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REPÚBLICA

PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

SESSÃO IET.0 66

EM 3 DE JUNHO DE 1924

Presidência do Ex,"° Sr, António Xavier Correia Barreto

Secretários os Ex.m08 S

Joaquim Manuel dos Santos Garcia António Gomes de Sousa Varela

Sumário.—A sessão abre às 15 horas e 17 minutos* com 24 Srs. Senadores. Aprova-se a acta e dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Augusto de Vasconcelos refere-se à representação portuguesa na Conferência Interparlamentar, de Comércio, falando também sobre o assunto o Sr. Ribeiro de Melo.

O Sr. Procópio de Freitas reclama que se faça um inquérito sobre o conflito entre a policia e comunistas, nos Olivais.

O Sr. Oriol Pena ocupa-se também desse conflito, e diz que a sua impressão é a de que a polícia cumpriu rigorosamente, o seu dever.

O Sr. D. Tomás de Vilhena reclama a presença do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira).

O Sr. Joaquim Crisóstomo ocupa-se da questão do pão.

O Sr. Presidente do Ministério (Álvaro de Castro) dá conta do que se passu com a aviação, dizendo que as forças da guarnição estão tratando de meter na ordem os oficiais que se revoltaram. Falam sobre o assunto os Srs. Pereira Osório, Augusto de Vasconcelos, Mendes dos Beis, Procópio de Freitas, Joaquim Crisóstomo e Ribeiro de Melo, replicando a todos os oradores o Sr. Presidente do Ministério.

Ordem do dia. — Prossegue a discussão da proposta de lei n." 548, falando os Srs. Pereira Osório, Hernulano Galhardo, D. Tomás de Vilhena, Medeiros Franco e Lima Alves, sendo a proposta de lei aprovada na generalidade.

Aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.

Presentes à chamada 74 Srs. Senado-dores.

Entraram durante a sessão 25 Srs. Senadores.

Srs. Senadores que responderam à chamada:

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Álvaro António Bulhão Pato.

António da Costa Godinho- do Amaral.

António Gomes de Sousa Varela.

António Maria da Silva Barreto.

António Xavier Correia Barreto.

Artur Augusto da Costa. •

Artur Octávio do Rego Chagas.

Augusto Casimiro Alves Monteiro.

Augusto César de Almeida Vasconcel-los Correia.

César Procópio de Freitas.

Francisco António de Paula.

Francisco José Pereira.

Francisco de Sales Ramos da Costa. . Francisco Xavier Anacleto da Silva.

Herculano Jorge Galhardo.

João Carlos da Costa.

João Catanho de Meneses.

João Manuel Pessanha Vaz das Neves.

Joaquim Manuel dos Santos Garcia.

Joaquim Pereira Gil de Matos.

José António da Costa Júnior.

José Augusto Ribeiro de Melo.

José Duarte Dias de Andrade.

José Joaquim Pereira Osório.

José Mendes dos Reis.

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Diário das Sessões do Senado

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.

Aníbal Augusto Ramos de Miranda.

António de Medeiros Franco.

Augusto de Vera Cruz.

César Justino de Lima Alves.

Gonstantino José dos Santos.

Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.

Elísio Pinto de Almeida e Castro.

Ernesto Júlio Navarro.

Francisco Vicente Ramos.

Frederico António Ferreira de Sim as.

Joaquim Crisóstomo da Silveira Jániòr,

Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.

José Joaquim Fernandes de Almeida,

José Joaquim Fernandes Pontes. . José Machado, Serpa.

Luís Augusto de Aragão e Brito.

Luís Inoccncio Ramos Pereira. . Raimundo Enes Meira.

Rodrigo Guerra Alvares Cabral.

Tomás de Almeida Manuel de Vilhe-na (D.).

Vasco Gonçalves Marques.

Srs. Senadores que faltaram à séêsão:

António Alves de Oliveira Júnior. Aprígio Augusto de Serra e Moura. João Alpoim Borges do Canto. João Maria da Cunha Bãfbosa. João Trigo Motinho. Joaquim Teixeira da Silva. Jorge Frederico Velez Caroço» José Augusto de Sequeira. José Nepomuceno Feínandes Brás. Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Júlio Ernesto de Lima Duque. Luís Augusto Simões de Almeida. Mannel Gaspar de Lemos. Nieolau Mesquita-j-Pedro Virgolino Ferraz Chaves. Ricardo Pais Gomes. Roberto da Cunha Baptista. Rodolfo Xavier da Silva» Vasco Crispiano da Silva. Vítor Hngo de Azevedo Coutinho.

O Sr. Presidente: —Vai protíeder-se à chamada.

15 horas e 5 minutos,

O Sr. Presidente: — Estão presentes 24 Srs. Senadores. Está aberta a sessão. Eram 15 horas e 10 minutos. Vai ler-se a acta. Leu-se.

O Sr. Presidente : — Como ninguém pede a palavra considera-se aprovada. Vai ler-se o

Expediente

Ofícios

Do Juízo de Direito da 6.a vara cível da comarca de Portugal.

Tenho a honra de solicitar a necessária autorização da Câmara da digna presidência de V. Ex.a para o Sr. César Justino Lima Alves, comparecer no dia 80 de Junho próximo, pelas 13 horitgj na quidta das Peles, freguesia de Odivelas, a fim de funcionar como perito em uma vestoria*

Autorizado.

Do ministério dá Agricultura a fim de que sirva de base a um inquérito que ordenei, venho rogar a V; Ex.a se digne enviar-me, com a possível urgência, cópia fiel das acusações formuladas na sessão de .20 do corrente pelo Sr. César Justino Lima Alves, com referência ao funcionamento da estação de ensaio dó máquinas e nomeadamente'ao modo como estão organizados determinados processos de subvenção à lavoura mecânica interessando o engenheiro alemão Henrique Behafeld, estabelecido nesta cidade.— O Minis'tro da Agricultura, Joaquim Ribeiro.

Da Câmara dos Deputados, remetendo uma proposta de lei, que coilsiderâ ííâ-cional a festa de Portugal, qae se celebrará no dia 10 de Junho de cada ano.

Pára a 2.a ietç&o.

