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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

37.ª SESSÃO ORDINÁRIA DO 3.º PERÍODO DA 1.ª LEGISLATURA

1912-1913

EM 6 DE FEVEREIRO DE 1913

Presidência do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretários os Exmos. Srs.

Evaristo de Carvalho
Arantes Pedroso

Sumário. - Chamada e abertura da sessão. Leitura e aprovação da acta. Expediente.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Arantes Pedroso fala sôbre um folheto que se publicou relativo a assuntos coloniais, respondendo-lhe o Sr. Ministro das Colónias (Almeida Ribeiro).

O Sr. Miranda do Vale chamou a atenção do Govêrno para uns decretos de transferências de verbas, respondendo-lhe o Sr. Ministro dos Estrangeiros.

O Sr. Bernardino Roque declara concordar inteiramente com a resposta dada pelo Sr. Ministro das Colónias ao Sr. Arantes Pedroso.

Lê-se o parecer n.º 37 (relativo à administração do Arsenal do Exército). Usa da palavra o Sr. Goulart de Medeiros, que declara não concordar com o projecto, sendo adiada a discussão, por proposta do Sr. Presidente, até ali comparecer o Sr. Ministro da Guerra.

Como não houvesse número para tomar deliberações, foi dada a palavra ao Sr. Silva Barreto, que faz considerações sôbre assuntos relativos à pasta do Interior, respondendo o Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues).

O Sr. Sousa Júnior fala tambêm sôbre assuntos relativos à pasta do Interior, respondendo-lhe o respectivo Ministro.

Os Srs. Cupertino Ribeiro, Goulart de Medeiros e Pais Gomes fazem considerações relativas à pasta do Fomento, respondendo-lhes o respectivo Ministro (António Maria da Silva).

Ordem do dia. - Continua em discussão o projecto n.º 38 (Ministério de Instrução Pública).

Lê-se a questão prévia do Sr. Goulart de Medeiros, que é rejeitada.

Lê-se a do Sr. Miranda do Vale, que continua em discussão.

Falam os Srs. José de Pádua, Ministro do Interior, Miranda do Vale, Silva Barreto e Ladislau Piçarra.

O Sr. Nunes da Mata manda para a mesa o parecer sôbre a proposta relativa à contribuição predial, pedindo para a sua discussão a possível urgência o Sr. Presidente do Ministério.

É revogada, por votação, a deliberação anteriormente tomada de não poderem os Ministros, que não fazem parte do Parlamento, apresentar propostas sôbre os projectos em discussão.

O Sr. Presidente encerra a sessão.

Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:

Abílio Baeta das Neves Barreto.
Alfredo José Durão.
Amaro de Azevedo Gomes.
Anselmo Augusto da Costa Xavier.
Anselmo Braamcamp Freire.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Augusto Cerqueira Coimbra.
António Bernardino Roque.
António Maria da Silva Barreto.
Augusto de Vera Cruz.
Domingos Tasso de Figueiredo.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Faustino da Fonseca.
Inácio Magalhães Basto.
José António Arantes Pedroso Júnior.
José de Cupertino Ribeiro Júnior.
José Machado de Serpa.
José Maria de Moura Barata Feio Terenas.
José Miranda do Vale.
José Nunes da Mata.
Luís Fortunato da Fonseca.
Manuel Goulart de Medeiros.

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Manuel José de Oliveira.
Manuel Rodrigues da Silva.
Pedro Amaral Bôto Machado.
Ramiro Guedes.
Tomás António da Guarda Cabreira.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Alberto Carlos da Silveira.

ntónio Brandão de Vasconcelos.
António Caetano Macieira Júnior.
António Joaquim de Sousa Júnior.
António Ladislau Parreira.
Artur Augusto da Costa.
Carlos Richter.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
José Afonso Pala.
José Estêvão de Vasconcelos.
José Maria de Pádua.
Leão Magno Azêdo.
Luís Maria Rosette.
Manuel Martins Cardoso.
Ricardo Pais Gomes.
Tito Augusto de Morais.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Adriano Augusto Pimenta.
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Alfredo Botelho de Sousa.
António Ladislau Piçarra.
António Pires de Carvalho.
António Ribeiro Seixas.
António Xavier Correia Barreto.
Artur Rovisco Garcia.
Bernardo Pais de Almeida.
Cristóvão Moniz.
Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro.
Francisco Correia de Lemos.
João José de Freitas.
Joaquim José de Sousa Fernandes.
Joaquim Pedro Martins.
José de Castro.
José Luís dos Santos Moita.
José Maria Pereira.
Manuel José Fernandes Costa.
Manuel de Sousa da Câmara.
Sebastião de Magalhães Lima.

Pelas 14 horas e 30 minutos, o Sr. Presidente mandou proceder à chamada.

Tendo-se verificado a presença de 24 Srs. Senadores, S. Exa. declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão anterior, foi aprovada sem reclamação.

Mencionou-se o seguinte

EXPEDIENTE

Ofícios

Do Ministério do Interior, comunicando que não pode enviar os documentos pedidos pelo Sr. José Maria Pereira, referentes à sindicância pedida pelo professor do Liceu de Camões, Artur Fernando Rocha, por os mesmos documentos se acharem em poder do sindicante.

Mandou-se dar conhecimento ao interessado.

Do Ministério das Finanças, enviando uma nota das moedas de prata de 50 centavos, com a efígie da República, cunhadas na Casa da Moeda até 27 de Janeiro último e entregues ao Banco de Portugal, satisfazendo assim ao pedido do Sr. Senador João José de Freitas.

Mandou-se dar conhecimento.

Do Ministério do Fomento, remetendo os documentos pedidos pelo Sr. José de Cupertino Ribeiro Júnior, em sessão de 19 de Dezembro findo.

Mandou-se dar conhecimento.

Do Ministério das Colónias, enviando cópia do contrato provisório celebrado naquele Ministério, em 5 de Dezembro último, para o fornecimento de energia eléctrica em Lourenço Marques, satisfazendo assim ao pedido do Sr. Faustino da Fonseca.

Mandou-se dar conhecimento.

Do Ministério das Colónias, remetendo duas cópias do telegrama expedido por êste Ministério ao governador da província de Cabo Verde, em 8 de Outubro último, sôbre os vencimentos dos oficiais, que exerciam comissões civis naquela colónia; e do telegrama recebido daquele governo.

As cópias dos restantes documentos, respeitantes ao mesmo assunto, serão remetidas oportunamente, visto terem sido pedidos os necessários elementos ao governador daquela província.

Com respeito ao processo relativo a queixas do primeiro oficial aduaneiro João Bento Rodrigues Alves Fernandes, deu entrada

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o mesmo processo na Direcção Geral de Fazenda, onde está à disposição do Sr. Manuel de Sousa da Câmara.

Para a Secretaria.

Da Associação Central da Agricultura Portuguesa, remetendo uma representação da mesma associação relativamente à resolução da Câmara dos Deputados, de 29 de Janeiro último, sôbre contribuição predial.

Foi mandada publicar no "Sumário".

Do juízo de direito da 4.ª vara de Lisboa, pedindo para que o Sr. Elísio Pinto de Almeida e Castro seja autorizado a comparecer naquele juízo no dia 8 do corrente, pelas doze horas, a fim de depor como testemunha na acção de divórcio litigioso intentado por António Pires Pereira Júnior contra sua mulher, D. Sofia da Silva Rosa.

Foi concedida.

Da Presidência da Câmara dos Deputados, remetendo uma proposta de lei, que considera, para todos os efeitos, "instituição de utilidade pública" o Jardim Zoológico e de Aclimação em Portugal, com isenção de quaisquer impostos e contribuições.

Para a comissão de faianças.

Pareceres

A comissão de administração pública é de parecer que deve ser aprovada a proposta de lei n.° 43-A, autorizando a Câmara Municipal de Tabuaço a consignar as sobras das suas receitas ordinárias e extraordinárias ao pagamento dos juros e amortização do empréstimo a que se refere a lei de 1 de Julho de 1912.

Foi mandado imprimir.

Da comissão de finanças sôbre o projecto de lei n.° 52-A, relativo ao lançamento e cobrança da contribuição predial.

Mandou-se imprimir com urgência.

Do Sr. Munes da Mata, como vogal da mesma comissão, o parecer em separado sôbre o mesmo projecto de lei.

Mandou-se imprimir com urgência.

Licença

Tendo sido nomeado, por portaria de 27 do mês findo, para fazer parte da comissão encarregada de estudar e propor as bases da organização dum arsenal na margem esquerda do Tejo, rogo a V. Exa. se digne consultar a Câmara se me autoriza a desempenhar tal comissão. = Amaro de Azevedo Gomes.

Foi concedida a autorização.

