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REPÚBLICA 3^F PORTUGUESA
*• - .-.^V--^-r'. '.
DIÁRIO DO SEÍÍA-DO
SESSÃO 2ST. 49
EM 5 DE MAIO DE 1921
Presidência do Ex. Sr. António XaYier Correia Barreto Secretários os Ex.mos Srs,
Luís Inocêncio Ramos Pereira' Joaquim Pereira Gll de Matos
Sumário. — A sessão abrç às 15 horas e 10 minutos com 25 Srs. Senadores' presentes. Aprovou-se a acta. \
Antes da ordem do dia. — O Sr. liamos Preto requere urgência e dispensa do Regimento para um projecto de lei referente à Câmara de Castelo Branco. É aprovado.
Ordem do dia.—Prossegue a discussão do projecto que interpreta certas disposições da lei sobre a amnistia. O Sr. Ministro da Justiça, que ficara com a palavra reservada, conclui o seu discurso. Antes, porém, retira-se da discussão o projecto n.° 287, sobre promoções ao generalato. Falam sobre as consequências da amnistia os Srs. Cata-nho de Meneses, Dias de Andrade, Oliveira e Castro, Ramos Preto, Jacinto Nunes, Pereira Osório e Machado de Serpa, sendo aprovada uma proposta de emenda do Sr. Catanho de Meneses, que prejudica a proposta ministerial. O Sr. Ministro das Colónias apresenta as propostas para governadores de Timor e da Guiné.
Em seguida encerrou-se a sessão.
Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Alberto Carlos da Silveira. Alfredo Rodrigues Gaspar. Amaro Justiniano de Azevedo Gomes. António Gomes de Sousa Varela. António Vitorino Soares. António Xavier Correia Barreto. Arnaldo Alberto de Sousa Lobão. Artur Octávio do Rego Chagas. Francisco Manuel Dias Pereira.
Francisco Martins de Oliveira Santos.
Francisco Vicente Ramos.
João Joaquim André de Freitas.
Joaquim Pereira Gil de Matos. '
José Duarte Dias de Andrade.
José Jacinto Nunes.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Joaquim Pereira Osório.
José Ramos Preto.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Manuel Gaspar de Lemos.
Nicolau Mesquita.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Raimundo Enes Meira.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Abílio de Lobão Soeiro.
António Maria da Silva Barreto.
António de Oliveira e Castro.
Bernardo Pais de Almeida.
Celestino Germano Pais de Almeida.
César Justino de Lima Alves.
Constâncio de Oliveira.
Cristóvão Moniz.
Ernesto Júlio Navarro.
Henrique Maria Travassos Valdôs.
Herculano Jorge Galhardo.
João Carlos de Melo Barreto.
João Catanho de Meneses.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Dionísio Carneiro de Souta e Faro.
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Diário das Sessões do Senado
José Miguel Lamartine Prazeres dá Costa. --••:':•.,. Rodrigo Guerra-Álvares Cabral.
Srs. Senadores que não comparec»-•f "* ràm 'à sessão: ' ', \
Hip.ólito. /
AlfredoNarcisoMarçalMartinsPoitugaL
António Alves de Oliveira,,
António Augusto.Teixeira.
Armindo de Freitas Ribeiro de Faria.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Augusto César de Vasconcelos Correia. - Augusto Vera Cruz.
Bernardino Luís Machado Guimarães.
Ezequiel do Sovera! Rodrigues.
Heitor Eugênio de Magalhães Passos.
João Namorado de Aguiar.
Joaquim Celorico Palma.
José Augusto Artur Fernandes Tôrrea.
José Mendes dos Reis. - *
'" José Nunes do Nascimento. ' Júlio. Ernesto dê Lima Duque.
Luís António, de Vasconcelos Dias.
Manuel Augusto Martins.
Pedro Alfredo de Morais Rosa.
Pedro Amaral Boto Machado. " 'Ricardo Pais Gomos.
Rodrigo Alfredo Pereira de Castro.
Silvedo da Rocha e Cunha.
Torcaío Luís de Magalhães.
Vasco Gonçalves Marques.
Pelas lõ'horas e dez minutos o Sr. Presidente manda proceder à chamada.
lendo-se verificado a presença de 25 Srs. Senadores, S. Ex.a declara aberta a
. íoi lida a acta da sessão anterior e aprovada sem reclamação. Leu-se o seguinte
Expediente
. Projecto de lei
D o* Sr. Rego Chagas, conservando no exercício dos seus cargos no magistério os oficiais de terra e mar que exercem as funções de .professores efectivos nos estabelecimentos militares.
Para l* leitura,.
Telegrama
Dos funcionários da Câmara de Amares, que pedem seja discutido o projecto que; melhora a. situação.
Para • «Diária». ....
Parecer
Da comissão de faltas, concedendo licença aos Srs. Senadores, Armindo de Freitas Ribeiro de Faria, João Carlos de Melo Barreto e José Joaquim Pereira Osório, respectivamente, 20 dias, 2 dias e l dia. -'.'..
Aprovado.
Proposta de lei n.° 824
Foram mandados imprimir os pareceres das comissões de trabalho e finanças referentes a esta proposta de lei, que manda, pagar pelo dobro ao pessoal da Imprensa Nacional os trabalhos extraordinários.
Antes da ordem do dia
O Sr. Afonso de Lemos: — Sr. Presidente: sabe V. Ex.a e sabe a Câmara que um dos motivos alegados para justificar &f prorrogação da actual sessão legislativa foi a discussão dos orçamentos. Sabem todos também que já passou Abril e estamos quási em meados de Maio, sem que nina palavra se dissesse sobre tal assunto.
Todos reclamam a normalidade do país, e nós, seus representantes, temos de dar o exemplo, e a jbase dessa normalidade é a discussão do Orçamento do Estado.
Pedia a V. Ex.a para instar com o Sr. Presidente da Câmara dos Senhores Deputados para que -comece a discussão do Orçamento.
Eu entendo que a Câmara, destinando uma sessão semanal para tratar só do Orçamento, iria fazendo trabalho ponderado e nós todas as semanas .fazíamos trabalho igual, e isto sem grande excesso, e chegaríamos ao fim do mês que vem entrando assim na normalidade constitucional.
Interpretando o sentir de toda a Câmara, eu prometo não abandonar este assunto e em todas as sessões renovarei este pedido a V. Ex.a
L
O Sr. Rego Chagas: — Mando para a Mesa um parecer da comissão de infracções-e faltas.
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Sessão de õ de Maio
\ Projecto de lei
. Artigo 1.° E reconhecida como de utilidade pública e de necessidade urgente a expropriação da nascente denominada a do,Gorgolão situada na tapada do Gor-golão, limite de Louriçal do Campo, para abastecimento do mesmo povo de Louriçal do Campo, do concelho de Castelo Branco.
Art. 2.° Fica a Câmara Municipal do concelho de Castelo Branco autorizada a proceder à expropriação referida no artigo anterior e nos termos regulamentares.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões do Senado, em 5 de Maio de-1921. — O Senador por Castelo Branco, José Ramos Preto.
Dispensadas as formalidades regimentais, foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento, sendo o projecto aprovado na generalidade e na especialidade, sem discussão, e dispensada a última redacção. sob requerimento do Sr. Ramos Preto.
O Sr. Presidente: — Não está presente o Sr. Ministro da Justiça, não podendo, portanto, continuar a discussão do projecto referente a interpretar a lei da amnistia.
Vou pôr em discussão o parecer da comissão de guerra atinente ao projecto n.° 787, devendo informar o Senado de que esse parecer é desfavorável ao referido projecto.
O Sr. Pereira Osório : — Não me parece que seja necessária a presença do Sr. Ministro da Justiça para o projecto que interpreta a lei da amnistia seguir os seus trâmites.
A discussão está .feita, podendo, portanto, liquidar-se o assunto.
Q Sr. Presidente: — O Sr. Ministro da Justiça ficou com a palavra reservada e há. ainda três oradores inscritos.
Vai ler-se o parecer da comissão de guerra referente ao projecto n.° 787.
É lido na Mesa o parecer.