Nota dç interpelação

Pretendo interpelar o Sr. Ministro do Interior sobre o decreto de 26 de Maio coríeníe que aprovou os estatutos do Corpo de Scouts Católicos Portugueses como atentatório da Constituição e leis da República e da dignidade e prestígio desta.

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Sessão de 3 de Junho de 1924

O Sr; Presidente:—O Sr. Juiz de Direito da 6.a vara cível, pediu à Câmara que autorize a comparência do Sr. Lima Alves, no dia 30 deste mês na quinta das .Peles. - Foi concedida.

O Sr. Augusto de Vasconcelos: — Sr. Presidente : não estive ontem na sessão, porque tive de ir visitar uma pessoa de família, que se encontra doente, e por isso não ouvi as considerações do Sr. Ribeiro de Melo, a respeito da Conferência Inter-Parlamentar de Comércio.

Julgo, no entanto, que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Her-culano Galhardo responderam a S. Ex.a na parte que diz respeito à utilidade da Conferência. .

Não me permitia portanto pedir a palavra para tratar deste assunto, se não quisesse frisar, e pôr mais om evidência, a utilidade que todos os países atribuem a esta Conferência.

O Brasil, que é uma grande Nação, enviou três parlamentares à Conferência.

O Sr. Ribeiro de Melo (em aparte}; — Isso é o Brasil que é um país rico.

O Orador:—Nem só os países ricos fazem a sua representação nessa Conferência.

A Turquia, cuja situação financeira está bastante agravada, a Letónia, que também não está em condições prósperas, enviam representantes a essa Conferência.

Não compreendo, Sr. Presidente, como se possa negar importância a uma .Conferência que permite quê os parlamentares dos diferentes países possam ir aos diferentes Parlamentos tratar de todas as questões económicas interessantes.

Chegámos a uma fase da política internacional em que as negociações entre os diversos países se podem fazer à face de todos, podendo cada um defender os seus interesses em lugar de serem defendidos nas chancelarias.

Nunca pensei que princípios contrários à Conferência fossem defendidos pelo Sr. Ribeiro de Melo.

O Sr, Ribeiro de Melo (em aparte}-.— Peço perdão, eu não defendo esses princípios.

O Orador: — Sr. Presidente: chegámos a uma fase interessante e progressiva da política internacional, que todos os países têm obrigação de defender e encorajar e não de diminuir.

O Sr. Ribeiro de Melo: —Pára isso era necessário quê V". Ex.a nos dissesse qnâl a utilidade quê nos tem advindo dessa Conferência.

O Orador:—Já a mostrou ontem o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

No entanto, devo frisar â V. Ex.a que a protecção que aos vinhos licorosos portugueses foi dispensada em França é o resultado dessa Conferência.

Há, todavia, tira ponto, em qtíô eu não posso deixar de estar de acordo com o Srl Ribeiro de Melo: é aquele que se refere à insuficiência da representação, pela parte que me dia respeito.

Não apoiados.

V. Ex.a deve concordar que ôti não tenho culpa disso; a culpa ó do Parlamento, que fez mal a sua escolha.

Não apoiados.

Mesmo escolhendo mal, eu não posso ^deixar de diz.er que Portugal, nessa Conferência, tem uma situação de tal forma elevada, que os seus representantes, embora insuficientes, embora fazendo rflató-rios, dos quais o Sr. Ribeiro de Melo discorda, são escolhidos para uma missão de confiança e essa escolha representa uma prova de consideração para o nosso País.

Se nós nos amesquinharmos a ponto de o apagarmos daqueles deveres de soberania, que importam representação internacional» vamos por mau caminho.

Apoiados.

Há economias que não se justificam, e algumas que são contraproducentes.

Se se quisesse faser esta economia o ano passado, na nossa representação à Sociedade das Nações, resultava num alimento de despesa, porque esSa representação conseguiu na comissão de distribui-, cão de despesas a diminulçãp (íe uma unidade naquilo que Portugal tinha de pagar, o que representa uma economia superior a 300 contos no orçamento.

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Diário deu Sessões 'do Senado

legado, eu aceitava com toda a satisfação essa indicação.

O Orador:—Mas se V. Ex.a tivesse reparado bem, veria que as decisões tomadas em matéria económica pela Sociedade das Nações já tinham sido votadas pela Conferência Parlamentar de Comércio, e foram adoptadas pela Sociedade das Nações.

O Sr. Ribeiro de Melo: — Não havia necessidade disso.

O Orador:—Havia sim, senhor, porque nesta comissão estão alguns dos economistas mais notáveis do mundo, e são eles que têm dotado as medidas seguidas depois pelos outros organismos das conferências internacionais.

Eram estas as palavras que tiaha a dizer por dever de representação que o Parlamento, embora mal, me tem confiado.

O Sr. Ribeiro de Melo:—Não apoiado. O orador não reviu.

O Sr. Ribeiro de Melo: — Sr. Presidente: apenas para dizer ao Sr. Augusto de Vasconcelos que as considerações que eu fiz na sessão de ontem e durante a sua ausência de modo nenhum se referiram à sua personalidade, isto é, à volta da competência ou insuficiência para bem representar o País nas conferências inter-par-lamentares de comércio. Antes pelo contrário, se tivesse de atender aos merecimentos, certamente o Sr. Augusto de Vasconcelos seria sempre escolhido e sempre a mea agrado, pela razão seguinte, porque S. Ex.a, além dos grandes merecimentos que tem, possui esta belíssima qualidade: ó um republicano de sempre.

Muitos apoiados.

Agora, Sr. Dr. Augusto de Vasconcelos, os meus reparos ainda estão de pé, porque ainda me não convenci do contrário.

O Sr. Herculano Galhardo disse ao Senado as razões que muito bem entendeu, e só nos ficou o pesar do seu estado de saúde.

O Sr. Augusto de Vasconcelos, pelo contrário, defende a Coníerência.

Mas o que S. Ex.a não demonstrou é que dessas conferências tivessem resultado tais vantagens que se impusesse a obrigação de mandar no ano de 1924, em que o déficit é de 400:000 contos, a circulação fiduciária de 1.300:000 contos, a libra a 1.50?$!, a carestia da vida insuportável, uma delegação portuguesa a essa Conferência. .

O Sr. Augusto de Vasconcelos: —V. Ex.a esquece apenas que é uma verba que está orçamentada.

