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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

39.ª SESSÃO ORDINÁRIA DO 3.º PERÍODO DA 1.ª LEGISLATURA

1912-1913

EM 10 DE FEVEREIRO DE 1913

Presidência do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretários os Exmos. Srs.

Bernardo Pais de Almeida
Evaristo de Carvalho

Sumário. - Chamada e abertura da sessão. Leitura e aprovação da acta. Expediente.

Antes da ordem do dia. - Entrou em discussão o parecer n.° 37 (Administração do Arsenal do Exército).

O Sr. Pereira Bastos, Ministro da Guerra, declara considerar urgente o projecto, que é em seguida aprovado, sem discussão, na generalidade e na especialidade.

Entra em discussão o parecer n.° 42 (Serviço de policia no Arsenal de Marinha).

Usam da palavra os Srs. Freitas Ribeiro, Ministro da Marinha, e Arantes Pedroso.

Posta à votação a generalidade do projecto, vindo da Câmara dos Deputados, foi rejeitada, sendo aprovada a substituição proposta pela comissão, na generalidade. Sôbre a especialidade usa da palavra o Sr. Nunes da Mata, sendo em seguida aprovada.

Entra em discussão o parecer n.° 39 (Tesoureiros da Fazenda Pública).

Usam da palavra os Srs. Afonso Costa, Presidente do Ministério; José Maria Pereira e Nunes da Mata, que ficou com a palavra reservada.

Ordem do dia. - Continua em discussão o parecer n.° 38 (Ministério da Instrução Pública).

Usam da palavra os Srs. Fortunato da Fonseca, Brandão de Vasconcelos, Sousa da Câmara, Miranda do Vale, Rodrigo Rodrigues, Ministro do Interior; Ladislau Piçarra, Machado de Serpa e Silva Barreto.

O Sr. Presidente encerra a sessão.

Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:

Abílio Baeta das Neves Barreto.
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Alfredo José Durão.
Amaro de Azevedo Gomes.
Anselmo Augusto da Costa Xavier.
Anselmo Braamcamp Freire.
António Brandão de Vasconcelos.
António Joaquim de Sousa Júnior.
António Ladislau Piçarra.
António Maria da Silva Barreto.
António Pires de Carvalho.
Bernardo Pais de Almeida.
Domingos Tasso de Figueiredo.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Faustino da Fonseca.
Joaquim José de Sousa Fernandes.
José António Arantes Pedroso Júnior.
José de Cupertino Ribeiro Júnior.
José Maria Pereira.
José Miranda do Vale.
José Nunes da Mata.
Luís Fortunato da Fonseca.
Manuel Goulart de Medeiros.
Manuel Martins Cardoso.
Manuel Rodrigues da Silva.
Manuel de Sousa da Câmara.
Ramiro Guedes.
Tomás António da Guarda Cabreira.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Alberto Carlos da Silveira.
António Augusto Cerqueira Coimbra.
António Bernardino Roque.
António Caetano Macieira Júnior.
Artur Augusto da Costa.

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Augusto Vera Cruz.
Carlos Richter.
Cristóvão Moniz.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Joaquim Pedro Martins.
José Afonso Pala.
José Machado de Serpa.
José Maria de Moura Barata Feio Terenas.
José Maria de Pádua.
Leão Magno Azêdo.
Manuel José de Oliveira.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Adriano Augusto Pimenta.
Alfredo Botelho de Sousa.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Ladislau Parreira.
António Ribeiro Seixas.
Artur Rovisco Garcia.
Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro.
Francisco Correia de Lemos.
Inácio Magalhães Basto.
João José de Freitas.
José de Castro.
José Estêvão de Vasconcelos.
José Luís dos Santos Moita.
Luís Maria Rosette.
Manuel José Fernandes Costa.
Pedro Amaral Bôto Machado.
Ricardo Pais Gomes.
Sebastião de Magalhães Lima.
Tito Augusto de Morais.

Às 14 horas e 30 minutos o Sr. Presidente mandou proceder à chamada.

Tendo-se verificado a presença de 28 Srs. Senadores, S. Exa. declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão anterior, foi aprovada sem reclamação.

Estando já presentes 36 Srs. Senadores, deu-se conta do seguinte

EXPEDIENTE

Pareceres

Da comissão de finanças sôbre o projecto de lei n.° 53-A, que tem por fim isentar o Jardim Zoológico de Aclimação em Portugal do pagamento do imposto do sêlo nos seus bilhetes de entrada.

Foi mandado imprimir e distribuir.

Da mesma comissão sôbre a proposta de lei n.º 19-D que regula a promoção dos aspirantes a oficial e dos sargentos ajudantes a alferes.

Foi mandado imprimir e distribuir.

Declaração de voto

Declaro que, se estivesse presente quando se votou a inclusão, no Ministério de Instrução, da Escola de Medicina Tropical, votava contra. = A. Bernardino Roque.

Pedido de dispensa

Do Sr. Senador Alfredo Botelho de Sousa, pedindo dispensa de continuar pertencendo à comissão de marinha e pescarias, pelo facto de estar embarcado e não poder seguir com assiduidade os trabalhos do Senado.

Concedido.

Justificação de faltas

Foram justificadas, com atestado médico, as faltas às sessões, do Sr. Senador Sebastião de Magalhães Lima.

Para a comissão de infracções.

Projectos de lei

Do Sr. Senador António Ladislau Parreira, determinando que os mancebos recrutados para a armada e alistados no corpo da marinheiros, em fins de 1909 e 1910, na vigência da anterior, lei do recrutamento (1901) e que correspondem a contingentes de 1910 e 1911 da actual lei de recrutamento (12 de Setembro de 1911), que se não reconduzem, permanecerão sucessivamente no serviço activo durante cinco anos e nas tropas territoriais até os quarenta e cinco anos de idade.

Para as comissões de marinha e finanças.

Proposta

Proposta de emenda ao último período do artigo 71.° do Regimento:

Todos os oradores falarão sempre voltados para a Presidência, a quem tam sómente se dirigirão. = Abílio Barreto = João de Freitas = Ladislau Piçarra = José Miranda do Vale = José de Cupertino Ribeiro Júnior = Manuel de Sousa da Câmara.

Para a comissão do Regimento.

Procedeu-se a umas segundas leituras.

O Sr. Ladislau Piçarra: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para declarar que faltei ás duas últimas sessões do Senado por

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estar ausênte de Lisboa, e, como o motivo dessa ausência foi estranho à minha vontade, espero que o Senado me relevará essas duas faltas.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o parecer n.° 37, referente á proposta de lei n.° 248-B, que trata da administração do Arsenal do Exército.

Foi lido, entrando seguidamente em discussão na generalidade.

O Sr. Ministro da Guerra (Pereira Bastos): - Sr. Presidente e Srs. Senadores, eu pedi a palavra simplesmente para dizer que julgo da máxima conveniência que o Senado aprove êste projecto.

Reconheço, é certo, como a comissão de guerra do Senado tambêm reconheceu, que êle representa pouca cousa em comparação com o que seria necessário fazer; êsse pouco, porem, é de urgência que se faça, para benefício do Arsenal.

Relativamente às modificações introduzidas nos artigos 1.° e 2.° pela comissão de guerra do Senado, devo dizer, não obstante concordar com elas, que devem ser consideradas como uma questão de redacção.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Em nome da comissão de redacção, declaro que aceito a questão nos termos em que a põe o Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Presidente: - Eu vou consultar o Senado sôbre se entende que se trata duma questão de redacção.

Consultado o Senado, assim o entendeu.

Ninguêm mais se inscrevendo, foi o projecto aprovado na generalidade e, seguidamente, na especialidade, sem discussão.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o parecer n.° 42.

É o seguinte:

Parecer n.° 42

Senhores Senadores. - À vossa comissão de marinha e pescarias foi presente, para dar parecer, a proposta de lei n.° 200-D, aprovada na Câmara dos Deputados, na qual se exara que o lugar de guarda do Arsenal seja preenchido por praças da armada, da graduação de cabos.

Sendo o serviço de polícia do Arsenal de Marinha de bastante importância, devendo, portanto, haver o maior escrúpulo no recrutamento do pessoal que tem de exercer as funções de guarda, não tendo as providências adoptadas nas alterações ao regulamento da Administração dos Serviços Fabris, decreto de 22 de Maio de 1911, que pretendeu substituir os mesmos guardas pela polícia cívica, dado na prática o resultado que seria de esperar, pareceu a esta vossa comissão ser agora oportuno, conservando a essência da citada proposta de lei, modificar as referidas alterações ao regulamento e criar para o corpo de guardas do Arsenal de Marinha uma organização que trará não só uma pequena economia para o Estado, mas tambêm melhorará o serviço de polícia, dando ao mesmo tempo mais homogeneidade ao corpo de guardas.

Nesta ordem de ideas, a vossa comissão de marinha e pescarias, tendo cuidadosamente salvaguardado todos os direitos adquiridos, achou conveniente dar outra redacção á proposta de lei n.° 200-D, tornando-a assim mais explícita e completa.

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° O serviço de polícia do Arsenal de Marinha, compreendendo a Fábrica Nacional de Cordoaria, é feito pelo corpo de guardas e constituído por: 1 chefe de guardas, 12 guardas de 1.ª classe e 24 de 2.ª

§ 1.° Quatro guardas de 2.ª classe e dois de 1.ª prestam serviço na Cordoaria.

§ 2.° Êste pessoal é directamente subordinado á Direcção das Construções Navais e cumpre as instruções de polícia que constarem dos regulamentos especiais e as ordens que lhe forem dadas pela Direcção dos Serviços Fabris.

Art. 2.° O seu vencimento mensal é o seguinte: 36 escudos para o chefe dos guardas, 27 escudos para os guardas de 1.ª classe e 24 escudos para os guardas de 2.ª classe.

Art. 3.° O recrutamento dêste pessoal faz-se por concurso entre os cabos das diferentes brigadas do corpo de marinheiros em serviço activo ou que tenham passado, há menos dum ano, á reserva e preencham as seguintes condições:

a) Estarem na 1.ª classe de comportamento e não contarem mais de trinta e cinco anos;

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b) Terem a robustez precisa, o que será verificado pela junta médica do Arsenal;

c) Apresentarem certidão limpa do registo criminal aqueles que estejam na reserva e que tenham a ela passado na 1.ª classe de comportamento.

§ único. Êste concurso realiza-se em Julho e é válido até 30 de Junho do ano seguinte.

Art. 4.° O concurso será feito conforme o programa elaborado pela Administração dos Serviços Fabris, a qual nomeará tambêm o júri.

Art. 5.° As nomeações são provisórias no primeiro ano, tornando-se depois efectivas se as informações e provas dadas sôbre aptidão, zêlo, assiduidade e comportamento forem favoráveis.

Art. 6.° Se os nomeados estiverem no serviço activo serão imediatamente abatidos ao efectivo do corpo de marinheiros.

Art. 7.° Os guardas tem direito a reforma, licenças, pensões e tratamento no Hospital de Marinha, em conformidade com o disposto no decreto de 22 de Maio de 1911 para o pessoal fabril, e podem tambêm adquirir os seus uniformes no depósito de fardamento e pequeno equipamento da armada.

Art. 8.° O ingresso faz-se na classe de guardas de 2.ª classe, à esquerda dos existentes e com o vencimento do artigo 2.°

Art. 9.° A promoção a chefe e a guarda de 1.ª classe é regulada pela ordem de antiguidade no quadro, quando tenham boas informações.

Art. 10.° Cessam todas as gratificações que se abonam ou seja de uso abonar por qualquer título ou fundamento.

Art. 11.° O novo quadro ir-se há estabelecendo á maneira que os actuais guardas do quadro desaparecerem, sendo desde já dispensados os serviços da polícia civil.

Disposição transitória

Art. 12.° Aos actuais guardas são mantidos todos os direitos e regalias que presentemente usufruem.

Art. 13.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das sessões da comissão, em 23 de Janeiro de 1913. = Amaro de Azevedo Gomes = António Ladislau Parreira = Artur Costa = Alfredo Botelho de Sousa = José António Arantes Pedroso, relator.

Proposta de lei n.° 200-D

Artigo 1.° O lugar de guarda do Arsenal será preenchido por praças da armada, da graduação de cabos, e, quando não as haja, podem concorrer as praças do corpo de polícia cívica de Lisboa, satisfazendo uns e outros ás disposições regulamentares, em vigor, para o acto da admissão.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso, em 20 de Junho de 1912. = António Aresta Branco, Presidente = Baltasar de Almeida Teixeira, 1.° secretário. = Francisco José Pereira, 2.° secretário.

O Sr. Arantes Pedroso: - Requeiro que seja dispensada a leitura do parecer n.° 42, visto já se ter lido na sessão passada.

O Senado concedeu a dispensa da leitura, entrando o parecer n.º 42 em discussão na generalidade.

O Sr. Ministro da Marinha (Freitas Ribeiro): - Cumpre-me declarar ao Senado quais as razões que motivaram a apresentação dêste projecto de lei.

O Regulamento da Administração dos Serviços Fabris de 1908 prescrevia que as vagas que se dessem no corpo dos guardas do Arsenal fossem preenchidas por concurso aberto entre praças graduadas da armada e do exército com baixa limpa.

