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REPÚBLICA

DIÁRIO DO

PORTUGUESA

EM 7 DE AGOSTO DE 1917

Presidência do Ex.mo Sr. António Xavier Correia Barreto

Secretários os Ex.mog Srs,

Bernardo Pais de Almeida Luís Inocéncio Ramos Pereira

Sumário.— Chamada e abertura da sessão. Leitura e aprovação da acta. Dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Presidente do Ministério, pede urgências dispensa do Regimento para duas propostas de lei, uma relativa a um crédito especial e outra relativa ao contencioso fiscal.

*0 Sr. Ministro do Fomento pede urgência e dispensa para uma proposta relativa ao contrato f eito com a fabrica de Santa Iria e outra relativa a máquinas e instrumentos agrícolas.

Os Srs. Alberto dá Silveira, Celestino de Almeida e Gaspar de Lemos, em nome dos respectivos partidos, declaram aprovar as urgências pedidas.

São aprovadas sem discussão as propostas para que pediu urgência o Sr. Presidente do Ministério.

Sobre a proposta relativa ao contrato com a fábrica de àanta Iria, usam da palavra os Srs. José Maria Pereira e Ministro do Fomento, sendo em seguida aprovada.

Sobre o proposta relativa a máquinas e instrumentos aqíticolasj usam da palavra os Srs. Alberto da Silveira e Ministro do Fomento, sendo em seguida aprovada a proposta de lei.

São dispensadas as últimas redacções das quatro propostas, a requerimento do Sr. Fortunato da Fonseca.

O Sr. José Maria Pereira faz considerações relativas à Casada Moeda, respondendo o Sr. Presidente do Ministério.

Ordem do dia.—Entra em discussão o parecer relativo ao orçamento do Ministério das Colónias.

Usam da palavra os Srs. António Arez, Gonçalves Pereira, Paulo Lobo e Ministro das Colónias.

O Sr. Presidente encerra a sessão.

Presentes à chamada 30 Srs. Senadores.

São os seguintes:

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Agostinho José Fortes.

Alberto Carlos da Silveira.

Amaro de Azevedo Gomes.

António Alves de Oliveira Júnior.

António Augusto de Almeida Arez.

António José Gonçalves Pereira.

António José da Siíva Gonçalves.

António Maria da Silva Barreto.

António da Silva Gouveia.

António Xavier Correia Barreto.

Augusto Casimiro Alves Monteiro.

Augusto de Vera Cruz.

Bernardo Pais de Almeida.

Celestino Germano Pais de Almeida.

Elísio Pinto de Almeida e Castro.

Francisco Joaquim Ferreira do Amaral.

Francisco Vicente Eamos.

Herculano Jorge Galhardo.

José de Castro.

José Maria Pereira.

José Paulo Filomeno Piedade Martinho Lobo.

José Tomás da Fonseca.

Luís António de Vasconcelos Dias. •

Luís Filipe da Mata.

Luís Fortunato da Fonseca.

Luís Inocéncio Ramos Pereira.

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Rodrigo Guerra Alvares Cabral. Vasco Gonçalves Marques.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Faustino da Fonseca.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Alfredo José Durão. Alfredo Rodrigues Gaspar. António Campos.

António Joaquim de Sousa Júnior. António Maria Baptista. Augusto César de Vasconcelos Correia. Augusto Cymbron Borges de Sousa. Caetano José de Sousa Madureira e Castro.

Carlos Bichter.

Duarte Leite Pereira da Silva. Francisco de Pina Esteves Lopes. Frederico António Ferreira de Simas.

• Jerónimo de Matos Ribeiro dos Santos. João Duarte de Meneses,

João Lopes da Silva Martins Júnior.

João Maria da Costa.

João Ortigão Peres.

Joaquim José Sousa Fernandes.

Joaquim Leão Nogueira Meireles.

Joaquim Pedro Martins.

• José Afonso Baeta Neves. José António Arantes Pedroso.

José Eduardo de Calça e Pina da Câmara Manuel.

José Guilherme Pereira Barreiros.

José Lino Lourenço Serro

José Machado de Serpa.

.José Pais de Vasconcelos Abranches.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Leão Magno Azedo.

Luís da Cariara Leme.

Manuel Soares de Melo e Simas.

Pedro do Amaral Boto Machado.

Porfírio Teixeira Rebelo.

Remígio António Gil Spínola Barreto.

Ricardo Pais Gomes.

Simão José.

Pelas 15 horas o Sr. Presidente manda proceder à chamada.

Tendo-se verificado a presença de 30 Srs. Senadores. S. Ex.a declara aberta a sessão.

Lida a acta da sessão anterior, foi aprovada sem reclamação.

Diário ãas Sessões do Senado Mençiona-se o seguinte Expediente

Ofícios

Da Presidência da Câmara dos Deputados, enviando o orçamento do Ministério da Marinha para o ano de 1917-1918.

Para a comissão do Orçamento.

Do Sr. Ministro das Finanças, enviando a cópia da informação prestada pela Direcção Geral de Contabilidade Pública en satisfação ao requerimento do Sr. Senador Rodrigo Guerra Álvares Cabral.

Para dar conhecimento ao interessado.

Do Sr. Ministro do Interior, comunicando não haver disponíveis na Imprensa Nacional as obras pedidas pelo Sr. Senador Faustino da Fonseca.

Para dar conhecimenlo ao interessado.

Do Sr. Ministro dos Estrangeiros, comunicando as informações pedidas pelo Sr. Senador Rodrigo Guerra Alvares Cabral sobre a Companhia Lisbon Electric Tranrways Limited.

Da Presidência da Câmara dos Deputados enviando as propostas de lei:

Tornando extensiva à Companhia do Caminho de Ferro do Porto à Póvoa e Faaialicão a mesma concessão respeitante à criação e emissão de obrigações, que foi feita à Companhia dos Caminhos de Ferro do Alto Minho na base 8.íl da lei de 20 de Julho de 1912.

Concedendo uma pensão a José Teixeira Simões.

Prorrogando por mais 12- meses à Câmara de Alenquer o prazo da construção autorizada pela lei n.° 629, de 23 de Junho de 1916.

Concedendo subsídio para renda de casa aos oficiais do exército do activo.

Suspendendo por dois anos determinados reembolsos à Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência.

Enviadas para as comissões.

Pareceres

Da comissão de petições sobre o projecto de lei n.° 644.

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Sessão de? de Agosto de 1917

Nota de interpelação

Desejo interpolar o Sr. Ministro das Finanças numa das próximas sessões, antes da ordem do dia, não só com respeito aos decretos que estatuíram o regime, arrolamento e liquidação dos bens dos inimigos e equiparados; mas ainda com relação à intervenção da Intendência dos Bens dos Inimigos na execução dos mesmos decretos, e necessidade urgente da revogação do artigo 4.° do decreto n.° 2860, de 30 de Novembro de 1916, por ser inconstitucional e ofensivo da independência do Poder Judicial.

Para esse efeito peço seja comunicado este meu desejo ao respectivo Sr. Ministro.— O'Senador, José de Castro.

Declaração

Em conformidade com o preceituado no artigo 20.° e parágrafos da Constituição Política aceitei a minha nomeação de auditor geral junto do comandante do nosso corpo expedicionário em França, com a graduação de tenente-coronel, devendo seguir viagem em breve.

Seando, 2 de Agosto de 1917.—O Senador, António Arez.

Para o Sumário.

Pedido de licença

O Sr. Senador Amaro de Azevedo Gomes pede 30 dias de licença. Para a comissão de faltas.

O Sr. Senador José Afonso Baeta Neves pede 15 dias de licença. Para a comissão de faltas.

Pedido

De João Manuel Garcia, pedindo para ser reconhecido como revolucionário civil. Para a comissão de petições.

Projecto de lei

Da iniciativa do Sr. Senador José de Castro sobre o trabalho dos presos.

Representações

Da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, solicitando a aprovação do projecto de lei que cria a Relação Judicial em Coimbra.

Para o Sumário.

Do Sr. Alfredo Apell cidadão russo, sobre o projecto de lei da iniciativa do Sr. Senador Agostinho Fortes que tem por fim conceder a qualidade de cidadão português ao representante.

Para o Sumário.

Telegramas

Do director da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, renovando o pedido da criação da Kelaçfão de Coimbra, constante da sua representação.

Para o Sumário.

O Sr. Presidente do Ministério, Ministro das Finanças, e interino da Guerra (Afonso Costa): — Sr. Presidente : estão sobre a Mesa duas propostas de lei para as quais peço urgência e dispensa de Regimento.

Trata-se de duas cousas muito simples: uma refere-se ao Ministério das Finanças e diz respeito a um crédito especial de 39.241$82, para reforço de certas verbas orçamentais do referido Ministério, verbas absolutamente indispensáveis.