Telegramas

Madrid. - Muy honradas por comunicación telegráfica Senado de la República Portuguesa rogamos a V. acepte testimónio nuesta respeituosa consideración y profundo agradecimiento. = Angeles y Mercedes Moret.

Para a Secretaria.

Pôrto. - Comovido agradeço nome cidade Pôrto proposta votada Senado digna Presidência V. Exa. e faço votos prosperidades República que povo português adora como se viu na manifestação perante S. Exa. Presidente República na Praça Liberdade final jornada histórica de ontem. = Xavier Esteves.

Para a Secretaria.

O Sr. Arantes Pedroso: - Sr. Presidente: sabe V. Exa. e sabe o Senado que há dias foi distribuído por todos os Srs. Senadores um folheto intitulado Alma negra, assinando êsse folheto o Sr. Jeronimo Pereira de Carvalho.

Sr. Presidente: dizem-se aqui cousas monstruosas que nem me atrevo a ler ao Senado, e triste é dizê-lo, grande parte da matéria nele contida é um apontoado de falsidades. Sr. Presidente, eu pregunto a V. Exa. que "alma negra" de português é esta que no momento em que na Inglaterra se levanta novamente a questão dos chocolateiros contra Portugal, é nesta ocasião e só nesta ocasião que aparece êste folheto. Eu não quero tirar ilacções mas a verdade é que são falsas algumas alegações. Mas há ainda mais, Sr. Presidente. V. Exa. sabe que há pouco tempo o director geral das colónias, Sr. Freire de Andrade, escreveu uma carta ao Sr. Cadbury, que com todo o patriotismo rebatia as acusações feitas por aquele senhor ao nosso país. Veja V. Exa. se o folheto não apareceu em tam má ocasião! Dá-se tambêm o caso do autor do citado folheto ter em 1907 escrito exactamente

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o contrário do que agora escreve, fazendo uma defesa calorosa dos roceiros.

O autor foi delegado em S. Tomé e ex-curador dos serviçais na Ilha do Príncipe e foi demitido do lugar por queixas que apresentaram contra êle, obrigando o Ministro de então a demiti-lo do lugar; portanto êste folheto é uma bela arma na mão dos chocolateiros, pela autoridade do nome que o assinou.

Vejo presente o Sr. Ministro das Colónias e pregunto a S. Exa. se na nova legislação não haverá um artigo para se proceder criminalmente contra quem ajuda os estrangeiros a difamar o país e a República. (Apoiados).

O Sr. Ministro das Colónias (Almeida Ribeiro): - Sr. Presidente: quando entrei, já o Sr. Arantes Pedroso tinha começado as suas reclamações contra a Alma negra de que eu já tive conhecimento no Ministério das Colónias. Êste folheto contêm alegações falsas e eu entendo que merece uma repressão criminal, desde que essa repressão possa ser exercida profícuamente. O caso reclama providências enérgicas, tanto mais que o autor do folheto foi funcionário do Estado, sub-delegado e curador na ilha do Príncipe e não fez chegar ao conhecimento dos seus superiores os factos graves a que agora alude. Estas circunstâncias agravam a situação do autor do folheto e mais nada era preciso para que se intente procedimento criminal.

O orador não reviu.

O Sr. Miranda do Vale: - Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção de qualquer membro Govêrno sôbre uns decretos ultimamente publicados no Diário do Govêrno e que se referem a umas transferências de verbas dos Ministérios do Fomento e Estrangeiros.

Sr. Presidente: o regulamento de contabilidade preceitua, muito claramente, no n.° 5 do artigo 25.°, a necessidade de fundamentar estas transferências.

Ora, tanto num como noutro dêstes decretos, não se fundamenta de forma nenhuma a transferência das despesas. Dum dos Ministérios consegue-se perceber a razão duma das transferências das verbas.

Do Ministério dos Estrangeiros escapa à minha fiscalização a necessidade destas transferências.

A lei de contabilidade pública foi organizada exactamente para que estas verbas possam ser fiscalizadas, não só pelos membros do Parlamento, mas por todos os portugueses.

Por isso, peço aos Srs. Ministros, como necessidade profundamente imprescindível, que, quando se publiquem decretos dêste natureza, êles sejam fundamentados de forma a que qualquer pessoa, conhecedora ou não dos negócios públicos, os possa avaliar.

É para isto que eu chamo a atenção dos Srs. Ministros.

Folgo de ver entrar o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, para chamara atenção de S. Exa. para o assunto.

Se o Senado me permite, eu vou repetir as minhas considerações, visto achar-se agora presente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Em duas palavras eu digo a V. Exa. o que desejo.

No Diário do Govêrno de 29 de Janeiro último foi publicado um decreto, assinado por todos os membros do Govêrno, ordenando umas transferências de verbas.

Devo dizer que isso é perfeitamente legal e que essas transferências se efectuaram dentro do mesmo artigo, segundo determina a lei.

Por êsse lado não há nada que reclamar.

O que eu digo é que para tornar, tanto quanto possível, eficaz a fiscalização parlamentar, e porventura - o que seria muito louvável - a fiscalização de qualquer cidadão que se interesse pela marcha dos negócios públicos, se devem documentar essas transferências.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (António Macieira): - Sr. Presidente: pedi a palavra tam só para declarar que tomei bem nota das palavras do Sr. Senador Miranda do Vale, e posso garantir a S. Exa. que, pela minha parte, contribuirei em tudo que possa esclarecer o Parlamento e o país acêrca da administração dos negócios públicos.

O Sr. Bernardino Roque: - Sr. Presidente: em vista das declarações categóri-

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cas que o Sr. Ministro das Colónias fez em resposta às observações produzidas pelo Sr. Arantes Pedroso, desisto da palavra.

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o parecer n.° 37.

Foi lido e pôsto em discussão na generalidade.

É o seguinte:

Parecer n.° 37

Senhores Senadores. - Começa esta comissão por lamentar que, com o projecto n.°, cujo exame lhe foi confiado, se venha continuar o sistema, que julga bastante prejudicial, de estar constantemente introduzindo pequenas modificações em leis existentes.

Parece-lhe, pois, de toda a conveniência, iniciar quanto antes a revisão do decreto de 25 de Maio de 1911, que reorganizou o exército.

A comissão julga um bom princípio administrativo a autonomia do Arsenal do Exército, mas afigura-se-lhe bastante acanhada a que se propõe, e que, no fundo, se reduz a obter mais algumas receitas para o referido estabelecimento.

Desejava a comissão que o Arsenal tivesse a organização duma sociedade fabril, da qual o Estado fôsse sócio comanditário. O seu pessoal superior deveria constituir um quadro especial de técnicos. Só assim se poderia verificar o verdadeiro custo do material fornecido ao Estado.

Contudo, a vossa comissão de guerra, não desejando levantar dificuldades a um projecto já aprovado pela Câmara dos Senhores Deputados, e que não somente o seu autor, mas tambêm a comissão de finanças da mesma Câmara, julgam necessário ao bom funcionamento daquele estabelecimento, propõe a sua aprovação com as seguintes indispensáveis modificações:

No artigo 1.°, em seguida à palavra "administração", devem ser introduzidas as seguintes: "dos estabelecimentos e serviços dependentes".

No artigo 2.° as palavras "que forem destinadas a material de guerra" devem ser substituídas pelas seguintes: "que lhes forem destinadas".

Sala das Sessões da comissão de guerra do Senado, 16 de Janeiro de 1913. = Alberto Carlos da Silveira = Pedro Bôto Machado = Abílio Barreto = Manuel Goulart de Medeiros.

Proposta de lei n.° 248-D

Artigo 1.° A administração do Arsenal do Exército será exercida pelo director do Arsenal, general que tenha feito a sua carreira na arma de artilharia, ou coronel nas mesmas condições, e pelos conselhos administrativos das fábricas, depósitos e restantes serviços.

Art. 2.° As receitas do Arsenal do Exército serão constituídas por todas as verbas inscritas no Orçamento Geral do Estado para os serviços do Arsenal do Exército; pelas importâncias recebidas doutros Ministérios ou de particulares, pelo fornecimento de artigos de qualquer espécie; pelas quantias recebidas de qualquer dependência do Ministério da Guerra, pelos artigos fornecidos a pronto pagamento e pelo fornecimento de todos os que não forem de material de guerra; por verbas extraordinárias e de qualquer proveniência que forem destinadas a material de guerra e pelo produto da venda de sucatas e de quaisquer artigos que não tenham aplicação aos serviços do mesmo Arsenal.

§ 1.° As verbas orçamentais serão exclusivamente aplicáveis às despesas para que foram consignadas.

§ 2.° Todas as demais receitas poderão ser aplicadas, indistintamente, a quaisquer dos serviços dependentes do Arsenal do Exército.

Art. 3.° As despesas com aquisição de todos os materiais, com a féria, do pessoal fabril e com os vencimentos de todo o pessoal que fizer serviço no Arsenal, alêm daquele, serão pagas pelas verbas consignadas no artigo anterior.

