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REPÚBLICA PORTUGUESA
SESSÃO LEGISLATIVA DE J9II-I9I2
DIÁRIO DO SENADO
SESSÃO N.° 58
EM 22 DE MARÇO DE
SUMARIO. — Chamada e abertura da sessão. — Leitura e aprovação da acta. — Expediente. — O Sr. Senador Sousa Júnior manda para a mesa um projecto de lei relativo à família de Manuel Tavares de Almeida.
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DIÁRIO DO SENADO
Presidência do Ex.mo Sr, Anselmo Braamcamp Freira
Secretários os Ex.mos Srs,
António Beruardlno Roque Bernardo Paes de Almeida
Srs. Senadores que compareceram à sessão: Abílio Baeta das Neves Barreto. Adriano Augusto Pimenta, Afonso Hen-riques do Prado Castro e Lemos, Alfredo Botelho de Sousa, Alfredo José Durão, Ar.íba: de Sousa Dias, Anselmo Augusto da Costa Xavier, Anselmo Braamcamp Fraire, António Augusto Cerqueira Coimbra, António Bernardino Roque, António Caetano Macieira Júnior, António Joaquim de Sousa Júnior, António Ladislau Parreira, António Ladislau Piçarra, António Maria da Silva Barreto, António Pires de Carvalho, António Ribeiro Seixas, António Xavier Correia Barreto, Artur Augusto da Costa, Artur Rovisco Garcia. Augusto de Vera Cruz. Bernardo Paes de Almeida, Carlos Richter, Celestino Germano Paes de Almeida,, Cristóvão Moniz, Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro, Elisio Pinto de Almeida e Castro, Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho, Fa:istino da Fonseca,' Francisco António Ochoa, Francisco Correia de Lemos, Inácio Magalhães Basto, João José de Freitas, Joaquim José de Sousa Fernandes, Joaquim Pedro Martins, José António Arantes Pedroso Júnior. José de Castro, José de Cupertino Ribeiro Júnior, José Estêvâc de Vasconcelos, José Machado de Serpa, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Pádua. José Maria Pereira, José Miranda do Vale, José Nunes da Mata. Luís Fortunato áa Fonseca, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel José de Oliveira, Manuel Martins Cardoso, Manuel Rodrigues da Silva, Manuel de Sousa da Câmara, Narciso Alves da Cunha, Pedro Amaral Boto Machado, Ricardo Paes Gomes, Sebastião Pe-res Rodrigues e Tornas António da Guarda Cabreira.
Srs. Senadores qv.e não compareceram: Abel Acácio de "Almeida Botelho, Albano Coutinho. Alberto Carlos da Silveira, Amaro de Azevedo Gomes, Antão Fernandes de Carvalho,'António da Silva Cunha, Augusto Almeida Mon-jardino, Bernardino Luís Machado Guimarães, Domingos Tasso de Figueiredo. Francisco Eusébio Lourenço Leão, José Relvas, Leão Magno Azedo, Manuel José Fernandes Costa, Ramiro Guedes e Sebastião de Magalhães Lima.
As 14 horas e J õ r.iinutos. o Sr. 'Presidente mandou proceder à chamada.
Tendo-se verificado a presença de 36 Srs. Senadores, S. Ex.* declarou aberta a sessão.
Estiveram na sala os Srs. Presidente do Ministério e Ministros da Justiça, ãa Guerra, do Fomento e da Marinha.
Lida a acta da sessão antecedente^ foi aprovada sem ré-clcr
Mencionou-se o seguinte
3PEDIENTE
Oficio
Da Presidência da Câmara dos Deputados, acompanhando a proposta de lei que-tem por fim autorizar o Go-
a abrir no Ministério das Finanças a favor do das Colónias, um crédito extraordinário de 200:000^1000 réis, destinado a despesas urgentes na província de Angola.
Para as comissões de finanças e de colónias.
Teve primeira' leitura o projecto de lei apresentado na sessão passada pelo Sr. Senador Sousa Júnior por parte da comissão de higiene.
Segundas leituras
Tiveram segunda leitura as propostas apresentadas na sessão passada pelo Sr. Senador Nunes da Mata, sendo uma relativa à remessa ao Senado de exemplares das publicações feitas pelas sociedades scientíficas subsidiadas pelo Estado e outra destinada â comissão de legislação para o fim de ser consultada sobre se a de finanças pode desde já rever o decreto do Governo Provisório referente aos impostos de consumo, cuja cobrança foi dispensada em Lisboa.
Teve também segunda leitura a proposta enviada para a mesa na sessão passada pelo Sr. Senador Silva Barreto e relativa aos serviços de instrução primária.
Foram admitidas.
O Sr. Sousa JúniOT:— Sr.]Presidente: na cidade do
Porto, e no exercício das suas funções de desinfectador
do posto de desinfecção, faleceu da doença contagiosa
| Manuel Tavares de Almeida. A família deste indivíduo,
j uma pobre viuva e quatro filhos menores, encontra-se hoje
í em t situação bastante precária.
É justo que o Estado dê a esta infeliz família o que a morte do seu chefe lhe tirou.
Em sei que as circunstâncias do Tesouro não são desafogadas, mas a verdade vé que desgraças destas requerem remédio urgente. Por isso, .Sr. Presidente, eu me atrevo a mandar para a mesa um projecto de lei para que à família em questão o Estado conceda a pensão anual de ÍS0.3000 réis.
Sr. Presidente: devo acrescentar ainda que Manuel Tavares de Almeida foi um funcionário exemplar, muito cumpridor dos seus deveres e uma pessoa inteiramente dedicada aos serviços sanitários. Por várias vezes eu tive ocasião de trabalhar com ele, podendo asseverar a V. Ex.* e ao Senado que, em zelo e competência, dificilmente se encontraria quem o pudesse exceder.
Nestas condições, mando para a mesa o meu projecto de lei, em duplicado, como manda o Regimento.
S. Ex.A não reviu.
Leu-se e ficou para segunda leitura.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do parecer n.° 94
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SESSÃO N.° 08 DE 22 DE MÁECO DE 1912
Foi lida na mesa a seguinte:
Proposta
Sendo de muita importância o parecer n.° 94 e não se achando alguns membros do Senado habilitados a discuti-lo convenientemente, pois ele não foi distribuído com a antecipação de quarenta e oito horas, como ordena o Re gimento, sendo certo que eu só agora o recebi, proponho que se adie para amanhã a sua discussão. = O Senador, Artur Costa.
O Sr. Artur Costa: —Peço a V. Ex.a, Sr. Presidente, que consulte o Senado sobre se me autoriza a retirar a minha proposta.
Consultado o Senado, concedeu a autorização pedida.
O Sr- Presidente:—Continua em discussão o parecer n. 94.
O Sr. Arantes PredÓSO: — Sr. Presidente: muito poucas palavras vou preferir; apenas as necessárias para justificar, como membro da comissão de marinha, o aditamento que apresentei e que consta do meu parecer em separado.
Sr. Presidente: todos nós sabemos que foi devido principalmente à acção heróica dos oficiais revolucionários que a República se proclamou no dia õ de Outubro.
O Governo Provisório, para galardoar estes oficiais, concedeu-lhes diferentes postos de acesso.
Não discuto agora, Sr. Presidente, se este recompensa foi condigna; pode mesmo ser que fosse pequena.
O que é facto é que, dias depois de ser publicado o primeiro decreto, o Governo Provisório fazia sair outro em que, taxativamente, determinava que os postos de acesso eram concedidos com prejuízo de antiguidade.
Quando se tratou de efectivar as disposições dos dois decretos notou-se logo uni mal estar geral na corporação da armada, o que fez com que a disciplina afrouxasse um pouco e deixasse de ser o que todos nós desejamos que seja.
Sr. Presidente: o meu aditamento que nada tira aos oficiais revolucionários, nem galões, nem promoção, que não os inibe de comandar nem de exerce"rem todos os cargos inerentes aos seus postos, tem unicamente o fim de acabar com a desarmonia existente na armada, avigorar a disciplina, e fazer com que na marinha de guerra haja paz e harmonia, o que tam necessário é para o país e para a Republica.
O Sr. Miranda do Vale: — Sr. Presidente: o parecer que vai entrar em discussão é a justificação da revisão do decreto do Governo Provisório que galarduou os oficiais de marinha que fizeram a' revolução.
Parece-me bem. Sr. Presidente, que no Senado se diga alguma cousa sobre o movimento que implantou a República em Portugal.
É preciso acentuar bem que a República não se, fez só pela Revolução de 5 de Outubro.,..
O Sr. Arantes Pedroso:—Eu disse principalmente:
O Orador: — Eu não me estou referindo ao discurso de V. Ex.a; apenas desejo dizer umas palavras sobre a Revolução de õ de Outubro, que no meu entender, para que alcançasse bom êxito, teve de ser precedida de trabalhos de propaganda.
A Revolução de 5 de Outubro não foi exclusivamente a que fez a República em Pertugal, (Apoiados); para a proclamação da República em Portugal contribuíram outros elementos (Apoiados).
Para a proclamação da República, contribuiu e muito
o Sr. Presidente do Senado, abandonando o seu lugar de par do reino e vindo enfileirar-se ao lado dos que combatiam pela República (Apoiados), apesar de ter já pelos seus trabalhos e pelos seus anos direito a descançar.
O Sr. Ladislau Piçarra: — Parece-me que o Sr. Presidente não é tam adiantado em anos, que não possa ainda colaborar com toda a energia na obra da República.
O Orador: — O Sr. Presidente sabe muitíssimo bem que eu não lhe quis chamar velho, mas diser que, pelos seus trabalhos, já tinha direito a uma vida cómoda e de descanso.
V. Ex.a, Sr. Presidente, veio enfileirar-se ao lado dos que combatiam pela República, tomando a grande responsabilidade de presidir à Câmara Municipal de Lisboa numa época em que esse cargo bem difícil era.
Para o bom êxito do movimento de 5 de Outubro, contribuíram aqueles que na Câmara dos Deputados constan-temente flagelavam os crimes da monarquia. Muitos outros colaboraram na proclamação da República.
Até eu próprio, Sr. Presidente, indo aos comícios, dando a minha presença a todas as manifestações republicanas dos últimos tempos, contribuí para a proclamação da República, e até os próprios monárquicos tirando dinheiro dos cofres públicos para pagar os régios favores e forçando os cofres do Crédito Predial, contribuíram para a proclamação da República.
Mas, por mais que todos trabalhássemos, estes trabalhos seriam estéreis, se não fosse o movimento de 5 de Outubro.
Por consequência, todos os que são republicanos e desejam o engrandecimento das instituições republicanas,.devem exaltar aqueles que tiveram a superior coragem de levar a efeito o movimento de 5 de Outubro.
A ninguém devem esquecer aquelas trinta e seis horas de vida nervosa, que sofreu quem estava em Lisboa.
Foi por isso, Sr. Presidente, que eu, de ordinário calmo e sereno, não tendo nestas questões políticas grande pressa, fiz as maiores diligências para que este projecto tivesse dispensa do Regimento e entrasse imediatamente em discussão; porque eu desejava que, por essa forma ficasse bem demonstrada a estima, consideração e respeito do Senado, pelos grandes actos de heroísmo praticados por ocasião da Revolução.
O Governo Provisório foi liberal nas reformas que fez.
Melhorou bastante vários serviços de administração pública.
Acresceu ordenados, alguns até mais do que os próprios interessados esperavam; e, contudo, Sr. Presidente, na recompensa que deu aos oficiais revolucionários não podia ser mais parco, nem mais económico.
Razões taria para o fazer.
O Tesouro Português não está em condições tais que possa usar para com os seus altos servidores, daquela generosidade que bm países ricos estamos acostumados a ver.
O Governo Provisório procedeu para com os oficiais revolucionários como Governo duma Naçio pobre e arruinada.
E contudo, Sr. Presidente, eles sofreram em algumas horas uns poucos de anos de martírios.
Sr. Presidente, já que não podemos ser mais generosos do que o foi o Governo Provisório, não diminuamos ainda o valor dessa recompensa.
Tenho a opinião, meramente pessoal, evidentemente, de que se devia confirmar pronta e rapidamente esse decretos do Governo Provisório.
Era a minha opinião, que não foi compartilhada pelo Senado, mas que eu aceitei como acatarei outras, embora sejam adversas ao meu modo de ver.
