dos Conselhos Médico-Legais, dos Cursos Superiores de Medicina Legal e tantos outros de manifesta utilidade que se torna desnecessário enumerar. Escusado será dizer que são absolutamente dispendiosos êstes serviços e que, não obstante assim suceder, as verbas que lhes são destinadas são, nalguns casos, inferiores às necessidades do serviço; assim a vossa comissão propõe que no capítulo 7.°, artigo 25.°
Instituto de Medicina Legal do Pôrto:
Material e diversas despesas .... 15.000$
Instituto de Medicina Legal de Coimbra:
Material e diversas despesas .... 15.000$
Para ocorrer a êste aumento de despesa propõe a vossa comissão do Orçamento que seja deminuida a verba do capítulo 3.° (Despesa extraordinária) na quantia respectiva - 12 contos - ficando assim mantida a despesa total.
CAPÍTULO 8.º
Anos económicos findos
A vossa comissão não propõe qualquer alteração, porque, de harmonia com e critério estabelecido, estas verbas correspondem a situações autorizadas por lei, de vendo, por isso, ser inscritas.
CAPÍTULO 9.º
Despesa extraordinária
Propõe a deminuição de 12 contos no capítulo 3.°, que ficará assim: Para satisfação das ajudas de custo de expediente a escrivães e oficiais do diligência, nos termos do artigo 2.° da lei n.° 1:231, de 27 de Setembro de 1921 .... 34.800$
Sala das sessões da comissão de Orçamento, Março de 1926. - António de Paiva Gomes - João Luís Ricardo - F. G. Velhinho Correia - Filomon de Almeida - Artur Saraiva de Castilho - Amando de Alpoim (com restrições) - Armando Pereira de Castro Agatão Lança - lavares Ferreira - A. Ginestal Machado - Henrique Pires Monteiro - João da Cruz Filipe - Alberto Álvaro Dias Pereira, relator.
O Sr. Presidente: - Está em discussão o capítulo 2.°
O Sr. Henrique Cabral: - Sr. Presidente: todos os orçamentos têm que discutir. O orçamento do Ministério da Justiça não é aquele, porém, em que, por maior boa vontade que haja, se possa fazer uma larga discussão pelo que diga respeito a movimento de receitas e de despesas.
Não desejaria, portanto, tomar tempo à Câmara, se não tivesse perante mim um parecer da comissão que, na minha qualidade de bacharel formado em direito, como toda a gente, na frase do poeta, sou obrigado a apreciar, e se não tivesse na pasta da Justiça um Ministro que pelos seus dotes de inteligência, largos conhecimentos e pelo empenho que põe em todas as cousas que correm pelo seu Ministério se tem afirmado como um valor autêntico, podendo servir de modelo e ensinamento a todos os novos, em cujo número me considero.
O parecer - e nas minhas palavras não vai o menor desejo de louvaminhar o seu
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ilustre relator - é um documento que ou, na minha qualidade de homem que procurou e procura fazer uma educação jurídica, certamente não poderia elaborar com o cuidado, com a competência, com a observação o análise detalhada como êle está feito. É subscrito pôr um colega que não é formado em direito, mas que bem afirma nele superiores qualidades que o impõem como homem de trabalho e de estudo e, sobretudo, como intelectual. Nele se faz uma análise circunstanciada e detalhada de todo o orçamento do Ministério da Justiça e dos Cultos, mas, considerando-se o orçamento, como muito bem afirma, um acto de pura administração e não sendo, portanto, possível modificar serviços que vão assim agravar despesas, limita-se a ficar em vagas aspirações, às quais me associo, julgando que ainda há quem se preocupe com os assuntos, alguns muito importantes, que correm pela pasta da Justiça.
Seguindo pari passu o que no parecer se diz, parece-me, Sr. Presidente, que a parte relativa à Direcção Geral da Justiça e dos Cultos, serviços de registo civil, merece algumas considerações, considerações ligeiras, porque por ocasião da discussão do orçamento do Ministério do Interior já aprendi que, por melhor boa vontade que haja em fazer reduções de despesa de modo a se alcançar êsse tam preconizado equilíbrio orçamental, há normas rígidas de contabilidade e preceitos estabelecidos que se torna impossível deixar de respeitar e guardar, e que não dão margem a que os nossos desejos e aspirações se convertam em realidade.
Os serviços do registo civil, organizados pela República como necessidade social e política que se impunha não correspondem neste momento àquilo a que era preciso que correspondessem dentro de um regime de liberdade e de democracia, sobretudo tratando-se de serviços desta natureza, em que a República tinha de afirmar os seus princípios, contrapondo-os aos de um serviço que vinha de longe e com uma orientação muito diversa da actual.
E assim, Sr. Presidente, sem entrar em detalhes, eu devo dizer a V. Exa. e à Câmara que os serviços do registo civil necessitam de ser reformados, muito principalmente na parte que diz respeito a emolumentos, de forma a que não sejam tam elevados para o povo, como o são, para o que é preciso reformar as tabelas existentes, tornando-as mais acessíveis.
Quanto à sua instalação, Sr. Presidente, eu direi que é tudo quanto há de mais impróprio de um País civilizado, impróprio de uma República.
Eu conheço, Sr. Presidente, uma grande parte das repartições do registo civil e assim posso garantir a V. Exa. que elas são na verdade impróprias de um País civilizado, impróprias do regime que as criou.
Na verdade, Sr. Presidente, as repartições do registo civil estão montadas por forma em que não há uma dependência própria onde se realize o acto de maior importância para a vida do homem, que é o casamento, o que na verdade se não compreende.
Não posso, Sr. Presidente, como republicano que sou, deixar de ver isto com profundo desgosto, pois, a verdade é que não se defende somente a República com armas na mão, defende-se também, como eu pretendo defendê-la, desejando que ela tenha uma administração séria e honesta.
