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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
sessão n.° 30
EM 18 DE MAIO DE 1923
Presidência do Ex.mo Sr. António Xavier Correia Barreto
Secretários os Ex.mos Srs.
Luís Inocêncio Ramos Pereira
João Manuel Pessanha Vaz das Neves
Sumário. — As 15 horas, com 24 Srs. Senadores presentes, o Sr. Presidente declara aberta a sessão.
Aprova-se a acta e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Santos Garcia lavra o seu protesto pela forma como decorreu, em Évora, um processo movido contra um oficial.
O Sr. Gaspar de Lemos propõe que na acta se exare um voto de saudação ao Congresso Ribatejano, que hoje se inaugurou em Santarém.
Secunda esta proposta o Sr. Francisco José Pereira, aprovando-a em seguida o Senado.
O Sr. Joaquim Crisóstomo comenta a forma como se está fazendo a liquidação nos Transportes Marítimos do Estado.
Responde o Sr. Ministro do Comércio.
O Sr. Júlio Ribeiro requere documentos pelo Ministério do Comércio, havendo entre o respectivo Ministro e o orador explicações.
Discute-se e aprova-se a proposta de lei referente a pensões às famílias das vítimas de 14 de Maio.
O Sr. Pereira Osório estranha que todos os indivíduos processados por virtude do decreto sôbre os lucros ilícitos sejam absolvidos, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Justiça.
Aprova-se uma proposta abrindo um crédito para pagamento de alimentos aos presos.
O Sr. D. Tomás de Vilhena pregunta se uma convenção sôbre o exclusivo da navegação aérea em Portugal, apresentada ao Govêrno, já foi assinada.
O Sr. Ministro do Comércio esclarece que o Govêrno tratará o assunto no Parlamento, para que êle decida.
O Sr. Procópio de Freitas também insta pela liquidação imediata dos Transportes Marítimos do Estado.
Responde o Sr. Ministro do Comércio.
O Sr. José Pontes refere-se a convenção aeronáutica com a França, dando ainda explicações sôbre o assunto o Sr. D. Tomás de Vilhena.
Ordem do dia. —Entra em discussão o projecto de lei n.° 85, criando a freguesia da Lomba da Mata.
É aprovado, bem como a proposta de lei n.º 81 sôbre fianças nas alfândegas.
Segue-se o projecto n.° 267, sôbre o cais de Angra do Heroísmo, que é rejeitado.
O projecto n.º 262, fixando a constituïção de assembleas eleitorais, é aprovado.
A proposta de lei n.º 251 é aprovada, sucedendo outro tanto com os projectos n.os 225, 387 e 390.
Sôbre o projecto n.º 203, fala o Sr. Ferreira de Simas, sendo o mesmo projecto aprovado, como também o foi o n.° 398.
Sôbre a proposta de lei n.º 398, falam os Srs. Joaquim Crisóstomo, combatendo-a, e D. Tomás de Vilhena, aplaudindo-a, respondendo aos dois oradores o Sr. Ministro da Instrução e sendo a proposta aprovada.
Segue-se a proposta de lei n.° 399, sôbre a qual falam os Srs. Joaquim Crisóstomo, D. Tomás de Vilhena e o Sr. Ministro da Instrução, sendo a proposta aprovada, bem como o projecto de lei n.° 275.
Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Presidente propõe que se indiquem três Srs. Senadores para fazerem parte da União Interparlamentar do Comércio.
O Sr. Pereirs Osório propõe que os Srs. Senadores escolhidos sejam apenas dois.
O Sr. Ramos de Miranda associa-se às saudações do Senado ao Congresso Ribatejano.
Abertura da sessão às 15 horas e 50 minutos.
Srs. Senadores que responderam à chamada:
António Maria da Silva Barreto.
António de Medeiros Franco.
António Xavier Correia Barreto.
Artur Octávio do Rêgo Chagas.
César Procópio de Freitas.

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Diário das Sessões do Senado
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Francisco António de Paula.
Francisco José Pereira.
Francisco Vicente Ramos.
Herculano Jorge Galhardo.
João Carlos da Costa.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Joaquim Pereira Gil de Matos.
Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.
José Augusto de Sequeira.
José Duarte Dias de Andrade.
José Joaquim Pereira Osório.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Manuel Gaspar de Lemos.
Raimundo Enes Meira.
Rodrigo Guerra Álvares Cabral.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Aníbal Augusto Ramos de Miranda.
António da Costa Godinho do Amaral.
Artur Augusto da Costa.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Augusto de Vera Cruz.
Constantino José dos Santos.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Francisco António Ferreira de Simas.
João Catanho de Meneses.
João Manuel Pessanha Vaz das Neves.
João Maria da Cunha Barbosa.
Joaquim Teixeira da Silva.
José António da Costa Júnior.
José Joaquim Fernandes Pontes.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Nicolau Mesquita.
Tomás de Almeida Manuel do Vilhena (D.).
Srs. Senadores que faltaram à sessão:
Abílio de Lobão Soeiro.
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Alfredo Narciso Marçal Martins Portugal.
Álvaro António Bulhão Pato.
António Alves de Oliveira Júnior.
António Gomes de Sousa Varela.
Augusto César do Almeida Vasconcelos Correia.
César Justino de Lima Alves.
Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Alpoim Borges do Canto.
João Trigo Motinho.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Machado Serpa.
José Mendes dos Reis.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Luís Augusto Simões de Almeida.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Querubim da Rocha Vale Guimarães.
Ricardo Pais Gomes.
Roberto da Cunha Baptista.
Rodolfo Xavier da Silva.
Silvestre Falcão.
Vasco Crispiniano da Silva.
Vasco Gonçalves Marques.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
As 15 horas e 5 minutos, com a presença de 24 Srs. Senadores, o Sr. Presidente da Câmara declara aberta a sessão.
Em seguida é lida e aprovada a acta da sessão anterior, sem reclamação.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Requerimentos
Requeiro que, com a máxima urgência, pelo Ministério do Comércio e Direcção Geral dos Correios e Telégrafos, me sejam enviadas as seguintes informações:
Qual é precisamente a taxa e preço de trânsito ou trânsitos dos telegramas entre a Europa e a América do Sul pelos cabos amarrados em território português?
E em que moeda se faz a liquidação de contas? — Raimundo Meira.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério do Trabalho, me seja enviada cópia do processo de sindicância ao Asilo Almirante Reis, feita pelo advogado Dr. Joaquim Prado;
Cópia do processo do sindicância ordenada pelo provedor à ex-enfermeira do

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Asilo Almirante Reis, Palmira Vasques, feita pelo empregado Amaral Frazão;
Cópia da queixa apresentada ao Sr. Ministro do Trabalho contra o provedor da Assistência Pública e assinada, entre outros, por Amaral Frazão. Pedro Artur da Silva e Francisco Loureiro Pinto. — Júlio Ribeiro.
Para a Secretaria.
Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja enviada nota da totalidade de todos os vencimentos, gratificação, comparticipação de lucros, etc, que no último ano recebeu cada um dos vogais da Caixa Geral do Depósitos. — Júlio Ribeiro.
Paia a Secretaria.
De Augusto César da Costa Rebelo, pedindo seja dado seguimento à sua petição, promovendo-o ao pôsto a que tenha direito.
Para a 4.ª Secção.
Comissão de redacção
Proponho para agregar a esta comissão os Srs. Silva Barreto, Francisco de Paula e Vicente Ramos.
Sala das Sessões do Senado, 18 de Maio de 1923. —O presidente da comissão, Joaquim Pereira Gil.
Aprovado.
Pedido de licença
Do Sr. Ribeiro de Melo.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Telegramas
Das Câmaras Municipais da Sertã, Loures, Viana do Castelo e Vila de Rei, protestando contra o projecto de lei que obriga as câmaras a elevar os vencimentos aos médicos municipais.
Para a Secretaria.
Do professorado de Mafra, pedindo melhoria de vencimentos.
Para a Secretaria.
Do funcionalismo público do Pôrto, secundando as reclamações dos seus colegas de Lisboa.
Para a Secretaria.
Do médico de Mesão Frio, protestando contra a Câmara, que reclamou contra o projecto de lei que melhora vencimentos dos médicos municipais, pois o seu vencimento é irrisório: 150$.
Para a Secretaria.
Dos sargentos da guarnição da Madeira, pedindo a aprovação do parecer n.° 442.
Para a Secretaria.
Ofícios
Do Ministério da Guerra, satisfazendo o requerimento n.° 298, de 6 de Novembro do ano findo, do Sr. Artur Costa.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Soure, pedindo a aprovação do projecto de lei que autoriza as câmaras a lançar certas percentagens para criar receitas.
Para a Secretaria.
Da 1.ª Secção, enviando* aprovada, a proposta de lei n.° 426.
Da 1.ª Secção, acompanhando, aprovadas, as propostas de lei n.os 407 e 419.
Parecer
Da comissão do Orçamento, sôbre o orçamento do Ministério do Interior. Imprima-se e distribua-se.
Última redacção Da proposta de lei n.° 190, restaurando a comarca do Ourique. Aprovada.
Projecto de lei
Dos Srs. Ramos de Miranda e Francisco José Pereira, criando na comarca de Santarém um juízo criminal.
Para a 2.ª secção.
Representação
De vários cidadãos, reclamando contra a lacuna existente no contra-projecto em discussão, na parte estatuída pelo artigo 9.° da lei n.° 5:411.
Para a 2.ª secção.
Antes da ordem do dia
O Sr. Santos Garcia: — Sr. Presidente: em primeiro lugar, mando para a Mesa um projecto do lei, que promove a protecção ás aves úteis à agricultura.

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Em segundo lugar, vou-me referir a um facto para o qual desejava estivesse presente algum dos Ministros, para dêle tomarem nota, a fim de o transmitirem ao Sr. Ministro da Justiça.
Como S. Ex.ªs não estão presentes, e eu não posso deixar de lavrar o meu maior protesto, vou expôr o caso:
Há meses, no tribunal de Évora, depois de ser proferida a sentença por um crime de liberdade de imprensa, um oficial do exército levantou vivas à República, no que foi secundado por alguns republicanos presentes.
Por êsse motivo, o presidente do tribunal, numa compostura bem pouco própria do lugar que ocupa, invectivou a assistência.
Devo dizer a V. Ex.ª que em virtude de êsse oficial ter levantado êsses vivas à República foi êle submetido a um conselho de guerra e absolvido.
Mas o presidente dêsse tribunal imputou êsse mesmo crime a três republicanos e instaurou-lhes o respectivo processo, sucedendo porém que as únicas testemunhas dadas contra êsses indivíduos eram suas inimigas, tendo sido condenados pelo juiz que instaurou o processo, passando assim a ser acusador e julgador, em três meses de cadeia.
Um dêles, pelo menos, provou-se, por forma insofismável, não ter estado na sala e isso por documento assinado por doze indivíduos.
Essa sentença teve a sua apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, e aí a sentença foi confirmada.
Sr. Presidente: muito embora eu tenha a certeza de que o Sr. Ministro da Justiça nada poderá fazer, eu não posso deixar de protestar contra êste facto, porque sei que se trata de um caso de vingança e ainda muito mais pelo facto de oficial incriminado e que confessou o delito, tomando dêle a respectiva responsabilidade, ter sido absolvido.
São estas as considerações que desejava fazer e como não está presente nenhum Sr. Ministro, eu pedia a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de as transmitir ao Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Presidente: — Transmitirei ao Sr. Ministro da Justiça as considerações de V. Ex.ª
O Sr. Gaspar de Lemos: — Sr. Presidente: iniciou hoje os seus trabalhos em Santarém o Congresso Ribatejano e desejo congratular-me por êsse facto, que considero muito importante nas suas conclusões, procurando junto dos parlamentares, junto dos poderes públicos, a sua efectivação legal, mas eu espero que o Congresso Ribatejano enverede por êsse caminho, porque pela forma como eu vejo iniciar os seus trabalhos, sendo as suas teses apresentadas por individualidades em destaque no campo da sciência e da actividade económica, êle já dá bons indícios.
Parece-me bem que o Senado da República exare na sua acta um voto de congratulação pela realização do Congresso Ribatejano.
Muitos apoiados.
O Sr. Francisco José Pereira: — Sr. Presidente: Senador pelo distrito de Santarém, eu tencionava apresentar uma proposta ao Senado e acabava eu de chegar quando o Sr. Gaspar de Lemos o fez.
Tenho a dizer que entusiasticamente me associo ao voto proposto pelo Sr. Gaspar de Lemos, e faço votos para que o Congresso Ribatejano, que pela primeira vez se reúne hoje em Santarém, tenha aquele êxito que é necessário esperar, para o interêsse daquela região, que é das regiões mais ricas do país.
Os poderes públicos têm abandonado aquela região o a prova está no estado desgraçado em que se encontra o Tejo, sendo êste o assunto duma das teses que deve ser mais discutida, e que em torno dela se levantarão as reclamações necessárias aos poderes públicos, que serão dignas de ser atendidas.
Foi aprovada a proposta do Sr. Gaspar de Lemos.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Embora não esteja presente o Sr. Ministro do Comércio, como seria para desejar, vou referir-me a um assunto da mais alta importância administrativa, que necessita ser urgentemente resolvido.
A Câmara, pelas notícias publicadas nos jornais, deve ter conhecimento que os navios da frota marítima do Estado se encontram há longo tempo fundeados no Tejo, em péssimas condições de conser-

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vação. Deminuem de valor dia a dia, hora a hora.
Porque é que não se procede à sua liquidação imediata, nos termos da lei n.° 1:346, de 9 de Agosto de 1922? O artigo 6.° da referida lei textualmente dispõe:
«A frota mercante do Estado, dividida por grupos, conforme os serviços a estabelecer, será entregue por concurso público, a uma ou mais sociedades anónimas de responsabilidade limitada já constituídas nos termos da legislação portuguesa, ou a entidades que se obriguem a constituí-las para efectivação dos serviços indicados rio artigo seguinte e seus parágrafos».
Em cumprimento do preceituado nêste artigo, foi aberto concurso público para adjudicação dos navios, mas a comissão liquidadora ainda não se pronunciou sôbre as propostas, ou, se já deu o seu parecer, o Govêrno nenhuma decisão tomou.
Quantos foram os concorrentes, e quais as condições em que êles formularam as suas propostas, não o sabe a Câmara, e muito menos o país. Consta que entre as propostas figura uma da Companhia Nacional do Navegação, impondo cláusulas que vão de encontro às bases fundamentais do programa do concurso. Será assim?
Em tais circunstâncias impõe-se a anulação do concurso e a sua repetição nos termos do artigo 12.° da citada lei, que dispõe:
«Repetir se há o concurso quando ficar deserto aquele a que alude o artigo 6.º
A lei presume a hipótese de no primeiro concurso não ser apresentada proposta alguma, ou de os concorrentes deixarem de satisfazer aos requisitos indispensáveis para se efectuar a adjudicação dos navios.
Diz-se publicamente nos meios políticos que a Companhia Nacional de Navegação, na sua proposta, declara que não se conforma com as bases do concurso, e que reclama uma nova avaliação dos navios, de forma que o seu valor seja expresso em libras a divisa cambial da data da adjudicação. Manobras financeiras muito
em uso na Rua do Comércio, onde a Companhia tem a sua sede. Que motivos ou razões invoca para justificar a sua pretensão? Ninguém ignora os processos infames e criminosos de que os banqueiros lançam mão para agravar ou melhorar o câmbio, devendo notar-se que a Companhia tem grande influência, pela elevada categoria dos seus directores, nas oscilações de bôlsa. Quem é o traidor à Nação que, mancomunado com os traficantes da nossa finança, se presta a servir os interêsses duma cáfila de exploradores? Cuidado e muito cuidado, porque os lobos espreitam os redis, e se as assaltarem, assenhoreando-se das presas, não é com artigos violentos, publicados nos jornais, nem com discursos enérgicos pronunciados no Parlamento, que se repõem as cousas no seu estado anterior. Além disso a Companhia pretende, contra expressa determinação da citada lei, que os navios lhe sejam adjudicados à medida que dêles fôr necessitando.
Só com manifesta má fé, confiando-se muito na mediocridade do Sr. Ministro do Comércio, é que se pode admitir a possibilidade duma cláusula tam lesiva dos interêsses do país figurar em qualquer contrato celebrado pelo Estado. Entre os directores da Companhia Nacional de Navegação estão convencidos que haja um Ministro da República tam estúpido que lhes permita apoderar-se dos navios da frota marítima, que lhes convierem, pelo preço que lhes agradar, e de imobilizarem os restantes, a seu belo prazer? Cavalheiros que assim procedem ou contam com uma influência dominadora, ou prezam pouco a sua liberdade. Uma proposta dessas confunde-se com um ^verdadeiro conto do vigário, dos que a imprensa relata diariamente. Ora se os vigaristas em flagrante delito, isto é, quando tentam apoderar-se do que não lhes pertence, por meios artificiosos, são presos e conduzidos à esquadra, £ porque não se entregam os signatários da mencionada proposta aos tribunais criminais, para exemplo dos delapidadores do dinheiro do Estado?
Parece-me que andam todos empenhados, tanto administradores dos bens da Nação, como directores de Bancos o Companhias, em arrastar o país à falência. Lembro-lhes, porém, que hão pagar caro