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DIÁRIO DO SENADO
Esta minha pressa em se confirmarem os decretos do Governo Provisório relativos às promoções dos oficiais revolucionários tinha uma razão de ser.
Eu pensava que me acompanhava nessa pressa todos aqueles que durante as trinta e seis horas que a revolução durou, experimentaram cruciantíssimas angústias.
Estou intimamente convencido de que todos os republicanos, desde aqueles que se bateram denodadamente contra a monarquia, como os que pela sua situação estavam garantidos contra o perigo, não deixaram, nesse últímu estrebuchar da monarquia, de tremer ante o malogro dessa tentativa.
Se a monarquia vingasse, os revolucionários tinham a recear, não só por si como pelos seus amigos, porque de antemão sabiam como ela seria inexorável para.com os seus inimigos.
A Assembleia Constituinte procedeu já ao reconhecimento da Revolução de 5 de Outubro, galardoando o herói da Rotunda.
Sr. Presidente: falecem-me os conhecimentos militares para discutir, para poder avaliar quem é que teve a primazia na luta que teve por epílogo a deposição da monarquia e a proclamação da República, em todo o caso direi o que se' me afigura a esse respeito, declarando desde já que as declarações que vou apresentar cão se destinam a sustentar primadas, porque eu parto do princípio que todos estavam no posto em que deviam estar e manter-se.
Apesar de me falecerem os conhecimentos militares, parece-me que não errarei nas conclusões a qaevon chegar.
Eu tenho a impressão, Sr. Presidente, de que, se ao Sr. Machado Santos falecesse a coragem e depusesse a sua espada no dia 4 de Outubro, por verificar que era inútil sacrificar a vida de todos que estavam sob o seu comando, a República ainda tinha condições de vingar, porque havia no Tejo uns poucos de cruzadores, que pela República fariam troar a sua artilharia; e isso era o suficiente para dar animo e coragem àqueles que estavam hesitantes.
Mas, Sr. Presidente, se não fosse a acção do núcleo de oficiais, que primeiro combateram no Quartel de Marinheiros e mais tarde dentro dos cruzadores, se o coman dante Parreira a certa altura do dia 4 de Outubro julgasse inútil o seu sacrifício e o da sua gente, se um momento de desânimo, bastante desculpável, o invadisse e em. determinado momento depusesse a sua espada de combatente republicano, eu não sei o que aconteceria; ou. por outra, eu estou intimamente convencido de que a República não vingava e de que a Rotunda se transformaria num mar de sangue, donde nenhum republicano se levantaria com vida.
Sr. Presidente, emquanto D. Manuel II esteve no paço das Necessidades cercado pela tropa, emquanto ele teve a ilusão de que ela o defendia, ele teve o prestigio que lhe dava o símbolo que representava. Mas desde que as balas fizeram estremecer o Paço das Necessidades e este representante da monarquia, trâazido de medo, fugia pela cerca, saltando os muros, a monarquia estava irremediavelmente perdida.
Eu estou absolutamente convencido de que foi este o momento decisivo para a vitória da República, e para a perda completa do prestigio da monarquia. Assim o sentiu V. Ex.a, assim o sentiram todos-os que seguiram com ânsia o movimento revolucionário de Õ de Outubro. Sr- Presidente: bem desinteressados se tem mostrado os oficiais revolucionários, que se bateram no quartel de marinheiros sob ox comando do Sr. Ladislau Parreira. Não há dúvida nenhuma de que este comandante é uma das figuras mais altamente simpáticas da Revolução. Combateu pela República e como militar disciplinado, unia vez feita a República, ele foi imediatamente pôr a sua espada e toda sua força, que na ocasião era grande, ao serviço do poder civil. O Sr. Parreira foi nesse momento um militar brioso, um militar disciplinado, um militar obediente ao poder civil. Aceitou o que o Governo lhe deu, e nisso não fez mais do que mostrar-se um militar disciplinado. Não tinha o direito de recusar. Cumpriu aquele decreto, como cumpriria qualquer ordem. O Governo Provisório, que tinha chamado a si legitimamente todos os poderes, mandava que o primeiro tenente Parreira pusesse os galões de capitão de mar e guerra ; ele tinha como militar disciplinado o dever absoluto, a obrigação restrita de o fazer. A meu ver, como militar não lhe era permitido pôr em dúvida se a recompensa era exagerada ou se era pequena cumpri a as ordens dos seus legítimos superiores como agora há-de cumprir aquilo que os representantes da Nação lhe ditarem e há-de cumpri-lo com a mesma disciplina,porque é a Nação que fala, é a Nação a quem ele deve toda a obediência. Sr. Presidente: eu não desejo alongar mais esta minha exposição, como disse no princípio do meu discurso, quero apenas referir-me à Revolução de 5 de Outubro. Todos os que somos republicanos, e eu não uso na prática fazer distinção entre republicanos de antes e republicanos depois de 5 de Outubro, a distinção que faço é de republicanos sinceros e dos que o não são, a meu ver, Sr. Presidente, todos os republicanos sinceros devem fazer a diligência de não apoucar a Revolução de 5 de Outubro. (Apoiados). Se nós de qualquer maneira ou forma tentássemos diminuir, 'ou modificar ligeiramente que fosse o acto do Governo Provisório, nós faríamos um mau acto de republicanos. A quem convêm apoucar o acto de õ de Outubro, c apenas aos inimigos das instituições. Não faça o Parlamento, não façam os representantes da Nação, aqueles.que se prezam de ter sido sempre verdadeiros republicanos, nào façam a vontade «àqueles que são inimigos das nossas instituições, apoucando e significação do movimento de õ de Outubro. Mas é preciso acentuar bem a atitude que tem tomado estas criaturas nos períodos que tem seguido, o dia õ de Outubro. O primeiro momento foi de perfeito desalento, não existia em Lisboa nem no país uma única pessoa que não fosse ou não acatasse bem a República, eram todos republicanos. Depois surgiu a conspirata de Tui e um bocado de esperança bafejou os inimigos das actuais instituições. Tiveram eles a esperança duma restauração e começaram-se-a criticar os actos dos republicanos, achincalhando as suas pessoas. Veio depois o terceiro período, o do desânimo, e então os monárquicos adoptaram uma táctica absolutamente oposta ; péla inflência que tem nas secretarias e por todas as formas ao seu alcance procuram dificultar a iniciativa republicana, ou incomodar os' que defendem a República.
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Evidentemente, a Nação não tem dinheiro para indem- i os oficiais voluntariamente, e voluntariamente arriscaram
mzar estes indivíduos dos transtornos que a Revolução lhes ocasionou, alguns de saúde, até. Um dos revolucionários que melhor figura fez durante a revolução morreu já. £ Quem nos garante a nós que a morte desse homem não foi apressada pelo movimento de 5^de Outubro?
Sofreu-se muito naquelas horas. E possível que em pontos mais distantes do país isso se não sentisse esta anciedade com tanta energia, porque se não ouviam os tiros, mas quem atravessou essas ruas, sentindo as balas sibilar por cima da cabeça, não o esquecerá jamais.
Podemos nós pessoalmente não simpatizar com alguns dos homens que presidiram à revolução; agora, como revolucionários, nós devemos-lhes a maior consideração.-Não lhes dêmos mais do que lhes deu o Governo Provisório, mas também não lhes dêmos menos.
O Sr. Botelho de Sousa:—A justiça que se pretende fazer, confirmando o decreto do Governo Provisório, relativo às promoções dos oficiais revolucionários, já foi apreciada pelos Srs. Senadores Miranda do Vale e Arantes Pedroso. Nesta parte, parece-me que todos etía-mos de acordo. Resta simplesmente apreciar ou exami nar o § único do parecer dado em separado pelo Sr. Arantes Pedroso.
Diz esse § único o seguinte:
Leu.
Antigamente davam-se promoções, sem prejuízo de antiguidade, aos militares que seguiam para o Ultramar. Isto é certo que dava lugar a dificuldades, mas também é fora de dúvida que os serviços prestados à causa da República pelos oficiais, que se pretende galardoar, são bastante superiores aos prestados por aqueles oficiais.
A substituição apresentada pelo Sr. Arantes Pedroso não deve de forma nenhuma ser aprovada, porque estes oficiais ficariam inteiramente postos de lado em todos os serviços de marinha.
A princípio pretendeu se que eles fossem promovidos com prejuízo de antiguidade, para não ferir a disciplina; mas o resultado duma tal alteração ao decreto do Governo Provisório seria que, mais tarde, estes oficiais, que hoje estão à direita de muitos camaradas seus, passariam a ficar à sua esquerda, e então é que muito teria a sofrer a disciplina.
Com a substituição agora apresentada ao § único, a situação que lhes seria criada era pior, porque como vamos ver, eles não podiam desempenhar comissão alguma.
Os oficiais promovidos, por exemplo, a capitães-tenen-tes, e que eram segundos-tenentes, não poderiam comandar uma canhoneira, porque não há um primeiro tenente que pudesse servir de imediato. Do mesmo modo, não poderiam ser imediatos dum cruzador, porque teriam sob as suas ordens oficiais de guarnição, primeiros tenentes mais antigos do que eles.
,; Mas se esses oficiais não podiam ter comissões de embarque, poderiam ao menos ser empregados em comissões em terra ? Nem isso. Não podem ser chefes de repartições, porque iriam ter primeiros tenentes, e mesmo alguns segundos tenentes mais antigos, sob as suas ordens.
Nestas condições estes oficiais seriam postos de lado para todas as comissões, tanto de embarque, como em terra.
Se tal se fizesse, seria uma singular maneira de recompensar os oficiais que voluntariamente se arriscaram pela República.
E é preciso reconhecer que o sacrifício destes oficiais, o seu acto de heroísmo é bem maior do que o daqueles que se distinguem em uma guerra. Para a guerra vão os militares por dever; para a revolução, neste caso, foram
tudo.
Diz-se que a disciplina sofreu com as promoções dos oficiais revolucionários aos postos que actualmente tem. Ora, a promoção com prejuízo de antiguidade não é caso novo em Portugal, nem foi o Governo Provisório que primeiro fez entre nós as promoções por distinção com prejuízo de antiguidade.
Como muito bem disse o Sr. Abílio Barreto, muita promoção se tem dado com prejuízo de antiguidade.
Nos oficiais que vão para- o Ultramar, que vencem um posto de acesso, nos oficiais que fazem o curso do estado maior, encontramos exemplos de oficiais que, estando num dia à esquerda de camaradas seus, passam no dia seguinte para a direita. E pela organização do exército decretada pelo Governo Provisório, uma parte dos coronéis é promovida ao generalato. por escolha, podendo dar-se o caso dt haver um general comandando uma divisão, ou mesmo con:andante em chefe, mais moderno que coronéis sob as suas ordens, comandando regimentos.
O Sr. Goulart de Medeiros: quem saiba fazer a escolha.
É preciso que haja
O Oradcrr: — Sem dúvida. Mas se a promoção por escolha não existe mais largamente entre nós, é porque se encontrariam em dificuldades para o fazer com justiça e sem favoritismos, e nunca porque ela seja contra a disciplina.
Em quási todos os países se fazem promoções por escolha. Na marinha inglesa vamos encontrar oficiais com pouco mais de trinta anos de idade, comandando navios de combate e tendo sob as suas ordens, como imediatos e oficiais de guarnição camaradas seus muito mais idosos e antigos no serviço.
Parece-me ter justificado suficientemente que as promoções dos oficiais revolucionários, tais como foram feitas pêlo Governo Provisório, de modo algum se podem considerar como origem de indisciplina na marinha.
Nestas condições julgo que o § único, apresentado no parecer em separado do Sr. Senador Arantes Pedroso, não pode ser aceito pelo Senado.
S. Ex." não reviu.
O Sr. Peres Rodrigues: — Quando este projecto veio da Câmara dos Deputados e para ele foi requerida a urgência, eu fui dos que votaram contra, por não ver necessidade dessa urgência, nem a compreender.
,;j Pois, urgência para conservar?! j Nem faz sentido !; Urgência para alterar.
Se algum membro desta Câmara tinha'esperança de que se produzisse essa alteração e tomava a peito que ela se fizesse, tendo em vista ò que sofriam aqueles que se julgavam apontados para essas promoções, não era o adiamento por mais alguns dias da alteração almejada, que poderia modificar o seu estado de alma. de modo a ser necessário votar a urgência.