Projecto de lei n.° 787
Senhores Senadores.— O acesso ao mais alto cargo da hierarquia militar não deve ser determinado apenas pelo critério da antiguidade dos oficiais, porque por este
não pode aquilatar-se o complexo conjunto de requisitos de vigor físico e intelectual, de carácter, de instrução geral e de saber profissional a que têm de satisfazer os chefes superiores do exército; a selecção dCstes deve sor regulada por 'condições e provas escrupulosamente fixadas, em que se manifesta a sua real superioridade para o bom desempenho da alta missão que lhes ó confiada.
Nesta justa orientação, a lei orgânica do exército de 25 de Maio de 1911 fixou como condições indispensáveis, entre outras, para o acesso dos coronéis ao posto de general, além dos quatro anos de serviço naquele posto, a sua habilitação com o curso de qualquer das armas da Escola de Guerra e o parecer favorável, sobre a sua promoção, do Conselho Superior de Promoções, e introduziu na nossa legislação militar o salutar princípio da promoção por escolha, reservando um quarto do quadro dos generais para ser preenchido por este sistema de promoção.
As disposições desta lei foram ampliadas no regulamento para as provas especiais para o posto do general, aprovado por decreto de 11 de Outubro de 1913, o qual fixou as provas a que deveriam ser submetidos os coronéis nas condições indicadas na lei orgânica, que pretendessem ascender ao generalato.
Em virtude de circunstâncias extraordinárias, derivadas do estado de guerra, foi reduzido, por decreto, o tempo de permanência no posto de coronel, exigido para a promoção ao generalato pela lei orgânica e por aquele regulamento. Esta alteração não deve ser mantida, não só porque dela resultou -uma extraordinária aceleração na promoção aos postos superiores do exército, incompatível com as precárias circunstâncias do Tesouro, mas também porque o tempo de permanência exigido pela lei orgânica não pode considerar-se excessivo para um eficaz e proveitoso tirocínio nas diversas comissões de serviço, inerente ao posto de coronel, que o habilitem para o desempenho das altas funções do posto imediato.
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Diário ààr Sestôtss do Senado
legal, de que resulta um apreciável acréscimo nos pesados encargos do orçamento dó Ministério da Guerra, aumenta a muito numerosa classe inactiva do exército com oficiais válidos que poderiam continuar a fazer bom serviço' por mais alguns anos, e não se harmoniza com a faculdade, conferida com a mesma lei, de só prestarem as provas especiais de aptidão "para a promoção por escolha os coronéis incluídos no terça superior da escala geral cie antiguidades, que tenham requerido a admissão àquelas provas, sem que do resultado favorável obtido nas mesmas por coronéis mais modernos resulte taxativamente a passagem à reserva dos mais antigos que deías desistirem.
É justo estender aquela faculdade aos coronéis chamados a prestar as provas especiais para o posto imediato, por serem os mais antigos na sua arma. Conciliar-se hão assim os interesses gerais do Estado com os dos oficiais, e desaparecerá a anomalia de a desistência da promoção ao posto imediato inabilitar um oficial válido de continuar a prestar no seu posto serviços que até af poderia ter desempenhado com distinção e boas informações dos chefes.
Sendo natural que muitas vezes a desistência das provas especiais de aptidão seja provocada por circunstâncias meramente acidentais e de carácter transitório, deve ser permitido aos coronéis que desistirem de prestar as provas espaciais de aptidão para o generalato, na época superiormente designada, prestá-las d€í-.corrido um ano, se o requererem.
Se não oferece dúvidas a necessidade de reunirem certos requisitos o de satisfazerem as provas especiais de aptidão para a promoção ao posto imediato a coronéis que têm feito a sua longa carreira no serviço assíduo do exército, ó incontroverso que a tais provas também devem sujeitar-se os que deixarem aquele serviço para desempenharem, em geral por conveniência própria, comissões civis. Para compensação e recompensa dos seus serviços terão estes o acesso aos mais altos 'graus da hierarquia nas comissões civis que preferirem ao serviço dó exército,, mais árdao e de mais remuneração. Não é justo-que estes militares tenham, con-juutamente. regalias superiores às dos
seus camaradas do exército e às dos seus colegas do funcionalismo civil.
É por isso que só devem ser dispensados de prestar as provas especiais de aptidão para a promoção a general os coronéis que, por um brilhante feito de armas ou por relevantes serviços prestados ao exército, mereçam a promoção por distinção.
As alterações e adiamentos que julgo necessário introduzir com urgência na legislação militar referente às condições de promoção ao generalato representarão uma diminuição de despesa no orçamento do Miristério da Guerra, sem prejuízo do aperfeiçoamento das nossas instituições militares, e são suficientemente justificadas pelas considerações que expus. Tenho por isso a honra de as submeter à apreciação da Câmara, sintetizadas no seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Nenhum coronel, qualquer que seja a sua situação de serviço públi co, poderá ser promovido a general sem que tenha prestado, com resultado favorável, provas especiais de aptidão* para este posto.
§ único. Poderão ser promovidos a generais, sem terem sido submetidos a provas especiais de aptidão, os coronéis que neste posto tenham praticadolum^brilhan-te feito de armas ou prestado ao exército serviços relevantes considerados como tais pelo Parlamento.
Art. 2.° Para prestar as provas especiais de aptidão para o generalato serão nomeados pela Secretaria da\Guerra|os coronéis das diversas armas e do serviço do estado maior que tenham satisfeito às seguintes condições de promoçãOè:
a) Ter, pelo menos quatro anos de serviço no posto de^coronel com boas informações ;
5) Ter tomado^/ parte, no posto de coronel, em três escolas de repetição, com boas referências dos respectivos generais;
c) Ter o curso de qualquer das armas ou do estado maior da Escola de Guerra;
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Sessão de õ de Maio de 1921
§ 1.° A nomeação a que se refere este artigo recairá:
a) Nos^coronéis que, pelo seu lugar na escala de acesso, tenham probabilidades de obter promoção, por antiguidade, 3, dentro de um ano, não devendo porém haver em cada arma coronéis tirocinados em número superior ao dos generais dela provenientes;
b) Nos coronéis que, achando-se compreendidos no terço superior da escala geral de antiguidades de todos os oficiais deste posto, tenham declarado desejar ser submetidos às provas.
§ 2.° Para os coronéis do quadro de artilharia a pé, o ano de comando de tropas a que se refere a alínea d) poderá ser substituído por-um ano de comando efectivo dum dos sectores de defesa do campo entrincheirado de Lisboa, contanto que em qualquer dos postos de major ou tenente-coronel tenham exercido, pelo menos durante um ano, o comando efectivo duma das unidades de artilharia de costa ou de guarnição.
§ 3.° (transitório). Os actuais coronéis das diversas armas e do serviço do estado maior não deixarão de ser. chamados a prestar as provas especiais de aptidão para a promoção ao generalato se, por circunstâncias excepcionais de serviço, não houverem podido satisfazer a condição expressa na alínea ô) do presente artigo.
Art. 3.° Os coronéis que, devendo ser submetidos às provas especiais para o generalato, desistam de prestá-las na época que lhes for designada, continuarão no serviço activo, passando a ocupar na escala de antiguidades o lugar imediatamente inferior ao dos coronéis da sua arma que tiverem prestado aquelas provas com resultado favorável.
§ único. Os coronéis que tenham desistido de prestar as provas'especiais para o generalato na época que lhes for designada poderão prestá-las se o requererem decorrido um ano. No caso de obterem resultado favorável irão ocupar na escala de acesso o lugar que primitivamente lhes competia por .antiguidade.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.
. Saladas Sessões, 10 de Março de 1921.— Francisco Manuel Dias Pereira.
Senhores Senadores.—A vossa comissão de guerra foi presente o projecto de lei n.° 787 da iniciativa do Sr. Francisco Manuel Dias Pereira.
A vossa comissão, tendo em atenção o disposto no artigo 23.° da Constituição da Kepública, entende que é à Câmara dos Deputados que deve ser presente este projecto de lei.
Sala das sessões da comissão de guerra do Senado, em Março de 1921.—Jorge Frederico -Velez Caroço = Alberto da Silveira — Abel Hipôlito — Raimundo Mei-ra — Artur Octávio do Rego Chagas.
