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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
SESSÃO N.° 65
EM 26 DE JUNHO DE 1922
Presidência do Exmo. Sr. Manuel Gaspar de Lemos
Secretários os Exmos. Srs
Luís Inocêncio Ramos Pereira
José Joaquim Fernandes de Almeida
Sumário. - Aberta a sessão, com a presença de 26 Srs. Senadores, procede-se à leitura da acta, que foi aprovada, e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Presidente informa que está sôbre a Mesa, para ser discutido, o orçamento do Ministério da Instrução Pública.
A requerimento do Sr. Augusto de Vasconcelos que foi aprovado, a Câmara resolve que se faça a discussão na sessão imediata.
Ordem do dia. - Continua em discussão o projecto de lei n.º 59 (provimento de vagas de tesoureiros da fazenda pública).
Falam os Srs. Joaquim Crisóstomo, Pereira Gil e Augusto de Vasconcelos. Foi a proposta aprovada com uma emenda do Sr. Joaquim Crisóstomo.
São proclamados Senadores pelo Funchal os Srs. César Procópio de Freitas e Vasco Crispiniano da Silva.
A requerimento do Sr. Silva Barreto entra em discussão a proposta de lei n.° 115 (supressão de uma escrivania em Loulé). Sôbre o assunto usam da palavra os Srs. Joaquim Crisóstomo, Artur Costa, Godinho do Amaral e Machado Serpa. Foi aprovada a proposta de lei.
Entra a seguir em discussão a proposta de lei n.º 112 (criação da freguesia da Moçarria). Foi aprovada.
A requerimento do Sr. Joaquim Crisóstomo é adiada a discussão do projecto de lei n.º 16.
Entra em discussão a proposta de lei n.° 78 (Orçamento Geral do Estado, compreendendo resumos e desenvolvimentos de receita e despesa). Foi aprovada.
O Sr. Presidente encerra a sessão.
Abertura da sessão às 15 horas e 20 minutos.
Presentes à chamada 26 Srs. Senadores.
Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:
Abílio de Lobão Soeiro.
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Gomes de Sousa Varela.
António Maria da Silva Barreto.
Artur Augusto da Costa.
Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.
Francisco António de Paula.
Francisco José Pereira.
Francisco Vicente Ramos.
João Manuel Pessanha Vaz das Neves.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Pereira Gil de Matos.
Joaquim Teixeira da Silva.
Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.
José Augusto de Sequeira.
José Duarte Dias de Andrade.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Machado de Serpa.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Manuel Gaspar de Lemos.
Ricardo Pais Gomes.
Rodolfo Xavier da Silva.
Rodrigo Guerra Álvares Cabral.
Silvestre Falcão.
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2 Diário das Sessões do Senado
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Alfredo Narciso Marçal Martins Portugal.
Aníbal Augusto Ramos de Miranda.
António de Medeiros Franco.
Augusto de Vera Cruz.
César Justino de Lima Alves.
Constantino José dos Santos.
Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Frederico António Ferreira de Simas.
Herculano Jorge Galhardo.
João Alpoim Borges do Canto.
João Carlos da Costa.
José António da Costa Júnior.
José Mendes dos Reis.
Nicolau Mesquita.
Srs. Senadores que não compareceram à sessão:
Álvaro António Bulhão Pato.
António Alves de Oliveira Júnior.
António Xavier Correia Barreto.
Artur Octávio do Rêgo Chagas.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Catanho de Meneses.
João Maria da Cunha Barbosa.
João Trigo Motinho.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Joaquim Fernandes Pontes.
José Joaquim Pereira Osório.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Júlio Maria Baptista.
Luís Augusto Simões de Almeida.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Querubim da Rocha Vale Guimarães.
Raimundo Enes Meira.
Roberto da Cunha Baptista.
Tomás de Almeida Manuel de Vilhena (D.).
Vasco Gonçalves Marques.
Pelas 15 horas e 20 minutos o Sr. presidente manda proceder, à chamada.
Fez-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 26 Srs. Senadores. Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Leu-se.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa
O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.
Vai ler-se o
Expediente
Oficio
Do Ministério do Comércio e Comunicações, satisfazendo um requerimento do Sr. Silveira Júnior apresentado em sessão de 8 do corrente mês.
Para a Secretaria.
Telegrama
Do presidente da Câmara da Lousa, pedindo que não seja aprovado o projecto que reduz os direitos de importação de papel para jornal.
Para a Secretaria.
Pareceres
Da comissão de administração pública, sôbre o projecto de lei n.° 106, dando preferência, no preenchimento de vagas no Ministério da Agricultura, aos funcionários que tenham sido nomeados provisoriamente e que tenham sido dispensados do serviço.
Para imprimir e distribuir.
Da comissão de administração pública, sôbre o projecto de lei n.° 142, que cria uma assemblea eleitoral em Vale da Pinta, concelho do Cartaxo.
Para imprimir e distribuir.
Da comissão de legislação, sôbre o projecto de lei n.° 143, que determina que no dia da chegada dos aviadores Gago Coutinho e Sacadura Cabral sejam arquivados todos os processos instaurados, por delitos de imprensa.
Para imprimir e distribuir.
Da comissão de faltas, justificando as faltas do Sr. João Alpoim Borges e Castro.
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Da comissão do Orçamento, sôbre o orçamento da despesa do Ministério do Interior.
Para imprimir e distribuir.
Últimas redacções
Foram aprovadas as seguintes últimas redacções:
90-(d) - Orçamento do Ministério das Colónias.
90-(f) - Orçamento do Ministério da Justiça.
27 - Concedendo uma redução de preços nos bilhetes de caminhos de ferro a determinados inválidos militares.
74 - Sôbre propriedades encravadas.
141 - Suprimindo os exames de 2.ª classe dos liceus.
Projecto de lei
Do Sr. Gaspar de Lemos, autorizando a Direcção dos Serviços Florestais a fazer um empréstimo de 6.000$ à Cooperativa dos Empregados Florestais.
Para a Secretaria.
Licença
Do Sr. Joaquim Xavier de Oriol Pena, pedindo cinco dias de licença.
Foi concedida.
Da Associação Central da Agricultura Portuguesa, sôbre as propostas de finanças.
Para as comissões de finanças e Orçamento.
Acórdão
Da comissão de verificação de poderes, proclamando Senadores, pelo distrito do Funchal, os Srs. César Procópio de Freitas e Vasco Crispiniano da Silva.
Para a Secretaria.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está sôbre a Mesa o orçamento do Ministério da Instrução. Não estava marcado para ordem do dia, mas, conforme o artigo 5.° das alterações do regimento, tenho obrigarão de incluir imediatamente na ordem do dia a proposta orçamental do Ministério da Instrução.
O Sr. Augusto de Vasconcelos: - Requeiro que o orçamento só entre amanhã em discussão.
O Sr. Presidente: - Chamo a atenção da Câmara para êste assunto: entendo que devia pôr imediatamente em discussão o orçamento do Ministério da Instrução; mas, de facto, parece-me que é um pouco violento para os Srs. Senadores o tomarem, conhecimento de todo êsse parecer; em todo o caso, deixo à Câmara o resolver êste assunto.
O Sr. Augusto de Vasconcelos: - Como já disse, parecia-me melhor que, para interêsse da discussão, fôsse dado para ordem do dia de amanhã.
O Sr. Rodrigo Cabral: - Pedi a palavra a fim de interrogar a Mesa. Peço a V. Exa. que me informe se na Mesa existe mais algum parecer sôbre orçamentos.
O Sr. Presidente: - Sôbre a Mesa está apenas o orçamento do Ministério da Instrução.
O Orador: - Então, não vejo necessidade de se discutir hoje.
O Sr. Presidente: - Vou pôr à votação o requerimento do Sr. Augusto de Vasconcelos.
Foi aprovado.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Prossegue a discussão do projecto de lei n.° 59.
Continua o seu discurso o Sr. Joaquim Crisóstomo, que ficou com a palavra reservada.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Sr. Presidente: sustentei na penúltima sessão que a doutrina do projecto, que se discute, estava em manifesta oposição com as boas normas de administração pública consignadas na legislação em vigor e, especialmente, no decreto de 15 de Outubro de 1910. Disse também que a doutrina dêstes parágrafos era profundamente imoral, nefasta e deficiente para os interêsses do Estado, e que ia de encontro às doutrinas do Partido Democrático que, no seu pro-
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grama de 1914 e 1915, havia estabelecido em relação ao pró vime até do cargo de tesoureiro àa fazenda pública.
Hoje vou referir-me às considerações feitas pelo Sr. Ribeiro de Melo, e às propostas tendentes a defender a doutrina do projecto.
Dizem S. Exas. que é necessário e indispensável, sempre que vague qualquer lugar de tesoureiro de finanças, fazer imediatamente e de pronto o. provimento. Essa doutrina não é nova, é muito antiga.
Isso achava-se já estabelecido no artigo 21.° do decreto de 4 de Janeiro de 1870. Não é necessário, portanto, que venhamos estabelecer uma nova medida, quando essa doutrina já está consignada num diploma, que se encontra para todos os efeitos em vigor.
Portanto, não traz o projecto novidade alguma na parte em que estatui que o ' provimento se fará, cora a máxima urgência.
Esta urgência já está estabelecida numa lei em vigor/e portanto é absolutamente desnecessário, que se reproduza. É certo, porém, que pode haver mina certa demora entre a vacatura e o provimento, mas isso ninguém poderá impedir, a não ser que o Ministro das Finanças tenha & sua disposição empregados de finanças para quando houver conhecimento, por meio de telegrama, da vacatura, êle mandar imediatamente êsse empregado ocupar o lagar vago.
Isto talvez fôsse um modelo de perfeição, mas na prática não daria grandes resultados, porque sempre que vaga um lugar há-de medear um determinado espaço de tempo para o seu provimento, desde que se queira, é claro, que êsse provimento obedeça a um critério justo e não a um acto atrabiliário, como seria nomear um proposto de tesoureiro que não possui os conhecimentos precisos.
Disse aqui um ilustre orador que anteriormente a 15 de Outubro de Í920 não estava êste assunto previsto na lei. Isso não é exacto.
Já anteriormente a essa data o assunto estava previsto e regulado na lei, e por sinal que muito bem regulado e muito cautelosamente previsto.
Só quem desconhecer os serviços de finanças, ou ignorar a legislação de finan-
ças é que poderá afirmar que, pela primeira vez, surgiu em Portugal êste assunto, regulado pelo artigo 9.° do decreto de 20 de Outubro de 1920.
Êste decreto não foi mais do que uma modificação melhorada da lei anterior.
Desde que foi proclamada a República estabeleceu-se um certo número de vantagens para os funcionários públicos e. determinadamente, para os tesoureiros de finanças.
Uma medida promulgada em 26 de Maio de 1911 já preceituava no seu artigo 19.° que o ingresso nos cargos de tesoureiros de finanças seria feito.