Peço, pois, ao Senado a urgência para esta proposta, que já na outra Câmara foi votada abertamente, e espero que esta Câmara a vote também.

É uma medida indispensável.

A outra proposta diz respeito ao provimento do lugar de auditor junto do Tribunal Superior do Contencioso Fiscal.

Não encontro juiz de l.a instância para desempenhar este lugar; por isso eu propus e a outra Câmara aprovou a minha proposta para que esse lugar seja preenchido por um professor de direito.

V. Ex.as compreendem que ó absolutamente urgente que se faça este provimento.

A capacidade dos professores garante que eles poderão exercer esse lugar.

Peço, pois, urgência e dispensa do Regimento para esta proposta.

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Diário das Sessões do Senado

Para ambas peço urgência e dispensa do Regimento.

São lidas as propostas de lei dos Srs. Ministros das Finanças e do Fomento.

O Sr. Alberto da Silveira:—Como princípio, a União Republicana rejeita a ur-.gência, mas prescinde da respectiva votação, por não valer a pena, visto não ter influência no resultado da votação.

O Sr. Celestino de Almeida: — Os Senadores evolucionistas dispensam a chamada para a urgência e dispensa de todas as propostas.

O Sr. Gaspar de Lemos: — Os Senadores do Partido Democrático dispensam a chamada.

São aprovadas, sem discussão na generalidade e na especialidade, as propostas de lei do Sr. Presidente do Ministério.

São as seguintes:

Artigo 1.° E aberto no Ministério das Finanças, a favor do mesmo Ministério, um crédito especial da quantia de 39.241$82, destinada a reforçar as verbas dos capítulos e artigos do orçamento das despesas aprovado para o ano económico de 1916-1917, constantes do mapa junto que se considera como parte integrante desta lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Artigo 1.° É substituído o § 4.° do artigo 66.° do decreto n.° 2,- de 27 de Setembro de 1894, pela forma seguinte:

| 4.° O lugar de auditor do Tribunal Superior do Contencioso Fiscal poderá ser exercido em comissão por um juiz de direito de 2.a instância, por um professor de direito de qualquer das Universidades da República ou ainda por um juiz de direito de l.a instância, mas a nomeação deste último só poderá ser feita precedendo o concurso, que fica preceituado no parágrafo antecedente.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em .contrário.

Entra em discussão a proposta relativa ao contracto com a fabrica de Santa Iria.

Ê o seguinte:

Artigo 1.° É aprovado o contrato provisório celebrado pelo Governo, em 2 de

Agosto de 1917, para o arrendamento da Fábrica de Produtos Químicos da Póvoa de Santa Iria, em harmonia com o decreto n.° 3:186, de 12 de.Junho do rnesmo ano, contrato que se considera anexo a esta lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

O Sr. José Maria Pereira:—A proposta de lei em discussão trata dum assunto a que por diversas vezes me referi.

Faço a justiça de acreditar que o Sr. Ministro do Fomento pôs todo o cuidado na redacção do respectivo contrato.

Por uma leitura rápida não é possível pronunciar-me categoricamente sobre o que está escrito nessa proposta.

Mas afigura-se-me que, dada a urgência dela, porque representa um grande benefício para a agricultura, temos de nos louvar no esforço e inteligência do Sr. Ministro do Fomento.

Portanto, em princípio aprovo esta proposta, e, com relação aos seus detalhes, tenho, .como garantia da sua seriedade, a honestidade e a inteligência do Sr. Ministro do Fomento e a honorabilidade dalguns firmantes do contrato.

Entretanto, declino no Sr. Ministro do Fomento a responsabilidade de qualquer óbice, ainda que involuntário, que possa haver no contrato.

O Sr. Ministro do Fomento (Herculano Galhardo): — Cometo por agradecer ao Sr. José Maria Pereira a forma como se me dirigiu.

Decerto que eu não me atreveria a vir apresentar ao Senado uma medida desta ordem, sem ter todo o cuidado em a elaborar de forma a defender os interesses do Estado e de acordo em todos os seus pontos com as bases do concurso publicadas em 12 de Junho de 1917.

E. subordinado a tais condições, não tive dúvida, em pedir para esta proposta a urgência e dispensa do Regimento.

Ê aprovada a proposta na generalidade e na especialidade.

'O Sr. Fortunato da Fonseca:—Requei-ro dispensa da última redacção para estas propostas, já aprovadas.

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Sessão de 7 de Agosto de 1917

É lida o proposta, que tracto, da organização de máquinas agriculas. E a. seguinte :

Artigo 1.° E o Governo autorizado a adquirir, desde já, máquinas, instrumentos e motores agrícolas, entregando-os nos estabelecimeetos oficiais de agricultura dependentes dos Ministérios do Fomento e da Instrução Pública, podendo ainda dotar estes estabelecimentos com os fundos indispensáveis para aquisição de gados que forem necessários para a conveniente exploração dos mesmos estabela-cimentos ou para as suas funções de ensino.

§ 1.° As máquinas, instrumentos e motores agrícolas a que se alude neste artigo, destinados aos serviços dependentes da Direcção Geral da Agricultura, poderão ser alugados a sindicatos agrícolas e a lavradores, pela forma prescrita no regulamento que se elaborar, sendo o preço do aluguel independente do custo de transporte em caminho de ferro, que fica a cargo do Estado.

§ 2.° O Governo estabelecerá, à medida que dispuser dos recursos necessários, postos especiais de utensilagem agrícola de demonstração e adaptação dos utensílios e educação do respectivo pessoal.

Art. 2.° As verbas necessárias para execução do disposto no artigo 1.° serão pagas pelos créditos abertos a favor do Ministério do Trabalho e Previdência Social, sendo a aplicação dessas verbas feitas por acordo entre os Ministérios do Fomento, de Instrução Pública e do Trabalho e Providência Social.

Art. 3.° No artigo 373.°, classe 5.a, da pauta dos direitos de importação, a que se refere a lei de 10 de Maio de 1892, serão incluídos os selos metálicos desmontáveis, os motores inanimados e as máquinas auto-motores agrícolas.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.

Está em discussão na generalidade e especialidade.

O Sr.. Alberto da Silveira:—Devo dizer a V. Ex.a, com a minha franqueza habitual, que esta medida é daquelas que merecem a nossa completa aprovação. Este projecto ó alguma cousa. c

É um projecto que representa uma tentativa em favor da nossa agricultura.

Um país agrícola, como o nosso, merece a aprovação de todas as medidas coma esta.

O Sr. Ministro do Fomento não precisa dos meus louvores, mas eu não lhos regatearei.

Este projecto é de grande incentivo e interesse para a agricultura.

Faço apenas uma pequena referência ao seguinte:

Leu.

É preciso que no regulamento não fique consignado o máximo do aluguer.

A União Republicana vota, com todo o prazer, este projecto.

O Sr. Ministro do Fomento (Herculano Galhardo): — Sr..Presidente : pedi a palavra para agradecer ao Sr. Alberto da Silveira a forma como fez a apreciação desta proposta e as palavras que me dedicou.

Folgo em ver a oposição colaborar com o Governo em assuntos de interesse nacional.

Com o apoio que Y. Ex.a e os seus correligionários me acabam de dar, o Governo sente-se animado e fortalecido para maiores e mais valiosos trabalhos.

Foi aprovado na generalidade e na especialidade.

O Sr. Fortunato da Fonseca :—Requeiro a dispensa da última redacção. Foi aprovado.

O Sr. José Maria Pereira:-^Sr. Presidente : visto estar presente o Sr. Ministro das Finanças, eu desejo fazer umas pre-guntas para as quais chamo a atenção de V. Ex.a, do Governo e do Senado.

Constou-níe hoje que ontem se deram acontecimentos de certa gravidade, que revelam o estado de indisciplina que a cada momento se repete.

Refiro-me aos factos que se deram agora na Casa da Moeda.

Constou-me que operários deste estabelecimento do Estado haviam-se dirigido em termos menos respeitosos ao director daquele estabelecimento, terminando de forma, violenta, por intimarem o director a sair.

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ração pelo Sr. Ministro das Finanças, tanto mais que este caso se deu com uni homem que tenho aã conta dum funcionário distinto, cavalheiro que merece toáa a consideração e respeito.

E necessário, portanto, que o Sr. Ministro das Finanças venha ao Senado fazer a narração dos factos que se acabam de dar, dizer se são ou não verdadeiros esses factos, se honve acto de indisciplina, e se averiguadas as causas desse conflito, o Governo já. tomou as providências necessárias para castigar os que delin-quiram, ou se porventura se deu o caso, que eu não creio, de ter ês:e funcionário procedido menos convenientemente.

Tratando-se dum assunto desta natureza, é necessário toda a ponderação, porque estes casos o que vem é demonstrar o estado de indisciplina em que estão to-.das as classes.