O Sr. Dias Pereira:—Eu não posso, Sr. Presidente, conformar-me com o parecer da comissão de guerra, porque entendo que este projecto não trata da organização de serviços militares, como diz a mesma comissão, porquanto não se fixam quadros e apenas se trata do modo de fazer concursos e dos anos em que um oficial tem de estar no posto de coronel. E, além disso e muito principalmente, porque o Senado teve um critério diferente para a aprovação dum projecto de lei aumentando o quadro dos guarda-mari-nhas maquinistas. Neste caso tratava-se, sim, dum aumento de quadro, duma mudança de dez para vinte maquinistas de marinha. Isto, sim, que era pior.
O Sr. Jacinto Nunes disse que a iniciativa .desse projecto pertencia à Câmara dos,Deputados. Ora o projecto que eu apresentei não trata de qualquer organização militar. Uma alteração de quadro, de dez para vinte maquinistas, é que não podia ser aqui discutida. O meu projecto em nada altera o quadro dos oficiais do exército.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Enes Meira: — Sr. Presidente: simplesmente para dizer que o projecto de lei apresentado altera a organização do exército, visto esta determinar que os coronéis reprovados no exame para general são mandados passar à reserva.
Em todo o caso a Câmara resolverá como entender.
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Diário da» Sessões ao Senado
Consultada a Câmara, foi aprovado o requerimento.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente:—Visto já estar presente o Sr. Ministro da Justiça, continua em discussão a proposta de lei n.° 825.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos
' (Lopes Cardoso):— Sr. Presidente: fiquei com a palavra reservada na sessão de ontem, mas poucas palavras terei de acrescentar àquilo que já disse sobre a proposta de lei~n.° 825.
Se bem me recordo, disse o Sr. Cata-nho de Meneses que esta proposta de lei de forma alguma podia ser considerada como uma proposta de interpretação ao artigo 7.° da lei da amnistia, visto que continha matéria nova.
Já disse ontem, e repito agora, que nlio eatava no ânimo do Governo, ao redigi--la, crear matéria nova sobre a lei da amnistia. O seu intuito, perfeitamente revelado, não só no relatório qie antecede esta proposta de lei, mas também pelas palavras que ontem tive ocasião da produzir, é o de querer dar uma interpretação clara e constitucional ao artigo 7.° da lei n.° 1:144.
Alguns interessados sôbre^ o artigo 7.° dessa lei levantaram dúvidas sobre a sua interpretação, porque, à sombra dele, re-quererani a sua reintegração com o fundamento de que, tendo sido amnistiadas todas as infracções militares, £ consequência lógica era fazer-se perfeito silêncio sobre elas, e assim também sobre as penas que os haviam afastado do serviço.
A impressão do Governo foi, e é, que ao artigo 7.° da lei n.° 1:144 não podia ser dada uma tal interpretação, e tendo eu sido encarregado, pelos meus colegas do Gabinete, de estudar ó assunto, para 6 que me avistei com os representantes dos diversos partidos na outra casa do Parlamento, essa impressão que ea já tinha radicou-se nç meu espírito, e deu-me a completa certeza de que, pelo menos, o pensamento da outra Câmara, ao votar a lei da amnistia, tinha sido de que ela não trazia como consequência forçada a reintegração daqueles qne haviam sido demitidos,' por motivo de processos discipii-uares, ou em virtude de sentenças criminais. •'•--.--
E, embora o .Governo pudesse recorrer a quaisquer meios de consulta e resolver depois o assunto como se lhe afigurasse em sua opinião, entendeu que melhor procederia, poucos dias depois da lei du amnistia ser votada, trazendo ao Parlamento a sua dúvida e pedindo-lhe que usasse da sua função constitucional de interpretar leis, produzindo uma interpretação que não deixasse dúvidas, que só poderiam servir, em qualquer caso, para diminuir aquele alto pensamento que presidiu à votação da lei da amnistia, e nesse caso poderiam prestar-se a campanhas contra a República, atacando-a até no seu gesto de completa e inteira generosidade.
A dúvida nascia do emprego da palavra reconduzir; isto é, se o artigo 7.° da lei da amnistia daya direito a que fossem reintegrados todos os funcionários, ou se não lhes dava 6sse direito, e, nesse caso, vigente toda a legislação que havia em matéria de disciplina de funcionários públicos, sem que a lei da amnistia lhe tivesse trazido qualquer cousa de novo.
Que a dúvida existia verificou-se imediatamente na Câmara dos Deputados, e verificou-se porque tendo sido apresentada esta proposta de lei, e depois de se proceder à sua leitura, ela foi votada, sem a mais completa discussão, podendo mesmo dizer-se que ela foi votada por unanimidade. E é de notar que essa votação se fez, sem o Governo fazer a mais ligeira questão da sua matéria ou çla sua forma.
Sr. Presidente: tendo corrido a apresentação desta proposta de lei na outr'a Câmara, pela forma que acabo de citar, e. trazida jjara o Senado, encontrou-se o Governo em face do relatório da comissão de legislação civil em que se afirmava que e ata lei não era uma lei interpreta-tiva, porquanto a lei n.° 1:144 era clara, e portanto não. precisava de ser interpretada. 'E o que é mais interessante é que, tendo entrado na discussão desta proposta de lei jurisconsultos de reconhecido mérito, a dúvida apareceu desde logo. Assim, o Sr. Jacinto Nunes esclareceu que, em virtude .do artigo 7.°, todas as pessoas amnistiadas tinham o direito a ser reintegradas, embora o não fossem nos seus antigos lugares.
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Sessão' de 'õ >de -M'cdo de 1921
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viduos não tinham esse direito, porque o artigo 7.° não se referia a recondução em cargos, mas a recondução, em funções, e que esta expressão correspondia, portanto, à reintegração em funções.
•Estas opiniões foram reforçadas por argumentos aduzidos por outros Srs. Senadores ; mas o que ficou bem claramente definido ó que a dúvida do Governo procedia, pois que aqueles que, há dias, tinham votado o artigo 7.° çla lei da amnistia, estavam hesitantes na forma da sua execução.
Acertado me pareceu, portanto, o caminho encetado pelo Governo, desejando que a própria Câmara que tinha tido a iniciativa e que, por si, tinha criado a lei n.° 1:144, a esclarecesse de forma a que fosse cumprida com todo o rigor, dentro do seu espírito.
A isto respondeu, em nome da comissão de legislação, o Sr. Catanho de Meneses, defendendo o parecer, que eu não censurei,, como S. Ex.a disse, mas que eu apreciei com todo o respeito que devo aos dignos presidente e vogais da referida comissão.
. Diz a comissão de legislação civil que»a proposta de lei não é interpretativa e que á lei está bem clara, podendo os tribunais resolver em face dela sem que dúvidas haja. •
Se.'as.sim é, não há nada mais a fazer, pois não há necessidade de criar uma lei nova que não atinge o fim a que se destinou.
A lei da amnistia obriga a todos os cidadãos portugueses, tem efeitos imediatos que não podem derrogar-se por leis anteriores, tanto mais tratando-se de uma lei criminal no sentido restritivo da liberdade dos réus. Foi^por isso que eu disse que o Governo entendia que a proposta da comissão de legislação civil não era de atender, pois não teria sanção possível. •
O Governo pregunta: •: ^Deseja o Parlamento que, por efeito da lei da amnistia, se reintegrem todos os funcionários a quem ela aproveita?
Todos ficamos sabendo que a lei é assim interpretada. ••
O Parlamento pode ainda adoptar outro procedimento, pode modificar a proposta; do Governo no sentido que lhe parecer, mais conveniente. l , . .
Qualquer que seja a atitude dó Parlamento, para o Governo é indiferente, pois ' que, desde a primeira hora, declarou que considerava uma, quentão aberta. tudo: o que se referia à amnistia. > , . ,
A proposta da comissão de legislação, cria uma matéria inaplicável. . .. ".