Vê-se pois que, segundo o estabelecido neste artigo, o Ministro não tinha a faculdade de nomear quem. quisesse. Tinha de nomear indivíduos que estivessem naquelas condições. Não podia nomear arbitrariamente quem quisesse.
Como não estavam, ainda suficientemente acautelados, por meio desta disposição, os interêsses da classe dos funcionários das finanças, foi promulgada a lei de 4 de Junho de 1913. Esta lei é da autoria e da responsabilidade do Partido Democrático, visto que ela foi referendada pelo leader dêsse Partido, o Sr. Dr. Afonso Costa.
Pelo seu artigo 7.° podiam concorrer aqueles que se encontrassem providos definitivamente, com mais de dois anos de bom e efectivo serviço. Só no caso de não haver concorrentes nestas condiçOes é que a nomeação podia recair em qualquer indivíduo, que satisfizesse os preceitos do artigo 19.° da lei de 26 de Maio de 1911.
Vê-se que, nesta lei, se pretendia melhorar a situação dos funcionários de finanças, atendendo-se à sua situação, e procurando-se definir e estabelecer normas, segundo as quais o Ministro não pó-' deria nomear livremente, preferindo os mais modernos aos mais antigos.
A única liberdade, que se deu ao Ministro, foi a de nomear de entre os escrivães de finanças, que tivessem mais de dois anos de bom e efectivo serviço. "
Ainda pelo artigo 8.° da mesma lei de 1913 se preceitua que, emquanto houvesse tesoureiros, nunca a nomeação podia recair sôbre indivíduos, que não tivessem . concurso para tesoureiros.
E ainda se estabeleciam preferências.
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Aberto um concurso, concorrendo a êle vários tesoureiros de finanças, o Ministro, na selecção a efectuar, tinha a obrigação de dar preferência àqueles que tivessem exercido, anteriormente ao concurso, o cargo de tesoureiros propostos de finanças.
Evidentemente, desde que havia uma lei que regulava as transferências duma determinada classe, os Ministros tinham a obrigação restrita de cumprir essa lei, e quando o Ministro não a cumprisse, além da responsabilidade moral, que lhe advinha dêsse facto, havia também a responsabilidade jurídica, e, portanto, a contingência dessa nomeação ilegal, que o Ministro fizesse, ser anulada pelo Supremo Tribunal de Justiça.
Vê-se, portanto, que depois de implantada a República, ou seja pela lei de 26 de Maio de 1911, ou pela lei de 4 de Junho de 1911, sempre que vagasse qualquer cargo de tesoureiro de finanças o Ministro não podia nomear livremente o funcionário. Tinha de se sujeitar necessàriamente a um determinado número de normas estabelecidas pela lei, embora tivesse, de entre os funcionários da mesma classe, o arbítrio de escolher aquele que mais confiança lhe merecesse, é certo que ficava limitado a escrivães de finanças, e só podia ir além quando êsses funcionários não fôssem a concurso.
Ainda não ficou por aqui a legislação sôbre êste assunto. Ela foi mais longe, pois êste conjunto de medidas e preceitos que se iam sucessivamente estabelecendo ainda não satisfaziam às necessidades da classe, nem correspondiam ao espírito equitativo e justo daqueles que superintendiam neste ramo de serviço público da nossa sociedade, mas ao interêsse burocrático porque, felizmente, ainda há um ou outro funcionário público, que se interessa pelo aperfeiçoamento dos serviços a seu cargo. Êstes, dando maior amplitude às suas atribuições, iam junto dos Ministros fazê-los sabedores da conveniência em que a legislação sôbre êste assunto fôsse modificada e assim, em harmonia com a opinião dêsses funcionários, a legislação se foi aperfeiçoando em diferentes diplomas.
A legislação de 1915, sôbre êste assunto, é também da responsabilidade do Partido Democrático, porque foi referendado pelos Srs. José Augusto Ferreira da Silva e Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Esta doutrina é, portanto, perfilhada pelo Partido Democrático que, em 1911, a estabeleceu, em 1913 a aperfeiçoou e em 1915 a confirmou.
De todos êstes diplomas se verifica que, desde a implantação da República, tem havido o propósito inabalável de conceder garantias aos tesoureiros de finanças, tanto no interêsse da classe a que pertencem, como no interêsse dos serviços públicos.
Porque é que aqueles que ontem estabeleceram uma doutrina boa, sensata e lógica querem destruí-la agora, esquecendo aquilo que durante largo tempo sustentaram e de que fizeram propaganda, pretendendo conceder ao Ministro a liberdade da escolha, não só entre os tesoureiros de finanças como incluindo, na classe dos indivíduos que podem ser nomeados, outros que não têm a categoria de tesoureiros de finanças?
Esta diversidade de critérios, num assunto desta natureza, pode fazer-me conjecturar; mas, como eu não tenho direito de revelar aquilo que conjecturo, porque não tenho bases seguras para o fazer, passo a afirmar que me custa a acreditar que os partidos, em vez de irem avançando em ideas, em princípios, em teorias, vão retrogradando.
Para que restaurar doutrinas antigamente já condenadas?
Francamente não sei.
Era possível que o autor do projecto, o relator da comissão e ainda outras individualidades de destaque do Partido, a que pertencem êsses ilustres Senadores, viessem aqui defender a doutrina do projecto, mas defendê-lo com argumentos sólidos, com argumentos precedentes e convincentes, mas dê todas as considerações apresentadas, a meu ver, e creio que é êste o modo de entender daqueles que pensam e raciocinam, nem uma única precede, todas, absolutamente todas, tendem não a justificar o projecto, mas a condená-lo.
E porque condená-lo?
Porque êsses argumentos não têm base, não têm nada em que se firmem, são absolutamente nefelibatas, se me permitem o termo, são todos argumentos de conjectura.
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Quem me garante a mim, Sr. Presidente, que um proposto de tesoureiro de finanças, depois de publicadas em lei as propostas de finanças que estão na outra Câmara, e que vão fazer entrar nos cofres do Estado milhares de contos, recebendo uma dessas quantias não vai usar dela em seu proveito?
Mas isto, Sr. Presidente, não passa de conjecturas, de hipóteses, e eu no campo das hipóteses até posso admitir que esta casa abate, e que nós ficamos aqui subterrados.
Posso conjecturar que um homem habilidoso, como há por aí muitos em Lisboa, por meio de uma chave falsa entra num dos estabelecimentos de crédito oficial, Caixa Geral de Depósitos, por exemplo, consegue abrir um cofre e levar muito dinheiro.
Mas nós devemos ir conjecturando hipóteses concretas.
Se não há casos conhecidos nos relatórios correntes na imprensa, desta natureza, porque é que nos havemos de preocupar com uma situação que na verdade se não observa?
Evidentemente que não.
Se porventura fôssem muito frequentes êstes casos, então é que nós teríamos de ser chamados no sentido de providenciar que êles acabassem.
Mas se êles não surgem senão isoladamente, para que é que nós havemos de estar com isto?
Até hoje ninguém se lembrou de exigir fiança para se poderem desempenhar tais cargos.
Ninguém até a data pensou em exigir caução para o desempenho das funções dos Ministros e no emtanto, nas é cousa que se possa comparar com os tesoureiros de finanças.
Nós não vivemos em suma, num país onde se tenha adoptado a caução para todos os funcionários públicos; é simplesmente para um ou outro caso isolado.
Mas o que é mais extraordinário, e que os oradores que me precederam salientaram, é o facto de um secretário de tesoureiro de finanças poder receber por dia 1:000 contos e a sua caução ser de dez.
De que serve então a caução neste caso?
Sr. Presidente: isto da caução é apenas um espantalho!
O que se observa lá fora na prática é que o secretário de finanças não dá contas todos, os dias ao tesoureiro e, entretanto, êle tem em seu poder quantias muito importantes.
Então, para que serve ainda a caução?
Conseqúentemente o sistema da caução é puramente irrisório.
Se nós fôssemos a exigir um tesoureiro uma caução correspondente ao que êle recebesse por ano, ou por dia, ainda se poderia alegar uma certa justificação. Mas a verdade é que, quando se dá o alcance, êle vai sempre além da caução.
Logo, se êsses senhores que sustentam a necessidade absoluta da prestação da caução têm qualquer razão nas suas asseverações, há, então, que elevar as cauções a dez, vinte ou trinta vezes o que está estabelecido, porque só assim haveria uma relação entre a responsabilidade do funcionário, e a quantia que êle deposita.
O contrário disto é, repito, irrisório.
Nós não vivemos, felizmente, num país DO último grau da decadência; não vivemos num país em que todos tenhamos de duvidar em absoluto de todos os funcionários. Pelo contrário, o conhecimento que tenho de alguns funcionários leva-me à conclusão de que o funcionalismo público é, na sua grande maioria, honesto e trabalhador.
Portanto, o argumento de que é necessário acautelar os interêsses do Estado não precede. Além disso, segundo a lei, que está em vigor, e que é de 1870, os inspectores de finanças, que são os que fazem estas nomeações de propostos, têm o cuidado, porque nisso têm responsabilidade moral, de fazerem uma acertada escolha de funcionários. Esta escolha não é feita ao acaso. A nomeação não recai sôbre o primeiro indivíduo que passa pela rua. A nomeação faz-se obedecendo ao preceituado na lei, que exige um indivíduo idóneo, como se conclui do artigo 21.°
Como se tem executado êste preceito?
Há alguém que possa citar, com factos concretos, que os propostos de finanças claudicaram ou defraudaram a Fazenda Pública?
É preciso não atirar com certas atoardas para o público, que é simplista e que, muitas vezes, toma a nuvem por Juno.
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Estou falando em uma assemblea de gente culta, ilustrada, inteligente e observadora, que não pode, nem deve enveredar pelo caminho do irrisório e do fantástico.
Continuam os defensores do projecto a dizer que a escolha assim feita não vai recair sôbre indivíduos competentes, e a propósito o Sr. Ribeiro de Melo contou um caso sucedido em Tôrres Vedras com certo indivíduo, que andou metido na traulitânia, e que se alcançou com dinheiro do Estado, como se isso tivesse alguma ligação com o projecto, ou como se o argumento fôsse procedente. Se, porventura, êsse indivíduo se alcançou, é porque era um homem desonesto, mas isso não concorre nada para que a lei seja alterada.
Assim como se deu a coincidência de o homem ter estado na traulitânia, também se podia ter dado a inversa, isto é, de êle ter estado na defesa da República e haver desviado dinheiro dos cofres do Estado.
No caso que S. Exa. relatou só havia uma cousa a saber, era conhecer bem o passado dêsse homem; porque, se êle, no exercício das suas funções, já tivesse dado provas de menos honesto, só teríamos de acusar o Ministro que o nomeou.
Também o Sr. Artur Costa citou um caso sucedido em Barcelos, para onde tinha sido nomeado um escrivão muito velho, o que se não compreendia, atendendo a que aquela comarca era muito trabalhosa.
Mas, Sr. Presidente, nós não podemos seguir êsse critério, porquanto o que predomina em todos os ramos do serviço público é a antiguidade.