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a aventura, porque quem o alheio veste na praça o despe. É apenas uma questão de tempo, e de oportunidade. Os grandes exploradores do povo, nos momentos em que a justiça da lei e dos tribunais ordinários está suspensa, por efeitos revolucionários, vão parar à guilhotina, ou são enforcados às esquinas das ruas.
Sr. Presidente: é fácil portanto concluir-se que a proposta da Companhia Nacional de Navegação, solicitando uma nova avaliação dos navios, em libras, ao câmbio da data da adjudicação, e a entrega dos navios, à proporção que os fôr requisitando, devia ter sido rejeitada in limine pela comissão liquidatária. Nem um só argumento se pode invocar para justificar a sua atitude de incerteza perante uma situação tão clara e definida. Quem impõe condições é o Estado, de harmonia com os seus interêsses, consignados e garantidos pela lei, e não os pretendentes à adjudicação. Se as cláusulas do concurso lhes convêm, apresentam as suas propostas, no caso contrário abstêm-se de o fazer. Fui educado na escola dos princípios jurídicos e por isso condeno o estado de desordem, de imoralidade e anarquia administrativa a que chegámos.
O Sr. Presidente: — Já passou o quarto de hora.
O Orador: — Pedia a V. Ex.ª que consultasse a Câmara sôbre se consentia que eu falasse mais 5 minutos.
A Câmara consentiu.
O Orador (continuando): — Agradeço à Câmara a sua gentileza e prometo ser breve.
Sr. Presidente: corro como certo que a comissão liquidatária dos Transportes Marítimos do Estado, nomeada nos termos dos artigos 1.° e 2.° da lei n.° 1:346, em virtude de desinteligências provocadas pela apreciação da proposta a que me venho referindo, pediu a sua exoneração, e que o Sr. Queiroz Vaz Guedes, que finge de Ministro do Comércio, lha recusou. Que há de verdade a êste respeito?
Convém que se dê ao país conhecimento de tudo o que se passa, para evitar suspeições e para que se faça justiça a alguns homens honestos que compõem a aludida comissão.
Não li o parecer que ela formula sôbre a proposta da mencionada Companhia, mas sei que excedeu o tempo que devia ter levado a elaborar êsse trabalho. Em Portugal a burocracia marcha a passo de boi, e chega sempre, para o efeito do defender os negócios públicos, tarde e a más horas.
Figura no número dos indivídos que compõem a comissão liquidatária, na qualidade de representante do Pôrto de Lisboa o Sr. Afonso de Macedo, que pelo seu honesto proceder merece que lhe faça uma referência especial, deslocando-o dos seus colegas. Na época de corrupção que atravessamos, o Sr. Afonso de Macedo tem direito à consideração das pessoas do bem, pois tendo sido procurado por alguns falsos patriotas com o fim do lhe captarem o seu voto a favor da Companhia, comprometendo-se a averbarem gratuitamente em seu nome acções da mesma, recusou-se terminantemente a transigir com roubalheiras. E tal o meu desalento e o meu scepticismo, que não sei se deve despresar mais o gatuno esfarrapado, habitue das prisões, se o escroc engravatado e enluvado que vive sem trabalhar no luxo e na opulência à custa da frondosa árvore do Estado.
Tenho dito.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Vaz Guedes): — Sr. Presidente: quando entrei na sala já o Sr. Joaquim Crisóstomo ia em meio das suas considerações e por isso não ouvi parte delas; em todo o caso, creio que versaram sôbre o concurso da frota marítima do Estado.
Em primeiro lugar, devo dizer a V. Ex.ª que a proposta do concurso para fretamento da frota foi apresentada e apreciada por quem de direito. Está seguindo os seus trâmites.
Conto poder trazer ao Parlamento a proposta competente, talvez nos princípios da próxima semana.
O conselho de Ministros já opinou se êle procederá como sempre tem feito.
Com respeito aos créditos, a informação que tenho é que realmente muitas dúvidas têm havido em que a comissão liquidatária, é por assim dizer uma admi-

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nistração da massa, permita-se-me a frase, tem tido muito trabalho.
Realmente as dívidas eram imensas, tem do ser fiscalizadas e sujeitas a exame minucioso, em que havia realmente algumas justas, mas outras que o não eram dan-do-se preferência a alguns pessoais, da América do Norte por óbvios motivos.
Com relação ao outro caso, eu lastimo que isso se tivesse dado, porque a sindicância não era destinada a sindicar actos da actual administração.
Eu acho melhor que o Senado deixe passar isto, e aguarde os resultados porque faltam apenas dois meses para terminar o pagamento marcado por lei.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Ribeiro: —Requeiro, Sr. Presidente, que entre em discussão, sem prejuízo da ordem do dia, o projecto n.º 426 que está sôbre a Mesa, e aproveito estar no uso da palavra para mandar para a Mesa dois requerimentos para que me sejam enviados os documentos que já pedi há tanto tempo.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Vaz Guedes) (interrompendo): — Quanto aos documentos a que o Sr. Júlio Ribeiro se refere, só ontem despachei autorizando que fôssem passados, porque mais cedo me não foi sujeito o requerimento à minha assinatura.
O Orador: — Os Ministros autorizam, a culpa é da burocracia.
O Sr. Ministro do Comércio o Comunicações (Vaz Guedes): — Note V. Ex.ª que todos os documentos que tenho autorizado têm vindo para o Senado.
Há ainda um pedido sôbre correios que também já autorizei e muito breve V. Ex.ªs terão os documentos que pedem.
Foi lida a proposta de lei n.° 426.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Júlio Ribeiro.
Posta a proposta de lei n.° 426 à discussão na generalidade, e depois na especialidade, foi aprovada sem discussão.
E a seguinte:
Proposta de lei n.° 426
Artigo 1.° São extensivos aos pensionistas civis e militares das revoluções de
5 de Outubro de 1910 e 14 de Maio do 1915, referidos no artigo 8.° da lei n.° 1:131, de 14 de Agosto de 1922, os benefícios de lei n.° 1:355, de 15 de Setembro do mesmo ano, calculando-se a melhoria, nos termos do artigo 25.° desta última lei, sôbre 20 por cento da actual pensão.
Art. 2.° As pensões de que trata esta lei são isentas de qualquer imposto e pagas por inteiro desde 1 de Janeiro de 1923.
Art. 3.° Por morte dos pensionistas transitará a pensão para as suas viúvas mães e filhos, quando menores.
Art. 4.° Fica assim alterado o artigo 18.° da lei n.° 1:355 e revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 15 de Maio de 1923. — Alberto Ferreira Vidal —Baltasar de Almeida Teixeira.
Pediu dispensa da última redacção para esta proposta, o que foi aprovado, o Sr. Medeiros Franco.
O Sr. Pereira Osório: — Sr. Presidente: eu pedi a palavra e a comparência do Sr. Ministro da Justiça, para fazer umas leves considerações, e chamar a atenção de S. Ex.ª para um assunto que eu considero de capital importância. Quero referir-me à harmonia dos poderes do Estado.
Infelizmente esta harmonia nem sempre se dá, e não se dá sobretudo em ocasiões importantes para a vida do República. Já sucedeu isso quando se tratou do julgamento dos indivíduos que cometeram os crimes da traulitânia, e sucede agora com o julgamento dos processos de execução da lei que trata dos lucros ilícitos.
Eu não acuso os tribunais, mas o que chama a minha atenção é que é um desprestígio para a República, o ter-se começado a executar êsse diploma legal que tanto interessa a vida nacional e sobretudo os explorados, e que apenas de tantos casos um tivesse sido condenado, que foi no Tribunal do Comércio, ornais todos têm tido absolvições.
Essas absolvições são realmente justas? Não sei.
Mas precisamente porque se tem dado êste facto estranho, noutros períodos di-

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ficeis para a República, em que a opinião pública exige uma condenação severa daqueles que realmente embaraçam e prejudicam a vida nacional, é que eu não posso deixar de chamar a atenção do Sr. Ministro da Justiça para o caso, a fim de S. Ex.ª inquirir dos motivos por que se dão essas absolvições.
Será pela má organização dos processos, como quando se trata dos crimes da traulitânia?
Será pela organização do júri especial nesses processos?
Não sei, mas o que eu entendo é que convém que o Sr. Ministro da Justiça intervenha, para que se não continue a dar êste caso estranho de o País estar esperançado em que uma lei produza bons resultados e se castiguem os delinquentes, e a final se vejam absolvições e a vida a encarecer cada vez mais.
Mas ainda se dá uma outra circunstância: é que há jornais que, defendendo êsses indivíduos que são absolvidos, ainda preguntam quem é que os indemniza da pena já sofrida anteriormente ao seu julgamento, visto lhes terem encerrado os respectivos estabelecimentos.
"Ora eu devo dizer que se a lei tem alguma cousa de bom, é precisamente isso.
Pelos factos que eu citei, já tenho muito poucas esperanças na acção d s tribunais — e nisto não vai ofensa para ninguém, porque ainda há muitos magistrados que sabem cumprir o seu dever — mas a opinião pública já não tem esperanças senão naquilo que se faz automàticamente, sem depender do julgamento, porque assim já êsses indivíduos tiveram um prejuízo, pelo encerramento dos seus estabelecimentos, embora os tribunais não tivessem provas suficientes para os condenar.
Apoiados.
Peço portanto ao Sr. Ministro da Justiça o favor do indagar dos motivos que originam essas absolvições, modificando a lei, se isso fôr necessário, de modo que o prestígio da República, e principalmente o do Poder Executivo, não estejam em cheque, como está sucedendo.
O Govêrno apresenta uma proposta de lei e defende-a julgando que com ela vai modificar as condições de vida, as duas Câmaras aplaudem quási por unanimidade a atitude do Govêrno e aprovam a
proposta, mas, quando ela é posta em execução, começam a aparecer as absolvições, com a agravante de que ainda se julgam no direito de serem indemnizados pelos prejuízos que sofreram antes do julgamento, no que alguns jornais os acompanham.
Era só o que faltava ver: o Estado ter que indemnizar os donos dêsses estabelecimentos, pelos prejuízos que êles dizem que sofreram!
Aproveito a ocasião para pedir a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se digne consultar a Câmara sôbre se aprova a urgência para a discussão da proposta de lei n.° 419, nos termos do § 2.° do Regimento.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Ribeiro (em nome da comissão de finanças). — Mando para a Mesa um parecer.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos
(Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: ouvi com a maior atenção as considerações feitas pelo Sr. Pereira Osório, acêrca do decreto ultimamente publicado para evitar os lucros ilícitos e sobretudo para evitar as especulações, que têm sido de tal ordem, que bastante têm contribuído para o agravamento da vida.
O tribunal encarregado de julgar as faltas cometidas pelos indivíduos que auferem lucros exagerados foi criado por um decreto publicado em Outubro último, salvo êrro, não tendo o Govêrno possibilidade do modificar a sua organização, a não ser que lhe fôsse dada uma autorização parlamentar, como a teve o autor do decreto.
Em todo o caso, eu devo dizer que a organização do tribunal, pelo menos sob o ponto de vista teórico, era de prever que dêsse os melhores resultados, porquanto aqueles que eram encarregados do averiguar dos actos dos indivíduos incriminados e incursos nas disposições do decreto eram precisamente aqueles que, por assim dizer, maiores vítimas têm sido da carestia da vida, visto o tribunal ser constituído por dois funcionários públicos, dois operários e dois representantes do comércio.
Nestas condições, natural era que êles fizessem justiça, castigando quando reconhecessem que era caso para tal.

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Infelizmente porém tem-se visto que aquilo que seria de prever não corresponde àquilo que se pretendia.
Em face disso, tenciona o Sr. Ministro da Agricultura, de acôrdo comigo, apresentar uma proposta de lei, tendente a ser concedida autorização ao Govêrno, para modificar a constituïção do tribunal encarregado de julgar os infractores do decreto sôbre os lucros ilícitos, e introduzir-lhe certas modificações que a prática parece ter aconselhado.
Efectivamente quási todos os indivíduos que têm sido abrangidos por êsse decreto, residentes em Lisboa, têm. sido absolvidos, o mesmo sucedendo no Pôrto.
O orador não reviu.
O Sr. Pereira Osório (para explicações): — Sr. Presidente: pedi a palavra para agradecer ao Sr. Ministro da Justiça a resposta que se dignou dar-me, e ao mesmo tempo para lembrar a S. Ex.ª o caso por mim também aqui citado há tempo, relativo ao julgamento dos processos instaurados por motivo do jôgo.
Como eu então disse, citando casos concretos, várias casas de jôgo foram assaltadas, sendo apreendidos nelas objectos destinados ao jôgo e efectuadas prisões dalguns indivíduos que foram soltos, mas até hoje nem uma única dessas casas foi encerrada.
S. Ex.ª o Sr. Ministro da Justiça respondeu-me nessa ocasião que ia tomar as providências necessárias para que a lei fôsse cumprida e como eu não soube mais nada do que se passou a tal respeito, pedia a S. Ex.ª o favor de me informar sôbre o que há relativamente a êsse assunto.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer ao Sr. Pereira Osório, que logo a seguir às considerações feitas por S. Ex.ª, quando tratou dêsse assunto, eu mandei, por intermédio do meu Ministério, pedir as necessárias informações ao respectivo magistrado, sôbre o estado dos processos.
Até hoje ainda me não foram dadas essas informações, e amanhã mesmo vou insistir por elas, a fim de intervir imediatamente desde que possa, dentro da lei, ter essa intervenção.
O Sr. Pereira Gil: — Pedi a palavra para enviar para a Mesa a última redacção do projecto de lei n.° 190.
Pôsto à votação o requerimento do Sr. Pereira Osório, foi aprovado, sendo seguidamente aprovado sem discussão, tanto na generalidade como na especialidade, a proposta.
È a seguinte:
Proposta de lei n.° 419
Artigo 1.° E aberto no Ministério das Finanças, a favor do Ministério da Justiça e Cultos, um crédito especial de 1:280.000$, dos quais 20.000$ são destinados à remoção de presos nos Caminhos do Ferro do Estado, e 10.000$ para idêntico encargo em caminhos de ferro não pertencentes ao Estado, rubricas estas todas pertencentes ao capítulo 6.°, artigo 2.° do orçamento do Ministério da Justiça para o actual ano económico, e a de 1:050.000$ a adicionar à dotação inscrita no capítulo 2.° da «Despesa extraordinária» do mesmo orçamento, com aplicação a suprir os deficits das despesas de material e diversas de todos os estabelecimentos prisionais, correccionais e de protecção a menores.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 27 de Abril de 1923. — Alberto Ferreira Vidal — Baltasar de Almeida Teixeira.
O Sr. Pereira Gil: — Requeiro dispensa de leitura da última redacção dêste projecto que acaba de ser votado.
O Senado aprovou êste requerimento.
O Sr. Presidente: — O Sr. Pereira Gil propõe que sejam agregados à comissão de redacção os Srs. Silva Barreto, Francisco de Paula e Vicente Ramos. Os Srs. Senadores que aprovam esta proposta tenham a bondade de se levantar.
O Senado aprovou esta proposta.
O Sr. D. Tomas de Vilhena: — Sr. Presidente: li na imprensa que tinha sido apresentada ao Govêrno Português pelo Comité France-Portugal uma proposta de convenção sôbre a navegação aérea.
Vejo também na imprensa que o Govêrno já assinou essa convenção, assim como também vejo que a não assinou.