O Orador: — Pelo facto de estar orçamentada não quere dizer que se gaste.

Desde que a Nação não está em condições de lhe dar aplicação, ela transitará para o outro orçamento, e se ela for de x, passará a ser de x-L

Se houvesse grande vantagem para Portugal, está muito bem, fazia-se o sacrifício, mas assim, não.

Diz-se que ó necessário levar ao conhecimento das gentes internacionais a forma, como Portugal procura reagir perante as dificuldades que tanto atrofiam a sna vida interna, para o prestígio externo. Isso são palavras muito bonitas que eu queria ver provadas, -mas que ainda não foram confirmadas nem pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, nem pelo Sr% Augusto de Vasconcelos.

É uma questão supérflua, são gastos inúteis que vamos fazer, e ao patriotismo do Sr. Augusto de Vasconcelos impunha--se até adoecer por momentos para não ir à Conferência Inter-Parlamentar do Comércio, para que se não gastasse a verba que está orçamentada, e que não devia ser despendida por quem sempre tem defendido a compressão de despesas.

O Sr. Augusto de Vasconcelos: —

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O Sr. Augusto de Vasconcelos: — É profundamente injusto V. Ex.a para com o Sr. António da Fonseca, que fez numa dessas conferências um relatório dos mais notáveis.

Muitos apoiados.

O Orador: ^-Bem sei, foi em Lyon.

O Sr. Augusto de Vasconcelos: — Não

senhor, foi em Bordéus.

O Orador:—Tem razão, foi em Bordéus.

Mas não há mais nada, não vai V.*Ex.a mais longe, porque não pode ir, e com isso não me convence, porque eu sou muito difícil de convencer, principalmente quando se trate de defender os interesses da Nação e o Tesouro Público, haja ou não verbas orçamentadas.

Vamos gastar dinheiro numa conferência onde não se realiza nada de positivo, onde não se leva uma palavra de tranquilidade em defesa das próprias instituições republicanas, onde não há uma palavra escrita que nos sirva de ensinamento, que nos traga uma novidade.

O Sr. Augusto de Vasconcelos:—V. Ex.a não leu as teses com toda a certeza.

O Orador: — V. Ex.:i fala muito bem, como Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros, e .Ministro Plenipotenciário, que foi, mas eu apenas encontrei um escrito do Sr. Rafael'Levy, que era ao tempo Senador, e que diz que as exportações em 1919 deram um saldo positivo, mas 'que as importações em 1922 e 1923 subiram de tal maneira, que cobriram fartamente o saldo havido.

É um balanço comercial e nada mais.

V-. Ex.a, Sr. Augusto de Vasconcelos, apesar da sua autoridade, ainda não demonstrou que a Nação está na possibilidade de poder despender, com os membro • da comissão, essa grande soma de libras, que representam escudos, e muito escudos, para uma obra que é absolutamente inútil.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Procópio de Freitas:—Como as minhas considerações demandam a pre-

sença dos Srs. Ministros'da Guerra, Finanças e do Comércio, peço a V. Ex.a que mande saber se alguns desses senhores estão presentes.

O Sr. Presidente: — Conforme a lista, há outros Srs. Senadores antes de V. Ex.a inscritos para interrogarem esses Srs. Ministros.

O Sr. Ministro do Interior disse-me pelo telefone que estava tratando de assuntos de ordem pública.

O Orador:— Apesar de não estar presente nenhum desses Srs. Ministros, entendo que me devo referir a um assunto.

Diz-se por aí que o caso dos Olivais não se passou exactamente como o Sr. Ministro do Interior expôs a esta Câmara.

Afirma-se que dois desses homens foram fusilados pela polícia.

Diz-se que, tendo chegado a polícia ao ponto onde eles estavam, dois deles fugiram e dois não. Para perseguirem um desses grupos foi o cabo Neves acompanhado de outro agente, e que um desses fugitivos em certa ocasião, cansado, parou, e, voltando-se, deu um tiro no cabo.

O outro agente matou um deles.

Diz-se que os outros dois fugitivos tinham conseguido refugiar-se numa fábrica de cortiça, e que, depois alguém, cujo nome se cita, foi denunciá-los.

Esses indivíduos foram trazidos para fora e sofreram pancadas, citando-se até o testemunho de um sargento da administração militar que no momento passava numa carroça..

Indo para a esquadra, mais tarde foram levados para um sítio chamado «Olival», e, tendo-se colocado agentes a uma certa distância para impedir a circulação do público, foram esses homens fuzilados.

Isto têm-se dito e escrito nos jornais.

O que eu desejo é que se proceda a um rigoroso inquérito, porque um procedimento destes da parte da polícia não pode merecer a aprovação de ninguém.

Eu oriento os meus actos dentro da justiça e tenho sempre a ceragem de expor as minhas opiniões. • Peço a V. Ex.a o favor de comunicar as minhas considerações ao Sr. Ministro do Interior.

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Diário das Sessões do Senado

O Sr. Presidente: — Farei chegar ao conhecimento do Sr. Ministro do Interior essas considerações.

O Sr. Oriol Pena: — Sr. Presidente: não me pôde chegar a palavra ontem, mas têm ainda actualidade as considerações que quero fazer.

A actualidade foi agora refrescada pelas breves palavras pronunciadas pelo Sr. Procópio de Freitas.

Tenho a declarar que tendo estado ausente dê Lisboa no sábado e no domingo, aproveitaria a primeira sessão, em que estivesse presente e podesse falar para manifestar em público o meu sentimento pelo falecimento do cabo de polícia Noves, vítima dó seu dever no caso chamado dos Olivais.

Aproveitaria o ensejo para dizer a minha impressão sobre o modo correcto, firme, vigoroso e decidido com que a policia precedeu.

Entendo que todos nós, os que nos dizemos conservadores, deveríamos ter--nos encorporado no préstito fúnebre desse desgraçado cabo de polícia. Tê-lo--ia feito com muito sentimento, se não tivesse estado ausente de Lisbea.

No meu entender e no entender de várias pessoas com quem tenho falado e discutido sobre o caso, e em presença dos incompletos e reduzidos extractos dos jornais, íieou-me a impressão de que a polícia cumprio rigorosamente o seu dever.

