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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
1918-1919
SESSÃO N.º 29
EM 21 DE FEVEREIRO DE 1919
Presidência do Exmo. Sr. Machado Santos
Secretários os Exmos. Srs.
Luís Caetano Pereira
Guilherme Martins Alves
Sumário.— Às 14 horas e 30 minutos abre a sessão com 25 Srs. Senadores prementes. O Sr. Tiago Sales apresenta reclamações sôbre a acta, que o Sr. Presidenta atende, propondo em seguida que na acta se lance um voto de protesto contra o atentado de que foi vitima o Sr. George Clemenceau, Presidente do Govêrno francês, e de congratulação por o assassino não ter conseguido os seus fins. Falam os Queiroz Veloso, Castro Lopes, Afonso de Melo, Paula Nogueira e Alfredo da Silva, sendo ou votos propostos aprovados. E depois de apresentados documentos pelo Sr. José Júlio Águas, a sessão é encerrada por não haver número.
Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alfredo da Silva.
Amílcar de Castro Abreu e Mota.
António Maria do Azevedo Machado Santos.
António Maria de Oliveira Belo.
Arnaldo Redondo de Adães Bermudes.
Artur Jorge Guimarães.
Carlos Frederico de Castro Pereira Lopes.
Cláudio Pais Rebêlo.
Constantino José dos Santos.
Francisco Nogueira de Brito.
Francisco Vicente Ramos.
Germano Arnaud Furtado.
Guilherme Martins Alves.
João da Costa Couraça.
João José da Costa.
João Lopes Carneiro de Moura.
João Viegas de Paula Nogueira.
José Epifânio Carvalho de Almeida.
José Júlio César.
José Maria Queiroz Veloso.
José Tavares de Araújo e Castro.
Júlio Dantas.
Luís Caetano Pereira.
Tiago César de Moreira Sales.
Sr. Senador que entrou durante a sessão:
Luís Xavier da Gama.
Srs. Senadores que não compareceram à sessão:
Adolfo Augusto Baptista Ramires.
Adriano Xavier Cordeiro.
Alberto Cardoso Martins de Meneses de Macedo.
Alberto Carlos de Magalhães e Meneses.
Alberto Correia Pinto de Almeida.
Alberto Osório de Castro.
Alfredo Monteiro de Carvalho.
António Augusto Cerqueira.
António de Bettencourt Rodrigues.
António da Silva Pais.
Cristiano de Magalhães.
Domingos Pinto Coelho.
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Duarte Leite Pereira da Silva.
Eduardo Ernesto de Faria.
Fernando de Almeida Cardoso de Albuquerque (Conde de Mangualde).
Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.
Francisco Martins de Oliveira Santos.
João da Costa Mealha.
João José da Silva.
João Rodrigues Ribeiro.
João de Sousa Tavares.
José António de Oliveira Soares.
João Freire de Serpa Leitão Pimentel.
José Joaquim Ferreira.
José Marques Pereira Barata.
José Novais da Cunha.
José Ribeiro Cardoso.
José dos Santos Pereira Jardim.
Júlio de Campos Melo e Matos.
Júlio Faria de Morais Sarmento (Visconde do Banho).
Luís Caetano Pereira da Costa Luz (Visconde de Coruche).
Luís Firmino de Oliveira.
Manuel Homem de Melo da Câmara (Conde de Águeda).
Manuel Jorge Forbes de Bessa.
Manuel Ribeiro do Amaral.
Mário Augusto de Miranda Monteiro.
Pedro Barbosa Falcão de Azevedo e Bourbon (Conde de Azevedo).
Pedro Ferreira dos Santos.
Sebastião Maria de Sampaio.
Severiano José da Silva.
Zeferino Cândido Falcão Pacheco.
O Sr. Tiago Sales: — Pedi a palavra sôbre a acta porque creio que ontem, ao tratar de assuntos de agricultura, me fiz compreender mal, porquanto, lendo hoje os» sumários dalguns jornais, vejo que afirmam ter eu dito que muito dos prejuízos ocorridos eram devidos a falta de transportes marítimos, quando, nu verdade, me referi na sessão de ontem apenas a transportes terrestres.
Não ouvi bem ler a acta, não fiei bem se lá se diz transportes terrestres se marítimos. Se se falou de transportes marítimos, peço a V. Exa. para mandar fazer a rectificação necessária.