Se formos abolir êste princípio, vamos derruir tudo quanto se acha estabelecido. E tanto assim que, para a vaga de um general, não se vai nomear um major ou capitão, mas sim um coronel, isto é, a promoção é feita por antiguidade e só deixa de ser nomeado o militar da classe imediatamente inferior quando, por acaso, se não encontra em condições físicas de desempenhar êsse lugar que se encontra, vago. Quando isso acontece, o funcionário é submetido a um exame médico, que é dá por inepto, pelo que é reformado.
De maneira que êsse argumento também não procede.
Se se entende que os indivíduos mais idosos são os menos competentes para o desempenho de qualquer cargo, então vai-se de encontro a tudo quanto se acha estabelecido como bom, relativamente a promoções.
Se o indivíduo a que se referiu o Sr. Artur Costa não tinha as condições físicas necessárias para o lugar onde tinha sido provido, êle devia ser submetido a um exame médico, segundo a lei que regula a promoção dos funcionários de justiça, e assim se dava completa satisfação à lei, procedendo-se com a mais completa e inteira moralidade.
Se, porventura, se adoptasse o critério de S. Exa., quando vagasse o lugar de escrivão de Braga, por exemplo, era ali colocado o que menos provas de competência tivesse dado, além de ser o mais novo.
Ora eu, entre colocar num certo cargo um indivíduo que conquistou o direito à promoção pelos seus serviços, e a nomeação de um outro, que nenhuns serviços prestou, que nenhumas provas de merecimento e moralidade deu, preferiria nomear o mais antigo, porque êste não ficava colado ao lugar emquanto fôsse vivo. Desde o momento em que as suas condições físicas e jurídicas o impedissem de continuar a exercer o seu lugar era mandado submeter a um exame e, se fôsse dado por incapaz, era aposentado.
Logo, o caso citado de haver um escrivão nomeado para uma comarca, apesar da sua idade ser avançada, e que não tinha as suficientes condições físicas para o exercer, não é o bastante para se estabelecer que o Ministro pode nomear livremente qualquer escrivão de finanças;
Mas alega-se também que as transferências feitas nos lugares de tesoureiros de finanças de 2.ª classe para 1.ª, de 3.ª para 2.ª e de 4.ª para 3.ª classe, trazem como consequência o serem providos, interinamente, quatro indivíduos como secretários de finanças, p que, na época que atravessamos, que é de economias, não é de boa administração, e traz ainda como consequência, segundo a opinião do Sr. Ribeiro de Melo, a necessidade de fazer o inventário e balanço dos cofres, e daí despesa para o Estado.
Ora, não é assim. A lei diz o contrário. É preciso que quem discute conheça a lei, pois, de contrário, não diz cousas acertadas. Êste assunto está regulado pelo artigo 2.° do decreto n.° 6:496, responde
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terminantemente às observações de S. Exa. Uma vaga não dá lugar a quatro interinidades, só dá lugar a uma, porque nenhum tesoureiro de finanças pode abandonar o seu lugar sem que esteja presente o seu sucessor.
Na justiça é assim.
Um juiz de 1.ª classe que seja promovido à Relação, no dia em que o despacho vem publicado entrega a vara. O mesmo se dá em relação a um juiz de 2.ª classe promovido à 1.ª Para a magistratura é assim, mas para os tesoureiros de finanças já assim não é: o proprietário do cargo que é promovido, transferido ou aposentado, conserva o cargo até que apareça o seu sucessor. A mudança de funcionários não importa nomeação de interinos.
Não vejo inconveniência alguma em que se nomeiem os mais antigos que são, até, em regra, os mais competentes. Um ou outro caso isolado, que se possa apresentar em desabono dêste princípio não colhe, nem justifica que se altere a lei vigente, nem que se dêem essas interinidades porque, sempre que um funcionário seja promovido, transferido, aposentado ou concedida licença ilimitada, conserva o seu lugar até que o seu sucessor se apresente a tomar conta do cargo.
Eu desejaria. Sr. Presidente, que os funcionários militares, que têm assento no Senado, dissessem, se amanhã se dêsse uma vaga de coronel, se achavam bem que fôsse promovido para essa vaga um capitão; se achassem bem esta doutrina, e se me respondessem afirmativamente, preguntar-lhes-ia para que havia de haver um princípio para um caso e não devia haver para outro. No exército não há, em regra, promoções por distinção; é tudo por antiguidade, princípio êste que todos os militares respeitam e aceitam. Ora, porque é que essa antiguidade, que faz lei, ou convém ao exército que a aceita e aplaude, não há-de ser também aplicada aos tesoureiros de finanças? Evidente que quem tal doutrina defende tem pouco desejo de acertar. Haverá, porventura, algum funcionário do Terreiro do Paço, que ocupe a categoria de primeiro oficial, que aceite como bom, justo e razoável que, em uma vaga de primeiro oficial, possa o Ministro nomear livremente um simples amanuense?
Da mesma forma poderá haver alguém na justiça, que admita que, para uma vaga de juiz de Relação, possa ser promovido um juiz de 2.ª classe?
Mas é necessário verem-se estas cousas com os olhos abertos, com sinceridade, e não querer abrir uma excepção para os tesoureiros de finanças, quando a lei geral estabelece a promoção por antiguidade em todos os outros ligares de funcionários públicos.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Senadores, esta questão tem também o aspecto moral, que é importantíssimo.
Todos nós sabemos que neste país se tem traficado muito. É vulgaríssimo um escrivão de 3.ª classe trocar com outro de 1.ª, um solicitador de uma comarca da província trocar com outro de Lisboa, e assim sucessivamente. Toda a gente afirma que não se pode ocupar actualmente um lugar de notário em Lisboa, que não seja por meio de negócio. E tanto assim é, que um colega meu me disse uma ocasião que, durante muito tempo, tivera princípios de moral, andando bastante tempo a solicitar de um Ministro a sua colocação em Lisboa, mas depois de alguns meses de espera resolveu-se a fazer o negócio, para o que tratou de averiguar, por pessoas das suas relações, quem é que desejava trocar com êle. Obtida essa informação, dirigiu-se à pessoa e preguntou-lhe quanto queria ela pelo lugar. Chegados que foram a um acôrdo, entregou-lhe a quantia pedida, e cá está em Lisboa.
Na classe do notariado sustenta-se, como princípio, que não se alcança um lugar que não seja por dinheiro, e muito.
Para se arranjar um lugar de escrivão da Boa Hora é regra geral que tem de ser pago a dinheiro.
O Sr. Pais Gomes: - Mas êsses negócios são entre os próprios interessados. O Estado não entra neles.
O Orador: - Sem duvida; êsses negócios passam-se absolutamente entre os próprios interessados, até que recentemente foi publicado um decreto regulando as transferências, e, por sequência, a permuta.
Sempre que o Ministério da Justiça sabia que havia ofertas de dinheiro por qual-
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quer lugar de justiça opunha-se terminantemente a essas transferências, mas a verdade é que elas se faziam.
Ora, essas negociatas, que se têm feito entre tesoureiros de finanças, vão passar-se agora a repetir. Quero dizer, até aqui a porta estava fechada, mas daqui em diante vai abrir-se toda, para que se negocie à vontade.
Bem sei que não foi esto o intuito de quem apresentou o projecto, nem é esta a idea de quem o defende, mas eu não quero saber de intenções, olho apenas às consequências fatais, que daqui resultam.
Se êste projecto fôr convertido em lei, bem pode acontecer que eu amanha, sendo, por hipótese, tesoureiro de finanças em Coimbra, e haja um sujeito que pretenda o meu lugar, e cujo pai tenha meia dúzia de contos de réis, como eu já estou cansado, o pretendente procura-me e pregunta-me se quero vender o lugar. Digo-lho que sim, e fixa-se a importância a dar, 20.000$ ou 30.000$.. Parte-se para Lisboa, e como o Ministro não tem de abrir concurso, e o pretendente se faz acompanhar de um padrinho político, que anda em tudo na melhor boa fé, procura o Ministro, apresenta o que deseja ser exonerado, e o amigo pretendente do lugar, dizendo que êste é filho de um correligionário com grande influência em Coimbra, e o Ministro em vinte e quatro horas consuma a negociata, nomeando o pretendente. Faz-se isto no gabinete do Ministro, na presença do tesoureiro de finanças, do pretendente e do padrinho dêste.
Ora, o que se deseja com o projecto é abrir êstes escândalos, praticar estas imoralidades? Se querem isso, digam-no francamente, porque então todos sabem o que votam.
Repito, não foi êste o intuito do autor do. projecto, não são estas as intenções dos que o defendem, mas os resultados são êstes, e quem votar êste projecto tenha a certeza do que pratica um acto de imoralidade, a quem o rejeitar pratica um acto que o nobilita.
Mas, como se os argumentos apresentados pelos que defendem o projecto não fôssem suficientes, apresenta-se como era de pêso o de ser necessário defender as instituições.
Oh! Sr. Presidente, mal vai para a República se ela tem de recorrer a êste projecto (Apoiados) para se defender. Isto é um recurso extremo, é um recurso que só se poderia tomar no caso dos inimigos da República estarem na rua lutando contra ela. Mas não, êles estão aqui nesta Câmara bem sossegados.
Só no caso de vermos flutuar a bandeira monárquica, é que se poderia lançar mão dêsse recurso, e então até seria o primeiro a votar a confiscação dos bens dos nossos inimigos.
Mas emquanto as instituições estiverem radicadas no espírito do povo, estou convencido que não precisamos dó medidas desta natureza.
Isto dá a impressão de fraqueza dum regime.
Quando a República tem uma legislação administrativa e técnica conquistando para as classes garantias várias, aparece um ilustre membro a querer derruir essas conquistas.
Vemos que há indivíduos, que não são nada republicanos em lugares de confiança administrativa, porque se diz que êsses indivíduos são da confiança de quem os nomeou, não olhando aos seus ideais políticos.
O que só dá em relação às autoridades administrativas, dá-se até com comandantes de certas unidades, pois que já ouvi dizer que o actual comandante da guarda republicana não é um republicano dedicado, mas que é um cavalheiro de tal carácter que, em quanto se encontrar à frente da mesma guarda, há-de ser sempre fiel e obediente às instituições republicanas. Mas também compreendo que o Govêrno devia escolher para seu representante junto dos tribunais criaturas da sua confiança.
Mas para tesoureiro exigir-se a confiança do Govêrno, para quê?
O que é preciso é que se seja um homem honesto.
Em questão de honestidade não temos de atender a política.
Quem desempenhou, dez anos um lugar de tesoureiro de finanças, e foi sempre pontual, êsse indivíduo tem a seu favor um passado correctíssimo de isenção, que garante o seu futuro.
Se é um lugar para receber dinheiro, gaias, para que é preciso que seja-
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da confiança da República? Evidente, mente que não.
Há 308 tesoureiros de finanças; se há entre êles caem seja republicano, também há quem o não seja.