As alterações ao mesmo Regulamento de 1911 preceituavam que as vagas que de futuro houvesse não fossem preenchidas e se requisitassem polícias cívicos para o desempenho de tais lugares, os quais seriam sempre substituídos no fim dum ano de serviço. O que levou a Administração dos Serviços Fabris a substituir as praças da armada por agentes da polícia, foi o propósito de procurar evitar a prática de contrabando e menos eficaz fiscalização por parte dos guardas, o que se atribuía de há muito ao facto dos guardas, sendo antigos marinheiros, acamaradarem com o pessoal operário e praças de marinhagem, seus antigos companheiros. Está comprovado que o serviço da polícia como guarda do Arsenal não melhorou reconhecidamente os inconvenientes que se tentavam obviar.

Por isso, eu concordo plenamente com o projecto apresentado na Câmara dos Deputados e, sobretudo, com o projecto do Senado, por ser mais completo, por conter a

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regulamentação a que ficará sujeito o corpo de guardas do Arsenal e ainda porque resultará economia da sua aprovação.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Arantes Pedroso: - Sr. Presidente: o projecto que veio da Câmara dos Deputados é duma simplicidade extrema; todavia, a comissão de marinha, depois de o estudar cuidadosamente, viu que êle era de difícil execução na prática, constituindo até um embaraço nocivo para a fiscalização e para a disciplina.

Porêm, a actual proposta de lei da comissão de marinha, conservando a idea inicial do projecto da outra casa do Parlamento, fixou um quadro suficiente de guardas, trazendo uma considerável redução de despesa, por isso que acabou com todas as gratificações, recebendo os funcionários apenas o respectivo vencimento.

Leu.

Comparando a despesa a fazer com o actual quadro proposto pela comissão de marinha do Senado, com a tabela em vigor, vê se que há uma economia de réis 123$150, mas essa economia ainda é maior, pois que a despesa feita foi superior à orçamentada, podendo, pois, dizer que a economia é de 288$902 réis anuais.

Depois do que acabo de dizer nada mais tenho a acrescentar, pois os outros artigos do projecto em nada contrariam a idea primitiva da proposta.

Foi admitida a proposta da comissão de marinha.

Foi rejeitada a proposta da Câmara dos Deputados.

Foi aprovada a proposta da comissão de marinha do Senado.

Entrou em discussão o artigo 1.°

O Sr. Nunes da Mata: - Chamo a atenção de V. Exa. para o § 2.°, que não está bem claro.

Leu.

O Sr. Arantes Pedroso: - Eu não faço questão. Mando para a mesa a seguinte emenda:

Substituir "êste pessoal" por:

"§ 2.° O pessoal de polícia é directamente subordinado"... = Arantes Pedroso.

Foi admitida.

Leu-se na mesa e foi aprovada.

Foram aprovados sem discussão os artigos 1.°, 2.°, 3.°, 4.°, 5.°, 6.°, 7.°, 8.°, 9.°, 10.°, 11.°, 12.° e 13.°

Entrou em discussão o parecer n.° 39.

É o seguinte:

Parecer n.° 39

Senhores Senadores. - Pela legislação anterior a 26 de Maio de 1911, as receitas do Estado, cobradas nas tesourarias, não eram devidamente defendidas, sendo mesmo por vezes defraudadas, em razão de abusos que a mesma legislação não previa e bem assim em resultado do processo de compensações que abria uma larga porta ao favoritismo, visto serem arbitrárias.

O decreto de 26 de Maio de 1911 teve a pretensão de pôr cobro a um tal estado de cousas, mas fê-lo por modo incompleto e conjuntamente inconveniente, dando lugar a que os abusos e arbitrariedades, cometidos em detrimento do Estado, não desaparecessem por completo, e ao mesmo tempo é êle próprio que com desenvoltura nada galharda os passa a praticar em prejuízo de quási todos os tesoureiros, sendo principais vítimas os de Lisboa.

Para se poder fazer uma idea da sua acção a êste respeito, bastará dizer que o vencimento mensal do tesoureiro do 2.° bairro de Lisboa, que é o mais rico, ficou reduzido à diminuta quantia de dois escudos!

O ilustre relator da comissão de finanças da Câmara dos Deputados tambêm frisou êste facto injustificável.

O que não oferece dúvida é que uma tal situação é insustentável; mas, ainda que o não fôsse, bastava que fôsse injusta e até iníqua para que sem demora deva terminar.

É o que se pretende conseguir com a proposta de lei n.° 248-I, vinda da outra casa do Congresso, patrocinada pelo seu autor, um ex-Ministro de Finanças com fama de homem de talento e pela comissão de finanças da outra Câmara, que no assunto teve como relator uma autoridade em questões financeiras.

Sem de modo algum se pretender diminuir os créditos dos patronos da presente proposta de lei, entende entretanto a vossas comissão de finanças que ela necessita dalgumas alterações e que os seus quatro artigos principais sob o ponto de Vista orçamental e económico, os artigos 2.°, 3.°,

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12.° e 14.°, que regulam as gratificações dos tesoureiros e os abonos para falhas e bem assim os subsídios para o pessoal das tesourarias e para o funcionamento destas, devem ser completamente substituídos por outro ou outros.

Como é sabido, a principal dificuldade nas cobranças das receitas do Estado provêm da maior ou menor confiança na austeridade dos tesoureiros e no melhor ou pior funcionamento das tesourarias.

Como garantia da austeridade e fidelidade dos tesoureiros, tem-se reconhecido até hoje que o único processo viável, sob o ponte de vista geral, consiste na fiança ou caução.

Pelo que diz respeito ao funcionamento das tesourarias, três processos, pelo menos, podem ser empregados.

Consiste o primeiro em as tesourarias estarem em casas por conta do Estado e constituírem repartições públicas com funcionários pagos pelo Estado, tendo os deveres e direitos dos outros funcionários públicos; tudo sob a fiscalização directa e imediata do Govêrno.

Consiste o segundo em as casas ainda serem por conta do Estado e êste entregar aos tesoureiros, como gratificação de exercício e abono para falhas, uma percentagem sôbre as cobranças ou sôbre as cauções, entregando-lhes suplementarmente outras quantias julgadas suficientes para o pagamento dos fiéis e mais empregados.

Consiste o terceiro processo em as casas serem ou não serem por conta do Estado e êste entregar aos tesoureiros Unicamente uma dada percentagem sôbre as cobranças ou sôbre as cauções, sem mais nada.

O primeiro processo, no estaco actual da mentalidade e moralidade humana, carece não ser viável.

Ao mesmo tempo não tem a garanti-lo o acicate e o estímulo do interêsse, e por outro lado tem o inconveniente de retirar aos tesoureiros á completa liberdade na escolha dos empregados que os devem auxiliar, liberdade que é indispensável, desde o momento que aqueles são obrigados a dar fiança ou caução.

O segundo processo é o que a proposta de lei adopta por meio dos artigos 2.º, 3.º, 12.° e 14.° para os tesoureiros de Lisboa e do Pôrto, adoptando o terceiro processo por meio dos artigos 2.°, 3.° e 12.º para as restantes tesourarias do país.

Antes de ser feita a crítica dêstes artigos e de ser feita a proposta da sua substituição, convêm esclarecer dois assuntos que tem certa importância.

Consiste o primeiro em averiguar se é ou não dispensável a caução, visto correr impressa a opinião de que é dispensável; consiste n segundo em saber se as percentagens e bem assim as cotas que os tesoureiros tem a receber devem ser função das cobranças ou receita de cada ano ou se devem ser função das cauções.

Emquanto à dispensa da caução, seria medida arriscada no estado actual da psicologia social e cuja experiência não deve ser recomendada.

A caução tem, é certo, o inconveniente de afastar os pretendentes honrados e prestantes que não possam dar caução, mas tem vantagens que compensam plenamente êste inconveniente.

O que é essencial é que as cauções sejam sempre função das receitas.

Pelo que diz respeito a serem as cotas função das receitas ou das cauções, não parece ser assunto que mereça larga discussão.

Segundo a legislação até hoje adoptada, as cotas eram função das receitas; pela presente proposta de lei, as cotas passam a ser função das cauções.

Apesar da ilustre comissão de finanças da Câmara dos Deputados encarecer com palavras elogiosas uma tal mudança, a vossa comissão de finanças não consegue medir-lhe o alcance.

Uma de duas, ou as cauções são proporcionais às receitas, e nesta caso não há a menor vantagem em uma alteração que só vem fazer confusão, ou não são proporcionais e então uma tal base é falsa, devendo por isso resultar prejudicial para o Estado ou então resultar prejudicial e iníqua para alguns tesoureiros.

Por isso não há a menor vantagem e só oferece, inconvenientes a adopção das cauções como base das percentagens e respectivas cotas.

É certo que os tesoureiros ficam um pouco na contingência das crises económicas, sendo as cotas função das receitas ou cobranças; mas não ficariam na mesma contingência sendo as cotas função das cauções, visto estas deverem ser função das receitas?

Não está porventura o Estado tam-

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bem sujeito a essas contingências, e com êle não estão igualmente sujeitas a essa contingência todas as classes sociais?

Mas não há razão para um tal receio, desde o momento que o artigo 2.° da proposta de lei salvaguardava generosamente essa contingência, que ainda é salvaguardada, embora modesta e democraticamente, pelo artigo 2.° que em substituição daquele se propõe.

Uma das cousas que mais dá nas vistas na presente proposta de lei é o estarem os vencimentos dos tesoureiros distribuído por quatro artigos, o 2.°, o 3.°, o 12.° e 14.°, quando podiam ser distribuídos em um só artigo e o máximo dois. Com efeito, desde o momento que o vencimento dos tesoureiros deve ser função da sua responsabilidade e do seu trabalho, era bastante um artigo e uma tabela em que equitativamente se conseguisse êsse resultado. Entretanto, a comissão de finanças, em atenção a qualquer possível crise económica em algum dos concelhos e considerando que há tesourarias com muito pequena receita, como a da ilha do Corvo, por isso manteve o artigo 2.° em substituição do artigo 2.° e 12.° da proposta de lei, mas estabelecendo-lhes o mínimo de vencimento com que é possível viver sem trabalhar, embora haja quem viva com menos, trabalhando. O artigo 2.° da proposta de lei, com os seus vencimentos de categoria generosos, representa um convite aos mandriões com dinheiro para alcançarem o lugar de tesoureiro e em seguida entregarem o serviço ao proposto, a fim de continuarem mais desafogadamente na sua vida inútil, ou tratando dos seus negócios. Isto que já era matéria corrente em algumas tesourarias, passaria a ser a regra geral, se fôsse aprovado o artigo 2.° como está na proposta de lei. O artigo que em substituição se propõe e que contêm o estritamente essencial não dá margem a um tam imoral abuso.

Englobando, pois, a doutrina dos artigos 2.° e 12.° em um artigo único que os substitua, propõe-se para êsse efeito o seguinte:

"Art. 2.° Os tesoureiros de todas as tesourarias do país receberão, alêm do vencimento variável que determina o artigo 3.° e seus parágrafos, e respectiva tabela, a quantia anual fixa, para cada um, de 360 escudos, pagos mensalmente e isentos de toda e qualquer dedução, como vencimento de categoria e para auxiliar as despesas com os propostos".

Se no futuro, quando melhorarem as condições do Tesouro Público, se reconhecer que o vencimento fixo de 360 escudos é escasso de mais, fácil será a sua ampliação até a quantia que for julgada razoável.

Os artigos 3.° e 14.° salientam se pelas desigualdades e injustiças a que dão lugar, embora os intuitos do autor ou autores da proposta de lei fossem bem diversos, sendo para lamentar que assim fossem presentes ao Congresso.

Para se fazer idea das desigualdades e injustiças a que dá lugar o artigo 3.°, bastará ver que, emquanto o tesoureiro, que tem em caução 7.000 escudos, receberá a importância anual de 420 escudos, o que tiver 8.000 escudos de caução receberá apenas 400 escudos. Mais sensível é o exemplo de que, emquanto o tesoureiro, que tiver de caução 9.000 escudos, receberá a importância anual de 450 escudas, o que tiver 10.000 escudos de caução receberá apenas 300 escudos! Êstes exemplos, por si só, bastam para provar que o artigo como está não é aceitável.

O artigo 14.° é um artigo de excepção, e isso bastaria para não poder ser aceite em uma democracia. Mas há mais. Êste artigo é imoral e injusto, não só pela desigualdade flagrante que estabelece entre os tesoureiros de Lisboa e do Pôrto dum lado e os restantes tesoureiros de todo o país, mas ainda pela desigualdade injustificada que estabelece entre os tesoureiros das duas grandes cidades. Toda a gente sabe que o 4.° bairro de Lisboa é de todos o mais profícuo para o respectivo tesoureiro, em razão das grandes heranças, como a de Burnay e outras que pela tesouraria daquele bairro tem sido e serão processadas. Emquanto ao 1.° bairro de Lisboa, tambêm toda a gente sabe que é um bairro de proprietários modestos ou pobres, pois dele faz parte todo o pobre bairro de Alfama. Ao mesmo tempo tenha-se presente que a receita média dos três últimos anos na tesouraria do 4.° bairro de Lisboa foi de 669.993 escudos apenas, emquanto que a receita do 1.° bairro foi de 954.129 escudos. Pois no artigo 14.° concede-se a estas duas tesourarias a mesma gratificação

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ou subsídio de 1.800 escudos, alêm do que era estatuído nos artigos 2.°, 3.° e 12.°, apesar das condições das duas tesourarias serem tam diversas. Esta desigualdade ainda se torna mais flagrante em relação ao Pôrto, cujas tesourarias ficariam recebendo apenas 900 escudos de subsídio, apesar da receita média da do 2.° bairro desta última cidade ser de 789.872 escudos e por conseguinte superior à receita do 4.° bairro de Lisboa.