Disse ontem o Sr. Catanho de Meneses que à forma como esta proposta de lei-es-, táva redigida criava matéria nova. e uma situação nova, e que o Governo não queria receber o encargo de reintegrar os fun.-cionários, estabelecendo-se, aliás, unia fórmula em que todas as cautelas eram tomadas, visto 'que se exigia que se fizesse" a reintegração por decreto fundamentado publicado no Diário dó Governo^ e" que assim se fazia a reintegração como 'se quisesse. ' .''''"' \f\[ Ora ó preciso' que se diga que o Governo não tem sobre esse assunto o mehof propósito. Os homens que actualmente ocupam as cadeiras do poder, que íne conote,' nunca reintegraram ninguém'nestas con-' dições, nem nenhum dos membros 'deste Governo, nesta ou noutra situação ministerial, cometeram qualquer cousã\ parecida com isso'. ' ' • !'• "<_:_ p='p' _-='_-'> Mas eu já disse ontem; e'repito'agora: não poderia o Governo reintegrar, mas pó* deria, em face da legislação/ nomear, porque não havia nada na lei da amnistia' que, expressam ente j proibisse que se -fizessem novas nomeações. 'Disse isto- ape-nas no campo doutrinário', 'e .parece-me que o Sr. Catanho de Meneses não 'contrariou esta minha afirmação.' '- . :. '.
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Diário deu Setsões ao Senado
l & Mas que tem isso com a questão ? ! i £ Que necessidade há mesmo — a não ser episodicamente—de fazer referência a estas cousas?! O que importa ao Governo é o direito a constituir após a amnistia, o direito a constituir de futuro, nas condições em que a comissão a apresento a.
O que importa ao Governo é que a Câmara defina qual é o espirito do artigo que votou, isto é, qual é a interpretação rigorosa que nós temos de dar ao artigo 7.° da lei da amnistia.
1 Disse o Sr. Catanho de Meneses que, pela forma como estava redigido o artigo 7.°., se dava o facto de se fazer distinção, quanto a reintegrações, entre pessoas que tinham sido demitidas disciplinarmente e aquelas que tinham sido demitidas por efeito de processos criminais, e aquelas que tinham sido demitidas sem ter havido sentença criminal ou processo disciplinar.
Eu expliquei ontem, e suponho qne S. Ex.a deve ter ficado inteiramente convencido, de que esta redacção foi feita partindo do princípio de que todas as pessoas demitidas o tinham sido em virtude de processo criminal ou disciplinar. Acrescentei até que, tendo sido procurado pelo Sr. Enes Meira para ine dizer que havia funcionários que tinham sido exonerados sem ser por qualquer destes dois processos, eu imediatamente ]he respondera que era necessário cortar essas palavras em que o Sr. Catanho de Meneses quis ver uma distinção, e dessa forma não haveria desigualdades.
Disse mais: que era para não tirar a iniciativa ao ilustre Senador a quem me refiro que eu próprio me abstinha de apresentar uma proposta de emenda nesse sentido. Portanto, essa dificuldade não existe.
Mas, se ainda há, dentro do artigo, alguma palavra que possa parecer matéria nova, essa palavra deve ser cortada, mesmo no interesse da mais rigorosa interpretação, e porque seria inútil, numa lei in-terpretativa, escrever matéria nova, porque a essa matéria nova ninguém devia obediência.
Tudo se reduz, portanto, à Câmara responder se a palavra «reconduzir» foi empregada, neste caso, como sinónimo de éintegrar.
Diz o Sr. Jacinto Nunes que não; diz
0 Sr. Oliveira que sim.
Mas o que o Governo deseja é que a Câmara dê ao artigo 7.° uma interpretação autêntica.
Que ela diga que o Sr. Dias Ferreira afirmava que existiam, ou não, as leis in-terpretanvas, isso para mim nada me importa. O que o Governo quere, repito, é que se dê uma interpretação autêntica a esse artigo, conforme a Constituição dá direito ao Congresso da República, e em-quanto a Constituição isso determinar con-
1 binarei a ter uma grande veneração pela memória do grande jurisconsulto Dias Ferreira," mas não deixarei também de continuar a ter um grande acatamento pela lei fundamental da Eepública Portuguesa.
É-nos, pois, indiferente que a forma apresentada pelo Governo seja aprovada, ou que o seja a proposta apresentada pelo Sr. Catanho de Meneses; o que é necessário é que a Câmara explique qual o âmbito da disposição legal que nós deveremos interpretar.
Disse ontem S. Ex.a, defendendo e muito bem o parecer da comissão, que a comissão tinha seguido na redacção do seu artigo a mesma doutrina que foi empregada quanto aos súbditos estrangeiros, na ocasião em que se legislou contra^ os nossos inimigos da guerra. E, ,as-sim, essas pessoas indesejáveis eram, ou não, admitidas no país pelo Governo, conforme parecer que era publicado no Diário do Governo.
Perfeitamente de acordo.
S. Ex.a achou uma forma que eu estou convencido de que era a mais honesta, e encarregando-nos de dar execução a assunto de tamanha responsabilidade para os homens públicos da República e de tamanho interesse para o regime, só nos honra e só provoca da nossa parte o maior agradecimento, mas a verdade é que as circunstâncias são diversas. O facto de deixar ao Governo o direito de considerar interdita a entrada no país a determinados indivíduos revelou também da parte desta Câmara uma prova de confiança no Governo a que me honro de pertencer, mas permita-me S. Ex.a que lhe diga não poderia nunca servir de ponte para casos tam diversos.
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Sessão de 5 deMaio^de
ambos eles casos de ordem de segurança -pública.
Uin dôles prevenir-se Portugal em guora, -contra os seus inimigos, o outro provcnir-se a Eepública contra os seus inimigos políticos a que acaba de perdoar.
Qualquer dos dois casos são casos meramente policiais e que ficaram na lei perfeitamente claros, dando a Câmara certas faculdades ao Governo, dizendo-lhe ato onde iauí essas íaculdades e onde ter-1 minavam.
Quanto à interpretação do artigo 7.° ó uma cousa iuteiianiente diversa.
Noa nau precisamos de saber se é o~Go-vêrno que reintegra; nós o que queremos é saber, nos termos desta lei, quem. ó que a Câmara quis amnistiar.
Portanto não há a niuis leve paridade entro um caso e outro.
A argumentação do S. Ex.a só serviu para mostrar os seus magnitícos propósitos, e a sua intenção do acertar num assunto dó tanta gravidade. Para mais nada serve.
Na proposta da comissão de legislação civil Jê-se: «O Governo poderá reintegrar em parecer fundamentado».
A que corresponde isto? Corresponde a contrariar inteiramente o princípio da amnistia.
A amnistia é uma providência geral. A amnistia mesmo, se quisermos dar lhe aquele sentido que lhe dão todos os tratadistas do direito penal, deveremos dizer que se vota com um artigo único, não tem excepção. Então ó que é uma amnistia perfeita.
Infelizmente as circunstâncias em que se colocaram os inimigos da República, e as circunstâncias em que esta lei foi votada, não deram /ensejo a que a generosidade da República tosse tain longe, e que a amnistia fosso tam ampla.
Por amnistia preceitua-se todo e completo esquecimento.
Mas o que se não pode compreender é que, tendo sido a amnistia votada com restrições, e'restrições importantes, não relativa a cada inidvíduo, ou a cada caso, mas a cada classe de crimes ou infracções disciplinares, vá agora, por uma deliberação desta Câmara, ser alterada, para se transformar apenas num mero episódio de casuística, em que cada as-
sunto vá ser resolvido da sua forma pelo Poder Executivo, e que hoje não tem decerto melhores informações a respeito dos amnistiados do que tinha há dois anos quando eles foram condenados e onde, portanto, o Poder "Executivo não representará mais cousa alguma do que verificar se essa pessoa está ou não abrangida por um decreto.
Sr. Presidente: parece-me que a discussão correu com suficiente clareza. Suponho que nada mais há a acrescentar da minha parte.
De princípio eu acatei a emenda do Sr. Raimundo Meira, por me parecer que vinha beneficiar o texto proposto. Se há qualquer emenda nesse sentido, eu acoito o artigo 1al como está ou melhor redigido, porque tenho a consciência de que dentro desta Câmara há-do haver quom redija melhor do que eu. Nada me importa que soja votada a matéria do parecer da comissão de legislação 'civil. Repito apenas que nada ganhamos com isso.
