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REPÚBLICA PORTUGUESA

SESSÃO LEGISLATIVA DE 1911-1912

DIÁRIO DO SENADO

SESSÃO N.º 18

(NOCTURNA)

EM 29 DE DEZEMBRO DE 1911

SUMÁRIO. - Chamada e abertura da sessão. - Leitura e aprovação da acta. - Não houve expediente.

Ordem da noite. - Discussão do parecer sôbre o orçamento do Ministério da Guerra. Tomam parte no debate os Srs. Senadores Eusébio Leão, Goulart de Medeiros, Ladislau Parreira, José de Pádua, Artur Costa, Correia Barreto e Amaro de Azevedo Gomes, respondendo a todos o Sr. Ministro da Guerra (Alberto da Silveira). O parecer é aprovado na generalidade, sendo tambêm aprovado, sem discussão, na especialidade. - Discussão do parecer da comissão de finanças sôbre o orçamento do Ministério do Interior. Tomam parte no debate os Sra. Senadores Ladislau Piçarra, Artur Costa, Silva Barreto, Ladislau Parreira e Bernardino Machado, respondendo a todos o Sr. Ministro do Interior (Silvestre Falcão). O parecer é aprovado na generalidade, sendo tambêm aprovado, sem discussão, na especialidade. - Discussão do parecer sôbre o Ministério das Finanças e do parecer sôbre a receita e despesa. Entram no debate os Srs. Senadores José Maria Pereira, Bernardino Machado, Cupertino Ribeiro, Artur Costa, José de Pádua e Goulart de Medeiros, respondendo a todos o Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes). Os pareceres são aprovados na generalidade e na especialidade. - É aprovado sem discussão o parecer relativo à frequência das aulas, no período transitório, aos candidatos à admissão nas escolas normais. - O Sr. Presidente encerra a sessão.

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Presidência do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretários os Exmos. Srs.

António Bernardino Roque
Bernardo Paes de Almeida

Srs. Senadores que compareceram à sessão: Abel Acácio de Almeida Botelho, Abílio Baeta das Neves Barreto, Adriano Augusto Pimenta, Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos, Alberto Carlos da Silveira, Alfredo Bote lho de Sousa, Alfredo José Durão, Amaro de Azevedo Gomes, Aníbal de Sousa Dias, Anselmo Augusto da Costa . Xavier, Anselmo Braamcamp Freire, António Bernardino Roque, António Joaquim de Sousa Júnior, António Ladislau Parreira, António Ladislau Piçarra, António Maria da Silva Barreto, António Pires de Carvalho, António Ribeiro Seixas, António da Silva Cunha, António Xavier Correia Barreto, Artur Augusto da Costa, Artur Rovisco Clareia Bernardino Luís Machado Guimarães, Bernardo Paes de Almeida, Carlos Richter, Domingos Tasso de Figueiredo Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho, Faustino da Fonseca, Francisco Correia de Lemos, Francisco Eusébio Lourenço Leão, José António Arantes Pedroso Júnior José de Cupertino Ribeiro Júnior, José Machado de Ser pá, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Pádua, José Maria Pereira, José Miranda do Vale Luís Fortunato da Fonseca, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel Martins Cardoso, Manuel Rodrigues da Silva, Manuel de Sousa da Câmara, Pedro Amaral Boto Machado Ramiro Guedes, Sebastião Peres Rodrigues e Tomás António da Guarda Cabreira.

Srs. Senadores que não compareceram: Albino Coutinho Antão Fernandes de Carvalho, António Augusto Cerqueira Coimbra, António Caetano Macieira Júnior, Augusto Almeida Monjardino, Celestino Germano Paes de Almeida, Cristóvão Moniz, Eduardo Abreu, Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro, Elisio Pinto de Almeida e Castro, Francisco António Ochoa, Inácio Magalhães Basto, João José de Freitas, Joaquim José de Sousa Fernandes, Joaquim Pedro Martins, José de Castro, José Estêvão de Vasconcelos, José Nunes da Mata, José Relvas, Leão Magno Azedo, Manuel José Fernandes Costa, Manuel José de Oliveira, Narciso Alves da Cunha, Ricardo Paes Gomes e Sebastião de Magalhães Lima.

Às 9 horas e 25 minutos da noite, o Sr. Presidente mandou proceder à chamada.

Tendo-se verificado a presença de 36 Srs. Senadores, S. Exa. declarou aberta a sessão.

Foi lida, e aprovada sem reclamação, a acta da sessão anterior.

Foi mandado para a mesa o seguinte parecer:

Senhores Senadores. - A vossa comissão de petições, certa, pelas investigações a que procedeu, de que o requerente Joaquim José Amoinha Lopes prestou os serviços e foi vítima das perseguições que alega, é de parecer se lhe faça a justiça que pede e é devida a todos que se sacrificaram pela República, mandando-o repatriar.

Sala da comissão de petições do Senado, em 28 de Dezembro de 1911. = Anselmo Augusto da Costa Xavier = M. Rodrigues da Silva = Feio Terenas = Carlos Richter = Ladislau Piçarra.

Leram-se as últimas redacções dos projectos n.°s 12-A, 11-B, 5-F e 5-A, que foram aprovados sem discussão.

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o resto do orçamento do Ministério da Guerra, que vai ler-se:

Senhores Senadores. - A vossa comissão de finanças, impossibilitada, por falta de tempo, de estudar e discutir convenientemente o orçamento do Ministério da Guerra para 1911-1912, limita-se a fazer algumas ligeiras considerações sôbre tam complexo e, importante assunto.

Evidentemente, o aumento de despesa inscrito no referido orçamento, e que é de 1.238:100$900 réis, constitui uma verba importante. Ela é, porem, de importância mínima se considerarmos na remodelação profunda que os serviços do exército de terra exprimentaram, com a implantação da República, e que tendem a converter uma antiga instituição oligárquica num verdadeiro organismo social. A comissão de- finanças da Câmara dos Deputados introduziu no presente orçamento algumas alterações que merecem a nossa inteira aprovação, porque elas tendem a remediar um inveterado vício das administrações monárquicas, e que no orçamento dêste e de todos os outros Ministérios se nota - a exiguidade de verbas do material quando compradas com a benigna abundância das verbas do pessoal. Há evidentemente no presente orçamento uma copiosa cifra de quadros e de complexas comissões de serviço, nem todas elas criteriosamente baseadas na organização do exército decretada ultimamente. Tudo nos faz supor, porém, que êstes inconvenientes irão desaparecendo, votando-se de preferência o empenho da entidade Govêrno em dotar o exército de maiores e mais eficazes meios de defesa. Actualmente, conforme os serviços dêste Ministério estão entre nós organizados, a triste verdade é que gastamos proporcionalmente com a forca naval terrestre mais do que a Bélgica e a Holanda, quási tanto como a França, e contudo essa fôrça contêm-se entre nós numa grande inferioridade. Na opinião da comissão, é tam exagerado o aumento de 360:815$871 réis no pagamento às classes inactivas, como insuficientes são as dotações de 121:596$324 réis e 153:152$405 réis, respectivamente destinadas à compra de material para a instalação das diferentes unidades, e para fardamento e praças a mais dos quadros.

Também o presente orçamento enferma ainda da confusão dos antigos orçamentos monárquicos, especializando as diferentes verbas por serviços, em vez de os descriminar por capítulos e artigos, conforme os lançamentos são feitos em contabilidade. É um inconveniente êste a remediar no próximo orçamento.

A vossa comissão de finanças é de parecer que o orçamento do Ministério da Guerra seja aprovado, com as alterações que lhe foram introduzidas na Câmara dos Senhores Deputados; e faz votos por que o orçamento seguinte seja presente ao Senado em condições tais de clareza e de tempo que permitam a sua larga discussão e exame.

Sala das Sessões da Comissão de Finanças do Senado, 29 de Dezembro de 1911.= José Maria Pereira, Presidente = José Nunes da Mata = Peres Rodrigues = José Miranda do Vale = Tomás Cabreira = Ladislau Picar rã = Alfredo Botelho de Sousa = Abel Botelho.

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SESSÃO N.° 18 DE 29 DE DEZEMBRO DE 1911 3

O Sr. Eusébio Leão: - Desculpem V Exas. Senhores Senadores se eu mais uma vez volto a chamar a atenção de todos para o que se passa com êste orçamento, que é ainda singularmente agravado em relação aos outros. Quero referir-me à enorme despesa que se faz com as classes inactivas.

Segundo o orçamento, gasta-se, com as classes inactivas no exército, metade do que se gasta com o pessoal em actividade.

Não sei se facto semelhante se dará em outro qualquer país do mundo, mas o que isto representa é uma administração perdulária a que é preciso pôr termo. Nestas minhas considerações não vai a mais pequena sombra de sensura ao actual Ministro da Guerra ou a qualquer dos seus antecessores do tempo da República. Êles receberam esta tristíssima herança da monarquia que pensara afirmar o seu predomínio com o elemento militar, de maneira que fazia todos os favores indo até o ponto de, para arranjar acesso rápido aos seus apaniguados, reformar gente que estava ainda em condições de prestar serviço. Isto constituía um abuso e um escândalo contra o qual lavro o meu protesto. Estou convencido de que os Governos da República hão-de melhorar estas coisas. Todos nós conhecemos muitos oficiais do exército reformados que ainda estão válidos e com energia para o trabalho, pois muitos deles reformaram-se para irem exercer fora do exército profissões que muitas vezes demandam maior actividade do que aquela que tinham de despender no exército.

As classes inactivas no Ministério da Guerra custam, como já disse, um pouco mais de 50 por cento do que o pessoal activo; em relação ás despesas totais representam pouco mais ou menos um gasto de 17 por cento.

Senão vejamos:

Despesas totais, 10:140 contos.

Classes inactivas, 1:700 e tantos contos.

Estou convencido de que o Sr. Ministro da Guerra, com o seu alto critério e com o seu grande amor à República e à boa administração, vai fazer qualquer cousa, não para mudar em poucos anos a situação actual, pois isso seria impossível, mas para que êste verdadeiro cancro se vá atenuando tanto quanto possível.

Tenho dito.

O Sr. Ministro da Guerra (Alberto da Silveira): - O ilustre Senador e meu prezado amigo o Sr. Eusébio Leão acaba de se referir às classes inactivas do Ministério da Guerra e nota, com muita razão, que é muito grande a verba que se gasta com aquelas classes.

O mal vem de muito longe; assim o afirmou S. Exa. e é a pura verdade.

O mal vem do anterior regime, o não é fácil remediá-lo de momento.

Várias medidas de favoritismo, que não vale a pena citar agora, fizeram com que no exército se reformassem indivíduos válidos para o serviço. Esta é que é a verdade, e eu não estou aqui senão para a dizer.

Houve, por exemplo, a célebre lei chamada de equiparação, que fez com que se reformassem indivíduos novos e válidos.

Era uma imoralidade!

Essa lei foi revogada pela República. (Apoiados).

Foi uma medida de alta moralidade. No momento actual há só uma cousa a fazer - e neste momento apelo para o país e para o Exército - é que as juntas militares sejam excessivamente rigorosas.

Não se deve dar ninguém por incapaz sem que realmente o esteja. (Apoiados).

Desde que as juntas sejam dêste rigor, a verba das classes inactivas não aumentará.

Não quere isto dizer que as juntas não sejam justas; mas é preciso que sejam rigorosas.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Sr. Presidente, mando para a mesa uma moção, que justifico em muito poucas palavras.

Pareceria esquisito que eu, sendo militar, não entrasse na discussão da tabela de despesa do Ministério da Guerra, quando, na discussão da generalidade do projecto, frisei bem que não me conformava com a maneira por que todo êle estava organizado. Estou certo que todos acreditam que eu sou incapaz de deixar de o aprovar, nesta altura, visto estar a terminar o duodécimo, e por conseguinte sermos forçados a votar outro, no caso de rejeição do Orçamento, o que seria lastimável: entretanto não posso deixar passar sem protesto a forma por que estão feitas as tabelas de despesa, em discussão, e nesse sentido mando para a mesa a moção que passo a ler.

