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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
1918-1919
SÃO N.° 15
EM 30 DE JANEIRO DE 1919
Presidência do Exmo. Sr. Zeferino Cândido Falcão Pacheco
Secretários os Exmos. Srs.
Luís Caetano Pereira
Guilherme Martins Alves
Sumário.— A sessão abre às 14 horas e 35 minutos, com 26 Srs. Senadores presentes. Aprova-se a acta e lê-se o expediente. Antes da ordem, falam os Srs. João José da Silva, sôbre a constituição da comissão de infracção e faltas; João José da Costa, que lembra que se altere a comissão de petições; Manuel Ribeiro do Amaral, que saúda o povo de Lisboa pela atitude por êle tomada por ocasião da revolta monárquica; Severiano José da Silva, que depois de igual saudação se ocupa largamente da última reforma das contribuições industrial e de sumptuária; Machado Santos, que apresenta um projecto de lei destinado a castigar todos os que se envolvam em conspirações contra a República; e Pinto Coelho, que presta a sua homenagem aos ex-Presidentes Roosevelt e Rodrigues Alves, há pouco falecidos.
Na ordem do dia, o Senado manifesta o seu sentimento pela morte de Teodoro Roosevelt e Rodrigues Alves, respectivamente ex-Presidente dos Estados Unidos da América e Presidente eleito dos Estados Unidos do Brasil. Falam, alêm do Presidente, os Srs. Castro Lopes, Oliveira Luzes, Machado Santos, Queiroz Veloso, Carneiro de Moura e João José da Costa. São aprovados os votos de sentimento propostos pela Mesa, encerrando-se a sessão em seguida. Eram 16 horas e 30 minutos.
Senhores Senadores presentes à abertura da sessão:
Alfredo Monteiro de Carvalho.
Alfredo da Silva.
António Maria de Azevedo Machado Santos.
António Maria de Oliveira Belo.
Arnaldo Redondo de Adães Bermudes.
Artur Jorge Guimarães.
Carlos Frederico de Castro Pereira Lopes.
Cláudio Pais Rebêlo.
Constantino José dos Santos.
Domingos Pinto Coelho.
Francisco Martins de Oliveira Santos.
Francisco Nogueira de Brito.
Francisco Vicente Ramos.
Germano Arnaud Furtado.
Guilherme Martins Alves.
João da Costa Couraça.
João da Costa Mealha.
João José da Costa.
João José da Silva.
João Lopes Carneiro de Moura.
José Epifânio Carvalho de Almeida.
José Júlio César.
José Maria Queiroz Veloso.
José Tavares de Araújo e Castro.
Júlio Dantas.
Luís Caetano Pereira.
Luís Caetano Pereira da Costa Luz (Visconde de Coruche).
Manuel Ribeiro do Amaral.
Mário Augusto de Miranda Monteiro.
Severiano José da Silva.
Tiago César de Moreira Sales.
Zeferino Cândido Falcão Pacheco.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Alberto Correia Pinto de Almeida.
João Viegas de Paula Nogueira.
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Srs. Senadores que não compareceram à sessão:
Adolfo Augusto Baptista Ramires.
Adriano Xavier Cordeiro.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alberto Cardoso Martins de Meneses de Ma sedo.
Alberto Carlos de Magalhães e Meneses.
Alberto Osório de Castro.
Am Içar de Castro Abreu e Mota.
António Augusto Cerqueira.
António de Bettencourt Rodrigues.
António da Silva Pais.
Cristiano Magalhães.
Duarte Leite Pereira da Silva.
Eduardo Ernesto de Faria.
Fernando de Almeida Cardoso de Albuquerque (Conde de Mangualde).
Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.
João Rodrigues Ribeiro.
João de Sousa Tavares.
José António de Oliveira Soares.
José Freire de Serpa Leitão Pimentel.
José Joaquim Ferreira.
José Marques Pereira Barata.
José Novais da Cunha.
José Ribeiro Cardoso.
José dos Santos Pereira Jardim.
Júlio de Campos Melo e Matos.
Júlio de Faria de Morais Sarmento (Visconde do Banho).
Luís Firmino de Oliveira.
Luís Xavier da Gama.
Manuel Homem de Melo da Câmara (Conde de Águeda).
Manuel Jorge Forbes de Bessa.
Pedro Barbosa Falcão do Azevedo o Bourbon (Conde de Azevedo).
Pedro Ferreira dos Santos.
Sebastião Maria de Sampaio.
O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à chamada.
Procede-se à chamada.
Eram 14 horas e 35 minutos.
O Sr. Presidente: — Responderam à chamada 17 Srs. Senadores.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Leu-se a acta.
O Sr Presidente: — Está em discussão a &cta.
Foi aprovada a acta.
O Sr. Presidente: — Fui informado de que se encontra nos corredores da Câmara o Sr. José Vicente Ramos.
Convido, por isso, os Srs. Castro Lopes e Alfredo Monteiro de Carvalho a introduzirem S. Exa. na sala.