Mas com êste projecto, certo é que vamos arranjar mais inimigos.
Considerado sob o ponto de vista político, ainda é nefasto à República.
Se se tratasse duma colocação de professores, em que a legislação é das mais perfeitas, em que a acção do Ministro é automática, limitando se a chancelar LS informações das repartições que D revêem todos os casos. Mas emfim, admito quem, nesta parte, faça observações, porque do ensino depende o futuro duma criança, e um professor, em vez de seguir doutrina liberal, pode manifestar-se contra as instituições, inoculando nas crianças ideas contra o regime.
Para o caso das nomeações de professores ainda admitia que o Ministro tivesse uma relativa liberdade para nomear os professores, mas numa questão de finanças em que um empregado está apenas encarregado de receber e pagar, não vejo que mal possa vir para a República do facto de êle não ser republicano.
Após a implantação da República, como já disse, as colocações nas vagas de tesoureiros de finanças foram reguladas pelas leis de 1911, 1913, 1915 e 1920, e em todos êsses quatro diplomas se estabelecia que, havendo uma vaga, seriam preferidos, em primeiro lugar, os tesoureiros de finanças, e só para as vagas de tesoureiro de 3.ª e 4.ª classe é que poderiam ser nomeados indivíduos, que não fôssem tesoureiros, mas que estivessem em determinadas condições.
O estabelecido neste projecto é absolutamente novo, e não tem nada em que se apoie na legislação da República; é ume, innovação, mas uma innovação prejudicial aos interêsses do Estado, e uma innovação, a meu ver, imoral.
Os argumentos com que aquele lado da Câmara pretendeu defender o projecto, são todos absolutamente improcedentes, como já tive ocasião de demonstrar.
Não há o inconveniente apontado pelo facto das tesourarias estarem algum tempo vagas, visto que nenhum tesoureiro pode ir ocupar êsse lugar sem que haja um substituto para o lugar que êle deixou.
Quanto ao caso de possíveis desvios de dinheiro, também êsse argumento não tem valor, visto que ainda não se deu caso alguma dessa natureza.
Igualmente não tem valor o argumento apresentada de que era preciso defender o regime, porque se um tesoureiro de finanças não fôr afeiçoado à República nenhum inconveniente advirá porque êsse lugar não é político, e em cargos de maior importância nunca se tem exigido atestados de republicanismo a ninguém.
O que é que fica das razões apontadas por aquele lado da Câmara? Não fica absolutamente nada; tudo caiu.
Nós a ser aprovado êste projecto, vamos colocar na mão do Ministro uma arma de que êle poderá fazer um bom uso, como eu faço, por exemplo, um bom uso de um canivete para aparar os lápis, mas de que também poderá fazer um mau uso, prejudicando uns e favorecendo outros.
Encarado, portanto, êste projecto, pelo lado técnico, pelo lado moral, ou pelo lado político não passa absolutamente duma verdadeira imoralidade.
Há casos em que compreendo que em volta dêles haja um interesse político, mas, neste caso. não vejo nada especial, que possa justificar o interêsse, que aquele lado da Câmara mostra na sua aprovação.
Por minha banda, declaro-o bem altamente, combato-o com toda a sinceridade, porque acho que é uma imoralidade.
Sr. Presidente: ainda compreendia que aqueles que defendem êste projecto estivessem convencidos de que êle traria vantagem; mas, depois das minhas considerações, e das razões que aqui tenho apontado, não vejo razão para que ainda assim pensem..
Para que se não diga que não quero até certo ponto facilitar a acção do Ministro, quando tiver de fazer qualquer colocação, eu, para o caso de o projecto não ser rejeitado na sua generalidade, mandarei para a Mesa urna proposta.
A lei manda fazer concursos para qualquer vaga de 1.ª, 2.ª, 3.ª e 4.ª classe, e eu na proposta admito que continuem os concursos para 1.ª, 2.ª e 3.ª classe apenas nas condições em que está presentemente regulado.
Só para a 4.ª classe é que admito
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que os Ministros nomeiem livremente entre os indivíduos a que se refere êste artigo.
Proponho que o artigo 1.° do projecto seja emendado nos seguintes termos:
Vaga qualquer tesouraria de fazenda pública, de 4.ª classe, poderá o Govêrno prescindir do concurso a que se refere o artigo 9.° do decreto n.° 7:027-A, de 15 de Outubro de 1920, e prover logo o cargo, nos termos do artigo 5.° do mesmo decreto. - Joaquim Crisóstomo.
Foi admitida.
O Sr. Presidente: - Fui procurado, há pouco, por uma grande comissão de. habitantes da província de Moçambique, quê veio apresentar as suas homenagens ao Senado e agradecer a atitude que esta Câmara tomou na última sessão, a propósito da questão de Moçambique.
Declarei-lhe que nos era particularmente grato receber tal manifestação, por ser um caloroso gesto de patriotismo.
Vozes: - Muito bem.
O Sr. Herculano Galhardo: - Pedi a palavra a fim de mandar para a Mesa a seguinte
Proposta
Proponho a substituição do Sr. Alves de Oliveira, durante o seu impedimento, pelo Sr. Fernandes de Almeida. - Herculano Galhardo.
O Sr. Pereira Gil: - Sr. Presidente: começo por pedir à Câmara que me releve o falar pela terceira vez sôbre o projecto em discussão.
Não tirarei, porém, muito tempo ao Senado.
Mal imaginava eu, ao apresentar êste simples projecto, que êle havia de levantar tanta celeuma por parte da oposição, e que ela se devia erguer toda na defesa dos princípios que aqui tem sustentado.
Mas, que princípio são êsses?
E por acaso o princípio do mérito, da competência, do zelo pelo serviço público?
É o princípio do amor da Pátria, da defesa da República?
Nada disso.
É apenas o princípio da antiguidade pura e simples.
Notem bem V. Exas.: da antiguidade pura e simples.
Mas, vem por acaso êste princípio de muito longe?
Virá por acaso do tempo do Marquês de Pombal, de Mousinho da Silveira, de Hintze Ribeiro, de João Franco, ou, ao menos, de Afonso Costa?
Não êle vem apenas do decreto n.° 7:027-A, de 15 de Outubro de 1920.
V. Exas. sabem bem que êstes decretos de números seguidos de letras têm sido um pouco escabrosos para a República.
Êste princípio da antiguidade pura e simples, tem pouco mais de ano e meio.
É isto que querem se continue a aplicar, e que já se aplica com verdade dêste decreto.
E como foi aplicado êste princípio de antiguidade?
Não foi como há pouco disse o Sr. Joaquim Crisóstomo, promovendo da 4.ª à 3.ª, da 3.ª à 2.ª e da 2.ª à 1.ª classes, não foi nada disso.
Isto ainda se compreendia, se houvesse um quadro organizado.
Quando se estabeleceu o decreto n.° 7:027-A bem sabiam êsses legisladores, que não se podia aplicar aos tesoureiros êste princípio da organização dum quadro, porque, como S. Exa. acentuou bem, não precisam de grandes habilitações e de grandes cursos para desempenhar êsse lugar; basta que sejam honestos, honrados e considerados na sua terra.
É por isso que se escolhem as pessoas de bem, as pessoas consideradas nos seus meios como sendo da maior honorabilidade, porque acima da caução, como bem disse o Sr. Augusto de Vasconcelos, está a consideração que o indivíduo goza na sua terra, e a sua honestidade.
O legislador bem sabe isto, não teve coragem de organizar um quadro, porque não podia, êle sabia que a maior parte dos tesoureiros estavam contentes, e não queriam sair de onde estavam, pois ao aceitarem o lugar era apenas para ali se conservarem.
Então o que se fez?
Arranjou-se a antiguidade para quê?
Para organizar uma lista em que figura A, B, C, etc.
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O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Qual o resultado disso?
O Orador: - Vai ver; mas vamos à parte moral, Sr. Joaquim Crisóstomo; eu declaro - e custa-me fazer esta declaração - que não recebo lições de moral de quem quer que seja.
Vamos à técnica do decreto n.° 7:027-A, ainda há quatro ou cinco dias veio um aviso no Diário do Govêrno abrindo concurso para a tesouraria de S. João da Pesqueira, que é de 3.ª, podem concorrer a ela todos porque todas as classes podem concorrer à 3.ª, o que mostra bem que não há lei hierárquica e portanto, não há quadro de tesoureiros.
O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo): - Todos podem concorrer.
O Orador: - Por isso mesmo; mas vamos ver o que sucede no regime do decreto n.° 7:027-A e com a tal lista de antiguidades, que êle manda seja publicada anualmente.
Está em concurso o lugar de tesoureiro de S. João da Pesqueira, o tesoureiro P é daquela região que há muito pensa em ir para lá e quere concorrer; mas o F, que está adiante do P, escreve lhe ou manda-lhe dizer: V. Exa. tem muita vontade em ir para S. João da Pesqueira; eu sou mais velho e também queria concorrer, a não ser que... V. Exa. compreende?
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Para isso era preciso muita coragem, isso era um acto para meter na cadeia.
O Sr. Augusto de Vasconcelos: - Isto é um caso previsto pelo Código Penal.
O Orador: - Será, mas essas cousas dificilmente se provam e ficam sempre livres do Código Penal.
Eu simplesmente quero acentuar, que a técnica do decreto, em questão, se presta a estas manigâncias.
Há também outros casos previstos no Código e que se não podem evitar.
Mas vamos a outra hipótese:
A lista de antiguidades mostra que o Sr. A é tesoureiro em Calheta. Vislumbra-se no horizonte uma vaga em Lisboa. Começam lego os pedidos do Pôrto, de Braga, de Coimbra junto de A para que concorra. Êle está velho, suponhamos, e não quere sair de lá, mas são tantas as instâncias e promessas que êle cede, e cede ao tesoureiro do Funchal, talvez porque êste está mais próximo e o soube melhor convencer, vista a urgência que êle tem em sair do Funchal. Depois de A ser tesoureiro em Lisboa, como o decreto também permite as permutas, troca com o do Funchal; êste em Lisboa, como é do norte e para lá lhe couvém ir, troca com e do Pôrto.
Aqui tem a Câmara as contradanças a que pode dar ocasião o decreto, sem falar nas interinidades sucessivas, que se podem dar, e que deixam a descoberto o Estado, visto os interinos não prestarem caução e nas despesas que acarretam, por isso que, na transição duma tesouraria para outra, é necessário comparecer um empregado superior que ganha ajudas de custo e transportes, o que representa algumas centenas de contos por ano.
A técnica do meu projecto é simples. Em vez do Ministro servir de chancela do que as repartições lhe apresentam, fica com a liberdade do escolher entre os indivíduos, que estão, nos termos, do artigo 5.° do decreto n.° 7:027-A, aquele que julgar mais idóneo para o lugar. Assim evitam-se muitas interinidades e despesas, e, visto que aos Ministros temos de lhe exigir aqui responsabilidades, dêmos-lhes liberdade e latitude para agirem como melhor convenha aos interêsses do Estado.