Ficou-me a impressão de que a policia fez polícia, como ela deve ser feita, quando ficou sem a vida o comandante desse troço de guardas, no cumprimento estrito do seu dever.

Se ele, o falecido cabo "Neves, o os seus guardas tivessem tido o impulso e a precipitação apontados pelo Sr= Procópio de Freitas . . .

O Sr." Procópio de Freitas (interrompendo}:— Tenho aqui a local que é do próprio Correio da Noite.%

O Orador: — Não sei.dessas informações e são-me indiferentes.

Estou a expor o que a inteligência me diz e julgo ser a verdade.

• Oiça S. Ex.e o resto das minhas considerações.

Nada mais fácil aos agentes de polícia

se eles quisessem praticar a brutalidade violenta de destruir esses homens — no dizei1 de S. Ex.a— e talvez as mãos não lhes devesse doer, porque pelos cadastros aqui lidos e pelo relato dos Sr. Ministro do Interior, nenhum deles era digno de comiseração., nem de dó, o cabo Neves estaria talvez vivo ainda hoje.

Não se íez assim.

Segundo relatam os jornais o grupo dos agentes, em missão de defesa da or dem, procurou dominar os díscolos, orde nando-lhes que levantassem as mãos ao ar e foi nesse momento que se deu a colisão.

Não posso compreender por quo razão o Sr. Procópio de Freitas queira atribuir à polícia a responsabilidade no fuzilamento desses homens.

Compreendo que S. Ex.a neste assunto, procure defender a sua posição de extremista, mas nós temos a obrigação de lhe contraditar e contrabater afirmações desta natureza e dizer, alto e bom som, a verdade.

Disse aqui o Sr. Ministro do Interior— e creio ser essa a verdade— que estavam quatro criaturas de cadastros apostadas em chacinar um homem e que a polícia, em obediência às ordens e instruções do seu brioso comandante, não fez mais do que cumprir essas ordens cm cnjo cumprimento perdeu u vida um dos seus chefes.

Para esse que morreu no seu posto, em defesa da ordem, em perseguição do crime, vai todo o nosso respeito e a nossa saiidade.

Lamento, Sr. Presidente, ter estado ausente de forma a não poder vir prestar-lhe homenagem, em nome dos consejr-vadores deste lado da Câmara, pela dedicação, coragem e altruísmo - com que esse homem arriscou a vida deixando crianças na orfandade.

Tenho dito.

O Sr. Procópio de Freitas: — Sr. Presidente : não haja confusões com as minhas palavras. A única afirmação que eu fiz foi que houve jornais e mesmo várias pessoas o dizom também, não sei se com fim reservado ou não, que o caso dos Olivais não se passou exactamente como o Sr. Kinistro do Interior expôs ao Senado.

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passado eom o Sr. Ministro do Interior aqui expôs, nem podia fazer tal afirmação.

O que eu disse foi isto e o que digo e continuo a dizer é que é indispensável que se proceda a um rigoroso inquérito sobre os factos, porque, se não foi assim, como dizem os jornais, com o que muito folgarei, ostá bem; -mas, se foi assim como eles dizem, está mal e muito mal.

Tenho dito.

O orador não reviu.

.0 Sr. D. Tomás de Vilhena : — Sr. Presidente : tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro dos' Negócios Estrangeiros, para me referir ao assunto da nomeação do embaixador para Londres. •

Como S. Ex.a uão está presente não uso da palavra e simplesmente digo que é para lamentar que não esteja aqui um Ministro, pelo menos.

Se há questões

O orador não reviu,

O Sr. Joaquim Crisóstomo : — Sr. Presidente: estranho que o Governo, em geral, não assista à primeira parte das sessões desta Câmara.

Mais duma vez o Senado se tem manifestado no sentido de convidar o Governo a fazer-se representar, sem que haja produzido efeito as suas justificadas reclama-

A Constituição e o nosso regimento dão--nos o direito de exigir a comparência do Governo para responder pelos seus actos, embora não tenha quaisquer preceitos de natureza penal para o Senado aplicar no caso de serem infringidas essas disposi-

Bem sei que é fácil propor uma moção de desconfiança, uma moção de censura, uma moção reveladora de estranheza por parte do Senado perante a atitude do Governo.

Por um dever, talvez de cortesia, ainda nenhum dos nossos ilustres colegas tomou essa atitude, sendo certo, a meu ver, que ele se impõe para que de futuro haja, não digo mais respeito, mas, pelo menos, mais consideração por um dos órgãos da soberania nacional.

Como estou no uso da palavra, aproveito o ensejo para referir à Câmara uma notícia que se me afigura verdadeira publicada no jornal O Diário de Lisboa, de ontem, onde consta que o Comissariado dos Abastecimentos dividiu pelos funcionários dependentes dessa entidade 1:000 contos, a título de gratificação pelos serviços por eles prestados.

Essa verba provém dos lucros alcançados pelo Comissariado nos seus armazéns.

No momento, em que a vida está quási insuportável atenta a elevação do preço dos géneros, é de estranhar que uma entidade oficial, em vez de se preocupar em servir bem o público, oriente a exploração dos serviços a seu cargo unicamente com o fim de obter largos lucros. Mas o mais grave é que o Comissariado mais de uma vez tem auferido lucros'em gene? ros vendidos que vão além de 50 por cento.

O Sr. Ministro da Agricultura, a quem por mais de uma vez me tenho referido e por quem tenho a maior consideração pessoal, conquanto o julgue incompetente para desempenhar os serviços. que correm pela sua pasta, assiste perfeitamente indiferente a todas estas irregularidades do Comissariado, onde se vende manteiga falsificada, não havendo muitos dias que um dirigente dos armazéns da Bua do Norte foi autuado e condenado, porque a manteiga, em vez de ter 15 por cento de água, tinha 24 por cento.

Pois, apesar de tudo isto. o Sr. Ministro da Agricultura concede ao Sr. Sá da Costa, que não é outra cousa senão um delegado do Sr. Pina Lopes, que passou da Manutenção .Militar para o serviço da moagem, os mais amplos poderes.

O Sr. Ministro da Agricultura conserva este funcionário num lugar de grande importância, sem que procure por qualquer forma pedir-lhe conta dos seus actos.