Terminando, repito, o meu desejo é que o Sr. Ministro das Finanças de todas as explicações que são indispensáveis.

Aproveito a ocasião para mandar para a Mesa um requerimento.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das .Finanças (Afonso Costa): — Ontem de tarde houve efectivamente na Casa da Moeda um incidente desagradável.

Alguns operários, não se pode dizer fossem todos, não sei porque espécie de razão, tiveram primeiro uma conversa com o Sr. director, que terminou com palavras um pouco excessivas da parte desses operários.

O facto deu-se estando en nessa ocasião na Câmara dos Deputados.

Mandei logo chamar o Sr. director e encarreguei um funcionário superior do meu Ministério de apurar como os factos se tinham passado e de me dar todas as informações, para ver o que se devia fazer.

O Sr. Bruschy teve uma conferência com alguns dos operários da Casa da Moeda e por essa conferência eu tive conhecimento de que os factos se passaram da seguinte maneira:

Os operários desejam ter trabalhos extraordinários para neles ganhar mais alguma cousa; tiveram, porém, a informação de que o Governo, para acudir à crise dos trocos, ia mandar proceder não só à cunhagem de novas moedas, mas também fazer imprimir cédulas. Mais os informa-

L)tárto das Sessões do Senado

ram de que essas cédulas não seriam impressas na Casa da Moeda e, por esse facto, se alteraram, dizendo que queriam ter trabalhos extraordinários.

Há dias, uma comissão de operários procurou no Ministério das Finanças o Sub-Secretário de Estado, ao qual entregou uma representação pedindo aumento de salário.

Estava-se tratando do assunto quando soube dos factos ocorridos na Casa da Moeda e para a solução do qual tomei as providências que o caso requeria.

Disse o Sr. José Maria Pereira que se tem por várias vezes manifestado uma espécie de indisciplina, que é atribuída à política.

Suponho que estes factos não podem, ser atribuídos à política j mas a muitas causas. ±Li costume dizer-se que a causa determinante do mal -estar social é a guerra, para assim justificar o estado de indisciplina desta ou daquela classe. O que é factq, porém, é que também por virtude da guerra se têm desenvolvido muitas indústrias, as quais por sua vez têm melhorado as condições de vida dos seus operários, as quais, se não houvesse guerra, não se teriam talvez desenvolvido. Quanto ao conflito da Casa da Moeda, foram já tomadas providências. O Governo, para normalizar a questão dos trocos, terá de recorrer, além da Casa da Moeda, a outros estabelecimentos do Estado ou corporações com ligações directas com o Estado; mas, em quaisquer casos, não se dispensará a Casa da Moeda do seu trabalho para normalizar a questão dos trocos. Se esta era a verdadeira causa, ela deve ficar assim solucionada.

Oxalá que a Casa da Moeda trabalhasse com a rapidez que o Governo desejaria e que as circunstâncias actuais tornariam conveniente.

O que se pode dizer neste momento é que os factos hão-de ser apurados e os castigos hão-de ser aplicados.

O Sr. Santos Lucas tem grandes qualidades de dirigente,, que tornam mais graves os actos praticados por esses desvairados.

O Sr. José Maria Pereira certamente me acompanha no voto que faço para que este acto de indisciplina tenha a reprovação unânime do todo o país.

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Sessão de? de Agosto de 1911

O Sr. José Maria Pereira: — Ouvindo as explicações do Sr. Ministro das Finanças, dispensar-me-ia de lhe responder, não por menos consideração para com S. Ex.a, nem porque as suas explicações me satisfizessem, se no decorrer do seu discurso não tivesse magoado injustamente os partidos políticos que lhe não são afectos.

Quis S. Ex.a dizer que o estado de indisciplina que lavra no país não era devido aos actos do Governo, mas aos partidos políticos contrários.

Devo afirmar que pelo que toca ao meu partido, ele nunca se associou nem associa a desordens.

A indisciplina que vemos em diversas classes da sociedade portuguesa é devida exclusivamente aos erros do Governo.

Assim, a disciplina no exército diz-se que está hoje como nunca esteve.

Mas, há pouco tempo ainda, fui informado por pessoa que me merece todo o crédito, que numa travessa que liga a rua do Alecrim à rua das Flores, junto a uma escada que dá ingresso para uma casa suspeita, três militares parados à guisa de polícia faziam parar os transeuntes,- que revistavam, doixando-os seguir após uns ditos obscenos.

Mas o caso a que eu me queria referir não é apenas este, que, sendo já impróprio de quem tem a seu cargo a manutenção da ordem em tempos marciais, pode ser desculpado pela falta de educação de caserna; mas há mais:

Um destes soldados deu a arma ao outro e sumiu-se para uma casa onde naturalmente teve uma conversa demorada.

Regressando, o seu camarada entregou-lhe a arma e, por seu tm-no, imitou o primeiro soldado.

Ontem também vi percorrer as ruas elementos do exército, apesar das garantias já não estarem suspensas, e, em plena Praça do Comércio, vi uma sentinela com ares bamboleantes, fumando.

Este e outros factos são do domínio público.

Aguardo com serenidade as providências que o Sr. Ministro das Finanças certamente já encetou acerca do conflito havido na Casa da Moeda, mas como S. Ex.a levantou um pouco a ponta do véu acerca das causas mais próximas que podem ter

suscitado o conflito, devo dizer o que me consta.

O pessoal operário, assoberbado com a crise das subsistências, pediu melhoria de situação e, por parte do Sr. director, havia sido assegurado que os trabalhos extraordinários dessa mesma casa seriam dados a eles como tarefas especiais.

As palavras do Sr. Presidente do Ministério mostram-nos que é verdadeiro o caso a que aludi. E, sendo assim, eu desejo saber se tem fundamento a versão de que o Governo, como a Casa da Moeda não dispõe de elementos suficientes para executar uma emissão rápida de cédulas, resolvera entregar esse trabalho à Santa Casa da Misericórdia.

Lastimo que o facto se dê e que o Governo não tenha tido o cuidado de prevenir o caso de que nos vimos queixando, estabelecendo medidas tendentes a evitar a emigração da prata, resultante do estado de guerra.

O Sr. Ministro das Finanças não carece que eu lhe dê indicações acerca da forma como este problema podia ser resolvido, e por isso me dispenso -de fazê-las. Entretanto, direi que, conhecida como é de todos nós a grande disparidade entre o câmbio espanhol e o português, facilmente se compreende que, se não fecharmos a saída da nossa moeda para Espanha, as nossas dificuldades, no tocante à falta dessa mercadoria, agravar-se hão.

Impõe-se, portanto, a arrecadação imediata da nossa moeda, metal, que seria substituída por papel, cédulas ou notas do Banco de Portugal. Isto como medida transitória,. até que acabasse o estado de guerra e se pudesse normalizar a circulação, metálica.

E um alvitre apenas e como tal a apresento.

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Diário das Sessões do Senado

política do Governo. Eu disse que este estado era muito natural, em virtude da guerra, que tem irritado os ânimos.

Quanto à falta de trocos, a culpa não é do Governo. V. Ex.a sabe que o valor intrínseco da moeda de prata não é superior ao seu valor, e quem tal afirmar engana-se ein absoluto.

O Governo tem procurado proibir a exportação.

Já pôs em circulação a moeda de quatro centavos...

O Sr. José Maria Pereira:

já desapareceram.

•Também

O Orador : — Não desapareceram todas, porque £Índa não foram todas lançadas em circulação. Foram cunhados uns 700 contos em moedas de 4 centavos, e apenas vieram para a circulação uns 60 contos.

O Governo vai também fazer circular pequenas moedas de $02 e de $01, que ainda não houve possibilidade de cunhar por falta do cadinhos.

O Governo tinha previsto a caça à moeda de prata, e assim preveniu-se com cédulas de 2$50, com cédulas de 1$ e com cédulas de $50, ainda do tempo da monarquia, que foram postas na circulação com a sobrecarga da «República».

Temos também que contar com as cédulas novas de- 1$ e $00, que são inuito bonitas, e que, uma vez postas em giro, 'permitirão, como já sucede com as cédulas antigas a que já me referi, que se recolha a prata sem inconvenientes. . O Governo, logo que veja ter-se espalhado suficientemente a cédula que substitui a prata, dá ordem para as suas tesourarias, caixas filiais e Banco de Portugal, no sentido de que guardem a prata e entreguem simplesmente cédulas. t Depois pnblicar-se há o decreto, que já está feito, mandando recolher toda a moeda de prata em circulação, começando pela de cunhagem anterior à República. Uma vez recolhida esta moeda, será toda refundida para fabricar moedas da República, que se guardarão até o momento de convir lançá-las em circulação.

Não há nada que nos indique que a prata venha a ter mais valor do que aquele que têm as moedas era circulação.