Tomou assento o Sr. José Vicente Ramos.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se o Expediente
Telegramas
Do Rei da Servia, agradecendo o telegrama de saúdação do Senado pela vitória dos aliados.
Para a Secretaria.
Do Senado da República Argentina, congratulando-se pela vitória dos aliados. Para a Secretaria.
Do Sr. Senador Baptista Ramires participando não poder comparecer à sessão.
Para a comissão de infracções e faltas.
Ofícios
Da Associação de Classe dos Trabalhadores de Teatro, comunicando haver exarado na acta um voto de sentimento pela morte do Sr. Presidente Sidónio Pais.
Para a Secretaria.
Do Ministro do Comércio, comunicando achar-se habilitado a responder à interpelação do Sr. Francisco Martins de Oliveira Santos.
Para a Secretaria.
Da Sociedade Nacional de Belas Artes, enviando 50 bilhetes de convite para a 4.ª exposição de aguarelas e desenhos.
Para a Secretaria.
Justificação de faltas
O Sr. Senador Sequeira participa não poder comparecer às sessões do Senado por motivo de doença.
Para a comissão de infracções e faltas.
Os Srs. Senadores Luís Firmino de Oliveira e Pereira Barata comunicam, por
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telegrama, não puderem comparecer às sessões do Senado.
Para a comissão deainfracções e faltas.
O Sr. Senador José Novais da Cunha comunica ter faltado às sessões do Senado por motivo de doença.
Para a comissão de infracções e faltas.
O Sr. Senador Visconde de Coruche participa ter faltado ás sessões do Senado por motivo de doença e dificuldades de transportes.
Para a comissão de infracções e faltas.
Pedidos de licença
De vinte e cinco dias, para se ausentar para o estrangeiro, do Sr. Senador António Maria de Oliveira Belo.
Do Sr. Senador Afonso de Melo, por motivo de doença.
Do Sr. Senador Eduardo de Faria, trinta dias, por motivo de serviço público.
Constituição de comissões
O Sr. Senador Castro Lopes comunica achar-se constituída a comissão de verificação de poderes, que escolheu para secretário o Sr. Senador Alfredo Monteiro de Carvalho, elegendo-o a êle presidente.
Para a Secretaria.
Pedido de documentos
Insto pela remessa, pelo Ministério das Subsistências e Conselho de Administração dos Caminhos de Ferro do Estado, das informações que, com urgência, pedi na sessão de 8 de Janeiro dêste ano, em documento que, conforme averiguei, foi logo enviado à instância competente, pela secretaria do Senado.— O Senador, Artur Jorge Guimarães.
Para a Secretaria.
Comissão de petições
Fica assim constituída:
Fernando de Almeida Cardoso de Albuquerque, Francisco Vicente Ramos, João José da Costa, João da Costa Mealha e Júlio de Campos Melo.
Projectos de lei
Do Sr. Senador Adriano Xavier Cordeiro, sôbre o casal de família.
Para as comissões de legislação civil, agricultura e finanças.
Do Sr. Senador Manuel Ribeiro do Amaral, sôbre o património do pessoal empregado no comércio.
Para a comissão de legislação.
Do Sr. Senador Machado Santos, instituindo várias medidas defensivas da República,
Para a comissão de legislação civil.
O Sr. Presidente: — Existindo na Mesa cartas de vários Srs. Senadores, que não podem comparecer às sessões desta Câmara, e havendo uma resolução do Congresso, do 29 de Maio de 1913, que diz que as votações são válidas desde que estejam presentes metade e mais um dos Srs. Senadores, em exercício, e estando presentes, nesta ocasião, 30 Srs. Senadores, entendo que esta Câmara pode deliberar, visto o quorum ser de 29.
Assim foi resolvido.
O Sr. João José da Silva: — Sr. Presidente: pedi a palavra para comunicar à Mesa que o Sr. secretário da comissão do regimento, infracções e faltas, Sr. António Cerqueira, não pode comparecer á sessão, por incómodo de saúde, sendo natural que tenha de faltar a outras sessões.
Nestas circunstâncias, é provável que essa comissão não possa funcionar sem que a ela seja agregado um outro Sr. Senador.
Alêm disso, a comissão compõe-se apenas de três vogais, e pode acontecer que dois dêles não estejam habilitados a assinar quaisquer pareceres, por as suas opiniões serem contraditórias, o que torna impossível a obtenção de maioria.
Lembrava, portanto, que à comissão citada fôsse agregado o Sr. Senador Carneiro de Moura, não obstante S. Exa. já estar sobrecarregado com outras comissões.
Creio, porêm, que êsse nosso colega não se recusará a assumir mais êsse encargo.
Pôsto à discussão o alvitre apresentado pelo orador, foi aprovado.
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O Sr. João José da Costa: — Sr. Presidente: pedi a palavra para comunicar a V. Exa. e à Câmara que a comissão de petições não tem podido reùnir. E proponho, por êsse motivo, para serem agregados a mesma comissão os Srs. Nogueira de Brito e Arnaud Furtado.
