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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 13
EM 19 DE DEZEMBRO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
António de Sousa Maia
Sumário. - Abertura da sessão. Leitura da avia. Correspondência.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Paulo Cancela de Abreu usa da palavra para interrogar a Mesa. Responde-lhe o Sr. Presidente.
O Sr. Baltasar Teixeira ocupa-se da nomeação ilegal dum professor para o Liceu Camões, e envia para a Mesa uma nota de interpelação sôbre o assunto.
O Sr. Carlos Pereira insta pela publicação da lei que estabelece multas para as infracções da penca.
Ordem do dia. - É aprovada a acta.
São concedidas duas licenças.
É lida uma nota de interpelação.
O Sr. Presidente propõe um voto de sentimento pela morte do Sr. Norton de Matos, juiz do Supremo Tribunal de Justiça.
Associam-se a êste voto os Srs. Almeida Ribeiro, Américo Olavo, Ferreira de Mira, Carvalho da Silva e Mariano Martins.
É aprovado o voto de sentimento.
O Sr. Presidente declara que não pode ser discutido nenhum dos pareceres inscritos na ordem do dia, em virtude de não se ler apresentado ainda o novo Govêrno.
Em seguida, o Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 16 horas e 15 minutos.
Presentes à chamada 44 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 18 Srs. Deputados.
Sra. Deputados presentes à abertura, da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto Ferreira Vidal.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio do Azevedo.
António Albino Marques do Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António do Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Brandão.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pires de Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Eugénio do Vasconcelos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins do Paiva.
Delfim Costa.
Francisco Cruz.
Hermano José de Medeiros.
João Salema.
Joaquim Brandão.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge do Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
Júlio Gonçalves.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Mariano Martins.
Mário de Magalhães Infante.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.

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2 Diário da Câmara dos Deputados
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Vitorino Henriques Godinho.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Correia.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Carlos Cândido Pereira.
Francisco Dinis de Carvalho.
Jaime Júlio de Sousa.
José Pedro Ferreira.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Não compareceram os Srs.:
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Álvaro Xavier de Castro.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Abranches Ferrão.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João José da Conceição Camoesas.
João José Dinis Damas.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.

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Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Procede-se à chamada às 15 horas.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 44 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Abriu a sessão às 15 horas e 15 minutos e foi lida a acta da sessão anterior.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o expediente.
Foi lido o seguinte
Expediente
Ofícios
Do presidente da Associação Portuguesa de Urologia, agradecendo a saudação desta Câmara àquela associação.
Para a Secretaria.
Do Senado, enviando uma proposta de lei que cede ao Ministério do Comércio e Comunicações o edifício do ex-convento de S. Salvador de Évora.
Para a comissão de instrução especial e técnica.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está aberta a inscrição para antes da ordem do dia.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para interrogar a Mesa): - Pedia a V. Exa., Sr. Presidente, a fineza de me informar sôbre o seguinte:
Em primeiro lugar, se V. Exa. sabe se o novo Govêrno se apresenta hoje á Câmara, como é de esperar, visto que já ontem tomou posse; em segundo lugar, se V. Exa. conta marcar sessão para amanhã ou para depois das próximas férias do Natal.
O Sr. Presidente: - A primeira pregunta, tenho a responder a V. Exa. que até êste momento não chegou informação à Mesa sôbre se o novo Govêrno se apresenta, ou não, à Câmara; à segunda pregunta, que tenciono marcar sessão em todos os dias úteis.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Então marcará sessão para amanhã.
Pedia, pois, a V. Exa. para mandar averiguar, se o Govêrno se apresenta, ou não, hoje à Câmara. Fomos informados pelos jornais de que o Govêrno tomou ontem à tarde posse. Ora, estando o Parlamento aberto o desejando o novo Govêrno respeitar acima de tudo o prestígio do Parlamento e trabalhar de acôrdo com o Poder Legislativo, não se compreende que não venha, hoje fazer a sua apresentação.
Rogava, no emtanto, repito, que V. Exa. mandasse averiguar se realmente o Govêrno se apresenta hoje, a fim de dar conta à Cardara da crise e da forma como esta se debelou.
O orador não reviu.
O Sr. Baltasar Teixeira: - Sr. Presidente: no Diário do Govêrno de hoje vem publicada a nomeação de um cidadão para professor do Liceu Camões. Ora, como êsse indivíduo não tem concurso para professor do liceu nem tam pouco é diplomado com o curso da Escola Normal Superior, segue-se que a nomeação é ilegalíssima. Sei que êsse caso pode vir a ter consequências muito graves; sei