Leu-se na mesa, foi admitida e é do teor seguinte:

O Senado reconhecendo que a tabela da despesa do Ministério da Guerra é excessiva para os recursos do Tesouro, mas reconhecendo tambêm que ela é uma consequência necessária da organização dêsse Ministério e suas dependências que não pode, sem demorado estudo, ser devidamente modificada, aprova a referida tabela, reservando as suas precisas providências para a discussão do próximo orçamento de 1912-1913. = Manuel Goulart de Medeiros.

O Sr. Ladislau Parreira: - Sr. Presidente: eu não falaria talvez sôbre o orçamento do Ministério da Guerra se não fora uma passagem do parecer da comissão de finanças da outra Câmara, que me foi em extremo agradável.

Diz-se nesse parecer que a comissão de finanças não vacilaria em aceitar aumentos de despesa, contanto que sejam produtivos ou sejam para a defesa nacional.

Foi-me em extremo agradável esta declaração, porquanto, com o aumento que se faz no seu orçamento, o Exército pode organizar-se e tambêm os seus serviços e as suas reservas.

A Marinha tambêm precisa dum aumento dêsses, e para preparar já o terreno nesse sentido é que venho abordar êste assunto.

Na sessão da tarde pugnei por economias no orçamento da Marinha que existe; agora venho anunciar que no próximo orçamento, ou nos outros que se seguirem, é indispensável criar um encargo, e de modo permanente, para fazer o que não há.

Realmente nos próximos orçamentos do Ministério da Marinha teremos tambêm um aumento de despesa considerável.

Porque é completamente impossível, com o orçamento reduzido que temos, arranjar uma esquadra. E ou ela se faz agora, e em termos, ou nunca se fará, e então acaba-se de vez com a marinha, se o julgam possível.

É necessário que se saiba se querem ou não a sua defesa. A Nação tem que dizer se quere ou não suportar o sacrifício de aumentar as suas despesas para arranjar uma esquadra que lhe é indispensável. (Apoiados). O Exército e a Armada estão unidos neste ponto, em que não pode haver discrepância.

E indispensável o aumento do orçamento do Ministério da Guerra; para arranjar um exército de primeira linha, e constituir as suas reservas, há-de ser indispensável aumentar o da Marinha para criar a sua esquadra, que lhe é indispensável. E não se diga que o Exército tinha pouco, porque a Armada não tinha cousa alguma, porque não tem nada, positivamente.

Onde se há-de ir buscar receita?

Os técnicos não sabem.

Tem a palavra os economistas.

E essa receita há-de ser de molde a podermos arran-

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jar uma esquadra nas condições em que nos é imprescindível, porque, para ser igual à que temos, mais vale nenhuma.

O Sr. José de Pádua:- Sr. Presidente, o Sr. Goulart de Medeiros não teve o propósito de melindrar o Sr. Ministro da Guerra com a sua moção, mas como acho que a matéria dela seria bem aplicada a todos os Ministérios, proponho um aditamento para que na moção do Sr. Goulart de Medeiros sejam substituídas as palavras Ministério da Guerra pela palavra Ministérios, ficando assim a moção do Sr. Goulart de Medeiros aplicada a todos os Ministérios, cujos orçamentos precisam ser cuidadosamente revistos, para o novo ano de 1912-1913, que em breve hão-de ocupar as Câmaras, isto por motivos muito simples.

Sei que o Sr. Goulart de Medeiros não teve com a sua moção nenhum intuito desagradável seja para quem for, mas não deixo de propor o aditamento, porque entendo ser sempre conveniente salvaguardar más impressões:

Proponho que as palavras Ministério da Guerra sejam substituídas por Ministérios.

Sala das Sessões, 29 de Dezembro 1911. = O Senador, José de Pádua.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se a proposta do Sr. José de Pádua.

Foi lida na mesa.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Senadores que admitem esta proposta queiram levantar-se.

Pausa.

Está admitida.

O Sr. Ministro da Guerra (Alberto da, Silveira): - Não há dúvida de que todos os orçamentos necessitam de uma revisão.

Evidentemente que sendo ainda muito curto o tempo da República, não se encontram os seus homens públicos, aqueles que foram chamados aos lugares de Ministros pela vontade do povo, representado pelos Deputados e Senadores, com a pratica da vida ministerial, que os levasse a poderem formular imediatamente bons orçamentos e a estudarem todos os ramos de serviço público.

Tudo, porém, se poderá conseguir com mais algum tempo.

Comigo, por exemplo, deu-se o caso de ter que organizar o orçamento do Ministério da Guerra, dentro dura mês.

Sr. Presidente: preciso dizer que não nos iludamos com respeito às despesas do Ministério da Guerra.

Que façamos todos os cortes, todas as economias, e que organizemos todos os serviços com toda a economia, é justo e para isso concorrerei como puder o souber; mas pensar que as despesas do Ministério da Guerra se podem diminuir considerávelmente, isso é que não devemos fazer.

Não nos iludamos!

Êste orçamento traz apenas as despesas de pessoal, insignificantes em relação às despesas de material a fazer.

Para nos colocarmos numa situação de defesa regular é preciso tanto que eu quási não me atrevo a dize-lo à Câmara.

Vozes: - Diga, diga. É preciso que se saiba tudo.

O Orador: - Posso afirmar, por um cálculo muito moderado, que a verba das despesas a fazer deve andar por cerca de uns 20.000:000$000 réis.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Para o campo entrincheirado e tudo mais seria pouco...

O Orador: - Como disse é um cálculo muito reduzido e só para o caso de ficar o Exército organizado regularmente.

O Sr. Eusébio Leão: - O Sr. Ministro não deve fazer reticências. É preciso que diga tudo, para que o país saiba que herança recebeu da monarquia.

O Orador: - Não temos material; a defesa do porto de Lisboa é rudimentar. Não temos espingardas para 300 mil soldados, número dos que em dez anos ficarão regularmente instruídos.

Não temos munições que correspondam a êsse armamento, etc., etc.

Ainda um ponto importante é o do gado para arrancar o material.

Não se iluda a Câmara sôbre as despesas do Ministério da Guerra. Elas tem de aumentar e muito.

Há muito que cortar em organizações que tem de desaparecer, por serem parasitárias, que ficaram da monarquia, mas temos que gastar 20 mil contos de réis, pouco mais ou menos, para o nosso exército ficar regularmente.

Ora esta verba não se arranja dum momento para outro.

É certo que na actual reforma do exército existe a taxa militar que deve dar daqui a anos uma verba regular.

Eu fundo esperanças em que se possa fazer uma operação de crédito, baseada nesse rendimento, para se arranjar algum dinheiro com que se possa ajudar o sacrifício que o país tem fatalmente que fazer, se quiser ter exército.

Era isto o que eu, com a minha habitual franqueza, queria dizer â Câmara, a propósito da moção do Sr. Medeiros.

Foi mancada para a mesa a seguinte declaração:

Declaramos que não aprovamos a moção do Sr. Senador Goulart de Medeiros, nem a emenda do Sr. Senador José de Pádua, porque o Senado não carecia de afirmar o seu direito de fazer no orçamento que brevemente deve vir à Câmara as correcções, emendas e alterações que julgar necessárias. - Sousa Júnior = José António Arantes Pedroso = Alfredo Botelho de Sousa.

O Sr. Artur Costa: -Parecerá necessariamente extraordinário que eu, não tendo a honra de pertencer ao exército, me atreva a pedir a palavra na ocasião em que se discute o orçamento do Ministério da Guerra.

Mas eu não venho discutir êsse orçamento.

Venho, permita-me V. Exa. Sr. Goulart de Medeiros, combater a sua mocotó, não porque ela não fôsse inspirada em sentimentos patrióticos; mas porque, segundo as palavras que nós ouvimos proferir do Sr. Ministro da Guerra, todos estamos convencidos de que as tabelas do Ministério da Guerra não são excessivas.

Tomáramos nós que elas, em vez de importarem em 10 mil contos, importassem em quantia superior.

Tomáramos nós poder gastar o que fôsse preciso, para nos colocarmos em condições de ver por todos respeitada a nacionalidade portuguesa.

O Sr. Goulart de Medeiros: - V. Exa. não ouviu ler toda a minha moção, que diz respeito às condições actuais do Tesouro.

O Orador: - Ouvi, sim senhor, mas V. Exa. tambêm acaba de ouvir dizer ao Sr. Ministro da Guerra, que não nos devemos iludir, porque as tabelas do seu Ministério

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não poderão sofrer uma grande redução no futuro orçamento. Tanto o orçamento do Ministério da Guerra, como o da Marinha, inscrevem verbas que se destinam a garantir a nossa defesa.

Julgo, portanto, que a moção de V. Exa. é desnecessária, como desnecessária é a moção do Sr. José de Pádua.

É claro que nós temos o direito de rever, de estudar, de apreciar e de aumentar ou cortar quaisquer despesas; mas não é só no Ministério da Guerra. É em todos os Ministérios. Evidentemente não temos o direito de rever as leis, que autorizam a inserção de verbas no capítulo das despesas. É um direito de que não podemos ser esbulhados. O nosso desejo é de que o nosso orçamento seja, quanto possível, reduzido.

Isto está no espírito de toda a Câmara; mas, aprovada a moção do Sr. José de Pádua, ficará a todos a impressão de que é imprescindível que se façam reduções nos orçamentos de todos os Ministérios; mesmo naqueles que já foram aprovados, sem o mínimo protesto.

A não ser assim, havia uma excepção para o Ministério da Guerra.

Ora eu não estou aqui a defender a instituição militar.

V. Exa., Sr. Goulart de Medeiros, melhor do que eu a defende, porque lhe dedica amor, e é um brioso militar.

Mas eu não vejo necessidade de votar a sua moção.

Foi aqui dito, pelo Sr. Adriano Pimenta, que o Grupo Democrático, aprovando êste Orçamento, não abdicava o direito de examinar com largueza o que tem, de ser presente à Câmara em 15 de Janeiro, isto é, o que tem de regular para o ano económico de 1912-1913.

E depois, a moção do Sr. José de Pádua, referindo-se a todos os Ministérios, abrange, portanto, o da Justiça, que nós reconhecemos não ter afectado as condições económicas, pelo menos até hoje.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Mas parece que a execução da lei da separação das Igrejas do Estado, deve aumentar a despesa.

O Orador: - Não se aflija V. Exa. com isso.

O Sr. Goulart de Medeiros: - É o que se deduz do relatório do Sr. Ministro das Finanças.

O Orador: - Não conheço essa passagem do relatório do Sr. Ministro das Finanças.

A República precisava de afirmar os seus direitos e a supremacia do poder civil; assim como votámos aqui um decreto para defesa da República nas fronteiras, tambêm votaríamos o que necessário fôsse para se executar o decreto da separação, caso exigisse grandes despesas.

Ai de nós se não confiamos nos homens que se sentam nas cadeiras do Govêrno.

O aditamento apresentado pelo Sr. José de Pádua seria aceitável, e eu concordaria com êle se julgasse que era necessária a afirmação que consta da moção apresentada pelo Sr. Goulart de Medeiros.

Mas, não é ela necessária, e, portanto, peço ao Sr. Medeiros que retire a sua moção, e ao Sr. José de Pádua que retire o seu aditamento, pois assim ficaremos em relação ao orçamento do Ministério da Guerra na mesma situação em que ficamos com os outros orçamentos.

O Sr. Faustino da Fonseca: - Pedi a palavra para acentuar o que já disse com relação ao orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

A situação financeira de Portugal é gravíssima, consequência do grande período de roubos em que a nação viveu, tendo que se aplicar quási metade da receita ao pagamento de juros de uma dívida pública que vai quási a 800.000:000 réis.

Da outra metade, é uma parte absorvida pelo exército e pela marinha, isto é: a despesa com as fôrças de terra e mar representam uma quarta parte da receita do país.

Nestas circunstâncias, como é que poderemos aumentai-as despesas com a marinha e o exército?

Não as poderemos aumentar, a não ser que se contraísse um empréstimo, cujos juros viriam agravar a situação, e Portugal ficaria sem dinheiro para obras de fomento e instrução.

Precisamos de economizar tanto quanto possível, tanto no Ministério da Guerra como no Ministério da Marinha.

A Suécia, a Dinamarca e a Holanda gastam menos com as suas fôrças armadas do que nós, e qualquer daquelas nações se encontram com muito mais material do que nós.