Consultada a Câmara, foi aprovada a proposta.
O Sr. Manuel Ribeiro do Amaral: - Antes de entrar no assunto para que expressamente pedi a palavra, permita-me, Sr. Presidente, que chame a atenção da Câmara para factos que no actual momento estão ocorrendo.
Nesta hora amargurada alguma cousa é preciso lembrar; assim quero referir-me à atitude mantida pela população de Lisboa por ocasião do conflito sucedido há dias nesta cidade, e desejo citar principalmente as classes populares, que, entregues a si mesmas, poderiam talvez, deixando-se arrastar por paixões perigosas, ter procedido de modo bem diverso daquele que é conhecido de nós todos. (Apoiados).
Congratulo-me, na qualidade de representante dessas classes, pela nobreza e patriotismo com que e as se têm manifestado, não tendo praticado nem um só acto de represália, o que as torna dignas de todo o louvor. (Apoiados).
E assim que o povo se nobilita, nobilitando o país. Congratulando-me, pois, com semelhante facto, espero que a Câmara me acompanhe o faça consignar na acta desta sessão um voto de louvor às referidas classes pelo alto exemplo de abnegação e patriotismo que deram.
Vozes: — Muito bem. Muito bem.
O Orador: — Não é necessário fazer a declaração que a Câmara vai ouvir e que vem a ser a de que hoje, como ontem, em política sou perfeitamente independente, não estando filiado, nem agora, como Senador, nem antes de o ser, em qualquer partido político. A minha política resume-se em desejar o bem da minha pátria. Aqui sou um Senador da República que não tem partido, continuando a ser independente. É preciso que isto se acentue bem!
O fim principal para que pedi a pala-var não se refere só às cousas políticas,
porque contende tambêm com o problema da ordem pública, que até hoje se não tem procurado atacar de frente e resolver de vez. A principal causa das lutas entre nós vem da errada compreensão dos direitos e deveres sociais, especialmente por parte de duas classes preponderantes: a que representa o trabalho e a que representa o capital. E da luta sem tréguas destas duas classes que se origina o mal-estar de que enferma actualmente a sociedade.
No desejo de concorrer para a resolução dêste problema, eu, o menos competente do todos, vou mandar para a Mesa um projecto de lei tendente, pelo menos, a atenuar uma grande parte do mal-estar a que me venho referindo.
Êste projecto há-de ter defeitos, mas a perfeição a que o há-de levar a competência dos que o hão-de examinar deixa-me a esperança de que será convertido numa lei útil ao meu país.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.
O Sr. Severiano José da Silva: — Desde há muito que venho pedindo a palavra, e, desde que a solicitei, até agora, tais acontecimentos se têm dado que me obrigam a, antes de me referir ao assunto para que me inscrevi, a êsses mesmos acontecimentos tenho de aludir, tam graves êles são.
Por sôbre as nossas cabeças estalou um rugido de traição. Sentimos como que uma punhalada nas costas. Gente sem patriotismo revoltou-se contra a República para a destruir, indo entrincheirar-se em Monsanto. Foi para ali que o povo de Lisboa correu como um leão indomável e fê-lo sem pensar em si próprio, sem se preocupar com a própria vida, sacrificou tudo para que de novo pudesse flutuar livremente a bandeira da República!
Viva a população de Lisboa!
É êsse povo que eu desejo saudar dês-te lugar ardentemente:
Viva o povo de Lisboa.
Vozes: Viva! Viva!
O Orador: — Mas, como disse, Sr. Presidente, não era só para realizar êsse meu desejo que tinha pedido a palavra. Se o povo de Lisboa e os soldados de Portugal se batem pela República que nós ama-
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mós, noutro campo se nos abre tambêm outro combate. Se êsses soldados têm por missão restabelecer a ordem pública, nós temos a de estabelecer o império da lei. Várias reclamações, Sr. Presidente, chegaram ao meu conhecimento, sôbre os diplomas publicados em ditadura, e principalmente no que diz respeito aos decretos n.ºs 4:699 e 4:700, que se referem à contribuição industrial é à contribuição sumptuária.
As reclamações tinham pontos de vista perfeitamente assentes e podem e devem ser atendidas, não só pelos poderes constituídos, Poder Legislativo e Poder judicial, mas ainda pelo pouco senso que assistira à elaboração dêsses diplomas. A contribuição industrial vem necessitando de revisão há mais de vinte anos, sendo o seu produto insignificante, por causa da forma como estava lançada. Tinha erros, Sr. Presidente, que, manifestamente conhecidos, foram agravados pelos decretos que acabei de citar. De maneira quedada êrro continuaria a subsistir exagerado.
Assim, por exemplo, na parte referente à contribuição industrial, sucede que todas as sociedades anónimas são tributadas somente na parte accionista, apesar de muitas serem consideradas por grandes capitais obrigacionistas e de haver até sociedades anónimas que nas têm capitais accionistas, por o haverem distribuído sem receberem nenhum lucro.