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que o professorado liceal está todo indignadíssimo e que faz tenção de protestar por todos os meios para conseguir que tal nomeação não produza os seus efeitos; sei, ainda, que os alunos das Escolas Normais Superiores estão também no intuito do protestar,, por todas as formas, para que se consiga a anulação do despacho. Os alunos irão até à greve; e neste tempo do agitação que vai correndo, é preciso evitar tudo quanto possa provocar intranquilidade.
Como não se encontra presente nenhum dos Srs. Ministros, vou enviar para a Mesa uma nota de interpelação, dirigida ao Sr; Ministro da Instrução, sôbre o assunto.
Se usei da palavra foi por considerar o caso gravo, e muito grave, e para ficar Lurado desde já o meu protesto contra à ilegalidade da nomeação.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Pereira: - Sr. Presidente: há alguns dias já que esta casa do Parlamento votou as emendas introduzidas pelo Senado à proposta de lei referente à pesca.
O certo, porém, é que quando o País esporava que imediatamente se começasse a dar cumprimento a essa lei, quando todos nós tínhamos fundadas esperanças de que se dêsse pressa em publicar tal lei, sucede que até hoje ela ainda não foi publicada, o que, Sr. Presidente, representa já bastante prejuízo para o Estado, porquanto ainda nos últimos dias, só porque a fiscalização da pesca tem sido mais intensiva, muitas e muitas traineiras e motoras espanholas têm sido apresadas em águas nacionais. Êsses barcos, porém, irão ser multados com multas insignificantes, que são as da legislação anterior, quando já hoje temos uma lei que servo para castigar os desmandos dos nossos vizinhos.
Parece, porém, que não há pressa em publicá-la.
Contra êsse lacto eu protesto veementemente, certo do que a Câmara mo acompanha.
Não se pode continuar a aplicar multas do 25 escudos que só por uma elasticidade inierpretativa podem chegar a mil escudos.
É preciso que a nova lei seja publicada para poder ser aplicada a bem dos interêsses nacionais.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Não podendo discutir-se qualquer dos projectos marcados para antes da ordem do dia e não havendo ninguém inscrito, passa-se à ordem do dia.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Está em discussão a acta.
Pausa.
Ninguém pode a palavra, considera-se aprovada.
Foram concedidas as seguintes licenças:
Pedidos de licença
Do Sr. João de Ornelas da Silva, 15 dias.
Do Sr. João Luís Ricardo, 15 dias.
Concedidas.
Foi Vida na Mesa a seguinte
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro da Instrução Pública sôbre o decreto de 15 do corrente, publicado no Diário do Govêrno do hoje, que nomeia Joaquim Correia Salgueiro professor efectivo do 1.° grupo do Liceu de Camões, em Lisboa.- Bali asar Teixeira.
Expeça-se.
O Sr. Presidente: - Comunico à Câmara o falecimento do Sr. Dr. Norton de Matos, que era irmão do ilustre Deputado o Sr. general Norton de Matos.
O ilustre extinto foi secretário do Govêrno da Índia e reitor da Universidade de Coimbra.
No desempenho dessas funções demonstrou sempre ser um cidadão digno do nosso apreço, impondo-se à veneração do País, ao qual prestou relevantes serviços.
Proponho, pois, que na acta da nossa sessão só consigno um voto de sentimento pela sua morte.
O Sr. Almeida Ribeiro: - Sr. Presidente: o Dr. Norton de Matos, cuja morto todos pranteamos, foi uma figura do relê-

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vo na magistratura. Ao País prestou os melhores serviços, quer nos cargos que desempenhou na Índia, quer como reitor da Universidade de Coimbra, e mais tarde como presidente do júri de exames de Estagio na Universidade de Lisboa. Manifestou-se sempre um magistrado íntegro, absolutamente honesto e cumpridor dos seus deveres.
Associo-me, pois, em nome dêste lado da Câmara, ao voto de sentimento que V. Exa. 3 acaba de propor.
O orador não reviu.
O Sr. Américo Olavo: - O Grupo Parlamentar de Acção Republicana associa-se ao voto de sentimento que V. Exa. acaba de propor.
O orador não reviu.
O Sr. Ferreira de Mira: - Em nome do Partido Nacionalista, associo-me ao voto de sentimento proposto por V. Exa.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: - Em nome da minoria monárquica, associo-me à proposta de V. Exa. para que na acta se lance um voto de sentimento pela morte do Sr. Dr. Norton de Matos.
O orador não reviu.
O Sr. Mariano Martins: - Sr. Presidente: em meu nome pessoal associo-me à proposta de V. Exa., manifestando todo o meu pesar pela morte do Sr. Dr. Norton de Matos, que foi meu colega no Conselho Colonial.
Nessa situação tive ensejo de poder apreciar as suas altas qualidades de inteligência e as suas nobres qualidades de carácter.
Na parte jurídica o ilustre extinto foi orientador do Conselho, que sempre acatava as indicações de S. Exa.
Tendo sido magistrado íntegro, sabedor, honesto, cumpridor dos seus deveres, muito trabalhador e bastante inteligente, é a sua falta muito sentida no Conselho Colonial. E é na minha qualidade de membro dêsse Conselho que eu me associo ao voto de sentimento proposto por V. Exa.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Câmara, considero aprovado por unanimidade o voto de sentimento por mim proposto pela morte do Dr. Norton de Matos.
O Sr. Presidente: - Como se não podem discutir nenhuns dos projectos que estão marcados para ordem do dia, por isso que não está presente nenhum dos Srs. Ministros, eu vou encerrar a sessão.
A próxima sessão será amanhã, à hora regimental, sendo a ordem do dia a que estava dada para hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 16 horas e 45 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Renovação de iniciativa
Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 1-R, publicado no Diário do Govêrno n.° 179, de 5 de Agosto de 1921, e que teve parecer das respectivas comissões, sob o n.° 11.
Em 18 de Dezembro de 1923. - O Deputado, Lourenço Correia Gomes.
Junte-se ao processo.
Para a comissão de administração pública.
Requerimento
Requeiro que, pelo Ministério da Agricultura, me sejam fornecidas, com a possível brevidade, as cópias das seguintes peças do processo relativas ao leilão do chá que a Alfândega do Pôrto efectivou em 1920, e que pertencia a súbditos ingleses:
1.° Documento em que se prove terem os interessados conhecimento de que estava o chá a despacho na Alfândega do Pôrto;
2.° Documento comprovativo de se haver efectuado o leilão, conforme o que se acha estipulado na lei;
3.° Troca da correspondência existente a tal respeito entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o Ministério da Agricultura;
4.° Cópia de todos os despachos ministeriais lançados sôbre as diferentes peças do processo. - Manuel de Sousa da Câmara.
Expeça-se.
O REDACTOR - João Saraiva.