Idêntica desigualdade se nota no artigo 14.° com relação a tesourarias que não contempla, como a de Ponta Delgada, com uma receita média de 304.251 escudos, e a de Braga com 293.509 escudos de receita, e outras como Coimbra, Funchal, etc.

Tendo em vista as considerações anteriores, propõe-se a substituição da parte orçamental dos artigos 3.° e 14.° da proposta de lei e bem assim o artigo 20.°, pelos artigos 3.° e respectiva tabela, e artigo 3.°-A, que vão a seguir:

Art. 3.° Os tesoureiros perceberão duodécimalmente como gratificação de exercício, abono para falhas e subsídio para despesa com o pessoal das tesourarias e para o funcionamento destas as cotas em escudos, segundo a tabela que vai apensa a esta lei, devendo-se entrar na mesma tabela e na sua coluna A com a média nos três últimos anos dos seguintes números e valores:

1.° Receita cobrada em escudos;

2.° Dôbro do número de conhecimentos processados e cobrados;

3.° A quarta parte do capital cobrado em operações de tesouraria;

4.° Metade do número de funcionários públicos recebendo os seus vencimentos pelas tesourarias;

5.° A quarta parte, do número de verbas entradas na caixa económica respectiva e metade do número de verbas saídas.

A soma final das cotas correspondentes é que representa a importância total que durante cada ano, e paga duodécimalmente, cada tesoureiro tem a receber.

§ 1.° Se em algum ou alguns dos três anos anteriores tiver havido crise económica em qualquer distrito ou concelho, ou tiver havido dispensa de parte da cobrança, recorrer-se há, para o cômputo do valor a entrar na coluna A, ao ano ou anos imediatamente anteriores aos três a que se refere o artigo.

§ 2.° Os valores intermediários das cotas, que não estão consignados na tabela, obtêm-se somando à cota imediatamente inferior a centésima parte do produto da percentagem correspondente pelo excesso do número da coluna A, tambêm correspondente e portanto imediatamente anterior e inferior. Assim, por exemplo, a cota que corresponde a 240.000 é 670 + 40.000 X 0,15/100 = 670 + 60 = 730.

§ 3.° Quando os tesoureiros não estiverem em exercício, deixarão de receber a terça parte da importância total que recebiam, segundo os diversos números dêste artigo e respectiva tabela.

Art. 3.°-A. Os tesoureiros são obrigados a dar como caução uma importância igual a dez vezes a importância da soma das cotas que corresponderem aos n.ºs 1.° e 3.° do artigo 3.°

Tabela das percentagens e cotas dos tesoureiros

[Ver tabela na imagem]

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[Ver tabela na imagem]

Embora esta tabela destoe por completo das normas até aqui adoptadas e constitua uma novidade em finanças, entretanto, faça-se o que se fizer, dificilmente se encontrará qualquer outro processo mais simples, racional e equitativo para a regular manutenção e funcionamento das tesourarias de todo o país, não dando margem a desigualdades e arbítrios e fazendo justiça a todos os tesoureiros, sem preferência para nenhum.

Explicação do artigo 3.° e tabela:

No artigo 3.° e seus parágrafos está explicado o modo como deve ser empregada a tabela, e por isso bastará fazer dois exemplos:

1.° Exemplo. - Numa tesouraria a receita média é 33.424 escudos, processam-se 2:100 conhecimentos, cobram-se de operações de tesouraria 2.430 escudos, paga-se a 400 funcionários, dá-se entrada na Caixa Económica a 600 verbas e dá-se saída a 400; qual é a cota final?

[Ver valores da tabela na imagem]

A = 33.424 corresponde
A 2 X 2.100 = 4.200
A 1/4 X 2.430 = 608
A 1/2 X 400 = 200
A 1/4 X 600 = 150
A 1/2 X 400 = 200
A soma das cotas ou cota final é

2.° Exemplo. - Numa tesouraria a receita média é 136.468 escudos, processam-se 4:760 conhecimentos, cobram-se de operações de tesouraria 4.600 escudos, paga-se a 680 funcionários, dá-se entrada na Caixa Económica a 800 verbas e dá-se saída a 600; qual é a cota final?

[Ver valores da tabela na imagem]

A = 136.468 corresponde
A 2 X 4.760 = 9.520
A 1/4 X 4.600 = 1.150
A 1/2 X 680 = 340
A 1/4 X 800 = 200
A 1/2 X 600 = 300
A soma das cotas ou cota final é

O artigo 14.°, ou antes o seu § 2.°, tendo sido, de certo, determinado por um espírito de justiça, entretanto envolve uma certa injustiça relativa, pois não foram apenas os tesoureiros de Lisboa que foram lesados pelo decreto de 26 de Maio de 1911. Muitos outros tesoureiros foram tambêm lesados por êsse país fora. No caso, pois, de ser aprovado o artigo 3.° que se propõe e a sua respectiva tabela, deverá o artigo 14.° da proposta de lei ter a seguinte redacção:

Artigo 14.° Em cada uma das tesourarias dos bairros de Lisboa e do Pôrto, os lugares de propostos serão desempenhados por fiéis, nas condições estatuídas no artigo 11.°, sendo-lhes agregados o mais pessoal que pelos tesoureiros for julgado necessário.

§ 1.° Emquanto existirem empregados nomeados nos termos do decreto de 28 de Julho de 1888, cujos vencimentos são pagos directamente pelo Estado, serão deduzidas das verbas a receber pela tabela do artigo 3.° as importâncias necessárias para o pagamento dêsses vencimentos.

§ 2.° Aos tesoureiros serão liquidados os vencimentos e subsídios até a quantia máxima de 360 escudos por ano, a partir de 1 de Julho de 1911.

Para a comissão de finanças poder fazer um estudo comparativo da despesa prevista pela proposta de lei n.° 248-I e seus artigos 2.°, 3.°, 12.° e 14.° e da despesa que resultaria dos artigos 2.° e 3.° com a respectiva tabela, era necessário que a mesma comissão conhecesse as receitas das tesourarias, o número dos seus respectivos conhecimentos e bem assim as importâncias das operações de tesouraria, número de funcionários públicos que recebem os seus vencimentos pelas tesourarias e ver-

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bas entradas e saídas das Caixas Económicas. A comissão de finanças apenas conseguiu obter as receitas das tesourarias por intermédio do Diário do Govêrno de 28 de Junho de 1912. Emquanto às operações de tesouraria, número de funcionários públicos pagos pelas tesourarias e verbas entradas e saídas das Caixas Económicas, pouca falta faz para o efeito o facto de não serem conhecidos com rigor, pois que o aumento de despesa para o Estado determinado pelos n.ºs 3.°, 4.° e 5.° do artigo 3.° deve ser pequeno. Outro tanto se não pode dizer da falta dos conhecimentos, pois o número dêstes deve influir bastante na despesa em vista do n.° 2.° do referido artigo 3.° Como, porêm, a comissão tinha de tomar uma resolução, e como ao mesmo tempo fôsse sabido que o número de conhecimentos regula em geral por 5 a 10 por cento do número de escudos da receita respectiva, sendo raro o caso do número de conhecimentos ser superior a 10 por cento do número de escudos da receita e sendo menos raros os casos em que o número de conhecimentos é inferior a 5 por cento, por isso tomou a resolução de meter ombros ao trabalho grande e enfadonho de calcular a despesa sôbre a receita e número de conhecimentos tanto para o caso em que êste último número fôsse 5 por cento, como 10 por cento do número de escudos da receita. As tabelas seguintes apresentam êsse trabalho, que se refere a todas as tesourarias.

Como se disse, a despesa relativa aos n.ºs 3.°, 4.º e 5.° do artigo 3.° não deve determinar aumento sensível na despesa total, e êsse aumento está ressalvado pela diminuição desta última despesa calculada sôbre os n.ºs 1.° e 2.° em comparação da despesa prevista na proposta de lei.

Valores das cotas pelo 1.° e 2.° números do artigo 3.° e supondo que o número de conhecimentos é 10 por cento ou 5 por cento do número de escudos da receita

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[Ver valores da tabela na imagem]

Soma das cotas pelo n.° 1 e 2 do artigo 3.°, supondo que o número de conhecimentos é 10 por cento de número de escudos da receita
Soma dos vencimentos nas 295 tesourarias, segundo o artigo 2.°
Total da despesa com tesoureiros e tesourarias
Soma das cotas pelo n.° 1 e 2 do artigo 3.°, supondo que o número de conhecimentos é 5 por cento do número de escudos da receita
Soma dos vencimentos nas 295 tesourarias, segundo o artigo 2.°
Total da despesa com tesoureiros e tesourarias

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Como se vê das tabelas anteriores e pela conclusão final a que se chega por meio da soma das cotas de todas as tesourarias do País em número de 295, a sua soma com a soma dos valores determinados pelo artigo 2.° conduziriam à despesa de 250.067 escudos, no caso de que em média o número de conhecimentos fôsse 10 por cento do número dos escudos de receita, e conduziriam á despesa de 234.682 escudos, no caso de que em média o número de conhecimentos fôsse 5 por cento do número dos mesmos escudos. Na maioria dos casos, a média geral deve estar mais próxima de 5 do que de 10, e por vezes estará mesmo abaixo de 5. Suponha-se porem que essa média seja 6, então a despesa seria de 237.759 escudos ou menos 12.990 escudos do que a despesa prevista na proposta de lei. Esta importância é de supor que não seja por ora atingida pelas verbas de despesa para o Estado e receita para os tesoureiros a que se referem os n.ºs 3.°, 4.° e 5.° do artigo; mas se for atingida, só há motivo para aplauso pois será isso sinal de que as condições económicas do País progridem constantemente.

A fim de evitar que, ao abrigo do artigo 10.°, alguns tesoureiros de classe inferior passem a desempenhar indevidamente o serviço em tesourarias de classe mais elevada, talvez fôsse conveniente que no referido artigo 10.° fossem acrescentadas adiante da palavra "tesoureiros" as palavras "da mesma categoria".

O artigo 13.° não pode ficar como está na proposta de lei, pois se o tesoureiro pode ser dispensado de exigir caução ao proposto, não faz sentido que, no caso de entender que lhe deve exigir caução, seja obrigado a exigir lhe toda a com que êle mesmo entrou.

Que tem o Estado que ver se o tesoureiro exige toda a caução ou se exige apenas uma parte, se lhe é facultado não exigir nada e se, alêm disso, é o tesoureiro e só o tesoureiro que responde para com o Estado? Por isso se propõe a substituição do artigo 13.° pelo seguinte:

"Art. 13.° A caução do tesoureiro responde para com o Estado pelo regular exercício das funções do proposto, a quem o tesoureiro poderá exigir qualquer caução".

Se o artigo 20.° da proposta de lei fôsse substituído pelo artigo 3.°-A que se propôs, rapidamente se determinava a caução de qualquer tesoureiro pela tabela das cotas. Assim a caução dos tesoureiros dos 4 bairros de Lisboa, visto não terem o serviço referente a operações de tesouraria, seria respectivamente 16.300 escudos, 24.010 escudos, 15.650 escudos e 13.040 escudos. A caução do tesoureiro de Vila de Rei seria de 1.268 escudos.

O artigo 19.° da proposta de lei pode promover justos reparos, pois em uma boa democracia não é regular nem é conveniente dar ao Govêrno autorização para, por seu mero alvedrio, fazer a nomeação de empregados públicos de tanta responsabilidade: a lei e só a lei é que deve fazer essas nomeações, em resultado de prévios concursos e segundo regras certas e ao alcance do conhecimento de todos. Mas, no caso sujeito, êste artigo 19.° é admissível perante a justiça e a equidade, a fim de evitar que sejam demitidos tesoureiros interinos que, embora não tenham as habilitações exigidas para entrar em concurso, entretanto tenham dado provas de zêlo e competência no exercício das suas funções.

Com relação aos concursos para inspectores de finanças de 2.ª classe e para secretários de finanças de 3.ª classe, conveniente seria para o serviço público que a êles fossem admitidos os tesoureiros em determinadas condições, em razão da prática que tem em assuntos de contribuições e cobranças. A comissão de finanças limita-se a recomendar o assunto por julgá-lo de utilidade, mas não apresenta proposta por entender que deve primeiro ser ponderado e estudado por pessoas competentes na especialidade.

Quanto à idea que corre impressa das propostas dos tesoureiros serem substituídos por aspirantes das tesourarias nomeados por despacho ministerial, não é admissível, visto os tesoureiros serem obrigados a dar caução e portanto não lhes pode ser coartada a completa liberdade de escolherem

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as propostas e de as substituírem, quando assim e entenderem.

Antes de terminar, não deve a comissão de finanças deixar de chamar a atenção do Senado e do Sr. Ministro das Finanças para assunto que não é fácil regularizar, mas que seria de indiscutível equidade que se regularizasse. Consiste êle em que, em algumas tesourarias de Lisboa e Pôrto há fiéis e outros empregados com longos anos de bom serviço, e que sentem chegar a velhice sem ter o menor direito a qualquer aposentação. Assim, pôr exemplo, na tesouraria do 2.° bairro de Lisboa há um 2.° fiel com 80 anos de idade e 52 anos de bom serviço, que ainda se esforça por desempenhar as suas funções de fiel, para não morrer de fome! Não é realmente um contraste doloroso, êste dum funcionário por cujas mãos devem ter passado centenas e milhares de contos de réis, aguardar com terror o momento em que há-de morrer de fome ou há-de estender a mão à caridade pública!? Não se pode negar que o assunto merece ser considerado e ponde rado no intuito de se chegar a uma solução que evite uma situação um tanto deprimente em uma sociedade culta.