V. Exas. compreendem a desvantagem para o Tesouro Público resultante dum tal modo de lançar contribuições. Outros factos há bem interessantes e frisantes, como, por exemplo, o que se dá com a Companhia Nacional dos Caminhos de Ferro Portugueses, que paga 3 contos de contribuição ao Estado, o correspondente ao capital accionista, à contribuição industrial dos seus empregados e a muitos contos. Será isso equitativo?
Alêm disso há outra contribuição que à simples vista demonstra que o imposto é mal lançado por igualdade e por equiparação. Quero citar a das ourivesarias, que são tributadas em 300$, apesar de haver algumas que nem isso apuram por ano. Isso prova que o princípio adoptado é errado e falso.
Há um fenómeno notável, que o desejo de tributar fez nascer. E o da contribuição sumptuária sôbre venda de carros.
Tendo-se estabelecido, quando se implantou a República, que nunca haveria contribuição sôbre despesas, essa contribuição apareceu novamente, e isto é tanto mais injusto quanto a contribuição predial aumentou extraordinariamente, o que se reflectiu na renda das casas, porque quem a paga é o inquilino. Mas o que, sobretudo, choca é ter-se falseado o princípio de não se lançarem impostos sôbre os gastos de cada um.
Há ainda na sumptuária exemplos bastantes dos disparates que a êsse processo de arranjar dinheiro conduz.
A contribuição sôbre automóveis é, à primeira vista, bem lançada porque parece ir recair sôbre o luxo. Mas todos sabemos que os automóveis são necessários a certos funcionários do Estado, a médicos, a quem vive na província e precisa de rápidos meios de condução, etc. Todos êsses têm automóveis por utilidade.
Como pode, sendo assim, admitir-se que lhos tributem?
Hoje o automóvel é tambêm indispensável à indústria.
Na América quási toda a gente anda de automóvel.
Em face do exposto, peço licença para mandar para a Mesa um projecto de lei, com extensos considerandos justificativos, o qual se destina a acabar com iniqúidades (que não devem continuar subsistindo. E certo que a cobrança do imposto, a que me estou referindo, já se fez, terminando essa cobrança amanhã. Mas os indivíduos que a tiverem pago receberão êsse dinheiro pela forma usada nos reembolsos dessa natureza.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Oliveira Santos: — Requeiro a urgência e dispensa do Regimento para o projecto de lei do Sr. Senador Amaral relativo aos empregados do comércio.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se.
Leu-se, foi admitido e enviado à comissão.
O Sr. Machado Santos: — Todos os Srs. Senadores ouviram, dentro desta sala, o leader monárquico afirmar a sua lialdade ao Govêrno e prometer-lhe o seu apoio para a manutenção da ordem
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pública. Na Câmara dos Deputados sucedeu outro tanto.
V. Exa. ab ouviram os leaders do partido católico fazer igual afirmação, assegurando que estavam unidos em volta do Govêrno para a manutenção da ordem pública.
V. Exas. ouviram o Sr. Presidente do Ministério declarar que o exército português, mesmo depois da questão das juntas, era um elemento de ordem, que estava ao lado da República para reprimir quaisquer desordens.
E qual foi o resultado de todos êstes compromissos solenes tomados perante o Parlamento? A guerra civil!
Desnecessários são pois, mais comentários para justificar o projecto de lei que tenho a honra do mandar para a defesa, destinado a castigar todos aqueles que contra o regime peguem em armas.
Leu.
Requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se concede a urgência e dispensa do Regimento para o projecto que acabo de ler.
É lido na Mesa o projecto.
Consultada a Câmara, reconheceu a urgência.
O Sr. Presidente: — Lembro que é preciso votação nominal para a dispensa do Regimento.
O Sr. Machado Santos: — Pondero ao Senado que estamos a braços com uma guerra civil, para a debelarão da qual serão precisos três ou quatro meses. São necessárias medidas enérgicas, a fim dum tal movimento não causar as maiores ruínas.
O Sr. Presidente: — Vai fazer-se a votação nominal.
Começa a fazer-se a chamada.
O Sr. Machado Santos: — Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que eu retire o meu requerimento na parte respeitante à dispensa do Regimento. (Apoiados).
A Câmara resolve de harmonia com os desejos do Sr. Machado Santos.
O Sr. Pinto Coelho: — Interrompi trabalhos em que estava para não faltar a esta sessão, visto constar-me que se consignavam na acta votos de sentimento pela morte de Roosevelt, que foi Presidente dos. Estados Unidos da América do Norte, e pela de Rodrigues Alves, eleito Presidente da República do Brasil.
Roosevelt foi um ilustre homem de Estado que, na Presidência da República, patenteou as mais altas qualidades de estadista. Por muitos títulos êle é digno da nossa simpatia. Mas, entre todos, avulta o de ter sido êle quem mais devotadamente entrou na campanha que motivou a adesão dos Estados Unidos à causa dos aliados.