Art. 4.° Anualmente, o director do Arsenal dará conta circunstanciada, em relatório estatístico, dos serviços feitos no estabelecimento a seu cargo directamente ao Ministro da Guerra, a quem está directa e imediatamente subordinado. Esta conta será apresentada até o fim do trimestre seguinte ao encerramento do ano financeiro.

§ único. O disposto neste artigo não dispensa o Arsenal do Exército da fiscalização e da prestação de contas perante as autoridades a quem por lei ou regulamento tenham de prestar-se.

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Art. 5.° O Govêrno mandará elaborar, com a máxima urgência, o regulamento necessário para a execução desta lei.

Art. 6.° Em conformidade com o disposto no artigo 70.° da Constituição Política da República Portuguesa fica revogada a legislação em contrário e especialmente, em relação ao Arsenal do Exército, o artigo 18.° da lei de 9 de Setembro de 1908.

Palácio do Congresso, em 10 de Julho de 1912. = António Aresta Branco, Presidente = Baltasar de Almeida Teixeira, 1.° Secretário = Francisco José Pereira, 2.º Secretário.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Sr. Presidente eu entendo que o Arsenal do Exército deve ser um estabelecimento absolutamente independente e com completa autonomia, estabelecimento de que o Estado deveria ser apenas sócio comanditário.

Êste projecto que entrou em ordem do dia concede a êsse estabelecimento uma pequena autonomia.

Eu entendo, Sr. Presidente, que o nosso Arsenal do Exército não tem correspondido ao que dele se poderia e deveria exigir, e que não tem produzido o que devia produzir.

É necessário, repito, que se dê a êste estabelecimento uma completa autonomia, e que assim se coloque em condições de se poder apreciar se há vantagem na sua existência.

São estas as razões que me levaram a não aceitar o projecto tal qual está redigido.

O Sr. Presidente: - Como não está presente o Sr. Ministro da Guerra, retiro êste projecto da discussão.

Deveria agora entrar em discussão o parecer n.° 43, mas, como não há número para se tomarem deliberações, vou dar a palavra aos Srs. Senadores que se inscreveram para se dirigirem aos vários membros do Govêrno. Tem a palavra o Sr. Silva Barreto, que a pediu para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Interior.

O Sr. Silva Barreto: - Sr. Presidente: pedi a palavra para preguntar ao Sr. Ministro do Interior em que alturas, ou em que lugar, se encontra o processo contendo as conclusões duma sindicância, que foi mandada fazer às duas casas do Parlamento, em virtude dum requerimento apresentado pelo Sr. Cunha Belêm.

Dizem me que essa sindicância foi entregue no Ministério do Interior por um dos Srs. sindicantes, e que até exigiu, e lhe foi passado, recibo da entrega.

Desejo que o Sr. Ministro me informe se, realmente, essa sindicância, se encontra, como disse um dos sindicantes, no Ministério do Interior, e se S. Exa. está ou não disposto a ordenar a sua publicação no Diário do Govêrno. Como seja muito volumosa, e assim se mostre muito dispendiosa a publicação, poderão ser publicadas as conclusões.

Quando da outra vez me referi à sindicância ás duas casas do Parlamento, aludi a uma outra sindicância feita a uma senhora professora da Escola Normal do sexo feminino, e tambêm professora de instrução primária.

O Sr. Ministro disse-me que tinham sido publicadas no Diário do Govêrno as penalidades que o seu antecessor havia aplicado a essa professora, a que S. Exa. se conformou; mas eu desconheço essa publicação e por isso fiz essa pregunta.

Eu fui ler o processo dessa professora, no que respeita à Escola Normal, mas é muito volumoso, não sei se V. Exa. já o viu.

Tem seguramente dois palmos de altura. Agora o processo que respeita à sindicância como professora de ensino primário, é pequeno e compunha-se facilmente. Deve dizer a V. Exa. que me conformei com as conclusões dos Srs. sindicantes, sobretudo no que diz respeito à sindicância do ensino primário.

Esta sindicência foi feita pelo inspector da circunscrição de Lisboa.

Eu chamo a atenção de V. Exa. para um ponto importante que resulta da defesa dalguns pontos concretos da própria acusada.

Esta professora diz que os erros que cometeu são igualmente cometidos por outros professores.

Esta acusação é grave e portanto eu entendo que V. Exa. deve tomar conhecimento dêste processo, sobretudo na parte que faz a acusada a professores de ensino normal e primário que leccionam particularmente.

Eu tenho aqui uns apontamentos que

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são edificantes. A República deve empregar todos os meios para verificar se essas acusações são gratuitas, se são próprias de quem não tem a consciência das suas responsabilidades, ou se são realmente de carácter concreto.

Vou concluir, pedindo a V. Exa. licença para ler um postal que recebi e que trata dum assunto de que já tinha conhecimento.

Foi com sentimento que vi a resolução que a Direcção Geral de Instrução Primária tomou, contra a lei e contra os bons princípios da pedagogia e da educação nacional.

O bilhete postal diz:

Leu.

Isto é de Leiria, é dum professor de ensino normal, dos mais distintos, patriota e amigo dedicado da República, e que sente que os negócios de instrução primária sejam tam mal tratados pelas estações superiores.

Votou-se uma lei autorizando a matricula dos alunos na Escola Normal, nas condições desta lei, pela Direcção Geral de Instrução Primária permite-se agora que até 20 de Fevereiro se matriculem nessas escolas os que queiram frequentar o primeiro ano das escolas normais até 20 de Fevereiro; nesse despacho exige-se que o pretendente tenha o terceiro ano do liceu ou que frequente o quarto ano.

Ora eu presunto: qual a disposição que permite a matrícula nestas condições?

Não há disposição alguma, e portanto eu chamo a atenção de V. Exa. para esta circular.

Nas escolas normais permite-se a matrícula para novos alunos até 20 de Fevereiro; nós preceituamos que, para os alunos poderem entrar, seria preciso o 3.° ano do curso do liceu; mas não se estabeleceu a idade, e assim V. Exa. vê que os alunos se podem matricular aos 14 anos, e por consequência temos professores aos 16 anos.

Alêm disso não há disposição legal que o permita, nem V. Exa. o pode fazer, como membro do Poder Executivo, visto que atentava contra a lei votada nesta casa do Parlamento.

Eu quero crêr que V. Exa. não viu nem teve tempo para ver a disposição legal que se opõe textualmente a que a matrícula das escolas normais se faça por esta forma, o que é contrário ao que está preceituado nas leis e nos regulamentos.

Quanto ao processo Cunha Belêm, repito, deu origem a uma sindicância às duas casas do Parlamento.

Fez-se essa sindicância, e afirma-se que desapareceu.

Entendo que V. Exa. tem o dever de exigir saber o que há sôbre esta afirmação, que oxalá seja falsa. Um dos membros da sindicância entregou recibo dessa sindicância.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): - Isso põe a questão noutros termos. Continuando no cumprimento do apuramento das sindicâncias, sei que falta um processo, e já tive de tomar medidas com relação à desaparição.

Já V. Exa. vê que é impossível, dentro do tempo de que posso dispor, tomar conhecimento de todas as sindicâncias, e do procedimento que deve haver em face delas.

Não tive ainda tempo, oportunidade, porque, alêm dos serviços próprios do Ministério, outros se impõem, como a presença no Parlamento, etc., que me absorvem a atenção.

E V. Exa. não deve estranhar tal facto; e não deve achar que da minha parte haja qualquer desleixo... (Apoiados).

Sôbre a Escola Normal já impende um despacho do Ministro do Interior que me antecedeu. De forma que só posso tomar resoluções depois de saber qual a orientação a seguir.

Não é lógico que vá um ministro desfazer aquilo que outro ministro fez justificada e fundamentadamente.

Vou mandar o primeiro à Procuradoria da República, para sôbre êle dizer o que seja mais conveniente.

Quanto ao facto da admissão às escolas normais, a que V. Exa. se referiu, devo chamar para mi m toda a responsabilidade dele. Vou justificá-lo.

Chegaram dos Açôres reclamações dizendo que o prazo marcado para a admissão foi conhecido lá muito tarde, pelo Diário do Govêrno.

Assim eram impedidos de matricular indivíduos que tem todas as condições.

Isto foi realmente uma falta a que era

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necessário dar remédio com uma medida que restabelecesse a justiça.

O que resultaria de pormos dentro do prazo marcado, não por lei, mas pela repartição...

O Sr. Silva Barreto: - Observo a V. Exa. que o prazo é marcado por lei.

O Orador: - A idade é que é. Resultaria continuarmos no deficit de professores, que faz com que todos os dias me chamem a atenção nas Câmaras, para o estado em que se encontram as escolas.

O prazo de matricula foi alargado para os Açôres, e não se podia fazer uma excepção para as ilhas.

