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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

1918-1919

SESSÃO N.º 16

EM 3 DE FEVEREIRO DE 1919

Presidência do Exmo. Sr. Zeferino Cândido Falcão Pacheco

Secretários os Exa. mos Srs.

Luís Caetano Pereira

Guilherme Martins Alves

Sumário. — Chamada e abertura da sessão.

Leitura e aprovação da acta — Expediente — Vários Srs. Senadores requerem que as comissões sejam agregados outros. O Sr. João José da Silva manda para a Mesa um parecer da comissão de faltas, e o Sr. Castro Lopes requere urgência e dispensa do Regimento para o aludido parecer, sendo aprovado o requerimento. Tomam parte na discussão os Srs. Oliveira Santos, João José da Silva, Machado Santos, Castro Lopes, Severiano José da Silva, Pinto Coelho, Ribeiro Amaral, Tiago Sales, Arnaud Furtado, Afonso de Afeio, que apresenta uma proposta, Carneiro de Moura, Queiroz Veloso e Luís Gama, sendo aprovada aquela e indo à comissão outra do Sr. Castro Lopes. É interrompida a sessão, e, reaberta, entra o Ministério, usando da palavra o Sr. Presidente do Ministério (José Relvas) e os Srs. Senadores Castro Lopes, Oliveira Santos, Júlio Dantas, João José da Costa, Adães Bermudes, Pinto Coelho, Machado Santos, Queiroz Veloso, Severiano José da Silva e Afonso de Melo. O Sr. Presidente designa ordem do dia e encerra a sessão.

Senhores Senadores presentes à abertura da sessão:

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Alfredo Monteiro de Carvalho.

Arnaldo Redondo de Adães Bermudes.

Artur Jorge Guimarães.

Carlos Frederico do Castro Pereira Lopes.

Cláudio Pais Rebêlo.

Constantino José dos Santos.

Domingos Pinto Coelho.

Francisco Martins de Oliveira Santos.

Francisco Nogueira de Brito.

Francisco Vicente Ramos.

Guilherme Martins Alves.

João da Costa Couraça.

João da Costa Mealha.

João José da Costa.

João José da Silva.

João Lopes Carneiro de Moura.

João de Sousa Tavares.

José Epifânio Carvalho de Almeida.

José Júlio César.

Luís Caetano Pereira.

Luís Xavier da Gama.

Manuel Ribeiro do Amaral.

Severiano José da Silva.

Zeferino Cândido Falcão Pacheco.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Alberto Correia Pinto de Almeida.

Alfredo da Silva.

António Maria de Azevedo Machado Santos.

Germano Arnaud Furtado.

João Viegas de Paula Nogueira.

José Maria Queiroz Veloso.

José Tavares de Araújo e Castro.

Júlio Dantas.

Tiago César de Moreira Sales.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Adolfo Augusto Baptista Ramires.

Adriano Xavier Cordeiro.

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2 Diário das Sessões do Senado

Alberto Cardoso Martins de Meneses de Macedo.

Alberto Carlos do Magalhães e Meneses.

Alberto Osório do Castro.

Amílcar do Castro Abreu e Mota.

António Augusta Cerqueira.

António de Bettencourt Rodrigues.

António Maria de Oliveira Belo.

António da Silva Pais.

Cristiano Magalhães.

Duarte Leito Pereira da Silva.

Eduardo Ernesto do Faria.

Fernando de Almeida Cardoso de Albuquerque (Conde do Mangualde).

Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.

João Rodrigues Ribeiro.

José António de Oliveira Soares.

José Freire de Serpa Leitão Pimentel.

José Joaquim Ferreira.

José Marques Pereira Barata.

José Novais da Cunha.

José Ribeiro Cardoso.

José dos Santos Pereira Jardim.

Júlio de Campos Melo e Matos.

Júlio de Faria de Morais Sarmento. (Visconde do Banho).

Luís Caetano Pereira da Costa Luz (Visconde de Coruche).

Luís Firmino de Oliveira.

Manuel Homem de Melo da Câmara (Conde de Águeda).

Manuel Jorge Forbes de Bessa.

Diário Augusto de Miranda Monteiro.

Pedro Barbosa Falcão de Azevedo e Bourbon (Conde de Azevedo).

Pedro Ferreira dos Santos.

Sebastião Maria de Sampaio.

Às 13 horas e 15 minutos, achando-se na sala 25 Srs. Senadores, foi reaberta a sessão.

Foi lida e aprovada a acta da sessão anterior.

Mencionou-se o seguinte

Expediente

Ofícios

De Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, enviando um ofício da Missão da República de Cuba, agradecendo as saudações do Senado Português.

Para a Secretaria.

Do Sr. Ministro do Comércio, comunicando ter enviado ao Ministério dos Abastecimentos, as relações nominais dos Srs. Senadores que competem as comissões do Senado, a quem devem ser distribuídos. passes nos caminhos de ferro.

Para a Secretaria.

Do juiz presidente do Tribunal do Comércio de Lisboa, solicitando licença para que possa comparecer neste tribunal o Sr. Senador Germano Arnaud Furtado, a fim de depor como testemunha.

Aprovado.

Da Sociedade Nacional de Belas Artes, enviando 50 bilhetes de convite para a reposição dos trabalhos do falecido artista Frank Craig.

Para a Decretaria distribuir.

Projectos de lei

Da iniciativa do Sr. Senador Germano Arnaud Furtado, isentando do pagamento de contribuição de registo as transmissões a favor de estabelecimentos de instrução ou beneficência, quando criados, mantidos ou subsidiados pelos corpos administrativos.

Para as comissões de administração pública e finanças.

Da iniciativa do Sr. Senador Severiano da Silva, suspendendo os decretos n.ºs 4:609 e 4:700, publicados no Diário de Govêrno de 26 de Julho de 1918.

Para a comissão de finanças.

Pedidos de licença

Do Sr. Senador Francisco Vicente Ramos, que pede oito dias do licença.

Propostas de agregação

Proponho que se agreguem à comissão de legislação civil, comercial e criminal, os Srs. Senadores Drs. João Lopes Carneiro de Moura e José Júlio César.

Sala das sessões do Senado, 3 de Fevereiro de 1910. – O Senador, Alfredo Monteiro de Carvalho.

Para a Secretaria.

O Senado aprovou.

Requeiro sejam agregadas à comissão de subsistências (revisão ditatorial) os

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Sessão de 3 de Fevereiro de 1919 3

Srs. Senadores Mealha e Ribeiro do Amaral.

Senado, 3 de Fevereiro de 1919. — O Senador, Oliveira Santos.

Para a Secretaria.

Foi, aprovada.

É lido o seguinte

Projecto de lei

Considerando que as Câmaras Legislativas o por isso o Senado têm competência para deliberarem dentro do seu regulamento, sôbre as condições pelas quais os Senadores perdem o seu mandato, pela mesma razão jurídica da verificação dos seus poderes proponho:

Artigos 1.° O Senador que transgredir as disposições dos artigo, 170.°,
171.º, 172.° o seu § única do regimento do Senado, perderá os seus mandatos, deixando de comparecer a oito sessões consecutivas.

Art. 2.º Esta disposição do Regulamento do Senado, entra, imediatamente em vigor.

Sala das sessões do Senado, em 3 de Fevereiro de 1910. - O Senador Castro Lopes – Carneiro de Moura — Alfredo Monteiro de Carvalho — Artur Jorge Guimarães — Germano Furtado.

Para a comissão de infracções e faltas.

O Sr. Castro Lopes: — Tendo acabado de ouvir ler o parecer da comissão de faltas e infrações, eu requeiro Sr. Presidente, que seja consultada a Câmara sôbre se concede a urgência e dispensa do Regimento, para a discussão imediata do mesmo parecer.

O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à votação, nominal, como preceitua o regimentos.

Procedeu-te a chamada.

Disseram aprovo os seguintes Srs. Senadores:

Alfredo Monteiro de Carvalho.

António Maria da Azevedo Machado Santos.

Arnaldo Redondo de Adães Bermudes.

Artur Jorge Guimarães.

Carlos Frederico de Castro Pereira Lopes.

Cláudio Pais Rebelo.

Constantino José dos Santos.

Domingos Pinto Coelho.

Francisco Martins de Oliveira Santos.

Francisco Nogueira de Brito.

Francisco Vicente Ramos.

Germano Arnaud Furtado.

Guilherme Martins Alves.

João da Costa Mealha.

João José da Costa.

João José da Silva.

João Lopes Carneiro de Moura.

João de Sousa Tavares.

João Viegas de Paulo Nogueira.

José Epifânio Carvalho de Almeida.

José Júlio César.

José Tavares de Araújo e Castro.

Júlio Dantas.

Luís Xavier de Gama.

Manuel Ribeiro do Amaral.

Tiago César de Moreira Sales.

Zeferino Cândido Falcão Pacheco.

Disse: rejeito o Sr. Senador.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

O Sr. Presidente: - Tendo, o requerimento sido aprovado por mais de dois terços, está aprovada a urgência e dispensa do Regimento relativas à proposta.

É lida e posta em discussão.

O Sr. Oliveira Santos: — Sr. Presidente: eu não posso conformar-me com a doutrina da comissão, de faltas, tanto mais quanto é certo que êsse assunto foi já ventilado numa reunião preparatória do Senado em que prevaleceu a opinião de que tinha aplicação a este caso a lei eleitoral de 1911.

Dá-se ainda o caso de que a mesmo critério está sendo aplicado na outra casa do Congresso, que já eliminou oito membros da mesma Câmara na conformidade daquela lei. Nessa ordem de idéias, peço a V. Exa. que consulte o senado sobre se essa outra da lei de 1911, está ou, não em pleno vigor.

Requeiro essa consulta, porque da forma, porque ela for aceita, pelo Senado, pode depender, até certo ponto, o funcionamento desta Câmara.


Acho que é um assunto importante e que, por isso, deve resolvido imediatamente.

Tenho dito.

O Orador não reviu.

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4 Diário das Sessões do Senado

O Sr. João José da Silva: — No meu entender a lei de 1911 não pode ser aplicada aos Senadores da presente legislatura. Dá-se ainda o caso da lei, que está em vigor, citar a anterior e não mandar recorrer em casos omissos a essa lei anterior.

E como essa lei foi feita para a Câmara dos Deputados, nós, Senadores, entendemos que ela se não pode aplicar a esta Câmara.

Alêm disso, a lei que está em vigor substitui, para todos os efeitos, a lei anterior e não há que recorrer em casos omissos.

A essa lei anterior falta, efectivamente, a fórmula «fica revogada a legislação em contrário», mas isso é uma fórmula banal, e apesar da lei não conter essas disposições, entende-se que fica revogada a legislação em contrário.

Eu não vinha disposto a discutir o assunto, porque ignorava que êle seria ventilado nesta sessão; de maneira que não posso reproduzir fielmente as razões em que se funda o parecer da comissão, mas são estas, pouco mais ou menos. O orador não reviu.

O Sr. Machado Santos: — Sr. Presidente: a lei eleitoral de 1911 não foi confeccionada para uma Câmara de Deputados, mas sim para uma Assemblea Constituinte, a qual se desdobrou depois em duas Câmaras, pela fôrça da Constituição Política. Alêm disso, sempre que se deram vagas no Senado e na Câmara dos Deputados, foi aplicada a lei eleitoral de 1911.

O Sr. Severiano José da Silva: — Isso é que é importante!

O Orador: — Se o decreto publicado o ano passado alterou a forma da constituição do Senado, em todo o caso a penalidade a aplicar aos eleitos que faltassem ao cumprimento dos seus deveres não foi modificada. Portanto, vigora a que estava na legislação anterior. E admira-me muito que um jurisconto tam notável como é o Sr. João José da Silva venha defender uma opinião contrária à que têm tido todos os seus colegas.