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Como se trata duma questão grave, porque, pelo artigo 10.°, essa concessão podia ir além de trinta anos, eu desejava saber se essa convenção foi assinada ou se o não foi, e se o Govêrno tem tenção de a trazer ao Parlamento, para êste a discutir.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Queiroz Vaz Guedes): — Devo informar a Câmara que de facto foi apresentada ao Govêrno uma proposta relativamente à navegação aérea, e o Govêrno deliberou trazê-la ao Parlamento, acompanhada do parecer da comissão técnica.
O Sr. D. Tomás de Vilhena: — O Govêrno, então, não assinou nada.
O Oradora — O Govêrno apenas se comprometeu a trazer ao Parlamento essa proposta para que êste aprecie e resolva como entender mais conveniente para os interêsses do Estado.
O Sr. Procópio de Freitas: — Sr. Presidente: o assunto que eu desejava versar já foi, em parte, tratado pelo Sr. Joaquim Crisóstomo. Era também relativamente aos Transportes Marítimos do Estado.
Contudo, também direi alguma cousa, a fim de chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para a necessidade que há de liquidar o mais depressa possível êsse assunto, visto que os vapores se vão desvalorizando. Alguns dêsses navios há muito tempo que não entram em doca seca, razão por que se vão deteriorando.
Estou convencido de que muitos dêles têm necessidade de grande beneficiação. Os que andam fretados, os seus fretadores o que pretendem é tirar dêles o máximo rendimento, e não se preocupam com as beneficiações de que carecem.
Chamo também a atenção de S. Ex.ª para outro assunto que me parece importante, e que é modificar as condições em que são feitos os fretamentos dos barcos, para se não repetir o mesmo caso que se deu com o vapor Figueira, em que o navio, poucos dias depois de ter sido fretado, foi para cima das pedras em Leixões, tendo o Estado de fazer a despesa para o pôr a flutuar.
Pela forma como são feitos actualmente os contratos de fretamento pode dar-se o caso de um navio ser fretado, por exem pio, por 1.000$ por dia, ir de Lisboa para Leixões, e ao chegar lá naufragar, tendo o Estado de fazer a despesa para o salvar, se fôr possível, tendo recebido apenas 2.000$ do fretamento.
Pode dar-se ainda outro caso pior, que é o Estado perder completamente o navio.
Isto é uma conseqüência dos navios não estarem seguros.
Parece-me que estando os navios dos Transportes Marítimos do Estado para serem liquidados, há toda a conveniência em que êles sejam seguros.
Aproveito a ocasião de estar com a palavra para tratar doutro assunto que diz respeito à telegrafia sem fios na Madeira e Pôrto Santo.
Há tempo disse o Sr. Ministro do Comércio que brevemente seria montado um pôsto de telegrafia sem fios, de grande alcance, no Funchal, e que nessa ocasião se poderia transportar o pôsto que ali existe para a Ilha de Pôrto Santo, mas, como se vai demorando a instalação no Funchal do pôsto de grande alcance, chamo novamente a atenção de S. Ex.ª para a necessidade de ser colocado com urgência um pôsto de telegrafia sem fios na Ilha de Pôrto Santo, visto essa ilha não ter comunicações telegráficas de espécie alguma.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Queiroz Vaz Guedes): — Sr. Presidente: em resposta ao Sr. Procópio de Freitas, e com relação à frota marítima do Estados devo dizer que tenciono apresentar na' segunda-feira ao Parlamento, conforme já declarei há pouco ao Sr. Joaquim Crisóstomo, uma proposta de lei sôbre o assunto. O Parlamento, em sua soberania, resolverá como entender, ou conservando a frota, ou fazendo a sua adjudicação.
Eu, como Ministro do Comércio, trazendo ao Congresso uma proposta de lei, absolutamente liberta de qualquer pressão, só faço votos por que se realize aquilo que mais se coaduna com os interêsses nacionais.
Devo, porém, frisar que, se por acaso não fôr agora a ocasião de fazer a adjudicação dos navios, se devem fazer os respectivos seguros.

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Alega-se que estes são muito caros.
O que é preciso é, de qualquer maneira, modificar o que está, porque acidentes como o do Figueira não devem subsistir.
E a êste respeito é-me grato comunicar à Câmara que o Sr. engenheiro que -está procedendo ao seu salvamento me informou, há tempo, ter toda a esperança, quási me podendo assegurar que poria o .navio a flutuar.
Quanto ao outro assunto versado pelo Sr. Procópio de Freitas, já há dias pedi a S. Ex.ª a fineza de ir à Administração Geral dos Correios verificar, com os seus próprios olhos, o contrato que existe com a casa Marconi, a fim de o apreciar devidamente e poderemos depois proceder de acôrdo.
O orador não reviu.
O Sr. Procópio de Freitas (para explicações): — Pedi a palavra para agradecer ao Sr. Ministro do Comércio a resposta que acabou de me dar, e faço sinceros votos porque, o mais ràpidamente possível, se liquide o assunto dos Transportes Marítimos do Estado.
O Sr. José Pontes (para explicações): — Sr. Presidente: o meu amigo e colega Sr. D. Tomás de Vilhena perguntou a S. Ex.ª o Sr. Ministro do Comércio o que havia sôbre uma proposta de aviação, possivelmente assinada pelo Govêrno português e que interessava à França.
A pregunta foi feita ao Sr. Ministro do Comércio mas eu, nobre e prontamente, quero dar explicações e faço-o com desassombro e sempre com a responsabilidade do que posso afirmar.
Sr. Presidente: consciente do meu valor moral, porque nunca meti as mãos nos cofres do Estado e tenho a minha vida exteriorizada em trabalhos do máximo interêsse nacional, posso gritar que, ao envolver o meu nome e a minha actividade nêste assunto duma convenção aérea, o fiz e o faço com o maior patriotismo e com o desejo de que a terra portuguesa tenha assegurado os seus interêsses.
Altivamente declaro que, se fui estudante pobre e cheguei a ser alguém, tudo consegui tendo passado pelo jornalismo como o melhor dos camaradas e mais leal
dos companheiros, sem necessidade, até hoje, de me ligar a qualquer organismo financeiro ou de me poeirar com a farinha dalguma organização poderosa.
Digo-o daqui alto e bom som. E hei-de dizê-lo numa interpelação ao Sr. Ministro do Comércio, para que todos me possam ouvir e responder e, escalpelizando a minha acção e criticando-a, digam se não trabalho à luz do sol.
As cousas hão-de vir a público, mas não julgo oportuno tratar agora do assunto.
S. Ex.ª o Ministro do Comércio, como pessoa que sabe qual a responsabilidade do lugar que ocupa, disse que o assunto ainda não estava resolvido.
Assim é. Tempos virão. Depois falaremos.
Simplesmente, permitam-me o orgulho de constatar que um gigante desceu dos ares à terra para analisar a minha obra e apenas reconheceu que eu podia gritar, alto e bom som, que nunca trabalhei para mim, mas sempre em benefício do País e dos outros.
Tenho dito.
O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Sr. Presidente: declaro francamente que, por mais que procure, não vejo qual o motivo que tivesse dado lugar a uma expansão tam calorosa do meu amigo Sr. José Pontes, por quem, aliás, eu tenho muita estima e consideração.
Não me parece que uma pregunta que eu fiz ao Sr. Ministro do Comércio sôbre um negócio do interêsse nacional, e de interêsse nacional gravíssimo, sôbre a qual cada um de nós, honradamente, pode ter os seus pontos de vista, embora êsses pontos de vista se choquem com outros, possa ser tomada como nota de falta de patriotismo ou de estar metido em qualquer negócio menos regular.
Não me parece que o desejo que eu tenho de saber qual a atitude do Govêrno nesta questão possa motivar uma tal suposição.
Eu não insinuei, nem dirigi insinuações a ninguém e muito menos ao Sr. Pontes por quem tenho muita simpatia.
Quando um dia eu entender que S. Ex.ª é réu de qualquer crime, não jogarei de porta, não me esconderei, virei aqui fazer a acusação cara a cara, frente a frente.

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Trata-se apenas de um negócio de alto interêsse.
O Sr. José Pontes: — Não diga V. Ex.ª negócio, peço-lhe que uso de outra expressão, pelo menos na parte que me diz respeito.
O Orador: — Não tenho a menor intenção de levantar suspeitas a V. Ex.ª nem a ninguém.
O Sr. José Pontes: — Quando V. Ex.ª tivesse de o fazer, seria eu o primeiro a pedir-lho que o fizesse.
O Orador: — Tratei apenas de saber se o Govêrno tinha ou não assinado uma concessão ou se estava disposto a trazê-la ao Parlamento.
Se V. Ex.ª não entra em negócios, eu ainda menos porque nunca negociei, apenas tenho vendido milho, geralmente mais barato que qualquer outra gente.
O orador não reviu.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, a proposta de lei n.° 327, criando a freguesia da Malveira.
Lê-se. É a seguinte:
Proposta de lei n.° 327
Artigo 1.° A freguesia de Alcainça, concelho de Mafra, passa a denominar-se da Malveira e terá a sua sede nesta povoação.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 12 de Dezembro de 1922. — Alfredo Ernesto de Sá Cardoso — Baltasar de Almeida Teixeira — João de Ornelas da Silva.
Última redacção Artigo 1.° A freguesia de Alcainça, concelho de Mafra, passa a denominar-se da Malveira e terá a sua sede nesta povoação.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da comissão de redacção, 12 de Janeiro de 1923. — João Manuel Pessanha Vaz das Neves — Joaquim Pereira Gil de Matos — António de Medeiros Franco — António Gomes de Sousa Varela — Abílio Soeiro.
Parecer n.° 237
Senhores Deputados. — A vossa comissão de administração pública tem a honra de submeter, à vossa aprovação, o projecto de lei n.º 46-F, da iniciativa do ilustre Deputado Sr. Constâncio de Oliveira, em que passa para a povoação de Malveira a sede da freguesia de Alcainça.
As razões que justificam o referido projecto, acham-se muito bem aduzidas no relatório que o precede, e, por isso, desnecessário se torna a sua repetição, pois a vossa comissão faz suas as aludidas razões.
Nêstes termos, é de parecer que, o referido projecto, merece a vossa aprovação.
Sala das Sessões, Junho de 1922. — Abílio Marçal—Pedro de Castro — Alberto Vidal — Pedro Pita (com declarações)— João Vitorino Mealha, relator.
Projecto de lei n.° 46-F
Senhores Deputados. — Uma das freguesias do concelho de Mafra tem a sua sede em Alcainça.
Isto, porém, apenas se justifica pela existência dum cemitério nessa povoação, porquanto a sede da Junta da Freguesia o a residência do regedor se encontram numa povoação próxima, denominada Malveira.
É que esta povoação, pelo número dos seus fogos e pelo seu movimento comercial, goza duma importância que não tem Alcainça, devido principalmente ao número restrito dos seus habitantes.
São, pois, indiscutíveis as razões que podem ser aduzidas para justificar que a freguesia que tem a sua sede em Alcainça, e desta povoação tem o nome, passe a denominar-se da Malveira e tenha aqui a sua sede.
Por isso tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:
N
Artigo 1.° A freguesia de Alcainça, concelho de Mafra, passa a denominar-se da Malveira e terá a sua sede nesta povoação.
Art. 2.° E revogada a legislação em contrário.
Lisboa, 6 de Abril de 1922. — O Deputado, Constâncio de Oliveira.
Como ninguém peça a palavra, é posta à votação sendo aprovada.

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Sessão de 18 de Maio de 1923
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 85, criando a freguesia da Lomba do Loução.
Lê-se. E o seguinte:
Projecto de lei n.° 85
Senhores Senadores. — Os habitantes das Lombas do Loução e do Alcaide, da freguesia da Povoação, concelho dó mesmo nome, distrito de Ponta Delgada, vêm alimentando de há muito uma aspiração bem justa: a de se constituírem em freguesia, nos termos do artigo 5.° da lei n.° 621, de 23 de Junho de 1916.
A comissão executiva da câmara municipal daquele concelho, compreendendo a necessidade de se desanexarem da freguesia da Povoação as duas referidas Lombas, para com elas se formar uma nova freguesia, e procurando interpretar o sentimento dos seus respectivos moradores, reclamou, ela própria, do Poder Legislativo a criação da pretendida freguesia, que se denominará —freguesia da Lomba do Loução— com sede nêste lugar, e será constituída pelas áreas e povoados das duas Lombas do Loução e do Alcaide— nitidamente extremadas e distintas das demais Lombas que fazem e ficam fazendo parte da freguesia da Povoação.
Cumpriram-se todas as formalidades que são exigidas pela lei n.° 621, de 23 de Junho de 1916, como consta dos documentos que acompanham a representação da Câmara Municipal do concelho da Povoação e que para todos os efeitos são considerados parte integrante dêste relatório.
Vê-se que o referendum a que se procedeu produziu resultados satisfatórios à pretensão reclamada: que tanto a nova freguesia, como a da Povoação donde aquela se desentranhará, ficam a dispôr dos meios necessários e indispensáveis; para fazerem face aos respectivos encargos, e que o número de habitantes da nova e da velha freguesia é muito superior ao mínimo fixado na citado lei n.° 621.
Assim, afigura-se-nos, de todo o ponto, legal e consequentemente merecedor da vossa aprovação o seguinte projecto do lei:
Artigo 1.° São desanexadas da freguesia da Povoação, concelho do mesmo nome, do distrito de Ponta Delgada as Lombas do Loução e do Alcaide, com as quais
se constituirá uma nova freguesia, que se denominará freguesia da Lomba do Loução, com sede nêste lugar.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões do Senado, 16 de Maio de 1922. — Rodrigo Guerra Álvares Cabral—António de Medeiros Franco.
Senhores Senadores. — A vossa comissão de administração pública, apreciando q projecto de lei da iniciativa dos Srs. Álvares Cabral e Medeiros Franco, n.° 85, e tendo presentes as disposições dos artigos 3.° e 1.°, da lei n.° 621, de 23 de Junho de 1916, à qual aquela faz referência expressa, e analisando a documentação que acompanha o aludido projecto, nada encontra que satisfaça aos preceitos dos n.os 3.° o 4.° do artigo 1.°, como não encontra entre êles a demonstração de que a nova freguesia fica constituída pelo menos com 800 habitantes.
Nêstes termos parece à vossa comissão do administração pública que, emquanto não fôr satisfeito plenamente ao exigido pelas aludidas disposições da lei n.° 621, não deverá nem poderá ser considerado o aludido projecto de lei n.° 85.
Sala das sessões da comissão do administração pública, 20 de Junho de 1922. — Augusto Monteiro (com declarações) — Joaquim Pereira Gil (com declarações) — Godinho do Amaral (com declarações) — Ricardo Pais Gomes, relator.
Pertenço ao n.° 85
Senhores Senadores. — A chamada orgânica administrativa, bem que constitucionalmente dependente da apreciação e aprovação do Congresso da República, obedece a certos e determinados requisitos legais preestabelecidos.
A essa exigência satisfaz cumpridamente a documentação que instrui êste projecto.
Quere dizer: já não há agora motivo para as dúvidas que informavam o primeiro parecer desta comissão.
Tudo corrente e em forma legal; e tudo no sentido da procedência do projecto, ou seja da criação da freguesia da Lomba do Loução, com sede no mesmo lugar dêste nome, e nos termos do articulado.
Sala da comissão de administração pública do Senado, 7 de Fevereiro de

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Diário das Sessões do Senado
1923. — Alfredo Portugal — Joaquim Pereira Gil — José Joaquim Pereira Osório — Ricardo Pais Gomes — Godinho do Amaral — José Machado de Serpa, relator.
Como ninguém peça a palavra é pôsto à votação sendo aprovado.
A pedido do Sr. Medeiros Franco, é dispensada a última redacção.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, a proposta de lei n.° 31, sôbre mercadorias da carga dos pavios ex-alemães.
Lê-se. E a seguinte:
Proposta de lei n.° 31
Artigo 1.° Decorridos que sejam três anos sôbre a data de 2 de Abril de 1921, e não havendo reclamações de terceiros, consideram-se canceladas, sem necessidade de renovação, as fianças que foram prestadas nas alfândegas, conforme as ordens de entrega de mercadorias da carga dos navios ex-alemães, passadas pela Procuradoria da República, e, portanto, desobrigados os respectivos interessados das responsabilidades correspondentes.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 16 de Agosto de 1921. — Jorge de Vasconcelos Nunes — António Marques das Neves Mantas.
Última redacção
Artigo 1.° Decorridos que sejam três anos sôbre a data de 2 de Abril de 1921, e não havendo reclamações de terceiros, consideram-se canceladas, sem necessidade de renovação, as fianças que foram prestadas nas alfândegas, conforme as ordens de entrega de mercadorias da carga dos navios ex-alemães, passadas pela Procuradoria da República, e, portanto, desobrigados os respectivos interessados das responsabilidades correspondentes.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da comissão de redacção, 12 de Janeiro de 1923. — João Manuel Pessanha Vaz das Neves — Joaquim Pereira Gil de Matos — António de Medeiros Franco — António Gomes de Sousa Varela — Abílio Soeiro.
N.º 8. — Proposta de lei. — Senhores Deputados. —De há muito vai decorrido um ano sôbre a ratificação pelo Congresso da República do Tratado de Paz e protocolo anexo, assinados em Versalhes em 28 de Junho de 1919.
Portal motivo ficaram desobrigadas as entidades interessadas das garantias que asseguravam compromissos relativos à carga dos navios ex-alemães capturados nos portos do continente da República e ilhas adjacentes, nos termos dos decretos n.° 3:246, de 13 de Julho de 1917, e n.° 5:334, de 22 de Março de 1919, subsistindo, porém, ainda, por se não encontrarem compreendidas nos decretos supracitados, as fianças fixadas nas ordens de entrega passadas pela Procuradoria da República junto da Relação de Lisboa, visto as responsabilidades das mercadorias respectivas não haverem sido garantidas por certificados das legações dos países dos donos das mesmas.
Segundo parecer votado por unanimidade em conferência da Procuradoria Geral da República, à validade e extinção de tais fianças é sòmente aplicável o disposto na legislação civil (Código Civil, (artigo 848.° e seguintes) emquanto por diploma legal bastante se não determine outra causa ou fixe prazo.
Considerando, portanto, que, se por um lado convém, acautelando os interêsses do Estado, dilatar o período de validade dessas fianças, por outro seria injusto, visto tratar-se de circunstâncias excepcionais, o prolongamento das mesmas nos termos do Código Civil, tenho a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Decorridos que sejam três anos sôbre a data de 2 de Abril de 1921. e não havendo reclamações de terceiros, consideram-se canceladas as fianças que foram prestadas nas alfândegas, conformo as ordens de entrega de mercadorias da carga dos navios ex-alemães, passadas pela Procuradoria da República, e, portanto, desabrigados os respectivos interessados das responsabilidades correspondentes.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 16 de Agosto de 1921. O Mi-