Na verdade, Sr Presidente, as repartições do registo civil não podem, nem devem continuar como estão, pois, a verdade é que elas se encontram num estado que enche de vergonha todos aqueles que têm de lá entrar.
Não posso, pois, deixar de chamar a atenção do Sr. Ministro da Justiça para êste assunto assim como para a inspecção que elas têm, pois, na verdade se bem que o funcionário encarregado dêsse serviço seja muito inteligente, e cumpridor dos seus deveres, não chega, nem pode chegar para poder inspeccionar convenientemente todas as repartições do registo civil do País.
Quanto ao Poder Judicial, Sr. Presidente, muito a Câmara, a meu ver, se deve ocupar dele, desde a organização do Poder Judicial até o seu recrutamento e desde o seu recrutamento até a forma de pagar.
Recordando os tempos da propaganda em que a minha fé e a minha crença não tinham limites e que se ainda hoje existem com bastante ardor, as sinto, todavia, um pouco abaladas pela forma como tem decorrido a vida da República e pela manei-
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rã como na prática se têm desmentido as doutrinas então apregoadas, recordando, dizia eu, os tempos da propaganda, parece-me estar ainda ouvindo dizer que uma das cousas que se impunham era a reforma judiciária. Impunha-se como uma necessidade absoluta, a reorganização do Poder Judicial, pois que a civilização de um país afere-se pelo seu poder da justiça. Desde que não haja dentro de uma civilização um Poder Judicial que corresponda a todas as necessidades sociais, não existirão a liberdade humana, nem o direito de propriedade, nem tudo quanto tenha de ser assegurado por aquele Poder.
Sr. Presidente: impõe-se uma reforma da organização judicial.
O actual Sr. Ministro da Justiça é bem competente para meter ombros a essa obra. Eu sei que é um trabalho complexo, mas exactamente para a realização de semelhantes trabalhos é que devem servir os estadistas. Nos assuntos complexos é que se afirmam os homens de Estados Assuntos de mero expediente, despachos de delegados ou de juizes, e transferências, estão bem para serem tratados por qualquer funcionário das repartições por onde tais serviços corram.
Para os homens de Estado são as grandes reformas.
São precisas reformas: a reforma judiciária, a reforma do Código do Processo Civil.
Também se impõe a codificação de toda a legislação criminal.
Emfim, é preciso fazer-se toda esta obra em conjunto.
Para ela eu confio no actual Sr. Ministro da Justiça, que nos tem dado sobejas provas de competência e de grande boa vontade em ser útil ao seu País.
Apoiados.
É necessário que os novos e um grupo deles se encontra nesta Câmara - eu conheço-os bem - se reunam em volta de S. Exa. o Sr. Ministro da Justiça, para lhe dar, com todo o vigor dos seus anos e da sua inteligência, o auxílio de que S. Exa. porventura careca para que mais fàcilmente se consiga a realização de tam grande e patriótica obra.
É preciso que não fiquemos em vagas aspirações.
Como S. Exa. o Sr. Ministro da Justiça me está dando a honra de ouvir estas minhas desataviadas considerações, eu declaro desde já que, segundo me parece, talvez se pudesse estabelecer, como critério a seguir na reforma judiciária, a redução do número de comarcas.
É minha opinião, que existem comarcas a mais.
O número de comarcas é grande, e é grande, porque verifico que na maior parte delas o número de questões não justifica a existência dessas comarcas.
Era preciso reduzi-las, agrupando os povos conforme a sua aproximação e conforme até as suas tendências.
Depois aos magistrados deve pagar-se bem.
Uni magistrado não pode administrar justiça com aquele saber e independência que é preciso manter no momento em que as solicitações e as necessidades são de toda a ordem.
Um serviço perfeito exige uma remuneração condigna.
Eu conheço magistrados a quem pela sua situação de família, pela situação que são obrigados a manter, é necessária uma grande honestidade, um grande desejo de serem honrados e honestos para se manterem numa perfeita linha de conduta.
Quem quere bons magistrados, paga-lhes bem.
Exija-se bom serviço, criem-se inspecções permanentes, mas inspecções que não sejam a fingir, obrigando-os a cumprir o seu dever e a estarem no seu lugar, porque eu conheço muitos juizes que cumprem o seu dever, mas não o fazem cumprir àqueles que estão sob as suas ordens.
E sabe V. Exa. porquê?
Não é porque o seu temperamento não lhe indique o cumprimento dêsse dever, mas porque precisamente o ambiente é tam apertado, que mal se podem abster de todas as influências que os rodeiam.
Por isso, colocando-os numa situação de independência, teremos realizado um grande trabalho para atingir aquilo que em Portugal é necessário, principalmente neste momento em que a onda da desordem é enorme.
Sei que o Sr. Ministro da Justiça concorda com êste meu ponto de vista; nos pequenos momentos de prazer espiritual que tenho tido com S. Exa. em conversas sôbre assuntos que dizem respeito à sua pasta, tenho verificado que S. Exa. está
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perfeitamente conhecedor dêsses assuntos para poder lazer uma grande obra, e digo mais, se não fôsse êsse estado de consciência não estaria a perder o meu tempo e a minha gramática, que bem má é, a discutir êstes assuntos.
Quanto ao Código do Processo Civil, S. Exa. conhece bem os defeitos de que êle enferma.
É preciso, dentro do Código do Processo Civil, fazer uma grande reforma, fugir um pouco da feição escrita para a feição oral, acautelar os interêsses do autor e do réu.
O mesmo se pode dizer quanto ao processo criminal.
Eu recordo-me que em treze anos em que me formei - e formei na Escola de Medicina de Lisboa, sendo bacharel em direito pela Universidade de Coimbra - se fez pela primeira vez um curso semestral do processo criminal.