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É por isso que eu mando para a Mesa a seguinte proposta de emenda a êste artigo:
Emenda ao artigo 6.°, § 1.° Será sempre permitido ao proprietário proceder ao despejo dos seus imóveis, quando deles precise para seu uso ou dos seus ascendentes e descendentes. — Tomás de Vilhena.
O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente: eu sou em princípio contrário ao preceito consignado neste artigo, porque êle representa nem mais nem menos do que a perversão do espírito da lei e a conversão numa verdadeira ilegalidade e injustiça de uma disposição útil que estava na lei antiga.
É de boa e elementar jurisprudência que ninguém pode fazer qualquer contrato sôbre bens que sejam da sua administração ou de que seja usufrutuário, além do termo do contrato.
Pois como é que eu hei-de fazer um contrato, como simples usufrutuário, neste caso do inquilinato, ou de qualquer outro, de modo que esse contrato vá além do seu termo no que diz respeito a direitos?
Isto fere o bom senso jurídico, e é por isto que eu sou de opinião da que neste preceito, apesar da necessidade que há de casas para habitação, apesar de toda essa argumentação que se invoca a favor da continuidade do inquilinato, que alguma cousa se salve do que existe na lei antiga.
E pôsto isto, eu mando para a Mesa uma proposta de eliminação pura e simples dêste artigo, sem mais considerações, porque já bastantes vezes tenho manifestado a minha opinião sobre êste ponto, reservando ùnicamente o desejo do estudo para a Secção, porque eu sei que dentro dela há-de predominar o bom senso de modo a legislar-se duma forma que concilie, o mais possível, os interêsses das duas classes.
E é por isso que eu faço desta proposta, como se costuma dizer em direito, uma proposta de alternativa; mas se, porventura, a sua doutrina não fôr aprovada eu então apresentarei uma proposta em que se exceptuem os casos em que o proprietário ou os seus ascendentes pretendam usufruir o prédio.
A proposta é a seguinte:
Proponho a eliminação do artigo 6.° — Querubim do Vale Guimarães.
Lida na Mesa a proposta do Sr. Querubim Guimarães, é admitida.
O Sr. Catanho de Meneses (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª a fineza de me informar qual é o artigo que está em discussão.
O Sr. Presidente: — É o artigo 6.°
O Sr. Rodrigo Álvares Cabral: — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que acho também bastante lamentável que o dono duma propriedade não possa residir nela.
Entendo que se deve introduzir na lei uma fórmula qualquer que dê ao proprietário o direito de exigir o despejo do seu prédio ou de parte dêle, quando quiser ir para lá viver, e quando não tenha casa, mas entendo também que tal disposição deve ser redigida de maneira a não dar lugar a abusos.
Para isso parece-me que bastaria que se dissesse - para seu uso próprio — porquanto se ficar estabelecido que o proprietário pode exigir o despejo do seu prédio para habitação dos seus ascendentes e até colaterais; isso pode dar lugar a sofismas.
Mas ainda para maior garantia desta disposição, parece-me que haveria toda a vantagem em limitar o tempo dentro do qual o proprietário terá de ir habitar a sua casa.
Assim, sou de parecer que se devia estabelecer que se passado um ano, o proprietário não habitar no seu prédio, terá de pagar uma indemnização ao inquilino que for despejado.
Neste sentido, mando para a Mesa o seguinte artigo novo:
Artigo novo. A todo o senhorio que não resida em casa própria, é permitido requerer o despejo do prédio ou parte de prédio que lhe pertença, desde que o faça para nela estabelecer a sua residência.
§ único. Se passado um ano, o senhorio não tiver ainda ocupado o prédio cujo despejo requereu, poderá o inquilino despejado exigir, pelos meios ordinários, uma indemnização correspondente a dez vezes

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a renda que por êsse prédio pagava anualmente. — Álvares Cabral.
Lida na Mesa, foi admitida.
É lido o artigo 7.º
O Sr. Catanho de Meneses: — Mando para a Mesa a seguinte proposta de emenda a êste artigo:
Proponho que no artigo 7.°, em seguida à palavra «industrial» se acrescente: «ou agricultor», e no fim do artigo se acrescente «ou serem despedidos», «ou serem despedidos por justos motivos». — J. Catanho de Meneses.
Foi admitida.
É lido o artigo 8.°
O Sr. Catanho de Meneses: — Envio para a Mesa uma emenda ao artigo 8.° e seus parágrafos.
Proponho que no artigo 8.º se elimine as palavras «prédios urbanos», substituindo-se as palavras «na área da jurisdição do juízo», por estas: «na área da comarca ou vara». — J. Catanho de Meneses.
Proponho que no § 3.° do artigo 8.° se eliminem as palavras seguintes à palavra «rôgo». — J. Catanho de Meneses.
Proponho mais: que se elimine o § 1.° do artigo 8.°, e que no § 2.°, que ficará sendo o § 1.°, as palavras «êste pagamento», sejam substituídas por êstas: «o pagamento da renda. — J. Catanho de Meneses.
Foi admitida.
O Sr. Querubim Guimarães: — Eu vou enviar para a Mesa uma proposta de alteração a êste artigo.
Eu entendo, e já ontem apresentei uma proposta de harmonia com êste modo de pensar, que deve ser garantido ao proprietário e ao inquilino a liberdade de contratarem, e o proprietário e o inquilino que contratem como entendem e como querem.
Não se compreende que nós estejamos ainda a viver sob o domínio de uma lei antiquada e lesiva da liberdade de contratar, lei que tolhe aquela liberdade que é legítima de qualquer pessoa contratar como entender.
Eu não vejo inconveniência em se consignar na lei um princípio dando plena liberdade ao inquilino e ao senhorio de se entenderem sôbre o quantitativo da renda, sôbre a forma de pagamento e sôbre o local.
Nós vemos a cada passo, que quando o inquilino e o senhorio se entendem bem, o inquilino é o próprio que vai contra a lei pagando o que o senhorio exige, não sendo é claro uma cousa exagerada, quando êsse inquilino podia, escudado na lei, não pagar mais.
Mas êle que paga de boa vontade é porque reconhece que o deve pagar e que não acha muito.
Eu não sou obrigado a pagar mais do que aquilo que está na lei, mas se eu em minha consciência entender que devo pagar mais, quem é que me proíbe?
Evidentemente que vou contra a lei, e como eu há muitos e muitos inquilinos que assim procedem, porque compreendem que o que o senhorio lhes exige não é nada de mais.
Portanto, para que é que havemos de continuar a manter na lei um preceito que nada justifica e que nós sabemos que a cada passo é desrespeitado?
O Sr. Carlos Costa (interrompendo): — E que só serve para prejuízo do Estado.
O Orador: — Diz V. Ex.ª muito bem.
O que não se deve permitir evidentemente é que o senhorio, contra a vontade do inquilino, lhe exija uma renda maior do que aquilo que êle entende que deve pagar.
E por isso que eu mando para a Mesa uma proposta de substituição dêste artigo, por um outro, redigido de harmonia com esta minha maneira de pensar, artigo êsse que fixa nos parágrafos o local e a forma de pagamento da renda.
Esta é que é a doutrina que me parece mais consentânea com os bons princípios e com as boas normas.
É a seguinte:
Proponho que o corpo do artigo 8.° seja substituído por outro nos seguintes termos:
É permitido aos proprietários e inquilinos, convencionarem livremente o que entenderem sôbre quantitativo da renda, forma e local do seu pagamento.