£ A que vein essa lei, se a ninguém aproveita?
Acho, ó certo, inconveniente na votação do artigo da comissão. Sc, todavia, for votado, o Governo dar-lho há completa execução, partindo do princípio de que há-dc ser aplicada em termos usáveis. .
O Governo, pois, não faz questão de proposta neste caso, nem faz questão de forma; quero uma resposta e quere saber como há de pautar o seu procedimento. O Senado resolverá como entender, e estou convencido de que confia em que o Governo não deixará de cumprir o seu dever, certo" d'e que o Parlamento procedeu na intenção do salvaguardar os interesses da República e o bom nome do Estado Português. ' -
Tenho dito, Sr. Presidente.
O orador não reviu.
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posta qne veio ao Senado, de que não se tratava duma proposta interpretaíiva nas antes duma proposta que criava novos direitos. E embora S. Ex.a diga que o intuito do Governo era apenas provocar uma resolução da Câmara para a interpretação ao sentido da palavra urecondu-' zir», a verdade é que nós cão temos de discutir os intuitos do Governo, mas as propostas apresentadas pelo Governo. Não duvido, Sr. Presidente, dcs intuitos do Governo ao apresentar somelhaate proposta; mas, então, melhor seria ter apresentado uma -proposta em qco se dissesse pouco mais ou menos o seguinte: «Os amnistiados militares ou civis iiSo poderão ser reconduzidos ou reintegrados em quaisquer funções do Estado».
Desta fornia já se não criavam direitos novos.
Por. esta proposta, desculpe-cie o Senado, os indivíduos podem não sor reconduzidos ou reintegrados nos seus anteriores lugaresj mas não ficam inibidos de ocupar outros cargos.
O que se torna, pois, necessário é tor-x nar a lei bem clara a fim de evitar dividas qu0s como esta, derivam do texto de, lei.
Supondo que era o qne o Governo dizia, o Governo tinha simples meio de dizer, reconduzir ou reintegrar nas funções cue ' exercia anteriormente. E tudo estava feito com menos palavras."
Mas o que íez o Governo?
Vamos à primeira hipótese.
S. Ex.a dava-lho a primeira interpretação e dizia: creconduzir não quero dizer reintegrar», e por consequência posso reintegrar o funcionário embora o não recon-duza.
O Sr- Ministro da Justiça e dos Cultos (Lopos Cardoso): — S. Ex.a desculpe ine se nesse eu noutro ponto, terei do rectificar o que está dizendo.
Eu disse exactamente o contrário.
O Orador: — S. Ex.a não entendeu o quo eu dissOo
Eu estou formulando hipóteses.
Assim dizia, supúnhamos o primeiro critério, entondcndo-se por reconduzir quo nilo é reintegrar, o estava-se no artigo dizendo que os amnistiados não podiam cor reconduzidos»
Vinha a proposta de lei ao Senado a dizer que a amnistia não rosultada reintegração e muito menos a recondução dos que foram condenados em processos disciplinares ou por sentença. E resultava a recondução dos que não fossem condenados por processos disciplinares ou por sentença.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos
(Lopes Cardoso): — Já declarei que desde que tive conhecimento que havia alguém que não tinha sido separado por motivo do processo disciplinar ou por sentença, imediatamente tomei a iniciativa do compor o artigo neste sentido.
O Orador:—Depois da comissão de legislação formular o seu parecer, seria melhor S., Ex.a ouvir-mo primeiro, eu que me honro extremamente de pertencer a esta Câmara, onde as questões se discutem sempre elevadamente, muitas vezes sei:: preocupações partidárias.
Há mais alguma cousa quo triunfa, há o triunfo das convicções, das idcas. e permitam-me dizer, como membro desta Câmara, que não deixo do as ter. K ao sou apenas membro desta Câmara, mas também, da comissão.
Mas, cizia eu, que do facto de se entender que reconduzir ni3o ó reintegrar, um novo artigo apresentado muda a face do direito.
Se ô assim, como ó quo o projecto vindo da outra Câmara não constitui direito novo ?
Foi por isto quo a comissão entendeu qno a proposta Avinda da outra Câmara criava direito novo.
Assim ÍL comissão deu-lhe o tratamento que merecia uma proposta do semelhante ordem, entendendo que lho devia introduzir as alterações necessárias.
Ora a comissão quis quo o Governo explicasse as razões por que reintegrava funcionários quo tinham sido amnistiados.
S» Ex.a diz quo do sua parto não reintegra ninguém, porque daria muito trabalho ao Governo estar a examinar processo por processo.
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zavam da amnistia, ninguém se podia apresentar só pelo facto de ser abrangido pela amnistia a pedir a reintegração e quanto aos outros tenho obrigação de reintegrar.
De maneira como está redigida a proposta, vindo da outra Câmara, havia a atender a duas classe de amnistiados: , uns, que tinham sido condenados por processos disciplinares e outros que já tinham • sido condenados nuns e noutros processos. Para uns, a reintegração resultava imediatamente da amnistia, para outros resultava, não de amnistia, mas de vontade exclusiva do Governo. Em suma, tanto para uns como para outros o Governo ficava com a faculdade inteira de poder reintegrar, com a diferença de que com respeito aos que tivessem sido condenados por sentença só o poderia fazer até certos limites, j&ste era o projecto da comissão.
Por consequência, o Governo ficava mais à vontade com o projecto da comissão de legislação do Senado do que com a lei n.° 1:144.
Eu não desejo, Sr. Presidente, íevan-,tar dificuldades ao Governo, mas o que eu não posso é aceitar a proposta tal qual veio ao Senado, nem a tam pouco a apresentada pelo Sr. Meira.
E, por consequência, terminando as minhas observações, eu tenho a honra de mandar para a Mesa, caso não vingue a substituição feita pela comissão, a seguinte substituição ao artigo 7.°:
«Proponho que o artigo 7.° da proposta seja substituído por este:
Os amnistiados civis ou militares não poderão ser reconduzidos ou reintegrados em quaisquer funções públicas que exerceram anteriormente, nem eximir-se aos efeitos da lei' n.° 768 que continuará inteiramente em vigor».
Isto assim é claro e eu vou dizer porquê: porque já não deixa o argumento que da amnistia não resultava a reintegração realizada à vontade do Governo.
Com a minha substituição fica-se sabendo, duma maneira clara e positiva, que aos amnistiados não pode de maneira alguma ser concedida a reintegração e que a palavra «reconduzidos» é sinónimo de reintegração.
O orador não reviu. r/
Lida na Mesa a proposta do Sr. Cata-nho de Meneses, foi, admitida.
O Sr. Dias de Andrade:—Sr. Presidente: vai já longa a discussão da proposta de lei n.° 825.
Tenho assistido com o maior interesse a essa discussão, em que tem tomado parte as vozes mais autorizadas desta Câmara e ao mesmo tempo o ilustre jurisconsulto que è o Sr. Ministro da Justiça. Isso, porém, não me dispensa de directamente justificar em singelas considerações o meu voto.
Concordando num ou noutro ponto com as considerações feitas pelos ilustres oradores, eu não posso concordar com as conclusões a que a maior parte deles chegou. E vejamos porquê.
Segundo etimologia da própria palavra, amnistia vem da palavra grega amnéxis, que significa esquecimento, o que importa perpétuo silêncio sobre o facto. Não é um perdão ao criminoso, é o esquecimento do facto. Quere dizer que os amnistiados, por efeito da própria lei, ficam no statu quo ante, ficam exactamente como na véspera 'de cometerem o delito.
Estas são as conclusões lógicas e naturais a tirar. Portanto, todos os amnistiados ficaram, pela força da lei, colocados em lugares que exerciam.
^Mas há, por ventura, na lei n.° 1:144 alguma restrição aos efeitos naturais e lógicos resultantes da amnistia? Há. É o artigo 6.°
Eu entendo que a interpretação verdadeira- do artigo é aquela que o Senado votou, é a interpretação restrita.