Até ali, creio que nunca se fez êsse curso.
Pois ainda agora me lembro das dificuldades em que me vi para estudar em seis meses o processo criminal, não pela 'sua complexidade, talvez, mas pelo emaranhado de leis que tinha de compilar, para satisfazer ao professor dêsse curso.
E ainda hoje mesmo me vejo em sérias dificuldades, quando tenho de tratar de um processo crime, e trabalho há catorze anos neste métier, para estar completamente senhor de tudo quanto diga respeito à matéria criminal.
Parece-me, portanto, que seria muito vantajoso codificar toda essa legislação dispersa, procurando até introduzir-lhe algumas modificações.
Apoiados.
Dentro do assunto ficaria bem uma reforma do júri: uma instituição democrática, criada há muitos anos, mas que representa mais uma aspiração do que propriamente um organismo bem colocado no seu lugar, com um funcionamento perfeito e correspondendo às necessidades do momento.
Era preciso, talvez, reformá-lo, não direi quanto ao número, mas quanto à forma do seu recrutamento.
Apoiados.
Realmente, V. Exas. têm verificado que a falta de olharmos, constante e energicamente para o assunto, tem dado margem a que os tribunais se tenham visto por vezes impossibilitados de ditar a sua justiça, pois que já muita gente tem tido medo de ser jurado.
É preciso, por conseguinte, fazer um recrutamento cauteloso e rodear o júri de todas as garantias, de forma a bem poder desempenhar a sua missão.
Apoiados.
Sôbre matéria de inquilinato, diz a comissão o seguinte:
Leu.
Isto é já uma scie. Fala-se em Portugal sôbre matéria de inquilinato e toda a gente se declara habilitada a tratar do assunto, ou porque tenha uma casa para arrendar ou porque precise de alugar uma casa. Ora, problema da complexidade que é êste, reputo-me dentro desta Câmara incompetente para o resolver. Faço parte da comissão de legislação civil e criminal, mas entendo que se o Parlamento está à espera que a comissão apresente quaisquer trabalhos nesse sentido - e eu sou um dos mais humildes dos seus membros (não apoiados)- pode estar muito tempo à espera disso. Entretanto, entendo que alguma cousa é preciso fazer sôbre inquilinato.
O Sr. Ministro da Justiça, por exemplo, que já tem alguma obra a êsse respeito, poderia fazê-lo, o que, aliás, é difícil, repito, porque o inquilinato é uma obra em evolução constante; a função contratual tem modificações constantes; o que se dá em Lisboa não se dá no Pôrto, o que se dá nesta cidade não se dá nas províncias, etc.
Apoiados.
Eu não estou a dar sugestões, mas a fazer um enunciado de questões, com o desejo de me associar ao que está escrito no parecer, que é bem feito, e não com o desejo de dar novidades.
Mas parece-me que, dentro dêsse problema, alguma cousa se poderia aproveitar. E a comissão de legislação civil e comercial bastante tem trabalhado, especialmente um dos seus membros, cujo nome aqui não cito, para não ferir a sua modéstia.
O problema do inquilinato está constantemente a apresentar aspectos novos, e todos os dias chegam àquela comissão reclamações.
Era, portanto, bom que se ouvissem os
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homens que mais têm tratado de questões do inquilinato, e que se resolvesse alguma cousa, porque há muito que fazer.
Se, dentro da minha humildade, V. Exa., Sr. Ministro, entender que eu lhe posso ser útil, para colaborar no sentido de que êste Parlamento alguma cousa resolva sôbre o assunto, seria isso para mim muito consolador e como que a compensação do meu esfôrço.
A comissão tocou também o ponto do recrutamento administrativo.
Ainda é na nossa magistratura que melhores e mais justificados valores existem, Pão só pela sua competência, como também por uma vida inteira de trabalho e de dedicação.
Mas V. Exas. sabem que não há regra sem excepção. Se nos aparecem bons magistrados ainda é, por assim dizer, por uma grande parcela de tradição, e não porque a forma de recrutamento seja perfeita. Não digo isto por qualquer parti-pris, mas sim apenas com o desejo de conseguir que o mal se remedeie.
E direi a V. Exas. que, neste ponto, estou inteiramente de acordo com o ilustre relator dêste parecer.
Que não venham para a magistratura os homens que faliram na advocacia, mas sim todos aqueles que, pelo seu trabalho escrito, ou de qualquer natureza, possam dar a garantia de que, no futuro, serão uns magistrados competentes.
Mas, para que isto se dê, é necessário que êles tenham aquela independência moral e material de que tanto necessita um órgão cujas funções são tam delicadas.
É necessário que o Poder Judicial corresponda com inteira eficácia àquilo para que foi criado!
Apoiados.
Sr. Presidente: há um outro assunto que eu desejo nesta hora frisar: é a instalação dos tribunais na capital.
O Poder Judicial - e logo de começo podemos citar a capital- está, em quási toda a parte, instalado em condições vergonhosas. Nunca fui capaz de compreender a razão por que êsse facto se dá.
Porque sejamos um País de fracas receitas públicas?
De administração precária, não olhando a sério, como devíamos, para as questões vitais que tanto nos interessam?
Não sei!
Não me preocupa agora o buscar a origem dêsse fenómeno; constato simplesmente que isso se dá.
Não se encontra ainda em Lisboa construído o Palácio da Justiça, como existe em todos os países do mundo. A Boa-Hora só fui uma vez e saí de lá horrorizado. Na minha humilde comarca, com os cuidados que nós, pequeninos, consagramos à nossa terra, temos um tribunal mais confortável, mais asseadinho, onde se pode afirmar que a justiça dos homens não é uma quimera e onde não há que ter o cuidado - como sucede na Boa-Hora - de tapar o nariz à entrada.