Houve realmente uma tentativa — e eu tive disso conhecimento — de utilização das moedas para os artefactos, dada a dificuldade na importação da prata, mas não deu resultado, porque lhes saía muito cara, e mesmo isto foi feito em pequena quantidade, que não podia ter influência alguma na questão dos trocos. Logo que tive conhecimento do facto tomei todas as precauções para que se não agravasse a crise, mas não foi necessário tomar mais rigorosas providências.

Pôs-se em circulação, além das notas de 2$50, as de 1?$! e $50., e preparou-se o Governo para tomar outras providências que a ocasião indicasse.

Afirma-se que se está fazendo no país a drenagem de cobre, que é exportado para Espanha, para o Governo deste pais cunhar os seus 10 cêntimos, mas isso não pode ser verdade, porque o mesmo lhe sairia mais caro.

Também não há probabilidade do cobre ter mais valor, para que o especulador o guarde, esperando o momento de subida.

O Governo vai lançar no mercado as cédulas de $20, de $10 e de $05.

A Casa da Moeda emitirá as de $20 e $10, e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, autorizada por um decreto., emitirá as de $05. -

Assim, o trabalho será mais rápido, a emissão far-se há mais depressa e não deve suscitar reparos a autorização que se dá à Santa Casa da Misericórdia, pois ela depositará a quantia correspondente às cédulas que emitir e essas cédulas apresentam garantia absoluta contra a falsificação, dado os recursos de que a Santa Casa dispõe para a impressão dos bilhetes dê lotarias.

Esta autorização não é para estranhar, pois ela poderia ser dada às câmaras mu-nicipais, às associações comerciais, mas nenhumas delas têm os recursos que tem a Santa Casa.

Não pode dizer-se que foi este facto que levou os operários a actos de indisciplina, pois eles certamente reconheciam que não tinham tempo para fazer essas cédulas.

G Governo não se afasta do caminho que/ adoptou.

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Sessão de 7 de Agosto de 1917

mas esse papel já se encontra em grande quantidade no país.

Esta tendência de especular com tudo dará, quanto à moeda, a consequência de vivermos algum tempo com papelinhos, mas o Governo tirará daí a resultante necessária, qual é a de mandar fundir a prata que recolhe, para cunhar a nova moeda com° a efígie da Eepública.

S. Ex.a não reviu.

ORDEM DO DIA

Discussão do orçamento do Ministério das Colónias

O Sr. António Arez: — Sr. Presidente: a míngua de recursos para-poder discutir convenientemente a proposta orçamental relativa ao Ministério das Colónias, apre-cirndo a situação económica e financeira do ultramar portuguvs, quais os erros da sua administração e os meios de os remediar, visto as tabelas da despesa não se encontrarem ainda todas publicadas, as contas de gerência não estarem organizadas, das estatísticas de comércio e navegação só serem conhecidas as da Guiné e Angola e os relatórios dos governadores e dos inspectores da fazenda não serem distribuídos, não dispondo, portanto, de material de trabalho preciso para um largo e desenvolvido exame, nada posso fazer senão uma crítica de carácter geral sobre ò assunto, tam tardiamente e com um parecer tam resumido, submetido à apreciação do Senado.

Sr. Presidente: para a valorização das extensas regiões de alêm-mar, não vou pedir, neste momento dificílimo que atravessa • o nosso Portugal e que atravessa o mundo inteiro, grandes obras de fomento colonial, tais como caminhos de ferro, docas, portos e construções, nem que se procurem nos grandes empréstimos os meios necessários para os melhoramentos a executar, não obstante ser necessário gastar dinheiro a rodos para fertilizar aquelas terras.

Mas, Sr. Presidente, se quisermos, na realidade, que as colónias sejam a razão da nossa existência política—e foi esta uma das causas da nossa beligerância — e se não quisermos que elas sejam o cancro da metrópole, precisamos neste caso mudar dos processos de administração e de rumo, quanto antes, .enveredando pelo

caminho dos nossos vizinhos: vida nova,: emfim. - •

E o que mais uma vez desejo acentuar corno sendo de elementar critério e precaução.

Sr. Presidente: depois do advento da República, teve especialmente a província de Angola uma mudança enorme.

De facto, reprimiu-se por completo a escravatura mais ou menos encapotada que era feita lá pelo interior, fora das vistas das-autoridades civis e militares;, regularizou-se o trabalho dos indígenas e conferiram-se-lhes direitos bem superiores aos que concedemos aos trabalhadores das nossas aldeias; abriram-se vias de comunicação ordinária; sanearam-se povoações; montou-se o serviço administrativo de molde a dar-nos uma idea de que isto era uma colónia dum- povo europeu ; desenvolveu-se a instrução profissional; lançaram-se as bases para a reorganização do exército; instituiram-se as missões ci-vilizadoras e pensou-se na. codificação da justiça indígena.

Que o digam os tristes e bem lamentáveis acontecimentos de Seles, Amboim e Novo Redondo, ocorridos no mês de Maio, rebelião que carece de ser esmagada rapidamente, castigando com todo o rigor os revoltosos.

Apesar de todos os erros e dos processos até agora adoptados, avança-se em todo o caso, embora lentamente, e os que trabalham em Angola não devem desanimar, não devem cobrir o rosto de vergonha, como alguém escreveu — grave injustiça, com que se pretendeu "ofender a mais bela e importante província ultramarina.

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cumprir ás leis;.ieinos.de respeitar os di-' reitos que elas conferem, aos que à sua sombra vão sacrificar,a .sua saúde; temos de auxiliar a- iniciativa" particular e mio-propositadamente contrariar e atrofiar ioda essa iniciativa,'aniquilando os colonos com as-exigências' dos tutores:

i Quantas empresas particulares tiveram de desistir, em= presença; de tantas exigências absurdas! ;-.

Temos de decretar . medidas que tendam a canalizar esses milhares de portugueses que vão levar a sua actividade e energia a países estranhos; temos de criar instituições bancárias-é de créditos agrícolas j porque sem "estas instituições é impossível a existência- -do 'pequeno agricultor; temos de. nos ocupar da qiestào da mão de obra; temos de criar postos agrícolas experimentais e' missões agrícolas móveis; temos de tratar a' valer da questão, da viação e de -transportes; temos de dar facilidades de fretes: marítimo s para colocação dos produtos' coloniais nos mercados .europeus*

^ Sem capitais, dispondo só dos seus braços, e, na maioria dos casos, sem saber ler sequei*, que pode'essa gente ir fazer à' África,- sem ajuda;ou arrimo de ninguém?

- Os administradores do'Terreiro do Paço não atendem convenientemente às neces-sidades' de Angola*

-" O-país, também, pouóo tom por si concorrido para o progresso da província; antes os seus industriais persistem era opbr-se às reclamações da colónia, contra .reclamando para que não sejam melhoradas as suas pautas aduaneiras, ou para que sejam mais aumentadas as taxas já de si absurdas.- • •• -''\Éía Lisboa lêgisla-se para^o ultramar flO Ministério dáâ Colónias.- ••

• E 'um "erro"tremendo; de funestas con-ísequêneias, querer aplicar 'ás leis dó continente' às colónias j Onde os usos o os costumes são tam diferentes. E uma das cousas a atender é ao meio indígena, de acordo com o 'qual' é - preciso- legislar (Àpoiadoâ]i -' ' :

Diário dás Sessões do Senado

A descentralização administrativa já-não é, felizmente, uma novidade entre nós.

Fo: posta em prática em Moçambique; em 1907, pelo Ministro Aires de Orne-las, sendo Governador Greral o ilustre colonial Freire de Andrade.

Em 19J.4 foram promulgadas para as colónias as leis orgânicas de administração civil e de administração financeira, as q;iais estão em r vigor apenas em Cabo Verde, Guiné e índia.

Quero, Sr. Presidente, que essas belas reformas entrem em execução plena, no mais breve prazo, nas restantes províncias.

Desejo que se faça obra útil e não pes^ soai, pois os Governos têm jogado positivamente a cabra-cega, não vendo nada, sendo a história da nossa administração ultramarina feita aos solavancos, sem método, sem nexo, sem uma sequência qualquer, balouçando a pobre num mar encapelado de leis, umas em oposição manifesta com outras, umas em briga com outras.

Uma das questões que mais se impõe neste momento 'de obras decisivas é a colonial.

Não havia até hoje um. plano realizável, não se sabia o que estava preparado. E, infelizmente, • vê-se ainda que há hesitações onde devia haver resoluções decididas; há tentativas onde era necessário existir uma grande consciência de problemas.

Sr. Presidente: a província de Angola é das que mais necessita duma assistência denodada e cuidadosa. Dum Governo cauto, experimentado e seguro; dum administrador geral de esclarecido critério e saber, com um estudo prévio do que há--de fazer, e com qualidades e requisitos para permanecer in loco o 'tempo necessário para poder lançar asi bases precisas para uma boa gerência.