Sala das Sessões do Senado, 20 de Janeiro de 1913. = Joaquim Pedro Martins (com declarações) = Estêvão de Vasconcelos (com reserva) = José Maria Pereira (com reserva) = João de Freitas (vencido em parte) = Tomás Cabreira (com reserva) = Inácio de Magalhães Basto (com reserva) = Rodrigues da Silva (vencido em parte) = Nunes da Mata (relator).

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° Os tesoureiros da Fazenda Pública constituem um quadro privativo dividido em três classes, sem dependência entre elas, de conformidade com a classificação fiscal dos concelhos.

Art. 2.° Os vencimentos de categoria para cada uma das classes são:

Tesoureiros dos bairros de Lisboa e Pôrto, 900$000 réis.

Tesoureiros de concelhos de 1.ª classe, 600$000 réis.

Tesoureiros de 2.ª classe, 480$000 réis. Tesoureiros de 3.ª classe, 360$000 réis.

Art. 3.° Os tesoureiros perceberão como gratificação de exercício e abono para falhas, em partes iguais, e paga duodecimalmente, a percentagem de 6 por cento nas cauções inferiores a 8:000$000 réis; a de 5 por cento nas iguais ou superiores a esta importância até à de 10:000$000 réis, e a de 3 por cento nas que atingirem ou excederem esta última quantia.

Art. 4.° Cessam os abonos que, sob o título de cotas, compensações ou subsídios lhes eram até o presente abonados.

Art. 5.° Nas certidões de relaxe será contada a importância de 200 réis em cada uma, como emolumento destinado a compensar aã despesas de expediente, que continuam a cargo dos tesoureiros.

Art. 6.° As transferências de fundos serão feitas gratuitamente pela Administração Geral dos Correios e Telégrafos, sob condições a regulamentar.

Art. 7.° Vaga qualquer tesouraria, será feito o competente anúncio no Diário do Govêrno, e quando não seja requerida no prazo de quinze dias por tesoureiros já providos definitivamente (e neste caso o Govêrno escolherá livremente) será feito concurso nos termos do artigo 19.° e seu parágrafo do decreto de 26 de Maio de 1911.

Art. 8.° Na falta de requerentes já tesoureiros, poderão ainda as vagas ser providas definitivamente em tesoureiros interinos com aprovação em concursos anteriores, ou ainda em propostos com dez anos, pelo menos, de bom e efectivo serviço.

Art. 9.° Nos concursos a que se refere o artigo 7.° será motivo de preferência em igualdade de classificação o facto de ter exercido ou exercer o lugar de proposto.

Art. 10.° Pode ser concedida a permuta, entre dois ou mais tesoureiros, quando requerida por êles, e favoravelmente informada pelos inspectores de finanças e pala Direcção Geral respectiva.

Art. 11.° Cada tesoureiro terá como auxiliar e substituto um proposto de sua confiança, confirmado pela Direcção Geral da Fazenda Pública, ouvido o respectivo inspector de finanças.

Art. 12.° O Estado abonará a cada tesouraria a importância de 300$000, 240$000 ou 180$000 réis anuais, conforme a classe, destinada às despesas com os propostos e isenta de toda e qualquer dedução.

§ único. Nos concelhos de 3.ª classe, quando sedes das comarcas, a importância para proposto é igual á dos de 2.ª classe.

Art. 13 ° A caução do tesoureiro responde para com o Estado pelo exercício de funções do proposto, a quem o tesou-

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reiro poderá exigir, querendo, uma caução para com êle nunca inferior à própria.

Art. 14.° Em cada uma das tesourarias dos bairros de Lisboa e do Pôrto os lugares de propostos serão desempenhados por fiéis, aos quais é aplicável o disposto no artigo 11.°, coadjuvados pelo pessoal que pelos tesoureiros for julgado necessário, e para o pagamento de cujos vencimentos será abonada a cada tesouraria de Lisboa, alêm da importância de 1:200$000 réis fixada no § 1.° do artigo 25.° do decreto de 26 de Maio de 1911, a quantia de 600$000 réis para as do 1.°, 3.° e 4.° bairros e a de réis 1:100$000 para a do 2.° bairro, e a cada uma das do Pôrto, a quantia de 900$000 réis fixada no § 2.° do mesmo artigo.

§ 1.° Emquanto existirem empregados nomeados nos termos do decreto de 28 de Julho de 1888, cujos vencimentos são pagos directamente pelo Estado, serão deduzidas das verbas fixadas no § 1.° do artigo 25.° do decreto de 26 de Maio de 1911 as importâncias necessárias para o pagamento dêsses vencimentos.

§ 2.° Aos tesoureiros de Lisboa serão liquidados os vencimentos e subsídios, a partir de 1 de Julho de 1911, nos termos dos artigos 2.°, 3.° e 14.°

Art. 15.° Aos tesoureiros da Fazenda Pública de nomeação posterior a 5 de Outubro de 1910 é reconhecido o direito à aposentação, devendo concorrer para a caixa de aposentação com a cota de 5 por cento, como os demais empregados do Estado, desde a data do termo de posse, cota esta que incide sôbre os vencimentos de categoria e sobre metade da percentagem fixada no artigo 3.°, considerando-se a outra metade da percentagem como abono para falhas.

Art. 16.° É concedido o prazo de noventa dias aos demais tesoureiros para requererem o reconhecimento dêsse direito, em iguais condições às do artigo antecedente, sob a obrigação de concorrerem para a caixa de aposentação, em noventa e seis prestações mensais, com as cotas correspondentes ao período decorrido desde a data do termo de posse, acrescidas de juros de mora de 6 por cento ao ano.

§ 1.° Igual faculdade é concedida, com relação ao período em que exerceram as funções de recebedores aos funcionários que actualmente contribuam para a caixa de aposentação, tendo transitado directamente daquele para o actual emprego.

§ 2.° Os vencimentos a que os tesoureiros ficam com direito, quando aposentados, serão: o ordenado de categoria fixado no artigo 2.° acrescido de metade das percentagens fixadas no artigo 3.°, quando tenham atingido a idade e o número de anos de serviço que a lei geral sôbre aposentações exige para a aposentação por inteiro e as respectivas proporções quando noutras condições.

Art. 17.° À Direcção Geral da Fazenda Pública incumbe a inspecção dos serviços privativos das tesourarias, para o que poderá requisitar da Direcção Geral das Contribuições e Impostos o pessoal que se lhe tornar necessário.

Art. 18.° Os funcionários encarregados dessas inspecções ou das transições perceberão as ajudas de custo fixadas no artigo 26.° do decreto de 26 de Maio de 1911, conforme as suas categorias ou equiparações, sendo-lhes abonada adiantadamente a importância correspondente a dez dias, a liquidar no último abono.

Art. 19.° Fica o Govêrno autorizado a nomear definitivamente os tesoureiros interinos que o forem à data da publicação desta lei, tiverem dado provas de competência e zêlo no exercício das suas funções.

Art. 20.° O Govêrno procederá á revisão da tabela da importância das cauções em vigor, para ser presente à sanção legislativa, tendo em vista não só a cobrança dos rendimentos públicos, mas tambêm o movimento das operações de tesouraria e a importância dos pagamentos normais.

Art. 2l.° São elevados respectivamente a quarenta e a sessenta dias os prazos designados do artigo 44.° do decreto de 26 de Maio de 1911, pelo que respeita aos tesoureiros da Fazenda Pública, para tomarem posse, nas duas hipóteses no mesmo artigo indicadas, ficando esta sempre dependente da apresentação dos títulos da caução.

Art. 22.° O exercício das funções de tesoureiro é incompatível com o de quaisquer outras que obrigue a ausência da repartição.

Art. 23.° Continuam em vigor com respeito aos tesoureiros e tesourarias todas as disposições anteriores não contrariadas pela presente lei.

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Art. 24.° Fica revogada a legislarão em contrário.

Palácio do Congresso da República, em 9 de Julho de 1912. = António Aresta Branco, presidente = Baltasar de Almeida Teixeira, primeiro secretário = Francisco José Pereira, segundo secretário.

O Sr. Presidente: - Com êste projecto dá-se uma cousa curiosa. Só o relator é que assina sem declaração, de forma que pode dizer-se que êste parecer é só do Sr. relator.

O Sr. Tomás Cabreira: - Requeiro para ser dispensada a leitura.

O Senado dispensou.

Entrou em discussão na generalidade.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Este projecto já vaio feito da Câmara dos Deputados, e a comissão do Senado deu o seu parecer, mas assinaram uns com declarações, outros com reservas, outro vencido, etc.

Eu pedia, aos Srs. Senadores que assinaram, o parecer o favor de explicarem a razão porque o fizeram, para eu saber a orientação que hei-de tomar.

O que eu desejo é ouvir as declarações de S. Exas.

O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Senadores que assinaram o parecer com declaração, e que estejam presentes, a fazerem as declarações que o Sr. Presidente do Ministério deseja.

O Sr. José Maria Pereira: - O projecto que está em discussão foi objecto de largo debate.

Qualquer alteração que se introduza desfaz o que tinha feito a Câmara dos Deputados.

Resumindo, pois, Sr. Presidente, eu devo dizer que, em face das informações que colhi sôbre o texto votado pela Câmara dos Deputados, me convenci, bem como outros membros da comissão, de que êsse texto era o mais conveniente para os interesses do país, com a vantagem de ser elaborado em harmonia com elementos oficiais, e por êsse motivo não dei o meu voto às modificações apresentadas pelo ilustre Senador Sr. Nunes da Mata.

O Sr. Nunes da Mata: - Sr. Presidente: em primeiro lugar devo declarar que uma das cousas que mais dá nas vistas na presente proposta de lei é o estarem os vencimentos dos tesoureiros distribuidos por quatro artigos, o 2.°, o 3.°, o 12.° e o 14.°, quando podiam ser distribuídos em um só artigo ou o máximo dois.

Desde que o vencimento dos tesoureiros convém que seja função da sua responsabilidade e do seu trabalho, era efectivamente, bastante um ou dois artigos e uma tabela em que equitativamente se conseguisse êsse resultado, como, por exemplo, o 2.° e 3.° artigos e a tabela do meu parecer.

Vejamos agora, Sr. Presidente, qual é o movimento das tesourarias dos bairros de Lisboa.

É bastante mencionar a receita ordinária que é, em média, de 954.129 escudos para o 1.° bairro, 1.858.871 escudos no 2.° bairro, 895.558 escudos no 3.° bairro e 669.993 escudos no 4.° bairro.

Nestas condições, é lógico, é justo, é razoável que o tesoureiro do 4.° bairro, que é de todos o menos trabalhoso para o tesoureiro, em virtude das grandes contribuições que por esta tesouraria são processadas, mas que é o que cobra menos receita para o Estado, tenha a mesma gratificação que o tesoureiro do 1.° bairro, que é geralmente habitado por gente modesta e de que faz parte todo o pobre bairro de Alfama?

É, porventura, racional que se estabeleçam iguais vencimentos para êstes dois tesoureiros, como se faz nos referidos artigos da proposta de lei?

Na minha opinião não deve ser assim.

Idêntica desigualdade se nota no artigo 14.° com relação a tesourarias que não contempla, como a de Ponta Delgada, com uma receita média de 304.251 escudos, e a de Braga com 293.509 escudos de receita, e outras, como Coimbra, Funchal, etc.

As tesourarias do Pôrto ficariam recebendo apenas 900 escudos de subsídio, apesar da receita média de qualquer dos bairros desta cidade ser superior à receita do 4.° bairro de Lisboa.

Então é, porventura, justo que se estabeleçam estas diferenças?

Vou tratar agora dos vencimentos de categoria dos diversos tesoureiros.

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No artigo 2.° fixa-se, para os vencimentos de categoria dos tesoureiros dos bairros de Lisboa e Pôrto, 900 escudos.

Vem depois os tesoureiros de 1.ª classe, com 600 escudos de vencimento de categoria, e depois os de 2.ª classe com o vencimento de 480 escudos e os de 3.ª com o vencimento de 360 escudos.

Como o Senado vê, entre êstes vencimentos dos tesoureiros de 1.ª, 2.ª e 3.ª classes há apenas uma diferença de 120 escudos anuais.

Mas pregunto: Qual é a razão em virtude da qual cada um dos tesoureiros de Lisboa e Pôrto recebem 900 escudos?

Trata-se da categoria das cidades?

Nesse caso, parece-me que os vencimentos dos tesoureiros de Lisboa deviam ser superiores aos do Pôrto.

Se se trata de categoria de classes, então deviam ter o mesmo vencimento que é estipulado para os restantes tesoureiros de 1.ª classe.

É por todas estas razões que eu frisei no meu parecer que era menos justo o que se tinha aprovado na Câmara dos Deputados.

Sr. Presidente: numa República Democrática ou num regime de pura democracia, quem mais trabalha e tem maior responsabilidade é que deve ter melhor vencimento, devendo êste ser função do trabalho e responsabilidade.

São êstes os princípios que devem vigorar dentro dum regime verdadeiramente democrático.

Mas há mais.

Como V. Exas. sabem, não convêm que os vencimentos de categoria sejam muito grandes, a fim de evitar o abuso que alguns tesoureiros praticam de entregarem as tesourarias aos propostos e irem passear ou tratar dos seus negócios, ficando a responsabilidades das tesourarias a cargo dos propostos. Por isso no meu parecer apresento, a modificação completa do artigo 2.°

A República tem o dever imprescindível de evitar que continuem a praticar-se actos injustos como até aqui se tem praticado, qual é o de haver tesoureiros de várias localidades, como as referidas, e que recebem, pela proposta de lei, vencimentos muito inferiores e que não estão em proporção com as suas responsabilidades e trabalho.