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nistro das Finanças, T. J. Barros Queiroz.
Está conforme. — Direcção Geral da Secretaria do Congresso da República, 16 de Agosto de 1921. — O Director Geral, Francisco José Pereira.
Como ninguém peça a palavra é posta à votação sendo aprovada.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.º 267, concedendo uma autorização ao Govêrno relativamente ao cais de Angra do Heroísmo.
Lê-se. E o seguinte:
Projecto de lei n.° 267
Senhores Senadores. — Há longos meses que os povos da Ilha Terceira pretendem um pôrto de abrigo na baía de Angra, sem que, até hoje, tivesse sido atendida tam justa aspiração.
Em 1642, Francisco de Ornelas da Câmara, o herói da Restauração da Ilha Terceira, solicitou de D. João IV um molhe de abrigo para Angra, frisando que a navegação que de contínuo se fazia para o Brasil e índias, com escala pelos Açôres, carecia dum pôrto que oferecesse segurança para ali serem reparadas quaisquer avarias ou os navios escaparem às tempestades bastante frequentes naquelas águas.
Procedeu-se aos estudos e à elaboração do orçamento, mas nenhuma solução deu D. João IV à pretensão do povo terceirense.
Decorridos anos, em 1805, o conde de S. Lourenço, capitão-general dos Açôres, tentou também a construção duma doca no pôrto de Angra, enviando ao respectivo Ministro o projecto que, por sua iniciativa, fôra elaborado.
Não foi atendida tal proposta!
Durante o govêrno de José Silvestre Ribeiro e a seu pedido, a Câmara Municipal de Angra representou sôbre a necessidade de ser construído um molhe de abrigo, secundando a sua representação em 1846.
Baldadas foram as tentativas, porque nada se fez!
Em 1915, sendo eu governador civil de Angra do Heroísmo, promovi junto do respectivo Ministério que procedesse
ao estudo, projecto e orçamento do prolongamento do cais do Pôrto das Pipas, por forma a ficar acostável e de abrigo para as embarcações que entrassem naquele pôrto.
Foram ordenados e executados os estudos e orçamento, continuando, porém, até hoje, deserto o pôrto de Angra, onde, não há ainda muitos anos, a navegação era superior à das outras ilhas do arquipélago açoreano.
Pois são os elementos que se encontram registados nos arquivos e anais da vida do povo terceiriense e que demonstram claramente a falta de atenção e carinho que tem havido, desde longa data para esta pretensão.
a vossa esclarecida atenção, Srs. Senadores, pretendo apresentar ainda algumas ponderações que justifiquem a necessidade da efectivação de tam importante melhoramento:
O pôrto de Angra do Heroísmo, completamente exposto aos ventos e grandes temporais de sul e sueste, não oferece segurança às embarcações de qualquer lotação, sendo apenas procurado por aqueles que, em viagens regulares, ali vão efectuar as suas operações de cargas e descargas, embarque e desembarque do passageiros.
E frequente alguns navios sofrerem avarias perto das costas da Terceira, que lhes presta imediatamente os primeiros socorros, não podendo, contudo, recebê-los no seu pôrto por insuficiência das suas condições de abrigo.
E, assim, a falta de navegação tem obstado, até certo ponto, a que se desenvolvam alguns ramos de comêrcio e indústria, não deixando progredir um povo que tem faculdades de aptidão e de trabalho apreciáveis e que devidamente utilizadas contribuiriam, com importantes iniciativas, para a riqueza do país.
Melhor sorte tiveram as ilhas de S. Miguel e Faial, que nos seus portos artificiais recebem toda a navegação que escala os Açôres, nas suas viagens de longo curso, e ainda os navios que, por qualquer acidente no decorrer dessas viagens, são forçados a procurar pôrto de abrigo.
Mas o povo da Ilha Terceira ponde- ' rando bem as circunstâncias difíceis do Estado e o custo das obras, designada-

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mente as hidráulicas, não pensa — nem podia pensar — hoje, em ter um molhe na baía da sua cidade.
Eu mesmo não seria seu intérprete para um empreendimento dessa natureza, talvez irrealizável no presente momento, e que acarretaria para o Tesouro um pesado encargo que os seus actuais recursos não comportariam.
O que se pretende, por direito e por justiça, é o prolongamento de um dos cais (Alfândega ou Pôrto das Pipas) por forma a quaisquer embarcações poderem efectuar ali, com segurança, as suas operações, sendo também recolhidas aquelas que, por quaisquer circunstâncias, não possam seguir a rota da sua viagem.
E, porque se acha já elaborado o projecto nêste sentido, sendo necessário apenas actualizar o respectivo orçamento, eu venho apelar para o Congresso da República, a fim de que atendida seja esta pretensão, e assim tenho a honra de apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Fica o Govêrno autorizado a mandar proceder à revisão do projecto e à actualização do respectivo orçamento referente ao prolongamento de um dos cais da baía de Angra do Heroísmo, na Ilha Terceira, por forma a ficar um molhe acostável e de abrigo para embarcações que entrem naquele pôrto.
Art. 2.° As câmaras municipais da Ilha Terceira poderão lançar quaisquer impostos especiais sôbre a importação de mercadorias, exclusivamente destinados à realização das obras do pôrto do Angra do Heroísmo, devendo as respectivas importâncias ser entregues na Agência do Banco de Portugal com a necessária designação.
Art. 3.° O Govêrno poderá também fixar taxas para os navios que efectuarem operações no aludido pôrto ou criar um adicional ao imposto do comércio marítimo, já estabelecido.
Art. 4.° No orçamento do Ministério do Comércio e Comunicações se inscreverá a verba necessária para ocorrer às despesas com a construção do molhe-cais de abrigo a que se refere o artigo 1.°
Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrário.
Senado, 18 de Agosto de 1922. — Joaquim Teixeira da Silva.
Senhores Senadores. — O projecto de lei n.° 267, da autoria do Sr. Teixeira da Silva, tende a efectivar obras que já deviam ter sido realizadas e até mesmo ultimadas, a bem dos interêsses não só do Estado, como da rica região açoreana de Angra do Heroísmo.
Por tal motivo merece louvor a iniciativa traduzida na elaboração do presente projecto de lei.
Entende, porém, a vossa comissão de obras públicas que a execução da matéria constante do artigo 1.° do projecto de lei n.° 267 pertence ao Poder Executivo, além de que o texto exarado nos artigos 2.° e 3 0 não pode ser da iniciativa desta casa do Parlamento, como o estabelece a Constituïção Política da República Portuguesa.
Pelo exposto, entende a vossa comissão de obras públicas que o presente projecto de lei não pode ser submetido à apreciação do Senado.
Sala das Sessões, 2 do Setembro de 1922. — Herculano Jorge Galhardo — Afonso de Lemos — Vicente fiamos — Santos Garcia, relator.
É rejeitado na generalidade.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 362, fixando o número de assembleas eleitorais no concelho de Felgueiras.
Lê-se. É o seguinte:
Projecto de lei n.° 362
Artigo 1.° As assembleas primárias eleitorais do concelho de Felgueiras, do círculo n.° 10 (distrito do Pôrto), serão em número de cinco, com a sua sede respectivamente em as freguesias de Airães, Margaride, Vila Cova, Sousa e Penacova.
Art. 2.° A assemblea primária de Airães será constituída pelas seguintes freguesias:
Airães, Vila Verde, Refontoura, Aião, Pedreira, Lordelo e Santão.
A assemblea primária de Margaride, pelas de:
Margaride, Sendim, Jugueiros, Várzea, Varziela e Pombeiro.
A assemblea primária de Vila Cova, pelas de:
Vila Cova, Macieira, Pinheiro, Moure, Borba, Caramos e Friande.

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Sessão de 18 de Maio de 1923
A assemblea primária de Sousa, pelas de:
Sousa, Idães, Sernande, Rande, Unhão, Ravinhade e Torrados.
A assemblea primária de Penacova, pelas de:
Penacova, Santo Adrião de Vizela, Regilde, Vila Fria, Lagares e S. Jorge de Vizela.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 29 de Janeiro de 1923. — Alfredo Ernesto de Sá Cardoso — Baltasar de Almeida Teixeira — João de Ornelas da Silva.
Senhores Senadores. — A proposta de lei n.° 362, vinda da Câmara dos Deputados, tem por fim dividir o concelho de Felgueiras em cinco assembleas eleitorais, a fim de que os eleitores, por uma cómoda divisão, possam mais fàcilmente concorrer às urnas e exercer o seu direito de voto.
A nova constituïção das assembleas eleitorais facilita a propaganda e fiscalização eleitoral naquele concelho, estando de harmonia com as disposições do artigo 47.° da lei n.° 3, de 3 de Julho de 1913.
Por isso a vossa comissão de legislação e administração pública é de parecer que a proposta merece ser aprovada tal qual está.
Sala das sessões da comissão, 22 de Fevereiro de 1923. — Ricardo Pais Gomes — Alfredo Portugal — João Catanho de Meneses — José Joaquim Pereira Osório — José Machado de Serpa — Godinho do Amaral — António de Medeiros Franco— Joaquim Pereira Gil, relator.
Última redacção
Artigo 1.° As assembleas primárias eleitorais do concelho de Felgueiras, do círculo n.° 10 (distrito do Pôrto), serão em número de cinco, com a sua sede respectivamente nas freguesias de Airães, Margaride, Vila Cova, Sousa e Penacova.
Art. 2.° A assemblea primária de Airães será constituída pelas seguintes freguesias:
Airães, Vila Verde, Refontoura, Alão, Pedreira, Lordelo e Santão.
A assemblea primária de Margaride., pelas de:
Margaride, Sendim, Jugueiros, Várzea, Varziela e Pombeiro.
A assemblea primária de Vila Cova, pelas de:
Vila Cova, Macieira, Pinheiro, Moure, Borba, Caramos e Friande.
A assemblea primária de Sousa, pelas de:
Sousa, Idães, Sernande, Rande, Unhão, Ravinhade e Torrados.
A assemblea primária de Penacova, pelas de:
Penacova, Santo Adrião de Vizela, Regilde, Vila Fria, Lagares e S. Jorge de Vizela.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da comissão, 9 de Março de 1923. — João Manuel Pessanha Vaz das Neves — Joaquim Pereira Gil de Matos — António de Medeiros Franco — António Gomes de Sousa Varela — Abílio Soeiro.
Parecer n.° 176
Senhores Deputados. — A vossa comissão de administração pública foi presente o projecto de lei n.° 84-C, da iniciativa do Sr. Deputado Alberto Cruz, destinado a alterar a constituïção das assembleas primárias do concelho de Felgueiras.
Sendo certo que as divisões eleitorais devem atender à comodidade dos povos, a fim de que êles possam com maior facilidade concorrer às urnas e exercer o seu direito de eleitores e justificando-se plenamente o referido projecto, pelo seu relatório, esta comissão é de parecer que merece a vossa aprovação.
Sala das sessões da comissão de administração pública, 8 de Julho de 1922. — Abílio Marçal— Vitorino Mealha — Pedro de Castro — Alberto Vidal — Custódio de Paiva, relator.
Senhores Deputados. — A vossa comissão de legislação civil e comercial examinou o projecto de lei n.° 84-C, que cria uma nova divisão das assembleas eleitorais do concelho de Felgueiras e, atendendo às razões expostas no relatório que o precede e à circunstância de ficar cada uma das novas assembleas com mais de 150 eleitores, é de parecer que merece a vossa aprovação.
Sala das sessões da comissão de legislação civil e comercial, 8 de Agosto de 1922. — Feliz Barreira — Pedro Pita (ven-

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cido) — António Dias—José de Oliveira da Costa Gonçalves — Adolfo Coutinho.
Projecto de lei n.° 84-C
Senhores Deputados. — Por toda a parte se nota que as dificuldades de comunicações o a má disposição ou distribuïção das assembleas primárias eleitorais faz com que o eleitorado republicano se afaste das urnas, deixando de exercer um direito o um dever absolutamente essencial à vida da nação e da República.
Acresce também que, combinada pelos antigos caciques monárquicos, que abusivamente dominavam a opinião pública, há no concelho de Felgueiras, do círculo n.° 10 (Penafiel), ainda uma organização eleitoral que não sòmente prejudica a acção republicana naquele concelho, mas também impede que êsses antigos feudos, contrários ao regime republicano, sejam atingidos pela eficaz propaganda republicana e por uma fiscalização dos actos eleitorais que os tornem compatíveis com a liberdade política, que a República marca pelas suas leis e pelos seus princípios.
Para modificar êste estado de cousas, apresentamos o seguinte projecto de lei, com o qual se intenta a extinção desta situação anómala da política local, facilitando também o acesso às urnas do verdadeiro povo republicano, colocando as assembleas primarias nos lugares e freguesias mais centrais, e favorecendo em todas elas a fiscalização dos actos eleitorais pelos eleitores de todas as opiniões políticas.
Projecto de lei
Artigo 1.° As assembleas primárias eleitorais do concelho de Felgueiras, do círculo n.º 10 (distrito do Pôrto), serão em número de cinco, com a sua sede respectivamente em as freguesias de Airães, Margaride, Vila Cova, Sousa e Penacova.
Art. 2.° A assemblea primária de Airães será constituída pelas seguintes freguesias:
Airães, Vila Verde, Refontoura, Aião, Pedreira, Lordelo e Santão.
A assemblea primária de Margaride pelas de:
Margaride, Sendim, Jugueiros, Várzea, Varziela e Pombeiro.
A assemblea primária de Vila Cova pelas de:
Vila Cova, Macieira, Pinheiro, Moure, Borba, Caramos e Friande.
A assemblea primária de Sousa pelas do:
Sousa, Idães, Sernande, Rande, Unhão e Ravinhade.
A assemblea primária de Penacova pelas de:
Penacova, Santo Adrião do Vizela, Regilde, Vila Fria, Lagares e S. Jorge do Vizela.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Lisboa, 11 de Maio de 1922. — Alberto Cruz.
Como ninguém peça a palavra é pôsto à votação sendo aprovado, tanto na generalidade como na especialidade.
A pedido do Sr. Pereira Gil, ê dispensada a última redacção.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, a proposta de lei n.° 351, concedendo a reforma a um sargento.
Lê-se. É a seguinte:
Proposta de lei n.° 351
Artigo 1.° E concedida a reforma, no pôsto de aspirante a oficial, ao primeiro sargento n.° 1:750 da 7.ª companhia de reformados, Francisco Guimarães Fisher.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 18 de Janeiro de 1923. — Alfredo Ernesto de Sá Cardoso — Baltasar de Almeida Teixeira—João de Ornelas da Silva.
Senhores Senadores. — A comissão técnica de guerra e marinha, tendo examinado os pareceres das comissões de guerra e finanças da Câmara dos Deputados, especialmente o parecer da comissão do guerra, de Maio de 1921, que acompanham a proposta de lei n.° 351 e tendo ponderado a justiça dessa proposta, é do parecer que ela merece a vossa aprovação.
Sala das sessões, Março de 1922. — Artur Octávio Rêgo Chagas — Aníbal A. Ramos de Miranda — João Carlos da Costa — J. Mendes dos Reis (com declarações) —Raimundo Meira, relator.