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Proponho que o § 1.° seja substituído por êste outro:
§ 1.° Se nada se estipular quanto ao lugar do pagamento, deve êste realizar-se no domicílio do senhorio.
§ 2.° Quando a renda tenha de ser depositada, o depósito será sempre feito na sede do juízo que for competente para a acção de despejo. — Querubim Vale Guimarães.
Foi admitida.
O Sr. Alfredo Portugal: — Sr. Presidente: pedi a palavra porque desejo mandar para a Mesa uma proposta de eliminação do § 3.° do artigo 8.°
Quando os senhorios não possam ou não saibam assinar, lá está a lei geral a indicar a forma como se deve proceder.
É a forma geral da passagem dos recibos de pagamento.
O que não tem razão de ser é outrem assinar a rôgo do senhorio, com intervenção de duas testemunhas, que serão mencionadas no corpo do recibo.
Isso traz demoras, complicações e dificuldades por vezes, pois não devemos fazer as leis só para Lisboa e Pôrto, temos de nos lembrar que também há a província onde é mais difícil satisfazer a essas formalidades todas e que às vezes a falta de uma dessas formalidades poderia dar origem a uma acção de despêjo, o que não é justo.
Mando para a Mesa a minha proposta.
Foi lido na Mesa e entrou em discussão o artigo 9.°
O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Mando para a Mesa uma proposta de substituição do § único.
Desde que se tomou para o arrendamento a estiva camarária, nunca mais ninguém paga renda.
Artigo 9.° — § único. O valor dos géneros será determinado pelo preço corrente no mercado, em relação ao ano a que a renda disser respeito. — D. Tomás de Vilhena.
Lida na Mesa, foi admitida.
O Sr. Catanho de Meneses: — Mando para a Mesa a seguinte proposta de aditamento:
Proponho que no artigo 9.°, em seguida às palavras «o depósito da renda», se
acrescentem estas: «de prédios rústicos». — J. Catanho de Meneses.
Lida na Mesa, foi admitida.
Foi lido na Mesa e entrou em discussão o artigo 10.°
O Sr. Santos Garcia: — Mando para a Mesa uma proposta de substituição de parte do artigo 10.°:
Proponho que no artigo 10.º, onde se lê «celebrados em documento autêntico anterior a 1920», seja substituído por «celebrados em documento autêntico anterior a 1921». — Santos Garcia.
Lida na Mesa, foi admitida.
O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção de V. Ex.ª e da Câmara para a doutrina consignada no artigo 1.°, que é mutatis mutandis, a mesma cousa que se acha estabelecido num projecto de lei que foi apresentado na Câmara dos Deputados e que já lá foi aprovado.
Desejava que V. Ex.ª me informasse se êsse projecto já veio para o Senado e, nesse caso, se está em condições de ser examinado pela respectiva secção.
O Sr. Presidente: — Devo observar ao Sr. Querubim Guimarães que êste artigo não pode ser votado porque já foi apresentada uma emenda sôbre êle.
O Sr. Ferreira de Simas: — Sr. Presidente: pedi a palavra para reclamar de V. Ex.ª as providências necessárias a fim de ser publicado como lei o projecto n.° 72, pois do contrário as tabernas continuarão a ficar abertas até a 1 hora, visto o Sr. governador civil já ter mandado abrir inscrição para as licenças de porta aberta.
O Sr. Presidente: — O projecto de lei a que se referiu o Sr. Querubim Guimarães vai amanhã para a secção.
Foi lido na Mesa e entrou em discussão o artigo 11.°
O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente: mando para a Mesa a seguinte proposta de eliminação dêste artigo:
Proponho a eliminação do artigo 11.°. - Querubim do Vale Guimarães.
Lida na Mesa, foi admitida.