Não se pode dar a tesoureiros, que tem responsabilidades diferentes e tambêm serviços muitíssimo diferentes, o mesmo vencimento.

Isto chega a ser imoral.

Eis as razões, como disse, que me levaram a apresentar a minha tabela, que tem por base o movimento das repartições.

Segundo a proposta de lei em discussão, o vencimento dos tesoureiros passa a ser função da caução ou fiança dos tesoureiros. É indiferente que o vencimento seja função da caução ou que seja função da receita e trabalho na tesouraria, desde o momento que por sua vez a caução seja função da receita e respectivo trabalho.

Afinal, chega-se à conclusão de que as concessões são e devem ser sempre função das receitas.

Segundo a legislação até hoje adoptada, as cotas eram função das receitas; pela presente proposta de lei, porem, as cotas passam a ser função das cauções.

V. Exas. sabem tambêm que há tesourarias em que o rendimento é pequeno, e, contudo, o trabalho do tesoureiro é grande, emquanto que há outras em que, sendo grande o rendimento, é pequeno o trabalho do tesoureiro.

Por isso, Sr. Presidente, eu entendia que todos êstes inconvenientes se evitavam por meio da seguinte tabela:

Leu.

Por esta tabela evitam-se as desigualdades, anomalias e absurdos que se dão com a proposta de lei em discussão, como passo a demonstrar.

Um tesoureiro que tem em caução 7.000 escudos, receberá pela proposta de lei a importância anual de 420 escudos, emquanto o que tiver 8.000 escudos receberá apenas 400 escudos.

Mas há mais: O tesoureiro que tiver de caução 9.000 escudos, receberá a importância anual de 450 escudos, o que tiver 10.000 escudos de caução, receberá apenas 300 escudos.

V. Exas. acham realmente digno que duma assembleia de homens que pensam, que raciocinam, que sabem fazer cálculos, saia um documento desta natureza?

Eu, por mim, considero inaceitável êste artigo tal como está, pois não se deve de forma alguma talhar gratificações a dedo, dando em resultado que os indivíduos que mais trabalham, recebem menos do que os

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que trabalham menos e tem menos responsabilidades.

O que é justo, o que é racional, é que quem mais trabalha, mais ganhe, como se conseguiria com as propostas que fazem parte do meu parecer.

O Sr. José Maria Pereira: - É êsse o ponto fraco do projecto!

O Orador: - Tem muitos, não é só êste e eu já vou prová-lo a V. Exa.

Nós podemos, pois, dispor do que é do Estado, assim, desta maneira?

Não, Sr. Presidente.

O que é meu, posso distribui-lo como entender, o que é do Estado, não.

O artigo 14.° é, no meu entender, um artigo de excepção, por isso que estabelece uma profunda desigualdade entre os tesoureiros de Lisboa e do Pôrto e os restantes tesoureiros de todo o país.

Por êste artigo, os tesoureiros do 1.° 3.° e 4.º bairros de Lisboa ficam a receber, alêm dos vencimentos dos artigos 2.°, 3.° e 12.°, mais 1.800 escudos cada um, e os do Pôrto 900 escudos cada um, ou seja metade. Para os restantes tesoureiros do pais não dá êste artigo: são enteados.

Por exemplo: aqui temos a Tesouraria do 4.° bairro de Lisboa, cuja receita média é de 669.663 escudos.

Êste bairro é de gente rica, é de contribuintes ricos; pois é exactamente a êsse tesoureiro que se vai dar a verba importante de três mil quatrocentos e cincoenta escudos por ano.

Isto é uma injustiça, se atendermos ao pequeno vencimento dos tesoureiros doutras Tesourarias de 1.ª e de 2.ª classe, com importante movimento, trabalho e receita.

É para remediar estas injustiças que eu fiz a minha proposta e calculei a tabela junta, que fazem justiça a todos os tesoureiros, sem agravar as despesas do Estado, como passo a mostrar:

Pela minha proposta e tabela, os tesoureiros do 1.°, 2.°, 3.° e 4.° bairro de Lisboa deviam ter respectivamente 2.700, 3.700, 2.600 e 2.200 escudos; os do Pôrto, 2.400 e 2.450 escudos; o de Ponta Delgada, 1.700 escudos; o de Braga, 1.600 escudos; o de Figueira da Foz, 1.300 escudos, etc., etc.

Comparem agora com o que está na proposta de lei em discussão e vejam se são aceitáveis as anomalias e injustiças a que dá logar.

Em Braga a receita média nos três últimos anos foi de 293.509 escudos.

O vencimento que terá o tesoureiro será de 1.320 escudos.

Emquanto para o tesoureiro do 4.° bairro dá-se a grossa maquia de 3.450 escudos.

Na Figueira da Foz a receita da tesouraria foi de 140.445 escudos.

O vencimento do tesoureiro virá a ser pela proposta de lei de 1.080 escudos apenas.

Vamos a ver em Ponta Delgada. A receita da Tesouraria foi de 304.251 escudos.

Pois pela proposta ds lei compete ao tesoureiro aproximadamente apenas a importância de 1:380$000 réis para êle pelo seu serviço, para pagar ao proposto e mais pessoal que tem forçosamente de ter ao serviço da Tesouraria.

Há porventura razão de qualquer ordem que justifique o dar-se ao tesoureiro do 4.° bairro 3 contos quatrocentos e cincoenta mil réis e ao de Ponta Delgada, Braga, Coimbra, Évora, Viseu, Funchal e outros apenas 1 conto de réis ou 1 conto de réis e mais alguma cousa, conforme a caução?

Não pode nem deve ser votada uma lei em tais condições. Por tal modo me convenci de que o Senado não podia votar uma tal lei que me dei ao trabalho de calcular os vencimentos dos 295 tesoureiros do país, partindo da hipótese de que o número de conhecimentos era 5 por cento do número de escudos da receita e tambêm os calculei supondo que o número dos conhecimentos era de 10 por cento.

Nós devemos premiar o trabalho e não castigar o trabalho. Por isso, em caso algum podemos aprovar á proposta de lei conforme veio da outra casa do Congresso.

Eu tenho a minha responsabilidade salvaguardada. Ao elaborar o meu trabalho, procurei basear-me no critério de não talhar gratificações a dedo, atendendo ás diferenças de trabalho dos tesoureiros de finanças nos diversos concelhos e até nos bairros de Lisboa e Pôrto.

A tabela que eu apresento parece-me tambêm racional e justa ainda sob o ponto

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de vista da determinação do valor das cauções ou fianças dos tesoureiros, as quais se obtêm facilmente por meio dos vencimentos ou antes cotas dos tesoureiros, por exemplo, multiplicando-os por 10.

Um tesoureiro ganha 1:000 escudos, em virtude do movimento da tesouraria, dá 10:000 escudos como caução. Ganha 2:000 escudos, dá 20:000, e assim sucessivamente. Os tesoureiros são, pois, obrigados a dar como caução uma importância igual a dez vezes a importância da soma das cotas que corresponderem aos n.ºs 1.° e 3.° do artigo 3.°

O Sr. Presidente: - Já deu a hora de se passar à ordem do dia.

Se o Sr. Nunes da Mata deseja, pode ficar com a palavra reservada para a próxima sessão.

O Sr. Nunes da Mata: - Se V. Exa. mo permite, ficarei, então, com a palavra reservada para a sessão seguinte.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Continua em discussão o artigo 2.° do projecto que cria o Ministério de Instrução.

Tem a palavra o Sr. Fortunato da Fonseca.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - Sr. Presidente: o Sr. Senador Miranda do Vale propôs na última sessão que fôsse incluído no projecto que está em discussão um artigo referente ao Conselho Superior de Instrução Pública. Folgo bastante com êsse facto, contudo parece-me que, em virtude de se criar êsse conselho, a parte geral dêste projecto tem de sofrer umas certas modificações.

Desde que criamos o conselho superior de instrução pública, a parte pedagógica que própriamente respeita às diversas escolas compete ao conselho escolar; a outra parte - direcção do ensino, revisão dos programas, etc. - pertence ao Conselho Superior de Instrução Pública.

Nestas condições, as diversas repartições ficam apenas com um carácter burocrático, não se compreendendo, pois, que para chefes dessas repartições seja necessário nomear indivíduos em condições técnicas.

Sr. Presidente: é lamentável que a burocracia invada as atribuições do professorado, mas tambêm lamentável é que aqueles que se habilitaram para professores vão invadir atribuições alheias à sua especialidade.

Ainda há outro ponto que quero frisar.

Quando se diz "repartição técnica" parece-me ter-se em vista a instrução técnica scientífica em separado da instrução artística.

O facto é que a instrução técnica tanto pode ser scientífica como artística; e a artística divide-se em duas partes: a arte em geral, e a arte aplicada. Alêm disso, julgo que hoje em todas as indústrias scientíficas há, mais ou menos, a inclusão de sentimento estético: os produtos são feitos por forma a agradarem ao público.

A parte pedagógica parece estar ligada ao Conselho Superior de Instrucção Pública, sobretudo a escolar.

Não vejo como é que se possam separar as duas repartições de instrução técnica e instrução artística.

A repartição de instrução técnica e artística devia ter uma direcção geral, ou haver uma repartição como duas secções.

A parte pedagógica tem hoje dois elementos: não se sabe bem se êsses elementos deverão ser dirigidos pela repartição técnica ou artística.

Tenho dito.

O Sr. Sousa da Câmara: - Podia dispensar-me de falar, (Não apoiados) visto que o que tencionava dizer acabou de ser dito pelo ilustre Senador Fortunato da Fonseca.

Efectivamente neste projecto há como que uma novidade: a transformação destas diferentes repartições, transformação burocrática e técnica; e assim supunha eu que teriam principalmente de tratar das questões técnicas.

Mas há a proposta do Sr. Miranda do Vale para um Conselho Superior de Instrução Pública.

Fica-se sem se perceber o que sejam estas repartições.

São, como disse o Sr. Fortunato da Fonseca, puramente administrativas.

E então vamos, apezar de estarmos quási sempre com a fobia burocrática, aumentar o número de funcionários com professores; e êste aumento tem a agra-

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vante, é que quando os funcionários começam a estar aptos para desempenhar as suas funções, vão-se embora, porque a comissão e de cinco anos. Assim vamos aumentando êste vício, chamemos-lhes assim, indefinidamente estendendo-a a todo o professorado.

Ouso dizer que me parece uma descentralização máxima e apesar de tudo isto S. Exa. que foi o relator dêste projecto, arranjou, segundo a minha maneira de ver uma orientação absoluta para todo êste serviço de repartição, em vez de ficarem como estavam diversas direcções gerais, S. Exa. estabeleceu numa só repartição, num só funcionário todos êsses serviços.

Neste artigo 2.° há duas cousas com que eu cão posso concordar; concordo com a emenda apresentada pelo Sr. Ministro do Interior, mas não posso concordar com a emenda do Sr. Miranda do Vale que vai alterar toda a índole dêste projecto, e alêm disso tratando do detalhe da secretaria e das repartições, nada tem que ver com o Conselho Superior de Instrução; a matéria dêste conselho pode-se tratar num artigo especial que não tem aqui cabimento algum.

Eu pedi a palavra para explicar o meu voto; voto o artigo 2.° com a emenda do Sr. Ministro do Interior, que me parece necessária, tanto mais que desaparece uma repartição, que aqui citava, que deixa de ser criada, passando a haver uma delegação do Ministério do Fomento da forma que deminui uma repartição.

Há, porêm, uma parte que eu não compreendo, aguardo as explicações do ilustre relator do projecto, porque não compreendo bem esta entidade de secretário geral.

Eu creio que o expediente, tudo que está no artigo 3.° pode ser feito pelo chefe de repartição; assim não e preciso esta entidade com funções de sub-secretário de Estado; parece-me que nesta repartição devia estar um corpo único que seria o Ministro e nada mais.

Tenho dito.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: - Pedi a palavra para me referir ao artigo 2.° com respeito à Repartição de Higiene Escolar.

S. Exa. sabe que havia junto do Ministério de Instrução uma repartição de construções escolares. Em 1907, João Franco encontrou ali qualquer irregularidade, e se havia de chamar à responsabilidade os funcionários entendeu que devia acabar com essa repartição, o que se efectivou em 1909.

É indispensável que junto do Ministério de Instrução haja uma repartição de construções escolares. Concordo mais com a proposta do Sr. Ministro do Interior de que seja uma delegação, para que não aconteça o que está sucedendo, uma grande demora em qualquer obra por mais pequena que seja, e que se, evitem as peias autocráticas agora existentes para a mais pequena reparação.

Há alguns meses sucedeu o seguinte, e eu lembro-me porque estava nessa ocasião numa dessas repartições e ouvi dizer ao chefe dessa repartição que tinha vindo ali uma requisição há muito tempo para reparações numa escola do concelho de S. Pedro do Sul, mas que agora já não era precisa, porque já tinha caído a casa.

Ora, isto é que é presiso que não continue, para que estas obras se façam imediatamente e se evitem êstes grandes inconvenientes.

O Sr. Miranda do Vale: - Sr. Presidente: ás considerações apresentadas, vou responder em algumas palavras, explicando a minha orientação na emenda que mandei para a mesa.

Deixe-me V. Exa. dizer que eu tenho a maior consideração pela burocracia do meu país (Apoiados), sempre tenho afirmado a muita consideração que por ela tenho. O único defeito que encontro na burocracia portuguesa é ser muito numerosa, do que resulta uma grande despesa para o país, apesar de ser mal remunerada.

Estamos num beco sem saída.

De forma nenhuma da minha parte há fobia pela burocracia.