Dai só poderão resultar benefícios para o ensino e para os concorrentes; e não poderá resultar mal para ninguêm, porque as aulas começaram há poucos dias.

Foi apenas para bem servir o ensino que se fez o alargamento do prazo.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Sousa Júnior: - Sr. Presidente: vou chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior para uns assuntos de administração.

Os professores primários do Pôrto queixam-se de que não recebem a verba destinada a limpeza e expediente desde Junho e não recebem a importância para renda de casa desde Outubro.

Peço ao Sr. Ministro que dê ordem na contabilidade para que se pague aos professores primários.

O segundo ponto para que desejo chamar a atenção de V. Exa. é para as certidões de óbito. Sabe V. Exa. e sabe o Sr. Ministro, que a lei do registo civil obriga a certidão de óbito passada pelo médico assistente ou pelo médico verificador, mas a verdade é que em muitos pontos do país, em muitas terras, em muitas aldeias pequenas e até em terras, de grande importância se enterram pessoas sem que seja passada a certidão de óbito por médico. Isto é vergonhoso. Ainda há pouco, visitando eu alguns concelhos do distrito do Pôrto, tive ocasião de verificar isto.

No concelho de Santo Tirso só foi passada certidão de óbito a um indivíduo que morreu, porque tinha de ser transportado para o Pôrto e lá não o recebiam sem aquela certidão.

Êstes factos dizem tambêm respeito ao Sr. Ministro da Justiça, que não está presente, o qual deve exigir que os oficiais do registo civil exijam a certidão de óbito passada por médico.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: - Os regedores tambêm podem fazer isso.

O Sr. Estêvão de Vasconcelos: - É uma violência, chega a ser uma monstruosidade obrigar os subdelegados de saúde a passarem certidões de óbito a indivíduos tratados por curandeiros.

O Orador: - A verdade é que dalguma maneira se precisa remediar êste mal.

O Sr. José de Pádua: - Há muitas freguesias em que não há médico.

O Orador: - Quantos médicos existem no país?

Eu creio que 2:000.

Áparte do Sr. José de Pádua que não se ouviu.

Isto é: dá 1 médico para 3:000.

O que eu desejo, é que não seja enterrada qualquer pessoa, sem que a sua morte seja certificada por meio do Registo Civil.

Há ainda um outro ponto para que eu desejo chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior.

Refiro-me a uma reclamação que foi presente a V. Exa. e igualmente ao Sr. Presidente do Ministério, respeitantemente ao estado sanitário de Manteigas.

Nessa reclamação se demonstra que a vila de Manteigas se encontra numa situação excepcionalíssima sob ponto de vista da sua mortalidade.

A mortalidade na vila de Manteigas é de 33 por 1:000 e por ano.

É preciso, portanto, colocar a vila de Manteigas em condições de se poder diminuir esta percentagem, e de se estinguir o foco de infecção que ali produz manifestações epidémicas, as quais vem dizimando aquela população acêrca de dois anos.

Peço ao Sr. Ministro do Interior, que da verba chamada de despesas extraordinárias, áparte o máximo que possa, a fim de que o hospital de Manteigas seja concluído quanto antes.

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Por último, chamo tambem a atenção do Sr. Ministro do Interior para um facto, que eu já aqui tratei no Senado, por duas ou três vezes.

Eu disse que nós não tínhamos elementos suficientes para apreciar as medidas que tem sido tomadas a respeito da raiva em Portugal.

Êste assunto é muito importante e por certo que a respeito dele ainda se não tomaram as providências adequadas.

Peço ao Sr. Ministro que tome nota da minha reclamação e que em breve nos diga quais as medidas que foram tomadas a êste respeito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues: - Sr. Presidente: vou referir-me aos pontos para que o Sr. Senador Sousa Júnior chamou a minha atenção.

Em primeiro lugar devo dizer a V. Exa. que os professores tem muitíssima razão nas suas queixas e se êles não são sempre atendidos, isso depende da forma por que estão organizados os serviços da Contabilidade Pública, os quais serviços não estão debaixo da minha direcção.

A superintendência dêsses serviços compete ao Ministério das Finanças e, sob o ponto de vista da disciplina, estão, no momento actual, muito bem entregues ao meu digno colega que gere a respectiva pasta.

Prometo, pois, chamar a atenção do meu colega para êsse ponto e estou convencido que S. Exa. tratará quanto antes de fazer desaparecer êsse estado de cousas a que S. Exa. se referiu.

O Sr. Sousa Júnior (interrompendo): - O que eu desejo é que os professores de instrução, primária, dentro da República não tenham motivos de se queixarem dessas faltas que apontei.

O Orador: - Há o pagamento ao material escolar, há o pagamento de dinheiros necessários para rendas de casa, há enfim um mare magnum de cousas que só poderão ser atendidas quando a repartição esteja em condições de poder corresponder às funções que lhe competem.

Há muitos serviços que estão desorganizados, e que, por tanto, precisam de organização imediata.

Falta ainda o regulamento disciplinar dos empregados, e outros elementos que permitiam o bom funcionamento dos serviços públicos.

Quanto às certidões de óbito, devo dizer que êste assunto pertence ao Sr. Ministro da Justiça; mesmo V. Exa. o disse.

Essas certidões são passadas muitas vezes pelos regedores, por não haver, senão muito distante, médico, ou por outra qualquer razão.

O Sr. Sousa Júnior: - O que eu disse foi por saber muito bem que os oficiais do registo civil se entendem com os subdelegados de saúde para não terem êsse trabalho. É para isto que eu chamei a atenção de V. Exa.

O Orador: - Eu estou certo de que pela pasta da Justiça se tomarão providências para remediar o caso.

Pela minha parte, oficiarei aos subdelegados de saúde, para cumprirem o seu dever.

O Sr. Sousa Júnior: - Eu sei que há muitos médicos que estão em perfeito acôrdo com os oficiais do registo civil, para não fazerem êste serviço.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: - Não se pode dizer isso por uma forma geral.

O Orador: - Se eu não levantei a acusação que se fez, foi porque ela vinha dum médico que preza muito a sua profissão, e compreendi que não fazia referências duma forma geral.

Chamou V. Exa. tambêm a minha atenção para os casos de raiva.

Os administradores dos concelhos mandam uns mapas com o número de cães mortos, mas a verdade é que êles enchem êsses mapas porque tem obrigação de o fazer; mas isso não corresponde à verdade, visto que o número de cães mortos é superior aos cães de todo o país.

O facto é que se criam leis novas e se vai sobrecarregar as autoridades administrativas, de forma que não tem tempo possível para as executar.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: - Em 1897, estando no Govêrno João Franco, conseguiu extinguir a raiva, demitindo os administradores que faltavam ao seu dever.

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O Sr. Sousa Júnior: - A verdade é que hoje as estatísticas acusam um aumento.

O Orador: - Muitas medidas há, mas são de ordem administrativa.

Pelo que respeita á Repartição de saúde, V. Exa. chamou a minha atenção para um facto importante, qual é o de estarem os habitantes de Lisboa à mercê de infecções, que se deve procurar evitar.

Como e assunto é importante, pedi informações á repartição respectiva, para me habilitar a responder a S. Exa., as quais me serão fornecidas num relatório circunstanciado acêrca do assunto, mas êsse relatório ainda não está completo, e, logo que me seja enviado, declarar-me hei habilitado a dar todas as informações que V. Exa. me pediu, e V. Exa. terá oportunidade de formular até outras preguntas que entenda dever fazer.

O Sr. Sousa Júnior: - Eu não toquei nesse ponto, quando me referi à questão das febres tifóides, e só tenho que dizer que não compreendo, como e que as repartições de saúde tem coragem de, a propósito duma epidemia de febre tifóide, que pela sua expansibilidade se tornou notável, visto que foram atacadas cêrca de 3:000 pessoas, ainda não apresentaram o seu relatório sôbre essa epidemia, quando isso é uma cousa que se deve fazer imediatamente, em pé de guerra, como costuma dizer-se.

Devia ter sido feito um mês depois, o máximo.

O Orador: - Como V. Exa. sabe, êsses trabalhos são muito demorados.

A mim compete tomar a responsabilidade dos actos dessas repartições, emquanto não me convencer do contrário, isto é, de que da parte delas há negligência, que então o meu procedimento deve ser outro.

O Sr. Sousa Júnior: - Desde que V. Exa. cobra a repartição em questão com a sua responsabilidade nesse sentido, devo dizer que entendo, sob sua responsabilidade, que nós precisamos conhecer imediatamente os resultados dêsses trabalhos.

O Orador: - Justifico-a por isso mesma que reconheço que para executar êsse trabalho são precisos estudos e trabalhos demorados, não só de laboratório como do demais pessoal, para se conhecer onde se fazia a inquinação das águas e depois se poder adoptar as necessárias medidas.