O Sr. Ladislau Parreira: - Mas tem gasto grandes quantias com a aquisição do material que possuem.

O Orador: - Compreendo a necessidade que há de estabelecer a nossa defesa, mas temos primeiro que fazer a defesa contra a parasitagem, para que ainda não houve fôrças suficientes que a terminassem.

Precisamos acabar com os parasitas que vem no Orçamento; e se não podemos arcar com a verba das classes inactivas, reduzamo-la a metade; da mesma forma, se não podemos arcar com os juros e encargos da dívida interna, reduzamo-los a metade. Devemos, antes de sobrecarregar os orçamentos de despesa com novas verbas, tratar da maneira de aumentar as receitas.

Estou sentindo um verdadeiro remorso da forma como, muitas vezes, acusei os homens que apresentavam orçamentos, no tempo da monarquia. Êsses homens deixavam-se levar pelo optimismo, calculavam a receita sôbre hipóteses, como nós estamos calculando.

Nós precisamos primeiro fazer aparecer dinheiro, e depois de fazer aparecer êsse dinheiro, só então, aumentaremos a despesa, porque, por mais canhões e navios que tenhamos, nós podemos chegar ao momento em que, nem sequer tenhamos dinheiro para pagar juros da dívida, e então, nesse momento, já nenhuma dessas nações se serviria dos seus couraçados; os seus banqueiros bater-nos hiam à porta, e nós não temos maneira de evitar a banca-rota.

A terra portuguesa está miseravelmente tratada, não pode com a responsabilidade duma hipoteca à sua dívida. É preciso aniquilar os parasitas que vivem no orçamento e que sejamos rigorosos no exame das verbas de despesa com pessoal; depois é que podemos adquirir canhões e navios, porque temos ainda vastíssimas colónias, e se acaso um dia a sua divisão vier a dar-se, o que nos ficar em partilha será ainda muitíssimo grande para, tendo navios, podermos ter ainda grandes riquezas. Mas, primeiro que tudo, antes de nos deixarmos arrastar pela paixão patriótica das despesas navais, precisamos de tomar deliberações com relação ao aumento da receita.

O Sr. Eusébio Leão: - Sr. Presidente, não esperava voltar ao assunto, mas as considerações feitas pelos Srs. Ministro da Guerra, Faustino da Fonseca e outros colegas, obrigaram-me a pedir a palavra e a vir em reforço do que disse o Sr. Parreira, porque é a ocasião oportuna de lançar as bases da defesa nacional e eu entendo que uma nação que se não arma para manter a integridade do seu património é uma nação fatalmente condenada a morrer. (Apoiados).

Todas as nações da Europa, sem excepção das mais insignificantes, estão a fazer os maiores sacrifícios para aumentar as suas fôrças militares, e vê V. Exa. aos sacrifícios que estão fazendo a Bélgica e a Holanda para manterem, ao menos, a sua neutralidade se alguém lhes quiser tocar.

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V. Exa. está vendo a luta verdadeiramente gigantesca que se trava entre a Inglaterra e a Alemanha no aumento das duas esquadras, e quem ler o que se diz na imprensa dos dois países vê que, se a Alemanha, por motivos eleitorais, não pensa agora tanto no aumento das fôrças militares, deixa perceber que, passado o período das eleições, voltará novamente à sua preocupação e que medidas tendentes ao aumento das suas forcas militares, naturalmente serão postas em prática.

É preciso estar com os olhos fechados para não ver o que se passa por essa Europa fora, para supor que Portugal há-de, impunemente, continuar desarmado, há-de deixar de fazer todos os sacrifícios para ter uma defesa activa, eficaz, quer per terra, quer por mar.

A política internacional, actualmente, dá-nos a impressão dum homem que vai caminhando por uma estrada fora, sentindo a necessidade de levar um revólver engatilhado para se defender de qualquer assalto que inopinadamente possa surgir de qualquer lado; e não é segrêdo para ninguêm que, em torno de Portugal, existem ambições desenfreadas acêrca das suas colónias e é necessário que Portugal se arme para combater ou defender-se, que tenhamos fôrça para amigos e inimigos...

Sr. Presidente, uma nação que não se defende é uma nação condenada a morrer.

Eu tenho dito muitas vezes em conferências públicas que a República precisa de fazer grandes sacrifícios, primeiro, para a instrução pública; segundo, para as medidas de fomento; terceiro para a defesa armada.

Não, não podemos estar à espera de arranjar dinheiro, como se estivéssemos à espera da sorte grande; nós temos um vasto domínio ultramarino, e não se compreende que exista uma nação com tam vastos domínios, sem ter uma defesa naval activa, sem que sirva de garantia de defesa da nossa marinha mercante.

Diz-se que a Holanda tem uma defesa bem organizada com um orçamento pequeno.

Nós tambêm, com um pequeno aumento nas despesas ordinárias, sem agravar sensivelmente o nosso orçamento, poderíamos ter uma marinha menos mal organizada, que se pudesse apresentar em frente de amigos e inimigos, para a defesa nacional.

Eu entendo que o país não deve recuar; é uma questão de vida ou de morte para nós.

É preciso que nós nos preparemos, à custa de todos os sacrifícios e de muito trabalho, a fim de nos podermos manter, com honra e dignidade, perante as grandes na coes.

Nós devemos estreitar as nossas relações com iodas as nações da Europa, mas para isto não bastam doutrinas teóricas do pacifismo, porque o pacifismo é um sonho que ainda vem muito longe.

Nós não podemos deixar de estar armados; para manter a paz é preciso preparar-se para a guerra. Não podemos fugir a esta lei.

Veja V. Exa. como nações que tinham armadas quási nulas, como a nossa, se tem preparado; mesmo a nossa vizinha Espanha, que na guerra com os Estados Unidos da América perdeu os seus vastos domínios ultramarinos e quási toda a sua esquadra, procura hoje reconstitui-la, não recuando diante de sacrifício algum.

Sr. Presidente: as nações mais ilustres, como a Inglaterra, a Alemanha e a Itália, etc., preparam a opinião pública por meio de conferência, de livros e de imprensa, quando se trata dêstes problemas que interessam a honra e a vida nacional. São campanhas sistematicamente organizadas para que o povo se compenetre bem do seu alcance.

Pois bem, eu enteado, Sr. Presidente, que todos nós que trabalhamos pela República, analogamente temos o dever moral de fazer compreender à Nação a necessidade de fazer um grande sacrifício para nos armarmos e de fendermos.

Temos estado a falar dos minguados recursos, como se porventura nós estivéssemos nesta situação. Entendo que não deve ser assim. É preciso que se diga alto e em bom sem que a República não siga os mesmos processos da monarquia. É falso. Estou convencido de que o desenvolvimento da riqueza pública se fará e que nós poderemos adquirir material de guerra que coloque Portugal como um valor perante a nossa aliada.

É preciso que acabemos com a calúnia que tem pretendido reduzir muito o nosso valor moral. Estou convencido de que o Govêrno da República nos acompanha neste grande pensamento de; por todas as formas, fazer a defesa da República.

E todos nós devemos trabalhar nessa grande obra.

Tenho dito.

O Sr. Correia Barreto: - Sr. Presidente: tem-se dito que a nova organização militar traz encargos importantes para o Ministério da Guerra. É claro que se estabeleci aquela organização militar foi porque a julguei indispensável à defesa do país.

Poderia ter errado, mas a reforma foi feita com boa intenção. (Apoiados).

Se realmente houvesse aumento de despesa, ainda assim não hesitaria em fazer a reforma do exército como a concebi, porque estava convencido que era útil ao meu país.

O actual orçamento do Ministério da Guerra é o que foi feito no meu tempo, em que se fizeram alguns cortes é um orçamento que só pode chamar honrado.

[Ver valores da tabela na imagem]

O orçamento ordinário proposto para o ano económico de 1911-1912 é de
A despesa extraordinária é de
O que dá o total de
O orçamento de despesa ordinária e extraordinária para o ano de 1909-1910 foi de
Aumento de despesa para 1911-1912

Ora nós todos sabemos com que seriedade eram feitos os orçamentos, por isso as verbas neles inscritas eram sempre inferiores às correspondentes despesas.

Por isso, em 3 de Fevereiro de 1910, abriu-se um crédito de 7:937$600 réis e, em 25 de Maio do mesmo ano, outro crédito de 380:244$983 réis, o que dá uma totalidade de 388:182$583 réis, que, abatida ao aumento da despesa para o ano de 1911-1912 reduz êste a réis 1.126:152$550.

Mas o Ministério da Guerra tem em serviço a mais do que dispõe a actual organização militar, dezasseis mil e tantas praças, com as quais faz despesa em pré, rancho, fardamento, etc., de 873:520$610 réis.

Também pela organização ficaram fora dos quadros oficiais generais, oficiais das diversas armas e serviços e 19 bandas de música, etc., cuja despesa é na importância de 472:104$140 réis.

Subtraindo estas duas quantias ao acréscimo de despesa do Ministério da Guerra para o actual ano económico, verifica-se que, posta em plena execução a actual organização da exército, não só não haverá aumento de despesa, mas uma redução de 219:572$600 réis.

É uma diferença grande, devendo notar-se que no tempo da monarquia não havia instrução alguma para as praças que não eram chamadas ao serviço das fileiras e actualmente, com o serviço militar obrigatório, tem de se instruir anualmente 36 mil mancebos. São, pois, 36 mil soldados bem instruídos com que o país pode contar todos os anos para a sua defesa.

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É claro que êste Orçamento, como muito bem disse o Sr. Ministro da Guerra, só tem uma pequena verba para material de guerra, em todo o caso alguma cousa há. Para dotação do Arsenal do Exército, a maior fábrica militar do país, está consignada a verba de 760:000$000 réis, dos quais 365:000$000 são destinados ao pagamento de mão de obra e 395:000$000 à aquisição de materiais. Êstes números mostram que o regime económico e administrativo do Arsenal do Exército deixa muito a desejar, mas a anormalidade melhor se acentua examinando as dotações dos diferentes estabelecimentos fabris. Antes disso, devo dizer a V. Exa., Sr. Presidente, e é bom que se saiba, que no tempo da monarquia, devido a empenhes, admitia-se no Arsenal do Exército toda a qualidade de gente: coxos e havia cegos, velhos já reformados, incapazes de serviços, e que estavam dados para serviços violentos; daí a grande quantidade de pessoal, pouco idóneo, que os estabelecimentos fabris ainda hoje possuem e que, junto ao pessoal extraordinário que foi admitido em ocasião em que dele havia necessidade e que devido a empenhos não foi despedido quando o seu serviço se tornou desnecessário, tornam grande o desequilíbrio entre a importância da féria e a do material.

A fábrica de pólvora sem fumo tem para féria réis 62:000$000 e para material 136:000$000; tem, por tanto, bom regime industrial devido à sua recente instalação, dotada com os mais modernos maquinismos e com o pessoal indispensável para a sua laboração, tendo-me sempre oposto tenazmente à admissão de pessoal desnecessário.

A fábrica de pólvora negra tem 38:000$000 réis para féria e 32:000$000 réis para material, mas nesta fábrica aplica-se a maior importância da féria porque trabalha com materiais muito pobres, tais são o salitre, o enxofre e a madeira de salgueiro.

A fábrica de material de guerra tem para féria réis 215:0000000 e 202:5000000 réis para material; é notável o desequilíbrio entre a féria e o material, tanto mais que esta fábrica emprega matérias primas caríssimas, tais como cabedal, aço e outros metais e madeiras caras, entre Bestas a nogueira.

Êste desequilíbrio tem a sua explicação, e para isso chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra no facto de haver muito pessoal a mais.

Quis remediar um pouco êste estado de cousas ordenando que 15 correeiros extraordinários fossem para a fábrica de calçado para o exército, onde iam trabalhar com as máquinas. Pois como na fábrica de calçado os obrigavam a trabalhar, o que não sucedia na outra por serem mais do que os necessários, insultaram-me nos jornais e o facto é que alguns, quási todos, voltaram para o Arsenal.

Evidentemente que esta fábrica luta com dificuldades para pagar ao pessoal.