O Sr. Sousa da Câmara tambêm me acusou de centralizar, sendo eu contrário a isso.

Êstes serviços de instrução estão centralizados no país, e, infelizmente, hão-de estar por muito tempo.

Não vejo meio da iniciativa particular tomar conta disso; não creio que possamos por emquanto entregar os serviços de instrução pública à iniciativa particular, o que eu desejava muito que se pudesse fazer. Eu desejava que as escolas superiores fôssem institutos particulares.

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O funcionamento desta repartição é autónomo.

O secretário é de livre escolha do Govêrno. É apenas um desdobramento dêsse funcionário. É para o Ministro ter a seu lado um indivíduo da sua completa, absoluta e inteira confiança a auxiliá-lo. Êste indivíduo vem fazer as vezes de director geral, que aqui passa a ser chefe de repartição.

Parece-me que daqui resulta economia.

A função do secretário é a dum homem que auxilia o Ministro.

O secretário faz as vezes de director geral. O Ministro serve para a orientação superior, para os serviços do Parlamento, e responde perante a representação nacional pelos serviços da instrução.

Nas questões meramente burocráticas, o indivíduo, o funcionário da confiança do Ministro, logo que êste abandona o poder, tem que tambêm dar por finda a sua missão.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - É isso um êrro.

O Orador: - É êste o meu modo de ver.

Creio ter respondido às observações produzidas pelo Sr. Sousa da Câmara.

Referiu-se depois o Sr. Fortunato da Fonseca às funções especiais dos chefes de repartição.

São, sim, funcionários públicos, não há dúvida alguma, mas funcionários meramente administrativos.

E agora vou eu explicar as razoes em virtude das quais a comissão entendeu que êstes lugares deviam ser ocupados por professores e não por burocratas de carreira, mas peço aos Srs. Senadores que me não acusem novamente de fobia burocrática.

A verdade é que, devido ao mau recrutamento do nosso funcionalismo, tem acontecido atingirem lugares de elevada graduação burocrática indivíduos de menor competência.

Isto é um facto, e eu conheço muitos.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - E não se evitam.

O Orador: - Pois a mim quere me parecer que, por êste projecto, se evitarão êsses inconvenientes.

É frequente, entre nós, ver indivíduos de fracas habilitações, como antigos sargentos do exército, alcançarem lugares de primeiros oficiais.

Isto é frequentíssimo em todos os distritos da administração pública.

Na Câmara Municipal de Lisboa conheço eu um funcionário, com a graduação de primeiro oficial, que executa ainda os serviços que executava quando para lá entrou.

Vence como primeiro oficial, visto que alcançou essa graduação, mas não dispõe de faculdades para o desempenho das funções que a essa hierarquia competem.

Isto que acontece na Câmara Municipal, dá-se com outros ramos de serviço público.

Segundo uma informação muito próxima, eu sei que êste facto da Câmara Municipal não é isolado, e que muitos há de igual natureza.

Ora o Senado deve compreender perfeitamente que não pode o Ministro da Instrução estar subordinado à contingência de nomear para chefe duma das suas repartições um indivíduo qualquer nestas circunstâncias.

A comissão entendeu, sobretudo nesta fase de início, que se deviam colocar nas repartições dependentes do Ministério da Instrução indivíduos duma competência segura, duma indiscutível e reconhecida capacidade, para o bom e regular desempenho das funções que tem de ser-lhes cometidas.

Interrupção do Sr. Feio Terenas que se não ouviu.

O Orador: - V. Exa. quere o concurso? Mas os concursos não oferecem nenhumas garantias.

Os concursos tem sido uma fonte de arbitrariedades.

Nos próprios concursos para o professorado nós temos visto cousas estupendas.

Nos próprios países mais adiantados os concursos estão desacreditados.

O concurso não me dá absolutamente nenhuns elementos de garantia.

V. Exa. sabe muito bem.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - E desta forma acontece o mesmo.

O Orador: - Aqui o caso é outro.

Eu não posso fazer mais do que expor

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as razões que determinaram a comissão a fazer isso.

Há, no Senado, Senadores que não concordam, mas isso depois na votação se decidirá.

Os professores conhecem bem a legislação vigente, a legislação passada e até conhecem a legislação futura. Estão em condições de administrar.

Esta questão de administração é urna qualidade própria do indivíduo; há administradores, e infelizmente, o nosso país foi bem infeliz nisso, que não sabem administrar; há outros que, tendo excelentes faculdades para administrar, nunca se evidenciaram.

De entre os professores há muitos que podem ter condições para chefe de repartição.

É preciso acabar com isto de amanuenses, sem habilitação para tal, ascenderem a altos cargos.

No momento presente não temos pessoal para iniciar êsses trabalhos.

O Sr. Brandão de Vasconcelos não concorda com a emenda do Sr. Ministro; e citou a morosidade para a execução duma obra numa escola. Isso é tudo questão de orientação.

Na minha escola, que tem hoje organização autónoma, para fazer-se uma excursão tem que se rubricar uma grande quantidade de papel.

Isto mostra o defeito da organização da burocra2Ía e a necessidade de inventar papelada para lhe dar que fazer.

É um mau regime que herdamos da monarquia e que os ministros da República ainda não tiveram fôrça ou tempo para remediar.

Não concordo com a substituição do concelho de higiene pelo de instrução pública.

Não concordo absolutamente nada com isso, mas não tem maior importância que a existência do conselho seja mencionada no artigo 2.° ou num artigo especial.

É uma questão secundária.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a mesa um aditamento à proposta que apresentei.

É relativo à comissão médica. Eu proponho o seguinte:

Leu.

Parece-me, pois, que se podia dar esta função à junta médica; será talvez exigir muito a poucos funcionários, mas parece-me melhor aumentá-los depois, se for necessário, do que estar a nomear muito pessoal sem se saber o que se lhe há-de dar que fazer.

A proposta que mando para a mesa resume-se em dar atribuições a essa comissão.

Como V. Exa. vê, existem duas escolas de instrução física, mas não existe critério algum para a nomeação dêsses professores de educação, de maneira que é absolutamente necessário um critério para orientar o Ministro.

Estas escolas não podiam ter execução; estavam inscritas no orçamento, mas foram cortadas da actual tabela.

É evidente que é necessário criar a educação física. Há uma sociedade que tem tomado a peito êsse importante problema; foi ela que propôs fazer uma escola para e qual Estado concorreria apenas dando a sede.

É para preencher esta lacuna que existe no projecto que eu apresentei a minha proposta.

Estando no uso da palavra, aproveito a ocasião de explicar qual a razão por que proponho uma delegação do Ministério do Fomento.

Em primeiro lugar, não parecia razoável que, estando nós a querer coordenar serviços e valorizá-los, criando um Ministério de Instrução, se fôsse entregar-lhe serviços que são própriamente de construção, de modus faciendi.

Evidentemente ao Ministério de Instrução pertence o dirigir, dar indicações, pugnar pelas condições escolares, material e mobiliário, mas o que diz respeito à execução das construções, empreitadas, deve pertencer ao Ministério do Fomento.

Criando-se esta delegação do Ministério da Instrução, havia de suceder o que sucede hoje com a contabilidade, se saísse do Ministério das Finanças, onde os embaraços já são grandes; e se êsses embaraços existem, é devido a não estarem centralizados naquele Ministério todos êsses serviços, e tanto assim que nas duas casas do Parlamento tem sido chamada a atenção do Govêrno para os atrazos de pagamentos, o que é devido à má qualidade do pessoal, porque o próprio chefe da repar-

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tição é o primeiro a dar nota das faltas dos empregados, o que demonstra que o atrazo de pagamento resulta mais da falta de cumprimento dos deveres dos funcionários daquela repartição, que da organização burocrática do serviço.

Aqueles empregados tem permissão de dar quatro faltas sem serem justificadas e quantas queiram, sendo justificadas; de maneira que há empregados que estão constantemente a faltar, o que prejudica o serviço.

De forma que, com a delegação que procuro estabelecer, que me foi suscitada a propósito dos casos que o Sr. Brandão de Vasconcelos apontou, se obviará a êsses casos vergonhosos a que S. Exa. aludiu e creio que isto se fará com economia, tanto que esta delegação não traz aumento algum de despesa; é só desviar para lá o pessoal que está trabalhando no Ministério do Fomento.

Foi êste o intuito que me orientou na proposta que mandei para a mesa.

S. Exa. não reviu.

Leu-se na mesa a proposta e foi admitida.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - É para responder a uma parte do discurso do Sr. Miranda do Vale.

Várias vezes S. Exa. se tem manifestado nesta casa sôbre o facto da burocracia se intrometer em assuntos que não são da sua competência, que às vezes se perdem certas iniciativas por entrarem dentro do domínio burocrático.

É claro que uma cousa é a função burocrática, outra cousa é a função técnica, quer seja artística, quer seja scientífica.

Se nós tirarmos todos os assuntos pedagógicos das diversas repartições, claro é tambêm que elas ficarão nitidamente burocráticas.

É preciso saber-se bem se efectivamente os empregados devem ser indivíduos técnicos, porque há casos em que talvez o não possam ser.

Exemplo: suponhamos que para a direcção duma repartição artística é nomeado um pintor de história.

Que competência tem um pintor de história, que unicamente é um artista, para dirigir uma repartição de carácter burocrático?

Como é que se compreende que um artista, naturalmente emotivo, tenha aquela serenidade e reflexão tam característica do bom chefe de repartição, a paciência necessária para o estudo das leis, direcção do pessoal, conhecimento prático do expediente da secretaria, etc.?

O Sr. Miranda do Vale: - Em primeiro lugar, direi a V. Exa. que não é isso que está em discussão.

O Orador: - Mas foi isto o que V. Exa. discutiu; logo tenho o direito de lhe responder.

V. Exa. colocou a questão neste ponto, não pode agora invocar motivos diversos para impedir a minha resposta.

Eu estou no meu direito de refutar o que V. Exa. disse; se eu não estou dentro da Bordem, tambêm V. Exa. não estava.

É preciso não adoptarmos o costume de se ir buscar rodeios para fugir ao assunto que se discute.

O Sr. Miranda do Vale: - Não foi minha intenção fazer rodeios, eu apenas respondi a V. Exa.

Quem levantou a questão foi V. Exa.

Quem determina êsse serviço é o Ministro.

O Orador: - Então o Ministro é que dirige a repartição?

O Sr. Miranda do Vale: - V. Exa. não leu o projecto.

Leu.

O Orador: - V. Exa. quere que o Ministro esteja sempre a fazer excepções.

Estabelece-se diálogo entre o orador e o Sr. Miranda do Vale.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - Se eu me referi a êsse ponto, foi porque V. Exa. falou nele. Em virtude disso tudo é que eu não podia deixar de me referir aos chefes técnicos, quando se tratava duma nova modificação das repartições.

É claro que eu não podia furtar-me a notar uma modificação que se tinha dado no intuito geral do projecto.

O Sr. Miranda do Vale: - Continuo a não compreender, certamente por deficiência da minha inteligência, a argumentação do Sr. Fortunato da Fonseca.

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S. Exa. quere considerar como questão genérica o facto de eu vir propor para se incluir na criação do novo Ministério o Conselho de Instrução Pública.

Não me parece que possa ser assim, porque o facto de eu apresentar esta emenda, ampliando o Conselho de Instrução Pública, não é afinal uma criação.

O Conselho de Instrução Pública existe e continuará a existir, embora não fôsse criado por êste projecto de lei.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - Mas não se diz aqui que será revogada a legislação em contrário.

O Orador: - Mas não há nada que revogue a existência do Conselho Superior de instrução Pública.

Interrupção do Sr. Fortunato da Fonseca, que se não ouviu.

V. Exa. compreende, estando a interromper-me constantemente, não há meio de eu ligar a minha argumentação.

O Conselho de Instrução Pública existe e continuará a existir, simplesmente, depois de aprovado o artigo 1.°, havia que modificar-se a constituição dêsse conselho.

Foi isto que se fez.

Quer dizer o conselho que até aqui era simplesmente consultado sôbre questões de instrução primária e secundária, passará agora a consultar-se tambêm sôbre questões agrícolas e artísticas.

Não havia facto nenhum novo que autorizasse a trazer-se para a tela da discussão o artigo 5.°, por consequência não acrescentarei nada mais à minha argumentação, tanto mais que o Sr. Fortunato da Fonseca se não convenceu; mas se S. Exa. recolhendo ou adoptando as palavras que eu proferi, chegados que fomos à altura do artigo 5.°, não estiver convencido, farei a deligência por convencê-lo.

A função desta repartição foi sempre burocrática, foi sempre administrativa; por consequência o argumento de S. Exa. não colhe.

Podem encontrar-se indivíduos com competência administrativa para êsses lugares; não os encontrando nas outras repartições, vão-se buscar fora.

Um ponto que o Sr. Fortunato da Fonseca tocou foi êste.

Disse S. Exa. que fazendo-se esta distinção das repartições técnicas e artísticas, aconteceria que umas determinadas escolas, em que o ensino é ao mesmo tempo técnico e artístico, ficariam mal colocadas, e por consequência reconhecia a necessidade destas duas repartições de ensino ficarem subordinadas á mesma repartição.

V. Exa. faz uma proposta nesse sentido e se o Senado lha admitir é menos uma repartição.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - Não é menos uma, entendo que devem existir as duas.

O Orador: - Disso é que eu não vejo necessidade.

Se V. Exa. quere duas repartições, é porque reconhece a necessidade de se dirigir êsse ramo de serviço público de certa forma, aliás não há necessidade de criar duas repartições.