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metrópole, porque só quem lá governa poderá conhecer as suas dificuldades e os seus remédios (Apoiados').

Continuando amarrada ao regime proteccionista, terminará por arruinar a^ si própria, ou por arrumar a metrópole, porquanto, como muito bem escreveu Freire de Andrade no seu excelente relatório sobre Moçambique, volume ni;

«Quaisquer que sejam as pautas que na província de Angola se adoptem, não poderão elas ser de tal modo protectoras que consigam aqui o que na metrópole mal se tem realizado, isto é, criar lá industrias novas, cujos produtos aqui possam ser vendidos».

Só a mais completa autonomia administrativa e financeira a podo erguer da desgraçada crise que de há muito a vem torturando; (Apoiados").

Dos erros do passado resultou a situação presente, que nada tem de invejável.

As crises não se podem evitar em absoluto, mas podem minorar-se OB seus efeitos de permanentes, com um conjunto de reformas adaptáveis às condições do meio.

O déficit que apresenta, não obstante a sensível elevação do imposto de cubata, cuja cobrança está calculada para 1917-1918 em 803 contos, ó enorme e atinge a importante cifra de 4:000 contos para uma receita de 2:500 contos e uma despesa de 7:000 contos. Situação 'desoladora e muito para estranhar numa colónia que, sendo das mais ricas, devia ter unia receita superior aos irrisórios 2:500 contos que acusa o seu orçamento para o presente ano económico,—nesta província donde a metrópole podia extrair tanta riqueza.

Angola não pode pagar o que deve, porquanto, devendo mais de 9:000 contos a fornecedores', a subvenção é apenas de 1:000 contos. '

A província precisa de olhar para o futuro; precisa de cuidar a sério das suas receitas j para autonomamente poder fazer face às despesas que tem, para que se não diga ,por mais tempo que Angola é um sorvedouro que só acarreta encargos para a metrópole.

Nos outros países estamos vendo a realização de verdadeiros milagres.

<_ p='p' os='os' também='também' não='não' conseguiremos='conseguiremos' porque='porque'>

E precisamente as dificuldades do presente oferecem um ensejo para realizarmos, nas colónias, e nomeadamente em Angola, uma larga obra de administração, um esplêndido plano de fomento. Ou vencemos as actuais dificuldades ou sós-sobramos como potência colonial,— a terceira,— não obstante todas as espoliações sofridas (Apoiados).

Na gerência da pasta das colónias encontra-se um homem de talento, cheio de fé ardente nos destinos da sua e da nossa querida Pátria, conhecendo bem os problemas em equação.

Nada mais é preciso senão vontade firme, norteada por uma orientação segura.

Que por ela saiba aproveitar o que o nosso ubérrimo torrão de alêm-mar pode dar, em troca de auxílios indispensáveis, para se solverem os encargos de hoje, que O influxo, da guerra.fez agra,var ex* traordináriainente.

Tomemos emenda, Sejamos práticos. É tempo. E preparemo-nos nas angústias do presente para as vitórias do futuro, pois para o futuro devem olhar todos os países; aliás, a .decepção não se fará esperar, por causa das ambições dos Smuths. Desapareceu o perigo alemão, mas surgiu um outro, parece.

Ah l a União Sul-Africana. A pretensão dalguns dos seus homens mais em evidência, sobre uma parte importante das nossas colónias, eis o meu receio, o constante pesadelo do meu espírito. E, certamente, o receio e o pesadelo daqueles que se interessam pelo património ultramarino, à medida que a luta gigantesca progride, na mais terrível guerra conhecida na história.

Os factos falam, infelizmente; Contra os factos não há argúcias que valham. E o grito de alerta foi por mim dado nesta casa do Congresso da Kepública no ano de 1916, pela primeira vez*

Prosseguirei serenamente na exposição.

Na província de Angola, a actual lei do selo é de todo inadequada. Um estudo da matéria para simplificar a legislação existente e torná-la acessível, impõe-se.

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gem a que o Estado não arrecade as receitas que de direito lhe pertencem, como os factos provam a minha afirmativa.

£ Concebe-se, porventura, que a contribuição predial, dos últimos três anos, fosse apenas de 84.4430?

É absolutamente irrisório este rendimento, e ninguém de boa fé se pode convencer que o valor colectável da propriedade rústica e urbana de Angola, apesar de restrita esta contribuição aos concelhos do litoral em virtude do disposto no artigo 2.° da portaria do comissário régio de 11 de Novembro de 1896, seja representada pela anuidade média de 28 contos.

Percebe-se, por acaso, que a contribuição industrial, por licenças, também nos três últimos anos, produzisse somente 368.123&, a saber:

1913-1914 ........ 132.635-5

1914-1915 ........ 103.567ô

1915-1916........131.921£

As flutuações deste rendimento são devidas principalmente à confusa regulamentação deste imposto, obedecendo o seu lançamento a bases que não merecem, fé, o os processos que o regulamento dá para se conhecer do exercício da indústria são complicados e ineficazes, e desta complicação necessariamente resulta à Fazenda Nacional não conhecer a verdade caiando tem de lançar a contribuição.

^ Que, no mesmo período, a coatribuição de juros rendesse unicamente 5.496022?

f Que o imposto do selo não excedesse a 265.762$?

Na liquidação e cobrança da contribuição de registo por título gratuito e oneroso, observa-se o regulamento de 4 de Dezembro de 1902, modificado quanto à taxa da contribuição por título oneroso pelo decreto de 29 de' Agosto de 1906.

Sendo as matrizes prediais a base de incidência para a liquidação destas contribuições, ressentem-se dos defeitos da matriz, ou das avaliações quando têm de ser feitas, pois o vulgar é atribuir-se sempre às propriedades um valor inferior ao rial, como, com toda a competência, escreveu o distinto inspector superior de Fazenda de Angola, António de Meireles, no sen relatório sobre o projecto de

orçamento geral de receita e despesa para o ano económico de 1917-1918.

É claro, pois, que esta situação é insustentável, e quo a matéria tributária está longe de alcançar o seu termo razoável. •

Reclamo toda a atenção do Governo para a situação dos ordenados, porque, no ultramar há filhos dilectos e enteados desprotegidos na classe dos funcionários públicos.

Não há nem pode haver razão plausível para as gratificações de exercício em Angola serem mais reduzidas do que em Moçambique. Contra esta flagrante injustiça protesto energicamente, como Senador por Angola e ainda na minha qualidade de antigo magistrado" nessa província.

^Porque não se faz a equiparação?

Considero, Sr. Presidente, de toda a equidade cue custeando o Estado as despesas de transporte com a família do empregado público quando se dirige para as colónias, deve custear igualmente estas despesas quando o funcionário regresse no gozo de licença graciosa.

£ Porque o regime de excepção a favor dos novos auditores fiscais, seus adjuntos e inspectores, não obstantes os magníficos rendimentos que a lei lhes dá?

,jOu será por eles receberem tão-chorudos vencimentos?

A vida do colono e do indígena está sujeita a mil acidentes, que uma melhor organização do serviço de saúde poderia evitar, dotando os hospitais do Estado com todas as exigências médicas e cirúrgicas modernas, e outras medidas recomendas pela sciência e aconselhadas pela prática, pois nem ao menos os hospitais das capitais estão em condições de poderem, satisfazer às mais elementares exigências médicas e cirúrgicas, apesar do pessoal ser muito apto, porquanto o quadro de saúde é, em grande maioria, constituído por facultativos distintos.

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Exceptuando o caminho de ferro de Ben- í guela, nenhum outro tem a província que l ofereça sérias garantias de transporte. J E é necessário, que se estude por uma forma, quanto possível, definitiva, quais as vias de comunicação que há a estabelecer, quais os ramais ferro-viários que há a construir, e quais os meios de viação acelerada que há a adoptar.

Sobre o resgate das linhas férreas de Ambaca, espero que esse importantíssimo problema não será descurado pelo actual Governo, e espero que na próxima Sessão Legislativa esta questão será debatida no Parlamento.

Relativamente à instrução pública, pretendo, como é de toda a justiça, a criação dum liceu nacional em Loanda e em Lou-renço Marques, e o ensino da 6.a e 7.a classes nos liceus de Nova Goa e Macau.

Os nossos domínios de alêm-mar, acham--se invadidos por missões estrangeiras à sombra das actas das conferências de Berlim e de Bruxelas e do convénio de 1891 com a Gran-Bretanha.

Cada um destes missionários, não haja ilusão a tal respeito, é um elemento perturbador do nosso sossego, um instrumento de propaganda e descrédito.

E com imensa mágoa noto que contra 54 missões estrangeiras em Angola, só existem 2 missões portuguesas, e estas mesmo lutando com toda a sorte de dificuldades financeiras.

Em Moçambique temos 17 missões prestando bons serviços; e não obstante, ninguém as atende nas suas justas reclamações.