Relativamente ao material que se pode fabricar no país, direi que pode manufacturar-se todo o cartuchame na fábrica de Cheias, produzindo-se até 100 mil em 10 horas de trabalho. Já hoje existem naquela fábrica as máquinas
necessárias para isso.

Com relação às munições de artilharia de campanha e de montanha, existe a fábrica de material de guerra que, se ainda não produz munições, é porque não tem montadas todas as máquinas necessárias, podendo então o país contar com o fabrico das referidas munições.

Falta-nos o fabrico das espingardas. Não é, porem, difícil fabricá-las cá no país, e para isso mandei adquirir os maquinismos necessários para o fabrico diário de 50 espingardas, ficando no país a importância da mão de obra e de várias matérias primas e os lucros do fabricante, que não são para desprezar.

Ternos 50 espingardeiros, mas por deficiência de maquinismos não se produz uma só espingarda; os operários limitam-se a ajustar as peças respectivas que vem de fora...

Se se entender quê o fabrico de 50 espingardas em 10 horas de trabalho é insuficiente para as necessidades do exército, pode duplicar-se a produção com pequeno dispêndio; basta adquirir as máquinas de menor produção em número suficiente para acompanharem as que produzem grande número de peças.

Não se pense que o material de guerra fabricado no país sai mais caro do que o adquirido no estrangeiro; é o contrário.

O cartucho da espingarda custa hoje 20 réis; vindo de fora, seria o seu preço 32 réis o que representa uma diferença de 12:000$000 réis em cada milhão, de modo que com a produção actuai de 9 milhões por ano, economiza o estado anualmente 108 contos de réis, que as fábricas estrangeiras deixam de ganhar.

Portanto apelo para a alta inteligência e muito saber conhecidos de todos nós e para o patriotismo do Sr. Ministro da Guerra, para prover a pouco e pouco, porque o país não pode despender uma grande quantia duma só vez, a êste estado lastimável do nosso material de guerra, porque, como muito bem disse o Sr. Eusébio Leão, é necessário que o nosso exército tenha o valor material e moral convenientes para nos defender duma agressão.

O Sr. Ministro da Guerra:-É apenas para dizer ao Sr. Ministro da Guerra do Govêrno Provisório que tenho muito prazer de ter ocasião de enaltecer mais uma vez os grandes serviços que S. Exa. tem prestado ao exército.

É certo que V. Exa. conhece bem as fábricas de material de guerra do nosso país e que, conseqúêntemente, V. Exa. sabe que o problema que se me propõe resolver não é de extrema facilidade; entretanto prometo abordá-lo, se tiver tempo para isso, o melhor que me seja possível.

O Sr. Azevedo Gomes: - Sr. Presidente, pedi a palavra depois das declarações do Sr. Ministro da Guerra, que S, Exa. entendeu dever fazer perante o Senado, por lhe parecerem necessárias ao país, tratando-se da mesma questão da defesa nacional.

Ora, sôbre o modo de a resolver eu divirjo da opinião de S. Exa. e da maioria dos que a tem tratado.

Entendo que, por melhor que seja a nossa organização militar, quer de mar, quer de terra, ela não pode por si só garantir a nossa autonomia e a integridade do território na metrópole e nas colónias e que, portanto, para que a nossa defesa se torne eficaz, tem forçosamente de se. apoiar sempre na aliança duma grande potência.

Creio que será de todo o ponto patriótico e racional fazer que a nossa organização militar parta desta base, nestes termos: que o sacrifício que ela exige ao país seja empregado de modo que nos dê o máximo valor para a aliança, qualquer que seja a grande potência ou grupo de potências. (Apoiados).

Ora esta questão é muito importante e, portanto, parece-me que o nosso objectivo político se deve definir e estabelecer numa sessão do Congresso, reunidos os Senadores e os Deputados.

Aí se deve estabelecer e definir os princípios básicos dessa organização, quer das fôrças de terra, quer das forcas de mar.

É êste o alvitre que eu apresento a V. Exa. e ao Senado.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Sr. Presidente, eu não calculei que a minha moção ocupasse por tanto tempo a atenção do Senado e provocasse tão patrióticas afirmações.

Pediu-me o Sr. Artur Costa que a retirasse. Não cedo aos desejos de S. Exa.. Não posso retirar a minha

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moção porque tenho sempre o cuidado de não fazer afirmações gratuitas e só apresento a minha opinião quando estou inteiramente convencido da verdade dela.

Sr. Presidente, folgo imenso que a minha moção tenha dispertado sentimentos tão patrióticos em todo o Senado e que ela dêsse origem a elogiar-se tam merecida e eloquentemente o nosso valor militar e os serviços do nosso exército.

Permita-me, porém, o Sr. Eusébio Leão que lhe diga que o respeito dos estranhos para com a nossa Pátria não há-de provir do alarde de fôrças militares, quer elas sejam de mar, quer sejam de terra. Êsse respeito há-de provir da honradez e do bom critério na nossa administração pública e da elevação da nossa cultura intelectual. (Apoiados).

E neste ponto, Sr. Presidente e Srs. Senadores, nós estamos abaixo de toda a Europa.

Somos a nação cuja percentagem de analfabetos é maior.

O que nos há-de honrar perante o mundo, é fazer cessar êste estado de coutas, verdadeiramente lamentável.

Se nós, pela situação geográfica das nossas colónias, estamos em íntimas relações com a França, a Alemanha e outros países, para que êles nos respeitem é preciso não lhes darmos e ao mundo a impressão de que vivendo próximos de Marrocos temos o mesmo grau de civilização.

Sr. Presidente, temos muito que fazer em todos os ramos da administração pública.

Nós temos que gastar na instrução milhares e milhares e contos de réis.

Ilude se o país se pensa que apenas com algumas centenas de contos de réis, pode refundir e aperfeiçoar tudo o que diz respeito à instrução.

Eu já na Assembleia Constituinte tive ocasião de dizer que havia lido algures que o Inspector da Circunscrição Escolar, com sede em Coimbra, afirmara que só para a sua circunscrição precisava de milhares de contos.

Eu não acho excessiva esta verba, porque a verdade é que nós temos que construir um grande número de edifícios para escolas, visto que a maior parte delas estão instaladas em casas particulares pelas quais se paga renda, e que não estão nas precisas condições higiénicas, não sendo, portanto, próprias para receberem as crianças que ali passam uma grande parte da sua vida.

A falta dessas condições higiénicas dificulta o desenvolvimento físico das crianças e em parte prejudica o desenvolvimento moral.

Sr. Presidente, nós temos que convencer-nos de que exigindo a solução de tam grave problema o dispêndio de milhares de contos de réis, é loucura gastar perduláriamente com outros serviços menos importantes.

Além da instrução, nós temos de reorganizar quási todos os outros serviços nacionais, temos de atender a todas as urgentes e precisas obras de fomento.

Temos tambêm ainda de remodelar a nossa justiça, e agora refiro-me em especial ao Sr. Artur Costa que disse que o respectivo Ministério era aquele que não merecia reparos pela sua boa administração.

O Sr. Artur Costa: - O que eu disse era que o orçamento do Ministério da Justiça estava muito reduzido.

O orador: - Ora V. Exa. sabe que a causa que deve merecer as nossas melhores atenções é a justiça.

V. Exa. sabe perfeitamente que só pode recorrer à justiça quem é rico.

Ao pobre está fechado êsse templo augusto.

Temos de tornar a justiça, se não gratuita, pelo menos mais barata, e para isso é forçoso aumentar o orçamento do respectivo Ministério.

Também ainda ha poucos dias ouvimos dizer ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros do Govêrno Provisório que se queríamos manter o nome glorioso que nos legaram os nossos antepassados era necessário que conservássemos as embaixadas, e que deveríamos não reduzir, mas sim aumentar as despesas daquele Ministério.

Enfim, eu vejo que todos se queixam de que as tabelas dos seus Ministérios são muito restritas para as suas necessidades e que é necessário obter receitas, para fazer face ás despesas indispensáveis.

Eu folgo que todos nesta Câmara estejam dispostos a votar tambêm os maiores sacrifícios, para que o exército esteja à altura da sua alta missão, e para que a nossa marinha se reconstrua, para que ela se torne digna da República Portuguesa.

A minha moção reclama apenas a harmonia e conformidade das despesas do Ministério da Guerra com as actuais receitas do Tesouro.

Não esqueçamos que o Sr. Ministro das Finanças ainda há pouco nos falou assim: Onde temos nós matéria tributária? Estão ou parecem quási esgotadas todas as fontes de impostos, não será, talvez possível exigir mais sacrifício ao contribuinte".

O Sr. Ministro das Finanças, que tem obrigação de observar com atenção o estado económico do país e de estar bem informado a êsse respeito vem dizer-nos em tem aterrador que temos chegado quási aos limites dos impostos, e ao mesmo tempo aumentam-se as despesas em outros Ministérios, esquecendo-se porém entre outros essenciais o problema da instrução primária, aquele que devia em primeiro lugar acudir ao nosso espírito, que devia ser o primeiro a ser resolvido para honra do nosso país.

Eu oficial do exército, que passei a minha vida junto doa soldados, que apenas há um ano deixei o convívio com a tropa para exercer uma comissão, conhecendo a vida militar na caserna o nos campos de exercício, poderia esquecer os meus companheiros?

Certamente que não. Certamente que desejo o aperfeiçoamento do exército mas em harmonia com os recursos da Nação. Direi, porém, tambêm que voto que se organize um exército apto para defender a Pátria, mas não um exército fictício que só conste de efectivos no papel e sem recursos materiais. É preciso um exército instruído e bem preparado que possa defender a Pátria com honra e dignidade. Nós não estamos nas mesmas condições, em que estávamos no tempo da monarquia, em que o exército era apenas destinado ao serviço de polícia.

Devo lialmente declarar que isso não era devido aos oficiais não estarem em condições de desempenhar a sua missão, porque rae parece que não exagero dizendo que êles estavam a altura dos mais distintos oficiais da Europa. Senão tinham a prática dos exercícios, no entretanto pela sua inteligência, pelo seu estudo, pelos seus trabalhos, achavam-se em condições de cumprir a sua nobre missão. Isto que digo com respeito aos oficiais pode-se dizer tambêm com toda a justiça a respeito dos sargentos.

Sr. Presidente, quanto à matéria prima, do exército, permita-se-me a frase aos soldados se êles eram em pequeno número e menos instruídos é porque a monarquia só pensava no exército para defender as instituições e êsse pequeno número provou sempre ser da melhor qualidade.

Desejo por isso que um exército com tam bons elementos seja devidamente aperfeiçoado.

Cumpre-me nesta altura afirmar categoricamente que os princípios em que se baseou a actual organização do exército não são uma novidade, uma descoberta dos seus auto rés, são urna velha aspiração de todos os republicanos que desde o principio da propaganda sustentavam sempre que a organização militar, devia ter por base o serviço obrigatório e que o exército permanente devia ser reduzido aos quadros.

A realização desta aspiração deve ser feita com prudência e critério.

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Há ainda uma pequena cousa que o Sr. Senador Barreto esqueceu na sua defesa do orçamento do Ministério da Guerra.

As praças que vem agora prestar serviço não ficam permanentemente nas fileiras. É necessário portanto que o país tenha uma polícia para substituir o exército e a Guarda Republicana que tem de ser aumentada. Por consequência ainda que pela nova organização não houvesse aumento de despesa no Ministério da Guerra, havia de aumentar fatalmente a despesa do Ministério do Interior que paga à referida guarda. E uma consequência necessária da nova organização militar. Terei ocasião de provar, que essas economias que V. Exa. apontou, não são absolutamente exactas a despeito dos seus cálculos.

No entanto devo afirmar que creio que todas as medidas de S. Exa. foram tomadas na melhor das intenções. Estou perfeitamente convencido de que a organização do exército muito tem de aproveitável; mas é certo tambêm, que algumas modificações tem sucessivamente de fazer-se.

As despesas feitas por S. Exa. foram com certeza inspiradas, no desejo de prestar ao seu país um bom serviço e seriam justificadas, se houvesse tambêm no orçamento aumentos de receita.

O que eu acho condenável é que neste como em qualquer outro Ministério, não havendo aumento de receita, geral haja aumentos de despesa.