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chamei lata, os amnistiados, civis ou militares, ficam inibidos, para todo o sempre de exercerem funções públicas e a pena é perpétua, o que vai de encontro à, Constituição da Kepáblica que suprimiu as peuas perpétuas.
O Sr. Pereira Osório : — Isso são argumentos de efeito.
O Orador: — São argumentos de verdade, i
O Orador: — Um magistrado que fosse condenado a dois anos, por exemplo, de suspensão, fica pior depois ca amnistia do que antes, pois que, antes dela, cumpriria a sua pena e não ficava inibidc? de exercer funções públicas.
Um professor de instrução primária — e já ontem se referiu a isso o Sr. Sorpa — íoi transferido ou afastado do serviço, «j Em que consiste para ele a amnistia? Em nada! Ê uma amnistia que não é amnistia. Ou o Parlamento não sabe o que votou ou votou uma mistificação.
Por todas estas razões, entendo que a interpretação autêntica do artigo é que os amnistiados não podem ser reconduzidos nas suas funções, mas devem ser reintegrados nos seus quadros.
Nestas circunstâncias, nada há que interpretar e a proposta do Sr. Ministro da Justiça não é interpretativa, constitui 'tinia inovação. Nisso estou de acordo com Q Sr. Catanho de Meneses.
<_:_ que='que' de='de' quê='quê' uma='uma' executivo='executivo' artigo='artigo' meio='meio' senado='senado' lei='lei' por='por' penas='penas' caso='caso' para='para' aplicar='aplicar' podelevantar='podelevantar' não='não' pouco='pouco' mas='mas' amnistias='amnistias' penas.='penas.' altera='altera' e='e' disciplinares.='disciplinares.' em='em' é='é' aplica='aplica' estruturalmente='estruturalmente' processos='processos' poder='poder' o='o' p='p' neste='neste' judicial='judicial' votou='votou' pode='pode' competência='competência' _7.='_7.' quem='quem' há='há' inovação='inovação' votar='votar' teia='teia'>
Segundo a| Constituição da República Portuguesa, quem aplica penas é o Poder Judicial independente do Poder Legislativo,.
O Sr. Catanho de Meneses:—O Poder Judicial aplica as penas que são aplicadas pela lei.
,0 Orador: --- A proposta governamental é uma inovação, é uma restrição de direitos adquiridos desde. 9 de Abril.
O Parlamento deu apenas uma lei de. amnistia e quem aplica as penas ó o Poder Judicial.
Para conclusão, Sr. Presidente, o Senado o que tem a fazer ó manter o artigo 7.° da lei n.° 1:144, tal qual como^está.
Tenho dito.
O Sr. Oliveira e, Castro: — Sr. Presidente: eu não sou nem contra o projecto da Câmara dos Senhores Deputados nem contra o parecer da comissão de legislação civil, nem contra a ^opinião de ninguém.
Eu simplesmente,- Sr. Presidente, .quero frisar a razão porque assinei sem declarações o parecer relatado pelo Sr. Catanho de Meneses.
Eu, Sr. Presidente, desde o momento em que a palavra. .,. entendia que se tratava duma interpretação.
Para ruim, Sr. Presidente, a palavra reintegração não tem o mesmo signifi-fcado que reintegração.
Pode dizer-se que a corrente estabelecida na Câmara dos Senhores Deputados e a corrente que aqui pode estabelecer-se é de que a palavra «recondução» se quis empregar como sinónimo de «reintegração», e é exactamente essa a significação que os dicionários lhe atribuem.-
E se foi assim que o Parlamento da Kepública votou Osse artigo 7:°,, então trata-se duma lei interpretativa, e não é a comissão de legislação civil, nem o 'Ministro da Justiça, mas sim o Parlamento, que há-de definir essa situação.
Eu com estas minhas palavras quero apenas explicar a minha atitude quando assinei o parecer sem declarações, e ao mesmo tempo esclarecer as minhas palavras e o meu pensamento quando ontem interrompi o Sr. Ministro da Justiça.
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ser que, segundo o artigo 41.°, ele prove claramente a sua inocência.
A não ser assim, esse funcionário não pode ser reintegrado em funções públicas não só para defesa da Eepública, mas também porque esse funcionário praticou factos de tal forma graves no desempenho das suas' funções, que o irradiaram para sempre dos quadros do funcionalismo do Estado.
No emtanto foi bom que se consignasse na lei este artigo 7.° da autoria do Sr. Pereira Osório.
Mas há mais Sr. Presidente. Do parecer da comissão expungiram-se algumas palavras.
Vi realmente que foi essa a intenção do Sr. Catanho de Meneses.
Termino por manifestar a razão porque concordei em dar-se-ao Governo a faculdade de poder reintegrar os amnistiados.
Votei a amnistia e disse muito claramente que a votava pelo coração e pelo pensamento. Votei-a pelo coração, porque se tratava dum acto generoso de pacificação numa hora solene; e votei-a por pensamento, porque estava convencido de que alguns inocentes haviam sido condenados indevidamente, além da enorme desigualdade das penas aplicadas.
Referi-me há pouco ao regulamento dos funcionários civis. Ele se refere a funcionários inocentes. <_ só='só' que='que' a='a' questão='questão' governo='governo' em='em' aqui='aqui' é='é' ao='ao' p='p' dar='dar' há-de='há-de' também='também' faculdade='faculdade' não='não' pois='pois' porque='porque'>
Sr.'^Presidente: eu não quero ser um irredutível adversário dos inimigos das instituições, a^não ser daqueles que cons-pi?'am contra elas de arma na mão; não quero^tambémj ser um delator. Mas deu--se o facto de indivíduos que assistiram à'_ípossejdej*autoridades administrativas, serem demitidos e outros que participaram da junta governativa, que prestaram juramento ante Paiva Couceiro e que fizeram a apologia da traulitânia tendo sido primitivamente demitidos, foram 'colocados na inactividade e estão hoje exercendo altos cargos, como eu conheço um caso.
O que ó preciso é remediar todas estas desigualdades, arquivar todos os processos que não estão feitos, porquê não pode ^recorrer das sentenças dadas pelos tribunais, visto ao Governo não ser dado intervir, mas em relação aos processos dis-
ciplinares em que o Governo teve intervenção, porque ó que não há de ser se na aplicação da pena houve .desigualdades, _e se as houve porque não as há de corrigir?
Este é que é o verdadeiro caminho que se devia seguir.
Sr. Presidente: eu defendi calorosamente o meu modo de ver, e defendi calorosamente o parecer da comissão de legislação civil pelas razões que já aqui apresentei, mas sobretudo, Sr. Presidente, como. magistrado, com a consciência de que tenho cumprido sempre o meu dever entendo que não devia nesta hora deixar de me levantar por um princípio de justiça, que deve ser igual para todos.
Ó orador não reviu.
0 Sr. Ramos Preto: — Agradeço as palavras amáveis e a atenção que V. Ex.a acaba de ter para comigo.
Sr. Presidente: por circunstâncias estranhas à minha vontade eu não pude assistir à discussão do projecto de amnistia da autoria de V. Ex.a, mas se estivesse presente teria votado o projecto de amnistia tal como V. Ex.a o escreveu, e teria-o votado assim mais por uma questão de sensibilidade, por um sentimento de justiça, única forma que encontro na minha consciência para poder remediar injustiças graves que foram cometidas.
Fui contra a amnistia e houve momentos em que o Poder Executivo podia ter tomado uma atitude que dignificasse a Eepública. Teve oportunidade para o fazer.
Para aqueles que propositadamente tinham feito mal, justamente condenados, a República podia ser generesa comutan-, do-lhe a pena; para aqueles que foram vítimas de condenações grandes absolutamente despropositadas, para esses o indulto.
Mas desde que foi aceita a amnistia, houvesse a coragem de a dar ampla e completa. Não faz sentido apregoarmos generosidades e por outro lado cerceá--las.
São factos consumados, e hoje esta discussão tem sido um tanto escolástica.
Se há a intenção de que esses funcionários que íoram atingidos por sentença condenatóriá nunca mais podem desempenhar cargo civil, aceito a emenda do Sr. Catanho de Meneses.
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O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos
(Lopes Cardoso): — É isso o que o Governo quere saber.