O orador não reviu.

O Sr. Castro Lopes: — Sr. Presidente: nós estamos todos de acôrdo (Apoiados),

porque aquilo que se deseja conseguir, é que aqueles que cometem faltas, sejam punidos. Sôbre este ponto não há divergências de ideas. Agora o que todos nós queremos, é que isso se faça dentro da lei, do rigor estrito da forma, principalmente na ocasião em quê nós, republicanos, temos do mostrar que estamos dentro da lei.

Desde o momento em que possa haver uma divergência por parte de um jurisconsulto, como é o ilustre presidente da comissão de infracções e faltas, o Sr. João José da Silva, que estudou conscienciosa-mente o assunto, e como são os Sr. Alfredo Monteiro de Carvalho e Carneiro de Moura, pessoas que nos merecem a maior consideração pelo seu saber e pelo seu carácter, nós o que temos de fazer é ver se chegamos a uma conclusão.

Sr. Presidente: nós podemos, e devemos, para estarmos dentro do rigor da lei, conseguir que a comissão fique encarregada de elaborar um projecto que resolva o assunto, sem perda de tempo, e eu, pela parte que me toca, não teria dúvida em pedir urgência e dispensa do Regimento para que a sua discussão se fizesse imediatamente.. Êsse projecto deve ser feito de maneira que corresponda aos nossos desejos de estarmos dentro da lei e a êle darei eu o darão os Srs. Senadores da maioria todo o seu apoio, sem nenhuma divergência. Creio que, aparta a questão da lei de 1911 ser ou não aplicável, nós estamos perfeitamente de acordo.

Tenho dito, Sr. Presidente.

O orador não reviu.

O Sr. Oliveira Santos: — Sr. Presidente: eu continuo na mesma opinião de há pouco. A questão que se debate é uma questão urgente, muito urgente, e eu entendo por isso mesmo que ela não pode protelar-se.

A lei de 1911 é terminante, não admite dividas; portanto indiscutível. E, por isso, faço a V. Exa. êste requerimento:

O Senado entende que a lei de 1911 está ou não em vigor?

Peco a V. Exa. que interrogue o Senado sôbre se considera ou não que a lei de 1911 em vigor.

É um requerimento que submeto à apreciação da Câmara. A Câmara dos De-

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Sessão de 3 de Fevereiro de 1919 5

putados resolveu o assunto com toda a brevidade. E preciso que isso se faça tambêm no Senado.

O Sr. Severiano José da Silva (interrompendo).— O requerimento de V. Exa. parece querer abafar a questão...

O Orador: — Parece, mas não assim! Creia V. Exa. que não pretendo abafar a questão. Desejo apenas resolver um assunto que exige rápida solução.

Eu não sou jurista, mas entendo estar na boa doutrina emquanto não me mostrarem o contrário; por isso, persisto no meu requerimento.

O orador não reviu.

O Sr. Severiano José da Silva: — Eu não creio, Sr. Presidente, que haja nesta Câmara qualquer membro que tinha a intenção sequer, de protelar um assunto que a todos se afigura urgente.

Li muito ligeiramente o parecer da comissão e segundo dêle depreendi, a lei de 1911 era posta de parte, porque se referia a — Deputados.

Essa lei foi para a Constituinte e referia-se a Deputados. Agora o que eu desejava era que a comissão me esclarecesse sôbre êste ponto — é se consultou ou não o exemplo do precedente.

Ainda há poucos dias serviu de grande argumento para dar vigor à lei de 1911 o exemplo do que se tinha praticado, quando se fizeram eleições suplementares.

Se há dúvidas sôbre a vigência da lei de 1911, veja-se se há exemplo de precedência, porque êsse exemplo deve dar-lhe vigor.

Não sou legista e respeito muito a opinião dos legistas que aqui se acham e muito principalmente a do Sr. João José da Silva.

Não é desprimor o não concordar com o parecer da comissão, visto que a êsse parecer falta um elemento de muita importância que é a indicação de haver exemplo de precedência. Se o há, poderemos continuar no mesmo procedimento.

O orador não reviu.

O Sr. Domingos Pinto Coelho: — Muito breves palavras apenas para justificar o meu voto.

Não conheço o texto da lei de 5 de

Abril de 1911, nem o da lei de 30 de Março de 1912.

A votação de urgências e dispensas do Regimento tem o inconveniente de ter de se discutir um assunto, sem o necessário estudo preliminar.

O Sr. João José da Silva é um jurisconsulto que merece a maior confiança, e S. Exa. afirma que o decreto de 30 de Março substitui, para todos os efeitos, o de 5 de Abril.

Se assim é, a lei de 5 de Abril está revogada.

A falta do artigo especial, em que se diga que fica revogada a legislação em contrário, não pode modificar o nosso parecer, porque isso representa apenas uma fórmula.

Ouvi o argumento do Sr. Machado Santos de que a doutrina se aplica tanto a Deputados como a Senadores, mas a verdade é que a palavra que existe na lei é Deputados e não Senadores. Sendo assim, a doutrina deve continuar a ser aplicada a Deputados. Querer aplicá-la a Senadores é querer usar de argumentos a que se chama de analogia.

Desde o momento em que lá existe a palavra «Deputado» compreende-se que essa disposição só é aplicável aos Deputados. Querer aplicá-la aos Senadores, é usar positivamente, daquele argumento que em direito se chama argumento de analogia.

Ora nós estamos em matéria penal e, nesta matéria, não há argumentos de analogia.

Não devemos, pois, proceder «por analogia», mas sim seguir o caminho legal.

Quanto ao requerimento do Sr. Oliveira Santos, creio poder dizer que S. Exa. não tem razão. Quem votar o parecer entende que a lei de 1911 está revogada. Quem o não votar entende o contrário.

O Sr. Oliveira Santos: — Entendo que o Senado deve votar o meu requerimento. O Senado devo dizer se está ou não em vigor a lei de 1911.

O Orador: — Basta ler o parecer para se ver que a lei de 1911 está revogada. Os Srs. Senadores, que concordam com o Sr. Oliveira Santos, rejeitam o parecer.

Creio ter justificado o meu voto.

O orador não reviu.

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6 Diário das Sessões do Senado

O Sr. Ribeiro do Amaral: - Apesar de não ser jurisconsulto, tenho obrigação de conhecer a lei. Ora se é preciso aplicar penalidades, qual é a alei em vigor?

Para que servem as comissões de infracções? Então uma comissão dá o seu parecer sôbre um determinado caso e depois não há penalidade alguma a aplicar quando dêsse parecer resulta ter sido desatendida a lei?

Há-de haver, forçosamente, uma penalidade. Se essa penalidade não está no Código, a Câmara tem de resolver imediatamente sôbre o caso.

O Sr. Tiago Sales: - Mereça-me a maior consideração o parecer da comissão, tanto mais que esta é constituída por pessoas que, como peritas, são bastante autorizadas.

É certo que êste assunto tem de ser ponderado, porque é delicado.

Mas mais delicado é o momento actual e urge tomar providências sôbre o caso.

Parecer-me que, da parte dos ilustres membros da comissão de infracções, há um equivoco.

A lei eleitoral de 1911 foi feita para se aplicada não só a Deputados como a Senadores, visto que todos saíram dos membros das constituintes eleitos pela ferida lei.

Em harmonia com essa lei, foram feitos os Regimentos da Câmara dos Deputados e do Senado, na parte que trata das faltas às sessões.

Posso garantir que na Câmnra dos Deputados, durante anos sucessivos, foi aplicado o seu Regimento de harmonia com essa lei.

Recordo-me até, de que várias vezes a Câmara dos Deputados se preocupou com a falta de número, e eu fui um dos que várias vezes prestaram contra êsse facto.

A meu lado eu vi secundar-me o ilustre Deputado e grande cidadão o Sr. Jacinto Nunes. Em virtude dessas reclamações, várias vezes a comissão infracções teve de reunir, apresentando pareceres em que se eliminavam Deputados, alguns dos quais pertencentes à maioria e por conseguinte amigos políticos dos parlamentares, que constituíam a maioria da referida comissão de infracções.

Ora, igualmente de acôrdo com essa disposição da lei eleitoral, foi feito aqui o nosso Regimento, cujo Regimento, cujo artigo 172.º diz:

"Nenhum Senador, emquanto o Senado se conservar aberto, poderá ausentar-se da capital por mais de oito dias, sem prévia licença do Senado".

Se nenhum Senador se pode ausentar por mais de oito dias, evidentemente se êsse número de faltas fôr superior àquelas, terá, quem as deu, de ser eliminado, em virtude da lei de 1911.

Se isto é assim, eu não compreendo bem o embaraço do S. Exas.

É que há Senadores, que nunca tomaram lugar nesta casa do Parlamento.

Pregunto se criaturas, que nunca puderam ou não quiseram aceitar o mandato para que foram eleitos, podem esperar da nossa parte alguns embaraços em aplicar a lei, que não pode estar revogada duma maneira taxativa, visto não haver nenhuma disposição neste sentido, havendo já o precedente aberto e estabelecido, não só nesta como na outra casa do Parlamento.

O que é facto é que é indispensável que se trabalhe, e que o Senado cumpra o seu fervoroso desejo de ser útil à Repúblca e ao país. (Apoiados).

É preciso, pois, que afastemos todos os embaraço, que se oponham a êste empenho patriótico.

É preciso que não constitui o facto ridículo de haver Senadores, que nunca vieram ao Senado e que embaracem a nossa vida parlamentar pesando sôbre o respectivo quorum.

Não quero de forma alguma melindrar os Srs. Senadores que fazem parte da comissão de infracções e faltas, dizendo que, para decôro do Parlamento e da Repú-blica, devemos aplicar a lei de 1911 que regula as faltas dos Senadores.

Já aqui se disse que o Parlamento tem de salvar o seu prestígio, e só pode fazê-lo trabalhando em defesa do país; custe o que custar, há que afastar os obstáculos que a isso se oponham; e há ainda um dever mais alto que nos impõe uma medida urgente: dar a impressão ao estrangeiro de que essa aventura trágico-cómica de Couceiro de forma alguma vem embaraçar a vida dos poderes constituídos, e de modo nenhum teve a importância capaz de entravar a marcha dos nossos trabalhos.

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Sessão de 13 de Fevereiro de 1919 7

Não me importaria aprovar o parecer da comissão, se, porventura, não tivesse, um certo receio, qual o do projecto de lei que S. Exa. apresentam, ficar dias e dias para ser convertido em lei; todos sabemos os trâmites que o projecto terá de seguir. Só por vezes dificuldade tem havido para definir o Senado e a Câmara dos Deputados, maiores ainda haverá daqui por diante, visto que alguns dos seus membros são militares, indo tomar parte na luta em defesa da República.

Sendo assim, vejam V. Exas. o perigo de resolver o assunto por um projecto de lei, que pôde colocar-nos em situação difícil para trabalhar, por não ser isso possível. Aprovemos, pois, uma disposição regulamentar em harmonia com a lei de 1911, pela qual pendesse o lugar de Senador o que der mais de dez faltas consecutivas e assim fica o caso liquidado.

Tenho dito.

O Sr. Arnaut Furtado: — Falo a favor do projecto, embora a minha intenção fôsse não falar nem pró nem contra, porque não concordo com êle na generalidade.

Mas há uma parte final que merece a minha concordância: a comissão diz que vai apresentar ao Sediado um projecto de lei no sentido de regular a questão.

Não pretendo, como disse o Sr. Tiago Sales, dar aos outros apenas a impressão de que trabalhamos porque é pouco; é preciso mostrar que realmente trabalhamos.

Eu entendo que para regular a situação dos Senadores que não cumprem os seus deveres, vindo às sessões, nada mais é preciso do que interpretar lógicamente o Regimento desta Câmara.