Toda a gente que se utiliza dos armazéns reguladores sabe que nesses estabelecimentos os géneros que aí se vendem são da pior qualidade, além de que na maior parte das vendas os empregados não dão os pesos devidos.

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Diário tia» Senõei ao 'Senado

assunto, declara que, oxtinguindo-se os armazéns reguladores, podia levantar-se contra ele uma grande campanha, visto que eles foram montados para beneficiar o povo, que seria prejudicado com a sua suspensão; mais. disse o Sr. Ministro da Agricultura não conhecer pessoa alguma para desempenhar as funções de comissário.

Há cerca de dois anos, quando foi discutida a lei cerealífera da autoria do Sr. Ernesto Navarro, foram suprimidos todos os comissariados" do pais, excepto o de Lisboa, e eu nessa ocasião ponderei a S. Ex.a que não havia motivo algum para se abrir uma excepção; mas o Sr,. Ernesto Navarro declarou que era conveniente conservar, embora transitoriamente, o de Lisboa, para intervir em quaisquer dúvidas que se suscitassem no período transitório contra o regime existente e o regime futuro.

Desapareceu, por consequência, essa causa.

Hoje a questão da moagem e panificação já não oferece dúvidas a ninguém; por maiores que sejam os esforços dos Srs, Ministros para alcançar bom pão para a população de Lisboa todos caem perante a moagem.

Só há uma solução: é entregar à moagem de Lisboa o fornecimento do pão e deixá-la à vontade; é claro, assumindo as responsabilidades que daí lhe advierem, porque me parece que não será necessário intervir a polícia nem os fiscais no sentido de evitar o abuso, visto a moa-,gem, perfeitamente à vontade, vir a irritar a opinião pública ao extremo de essa opinião ter de intervir e actuar, não no sentido benévolo e transigente que nós observamos, mas com energia, proclamando a conveniência e a necessidade de a moagem ser expropriada, sendo a função do fornecimento do pão confiada a uma entidade estrangeira, porque, muito embora pareça à primeira vista que esta doutrina é falta de patriotismo, a verdade é que me parece não temos outra solução para o problema do pão.

É necessário fazer-se uma concess.lo do fornecimento do pão "a uma entidade que, ao mesmo tempo que possa fazer esse serviço, possa assumir a responsabilidade que dele lhe advier.

Será talvez uma doutrina especial, mas

o que é certo é que todas as tentativas que se têm í eito têin sido nulas dentro dar forças e elementos de que dispomos'; não há modo de fornecer pão capuz à cidade de Lisboa.

Temos, portanto, de recorrer a uma solução nova, que só depois de experimentada se pode ver se dá ou não resultado. No regime em que vivemos há dois' tipos de pão: um de primeira qualidade e outro de segunda; este de péssima qualidade, intragável, de forma que as pessoas doentes, que dispõem dalguns escudos, não o compram, restando-lhes simplesmente recorrer ao pão de primeira, cujo preço é tam elevado que o tornam quási inacessível à bolsa daqueles que não disponham de grandes meios de fortuna.

Apoiados.

Ainda há pouco o Sr. Ministro da Agricultura, propondo-se resolver este assunto, determinou que todos os produtores de trigo o dessem ao manifesto, e no caso de não o fazerem a autoridade competente poderia requisitá-lo e apreendê-lo.

Pregunto eu: £ qual é a orientação do Governo nesta matéria?

No meu entender, o que se devia era autorizar a importação imediata da farinha, desde que o lavrador se retrai.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente : pedi a palavra para comunicar ao 'Senado os factos que ocorreram com os aviadores.

Seguidamente à sessão de ontem da Câmara dos Deputados alguns aviadores pretenderam levar à sublevação algumas unidades, ligando-as no seu movimento de indisciplina. Fizeram-lhes expedir um telefonema que passo a ler:

«Da Amadora.— O Sr. director da,Ae-ronáutica Militar encarregou-me de comunicar a V. Ex.a o seguinte:

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Sessão de 3 de Junho de 1924

Morais Sarmento • o exonerado o Sr. major- Cifka Duarte. Os aviadores consideram o decreto inconstitucional e uma afronta à sua honra de homens e oficiais 'do exército, pelo que resolveram não o acatar e não aceitar, quaisquer que sejam as consequências que daí resultem, como director da Aeronáutica outro oficial que não seja o major Cifka Duarte. Toda a. •aviação se conserva ordeira e pacifica nos seus quartéis. A disciplina é absoluta; os oficiais de aviação apresentam os seus cumprimentos a todos os camaradas e Ex.mo comandante, e pedem que esta comunicação seja transmitida a todos os camaradas.— O oficial comandante dos grupos de esquadrilhas de aviação República».

Logo que foi conhecido este telefonema, que caracterizava o acto de rebelião, foi determinado pelo Sr. Ministro da Guerra ao Sr. general da divisão que tomasse as providências que o caso requeria. O Sr. Ministro da Guerra, de acOrdo com o Sr. general da divisão, entendeu conveniente, antes -dum procedimento enérgico, que. o Sr. Morais Sarmento fosso à Amadora e à Granja, a'fim de verificar se efectivamente os oficiais estavam em rebeldia. Efectivamente assim era, porque se recusaram a acatar determinações que esse oficial lhes fez.

O Sr. general de divisão entendeu ainda fazer uma démarche de carácter pessoal, mostrando aos oficiciis em rebeldia .os inconvenientes da situação, não só para eles como para o exército. Como se não convencessem, o Sr. Ministro da Guerra determinou que fossem contidos nos limites da disciplina os oficiais indisciplinados.

Foram intimados os três maiores responsáveis a apresentaren-se no quartel general,-e, no caso de não comparecerem, a esquadrilha da Amadora será cercada pelas tropas da guarnição.

Foi comunicado ao Sr. Ministro da Guerra que os sargentos e artífices dessa esquadrilha se tinham apresentado na ba-•taria de Queluz, não querendo acompanhar os oficiais no seu acto de indisciplina.

O Governo tem á segurança, que lhe é dada pelo comandante da divisão, de que as forças do seu comando obedecerão às

suas determinações- e o Sr. Ministro da Guerra tem absoluta confiança no Sr. general da divisão, um velho republicano e distintíssimo oficial que o Senado muito bem conhece.