O Orador:—Não poupemos as respon-sabilidades para com os outros. Cada um assuma as responsabilidades que tem.
Para que não haja novas complicações seria meíhor deixar o que está.
O Sr. Jacinto Nunes: — Mando para a Mesa a seguinte moção:
O Senado, reconhecendo que o artigo 7.° da lei n.° 1:144, de 9 de Abril último, não carece de interpretação, pois que nos seus termos exprime bem o sentimento do Senado que o votou;
«Considerando que a proposta de lei n.° 820 visa alterar agravando-o o disposto no referido artigo 7.° continua na ordem do dia.»
O Orador:—: A questão tem versado sobre o significado das palavras se conduzir e reintegrar.
Ora o que diz o artigo 7.° é que não podem ser reconduzidas nas funções que anteriormente desempenhavam.
Por exemplo, um juiz da Relação do Porto foi demitido desse lugar, mas pode ser colocado na Relação de Coimbra ou de Lisboa.
Se não pudesse ser colocado noutras funções, em que aproveitaria a amnistia?
Odiosa restringenda beneficia ampliando.. — é um dogma jurídico.
Eu ontem aplaudi .o Sr. Ministro da Justiça, quando disse que não se podiam aplicar penas perpétuas.
Ora penas perpétuas não podem ser restabelecidas; e, não podendo os amnistiados ser reintegrados, aplica-se uma pena perpétua. Chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça. S. Ex.a disse ontem, e muito bem, que não podem aplicar-se hoje penas perpétuas, porque até a tal se opõem o Código Civil e a Constituição no seu artigo 59.°
Mas se não podem ser reintegrados até aqueles que cometeram simples actos de indisciplina, não se põe em prática uma pena perpétua por um crime ligeiro, que pode ser o da simples suspeita?
Eis, Sr. Presidente, a minha opinião. Deve manter-se como foi aqui recligido e
votado e>m ambas as Câmaras, o artigo 7.° da lei n.° 1:144.
E note V. Ex.a ainda, Sr. Ministro da Justiça, ó que a proposta n.° 825, da autoria de V. Ex.a, altera, agravando.
Os amnistiados o que não podem é ser reconduzidos; reintegrados, podem ser. Não podem ser colocados no lugar donde saíram, mas podem ser colocados noutro lugar com funções da mesma natureza. Ora pela proposta n.° 825, os amnistiados não podem ser reintegrados.
O orador não reviu.
Lida na Mesa a moção apresentada pelo Sr, Jacinto Nunesf foi admitida.
O Sr. Pereira Osório: — Sr. Presidente: Bastava o Governo trazer aqui a proposta que se discute dizendo que a lei da amnistia precisava de ser esclarecida para se reconhecer a necessidade da apresentação da mesma proposta, pois é o Governo que tem de executar a lei e tem dúvidas sobre a sua aplicação. Basta a apresentação da proposta do Governo para que a moção de ordem do Sr. Jacinto Nunes não devesse ser tomada em consideração.
Há dúvidas? Procura-se esclarecer essas dúvidas ; mas a dúvida que existe deriva só da palavra «reconduzir», que o Governo não considera com etimologia igual à da palavra «reintegrar».
Eu estou plenamente def acordo com a proposta de emenda apresentada pelo Sr. Caianho de Meneses, a qual conserva o artigo da lei da amnistia tal como está, juntando apenas à.palavra «reconduzir» a palavra «reintegrar». «Reconduzir ou reintegrar» .
Diz o Sr. Jacinto Nunes que a proposta governamental vem restringir. Não vem tal e até S. Ex.a caiu numa contradição porque há pouco esteve|a definirão significado de reconduzjrj*e reintegrar dizendo que reconduzir é colocar nas mês-, mas funções, mas não no mesmo-lugar e reintegrar é colocar no! mesmo lugar; se a proposta governamental pretende que sejam reintegrados, não restringe.
Como fica na lei a palavra 'reconduzir, •ficam prevenidas as duas hipóteses.
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perpétuas ponho-me a pensar o que isso quere dizer. Todos nós vemos no Diário do Governo que foi demitido tal ou tal funcionário e nunca vi que ninguém reclamasse por a pena ser perpétua.
O Sr. Jacinto Nunes:—Eu referi-me a uma afirmação do Sr. Ministro da Justiça de que o Cúdigo Penal tinha acabado com as penas perpétuas.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos
(Lopes Cardoso): — O que eu disse foi que não é da índole da nossa Constituição {o estabelecimento de penas perpétuas e que se tratava de aclarar os efeitos de uma amnistia.
O Sr. Oliveira e Castro: — O que a Constituição prevê é a aplicação de penas corporais perpétuas.
O Orador: — O que consta do artigo 7.° não importa, de modo algum, uma condenação a pena perpétua. De resto, o ilustre Senador que acaba de me interromper disse e muito, bem que o critério que domina na Constituição é a proibição de penas corporais perpétuas.
Portanto, parece-me que esse argumento não deve absolutamente influir em nós para a votação deste assunto e eu chamo a atenção do Sr. Jacinto Nunes para o seguinte: .
Desde que há uma dúvida—• e ó o próprio Q-ovêrno que diz que a tem—-sobre a forma de interpretar a,lei, eu creio que nós não temos outra cousa a fazer senão 'esclarecer essas dúvidas.
Quanto à emenda apresentada pelo Sr. Catanho de Meneses, para que a seguir à palavra «reconduzir» se intercale «ou reintegrar», parece-me que deve colocar-nos todos de acordo, e o Governo com esta alteração se julgará habilitado a aplicar sem dúvidas a lei que nós votámos, da amnistia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Machado de Serpa: — Sr. Presidente: a moção mandada para a Mesa pelo Sr. Jacinto Nunes é tudo quanto há de mais ilógico e embaraçoso.
Se S. Ex.a entende que «reintegração» não é o mesmo que «recondução», reconhece tacitamente que a lei precisa de ser
interpretada duma forma clara e sem deixar dúvidas a ninguém sobre o seu âmbito.
Além disso eu creio que o Senado não tem faculdade para votar essa moção. O Senado, regimentalmente, o que tem a fazer é aprovar ou rejeitar a proposta vinda da outra Câmara, aliás, não se cumpria o Kegiinento.
Seguindo o exemplo apresentado pelo ilustre Senador Sr. Dias de Andrade, eu também lembrarei o aforismo jurídico «algumas vezes os poetas também fazem versos.
0 Sr. Ministro da Justiça que tem sempre a cautela de fazer versos certos na sua pasta de Justiça
1 Que necessidade tinha o Governo de consultar o Parlamento se quizesse a reintegração? O Governo dir-lhe-ía que não havia necessidade nenhuma, a não ser por um excesso de escrúpulo, qual o do Governo estar convencido de que o Parlamento ao votar a lói de amnistia não queria realmente que os amnistiados fossem reconduzidos nos seus lugares. Tanto era esta a opinião do Governo e talvez do Parlamento que a votação desta proposta, na Câmara dos Senhores Deputados, a confirmou. Eu que tenho alguma autoridade para assuntos desta ordem, fui o único que tendo votado o projecto de amnistia declarei que o não votava na especialidade e dizia-se à boca pequena que eu tinha sido contraditório, quando afinal o não fui. Eu votei a amnistia na generalidade e não a voto na especialidade, e votarei sempre todas as amnistias, emquanto a Eépública não tiver uma lei para julgar todos os que se revoltam contra as instituições, e por isso, quando se vê a braços com qualquer revolução, vê-se sempre esta iniquidade que resulta dos processos preparados e que nos obrigam tombem a votar projectos de amnistia.
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Agora, na especialidade, é que o não dei e declarei desde logo que -o não dava porque não admitia, nem hoje admito., que um pensamento tam elevado, como era o da amnistia, fosse restringida duma forma iam tacanha.
Nós votámos a proposta de amnistia de afogadilho, por causa de não perdermos o ensejo que nos era dado com as festas do soldado desconhecido.