Nestas condições, penso que o meu projecto merece a aprovação do Senado.
O Sr. Augusto de Vasconcelos: - Sr. Presidente: eu também não esperava entrar na discussão dêste projecto, confesso, mas o caminho que esta discussão tem seguido impõs-me o dever de o fazer.
Porque é que eu o faço? £ Porque é que eu tenho tomado a peito a discussão dêste projecto?
O Sr. Pereira Gil sorriu-se dos imortais princípios, que eu, invoco, e que têm sido invocados dêste lado da Câmara.
Mal vai numa Câmara democrática, que nós comecemos a rirmo-nos dos imortais princípios.
Mal vai que nós púnhamos de banda aqueles princípios porque lutámos du-
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rante a vigência do extinto regime; foram êsses que nós sustentámos, foram êles que me levou a falar sôbre êste projecto. O que me doe, com a sua apresentação, é que nós estejamos, republicanos, a deitar abaixo, pedra a pedra, aqueles princípios que sustentámos durante a propaganda, e que constituíram a base e o cimento dos ideais republicanos.
É por isso que eu me levanto contra êste projecto.
Diz o Sr. Pereira Gil: mas que princípio é que os senhores querem pôr de banda? é a antiguidade?
Não é, Sr. Pereira Gil, é outra cousa muito mais grave., é a garantia que os funcionários têm de que o arbítrio não se exerça contra êles. E é contra isso que eu me revolto.
Que seja a antiguidade, que seja a competência, que seja qualquer outro critério que possa promover os empregados, dando-lhes todas as garantias que à sua promoção se confere, segundo a lei, muito bem. Mas que se ponha tudo de banda, e que se entregue tudo ao arbítrio do Ministro, não. Isso é que, me doe, como me doeu que quem estivesse aqui a defender os princípios sãos e democráticos fôsse o Sr. Querubim Guimarães, representante do partido monárquico, contra o Sr. Ribeiro de Melo, representante da parte mais avançada do Partido Democrático. Quem sustentava os princípios republicanos era um monárquico e isso é que eu sinto como republicano.
Nós estamos um pouco a esgrimir com os moinhos; êste projecto de lei está morto, disse-o o Sr. Joaquim Crisóstomo, e disse-o muito bem, desde que o Sr. Ministro das Finanças, ali naquela cadeira, disse que não concordava com a doutrina do projecto, e que desejava que se mantivesse o princípio da antiguidade.
Êste projecto está morto, poderá passar porventura aqui no Senado, mas ainda que passe aqui, não passa na Câmara dos Deputados, porque suponho que a Câmara dos Deputados saberá manter êsses princípios de que o Sr. Pereira Gil se sorriu.
Quais foram os argumentos que aqui se invocaram para a defesa do projecto?
A defesa da República!
Foi o único e substancial.
Ora eu já aqui tenho dito, e é preciso acentuá-lo; a defesa da República não se faz pondo de banda os princípios em que ela se fundou; faz-se exactamente mantendo íntegros êsses princípios.
Se nós tiramos aos funcionários as únicas garantias, que lhes podem ser dadas, para que não fiquem sujeitos ao arbítrio ministerial, pregunto: é isto fazer a defesa da República?
Disse o Sr. Ribeiro de Melo, dirigindo-se aos senadores monárquicos: Porque os Srs. não fizeram essa defesa, é que o regime caiu.
Ora, não foi assim. Foi porque se não fez a defesa das garantias de todos, é que êsse regime caiu, e não porque se respeitassem êsses princípios.
Sr. Presidente: a análise do projecto, em todas as suas modalidades, foi de tal modo feita pelo Sr. Joaquim Crisóstomo, que não vou repetir o que S. Exa. também disse. Os argumentos alegados por S. Exa. estão todos de pé; e a êstes, que acabo de juntar, como antigo republicano e leader de um dos partidos da República, também nada se opôs.
Não compreendo que se aprove um projecto, que vai deitar abaixo a verdadeira legislação, de que foram autores os Srs. Afonso Costa, António Maria da Silva e Vitorino Guimarães. E exactamente dêste lado da Câmara que se defendem os decretos dos homens, que respeitaram os bons princípios democráticos.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito.
Pausa.
Vai ler-se a proposta de emenda do Sr. Joaquim Crisóstomo.
Lida na Mesa a proposta, foi rejeitada.
O Sr. Alfredo Portugal: - Requeiro a contraprova.
Tendo-se procedido à contraprova, foi confirmada a primeira votação.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o artigo 1.°
Lido na Mesa o artigo 1.°, foi pôsto à votação, sendo aprovado:
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o artigo 2.°
Leu-se.
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O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Devo dizer a V. Exa. que o projecto se discutiu na generalidade e na especialidade.
O Sr. Alfredo Portugal (para interrogar a Mesa): - Parece-me que há uma confusão da presidência.
Quando há tempo o Sr. Joaquim Crisóstomo interrogou a Mesa sôbre se o projecto, era discutido na generalidade e na especialidade, foi-lhe respondido que era só na generalidade, visto haver um artigo novo.
O Sr. Presidente: - O presente projecto começou a ser discutido numa sessão a que eu não assisti. Imaginei que tivesse sido pôsto à discussão na generalidade e na especialidade, como é costume, visto só ter dois artigos. Mas, dadas as circunstâncias a que acaba de aludir o Sr. Alfredo Portugal, eu vou conceder a palavra ao Sr. Joaquim Crisóstomo.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Pedi a palavra simplesmente para fazer uma ligeira observação à forma como está redigido êste artigo 2.º, redacção que a comissão adoptou e com a qual não concordo. Aqui diz-se: "Ficam revogadas todas as legislações em contrário". Eu entendo que bastaria dizer: "Fica revogada a legislação em contrário". Acho supérfluo que se ponha a palavra "todas", salvo se há o receio de que aprovando-se, como eu entendo que devia ser, ainda possa vigorar algum artigo que vá contrariar o presente projecto.
Envio para a Mesa a minha
Proposta de eliminação
Proponho que seja eliminada a expressão "todas" empregada no, artigo 2.º do projecto em discussão. - Joaquim Crisóstomo.
Foi admitida.
O Sr. Godinho do Amaral: - Pedi a palavra a fim de mandar para a Mesa o parecer da comissão de verificação de poderes relativo à eleição de dois Senadores pelo distrito do Funchal.
O Sr. Presidente: - Há uma proposta da comissão de administração pública. Chamo a atenção da Câmara par r a circunstância de se achar na Mesa a proposta do Sr. Joaquim Crisóstomo, que vou novamente mandar ler.
Lê-se na Mesa e foi aprovada, seguindo-se a da comissão, que igualmente foi aprovada, salva a emenda.
O Sr. Pereira Gil: - Peço a V. Exa. que consulte o Senado sôbre se concede dispensa da leitura da última redacção para o projecto que acaba de ser votado.
Foi dispensada.
O Sr. Silva Barreto: - Sr. Presidente: consta da ordem do dia a proposta de lei n.° 115, que permite extinguir uma das escrivanias da comarca de Loulé, de que resulta uniu economia para o Estado. Peço a V. Exa. para consultar o Senado sôbre se permite que entre já em discussão êsse projecto.
Foi permitido.
Leu-se na Mesa o parecer da comissão de verificação de poderes sôbre a eleição de dois Senadores pelo distrito do funchal.
O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Senadores a levantarem-se. Proclamo Senadores pelo distrito do Funchal os Srs. César Procópio de Freitas e Vasco Crispiniano da Silva.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para discussão, a proposta de lei n.° 115.
Leu-se. É a seguinte.
Proposta de lei n.° 115
Artigo 1.° É extintas estando vaga, ou quando vagar, uma das escrivanias da comarca de Loulé, passando para ela o escrivão do quinto ofício, se não preferir ficar com o seu cartório e com a numeração do ofício extinto.
§ único. Em qualquer caso os papéis do ofício que deixar de funcionar serão distribuídos pelos restantes ofícios.
Art. 2.º O oficial de diligências acompanhará o seu escrivão para o cartório onde êste fôr servir.
§ 1.° Se antes de vagar o lugar de escrivão vagar o de oficial de diligências,
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deverão os restantes oficiais fazer todo o serviço.
§ 2.° Vagando primeiro o lugar de escrivão, o serviço será igualmente distribuído pelos cinco oficiais, conforme determinação do juiz de direito, e sob superintendência dêle.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, Junho de 1922. - Domingos Leite Pereira - Baltasar de Almeida Teixeira.
Senhores Senadores. - A vossa comissão de legislação civil do Senado dá o seu parecer favorável à proposta de lei n.° 115, pois não se compreende que uma comarca com pouco movimento tivesse cinco escrivães; já quatro é de mais, mas cinco, na época que atravessamos, em para morrerem de fome.
De resto não há prejuízo para ninguém, antes beneficia os outros escrivães, e não prejudica a acção da justiça; portanto aprovamos a proposta de lei, o que não é novo no nosso país.
Sala das sessões, 12 de Junho de 1922. - João Pessanha Vaz das Neves - Joaquim Pereira Gil - Joaquim Crisóstomo (com declarações) - Godinho do Amaral, relator.
Parecer n.° 48
Senhores Deputados. - A vossa comissão de legislação civil e comercial é de parecer que merece a vossa aprovação o projecto de lei n.° 16-B da autoria dos ilustres Deputados Estêvão Aguas e Velhinho Correia.
Não se compreende, na verdade, que a comarca de Loulé tenha cinco ofícios, com o movimento judicial que tem tido nos últimos tempos. Quatro ofícios são talvez já de mais; mas cinco; nada há que o justifique.
Existe, de resto, uma vaga de escrivão naquela comarca.
Nestas condições, concordando com o referido projecto, a vossa comissão tem a honra de o recomendar à aprovação de V. Exas., com as seguintes modificações:
No artigo 1.°: intercalar entre as palavras "extinta" e "quando", as seguintes: "estando vaga ou".
No § 1.° do artigo 2.°, substituir a palavra "poderão", pela "deverão", e eliminar as palavras "se assim o declararem perante o respectivo juiz de direito, e neste caso não será preenchida a vaga".
O § 2.°, eliminado.
No § 3.°, eliminar as palavras "se o seu oficial tiver sido nomeado anteriormente á esta lei", que são absolutamente desnecessárias, em consequência das modificações propostas ao § 1.° do artigo 2.°
Sala das Sessões, 24 de Abril de 1922. - Costa Gonçalves - Angelo Sampaio e Maia - Adolfo Coutinho - José Marques Loureiro - Pedro Pita.
Senhores Deputados: - A vossa comissão de legislação criminal julga conveniente a supressão dum ofício na comarca de Loulé, sendo por isso de parecer que o projecto de lei n.° 16-B merece a vossa aprovação, com as modificações propostas pela comissão de legislação civil e comercial;
Sala das Sessões, 10 de Maio de 1922. - Alberto de Moura Pinto - Carlos Pereira - João Bacelar - Baptista da Silva - Adriano António Crispiniano da Fonseca, relator.