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Lido na Mesa, foi aprovado, sem discussão, o artigo 12.°
Foi lido na Mesa e entrou em discussão o artigo 13.º
O Sr. Catanho de Meneses: — Mando a Mesa a seguinte proposta:
Proponho que a matéria do artigo 13, seja substituída por outra nesses termos:
Artigo 13.° Se na citação para a acção de despejo não intervier pessoalmente o citando, far-se há também a citação por éditos de 15 dias, publicados no Diário do Govêrno, quando o haja, num dos periódicos mais lidos da localidade. — J. Catanho de Meneses.
Lida na Mesa, foi admitida.
Lido na Mesa, foi aprovado sem discussão o artigo 14.º
Lido na Mesa, entrou em discussão artigo 15.º
O Sr. Querubim Guimarães: — Mando para a Mesa uma proposta de eliminação:
Proponho a eliminação do artigo 15.° — Querubim do Vale Guimarães.
Lida na Mesa, foi admitida.
Lido na Mesa, entrou em discussão o artigo 16.º
O Sr. Catanho de Meneses (para interrogar a Mesa): - Desejava que V. Ex.ª me informasse qual é o artigo que está em discussão.
O Sr. Presidente: — É o artigo 16.º
O Sr. Catanho de Meneses (como relator): - Mando para a Mesa a seguinte proposta:
Proponho que no artigo 16.º a palavra «postura» seja substituída pela palavra «aposição». - J. Catanho de Meneses.
Lida na Mesa, foi admitida.
O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Sr. Presidente: pedi a palavra simplesmente para fazer notar à Câmara a forma, como neste projecto se persegue o proprietário.
Por êste projecto, o inquilino fica com o direito de sair do prédio sempre que queira, sem dar satisfação ao senhorio, o que, multas vezes, pode causar prejuízo ao proprietário, mas êste é que, em caso algum, pode rescindir o seu contrato com o inquilino.
Aqui tem a Câmara bem assinalado neste artigo o espírito de agressão contra o senhorio.
O Sr. Catanho de Meneses: — Sr. Presidente: mando para a Mesa uma proposta de substituição, um artigo novo.
Proponho que a doutrina do corpo do artigo 18.° seja substituída por um artigo assim concebido:
Artigo 18.° Da sentença final proferida em acção de despejo haverá sempre recurso até o Supremo Tribunal de Justiça. — J. Catanho de Meneses.
Foi aprovado o artigo 17.°
Foi lido e admitido o artigo novo do Sr. Catanho de Meneses.
Foi lido o artigo 18.° e pôsto à discussão.
O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente: por êste artigo se vê o espírito de parcialidade que há ao resolver esta questão a favor dos inquilinos.
Eu acho isto censurável como também acharia se se desse o contrário.
Eu não compreendo que seja permitido o recurso que manda efectuar o despejo e que não seja permitido o recurso que não manda efectuar o despejo.
Por isso mando para a Mesa uma proposta de substituição concebida nestes termos:
Proponho que as palavras «que ordenar o» do corpo do artigo 18.° sejam substituídas pelas palavras «que resolver, sôbre os». — Querubim do Vale Guimarães.
Foram lidas e admitidas estas propostas.
Foi interrompida a discussão, pelo adiantado da hora.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente: como o Govêrno ainda se não apresentou ao Parlamento, e segundo referências dos jornais de hoje, ainda se não pode considerar definitivamente orga-

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nizado, e pelo que os jornais dizem só se apresentará depois de férias, eu aproveito êste ensejo para solicitar a V. Ex.ª, Sr. Presidente, a fineza, de comunicar ao seu colega da Câmara dos Deputados o interêsse que há em ser pôsto em discussão naquela Câmara o projecto referente ao contrato celebrado entre o Govêrno e uma companhia americana, de fixar um cabo na Ilha do Faial.
Aproveito estar no uso da palavra para me referir ao relevante serviço prestado pelo jornal O Século dando publicidade a todas as emendas mandadas para a Mesa, afim de o público conhecer o que se quere fazer sôbre o assunto.
O Sr. Presidente: — Informo V. Ex.ª que oficiei ao Sr. Presidente da Câmara dos Deputados pedindo-lhe a fineza de, logo que possa, S. Ex.ª ponha em discussão êsse projecto.
Insistir parece-me uma impertinência.
O Sr. Presidente: — Eu, antes de dar a palavra ao Sr. Joaquim Crisóstomo para o «antes de encerrar a sessão» não vi que havia o projecto n.° 533 que se podia discutir ainda.
Vai entrar, pois, em discussão êsse projecto.
Foi lido o projecto n.° 533 e pôsto à discussão.
É o seguinte:
Projecto de lei n.º 553
Senhores Senadores. — Subsistindo as razões que determinaram o decreto n.º 4:076, de 10 de Abril de 1918, portarias n.ºs 1:295 e 1:635, de 10 de Abril de 1918 e 7 de Janeiro de 1919, e bom assim a lei n.° 1:188, de 29 de Agosto de 1921, tenho a honra de apresentar ao vosso estudo o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° A doutrina do decreto 4:076 e portarias que o esclarecem é aplicável aos contratos das empreitadas em via de realização na data do presente diploma aos que de futuro se realizarem e para os quais no caderno de encargos se inclua a cláusula de revisão.
Art. 2.° A revisão de preços será feita parcialmente e durante a execução dos trabalhos pela entidade encarregada dos respectivos abonos, sendo submetida à
aprovação superior, a qual será dada pelos administradores dos serviços autónomos ouvidos os respectivos conselhos, ou pelo Ministro nos serviços administrativos directamente pelo Estado.
Na falta do Conselho Privativo, será ouvido o Conselho Superior de Obras públicas ou a entidade especialmente designada pelo Ministro.
§ único. Os documentos parciais de abono das obras executadas serão feitos substituindo nos preços compostos do contrato os preços elementares, revistos, de jornais e materiais, aplicando à totalidade da importância documentada o coeficiente de redução da praça.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões em 13 de Novembro de 1923. — O Senador, Ernesto Júlio Navarro.
Senadores. — Pelo decreto n.º 4:076, de 10 de Abril de 1918, pela lei n.° 1:188, de 29 de Agosto de 1921, e pelas portarias n.° 1:295, de 10 de Abril, e n.° 1:635, de 7 de Setembro de 1919, estabeleceu-se doutrina equitativa e justa sôbre os contratos de empreitada, atendo se às circunstâncias anormais em que o país se encontrava, fixando-se um prazo que se calculava suficiente, supondo-se que a melhoria de situação não se demorava; aconteceu porém o contrário e as dificuldades de então subsistem. É portanto de toda a vantagem para os serviços públicos que a doutrina então estabelecida se mantenha até que a normalidade se restabeleça. Julgo pois que deve ter aprovação o projecto de lei n.° 533 da autoria do ilustre Senador Ernesto Júlio de Navarro. — Rodrigo Guerra Álvares Cabral.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente, desde que S. Ex.ª me deu a palavra para o «antes de encerrar a sessão», supunha que todos os assuntos a tratar estavam liquidados.
Em todo o caso respeito muito as determinações de S. Ex.ª e vou entrar na discussão dêste projecto, declarando desde já que êle não merece o meu voto.
Trata-se nem mais nem menos duma lei de excepção que vem alterar contratos, que vem modificar situações num mo-