É triste que assim suceda, quando, às vezes, tanto dinheiro se dispende inutilmente.

Não posso compreender a razão porque se excluiu rda dotação orçamental o Padroado da índia, tam imenso e tam importante, sustentáculo da nossa influência política nos confins do Oriente, onde foram tam grandes, tam poderosos.

Oxalá que o Grovêrno da República em breve não se arrependa desse erro, erro que reputo grave, para o prestígio do nosso domínio na índia.

Chamo a atenção do digno Ministro das Colónias para o caminho de ferro de Mormugão, porque só com uma hábil diplomacia se poderá pôr termo a tam grave situação.

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Desejo, como português, que se trate com muito critério e ponderação da convenção assinada com o Transval em 1909.

O ano de 1919 não vem longe; e o Gabinete do meu país sabe bem qual o melindre e qual a delicadeza desta questão, agora bastante agravada com a conquista da Bothalandia, e portanto quais as futuras complicações que destes factos podem advir para a vida económica da província de Moçambique. Urge, pois, prepararmo-nos para a situação que for criada pelo futuro tratado da paz.

Recomendo, também, o problema da delimitação da província de Macau, cuja situação financeira é extraordinariamente próspera, da questão do caminho de ferro e das relações comerciais com a China.

Não se esqueça o Governo de que os diplomatas chineses são muito argutos, e que os nossos, em regra, pouco subtis. E é eloquente o que sucedeu com as missões diplomáticas que enviámos ao Extremo Oriente em 1900, quando da revolta dos boxers, e mais tarde no ano de 1910.

Nada conseguimos de útil para o país.

Devemos olhar com mais carinho para a[longínqua, mas riquíssima colónia de Timor/ bem digna de melhor sorte, pois é aterrador o seu déficit orçamental.

Ecompezarque ainda vejo em assuntos de administração ultramarina, manterem--se os ruins processos doutros tempos, isto é, tirar às colónias o melhor dos seus rendimentos. Não. Não pode ser. Semelhante critério, repelido por todos os publicistas, não se ajusta ao fim da lei — administração da organização financeira e às conveniências do país.

Justas razões têm, pois, os povos de S. Tomé e de Macau, nos seus frequentes protestos contra os frequentes saques feitos nos cofres provinciais.

Os Governos devem sempre atender às reclamações das colónias e dos colonos.

Nunca os Governos Espanhóis souberam compreender as necessidades das reformas a conceder às suas possessões, e o resultado viu-se pela perda de quási todo o seu poder territorial, esboroando-se com tais erros todo o seu vasto império.

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República realizasse uma grande obra, uma completa transformação no ultramar, e tem obrigação de fazer porque tem vasto campo para poder operar. (Apoiados).

O Governo republicano tem graves res-ponsabilidades, podendo bem dizer-se que a República ó para muitos portugueses a decisiva esperança. Se ela fracassar por culpa dos dirigentes, todos suporão o que acontecerá, desd >, que o progresso do país ó incompatível com a monarquia.

Que Portugal seja nisto a grande nação modelar, e seria, realmente, um grande exemplo a dar ao mundo. (Apoiados).

A matéria é vasta e complexa. Muito ficou por expor. Um desenvolvimento especial necessitava evidentemente ser feito, para que tenha eco no país o modo como devem ser tratados alguns problemas que é indispensável ser conhecidos.

A hora porém vai adiantada, e, por isso, dou nesta sessão legislativa, prorrogada já portrês vezes por causa dos orçamentos, e estão votados apenas três, apesar de estaivaos em Agosto, por concluídas estas ligeiras considerações, fazendo votos para que o Governo atenda a todos os assuntos que interessam à vida financeira e económica das colónias, a ciais importante das quais tenho a honra de representar no Senado da República.

• Vozes :—Muito bem. Muito bem.

O Sr. Rodrigo Álvares Cabral:—Mando para a Mesa, por parte da comissão do Orçamento, o parecer sobre o Orçamento do Ministério do Fomento.

O Sr. Gonçalves Pereira: — Como relator do Orçamento das Colónias, como Senador colonial e como português, interessam-me sobremaneira todas as nossas colónias; mas há duas que me interessam particularmente Macau e Timor; a primeira porque dela sou representante no Senado, a segunda porque a represento no Conselho Colonial.

E é sobro estas duas colónias que eu vou fazer algumas considerações.

Um dos pontos mais importantes que vejo no Orçamento~do Ministério das Co* lónias, é o que se refere aos deficits das nossas províncias ultramarinas.

Folguei ouvir o discurso do Sr. Senador Arez, e folguei tanto mais por ver que jS. Ex.a se referiu particularmente à

Diário das Sessões do Senad

província de Angola, e de passagem à de Macau, e fê-lo por uma tal maneira, que eu o não poderia fazer, visto que me falham muitos dos elementos de que S. Ex.a dispõe. As considerações que vou fazer limitam-se, em face deste projecto, à província de Macau e à de Timor. Principiarei pela de Timor. Como justificação do déficit da província de Timor, diz o ilustre relator da Câmara dos Senhores Deputados, o seguinte:

Leu.

E espantoso que Timor tenha um déficit tam grande como aqui se apresenta. Para se justificar utu pouco esse déficit, eu vou fazer, em breves palavras, a história de Timor desde o ano em que conheci aquela colónia; e, dum modo geral, direi quais as medidas que se me afiguram mais eficazes para o diminuir. E faço-o tanto de melhor vontade quanto ó certo que tenho deveres a cumprir para com aquela colónia.

Eu conheço Timor desde 1893, e confesso que nunca tive unía 'impressão tam dolorosa como foi aquela que sofri ao saltar em terra naquela colónia.

Timor era um burgo com casas de madeira, cobertas de palha e zinco, umas çlo Governo, que serviam de edifícios públicos, e outras onde residiam os principais funcionários da colónia, desde o juiz de direito ao último fzncionário civil, burgo rodeado pelo mar e por um pântano enorme.

Não havia mais nada. Só vi miséria e decadência por toda a parte. E, no em-tanto, há muitos anos que possuíamos aquela colónia, sobre a qual tem passado dezenas de governadores, sem que nada se tivesse feito em seu benefício.

O que se fazia?

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mantendo-se na metrópole. Solicitava-se o cargo para alcançar o posto.

Compreende-se, portanto, que esses indivíduos, não direi todos, mas quási todos, que obtinham a nomeação de governador de qualquer colónia, e muito principalmente quando fossem para as colónias mais longínquas, o que queriam era ver passado o tal período dos três anos; e, tranquila e comodamente, aguardavam o seu terminus.

Não faziam cousa nenhuma! Não queriam incómodos! E, Sr. Presidente, esta atitude não desagradava ao Governo central, pois no Terreiro do Paço só desejavam que das colónias nada lhes fosse pedido, embora esses pedidos fossem em bo-nefício das mesmas colónias.

Nestas circunstâncias não-poderá causar estranheza que eu declare que há trinta e dois anos, quando comecei a percorrer as nossas colónias, as visse todas em lastimoso estado.

Na colónia de Timor não fiavia déficit, é facto, mas tambôrn não havia obras: nem de fomento, nom dê melhoramentos. Absolutamente nada.

Mas, Sr. Presidente, veio um ano em que Timor, então ligado a Macau, teve um déficit de 7:000 patacas, ou sejam uns 4 contos, aproximadamente, que foram pagos por Macau.

Fez-se na colónia um grande alarme sobre o facto de se apresentar um tam elevado déficit, como era aquele que eu já indiquei.

No ano seguinte o governador concluiu o seu tempo e saiu. Foi nomeado outro governador — Sr. Celestino da Silva — que desde logo se viu a braços com perturbações graves em Timor. Querendo reprimi-las, organizou forcas, que foram, todavia, infelizes na sua acção; sofreram o maior desastre que até então haviam tido as nossas armas,- pois que, além de terem morrido muitas praças, foram trucidados nove oficiais. Esse desastre ficou bem conhecido na história pelo nome de «desastre do capitão Câmara».

Timor começou a sofrer as consequências daquele desastre. A agricultura não produziu nada. Os pretos fugiram. Os impostos não foram pagos. O déficit começou, pois, a avolumar-se.

No ano seguinte o governador entendeu que devia vingar o desastre ocorrido.

no ano anterior e para isso requisitou forças da metrópole. Essas forças foram, tanto daqui, como de Moçambique.

O desastre foi vingado. Mas, Sr. Presidente, a colónia ficou com um grande déficit, não só por causa da despesa com aquelas forças, mas ainda por causa de continuar a crise económica e financeira. Esse ilustre governador entendeu depois que não era com. guerras que se governava a colónia de Timor.

Estabeleceu, então, um plano de administração. Um dos principais pontos desse plano, foi o pedir ao governo central que concedesse autonomia ao distrito de Timor. O governo concedeu essa autonomia em 1896, autonomia que aumentou enormemente o déficit.