O Sr. Rodrigues Alves era um ilustre brasileiro, filho de português, que se mostrou sempre amigo do nosso país, aproveitando sempre todas as ocasiões para conseguir que a união entre as duas nações fôsse a mais íntima possível. É, pois, com a maior sinceridade que me associo aos votos de sentimento que vão ser propostos, aos quais dou o meu assentimento prévio, visto ter de me retirar.
O Sr. Presidente: — Chegou a hora de só entrar na ordem do dia. Esta é a homenagem a prestar aos falecidos ex-Presidentes dos Estados Unidos da América do Norte, Roosevelt, e Rodrigues Alves, eleito Presidente do Brasil.
Pela prioridade da data do falecimento, começar-se há por prestar homenagem a Roosevelt.
Neste sentido abrirei a inscrição para esta primeira homenagem.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Por motivos de todos conhecidos é esta a primeira sessão, depois que 1 o telégrafo nos transmitiu a notícia do falecimento de Teodoro Roosevelt, em que nos, é possível render preito à sua memória.
Político habilíssimo, orador do grande fluência, autor de obras notáveis, dotado de extrema bravura comprovada à frente do seu regimento na guerra de Cuba e nas arriscadíssimas caçadas na África, Roosevelt é credor de reconhecimento pelas elevadas tendências humanitárias do seu espírito, manifestadas no combate dos trusts, na sua benéfica interferência entre operários e patrões e especialmente nos conflitos provocados por antagonismos de raças.
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A sua acção não se limitou ao seu país, teve uma influência mundial.
Entre muitas questões de natureza internacional, em que a exerceu duma maneira profícua sobreleva o termo das hostilidades entre a Rússia e o Japão que êle tentou e conseguiu.
Mesmo na recente vitória sôbre os impérios centrais, a sua acção se fez sentir não só pela propaganda activíssima a favor dos aliados, a cujo serviço pôs o seu grande prestígio e a extraordinária exuberância da sua palavra; mas, sobretudo, pela orientação imperialista que seguiu durante a sua última presidência, deixando assim preparado o terreno que permitiu a fácil germinação de idea intervencionista e com ela o auxílio monetário e a rápida organização militar de efeitos decisivos na terminação da guerra.
Por todas estas razões honro-me em vos propor que seja lançado na acta da sessão de hoje um voto de profundo sentimento pela morte dêsse grande vulto, e que se laçam as devidas comunicações ao Senado dos Estados Unidos da América do Norte.
O Sr. Castro Lopes: — Em nome da maioria desta casa do Parlamento, não posso deixar de me associar às palavras de sentimento que V. Exa. acaba de propor pelo falecimento do grande estadista Teodoro Roosevelt, porque êle era, inegavelmente, uma das mais altas individualidades do seu país.
Todos sabem qual foi o papel que êle desempenhou na guerra de Cuba e quais as consequências que dessa sua intervenção advieram; todos sabem o papel que êle desempenhou, tentando abater o feudalismo dos trusts financeiros; todos sabem como êle procurou atenuar o conflito de raças entre brancos e gente de cor; todos admiram o seu livro O ideal americano que todos os grandes estadistas europeus deviam ler. É realmente admirável a forma como êle aponta nessa obra a maneira por que os estadistas devem falar ao povo e aproximar-se dolo e como é preciso que para combater a desordem aqueles que têm um curso sejam precisamente os que, pela sua ilustração, devem prestar todo o auxílio, todo o concurso à defesa do que entendam dever ser a aspiração da nacionalidade.
Roosevelt foi por muitos títulos um cidadão dos mais ilustres. Portanto, eu, em nome da maioria do Senado, associo-me ao voto proposto pelo Sr. Presidente, e bem assim à comunicação a fazer ao Senado da América do Norte.
O Sr. Queiroz Veloso: — Teodoro Roosevelt foi incontestavelmente um homem notável; mas não é só por isso que a sua figura nos interessa, pois muitos homens de valor se podem apontar na série dos Presidentes da República dos Estados Unidos, desde Washington até Wilson. O que em Roosevelt especialmente nos prende e nos cativa é a sua feição típica de norte-americano, de genuíno representante do homem público, do político dos Estados Unidos, pela variedade das suas aptidões, pela diversidade das fontes onde foi colher a sua experiência da vida.
O especialista competente, mas exclusivamente concentrado na esfera da sua especialidade, o profissional consciencioso, mas que se limita apenas ao exercício da sua profissão, — não representam o verdadeiro tipo do norte-americano de hoje, ainda que sejam os directos descendentes dos famosos Peregrinos, ou dalgum dos companheiros de Penu, o fundador da Pensilvânia.
Uma das características mais essenciais do norte-americano é a rapidez com que se amolda às circunstâncias, com que se adapta às situações, com que desempenha, simultânea ou sucessivamente, as funções mais diversas. Concorrem para êste resultado a ausência de tradições fortalecidas pelo hábito, a frequência de ocasiões favoráveis oferecidas por um país novo e que dia a dia mais se desenvolve, a simplicidade dos meios, o exemplo da actividade geral e principalmente aquela facilidade de momentos, de exercício, de trabalho, que os norte-americanos pitorescamente designam por elbow roon, a liberdade de cotovelos.