Tudo isso, V. Exa. sabe, não é uma cousa que se possa fazer num mês.

V. Exa. e pessoa bastantemente autorizada para compreender que êstes trabalhos são muito demorados.

O Sr. Sousa Júnior: - Se V. Exa. me reconhece autoridade para o caso, digo-lhe que está muito mal, que, tendo havido uma epidemia quási há um ano em Lisboa, o Parlamento ainda não conheça os resultados das pesquisas que acêrca dela se fizeram.

V. Exa. não tem responsabilidade no caso. Está apenas a querer cobrir as repartições de saúde com a sua responsabilidade.

O Orador: - O que quis dizer a V. Exa. é que a repartição já procurou as informações precisas e o seu director me mostrou os serviços que se estavam fazendo, que brevemente devem estar ultimados; e se nessa ocasião se não poderem tomar quaisquer medidas, porque isso implique qualquer despesa que me ate as mãos, eu então virei aqui dizer quais as providências que é preciso adoptar e às preguntas que V. Exa. me fizer darei as explicações devidas.

O Sr. Sousa Júnior: - Em última análise, eu peço a V. Exa. que inste com essa repartição para que o mais depressa possível apresente os resultados dêsses trabalhos, para nós os conhecermos, porque se V. Exa. descansa sôbre essa repartição, ela nunca lhos apresenta, uma vez que a lei de saúde de 24 de Dezembro de 1901 manda que a repartição de saúde publique um boletim periódico sôbre o movimento da sanidade em Portugal.

Ora V. Exa. já viu alguma vez publicado êsse boletim?

Reúne-se o Conselho de Higiene, que para nada serve ou serve simplesmente para dizer que houve uns casos de varíola, uns outros tantos de febre tifóide, etc.

Ora para existir um conselho nestas condições era melhor que a República o suprimisse.

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O Sr. José de Pádua: - O conselho de higiene serve para receber uma gratificação e para elaborar boletins que de nada servem.

Orador: - O assunto vai-se alargando e eu não posso acompanhar S. Exas. em todo êsse campo.

Relativamente ao Boletim, há uma razão, é que a Imprensa Nacional não pode atender a todos os serviços públicos, e alêm disso a dotação é insuficiente.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Já deu a hora de se passar à ordem do dia, mas como está presente o Sr. Ministro do Fomento, se o Senado me permite, vou dar a palavra a quatro Srs. Senadores, que a pediram para quando S. Exa. estivesse presente.

Consultado o Senado, resolveu afirmativamente.

O Sr. Cupertino Ribeiro: - Sôbre o assunto para que tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Fomento, o qual se referia a linhas de caminho de ferro a construir, já S. Exa. deu os esclarecimentos precisos com que eu fiquei satisfeito.

Como sei que brevemente vai ser apresentado ao Parlamento um projecto sôbre êste assunto, nada mais tenho a dizer.

Aproveitando a ocasião de estar com a palavra, chamo a atenção do ilustre Ministro para um outro assunto que, com quanto não seja de grande importância, merece que se lhe dedique algum cuidado.

Como V. Exa. sabe, há no Orçamento uma verba destinada para reparações de estradas, que é dividida por distritos.

Essas verbas são aplicadas nas reparações das estradas do distrito, conforme o critério do director das obras, e sucede que nem sempre os directores ordenam as obras de reparações das estradas onde elas são mais precisas.

Sucede que há estradas que em certos pontos estão intransitáveis, sem que se faça o mais pequeno concerto, emquanto que há outros pontos em que podiam passar mais algum tempo sem reparação e que são logo concertados.

Nos passeios que tenho dado e em que tenho examinado êste ramo de serviço, vejo que não há um bom critério na sua distribuição.

Eu já o ano passado chamei a atenção do antecessor de V. Exa. sôbre o assunto, mas vi que as minhas reclamações não produziram o efeito desejado.

Terminando, peço a S. Exa. a fineza de ver se é possível melhorar êste serviço.

Eu sei que as verbas destinadas a estas reparações são pequenas; se elas forem bem aplicadas poderão servir ainda de alguma cousa; se forem mal, de nada servem.

O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder às considerações Ho ilustre Senador Sr. Cupertino Ribeiro e afirmar que penso como S. Exa. em relação ao assunto conservação e reparação de estradas.

Por isso mesmo apresentei à Câmara dos Deputados um projecto de lei nesse sentido, projecto que está dependente da discussão dessa Câmara e, como se encontre ainda na comissão de finanças, estive hoje nessa comissão, pedindo para sôbre êle dar o seu parecer com a maior brevidade, a fim de ser discutido tambêm nesta casa do Parlamento; nele se apontam as mesmas razões que eu sempre expendi, quanto à construção e reparação de estradas, que são concordes com o modo de ver de S. Exa., no que diz respeito à ordem e urgência com que devem ser construídas e reparadas.

Que a conservação se faça aqui ou acolá é indiferente, o que é necessário e urgente é que se faca.

Quando a Câmara tiver de se pronunciar sôbre êste projecto, V. Exa. verá que êle dá inteira e completa satisfação aos desejos de S. Exa.

O orador não reviu.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Pedi a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Fomento, a fim de chamar a sua atenção para o facto de só existirem cartas geodésicas de duas ilhas do arquipélago dos Açôres. As cartas das restantes ilhas são há muito reclamadas e de absoluta necessidade.

S. Exa. sabe melhor do que eu a importância que tem estas cartas e tenho já falado no assunto por várias vezes, estando

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naquelas cadeiras outros Ministros; por conseguinte, espero que S. Exa. o tornará na devida consideração.

Para outro assunto chamo a atenção de S. Exa., e êsse é de interesse nacional. É para o facto de existir na outra Câmara, desde a Assemblea Constituinte, uma proposta de lei referente ao cadastro geométrico. Tem sido infrutíferas todas as diligências e reclamações apresentadas até hoje para se conseguir a aprovação dessa proposta.

Peço, portanto, ao Sr. Ministro que tambêm se interesse pelo assunto, que é de fundamental importância para a economia nacional.

O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): - Respondendo às considerações do Sr. Goulart de Medeiros, tenho a dizer que é verdade existir na Câmara dos Deputados uma proposta no sentido que S. Exa. apontou, mas S. Exa. compreende que de forma alguma eu posso dar qualquer solução ao assunto, sem que a Câmara dos Deputados se prenuncie sôbre êle.

É certo que bem cabe nas atribuições da Direcção dos Serviços Geodésicos a resolução dêsse assunto e já tínhamos mesmo pensado que a sua dedicação havia da permitir resolver-se o assunto, a que S. Exa. se referiu, com proveito para o país, mas isso só terá lugar quando a Câmara dos Deputados, onde, creio, já existe parecer sôbre a referida proposta, aprovar essa proposta.

Só então o Ministro do Fomento poderá trazer ao Parlamento qualquer medida complementar, como seja a reforma dos serviços geodésicos, para a elaboração das cartas, porque, estarmos a gastar dinheiro e depois ter de ir tudo para os arquivos, é inconveniente.

É preciso aproveitar o resultado dêsses trabalhos, elaborar as plantas precisas, para que as cartas prestem bons esclarecimentos.

O Sr. Alfredo Durão: - As cartas geodésicas não convêm completá-las. Seja quem for que faça o cadastro...

O Orador: - Não se fazem por estes tempos mais chegados. A verba e exígua, não chega para todos os trabalhos que temos entre mãos.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Mas na ocasião da discussão do Orçamento não se pode apresentar projecto nesse sentido.

O Orador: - Podemos fazer uma transferência de verba, sem alterar o Orçamento...

O orador não reviu.

O Sr. Pais Gomes: - Pedi a palavra para fazer uma pregunta ao Sr. Ministro do Fomento.

Quero referir me a uma ordem de suspensão dada por S. Exa. aos trabalhos que estavam em laboração da estrada que conduz a Sinfães, que estabelece a comunicação da linha do Douro com a margem esquerda do mesmo rio. Essa estrada parece ter enguiço. É a terceira ou quarta vez que os trabalhos são suspensos, e ela está nas circunstâncias extraordinárias que já tive ocasião de dizer aqui.

O Sr. Ministro suspendeu agora êsses trabalhos, primeiro em parte e depois no todo.

Tenho a êsse propósito de dar esta comunicação:

Leu.

Permita-me V. Exa. fazer a seguinte presunta:

Leu.

O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): - Respondendo precisamente às preguntas que me fez, tenho a dizer o seguinte: efectivamente, mandei suspender os trabalhos da estrada, porque tinham reclamado contra a má orientação que levava, e havia uma única maneira de averiguar do caso: mandar um agente técnico da minha confiança ao local, para justificar que a primeira variante não podia ser adoptada.

Tambêm me foi afirmado que não adviria mal para o Estado, satisfazendo os interêsses dos povos que para o Govêrno reclamavam.