Não fizemos pois a obra que devíamos -fazer, uma obra que completasse as deficiências do projecto, e assim se nos àon-rou o dar-lhe o pensamento da amnistia,
votar esse projecto que carecia de alterações e modificações, e a prova é que a dois dias da sua aprovação, o Senado se teve de ocupar cie um outro projecto que, deixe-me V. Ex.a dizer, foi votado de olhos fechados.
Eu nas condições de V. Ex.a, Sr. Ministro ds Justiça, não tinha trazido ao Parlamento tal proposta.
Demais essa interpretação que V. Ex.a deu, é a que está mais em harmonia eozn o pensamento latino de que em matéria criminal devemos interpretar nma lei no sentido sempre mais favorável para o arguido ou dalinquênte.
Se o Governo entendia que podia reintegrar, e só não podia reconduzir, porque veio ao Parlamento pedir uma explicação ?
Veio talvez porque se convenceu de que o Congresso, ao votar a lei da amnistia, não tinha dúvida em reintegrar nem reconduzir os amnistiados.
Veio pois aqui e o Sr. Jacinto Nunes acaba de nos dizer que a lei não precisa de interpretação nenhuma se nós votássemos a mcção de S. Ex.a em que situação ficada o Governo, e principalmente V. Ex.R, Sr. Ministro da Justiça?
Se votássemos esta moção ficava o Governo sem. saber como interpretar a lei da amnistia?
Já outro dia preguntei, e continuarei a perguntar, se pela lei da amnistia e por esta proposta da comissão, são reintegrados automaticamente os infractores, e é que eu não vejo que aqui se esclareça este assunto.
Agora, Sr- Presidente, fica bem esclarecido que o Governo, por deliberação justificada e publicada no Diário do Governo, poderá reintegrar.
Oxalá que o Governo não tenha dúvidas a tal respeito e não tenha de vir com nova proposta sobre o assunto.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jacinto Nunes: — Sr. Presidente: serei muito breve, porque a hora vai muito adiantada.
Começou o ilustre orador que me precedeu, por dizer que a minha moção era ilógica. Não deu porém, S. Ex.a, a razão disso.
Ilógica foi a atitude de S. Ex.a na sessão em que votou a amnistia, pois que a votou na generalidade e não votou o resto.
Mas disse o Sr. Machado de Serpa que o Senado não tinha competência para alterar. Ou votamos ou rejeitamos. Não temos ?.. o
O Sr. Machado de Serpa (interronpen-do):—A moção de V. Ex.a é ilógica, mostrando que reintegração e recondução-não erani a mesma cousa, e. pode dar lugar a uma situação embaraçosa...
O Orador: — V. Ex.a não ouviu bem ler a minha moção,- com certeza, senão não diria que ela era ilógica. Ela está perfeitamente dentro da lógica e até tem preferência na votação.
E não direi mais nada.
O orador, não reviu.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Lopes Cardoso): — Sr. Presidente :\ o Sr. Machado de Serpa interroga o Governo pela seguinte forma: Os motivos porque trouxe esta proposta de lei ao Parlamento estão nitidamente expostos no relatório que apresentei na outra Câmara, mas ainda que a lei não trouxesse esse relatório, bastava a forma porque a discussão deste assunto tem corrido nesta casa para imediatamente justificar o procedimento do Governo, trazendo ao Parlamento a proposta que estamos discutirido e que tem por fim interpretar o artigo 7.° da lei da amnistia votada nesta Câmara.
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desde que se levantaram dúvidas sobre a sua execução, eu entendi que devia consultar os leaders da outra Câmara e outras instâncias superiores que foram de opinião que o assunto precisava de'ser esclarecido.
Eu compreendo que para alguns Ministérios não fosse necessário fazer esta consulta, mas para o meu Ministério e para o das Finanças os motivos já são muito diferentes, o que me obrigava a fazer esta pregunta.
O Sr. Machado de Serpa que é um digníssimo juiz, sabe e muito o que no meu Ministério significa a palavra recondução, ' em que, por exemplo, um juiz que serviu seis anos-numa comarca não pode ser reconduzido.
No Ministério da Justiça a palavra reconduzir tem uma significação muito restrita, que parece a significação que ao artigo 7.° da lei da amnistia quere dar o Sr. Jacinto Nunes e o Sr. Dias de Andrade desejam que ele tenha. • Ora, ó absolutamente indispensável averiguar qual tenha sido o sentido da Câmara ao votar o projecto da amnistia.
Disse S. Ex.a que o Governo devia ter a sua opinião formada^sobre o caso.
Não a tem; e a prova ó que veio fazer a consulta à Câmara.
O Governo não tem a certeza de qual fôbse o pensamento da Câmara ao votar aquela" proposta, e por isso trouxe ao Parlamente esta proposta para que a forma interpretativa seja verdadeira.
Quando foi redigida essa proposta, estava convencido que não havia funcionários que não estivessem afastados do serviço por processos disciplinares, mas depois sube que pelo Ministério' da Guerra foram afastados alguns funcionários, sem ter precedido esse afastamento de qualquer processo. E tratei de modificar a forma.
O Sr. Catanho de Meneses definiu depois a sua atitude, dizendo que entendia que a palavra reduzir correspondia a reintegrar, pelo artigo 7.°, e assim propôs que para esclarecimento do artigo 7.° bastavam as palavras «ou reintegrar s.
Aceito isto, porque corresponde ao fim que o Governo tem em vista.
O Governo não vem aqui impor uma proposta sua. Vem fazer uma pregunta.
Diametralmente oposta à opinião do
Sr. Catanho de Meneses é a moção que o Sr. Jacinto Nunes enviou para a Mesa.
Há que deliberar entre ambas, aclarando dúvidas.
Se se entende que reconduzir significa reintegrar, então é votar a proposta do Sr. Catanho de Meneses; se se quer dar à palavra reconduzir um sentido mais restrito, então se pronunciem pela moção do Sr. Jacinto Nunes.
Vem agora o Sr. Oliveira e Castro e diz que houve grandes desigualdades nos julgamentos e esta circunstância o levou a votar a amnistia.
S. Ex.a referiu-se até a um parecer duma instância de consulta em que alguns pediam uma revisão de processos.
Não é esta a altura de se discutir isto.
O facto de hoje vir aclarar-se um artigo da lei de amnistia ó muito diverso de amanhã haver uma iniciativa para admitir uma revisão de todos os processos.
xii justo que esse projecto se apresente, e ao Parlamento compete julgar da sua oportunidade. Mas agora, a propósito desta interpretação vir estabelecer esse princípio, não é oportuno.
Mais tarde, estabelecendo-se o processo de revisão, que se abra um novo período para cada um requerer a revisão dos processos.
Posta a questão como está, vou termi« nar, declarando mais uma vez que o Governo não tem opinião assente sobre uma ou outra interpretação, e aguarda que a Câmara se pronuncie.
O orador não reviu.
É lida a moção do Sr. Jacinto Nunes.
Posta à votação é rejeitada.
O Sr. Enes Meira requere a prioridade para a proposta do Sr. Catanho de Meneses, o que é aprovado.
Ê lida a proposta do Sr. Catanho de Meneses.
Posta à votação é aprovada.
A requerimento do. Sr. Pais de Almeida é dispensada a leitura da última redacção.
O Sr. Ministro das Colónias (Paiva Gomes):-r-Em harmonia com os preceitos constitucionais, apresento as propostas para o provimento dos lugares de governadores da Guiné e Timor.
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Diário das Sttsôes do Senado
S. Teme por circunstâncias alheias à minha vontade, mas espero fazê-lo amanhã.
Os nomes escolhidos são de pessoas competentes e capazes de cumprireir com o sen dever.
Ao Senado cumpre dizer se interpretei o seu sentir apresentando tais propostas, que são as seguintes:
1.° Proponho nos termos do artigo 25.° da Constituição para o lugar de governador =da colónia da Guiné o teneníe--coroael Sr. Jorge Frederico Velez Caroço.
. 2.° Proponho, para idêntico lugar na colónia de Timor o Sr. Dr. Domingos Faria de Sampaio e Melo.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
Interpelação do Sr. Silva Barreto ao Sr. Ministro da Instrução.
Projectos n.08 316 8 661.
Eleição para os cargos de governador da Guiné e Timor.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 2õ minutos.