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mento que se me afigura menos oportuno.
As leis de excepção tiveram razão de ser durante a guerra, agora, desde que os países aliados entraram numa fase de trabalho activo, já estas leis não têm razão de ser.
Na América a vida está plenamente normalizada.
A Inglaterra atravessa de facto uma grande crise, que foi o que provocou talvez a recente dissolução do Parlamento e modificou profundamente a sua fisionomia em consequência das correntes de opinião que fizeram a propaganda eleitoral — dum lado os proteccionistas, do outro lado os livre-cambistas.
Fora essa crise passageira, a vida na Inglaterra está normalizada.
A França procura reconstituir-te e é tam grande o patriotismo do seu povo, e a unidade de pontos de vista dos seus políticos, que ela marcha a passos agigantados para uma nova época de progresso e prosperidade; afora os seis conflitos com a Alemanha, tendentes a tornar efectivo o Tratado da Paz, a vida interna da França corre maravilhosamente.
O mesmo direi da Bélgica, que só acessoriamente intervém nos conflitos internacionais; e também o mesmo direi acêrca da Espanha, que não recebeu convulsão tam profunda como os outros paízes a que acabo de me referir.
Em Portugal nós estamos em difícil, mas esta situação é mais oficial que pròpriamente particular. Ainda não vi que esta grande crise que atravessamos se tenha reflectido nos orçamentos particulares. O que eu vejo são manifestações de grandeza, de opulência, de luxo, o que denota à evidência que a pobreza entre nós reside única e exclusivamente nos cofres do Estado, e que os cofres dos particulares estão em regra, afora um ou outro caso isolado, recheados, mas êsses casos sempre se hão de observar emquanto permanecer o actual regime capitalista e de propriedade.
Quantas falências se registam nos tribunais portugueses nos últimos tempos, que constituam um sintoma manifesto e evidente duma crise profunda que atravessem o comércio e a indústria nacionais?!
Houve nos meses de Setembro e Agosto um grande número de protestos de letras no Tribunal do Comércio Mas isso não foi consequência de dificuldades intrínsecas, mas sim da rarefacção da nota.
Por mais que procure as causas e os fundamentos que determinaram a apresentação do projecto de lei em discussão, nada vejo que me convença a dar-lhe o meu voto.
Não acompanho aqui, no Senado, pessoas; acompanho ideas e princípios. E dentro dêste meu critério, que se me afigura o mais lógico com a função que aqui desempenho, não tenho que votar tal projecto e hei-de fazer tudo quanto puder no sentido de evitar a sua aprovação.
Diz-se no relatório que precede o projecto simplesmente o seguinte:
Leu.
Ora diz-se aqui «persistindo». Eu sempre ouvi dizer que em direito quem alega é que prova, mas é mais fácil alegar que provar.
«Persistindo» é uma afirmação que não está justificada e representa apenas o modo de sentir e de pensar do autor do projecto, e nada mais.
Eu mais de uma vez tenho ouvido dizer, não sei se com razão se sem ela, que os partidos organizados da República que foram vítimas do sidonismo deviam destruir toda a obra do ditador e que se impunha como motivo poderoso de ordem pública aniquilar tudo quanto nessa época foi feito em matéria legislativa.
Eu já vi êste princípio sustentado num parecer firmado por ilustres membros desta Câmara. Pois hoje vejo precisamente o contrário, e vem-se a relembrar uma disposição que é da única responsabilidade dessa época, época em que o Chefe de Estado, alterando profundamente o regime constitucional e presidencialista, se arrogou poderes de um Presidente absoluto fazendo girar toda a acção política e parlamentar em tôrno da sua personalidade.
Nessa época eram realizáveis medidas desta natureza, mas hoje não, porque nós temos de nos colocar no actual regime de princípios e não podemos estabelecer excepções na nossa lei senão em casos em que elas se encontrem plenamente justificadas.
Pregunto eu: que correntes de opinião se formaram na imprensa, nas associações de classe ou nos meios em que se expressam as fôrcas vivas do país, a favor de