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Senhores Senadores. — A vossa comissão de finanças tem apenas a informar que a melhoria de reforma, resultante da aprovação da proposta de lei n.° 351, trará para o Estado o pequeno encargo de trinta escudos mensais, aproximadamente.
Sala das sessões da comissão de finanças, 17 do Abril de 1923. — Herculano Jorge Galhardo — Francisco de Sales Ramos da Costa — António Medeiros Franco— Luís Augusto de Aragão e Brito — Francisco António Ferreira de Simas — César Justino de Lima Alves — J. Mendes dos Reis, relator.
Parecer n.° 158
Senhores Deputados. — A vossa comissão de guerra, tendo estudado o processo referente ao primeiro sargento da 7.ª companhia de reformados, Francisco Guimarães Fisher, e o parecer que sôbre êle formulou a comissão de guerra da sessão legislativa de 1921, plenamente concorda com tal parecer e respectivo projecto de lei, que faz seus, e tem a honra de submeter à vossa apreciação.
Sala da comissão, 23 de Junho de 1922. — João E. Águas — Leio Portela — F. C. Rêgo Chaves — Amaro Garcia Loureiro — António de Mendonça — Albino Pinto da Fonseca — Fernando Freiria, relator.
Senhores Deputados. — A vossa comissão de finanças apreciando o projecto de lei n.° 158 da comissão de guerra e tendo em consideração, pelos documentos que verificou, os trabalhos e esforços produzidos pelo requerente, Francisco Guimarães Fisher, no ataque a Monsanto e no norte contra os insurrectos monárquicos, dá-lhe o seu parecer favorável.
Sala das sessões da comissão de finanças, 29 de Junho de 1922. — F. Velhinho Correia — Alberto Xavier (com restrições) — Aníbal Lúcio de Azevedo — Queiroz Vaz Guedes — Mariano Martins — F. C. Rêgo Chaves — Carlos Pereira — Lourenço Correia Gomes, relator.
Senhores Deputados. — A vossa comissão do guerra foi presente o requerimento do primeiro sargento da 7.ª companhia de reformados, Francisco Guimarães Fisher,
em que pede melhoria de reforma, por se haver inutilizado quando cursava o último semestre do curso de artilharia de campanha da Escola Militar.
Julgando indispensável mais elementos do que aqueles que estão apensos ao requerimento, dirigiu-se a vossa comissão, oficialmente, à Escola Militar e por êste estabelecimento foram fornecidas as informações necessárias para poder conscienciosamente dar o seu parecer.
O requerente foi admitido à matrícula na Escola Militar, em 1918, no regime dos cursos reduzidos, devendo o seu curso, na arma de artilharia de campanha, durar dois semestres, pelo que findaria em 30 de Junho de 1919.
Foi sujeito à inspecção médica antes da matrícula, tendo sido julgado apto.
Pelos acontecimentos políticos produzidos no mês de Dezembro de 1918 foi interrompida a freqüência dos respectivos cursos militares, e assim, o primeiro semestre, que devia findar em 31 de Dezembro, continuou e entrou pelo decurso do ano de 1919 até o dia 30 de Junho.
Não menos influiu também para o caso a doença que grassou no país nos últimos meses de 1918.
Em Janeiro e Fevereiro do 1919 seguiu o requerente para Monsanto e para o norte do país, fazendo parto das colunas de artilharia, em defesa da República. Restabelecida esta, continuaram os cursos, tendo-se encerrado o 1.° semestre em 30 de Junho, ficando o peticionário com a classificação de 12 valores.
E iniciado o 2.° semestre em 1 de Julho, e o requerente, continuando a mostrar a sua aplicação ao estudo e à freqüência, conseguiu obter até o fim do 1.° trimestre, no grupo de aulas, 13 valores e nos demais trabalhos 11 valores. Por esta forma mantinha-se certamente na posição em que se colocara dentro do curso desde o seu início, não podendo restar dúvida em que obteria boa classificação final. Porém, começa a sentir-se impossibilitado de continuar, e uma grave doença se manifesta, até que em 16 de Outubro de 1919 a junta hospitalar de inspecção o julgou incapaz de todo o serviço.
Perdeu a sua carreira e perdeu o exército um futuro oficial de artilharia, e a República um seu dedicado defensor. Foram os serviços a ela prestados em Janeiro

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e Fevereiro de 1919, que produziram a eclosão do terrível mal que o incapacitou.
Reconheceu-o a junta de saúde, reconheceu-o a repartição competente, porque lhe concedeu a reforma por impossibilidade adquirida por motivo de serviço. Deu-lhe o Estado aquilo a que qualquer militar tem direito. Não lhe deu, porém, aquilo a que êste tinha iodo o direito.
Se não fôsse a interrupção do seu curso, pelas razões expostas, e todas elas independentes da sua vontade, teria o requerente terminado o seu curso em 30 de Junho de 1919, e assim, sendo, como era e é de lei, logo promovido a aspirante a oficial, o julgamento da junta de inspecção alcançá-lo-ia no pôsto de alferes, ou, pelo menos, no de aspirante.
Teria sido reformado em qualquer dêstes postos, e não no de primeiro sargento, que era o que possuía em Outubro dêsse ano.
A sua aplicação ao estudo, constatada dela sua freqüência no 1.° semestre e pelas provas produzidas no 2.° semestre, leva-nos a aceitar o critério de que pode ser atendido no seu justo pedido, pois que, se não fôra a violência dos serviços que prestou %m Monsanto e no norte, não teria sido cortada a sua carreira militar.
Nêstes termos, a vossa comissão de guerra apresenta-vos o seguinte projecto de lei, pelo qual se melhora a situação de reforma, dando-lhe o pôsto a que se julga com direito:
Artigo 1.° E concedida a reforma, no pôsto de aspirante a oficial, ao primeiro sargento n.° 1:750 da 7.ª companhia de reformados, Francisco Guimarães Fisher.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das comissões, Maio de 1921. — João Pereira Bastos — Júlio Cruz— Viriato Fonseca — José Rodrigues Braga — Américo Olavo — João E. Aguas.
Ex.mo Sr. Presidente da Câmara dos Srs. Deputados da Nação. — Francisco Guimarães Fisher, primeiro sargento n.° 1:750 da 7.ª companhia de reformados, sendo aluno da Escola Militar, onde tinha o n.° 187, e cursava o 2.° semestre do curso de artilharia de campanha, foi reformado no pôsto de primeiro sargento, por doença adquirida em serviço, a qual o impossibilita de angariar meios de subsistência.
Parecendo-lhe de justiça, pelos motivos em seguida apresentados, que lhe seja conferida a reforma no pôsto de aspirante a oficial, assim o requere a V. Ex.ª
Alega o requerente:
1.° Ter frequentado com aproveitamento o 2.° semestre do curso de artilharia de campanha, até a data em que foi julgado incapaz do serviço (16 de Outubro de 1919), faltando-lhe apenas pouco mais de dois meses para completar o referido curso. (Documento n.° 1).
2.° Dever ter completado o curso em Junho de 1919, isto é, antes de ser julgado incapaz do serviço, se não fôssem os acontecimentos políticos que se deram, e, portanto, por um motivo estranho à sua vontade.
3.° Ter prestado serviços à República por ocasião da insurreição monárquica, não só em Monsanto (documento n.° 2), como no norte (documento n.° 3), o que contribuiu para o agravamento da doença, pela qual foi julgado incapaz do serviço.
Pede deferimento.
Vendas Novas, 7 de Fevereiro de 1920. — Francisco Guimarães Fisher.
Como ninguém peça a palavra, é posta à votação sendo aprovada.
A pedido do Sr. Pereira Osório, é dispensada a última redacção.
O Sr. Pereira Osório: — Requeiro a V. Ex.ª que consulte o Senado sôbre se permite que entre desde já em discussão o projecto de lei n.° 225 que está na ordem do dia, relativo à cedência do bronze para o busto de Antero de Quental.
É aprovado êste requerimento.
O projecto é o seguinte:
Projecto de lei n.° 225
Senhores Senadores. — Na, cidade de Ponta Delgada, terra natal do grande poeta Antero de Quental vai erigir-se, para eterna glorificação da sua memória augusta, um monumento, com uma estátua de bronze, que fique afirmando através dos tempos, entre as espumas domar e o verde-negro das serras, a homenagem dum povo que teve e tem naquele inigualável génio e naquele amoroso san-

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to o mais subido título de desvanecimento e do orgulho.
A estátua em bronze do poeta-filósofo erguida na própria cidade que lhe foi berço e túmulo, será para todos os devotos do sou nome de glória, o livro aberto das imarcecíveis virtudes que iluminaram a sua vida cheia de bondade e o seu coração repassado de tortura, o para as futuras gerações, uma fonte prenhe do amor e do luz, aonde, cada dia, elas irão beber os morais ensinamentos do seu espírito de eleito e as doces claridades da sua alma de puro.
Não deverá o Estado associar-se a esta homenagem?
Cremos que sim.
Justificar o seu acolhimento seria deminuir o valor da sua espontaneidade.
Não é, pois, sem uma comoção profunda que eu tenho a honra de apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° E autorizado o Govêrno, pelo Arsenal do Exército, a ceder gratutïamente o bronze e ordenar a fundição, nas respectivas oficinas do Estado, da estátua do grande poeta Antero de Quental, a erigir em Ponta Delgada, sua terra natal, segundo o projecto da comissão organizada para tal fim naquela cidade.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões do Senado, 28 de Julho de 1922. — António de Medeiros Franco— Rodrigo Guerra Álvares Cabral.
Senhores Senadores. — Todos os projectos desta natureza, e não são êles tam poucos, têm tido sempre parecer favorável desta comissão.
Ainda há pouco foi votado o do saudoso Dr. António Granjo e êste, pela qualidade do seu apresentante que moldura o seu relatório com expressões de lirismo pelo autor dos sonetos e de tantas obras que nós lemos, vem perpetuar o conhecimento do poeta ilustro que teve o seu nascimento na linda cidade de Ponta Delgada.
Antero de Quental não foi só um grande vulto na literatura, foi também um grande valor moral numa sociedade doentia.
A sua vida cheia de fé e de idealismo merece bem toda a nossa admiração e toda a nossa ternura.
O Parlamento aprovando êste projecto dignifica-se porque glorifica um grande poeta.
Sala das sessões da comissão, 8 de Março de 1923. — José Joaquim Pereira Osório — António de Medeiros Franco — Joaquim Pereira Gil — Godinho do Amaral.
Lê-se e entra em discussão.
Como ninguém peça a palavra è pôsto a votação sendo aprovado.
A pedido do Sr. Medeiros Franco é dispensada a última redacção.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 374.
O Sr. João Carlos da Costa: — Requeiro que seja retirado da discussão êste projecto de lei, em vista de não estar presente o seu autor o Sr. Anacleto da Silva.
É aprovado êste requerimento.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 387, elevando à categoria de vilas duas aldeias.
Lê-se. E o seguinte:
Projecto de lei n.° 387
Senhores Senadores: — As povoações de S. Miguel de Machede e de Sr. Manços, pertencentes ao concelho de Évora, hoje com a categoria administrativa de aldeias, são actualmente centros de grande importância.
Encarada essa importância debaixo do ponto de vista agrícola, justo é declará-lo que é ela de uma manifesta evidência, já pelos centros de lavoura que desenvolvem uma acção meritória a dentro da indústria agrícola e competentemente concorrem para o bem geral económico do país, já pelo número bastante elevado de agricultores que directamente exploram a terra, em parçaria e em arrendamentos a curto e a longo prazo.
Pelo que respeita ao seu desenvolvimento geral, extraordinário tem sido o esfôrço dessas pequenas localidades, porquanto, inteiramente desagregadas do Estado e muito particularmente do próprio município eborense, todavia pela iniciativa dos seus habitantes, proprietários uns, e pequenos agricultores outros, elas têm

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sabido impôr-se, seja pelo respeitante ao seu desenvolvimento industrial, comercial e até instrutivo, seja pelo referente ao número de eleitores que hoje possuem.
,;Não será pois de justiça conceder a essas localidades a designação que lhe deve competir, em face dessa sua importância, devido ao esfôrço dos seus habitantes?
Parece-nos que sim, e nessa ordem de ideas ousamos submeter à apreciação do Senado o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° As aldeias de S. Manços e de S. Miguel de Machede, do concelho de Évora, passam a denominar-se vilas de S. Manços e de S. Miguel de Machede.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, 2 de Março de 1923. — Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Senhores Senadores. — A segunda comissão de legislação nada tem a opor ao presente projecto de lei, visto que não envolve matéria de direito administrativo.
Sala das sessões da comissão, 17 de Abril de 1923. — J. Catanho de Meneses— Joaquim Pereira Gil — Godinho do Amaral — Alfredo Portugal — Medeiros Franco.
Como ninguém peça a palavra é pôsto a votação sendo aprovado.
A pedido do Sr. Francisco Paula é dispensada a última redacção.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 590, criando a freguesia de Gagos.
Lê-se. E o seguinte:
Projecto de lei n.° 390
Senhores Senadores. — A antiquíssima vila do Jarmelo, concelho e distrito da Guarda, teve outrora uma importância considerável. Porém, com o decorrer dos tempos perdeu muita daquela importância, apesar de se achar situada numa região agrícola ainda hoje afamada pelas suas indústrias de lacticínios e criação de gados. Sam conhecidas no País e até no estrangeiro as famosas vacas e cabras do Jarmelo, que constituem a base dos importantíssimos mercados mensais e feiras anuais, que se realizam na povoação dos Gagos, e a que concorrem os povos do alto distrito. Isso todavia não é suficiente para fazer consideràvelmente as duas freguesias de S. Pedro e S. Miguel, que actualmente abrangem a região da antiga vila do Jarmelo, visto que sendo composta de muitas povoações e tendo uma área relativamente grande, dificilmente podem ser administradas pelas respectivas juntas de freguesia.
Além disto, desde muitos anos tem existido uma certa emulação ou rivalidade entra as duas povoações que compõem os duas freguesias, e essa rivalidade tem por vezes explodido, digo, causado lutas entre os povos, principalmente por ocasião de eleições da junta da freguesia. Sucede até que uma parte da freguesia apresenta ao sufrágio uma lista que quando vitoriosa dá uma junta que se considera como representante da parte da freguesia que a elegeu.
Urge pôr cobro a esta situação, que não convém a uns nem a outros. Povos irmãos, como tais devem viver e para isso nada melhor do que colocá-los em situação igual.
Pretendem as povoações de Gagos, Almeidinha, e Quintas da Granja e da Pereira, da freguesia de S. Pedro, e Monteiros, da freguesia de S. Miguel, separar-se das suas antigas freguesias e constituir uma nova circunscrição administrativa com sede nos Gagos. Os eleitores, na sua quási totalidade o desejam, como se vê das actas do referendum que vão juntas. E legítima a aspiração, dando-se até o caso de as antigas freguesias, pelos seus representantes, concordarem com a criação da nova freguesia, como se vê do auto de demarcação que vai junto.
Sendo assim, nenhum inconveniente há, e antes toda a vantagem existe, em satisfazer o legítimo desejo dos referidos povos, que certamente viverão em completa paz e amizade com os seus vizinhos.
Nesta conformidade tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É criada uma nova freguesia com sede na povoação dos Gagos, concelho da Guarda, composta desta povoação e da de Almeidinha e Quintas da Granja e da Pereira, que até agora faziam parte da freguesia de S. Pedro, e da povoação de Monteiros, que fazia parte da freguesia de S. Miguel do Jarmelo.

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Art. 2.° A nova freguesia dos Gagos terá por limites: pelo lado do nascente os mesmos que actualmente separam os terrenos da povoação de Monteiros e a Quinta da Granja das freguesias da Castanheira, concelho da Guarda, e Pínzio, concelho de Pinhel; pelo lado do norte os mesmos limites que actualmente separam os terrenos da povoação de Almeidinha dos da freguesia da Ribeira dos Carinhos e povoação dos Lobatos, freguesia de S. Miguel; pelo lado do poente uma linha divisória que segue entre as povoações de Gagos, Devesa, Donfins e Urgueira, fixada por marcos a colocar: um junto do marco geodésico, outro sôbre a fonte da Alvandeira e outro ao centro do baldio do Picoto; e pelo lado do sul os mesmos limites que actualmente separam os terrenos da povoação de Monteiros dos das freguesias do Pousade, Rochoso e Castanheira, concelho da Guarda.
Art. 3.° São dissolvidas as Juntas das freguesias de S. Pedro o S. Miguel do Jarmelo, devendo ser feitas as eleições das Juntas destas freguesias e da dos Gagos, criada por esta lei, no prazo de sessenta dias.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões do Senado, 9 de Março de 1923. — O Senador pelo distrito da Guarda, Artur Costa.
Senhores Senadores. — A segunda comissão de administração pública dá o «eu parecer favorável ao projecto de lei n.° 390 da autoria do Sr. Artur Costa.
O processo está devidamente organizado com as certidões e mais documentos Indispensáveis para a sua criação, nos termos do artigo 3.° da lei n.° 621, de 23 de Junho de 1916, não tendo mais esta Câmara que cumprir o disposto no artigo 4.° da mesma lei, como sempre se tem feito em idênticos projectos.
Sala das sessões da comissão, em 18 de Abril de 1923. — Medeiros Franco — Alfredo Portugal — J. Catanho de Meneses — Joaquim Pereira Gil — Godinho do Amaral.
Como ninguém peça a palavra é pôsto à votação sendo aprovado, tanto na generalidade como na especialidade.
A pedido do Sr. Francisco Paula é dispensada a última redacção.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 203, regulando o funcionamento, do Instituto do Professorado Primário Oficial.
Lê-se. É o seguinte:
Projecto de lei n.° 203
Senhores Senadores. — Indispensável se torna o funcionamento do Instituto do Professorado Primário Oficial Português, determinando as funções que a parte principal do seu funcionalismo deve desempenhar.
Não traz o projecto de lei que tenho a honra de apresentar qualquer aumento de despesa nem invasão de funções de quem dirige superiormente a instrução, mas para a boa ordem e bom aproveitamento do Instituto parece-me indispensável.
Por tais razões tenho a honra de sujeitar à vossa douta apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° A directora do Instituto do Professorado Primário Oficial Português terá a seu cargo o ensino de Economia Doméstica Prática, a que se refere a alínea c) do artigo 23.° do decreto n.° 2:079, com todos os vencimentos de professora de ensino primário superior e mais regalias que possa vir a ter.
Art. 2.° A sub-directora do Instituto terá a seu cargo o ensino primário geral do mesmo Instituto, alínea a) do artigo 23.° do decreto n.° 2:079, com todos os vencimentos de professora do ensino primário geral e mais regalias que possa vir a ter. -
Art. 3.° O médico do mesmo Instituto desempenhará as funções de professor de Higiene e de Puericultura, com todos os vencimentos como médico escolar do ensino primário superior e mais regalias que possa vir a ter.
Art. 4.° Fica com autonomia administrativa o Instituto do Professorado Primário Oficial Português.
Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões do Senado, 28 de Julho de 1922. — Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Senhores Senadores. — A vossa comissão de instrução, tendo estudado o pro-