O Sr. Presidente: — A acta refere-se apenas a transportes, não dizendo se são
terrestres se são marítimos. Mas serão atendidos os desejos de V. Exa.
Como ninguêm mais pede a palavra sôbre a acta, considera-se aprovada. Está aprovada.
Pausa.
O Sr.. Presidente: — Não há expediente.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Os jornais de ontem, dão a notícia, e os de hoje confirmam
essa mesma notícia, de que em França se dou um atentado contra o Presidente do Govêrno Francês, M. George Clemenceau. Trata-se dum homem que todos nós, portugueses, respeitamos, que todos nós devemos estimar, porque êle representa não só a alma da França, como tambêm a alma e a raça latinas, às quais nós pertencemos.
A êsse homem se deve em grande parte o triunfo completo da causa dos aliados. Por isso, proponho que na acta da nossa sessão se lança um voto de congratulação por o Presidente do Govêrno Francês se ter salvo do atentado de que foi alvo, que se proteste contra esse atentado e se deseje o pronto restabelecimento dum dos maiores estadistas do nosso tempo. Julgo que interpreto o sentir de todo o Senado com esta proposta, devendo o Senado Português, se aprovar, comunicar o facto ao Senado Francês. (Apoiados).
Vozes: — Muito bem! Muito bem!
O Sr. Queiroz Veloso: — Sr. Presidente: o Senado ouviu com o mais profundo sentimento a notícia, que V. Exa. lhe comunicou, de que tinha havido uma tentativa de assassínio contra o ilustre Presidente do Govêrno Francês. Jorge Clemenceau não é hoje apenas uma grande figura da França: é um dos mais notáveis, dos mais insignes estadistas do mundo. Pela sua tenacidade, pela sua energia, pela sua mocidade de coração e de inteligência, a despeito dos seus 77 anos, Jorge Clemenceau, mais que ninguêm, concorreu para a vitória da França, para a vitória dos aliados.
No Govêrno da sua presidência se deve o ter sido colocado à frente do exército o marechal Foch. Foi êle quem propôs e de-
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fendeu com o maior*palor a idea do comando único e a nomeação do glorioso general francês para o comando supremo das fôrças que venceram a Alemanha. Só por isso merece Clemenceau a admiração, a gratidão de nós todos.
Ao Senado da França, que tem a honra de contar Clemenceau entre os seus membros, devo V. Exa., Sr. Presidente, significar não só os nossos sentimentos pelo atentado cometido, como as nossas sinceras congratulações por dêle ter saído salvo o grande patriota, o Pai da Vitória, como carinhosamente o denomina o povo francês. E nesta manifestação tenho a certeza de que o Senado tem a acoru-pauhá-la todas as fôrças vivas portuguesas, porque a França foi sempre como que a nossa guia, a nossa iuspiradora.
í Saudando Clemenceau, saudemos a França imortal!
Vozes: — Muito bem.
O Sr. Castro Lopes: — Em nome da maioria desta Câmara, quero tambêm referir-me ao atentado que causou profunda impressão em todos que conhecem a figura do Presidente do Ministério de Franca.
Acompanho, Sr. Presidente, com a maioria do Senado, as expressões que V. Exa. proferiu a respeito de Clemenceau e congratulo-me por êle não ter sido morto.
Está ainda na memória de todos o esforço extraordinário de inteligência e de fôrça de vontade que êle desenvolveu durante a guerra europeia. Eui nome, portanto, da maioria, associo-me às palavras de S. Exa., assim como às do Sr. Queiroz Veloso.
O Sr. Afonso de Melo: — Em nome dos representantes da agricultura no Senado, associo-me aos votos propostos por virtude dêsse bárbaro e inacreditável atentado contra essa figura de épica grandeza, não já só da França mas do mundo contemporâneo, que é o Sr. Clemenceau. Êsse estadista fez a sua carreira política de cabeça erguida, sem uma única curvatura de espinha, batalhando sempre pela liberdade. A sua vida deve ser um exemplo para todo o mundo. Não foi só como patriota insigne que êle se revelou na crise difícil e tremenda porque a França
passou. No que êle a todos deu lições foi na máscula energia que, até final, mostrou durante essa crise. Foi um lutador inde-fesso e intemerato que, na imprensa e no Parlamento afirmou sempre as suas opiniões, sem trausigências indecorosas, contra tudo e contra todos. Homens desta estatura triunfam sempre.