Risos.
Criámos êsse tribunal, dando-lhe todas as condições de vitalidade e eficácia de que êle carecia.
Tenho verificado, estudando a psicologia do nosso povo, que êle é, na sua essência simples. Se à frente de um tribunal êle vir nm magistrado austero, se verificar que há, a dentro dêsse tribunal, uma ordem grande, encontrando-se tudo e todos nos seus lugares apropriados, êle sairá dali com uma boa impressão e com um respeito absoluto pela justiça. Mas se, pelo contrário, o nosso povo vir que o advogado está sentado no lugar onde costuma estar o juiz, que o oficial de diligências saiu a tratar da sua vida particular, e cousas semelhantes, êle, no seu critério simplista, julgará, desde logo, que a Justiça é uma brincadeira e não lhe atribuirá, de modo algum, a importância que ela tem no seio de todos os povos civilizados. Não há cousa alguma dentro de uma comarca que estabeleça mais o respeito do que o Poder Judicial devidamente prestigiado.
Apoiados.
Sr. Presidente: eu queria fazer estas breves considerações, terminando por afirmar que, encontrando se à fronte da pasta da Justiça tke right man muito teremos a esperar, na verdade.
Estou convencido de que S. Exa., a continuar nas cadeiras do Poder - e oxalá isso se dê por muito tempo - poderá realizar uma grande obra. Se eu. um novo que venho a esta Câmara animado da melhor boa vontade puder servir ao Sr. Ministro da Justiça para alguma cousa, S. Exa. que disponha de mim, porque a
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única recompensa a que aspiro é a de poder dizer a mim próprio que, com a minha acção, alguma cousa de bom consegui que se fizesse.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador não reviu.
O Sr. Alberto Dinis da Fonseca: - Sr. Presidente: eu não tencionava usar da palavra sôbre êste assunto, o unicamente o faço por virtude das considerações produzidas pelo meu ilustre amigo e colega nesta Câmara, Sr. Henrique Cabral.
Começou S. Exa. por se referir à maneira deficiente como se encontram organizados os serviços do registo civil.
Eu sou daqueles que entendem que não haveria grande necessidade de organizar êstes serviços pela forma como foram, porque já antes êles existiam e podiam continuar como estavam.
Eu lembro, todavia, uma fórmula de se chegar a um acordo, para bem de todos.
A maior parte das pessoas que só utilizam do Registo Civil utilizam-se também do registo religioso.
O casamento, que é sem dúvida um dos actos mais graves da vida de um indivíduo, poderia efectuar-se como se faz em muitos países do estrangeiro, em que a pessoa o celebra conformo a sua religião, comunicando-o ao oficial do registo civil, que o lança por cópia nos livros respectivos.
Desta forma seriam satisfeitos os preceitos religiosos de cada um, protestante, budista, israelita ou católico que fôsse, satisfazendo-se ao mesmo tempo os preceitos do registo civil.
Trocam-se vários àpartes dos Srs. Alfredo Guisado, Henrique Cabral e Pedro Pita.
O Orador: - A forma melhor de conciliar os serviços seria essa.
Uma voz: - Não é êsse o artigo que está em discussão.
O Orador: - Ouço dizer que não é êste o artigo em discussão, e como não gosto de exorbitar dos direitos que me são concedidos, reservar-me hei para, quando se discutir o artigo 3.°, falar sôbre êle, e sôbre as observações que acabam de me ser feitas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): - Sr. Presidente: das considerações dos ilustres oradores que me antecederam no uso da palavra eu depreendo que S. Exas. estão animados dos melhores desejos de concorrerem, tanto quanto possível, para que as instituições do seu País e principalmente esta instituição da, justiça se eleve a uma altura tal que prestigie o País e prestigie a República.
Efectivamente, ocupando êste lugar, eu tenho por mais de uma vez assistido às demonstrações dadas pelo Sr. Henrique Cabral, pelo Sr. Faísca e por outros tantos elementos, que me lançam a convicção profunda de que, com o seu auxílio, quem aqui possa demorar-se algum tempo, quem tenha fôrça de vontade e desejo do ser útil ao País, pode realmente fazer uma obra que engrandeça a República.
Na pasta da Justiça há tanto que fazer, tanto que reformar, que eu bem posso dizer, som menosprezo para as instituições nem para os meus antecessores, que está tudo por fazer.
Falo na organização judiciária. Efectivamente a nossa Constituição, no artigo 85.°, promete a reforma ou a organização judiciária.
Até hoje, essa organização não está feita.
Desde Martens Ferrão, em 1868, que se têm apresentado vários projectos de organização judiciária.
Lembro-mo, entre outros, dos Srs. Veiga Beirão, Medeiros, Morais de Carvalho e Artur Montonegro.
Também eu, em 1916, apresentei à Câmara dos Srs. Deputados um projecto de reforma judiciária, o qual faz, como os outros, inteira e completamente no esquecimento.
Mas reconheço que são verdadeiras as palavras proferidas pelo Sr. Henrique Cabral.
Isto não pode, não deve continuar assim. Se acaso as circunstâncias permitirem que eu ocupe êste lugar por algum tempo, posso assegurar à Câmara que, rodeado dêstes bons elementos a que agora
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me referi, alguma cousa hei-de fazer nesse sentido.
Com boa vontade êsse trabalho pode e deve ser feito.
Com êstes elementos que se encontram na Câmara e de que me rodeio, estou convencido de que hei de levar a cabo ou de que levaremos a cabo esta obra que é essencial que não fique só em palavras, para que se traduza também em factos.
Apoiados.
O inquilinato, a que se referiu o Sr. Henrique Cabral, é uma questão extremamente delicada, e eu ia acrescentar, é uma questão extremamente perigosa.