O Governo tem, portanto, toda a certeza de que dominará o movimento de rebeldia que ficará como uma triste nota no nosso exército, mas não como um exemplo para futuros actos de rebeldia.

O orador não reviu. °

O Sr. Pereira Osório : — Este lado da Câmara confia absolutamente em que o Governo saberá manter, com energia, o prestígio e disciplina do exército, que é a salvaguarda da dignidade da Kepública.

O Sr. Mendes dos Reis: — Sou o primeiro a reconhecer as boas intenções dos aviadores, que julgam erradamente proceder em desagravo do seu brio ofendido, mas o que é facto é que ofenderam gra-vamente a disciplina do exército.

Portanto, o Governo tem estrita obri-.gação e dever .de os obrigar a respeitar a mesma disciplina.

Não posso deixar de felicitar o Governo pelas acertadas providências que tomou e pelo bom. critério com que as pôs em prática, sem precipitações nem violências escusadas, que seriam realmente injustificáveis para com rapazes, que, sendo embora uns revoltados, não podem contudo ser tratados como criminosos sem consideração.

O Sr. Augusto de Vasconcelos : — Em nome do meu Partido, íaço votos para que o conflito se resolva sem que a disciplina militar seja ofendida e não deixando de se ter em conta, tanto quanto possível, os serviços prestados.

O Sr. Procópio de Freitas : — Não serei eu que defenda actos de indisciplina, a não ser em casos muito extraordinários, em que os actos de indisciplina se justificam.

Não conheço o coronel que foi nomeado para a aviação nem- conheço nenhum, dos oficiais aviadores.

Sei, contudo, que são oficiais briosos e valentes, que têm- cumprido sempre os seus deveres.

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i meado para comandar a aviação tem escrito vários artigos contra ela.

Se assim é, de antemão .se devia saber que esse oficial não podia ser bem recebido pelos aviadores.

Portanto, Sr. Presidente, se é -certo que esse Sr. coronel não era um oficial que tivesse a simpatia desses oficiais aviadores, e se de facto ele tinha escrito contra a aviação, não tendo por conseguinte probabilidades de ser bem recebido, esse oficial não foi bem nomeado.

E assim, se o acto desses oficiais aviadores é punível dentro da disciplina militar, o que é facto .também é que tal nomeação não se devia ter feito. Tenho dito. O orador não reviu.

O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente: eu não encaro o acontecimento relatado à Câmara pelo Sr. Presidente do Ministério com o mesmo optimismo com que S. Ex.a o fez.

O acto de indisciplina da aviação militar tem origem remota, não é um facto isolado, é o reflexo dum estado geral.

Eu desejaria, como desejo, que o Sr. Presidente do .Ministério pudesse resolver esse caso com a simplicidade com que o apresentou.

No emtanto, num país pequeno tudo se sabe, e, assim, consta que o exército,português está descontente com a marcha dos negócios políticos.

Eu sei que o exército não tem nada que ver com isso. Mas as cousas são o que são.

Em todos os cafés, ruas, jornais, etc., se diz a una você que o exército está disposto a intervir nos negócios públicos.

Convém, pois, que o Sr. Presidente do Ministério diga o que há, para tranquilidade do país.

Um tal estado de perturbação nos espíritos constitui um mal geral, de onde Tesultará nm mal maior para a nação.

^O exército está descontente, porquê?

£ Porque quere intervir na marcha dos negócios públicos?

" ,; Porque quere interpretar as justas aspirações do povo que pede melhoria de condições de vida?

E muito difícil de determinar.

Mas sejam quais forem as causas, o ;que o Governo deve fazer, é ir de encon-

tro a elas, porque compreende-se que .um Governo forte, como são os ingleses e americanos, se mantenha firme e inabalável no seu posto, mas um Governo que não tenha- um apoio decidido na opinião pública e que mais tarde tenha de vir a sucumbir, como já tem sucedido, como sucedeu por exemplo, com o Governo António Granjo, vale mais ir ao encontro das justas aspirações da opinião pública.

É necessário que o Governo não enclausure na sua força aparente, que veja com olhos de ver e que não suponha que todos os que hoje lhe dirigem sorrisos e cumprimentos, serão amanhã os seus defensores, porque esses amanhã-seguirão um caminho, que é fugir, como já tantas vezes tem sucedido.

Para evitar tudo isso, e que no estrangeiro se façam juízos como muitas vezes já se têm íeito, juízos pouco favoráveis, eu entendo qua o Sr. Presidente do Ministério — é um conselho que me permito dar-lhe— deve procirar, quanto possível, ir ao encontro das aspirações do povo, que parece que não tem força, mas que a tein.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ribeiro de Melo:—Sr. Presidente: ouvi.na outra casa do Parlamento as declarações feitas pelo Sr. Presidente do Ministério, acerca do conflito, ou actos de indisciplina da aviação militar.

Ouvi também um Deputado e antigo oficial do exército dos mais valentes, dos que mais serviços têm prestado à República e à Pátria e que é republicano desde os bancos da Escola Politécnica, o Sr. António Maia.

O Sr. António Maia deixou de ser oficial do exército, em virtude de um conflito com o Ministro da Guerra de então, quando ele devia ser respeitado em Portugal.

O Sr. .Ministro da Guerra, do tempo, em vez de deferir o requerimento em que o Sr. António Maia pedia a demissão de oficial do exército, devia indeferi-lo, porque sabia que esse oficial fazia falta à defesa da República e da Pátria.

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regaço republicano e no do operariado, aquele cíilor que tinha antes e depois de proclamada em 1910.

O Governo da presidência do Sr. Álvaro de Castro, cujo chefe republicano, sabe enfrentar de face as grandes e momentosas questões da sociedade portuguesa, tem adormecido, devido naturalmente à resistência passiva dos funcionários do seu Ministério, da côterie que o rodeia, tem obliterado o sentimento de patriotismo; S. Ex.a esqueceu-se de cumprir e fazer cumprir as declarações de alta nobreza republicana que S. Ex.a levou à Câmara dos Deputados, anunciando, que todos • os erros e crimes, cometidos pela alta finança e pelo funcionalismo, seriam castigados.