Projecto de lei n.° 16-B
Senhores Deputados. - Teve a comarca de Loulé grande movimento judicial, que tem diminuído por várias razões, entre as quais a de criação de novas comarcas e maior facilidade de comunicações ferroviárias para a sede de outras;
A comarca tem cinco ofícios, número superior a êsse movimento e, por isso, origem de dificuldade para a vida dos respectivos serventuários.
Está, pois, naturalmente indicada a supressão dum ofício, quando vagar.
Nestas condições temos a honra de apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É extinta, quando vagar, uma das escrivanias da comarca de Loulé, passando para ela o escrivão do quinto ofício, se não preferir ficar com o seu cartório e com a numeração do ofício extinto.
§ único. Em qualquer caso os papéis do ofício que deixar de funcionar serão distribuídos pelos restantes ofícios.
Art. 2.° O oficial de diligências acompanhará o seu escrivão para o cartório onde êste fôr servir.
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§ 1.° Se antes de vagar o lugar de escrivão vagar o de oficial de diligências poderão os restantes oficiais fazer todo o serviço, se assim o declararem perante o respectivo juiz de direito, e, neste caso, não será preenchida a vaga.
§ 2.° Não havendo êste acôrdo, o oficial mais moderno dos nomeados posteriormente a esta lei deixa de servir, quando vagar qualquer escrivania, mas fica com o direito a ocupar o seu lugar novamente quando se der a primeira vaga.
§ 3.° Vagando primeiro o lugar de escrivão, se o seu oficial tiver sido nomeado anteriormente a esta lei, o serviço será igualmente distribuído pelos cinco oficiais conforme determinação do juiz de direito o sob superintendência dêle.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 17 de Março de 1922. - João E. Águas -F. G. Velhinho Correia.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Sr. Presidente: parece à primeira vista muito simples a doutrina dêste projecto, mas não o é nas suas consequências, e nos seus fundamentos. Pretende-se com êle suprimir um lugar numa comarca. E com que critério? Com o critério de que os funcionários vencem pouco. Ora, parece que quem apresentou êste projecto desconhece qual é a dotação da comarca de Loulé. Essa dotação, segundo o boletim que aqui tenho presente, é de 2.400$, e por consequência essa base não deve colhêr.
A fazer-se qualquer supressão, devia ter por principio uma reforma geral em bases criteriosas e scientíficas. Isto é que estava indicado.
Com êste projecto apenas se vai beneficiar pessoas certas e determinadas. Ora. nós não devemos aqui fazer leis para beneficiar A, B ou C, conforme as nossas simpatias.
Se o espírito de quem apresentou êste projecto fôsse o de fazer justiça, então melhor seria que se estudasse o que há na organização dos nossos tribunais, para se fazer uma medida geral de interêsse de todos, e não de interêsse especial dêste ou daquele.
Se V. Exa. consultasse a estatística veria, por exemplo, que a dotação do escrivão de Elvas é de 810$.
Se um escrivão em Loulé não pode viver com 2.400$, como é que um escrivão da comarca de Elvas pode viver com 810$?
Um escrivão, do Elvas ganha apenas 810$ e a vida em Elvas é muito mais cara do que em Loulé.
Em Benavente há três escrivães, sendo a dotação de cada um 600$.
Como é que um desgraçado escrivão pode viver com 600$ anuais?
São estas desigualdades que me impressionam, e por isso eu me revolto contra o facto de se ter apresentado um projecto que, devendo ser de interêsse geral, apenas interessa a dois ou três indivíduos.
O que nós devíamos fazer era o seguinte:
Em todas aquelas comarcas onde houvesse três escrivães e a dotação fôsse inferior a 1.200$, devia-se reduzir os escrivães a dois; onde houvesse dois escrivães e a dotação fôsse inferior a 1.200$, devia ser reduzido a um. Assim, sim.
Agora estarmos a legislar não obedecendo a um critério de interêsse geral, mas apenas ao interesse especial dêstes, ou daqueles serventuários das comarcas, isso é que eu não aprovo.
Isto não são leis que visem os interêsses gerais; são leis que visam apenas ao interêsse dalguns serventuários.
Em vez de entrar mais um serventuário para essa comarca, ficam apenas ali quatro serventuários, que distribuirão entre si o bodo.
A comarca da Horta, por exemplo, tem quatro escrivães, que apenas recebem 600$ de dotação.
Pois um escrivão ali pode viver com 600$, ao passo que em Loulé não pode viver com 2.400$, isto é, quatro vezes mais!
A comissão de legislação da Câmara dos Deputados, como a desta Câmara, não entendeu que devia alargar a supressão de cartórios, abrangendo todos aqueles em que fôsse justo aplicar êste
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A comarca da Horta, por exempla, ficaria muito bem com dois escrivães, e êsses dois escrivães, segundo a dotação actual, passariam a vencer 1.200$.
Uma lei destas devia ter um fim amplo e não visar apenas interêsses meramente particulares.
Esta lei, uma vez posta em execução, vai mais visar interêsses particulares do que interêsses públicos.
Êstes funcionários que vivem numa terra da província, onde a vida é relativamente mais barata não ganham apenas os 2.400$.
Êsses funcionários recebem de serviços extraordinários que fazem, e recebem muitas vezes gratificações das partes para o andamento mais rápido dos processos.
Nós não podemos averiguar precisamente quanto ganha um escrivão no exercício das suas funções.
Embora, como já disse, um escrivão da comarca de Loulé tenha de dotação 2.400$, êle recebe muito mais sabendo-se que as custas de inventário são de harmonia com o valor dos inventários, e o valor da propriedade tem aumentado seis e oito vezes, e portanto os emolumentos e salários dos escrivães, aumentaram pelo menos em 50 por cento.
Não ganham, portanto, apenas o que aqui está consignado.
Vou referir-me à comarca de Tavira.
Nessa comarca há quatro escrivães, cada um dos quais ganha 840$.
Estranho que os autores dêste projecto, que são Deputados pelo Algarve, se tivessem lembrado somente da comarca de Loulé, e que tivessem apenas lançado os seus olhos misericordiosos para os quatro escrivães de Loulé, esquecendo os quatro escrivães de Tavira.
Lamento que êles não tivessem, pelo menos, suprimido dois lugares de escrivães desta comarca.
Ora podia ter ido um pouco mais além o autor do projecto e chegar a Vila Real; há lá três escrivães, cada um com 670$, quere dizer, o autor do projecto fixou apenas a sua atenção em Loulé, não vai às outras comarcas em que os serventuários de justiça não ganham 2.400$, mas ganham, respectivamente, 750$ e 670$.
Sr. Presidente: quero legislar, estou pronto a concorrer com o meu auxílio, mas quero fazer uma obra útil, consecutiva e moralizadora, no sentido de melhorar e de não piorar, porque a verdade é esta: o mesmo direito que êstes escrivães têm para alcançar concessões também os outros o têm.
Se nós consultarmos os escrivães do país, todos querem a supressão de um cartório na sua comarca; nós não podemos estabelecer leis de excepção.
Neste projecto não são os interêsses da sociedade que vamos defender e acautelar, não são os interêsses do Estado que vamos cuidar, mas sim os interêsses particulares dos serventuários da comarca de Loulé.
Conheço, porque já lá estive exercendo, ainda que incompetentemente, o lugar de delegado, como conheço também o de Funchal e sei que nenhum funcionário do justiça desta comarca recebe tanto como os escrivães de Loulé.
A comarca de Loulé é considerada no Ministério da Justiça como uma das melhores quando ali vaga qualquer lugar há sempre dezenas de pretendentes e eu, se consegui entrar para aquela comarca, não foi devido aos meus merecimentos, nem à minha influência, mas sim pelo conhecimento de um amigo que se interessou, e que foi o Sr. Celorico Gil.
Tive tempo de verificar, durante o tempo que ali estive, que Loulé era uma comarca muito rendosa e pouco espinhosa, porque o civil é que constitui a base principal daquela comarca, quanto a crime que, como se costuma dizer é o êsse, naquela comarca os processos crimes são muito insignificantes, numa percentagem mínima, de maneira que os escrivães têm uma receita respeitável.
Portanto, porque é que se pretende agora vir apresentar ao Parlamento uma lei eliminando um cartório, quando se verifica que os interesses desta comarca são maiores do que em geral são os interêsses de quási todas as outras comarcas do país?
Evidentemente, Sr. Presidente, trata-se dum benefício que deseja somente atender aos interêsses dos serventuários da comarca de Loulé, e não aos interêsses do Estado, e da sociedade.
Trata-se de um benefício a favor de certos indivíduos e não se visa ao interêsse geral da justiça e da sociedade. Não se i com que argumentos se possa defen-
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der isto. Estou convencido de que, se alguém na Câmara dos Deputados tivesse lido detidamente o projecto e tivesse reflectido nele dois minutos, não tinha passado, porque há centenas de escrivães em dez vezes piores circunstâncias que as de Loulé, para as quais se não estabelece providência alguma tendente a benefíciá-los.
Vejamos quais são as razões justificativas consignadas no relatório que precede o projecto.
O projecto não parece ter sido feito agora, parece ter sido elaborado há quinze anos, estando guardado numa gaveta de onde, por várias vezes, passou para uma pasta, sem que nunca chegasse a ser apresentado.
Os autores do projecto não são jurisconsultos, e só assim se explica a sua atitude pela circunstância de desconhecerem o movimento das comarcas e a situação dos escrivãs.
O Sr. Águias é que é possível ter passado por ali, de passagem só, porque a sua trajectória é muito diversa. Portanto, desconhecem as condições do povo, as condições da comarca, nisto são leigos. Se tivessem trocado impressões comido não o apresentavam.
Como representante do país não posso favorecer este projecto, porque a minha consciência, afirma que não devem ser reduzidos êsses cargos.
Estive algum tempo lá, e conheço muito bem essas empregados. São empregados muito zelosos, e por isso não posso votar aqui uma lei que vá contra êles.
Lendo o relatório, eu desejaria preguntar ao autor dêste projecto quando é que foram criadas novas comarcas. Isto é como eu digo, o projecto está feito há vinte anos, e só agora foi apresentado, porque só agora acharam que era a oportunidade. Foi há vinte e quatro anos, no tempo em que era Ministro da Fazenda o Sr. Alpoim, que se fez uma revisão comarca, há vinte anos que os escrivães de Loulé têm o mesmo número do freguesias, e não tiveram ainda de empenhar o casaco para sustentar a mulher e os filhos. A situação dêles não é muito desafogada, mas qual é o empregado público em Portugal que vive numa situação desafogada. E absolutamente êles têm razão. Concordo que haja quatro ou três, mas o que combato neste projecto é a sua especialidade, e a impossibilidade de se evitar que uma lei vá fazer uma injustiça relativa. O argumento da criação de novas comarcas não é bom, porque desde 1900 a única que foi criada foi a de Grândola, logo depois de Monsanto, e a pedido do Sr. Jorge Nunes. Todos, êstes argumentos não precedem; e, se êles não precedem o projecto que neles se baseia, não têm uma base sólida.