Entretanto, a verdade é que o assunto nasceu do direito formado depois da guerra e nele há pontos que não podem, nem devem, nem é possível deixar continuar em claro.
É necessário atacar o assunto de frente, custe o que custar, doa a quem doer, embora a cadeira do Ministro possa ser prejudicada; ponto é que o trabalho se faça.
Ultimamente, a lei n.° 1:662, de 4 de Setembro de 1924, foi votada nesta Câmara por acordo de todas as suas cores políticas.
Quando maior era o debate a respeito de assunto tam melindroso, aconteceu que eu, entrando na sala, vi que todos os partidos desta casa do Parlamento se tinham congraçado em volta dêste assunto, e que estava feito mais ou menos um acordo, do qual nasceu, como já disse, a lei n.° 1:662.
Essa lei é imperfeita, é uma lei que não previne muitos casos que deviam estar prevenidos, e eu estou convencido de que, com boa vontade, atendendo-se tanto aos interêsses dos senhorios, que são de respeitar, como aos dos inquilinos, podemos fazer uma obra que, não sendo perfeita, deve satisfazer tanto aos inquilinos como aos senhorios.
Espero também, porque alguma cousa a comissão já tem feito nesse sentido, que em breve será trazida ao Parlamento uma proposta de lei sôbre um assunto que é tam momentoso como necessário.
Disse também o Sr. Henrique Cabral que era preciso modificar a forma de recrutar a magistratura portuguesa.
Disse S. Exa., exprimindo uma verdade, que a nossa magistratura é das magistraturas mais elevadas, mais competentes e mais dedicadas da Europa, posso assim dizer, vivendo com parcos recursos e que apesar de não ter os grandes vencimentos que tem a magistratura francesa e principalmente a magistratura inglesa, contudo é uma magistratura digna, pondo absolutamente de parte tudo quanto não seja os verdadeiros interêsses da justiça, que consiste em dar a cada um o que é seu.
Isto não obsta a que o recrutamento da magistratura se faça por forma a garantir a boa administração da justiça.
É por isso que eu, na proposta de lei que apresentei em 1916, estabelecia que, para se ser juiz, era preciso não só um exame documental, mas também um exame moral, pois só assim o magistrado pode dar completa garantia de que é competente para derimir todos os pleitos que tem de resolver.
É necessário também que a justiça se exerça em lugar que não desmereça daquela compostura, daquela aparência que é necessário ter.
Efectivamente aqui em Lisboa o tribunal da Boa Hora apresenta-se em condições que, longe de infundirem respeito, apenas causam lástima.
Apoiados.
As diversas varas, mal instaladas em aposentos que estão muito longe de ser aquilo que deviam ser, dão um aspecto à nossa administração da justiça que o estrangeiro há-de reprovar completamente e que nós mesmo a cada passo estamos a reconhecer que não é aquela casa onde a Justiça deve ser exercida.
O Estado Português com os poucos recursos que tem não pode construir assim fàcilmente um palácio de Justiça.
Mas ao mesmo tempo tem-se gasto tanto que um sacrifício para um palácio de Justiça não era outra cousa senão lançar uma semente que havia de ser rendosa pois que a magistratura exercendo aí o seu mester havia de ter aquele prestígio que realmente lhe não pode dar um tribunal como o da Boa Hora.
Sr. Presidente: posso assegurar a V. Exa. que tanto quanto em mim caiba, com alguma experiência que tenho dos assuntos desta pasta, com o auxílio desta mocidade que vejo aqui nesta Câmara, alguma cousa de útil para o país se pode fazer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. Dias Pereira: - Sr. Presidente: as minhas primeiras palavras, visto ser a primeira vez que uso da palavra nesta sessão legislativa são de saudação a V. Exa. que pelas suas distintas virtudes e qualidades de republicano é merecedor da minha muita consideração, e além disso pelo alto cargo que V. Exa. desempenha no qual representa uma autoridade, à qual tenho muita satisfação em prestar a minha homenagem e o meu acatamento.
Não posso consequentemente deixar de saudar toda a Câmara, os diferentes grupos políticos nela representados, porque, republicano de sempre, não posso deixar de a todos apresentar as minhas homenagens, fazendo os melhores votos para que a união dos republicanos seja sempre um facto e não uma simples e vã afirmação de nós todos.
Aos próprios adversários do regime eu saúdo porque para êles eu desejo impor o prestígio das instituições que sirvo numa luta de inteligência e num combate de ideas, como é próprio de cidadãos livres.
Também não posso deixar de dirigir duas palavras de homenagem à memória daqueles meus colegas da legislatura de 1919, e faço-o cumprindo um dever de sentimento.
E ainda, Sr. Presidente, em nome daquela solidariedade que nós devemos dar aos homens que pela República souberam trabalhar, eu invoco a memória querida do meu saudoso amigo Sr. Dr. Júlio Martins, moço roubado à vida quando tanto havia a esperar do seu talento, e um outro, meu companheiro, embora adversário político, que teve comigo sempre as melhores relações pessoais, o saudoso António Granjo, que foi um companheiro dilecto, que foi herói e mártir e que deu a sua vida pelo prestígio do poder que servia.
Apoiados.
Cumprido assim êste dever que o sentimento e a justiça, impunham, eu vou agora entrar, Sr. Presidente, na apreciação do capítulo 2.° do orçamento em discussão, e faço-o pedindo aos Srs. Deputados que vão usar da palavra, que se refiram a cada um dos capítulos em obediência às disposições regimentais.
Sôbre o capítulo 2.° "Direcção Geral da Justiça e dos Cultos", como ninguém lhe fez reparos creio que pode merecer a aprovação da Câmara.
Pôsto isso, termino as minhas considerações sôbre êste capítulo.