Mas eu tenho agora a explicação do facto, dada pelo Sr. Miranda do Vale: era provocar uma manifestação da Câmara.
O Sr. Miranda do Vale: — Apoiado.
O Orador:—Era mais 'um galardão aos oficiais, era como que uma aclamação.
O Sr. Miranda do Vale: — Apoiado.
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ns próprios galardoados dispensariam, pois estamos num momento já distante dos entusiasmos pela vitória e pelas consequências benéficas que se produziram, havendo lugar para exame, para ponderação, para contas, e perderíamos a ocasião se não as fizéssemos agora, se o projecto não fosse às comissões. Ora nisto de contas, do quanto importaram as recompensas dadas pelo Governo Provisório, não se trata só de promoções, mas por estas poderemos principiar. Poderão dizer que é uma meticulosidade ridícula, que, quando se reconhece ter diante de nós um acto de valor do qual resultam benefícios para a viça social, nào se fazem contas. Eu não entendo assim. Isso poderá ser no viver do indivíduo, na família; no Estado não pode ser. O Estado tem de ser de boas coutas. E tanto assim o entendeu a comissão de finanças, a que tenho a honra de pertencer, qua, graças às boas diligências do ilustre relator do parecer, o Sr. Botelho cie Sousa, foi, um a um, procurar os decretos de promoção dos revolucionários galardoados e computar o valor pecuniário das promoções, de forma que chegou assim à conta que aqui temos presente. Isto era preciso que se fizesse, tanto mais que temos o déficit da República. Tantas vezes se tem dito: a República extinguiu o déficit da monarquia, mas criou o déficit próprio da Repúb iça.
É bom que se saiba qual a parte desse dtjicit que corresponde às recompensas que o Governo Provisório deu a quem fundou a República.
Portanto, quando votei contra a urgência, eu tinha em vista que se aproveitasse a ocasião de se iniciar esse apuramento a fazer peia comissão respectiva.
Mas há mais; é que todos os actos de que derivam consequências graves devem ser discutidos. Ora o acto do Governo Provisório, galardoando, pela forma por que o fez, os oficiais revolucionários, teve consequências graves. E necessário r que isto se acentui, se reconbeça., se saiba e se diga. E necessário patentear todas as consequências graves dum acto qualquer para prevenir aquelas que fossem presumíveis e atenuar as cue fossem susceptíveis de atenuação. Era, portanto, ocasião de dirimir, sob esse ponto de vista, responsabilidades" do Governo Provisório.
Essas responsabilidades podem ser mínimas, se o Governo Provisório se limitou a obedecer á imposição da opinião pública, se recompensou na medida da exigência da opinião pública do momento. (Apoiados). Sendo assim, sem necessidade de mais considerações, ficaria perfeitamente ilibada a responsabilidade do Governo Provisório. Mas isto de prescruíar a opinião pública devidamente, de saber auscultá-la peles seus legítimos órgãos, de modo a acatá-la, a dar-lhe satisfação exacta e integral (tive já ocasião de acentuá-lo nesta casa a uca ex-Min:stro do Governo Provisório) é para o homem de Estado delicadíssima função, em que muitos falham (e, em que pelo menos, aquele membro do Governo Provisório não me pareceu revelar-se superior).
Porque, na expressão genérica do que se diz a exigência da opinião publica, é ainda necessário cuidadosamente distinguir o que há de legitimo e, portanto, exigível, e o que há de ilegítimo e, portanto, inatendível. (Apoiados).
Aqui houve uma parte verdadeiramente legítima: foi o reconhecimento, à gratidão de nós todos, cidadãos da República, para com os heróis da revolução; essa gratidão foi igual em todos. Era necessário que, tratando-se de traduzir esse sentimento em um facto—c galurdão aos heróis — a contribuição de cada um de nós para iísse facto não fosse desigual.
Para que a opinião pública tivesse a sua expressão completa devia ser assim. Mas não foi assina que se procedeu, porque a parte, com que contribuiu um qualquer português civil, não foi igual àquela com que foi obrigado a contribuir qualquer dos militares, que se julgam prejudicados por efeito das promoções concedidas.
Da parte desses militares algum sacrifício houve, portanto, qus não houve da parte dos civis.
E preciso tratar-se este ponto; é nele que fixo, não digo a minha argumentação (pela sequência destas palavras verão que não tendo a um fim para que me valha a pena arquitectar argumentos), mas fixo a minha atenção. Parece me ser esta a expressão da verdade.
A gratidão foi igual, mas a contribuição foi diferente, e isto por uma raz,ao que ninguém pode contestar—a psicologia do militar, esse capítulo tam especial da patologia humana, que só quem lida ^com militares pode entrar no seu perfeito conhecimento. E por isso que muitos civis não tem na verdadeira conta o significado do acto do Governo Provisório, galardoando com- as promoções os militares que se distinguiram na revolução. Eu tenho-o, porque sou militar, vivo, pelo menos, nessa classe., e parece-me estar em condições de avaliar bem o sacrifício que esse facto representou para muitos militares.
O Sr. Faustino da Fonseca: a sacrifício. Não compreendi bem.
•V. Ex.a referiu-se
O Orador: — O sacrifício do homem que, estando num certo grau duma escala, que lhe atribuía o mando sobre outros homens, dum dia para o outro vê inverter-se essa escala, passando de mandante a ser mandado.
O Sr. Faustino da Fonseca: — .Do dia da revolução para o dia seguinte. Peço a palavra, Sr. Presidente. O Orador: — Tam certo estou disto que «pronunciei, que sem nenhuma hesitação responderei a quantas obje-cões queiram opor-me, porque me fundarei não simplesmente na minha observação da vida comum no meio militar, não simplesmente nas minhas ideias, como fraco psicólogo, mas na experiência de factos. E com alguma autoridade, Sr. Presidente, porque assisti ao facto único, que. na marinha portuguesa, nestes últimos 25 anos, determinou por distinção em combate uma promoção, com preterições, Há 25 anos, desembarcava em uma praia duma das nossas colónias uma pequena força de marinhagem e praças indígenas. Tam pouco numerosa era a força de marinheiros, que era comandada por utn joven guarda-marinha. Tratava-se de acudir ao comandante dum posto militar que estava prisioneiro a algumas milhas do litoral. Essa força penetrou no mato, naquele mato denso e traiçoeiro em que o próprio Mousinho viu fracassar a enorme coragem, pois que lá foi, mais duma vez, vencido — era no pais dos Namarrais: Eu fiquei a bordo, e, passadas duas ou três horas, via recolher ao navio a força com cinco ou seis feridos, sendo o comandante ferido da maior gravidade. Passara-se o seguinte: A força avançando por um estreito caminho aberto no mato, chegara a certo ponto onde se levantara um obstáculo que tentara destruir. Qu£.ndo se achava ocupada nesse trabalho, foi atacada por todos os lados, por inimigo invisível. O primeiro a cair. foi o comandante, e de forma a não poder levantar-se, com um ferimento importantíssimo na raiz duma das coxas. Hor.ve o pânico, os marinheiros vacilam, o comandante, sub-erguendo-se, exorta-os a que não fujam, a que cumpram o seu dever, faz que o levantem, que o transportem aos ombros e assim continua a comandar e evita uma chacina, o massacre completo.
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Pouco depois achava-se no convés do navio.
E aqui que a minha memória invoca uma destas horas da vida que nunca mais esquecem.
Quando vi o oficial ferido, e, a hemorragia era enorme ; quis imediatamente tratá-lo, mas ele não consentiu que lhe pusesse as mãos.
Eu, na minha tímida- sciência de médico novo, parecia-me a cada momento que ele expirava e disso me ficaria um grande remorso, por não o ter socorrido a tempo, mas ele repelia-me, emquanto fazia ao nosso comandante o relato completo do que se passara.
Obsecava-o a ideia de que, tendo sido alguns dos seus, feridos pelas costas, se não fosse julgar que a retirada tinha sido uma fuga desordenada, pois feridos pelas costas podiam sê-lo quando avançavam, porque os tiros eram de todos os lados, feitos por inimigos invisíveis, emboscados no inato.
E só depois que concluiu o seu relatório; exangue da abundante hemorragia,e sofrendo muito da enorme ferida complicada e agravada da inclusão de muitos pequenos projécteis, foi que se me entregou para que eu o tratasse.
Tam grande foi a minha admiração pela coragem, pelo valor moral revelados em tais circunstâncias pelo valente guarda marinha, que ao ter depois conhecimento de que o Governo com a sanção das Cortes, o galardoara promovendo o a tenente, alegrei me, achando legítima e bem merecida a recompensa.
Todavia, pelo tempo adiante, considerando o desgosto dos camaradas preteridos na escala, seis ou oito, que não sei se chegaram a formular público protesto, mas que na intimidade, desabafavam revelando o espinho que ficara cravado no amor próprio da classe, muitas, vezes perguntei a mim mesmo se realmente seria legítima e conve mente uma tal forma de recompensar.
E contra a tirania do acaso em tais circunstâncias que se revolta a psicologia profissional, supondo em cada um a consciência de que não teria feito menos se o acaso o tem substituído ao camarada na acção a este cometida. E pois o que complica a questão: o capricho do acaso, empurrando uns para heróis, afastando outros que o poderiam ser — daqui uma causa de desigualdade, em geral não bem aceita.-
O Sr. Ladislau Parreira: — Peço licença para ob servar que, no dia 5 de Outubro, quando desembarcava no Arsenal de Marinha com as forças pertencentes aos cruzadores ern revolta, um capitão de mar e guerra veio oferecer os seus galões reluzentes pondo-se á disposição do primeiro tenente que tinha os galões bastante enegrecidos, como se sai duma revolução recente.
O Orador: — Eu vou referir a V. Ex.a o que se passou a bordo dum navio que estava na Madeira, quando ali se soube da morte de D. Carlos e de D. Luis Filipe.
O que se passou naquele momento, tenho-o bem gravado na memória.
Esteve por um triz a ser ali proclamada a República nessa ocasião.
O Sr. Ladislau Piçarra: — Foi pena que se não tivesse proclamado.
O Orador : — Era uma insensatez.
Quando tiveram conhecimento do telegrama que comunicava o falecimento do Rei, os oficiais reunidos num camarote, fundamente emocionados pela notícia, afirmaram unanimemente um propósito: Vamos proclamar a Republicai E tê-lo hiam feito, se não prevalece o bom senso à vista da bandeira azul e branca içada na fortaleza, e ao saber se que o telegrama para o comandante, contendo a notícia, era ainda expedido em nome da autoridade monárquica.
DE MARÇO DE 1912 7
E ainda bem que se reconsiderou, pois isto passava-se junto daquela formosa terra, tam frequentada e cobiçada de estrangeiro, mal se podendo prever todas as graves consequências que poderia ter um acto revolucionário inconsiderado. Mas do que fiquei certo foi de que, realizado esse acto, todos aqueles oficiais se sujeitariam resolutamente a todas as consequências, tudo sacrificando pela causa a que se tinham devotado. Ora, ísses oficiais com o mesmo navio a que ainda pertenciam, em 4 de Outubro, achavam-se bem longe do Tejo, em honrosa missão nos mares do Extremo Oriente.
Se fossem presentes, tenho a certeza que não deixavam dje tomar uma parte importante no movimento .de 4 de Outubro, j Seriam outros tantos leões a combater pela Rep ú b l iça! (Apoiados).
Aqui está, portanto, o acaso, o odioso acaso, a não permitir que entrassem no movimento revolucionário, oficiais inteiramente devotados à causa republicana.
Mas, faltou-me um episódio na narrativa do que sucedeu a bordo daquele navio no porto do Funchal no dia 2 de Fevereiro de 1908. Quando'os oficiais subiam ao convés na intenção de proclamar a República, alguém se lembrou de perguntar o que se faria do comandante; pois logo ali se assentou, em que o comandante seria tratado como adversário liai.
Ninguém pensava em lhe infligir qualquer humilhação, em sujeitá-lo às forcas ciudinas] ele não o merecia.
Não era um republicano; mas era uro.homem digno, um espírito culto, um oficial valente e discipíinador, e tanto bastava para que ninguém pensasse ern o ofender no seu brio profissional, em o humilhar. Ele não merecia as forcas caudinas. Como não as mereceram os oficiais vencidos a tiro em 4 de Outubro, nem tampouco muitos que não foram vistos nem dum nem doutro lado, antepondo a tudo "o dever militar entendido a seu modo, julgados por isso indiferentes em política, mas no íntimo almejando por uma mudança de regime que salvasse a Nação do lodo em que se afundava e prontos a dar a esse regime, quando estabelecido, o melhor da sua inteligência e do seu esforço.