Ora, Sr. Presidente, como é que o serviço da uma comarca deminui por haver facilidade de comunicações entre a comarca? O que é o serviço principal de uma comarca? São os inventários, são as acções cívicas, são às cações comerciais, e são principalmente os inventários. É os inventários de que é que dependem? Dependem do falecimento de pessoas que tenham filhos equiparados, interditos ou ausentes. Logo, nada tem o falecimento com as comunicações, que há numa comarca, e nas comarcas limítrofes.
A formação de nova comarca com terreno pertencente a Loulé, perfeitamente se tivesse sido recente, mas falar em meios de transporte com as comarcas limítrofes, não sei o que isso pode provar.
Que a comarca tem cinco ofícios, o que é superior ao movimento - isso era preciso que se demonstrasse com uma certidão relativamente ao número dos processos distribuídos.
Mas os inventários não deminuíram, antes têm sido os mesmos, e até mais pelo desenvolvimento da população, o aumento do valor da propriedade.
Ficam assim reduzidos a zero o que se diz a favor do projecto, que é como que um bilhete de boas festas dado aos escrivães, quando eu não vim para aqui dar bilhetes de boas festas a ninguém, antes vim para legislar subordinado ao critério do bom senso, e não para beneficiar funcionários quando daí não vem bem para a administração pública.
Decerto que vão pedir a palavra o Sr. relator e alguns Srs. Senadores que o acompanham, e que terei muito prazer em ouvir, mas este projecto é tam insignificante que nem merece estas considerações. (Apoiados da esquerda).
Mas, sendo assim também parece que nem deve merecer a aprovação de S. Exa.
Tenho dito.
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O Sr. Artur Costa: - Não tencionava usar da palavra, mas, como o Sr. Joaquim Crisóstomo tocou a nota moral, tenho obrigação de dizer que da parte dêste lado, as questões morais estão acima de tudo. (Apoiados).
Não queremos que dêste lado saia qualquer projecto que não seja justo, porque isso seria contra todos os princípios que professamos aqui.
O que se pretende é tam simples que eu em àparte apoiei o Sr. Joaquim Crisóstomo, quando S. Exa. disse que êle não merecia maiores considerações.
De facto a comarca de Loulé não dá êsses rendimentos fabulosos que S. Exa. lhe atribui.
Efectivamente o Boletim do Ministério da Justiça atribui-lhe a lotação de 2.400$ anuais, e S. Exa. fez o paralelo entre esta comarca e da de Guimarães, e acha que, se em cada uma delas há cinco escrivães com lotação igual, se devia também reduzir os lugares em Guimarães.
Ora em primeiro lugar, as lotações que vêm mencionadas no Boletim são muitas vezes exactas, mas traz muitas também que0estão longe da verdade.
Em segundo lugar, mesmo que os 2.400$, que o Boletim menciona para a comarca de Loulé sejam a expressão da, verdade, e eu presumo que o seja, e tenho bases para poder supor que o seja, porque conheço esta comarca e tive relações com dois escrivães dessa comarca, um dêles, quando estava no fim da vida, mostrou-me o seu livro de contas, verifiquei que a lotação não estava exagerada, mas, supondo que os escrivães fazem 2.400$ por ano, pregunto se isto será exagerado no actual momento, e se porventura os escrivães não têm de fazer as despesas de expediente com papel que se gasta aos montes.
S. Exa. esquece-se disto, mas sabe que é assim, porque é um magistrado e não pode deixar de reconhecer que, mesmo por êste lado é justo o projecto, porque coloca em melhores condições de vida êsses funcionários.
S. Exa. queria que se fizesse o mesmo por todo o país.
Estou de acôrdo, mas eu recordo que, havendo pelo país umas trezentas comarcas, apenas se poderão encontrar vagas, duas ou três, e de nada serviria votar uma lei suprimindo lugares quando não houvesse vagas.
O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo): - Não me parece bem feito o que fez a Câmara dos Deputados em relação ao que V. Exa. quere sustentar.
A Câmara dos Deputados andou previdentemente. Não me solidarizo com as palavras de V. Exa.
Àpartes de vários Senadores, que não foram atendidos,
O Sr. Presidente (agitando a campainha): - Peço ao orador que se dirija à presidência para evitar diálogos, e haver mais facilidade na discussão.
O Orador: - Tem V. Exa. razão, Sr. Presidente.
Pausa.
O alegar-se que o projecto tem em vista beneficiar os quatro escrivães, que ficam na comarca de Loulé, não influi nada. Não é motivo para que nós deixemos de fazer justiça a êsses funcionários, desde o momento em que se não prejudique ninguém. Isso é uma satisfação para todos nós.
A respeito de lotações, há pouco já disse, que foram feitas com uma diversidade espantosa. Há comarcas, como Guimarães, que devem dar para cada escrivão o dôbro da de Loulé.
Aludiu ainda o Sr. Joaquim Crisóstomo a que os escrivães recebem gratificações das partes.
A êste respeito, julgo que tenho um pouco mais de autoridade para falar do que S. Exa., porque fui escrivão perto de dezanove anos. E, sendo-o, nunca recebi na minha banca qualquer gratificação, e, como eu, há muitos escrivães em Portugal.
A quem de ordinário se gratifica, é aos escreventes e aos oficiais do diligências, mas aos escrivães, não.
Na província, então, a instituição de gratificação ainda lá não chegou.
Os oficiais de diligências em Lisboa preguntam logo aos interessados se, além daquilo que está mencionado na tabela, êles lhes darão uma gratificação. Na província não sucede isso; andam a solicitar citações para que possam ir ganhando alguma cousa, e não há ninguém que lhes pague um centavo a mais.
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Digo isto como homem honrado que sou.
Se há um ou outro escrivão que receba gratificações, são poucos.
Quantas vezes mesmo êles perdem ama parte dos seus emolumentos para darem às. viúvas, que vão para ali chorar.
O Sr. Joaquim Crisóstomo parece pertencer ao número daquelas pessoas, que julgam que os empregados de justiça são ladrões, como aqueles bandidos, que assaltam os viandantes nas estradas para os roubarem.
S. Exa. ainda não há muito tempo publicou um artigo bastante injusto contra os oficiais de. justiça, e não me repugna acreditar que S. Exa. está convencido de que a classe dos oficiais de justiça é formada por homens de pouca probidade.
S. Exa. referiu-se ainda ao facto de os escrivães receberem 50 por cento aproximadamente dos seus salários, em virtude de o valor da propriedade ter aumentado.
Ora, devo dizer que as acções comerciais, processos crimes, etc., não estão compreendidos nesses emolumentos extraordinários, que êsses escrivães recebem.
Mas êsses emolumentos a que S. Exa. se referiu não podem de forma alguma dar os 50 por cento.
Diga S. Exa. em sua consciência se julga que isso dá 50 por cento aos oficiais de justiça.
O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo): - Não deve dar, mas dá uma percentagem que não podemos calcular.
O Orador: - Direi mesmo a S. Exa. que essa percentagem é muito inferior a 5 por cento.
Por último, o Sr. Joaquim Crisóstomo disse que considerava, que ficassem apenas existindo quatro escrivães em Loulé, lamentando que em outras comarcas não se fizessem reduções.
Pois se S. Exa. concorda que haja apenas quatro escrivães em Loulé, voto com consciência o projecto.
Eu sou, também, de opinião que é necessário fazer em todo o país uma redução de lugares de escrivães. Mas é preciso acudirmos urgentemente à comarca de Loulé, porque, se se não extinguisse êsse lugar, o Ministério Público tinha de prover êsse lugar.
S. Exa. disse lamentar que em mais algumas comarcas não se fizesse também redução.
Estude S. Exa. êste assunto, e traga aqui um projecto de lei, e verá como nós o estudaremos da melhor maneira possível. Não é por política, que o meu partido vota êste projecto de lei.
Se realmente o partido que está no Poder quisesse fazer alguma questão política dêste projecto, procuraria exactamente que êle fôsse rejeitado para colocar na comarca de Loulé um correligionário seu.
Já vê, pois, S. Exa. que não é com intuitos políticos que nós defendemos êste projecto.
O orador não reviu.
O Sr. Godinho do Amaral: - Poucas considerações tenho a fazer sôbre o projecto, porque elas já foram suficientemente expostas pelo Sr. Artur Costa.
Há um ponto que eu desejo que fique bem acentuado, para que os nossos colegas da outra Câmara, que apresentaram o projecto não possam dum modo fácil ser acusados por uma frase solta, que, a meu ver, não tem grande significado, proferida nesta Câmara pelo Sr. Joaquim Crisóstomo.
S. Exa. declarou que êste projecto era única e simplesmente feito pelos ilustres deputados apresentantes para beneficiar certas e determinadas pessoais. Evidentemente que o projecto suprimindo um lugar é para beneficiar alguém.
Estou certo de que S. Exa., ao proferir a sua frase, não quis de forma alguma magoar o ilustre deputado apresentante dêste projecto.
Afinal o Sr. Joaquim Crisóstomo deu o seu apoio ao projecto, dizendo também que isto deveria ser aplicado a outras comarcas.
Pode S. Exa. ter a certeza de que eu estou completamente de acôrdo com essa idea. O que não é justo, porém, é vir argumentar com o facto de Tavira estar nas mesmas condições dos de Loulé, e não se ter reduzido o número de escrivães.
Se assim é, S. Exa. bem faria mandando uma emenda nesse sentido.
Êste projecto não prejudica ninguém.
Pelo contrário, beneficia uma classe, e nós, que temos actualmente a preocupa-
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ção de reduzir os quadros, devemos votar o projecto, pois, reduzindo o número de escrivães, escusamos de estar constantemente a aumentar a tabela de emolumentos e salários judiciais.
Estou convencido de que êste projecto será aprovado por toda a Câmara.
O Sr. Machado Serpa: - Sr. Presidente: acho tam aceitável a doutrina dêste projecto de lei, que desejo ampliá-lo à comarca da Horta, que represento nesta casa do Parlamento.
Essa comarca era classificada de 1.ª classe e passou, por virtude das disposições que regulam a classificação das comarcas, a 2.ª classe, por não ter movimento que justifique a comarca de 1.ª; entretanto, ficou com o mesmo número de escrivães e com o mesmo número de serventuários; como comarca de 2.ª classe é pouco rendosa e proveitosa para os magistrados e mais ainda para os funcionários de justiça.
Nestas condições pretendo submeter à apreciação do Senado a ampliação do projecto à minha comarca, pelo que envio para a Mesa uma proposta de aditamento.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se a proposta de aditamento enviada para a Mesa pelo Sr. Machado Serpa.
É a seguinte:
É extinta, quando vagar, uma das escrivanias da comarca da Horta, de harmonia com o preceituado na presente lei. - Machado Serpa - Joaquim Crisóstomo - Ferreira da Silva.