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uma medida desta natureza? Francamente não conheço.
Eu admito a hipótese de o ilustre autor dêste projecto possuir uma documentação suficiente que, quando me não convença, pelo menos justifique o seu procedimento. Admito pois essa hipótese e estou certo de que, havendo já pedido a palavra o Sr. Álvares Cabral, que foi o relator dêste projecto, e o Sr. Ernesto Navarro, S. Ex.ªs se darão ao trabalho de esclarecer a Câmara e consequentemente de me esclarecer também e habilitar-me, já não digo a mudar de opinião, mas pelo menos a reconhecer que êste projecto não representa, como eu há pouco disse, um acto individual, mas antes pelo contrário representará uma manifestação de qualquer corrente ou uma afirmação de um princípio justificado é claro, em circunstâncias que êsses ilustres Senadores apresentarão.
Eu por minha parte é que não posso, como vulgarmente se diz, votar de olhos fechados e às apalpadelas uma medida que visa a prorrogar um diploma promulgado em 1918, época em que mais se fazia sentir as consequências da guerra e em que ainda não se sabia a que extremos ela nos poderia levar.
Votar nessas condições uma medida desta natureza seria um acto que iria pôr em conflito a minha consciência.
Ninguém pode estranhar que eu me manifeste neste sentido, tanto mais que nunca presumi que êste projecto fôsse hoje discutido, supus sempre que, embora êle figurasse na ordem do dia, não houvesse ensejo de êle ser discutido, mas como não costumo estar absolutamente em branco e tenho por sistema ler toda a matéria que constitue objecto da ordem do dia, pela leitura que dela fiz, como disse, surgiram no meu espírito as dúvidas que expus e bastava que dúvidas eu tivesse para que me visse coagido perante aqueles que tinham obrigação de esclarecer êste assunto.
A que visa êste projecto?
Êle permite simplesmente aos indivíduos que têm contratos de empreitada firmados pelo Estado ou também aproveita a particulares nos seus contratos em que o Estado é alheio?
Só um estudo bem ponderado dêste assunto nos poderá habilitar a saber se êle
deve ser aplicado nos termos genéricos em que se acha concebido ou se tem de ser, limitado e restricto.
É preciso que não nos esqueçamos de uma cousa: é que o Estado é uma entidade moral, é uma personalidade jurídica nas relações com os particulares.
A nossa legislação reconhece algumas prerrogativas ao Estado, mas êle quando contrata em particular deve ser considerado um cidadão como qualquer outro.
Se esta empreitada dizia respeito simplesmente a contratos firmados entre empreiteiros e o Estado que pela desvalorização da moeda precisam de ser revistos para que não se diga que o Estado se locupleta à custa dos outros, eu também me permito dizer que essa doutrina é boa para os que contratam com o Estado, deve ser aplicada com os particulares entre si, deve ser igual tanto para uns como para outros.
Eu faço um contrato com um empreiteiro para fazer a terraplenagem de 1 quilómetro de linha férrea pelo preço de X, mas porque o empreiteiro daí a dois ou três meses viu que não pode realizar as obras por êsse preço, é justo que êle peça uma revisão e o Estado lhe pague X mais tal.
Eu não contesto êste princípio.
De contrario procederia com menos equidade e justiça.
Se êste princípio é verdadeiro quando se trata de entidades que contratam com o Estado, o mesmo princípio deve ser aplicado a todos os cidadãos que contratam entre si. Esta é que se me afigura a boa doutrina.
Diz ainda o artigo 2.°
Lê.
Trata-se da parte formulária em que é preciso ter muito cuidado para colocar os funcionários, a cargo de quem fica isto, superiores a todas as suspeitas.
Parece-me que a forma como está redigido o artigo 2.° é muito genérica, pelo que mandarei para a Mesa uma proposta tendente a esclarecê-lo.
Para que se acautelem suficientemente os interêsses do Estado tem de se estabelecer que nenhuma revisão será permitida senão em determinadas condições. Desde que se deixe ao empreiteiro a liberdade de requerer a revisão sempre que julgue conveniente e igualmente ao Ministro a

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faculdade de a conceder ouvindo as estações combatentes, teremos inutilizadas completamente as bases do contrato.
Para evitar o que se tem dado e que há-de continuar a dar-se a dar-se, eu queria que êste projecto a ter de ser aprovado o fôsse em condições de poder acautelar-se interêsses do Estado.
Que há de mais arbitrário que é o conferir ao Ministro a faculdade de escolher a entidade que tem de se pronunciar?
S. Ex.ª pode ser uma pessoa muito respeitável mas também pode ser pouco reflectida.
Portanto, nunca se pode num diploma dêstes conceder a um Ministro o poder de escolher a entidade que há-de pronunciar-se.
Infelizmente o Conselho Superior de Obras Públicas não passa de uma entidade de que para pouco serve.
É presidido por um general com uma idade tam avançada que o torna como que alheio aos assuntos submetidos à sua apreciação.
Os militares quando atingem certa idade, são reformados; naturalmente porque já prestaram à sociedade os serviços que deviam e precisam descansar.
Entretanto êste conselho é presidido por um militar com cêrca de 80 anos de idade, quando antes devia lá estar a um engenheiro novo.
Nesse conselho os processos estão um tempo infinito.
Mas ainda se diz:
Leu.
Isto é a transcrição de uma outra disposição.
Entende, porém, que deve ser clara, porquanto a redacção está pouco confusa.
Acho conveniência numa redacção mais simples para que tanto uns e como outros conheçam perfeitamente os seus direitos.
Supondo que o próprio autor do projecto reconhecerá quanto há de razão nas minhas considerações.
O Sr. Álvares Cabral: — Pretende-se acudir aos prejuízos resultantes das desvalorização da moeda para os empreiteiros de trabalhos do Estado.
A vida depois da guerra, em vez de melhorar, tem-se cada vez agravado mais.
O orador que me precedeu diz que é prejudicial ao Estado êste projecto de lei.
Não é assim.
Desde que não aprovemos êste projecto, as obras, em vez de serem feitas por empreitada, têm de se fazer por administrado, e que, como é óbvio, dará lugar a custarem três vezes mais caras.
Por esta razão é que eu sempre tenho advogado a idea de que todas as obras do Estado devem ser feitas por tarefas ou por empreitada.
Ainda hoje tenho êsse mesmo modo de ver.
Êste projecto representa a única forma de se continuarem a fazer as obras por tarefa e por empreitada.
Nós sabemos que em todos os países, em virtude da desvalorização da moeda, os preços das cousas vão subindo sempre e por isso ninguém se quererá abalançar a tomar qualquer empreitada, logo que lhe não garantam a revisão dos preços dos materiais e jornais à maneira que êles forem sendo alterados no mercado.
Além disto estas alterações não são obrigatórias, ficando a cargo das instâncias superiores a oportunidade de se efectuarem.
Parece-me também que não há inconveniente em se não marcar prazo fixo, porque, se amanhã os preços estacionarem, pelo menos não há necessidade da revisão, mas, como nós não sabemos por ora isso é possível, parece-me conveniente que a lei fique como está, porque, se virmos que a revisão não é necessária, não se faz.
São estas as considerações que eu como relator, entendo que são necessárias as para demonstrar que êste projecto está nas condições de ser aprovado.
O Sr. Ernesto Navarro: -— Sr. Presidente: o Sr. Joaquim Crisóstomo começou o seu discurso dizendo que não estava disposto a aprovar nenhum projecto nas condições dêste sem ter marcado um prazo, e que parecia que êste projecto não merecia discussão da parte dalguns Srs. Senadores.
O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo): — Sem ter pensado bem sôbre êle foi o que eu quis dizer.