E, num plano mais afastado, mas não condenados ao ostracismo, á repulsão, eu.considero ainda muitos oficiais que, tendo^militado em partidos monárquicos, ficaram contudo isentos da mácula da torpe política dos últimos tempos, por nela terem sido simples comparsas, atraídos muitos dele pelo mirabolante programa do franquismo, que imaginaram iria inaugurar uma administração honrada, absolutamente favorável aos interesses da Pátria. Não tinham contra o mistificador João Franco a forte prevenção que eu tinha, procedente da longa observação da marcha da política na nossa terra, e dos meus rudimentares conhecimentos de psicologia, que me permitiram diagnosticar naquela personagem ura autêntico degenerado. Eu não o conhecia fisicamente, e no intuito de conhece-lo acedi uma vez ao convite, duns camaradas para os acompanhar a uma sessão em que o herói discursava. Vi-o, ouvi-o, e logo à saída, disse àquele oficiais, camaradas, está confirmado o diagnóstico; fiquem.-se core esse degenerado, se isso lhes apraz. Eu fico nos meus princípios, esperançado em melhores dias com um novo regime de 'moralidade e justiça. Eles ficaram, porque não se achavam, como eu, forte nos meus velhos princípios e na 'minha, aliás bem modesta, sciência psicológica.
A spguir a 5 de Outubro eu não conhecia o es.tado dalma de cada um daqueles oficiais que, tendo tido diversa orientação, poderiam agora encontrar-se em uma aspiração comum: o bem servir a sua pátria.
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DIÁRIO DO SENADO
Isto me deu a noção de quanto convinha interessá-los j ciais, pessoas ilustradas, é cousa fácil; mas o mesmo não
pela vida da República, mante-los ao lado desta, agrupando-os em torno dos camaradas que tinham feito a revolução.
Eu, que nada tinha feito para a implantação da República, senti então o vivo desejo de cooperar activamente na sua defesa, na sua consolidação, que desde logo me pareceu viria exigir o dedicado esforço de todos es tons portugueses, dos verdadeiros patriotas. Lancei, por isso a ideia ^da organização entre as classes da Armada dum comité de defesa cia. República, do qual poderiam fazer
sucede com milhares de marinheiros para mais tendo a consciência que foram eles que imposeram a revolução.
Tiocam-se vários apartes.
O Sr. Presidente agita a campainha & pede ordem.
O Orador: — Eu não privo com a marinhagem ; dou--nie mais com os oficiais e é, do que neste convívio tenho observado, que eu depreendo que as promoções por distin-
parte todos os oficiais que, pelo seu passado, dessem ga- j (^0) decretadas pelo Governo Provisóriorepresentaram rantia de liai e dedicada cooperação. ' alguma cousa de muito grave, de muito prejudicial para
" " . . . _
Mas não querendo levar à realização o meu projecto sem a sanção dos camaradas que mais tinham contribuído para a implantação da República, submeti-o à sua aprovação e tive o desgosto de vê-lo rejeitado.
Ora, naquele projecto figurava o compromisso, que entre si tomariam os membros do comité, de não solicitar melhoria^ de situação nem qualquer comissão lucrativa, e ao contrário, prestar- se sem hesitação a servir todo o cargo ou comissão para que o comité os designasse. Tive depois pena de ter inserido no projecto aquele compromisso, pois DO ^eu árido scepticismo de homem já gasto na, experiência da vida, não pude impedir-me de ver naquela cláusula, a causa, talvez única, do malogro da minha iniciativa. Como se vê era eu que entào tentava exercer a política de atracção, a que ainda agora não sou adverso, quando a atracção seja do bom, do são, do útil ao bem do país. Em vez, porém, do que devia constituir a boa política republicana, veio aquele acto do Governo Provisório, prejudicial ao fim de tantas diligências empregadas, frustradas desde então, porque ele teve por consequências o descontentamento e sisania na classe dos oficiais de marinha ; a revolta surda, permanente, na maioria dessa classe; a resistência passiva, a mais eficaz e invencível das resistências, na execução dos respectivos serviços.
;Foi verdadeiramente uma gota de veneno instilada no coração da República!
O Sr. Ladislau Parreira: —
Logo, após o dia Ò de Outubro se começou a falar em recompensas e também logo se falou quais elas seriam : e foi mesmo V. Ex.a que defendeu as promoções por distinção, chegando até a propor e a defender a melhoria de reforma aos oficiais revolucionários.
O Orador: — Ainda mais, e visto que V. Ex.a não tem dúvida em que se ventile aqui o que se passou nas nossas reuniões dos primeiros dias da República, recordar-lhe hei que fui eu quem, primeiro do que ninguém, ali clamou pela necessidade de galardoar os oficiais revolucionários, dando-lhes categoria.
Na presença dum chefe civil que assistia às seasõss, e naturalmente se entendia com o Governo Provisório, eu disse bem alto que era urgente tirar esses oficiais da situação em que se achavam, de subalternos de quem não lhes era superior IMas a minha intenção não excluía o conhecimento do cuidado com que seria necessário proceder na forma de recompensar, de modo a não produzir perturbações da disciplina, a não criar à República dificuldades que do acto irreflectido poderiam surgir.
O Sr. Ladislau Parreira: — Eu devo dizer que a disciplina na armada é o maior padrão de glória dos oficiais revolucionários, e qcem restabeleceu a disciplina perturbada entre a marinhagem para se fazer a revolução, foram os próprios oficiais revolucionários. Disciplinar ofi-
a tranquilidade e prestígio da República.
É lamentável que assim suceda, mas as cousas são ò que são, e pior é sempre ocultá-las. O mal que venho considerando deriva fatalmente da psicologia do militar, para quem a inversão na escala, a alternativa no exercício do mando, representa o que de mais grave pode ocorrer na vida profissional. Tanto assim que, se quisermos citar .factos paralelos nas diversas profissões civis, só se nos deparam nos que se contam entre os maiores desastres que podem suceder na vida; como sejam : para o negociante a falência, para o industrial o incêndio da fábrica, para o marítimo o naufrágio. . . Por isso, não há que admirar que fosso profundo o descontentamento, o desgosto, na classe.
O Sr. Ladislau Parreira: — O salto brusco que a República me fez dar dentro da corporação a que pertenço, de pouco me servirá pois ele veio encontrar-me já bastante envelhecido.
As tais consequências graves a que V. Ex.a se refere, representam apenas um equívoco da corporação, não passam dum amuo passageiro. '§§|j
O Orador: — O facto é que lavra na classe descontentamento, que não pode avaliar-se pelos cento e quarenta requerimentos presentes ao Congresso. É muito maior o número dos que protestam; são duzentos, são trezentos, sem contar muitos dos que, mais por este facto do que por incompatibilidade com o novo regime, abandonaram definitivamente a carreira; sem contar os que prematuramente estão a passar à situação de reforma, avolumando cada dia mais a mole já excessivamente pesada das classes inactivas.
O Sr. Abílio Barreto: — Nas armas de cavalaria e artilharia tem-se reformado muitos oficiais, e nessas armas não houve promoções por distinção.
O Orador:—Dir-me hão talvez que não temos|que nos importar com o abandono de todos esses que se vão e a má votade dos que ficam, embora constituíssem a maioria, desde que Repiiblica tem por si a minoria de valentes que a fizeram e bastarão a sustentá-la contra todas as agressões possíveis. E eu dir-lhes hei: (Estais em erro!
É certo que não são em geral as maiorias que governam; o que elas fazem é submeter-se, deixar-se conduzir, dar, quando muito, apoio ostensivo a uma minoria, mas minoria de elite impODdo-se, mais do que pela coragem física, pelo valor moral, revelando-se, não acidentalmente e a intervalos, mas todos os dias em todos os njomentos, pela firmeza dos princípios, pela pureza das intenções, pela nobreza de sentimentos. Essas é que são as minorias que se impõem, podendo contar então com o apoio da maioria.
Apartes e interrupções que não deixam ouvir o orador.
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SESSÃO N.° 58 DE 22 DE MARÇO DE 1912
O Orador:—Nestas condições, e por estas considerações eu julguei um mau acto de política do Governo Provisório a recompensa como ela foi dada, pois de tal acto resulta a irritação de elementos que não são para desprezar, antes são para ponderar, para atrair.
Eu lastimo que, havendo no Governo Provisório dois Ministros que poderiam bem conhecer a psicologia do militar e avaliar o'acto que se ia praticar, não tivessem melhor critério ou não recorressem ao conselho dalguns velhos oficiais republicanos, poucos eram. E quando não quisessem recorrer ao conselho dos vivos, inspirassem-se no espírito dos mortos, fossem buscar inspiração à alma magnânima e cheia de abnegação e patriotismo de Cândido dos Reis.
Que me diga alguém de boa fó se Cândido dos Reis, sendo vivo e presidindo como devia ao primeiro Governo da República, teria suscitado ou aplaudido mesmo a iniciativa de recompensas pela forma por que 33 deram.
O Sr. Ladislau Parreira:—Não tenho dúvidas a este respeito. Ele nunca esqueceria os seus oficiais revolucionários que cumpriram as suas palavras.
° O Orador: — U Não tem dúvidas?! Vozes: — | Ordem ! j Ordem!
O Orador:—V. Ex.a conspirou com ele, mas eu privei mais com ele do que V. Ex.a
. O Sr. Ladislau Parreira: — Mas ao que V. Ex.a não
assistiu, foi à reunião de 2 de Outubro em. que se reuniram dezasseis oficiais e depois só apareceu desses menos de metade. (Apoiados).
O Orador: — Eu sou insuspeito e vou falando com toda a franqueza; mas, como também, na minha classe houve uma promoção com prejuízo da escala, pode alguém supor que fala em mim a paixão, cousa que me não anima, salvo a paixão patriótica, que essa tenho-a.
Não está aqui presente ninguém para testemunhar o caso que vou referir, como estava para testemunhar o outro a que aludi, mas garanto a sua veracidade com a rainha palavra de honra.
Quando em uma reunião de oficiais no estabelecimento, a que eu pertencia, estes demonstraram a mágua pelo facto das recompensas, e pela forma por que foram feitas, alguém, querendo talvez experimentar-me a esse respeito, me dizia:
«O doutor também lá tem na sua classe um capitão de fragata...»
obteve a seguinte resposta da minha parte:
«Tenho-o, e muito bom; é um grande cirurgião, eu não sou; ele manda como operador e eu como seu ajudante obedeço; continuarei pois no meu papel, obedecendo».
Aqui está pela minha parte o que se deu.
É certo que, ao ler a notícia das promoções, me pareceu haver nessa forma de recompensa alguma cousa de irregular, não me constando que em país algum se tives se, alguma vez, procedido de forma semelhante, saltando postos na promoção; mas o facto não me comoveu, e tanto assim, que o primeiro dos galardoados que encon trei, abracei-o, felicitando-o satisfeito.
Tendo-o porem, a seguir interrogado sobre as condições da promoção, ouvindo que esta se dava com o completo prejuízo da antiguidade, os meus lábios emudeceram; não tive uma palavra mais que dizer sobre o caso.
É que naquele momento eu previ as perniciosas conse-
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qúências do facto para a corporação, e o sentimento de tristeza de então persiste, porque essas consequências se tem infelizmente confirmado.'
Apesar de tudo quanto aqui me tendes ouvido, eu? não votaria qualquer proposta no sentido da conclusão do voto em separado do Sr. Arantes Pedroso,—-«nem mesmo quando essa proposta fosse da iniciativa dalgum dos oficiais galardoados».
E não a votaria, primeiro por coerência, pois que nas Constituintes eu.dei o meu voto parada promoção de Machado Santos nas mesmas condições, isto é, sem restrição relativa ao preceito da antiguidade.
E verdade que a situação daquele oficial na sua class^ é muito diferente da dos outros na classe respectiva, tornando na realidade desnecessária tal restrição ; mas o facto é que eu já pensava então, como hoje penso acerca das outras promoções, parecendo lógico que aproveitasse aquela ocasião de expor o meu modo de ver e propor qualquer cousa, nessa conformidade.
Não o fiz.. . por várias razões, sendo a principal o meu orgulho.