Para os diferentes serviços foram nomeados muitos funcionários idos da metrópole, cujos vencimentos, passagens e ajudas de custo agravaram muito as despesas, que não eram cobertas com as receitas da colónia. Macau concorria com 60.000 patacas para essas despesas, mas não chegavam.

Até lá, Sr. Presidente, os serviços em Timor faziam-se de uma maneira muito simples e económica.

Na parte militar, eram, como V. Ex.a bem sabe, os oficiais e praças da guarnição de Macau que faziam destacamentos para Timor e iam com vencimentos muito pequenos.. Apenas recebiam além dos vencimentos que percebiam em Macau uma pequena gratificação ; e o que é certo é que o serviço fazia-se de uma maneira regular.

Os serviços de fazenda eram também feitos por funcionários de Macau que eram para ali destacados e apenas recebiam alem do seu ordenado a gratificação de residência.

Tudo isso mudou. As forças passaram a ir da metrópole. Os oficiais iam ao abrigo duma circular, por virtude da.qual recebiam, só para ajudas de custo 500$; os sargentos venciam quási tanto como um capitão de infantaria. Tudo isto era pago por Timor.

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Eu não quero que o Senado imagine que estou a fazer uma crítica à má administração do governador de Timor.

O governador, durante a sua administração, prestou ali importantíssimos serviços e ligeiramente lhes digo que, o primeiro e mais importante serviço que fez em Timor, foi a política de aproximação entre os indígenas e os portugueses; e tanto assim que desde que aconteceu o desastre do capitão Câmara e a vingança desse desastre, em Timor poucas ou nenhumas foram as perturbações com o gentio.

Ele edificou casas para funcionários, mandou abrir estradas que hoje chegam a Dilly, saneou pântanos, deixando Timor de ser um cemitério.

Hoje vai-se melhor para Timor do que para Angola ou Moçambique. Fez obras importantíssimas, que custaram muito dinheiro; mas fê-las; sé não reduziu despesas, produziu benefícios materiais incalculáveis, como canalização e abastecimento de água oin Dilly, construção do hospital de Lahane, ponte de desembarque, etc., etc.

O Sr. Silva Gouveia: — Mas como recompensa de todos esses serviços deram--Ihe a demissão.

O Orador: — O que é facto é que a administração de Celestino da Silva, que muitos alcunharam de esbanjadora, foi proveitosa para Timor e que muitos funcionários civis e militares que ali serviram hão de conservar por muito tempo na sua memória e no seu coração o nome de Celestino da Silva.

Os militares, principalmente, porque lhes deu residência nos comandos militares, de tal maneira confortáveis com não as vi em parte nenhuma. •

O Sr. Celestino da Silva fez grandes melhoramentos, mas apesar disso o déficit cresceu sempre, porque esses melhoramentos foram mais materiais do que de fomento. Mas serviram de muito, para se dar início a outras medidas de progresso da colónia.

Foram estas as causas desse déficit, í Quais os meios de o evitar?

Parece-me que a atenção dos governadores deve convergir para medidas de fomento. Timor tem todas as condições

Diário das Sessões do Senado

para vir a ser uma colónia muito produtiva.

Timor pode desenvolver-se bem, se olharem para ela com dedicação.

A única dificuldade é que fica muito longe da metrópole, mas essa dificuldade pode remediar-se, estabelecendo carreiras de navegação e facilitando os transportes de mercadorias. Timor pode e deve produzir muito.

Uma outra medida que eu lembro a S. Ex.a o Sr. Ministro das Colónias é a organização de forças militares ultramarinas.

Esse serviço podia ser excelentemente feito, como dantes, por destacamentos idos de Macau, sem necessidade de irem forças da metrópole. A economia seria enorme e evitar-se-ia a desnacionalização de Macau.

Os filhos de Timor e Macau também poderiam ser empregados, com vantagem', nalguns serviços, com o que ,o Estado muito teria a lucrar, pois não seria preciso irem tantos empregados da metrópole para lá, o que acarreta .uma tam grande despesa.

Eu não compreendo 'que em Timor pudesse ser bem cabida uma Imprensa Nacional, assim como uma marinha colonial sem navios. Tudo isto, eliminado, e reduzidas muitas outras despesas, concorreria para a diminuição do déficit.

Quanto a Macau, esta colónia não teve déficit, antes, pelo contrário, apresenta um saldo espantoso, devido aos exclusivos que no período, durante o qual foram arrematados, têm produzido extraordinariamente — e eu felicito-me de ter concorrido, em parte, para a sua efectivação, porque fui aquele que mais gritou, deixe--me assim dizer, para que se não tivesse feito a célebre prorrogação do exclusivo do ópio, que estava então arrematado por 85 mil patacas anuais, e passou a render • l milhão e 56 mil patacas por ano; sem faiar nos outros exclusivos. Como o Senado vê, Macau tem hoje um rendimento fabuloso.

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Sejsão de? dt Agoste de 19&7

Isto não é unia fantasia da minha parte. ! Quando eu, em 1907, regressei de Macau para Lisboa, ao sair desta colónia, dizia--me o governador que Macau produzia muito dinheiro, que tinha mandado naquele ano 300 mil patacas para Timor, que tinha mandado vários saques, para Lisboa, de cerca de 40 e 50 contos cada um, para- irem para Angola, 'que tinha feito todas as despesas da colónia, e ainda tinha deixado em cofre 240 mil patacas.

Pois, Sr. Presidente, de 1908 para 1909 houve um déficit orçamental de 48 contos, porque os arrematantes do ópio e doutros exclusivos combinaram não ir às arrematações, resultando daí serem os exclusivos arrematados pelo preço que eles quiseram.

• Uma vez acabado o prazo do exclusivo quiseram fazê-lo prorrogar, o que não conseguiram, vindo a render l milhão e 56 mil patacas anuais, que é o que está dando hoje.

Portanto, Sr. Presidente, eu pedia para que as atenções dos governadores de Macau derivassem um pouco para as fontes de receita dessa província, que são impor-.tantes.

Eu sei que as cartas orgânicas das colónias determinam, num dos seus artigos, que as colónias — creio que para Macau é de 75 por cento — devem reservar das suas receitas uma parte para quaisquer contratempos que possam sobrevir. Mas isso não basta; e é preciso que não estejamos fiados na letra desse artigo, que uma má administração, ou por circunstâncias fortuitas que aparecem, podem deixar de existir.

Convinha, pois, muito que na colónia de Macau se estabelecessem fontes de receita mais estáveis, em bases seguras.

Outra questão importante é a que se refere no primeiro capítulo, à delimitação das, fronteiras.

E uma questão que pode ser grave para nós.

Não devemos olhar a conquistas; antes essa delimitação deve ser feita de acordo entre os governos português e chinês. .

Nem até vejo razão para se fazer questão da posse dalgumas ilhas que rodeiam Macau, que nada valem, nem para nós -nem para os chineses.

£ Assim para que nos serve a ilha da Lapa?

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Para defesa de Macau? Não. Com os elementos de destruição modernos, um navio de guerra em Hong-Kong, destruiria Macau em poucos momentos.

«;E para que nos servem as ilhas de D. João e Voucame?

Quási para nada. E no emtanto o seu litígio tem prejudicado o problema da alimentação de Macau.

Devemo-nos conservar no statu quo ante que está estabelecido no tratado luzo-chinês de 1887.

Fala-se na ilha da Lapa por causa do posto interior, que é importante para Macau.

Mas, então conservemos o porto do interior de comum acordo com 'os chineses, que estes nenhuma questão por isso nos levantarão, visto que a ilha da Lapa nunca nos será cedida, e o litígio dela pode prejudicar tudo.

Ainda sobre Timor, devem os seus governadores olhar com atenção para o desenvolvimento do seu solo.

Sobre Macau é conveniente que o Sr. Ministro das Colónias, atenda ainda ao seguinte facto.

Quando em 1889 fui para Macau, havia ali uma população macaista enorme.

Pois, hoje, pelo último recenseamento, calcula-se em õ por cento a população portuguesa, na qual se compreendem militares, funcionários, metropolitanos, etc.

Esta baixa na população macaista é devida a que os governos da metrópole não se terem utilizado dos elementos naturais da colónia para os empregos da província, elementos que são muito competentes, muito inteligentes e muito disciplinados preferindo-se gente da metrópole que com dificuldade vivem na colónia, causando este facto a saída dos macaistas 'para fora da colónia em procura de meios de vida, que ali lhes não são dados, determinando uma assustadora desnacionalização de Macau.

Termino aqui as minhas considerações sobre Macau e Timor.

Poderia também dizer alguma cousa sobre as outras colónias, mas como elas têm nesta Câmara os seus representantes, a eles deixo a missão de dizerem alguma cousa, que de certo muito melhor o farão do que eu o posso fazer.