Não está, porêm, ainda nada decidido, porque a pessoa encarregada de fazer essa estrada pronunciou-se contra um dos projectos apresentados.

Muito melhor foi suspender os trabalhos da estrada do que estar a executar o tra-

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balho aqui ou acolá, sem vantagem para o Estado, que não despende um centavo.

Creio ter dado em resumo idea do estado da questão.

O estudo essencial já está feito.

Adoptar-se há o que se julgar conveniente, daí não advirá prejuízo algum para o Estado.

Leu.

O conselho pronunciou-se contra uma determinada variante que importava em maiores despesas.

O que é necessário é que o Estado não despenda mais e que a linha seja construída de maneira a contentar os povos da região.

Há ainda a questão técnica.

Leu.

Creio que a esta pregunta já eu respondi nas minhas palavras de há pouco.

Tenho ainda que acrescentar que, nestes assuntos, eu tratarei apenas de me nortear por conveniências técnicas e económicas e não por conveniências de ordem política.

Creio que estão suficientemente respondidas as preguntas que o Sr. Senador me dirigiu.

Não sei se S. Exa. deseja quaisquer outros esclarecimentos.

O Sr. Pais Gomes (interrompendo): - Se se adoptar outra variante, são abandonados os trabalhos realizados?

O Orador: - Se eu me convencer que a nova variante é de utilidade e que o Estado não fica prejudicado, nenhuma dúvida terei em aceitá-la.

O orador não reviu.

Sr. Pais Gomes: - Pedi a palavra para declarar que registo as declarações do Sr. Ministro do Fomento, principalmente na parte em que S. Exa. salientou que a solução a dar à questão a que me tenho referido deverá ser tam só a dos interesses dos povos e ainda a dos interêsses económicos do Estado.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à ordem do dia.

Vai votar-se a questão prévia apresentada na sessão anterior pelo Sr. Goulart de Medeiros.

É a seguinte:

Questão prévia

Proponho que se discuta esta parte da questão prévia depois de recebidas as relações dos estabelecimentos de ensino dependentes actualmente dos diferentes Ministros. = Manuel Goulart de Medeiros.

Posta à votação foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vai agora votar-se a segunda parte da questão prévia apresentada pelo Sr. Miranda do Vale na sessão anterior.

É a seguinte:

Proponho que, antes de se encerrar a discussão do artigo 1.°, o Senado se pronuncie:

1.° Sôbre o título do Ministério:

a) Ministério de Instrução Publica;

b) Ministério de Educação;

c) Ministério de Instrução e Belas Artes.

2.° Sôbre sua composição.

a) Farão parte do Ministério as escolas dependentes do Ministério das Colónias:

b) Farão parte do Ministério as escolas dependentes do Ministério do Fomento;

c) Farão parte do Ministério as escolas profissionais dos Ministérios da Guerra e da Marinha;

d) Farão parte do Ministério as escolas de ensino primário e secundário dos Ministérios militares.

3.° Sôbre a organização pedagógica:

a) A orientação dos trabalhos escolares ficará dependente do Ministério de Educação;

b) Ou ficará dependente do Ministério a que pertencem as diferentes escolas. = José Miranda do Vale.

O Sr. Miranda do Vale (sôbre o modo de propor): - Eu proponho que as alíneas sejam notadas separadamente.

Vozes: - Mas isso ainda não foi discutido.

O Sr. Presidente: - O Sr. Senador que ocupou o lugar de 1.° secretário na sessão passada, não está presente e do Sumário não se conclui bem se foi encerrada a discussão da questão prévia.

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Visto que se trata de explanar devidamente o assunto, eu darei como não esgotada a discussão da questão prévia e concederei a palavra aos Srs. Senadores que quizerem tratar do assunto.

Sr. José de Pádua: - Eu desejo pedir ao Senado que, antes de votar êste projecto, pondere bem as resolução que tomar, visto que se trata de assunto muito importante.

Chamo, pois, a atenção do Senado para êste ponto.

Nós vamos criar o Ministério da Instrução. Tudo quanto diz respeito a instrução passa a ficar a cargo dêsse Ministério?

Eu tenho a êste respeito uma opinião diferente. Entendo que há estabelecimentos de ensino que pela sua natureza muito especial devem pertencer a outros Ministérios. Já vêem, pois, V. Exas. que eu tenho razão quando digo que êste projecto, a que eu chamo festim de Baltasar, vai na prática ser uma cousa absolutamente irrealizável.

Ficam dependentes do Ministério de Instrução todas as escolas ou incluem-se umas e excluem-se outras?

Creiam V. Exas. que a criação dêste Ministério vai trazer uma enorme complicação. Desejarei, pois, Sr. Presidente, que a criar-se, se é que não pode deixar de se criar, já que não pode trazer-nos benefício algum, que nos traga ao menos o minimo de inconvenientes.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): - Sr. Presidente: por vários motivos estranhos à minha vontade, não pude tomar parte na discussão do projecto no sentido geral e, portanto, não me foi possível definir qual a razão que ditou as palavras do Govêrno quando, no seu compromisso, ao fazer a sua apresentação ao Congresso, disse que considerava necessário que se criasse o Ministério de Instrução. Não me foi possível nessa ocasião definir o critério que tinha levado o Govêrno a formular essa afirmação, e tarde chego para o poder fazer; todavia, aproveitando a oportunidade, ainda me assiste o dever de afirmar qual foi a razão peia qual o Govêrno perfilhou em parte o critério a que se acha subordinado êste projecto; isto é, satisfazer aquilo que se considera uma necessidade nacional: dedicar aos problemas da instrução todo o cuidado que êles nos devem merecer, pondo, primeiro que tudo, a educação fora de toda e qualquer influenciei política.

É claro que isso se não faz apenas pelo facto de se criar um Ministério; mas emquanto entre nós houver esta opinião de que toda a instrução primária, técnica e superior cabe à responsabilidade do Estado, emquanto nós nos não cingirmos ao critério, por exemplo, da Inglaterra, que considera apenas como a cargo do Estado a instrução primária, a tarefa é mais difícil.

Vamos buscar para exemplo o Ministério das Colónias.

Nós ternos ali diversos estabelecimentos de instrução; temos a escola dos missionários, a Escola de Medicina Tropical, a Escola de Nova Goa.

Ora estas escolas...

O Sr. Goulart de Medeiros: - Missões religiosas?

O Orador: - Não senhor. Ensinam-se nestas escolas todos os conhecimentos gerais da sciência e de aplicação especial às colónias.

Temos a Escola de Guerra e a Escola naval, que evidentemente é um ensino especial, pois tem que ser própriamente militar.

Estas escolas não podem de forma alguma ficar pertencendo ao Ministério de Instrução Pública.

O assunto compreende uma vasta tese que se presta a larga discussão, e portanto tambêm se presta a cada um emitir o seu parecer. Mas evidentemente se nós queremos fazer alguma cousa, não é fazendo passar uma parte do ensino para um Ministério e outra parte para outro Ministério.

Sr. Presidente: eu creio que é das praxes desta casa não ser permitido aos Ministros que não são Senadores apresentarem propostas relativamente a qualquer projecto no decorrer da sua discussão...

O Sr. Presidente: - O Regimento nada diz a êsse respeito. É facto que o Senado tomou há tempos uma deliberação, de acôrdo com a afirmação que o Sr. Ministro

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do Interior acaba de fazer; todavia, eu posso consultá-lo novamente, a fim de saber se mantêm o que há tempo foi resolvido ou se entende que se deve proceder em sentido contrário, em vista dos inconvenientes que tal medida pode acarretar.

O Orador: - V. Exa. compreende que desta forma a acção do Ministro que não seja Senador se acha absolutamente manietada.

Sr. Presidente: quando se tratar da fixação dos quadros e do pessoal, eu, interpretando o sentir do Govêrno, hei-de demonstrar que se pode restringir muito aquele estado maior a que V. Exa. há pouco fez alusão.

Quanto à criação do Ministério de Instrução, eu devo dizer que é da maior vantagem que ela se faça, por isso que é absolutamente conveniente que todos os serviços de instrução fiquem perfeitamente coordenados por forma a produzirem aquilo que devem produzir.

Entendo, Sr. Presidente, que a instrução primária deve ser gratuita para toda a gente; porêm, a instrução secundária, preparatória, técnica e superior deve ser paga por aqueles que se vão utilizar dela. De resto, êste critério não é só meu; há muito que êle norteia os países que devem ser tidos na conta de sensatos. Emquanto, porêm, o Estado tiver a responsabilidade do ensino, emquanto lhe chamar ensino nacional, cabe-lhe tambêm o dever de não o deixar abandonado por diferentes Ministérios.