No artigo 171.º diz:

«Os Senadores que por justo motivo não puderem comparecer deverão participá-lo à Mesa».

No artigo 172.° diz:

«Nenhum Senador, emquanto o Senado se conservar aberto, poderá ausentar-se da capital por mais de oito dias, «sem prévia licença do Senado».

E no § único diz:

«A nenhum Senador poderá ser concebida licença por mais de trinta dias, seguidos ou intercalados, em cada legislativa, salvo o caso de doença prolongada e devidamente comprovada».

Qual é a razão desta restrição ou desta obrigação imposta aos Senadores? É, nem mais nem menos, a de facilitar o funcionamento regular desta Câmara.

Desde que qualquer dos Senadores, pelas suas faltas, empate ou proíba o regular funcionamento do Serrado, esse Senador está ipso fscto condenado. E como não pode ser preso, é castigado por outra forma: esta Câmara retira-lhe o mandato. Isto é tudo quanto há de mais lógico.

Eu já disse a V. Exas. que a perda de mandato surge automáticamente àqueles que não cumprem com o Regimento; nós precisamos do quorum e para o obter basta aplicar o Regimento.

Em todo o caso eu sei que está para ser prescate a Câmara um projecto de lei relativo ao assunto; entendo que se deve aguardar êsse projecto para ser apreciado, pedindo que essa apresentação se faça tam rapidamente quanto é para desejar.

Tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. Afonso de Melo: — Sr. Presidente: esta questão, debaixo do ponto de vista jurídico, é, como V. Exa. vê, dum aspecto bastante melindroso, e tam melindroso que eu, quando se votou a urgência e dispensa do Regimento para a aprovação do parecer, respondi à chamada com um rejeito. Êsse assunto, conforme já tive ocasião de dizer numa reunião de Senadores, precisa de ser meditado madura e demoradamente.

Presto a minha homenagem aos Srs. João José da Silva, Monteiro de Carvalho e Carneiro de Moura, que, com a sua inteligência muito esclarecida e reconhecida competência, apresentaram o parecer que foi lido há pouco. Mas o meu dever como Senador e como profissional do direito é não abdicar das minhas faculdades críticas e antes dizer desassombradamente o que se me afigura ser mais conforme com os bons princípios jurídicos, para que ama questão tam melindrosa como esta não seja votada sem uma ampla discussão.

Observou V. Exa., Sr. Presidente, que eu tive de subir esses degraus para ler o parecer apresentado pela ilustre comissão de infracções e faltas, pois que não ten-

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8 Diário das Sessões do Senado

do sido distribuído impresso, pela leitura que foi feita na Mesa, não consegui apoderar-me completamente do seu conteúdo, por forma a ficar bem esclarecido. É possível que os meus ilustres colegas desta Câmara se considerem já suficientemente ilucidados.

Eu devo dizer, porêm, a V. Exa. e à Câmara que me parece que a comissão de infracções e faltas não se colocou dentro dos princípios jurídicos, em que se devia ter colocado, pois deixou de lado alguns aspectos importantes do assunto. Vou explicar os motivos em que me fundo para fazer esta afirmação.

Sr. Presidente: tenho a opinião de que esta questão não gira somente em volta da validade da lei eleitoral de 1911.

Nós, Sr. Presidente, temos acima da lei de 1911, uma outra lei que nos rege, e que é a Constituição da República Portuguesa.

E essa lei, no único do artigo 8.°, diz o seguinte:

«A Câmara dos Deputados e o Senado são eleitos por sufrágio directo dos cidadãos eleitores.

§ único. A organização dos colégios eleitorais das duas Câmaras e o processo de eleição serão regulados por lei especial».

Já vê V. Exa., Sr. Presidente, e a Câmara, que segundo a Constituição a lei eleitora] nada tem que dispor sôbre a duração do mandato dos Deputados ou Senadores.

Essa lei apenas tem que prescrever sôbre a organização dos colégios eleitorais e o processo da eleição.

Terminada a eleição, já é o Senado que deve apreciar a validade do processo eleitoral e reconhecer os poderes dos Senadores eleitos.

Sr. Presidente: é o artigo 13.°, § único, da mesma Constituição, que diz o seguinte:

«A cada uma das Câmaras compete verificar e reconhecer os poderes dos seus membros, eleger a sua Mesa, organizar o seu Regimento interno, regular a sua política e nomear os seus empregados».

Já vê, V. Exa., Sr. Presidente, e a Câmara, que, segundo a minha opinião, baseada nos textos da lei fundamental, que acabo de citar, é à Câmara que compete verificar os poderes dos seus membros e por melo da sua Comissão de Verificação de Poderes, e se é o Senado que dá de poderes, é a êle tambêm que compete retirá-los suspendendo-os ou eliminando-os podendo, portanto, estatuir no seu próprio Regimento Interno, penalidades que vão desde a suspensão temporária da palavra até a cessação definitiva da funções de Senador. §

Sou, portanto, de opinião que devemos pôr de parte a questão da validade da lei de 1911, e nos cingirmos somente à doutrina exposta na Constituição da República, que, note V. Exa. e a, Câmara, é posterior àquela lei. E êste facto explica que a lei eleitoral de 1911 contivesse disposições sôbre a perda do mandato dos membros do Congresso Constituinte, que as leis posteriores à Constituição deixaram do inserir.

Não me leve, pois, a. mal a ilustre comissão de infracções, constituída por ilustres jurisconsultos, dos quais recebo lições, que, neste momento, eu solicite que reconsidere no seu parecer e traga à Câmara um outro sôbre modificações a introduzir no Regimento do Senado.

Será assim que faremos obra útil, de modo a revolucionarmos com rapidez as graves dificuldades em que o Senado se vê para funcionar, devido às repetidas faltas de número, originadas na ausência sistemática de muitos Senadores. Mas, Sr. Presidente, para que não saia obra tumultuaria, e não pareça que saltamos por cima das fórmulas da ordem legalista que temos que observar (Apoiados), procuremos, com todas as formalidades, introduzir no Regimento uma disposição que declare o número de falias precisas para a completa caducidade do mandato dos Senadores.

Ou, por outra: estabeleçamos a sanção correspondente às obrigações que o Regimento impõe aos Senadores, visto que o Regimento a êsse respeito é omisso, havendo, por isso, a oportunidade de fazer aplicação do disposto 10 § único do artigo 180.° do Regimento.

A comissão de infracções poderá apresentar hoje mesmo — se a urgência é muita — a sua proposta de modificação ou aditamento do Regimento, que será certamente aprovada, sem mais discussão, e as-

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sim ficará solucionada uma questão que não terá realmente motivo para se protelar em longas controvérsias, não obstante os melindres da resolução que tem de se tomar. Um aspecto do debate convêm, todavia, salientar: não se trata de aplicar penalidades com efeito retroactivo; não se deseja introduzir disposições de circunstancia, fazer uma obra de má vontade, seja contra determinadas correntes de opinião, seja contra determinadas pessoas. O que se votar é únicamente para vigorar para o futuro.

Quem cumprir com os seus devedores de Senador, vindo à Câmara e não embaraçando a vida regular do Poder Legislativo com injustificada: ausência, estará dentro do Regimento. Quem faltar e justificar a sua ausência, estará ainda dentro do Regimento.

Quem faltar e não quiser dar ao Senado ao menos a consideração de, perante êle, alegar motivos da falta, êsse estará fora do Regimento o não terá que se queixar de êle lho ser aplicado com rigor.

Tenho dito.

É enviada à Mesa a seguinte

Proposta

Propomos que a comissão de infracções, a cuja alta competência e integridade o Senado presta a mais completa homenagem, emita um novo parecer sôbre a sanção regimental a aplicar aos Senadores, que não tomaram até hoje posse dos seus lugares ou infrinjam as disposições regimentais sôbre a comparência às sessões, dando-se assim cumprimento ao § único do artigo 180.° do Regimento. — Afonso de Melo — José Júlio César — Tiago César de Moreira Sales — F. M. de Oliveira Santos — A. R. Adães Bermudes — J. M. de Queiroz Veloso.

O Sr. Carneiro de Moura: — Ouvi com muita atenção os Srs. Senadores que me precederam, e a todos presto homenagem pela sua ilustração e saber, e pela intenção pura que os levou a usar da palavra.

Com respeito ao Sr. Afonso de Melo, devo dizer que o espírito do parecer da comissão é êsse mesmo que S. Exa. apresentou. (Apoiados).

Estamos todos de acôrdo; primeiro, sabem o que representa um diploma legislativo, o que é a lei; e V. Exa. o Sr. Presidente, não tem incrustada sob a Mesa, banalmente, a legenda ler.

A lei é o que os povos vêem impondo soberanamente. E como a lei não representa um caprichoso formalismo, mas a resultante consuetudinária da vida dos povos, ela estabelece penalidades a aplicar. E as penalidades não se aplicam por analogia, mas porque a lei expressamente as determina.

Não é uma cousa banal a sanção das leis, e quando qualquer lei não tem sanção expressa ela não se realiza coercitivamente.

É preciso que se saiba que, quando se legisla, se legisla a sério. (Apoiados).

Ao estabelecer uma lei, a penalidade para os contraventores deve ser indicada, e quando se faltar ao cumprimento da lei, virá a pena, mas se a lei expressamente a indicar.

Nós temos uma história de trinta séculos de legislação latina, e isto quere dizer que as nossas condições jurídicas não são um devaneio de legislar, mas uma modalidade étnica e jurídica vivamente acentuada. O povo-rei, o povo romano, criando o Direito, marcou na história da civilização o génio da sua imortal existência. A criação do Direito não é um capricho de oportunistas, mas a adaptação consciente e reflectida das possibilidades scientíficas da vida das sociedades. Quando os jurisconsultos dizem que não se pode dar conta sanção à lei senão o que a lei como sanção determina, e quando êles dizem que em Direito Penal não se pode raciocinar por analogia, não afirmam dogmatismo impertinentes, mas asseveram princípios verificados pelas necessidades da luta social.

Em Direito, como em qualquer outro ramo do saber humano, não se inventa.

Eu, por dever de profissão, tenho estudado as leis das sociedades humanas, e alguma cousa do que sei serve-me para admirar a sciência do Direito.

Nós estamos diante dêste problema: esta Câmara carece de funcionar; carece de que não haja alguém que lhe arraste a sua vida legislativa.

De acôrdo! E, assim, esta Câmara, invocando o parecer dos Srs. Senadores que têm a cultura do Direito, pediu-lhes que lhe formulassem o parecer que está em discussão. Mas como queria a Câmara que

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a comissão lhe dissesse qual a disposição que permite excluir os Srs. Senadores que têm faltado às sessões, se não existe uma lei que preveja o assunto, e só por lei expressa se poderia aplicar a irradiação.

A lei do 1911 não se refere a Senadores. Mas diz-se: poderá aplicar a lei por analogia.

Mas por analogia pode alguém sofrer um castigo?!

Jamais isso se fez num povo culto. (Apoiados).

O que acabou de dizer o Sr. Afonso de Melo é positivamente o que diz a comissão. Vote-se uma lei especial e regulamentar que permita aplicar a pena de irradiação, para o Senado dar o seu parecer sôbre a legitimidade da exclusão. Isso é outra questão. Sem uma clara lei que o permita, não pode a comissão propor a irradiação de quem quer que seja.

E assim, concluindo, creio que a comissão pode muito bem hoje, amanhã, ou daqui a pouco, se o Senado quiser, apresentar o seu parecer, mas antes disso tem de ser votada a lei especial que a comissão propõe.

O Sr. Machado Santos, por exemplo, que nos faça a sua proposta, e nós, como legisladores, conseguiremos elevar a lei ao nível em que ela deve ser colocada. Não estamos aqui para fazer violências a quem quer que seja, porque, como legisladores, somos, antes de tudo. obrigado as respeitar o direito de cada um.