E, Sr. Presidente, daí resultou a indisciplina -e a falta de apoio ao Governo, não ao Governo do Sr. Álvaro de Castro, mas a todos os Governos, porque estão absolutamente desprestigiados todos aqueles Governos que não comecem por cumprir aquilo que dizem.

O Sr. Álvaro de Castro, que trouxe ao Parlamento da República os latrocínios cometidos pelas grandes indústrias, pelos grandes monopólios de Portugal, como o é, por exemplo o da Companhia dos Tabacos, ainda não declarou ao país os motivos que o levaram a não coibir esses abusos.

Disse o Governo que encontrou uma situação bem triste para as Instituições Republicanas, proveniente de vários fac-.tos, como seja o das 4:000 libras, entregues a Bancos e casas bancárias.

Pois bem, Sr. Presidente, até hoje o Governo do Sr. Álvaro de Castro ainda não conseguiu que esse dinheiro entrasse nos cofres do Estado.

O Sr. 'Alberto Xavier, corno director geral da Fazenda Pública, numa informação que deu ao Sr. Ministro das Finanças, de então, declarou-se conforme com a petição feita por uma casa bancária.

A cópia desse despacho, tenho-a eu na,s minhas mãos; e- qualquer dia, quando se realizar a minha interpelação ao Sr. Ministro das Finanças, terei o prazer de lê-lo à Câmara.

Em face dessa informação, o Ministro deferiu uma petição da casa Espírito Santo.

Sr. Presidente: andamos há meses a

apoiar o Governo presidido pelo Sr. Álvaro de Castro, com a convição de que S. Ex.a saberia trazer ao espírito da nação aquela confiança pela qual há muito anseamos, metendo nos eixos a desregrada administração do Estado, e sobretudo a alta finança.

E, Sr. Presidente, não se fez nada, absolutamente nada disso.

Os esbanjamentos continuam.

O Sr. Ministro das Finanças m,andou o Sr. Alberto Xavier a Londres e não veio dizer ao País em que condições se realizou essa viagem e quais foram os proventos dela.

O Sr. Ramos de Miranda: — Parece que tem procuração do Sr. António Maia.

O Orador: — Não tenho procuração do Sr. António Maia.

A única procuração que tenho é a de republicano, e essa impõe-me o dever de neste momento falar bem alto.

E creia V. Ex.a, Sr. Presidente do Ministério, que o meu voto de Senador não vai mais para o Governo de V. Ex.a, porque não o merece, visto não ter ido ao encontro das justas aspirações do povo português.

E cá estamos com o Governo do Sr. Álvaro de Castro há meses no Poder anunciando que vai castigar tudo aquilo que tem prevaricado, e não castigando ninguém.

Os Transportes Marítimos do Estado, que levaram a frota marítima à ruína, continuam impunes.

Todos aqueles que são responsáveis pelo desastre e desaire da Exposição de Portugal no Rio de Janeiro, sobretudo na parte, que diz respeito aos pavilhões, continuam impunes.

Todas as casas, como o Banco Português e Brasileiro e a Casa Torlades, que levantaram dinheiro dos cofres do Estado e ainda não entraram com esse dinheiro,, e o Sr. R^geroni, continuam no seu palácio a arvorar a bandeira da nação aliada e amiga, continuam impunes.

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Assim é que a Companhia dos Tabacos deve uma enorme quantidade de libras, e o Governo ainda a não forçou a pagar.

O Banco de Portugal está fora da alçada da lei, e o Estado não tem a força precisa para o meter na ordem.

A maior parte dos políticos portugueses estão envolvidos em negócios, com companhias e empresas, e não têm a força moral para se levantar contra tais entidades.

Não foi impunemente que os homens da propaganda, Afonso Costa, António José de Almeida, Augusto de Vasconcelos, Afonso de Lemos e tantos outros, fizeram a República em 1910. S. Ex.asde novo deviam ir defender nos comícios à entrance os ideais republicanos.

Hoje, quem nos governa são os detentores da alta finança, do grande comércio e da grande indústria. São também os adesivos que nos tempos dos partidos regenerador, progressista e franquista eram simples e meros regedores de aldeia.

Evoco o talento de Alexandre Braga, a sua palavra de grande tribuno, a que na Câmara dos Deputados ouvi chamar à monarquia «uma falperra de manto e coroa».

Por minha vez agora, eu, pigmeu da oratória, declaro que a Éepública é defendida por gananciosos.

Mas não se tem feito nada disso, nem se pode fazer, porque o Go/êrno está manietado pela alta finança e é defendido pelos neo-republicauos.

Nós vemos que é mandano para a legação de Londres um homem como o Sr. Dr. Augusto de Castro, que foi licenciado pela moagem por seis meses, para ir ser o representante da Eepública Portuguesa em Londres!

Veja-se isto, Sr. Presidente!

(j Onde está a sinceridade republicana, onde está o carácter da Nação?

Sr. Presidente: ao menos que uma voz se levante contra tudo isto. embora ela não seja escutada dentro do seu partido, embora essa voz seja amanhã expulsa dos grandes partidos organizados da Eepública.

O Sr. Dr. Álvaro de Castro organizou um Governo sob os melhores auspícios. S. Ex.a apenas encontra da .parte do Partido Nacionalista, pela voz do respectivo leader, o Sr. Dr. Augusto de Vasconce-

los, uma oposição medíocre. Mas deste lado da Câmara, S. Ex.a recebeu aplauso unânime, e aquele que mais se salientou na solidariedade governamental, fui eu, eu que vi na presidência do Governo um homem com talento, com um passado republicano e capaz de dar uma lição ao partido que havia abandonado', o Nacionalista.

Acompanhei o Governo convencido de que ele havia de pôr tudo na ordem.

Mas três, quatro, cinco, seis meses são passados e vemos as cousas no estado em que estão.

Agora encontra-se o Governo em face duma questão de disciplina.

O apoio que falta ao Sr. Presidente do Ministério é o do povo; essa é que é a questão. Não tenha S.. Ex.a ilusões:- não se deixe seduzir pelo canto da sereia do Sr. Ministro do Interior.

Deve o Sr. Presidente do Ministério convencer-se de que o seu colega do Interior se tem divorciado cada vez mais " do povo republicano; e assim, deve desviá-lo do Governo não deixando de olhar para outras pastas, cujos colegas não o têm, acompanhado bem.