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jecto de lei n.° 203, tem a ponderar o seguinte:
O decreto n.° 2:079, de 24 de Novembro de 1915, legalizou e pôs sob a tutela do Estado o Instituto do Professorado Primário que tinha sido criado pela iniciativa da professora D. Amélia Luazes.
Foi por êsse decreto estabelecido no mesmo Instituto um curso primário geral, um curso primário superior e cursos de economia doméstica, puericultura, dactilografia, estenografia, corte, costura e bordados.
Mais tarde o decreto ditatorial n.° 4:463, de 23 de Junho de 1918, dava nova orientação ao Instituto, regulamentando êsse decreto, o n.° 5:278, de 21 de Março de 1919.
Ainda a lei n.° 1:243, de 11 de Março de 1922, vem modificar a organização do estabelecimento, anulando pura e simplesmente o ditatorial n.° 4:463, já referido, e mandando pôr em vigor como lei o n.° 2:079, isto é, o primitivo decreto orgânico.
Logo no mês seguinte, em 1 de Abril de 1922, o decreto n.° 8:086 manda anexar o curso primário superior à Escola Normal Primária de Lisboa, de modo* que estão actualmente em vigor, daquele decreto orgânico e na parte que se refere aos cursos professados, apenas o curso primário geral, os cursos de economia doméstica e puericultura e os cursos de dactilografia e estenografia, costura, bordados, corte e rendas.
Que se pretende agora com o novo projecto de lei?
Atribuir k directora do Instituto o ensino da economia doméstica; à subdirectora as classes do curso primário geral e a um médico, a que chama médico do Instituto, a regência da puericultura e higiene. Não indica, porém, quem regerá os cursos de dactilografia, estenografia, bordados, renda, corte e costura.
Não existe no decreto n.° 2:079, transformado em lei n.° 1:243, o lugar de módico escolar do estabelecimento, representando a sua criação expressamente para o ensino um aumento de despesa que à comissão parece desnecessário.
Se as alunas frequentam a Escola Normal têm nessa Escola a cadeira de higiene puericultura, o mesmo sucedendo se estiverem matriculadas nas escolas primárias superiores, onde existe a secção de técnica de economia doméstica e a cadeira de higiene.
Se frequentam os liceus ou as escolas industriais, um curso especial de higiene, puericultura e economia doméstica virá desequilibrar a organização pedagógica dos cursos professados nessas escolas, por constituir uma sobrecarga para as alunas que frequentam as mesmas escolas.
Nestas condições a vossa comissão de instrução não pode ser favorável ao projecto, tanto mais que se está tratando da reorganização do ensino.
Sala das Sessões, 23 de Fevereiro de
1922. — Francisco António de Paula — César Justino de Lima Alves — J. Dias de Andrade — A. M. da Silva Barreto — Frederico António Ferreira de Simas — J. Catanho de Meneses.
Senhores Senadores. — A vossa comissão de instrução, estudando convenientemente o projecto, verifica que êle representa uma remodelação das funções que primitivamente foram atribuídas ao Instituto do Professorado Primário Oficial Português.
Ora, tendo a vossa comissão deliberado confiar a uma sub-comissão composta de três dos seus membros o estudo das alterações a introduzir nos diversos serviços de instrução, decerto merecerá a sua atenção o referido Instituto do Professorado, que, de harmonia com o plano adoptado, será atendido nas suas justas reclamações.
Sala das Sessões, 21 de Fevereiro de
1923. — Frederico António Ferreira de Simas— A. M. da Silva Barreto — J. Catanho de Meneses — J. Dias de Andrade — Francisco de Paula.
O Sr. Ferreira de Simas: — Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para lembrar que do parecer que foi distribuído ao Senado, não consta o que a secção técnica de educação consultou a tal respeito.
O Sr. Presidente: — Êste projecto era dos antigos; não tinha que ir à Secção.
O Sr. Ferreira de Simas: — Mas devo dizer a V. Ex.ª que foi.

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O Sr. Presidente: — Efectivamente assim é e então vai ler-se a última redacção da Secção.
Lida na Mesa a última redacção da Secção, foi posta à discussão na generalidade, sendo rejeitada sem que sôbre ela nenhum Sr. Senador houvesse pedido a palavra.
O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão a proposta de lei n.° 397, relativa à exportação de livros editados em Portugal. Vai ler-se.
E a seguinte:
Proposta de lei n.° 397
Artigo 1.° Não está sujeita às restrições impostas no decreto n.° 8:439, de 21 de Outubro de 1922, a exportação para o estrangeiro de livros editados em Portugal.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 20 de Março de 1923. — Alfredo Ernesto de Sá Cardoso — Baltasar de Almeida Teixeira — João de Ornelas da Silva.
N.º 445. — Senhores Deputados. — Do exame da proposta de lei n.° 382-D, da iniciativa do Sr. Ministro das Finanças, resultou para a vossa comissão de comêrcio e indústria a opinião de que tal proposta merece ser aprovada, pelas razões que constam do seu relatório.
Sala das sessões da comissão de comércio e indústria, Março de 1923. — Sebastião de Herédia — F. G. Velhinho Correia — Aníbal Lúcio de Azevedo — Artur Brandão — Carlos Pereira, relator.
N.° 382-D. — Proposta de lei. — O convénio literário assinado entre as Repúblicas Portuguesa e dos Estados Unidos do Brasil, quando da triunfal viagem de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República a êste Estado, isentando de direitos alfandegários os livros portugueses, para facilitar-lhes a importação impõe gratamente da nossa parte o dever de sacrificar a economia do ouro resultante da aplicação do decreto n.° 8:439. de 21 de Outubro passado, em benefício do alto interêsse que representa uma maior comunhão espiritual entre as duas Pátrias irmãs. Presta-se ao mesmo tempo homenagem aos homens de letras que tanto contribuem
para o engrandecimento de Portugal e ao honrado esfôrço de divulgação da nossa indústria editora e não será, decerto, a desistência do diminuto valor das cambiais a obter pela exportação em pequenas remessas, de livros portugueses que influenciará na melhoria financeira a que visa aquele decreto, importando apenas não alargá-la a outras exportações.
Nêstes termos tenho a honra de apresentar à ponderação da digna Câmara a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Não está sujeita às restrições impostas no decreto n.° 8:439, de 21 de Outubro de 1922 a exportação para o estrangeiro de livros editados em Portugal.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário. — Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Está conforme. — Direcção Cerai da Secretaria do Congresso da República, 20 de Março de 1923. — O Director Geral, Abílio Soeiro.
Lida na Mesa a proposta, foi aprovada na generalidade e na especialidade sem discussão.
O Sr. Pereira Gil: — Requeiro dispensa da última redacção para a proposta que acaba de ser aprovada.
Consultado o Senado sôbre se dispensava a última redacção para a proposta, resolveu afirmativamente.
O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão a proposta de lei n.° 398. Vai ler-se.
É a seguinte:
Proposta de lei n.° 398
Artigo 1.° Para ser entregue ao Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, será enviado ao Ministério da Instrução Pública, Direcção Geral de Belas Artes, um exemplar de todas as publicações a que se referem o § único do artigo 8.° e artigo 9.° da lei de 28 de Outubro de 1910.
Art. 2.° Por cada transgressão do preceituado no artigo anterior tornar-se há exigível a multa de 10$ às entidades responsáveis consignadas no artigo 8.° da referida lei de 28 de Outubro de 1910.
Art. 3.° No orçamento do Ministério da Instrução Pública inscrever-se há a verba que fôr reputada indispensável

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para o pagamento da franquia postal e remessa das publicações para a sede do Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 20 de Março de 1923. — Alfredo Ernesto de Sá Cardoso — Baltasar de Almeida Teixeira — João de Ornelas da Silva.
N.º 457. — Senhores Deputados. — Atendendo a que o Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, fundado há mais de meio século, é decerto a mais notável das instituïções portuguesas do Brasil;
Atendendo a que a sua biblioteca tem cêrca de sessenta mil volumes, podendo ser considerada uma verdadeira biblioteca nacional e um monumento erguido às letras portuguesas:
Tenho a honra de submeter à vossa apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Para ser entregue ao Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, será enviado ao Ministério da Instrução Pública, Direcção Geral de Belas Artes, um exemplar de todas as publicações a que se referem o § único do artigo 8.° e artigo 9.° da lei do 28 de Outubro de 1910.
Art. 2.° Por cada transgressão do preceituado no artigo anterior tornar-se há exigível a multa de dez escudos às entidades responsáveis consignadas no artigo 8.° da referida lei de 28 de Outubro de 1910.
Art. 3.° No orçamento do Ministério da Instrução Pública inscrever-se há a verba que fôr reputada indispensável para o pagamento da franquia postal e remessa das publicações para a sede do Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, 20 de Março de 1923. — O Ministro das Finanças, Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães. — O Ministro da Instrução Pública, João José da Conceição Camoesas.
Está conforme. — Direcção Geral da Secretaria do Congresso da República, 20 de Março de 1923. — O Director Geral, Abílio Soeiro.
Lida na Mesa a proposta, foi posta à discussão na generalidade.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente: estabelece o projecto em discussão que todas as emprêsas editoras de publicações periódicas ou não periódicas serão obrigadas a remeter ao Ministério da Instrução um exemplar das suas produções a fim de ser entregue ao Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, sob pena de multa de 10600 por cada impresso.
Ignoro completamente qual é a importância literária ou artística do referido grupo. Deve tratar-se evidentemente duma entidade merecedora de consideração e simpatia da Câmara. Não serei eu, que costumo proceder com a devida ponderação em todos os actos da minha vida, que ponha em dúvida os serviços prestados à Pátria e à República Portuguesa pelo Gabinete. Mas será porventura essa entidade a que mais requisitos e qualidades reune, ou a única que merece semelhante distinção? A que objectivos obedece o projecto que se discute? No Rio de Janeiro, assim como em outras cidades do Brasil, há bibliotecas nacionais e municipais, o numerosas associações formadas ùnicamente por portugueses. Vai abrir-se uma excepção, ou, melhor, um precedente, para com o Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, impondo às emprêsas editoras portuguesas a obrigação de lhe remeter um exemplar do todas as publicações a que se referem os artigos 8.° e 9.° da lei de 28 de Outubro de 1910.
1 Não representará semelhante determinação uma violência inqualificável? Já estará abolida em Portugal a propriedade privada, relativa a bens móveis e imóveis?
A Constituïção, por que nos regulamos, determina no artigo 3.°, n.° 25.°, que é garantido o exercício do todo o género de trabalho, indústria e comércio, salvo as restrições da lei por utilidade pública.
Não temos o direito de dispôr daquilo que não nos pertence, nem a nosso favor, nem de terceiro. O Estado, quando se apodera dos bens ou dos serviços dos seus cidadãos, é obrigado a indemnizá-los.
Na melhor das hipóteses, por motivos ponderosos que desconheço, quando se queira obsequiar o Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, só o podemos fazer à custa da Nação. Cada um é senhor legítimo do que produz, pelo que

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lhe assiste o direito do usufruir e dispôr de tudo o que lhe pertence.
Os impostos são votados em nome dos superiores interêsses do país, e atingem na sua incidência todas as fontes de riqueza e de actividade nacional. Caso diverso se verifica com a medida que se pretende pôr em execução, porque vai afectar ùnicamente as emprêsas editoras, impondo-lhes sacrifícios no interêsse duma entidade de carácter particular. Se o projecto fôr aprovado, pelo atentado que representa à propriedade privada, julgo-me habilitado a afirmar aqui o em toda a parte, que o Parlamento português, já deu o primeiro passo na senda do bolchevismo.
So o Sr. João Camoesas quer prestigiar a República e manter o actual regime do propriedade, apenas lhe resta enviar para a Mesa um projecto nos seguintes termos:
Fica o Govêrno autorizado a adquirir um exemplar de todas as publicações a que "se referem os artigos 8.° e 9.° do decreto de lei de 28 de Outubro de 1910, destinados ao Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro.
Tenho dito.
O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Eu voto com muito prazer êste projecto, porque o Gabinete Português de Leitura no Rio do Janeiro é uma instituïção nacional que merece ser premiada pelo Estado Português e honrada por todos nós.
O Gabinete Português de Leitura no Rio de Janeiro, que é um grande centro de actividade intelectual tem sempre as suas portas abertas a toda a gente e ê portanto de toda a vantagem que os nossos escritores tenham ali um lugar onde possam ser conhecidos.
Não me parece que seja um ónus terrível o sujeitar os editores a enviarem um exemplar, tanto mais que êsse exemplar que o editor envia pode ser semente para a divulgação da obra o para a aquisição, por conseguinte, de diversos exemplares.
Tudo quanto seja dar valor e prestígio à nossa colónia no Rio de Janeiro, que nos tem prestado tantos serviços e que tem feito tantas afirmações de patriotismo, acho bem feito, e é por isso que dou o meu voto com o maior prazer a êste projecto.
O Sr. Ministro da Instrução Pública
(João Camoesas): — Eu não posso de maneira alguma concordar com a doutrina defendida pelo Sr. Joaquim Crisóstomo.
O projecto em discussão visa a satisfazer uma velha e justa aspiração da colónia portuguesa do Rio de Janeiro.
O Gabinete Português de Leitura daquela cidade conta com uma biblioteca que tem já hoje perto de 60:000 volumes, e encontra-se instalado em condições de constituir legitimamente o orgulho de todos os portugueses daqui e do Brasil.
Na felicíssima comparação do Sr. Presidente da Republica, as instalações daquela sociedade podem considerar-se como a sala de visitas sumptuosa e magnifica da colónia portuguesa do Brasil.
Essa biblioteca de 60:000 volumes desempenha hoje no Brasil uma função de cultura, aberta não só à colónia portuguesa mas a todos que a queiram visitar é um padrão magnífico da cultura nacional.
Dentro do ponto de vista prático a que se ateve o Sr. Joaquim Crisóstomo, e dentro do ponto de vista do interêsse nacional importa mais auxiliar e prestigiar essa instituïção do que dispensar o auxílio do Estado a qualquer outra ordem de biblioteca.
Por todas estas razões eu estou inteiramente de acôrdo com as considerações do Sr. D. Tomás de Vilhena, que comigo coincide no desejo que o Senado da Republica preste desta forma uma homenagem aos portugueses que através de todas as dificuldades e sacrifícios souberam criar o Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro que é um padrão levantado à cultura nacional em terras do Brasil.
Pôsto à votação o projecto na generalidade, foi aprovado.
Entra em discussão o artigo 1.°
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Afigura-se-me que a redacção dêste artigo não está bem feita.
Eu entendo que ficaria melhor se em vez de «ser entregue» se pusesse «ser remetido».
«Entregue» faz presumir que se dá de mão em mão, ao passo que «remeter» dá a idea de que se envia pelo correio ou por qualquer outro meio.