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O Sr. Paulo Lobo: — Refere-se a ama das lacunas que existe no orçamento — a falta de referência ao Padroado do Oriente, acerca do qual já há quatro meses o orador teve ocasião de elucidar a Câmara. Chamou então a atenção dos poderes públicos para a situação actual desse sustentáculo da nossa influência no Oriente, fazendo ver que a sua extinção acarretaria a perda do nosso domínio da Ásia, que de muitas honras cobriu a Pátria, sustentando que as despesas feitas com ele deviam incidir sobre o orçamento da metrópole, como despesas de soberania e que afinal, não obstante tudo isto, todo o dinheiro despendido voltava em moeda sonante para Portugal.

É este um assunto de magna importância acerca do qual o orador muito desejaria que o Sr. Ministro das Colónias apresentasse um projecto de lei, fundamentado em minucioso relatório em que se regulasse de vez essa velha questão (jue merece um atento exame.

No orçamento anterior aparecia uma verba de 5.000$ para missões civilizado -ras. Essa verba, já de si extremamente escassa para o fim que se tinha em vista ao criar essas missões não aparece no actual orçamento.

No capítulo 2.° aparece a descrimina-ção das despesas a fazer com as duas direcções gerais do Ministério das Colónias. No desenvolvimento dessas despesas vê-se que a organização do pessoal dessas duas direcções subsiste a mesma dos orçamentos anteriores.

Ora estando já promulgadas as cartas orgânicas de quási todas as províncias ultramarinas, cabe preguntar se, estando para curto prazo a autonomia administrativa e financeira dos nossos domínios àe alêm-mar, deve aceitar-se agora como boa uma organização interna do Ministério, feita sobre um critério de centralização nada harmónico com os princípios que se estabelecem nas leis de que as cartas orgânicas são o corolário forçado.

Devendo, por isso. o Ministério ter de sofrer uma profunda remodelação nos seus quadros e serviços, pareceria que essa reorganização devia preceder o orçamento e, quando aprovado o orçamento,

nesta parte, reflectir o que se tivesse a esse respeito.

O Sr. Ministro das Colónias, decerto, reconhece a justiça do meu arrazoado a este respeito, e por isso certo estou de que em breve esta Câmara terá o prazer de apreciar,, apresentada por S. Ex.a, com a competência que eu me apresso a reconhecer-lhe, a reforma do seu Ministério.

Na opinião do orador também devia ser aumentado o subsídio ao Instituto Ultramarino, elevando-lhe a verba inscrita de 18.000$ para 25.000$. Esta instituição luta com dificuldades para bem cumprir a sua missão, devido à estreiteza dos seus recursos.

Também vê inscrita no capítulo 20.° a verba de 300$ para a comissão de cartografia para material, publicação e expediente. Esta importância é, no meu entender, insignificante. Estando por fazer o estado cartográfico de quási todas as nossas colónias, não é com essa verba que se pode ultimar um trabalho de tanta magnitude. Só o desenho duma das nossas grandes províncias absorveria essa importância, se todo o trabalho preliminar estivesse feito e bastasse apenas transcrevê-lo para uma carta.

E o orador julga esse trabalho um dos mais importantes e mais urgentes, merecedor de que a ele sé dediquem todos os cuidados, carecendo por isso de ser dotado com os fundos necessários para ser levado a cabo com êxito.

Além disso, p-ede a atenção do Sr. Ministro para o caminho de ferro de Mor-mugão, para. cujas despesas está inscrita a verba de 300.000$, e o orador lembra--se de que ainda há bem. pouco tempo S. Ex.a pedira um. crédito de 100.000$. Uma boa diplomacia para as companhias inglesas poderia pôr termo a .essa melindrosa situação, que representa uma intensa sangria no nosso Tesouro público.

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Setsão de 7 de Agosto de tò!7

minação das despesas, velando por instituições e necessidades que bem carecem de apoio e valimento.

O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taqui-gráficas.

O Sr. Ministro das Colónias (Ernesto de Vilhena): — Folga em constatar, tanto no Senado como na Câmara dos Deputados, que as1 questões coloniais se têm debatido sempre por forma levantada e proficiente.

Sente, contudo, que elas não sejam debatidas em mais ocasiões, no que'haveria a maior vantagem.

O Ministro, por muito que queira, não pode fazer o necessário» se não for apoiado pelas duas casas do Parlamento.

Os oradores que trataram das várias questões coloniais referiram-se especialmente a diversas questões.

Não poderá dizer tudo que pensa sobre essa matéria, mas fará sobre ela algumas rápidas considerações.

Quanto a Angola, assunto tratado pelo Sr. Arez, que se ocupou da necessidade de votar as cartas orgânicas, dirá que tem nisso o maior empenho, mas a promulgação dessas cartas exige certos trâmites, indispensáveis para que esses diplomas dêem o maior proveito possível.

Algumas têm sido promulgadas, estando outras quási prontas para serem promulgadas, tendo o orador o maior empenho em que rapidamente isso se faça, para o desenvolvimento do problema colonial de 1909, para cuja realização tem trabalhado.

Referindo-se à complexidade dos assuntos a tratar no seu Ministério, ao movimento quási febril que aí existe diariamente, passa a referir-se à dificnldade que hoje representa o Qovêrno de Angola, cujos múltiplos interesses e dificuldades governativas exigem à frente um homem de espírito liberal, critério e inteligência.

E difícil de resolver o problema de Angola, que é grave, não por culpa da República, nem da monarquia, mas de todos: tem de ser principalmente resolvido pela boa administração local.

No capítulo da manutenção da soberania de Angola tem-se cometido largos erros.

Angola está ainda no período da conquista. Nas guerras que temos • tido com

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os indígenas tem-se gasto rios de dinheiro e estamos sempre a recomeçar. 'Metade da província está ainda por ocupar. Muitas regiões estão desguarnecidas, o que pode dar lugar a consequências graves.

E necessário ultimar definitivamente a pacificação de Angola e, para isso, têm de ser reformados os processos até agora adoptados.

O território da província de Angola é imenso, de modo que as forças que são enviadas a guarnecê-lo têm de se fragmentar tanto que fácil é serem trucidadas por ocasião de qualquer revolta indígena.

Entende que é indispensável organizar quatro companhias de brancos munidas de metralhadoras e de modo a exercer uma influência mais intensa sobre o nosso território do que a que se tem exercido até agora. Essas quatro companhias estacionariam em pontos escolhidos e saudáveis como, por exemplo, os planaltos e o Bailundo. Está convencido de que a simples presença destes núcleos de força e de ocupação conteriam em respeito os indígenas.

A ocupação militar deve exercer-se intensamente para ser rápida e dar lugar imediatamente ao regime da administração civil.

Incumbir toda esta obra a um governador é impossível. Pensa o orador, portanto, que, ao lado desse governador, deve haver durante dois, três ou quatro anos um intendente de ocupaçfio, oficial que possa, em qualquer ocasião, desviar-se até as fronteiras mais longínquas e exercer em toda a província uma acção directa,, intensa e rápida que o governador não pode nunca exercer.

O problema das finanças de Angola é difícil. É necessário, por parte da metrópole, realizar um esforço enérgico que tenha como resultado o pagamento da dívida de Angola e o fornecimento dalguns milhares de contos para ali se iniciar uma vida nova.

Isto, porém, não depende só do Ministério das Colónias, e a metrópole encontra-se em dificuldades com respeito a fundos.

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Diário das Sessões do Senado

Preciso é realizar o barateamento dos fretes, estabelecer a regularidade dos transportes e fazer a revisão das pautas, sem deixar de fazer funcionar o regime da carta orgânica. '

Quanto a medidas de fomento, não vê facilidade de as desenvolver emquanto durar a guerra europeia.

Não o alarma o déficit da nossa colónia de Timor, porque se -trata de território de grande riqueza.

Kelativamente a Macau, a entrada da China- na guerra europeia traria vantagens para a resolução dos respectivos problemas.

Eespondendo às considerações do Sr. Paulo Lobo, alude ao caminho de ferro de Mormugão, e diz ser necessário reorganizar o Mnistório das Colónias, como complemento das cartas orgânicas. Considera indispensável essa reorganização, por forma que o Ministro possa estar em contacto directo com todos os serviços. En-

tende'que devem ser criados novos serviços, como os de agricultura, estatística, geográficos, arquivos e publicações, como entende quo deve ser reformado o Conselho Colonial.

Cita a convenção contratual de 1909, para a qual já chamou a atenção do Sr. governador de Moçambique, e termina agradecendo as palavras amáveis que lhe foram dirigidas e dizendo que promete dar o melhor do seu esforço e dedicação pelas colónias, para o que necessita de apoio e confiança.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taqui-gráficas..

O Sr. Presidente:—A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia e mais a proposta n.° 632.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

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