Roosevelt foi um dêstes tipos. Depois de ter feito a sua educação literária na Universidade de Harvard, a mais antiga e a mais completa das Universidades norte-arnericanas, pois abraça todos os ramos do saber humano, Roosevelt foi passar alguns anos nas grandes herdades da costa do Pacífico. Ai, naquela vida aventurosa de gentleman-farmer, ora nas grandes ca-
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valgadas através da planície, ora nas caçadas aos animais ferozes, adquiriu êle a robustez: física, a tenacidade, a ousadia, de que depois deu tam altas provas na companhia de Cuba, à frente do seu regimento de Rough Riders.
De regresso à sua cidade natal, Roosevelt encetou a carreira política, propondo-se e, Deputado à Assemblea Estadual de Nova York. Anos depois pretendeu ser governador do mesmo Estado, perdeu a eleição. A derrota não e esmoreceu, porêm, continuando a lutar na polida com a mesma actividade e entusiasmo.
Exerceu então os cargos mais variados, desde membro da Junta cios Serviços Civis dos Estados Unidos até comissário do polícia da cidade de Nova York. Talvez, noutro país, um ex-candidato a governador do Estado se julgasse amesquinhado e deprimido, se desempenhasse, depois, um cargo subalterno. Pois, nesse lugar, a acção enérgica e profundamente honesta de Roosevelt transformou os costumes de Nova York, introduzindo a mais severa moralidade, tanto na vida social, como na administração pública da cidade.
As suas qualidades de energia e de trabalho lavaram o Presidente Mac-Kinley a nomeá-lo Sub-Secretário de Estado da Marinha, quando estava para rebentar a guerra entre os Estados Unidos e a Espanha. A êle se deve a rápida organização da esquadra americana, que tam notável se havia de tornar nas Filipinas o em S. Tiago.
Logo no começo das hostilidades partiu para Cuba, à frente da um regimento de voluntários. A bravura, a coragem de que deu provas, criaram-lhe uma popularidade enorme nos Estados Unidos. Foi então eleito governador de Nova York; e, dois anos depois, com a reeleição de Mac-Kinley, teve a honra de ser escolhido para Vice-Presidente da República. A menos de um ano, duas balas assassinas prostram Mac-Kinley e Roosevelt sucede-Lhe na Presidência.
Nos três anos do seu mandato, o papel que exerce na política americana, torna-se preponderante. E então que Roosevelt, procurando suavizar ódios de raça, protege eficazmente as populações negras; e movendo a independência do novo Estado do Panamá, coloca sob a directa influência dos Estados Unidos o futuro canal de comunicação entre o Oceano e o Pacífico.
Terminado o mandato. Roosevelt propõe-se à Presidência, sendo eleito por uma grande maioria. Durante quatro anos, a sua actividade é incausável. Ora luta contra o feudalismo financeiro dos trusts, a despeito de arriscar a sua influência, mas preferindo pôr-se ao lado do povo, do que ao lado dos grandes capitalistas e dos grandes industriais do Partido Republicano, que tanto tinham concorrido para a sua eleição. Ora promove uma política acentuadamente imperialista, no intuito de dar os Estados Unidos um papel importantíssimo na bacia do Pacífico e, em especial, no Extremo Oriente; e para isso procura criar um grande exército e uma grande esquadra.
Desempenhou tambêm, então, um papel primacial intervindo para a terminação da guerra entre a Rússia e o Japão. Foi-lhe até conferido o prémio Nobel, destinado às grandes obras em favor da paz universal; e com os juros dêsse prémio fundou Roosevelt, em Washington, uma comissão permanente de arbitragem nos conflitos entre patrões e operários.
Terminado o quadriénio, retira-se à vida particular, mas sem abandonar por completo a política. E o período das grandes caçadas na África, das longas viagens no sertão do Brasil, do triunfal passeio aos principais países da Europa.
Do regresso aos Estados Unidos, Roosevelt propõe-se outra vez à Presidência, mas é derrotado; o mais uma vez se teria proposto, nas próximas eleições, se a morte o não viesse surpreender prematuramente.
Roosevelt exerceu uma enorme influência na atitude dos Estados Unidos a favor das causas dos aliados. Desde a primeira hora, a sua palavra e a sua pena não se cansaram de acusar a Alêmanha; e quando os primeiros contingentes militares partiram para a Europa não hesitou em sacrificar dois filhos. Um dêles lá repousa hoje no solo sagrado de Saint Quintin, húmido ainda do sangue de tantos heróis obscuros, que ali se sacrificaram pela liberdade da França e do mundo.
Roosevelt não foi só um eminente homem de Estado. Orador fogoso e eloquente, escritor de incontestável merecimento, toda a sua obra reveste um carácter,
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uma feição acentuadamente americana. Para êle, o homem de acção vale bem mais do que aquele que se limita a criticar a obra dos outros, o homem que luta é bem superior àquele que, por comodidade, por fraqueza ou por egoísmo, se põe propositadamente de lado.