O Sr. Severiano José da Silva: — Sr. Presidente: serei muito breve, e se não fôsse para apresentar uma razão que ainda aqui não foi apresentada, eu não falaria.

Eu não discordo de qualquer dos processos; o que desejo é que se alcance o fim desejado. Mas resta-me uma dúvida, e é que, não se seguindo o caminho que eu achava livre e jurídico pela aplicação da lei de 1911, porque, se não segue outro, que é o de fazer uma lei, e não o de aplicar o Regimento, porque o Regimento da Câmara não é uma lei?

O Sr. Carneiro de Moura: — É uma lei para a Câmara.

O Orador: — Nós viemos aqui com o nosso mandato, fomos eleitos por virtude
duma lei, e não podemos, de maneira nenhuma, de jus próprio, eliminar um indivíduo que foi eleito numas certas condições.

Eu tambêm sou jurista, pois que, desde que vejo que todos são juristas, julgo-me tambêm com autoridade para o ser, expondo livremente a minha opinião e pondo de parte, e por completo, as troças que porventura me queiram ou possam fazer.

Eu devo dizer a V. Exa. e à Câmara que nunca vi, nem nos tempos da monarquia, nem nos tempos da República, que uma lei pudesse ter efeitos retroactivos.

Nós, Sr. Presidente, não podemos aqui eliminar ninguêm.

Sr. Presidente: os Deputados e Senadores estão aqui por vontade do povo, e assim entendo que têm de aqui estar até o fim do seu mandato.

Desta forma não posso de maneira nenhuma estar de acôrdo com a doutrina apresentada agora pelo Sr. Carneiro de Moura, pois que dessa forma não ficava representada uma parte do país.

O Sr. Tiago Sales: — V. Exa. diz-me como é que um Senador pode aqui representar e defender condignamente a vontade dos povos que o elegeram, não comparecendo nunca às sessões?

O Orador: — Peço desculpa a V. Exa., mas êste sistema de interromper o orador que está falando dá quási sempre o resultado do se perder o fio do discurso que se está proferindo.

Não compreendo, pois, para que é que havemos de fazer uma lei se a outra foi adoptada. Isto está resolvido por si.

E não o digo por desprimor, nem com o intuito de retardar o andamento desta discussão, mas simplesmente para nos colocarmos bem: Por isso, Sr. Presidente, está dito o meu parecer, e mando para a Mesa, em virtude dos elementos que apresentei, a seguinte proposta:

«Proponho que seja consultado o Senado sôbre se se há-de ou não aplicar a lei eleitoral de 1911, sôbre matéria penal que não está revogada.— Severiano da Silva».

Tento dito.

O orador não reviu.

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O Sr. Queiroz Veloso: — Sr. Presidente: Não assisti à leitura do parecer da comissão de infracções e faltas, mas, pelos argumentos invocados pelos ilustres oradores que me precederam, concluo que o parecer é contrário à aplicação do artigo 106.° dos decretos com fôrça de lei de 5 e 20 de Abril de 1911, e que a comissão julga necessária uma lei especial para a eliminação dos Senadores que não compareçam, sem motivo justificado, a dez sessões consecutivas.

Não sou bacharel em Direito; mas isso não me inibe de expor francamente a minha opinião.

O Regimento do Senado diz o seguinte, nos seus artigos 170.° a 172.°:

«Art. 170.° Os Senadores têm obrigação de comparecer no Senado, às sessões, e não poderão escusar-se do serviço para que forem nomeados sem licença do Senado.

Art. 171.° Os Senadores, que, por justo motivo, não puderem comparecer, deverão participá-lo a Mesa.

Art. 172.° Nenhum Senador, emquanto o Senado se conservar aberto, poderá ausentar-se da capital por mais de oito dias, sem prévia licença da Senado».

O conjunto dêstes três artigos representa taxativamente:

1.° Que os Senadores têm obrigação de assistir a todas as sessões;

2.° Que não podem faltar sem motivo justificado;

3.° Que as faltas não podem ir alêm de oito dias consecutivos, sem licença do Senado.

Como a Câmara sabe, há Senadores, não obstante o Parlamento estar aberto há alguns meses, que ainda não tomaram posse dos seus lugares.

Pode o Senado considerar como Senadores quem deliberadamente tem faltado a todas as sessões, sem nenhum respeito pelas disposições peremptórias do seu Regimento? (Apoiados).

Evidentemente não; e para essa eliminação não é necessário recorrer à lei eleitoral de 1911.

A Constituição da República é posterior à mencionada lei, pois esta é de 20 de Abril de 1911, e a Constituição é de 21 de Agosto do mesmo ano.

Ora a Constituição, no § único do artigo 8.°, determina que a organização dos

colégios eleitorais das duas Câmaras e o processo da eleição devem ser regulados por lei especial.

Isto significa que, nos termos expressos da Constituição, a lei eleitoral tem de limitar-se à organização dos colégios eleitorais e ao processo da eleição. Não pode referir-se, portanto, às faltas de comparência dos Deputados e Senadores às sessões das respectivas Câmaras, pois isso nada tem com a organização dos colégios eleitorais, nem com o processo de eleição.

E é exactamente em obediência a essa disposição taxativa da Constituição da República que todas as leis eleitorais posteriores a 26 de Agosto de 1911 não trazem nenhum referência a faltas de comparência dos membros do Congresso, como trazia a lei eleitoral anterior, de 20 de Abril de 1911.

O § único do artigo 22.° da Constituição diz o seguinte, relativamente a vagas de Deputados:

«O Deputado eleito para preencher alguma vaga ocorrida por morte ou qualquer outra causa só exercerá o mandato durante o resto da legislatura».

Perfeitamente idêntico à disposição do § 2.° do artigo 24.°, concernente a vagas de Senadores:

«O Senador eleito para preencher alguma vaga ocorrida por morte ou qualquer outra causa exercerá o mandato pelo tempo que restava ao substituído».

A própria Constituição prevê, portanto, a hipótese de haver vagas de Deputados e Senadores, não só ocorridas por falecimento, mas por qualquer outra causa, que pode evidentemente ser a da aplicação da penalidade correspondente a um certo número de faltas, sem motivo justificado. O § único do artigo 13.° da mesma Constituição determina.

«A cada uma das Câmaras compete verificar e reconhecer os poderes dos seus membros, eleger a sua Mesa organizar o seu Regimento interno, regular a sua polícia e nomear os seus empregados».

Isto quere dizer que os Regimentos das duas Câmaras são da sua exclusiva competência; e como lhes pertence reconhecer os poderes dos seus membros, da mesma

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maneira podem estatuir as penalidades aplicáveis às faltas de comparência às sessões.

O Regimento em vigor na Câmara dos Deputados manda aplicar às faltes de comparência as disposições da lei eleitoral de 1911.

Mas deve notar-se que êsse Regimento é ainda 3 da Assemblea Nacional Constituinte e que foi aprovado em sessão de 4 de Julho de 1911, ao passe que a Constituição é de 26 de Agosto do mesmo ano.

O Regimento do Senado é de 8 de Dezembro de 1911, isto é, posterior a Constituição. Por isso se não refere à disposição da lei eleitoral de Abril de 1911, relativa a faltas de comparência dos membros do Congresso, pois êsse assunto não pode ser objecto da lei eleitoral, pertencendo exclusivamente aos Regimentos das Câmaras. É certo que o Regimento do Senado é omisso sôbre êste caso. Mas o artigo 180.° do mesmo Regimento prevê essa hipótese; bastará que o Senado aprove um artigo adicional, determinando — como é de justiça — que perdem o seu lugar todos aqueles Senadores que derem mais de um certo número de faltas, sem motivo justificado.

Tenho dito.

Lê-se em seguida na Mesa a proposta do Sr. Severiano José da Silva, que é admitida, assim como a apresentada pelo Sr. Afonso de Melo, a qual era assinada por vários outros Srs. Senadores.

O Sr. Pinto Coelho: - V. Exa. elucida-me sôbre a ordem da discussão?

Então põe-se em discussão uma proposta antes de estar em discussão o parecer?

O Sr. Presidente: — Esta proposta é de substituição.

O Sr. Pinto Coelho: — Mas parece-me que só depois de votado o parecer é que essa proposta tem cabimento.

O Sr. Machado Santos:— V. Exa. dá-me licença, Sr. Presidente? Essa proposta entra em discussão juntamente com o parecer da comissão?

O Sr. Presidente: — Sim penhor.

O Sr. Machado Santos: — Então está dentro do Regimento.

O Sr. Pinto Coelho: — O que não compreendo é que a Câmara discuta três assuntos ao mesmo tempo, mas, se é sob a forma de emenda ou de substituição, então está bem.

O Sr. Castro Lopes: — Sr. Presidente: como êsse e repito, nós estamos todos de acordo, e estamos de acôrdo porque queremos que haja uma disposição disciplinar, pela qual os Srs. Senadores que derem um determinado número de faltas percam o seu mandato.

As disposições dos artigos 170.° a 172.° e seu § único do Regimento, dão as penalidades, mas, desde o momento em que b á dúvidas, eu creio que com isto temos dito tudo.

Nestes termos, Sr. Presidente, nós estamos de acôrdo com o parecer da ilustre comissão de infracções, que muito respeitamos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pinto Coelho: - V. Exa. dá-me licença?

Segundo o artigo 112.° os aditamentos só pedem ser votados depois de aprovada ou rejeitada a matéria respectiva, quando não fiquem prejudicados pela votação sôbre esta.

A proposta do Sr. Dr. Castro Lopes é evidentemente um aditamento; e, sendo um aditamento, só pode ser discutida e votada, depois de discutida e aprovada a matéria respectiva.

Portanto, Sr. Presidente, V. Exa. tem de por à votação o parecer da comissão:

A proposta a que acabo de me referir, tem de ser admitida cora urgência e dispensa de Regimento, senão tem de ir à comissão.

Tenho dito, Sr. Presidente.

O orador não reviu.

O Sr. Severiano José da Silva: — Parece-me, Sr. Presidente, que a lei eleitoral, serve tanto para fazer como para desfazer Deputados.

Creio que nós não podemos ir estabelecer uma disposição, pela qual se possa, à vontade, eliminar um Senador e tenho receio de que nós vamos incorrer nesse perigo.

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Eu insisto portanto, Sr. Presidente, na minha proposta, de que se consulte o Senado sôbre se considera em vigor a parte penal da lei de 1911.

Posso dizer a V. Exa., Sr. Presidente, que o ilustre presidente da comissão, é da minha opinião.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Senador Castro Lopes.

Seguidamente lê-se na Mesa a proposta.

(Veja-se no Expediente).

O Sr. Castro Lopes: — Requeiro urgência e dispensa de Regimento para a minha proposta.

O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à votação nominal.

Seguidamente procedeu-se à votação nominal.

Disseram aprovo os seguintes Srs. Senadores:

Alfredo Monteiro de Carvalho.

António Maria de Azevedo Machado Santos.

Arnaldo Redondo de Adães Bermudes.

Artur Jorge Guimarães.

Carlos Frederico de Castro Pereira Lopes.

Constantino José dos Santos

Domingos Pinto Coelho.

Francisco Martins de Oliveira Santos.

Francisco Nogueira de Brito.

Francisco Vicente Ramos.

Germano Arnaud Furtado.

Guilherme Martins Alves.

João da Costa Couraça.

João da Costa Mealha.

João Lopes Carneiro de Moura.

João Viegas de Paula Nogueira.

José Maria Queiroz Veloso.

Júlio Dantas.

Tiago César de Moreira Sales.

Disseram rejeito os seguintes Srs. Senadores:

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Alfredo da Silva.

João José da Silva.

João de Sousa Tavares.