Não me permito propor, discutir, nem mesmo votar qualquer cousa, em que seja directa e individualmente interessado.
O Sr. Parreira e os outros meus caros camaradas hão-de reconhecer a razão e a sinceridade das minhas palavras e perdoar-me, se algumas lhe parecerem ásperas.
Tomem-nas como de quem fala naquela liberdade e independência do homem, que pouco tempo mais de vida contará.
Eu, como político, ou antea, como cidadão que intervêm na política do meu país, tenho os meus dias contados. Por isso me atrevo a proferir estas palavras, que noutras condições não proferiria.
E remato com uma observação que dará bem a noção do estado do meu espírito.
No dia 16 de Outubro de 1910 realizou se nesta capital uma apoteose, quê não teve talvez igual no mundo.
Ao aspecto dessa manifestação grandiosa, eu perguntava a mim mesmo se tal apoteose não seria um voo da nossa imaginação, enaltecendo ao máximo a memória dos que glorificávamos, ou se não representaria o sentimento da catástrofe, pressentida pelos republicanos no desaparecimento dos dois grandes homens, Bombarda e Cândido dos Reis.
Percorrendo através da cidade o caminho, transformado em via dolorosa, do Terreiro do Paço ao Alto de S. João, eu sentia um misto de entusiasmo e de receio, de ancie-dade e de mágoa, de esperança e de terror.
Chegando junto das sepulturas destinadas aos dois gloriosos .extintos, eu, que desde o tempo de académico não mais falara a multidões, falei então, e depois de acentuar v enormidade da catástrofe que representava para a Pátria a perda daqueles beneméritos, o baquear daqueles gigantes, proferi estas palavras, que peço licença para reler.
«Cada um de nós, por efeito da lição contida na vida de abnegação desses dois homens ilustres, e no afan de reparar a perda que o seu desaparecimento representa, procurará retemperar a própria vontade, discipliná-la em vista do bem colectivo, com renúncia aos interesses estritamente egoístas, e assim, pelo esforço de todos, alcançaremos para a nossa querida Pátria a mesma soma de bera que o esforço titânico daqueles superhomens conseguiria reaUzar.
; <_ p='p' iludir-me='iludir-me' neste='neste' nesta='nesta' esperança='esperança' hei='hei' enganar-me='enganar-me' _='_' raciocínio='raciocínio'>
Enganei-me. Iludi-me. E no estado de espírito resultante desta desilusão, que deveis filiar as palavras que acabais de ouvir.
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DIARtO DO SENADO
O Sr. Martins Cardoso:—Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro que se prorrogue o tempo destinado à primeira parte da ordem do dia, até se votar o projecto a que se refere o parecer n.° 94 em discussão. = Martins Cardoso.
Foi lido e aprovado.
O Sr. Artur Costa: — Sr. Presidente: depois do brilhantíssimo discurso do .Sr. Senador Peres Rodrigues, eu deveria ter declarado a V. Ex.a que desistia da palavra, porque todas as considerações,, ,que S. Es.a fez, foram suficientíssimás para elucidar o debate; por consequência, eu deveria limitar-me a apoiá-lo e não fatigar a atenção da Câmara, porque eu não pretendo fazer obstrucionismo, nem evitar que o projecto que se discute se vote na sessão de hoje.
Sr. Presidente: declaro a V. Ex.a, como já ontem fiz, que tenho a maior consideração pelos oficiais, quer da armada, quer do exército e mesmo pelos empregados dos correios, que foram galardoados pelo Governo Provisório da República pelos serviços prestados à Pátria durante a revolução de 4 è 5 de Outubro. Por isso ninguém tem o direito de supor que eu, por má vontade ou para fins inconfessáveis, ontem me levantei para pedir que a discussão do projecto ficasse dada para ordem do dia de hoje.
As razoes, que imperaram no meu pedido, foram as mesmas que empreguei para pedir que não entrasse em discussão o projecto sobre o jogo e outros.
Eu não tinha formado opinião sobre alguns desses pareceres e nem os tinha recebido em minha casa, tendo-os, aíiás, recebido alguns Srs. Senadores.
O projecto, tal como veio da Câmara d.os 'Deputados, merece a -minha aprovação, salvo a redacção do artigo 1.°, porque não me agrada.
Mas, Sr. Presidente, eu não posso deixar também de declarar a V. Ex.a que, pelas razões expostas pelo Sr: Senador Peres Rodrigues, razões que me abstenho de reproduzir, porque a Câmara as ouviu com toda'a atenção, dou também o meu voto ao parágrafo único apresentado pelo; Sr. Arantes Pedroso, ou pela forma em que aqui está ou por outra qualquer, que sirva para levar a normalidade e o sossego à corporação da armada, que merece toda a nossa consideração e respeito. Não seria justo, nem legítimo que nós não tivéssemos o direito de alterar o decreto do Grovêrno Provisório que galardoou os oficiais da armada com postos de acesso, mesmo com prejuízo de antiguidade.
Eu entendo, que isso iria produzir 'uma perturbação muito grande e não temos o direito de lançar a perturbação no seio dá República. £ Mas nós não teremos meio de introduzir no projecto urna disposição pela qual esses oficiais possam servir em comissão, sem ser debaixo das ordens dos mais modernos.?
Julgo que sim.
Eu ouvi com muita atenção a exposição feita pelo Sr. Botelho de Sousa e também conversei com oficiais de marinha sobre o assunte. . -
Disse o Sr. Senador Botelho de Sousa que, com o parágrafo único, alguns oficiais ficam arredados de todas as comissões de serviço. Se assim fosse, não devíamos aceitar essa disposição, raas devo dizer a S. Ex.a que o qne ouvi a vários oficiais de marinha com quem conversei não se harmoniza com o que afirma o mesmo Sr. Senador.
Por isso insisto em lembrar que não devemos rejeitar o parágrafo único do projecto.
Vamos formular uma hipótese. ,
Supúnhamos que amanhã é investido no comando dum navio de guerra o capitão de mar e guerra Sr. Ladislau
Parreira; Julgo que sim, porque entre os oficiais promovidos há capitães-tenentes, primeiros e segundos tenentes. Todos estes oficiais, segundo me parece, não terão a mínima dúvida em aceitar qualquer posto de imediato em navio de guerra .comandado pelo Sr. Ladislau Parreira. Mas, além destes, podem existir e de certo existem outros oficiais mais modernos do que S. Ex.a. : . Eu devo dizer, com , toda a franqueza, ,que me não agrada a redacção do §/único do artigo 1.° deste projecto; e não me agrada, porque pode ter duas interpretações. Uma delas é aquela que ojseu autor lhe dá, e outra a que poderá resultar da análise gramatical, deixem-me assim dizer,1 do mesmo parágrafo. . . Emquanto na corporação da armada houvesse oficiais que, .à data das promoções, fossem mais antigo? de que este, nenhum deles poderia ser encarregado.de nenhum serviço da armada, e daí viria o maior dos absurdos. Eu sei quê um ilustre membro desta Câmara, vai apresentar uma emenda que, pela sua clareza, terá o condão de desfazer qualquer dúvida que possa oferecer a interpretação dente § único. O que eu já disse, e repito, é que não quero que haja a menor dúvida. Eu sei, Sr. Presidente; por informações -que me foram dadas por um ilustre Deputado, "homem de carácter elevado e incapaz, portanto, de quaisquer mistificações, que na corporação da armada alguns oficiais há que não duvidam servir sob as ordens dos seus camaradas que eram mais novos na escala das promoções, e, por consequência, se nós introduzirmos neste ' projecto unia disposição em virtude da qiial apenas nno haja a obrigação, para os oficiais mais antigos, de iservirem às ordens dos oficiais mais modernos, julgo que tudo poderá ficar perfeitamente conciliado, pois assim serviriam todos aqueles que voluntariamente o quisessem fazer, sem prejuízo algum para a, disciplina. O Sr., Peres Rodrigues aludiu á coerência que deseja manter, e referiu-se ao que. se passou na Assembleia Constituinte^ com respeito à promoção, a um posto elevado, do Sr. Machado Santos. O Sr. Peres Rodrigues: — Eu disse que lamentei' não ter aproveitado o ensejo para, expressar o meu sentir. ....... O Orador: — A situação do Sr. Machado Santos era inteiramente diferente. O Sr. Machado Santos foi elevado a um posto que não existia, e por consequência, não ofendeu, nem foi prejudicar qualquer colega. Creio mesmo que não é oficial combatente. Nada mais tenho que dizer. O Sr. Botelho de Sousa:—Apenas duas palavras para responder ao Sr. Artur Costa, S. Ex.a apresentou um exemplo para demonstrar a possibilidade duin dos oficiais, que foram galardoados, ser comandante de. navio e ter como'imediato um oficial superior revolucionário e de guarnição um certo número de primeiros e segundos tenentes. Até aqui não me referi a pessoas, mas agora é necessário provar com exemplos, e tenho que me referir pessoalmente aos oficiais. .
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algum dos oficiais cuja antiguidade ainda hoje é de se- l telo, não só na minha presença, mas também de vários
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gundo tenente, com mais razão se manifestava aquela dificuldade.
O Sr. Miranda do Vale: —tiendo assim, os oficiais da revolução ficavam inibidos de comandar.
O Orador: — Estes oficiais, como o Sr. Cabeçadas e outros que estão i3a mesma situação, não podiam ter sob as suas ordens nenhum primeiro tenente.
Mas ainda quando tudo isto fosse possível, teriam os oficiais revolucionários necessidade de servir sempre jun tos, aos pares nos navios.
Pior seria ainda o caso de se considerar facultativo a uni oficial servir ou não sob as ordens de oficiais mais graduados, mas menos antigos; não se compreende realmente que numa corporação militar, em que os serviços devem ser feitos por escala, se esteja a perguntar aos oficiais, se querem ou não servir sob as ordens deste ou daquele superior.
Isso é que seria um- causa de indisciplina e que teria grandíssimas dificuldades.
V. Ex.a compreende que, numa cooporação organizada, nào se podem estar a fazer perguntas dessa natureza; eu mesmo que estou pronto, que não tenho a menor dúvida em servir sob as ordens de qualquer dos oficiais revolucionários, cuja antiguidade é menor que a minha, não gostava que me viessem perguntar se me melindrava por isso.
Mais desagradável seria ainda a situação daqueles oficiais, que não poderiam possuir todas ás regalias dos seus 'postos, sujeitos a cada momento a que um oficial se ne-
gasse dens.
servir, ou a continuar a servir sob as suas or-
O Sr. Artur Costa: — Eu lembrei esse alvitre porque julgo que é o que já se tem feito em casos idênti-
cos.
O Orador:—Eu não sei se tal se tem feito; julgo que
não
Em todo o caso, entendo que, emquanto os decretos do Governo Provisório não foram revistos, eram lei do país, e como tal ninguém tinha o direito de se sobrepor a ela.
O Sr. Sousa Júnior:—Mando para a mesa umas últimas redacções.
O Sr. Arantes Pedroso:—Eu já disse que a proclamação da República se deve «principalmente» aos oficiais revolucionários, e sobre este assunto nada mais tenho a dizer.
Pedi a-palavra para me referir aos argumentos apresentados pelo Sr. Botelho de Sousa.
V. Ex.a começou por dizer que os postos de acesso estavam na lei; não há dúvida nisso, mas é só um, .e, portanto, o prejuízo de antiguidade não tem a mesma latitude que no caso em discussão, pois houve dois e .três postos de acesso ; o mal é agora muito maior.
Disse-se também aqui na Câmara, que, quando um oficial é promovido em combate, ninguém reclamava; mas o que ninguém pode afirmar é que, tanto no exército, como na armada, esses postos de acesso fossem recebidos sem protesto.
O Sr. Abílio Barreto: — Quando foi do posto de acesso que teve Mousinho de Albuquerque, foi muito bem recebido por todos os. oficiais de cavalaria.
O Orador:—Os oficiai^ de cavalaria não constituem só o exercito.
Mousinho ele Albuquerque declarou em Viana do Cas-
paisanos, que o maior- erro da sua vida fora ter aceitado a promoção, porque dizia ele, se tivesse de voltar para o exército, não era bem recebido pelos seus camaradas que tinham sido mais antigos.
i
O Sr. Abílio Barreto: — O ?que é facto ó que em, toda a parte essa promoção se fez com agrado.
O Orador: — V. Ex.a não pode negar o que eu estou a dizer.