O elemento para reùnir essas duas repartições é o Ministro.

Os chefes prestam as suas informações ao Director Geral e êste por sua vez presta-as ao Ministro, e em um Ministério desta natureza não há necessidade de mais complicações de serviço.

Cada chefe de repartição se entende directamente com o Ministro, e a êste chefe de repartição incumbe as funções de director geral.

O chefe de repartição tem precisamente as fundões de director geral, e entende-se directamente com o Ministro.

O Ministro dirige superiormente os serviços, os chefes das repartições executam êsses serviços.

Desta maneira, acaba-se com um estado maior burocrático, que não se compadece com as circunstâncias do nosso Tesouro e que não está em harmonia com as acanhadas necessidades do nosso orçamento.

É preciso que terminem umas certas formalidades que só vem entravar e dificultar a execução dos diversos serviços públicos.

São êstes simplesmente os meus desejos.

V. Exa. entende que o ensino artístico e técnico são inseparáveis.

Apresente S. Exa. uma proposta nesse sentido e o Senado a apreciará.

O Sr. Fortunato da Fonseca: - Eu entendo que deve existir um traço de união

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entre o ensino artístico e o ensino técnico e que êsses serviços tem de ser subordina dos a uma direcção geral.

O que eu desejo é que haja uma repartição que tenha a seu cargo essas duas funções.

O Orador: - O Senado pode entender que é aceitável a idea do Sr. Fortunato da Fonseca; mas a mim afigura-se-me que não.

Efectivamente a arte pode dizer-se que domina hoje todos os serviços.

A arte, é actualmente por tal forma estensa, que pode abranger todos os ramos de trabalho.

A própria cirurgia não dispensa hoje o seu fundo de arte.

Há efectivamente cirurgiões que ilaqueiam uma veia ou procedem a uma outra qualquer operação, com um requinte artístico que outros não possuem.

Duas operações podem conduzir ao mesmo resultado; mas a verdade é que a uma presidiu um certo gosto artístico que à outra faltou.

Pode dizer-se, repito, que a arte tem actualmente muito valor e domina, tem influência em todos os ramos do ensino.

Mas, há ainda as escolas de Belas Artes, onde se ensinam, por exemplo, a escultura, a pintura e a declamação e então todos êsses ramos devem fazer parte da repartição do ensino artístico.

Por consequência, quere-me parecer que sem prejudicar muito, se poderia fazer a divisão, notando-se que o director da repartição do ensino técnico fôsse tambêm um pouco artista.

O Ministro escolheria o funcionário.

Não vejo que haja razão para as dúvidas do Sr. Fortunato da Fonseca. Uma direcção geral de ensino técnico e artístico com uma repartição de ensino técnico e artístico. Não podemos francamente estar a fragmentar uma determinada escola.

Cada escola deve ser colocada sob o ponto de vista administrativo numa qualquer repartição. Não vejo necessidade alguma de estar a fazer essa divisão por demais subtil.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Ladislau Piçarra: - Sr. Presidente: já disse aqui e repito que se há problema sôbre o qual deve incidir toda a atenção do Senado, é precisamente o problema da criação do Ministério de Instrução Pública.

Temos aqui ponderado mais duma vez, que a regeneração nacional depende essencialmente da educação da sociedade portuguesa, a educação do povo português está intimamente ligada à criação dêste Ministério.

Não é possível uma boa educação do povo sem uma boa organização do ensino; e esta organização não é possível sem uma boa organização ministerial.

Ora sem querer fazer larga divagação sôbre a criação do Ministério de Instrução, quero apresentar ao Senado algumas observações, que poderão suscitar uma certa discussão.

Não nos devemos, por forma alguma, precipitar na votação dêste projecto. É necessário que se faça toda a luz sôbre êste problema, para que ninguêm nos possa acusar de termos criado um Ministério que não dará na prática os resultados que todos nós desejamos.

É necessário que saia do Senado uma organização ministerial o mais razoável possível, para que desta saia uma reorganização do ensino, a mais perfeita possível.

Vou apresentar ligeiras considerações e ouvir a opinião douta dos meus colegas e do Sr. Ministro do Interior, que faz a honra de nos escutar.

O artigo 2.° do projecto da comissão do Senado inclui 8 repartições.

Peço licença para, ligeiramente; apreciar essas repartições.

Nota-se primeiro a secretaria geral.

O Sr. Fortunato da Fonseca discorda da opinião da comissão do Senado. É de opinião que o secretário geral do Ministério não deve mudar com os respectivos Ministros.

S. Exa. entende que o lugar de secretário geral do Ministério de Instrução deve ter carácter permanente, para assim dar continuidade aos serviços das repartições de ensino.

Ora esta divergência provêm talvez dum mal entendido entre S. Exa. e ilustre Senador o Sr. Miranda do Vale, que defendendo o parecer da comissão de instrução do Senado, insiste em que êste secretário geral varie com os Ministros, porque entende que o Ministro não pode, por si só,

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estar a informar-se minuciosamente de todos os serviços das repartições de instrução, tem de ter uma pessoa competente e da sua absoluta confiança que o informe minuciosamente dos serviços que correm pelo seu Ministério, para o Ministro poder intervir conscienciosamente nas repartições sob sua direcção.

Porque, Sr. Presidente, o que nós devemos pretender não é colocarmos neste Ministério um Ministro que seja uma simples figura decorativa; e que, por assim dizer, assine de cruz todos os documentos que lhe apresente o secretário, deve pessoalmente instruir-se dos actos das repartições; mas, para que êle conscienciosamente possa instruir se dêsses actos, necessita de ter uma pessoa habilitada e de sua confiança plena que o informe particularmente dos serviços para que o Ministro possa exercer uma acção verdadeiramente pessoal nas repartições.

Com certeza que é por esta razão que a comissão do Senado substituiu os chefes de repartição por directores gerais, é para assim fazer intervir directamente o Ministro nos actos das repartições de instrução, porque antigamente os Ministros, por assim dizer, alheiados dos serviços das repartições e substituídos pelos directores gerais, era sôbre êstes que incidiam todas as responsabilidades dos actos que corriam pelas repartições de ensino, e o Ministre, como tinha a seu cargo muitas atribuições, sobretudo no Ministério do Interior, é claro que dizia sempre: eu preguntarei ao meu director geral, isto é, desaparecia constantemente a figura do Ministro para aparecer a do director geral.

O que pretende a comissão do Senado?

É fazer desaparecer os directores gerais para aparecer o Ministro, e são os chefes de repartição que terão carácter permanente. Dirigem todos os serviços das repartições e o Ministro fiscaliza êsses serviços por intermédio do seu secretário geral.

Suponho que é êste o critério que presidiu ao trabalho que estamos discutindo; portanto acho bem que o lugar de secretário geral seja pessoa competente e de absoluta confiança do Ministro e para que o Ministro exerça uma acção pessoal nos serviços a seu cargo.

O secretário geral não quere dizer mais nada, e assim parece-me que se explica a divergência que existe entre os Srs. Miranda do Vale e Faustino da Fonseca.

Em seguida fala-se numa repartição de ensino primário normal e, na realidade, o serviço é tam importante que merece bem uma repartição.

Depois trata-se duma repartição de instrução secundária, depois duma repartição referente a assuntos universitários e, finalmente, uma repartição técnica.

Agora chegamos a um ponto sôbre o qual tem havido larga discussão e sôbre êle quero dizer alguma cousa.

Diz-se aqui que haverá uma repartição técnica.

Em primeiro lugar é preciso saber o que é que se entende por instrução técnica?

Se, sob esta designação, deve entender-se a instrução do ensino industrial, há então aqui uma lacuna, porque não vejo nada que se refira ao, ensino comercial, e toda a gente sabe que o desenvolvimento duma nação depende essencialmente da agricultura, do comércio e da indústria.

As grandes fontes de riqueza são, como se sabe, constituídas pelo comércio, pela indústria e pela agricultura; esta é a verdade, e se nós vamos acudir à indústria com uma repartição técnica, não podemos esquecer o comércio, como não se esqueceu a agricultura.

O meu maior desejo é contribuir para a boa orientação dêste assunto, por isso desejava ouvir a opinião da comissão que redigiu êste parecer.

Diz o Sr. Miranda do Vale, como relator, que considera englobado no ensino técnico o ensino comercial.

Nós sabemos que, em geral, no ensino técnico se compreende só o ensino industrial.

Permitam-me que diga que todas estas emendas devem ir à comissão e depois voltarem novamente à tela da discussão.

No desejo de contribuir com o meu insignificante pecúlio para o assunto em discussão, prosseguirei nas minhas modestas considerações.

Talvez se pudesse dizer, em vez de repartição de instrução técnica, repartição de ensino profissional ou repartição de ensino industrial e comercial.

A comissão resolverá qual a designação que devemos adoptar.

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O Sr. Miranda do Vale: - Opino desde já pela designação de repartição de ensino industrial e comercial.

O Orador: - Muito bem. Assim fica esclarecido o problema; nós no Senado teremos assim adoptado a divisão scientífica do ensino em agrícola, comercial e industrial.

Depois segue-se a repartição de instrução agrícola, que se divide como a outra, em elementar, média e superior.

Sei que na Câmara dos Deputados êste problema foi debatido e tenho o prazer de ver nesta Câmara um distinto Deputado que tomou parte nessa discussão.

Sei que êsse Deputado propôs que o ensino elementar agrícola e médio ficasse ligado ao Ministério do Fomento.

O Sr. Miranda do Vale: - Tambêm no Senado houve quem manifestasse essa opinião: foi o Sr. Cristóvão Moniz.

O Orador: - Exactamente: essa opinião foi apresentada pela voz autorizada do Sr. Cristóvão Moniz.

Nós temos que estudar êsse problema no Senado: se as escolas agrícolas, industriais e comerciais devem passar todas para o Ministério respectivo, se apenas algumas, ou nenhumas.

É um problema que devemos ponderar.

Agora chegamos a outro ponto: a repartição de instrução artística.

É um ponto com que eu não quero fatigar a atenção do Senado, mas sôbre o qual tenho que fazer ligeiras considerações.

Não há dúvida que o ensino artístico ocupa, cada vez mais um logar mais importante nos países cultos, anda intimamente ligado às questões de ordem prática, não só sob o ponto de vista industrial, como moral.

Toda a gente sabe que a educação artística é um elemento de primeira ordem para o aperfeiçoamento de carácter, porque é da educação artística que resulta o aperfeiçoamento dos sentimentos, da nossa sensibilidade moral.

Bastava esta circunstância para devermos ligar uma grande importância à cultura estética ou artística.

Mas há mais:

Hoje a cultura artística está invadindo cada vez mais o campo industrial, comercial e agrícola, porque todos desejam tornar cada vez mais artísticos os seus produtos, quer pelo aspecto, quer ainda pelo reclame.

Todos sabem que, hoje, tem na propaganda da indústria, do comércio e da agricultura, um largo quinhão o reclame artístico; por conseguinte a cultura artística está ligada á cultura das artes produtivas, não só pelo lado moral, mas ainda pelo lado prático, visto que serve para difundir os produtos da agricultura e da indústria, e por consequência para assegurar o domínio do comércio dêsses produtos.

A questão é esta: devem aceitar-se as repartições do ensino técnico e artístico.

Disse o Sr. Fortunato da Fonseca que deveria haver um traço a ligar estas duas repartições.

S. Exa. desejaria até que se criasse uma direcção geral, para ligar estas duas repartições.

Ora, Sr. Presidente, aqui partilho da opinião do Sr. Miranda do Vale, por mais duma vez, já tenho dito que o grande mal das sociedades, sobretudo dos latinos, é o excesso da burocracia, do funcionalismo.

Um dos grandes cancros que roeu as sociedades foi a burocracia.

O Sr. Miranda do Vale: - Só das sociedades latinas ou de mais algumas?

O Orador: - Ora a tendência moderna é exactamente para aliviar os encargos da massa geral dos contribuintes, e ainda para que as grandes despesas que se fazem na sustentação dêstes cancros possa reverter a favor da educação, e do desenvolvimento do comércio, da agricultura e da indústria.

Ora, desde que se está fazendo larga propaganda a favor do militarismo, entendo que nós necessitamos de contrapor, a essa propaganda, a propaganda educativa.

Está-se fazendo lá fora uma intensa propaganda anti-militarista, porque não há orçamentos que resistam ao engrandecimento do poder militar, que pretendem os propagandistas da defesa militar.

Interrupção do Sr. Arantes Pedroso.

O Orador: - V. Exa. não pode negar que se está fazendo uma campanha enorme

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contra o chamado imperialismo, isto é um facto que há-de concorrer para o desenvolvimento financeiro, é necessário pôr duma maneira harmónica o desenvolvimento do Ministério da Guerra e da Marinha com os recursos do país.

O Sr. Arantes Pedroso: - A prática está demonstrando que lá fora isso se não faz, e que todas as nações se estão armando cada vez mais.

O Orador: - Mas V. Exa. vê que em todas as nações há uma crítica acérrima contra êste furor do militarismo, que avassala hoje todos os povos.

Sr. Presidente: deixemos estas divagações, que vieram incidentemente, a propósito das minhas palavras, para justificar a opinião de que podemos dispensar a entidade do director geral da repartição artística, e que nos é suficiente um chefe para cada repartição.

A propósito das lúcidas considerações que fez há pouco o Sr. Ministro do Interior, S. Exa. expôs com muito critério, pondo em relevo a importância da educação física, S. Exa. entende que nós devemos atender a êste serviço tam importante, e lembrou numa proposta, se bem o entendi, que se devia criar junto do Ministério de Instrução uma delegação do Ministério do Fomento, a qual superintenderia nos serviços de higiene escolar, construções, etc.