E, por agora, Sr. Presidente, nada mais direi. No decorrer da discussão eu mandarei para a mesa algumas modificações, caso o Senado resolva que não há inconveniente em assim proceder.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Eu vou consultar o Senado sôbre se entende que deve ser revogada a deliberação tomada.

Consultado o Senado, resolveu afirmativamente.

O Sr. José de Pádua: - Respondendo às considerações do Sr. Ministro do Interior, eu devo dizer que não posso de forma alguma estar de acôrdo com S. Exa. sôbre alguns pontos de que tratou.

Nós vamos criar o Ministério de Instrução por duas razões: porque é necessário cuidar a sério da nossa instrução e porque é preciso simplificar os serviços do Ministério do Interior; e diz S. Exa. que ainda, a reforçar estas razões, há a necessidade de colocar o ensino sob a direcção geral duma pessoa que seja absolutamente estranha a influências políticas.

A política característica do nosso país há-de continuar a fazer prejuízos em diferentes serviços públicos.

Que o atraso da nossa educação depende dela estar ligada ao Ministério do Interior ou da Justiça, êsse argumento não colhe.

Se pelo facto de nós querermos organizar o nosso serviço vamos criar um Ministério de Instrução, eu preguntarei, visto que êste meu espírito mesquinho não há maneira de compreender: como é que pode haver uma repartição que, para fazer progredir o ensino técnico ou superior, tenha influência nesse progresso?

Acho que a essa repartição está apenas ligado o papel burocrático e administrativo de fiscalizar se o ensino se faz em harmonia com as leis em vigor e não tratar de programas que nunca podiam ser feitos por iniciativa dessa repartição.

Nestas circunstâncias, não vejo necessidade de, para se melhorar o ensino, se criar um novo Ministério, nem possibilidade de se encontrar um só homem em Portugal, porque aquele João Félix Pereira já morreu e depois dele não há pessoa que se tenha dedicado a estudar todas as sciências, embora todas as pessoas do nosso país se dêem ares de enciclopédicas, que por si só fôsse capaz de abranger todos os ramos da sciência e poder dirigir um Ministério que encerra serviços tam diferentes de sciência, tam diversos, que por isso mesmo é que em cada repartição se coloca um técnico.

Êste projecto não satisfaz porque parece que se pretende tornar muito longa a especialização, porque aparecem seis ou sete repartições, mas ainda assim não conseguiram o desideratum, que era ter á testa de cada escola uma repartição com o seu técnico. Por exemplo, para o ensino universitário, onde há várias faculdades, S. Exas. criaram uma só repartição com um só técnico.

Nestas condições, eu pregunto se será amanhã um bacharel em direito que há-de ter competência para dar informações sô-

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bre o ensino da faculdade de sciências ou de qualquer outra que não seja a sua?

A admitir o critério de V. Exa., nós temos que ter várias repartições com um técnico da especialidade á testa de cada uma delas.

Ora isto agravará considerávelmente as finanças do nosso país. Pensemos, pois, bem naquilo que vamos fazer.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): - Não se gastará mais do que se gasta actualmente.

O Sr. Sousa Júnior: - Gastar-se há menos.

O Sr. Miranda do Vale: - Há uma economia importante.

O Orador: - Ainda mesmo que assim seja, eu reputo gravíssimo que se sujeite cada ramo de ensino ao critério dum só homem.

O Sr. Sousa Júnior: - Como é então que V. Exa. resolve a questão?

Criando um conselho para cada repartição?

O Orador: - Eu desejaria que nessas repartições se tratasse exclusivamente da parte burocrática.

Ou atribuímos a essas repartições um papel exclusivamente administrativo, e eu então afirmo que não há razão para especializações, ou, então, V. Exas. querem que nessas repartições, alêm da parte meramente administrativa sé trate tambêm da parte pedagógica e nesse caso temos de criar muitas repartições.

Eu desejaria o máximo de descentralização, de maneira que as escolas se encaminhassem pela forma que melhor entendessem, e que o Estado só interferisse na fiscalização do cumprimento das leis, dos regulamentos e dos programas.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): - Veja V. Exa. que inconvenientes derivaram do facto de se conceder aos liceus o direito de livremente escolherem os seus reitores.

Escuso de dizer nada sôbre o assunto, porque e Senado conhece perfeitamente as irregularidades que dêsse facto resultaram.

O Orador: - V. Exa. de certo não ouviu que eu tinha excluído o ensino primário e secundário.

O Sr. Miranda do Vale: - É realmente o ponto em discussão que mais interessa ao estudo dêste projecto: devem as escolas dependentes dos Ministérios do Fomento, da Guerra, da Marinha e das Colónias pertencer ao Ministério de Instrução ou devem a êste pertencer só as repartições das Direcções Gerais de Instrução, hoje a cargo do Mistério do Interior?

O Sr. Ministro do Interior manifesta a sua opinião de que mesmo as escolas do Ministério do Fomento devem ser incorporadas no Ministério de Instrução; é esta tambêm a opinião exarada no parecer.

Eu devo dizer, com a franqueza que costumo usar, que o meu espírito ainda está hesitante.

Tem-se apresentado argumentos pró e contra a anexação das escolas do Ministério do Fomento ao da Instrução Pública; sôbre as escolas dos Ministérios da Guerra e de Marinha, parece que não haverá dúvidas de que elas fiquem estranhas ao Ministério de Instrução Pública.

Tenho visto êste assunto tratado.

Há um pequeno livro em que estão colegidas conferências de René Hermi, que se manifesta contrário à anexação das escolas superiores de agricultura às universidades, e estou convencido que a passagem actual das escolas de agricultura para o Ministério da Instrução traria vantagens financeiras.

Tenho já dito que existe na Direcção Geral de Agricultura uma tal quantidade de pessoal burocrático que pesa sôbre o Orçamento do Estado sem vantagem para a agricultura.

A passagem das escolas para a Ministério de Instrução iria libertar do ensino agrícola a Direcção Geral de Agricultura e permitir que o titular desta pasta pudesse executar algumas medidas de vantagem.

Êste lado da questão seduziu o meu espírito até o ponto de colaborar na elaboração do projecto de lei tal como se apresentou.

Mas, até afirmei, na primeira vez que tive a honra de falar neste projecto, que tinha a certeza que a passagem das escolas de agricultura para o Ministério da

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Instrução teria certa duração, passando em breve para o do Fomento, porque tenho como seguro que o Ministério do Fomento tal como existe hoje não terá longa duração: precisa de ser dividido (Apoiados).

O Sr. Goulart de Medeiros: - Mais outro.

O Orador: - Seria muito vantajoso para o Tesouro Público.

Neste Ministério onde predomina o espírito do abuso característico da monarquia, o papel de Ministro não pode ser proveitoso, tendo de distribuir a sua atenção por extensos e diversos ramos de serviços.

O Ministro nunca poderá empregar a sua atenção duma maneira eficaz. Assim, já permite que o Ministro exerça uma acção moralizadora sôbre os serviços públicos que é indispensável exercer-se, mormente no Ministério do Fomento.

Apresentei aqui uma melhor distribuição dos Ministérios, e poder-se hia fazer isso com vantagem e economia para o Tesouro.

Por consequência, se as considerações do Sr. Ministro do Interior e as feitas pelo Sr. José de Pádua...

O Sr. José de Pádua: - Então V. Exa. quere exceptuar o ensino agrícola e não quere exceptuar o ensino técnico?!

O Orador: - Se V. Exa. tivesse prestado atenção às minhas considerações, teria ouvido o que eu disse: que me referia às escolas do Ministério do Fomento, e muito especialmente às de agricultura, porque são as que conheço.

Por consequência, as considerações que faço a propósito das escolas de agricultura, deve V. Exa. aplicá-las às escolas de ensino industrial e comercial.

O que é certo, porêm, é que V. Exa. atribui a essas repartições uma função muito diferente da que elas tem.

O Sr. Senador José de Pádua admirou-se do meu espírito estar hesitante. Francamente, não acho que seja caso pára espantos, quando é certo que sôbre muitos assuntos nós não podemos ter ainda uma orientação definida.

Se eu tivesse a certeza de que a minha idea de divisão de Ministérios encontrava viabilidade, não havia para mim hesitações. Desde que eu vejo, porêm, que a criação dum Ministério de Agricultura não tem viabilidade, do mal o menos, que passe então o ensino agrícola para o Ministério de Educação. De resto, Sr. Presidente, êstes problemas não se podem encarar apenas por uma das fases.

Eu tenho a minha opinião sôbre êste assunto, mas não deixo de ver que, as considerações apresentadas pelo Sr. Ministro do Interior e por alguns Srs. Senadores, tambêm são para ponderar, pois que o problema é de difícil solução.

O orador não reviu.

O Sr. Nunes da Mata: - Mando para a mesa o parecer da comissão de finanças sôbre o projecto de lei da contribuição predial.