Não esqueçamos que o Sr. Ministro das Finanças fez a declaração de que a matéria tributária estava quasi esgotada em virtude da aprovação da contribuição predial.

Não tive o pensamento de especialmente censurar o Ministro da Guerra, apresentando uma moção deplorável somente quando se discutia a tabela das despesas do referido Ministério.

Se não apresentei idênticas por ocasião da discussão dos outros orçamentos, fui porque a minha posição de militar me obrigava a mais especialmente discutir êste que é relativo à minha profissão. Os meus colegas Senadores cada um conforme a sua profissão e estudos, proficientemente discutiram os outros orçamentos.

Os veterinários, agrónomos e engenheiros discutiram com toda a proficiência a tabela de despesa do Ministério do Fomento. Ilustres oficiais de marinha, discutiram com igual proficiência a tabela de despesa do seu Ministério. Pareceria, conservando-me silencioso, ou que eu não tinha competência e disso estou certo, (Não apoiados) para apreciar os assuntos do Ministério da Guerra, ou, que eu tinha pouca atenção para com os titulares dêsse Ministério não expondo com sinceridade as minhas opiniões. Eis a razão porque, na altura da discussão dêste Orçamento, apresentei a minha moção; mas Sr. Presidente a minha maneira de pensar é perfeitamente igual, infelizmente, com relação a todos os outros Ministérios porque os números são números e eu não fantasio, nem exagero, todas as despesas excessivas com relação aos recursos do Tesouro.

Um distinto membro da Comissão de Finanças procurou convencemos de que com os 500 contos de réis de diminuição do imposto do consumo e os 1:500 contos de réis resultantes do serviço militar reduzido, o país tinha sido beneficiado em quantia tam importante que em face dela era insignificante o déficit de 1:900 contos de réis, e que portanto nós estávamos numa situação desafogadíssima. Ora eu respeito muito S. Exa., acho realmente judiciosas; as suas afirmações mas não se trata neste momento de economia nacional, mas sim das finanças do Estado.

O Tesouro tem de receber e pagar, e o que eu vejo é que as despesas excedem as receitas, que, em vez de saldo há um déficit de 1:900 contos de réis. Portanto, lavro o meu protesto contra qualquer aumento de despesa, em qualquer Ministério, sem o correspondente aumento na receita geral do Estado.

O Sr. José de Padua: - Desisto da palavra.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais ninguém inscrito, vai votar-se.

Posta à votação q generalidade do parecer, foi aprovada. Passando-se à especialidade, foram aprovados, sem discussão, todos os capítulos.

Foram tambêm aprovadas sem discussão as despesas suplementares e extraordinárias, assim como as alterações feitas ao projecto pela comissão de finanças da Câmara dos Deputados.

Foi rejeitada a emenda apresentada pelo Sr José de Pádua, assim como a moção do Sr. Goulart de Medeiros.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à discussão, na generalidade, do orçamento do Ministério do Interior.

Leu-se o respectivo parecer que é o seguinte:

Senhores Senadores: A vossa comissão de finanças, analisando rapidamente o projecto do orçamento do Ministério do Interior, pois que, infelizmente, não teve tempo para mais, vem declarar-vos que achou todas as despesas descritas na melhor ordem e com a maior clareza, à excepção dos pequenos lapsos apontados no relatório da comissão de finanças da Câmara dos Deputados.

Desta forma não nos fui difícil destacar as seguintes verbas, para as quais chamamos a vossa especial atenção:

[Ver valores da tabela na imagem]

A despesa ordinária autorizada no orçamento de 1911-1912 foi de

Esta despesa podemos dividi-la em duas grandes partes:

a) Pessoal dos quadros; b) na disponibilidade; c) adido e d) menor
Material e despesas diversas, subsídios, etc.

Apesar da extrema rapidez com que redigimos êste ligeirissimo parecer, não resistimos ao desejo de pôr diante dos vossos olhos mais as seguintes cifras, que vem corroborar exuberantemente a pletora de empregados na disponibilidade e adidos, que se verifica em todas as nossas repartições públicas:

Pessoal na disponibilidade:

[Ver valores da tabela na imagem]

Secretaria do Congresso da República
Administração pública e civil
Instrução primária
Total

Pessoal adido:

Secretaria do Congresso da República
Administração política e civil
Saúde pública
Assistência Pública
Instrução secundária, superior e especial Instrução primária
Total

Ressalvando qualquer lapso que, por ventura, tenhamos cometido, em consequência da precipitação com que escrevemos êste pequeno relatório, aí deixamos êsses números, os quais, a nosso ver, mostram bem a necessidade imperiosa que temos de examinar cuidadosamente todo o pessoal que se distribui pelas diferentes repartições a cargo do Ministério do Interior, para que, inteligentemente

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10 DIÁRIO DO SENADO

e gradualmente, se vão reduzindo as despesas feitas com os empregados na disponibilidade e adidos.

Notai, Senhores Senadores, que, ao mesmo tempo que se observa esta grande acumulação de empregados, há repartições onde os serviços correm demorados, e para justificar essa morosidade., argumenta-se com a falta de pessoal nas mesmas repartições. Sendo assim, provado fica que o funcionalismo do Ministério do Interior está mal repartido.

Antes de fecharmos estas breves considerações, deve mós exprimir a nossa profunda mágua, por vermos quanto exíguas são as verbas destinadas à Instrução, à Higiene e às Belas Artes. Mas, de todas as deficiências que deixamos apontadas, não tem culpa o actual Govêrno, Por isso, temos a honra de propor-vos que aproveis êste projecto de orçamento, com as emendas que lhe introduziu a Câmara dos Deputados, reservando a vossa reflectida e conscienciosa crítica para o futuro Orçamento, que será apresentado no próximo dia 15 de Janeiro.

Sala da Comissão de Finanças do Senado em 29 de Dezembro de 1911.= José Maria Pereira, presidente = José Nunes da Mata = Abel Botelho = Feres Rodrigues = Tomás Cabreira = José Miranda do Vale = Alfredo Botelho de Sousa = Ladislau Piçarra.

O Sr. Ladislau Piçarra: - Sr. Presidente, eu desejava fazer uma análise um pouco demorada sôbre umas cifras que figuram no orçamento do Ministério do Interior, mas, em virtude do adiantado da hora, limito-me. a chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior e dos Srs. Senadores para algumas das verbas que figuram neste orçamento, para que no futuro orçamento elas sejam modificadas a bem dos interesses do país.

Devo dizer que neste Ministério, como aliás em todos os demais Ministérios, avultam as grandíssimas verbas destinadas a sustentar o pessoal burocrático.

As repartições públicas estão perfeitamente repletas de pessoal, e, alem do pessoal normal, tem um outro pessoal que serve só para auxiliar a sangria aos cofres públicos.

(Leu).

Quere V. Exa. saber a quanto monta a despesa feita com o pessoal dêste Ministério?

(Leu).

Quere dizer, êste pessoal absorve muito mais dinheiro que todos os outros serviços.

Neste Ministério avulta tambêm o pessoal chamado na disponibilidade e o pessoal adido.

O pessoal adido absorve 78 contos de réis, e o pessoal na disponibilidade 67 contos de réis.

Peço licença para ler tambêm quanto se gasta neste Ministério com o pessoal adido da Secretaria do Congresso da República.

(Leu).

Neste orçamento o que me impressiona muito dolorosamente, é a insignificante verba destinada à instrução, à higiene e às belas artes. Não é êste o momento para uma dissertação a tal respeito.

Estou de acordo com o Sr. Goulart de Medeiros: um país que discursa os interesses mais vitais, como são a instrucção, a higiene e as artes, êsse país não tem o direito de sobrecarregar o contribuinte, para realizar a chamada defesa nacional.

Mais uma vez declaro que não votarei nenhum aumento de despesa para a defesa nacional, se paralelamente não se aumentarem as verbas para a defesa dos interesses que mais importam ao futuro do país.

Realmente, seria até irrisório perante os estrangeiros, o facto de continuarmos a votar ao abandono os serviços mais vitais do. país, tais como: a instrução, a higiene, a indústria, etc., para só cuidarmos da nossa organização militar.

Para quê? Para defendermos um território que, num futuro, mais ou menos próximo, deixará de pertencer-nos se nesse território não soubermos desenvolver a agricultura, o comércio e a indústria.

Nós precisamos primeiro de desenvolver a instrução, e, a par da instrução, ir fomentando a nossa riqueza pública.

O Sr. Eusébio Leão: - Espere V. Exa. pelas consequências dessas teorias!

O Orador: - Enquanto se não cuidar a sério, enquanto se não olhar atentamente para o nosso desenvolvimento intelectual e moral, acho perfeitamente descabidos os sacrifícios que se exigem para a defesa militar.

Uma voz: - São precisas todas as defesas.

O Sr. Eusébio Leão: - Nessa grande luta económica travada em todas as nações civilizadas, não está, porventura, o aumento das despesas militares; quere dizer: no fundo dessa luta económica não está o aumento das despesas com a organização da defesa armada?

São precisas ambas as cousas: a instrução e a defesa armada.

O Sr. Adriano Pimenta: - Ambas não, mas sim todas as cousas.

O Orador: - Eu, simplesmente, o que quis agora frisar, foi o facto de termos impreterivelmente de sanear as repartições públicas. É preciso proceder-se a êsse saneamento.

O Sr. Artur Costa: - No final estamos todos de acordo. (Apoiados).

A monarquia deixou todos os serviços em tal estado, que se chega- à conclusão de que é preciso tudo: instrução, defesa armada, medidas de fomento e de higiene. É preciso tratar-se tudo. Não devemos, porém, ir depressa, porque poderemos cair.

O país tem recursos, e, portanto, não devemos desanimar.

Não ha dúvida que, como diz o Sr. Piçarra, a principal alavanca para o nosso ressurgimento, é a instrução.

Ao contrário do pessimismo do Sr. Inspector da 2.ª Circunscrição, que calcula em 20.000:000$000 réis a verba necessária para a organização dos serviços de instrução primária, na sua área, eu suponho que não será precisa uma tam importante quantia.

Temos o recurso às Escolas Móveis, que dão muito bom resultado e demandam pequenas despesas.

O Sr. Ladislau Pigarra: - Não servem para a infância; são só boas para adultos.

O Orador: - Temos; 70 por cento de analfabetos, e se conseguíssemos reduzir essa percentagem, pelas escolas móveis, a 50 por cento, já teríamos prestado um grande serviço à causa da instrução.

A propósito de instrução é que eu com sentimento vejo que no Ministério do Interior as despesas com a instrução primária desceram, era relação ao Orçamento de 1909-1910, 300 contos de réis.

Eu sei que quando se inscreveu esta verba no Orçamento havia a ideia de que no dia 1.° de Janeiro a despesa com a instrução primária passasse para cargo das

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SESSÃO N.° 18 DE 29 DE DEZEMBRO DE 1911 11

Câmaras Municipais e estas teriam de ir procurar receita para êsse custeio, para o qual se consignava no Orçamento o subsidio de 350 contos de réis.

Sob êste ponto de vista, o problema é muito melindroso, e eu resolvi chamar a atenção de S. Exa. para êste facto, porque uma grande maioria, pode dizer-se que a quási totalidade das Câmaras Municipais, está impossibilitada de recorrer a novos impostos para occorrer a essa despesa.

V. Exa., reduzindo o seu Orçamento em 300 contos de réis, quis mostrar que o Estado deixava de gastar esta quantia com a instrução primária; mas V. Exa. vai sobrecarregar as Câmaras Municipais com mais esta despesa, que elas não estão habilitadas a solver.

Há Câmaras Municipais, como por exemplo a da Guarda, que tem uma receita geral de 17 contos de reis e onde hoje a instrução pública do seu concelho lhe custa já 12 contos de réis.

O que será quando lá tiver mais escolas!

Isso ou é a falência imediata das câmaras municipais ou então temos de as autorizar a lançar adicionais nas suas contribuições, para elas poderem ocorrer a essas despesas.

Por consequência, nós temos de estudar com muitíssimo cuidado o problema da instrução primária no nosso país, de forma que a instrução possa marchar sem os grandes encargos que advêm das faltas de dinheiro.

Há outro ponto importante, que tambêm já foi tratado nesta Câmara, que é o dos professores aposentados.