Faltaria porém a um dever elementar de delicadeza se não agradecesse as palavras amáveis que me dirigiu o meu ilustre colega, Sr. Henrique Cabral, imerecidos elogios que foram ditados mais pela sua amizade do que pelo mérito que êste trabalho pode ter.
O Sr. Henrique Cabral: - Não apoiado. Foram palavras de justiça.
O Orador: - Êste trabalho, não tendo sido feito por um bacharel em direito, é só o resultado da experiência da vida, que embora curta, foi auxiliada pelo exame que tenho feito às diversas circunstâncias de ordem social que se relacionam com êste assunto.
Tenho dito, Sr. Presidente.
O orador não reviu.
São aprovados os capítulos 2° e 3.°
Entra em discussão o capítulo 4.°
O Sr. Pedro Pita: - Já sôbre o capítulo 4.° que só agora entra em discussão fizeram considerações o Sr. Henrique Cabral e o Sr. Ministro da Justiça.
Sr. Presidente: era natural que feita a discussão por capítulos e não havendo uma discussão na generalidade, haja a tendência, que eu acho legítima, para fazer uma apreciação em conjunto do Orçamento de cada Ministério, e legítimo até que se aproveitasse o capítulo 1.° para fazer essa discussão.
É que há assuntos que não podem de facto ser discutidos senão em conjunto, e há apreciações sôbre determinados serviços que só cabem numa discussão na generalidade.
Procurando sempre cumprir êsse preceito regimental, não quis intervir nessa discussão, embora reconheça que é legítima a divagação que se faça porque só em conjunto podem ser apreciados determinados serviços.
Para mim é de todos o mais interessante o capítulo 4.° dêste orçamento do Ministério da Justiça.
É certo que a discussão dos orçamentos não deveria ser feita nos termos em que todos nós a fazemos, e que eu próprio vou fazer.
É certo também que a discussão dos or-
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çamentos deve apenas ter em vista as verbas inscritas, os serviços dotados, sem necessidade de fazer referências propriamente aos serviços em si, ou à sua reforma.
É uma tendência natural que todos nós temos para aproveitar justamente esta discussão e apresentar pontos de vista, umas vezes pessoais, outras vezes dos próprios partidos, e que não têm oportunidade noutras ocasiões para fazer essas declarações.
Serviços de Justiça é a epígrafe dêste capítulo que obriga imediatamente a olhar para o modo como o serviço ô feito, para o modo como êsse pessoal é recrutado.
Vivendo dentro do foro, o estando em contacto com os tribunais o magistrados, tenho o prazer de afirmar que a magistratura do nosso País merece toda a nossa consideração (Apoiados), sob o ponto de vista moral sobretudo, vivendo orna vida de privações e sabendo resistir a todas as pressões o a todas as seduções.
Infelizmente, se assim é sob o ponto de vista moral, o mesmo não sucede sob o ponto de vista profissional, porque o recrutamento só faz às avessas.
A maneira como se paga ao magistrado é tam insuficiente que obriga a serem magistrados somente aquelas pessoas que, ou têm um grande amor à profissão, ou não têm competência para ganhar a vida de outra maneira.
Quem hoje acaba o seu curso o tem condições para marcar na vida profissional vem cá para fora o é advogado, só não se sente com asas inteiras vai procurar ser notário, conservador do registo civil, vai procurar um nicho, o só vai para a magistratura quando se não sente com aptidões para lutar e vivendo uma vida já difícil procura uma vida menos difícil.
Eu admiro como essas criaturas mal pagas, sujeitas a uma vida de judeu errante, mudando do comarca quando termina o seu sexénio ou quando tem de mudar de comarca, admira-me, como se dedicam ao estudo e procuram suprir pelo seu trabalho a base que lhes faltava quando para lá entraram.
Mas, Sr. Presidente, se isto é assim, se toda a gente, sabe que assim e, se há um tempo a esta parte entram para a magistratura as pessoas ricas que pretendem ser magistrados pelo luxo ou pelo desejo
de seguirem essa carreira, que é do facto nobre e seduz todo o rapaz que procura a formatura em direito, e por isso é constituída por êstes indivíduos, ou então por aqueles deficientes de inteligência ou preparação.
Ora, Sr. Presidente, se isto se está fazendo o que será a nossa magistratura amanha?
Sr. Presidente: não há problema nenhum que possa encarar-se isoladamente. É evidente que rum regime deficitário como o nosso é uma aspiração muito interessante esta que acabo de expor, mas do difícil resolução.
Como é possível fazer aumentar os ordenados? Aumentando os emolumentos e tornando menos acessível a justiça?
Evidentemente que não.
Não seria interessante concorrerem à magistratura judicial os advogados com prática no foro que pudessem satisfazer às provas que fossem exigidas e com uma preparação bem diversa daquela que têm os delegados?
Que condições tem os delegados para os casos civis se nunca advogaram?
Que preparação têm os juízes para casos comerciais que estão em comarcas onde o serviço comercial não existe?
Tudo isto está trocado.
Se tem remédio? Tem, sim, Sr. Presidente, e eu podia, sem tratar do fazer grandes divagações, apresentar o que me parecesse sôbre o caso e a sua solução. Mas tendo um espaço de tempo limitado - e eu não quero ultrapassá-lo - e tendo outros assuntos a tratar dentro do presente capítulo, vejo-me obrigado a ir depressa.
Há no Ministério da Justiça uma soma enorme do conselhos e de conselheiros; há o Conselho Superior Judiciário, há o Conselho Superior da Magistratura, há o Conselho Superior do Notariado.
Muitos conselhos como vemos, e, digamos a verdade, com pouca utilidade.
Eu suponho que um conselho só, com todas as atribuições que têm os três conselhos, servia perfeitamente. Apoiados.