Nas páginas apaixonadas de Uhomme libre e de L'homme enchainé se vê como êle venceu dizendo a verdade. Apesar da grandeza de Lloyd George, é ainda Clemenceau quem mais faz ouvir a sua voz e as suas idoas na conferência da paz. O sentimento de reprovação pelo atentado deve ser universal. Integrado nesse sentimento, o Senado deve manifestar-se perante o Senado da França e perante o Ministro dêsse país em Lisboa pelo que se passou.
O Sr. Paula Nogueira: — Pena é que nos tenhamos de referir a um facto que envergonha a civilização. Depois de tudo quanto Clemenceau fez em favor da França, que era a alma dos aliados, que era o principal país visado pela Alemanha, não sendo a Bélgica mais do que uma ponte de passagem; depois de Clemenceau ter levado os aliados à vitória, causa surpre-za que apareça alguém que, ou seja francês ou seja súbdito daquele grande império com o qual a França ingénua contava para vencer o seu inimigo de todos os tempos, tenha coragem para disparar um revolver contra aquele grande homem.
Perante um tal atentado, nós, portugueses, que dizemos que depois de Portugal é a França para nós uma outra pátria, vibramos de indignação. Sou um português do sul, criado e educado longe da capital, num cantinho do Algarve e, todavia, desde a minha tenra infância, desde que comecei a estudar a língua francesa, senti sempre em mim a maior admiração pelo carácter e pelo génio francês e reconheço, Sr. Presidente, em cada português, uma admiração pelo que êles consideram a sua segunda pátria, que é a pátria francesa.
Clemenceau, como há pouco disse aqui o Sr. Afonso de Melo, procurou orientar a França nas difíceis fases que ela atravessou nos quatro anos de guerra e viu com mágoa o caminho que diferentes Govêrnos franceses iam seguindo, couduzin-
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Diário das Sessões do Senado
do a França para uma paz extemporânea, que para Portugal traria tainbêiu os maiores prejuízos.
Em determinado período vimos com prazer que a França, reconhv?ceuclo o perigo que ia correndo, chamou a dirigir os seus destinos o velho Clemenceau t- depois disto vimos que a derrocada que ia em caminho se voltou o m. seutido contrário, conduzindo os aliados à vitória.
Por isso nos sentimos magordos ao vermos atingido por uma bala êste grande estadista, que a sua estrela mata uma vez sr.lvou, não o deixando assassinar.
A vida de Clemenceau é ainda preciosa, porque ainda não chegou a»» seu termo a paz. Ainda temos inimigos furtos a combater. Portanto, é ainda p recta o que o grande francês continue a c- lado do grande general Foch e de Llovd George. Eis
O * CJ
porque me associo a todas as proposta* apresentadas pelos meus ilustres colegas que me precederam no UbO da palavra.
O Sr. Alfredo da Silva: — Apenas duas palavras em nome da indústri i do sul. que tenho a honra de representar nesta Câmara.
Associo-me ao voto proposto por V. Exa., Sr. Presidente, de repulsa contra u atentado feito na pessoa do Sr. Clemenceau, cuja perda, neste momento em que na Conferência da Paz se debatem assuntos de tanta importância para a França, SG-ria enorme, porque Clemenceau nn Conferência da Paz é uma figura primacial, sendo ao mesmo tempo o homem mais popular na França.
O voto dêste Senado, relativamente ao atentado, representa uma afirmação do princípio de defesa que as sociedades devem manter, para garantir a sua conservação, a autonomia dos povos, o seu espírito moderno. E um voto que só dirige à -França, mas que representa tambêm uma afirmação de solidariedade por parte do nosso próprio país.
O Sr. José Júlio César: — Alêm do ter de mandar para a Mesa uma proposta e um requerimento, desejaria chamar a atenção do Govêrno para do:s assuntos relativos ao distrito de Viseu, o único do país onde ainda não existe a guarda republicana, o que causa enormes prejuízos e é uma vergonha.