Não se fizeram protestos contra a promoção de Mousinho. porque oficialmente não se podiam fazer, pois a lei era bem clara; contudo, nos centros onde se reuniam os elementos militares houve quem protestasse, como sempre tem sucedido quando se dá o posto de acesso.
O Sr. Abílio Barreto: — Eu não duvido do que V. Ex.a está a dizer.
O Orador:—V. Ex.a, Sr. Presidente, sabe bem que a antiguidade tem sido sempre respeitada. O próprio Governo Provisório, apesar dos decretos aqui citados, colocando os oficiais promovidos perpetuamente fora do quadro, parece não teve outro fim senão fazer com que êsses-oficiuis não pudessem concorrer em serviço com os oficiais que eram mais antigos, quando não, tinha-os promovido, deixando os'ficar no quadro.
O Sr. Ministro da Guerra do Govern o Provisório colocou os oficiais promovidos num quadro de honra, e sabe V Ex.a que esses oficiais em nada prejudicam os seus-camaradas que eram mais antigos.
Ainda há mais, Sr. Presidente, as praças de marinha promovidas para a Guarda Republicana e que depois pediram para voltar para o Corpo de Marinheiros, vieram ocupar o seu primitivo lugar e as que foram promovidas-no mesmo Corpo, foram-no sem prejuízo de antiguidade, e assim creio bem que no Corpo de Marinheiros está um-sargento nestas condições, os cabos mais antigos não podem servir sob as suas ordens.
Há uma questão psicológica da vida militar, como disse há pouco o Sr. Peres Rodrigues, que se estende tambêmr um pouco, à classe civil e, assim, o próprio Ministro do Fomento, quando promoveu os empregados dos correios e telégrafos- parece que o fez sein prejuízo de antiguidade.
Sr. Presidente: o dizer-se que nunca se tem protestado-contra a questão de antiguidade, não é verdade.
Quando Capelo e Ivens fizeram a travessia da África, esse ousado feito encheu de pasmo e admiração a Eu-ropa c quási todo o mundo civilizado, e a|corporaçao da-armada, no regresso dos exploradores, preparou-lhes a mais estrondosa e entusiástica festa de recepção,Çque se tem feito na marinha de guerra.
O Governo de então trouxe às Camarás um projecto de-lei que promovia ao posto imediato .os ilustres oficiais. Aconteceu, porem, que esse feito foi considerado corno-tendo sido praticado em combate e, então, não foram 148-requerimentos os que se enviaram à Câmara dos Deputados, talvez não chegassem a uma dúzia e o facto é que-um Parlamento monárquico atendeu a justiça dos reclamantes e modificou o projecto de lei, dizendo que a?pro-moção era sem prejuízo da antiguidade.
.0 Sr. Ladislau Parreira: — O Sr. Ivensfnemfpodia-ser promovido a contra-almirante.
O Orador:—,J Porquê?
O Sr. Ladislau Parreira: fora do quadro.
-Estava há dezoito anos
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falar sem de leve, sequer, proferir qualquer cousa que o possa magoar.
Sussurro que não deixa perceber o orador.
V. Ex.a interrompendo me coloca-me numa posição pouco airosa, pois tenho de J h e responder; contudo dir-lhe hei que, estivesse ou não fora do quadro, podia ter o posto de acesso; basta para S. Ex.a se convencer disso, ler a lei de Agosto de 1892.
Sr. Presidente: o argumento do Sr. Botelho de Sousa de que os oficiais promovidos não tinham, se passasse o meu aditamento, oficiais com quem embarcassem, oíí com quem servissem noutra qualquer comissão, não tem valor ai-gum, pois todos eles tem oficiais mais modernos erc condições de poderem servir debaixo das suas ordens.
Se há um, que realmente seria difícil haver, oficial mais j moderno para servir sob as suas ordens, não é isso razão \ para que se prejudique moralmente uma corporação in- ' teira, pois esse oficial tinha outras comissões de serviço, onde podia ser empregado até que houvessem oficiais com quem pudesse embarcar.
Interrupções.
Vai V. Ex.a ver: Ainda há poucos dias fcmos em piedosa romaria acompanhar os restos mortais das vítimas do desastre ca canhoneira Faro, 'entre as quais vinha o primeiro tenente Metzner, que ninguém pode dizer que não'era republicano. Esse primeiro tenente tinha quarenta e quatro anos de idade e treze de primeiro tenente. Outro argumento do Sr. Botelho de Sousa é que os oficiais, quando vão para o ultramar servir, ficam servindo sob a ordens doutros mais modernos. O argumento não tem valor de espécie alguma, porque esses oficiais que vão para o ultramar ficavam por lei de 1848, salvo erro, fora do quadro e não concorriam em serviço com os que eram mais antigos, e se hoje se porie dar o facto apontado pelo Sr. Botelho de Sousa, épirque os oficiais não se ofereceram para ir para o ultramar., conforme manda a lei, e ficam preteridos porque assim o querem. O outro argumento apresentado também não tem importância, parece-me. Diz S. Ex.a que no exército vai haver promoções por escolha entre os coronéis; ,; mas a essa promoção todoa podem concorrer? Quem estiver mais habilitado é preferido. Ora em campanha e no caso cue discute, só concorrem os nomeados, o caso ó completa-mente diverso e o mesmo argumento me serve para combater S. Ex.a relativamente às promoções por mérito esis-tentes nalgumas marinhas estrangeiras, pois todos podem concorrer a essa promoção. Sr. Presidente: inais uma*vez insisto pela aprovação do meu aditamento, os argumentos apresentados contra ele, como V. Ex.a viu. foram facilmente destruídos e a provando-o, torno a dize-Io, haverá união na corporação da Armada, o que é um bem para a República e para o pais. Tenho dito. O Sr. Botelho (Ie Sousa: —Sr. Presidente: isto vai se eternizando e eu não quero tomar mais tempo à Câmara; mas tenho de proferir ainda algumas palavras. É certo que a lei de 1892 prevê um posto de acesso por distinção. Mas para" o caso dá-se a alteração de antiguidade, quer a promoção seja dum ou de mais postos. Interrupção do .Sr. Arardes Pedroso que nào se percebeu. O Governo Provisório tinha poderes para fazer as promoções como as fez. E não pude haver dúvidas sobre as suas intenções, porque as que houvesse, desapareciam com o segundo decreto que esclareceu o primeiro. Disse também o Sr. Senador Peres Rodrigues que a psicologia do militar não aceita bem estas alterações na escala. Mas então temos que reconhecer que a nossa psicologia militar é diferente da de todas as corporações militares estrangeiras. Em todos os países se dão essas passagens. O Sr. Arantes Pedroso: —V. Ex.a sabe que em Inglaterra -não há essae promoçSes, por se ter visto o grave inconveniente desse facto. Só existe actualmente a promoção por combate. O Orador: — i Em Inglaterra? Existem lá essas promoções. Ali, é frequente ver promover de tenentes a capitães de fragata ura certo número de oficiais novos, que assim saltam por cima de numerosos camaradas seus; e mais tarde ainda promovê-los a capitães de mar e gtíerra, tudo com o fim de ter oficiais novos nos postos superiores. £ Periga a disciplina? Não. O Sr. Arantes Pedroso:—Disse que essas promoções eram por mérito: todos podem concorrer. O Orador:—Entende S. Ex.a que um oficial, por ter mais mérito, pode passar por cima doutros, e que o não pode sem perigo para a disciplina, o que se distingue por actos de heroismo. Sussurro. Vozes:—Ordem, ordem. O Orador:—Neste combate especialíasimo os que lá foram, foram por sua livre vontade. £ Porque não foram mais? Porque não havia talvez. Depois não se diga que é mau para a disciplina forçar os oficiais mais antigos a servir sob as ordens de mais modernos, mas mais graduados. Se é mau para a disciplina forçá-los, pior é, sem dúvida^ consultá-los. As leis militares, mais ainda que as outras, tem de ser rigorosamente cumpridas. O Sr. Faustino da Fonseca: — Acaba de dizer um oficial de marinha, nosso colega da Câmara Alta, que ao posto de general concedido por distinção todos podiam concorrer. j Podiam e deviam concorrer todos!
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Aqueles que se consideram melhores do que os bravos oficiais revolucionários deviam ter saído para a rua e então teriam direito a comandá-los, desde que os excedessem em decisão, em energia e em espírito de sacrifício.
Revolta-ine a hipocrisia monstruosa com que nesta sala sombria fingimos ter o direito de premiar, de promover, de distinguir esses homens que se distinguiram por si próprios, que assumiram por sua própria deliberação o supremo comando, que se fizeram a si próprios almirantes, generalíssimos, reis, presidentes, tudo quanto significava o poder, tudo quanto representava o poder, tudo quanto era de facto o supremo poder, a lialdade, a fé pelo ideal, e o espírito de sacrifício.
Eu pedi a palavra quando um outro Senador, que é também oficial de marinha, se referia à psicologia profissional militar, dizendo estar nessa odiosa psicologia a resistência às promoções por distinção.
A psicologia do militar profissional é a que levou os assassinos fardados de 4 de abril a fuzilarem a frio no Largo de S. Domingos esses heróicos republicanos que morreram traçando barretes frígios com o seu sangue fu-megánte.
Essa psicologia desprezo-a, com tanto mais direito quanto é certo que também fui militar.
Citou-se ontem aqui a opinião do Sr. Brito Camacho. Eu servi com o Sr. Brito Camacho que, sendo militar, escreveu que a força pública em vez dum braço se tornara um estômago.
Por isso ele e eu, e muitos outros abandonámos a fileira, porque então na fileira se pensava mais na gamela e na marmita do que no dever de servir a Pátria.
Assim, com militares e marinheiros servilmente dobrados ante o rei, com militares e marinheiros capazes de todas as cobardias, cúmplices de todas as cobardias, defensores de todas as cobardias; com militares e marinheiros que cederam ante o ultimatum inglês fuzilando o povo e apoiando o rei; que cederam ante a exigência da Alemanha na questão de Keonga, desprezando o clamor do povo e defendendo a traição do rei: que permitiram a intervenção dos estrangeiros na Junta de Crédito Público, vendendo o futuro do povo, e assegurando assim o trono do rei; perante esses traidores, nós não podíamos admitir outra noção do dever militar que não fosse o da revolta.
Estes oficiais estão portanto muito bem promovidos, não porque precisem das promoções pelo interesse material que tirem delas, mas porque a Nação precisa deles, para lhes confiar os altos postos em que necessita de lialdade, de bravura e de coragens provadas.
Não me repugnaria admitir a emenda proposta pelos Senadores do grupo democrático, de que estes oficiais promovidos por distinção, por serem aqueles que dirigiram a revolução republicana, só pudessem assumir o comando de navios com subalternos promovidos por distinção ou com os que aceitassem a sua patente, isto é, com bons e leais republicanos postos à prova. Não a aceito porque isso é que constituiria uma humilhação para o resto da classe.
Na ©casião do perigo, todos os altos comandos, todos os postos de responsabilidades, iriam para esses e só para esses, pelo seu direito incontestável de liais soldados da República. Isso não. Que todos sirvam a República, porque a República fez-se para todos os portugueses; porque a doutrina do partido evolucionista é a política de atracção mas com selecção e subordinação. Portanto, quem quiser servir lialmente a República, tem que acceitar a selecção isto é, a escolha destes oficiais promovidos pelo Governo Provisório, em face das indicações unânimes da opinião; a subordinação, isto é, o dever de aceitar lialmente e sem reservas o comando daqueles que conquistaram o direito de comandar, arrancando da sua espada e fazendo-a fulgurar como um gládio justiceiro na salvação da Pátria pela República. . . j
Senhor Presidente: eu não* teria falado, eu teria cedido aos pedidos que me fizeram para que não falasse se não fosse a repugnância pela falta de sinceridade e pela hipocrisia.
Não temos o direito de regatear o comando aos homens que comandaram no dia da revolução. Os revolucionários ainda armados, frementes do combate, foram reclamar ao Ministério da Guerra, onde reuniu o Governo Provisório, que se entregasse o comando do corpo de marinheiros ao comandante Parreira, que mandara romper fogo contra o Paço.