Mas nesta acção, nesta luta, Roosevelt acentua sempre que só é trabalho útil o que é honesto. A sua norma de vida, a sua regra de conduta foi sempre a célebre máxima de Franklin que, nas escalas norte-americanas, serve para exercício de caligrafia dos estudantes de primeiras letras: a honestidade é a melhor das políticas.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bom.
O Sr. Oliveira Luzes: — Associo-me tambêm, Sr. Presidente, ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pela morte de Roosevelt, o ex-Presidente da República dos Estados Unidos da América do Norte.
O Sr. Machado Santos: — Associo-me tambêm ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pela morte dêsse grande homem que foi o ex-Presidente da República dos Estados Unidos da América do Norte.
O Sr. Presidente: — Eu devo declarar à Câmara que, logo que tive conhecimento da morte do Sr. Presidente Rodrigues Alves, fui à embaixada apresentar as condolências do Senado pelo triste facto, que acabava de enlutar a nação brasileira. O Dr. Rodrigues Alves, filho de português, laço que, se possível é, mais nos prende e torna mais sensível o nosso pesar, foi um homem honestíssimo, de admirável bom senso e de notabílissimas aptidões financeiras, de que deu evidentes provas, quando por vezes, sob dois regimes, ocupou a cadeira de Ministro; e no exercício da suprema magistratura da nação prestou relevantíssimos serviços, aplanando dificuldades de fronteiras, e empreendendo um trabalho de reconstrução que trouxe ao Brasil um fecundo período de progresso e de prosperidade. Povos irmãos, da mesma raça, rejubilamos com as mesmas alegrias, como nos fere a mesma dor.
Por isso proponho que fique exarado na acta um voto de sentimento.
Que se faça sciente o Senado brasileiro do profundo pesar que experimentamos pela perda que acaba de sofrer a nação irmã; e para tornar mais expressivo o nosso sentir, que a sessão seja encerrada imediatamente, após a homenagem prestada a tam eminente cidadão.
Vozes: — Muito bem.
O Sr. Castro Lopes: — Quero juntar os meus, votos de sentimento aos que V. Exa. propôs pela morte do grande homem que foi o Presidente da República Brasileira, Sr. Rodrigues Alves, que tanto contribuiu para desenvolver o comércio, a indústria, a marinha e os caminhos de ferro no seu riquíssimo país. Dito isto, em nome da maioria do Senado, mando para a Mesa uma proposta para que na acta se consigne todo o sentimento desta casa pela morte do Sr. Rodrigues Alves e se comunique essa nossa resolução ao Senado brasileiro.
O Sr. Presidente: — Eu já tinha feito essa proposta.
O Sr. Castro Lopes: — Passou-me despercebido, Sr. Presidente, em virtude, por certo, das condições acústicas da sala.
O Sr. Oliveira Luzes: — Pedi a palavra Sr. Presidente, para me associar às manifestações propostas por V. Exa. pelo falecimento do Sr. Dr. Rodrigues Alves, ilustre Presidente eleito da República Brasileira.
O Sr. Carneiro de Moura: — Neste momento, em que está reunida a Conferência da Paz, em Paris, segundo é publicado pelas agências telegráficas do mundo inteiro, pregunta-se entre os representantes dos diversos países que ali tratam da paz do mundo, o que é que cada nacionalidade ali vai fazer.
Pela parte que nos toca a nós, portugueses vão a essa conferência desprovidos de bons argumentos que nos permitam mostrar o nosso valor.
Se as cinco grandes potências do Congresso de Paris puderam armar 12 milhões de homens para a luta, as pequenas
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10 Diário das Sessões do Senado
potências, que não conseguiram fazer outro tanto, têm tambêm uma acção grande a desempenhar, porque têm de mostrar que podem afirmar qual a civilização, virtudes e qualidades imortais.
O povo português possui elementos bastantes para mostrar que o constituem 30 milhões de lusitanos, que aquêm e além Atlântico representam a nacionalidade portuguesa.
O Presidente Rodrigues Alves, cuja morte agora se pranteia, era, sob todos os aspectos, um homem da nossa raça, visto descender de portugueses.
Foi brilhantíssima a sua carreira política.
Eis porque o Brasil tem neste momento razões suficientes para prantear a sua morte.
Na escala psicológica da nossa vida colectiva devemos encarar os homens que souberem afirmar qualidades para a solução dos pactos internacionais, come os mais notáveis do entre os que mais podem honrar um país.
E o conceito aplicado a Portugal é em extremo verdadeiro.
E que essa terra não é apenas êste pequeno quadrilátero territorial do ocidente da Europa, que vão entrar no arranjo internacional em elaboração.
Não somos apenas um povo com 6 milhões de almas, porque somos mais de 30 milhões.
Valêmos no emtanto alguma cousa no mundo.
As nossas desgraças caseiras não representam de maneira nenhuma um esmagamento {Apoiados) desde que saibamos lançarmo-nos no caminho que a nossa raça indica. (Apoiados. Muito bem).