Eu vejo com sentimento que está consignada neste orçamento uma verba de 65 contos de réis, importância com que o Tesouro tem de concorrer para a Caixa de Aposentações.

Quere dizer, pelo decreto de 24 de Dezembro de 1890 o Estado tem de concorrer com 65 contos de réis, para as aposentações.

Isto demonstra à evidência que o rendimento desta caixa não chega para ocorrer a essa despesa, que de outra forma nós não teríamos as escolas sem professores, porque muitos deles foram dados por incapazes e estão há muito tempo á espera que se prepare o processo da sua aposentação.

Há pouco, numa interpelação, chamei aqui a atenção do Sr. Ministro do Interior, para o facto duma escola que tem 150 alunos e está sem professor há 2 anos, porque o que lá estava passou à inactividade, mas não está aposentado, porque não há verba para isso, e desta forma não se pode colocar lá outro.

Francamente, termos professores que não estão aposentados e que não fazem serviço, mas que recebem ordenado como se estivessem a fazer serviço é um duplo mal.

Há tambêm uma verba de despesa no orçamento.

Leu.

O Sr. Ministro do Interior (Silvestre Falcão): - Essa verba está errada.

O Orador: - Então não insisto mais neste ponto.

São 24 contos de réis, e estão aqui 10 contos de réis.

Como porem o Sr. Ministro reconheceu o êrro, que é um mero lapso tipográfico, não insisto neste ponto.

Eu tenho a certeza de que o problema da instrução primária preocupa todo o país, mas estou igualmente convencido de - que a solução dêsse problema não demanda uma verba tam importante, como outros serviços, que são tambêm da maior utilidade.

Disse o Sr. Ladislau Parreira que a defesa do país não se faz com homens ilustrados.

O Sr. Ladislau Parreira: - O que eu disse foi que talvez não chegassem a tempo.

O Orador: - Quanto o povo for mais ilustrado, mais êle se encontrará nas condições de defender a sua Pátria.

Tenho dito.

O Sr. Silva Barreto:-Disse o Sr. Ladislau Parreira que a Pátria ia-se defender com analfabetos. Eu Protesto ...

O Sr. Ladislau Parreira: - V. Exa. dá-me licença?

Eu disse que, se nós esperássemos pelos soldados ilustrados, talvez que êles não chegassem a tempo.

O Orador: - Essas palavras é que eu não tinha ouvido.

V. Exa. sabe muito bem que os Estados Unidos da América do Norte bateram-se valentemente contra a Espanha, e os soldados dessa República são dos mais instruídos do mundo.

O que eu não queria é que se fizesse no Parlamento a afirmação de que a Pátria só se pode defender com analfabetos, ou indivíduos pouco instruídos.

Diz se que é de boa política votar-se êste orçamento sem demora, e aguardar, para uma discussão ampla, o que foi apresentado em Janeiro.

Quanto ao Orçamento actual, eu direi que êle me deixou uma desagradabilíssima impressão, se bem que muito peremptoriamente o compulsasse.

A reforma de João Franco, em volta da qual se fez tanto alarde, dizendo-se até que estava nela um belo futuro para a instrução, ficou conhecida pela reforma do pataco.

Pois a reforma apresentada pela República não passa tambêm, triste é dizê-lo, de uma reforma de pataco.

A reforma de instrução primária, que êste Parlamento tem de apreciar, confere ao professor um vencimento diário de 500 réis, e isto depois de se lhe exigir um curso elementar de seis anos, complementar ou superior de três anos e ainda quatro da Escola Normal!

É quási uma formatura em direito!

Pois êstes indivíduos, ao cabo de tanto trabalho, alcançam uma remuneração de 500 réis por dia!

E é por isto que eu digo que a Reforma da República é tal qual a de João Franco, uma reforma pataqueira.

Êste orçamento, pelo que respeita a instrução, está abaixo de todos os Orçamentos dos países mais atrasados da Europa.

Na própria Espanha, na Itália, etc., os professores não são bem remunerados; todavia, nas capitais, êles vencem ordenados superiores a 800$000 réis.

Em Portugal o nosso professorado recebe, o máximo, na capital, 375$000 réis por ano e mais 100$000 réis para renda de casas.

Com 100$000 réis, em Lisboa, só se arrendam pardieiros.

Os professores recebiam, no tempo da monarquia e recebem hoje, pela nova reforma da República, que tão festejada foi pelos subservientes, uma miséria.

A República, que tão generosa foi em pagar e dotar outros serviços, e sobretudo os do Ministério das Finanças, e para prova direi que os delegados do Tesouro só em quatro meses receberam, de emolumentos, 1 conto, 300 e tantos mil réis, devendo receber no fim do ano perto de 5 contos de réis, paga tão aparamente aos seus professores primários.

Ora, eu pergunto a V. Exa., se isto é próprio duma República democrata, liberal em excesso para certos funcionários, ao passo que deixa morrer de fome os educadores da mocidade portuguesa?

Reservo a minha liberdade de acção para discutir o futuro Orçamento, na parte que respeita sobretudo ao en-

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12 DIÁRIO DO SENADO

sino primário, fundamento inimitável da regeneração pátria, num futuro mais ou menos próximo. Por agora, limito me às ligeiras considerações que acabo de fazer. Tenho dito.

O Sr. Bernardino Machado: - Já teve ocasião de expressar aqui a sua opinião sôbre o Orçamento Geral do Estado.

Disse então que julgava absolutamente indispensável extinguir o déficit e que só havia uma forma de conseguir essa extinção, qual era a de acabar com a administração centralizadora a que o pais está sujeito.

No dia em que se der a autonomia necessária às províncias ultramarinas e às municipalidades da metrópole, ter-se há dado ao ultramar e á metrópole os recursos necessários para o progresso e desenvolvimento gerais da Nação.

Julga absolutamente indispensável uma reforma nesse sentido, e creia o Govêrno que, procedendo conforme a opinião dele, orador, fará uma reforma de alto alcance político e financeiro.

Chama a atenção do Sr. Ministro do Interior para as reclamações das juntas de paróquia, que são corporações verdadeiramente beneméritas, corporações que eram antigamente, o apanágio da rialeza, mas que são hoje o apanágio do povo.

Julga tambêm absolutamente indispensável o tratar-se da defesa nacional, mas julga igualmente indispensável notar que a principal fôrça da defesa militar consiste na fôrça individual do soldado, fôrça que reside, sobretudo, no seu valor moral e no seu valor físico. (Apoiados).

Aludindo ainda à descentralização administrativa, dirá que o partido republicano, quando na oposição, reclamou sempre a supressão das autoridades administrativas desnecessárias ao bem social. Os administradores de concelho e os governadores civis são prescindíveis; e, feita essa supressão, adviria para o Tesouro uma economia de mais de 300:000^000 réis, importância esta que deveria ser aplicada integralmente às cousas da instrução primária.

O discurso será publicado na íntegra quando S. Exa. devolver as notas taquigráficas.

O Sr. Ministro do Interior (Silvestre Falcão): - Vou responder resumidamente às diferentes considerações que fizeram os oradores que se referiram ao orçamento do Ministério do Interior.

O Sr. Piçarra queixou-se, e com muita razão, de que no Ministério do Interior havia muitos empregados. Não há dúvida de que assim é e estou convencido de que se pode vir um dia a reduzir o número de empregados dêsse Ministério, desde que se simplifiquem os serviços.

V. Exa. sabe perfeitamente que durante a vigência da monarquia havia a preocupação de complicar os serviços, porque dessa complicação resultava a criação de novos lugares, para os quais se nomeavam afilhados.

Daqui resultava que os serviços se complicaram por forma que é absolutamente impossível simplificarem-se dum momento para o outro.

Para V. Exas. fazerem uma pequena ideia do trabalho que há no meu Ministério, vou-lhes citar um facto.

Pelo que diz respeito a folhas para aluguer de rendas de casa e pagamento a professores, tem de se fazer todos os meses 24 mil folhas, visto que elas são em duplicado.

Note a Câmara que há só 4 empregados para fazer todo êste serviço.

É uma cousa tremenda e daqui resulta que todos os serviços estão atrasados, porque o número de empregados é insuficiente.

Eu estou convencido de que êste serviço se poderá modificar de forma a torná-lo mais fácil.

Acresce que a lei ultimamente decretada aumentou e muito o serviço daquela, repartição.

A própria lei do inquilinato veio aumentar êsse serviço, visto que tem agora de se fazer o pagamento da renda das casas aos meses, quando antigamente se fazia aos semestres ou anualmente.

O serviço está complicado; mas não é no prazo dum ano ou dois que se pode melhorar.

Iremos pouco a pouco vendo os empregados que se podem dispensar e estou convencido de que com o tempo se conseguirá o que se deseja.

Eu estou perfeitamente de acordo com o Sr. Ladislau Piçarra relativamente ao que S. Exa. disse com respeito á defesa nacional e â instrução.

Evidentemente é preciso cuidar da instrução e da defesa nacional.

Nós temes de cuidar da defesa nacional e tambêm de cuidar da instrução, tanto quanto possível, paralelamente.

Encontrámos o país num estado de decadência enorme.

Nós já fazíamos uma ideia de que corriam mal os negócios da nossa administração pública; mas o conhecimento exacto de toda a verdade só o adquirimos depois de cá estarmos.

O Sr. Artur Costa referiu-se a um assunto importante.

Referiu se S. Exa. ao facto das câmaras municipais não estarem habilitadas a pagar os serviços da instrução primária no próximo ires de Janeiro.

Efectivamente assim é e tanto que já há uma proposta a êsse respeito.

Uma voz: - Está votada.

O Orador: - Essa proposta vem dar-nos mais algum tempo para se poder regular o serviço de forma a que as câmaras municipais se habilitem a desempenhar a sua missão.

O Sr. Silva Barreto disse, e com muita razão, que o orçamento da instrução é deficiente.

Não pode deixar de ser deficiente.

O orçamento que vai ser apresentado à Câmara em Janeiro consigna para a instrução uma verba superior a 3.000:000$000 réis.

E maior a verba, mas ainda assim é insuficiente.

O Sr. Bernardino Machado referiu-se a umas economias que é necessário fazerem-se. Não há dúvida nenhuma, estão previstas nas reformas administrativas, e então reduzir-se hão as, despesas, desaparecendo as administrações de concelho, se for aprovada esta parte.

O Sr. Machado de Serpa: -Desaparecem os administradores de concelho? Agora?

O Orador: - Agora não; na reforma que se fizer.

O Sr. Artur Costa referiu-se a um êrro que há no orçamento, em vez de 10:000$000 réis, devem estar 40:000$000 reis.

Esta minha declaração bastará para que o assunto fique bem esclarecido.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Se algum dos Srs. Senadores tem a mandar algumas emendas para a mesa, sôbre alguns capítulos ou artigos, tem a bondade de o fazer.

Ninguém mais pedindo a palavra, foi o parecer aprovado na generalidade.

Posto em discussão, na especialidade, foram aprovados, sem discussão, todos os capítulos.

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SESSÃO N.° 13 DE 29 DE DEZEMBRO DE 1911 13

É posto em discussão, na generalidade, o orçamento do Ministério das Finanças.

Senhores Senadores. - A vossa comissão de finanças tendo estudado rapidamente o orçamento do Ministério das Finanças, vem apresentar-vos o seu parecer. O orçamento dêste Ministério atinge a verba de 40.653:226$971 réis, sendo 39.360:226$975 réis de despesa ordinária 1.293:000$000 réis de despesa extraordinária. Na despesa ordinária avulta a verba consumida com a dívida pública 32.057:572$412 réis, que absorve uma parte importante das receitas do Estado. Ao passo que a média das dívidas públicas nas despesas globais de todos os estados europeus é de 24 por cento, a dívida portuguesa, apesar d redução de 30 por cento nos juros da dívida interna atinge quási 48 por cento das receitas do Estado. Eis um herança terrível que nos deixou a monarquia.

Examinando a despesa dos serviços alfandegários, ré conhece-se ser muito reduzida, se êstes sofressem um transformação radical que os libertasse de muitas peia burocráticas que só prejudicam o comércio sem vantagem para o Estado. A estreiteza do tempo não nos permite fazer uma análise detalhada às outras verbas da despes ordinária e extraordinária, e por isso vos propomos que aproveis o orçamento do Ministério das Finanças, cora a alterações aprovadas na Câmara dos Deputados.