£ Quem precisou disso ? Ele que cumprira o seu dever, ou a República que necessitava da ordem e da disciplina naquela gloriosa falange ? Foi a República que lhe impôs o sacrifício do comando e para isso o proveu dos necessários galões. E o que fez para com ele, fez para com os outros seus colegas. Senhores, lembrem-se de que não somos nós que os promovemos, foram eles que nos trouxeram até aqui. O povo estava comnosco, mas os nossos diplomas eram rasgados, os nossos eleitores fuzilados, campeava a traição, o roubo e a cobardia. E é porque Parreira manda bombardear o Paço, porque Carlos da Maia assalta como um leão o cruzador «D. Carlos», porque os canhões de bordo troam constantemente, dominando as cobardes pistolas da polícia e as infames espingardas da guarda municipal, nunca fartas de assassinai o povo, que nós pudemos assumir em nome do povo, os supremos destinos da Nação.
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É lida e admitida a seguinte
Proposta
Artigo 1.° São confirmados, para continuarem em vigor, os decretos do Governo Provisório, que, em recompensa dos relevantes serviços prestados à causa da República na revolução de 1910, concedem reintegrações, nomeações, pensões, mercês honoríficas e louvores aos oficiais e praças de terra e mar e aos empregados da Direcção Geral dos Correios e Telégrafos, a que os mesmos decretos se referem. ==Faustino da Fonseca.
O Sr. Adriano Pimenta: — Sr. Presidente: vou ser o mais breve possível, visto que me cabe a palavra nesta altura da sessão.
Antes, porém, de entrar nas considerações que vou fazer para justificar o meu voto, devo começar por me referir a umas palavras proferidas pelo Sr. Miranda do Vale, que disse que os republicanos sinceros tinham por dever não apoucar nem o movimento de 5 de Outubro, nem os homens que nesse movimento entraram.
Sr. Presidente: eu prezo-me de ser republicano e sincero, porque antes da República trabalhei bastante por ela, e depois alguma cousa tenho feito em favor da mesma causa, e por isso ninguém me pode acusar de menos sincero, porque da República só tenho colhido sacrifícios e alguns dissabores. Portanto, Sr. Presidente, não desejo apoucar o movimento de 5 de Outubro, nem os homens que tomaram parte nesse movimento.
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cute a acção ou as relações que os oficiais promovidos possam ter com os outros oficiais da mesma armada, àqueles dirijo mais particularmente os meus cumprimentos, declarando que é com entusiasmo que vejo passar os seus nomes para a história da Pátria Portuguesa.
or. Presidente: se faço os meus cumprimentos aos revolucionários de 5 de Outubro, devo também dirigir palavras de muito respeito e consideração à corporação a que pertencem.
Saiido toda a armada portuguesa, porque dentro dela há soldados e oficiais que tem prestado grandes serviços á Pátria Portuguesa e estão prestando também à República e por isso merecem o respeito e consideração pública e do Senado português.
S. Ex.a contou que. quando um primeiro tenente vinha a comandar os seus homens, depois do movimento revolucionário, houve um oficial, de patente superior, capitão de mar e guerra, se me não engano, que se dirigiu a esse primeiro tenente, e lhe ofereceu os seus serviços
Se dentro da oficialidade de armada portuguesa, existem oficiais de elevada patente, que assim prestam essa homenagem àqueles que combateram a favor da República, é justo que nós aqui. no Senado, também por nosso turno prestemos a nossa homenagem àqueles que tão lial-mente procederam.
E feitos assim os meus cumprimentos, nào só aos oficiais revolucionários, mas a todos os que pertencem â corporação da armada, com grande desafogo, com grande serenidade, e com intensa justiça, porque eu estou absolutamente convencido de que ninguém me poderá acusar de qualquer intento de partidarismo, julgo-me no direito e no dever de discutir o projecto que está em ordem do dia, e, nestes termos, mando para a tuesa uma proposta de aditamento.
Sr. Presidente e Srs. Senadores; eu creio que os oficiais são os únicos competentes para escolher a melhor maneira de escalar o serviço, ou indicar como o mesmo serviço tem de ser feito, sem provocar melindres e sem ferir susceptibilidades.
Eu, na proposta que mando para a mesa, não tenho a pretensão de resolver o problema.
Na minha proposta limito me a exarar o principio de que é preciso respeitar, nas promoções feitas peLo Governo Provisório, o direito de antiguidade.
O assunto que hoje se debate nesta Câmara, é bastante-mente delicado e cheio de melindres, e tanto que bastaria um simples equívoco para despertar um conflito pessoal ou susceptibilidades pessoais, que nós precisamos arredar absolutamente.
Nós, ao discutir este projecto que veio da Câmara dos Deputados, não devemos ferir, nem as susceptibilidades dos oficiais promovidos pelo Governo Provisório, nem a dos oficiais qua existem na nossa marinha de guerra.
A discussão tem de correr serena; a discussão tem de se afastar de preocupações políticas, partidárias, ou de quaisquer outras preocupações de interesses de classes.
O respeito, o amor que todos os portugueses votam L nossa marinha de guerra, não permitem que no Senado da República Portuguesa se faça política à sombra dos seus interesses políticos. (Apoiados).
O povo português vê com adoração a nossa marinha de guerra, ama-a, como que vendo nela uma revivescência das 'suas grandes glórias, mas ela tem de ser um factor poderoso para manter o nosso domínio nas colónias, para manter esta situação da nossa Pátria, de que a alma portuguesa carece para poder viver em toda a sua plenitude, em toda a sua grandeza; e a marinha de guerra portuguesa, Sr. Presidente, é um penhor da nossa segurança, é um penhor da segurança das nossas colónias, honrosa tradição de unidade, de disciplina e lialdade que sempre tem mantido.
Sr. Presidente: parece-me que essa unidade, que era característica da armada portuguesa, está hoje profundamente abalada, graças ao decreto das novas promoções.
Todavia, Sr. Presidente^ o decreto do Governo Provisório é tudo quanto há de mais justo, tudo quanto há de mais correcto, tudo quanto há de mais digno na sua intenção e na sua essência.
O Governo Provisório, fazendo as promoções, não fez um favor, não fez um dom da sua graça, não tez mais do que exprimir o sentimento do povo português; não fez um obséquio aos heróis que se bateram pela República, nào fez mais do que exprimir o sentimento de gratidão e admiração que estava bem fundo e bem talhado na alma portuguesa.
O Governo Provisório não fez um favor aos oficias que promoveu ; estes oficiais tiveram através dos decretos do Governo Provisório a simples consagração que o povo republicano quis dar aos que se bateram desde a primeira hora.
Sr. Presidente: se o decreto do Governo Provisório foi uru acto de justiça, se esse decreto foi uma manifestação da aírna popular, o que é certo também, é'que o Governo Provisório falhou um pouco na forma com que devia atender aos costumes e à disciplina dos nossos oficiais.
Se o decreto do Grovérno, Provisório fazendo a promoção por distinção, foi de facto um acto de justiça e do consagração, £ qual seria o motivo por que se levantou agora da parte dos oficiais da nossa armada, destes homens que tem uma larga folha de serviços ao seu país, que tem a concepção clara das suas responsabilidades perante o país, porque se levantou, não direi um protesto, mas uma reclamação a este Parlamento para que se atenda um pouco as ?uas susceptibilidades feridas ou magoadas?
E preciso dizer-se com toda a franqueza e rudeza que o caso importa, porque não se podem empregar em situações desta natureza hipocrisias que ocultem a verdade; é preciso dizer-se que, contrariamente ao que ouvi, na armada existe de facto um fermento de discórdia.
Sr. Presidente: a esta casa do Parlamento nào, rnas creio que á Câmara dos Deputados vieram muitos requerimentos de oficiais da armada que reclamavam para que nas "promoções feitas pelo Governo Provisório e que tem de ser ratificadas pelo Parlamento, se salvaguarde a ques-tâo^da antiguidade.
Esses requerimentos de que vim tomando nota não são dum número limitado de oficiais despeitados.
O número desses requerimentos sobe a cento e quarenta e oito e entre esses requerimentos existem um de vice-almirante e quatro de contra-almirantes.
E preciso dizer a verdade.
Estes só por espírito de disciplina, eu entendo que ré? clamassem.
Como V. Ex.a, vê o número é considerável, mas há ainda muitos oficiais da armada que não requereram, por julgarem ter passado a ocasião de o poderem fazer e apesar de o não terem feito, sentem um mal-estar que, se não é perigoso para a República, pode, todavia, estabelecer dificuldades que o Senado tem necessidade de arredar da vida política.
Muitos desses oficiais estão dispostos a pôr-se fora do serviço activo, por meio do licença ilimitada.
O Sr. José de Pádua: — i^Isso é uma ameaça? ! Apartes.
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sobre essa Classe a sombra de qualquer suspeita de pretender encobrir qualquer cousa.
Sr. Presidente: o facto é este e é justo que se saiba... (sussurro) que se pese e aprecie para podermos tomar uma resolução de tal maneira que não crie dificuldades á República já tam assoberbada delas... (sussur-
ro^
Sr. Presidente: qual será o motivo por que essa corporação da armada, num grande número, porque é preciso que se saiba que muitos outros oficiais não requereram por-estarem em comissões e outras funções, como as dos capitães dos portos.. .. (sussurro).
Sr. Presidente: eu peço a V.,Ex.a um favor; está-se tratando dum assunto grave, eu tenho ouvido com a maior atenção a opinião dos meus colegas e creio que tenho igual direito a ser escutado. Podem as rainhas opiniões não estar de acordo com a opinião da maioria desta Câmara mas, precisamente por isso, creio que não fica mal à Câmara a deferência de ouvir-me, de estudar-me, de julgar-me, mesmo, se quiser.
Ia eu dizendo, Sr. Presidente, que havia motivos sérios, em virtude dos quais a corporação da armada manifestava o seu mal estar em virtude das promoções feitas pelo Governo Provisório.
E que, no fundo, as promoções feitas pelo Governo Provisório, nas condições em que elas se fizeram, sem respeito pela' antiguidade, melindraram não só o espírito patriótico dos oficiais, mas até os sentimentos de muitos republicanos que existiam na armada.
V. Ex.a sabe muito bem que, independentemente dos oficiais que entraram na Revolução de 5 de Outubro, alguns mais havia, dentro da armada portuguesa, que eram republicanos, como tais conhecidos, e que haviam prestado serviços á Republica: ,;será, por acaso justo, que estes oficiais, pelo fac-.to de não terem estado em Lisboa, ou na o terem sido avisados para esse movimento que, teve de se precipitar, sejam magoados no seu brio de mi-litaves porque não tiveram ensejo de combater, como os outros?
Eu compreendo que a Câmara estabeleça de direito as promoções que, pelo Governo Provisório naquele mo mento foram feitas, mas é justo compensar os trabalhos e sacrifícios, e a compensação não foi grande, deve dizer; se.
E justo que" se não procure ferir ou magoar o resto da corporação que é digna de todo o respeito (Apoiados}.
Sr. Presidente: mas os motivos que levaram a corporação da armada ou uma grande parte a representar ao Parlamento, chamando a sua atenção para a situação irregular em que ficava, os motivos não sào uma vaidade fútil, os motivos existem mais fundos, existem conscien-teinunte no espírito militar, e existem sentimentalmente na alma do militar.
Ouvi dizer aqui, a oficiais, dentro do Senado, que por toda a parte se íazem promoções por distinção.
Parece que era matéria corrente em todos os exércitos, em todas as nações.
Devo dizer a V. Ex.a e ao Senado que as promoções por distinção estão hoje mal consideradas e julgadas.
Tive ensejo de ver que alguns escritores da especialidade, combatem duma maneira clara e nítida as promoções por distinção.
A Inglaterra creio eu que não tem mesmo as promoções por distinção.
Interrupção do Sr. Botelho de Sousa, que não se ouviu.
Não quero dizer que em Inglaterra não haja promoções por distinção, absolutamente.
J^.ào estou a dizer que as promoções por distinção não foram bem feitas. Foram feitas, porque o exército quis que elas se fizessem.
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A honestidade dos oficiais da armada foi tal que, nos seus requerimentos, não quiseram sequer referir-se a esta situação.
Mas as promoções, por distinção se não são aceitas em Inglaterra, existem em França.
Escritores militares há 'que as combatem à outrance, chegando a dizer que não pode nem deve haver nunca as promoções por distinção, porque as promoções não são prémios, mas imposições de autoridade, e exigem aptidões especialíssimas para que possam realmente dar-se.