O Sr. Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: tendo o Sr. Nunes da Mata acabado de mandar para a mesa o parecer sôbre o projecto da contribuição predial e sendo extremamente urgente que acêrca dele o Senado se pronuncie, eu ouso pedir a V. Exa. que dê as ordens necessárias para que seja impresso imediatamente, a fim de amanhã ser distribuído e entrar em discussão com a possível brevidade.

Estou certo de que todos os Srs. Senadores se associarão a êste meu desejo, pois que êle redunda em proveito não só das Instituições, mas tambêm do Tesouro Público, que eu represento perante V. Exas.

O Sr. José de Pádua: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Farão parte do Ministério de Instrução Pública os serviços de instrução primária e normal, secundária, universitária e belas-artes. = José de Pádua, Senador.

Foi admitida.

O Sr. Silva Barreto: - Sr. Presidente e Srs. Senadores: êste projecto, como V. Exas. sabem, veio às Câmaras trazido pelo Govêrno que precedeu o actual.

O Sr. José de Pádua classificou-o de Festim de Baltasar. Com franqueza, eu não atinjo o alcance destas palavras...

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O Sr. José de Pádua: - V. Exa. vai ver que eu tenho razão:

Leu.

O Orador: - O Sr. José de Pádua, para fundamentar a sua afirmativa de que êste projecto era um Festim de Baltasar, leu-nos algumas partes do projecto em que se trata das repartições, dizendo-nos que pelo projecto se criam sete e uma secretaria geral e eis porque se devia classificar como S. Exa. o classificou.

S. Exa. parece que não reparou ou não ligou esta parte do projecto com o que actualmente existe, porque, se o tivesse feito, veria que já existem essas repartições, de que se compõe a actual Direcção Geral do Ensino Primário, Normal, Secundário, Técnico, etc.

Se V. Exa. reparar bem, verá que existem três repartições de instrução primária; no Ministério do Fomento igualmente existe um certo número de repartições, de carácter técnico; na instrução secundária, item, logo, a criação do Ministério visa a um único fim: centralizar todas as repartições de instrução e não a aumentar o número de repartições.

Interrupção do Sr. Fortunato da Fonseca, que não se ouviu.

O Sr. Ministro do Interior sabe muito bem que a terceira repartição de instrução primária se ocupava de construções escolares e da estatística; mas o Govêrno da República encarregou o Ministério do Fomento da construção de escolas primárias, destinando a êste fim uma verba de 200 contos de réis.

Parece-me ter provado, com as informações que dei, não haver aumento de repartições. Não há aqui uma só que não seja indispensável ao bom funcionamento dêste novo Ministério e ao desenvolvimento da instrução.

O Sr. Ministro do Fomento (António Miaria da Silva): - Faltava nomear o agente do Ministério do Interior que, juntamente com o do Fomento, resolvessem os assuntos que deviam ser cometidos a essa repartição como a outra qualquer: avalia os projectos que lhe são entregues, organiza as estatísticas do ensino e faz ainda outros serviços; não é própriamente uma repartição que trate exclusivamente de mobiliário e material escolar, trata tambêm de parte do expediente de ensino.

Hoje o Estado não pode administrar doutro modo senão tomando as suas obras por empreitadas; de contrário nós gastaríamos todo o dinheiro, que é uma verba de 200 contos de réis, para ser aplicada a trabalhos de escolas e sem nada termos.

O Orador: - V. Exa. sabe que há um arquitecto no Ministério do Interior; há mesmo escolas que tem sido feitas sôbre a direção dêsse mesmo arquitecto.

Sr. Presidente: eu não sou o autor do projecto; estudando-o concordei plenamente com êle, áparte algumas modificações que a comissão entendeu dever fazer e com as quais eu estou tambêm de acôrdo.

Se durante a discussão dêste projecto, alguém conseguir modificar o meu modo de ver, certamente que terei um grande prazer em o declarar. Eu devo dizer a V. Exa. que não sendo o autor do projecto, concordando com êle, discordei contudo na parte em que o seu autor acaba de afirmar que não tem ainda juízo seguro acêrca da sua orientação, na parte que diz respeito às escolas agrícolas, ás escolas técnicas de instrução primária preparatória, Colégio Militar, etc.

Pois, Sr. Presidente, houve aqui um ponto que se discutiu bastante, que continua a ficar escuro: foi a organização pedagógica.

Diz o § único o seguinte:

Leu.

Eu estudei êste assunto e cheguei à conclusão de que realmente êste parágrafo, por virtude da moção do Sr. Miranda do Vale, tem razão de ser, porque a orientação pedagógica deve ser a mesma em todos os estabelecimentos de ensino que não tenham um caráter acentuadamente técnico, como por exemplo as Escolas de Guerra e Naval.

O Colégio Militar, como escola de instrução secundária ou de ensino médio, deve passar para o novo Ministério.

Interrupção do Sr. Goulart de Medeiros que não se ouviu.

O Orador: - O Instituto dos Pupilos do Exército de Terra e Mar tambêm deve fazer parte do Ministério de Instrução.

Mas se o ensino agrícola médio e elementar fica bem neste Ministério, não vejo

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Sessão de 6 de Fevereiro de 1913 19

motivo para que o ensino técnico não faça parte tambêm do mesmo Ministério de Instrução.

Eu entendo que o Ministro de Instrução dêste país não pode, pela complexidade dos serviços, não obstante a sua sciência e boa vontade, abranger o tam complicado maquinismo dêste Ministério, por .maior que seja a sua competência e maleabildade das suas faculdades intelectuais.

O Ministério de Instrução deve ter à frente das suas repartições profissionais técnicos, sobretudo para orientarem o Ministro na maneira de resolver as questões, e principalmente para conseguirem, dos conselhos escolares das escolas que lhe estão subordinadas, modificações e reformas, já ouvindo-os, já concretizando os seus pareceres ou relatórios.

Resta-me a esperança que êste projecto, tal como está redigido, não dê azo nem a abusos nem a atropelos, contra os quais me revoltarei sempre.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ladislau Parreira: - Sr. Presidente: pedi a palavra quando o Sr. Silva Barreto fez alusão à passagem do Colégio Militar para o novo Ministério de Instrução Pública.

Eu concordo, e assim votarei, com o que a êsse respeito estabelece o projecto, tanto o que veio da Câmara dos Deputados, como o da comissão do Senado.

Leu.

Sr. Presidente: eu não entraria na discussão dêste projecto de lei, se não fora ver um pouco comprometida a existência do Colégio Militar, como estabelecimento de ensino secundário, com aquela característica especial de relativa independência dos outros liceus, que hoje tem.

Sr. Presidente: eu fui educado nessa bela escola, sou um seu antigo aluno, e venho prestar-lhe a minha homenagem de muita dedicação e do meu reconhecimento; porque ali temperei o meu carácter, ali adquiri o princípio da minha pequena ilustração e tambêm ali me habituei a disciplinar a minha vontade.

O Colégio Militar é um dêstes estabelecimentos de educação que tem uma característica sui generis que o define.

Traz-se daquele colégio uma espécie de maçonaria, que não existe noutro, que eu não encontrei noutra escola superior, e, em regra, os rapazes saem dali homens, bons militares.

Tem produzido, tanto para o exército como para a armada, belos resultados, esplendidos oficiais.

Acostumei-me ali a formar o meu caracter, e, sobretudo, a disciplinar à minha inteligência e vontade, e se não me foi difícil disciplinar a primeira, porque ela é cousa mínima (Não apoiados), quanto à vontade, ainda hoje julgo que o saber querer é uma grande qualidade em qualquer pessoa.

O Ministério da Marinha dá para o Colégio Militar, hoje, 12 contos de réis, e o da Guerra ainda mais, mas são belos os resultados que se tiram daquela instituição.

Não vejo, por consequência, necessidade de modificar o pé em que êle está, nem há razão alguma para que se passe a parte administrativa, alêm da parte pedagógica do ensino, para o Ministério que se vai criar.

Julgo mesmo que não haveria vantagem em que o Ministério da Guerra e o da Marinha que despendem, como já disse, uma parte importante dos seus orçamentos nesta instituição, fossem privados de interferência nesse estabelecimento de ensino, porquanto sendo êles que o mantém, justo é que tenham interferência na sua parte administrativa.

E, assim, desde que o novo Ministério fica com interferência na parte pedagógica dêste instituto, por exemplo na confecção de programas, etc., não há mesmo inconveniente em que êle seja administrado pelo Ministério da Guerra como até agora.

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição, e como a hora está muito adiantada, vou encerrar a sessão, marcando a próxima para amanhã, à hora regimental, efectuando-se antes da ordem do dia a eleição da comissão mixta indicada no pertence do parecer n.° 126 da comissão de finanças, e na ordem do dia a continuação do projecto em discussão.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 50 minutos.

O REDACTOR = Alberto Bramão.

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