Luís Caetano Pereira.

Severiano José da Silva.

Zeferino Cândido Falcão Pacheco.

O Sr. Presidente: — Foi aprovado o requerimento do Sr. Castro Lopes. Está em discussão a proposta.

O Sr. Castro Lopes: — Requeiro a V. Exa. que se leia novamente a minha proposta por não ter sido bem ouvida.

Foi aprovado e seguidamente lê-se de novo na Mesa a proposta do Sr. Castro Lopes.

O Sr. Luís Gama: — Sr. Presidente: eu não desejo por maneira alguma protelar a discussão dêste assunto. Mas devo dizer a V. Exa. que me não parece completa a proposta que na Mesa se acaba de ler.

Sabe V. Exa. perfeitamente que se pode dar o caso de haver Senadores que, por motivos de fôrça maior, não possam vir às sessões, e que nem sequer possam justificar as suas faltas. Ora êsses Srs. Senadores, entre os quais pode haver até dos mais afervorados republicanos, perdem o mandato?!; Perdem o mandato os Senadores que não possam vir a esta Câmara sem que lhes seja possível, ao mesmo tempo, justificar as suas faltas?!

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Severiano José da Silva: —Isso é um caso para se julgar depois. Isso fica para depois...

O Sr. Presidente: - Mais ninguêm pediu a palavra. Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Afonso de Melo.

Lida na Mesa a proposta, foi posta à votação, sendo aprovada.

O Sr. Luís Gama: — Acho extraordinário votar-se a proposta sem uma ampliação, para o caso dos indivíduos que não tenham maneira de justificar as suas faltas.

O Sr. Severiano José da Silva: — Os casos de fôrça maior atendem-se sempre.

O Sr. Luís Gama: — Depois de lavrada a sentença, nada há a fazer.

O Sr. Oliveira Santos: — O Senado pode alterar o Regimento.

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O Sr. Presidente: — Desde que se vote que a comissão dê outro parecer, a proposta do Sr. Castro Lopes tem de ir à comissão.

O Sr. Tiago Sales: — O Regimento opõe-se a isto terminantemente. Diz o artigo 129.°:

«A votação das matérias far-se há pela ordem seguinte: 1.° Sôbre as emendas, segundo a prioridade da admissão: 2.1 Sôbre a proposta ou projecto inicial na parte não prejudicada por aquelas; 3.° Sôbre os aditamentos; 4.° Sôbre substituições não prejudicadas pelas votações anteriores».

Ora, a proposta do Sr. Castra Lopes é uma encerrada na essência.

O Sr. Presidente: — Não é uma emenda, não senhor.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Interrompo a sessão até que possa apresentar-se aqui o Ministério, que está na Câmara dos Deputados.

Eram 17 horas.

Reabertura da sessão às 17 horas e 40 minutos.

O Sr. Castro Lopes: — Requeiro que a sessão seja prorrogada, visto o Ministério estar presente.

Aprovado.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (José Relvas): — É com a maior satisfação que o Govêrno se apresenta ao Senado, a quem afirma a sue, mais alta consideração e ao qual peço a mais larga colaboração nesta hora difícil.

Em nome de todo o Govêrno, aos Srs. Senadores a expressão do mais alto respeito.

Leu.

«O Ministério chamado a dirigir os destinos do país, por decretos de 27 do mês findo, vem hoje apresentar-se ao Congresso da República e saudar os representantes; da Soberania Nacional, no momento grave em que os inimigos do regime atentam contra êste, esquecendo o bem da sua Pátria e os compromissos de honra que tomaram.

Tendo-se organizado nos termos da lei fundamental do Estado, constituindo o único Govêrno legitimo de Portugal, congregando não só as diversas correntes da opinião republicana, mais tambêm a socialista, julga satisfazer, na sua estrutura, às condições indispensáveis para a defesa das instituições, alêm de corresponder aos elevados desejos *do primeiro magistrado da nação e ao justificado anseio de todos os bons portugueses.

O Govêrno quer e deve viver com o Parlamento, numa atitude de absoluto respeito palas prerogativas do Poder Legislativo e na mais perfeita comunhão de vistas, de intuitos e de acção com os elementos republicanos que nele têm assento, para que nesta hora solene possa realizar-se entre todos uma união tam forte e tam estreita, que na seguinte fórmula se defina: Um por todos, todos por um e um e todos pela Pátria e pela República.

A sua missão é grande e bem difícil, mas em poucas palavras se resume: subjugar enérgica e rapidamente a revolta monárquica, promover a punição justa e legal de todos os responsáveis por tam criminosa tentativa, restabelecer a normalidade em todo o país e em seguida entregar o regime, salvo e purificado, em mãos que forem competentemente escolhidas para a continuação da obra redentora iniciada apenas em 5 de Outubro de 1910.

De resto, cumprirá religiosamente todos os compromissos de ordem internacional, tanto mais fácilmente quanto é certo que se mantêm inalterávelmente firmes e cordiais as nossas relações com os governos estrangeiros; fará, em todos os ramos do serviço público, administração escrupulosa e honrada, e procurará, prover, com devotado interêsse, a todas; as exigências e dificuldades do actual momento.

Prometer largas reformas, rasgadas iniciativas ou medidas de fomento, em semelhante ocasião, seria prometer o impossível, e o Govêrno só falará ao país, hoje e sempre, a linguagem da verdade.

Em fim, sob o ponto de vista político, o Ministério, porque é de todos os partidos,

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não tem partido algum. O seu partido é a República, o seu programa é defender a República, a sua ambição é salvar a República.

Nem um só instante desfalecerá na execução do seu mandato, e, seguro da confiança do Chefe do Estado, do apoio patriótico do Parlamento Português, da sublime dedicação do povo republicano e do indomável valor das fôrças fiéis de terra e mar, afirma bem alto a sua fé inabalável no triunfo e jura defender a República até o último dos sacrifícios, até a máxima das abnegações.

Lisboa, 3 de Fevereiro de 1919».

O Sr. Castro Lopes: — Chegou o Govêrno a esta Câmara, onde era esperado com a maior ansiedade.

Bemvindo seja.

Sentam-se naquelas cadeiras verdadeiros republicanos, homens de valor e do honra.

A muitos ou a quási todos eu conheço.

A alguns me prendem laços de verdadeiro afecto desde os tempos da Universidade, como o Sr. Ministro da Justiça, o qual sempre pelo sublime ideal da República se sacrificou.

Em nome, pois, da maioria, composta de homens de honra e republicanos, eu declaro que é recebido o Govêrno com justa satisfação e com êle está pronta a colaborar pela salvação da Pátria e da República.

O Sr. Oliveira Santos: — Sr. Presidente: permita-me V. Exa. que eu, em primeiro lugar o na presença do Govêrno constituído por homens reconhecidamente republicanos, começo por saudar êsse glorioso povo republicano de Lisboa que eu vi nessa escalada gloriosa da Serra de Monsanto defendendo a República, encarnando assim vivamente o ideal republicano, e mostrando que as instituições republicanas são a única forma de Govêrno porque se bate. E se foi grande o seu espírito de sacrifício, a sua abnegação, menor não foi o desinterêsse com que defendeu êsse nobre ideal.

Eu disse, Sr. Presidente, dêste lugar por mais duma vez à Câmara e ao Govêrno de então, que no Pôrto se fazia a propaganda mais criminosa, e, sobretudo, mais anti-patriótica contra a República e, portanto, contra a Ordem e tranquilidade do País que desejava trabalhar.

Fiz ao Govêrno de então a declaração de que por êsse país fora se encarceravam, a pretextos vários, velhos e liais republicanos, e disse moita vez a V. Exa. que na cidade do Pôrto, cidade profundamente republicana, cidade da liberdade por excelência, se tinham feito prisões e se maltratavam e perseguiam êsses velhos republicanos mesmo sem pretextos ,e só por que eram republicanos.

E era apenas secundado pelo Sr. Machado Santos, quando dizia a verdade, quando referia essas violências e torturas infligidas aos republicanos.

Eu previ, nessa altura, a necessidade de salvar a República pela constituição dum Govêrno retintamente republicano, onde predominasse aquela fé, a fé alada que nos leva sempre à conquista dos grandes ideais. Êle aí está. È um Govêrno cheio de fé republicana e de patriotismo. Faz uma declaração absolutamente lial, absolutamente republicana e patriótica.

Ninguêm já pode ter dúvidas sôbre a acção dêsse Govêrno na defesa da República e todos podem ter a certeza de que as perseguições, a desordem e as violências terminaram.

Tenho a certeza absoluta de que se vai fazer obra republicana com generosidade, mas com firmeza.

Os» monárquicos não mais poderão estar à fronte dos lugares de confiança da República. Foi nesses lugares que êles a atraiçoaram.

Êste Govêrno é composto de bons e sinceros republicanos desde o Sr. Presidente do Ministério até o mais moderno dos Ministros. Ninguêm pode ter dúvidas: são homens de bem, homens de Govêrno e do acção, que é o que neste momento mais se precisa.

É mester que se mantenha desde já a ordem no País e é por isso que eu chamo a atenção do Govêrno para o simulacro de assalto ou tentativa de assalto esboçado contra um jornal que eu não leio, porque não quero ler, mas que por ser um jornal não há o direito de assaltar: refiro-me ao Tempo. Aqui, dêste lugar, protestei sempre contra os assaltos dos jornais; protestei com a maior veemência

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quando assaltaram e destruíram a Montanha, o Norte, a República, etc., etc. Por isso protesto agora contra o assalto a qualquer jornal seja êle qual for.

Se jornais há que estão fora da ordem, ao Govêrno cumpre chamá-los à orcem e mostrar-lhes o caminho que devem seguir.

Ao Govêrno cumpre reprimir êsses factos, e fazendo o apenas o faz no interêsse da República e da Pátria.

Eu, Sr. Presidente, sou republicano, alheio a quaisquer filiações partidárias, e como republicano independente que sou não compreendo, nem posso compreender, de maneira alguma, que se pratiquem certos actos desta natureza bem que as autoridades intervenham e os punam imediata e rigorosamente.

Repilo a violência, e a desordem conforme já disse, e dentro dêsse critério entendo que o Govêrno deverá ser cauteloso, enérgico, e seguir de perto todos os factos que se podem ligar com os destinos do país, de forma a evitar a desordem e o desassossego público que tanto vem prejudicando as Instituições Republicanas.

Defenda, pois, o Govêrno a pureza dos princípios republicanos e terá consigo toda a Nação.

Não necessita o Govêrno do meu voto, mas se necessitar dêle pode ter a certeza absoluta de que me encontrará inteiramente ao seu lado.

Muito tem o país a esperar de todos os membros que compõem o actual Govêrno o, muito especialmente, do Sr. Ministro da Guerra, que, neste momento, é o homem que mais apertadamente podiam escolher para uma obra republicana realizada com firmeza, ponderação e energia. É um oficial ilustrado e um homem de bem.

Sr. Presidente: eu tive ocasião de dizer, nesta Câmara, da minha justiça quando da organização das juntas militares do norte, e logo disse que a sua organização tinha um outro objectivo, qual era o da implantação da monarquia. Não me enganei, nem enganei o Senado, como não deixei de o informar com verdade quando referi as prisões dos republicanos.

Essas juntas militares não só saíram fora da ordem, da disciplina e dos seus deveres militares, como, repito, tiveram um outro objectivo criminoso, qual era o de restaurar a monarquia em Portugal. (Apoiados).

Por isso os dirigentes dêsses movimentos têm de responder pelos seus actos e essa responsabilidade deve ir até aos seus haveres pessoais. Fizeram-se despesas avultadas com essas juntas. Devem pagar essas despesas os seus responsáveis organizadores, e quando a fortuna pessoal dos dirigentes não chegue, a Casa de Bragança que responda até onde chegar, visto que não enjeitou as responsabilidades nos últimos acontecimentos.