O que está só serve para complicar os serviços e embora se não possa dizer que custa muito caro - porque o Conselho Superior Judiciário custa uma cousa como 70.000$ - o que é certo e que há
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sempre uma série de exigências da lei, que manda ouvir os conselhos, e nem sempre são bons os conselhos.
Sr. Presidente: refere-se o parecer, ao tratar dêste capítulo, a assuntos interessantíssimos, a que eu não quero deixar de aludir. Já a êles se referiram o Sr. Henrique Cabral e o Sr. Ministro da Justiça. E no que respeita a uma afirmação dêste último - a quem faço inteira justiça e a quem reconheço boa vontade e competência - tenho a dizer a S. Exa. que, querendo em definitivo, já poderia ter feito alguma cousa.
Quero referir-me à afirmação do Sr. Ministro da Justiça de que "tudo está por fazer no seu Ministério" e que é absolutamente verdadeiro. Simplesmente era preciso começar por quebrar o "encantamento".
Poderá chamar-se a isto basófia, mas se eu estivesse à frente da pasta da Justiça um mês que fôsse, se eu estivera nessa pasta, como já tive ocasião de estar à frente de outra, eu posso garantir que alguma cousa apareceria.
Pode-se lá compreender, Sr. Presidente, que não tenhamos uma "ordem dos advogados" e que da Universidade saia um rapaz com 21 anos, em inteira liberdade de deixar perder as causas que lhe confiam?! Pode-se lá compreender que possa haver um advogado, ao qual se não possam pedir contas pela forma como desempenha a sua missão?! Pode-se lá compreender que haja alguém que, em inteira liberdade, sem estágio nenhum, venha cá para fora e nas suas mãos tenha interêsses que só aos advogados são confiados e cujas causas tantas vezes são perdidas por erros seus?!
Infelizmente é aquilo que sucede ainda hoje no nosso País. Mas, Sr. Presidente, o que é perfeitamente arrepiante para quem tem de ir, pelos deveres do seu cargo de advogado, fazer serviço ao tribunal, é ver o pardieiro onde se administra a justiça, infecto e imundo, obrigando a fazer na mesma saleta pequena cinco inquerições de testemunhas ao mesmo tempo.
Do há muito que se impunha a construção de um palácio da justiça onde aqueles que têm de sofrer a sua acção a recebam com aquele respeito que impõe a justiça quando é dignamente administrada.
O Estado a cada passo tem aumentado as contribuições para atender as suas necessidades e ainda não houve uma alma caridosa que se lembrasse do procurar o meio do satisfazer esta imperiosa necessidade.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): - Num projecto de lei que apresentei em 1916 estava a maneira de fazer um palácio de justiça e bem assim a constituição da "ordem dos advogados"; mas, o tempo passou, eu deixei de ser Ministro da Justiça e êsse projecto morreu na comissão, como morreram outros. Oxalá que S. Exa. venha breve para esta pasta, apresente tudo isso que pretende ao Parlamento e veja o seu plano resolvido dentro do prazo de um mês.
O Orador: - Sr. Presidente: o àparte do Sr. Ministro da Justiça teve, ao menos, a vantagem de me dar a conhecer o seu estado de espírito a meu respeito, pois me pareceu que o modo como S. Exa. entendeu as minhas palavras o poderiam pôr a mal comigo - o que eu de forma alguma quereria. Patrício que muito prezo, pessoa que muito admiro, não me sentiria bem se S. Exa. ficasse do mal comigo.
Não posso, Sr. Presidente, deixar do reconhecer em S. Exa. o Sr. Ministro da Justiça todos os requisitos necessários para levar a cabo uma obra do género daquelas a que me refiro.
O que se torna necessário é que S. Exa. saiba querer. Foi mesmo por não ter usado em 1916 daqueles meios conducentes ao fim que tinha em vista que a sua proposta naufragou.
Sr. Presidente: pelo que respeita a legislação, basta dizer que ainda nos estamos a reger pela Novíssima Reforma Judiciária. No que respeita ao processo crime estamos sem saber qual a lei que está em vigor e a que já não está, vivendo quási que às apalpadelas.
Neste País tem-se feito tanta ditadura - ditaduras descaradas algumas, mascaradas outras - e ainda não houve uma pessoa que se lembrasse de deitar cá para fora com um Código do Processo Criminal que, mau que fôsse, era com certeza melhor do que aquele que está em vigor.
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Ficávamos sabendo que estava ali compilado tudo o que dizia respeito a processo criminal.
De resto, Sr. Presidente, não seria façanha para ninguém apresentar hoje um Código de Processo Criminal. Desde que a Itália publicou o seu código, que é verdadeiramente modelar, não havia mais do que copiar para termos um código por onde nos pudéssemos reger.
Fala-se também na reforma do Código de Processo Civil. É só indispensável.
As dificuldades de toda a gente em encontrar dinheiro para satisfazer os seus compromissos obriga a procurar a maneira de protelar a resolução das causas, para poderem assim ter esperança em dias melhores para a satisfação dêsses compromissos.
Até há relativamente poucos anos um indivíduo que emprestava o seu dinheiro com garantia hipotecária tinha a certeza de que o seu dinheiro estava seguro. Hoje não existe essa certeza.
É certo que bem contribuiu para isso a lei do inquilinato, com as suas monstruosidades, mas é também verdade que uma execução hipotecária antigamente se resolvia ràpidamente, ao passo que hoje demora anos e anos; e o indivíduo que amanhã vai pôr em praça, para pagamento do seu crédito, o prédio urbano que lhe tinha sido hipotecado, vê muitas vezes que êsse prédio está absolutamente desvalorizado porque lhe tiraram o valor metendo-lhe dentro inquilinos com rendas irrisórias mas que à entrada pagaram em traspasse a diferença da renda de uns poucos de anos.