Rodrigues Alves pertenceu aos portugueses, seguindo a política que dá a razão com poder maior. Soube por esta forma compreender que a República Norte Americana deve ser no mundo a portadora máxima da civilização, que vem rolando do oriente para o ocidente.
Mas quero afirmar que neste momento somos no ocidente os representantes dura a psicologia colectiva, que criou uma civilização própria, que se pode chamar bem nossa, a qual tem continuação no povo brasileiro.
O ilustre morto foi sempre um símbolo do lusitanismo.
Aberto o Panamá, alteradas as correntes mercantes do mundo, a doutrina de Monroe deixou de ter a significação restrita, que a originou.
Hoje a América representa no moderno cosmopolitismo um grande factor da civilização interoeeàuica, que nós os portugueses de aquém e de alêm Atlântico somos, dentro da liga dos povos cultos, uma das mais altas afirmações da moderna civilização.
O Dr. Rodrigues Alves bem merece as homenagens que hoje lhe presta o Senado português, porque nela eu vejo a afirmação indestrutível do nosso valor de raça.
O Sr. Machado Santos: — Quero associar-me tambêm a mais êsse voto de sentimento proposto por V. Exa., Sr. Presidente. Referindo-me a Rodrigues Alves, direi que êle foi o continuador da obra de Prudêncio de Morais, o Presidente ilustre que soube estabelecer a harmonia na grande família brasileira. Bastava isto para neste momento não podermos esquecer êsse homem eminente.
O Sr. Queiroz Veloso: — Associo-me, de modo o coração, ao voto de sentimento proposto por V. Exa. e não só em meu nome, como no dalguns Srs. Senadores independentes, que me deram a honra dêsse encargo.
Esta sessão tinha para ordem do dia a comemoração de dois antigos Presidentes da República, Teodoro Roosovelt e Rodrigues Alves. Foi coincidência feliz que o Senado, ao reabrir as suas sessões, depois da tentativa de restauração monárquica, aqui viesse únicamente para prestar homenagem A memória de dois notáveis representantes do duas grandes Repúblicas.
A norma de conduta de Rodrigues Alves, na sua longa vida política, é um eloquente exemplo de seriedade e patriotismo. Tendo sido monárquico, tendo ocupado altos cargos durante o império, foi depois da mais profunda, da mais intensa, da mais intemerata dedicação pela República, sem nenhum pensamento oculto de traição.
Ao Brasil ligam-nos laços especiais de parentesco e de afecto, a consanguinidade da raça, a comunhão da língua. Por isso
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sentimos duplamente a grande perda que a Nação Brasileira acaba de sofrer com o falecimento do ilustre cidadão, que tam altos serviços lhe prestara no primeiro quadriénio da sua presidência. Foi êle, coadjuvado pelo seu Ministro, o saudoso Barão do Rio Branco, quem conseguiu acabar definitivamente com essa irritantíssima questão do Acre, que tantas vezes estivera para provocar a guerra entre o Peru e o Brasil. Foi êle quem soube descobrir e escolher para prefeito da capital da República o Dr. Francisco Pereira Passos, sob cuja direcção inteligente e enérgica o Rio de Janeiro se transformou numa das mais belas e mais higiénicas cidades do mundo.
A sua gerência caracterizou-se principalmente por um grande influxo reformador, por um acentuado espírito de iniciativa, mas sem exageros utópicos nem fantasias irrealizáveis. Da sua experiência muito confiava ainda o Brasil, que tam entusiasticamente o reelegera há poucos meses.
O Conselheiro Rodrigues Alves foi sempre um sincero e dedicado amigo de Portugal. Português era seu pai, do coração do Minho, natural duma das freguesias do concelho de Ponte de Lima. Mais uma razão para a sua memória nos ser especialmente querida.
E nas mútuas tristezas que mais se avigoram os laços de família. Procuremos, pois, estreitar cada vez mais os laços que unem os dois países, quer no
ponto de vista intelectual, quer no ponto de vista económico.
Não esqueçamos nunca que somos dois povos irmãos, que as nossas aspirações, os nossos interêsses podem ser comuns, mas nunca contrários, e que no Brasil, como em Portugal, só fala a mesma língua portuguesa.
Vozes: — Muito bem.
O Sr. João José da Costa: — O comércio português tem procurado sempre no Brasil os seus mercados e as suas maiores transacções comerciais. Por isso não podia eu deixar de associar-me a essas manifestações ao Brasil e ao grande homem que se chamou Rodrigues Alves. E grande a distância que nos separa do Brasil, mas é tambêm grande a amizade que une os dois países — liberais e amigos.
O Sr. Presidente:—Em virtude das manifestações da Câmara, considero aprovada por aclamação a minha proposta. (Apoiados gerais).
A próxima sessão é na segunda-feira, havendo no sábado trabalho em comissões. E lembro à comissão de infracções a necessidade que há de que reúna para se ocupar de importantes assuntos pendentes.
Está levantada a sessão.
Eram 16 horas e 30 minutos.
O REDACTOR — Adelino Mendes.