Sr. Presidente: com respeito à educação física, construções e outros ramos de higiene escolar, entendo que são de tal importância que não devemos descurá-los, mas está-me a parecer que na organização da repartição de higiene escolar está compreendida tambêm a educação física.

V. Exa. sabe muitíssimo bem o vasto campo que nos oferece a higiene escolar.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): - Estou de acôrdo com essa opinião, tanto mais que não traz aumento de despesa.

O Orador: - Folgo com a opinião de V. Exa. Aceitaria somente esta designação: repartição de higiene escolar.

Todos os serviços que digam respeito à higiene escolar, tanto os que se prendem com os edifícios escolares, como propriamente com a inspecção médica escolar dos alunos, da habitação, etc., tudo isso ficaria sob a direcção técnica da repartição de higiene escolar.

É claro que as construções e reparações dos edifícios ficariam a cargo do Ministério do Fomento; mas a repartição de higiene escolar manifestar-se hia sôbre a maneira como deveriam ser construídos e reparados os edifícios.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): - Existe o pessoal, o que não traz aumento de despesa á criação duma repartição de higiene escolar e educação física.

O Orador: - Hoje a higiene escolar tem um campo tam vasto que fica compreendida nela a educação física.

Vou terminar mas não sem felicitar o Sr. Ministro do Interior pela sua lembrança de apelar para a iniciativa da Sociedade Promotora da Educação Física em Portugal, para a fundação duma escola de preparação do pessoal que ministra essa educação nos diferentes estabelecimentos de ensino.

Sou de opinião que efectivamente a escola de educação física deve ser da iniciativa particular de tal Sociedade.

O Estado deverá subsidiar tal iniciativa quando essa Sociedade nos apresente um estabelecimento digno de protecção.

O Sr. Miranda do Vale: - A única maneira será essa.

O Orador: - A questão é dar-nos garantia de apresentar-nos um estabelecimento apto a preparar o pessoal idóneo para desempenhar as funções que desejamos. (Apoiados).

Tenho dito.

O Sr. Machado de Serpa: - Sr. Presidente: sem propósito de querer contrariar os princípios em que se inspirou a comissão que deu parecer sôbre êste projecto, para estabelecer que a direcção dos serviços de administração do ensino deve ser cometida a profissionais, princípios que, creio, se tem adoptado em todos os países onde se trata com esmero destas questões de instrução, desejava, contudo, que algum dos ilustres membros da comissão me infor-

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masse se o pessoal existente, que ora dirige e trata dêsses assuntos, fica com os seus direitos ressalvados.

Faço esta pregunta porque em geral em todas as reformas se respeitam os chamados direitos adquiridos do pessoal.

No projecto vindo da Câmara dos Deputados acatava-se êste ponto fundamental dos interesses dos empregados do Ministério de Instrução, interesses que são tam legítimos como quaisquer outros, uma vez que foram adquiridos à sombra duma lei.

Em poucas palavras formulo a minha pregunta: acham-se acautelados os direitos adquiridos dos actuais serventuários das repartições de instrução pública, direitos que êles adquiriram pela sua nomeação?

Desejo saber se, por exemplo, um amanuense da Direcção de Instrução Pública tem os seus direitos acautelados se continuar a ser amanuense ou na inactividade, recebendo o seu ordenado, direitos que êle adquiriu pelo facto de ser nomeado amanuense.

Se, quando foi nomeado, tinha direito a ser promovido, pregunto: a reforma corta-lhe êsse direito e fica na classe de amanuense?

O Sr. Miranda do Vale: - Isso é do artigo 10.°

O Orador: - Pode dar-se o caso desta reforma ir prejudicar os direitos que uma lei conferiu a êsses funcionários no acto da sua nomeação, e ao porem-se em prática os princípios novos estabelecidos pela comissão, prejudicam-se os interesses do pessoal.

A comissão o dirá.

O orador não reviu.

O Sr. José Maria Pereira: - Pedi a palavra para mandar para a mesa dois pareceres da comissão de finanças.

O Sr. Silva Barreto: - Sr. Presidente: eu reservo-me para responder ás preguntas do Sr. Machado de Serpa quando se tratar de discutir o artigo 13.°, pois julgo que êsse é o momento mais oportuno para satisfazer aos desejos de S. Exa.

O Sr. Machado de Serpa: - Então julga V. Exa. inoportunas neste momento as minhas considerações e por isso se reserva para tratar dêste assunto quando se apreciar o artigo 13.°?

Ora, eu entendo que, tratando-se da reorganização do Ministério de Instrução e do seu pessoal, é esta a ocasião oportuna de resolver êste problema.

O Orador: - Sr. Presidente: eu vou ver se consigo, no menor espaço de tempo possível, trazer para êste debate o concurso, embora modesto, da minha pouca prática e dos conhecimentos da prática usada no estrangeiro, a respeito dos técnicos das respectivas repartições.

Era toda a parte do mundo o ensino primário, normal, técnico ou profissional estão divididos em diversas categorias.

As inspecções são constituídas por um corpo de funcionários técnicos; quer dizer, por um corpo de funcionários conhecedores do ramo de serviço para cuja fiscalização foram nomeados.

Assim há a inspecção primária normal, secundária, do ensino técnico, nas suas diversas modalidades.

Os inspectores, no fim do ano, apresentam aos chefes da respectiva secretaria os relatórios que respeitam à metodologia e processologia.

V. Exas. estão vendo; que sendo hoje a metodologia uma alta sciência, a inspecção, tendo que apresentar o relatório à repartição respectiva, precisa ser a chefia de reconhecida competência, porquanto, não sendo assim, que opinião pode emitir um chefe de secretaria acêrca dum trabalho apresentado por um técnico?

Que tem sucedido em Portugal?

A inspecção em Portugal só tem existido para a miseranda instrução primária.

Mas V. Exas. sabem que a inspecção primária em Portugal tem sofrido diversas interrupções: não tem tido solução de continuidade. O critério em questões de ensino tem sido um critério de pessoas que pouco conhecem das necessidades inerentes ao ensino. Toda a gente tem tratado de instrução, menos os que sabem de instrução (Apoiados). Tratam da instrução, médicos, engenheiros, etc.

A imprensa e a instrução são os dois grandes recursos das incompetências. Quem não sabe cousa nenhuma é hoje professor ou jornalista, salvo honrosas excepções, é claro.

Toda a gente lecciona alemão, por exem-

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plo, o inglês, porque uma vez eu outra frequentou uma aula de alemão ou de inglês. Na província é assim: qualquer cidadão apresenta se nestas condições para reger cadeiras, e até com diplomas passados por quem tem tanta competência como êle.

Tem resultado disto que os relatórios dos técnicos da inspecção vão para o cesto dos papéis inúteis.

Ninguêm se importa com isso, porque os burocratas não são homens entendidos em questões de instrução.

Portanto, parece-me e devo afirmar que lá fora assim é, e isto não é uma afirmação gratuita, que os chefes de repartição devem ser aqui, como em todos os países civilizados, onde a instrução é tomada a sério, técnicos.

E para quê?

Para que a parte técnica, própriamante a que diz respeito á função de inspecção, seja cabalmente observada, procedendo-se cora toda a competência á confecção dos relatórios e instruindo as respectivas fórmulas dos processos de instrução com os dados precisos.

É sobretudo para êste fim que o técnico deve pertencer a uma repartição.

Para confirmar as considerações que fiz, pregunto a V. Exa.: V. Exa. encontra em algum Ministério, como chefes de repartição, homens que não sejam técnicos?

Seria mesmo sujeitar a uma prova iniludível de pouco critério um corpo de técnicos estar subordinado a um chefe que não fôsse técnico.

V. Exa. vai ao Ministério do Fomento e encontra à testa do ensino agricola, quem? Um técnico.

Vai ao Ministério da Guerra e encontra à frente das repartições respectivas, quem? Um técnico.

Vai á Marinha e encontra à frente das suas repartições, quem? Um técnico.

O que se depreende de todas as considerações que fiz é que toda a gente se julga com competência para dirigir as diversas repartições e eu entendo que não é assim.

Nós procuramos muitas vezes o estrangeiro para dele tirarmos exemplos que mais ou menos satisfaçam a nossa razão ou orientem o nosso espírito na consumação dum fim.

Há um país que, embora o seu grau de instrução não seja modelar, se bem que em vinte anos tenha feito muito em favor da instrução, que é a França, onde nós todos sabemos que existe um homem que trabalhou durante vinte anos para conseguir o fim da sua bela obra, que era promover e provar que em quanto o Ministério de Instrução daquele país não tivesse à sua frente uma verdadeira competência, não daria um passo no progresso do seu ensino, quer êle fôsse especial, técnico ou elementar.

Sabem V. Exas. quem é êsse espírito superior? É Gustave Lebon.

Gustave Lebon escreveu uma obra apenas sôbre o método, com a sua alta filosofia.

Ora eu pregunto qual a competência do amanuense, que fez um concurso de provas limitado apenas à sua função burocrática, qual a competência dêsse amanuense para dirigir uma repartição, lugar a que ascende, muitas vezes quem sabe por que influências?

A competência é a que todos nós vemos: a instrução arrastada por todo êsse país fora.

Em Portugal havia apenas a inspecção para a instrução primária e agora restabeleceu-se a inspecção para a instrução secundária; eu chamo a atenção do Sr. Ministro do Interior, visto que veio a talhe de foice esta inspecção.

Esta inspecção é absolutamente inútil, e sabe V. Exa. porque?

Porque o inspector não pode inspeccionar a escola sem autorização superior, e autorizada a inspecção, o inspector não tem verba para desempenhar essa missão.

Portanto, há quinhentos inspectores que servem de amanuenses, o que é caro, e que por esta forma é uma inutilidade.

Sr. Presidente: falou se aqui em direitos adquiridos e referiu-se especialmente a êstes direitos o Sr. Machado de Serpa.

A questão está tratada no artigo 13.° Eis a razão porque disse que julgava oportuno tratar-se dêste assunto nessa ocasião. Então responderei á pregunta se, porventura, qualquer outro membro da comissão ou o Sr. relator não entender responder antes dessa ocasião.

O concurso para chefe não tem valor algum.

O Sr. Terenas é um homem cujos co-

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nhecimentos em matéria de instrução são os dum prático, dum homem que tem levado a vida acompanhando o movimento da escola popular, porque êle é um dos velhos republicanos que pugnou sempre pela escola primária, um dos homens que tem levado a sua, actividade às bibliotecas populares, o que, para mim, é um dos factores mais importantes para a instrução popular, principalmente se se conseguisse criar bibliotecas ambulantes.

Mas S. Exa. - eu respeito as opiniões dos outros - veio dizer nos que queria o concurso para êste lugar, o que eu estranho.

O Sr. Feio Terenas: - Ainda não disse isso. Faço tenção de fazer uma proposta nesse sentido, mas ainda não disse isso.

O Orador: - Mas quere concurso.

O Sr. Feio Terenas: - Sim, senhor.

O Orador: - O concurso tinha de ser feito entre professores, admitindo que o chefe de repartição tem que ser um técnico.

Em geral um concurso por provas públicas entre professores ou entre especialistas caiu em tal descrédito, que hoje, na Alemanha, o país clássico dos concursos, quási que foi eliminado. (Apoiados).

Era como que uma chaga viva da imoralidade, que imperava sempre na escolha dos candidatos, o que se agravava com as pressões dos influentes políticos.

Assim sucedeu que, pelos concursos de provas públicas, eram nomeados, não os mais competentes e experimentados e com mais saber, mas, principalmente, aqueles que tinham nuns dados minutos a felicidade de tirar o número que lhes permitia satisfazer a umas dadas preguntas, muitas vezes préviamente apresentadas ao candidato feliz.

Sr. Presidente: vou dar um exemplo frisantíssimo dos concursos em Portugal.

Em Portugal sempre tem havido concursos para os lugares de professores dos liceus.

V. Exa. sabe que o concurso para êstes lugares é uma cousa tremenda e, se aqueles que se submetem à prova dêsse concurso pesassem bem o que êle é, ninguêm lá ia.

É uma cousa horrorosa. É um concurso muito mais difícil do que qualquer outro para uma escola superior.

V. Exa. encontra num concurso para uma escola superior maior simplicidade do que num concurso para lentes de qualquer liceu de Portugal.

Pois sabe V. Exa. o que tem sucedido?

É o seguinte: um concorrente em 1908 foi reprovado, em 1909 foi rejeitado, em 1910 foi aprovado!

E sabe V. Exa. porquê? Porque em 1908 não era o Govêrno de feição, em 1909 tambêm não, mas em 1910 já era.

Concluindo, Sr. Presidente, eu mencionei o nome dum homem, que é autoridade suprema em questões de educação, Gustavo Lebon, e, embora não concorde com muitas das suas afirmações, sei que tem trabalhado por que sejam eliminados os concursos, incluindo até os das escolas superiores, pois é êle quem declara que uma prova de minutos não pode nem deve considerar-se como segura garantia da competência de quem quer exercer uma dada missão.

Tenho dito.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Cupertino Ribeiro: - Peço a V. Exa. que consulte o Senado sôbre se permite que eu me afaste dos trabalhos parlamentares por três dias, a fim de exercer uma comissão de serviço público.

Consultado o Senado, resolveu afirmativamente.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã. Para antes da ordem do dia, o parecer n.° 39 e a eleição dum membro para a comissão de marinha e pescarias; para ordem do dia o parecer n.° 33.

Está levantada a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.

O REDACTOR = Alberto Bramão.

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