É esta a bela obra do inquilinato que faz com que em Lisboa se não construa um prédio e se deixe por terminar, caindo aos bocados, os que estão começados. E que os beneméritos são poucos e os que empregam o seu dinheiro querem receber um rendimento que é legítimo e natural.
Êstes indivíduos que deviam ser acarinhados são os que estão mais sujeitos a toda a retroactividade de leis que se queira aqui votar e a todas as leis de excepção absoluta, quando a verdade é que o Estado convida o indivíduo a entregar-lhe o dinheiro pagando-lhe 10 por cento adiantados em bilhetes do Tesouro.
O Sr. Ministro da Justiça fez há pouco a afirmação de que a última lei sôbre inquilinato tinha sido produto de um acordo entre todos os lados da Câmara.
Posso dizer, embora pareça disparate, que esta afirmação é ao mesmo tempo uma verdade e não é.
Sr. Presidente: quando de facto surgiu aqui a proposta de lei que depois veio a transformar se na lei n.° 1:632, a Câmara ficou horrorizada.
Pressões de toda a ordem se exerciam sôbre os parlamentares, principalmente os da maioria, para que mantivessem os preceitos dessa proposta.
Iniciámos aqui um combate vigoroso e tenaz. Lembro-me perfeitamente de que, além da minoria monárquica, falaram dêste lado os Srs. Moura Pinto, Ginestal Machado, Alberto Jordão e eu.
Iniciámos um combate tenaz, combate de morte, e foi assim que ainda se pôde conseguir limar algumas das suas arestas, não sendo possível limá-las todas porque não podíamos abusar da situação em que nos encontrávamos, nem da transigência daqueles que eram mais do que nós.
Mas houve um grupo de Deputados, e a êsse número eu pertenci, que até ao fim, porque não se tratava de uma questão de princípios e era uma questão aberta dentro dos partidos, se declarou absolutamente contra essa proposta que, depois de transformada na lei n.° 1:662, quanto mais passa pelas minhas mãos, quantas mais vezes a tenho de consultar, mais me convenço de que é uma verdadeira monstruosidade.
Pelo que se refere esta proposta orçamental à divisão do serviço pelos três distritos judiciais de Lisboa, Pôrto e Coimbra, não se compreende esta anomalia de, por preocupações políticas, principalmente, se manter uma tam grande desigualdade entre êles, tam grande que? ao passo que duas relações estão sobrecarregadas de trabalho, a outra vive quási sem ter que fazer.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente (às O horas e 50 minutos): - Está encerrada a sessão.
A primeira sessão é amanhã à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
1.ª parte:
Interpelação do Sr. José Domingues dos Santos ao Sr. Ministro do Interior,
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Negócio urgente do Sr. Cunha Leal acerca da acção do Alto Comissário da Província de Moçambique.
Parecer n.° 40, que autoriza a colónia de Moçambique a contrair com a Caixa Geral de Depósitos um empréstimo em conta corrente até à importância de 18 milhões de escudos metropolitanos.
Parecer n.° 39, que autoriza o Govêrno a reorganizar os serviços de emigração.
Parecer n.° 40, que autoriza o Govêrno a decretar o regulamento disciplinar da Guarda Fiscal.
Parecer n.° 15, que aprova o Código de Justiça Militar (decreto n.° 11:207).
Parecer n.° 18, que regula as condições em que poderão ser concedidas as licenças para sair para o estrangeiro os indivíduos sujeitos ao serviço militar (decreto n.° 11:300).
Parecer n.° 58, que define e regula as funções dos oficiais da marinha mercante (decreto n.° 11:016).
Parecer n.° 99, que designa os dias em que será utilizado o sêlo comemorativo da independência de Portugal.
Parecer n.° 100, que torna obrigatória de 5 a 15 de Maio de cada ano a aposição de selos existentes da emissão determinada pela lei n.° 1:708, de 24 de Dezembro de 1924.
2.a Parte:
Projecto de lei n.° 1-C, que concede a quaisquer igrejas ou confissões religiosas personalidade jurídica.
Está encerrada a sessão.
Era 1 hora.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Requerimentos
Requeiro que, pelo Ministério da Justiça e dos Cultos, me sejam fornecidas cópias da exposição de João António Esteves que está apensa ao ofício n.° 113, de 8 do corrente, da Relação do Pôrto e da informação que sôbre a matéria dessa exposição emitiu a competente repartição, o que tudo consta do processo 267, 1. 102. --Rafael Ribeiro. Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério do Interior, me sejam fornecidas as informações oficiais que constem do Comissariado Geral dos Serviços de Emigração sôbre a conduta e procedimento de Sabino Casa Branca Rodrigues, agente da polícia de investigação criminal do Pôrto, e que esteve ao serviço da inspecção da zona do norte do referido Comissariado. - Rafael Ribeiro.
Expeça-se.
Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, com o máxima urgência, me seja fornecida cópia de toda a documentação respeitante ao processo justificativo do despacho de 24 de Junho de 1925, pelo qual foi autorizado o Banco Angola e Metrópole a negociar em cambiais, despacho que foi publicado no Diário do Govêrno, n.° 154, 2.ª série, de 3 de Julho do mesmo ano; e que, pelo mesmo Ministério, me seja permitido examinar, na Inspecção do Comércio Bancário, os livros de registo e demais documentação que lhes diga respeito, de todas as operações de compra e venda de libras, a prazo, realizadas nos anos de 1924 e 1925. - Jorge Nunes.
Expeça-se.
Proposta de lei
Do Sr. Ministro das Colónias, autorizando o Govêrno a remodelar, nos termos de designadas bases, o exército colonial.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de colónias.
Para o "Diário do Govêrno".
O REDACTOR - Herculano Nunes.
33 - Imprensa Nacional - 1925-1926