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Nêste sentido eu mando para a Mesa uma proposta.
O Sr. Ministro da Instrução Pública
(João Camoesas): — Eu não vejo necessidade na emenda do Sr. Joaquim Crisóstomo.
No artigo 3.° está consignado se há-de ser por entrega ou se há-de por remessa.
Portanto não vejo necessidade nessa emenda.
O Sr. Presidente: — Vou submeter à admissão a proposta enviada pelo Sr. Joaquim Crisóstomo.
O Sr. Medeiros Franco (sôbre o modo de votar): — Afigura-se que é absolutamente dispensável, desnecessária, e até prejudicial, a emenda que o Sr. Joaquim Crisóstomo, aliás muito bem intencionado, enviou para para a Mesa no sentido de as palavras «ser entregue» ficarem substituídas por «ser remetido».
Essa proposta nada adeanta, e até vem protelar a aprovação dêste projecto, por isso que essa emenda, sendo admitida, teria de ir à secção competente, e portanto ficaria protelada a aprovação do projecto.
Eu lembrava a S. Ex.ª que talvez fôsse conveniente que retirasse a sua proposta, por causa do embaraço que ela vai causar sem adeantar nada.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Desisto da emenda que enviei.
Pôsto à votação o artigo 1.°, foi aprovado.
Foram em seguida aprovados sem discussão os artigos 2.°, 3.° e 4.°
O Sr. Pereira Gil (para um requerimento): — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se dispensa a última redacção para o projecto que acaba de ser votado.
Foi concedido.
Entra em discussão a proposta de lei n.° 399.
É a seguinte:
Proposta de lei n.° 399
Artigo 1.° E isento de direitos o papel destinado à impressão da História da Colonização Portuguesa do Brasil, mediante têrmo de responsabilidade firmado pela entidade que toma a seu cargo êsse empreendimento, de que o papel importado ao abrigo desta lei não terá destino ou aplicação diversa da que nela se consigna.
Art. 2.° Todo o papel importado nos termos desta lei sê-lo há em nome da entidade de que trata o artigo 1.°, ficando de cada lote na alfândega as necessárias amostras devidamente autenticadas.
Art. 3.° Na alfândega por onde se efectuar a importação do papel que tiver o destino que marca êste diploma abrir-se há conta das quantidades importadas, lançando-se nela oportunamente o pêso declarado pela entidade editora da obra das folhas já impressas e da matéria prima inutilizada,
Art. 4.° A alfândega por onde se realizar a importação do papel adoptará as medidas de fiscalização mais adequadas h garantia das interêsses do Estado, fazendo entrar em depósito fiscalizado a matéria prima que sobejar da impressão da História da Colonização Portuguesa do Brasil.
Art. 5.° As disposições desta lei são aplicáveis ao papel importado pela Emprêsa da História da Colonização Portuguesa do Brasil, sob fiança aos direitos com destino à impressão da mesma obra.
Art. 6.° O regime especial estabelecido nesta lei caducará em Dezembro de 1924.
Art. 7.° Fica revovada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 20 de Março de 1923. — Alfredo Ernesto de Sá Cardoso — Baltasar de Almeida Teixeira — João de Ornelas da Silva.
Parecer n.° 441
Senhores Deputados. — A vossa comissão de comércio o indústria, reconhecendo o alto objectivo da obra eminentemente patriótica empreendida pela Sociedade Editora da História da Colonização Portuguesa no Brasil e a obrigação que ao Estado pertence de dar a maior parcela de colaboração e auxílio a obras de profunda elevação moral e patriótica, como aquela a que nos vimos referindo, aconselha à vossa aprovação o projecto de lei n.° 336-B, da iniciativa do Deputado Sr. Manuel de Sousa Coutinho.
Sala das sessões da comissão de co-

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mércio e indústria, 6 de Março de 1923. — Aníbal Lúcio de Azevedo, presidente e relator — Carlos Pereira — José Domingues dos Santos — L. G. Velhinho Correia — Francisco Cruz (vencido).
Senhores Deputados. — A vossa comissão de finanças, verificando o projecto de lei n.° 336-B, e concordando com o parecer que sôbre êle formulou a vossa comissão de comércio e indústria, é de parecer que êle merece ser aprovado.
Sala das sessões da comissão de finanças, 14 de Março de 1923. — Aníbal Lúcio de Azevedo (com declarações) — Joaquim Ribeiro — F. G. Velhinho Correia— Crispiniano da Fonseca — Viriato Fonseca — Carlos Pereira — Alfredo de Sousa—Lourenço Correia Gomes, relator.
Concordo — 15 de Março de 1923. — V. Guimarães.
Projecto de lei n.° 336-B
Senhores Deputados. — Tornando-se digna de auxílio a patriótica iniciativa da colónia portuguesa do Brasil para a publicação da História da Colonização Portuguesa do Brasil, obra monumental a que não preside qualquer intuito lucrativo, mas tam sòmente o de erguer um monumento ao esfôrço da gente portuguesa no continente americano durante três séculos, tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° E isento de direitos o papel destinado à impressão da História da Colonização Portuguesa do Brasil, mediante têrmo de responsabilidade, firmado pela entidade que toma a seu cargo êsse empreendimento, de que o papel importado ao abrigo desta lei não terá destino ou aplicação diversa do que nela se consigna.
Art. 2.° Todo o papel importado nos termos desta lei sê-lo há em nome da entidade de que trata o artigo 1.°, ficando de cada lote na Alfândega as necessárias amostras devidamente autenticadas.
Art. 3.° Na Alfândega por onde se efectuar a importação de papel que tiver o destino que marca êste diploma abrir-se há conta das quantidades importadas, lançando-se nela oportunamente o pêso declarado pela entidade editora da obra, das folhas já impressas e da matéria prima inutilizada.
Art. 4.° A Alfândega por onde se realizar a importação do papel adoptará as medidas de fiscalização mais adequadas à garantia dos interêsses do Estado, fazendo entrar em depósito fiscalizado a matéria prima que sobejar da impressão da História da Colonização Portuguesa do Brasil.
Art. 5.° As disposições desta lei são aplicáveis ao papel importado pela Emprêsa da História da Colonização Portuguesa do Brasil, sob fiança aos direitos com destino à impressão da mesma obra.
Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 19 de Agosto de 1922. — Manuel de Sousa Coutinho.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente: não concordo em absoluto com a doutrina da proposta em discussão, que isenta de direitos o papel destinado à impressão da História da Colonização Portuguesa do Brasil.
Sou o primeiro a reconhecer que a emprêsa que se encarregou dêsse trabalho, exerce uma função em que predomina o interêsse público, mas uma vez estabelecido o precedente de isentar de direitos o papel, toda a imprensa portuguesa reclamaria idêntica concessão.
O mau é abrirem-se as portas do favoritismo em matéria de impostos, porque todos se julgam em circunstâncias de serem beneficiados.
A idea do autor do projecto é boa e seria louvável se o Estado se encontrasse em condições de poder isentar de direitos, não só o papel destinado à referida História da Colonização como todo o papel de que a imprensa se utiliza.
Nêste momento devemos olhar de preferência para a situação financeira do país.
Estou certo que a proposta sôbre que incide a minha crítica tem dois aspectos: o económico e o moral. Quanto ao primeiro, pretende-se aliviar as emprêsas dum importante encargo reduzindo-se-lhe as despesas; em relação ao segundo, incutindo-se-lhe fôrça e energia para levar ao fim a sua obra.
Ora, se por um lado se me afigura justo que o Estado auxilie qualquer iniciativa de carácter patriótico, também é

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certo que essa função tem de ser exercida equitativamente, i Será a Emprêsa da História da Colonização Portuguesa do Brasil ,a única entidade que se dedique a serviços tipográficos e de impressão que mereça a protecção do Estado?
A Câmara sabe que a imprensa portuguesa atravessa uma crise assombrosa e que por dificuldades monetárias têm naufragado a maior parte dos jornais diários. Nenhuma cidade do mundo, em relação à densidade da sua população teve um número tam elevado de publicações periódicas como Lisboa, e não obstante, nêste momento, êsses jornais vão interrompendo o seu contacto com o público. Os que ainda se mantêm é à custa dos mais altos sacrifícios, porque os materiais empregados, e a mão de obra atingiu um preço fabuloso, e portanto as suas despesas excedem as suas receitas, provenientes da sua venda o dos anúncios. As emprêsas jornalísticas têm de lançar mão de mil recursos para se manter, e como eu sou um grande amigo da imprensa em virtude da importante e nobilíssima função social que ela desempenha, se tivesse de votar a proposta em discussão, torná-la-ia extensiva a todas as mencionadas emprêsas.
A minha orientação afasta-se portanto da que segue o Sr. João Camoesas. Contrista-me que S. Ex.ª dizendo-se democrata, venha à Câmara defender uma proposta destinada a favorecer uma emprêsa de publicações, esquecendo-se que toda a imprensa portuguesa necessita de protecção oficial. Recomendo a sua atenção ao assunto na certeza de que S. Ex.ª o procurará estudar e resolver satisfatoriamente.
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Instrução Pública
(João Camoesas): — Mais uma vez, e com bastante mágoa minha, eu não posso estar de acôrdo com as considerações do Sr. Joaquim Crisóstomo.
Não se trata duma publicação qualquer, trata-se duma das tentativas mais interessantes, dentro do ponto de vista intelectual e moral que Portugal tem realizado.
Muitos apoiados.
A história da colonização portuguesa no Brasil, ou seja a revindicação da actividade portuguesa na descoberta e colonização do continente americano, dirigida com superior talento pelo Sr.. Carlos Malheiro Dias, custeada com uma isenção patriótica, admirável por um português que mais de uma vez se tem tornado credor da gratidão dos portugueses, é um dos mais notáveis monumentos da cultura portuguesa que jamais se realizou nêste país. Bem merece, por conseqüência, do Estado todos os auxílios, todos os incitamentos, tanto mais que as pessoas que a esta obra se propuseram não têm o mínimo intuito lucrativo; olharam apenas à propaganda das altas virtudes do povo da nossa terra.
Eu não sei se o Sr. Joaquim Crisóstomo teve ocasião de ver já o volume publicado, que é o primeiro. Desde a impressão às ilustrações numerosíssimas que contém, revindica para Portugal quer a prioridade da descoberta do continente americano, quer dos métodos extraordinários e assombrosos, que desde o princípio fizeram daquela colónia uma nação, revindicando para Portugal uma função altíssima que lhe pertence e que andava descuidada.
Uma iniciativa desta importância não marca um precedente.
Desculpe V. Ex.ª e o Senado o calor que ponho na defesa desta proposta. Ela deriva dum sentimento de justiça, e também da muita admiração que quero aqui confessar, perante o Parlamento e o país, pelo escritor que com tanto entusiasmo e patriotismo se abalançou a uma obra desta natureza.
Tenho dito.
O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Sr. Presidente: quem me ouvir hoje aqui falar e não me conhecer, e não souber de facto que eu sou retintamente monárquico, há-de imaginar que passei a governamental, porque venho também defender êste projecto.
E que eu faço política, mas não faço politiquice. Fui sempre adverso à politiquice. Em se tratando dalgum caso de interêsse nacional eu dou o meu voto seja a quem fôr.
Por isso eu apoio esta questão.
Esta obra constitui um verdadeiro monumento que faz honra à nossa terra.
Em todos os tempos o ^Estado tem o

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dever de se associar a esta grande manifestação da cultura nacional, e eu seria aqui o primeiro a considerar severamente o Govêrno que viesse regatear isto que se pede.
E por esta razão que eu, inspirado no sentimento patriótico, dou o meu inteiro apoio a esta proposta de lei.
Tenho dito.
Foi aprovada a proposta na generalidade.
Entra em discussão na especialidade.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente: o artigo em discussão dispõe textualmente o seguinte:
«E isento de direitos o papel destinado à impressão da História da Colonização Portuguesa do Brasil, mediante têrmo de responsabilidade firmado pela entidade que toma a seu cargo êsse empreendimento, de que o papel importado ao abrigo desta lei não terá destino ou aplicação diversa da que nela se consigna».
Assiste-me o direito de preguntar ao Sr. Ministro da Instrução, qual é a entidade a que se refere êste artigo.
?Acha-se porventura organizada alguma companhia, sociedade ou emprêsa para tal fim? Que designação tem? Fazer leis não é o mesmo que semear batatas ao rêgo, ou vender jornais às esquinas das ruas. As leis, para se tornar possível a sua execução prática, necessitam de ser redigidas em termos claros e precisos. Só depois do Sr. Camoesas elucidar a Câmara, poderei enviar para a Mesa uma emenda destinada a dar forma jurídica ao artigo em discussão.
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Instrução Pública
(João Camoesas): — Sr. Presidente: mais uma vez estou em desacôrdo com o Sr. Joaquim Crisóstomo e estou convencido que depois de ligeiras considerações que eu vou fazer, S. Ex.ª acordará comigo.
O artigo 2.° refere-se à entidade que vem expressa no artigo 1.°, que diz assim:
Leu.
Esta é que é a entidade que toma a seu cargo a publicação da História da Colonização Portuguesa no Brasil. E no artigo 5.° vem o nome dessa emprêsa.
A. lei é suficientemente clara, não permite confusões, a redacção afigura-se-me clara pela configuração dos artigos, e embora fôsse mais aceitável a expressão utilizada pelo Sr. Joaquim Crisóstomo, não vejo necessidade de se alterar o artigo, de prejudicar o andamento da proposta.
Pôsto à votação o artigo 2.°, foi aprovado.
Lei lido e pôsto à discussão o artigo 3.°
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente: no artigo em discussão devia determinar-se qual a alfândega do país por onde será importado o papel. Não é acertado deixar a entidade encarregada de fazer a publicação a escolha da alfândega ou alfândegas, que mais lhe convém, para fiscalizar a entrada do papel. Trata-se de uma concessão que pode prejudicar altamente os interêsses do Estado, se não houver todo o cuidado em evitar fraudes e abusos. Melhor fora que se estabelecesse na lei que a importação sòmente se poderia efectuar pela alfandega de Lisboa.
Tenho dito.
Foi aprovado o artigo 3.° Foi aprovado sem discussão, depois de lido, o artigo 4.°
Foi lido e pôsto à discussão o artigo 5.°
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente: o artigo que se acaba de pôr em discussão, está pessimamente redigido. Parece mais uma charada a prémio do que um preceito destinado a constituir lei. Cada vez mais me convenço que os parlamentares de hoje se desinteressam da cultura da nossa língua. Sinto-me vexado como representante do país ao ler o referido artigo que diz:
«As disposições desta lei são aplicáveis ao papel importado pela Emprêsa da História da Colonização Portuguesa do Brasil, sob fiança aos direitos, com destino à impressão da mesma obra».
Fica-se sem se saber qual é a obra, bem como a quantidade provável do papel a importar. Assim o quere assim o tem, com uma diferença, é que eu não me

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solidarizo com as decisões do Senado, que desprestigiam as instituïções parlamentares. Primo sempre em cumprir o meu dever, e no exercício das minhas funções de Senador, tenho protestado o continuo a revoltar-me, contra tudo o que seja aprovar projectos, que não satisfaçam pelo menos, às regras mais rudimentares da sciência da linguagem. Se dependesse de mim o artigo em discussão seria substituído por outro; entretanto, como não desejo protelar a votação, limito-me a declinar a parcela de responsabilidade que me pudesse caber no projecto. Não quiseram ou não puderam modificá-lo e aperfeiçoá-lo, adaptando-o aos fins que o seu autor tinha em vista. Tenho dito.
São em seguida postos à votação e aprovados os artigos 5.°, 6.° e 7.°
O Sr. Medeiros Franco (para um requerimento): — Requeiro dispensa da última redacção.
Foi concedido.
Entra em discussão o artigo novo, referente ao projecto de lei n.° 875, da iniciativa do Sr. Pedro Ferraz Chaves.
Pôsto à votação, foi aprovado.
O Sr. Santos Garcia (para um requerimento): — Requeiro que entrem imediatamente em discussão as emendas ontem aprovadas na respectiva secção e referentes ao projecto de lei n.° 3.38.
Foi concedido.
Postas, à votação as emendas foram aprovadas.
O Sr. Presidente: — A Câmara dos Deputados determinou que três Srs. Deputados fizessem parte do grupo português da União Interparlamentar.
Parecia-me conveniente que êsse grupo fôsse constituído por três Srs. Deputados e dois Srs. Senadores e por isso proponho ao Senado que dêsse grupo façam parte dois Srs. Senadores.
O Sr. Pereira Osório: — Pedi a palavra para esclarecer o Senado que na outra casa do Parlamento foi apresentada uma proposta para que se indicasse o número do representantes daquela Câmara à União Interparlamentar, que anualmente se reúne em diferentes capitais da Europa para tratar de assuntos referentes ao funcionamento e às funções dos parlamentos.
A Câmara dos Deputados resolveu que ficasse representada no grupo português por três membros.
Resta agora ver qual há-de ser a representação do Senado.
Eu proponho que seja de dois membros, isto para se guardar aquela proporção que é de uso e costume, guardar-se entre as duas Câmaras, visto que a outra Câmara é incomparavelmente mais numerosa do que esta.
Eu proponho portanto que nesse grupo parlamentar o Senado fique representado por dois membros.
Foi aprovado.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Ramos de Miranda: — Antes de se entrar no assunto para que pròpriamente pedi a palavra, eu desejo associar-me à manifestação que o Senado fez há pouco aos Congressistas do Ribatejo que hoje inauguram o seu congresso em Santarém.
O assunto de que me vou ocupar é importante e eu muito desejaria que o Govêrno estivesse representado, porque queria chamar a sua atenção para êste caso que pode assumir um carácter um pouco grave pelas circunstâncias em que se vai manifestando.
Como não vejo agora nenhum membro do Govêrno nesta Câmara, ou pedia a V. Ex.ª, Sr. Presidente, a fineza de transmitir ao Govêrno o caso de que me vou ocupar, porque ou não quero perder a ocasião de o referir ao Senado.
O assunto é melindroso, e eu procurarei pesar bem as minhas palavras, porque eu não quero que delas possa surgir qualquer melindre mas que simplesmente delas ressalte a necessidade de os assuntos serem tomados por todos na sua devida consideração e de se não avolumar o carácter que muitas pessoas lhe queiram dar, e que pode ser prejudicial para todos.
Eu quero-me referir a um «milagre» que já está em voga, realizado anualmente num ponto do distrito que eu tenho a honra de representar nesta casa do Parlamento, no sítio de Fátima, no meio de