Requerimento
Os Senadores abaixo assinados, no uso da faculdade que lhes confere o artigo 12." da Constituição, requerem a convocação extraordinária do Congresso, a fim de deliberar sôbre a revisão da Constituição, na parte que 1'espeita à adopção do princípio da dissolução parlamentar pelo Presidente da República, dando assim cumprimento ao mandato com que foram eleitos.—Machado Santos —Germano Arnaud Furtado— Carlos F. de Castro Pereira Lopes — José Maria de Queiroz Vdoso— liarjo César de Moreira, Sales— A, R. Adàes Bermudes—Afonso de Melo Pinto Veloso—Cláudio Pais Rebêlo — João José da Costa — José Tonares de Araújo e Castro—Z.M/S- Caetano Pereira— Guilherme Martins Alves — Amílcar de Castro Abreu e Moia — Francisco Vicente Ramos, João de Paula. Nogueira — José Epifanio Car ralho de Almeida — João da Costa Couraça — Carneiro de Moura — José Júlio César — Alfredo da Silva — Júlio Dantas — Luís Xavier da Gama — João J- da Siha — António Maria de Oliveira Selo.
Proposta
Os Senadores reunidos numa das salas do Senado, a convite e sob a presidência do seu Presidente, o Exa. ni° Sr. Machado Santos, resolveram, tendo apreciado a situação política tal como o Govêrno a apresenta, afirmar, mais uma vez, o seu propósito de votar, sem perda de tempo, o princípio de dissolução parlamentar, dentro dos seus poderes constituintes, concorrendo, assim, para que as correntes de opinião pública se possam manifestar numa próxima eleição; mas reconhecem que o Senado não pode, nem deve deliberar a sua própria dissolução, contra todos os princípios constitucionais e legais e em condições que representariam uma coacção, não só ilegítima, mas em absoluto injustificada.
O Senado julga assim servir o seu país e afirmar os seus desejos de pacificação nacional republicana. Terminou a reunião dando-se ao Exa. 'no Sr. Machado Santos um voto de plena confiança para ir apresentar esta moção a S. Exa. o Sr. Presidente da República e expor-lhe tambêm o pensamento dos Senadores presentes sô-
j bre a situação política.
í Sala do Senado, 21 de Fevereiro de
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Sessão de 31 de Fevereiro de 1919
1919. — Machado Santos — Germano Ar-naud Fartado — Carneiro de Moura — João Veiga Paula Nogueira — Francisco Vicente Ramos —Amilcar de Castro Abreu e Mota — José Maria de Queiroz Velo-so — Tiago César Moreira Sales — Cláudio Pais Rebêlo—Guilherme Martins Alves — José Epifania Carvalho de Almeida — Constantino José dos Santos— Carlos F. de Castro Pereira Lopes—Arnaldo Redondo Adães Bermudes—Júlio Dantas — José Júlio César — José Tavares de Castro— Afonso de Melo — João José d a Costa— Alfredo da Silva—João da Costa Couraça.
Não assinaram esta moção, por terem retirado antes de finda a reímião, mas deram a ela o seu voto, os Senadores Srs. Luís Gama, João José da Silva e António Belo.
O requerimento e a proposta são aprovados, deliberando o Senado que dum e doutro documentos se dê imediato conhecimento ao Sr. Presidente da República.
O Orador: — Parece-me que se poderia levantar a sessão para que o Sr. Presidente pudesse ir desempenhar-se desta incumbência.
O Sr. Presidente: — Informo o Senado de que a moção apresentada pelo Sr. José Júlio César foi votada em uma sessão particular, tendo as assinaturas de 25 Srs. Senadores.
Vou procurar o Sr. Presidente da Cá mara dos Srs. Deputados para lhe pedir que marque sessão conjunta do Congresso para segunda feira.
Conforme os desejos manifestados por toda a Câmara, comunicarei ao Senado Francês o voto de sentimento pelo atentado contra Clemenceau, comunicando tambêm ao Presidente do Ministério francês a resolução desta Câmara. Apoiados gerais.
Emqaanto vou desempenhar-me da honrosa missão de que o Senado me incumbe, poderia proceder-se à votação da proposta, que o Sr. Ministro da Marinha considera urgente, para a nomeação do governador da província de Macau.
Procede-se à contagem.
O Sr. Presidente:—Não há número para se poder deliberar.
A próxima sessão será anunciada pelo Diário do Govêrno.
Está levantada a sessão.
Eram 14 horas e 50 minutos.
O REDACTOR — Adelino Mendes.