Sr. Presidente: nós não podemos viver num meio de desordem, num meio de indisciplina permanente; isto tem de acabar, o estou certo de que acaba com medidas rigorosas.

O País quer trabalhar, quere sossego.

Traga o Govêrno ao Parlamento uma proposta de lei nesse sentido se dela precisa e estou certo de que ela será imediatamente aprovada.

Caminhe o Govêrno no sentido de manter a ordem e a disciplina e terá cumprido o seu dever.

Tenho dito.

O orador mio reviu.

O Sr. Júlio Dantas: — Sr. Presidente: duas palavras apenas. Ouvi com o maior agrado a declaração ministerial. O meu mandato não é de natureza política. Não devo a minha cadeira de Senador nem ao favor do Govêrno, nem à fôrça eleitoral dos políticos. Estou aqui porque os artistas portugueses delegaram em mim a honra de os representar no Parlamento. Mas sou republicano, e quero afirmar a V. Exa. e à Câmara, o meu sincero júbilo por ver o Poder entregue a um Govêrno de liais e honrados republicanos. Alêm disso, como representante dos artistas portugueses, não posso deixar de orgulhar-me pelo fado de se encontrar à frente do Ministério um verdadeiro artista, espírito de excepcional cultura e de rara sensibilidade estética, que transformou num museu a sua bela casa dos Patudos, e que consagra ao culto da arte em geral, e, sobretudo, ao culto da arte portuguesa, os momentos nobres do seu nobre labor. A presença de S. Exa. no Govêrno, é para todos nós segura garantia de que, uma vez restabelecida a ordem

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no país, serão tomados na consideração que merecem os interêsses da arte nacional. Tambêm, como representante das Escolas de Belas Artes, me congratulo com a Câmara por ver a pasta da Instrução entregue a um homem de energia e de talento, que decerto porá ao serviço da mais difícil das políticas, que é a política pedagógica, a sua superior disciplina mental e a sua inquebrantável fé republicana. Saúdo, na pessoa dêstes dois Ministros, o Govêrno que acaba de apresentar-se ao Senado, certo de que êle, neste momento grave para a vida da República, saberá cumprir o seu dever. Tenho dito.

O Sr. João José da Costa: — Sr. Presidente: o Govêrno acaba de declarar que não tem política e que a sua política é a defesa da República, e isso me basta.

Como representante do comércio de Lisboa, devo dizer, que êsse comércio se sente orgulhoso de que o Govêrno seja composto de verdadeiros republicanos. É, aproveitando a ocasião para falar em nome do comércio, quero chamar a atenção do Sr. Ministro da Justiça para a lei do inquilinato, na qual, há pouco tempo, foram introduzidos alguns artigos que prejudicam considerávelmente o comércio, pedindo a S. Exa. que faça imediatamente pôr em execução a lei do inquilinato de 1911.

Devo ainda chamar a atenção do Sr. Ministro dos Abastecimentos para outros assuntos que correm pela sua pasta, mas antes disso quero declarar que bastante me satisfez a declaração de que S. Exa. está disposto a decretar a liberdade de comércio, bem como o barateamento do pão e outros géneros de primeira necessidade.

Ultimamente têm sido decretadas várias disposições relativas ao comércio, com que ninguêm tem lucrado, como, por exemplo, as senhas para os géneros racionados, e que tem causado grandes prejuízos ao comércio o ao público.

Constantemente se estão lançando contribuições ao comércio, é justo que se lhe dê toda a liberdade para êle poder transacionar.

Mas a liberdade de comércio deve ser para todos os comerciantes, e não apenas para uma parte, como há pouco se fez para a Companhia do Petróleo, à qual ainda não há muito se concedeu a liberdade de comércio. Tal restrição é que não compreendo!

Tambêm o Ministério dos Abastecimentos fez um contrato que, aliás, nada o honra, consentido que viesse do estrangeiro açúcar granulado, ficando o próprio Estado com 30 por cento da quantidade importada e autorizando quem o importa a vendê-lo a 1$40 e a 1$60. Esta maneira de negociar não é séria!

O açúcar pode fabricar-se em Lisboa, com os nossas ramas, como sucedia até 5 de Dezembro.

E preciso que se entre na normalidade e que o povo compre êsse artigo por um preço remunerador.

O comércio está pronto a sacrificar-se pela República, mas só pela República, como posso afirmá-lo, mas quere a sua acção livre.

Eu tenho a certeza de que o operariado do Pôrto e Braga está ao lado da República e a revolução já se teria dado se êles soubessem que nas cadeiras do Govêrno se assenta um Ministro socialista.

Repito, em nome do comércio que represento, não posso deixar de apoiar êste Govêrno que está pronto a defender a República.

O Sr. Adães Bermudes: — Não me arrependo de, em uma das últimas sessões, ter aconselhado o Govêrno transacto a que procurasse evitar os horrores da guerra civil.

Devemos todos reconhecer que êle empregou os maiores esforços para evitar ao país essa tremenda calamidade, cujas responsabilidades vão recair, assim, exclusivamente, pesadas e íntegras sôbre os tristes paladinos da reacção.

Desta nova tentativa de restauração monárquica resultará para a República mais um brilhante triunfo e, sobretudo, a definitiva consagração moral do regime republicano e a sua plena e definitiva identificação com a consciência nacional, que não pode deixar de manifestar-se perante a evidência concludente dos factos.

Esta nova aventura realista reveste-se de circunstâncias tam criminosas e abomináveis que demonstra, duma forma iniludível, que os partidos reaccionários não podem viver sob qualquer regime de li-

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berdade, pouco ou muito; que não podem viver senão sob um regime do despotismo, dominados por êle eu esmagando os outros sob o seu despotismo. Desde que deixem de ser perseguidos, tornam-se imediatamente perseguidores e não há contemplações que possam desarmar a sua feroz e obstinada intransigência, sendo, portanto, incompatíveis com o sentimento geral da Nação.

A lição, desta vez, é decisiva. Pura respeitar a liberdade de consciência e de opinião concedeu-se aos monárquicos aquela larga tolerância que é urna das mais elementares virtudes republicanas, e êles abusaram dessa tolerância, na mesma larga escala, para agredir e desacreditar constantemente a República.

Na honesta intenção de os integrar da vida nacional, a fim de se promover a pacificação (ia família portuguesa, tam necessária para que o país se pudesse restaurar, no trabalho, de tantas calamidades que tem. sofrido, concederam-se-lhes liberdades, garantias, favores e postos de destaque excepcionais, que elos agradeceram com a mais negra traição, aproveitando todas as concessões para maquinar a perda da República, que tam fraternalmente os acolhia.

Aos nossos votos sinceríssimos de confraternização corresponderam assolando o pais a ferro e a fogo.

E, quando nos cumpria recolher os frutos dos nossos sacrifícios pela comparticipação na guerra, êles não duvidaram inutilizar todos os direitos que tínhamos adquirido à sombra da bandeira republicana, rasgando e calcando aos pés essa bandeira que ajudou a formar, com as de todos os países cultos,- o glorioso arco-iris da vitória, o sagrado arco-iris anunciador da democracia universal.

Eu não sou político, Sr. Presidente, mas sou português, e, por isso, entendo que os ambiciosos aventuremos que provocaram criminosamente a guerra nacional não podem ser considerados adversários da República, que os não hostilizava: êles são declarados e confessos inimigos e traidores da Pátria, e, como tais, têm de ser perseguidos e castigados.

Para salvar a honra nacional, enxovalhada per êsses especuladores políticos, é para salvar o futuro do país, que neste momento se está decidindo na Conferência da Paz, e que corre os maiores perigos, precisamos que todos os republicanos, sem distinção do matizes, que todos os liberais, que todos os bons patriotas se unam, como um só homem, para dar a êsses aventureiros uma batida saem tréguas e um castigo sem mercê.

Neste momento, Sr. Presidente, não há responsabilidade a discutir, não há moralidades a pregar nem combinações políticas a Lazer; neste momento há apenas: dum lado todos os bons cidadãos que querem defender o futuro da sua Raça e a independência da sua Pátria, e do outro lado os traidores e os inimigos da Pátria e temos de desinfectar primeiramente o país desta peste, que vem entravando sistemáticamente a vida do país, e, depois disso, será tempo então de que todos aqueles que têm responsabilidades políticas façam o seu exame de consciência para se corrigirem os erros que têm sido praticacos e para se modificarem processos que não podem agradar a toda a gente e que tornaram possível a situação em que nos encontramos.

E, pelo esforço patriótico de todos nós, façamos com que o Poder deixe de ser o feudo alternativo ou exclusivo dos partidos, para que nas lutas partidárias se não esgotem todas as inteligências, actividades e energias da nação, e procuremos, sobretudo, tornar a República cada vez mais tolerante, mais honesta, mais disciplinada e mais laboriosa; uma República, em suma, dentro da qual caibam simultaneamente todos os bons portugueses.

Eu vejo, Sr. Presidente, pelas declarações do Govêrno, que são êstes os seus propósitos e que êle propugnará, indefectivelmemte, pela defesa das instituições. E, desde o momento em que êle adopta êste lema: — «Um por todos, todos por um e um e todos pela Pátria e pela República» — apraz-me declarar que me encontrará sempre a seu lado.

Tenho dito.

O Sr. Pinto Coelho: — Sr. Presidente: falo em nome do Centro Católica.

São poucos, nesta e na outra casa do Congresso, os representantes desse Centro; mas não me julgo com menos direito a levantar aqui a minha voz.

Represento aqui o Algarve, essa nobre província. Estou aqui pelos votos dos ci-

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dadãos, que têm direito absolutamente igual aos outros.

A minha candidatura vingou contra votos de republicanos e votos de monárquicos.

Entendo, portanto, que estou aqui usando da palavra, pôsto que seja pouco numeroso o grupo que represento no Congresso, com o mesmo direito com que outros falam. (Apoiados). E, no uso da palavra, reivindicarei mais uma vez para o Centro Católico a sua completa autonomia.

Na outra sessão desta casa coube-me a palavra depois de ter falado o Sr. Machado Santos. S. Exa. confundiu católicos e monárquicos na mesma censura.

Não respondi imediatamente a S. Exa., porque não ouvi as suas palavras, e só delas tive conhecimento pelas referências que li nos jornais, mas essas palavras mais uma vez me levam a reivindicar a autonomia a que me referi, e na ocasião em que os monárquicos são alvo duma especial animosidade. Essas reivindicações são as que fiz que logo na primeira sessão em que tive a honra de falar no Senado. (Apoiados).

Disse então:

Leu.

Sr. Presidente: o Centro não representa nenhum partido político. Propriamente falando, o Centro Católico é uma agremiação religiosa, se quiserem política, mas política na mais nobre e elevada acepção da palavra. Tem, entre vários fins, tambêm o de interferir na elaboração das leis, em ordem a que essas leis sejam a afirmação da unanimidade cristã, dando à Igreja as suas legítimas liberdades. Por isso mesmo não tem cor política, no seu grémio entram republicanos e monárquicos.

O Centro pregunta àqueles que vão inscrever-se se são católicos sinceros.

Desde que o são, entram para o Centro com as suas convicções políticas.

Não serão molestados por êsse facto.

Pregunto eu: haverá alguma incompatibilidade entre catolicismo e República?

Uma voz: — Não há.

O Orador: — Não há. E realmente os exemplos de autoridades para assim o demonstrar são tam conhecidos que é uma banalidade o citá-los.

Na Suíça, que é uma República federal, a igreja católica goza das maiores liberdades. Nos Estados Unidos do Brasil nação nossa irmã e República também as relações entre o Estado e a, Igreja são boas e amigáveis, e quando lá se proclamou a República, estabeleceu-se a separação entre o Estado e a Igreja, mas o estatuto dessa separação não contêm perto de duzentos artigos, cada um dos quais é um vexame ou uma expoliação. A separação lá fez-se num diploma com cinco os seis artigos, todos duma clareza e lialdade admiráveis.