Foi admitida.
O Sr. Machado Serpa: - Eu peço a V. Exa. que consulte o Senado sôbre se permite que a minha proposta seja retirada.
Consultada a Câmara, resolve afirmativamente.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão na especialidade.
Vai ler-se o artigo 1.°
Leu-se.
Seguidamente foram postos à votação todos os seus artigos e parágrafos, sendo aprovados sem discussão.
O Sr. Alfredo Portugal: - Pedia a V. Exa. o favor de consultar a Câmara sôbre se permite que seja dispensada a leitura da última redacção.
Foi dispensada.
O Sr. José Pontes: - Pedi a palavra, por parte da comissão de redacção, a fim de mandar para a Mesa três projectos de lei e dois pareceres da comissão do orçamento relativos aos Ministérios da Justiça e das Colónias.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão a proposta de lei n.° 112.
Leu-se na Mesa. É a seguinte:
Proposta de lei n.° 112
Artigo 1.° É criada no lugar da Moçarria, concelho de Santarém, uma nova freguesia, constituída por aquele lugar e pelos de Secorio e Vila Nova da Babeca, que, para êsse efeito, serão desanexadas da freguesia das Abitureiras.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 6 de Junho de 1922. - Domingos Leite Pereira - Baltasar de Almeida Teixeira - João de Ornelas da Silva.
Parecer n.° 32
Senhores Deputados. - O projecto de lei n.° 621-C cria uma nova freguesia no lugar de Moçarria, concelho de Santarém, constituída pelo dito lugar e pelo de Secorio e Vila Nova da Babeca, que se desanexarão das freguesia das Abitureiras.
A vossa comissão de administração publica, renovada a iniciativa do dito projecto, é de parecer que merece aprovação, pelos mesmos fundamentos expostos no parecer n.° 697, da anterior comissão de administração pública.
Sala das sessões da comissão de administração pública, 27 de Março de 1922. - Alberto da Rocha Saraiva - Costa Gonçalves - Custódio de Paiva - Pedro de Castro - Alberto Vidal.
Senhores Deputados: - A vossa comissão de legislação civil e comercial, em presença da documentação que acompanha o projecto de lei n.° 621-C, e que já
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foi considerada pela comissão de administração pública, é de parecer que o referido projecto merece a vossa aprovação.
Sala das sessões da comissão do legislação civil e comercial, 28 de Abril de 1922. - Pedro Pita - Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho - José de Oliveira da Costa Gonçalves - António Dias - Angelo Sampaio Maia.
N.º 15-G
Senhores Deputados. - Renovo a iniciativa do projecto de lei do ex-Deputado Sr. Sousa Varela, criando uma freguesia na Moçarria, da freguesia das Abitureiras, concelho de Santarém.
Sala das Sessões, 13 de Março de 1922. - João Bacela.
Parecer n.º 6
Senhores Deputados. - A vossa comissão de administração pública, fendo examinado com a atenção devida o projecto de lei n.° 621-C e verificando que êle vem instruído com os documentos prescritos na lei, dá-lhe o seu inteiro aplauso.
Atendendo porém à reclamação dos habitantes do lugar do Baixinho, e ainda para respeitar a inteira liberdade dos povos, tal qual como o preceitua a lei, a vossa comissão tem a honra de substituir o projecto referido 621-C, por esta outro:
Artigo 1.° É criada no lugar da Moçarria, concelho de Santarém, uma nova freguesia, constituída por aquele lugar e pelos de Secorio e Vila Nova de Babeca, que para êsse efeito serão desanexados da freguesia das Abitureiras.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, 12 de Agosto de 1921. - João Vitorino Mealha - José O'Neill Pedrosa - Sousa Varela - Alberto de Moura Pinto - Ribeiro de Carvalho - Joaquim Brandão, relator.
N.° 1-T
Senhores Deputados. - Renovamos a iniciativa do projecto de lei n.° 162-C, parecer n.° 697, publicado no Diário do Govêrno, de 11 de Novembro. - Sousa Varela - Francisco José Pires.
Parecer n.° 697
Senhores Deputados. - A vossa comissão de administração pública, tendo examinado com atenção o projecto de lei n.° 621-C, criando uma freguesia no lugar da Moçarria, concelho de Santarém, verificou que êle vem instruído com os documentos prescritos no artigo 3.° da lei n.° 621, de 23 de Junho de 1916, que regula a criação de novas freguesias.
A mesma comissão foi presente uma representação dos habitantes do lugar do Baixinho, protestando contra a sua inclusão na nova freguesia, pois desejam permanecer na freguesia das Abitureiras, a que actualmente pertencem.
Nestes termos, e porque a vontade dos povos deve ser inteiramente respeitada, como o prescreve a lei que regula o assunto, é a vossa comissão de parecer que o referido projecto deve ser aprovado, com a seguinte modificação:
Artigo 1.° É criada no lugar da Moçarria, concelho de Santarém, uma nova freguesia, constituída por aquele lugar e pelos do Secorio e Vila Nova da Babeca, que para êsse efeito serão desanexados às freguesia das Abitureiras.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da comissão de administração pública, 14 de Março de 1921. - Godinho do Amaral - F. Sousa Dias - Custódio de Paiva - Marques de Azevedo - Francisco José Pereira.
Senhores Deputados. - A vossa comissão de legislação civil e comercial, em presença da documentação que acompanha o projecto de lei n.° 621-C, e que já foi considerado pela comissão de administração pública, é de opinião que deve ser aprovado o parecer n.° 697.
Sala das sessões da comissão de legislação civil e comercial, 5 de Maio de 1921. - Angelo Sampaio Maio - Manuel Fragoso - Vasco Borges - Evaristo de Carvalho - António Dias, relator.
Projecto de lei n.° 621-C
Artigo 1.° É criada uma freguesia no lugar da Moçarria, freguesia das Abitureiras, concelho de Santarém.
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Art. 2.° Ficam pertencendo à mesma freguesia os lugares de Secorio, Baixinho e Vila Nova da Babeca.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões, 9 de Novembro de 1921. - Francisco José Fernandes Costa - Tavares Ferreira - Francisco José Pereira - Sousa Varela.
Senhores Senadores. - A vossa comissão de administração pública nada tem a opor ao projecto de lei n.° 112, vindo da Câmara dos Deputados, e pelo qual se cria uma nova freguesia no lugar de Moçarria, concelho de Santarém.
É por isso, de parecer que o projecto merece a vossa aprovação.
Sala das sessões da comissão, 9 de Junho de 1922. - Ricardo Pais Gomes (com declarações) - Godinho do Amaral - Joaquim Pereira Gil.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
Não se inscrevendo nenhum Sr. Senador, foi pôsto à votação, na generalidade e especialidade, sendo aprovado sem discussão.
O Sr. Francisco José Pereira: - Peço dispensa dá última redacção.
Foi dispensada.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o projecto de lei n.° 16.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Requeiro que a discussão dêste projecto seja adiada até que esteja presente o Sr. Ministro da Justiça.
A Câmara resolveu afirmativamente.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão a proposta de lei n.° 78.
Lê-se na Mesa. É a seguinte:
Proposta de lei n.° 78
Artigo 1.° Para os efeitos do artigo 54.º da Constituição Política, o orçamento geral do Estado compreenderá não só os resumos, mas também os desenvolvimentos das receitas e os das despesas de cada Ministério ou serviço.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 12 de Maio de 1922. - Domingos Leite Pereira - Baltasar de Almeida Teixeira - João de Ornelas da Silva.
Senhores Senadores. - A proposta de lei n.° 78, vinda da Câmara dos Senhores Deputados, tem em vista acabar com a irregularidade de os desenvolvimentos dos orçamentos das receitas e despesas de cada Ministério e serviços autónomos serem entregues ao Parlamento em épocas diferentes e, por vezes, muito posteriores à data em que tivessem sido apresentados os resumos e proposta orçamental.
Com esta salutar medida não deixa de concordar a vossa comissão do Orçamento, pois a apresentação de todos os resumos feita dispersamente não pouco tem concorrido para que o estudo e discussão do Orçamento tenham sido feitos muito tarde e, por vezes, precipitadamente, de tal sorte que o penado, por mais de uma vez, se viu forçado, a discutir e votar o orçamento em poucos dias, para que pudessem entrar em vigor na época legal. E não se diga que as repartições encarregadas dêste serviço não têm tempo, porque desde Julho se deve trabalhar na confecção do Orçamento, havendo muito tempo para estarem todos prontos e serem apresentados ao Parlamento até o dia 15 de Janeiro como ordena a Constituição.
Apesar disto assim ser, a vossa comissão do Orçamento receia que, num ou noutro ano, por motivos imperiosos, deixem de ser apresentados, com os resumos, todos os desenvolvimentos das receitas e os das despesas de cada Ministério e dos serviços autónomos. E como no artigo 1.° do projecto se declara que o Orçamento Geral do Estado compreenderá não só os resumos, mas também os desenvolvimentos das receitas e os das despesas de cada Ministério ou serviço, fácil será concluir que o Orçamento não está completo desde que falte algum dos desenvolvimentos.
Ora, uma das disposições mais importantes que existe na nossa legislação é, sem dúvida, a constante do artigo 1.° da lei n.° 954, de 22 de Março de 1920, conhecida por lei-travão, que a vossa co-
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missão entende dever ser mantida e observada. Para isso mester se torna introduzir no projecto um artigo novo que acautele a hipótese acima formulada.
Nestas circunstâncias, a vossa comissão do Orçamento propõe que se intercale o seguinte:
Artigo 2.° Continua em vigor a lei n.° 954, de 22 de Março de 1920; e, para os efeitos do seu artigo 1.°, considera-se como apresentação, do Orçamento a entrega na Mesa da Câmara dos Deputados dos resumos e proposta orçamental, ainda que, por qualquer motivo, não venham acompanhados de todos os desenvolvimentos a que se refere o artigo 1.°
O artigo 2.° da proposta passará a ser artigo 3.°
Sala das sessões da comissão do Orçamento, 1 de Junho de 1922. - Aníbal Augusto Ramos de Miranda - José Mendes dos Reis - A. M. da Silva Barreto - Joaquim Pereira Gil - Vasco Marques - Francisco de Sales Ramos da Costa - Artur Octávio do Rêgo Chagas - Artur Costa, relator.
N.º 83. - Projecto de lei. - Artigo 1.° Para os efeitos do artigo 54.° da Constituição Política, o Orçamento Geral do Estado compreenderá não só os resumos, mas também os desenvolvimentos das receitas e os das despesas de cada Ministério ou serviço.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário. - António Fonseca.
O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade e especialidade.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.
O Sr. Medeiros Franco: - Requeiro a dispensa da leitura da última redacção.
Foi dispensada.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
Proposta orçamental do Ministério da Instrução, propostas de lei n.ºs 16 e 851, os projectos n.ºs 55, 96 e 90-B.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 35 minutos.
O REDACTOR - Albano da Cunha.