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O Orador: — Eu tenho a dizer que tenho sempre muito prazer em ver os meus projectos serem discutidos, e porventura serem beneficiados com emendas úteis, e que folguei que o Sr. Joaquim Crisóstomo, tivesse discutido o assunto para poder esclarecer os Srs. Senadores que não pertencem à 1.ª Secção, onde êle foi discutido como devia ser.
Êste projecto, como muito bem disse o nosso colega Sr. Álvares Cabral, não é mais que a sequência de anteriores disposições, que foram, por assim dizer, obrigatòriamente paralisadas, em virtude da anormalidade da vida.
Nas empreitadas o preço dos materiais, a mão de obra, tudo emfim tem crescido sucessivamente, por assim dizer, dia a dia, e por uma forma que torna absolutamente impossível qualquer previsão.
O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo): — Podia tomar-se como base a moeda-ouro e conforme a desvalorização da moeda ia-se pagando aos empreiteiros.
O Orador: — Se se usasse dêsse meio, tenho a certeza de que não havia dinheiro para pagar aos empreiteiros.
Creia V. Ex.ª que o Estado tem perdido muitos milhares de contos em virtude da impossibilidade em fazer determinadas empreitadas.
Se porventura as empreitadas se tivessem feito em tempo competente a despesa não seria tam grande porque a paralisação dos trabalhos começados redundaria a maior parte das vezes na inutilização dos trabalhos efectuados.
Torna-se, portanto, de absoluta necessidade e de maior urgência que êste projecto de lei seja votado a fim de que possam continuar as obras.
Parece-me, Sr. Presidente, que a Câmara está suficientemente esclarecida da conveniência e oportunidade da proposta que está em discussão.
Mas se entende que não há razão para o fazer, não o faz. É o mesmo caso que se dá com os particulares, com a excepção que o Estado tem a lei de 1906 que contém disposições absolutamente taxativas sôbre prazos.
Para V. Ex.ªs verem a importância que tem êste projecto basta que lhes diga que na ligação ferroviária de Contomil com o Pôrto de Leixões, apesar de nós já termos aqui votado 6:000 contos para essa obra, se encontram paradas as obras porque ainda hoje tive conhecimento que a última empreitada que se propôs foi completamente abandonada.
E V. Ex.ªs sabem bem a importância que tem essa ligação, tanto sob o aspecto, comercial, como sob o aspecto do tráfego.
Pois êste projecto iria regulamentar todos os casos como êste.
S. Ex.ª referiu-se também às entidades que podem superintender neste assunto.
Como V. Ex.ªs vêem, êste projecto refere-se a empreitadas de quàsi todos os Ministérios, e quási todos êles têm os seus conselhos privativos que podem tomar conta dêstes casos quando porventura não haja outra entidade para o fazer.
Trocam-se explicações entre o orador e o Sr. Joaquim Crisóstomo sôbre o assunto.

O Orador: — Isto é para dizer a V. Ex.ª o que há com relação a algumas obras.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Mas isso deve ser sempre submetido ao parecer dos técnicos e nunca ao do Ministro.
O Orador: — Mas V. Ex.ª sabe que o Conselho Superior de Obras Públicas já está hoje muito sobrecarregado com trabalho e, portanto, haverá demora.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Vejo que a lei precisa ser regulamentada.
O Orador: — Já está e já estão tomadas as medidas necessárias. De facto, não se trata senão de estender, até certo ponto, uma disposição que foi aceita como indispensável para se continuarem a fazer as obras.
Tenho dito.
O Sr. Afonso de Lemos: — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que dou o meu voto ao projecto em discussão.
Já por mais de uma vez aqui tenho declarado que, a meu ver, a base da administração do país deve consistir numa obra de fomento. Mas não basta ter a aspiração, é preciso torná-la viável e realizá-la.

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Ora êste projecto torna possível uma obra de fomento, qual é a de caminhos de ferro, e quem diz caminho de ferro poderia dizer quedas de água. etc.
Depois, o projecto não é feito por um indivíduo qualquer e foi apresentado pelo Ernesto Navarro, que todos nós conhecemos e que é o presidente do Conselho dos Caminhos de Ferro do Estado, merecendo-nos portanto, todo o respeito.
Assim, eu dou o meu pleno voto ao projecto.
O Sr. Presidente: — Não está mais ninguém, inscrito sôbre a generalidade.
Vai votar-se.
Procedendo-se à votação, verificou-se não haver número preciso de Srs. Senadores.
O Sr. Presidente: — Fica encerrada a discussão do projecto na generalidade, visto não haver número para se votar.
A próxima sessão é na sexta-feira, à hora regimental, sendo a ordem do dia a continuação da que estava dada para hoje, com os seguintes projectos: n.ºs 533, 352, 10, 482, 342, 404, 420, 440, 360, 368, 501 e 14.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 25 minutos.
O REDACTOR — Alberto Bramão.

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