Nos Estados Unidos da América do Norte — êsse belo país, que na guerra que está a findar, deu um tam nobre exemplo que deve ser seguido pelas gerações vindouras, e onde as liberdades não são só para os que estão no Poder, pois há ali a maior tolerância para os que estão na oposição — a igreja católica goza das maiores liberdades. Presidentes da República que não são católicos, como Roosevelt e Taft, compareceram em congressos católicos e aí prestaram homenagem à Igreja Católica, enaltecendo a sua obra caritativa e a sua acção civilizadora na República.

A religião católica é o principal elemento de ordem o disciplina na sociedade.

Mas há mais exemplos: a Rússia, antes, é claro, do bolchevismo, e a própria China.

Na Rússia, quando caiu o tzarismo, a religião católica gozou, no regime republicano, das maiores liberdades.

O mesmo sucedeu quando a República se proclamou na China.

Não há, conseguintemente, nenhuma antinomia entre Religião e República.

Dir-se-ia que em Portugal é que existe a especialidade dessa antinomia. Mas pregunto:

De quem é a culpa?

Se, em 1910, ao proclamar-se a República, se tivesse enveredado pelo caminho da tolerância, não haveria hoje antinomia alguma entre a República e a Religião.

As primeiras medidas da República, em 1910, foram todas de guerra contra a religião católica.

Foram expulsos todos os membros das associações católicas.

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Depois de expoliada a igreja regular, expoliou-se a igreja secular.

A primeira República sucedeu uma outra, que veiu inaugurar Sidónio Pais.

Pois bastou que êste concedesse à igreja um pouco das liberdades que ela reclamava, para que os católicos se acercassem desta República.

A êle eu tive a honra de ouvir que considerava os católicos como os seus mais liais sustentáculos.

Daqui concluo que a autonomia da igreja católica, não é com a República, mas com os republicanos perseguidores.

Contudo, a igreja, mesma quando se vê mais injustamente perseguida, não se vinga.

Temos vivido em tempos de atentados, e eu pregunto se alguém é capaz de assacar a algum católico algum assassinato.

A igreja mesmo nem fomenta insurreições.

Ela proíbe aos seus filhos que se insurrecionem.

Esta é a nossa doutrina.

Será uma fraqueza talvez, mas não importa, a igreja tem-se dado bem com esta doutrina.

Nesta actual guerra civil, a igreja só interviria como elemento de conciliação.

E as minhas palavras são de que faço ardentes votos para que do Norte ao Sul surja a paz.

Pelo que respeita ao programa, eu direi que o Sr. José Relvas é uma figura nobre.

José Relvas é para mim uma figura de especial nobreza.

Tempos houve em que tive com S. Exa. relações de muita convivência.

Trabalhamos juntos e bem, não em partidos políticos mas em prol da agricultura portuguesa.

Portanto, a sua situação de chefe dêste Govêrno é para mim uma situação que por êste lado me importa confiança, não digo confiança, debaixo do ponto de vista da sua tolerância e respeito pelas confissões religiosas, pois não vejo na declaração ministerial uma única palavra que diga respeito às reivindicações do centro católico.

Não faço disso um agravo, porque compreendo que o Govêrno tem outro fim mais urgente a que aplicar a sua atenção.

Mas, porque não vejo nada a êsse respeito, a minha atitude será de espectativa e definirei a muita atitude pelos actos do Govêrno sôbre as reivindicações do Centro Católico, em cujos destinos confio.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Machado Santos: - Sr. Presidente: há muitos finos que não via apresentar-se naquelas bancadas ministeriais um Govêrno retintamente republicano. Vejo hoje, nesta hora que passa e que é de provação para os republicanos.

Êsse povo a que se referiu o Sr. Oliveira Santos, que impôs a defesa da República e que tam heróicamente se bateu em Monsanto, já hoje não receia que se volva aos tempos de Domingos de Gusmão, Torquemada, Jacques Clement e Ravaillac.

Êsse povo já não receia que o atraiçoem, que o anavalhem pelas costas. Isto justa para que todos nós auxiliamos o Govêrno que se apresenta, pois que todos suprimentos de suas deficiências na sua espinhosa missão, sem as atribuirmos a erros precipitados ou & intenções criminosas.

E tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. Queiroz Veloso: - Sr. Presidente: o ilustre Senador Sr. Júlio Dantas disse há pouco que não devia a sua cadeira de Senador nem a favores do Govêrno nem à fôrça eleitoral dos partidos. Também eu não devo a minha ao lado daqueles nem à influência política dêstes. Devo-a unicamente à boa amizade dos meus colegas das três Universidades da República, que tam generosamente me deram essa honra, que eu nunca poderei esquecer.

Represento aqui as três Universidades da República; e digo da República porque tenho a convicção de que a Universidade do Pôrto, assim como a própria cidade, continuam a ser profundamente republicanas, a despeito da transitória monarquia que ali acaba de ser restaurada. Não será por terem sido talvez obrigados alguns dos seus professores a declarar, no prazo de três dias, a sua adesão ao regime monárquico, sob pena de perderem os cargos que à custa do tantos trabalhos e canseiras conseguiram obter,

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que eu deixarei de considerar a Universidade do Pôrto tam profundamente republicana como o era antes dessa funesta aventura, que noves sobressaltos, novas inquietações veio trazer à vida política do país.

O Sr. Júlio Dantas, como representante dos artistas portugueses, dirigindo-se ao Sr. Presidente do Ministério, acentuou a feição requintadamente estética do seu espírito de verdadeiro artista, ESSA feliz inspiração fez-me lembrar que a Faculdade de Letras de Lisboa, de que tenho a honra de ser director, é a directa sucessora do antigo e nobre Curso Superior de Letras, de que o Sr. José Relvas foi aluno distintíssimo, dos quatro únicos estudantes como ainda eu pouco tive ensejo do o verificar, folheando casualmente os respectivos livros de matricula e de exames que ali completaram, a sua formatura em letras, pela defesa duma tese que a lei só exigia aos que aspiravam ao diploma superior. É, pois, com viva satisfação que vejo na Presidência do Ministério quem tanto se distinguiu nesse caso, onde professaram as mais altas individualidades portuguesas o que recentemente se transformou na actual Faculdade de Letras.

Na declaração ministerial frisa-se que a missão do Govêrno é grande e bem difícil. Assim é, na verdade. Mas a união de todos os republicanos, de que é feliz exemplo a composição do actual Ministério, sem preocupações de antigos partidos e tendo apenas em vista a defesa da República, será suficiente para vencer todas as dificuldades do momento.

A insurreição monárquica do norte, quando os destinos das nossas colónias se estão jogando na Conferência da Paz, não fôr apenas um crime político contra as instituições, foi Um verdadeiro crime contra a Pátria. (Muitos apoiados). Lembremo-nos de que no Congresso do Viena, em 1815 de que na Conferência de Berlim, em 1885, quando se criou o Estado Livre do Congo, bastante sofreram os nossos legítimos interêsses. Pois é numa ocasião de tanto perigo para o nosso futuro colonial, quando para sermos fortes na defesa dos nossos direitos precisamos de ser lialmente e inteiramente unidos, que a insurreição do Pôrto veio lançar-nos numa luta fratricida que, se não é subjugada a breve trecho, pode infelizmente ser fatal para a sorte da própria nação, de que uns, e outros somos filhos! E é isso exactamente o que mais faz avultar a tremenda responsabilidade moral dos revoltosos.

Eu não represento nesta casa do Parlamento partido político algum; represento as três Universidades da República, cujas funções não devem ser apenas preparar para as diversas profissões liberais, mas fomentar, fortalecer com mm alto espírito patriótico a unidade da alma nacional. Creio, porêm, que em nome do Senado posso afirmar que ele ouviu com o maior agrado a declaração do Govêrno, protestando o seu respeito pelas prerrogativas do Poder Legislativo e a sua perfeita comunhão de vistas com os elementos republicanos que tem aqui assento. O nosso dever é, portanto, auxiliá-lo, conjugando todos os esforços, aplanando-lhe o mais possível os estorvos do caminho, até que a normalidade se restabeleça por completo no país inteiro.

Tenho a certeza de que as fôrças republicanas hão-de esmagar a insurreição monárquica. O tempo não vai propício para restaurações realengas; a monarquia não pode nunca mais restabelecer-se em Portugal. Digo-o, absolutamente convencido, eu que antigamente fui monárquico e não devo nenhum favor à República.

Mas se a monarquia nunca pode ser restaurada, pode a vitória do Govêrno não ser, porêm, tam rápida, como a tranquilidade nacional desejada, merco dos postos de confiança em que a própria República colocara os insurrectos.

Para obviar a êsse perigo, é indispensável que todos, sinceramente, nos unamos em volta do Govêrno, de sorte que êle possa contar, em todas as emergências, com a nossa boa vontade e o nosso apoio.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. Severiano José da Silva: — Resume-se o programa do Govêrno em poucas palavras — pacificação dos portugueses.

Simples enunciado, difícil porêm traçar-lhe nitidamente os contornos que circunscrevam um compromisso.

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E difícil é traçá-los porque o terreno em que o Govêrno tem de operar está revolvido e inquieto.

Quando se implantou a República, obrigou o seu programa a bulir no princípio da autoridade, da propriedade, da família e a separar a religião do Estado.

E, sendo êstes princípios alicerces da sociedade e a religião um fenómeno que era preciso respeitar por seus interêsses morais e materiais, as medidas e leis adoptadas perturbaram a sociedade portuguesa como sucedeu em 1834 com semelhantes transformações.

Em dois anos de República, ia a sociedade portuguesa adaptando-se ao novo meio, porque os republicanos aplicavam moderadamente as suas novas fórmulas.

Passado porêm êsse tempo e par circunstancias que não vêm para aqui, nesta hora entenderam os republicanos, então detentores do poder, que era preciso praticar rápido e a fundo, todas as fórmulas preconizadas pela República.

Os processos adoptados para tal fim podiam deixar de ser violentos e chocantes.

Ao princípio da autoridade, que de divino passará a ser humano, achincalhou-se por tal forma, que o polícia ou guarda, em vez de respeito, inspirava dó.

O princípio da propriedade, significado do homem em sociedade, chegou por tal forma a ser abalado em seu conceito que ao proprietário se chamou simples detentor.

A maneira como por vezes se praticaram as leis de família fez estremecer os lares.

O processo como se praticava a separação da Igreja do Estado, tornou-se em perseguição ao padre e atentado a liberdade da consciência.

A sociedade portuguesa portal proceder de radicalismo, sentiu-se profundamente perturbada e quando apareceu um homem incarnando a reacção, ela estava ao seu lado. Com um punhado de homens, venceu milhares que custodiavam o radicalismo.

É que a opinião, sempre invencível, estava com êle.

Na luta com o radicalismo, teve de se rodear de elementos conservadores e monárquicos que tambêm o combatiam. Estes por ambição e falsa percepção dos fenómenos entenderam que o país queria a monarquia e, no momento oportuno que as circunstâncias prepararam, astearam o pendão azul e branco.

Sabe-se como lhes respondeu o povo.

Derrubou, num arranco sublime, essa bandeira, e disse lá no alto de Monsanto:

«Não, enganai-vos e atraiçoas-te-me. O povo se não quere o radicalismo republicano, tambêm não quero a monarquia. O povo quere a república progressiva, mas conservadora».

Eis o programa do Govêrno:

O que se produz alêm do Pôrto é simples episódio da errada interpretação que apontei. Há-de cair cedo ou tarde, porque o povo assim o quere, assim o demonstrou.