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uma planície escalvada, próximo de Vila Nova de Ourém.
O Sr. Ministro da Instrução entra na sala.
O Orador: — Eu torno a dizer que não tenho a intenção de agredir ninguém, nem de molestar nas suas crenças, nem nas suas superstições do quem quer que seja.
Eu simplesmente quero chamar a atenção, do Govêrno para que êste assunto seja ponderado, e que se lhe dedique a atenção que êle realmente merece.
E posso afirmar por conhecimento que tenho, visto pertencer à região, que inicialmente na Fátima havia um ou dois indivíduos que exerciam o ofício de curandeiros, ofício que o Govêrno vai permitindo, mas para o qual deve olhar com atenção.
Êsse exercício de curandeiro transformou-se em acção quási milagrosa, por indicação ou antes por instigação de terceiras pessoas.
Foi-se avolumando esta superstição a ponto tal de se reunir em volta de um dêsses curandeiros uma romaria quási que impulsionada por sugestões alheias, e assim êsse curandeiro foi adquirindo, por assim dizer, um poder de acção medicamentosa quási sobrenatural, sem no emtanto possuir a consagração, nem os conhecimentos das faculdades scientíficas.
Depois o facto transformou-se em carácter religioso e êsse curandeiro, penso que começou a dizer que a sua acção benéfica sôbre os doentes que a êle acorriam provinha da presença de uma certa imagem, que êle possuía e que estava junto da sua habitação.
Mais tarde o curandeiro desapareço do lugar e a imagem toma foros de milagrosa e passa a ter a influência que o curandeiro até ali tinha.
Não sei o destino que teve o curandeiro, mas o que é facto é que um ou dois anos depois, num belo dia previamente anunciado, faz-se uma romaria ao planalto de Fátima, provocada não se sabe por quem, e instigada não se sabe por quem, para prestar homenagem à mesma imagem, para a qual já se tinha construído uma capela, e então começou toda a gente correndo para a água de uma lagoa.
Actualmente a superstição já está de posse de muita gente que vem de muitos
pontos para ver o milagre, porquanto até se diz que nesse dia dança o sol.
A água da lagoa, por determinação do subdelegado foi classificada de água pútrida e mandada secar; mas para não perderem a sua qualidade milagrosa, abriram um pôço com 15 metros do profundidade
Nele aparece a água na época das chuvas que as recebe por estar aberto, e é com essa água que se fazem as curas milagrosas.
Ora chamo a atenção de quem para êste assunto deve olhar.
Àparte do Sr. Vicente Ramos.
O Orador: — Eu ponho a máxima cautela no que digo.
Estou notando o que dizem.
Por conseqüência daí podem provir até infecções transmitidas por pessoas doentes que lá se tenham lavado.
E, portanto, um perigo para a saúde pública, além de uma sugestão a que é levada a gente dos arredores da serra.
Os instigadores desta crença podem provocar uma reacção natural por parte dos espíritos esclarecidos ou que tenham conhecimentos scientíficos.
É preciso que se ponha côbro nessa brincadeira e se tenha mão nos sugestionadores.
Há tempo, ouvi dizer que tinha sido nomeada uma comissão da parte dos instigadores da romaria para saber se os factos eram ou não verdadeiros, tendo concluído que o eram. Essa comissão também terá suas culpas no caso de vir a dar-se qualquer conflito.
Limito por aqui as minhas considerações.
O orador não reviu.
O Sr. Dias Andrade: — Ouvi com atenção as considerações do Sr. Ramos de Miranda e comêço por registar com aprazimento, o cuidado que S. Ex.ª teve de se meter dentro de uma elevada correcção referindo-se aos factos que se passam em Fátima.
Nada sei da acção dos curandeiros da região.
Sei que, há alguns anos, e em certos dias ali vão muitos peregrinos prestar culto à Virgem.

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Ainda no último domingo, 13 dêste mês, essa romaria se realizou, juntando-se ali mais de 100:000 pessoas. O que ali se passou constituiu uma grandiosa manifestação de fé.
Com relação aos feitos sobrenaturais de Fátima, ainda a igreja se não pronunciou.
Foi iniciado o respectivo processo, que segue com o maior cuidado; concluído êle, Roma falará, e o seu juízo será acatado por todos os católicos.
A igreja procederá sôbre a aparição de Fátima tal como se fez com a aparição de Lourdes.
Não tem razão o ilustre Senador nas suas apreensões e nos seus receios para o futuro.
A propósito eu vou citar um caso passado em França quando ali começaram as peregrinações a Lourdes.
Um dia no Eliseu, na presença do marechal Mac-Mahon, Presidente da República, houve alguém que estranhou que a essa peregrinação fôssem tantos militares fardados, ao que aquele marechal respondeu: «Tenho muito menos medo de cem pipas de água benta do que uma barrica de petrólio».
Na verdade, não é na água benta que está o perigo para os Estados e para a ordem pública; êsse perigo está noutra parte e para aí é que o ilustre Senador devia chamar as atenções do Govêrno.
O Sr. Ministro da Instrução Pública (João Camoesas): — Pedi a palavra para dizer ao Sr. Ramos de Miranda que transmitirei as suas considerações sôbre os factos passados em Fátima ao Sr. Presidente do Ministério.
O Sr. Júlio Ribeiro: — Sr. Presidente: folgo com a presença do Sr. Ministro da Instrução nesta casa do Parlamento, porque me seria penoso usar da palavra sem S. Ex.ª estar presente.
Aproveito o ensejo, visto ser esta a primeira vez que daqui me dirijo a S. Ex.ª para o cumprimentar e prestar homenagem às suas qualidades de inteligência, de carácter e à inflexibilidade de princípios que tanto o têm elevado.
E é para essa inflexibilidade de princípios de S. Ex.ª que eu vou apelar, certo de que o não farei baldadamente.
Vejo por notícias dos jornais que o Sr. Ministro da Instrução vai dissolver a actual sociedade do Teatro Nacional por meio de uma portaria.
Estando esta sociedade constituída pelo decreto com fôrça de lei de 10 de Maio de 1919, assinado pelo Sr. Presidente da República e por todos os Ministros, não acredito que tal arbitrariedade se faça.
Não. Não creio.
A sociedade do Teatro Nacional funciona em virtude de um decreto, e em caso nenhum uma portaria pode revogar um decreto.
Podendo haver êrro ou confusão da minha parte pela insuficiência dos meus conhecimentos jurídicos, consultei todos os jurisconsultos e magistrados desta Câmara, presentes, os Srs. Catanho de Meneses, Augusto Monteiro, Pereira Gil, Manuel Gaspar, Joaquim Crisóstomo, João Nepomuceno, Elísio de Castro e Medeiros Franco, e todos êles me disseram, com a autoridade que advém da sua sciência jurídica, que em caso nenhum uma portaria pode derrogar um decreto com fôrça de lei.
Dando mesmo de barato que o Govêrno pudesse dissolver a sociedade, diga-me S. Ex.ª se já pensou que, nos termos do § 3.° do artigo 4.° da lei de 4 de Agosto de 1898, tem de ser entregue aos societários o recheio do Teatro.
Êsse § 3.° do artigo 4.° diz muito claramente:
«Se o Govêrno em algum tempo retirar à sociedade a concessão do Teatro para reentrar no uso dêle, a propriedade do scenário, de mobília de scena, do guarda-roupa e adereços que a referida sociedade tiver adquirido, reverterá plenamente para ela, excepto se estiver caucionado ou dever caucionar qualquer crédito».
Vai o Govêrno entregar o recheio do Teatro Nacional à sociedade dissolvida?
Não será uma inconveniência?
E merecerão todos os societários a medida violenta de uma dissolução?
Nêste teatro há societários com dezenas e dezenas de anos, e que sempre foram disciplinados, conscienciosos e mereceram os aplausos do público e o respeito de todos.
E os contratados?

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Agora, no período do verão, quando as companhias estão organizadas, não deixar funcionar os artistas, é levar-lhes a fome, a miséria e a desgraça.
Eu não acredito que tal se pratique, não se acautelando os legítimos interêsses de todos, porque confio muito no espírito da justiça do ilustre titular da pasta da Instrução.
Depois, também, nos termos do artigo 15.° do já citado diploma, aqueles que têm direitos adquiridos não poderão ser aposentados.
Mas há mais:
Só num caso o Govêrno pode dissolver a sociedade. E claro o artigo 68.° do mesmo decreto.
Eu leio:
«Se a sociedade não puder constituir-se por ser insuficiente o número ou o merecimento dos artistas que requererem para nela serem admitidos, o Govêrno declarará sem efeito o presente decreto».
?Verifica-se alguma destas circunstâncias? Não.
Tem o número suficiente e ninguém pode pôr em dúvida o valor artístico da maioria dos societários, embora lá haja quem não esteja à altura do Teatro Escola e tenha entrado por favoritismo.
?E está provado que os societários são indisciplinados?
?Já se procedeu a um inquérito?
?Devia tomar-se uma medida tam violenta sem rigorosamente se averiguar se há actos que a justifiquem?
É por estas circunstâncias de ordem legal e moral que eu estou convencido de que é apenas uma atoarda o dizer-se que o Sr. Ministro da Instrução vai dissolver a sociedade, que está funcionando em virtude dum decreto com fôrça de lei.
Não, não acredito que os societários do Teatro Nacional, em geral, não sejam competentes e que não estejam a altura das suas funções.
Se ali há defeitos e insuficiências, não vêm dos artistas, mas da organização da casa.
No Teatro Nacional há artistas competentíssimos e disciplinados, repito; e, quando muito, poderia ter havido uma insubordinação pessoal, e não colectiva, que justificasse tal medida.
Se a autoridade mais intimamente ligada aos artistas comunicou ao comissário do Govêrno que havia ali uma insubordinação, é essa autoridade que deve ser demitida por não ter sabido manter o disciplina, e experimentar com outra individualidade. Nunca um comandante de regimento diz que a unidade que dirige está insubordinada. E, se o dissesse, êle seria o primeiro a ser castigado. Nestas circunstâncias, se há uma portaria lavrada dissolvendo aquela sociedade, eu peço ao ilustre Ministro da Instrução que reconsidere.
Se errare humanum est, emendar os erros é só próprio dos grandes caracteres. Disse.
O Sr. Ministro da Instrução Pública
(João Camoesas): — A situação do Teatro Nacional é suficientemente conhecida da Câmara e do país.
Levantou-se já há muito tempo um intenso clamor por parte da opinião pública contra os termos irregulares como se vinha fazendo, dentro do ponto de vista do prestígio artístico, a exploração do Teatro Nacional.
O comissário do Govêrno que é um funcionário distintíssimo do Ministério dos Negócios Estrangeiros, um literato dos mais distintos, um jornalista notável e um crítico teatral considerado e respeitado por todos, desde há muito que vinha usando de toda a sorte de processos persuasivos no sentido de corrigir e emendar os vícios de funcionamento da sociedade artística.
Esgotados todos êsses recursos de persuasão, S. Ex.ª foi forçado perante os desmandos cada vez maiores", pois até se chegava a descurar, num teatro que devia ser um verdadeiro teatro normal, o que havia de mais rudimentar em matéria de arte teatral ou seja o cuidado da própria caracterização, a pedir providências enérgicas.
Estes factos forçaram o comissário do Govêrno a fazer-me uma comunicação, em virtude da qual eu não podia de maneira nenhuma conservar-me inerme perante êste estado de cousas, e resolvi não lavrar uma portaria, mas fazer expedir um decreto retirando a concessão à Sociedade Artística, o que é estritamente legal.

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Não o fiz no emtanto, sem assegurar tanto quinto possível os interêsses legítimos e respeitáveis dos artistas societários e contratados, porquanto, até se alterar o regime de exploração do Teatro Nacional, o Teatro podei a continuar a sei explorado pela actual Sociedade Artística.
O que fiz portanto ó estritamente legal e mais do que isso, estritamente moral, sem que da minha parte possa haver menosprezo ou falta de consideração pela Sociedade Artística em conjunto ou por qualquer dos seus membros.
Procedi assim visto que a referida sociedade vinha funcionando em termos de concitar contra si todas as pessoas deste país, e tanto assim que apesar de se conhecer na imprensa quo eu tencionava alterar o funcionamento daquela instituição, nenhum jornal do nenhuma corrente política avançou uma palavra em defesa do actual estado de cousas, o todos, pelo contrário, eram de opinião de que êle não podia assim continuar, para honra do país e para prestígio da própria arte teatral.
Retiramos por consequência a concessão à Sociedade Artística.
Fizemo-lo, repito, no uso de atribuições legais e em defesa do interesse e prestígio da nação;
A alteração do regime de funcionamento do Teatro Nacional far-se há breve para a qual nomeei uma comissão composta de indivíduos respeitáveis, que à vida teatral portuguesa e à arte do país têm ligado o seu nome.
Devo dizer a V. Ex.ª e ao Senado quo não me move nêste particular nenhum ódio ou antipatia pessoal.
Procedi nêste caso como costumo proceder sempre em todos os actos da minha' vida pública.
Não sei qual a solução que vai ter este assunto, e não ó este o momento asado para tratar do complexo problema da exploração do Teatro Nacional, de resto muito discutido por algumas mentalidades do hoje e outras mesmo de tempos atrasados.
Não me proponho por consequência elucidar do estada da questão nêste momento, mas posso dizer que estou convencido de que do resultado dos trabalhos da comissão há-de sair alguma cousa de melhor do que estava anteriormente.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Júlio Ribeiro: — Desde que S. Ex.ª diz quo dissolverá a sociedade por um diploma com torça legal, da força do que a instituiu, dou-me por satisfeito e agradeço essas explicações.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Folgo bastante em que o Sr. Ministro da instrução tivesse reconsiderado, porquanto, S. Ex.ª, numa entrevista que deu ao Diário de Lisboa, declarou que ia dissolver imediatamente a sociedade artística que explora o Teatro Nacional. Suponho que o Sr. Camoesas procedo de boa fé, atento o estado caótico em que se encontra aquele teatro, mas há também a considerar que os artistas, bons ou maus, não podem ficar sem trabalho dum dia para o outro.
A lei de 4 de Agosto de 1898, que permite ao Governo retirar a concessão, evidentemente parte do princípio que a sociedade artística é avisada com a necessária antecedência, a fim do cada societário procurar trabalho noutro teatro. O Governo, sempre que usa de uma faculdade que a lei lhe reconhece, deve fazê-lo de forma a não perturbar as condições de vida dos cidadãos. ?Que há de mais violento e arbitrário do que mandar fechar um teatro do Estado e deixar na miséria os artistas, por falta de colocação? Nem por momentos posso admitir que o Sr. Ministro da Instrução se abalance a praticar semelhante prepotência. Reflita S. Ex.ª e verá que os seus maus conselheiros o comprometem e lhe criam uma situação pouco invejável.
Afirma o Sr. João Camoesas que vai remodelar a exploração do Teatro Nacional em bases novas que satisfaçam ás exigências do público. Duvido muito dos milagres de tam raquítico e enfesado taumaturgo. Não temos infelizmente actores nem autores, e sem matéria prima nada se podo fazer. Antes porém quo meta mãos à sua obra demolidora, permita-me o Sr. Ministro quo lhe lembre a conveniência de submeter o assunto à apreciação de uma comissão de técnicos de bom critério e sã moral.

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Com o sossêgo e tranquilidade das famílias não se brinca, especialmente numa época de verdadeira crise alimentícia. Remodele o que quiser, mas com a condição de respeitar os direitos adquiridos dos societários do Teatro Nacional, e do não os deixar na contingência de terem de recorrer a cai idade publica.
Tenho dito
O Sr. Ministro da Instrução Publica
(João Camoesas): — O Sr. Senador Joaquim Crisóstomo investiu contra um estado de cousas que não existe, e por consequência a discussão carece de bases adjectivas.
Eu tranquilizo o Sr. Joaquim Crisóstomo quanto aos meus instintos de violência e crueldade, e se alguma cousa fiz foi na intenção de bem servir o pais e a arte teatral.
Apesar da opinião de S. Ex.ª sôbre o perigo da reünião das pessoas eminentes para a solução do determinados assuntos, eu, referindo me aos psicologistas. encosto-me a autoridade a que S. Ex.ª se encostou, ao valor dos técnicos para a solução de determinados casos e creio que isso será o suficiente para evitar os perigos a que S. Ex.ª se referiu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é no dia 22 a hora regimental com a seguinte ordem do dia:
Projectos de lei n.os 5, 10, 374, 348, 367 e 281.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 50 minutos.
O Redactor — Adelino Mendes.

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