Sala das Sessões, em 29 de Dezembro de 1911. = José Maria Pereira, Presidente = Alfredo Botelho de Sousa = José Nunes da Mata = Tomás Cabreira = Ladislau Piçarra = José Miranda do Vale = Abel Botelho = Peres Rodrigues.

O Sr. José Maria Pereira: -Pedia a V. Exa. que consultasse a Câmara sôbre se deve entrar em discussão a receita e a despesa conjuntamente. (Apoiados.)

Consultada a Câmara, foi aprovado.

Foram lidos na mesa os pareceres sôbre a receita despesa do Ministério das Finanças.

Senhores Senadores. - No cumprimento do seu dever vem a vossa Comissão de Finanças, emitir o seu parecer sôbre o capítulo, Receitas do Orçamento de 1911-1912 agora em discussão; e, sem largos preâmbulos, de resto inúteis para o fim a que se propõe e impossíveis no curto prazo de que dispõe, limitar-se há ela a expor vos o que de concreto deduziu e apurou dos estudos a que procedeu.

O Orçamento, actualmente em discussão, é um trabalho sóbrio: as cifras que êle indica, no seu capitulo de Receitas, a que nos referimos, são as que sem exageros ou reservadas intenções optimistas, indicam, na consciência do estadista que os subscreveu, os mínimos possíveis, sôbre que se poderia contar; e é, talvez, por efeito dêste prudente e consciencioso raciocínio, que o Orçamento fecha por um déficit de 1.966:976$474 réis. Se não vejamos:

Baseado nas perspectivas duma colheita cerealífera que baste, no ano futuro, ao consumo do país, o Orçamento indica unicamente receita de 100:000$000 réis, para direitos de importação de cereais, quando esta teve a média de 1.206:808$564 réis, nos últimos três anos, em que as colheitas cerealíferas foram das mais abundantes do país, acontecendo, mesmo, que a menor importância cobrada por esta rubrica foi de 488:445$425 réis no ano económico de 1901-1902.

[Ver valores da tabela na imagem]

É, pois, indubitável que a mencionada verba de réis 100:000$000, que o Orçamento calcula como receita para 1911-1912, deve estar aquém da verdade e que, se tomarmos a média dos últimos três anos, ou seja de réis 1.206:808$564, o déficit se encontraria reduzido a réis
e se não fossem ainda os decretos de 22 e 27 de Dezembro de 1910, que beneficiaram a economia das classes menos abastadas, mas reduziram o imposto do consumo, sôbre carnes, banhas e azeites na importância de réis
o déficit, não seria senão de

verba que não pode considerar-se déficit orçamental dum país, onde as receitas tem progressivamente aumentado todos os anos mesmo alêm das previsões orçamentais, e onde as despesas não podem ÍF alem das orçadas e votadas.

Na hipótese, porém, de que fôsse demasiadamente restrita a importação de cereais, como o Orçamento prevê, o que é incontestável é que, êsse facto, se, por um lado, traria diminuição de receita, por outro lado iria influir poderosamente nos câmbios, visto que, não havendo que pagar trigo importado, o agro do ouro diminuiria grandemente e dele beneficiaria o Estado nos pagamentos que, em ouro, tem que fazer por efeito dos seus encargos no e para com o estrangeiro.

Do que precede, e sem necessidade de entrar no detalhe dos estudos a que esta comissão procedeu se verifica abundantemente que no Orçamento, ora presente, se reduziu algumas despesas, no justo desejo de atingir um equilíbrio porque todos anseiam e não se procurou, em todo o caso, valorizar as receitas com que seria lógico contar na factura dum documento desta natureza e num país cujas tendências progressivas, cada vez mais se manifestam e acentuam.

E é nestes termos que a vossa comissão de finanças tem a honra de vos porpor a aprovação do Orçamento das receitas no ano de 1911-1912, nos termos já sancionados pela Câmara dos Deputados.

Sala da Comissão de Finanças do Senado, em 29 de Dezembro de 1911. = Tomás Cabreira = Abel Botelho = Peres Rodrigues = Alfredo Botelho de Sousa = José Miranda do Vale = Ladislau Piçarra = José Maria Pereira, Relator.

Senhores Senadores. - A vossa comissão de finanças, examinando a proposta de lei relativa às receitas e despesas gerais do Estado, para o ano económico de 1911- 1912, aprovada já na Câmara dos Deputados, e, conformando-se inteiramente com a referida proposta, tem a honra de vos propor que igualmente a aproveis.

Sala das Sessões do Senado, em 29 de Dezembro de 1911. = José Maria Pereira, Presidente = Peres Rodrigues = José Miranda do Vale = Alfredo Botelho de Sousa--Tomás Cabreira = Ladislau Piçarra = A bei Botelho, Relator.

O Sr. Bernardino Machado: - A dívida pública portuguesa é tamanha que, crê bem, está patente a obrigação do Estado não contrair absolutamente nenhum empréstimo que possa vir ainda avolumar mais essa dívida.

Todavia é até certo ponto satisfatório o poder dizer-se que uma parte considerável da dívida portuguesa se encontra na mão de portugueses. Mas êle, orador, entende dever chamar a atenção do Congresso para a dívida flutuante externa, dívida cuja existência não é justificável.

Pelo que toca a receitas, deve chamar a atenção do govêrno para os rendimentos alfandegários.

É necessário não esquecer que em todo o país se pensa na reforma da pauta. Ninguém pretende, é claro, um ré-

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14 DIÁRIO DOS SENADOS

gime de livre câmbio mas há um proteccionismo legitimo, que resulta da afirmação da solidariedade nacional - o proteccionismo a certas indústrias juntamente com a precisa protecção ao operariado, pela limitação do trabalho e aumento de salários, e isto por modo que o operário possa instruir-se e valorizar a indústria.

A indústria dos tecidos, por exemplo, indústria que ocupa milhares de braços, necessita duma boa protecção.

Seguidamente o orador faz mais algumas considerações para demonstrar a necessidade de modificar a pauta, por forma a proteger as indústrias, o operariado e o povo em geral, e termina dizendo que, alem duma boa administração, se deve fazer tambêm uma boa política republicana.

Êste discurso será publicado na íntegra quando S. Exa. o orador devolver as notas taquigráficas.

O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Folgo de ter ocasião de responder ao ilustre Senador Sr. Bernardino Machado, antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros, porque concordo com quási todas as ideias expendidas por S. Exa.

Em relação à nossa dívida, que S. Exa. achou, como toda a gente, excessivamente elevada, devo dizer que efectivamente uma das medidas que tenho em vista, e que procurarei publicar na primeira oportunidade, é a consolidação da nossa dívida flutuante externa.

É efectivamente de grande importância que isso se faça, para nossa tranquilidade sob o ponto de vista financeiro.

Com relação à ideia que S. Exa. expendeu, com muito brilho, de não se dever fazer mais nenhum empréstimo, é que eu tenho uma pequena discordância da opinião de S. Exa..

Não creio que seja mau fazer qualquer empréstimo, quando êle se destine a medidas de fomento (Apoiados) que possam ser reprodutivas, ou quando tenha êsse empréstimo o fim de converter uma parte da nossa dívida, de forma a obter capital com um juro menor.

Há casos em que os empréstimos são perfeitamente admissíveis e, se nós não os aproveitarmos, não teremos maneira de impulsionar a nossa vida económica.

Sem lançarmos mão de recursos nada se pode fazer.

Para obtermos o nosso fim, simplesmente é preciso fazermos um empréstimo, mas é necessário que êsse dinheiro que entra, seja eficazmente aplicado, com cálculo e estudo, cousas que não havia no tempo da monarquia.

Se nós chegámos a êste estado financeiro em que hoje estamos, à monarquia o devemos.

Nós herdamos da monarquia esta situação; mas é preciso que nos convençamos de que pelo caminho que as cousas levam, pela honestidade com que os governos republicanos tem feito administração e pela forma como o Parlamento se interessa por todas as questões de ordem pública e pretende fiscalizar a acção do Govêrno, será impossível regressarmos ao tempo da acção monárquica.

Sr. Presidente e Srs. Senadores, não quero tomar muito tempo à Câmara, porque a hora está adiantadíssima; portanto pouco mais direi.

Com relação ao assunto de que se ocupou o Sr. Bernardino Machado e à afirmação que fez de que o nosso regime alfandegário deveria ser modificado, estou absolutamente de acordo com S. Exa., quando diz, que é necessário que o proteccionismo não redunde só numa protecção ao capital, mas tambêm, o seja para as classes operárias, que tam dignas são dela.

Êsse proteccionismo, porém, às classes operárias não depende do Ministério das Finanças, mas sim de leis quê hão de ser promulgadas pelos diversos Ministérios, e, sobretudo, pelo do Fomento, leis que se não podem fazer num instante, rem seria conveniente mesmo fazê-las assim, porque trariam desequilíbrio prejudicial ao País.

O operariado há-de conquistá-los pouco a pouco, o que não quere dizer que o regime republicano não concorra já em grande parte nesse sentido, tratando de dar ao operário grandes garantias.

O que quero acentuar é que êsse regime se não pode conseguir já, como porventura seria o desideratum do operariado e dos que tem lutado pelo bem das classes proletárias.

Falou tambêm S. Exa. na necessidade de reformar a nossa pauta.

Essa necessidade é evidente.

Tenho pensado já nisso, mas tambêm entendo que essa questão tem de ser muito bem estudada.

Há uma comissão nomeada no Ministério das Finanças para proceder a êsses estudos e há de ocupar-se deles, e logo que tenha momentos livres para isso apresentarei ás Câmaras as modificações que me parecerem razoáveis, quando não seja uma reforma completa da pauta.

Pôsto isto, por agora limito-me a estas considerações.

O Sr. Cupertino Ribeiro: - Sr. Presidente: é arrojo da minha parte pretender destruir argumentos que; um estadista consumado aqui veio trazer, mas a Câmara desculpará se porventura rio que vou dizer houver algum desasscrto.

Começarei por dizer que não posso concordar com a opinião aqui sustentada de que se não deve fazer mais empréstimos, que êles são prejudiciais, e devemo-nos remediar com aquilo que pudermos economizar.

Isto é, segundo o meu modo de ver, um êrro económico e eu conheço na minha vida prática quanto é vantajoso pedir-se dinheiro quando êste se aplica bem e dele se tira o resultado compensador.

A questão é que o dinheiro que se vai pedir seja aplicado proveitosamente, de modo a tirar dele resultado.

Eu comecei a minha vida por pedir emprestado, mas de tal maneira apliquei a minha actividade, que êsse pouco que pedi emprestado pude desenvolve-lo de tal forma que, em alguns anos, pude saldar aquilo que tinha pedido, ficando com alguma cousa para mim.

Nos Estados é muito mais difícil desenvolver o dinheiro dos empréstimo:;, mas as regras são as mesmas. Se porventura o Estado pede dinheiro para fomentar a sua riqueza e tirar daí resultados preciosos, êsses que daí tira em poucos anos vão saldar os encargos que se vão contrair: o país ganha na sua riqueza e satisfaz honradamente o que pede.

Vou dizer uma cousa a propósito disso e citar um exemplo.

Nós temos caminhos de ferro do Estado em que temos empregado cerca de 37.000:000$000 réis, dos quais o Estado apenas aufere três e tanto por cento de rendimento. Para podermos tirar um juro apreciável, seria preciso ainda gastar, para concluir os pequenos ramais que faltam para comunicar com todas as artérias, cerca de 7.000:000$000 réis; ora êsses 7.000:000$000 réis aplicados ao capital já gasto viriam, necessariamente, trazer uma compensação de receita que nos elevaria o rendimento a mais do dobro do que é actualmente. Por isso se vê que os empréstimos só são maus quando mal aplicados, e são bons em todos os outros casos.

Ainda noutro ponto vou tocar.

Diz o Sr. Bernardino Machado que as indústrias pedem protecção para o seu trabalho, e que elas vivem em precárias circunstâncias.