Êle traçou a linha, ao Govêrno compete segui-la.

E tenho inteira fé de que a seguirá.

Os homens que o compõem tem um passado e êsse passado define-os perante mim e a sociedade.

Neles confio e tem por isso o meu incondicional apoio.

Vozes: — Muito bem.

O Sr. Afonso de Melo: — Sr. Presidente: vou procurar ser breve porque a hora vai adiantada e eu vejo que a Câmara começa a estar fatigada, mas não posso deixar de dizer algumas palavras na ocasião em que aqui se apresenta o novo Ministério, em virtude da situação em que me encontro dentro desta Câmara, que, como V. Exa. sabe, tem, pela representação das classes, uma constituição especial.

Eu represento no Senado os sindicatos agrícolas, e é nessa qualidade que começo por dizer algumas palavras.

Sr. Presidente: como representante da agricultura portuguesa, pelos seus sindicatos agrícolas, tenho muita satisfação em assegurar a V. Exa. e à Câmara que estou convencido de que o Govêrno corresponderá às esperanças que nele deposito como mantenedor da ordem, respeitador da lei e fautor tio progresso da economia nacional, pois que pela sua constituição me mereço a mais inteira e complete, confiança.

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Eu vejo à frente dêle o Sr. José Relvas, um dos mais esmerados e progressivos agricultores da nossa terra, que à lavoura tem consagrado o melhor do seu esforço e os mais primorosos dotes do seu talento, que tem muitas facetas, sendo uma das mais brilhantes precisamente aquela pela qual se tem esmeradamente consagrado ao progresso e desenvolvimento agrícola. S. Exa. como lavrador, que administra as suas terras, como director da Associação de Agricultura Portuguesa, é bem conhecido de todos nós, os agricultores, e por nós será respeitado e apoiado, na sua obra de Govêrno, que temos a certeza de ser digna do conceito que dêle fazemos.

S. Exa., em nome do Govêrno a que preside, mio veio prometer largas reformas, que não poderiam ser postas em execução nem sequer discutidas no actual momento, mas veio falar ao país uma linguagem de sinceridade e verdade.

S. Exa. tem resolver o problema da ordem pública. Os sindicatos agrícolas, estranhos à política, mas vivendo dentro da lei, não podem negar ao Govêrno todas as facilidades para seguir o seu caminho.

Sr. Presidente: não quero esquecer-me de que o actual Sr. Ministro da Agricultura sucede a um homem pelo qual a agricultura tinha grande veneração, o Sr. Fernandes de Oliveira, ao qual folgo de me referir nestes termos, agora que êle já não é Ministro.

O Sr. Jorge Nunes que o substitui na hora em que o Sr. Fernandes de Oliveira devia abandonar aquele lugar, é o homem próprio para ocupar, neste momento, a pasta da agricultura. Herdeiro de um grande nome como agricultor, como liberal, como tradição de honra e tolerância, S. Exa. não desmente nem estraga essa herança, antes é capaz de a acrescentar. Afirmo a S. Exa. a minha mais alta consideração, certo de que interpreto o sentir de todos os agricultores.

Sr. Presidente: permita-me V. Exa. ainda que, como magistrado que sou, saúde o Sr. Ministro da Justiça, um homem que da magistratura merece a maior estima e o maior respeito pela sua honradez nunca desmentida e pela sua inteligência e integridade de carácter sempre confirmadas.

E, visto que na política do nosso país represento alguma cousa mais do que um simples Senador pela agricultura, permita-me V. Exa. e a Câmara que eu relembre que, tendo fugido sempre a ocupar posições de demasiado destaque na política, entrei, todavia, para o Ministério que se seguiu ao assassinato do Sr. Sidónio Pais, por cuja memória e por cujos altos propósitos eu tenho o maior respeito, que os acontecimentos, sejam quais forem, me não levam a ocultar.

Entrei para êsse Ministério em circunstâncias muito anormais. Solicitado altas horas da noite para dar a minha cooperação a um Govêrno que tinha de constituir-se nessa noite mesmo, porque havia o receio de que, com um pronunciamento militar, se viesse, nesta hora difícil e melindrosa da vida da nação, perturbar a marcha dos negócios públicos e, dum modo geral, a vida do país, acedi a entrar nele.

Não me arrependo disso, porque estive em boa companhia. O meu nome foi, porêm, mal recebido pelas chamadas Juntas Militares, que nessa altura se arrogavam o direito de interferir directamente na organização dos Govêrnos da Nação.

Se faço êste relato, Sr. Presidente, é porque me parece que convêm ficarem registados os pontos a que me refiro, para que mais tarde, quando se fizer a história do momento que atravessamos, ela possa ser feita com verdade.

Sabendo, pois, Sr. Presidente, que o meu nome não era bem visto por parte do elemento militar, procurei imediatamente o Sr. Presidente do Ministério, Tamagnini Barbosa, e disse-lhe que me considerasse desde aquele momento demissionário, porque, tendo eu acedido a entrar para o Ministério únicamente no intuito de evitar que no país se cometesse mais um crime político — e quam grave êle era se está vendo agora — via que o meu nome, longe de servir para aplacar paixões, antes era um pretexto para as exacerbar. E não fiquei por aqui: acrescentei que, se por causa do meu nome se tivesse de disparar um tiro, nem que fôsse para o ar, eu já não punha só à disposição de S. Exa. a minha pasta, mas me recusava terminantemente a subir de novo as escadas do Ministério da Justiça. Esta declaração a repeti no Conse-

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lho de Ministros que se realizou na noite de 23 para 24 de Dezembro, deixando o meu pedido de demissão, por escrito, nas mãos do Sr. Presidente da República.

A demissão não me foi dada, porêm, pela necessidade de manter o prestigio do poder, e o Govêrno, não perdendo de vista os supremos interêsses nacionais que aconselhavam a manutenção da ordem a todo o custo, procurou uma solução conciliatória.

As cousas correram, porêm, por uma, tal maneira, que eu nem as sei bem explicar mesmo porque, por natural melindre, me mantive afastado do decurso das diligências em que o Sr. Presidente do Ministério se empunhou, até que se realizou um novo Conselho de Ministros, a que assistiram depois, os Presidentes das duas Câmaras e os leaders dos partidos políticos.

Suponho que não comete uma inconfidência nem uma incorrecção — pois que só falo de mim — afirmando que eu nesse Conselho, depois de sustentar mais uma vez o desejo de evitar scenas violentas, disse ao Sr. Presidente da República ao Sr. Presidente do Ministério e aos meus colegas que, se se tratava duma simples infracção de disciplina, se S. Exas. tinham elementos de convicção para crerem que se tratava de um movimento que apenas traduza, uma loucura, julgando-se o Governo com força para depois, oportunamente, meter os discolos na origem, que eu sairia imediatamente do Govêrno para que não houvesse quaisquer perturbações nesta conjuntura. Mas se a má vontade contra o meu nome não passava, como indicava dum ridículo pretexto, e que, por trás daquela manifestação, havia mais alguma cousa do que isso, havia manejos tendentes à modificação do regime, então eu, Ministro da República, por um dever de honra, não tinha de hesitar: entendia que o governo devia demitir-se imediatamente e constituir-se um governo de concentração republicana porque os factos seriam extremamente graves desde que nele estavam envolvidas, como se dizia, a guarnição do Porto e grande parte de Lisboa.

Trouxe estes factos à tela do debate, com esta minúcia, para que sobre eles não venham a fazer-se errados comentários e para demonstrar que, dando o meu apoio
ao presente Govêrno, o faço de harmonia com as ideas que expus muito antes da, sua constituição.

É êste um Governo de concentração republicana, encarregado de defender, o regime legal da Nação e de restabelecer a ordem neste desgraçado país?

Defenda o regime, restabeleça a ordem, que com o apoio que dentro e fora desta casa possa prestar-lhe pode o Govêrno contar abertamente.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (José Relvas): — O Governo ouviu com a maior satisfação as palavras proferidas pelos representantes políticos no Senado e por aqueles Senadores que representam os que os elegeram nesta casa.

Com igual satisfação ouvi as palavras de apoio, porque é exactamente do que o Govêrno mais carece para realizar a obra que se impôs.

O Sr. Queiroz Veloso disse que a monarquia não pode voltar.

Não pode ser restaurada.

Tem razão: a monarquia não pode ser restaurada, porque é a divisão.

O dever mais inadiável que se impõe ao Governo é defender a República, restituir a República ao território que está neste momento ocupado revolucionariamente pelos monárquicos.
É esta a razão do maior esforço do Governo, a sua preocupação de todos os seus momentos, o que espera seja brevemente realizado para fortuna do todos. (Apoiados).

Êsse é o desideratum.

Temos diante de nós a representação política de que carecemos para a imediata resolução desta situação, que este terrível crime, como alguém lhe chamou, criou.

O Govêrno encontrou constitucional-mente a solução, no alto sentimento que deve dominar neste momento os republicanos, cuja representação é completa dentro do Govêrno.

Temos de encarar êsse problema e dar-lhe solução.

Não pensa o Governo actual em interferir na, reunião dos partidos, nem, ter a menor intervenção política. (Apoiados).

Já o afirmei: desejo muito viver com o Parlamento, respeitando todas as suas prerrogativas e completa autonomia.

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Por isso mesmo que é um Govêrno de concentração republicana, é respeitador da lei, que não pode deixar de considerar necessária à vida normal do país.

Protesto, portanto, mais uma vez, o meu máximo respeito pelo Poder Legislativo, de cuja colaboração o Govêrno necessita e julga oportuna.

Ditas estas palavras, referir-me-ei a quem, com autoridade, aqui ocupa uma posição excepcional o Sr. Dr. Pinto Coelho.

Eu tenho por S. Exa. a máxima consideração e, por isso mesmo senti que o ilustre Senador se tivesse referido, pela forma como o fez, às relações entre a República e a Igreja.

S. Exa. esqueceu-se da fase actual dessas relações, que são diferentes das de 1910.

A separação mantêm-se como princípio, e o Estado não pode desistir dela.

O Estado é neutral.

A separação mantêm-se com a reforma introduzida por Moura Pinto e com a representação do país junto da Santa Sé.

A situação não é, pois, de perseguição à igreja.

O Sr. Pinto Coelho: — A frase que empreguei foi para significar que não podia haver antinomia entre a República e a Religião.

A antinomia só pode existir com uma República perseguidora.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (José Relvas): — A situação actual é outra.

Eu não sou um político e é-me muito grato dar esta explicação ao Senado.

O facto do Sr. Presidente da República me chamar para formar gabinete foi para mi m uma surpresa. Eu senti-me realmente muito pequeno perante uma ta m importante missão num momento tam grave; e não teria aceitado êste encargo, se não-partisse do princípio de que a situação é anormal e que ninguêm tem o direito dose furtar a ser ir o país.

Foi por isso que eu aceitei, e, passado-o primeiro momento, eu pensei que o problema se resolvia muito bem, suprindo a minha insuficiência com a alta competência das pessoas que ocupam êstes lugares.

Agradeço as referências de carácter pessoal que me fizeram. Já agradeci o apoio político. Êsse apoio pessoal que vêm da simpatia eu considero-o uma grande-força.

Devo dizer que tenho procurado pôr em jôgo exactamente êsses afectos, e aqueles Srs. Senadores que, acentuando o carácter pessoal, tiveram referências tam gentis para mim, fizeram-me recordar que, ainda apelando para êsses sentimentos pessoais, havemos de vencer esta crise que teve a grande virtude de poder afirmar neste momento as boas qualidades do povo português.

O orador não reviu.

Vozes: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — A próxima sessão e amanhã, á hora regimental, sendo a ordem do dia pareceres das comissões.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 10 minutos.

O REDACTOK—F. Alces Pereira.

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