Em Portugal houve as promoções de Mousinho e Roçadas, a que há pouco se referiram aqui. Essas mesmo são estabelecidas ern casos muitíssimo especiais.
Há escritores militares que declaram e que afirmam que os militares, nas promoções, tem de permanecer o mínimo do tempo nos postos.
De maneira, Sr. Presidente, que, quando os oficiais de marinha reclamam e requerem contra a forma por que foram feitas essas promoções, não contra as promoções que eles aceitam, mas independentemente da sua opinião formada pela leitura e pelo estudo, o que se não pode negar é que as promoções, como cá são feitas, ferem a psicologia do nosso militar.
Eu ouvi dizer aqui a um ilustre Senador e militar que só ein Portugal havia a sensibilidade esquisita dos oficiais se revoltarem por serem comandados por oficiais mais novos.
Eu devo dizer a V. Ex.a que não sou da especialidade, mas que tive o cuidado de procurar alguns conhecimentos sobre o assunto para formar uma opinião apenas, nada mais.
Eu devo dizer que a questão de antiguidade, o respeito da antiguidade, existe eui todos os exércitos, em todas as nações, e tão meticuloso ele é, que há todo o cuidaao em que nos regulamentos disciplinares se deve sempre respeitar e manter o principio de antiguidade.
Isto resulta que, quando numa comissão de serviço vão dois soldados, o mais antigo tem sempre urna acçào de fiscalização sobre o outro.
Daqui é conhecido de toda a gente, isto dá-se em toda a parte, e creio que ern Portugal também, se dá.
Sr. Presidente: a questão de antiguidade, portanto, é um princípio estabelecido em todos os exércitos, é um princípio estabelecido em todas as nações, é um princípio que entrou dentro da psicologia do militar, que faz parte do seu modo de ser.
Há pouco um ilustre militar, membro desta casa, referiu-se um pouco à psicologia e ao espírito militar, e essa psicologia existe de facto, e V. Ex.a, Sr. Presidente, sabe e sabem os Srs. Senadores que, alem da psicologia de cada um, existe a psicologia colectiva, que muitas vezes tem uma influência mais enérgica do que a individual.
Kxiste assim, Sr. Presidente, a psicologia dos profissionais, a psicologia dos advogados, a psicologia dos negociantes.
O princípio da antiguidade existe bem marcado na psicologia do militar," e a psicologia do militar é bem diferente da de qualquer cidadão.
A cada momento se ouve dizer a «honra militar».
Desde p momento que existe esta psicologia militar, contrariar esse principio é ir ferir susceptibilidades a tal ponto, que podem-se com isso criar dificuldades á República.
Sr. Presidente: com estas considerações não tive o intento de elucidar o Senado, porque creio que ele sabe muito bem quais são as responsabilidades que teru nesta hora. Pense o Senado maduramente e resolva com serenidade para evitar conditos, que no princípio duma República podem ser graves senão para a ordem, pelo menos para o sossego do país.
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ciais da armada, esses homens podem sentir amanhã esta injustiça que o Parlamento da República Portuguesa faz pesar sobre eles e, se ê^es são incapazes de fazer essa injustiça, fica-lhes contudo bem gravada na alma por verem que a República não pode cumprir os seus deveres. Tenho dito.
8. Ex.3- não reviu.
Foi lida e admitida a seguinte
Proposta
§ único. Os oficiais de marinha, que à data das prono-çoes dos oficiais a que se refere o artigo 1.°, eram mais antigos na escala das promoções, nào podem ser obrigados a servir sob as ordens dos oficiais promovidos cue então fossem mais modernos.= Adriano Pimenta.
O Sr. Martins Cardoso:—Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro que seja prorrogada a sessão, até se votar o projecto em discussão.-—Martins Cardoso;
Foi lido e aprovado.
O Sr. José de Pádua:—Não tenho a xinha assinatura no parecer, porque não assisti à reunião da comissão em que se concluiu a discussão do assunto ; todavia, assumo a responsabilidade do parecer, como se o tivesse assinado.
Entendo que o Senado não tem outra cousa a fazer sobre o assunto senão sancionar o que oGovêrno Provisório fez, interpretando a vontade de .todo o País.
Se assim não procedesse, o Senado iria degradar os oficiais de que se trata, isso é que seria fazer a indisciplina na vida militar.
A Nação quis promover aqueles oficiais. A armsda, se quer ser disciplinada, tem de atacar a lei que fez essas promoções.
S. Ex.'A não reviu.
O Sr. Arantes Pedroso: — Eu sou o primeiro a concordar com o Sr. Deputado José de Pádua, que realmente as promoções não devem ser todas por antiguidade, mas, como V. Ex.a sabe, ainda mesmo nos países onde existe a promoção por escolha, ela não é feita ao acaso, é feita por meio de exame, onde todos podem concorrer. O caso que se dircute é compleíaniente diferente.
Interrupção que nào se ouviu.
O Orador: — Lá estão V. Ex.as a quererem levar-me para o campo pessoal, para onde não quero seguir, onde tenho oficiais de que sou amigo e que sei que foram dos que mais concorreram para a proclamação da República.
O Sr. Presidente:—Como não está mais ninguém inscrito vai votar-se.
O Sr. Faustino da Fonseca: — Peço a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se permite que eu retire a minia proposta.
Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.
O Sr. Presidente:—Não há mais emendas ao projecto, há dois aditamentos um do Sr. Arantea Pedrcso e outro do Sr. Adriano Pimenta.
Vai portanto ler-se o artigo 1.° do projecto para ser votado.
Leu-se na mesa.
O Sr. Presidente:—Os Srs. Senadores que aprovam o artigo que acaba de ser lido tenham a bondade de se levantar.
Pausa.
Está aprovado por unanimidade.-
O Sr. Arantes Pedroso: — Peço a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se permite que eu retire o meu aditamento.
O Sr. Presidente.: — Os Srs. Senadores que aprovam que o Sr. Arantes Pedroso retire o seu aditamento tenham a bondade de se levantar.
Pausa.
Está aprovado.
Vai ler-se o aditamento apresentado pelo Sr. Adriano Pimenta.
Leu se na mesa.
O Sr. Sousa Júnior:—Requeiro a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se consente que haja votação nominal sobre essa proposta.
Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente. O Sr. Presidente:—Vai proceder-se à chamada.
Feita a chamada, procedeu-se à votação do aditamento apresentado pelo' Sr. Adriano Pimenta. Disseram a rejeito o 30 Sm. Senadores e «aprovo» 20. pelo que ficou rejeitado.
Disseram rejeito os Srs.: Abílio Baeta das Neves Barreto, Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos, Alfredo Botelho de Sousa, Alfredo José Durão, Aníbal de Sousa Dias, Anselmo Augusto da Costa Xavier, Anselmo Braamcamp Freire, António Augusto Cerqueira Coimbra, António Bernardino Roque, António Ladislau Parreira, António Ladislau Pi çarra, Artur Rovisco Garcia, Cristóvão Moniz, Faustiao da Fonseca, Francisco António Ochoa, Inácio Magalhães Basto, João José de Freitas, Joaquim Pedro Martins, José de Castro, José de Cuper-tino Ribeiro Júnior, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Pádua, José Maria Pereira, José Miranda do Vale, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel Martins Cardoso, Manuel Rodrigues da Silva, Manuel de Sousa da Câmara, Ricardo Paes Gomes, Tomás António da Guarda Cabreira.
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Foi mandada para a mesa a seguinte
Declaração de voto
Declaro que votei o § único proposto pelo Sr. Senador Adriano Pimenta, pela razão de entender que nenhum dos oficiais promovidos por distinção desejará no seu íntimo ter às suas ordens ern qualquer comissão camaradas que j de antemão sabe que sentiriam desgosto sincero com isso, e também porque, como verdadeiro liberal e democrata que me prezo de ser, nunca darei o meu voto a qualquer acto que corresponda a uma injustiça, seja contra quem for, e muito menos contra distintos camaradas que a República não deve de modo algum magoar na sua dignidade e ferir no seu sentir íntimo.
Sala das sessões do Senado, em 22 de Março de 1912.= José Nunes da Mata.
O Sr. Afonso de Lemos: — Pedi a palavra apenas para mandar para a mesa uma representação da Associação Comercial dos Lojistas de Lisboa, e peco a V. Ex.a que seja publicada no Diário das Sessões.
O Sr. Presidente: — Sendo constituída esta proposta de lei apenas por dois artigos, um dos quais ó o que respeita à legislação em contrário, considero-a votada e aprovada, tanto na generalidade, como na especialidade; sem embargo disso, para evitar dúvidas, vou pôr à votação o artigo 2.°
Lido j foi aprovado.
O Sr. Presidente : — A próxima sessão é na segunda-feira.
Antes da ordem do dia discussão das quatro propostas já admitidas dos Srs. Senadores: l.a Goulart de Medeiros; 2.a Nunes da Mata; 3.a Nnnes da, Mata, Botelho de Sousa, Peres Rodrigues e Magalhães Basto e 4.a Silva Barreto.
Na ordem do dia os pareceres n.os 90 e 93.
Está levantada a sessão.
Eram 18 horas.
Representação
Ilustres Senhores Senadores.—De há muito que a Associação Comercial de Lojistas de Lisboa vem reclamando junto dos poderes competentes, contra a expansão imoral do vício de jogar. De todas as vezes e a todas as entidades superiores, esta colectividade tem procurado pôr bem em relevo os gravíssimos inconvenientes de toda a ordem que resultam da permissão, ou seja da indiferença, com que, por todo o país se especula com os viciosos dos jogos de azar, e, ainda mais, com os que apenas começam a experimentar a tentação desse inqualificável vício.
DE MARÇO DE 1912 17
Agora, porem, que s« fala em regulamentar o jogo, essa especulação irifamante, procurando-se, ao .que parece, dar foros de legalidade ao escândalo, a Associação Comercial de Lojista? de Lisboa não pode ficar silenciosa, pois que na pugna moral em que tem andado empenhada — em nome das classes activas que tem a honra de representar — jamais soube o que seria transigir com o erro ou contemporizar com o abuso.
A sedução do dinheiro, a cubica do ganho, que embriaga e alucina os espíritos menos reflectidos ou mais tarados para o vício, tem produzido verdadeiras catástrofes numerosas. Frequentes são os casos em que a vida do jogador desfecha no epílogo trágico, sem dúvida evitável, se a insubsistente tolerância que até aqui tem pejado a existência dum pais civilizado tivesse cedido honradamente o passo a uma lei proibitiva, assente em bases p 'nderadas, exequíveis, ao mesmo tempo rigorosas e justas.
Não é nosso intuito, neste momento, reproduzir as razões que se opõem à regulamentação do jogo, tornando, pelo contrário, urgentes e indispensáveis medidas de repressão enérgicas e profícuas. Essas razões são óbvias e não carecera de atavios para se imporem à consideração de todos aqueles sobre quem pesa a grande responsabilidade de legislar. Entendendo que evitar a miséria de muitas famílias, a perda de muitos cidadãos, constitui um dever que não pode ser trocado pelo desejo de concorrer para a ruína alheia, a Associação Comercial de Lojistas de Lisboa mais uma vez requer dos poderes públicos providências decisivas para a proibição completa e não iludida de todos os jogos de azar, por meios infalíveis e inclementes.
E isto, Senhores, que esta colectividade espera da dignidade parlamentar, afim de que se extinga por uma vez essa voragem vergonhosa que os interesses ilícitos pretendem ver legalizada. E contra toda e qualquer contempo-rizacão com o vício do jogo que a Associação Comercial de Lojistas de Lisboa muito respeitosamente protesta, certa de que os poderes constituídos da República Portuguesa saberão cumprir o seu dever de moralidade.
E assim não se dirá que o que a monarquia justificada-mente recusou, resistindo aos insistentes pedidos com que foi assediada, tanto no país como no estrangeiro, encontrou na República fácil acolhimento e protecção.
A Associação Comercial de Lojistas de Lisboa manifesta a sua reprovação mais veemente contra o projecto da regulamentação do jogo pendente do Parlamento, na primeira legislatura da República Portuguesa.
Na assembleia geral desta colectividade realizada em 19 do corrente foi deliberado dirigir-vos este apelo, na convicção de que ele merecerá a vossa ponderada atenção.
Saúde e Fraternidade.
Lisboa, em 21 de Março de 1912.=Pelos corpos gerentes, José Pinheiro de Melo — José Romão de Matos.