Eu sei um pouco dalgumas especialidades industriais, por ser negociante, e posso dizer alguma cousa sôbre o assunto.

É certo que algumas fábricas não tiram o resultado preciso do capital que empregaram, mas isso não é devido à falta da protecção, mas sim a outros causas, que não vem para o caso apreciar aqui. No que toca à indústria

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SESSÃO N.° 18 DE 29 DE DEZEMBRO DE 1911 15

algodoeira, a sua protecção vai de 25 a 46 por cento pela pauta proteccionista que vem vigorando desde 1892. Ora de 1892 para cá vão 19 anos, prazo mais que suficiente para os industriais poderem dispensar a protecção pautal.
Estabelecida a protecção, as indústrias que então se criaram deviam desenvolver-se bastante porque o prazo de 10 anos é a idade crítica das indústrias quando começam, e decorridos êsses 10 anos elas já deviam estar bastante desenvolvidas para que pudessem dispensar o favor e o público fôsse favorecido; mas tal não aconteceu e vemos que passados 19 anos as indústrias ainda vem pedir protecção, exactamente na idade em que já há muito deviam ter passado do estado crítico e estar agora florescentes, isto é, em estado de poderem prescindir de toda a protecção exagerada.

Mas, não sucedeu assim, e o caso é que elas se queixam de falta de protecção a meu ver sem razão, em parte.

Eu sei que a indústria algodoeira tem em alguns dos seus artigos, direitos que se podem considerar proibitivos, e em os quais a sua protecção vai até alêm de 60 por cento 5 contudo eu creio que alguma cousa se deve fazer a benefício destas e doutras indústrias, até mesmo da algodoeira, porque em alguns produtos precisa de ser auxiliada; mas esta não se pode fazer sem estar concluído o inquérito a que o Govêrno mandou proceder; sem que isto venha ao conhecimento da Câmara para poder estudar a parte dos casos em que precisa proteger a nossa indústria conveniente e razoavelmente.

Estas cousas não se resolvem de momento sem se saber, o mais aproximadamente possível, o seu estado e condições da produção industrial.

Como já disse, o Estado tem gasto 37.000:000$000 réis para caminhos de ferro de sua conta própria.

É evidente que êstes caminhos de ferro vieram beneficiar todo o país, toda a propriedade rural, sem que esta até hoje tenha vindo auxiliar o Estado com o aumento tributário, tendo triplicado do seu valor. Eu chamo a atenção do Exmo. Sr. Ministro das Finanças para êste ponto, a propriedade rural paga actualmente cerca de 3.000:000$000 réis, ora o valor venal dessa cota tributária é de réis 600.000:000$000; é irrisório pensar que o país tenha apenas um valor de propriedade rústica de 600.000:000$000; êsse valor há-de ser muito maior, e mal de nós se assim não fôsse. Tendo crescido pois o seu valor, a cota colectável há-de ser muito superior à actual.

A contribuição predial em Lisboa está calculada numa importância muito superior, relativamente ao resto do país: 180.000:000$000 réis, aproximadamente; nestas condições parece-me que seria bom que o Sr. Ministro das Finanças prestasse a sua atenção para êste assunto, para ver onde há-de ir buscar receitas para as despesas que todos lhe pedem.

A contribuição industrial tambêm é susceptível de aumento; a forma como hoje é distribuída por agremiação de classes está muito má, nós sabemos, por exemplo, que há negociantes de primeira ordem, no género de indústria comercial, em que o máximo que chegam a pagar é 1:800$000 réis a 2:000$000 réis, e que fazem interesses superiores a 80:000$000 réis, e outros com interesses que se podem estimar em 60:000$000 réis e que pagam apenas 1:200$000 réis.

Há, porém, outros pequenos negociantes que pagam mais que o que devem pagar, por que as suas cotas são elevadas para os seus exiguos lucros, dando se isso nas classes pequenas e médias. Por isso neste ponto Sr. Ministro das Finanças tambêm V. Exa. tem bastante onde possa ir procurar aumento de receita para o Estado. Disse o Sr. Bernardino Machado que é necessário proteger as indústrias, mas que é necessário dividir pelo operariado. Estou de acordo, mas é preciso que não se vá buscar toda essa divisão ás indústrias a ponto de cavar a sua ruína e então nem industriais nem operários poderão resistir à catástrofe, se de todos os lados não houver o instinto do equilíbrio para se não cair no abismo.

É indispensável que a indústria tire algum resultado dos capitais empatados em cousas que em poucos anos estão desvalorizadas e tambêm para compensar o seu trabalho, que ao operário se pague na devida proporção dos interesses auferidos, de modo a tudo caminhar harmónico e sem sobresaltos.

Os excessos de exigência de salários tem tornado a vida cara em toda a parte, e são êsses mesmos operários que não medindo bem as proporções, vem depois gritar que o produto agravado pelo excesso do custo lhes é vendido por maior preço, o que é lógico; pois quem produz caro não pode vender barato. Vamos pois a passo seguro, medindo as cousas pelas médias, para não sermos surpreendidos pelos exageros. Nem tudo para uns, nem tudo para os outros. Procuremos todos estar nas melhores condições de vida desejadas, mas façamo-lo com prudência, o que, não dispensa a firmeza e o progresso.

Posto isto, não quero fatigar mais a atenção da Câmara e peço desculpa de a ter massado com esta minha prolonga.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Bernardino Machado: - Falando de empréstimos e condenando-os referia-se ao Estado português. Se conferirmos autorizações às províncias ultramarinas com os seus recursos, poderão levantar-se outros empréstimos normais, mas o Estado não deve por enquanto contrair nenhum.

Acima de tudo, é necessário o fomento do nosso crédito, com uma administração austera para nos impor ao estrangeiro. E necessário não aumentar a nossa dívida, a não ser, quando se faça um empréstimo dentro do país.

O regime de proteccionismo é uma necessidade, um dever de solidariedade nacional.

É necessário que a protecção dada á indústria reverta tambêm em favor do operariado.

Disse.

Êste discurso será publicado na íntegra quando S. Exa. devolver as notas taquigráficas.

Em seguida foi o parecer aprovado na generalidade e na especialidade, sem discussão.

Lê-se na mesa o parecer relativo às receitas e despesas.

O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Sr. Presidente: é para lembrar que êste artigo 2.° deve ser posto à votação com as modificações resultantes das emendas feitas na Câmara dos Deputados.

O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O Sr. Artur Costa: - Sr. Presidente: peço para ler o artigo 6.°

Leu-se na mesa.

Peço tambêm para ler o artigo 5.°

Leu-se na mesa.

Sr. Presidente: isto já vem votado da Câmara dos Deputados e eu julgo que o Govêrno não deve ser autorizado pelo Parlamento a fixar taxas de contribuição predial.

A Constituição diz que quem fixa impostos é só o Parlamento e eu julgo que autorizar o Govêrno a fixar a contribuição predial é o mesmo que fixar impostos.

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16 DIÁRIO DO SENADO

Eu desejo que isto não passe em julgado, e que não venha o mesmo no futuro orçamento.

O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Explica a razão por que substituiu a sua proposta primitiva.

O Govêrno fica com o arbítrio que pode ter uma criança que vai fazer uma conta, depois de ter aprendido as regras da aritmética. O Govêrno fica apenas autorizado a fixar as taxas médias da contribuição predial, depois de ter procedido às avaliações.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. devolver as notas taquigráficas.

O Sr. José de Pádua: - Sr. Presidente: as explicações do Sr. Ministro das Finanças satisfizeram-me por completo.

Não tenho o menor receio, mas sei, porque ontem li nos jornais, que existe o boato, que eu desejo que S. Exa. desfaça duma maneira categórica, que está apavorando parte do país com a ideia de que o Sr. Ministro das Finanças vai elevar em muito a contribuição predial, o que, com as alcavalas do costume, trará para o Estado mais 20 por cento desta receita.

Como há câmaras municipais dêste país que já tributam até 20 por cento, esta tributação elevar-se há a 40 por cento, a ser verdadeiro o boato que corre, e por isso há muita gente apavorada com esta ideia, que seria de graves consequências se se realizasse.

Toda a gente receia que êsses 40 por cento tenham de entrar para as arcas do Tesouro, quando não é nada disto; mas para provocar uma resposta do Sr. Ministro das Finanças, que vá desfazer êstes boatos, é que me resolvi a tocar no assunto.

É preciso desfazer êstes boatos, a fim de que, amanhã, êles não tomem maiores proporções.

O Sr. Ministro das Finanças (Sidónio Paes): - Folgo em ter de responder ao Sr. Senador José de Pádua, porque posso dar uma resposta que o vai deixar inteiramente satisfeito.

Posso garantir a V. Exa. e à Câmara que o nosso pensamento não é agravar a massa geral dos contribuintes; o que nós vamos fazer é o cálculo das taxas médias, de forma a obter o rendimento do ano passado e mais o pequeno acréscimo que é possível.

Portanto, o que poderá ser agravado?

Poderá haver desigualdade nestes contribuintes, de forma que alguns venham a pagar mais que o que pagavam antes, quando havia grande desigualdade.

O Govêrno concorda com êste sistema de taxas progressivas da lei de 4 de Maio de 1911, cujo espirito é, aliás, aliviar o proprietário de pequeno rendimento e sobrecarregar o que tem mais rendimento.

Se V. Exa. me perguntasse se da aplicação desta lei vai produzir-se uma desigualdade relativamente ao sistema da repartição, responder-lhe hei que não há dúvida que sim.

Mas essa desigualdade é fundada na justiça ou na injustiça?

É fundada na justiça.

Os contribuintes, pelo que respeita â contribuição predial, não vão pagar mais.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Houve alguém que suspeitou de que, pela maneira por que estava redigido o artigo, se pensava em atingir a receita geral do Estado, mas vista a declaração solene de V. Exa. de que o artigo se refere única e exclusivamente á contribuição predial, dou-me por satisfeito.

O Orador: - V. Exa. tem a bondade de mandar ler alto êsse artigo?

O Sr. José de Pádua: - Para mim não é precisa a leitora; estou absolutamente satisfeito com a declaração de V. Exa.

É lido na mesa o artigo cuja leitura é pedida pelo Sr. Ministro das Finanças.

O Orador: - Eu asseguro à Câmara que a interpretação que dei é neste sentido: êsse limite refere-se apenas à contribuição predial.

Comecei por dizer que se refere ao rendimento do ano passado.

O Sr. José de Pádua:- Por conseguinte não pode dar senão um pequenino aumento e não aquilo que por aí já iam dizendo, que ia até 40 por cento.

O Sr. Artur Costa:-Desisto da palavra.

O parecer é aprovado na generalidade, sendo em seguida aprovado na especialidade.

É lido na mesa um parecer para o qual o Sr. Silva Barreto em nome da comissão de instrução pedia a urgência, sendo aprovado sem discussão na generalidade e na especialidade.

É o seguinte:

Senhores Senadores. - A vossa comissão de instrução conforma-se com o projecto que respeita à matricula de candidatos nas escolas de ensino normal e por isso propõe ao Senado a sua aprovação.

Sala das sessões do Senado, em 29 de Dezembro de 1911. = Ladislau Piçarra -António Joaquim de Sousa Júnior = Faustino da Fonseca = António Maria da Silva Barreto, Relator.

Senhores Senadores. - A comissão de finanças do Senado, tendo tomado conhecimento da proposta de lei n.° 19-A, é de parecer que lhes deis a vossa aprovação, pois que é necessária a despesa determinada pelos exames a que o projecto se refere, e que essa despesa poderá sair da verba que se acha inscrita no orçamento.

Sala das sessões da comissão de finanças, em 29 de Dezembro de 1911. = José Maria Pereira, Presidente = Alfredo Botelho de Sousa = Tomás Cabreira = Peres Rodrigues, Secretário.

O Sr. Presidente: - Desejava consultar a Câmara sôbre se ela me autoriza a marcar toda a semana para trabalhos de comissões, por haver pendentes de parecer muitas deliberações. (Apoiados].

Em vista da manifestação da Câmara, vou marcar a primeira sessão para o dia 8 de Janeiro e a ordem do dia a apresentação de pareceres.

Está encerrada a sessão.

Era 1 hora e 10 minutos da madrugada.

O REDACTOR - Alberto Bramão.

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