O Sr.. Álvaro de Castro pode presidir a um Governo e pode realizar a sua obra dentro da República. Mas sempre sozinho.

Precisa-se de um Governo Republicano, que não venha vexar uma classe com um decreto sidonista.

Não houve a coragem de rasgar a legislação sidonista, e o Sr. Ministro da Guerra vai aplicar a um oficial republicano de sempre um decreto sidonista.

Mas pouco importa, porque dentro do meu partido o Sr. Malheiro Reirnão ainda é capaz de ir às cadeiras do Poder repetir actos que praticou como secretário de Estado do Sr. Sidónio Pais.

Isto assim irá, até que um dia a consciência republicana diga: «Basta»!

Preciso fazer uma declaração, porque não é, esta, naturalmente, a última vez que falo nesta casa.

Sou republicano, e .fui-o sempre; nenhuma ditadura há que tenha o meu aplauso, e qualquer situação que venha depois do Sr. Álvaro de Castro não será uma situação constitucional. Pois bem: declaro que aceitarei essa situação seja ela qual for.

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O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Agradeço as palavras elogiosas que me endereçaram.

Não posso deixar de aludir ao que disse o Sr. Procópio de Freitas.

Assim, tenho a observar, relativamente ao Sr. coronel Morais Sarmento, que, quer na primeira como na segunda entrevista desse oficial com os aviadores, recebeu pessoalmente provas de simpatia e de consideração, o que destrói as afirmações do Sr. Procópio de Freitas, de que esse coronel não tinha as simpatias da aviação.

Mas o Ministro da Guerra não tem dê averiguar das simpatias ou antipatias de qualquer militar que escolha para uma missão de serviço.

O Sr. Ribeiro de Melo aproveitou a ocasião para enxertar neste debate uma longa interpelação ao Governo, acerca dos actos passados, presentes e futuros. .

Não falaria sobre o assunto se não fosse o meu propósito de definir os meus actos e dos meus colaboradores.

Sou daqueles que acatam as deliberações do Parlamento como a verdadeira expressão da opinião republicana.

Sou, felizmente, dos que crêem que através de todos os percalços e do todas as perturbações que podem sofrer a nossa vida económica e financeira, o esforço de todos nós conseguirá a prosperidade da nossa terra.

Não descreio da República nem dos seus homens, mesmo daqueles que em momentos impensados praticam actos mais lesivos do que vantajosos para o regime.

S. Ex.a citou actos que tive ocasião de louvar e aplaudir, e, como digo, faço, e tanto mais à vontade, quanto é certo que a propósito de uma pena disciplinar que ao Sr. António Maia foi aplicada por um Ministro—justamente aplicada—tive ocasião de me colocar no debate na Câmara dos Deputados, precisamente numa situação que era mais favorável do que contrária ao Sr. António Maia.

Esse facto leva-me, evidentemente, a estar à vontade nesta questão.

A este respeito já tive ocasião de dizer a minha opinião como chefe de Governo e disse, muito simplesmente, que o Governo só tem um único caminho a seguir -caminho que certamente o magoa, que o

íere, porque, no trajecto que tem a p.er-correr, encontrará porventura amigos, pessoas por quem tem a mais alta consideração peàsoal; mas, como os homens de Governo só 'têm um único trajecto a seguir, esse trajecto só pode ser modificado por duas entidades: uma, é o Chefe do Estado; outra, é o Parlamento.

Indicando uma destas entidades que não é esta a orientação que o Governo tem a seguir, o Governo sabe o que tem a fazer.

Mas, na solução deste grave assunto, não pode vacilar: corra para a satisfação daqueles que supõem ser necessária a disciplina do exército ou corra, para uma1 cousa que reputo perigosa para a República, que reputo a porta aberta para horas muito amargas. . v

Disse o Sr. Ribeiro de Melo que este Governo tinha perdido a confiança da opinião republicana, por na prática de determinados actos não ser mais enérgico.

É injusta a acusação que S. Ex.a fez ao Governo.

S. Ex.a referiu-se ao caso das 400:000 libras.

Já tive ocasião de dizer ao Senado o estado da questão.

Entendo que desde o momento que em processo se exigiu aos Bancos o pagamento das libras que eram devidas ao Estado, não tenho de tomar procedimento algum contra os homens que intervieram nesse despacho, emquanto os tribunais se não pronunciarem.

Muitos apoiados.

A lei da responsabilidade ministerial dá a V. Ex.a, como a qualquer cidadão, os poderes e faculdades para perseguir os homens que foram Ministros.

V. Ex.a é injusto, além de desconhecer os factos, levantando suspeitas e que são absolutamente contrárias à verdade.

Estou de acordo em que este Governo não tenha praticado senão crimes; mas deixe-me" V. Ex.a dizer, com uma certa vaidade: desejava que muitos Governos tivessem praticado esses crimes.

V. Ex.a referiu-se à Exposição do Rio de Janeiro.

O processo esteve muito tempo no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e dele , foi destacado o processo-crime contra uma pessoa que de íacto nele estava arguida.

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e não há necessidade de se levantarem as imunidades desse parlamentar, senão na devida altura, emquanto os juizes não se pronunciarem.

V. Ex.a referiu-se a outros casos, de que não tenho especial conhecimento, porque correm por outras pastas, não podendo, por isso, informar o Senado a respeito dessas questões.

Sobre o caso da Exposição do Rio de Janeiro, há nm despacho do Sr. Ministro do Comércio, mandando a grande número de funcionários, que receberam ajudas de custas que lhes não competiam, o diniieiro recebido.

Isso é do conhecimento público, porque, segundo creio, algumas dessas pessoas reclamaram contra esse despacho.

Tive também ocasião de dizer aqui o que tinha ocorrido quanto à Companhia dos Tabacos e a deficiência em que se encontrava o Estado para fazer rapidamente entrar nos seus cofres as quantias devidas.

Só havia dois caminhos a seguir: recursos aos tribunais comuns ou recurso à arbitragem.

Várias questões têm aparecido, não suscitadas pelo Governo, como perturbações de toda a ordem, que têm vindo ferir a nossa vida económica, produzindo desconfiança nos capitais e inibindo o Governo de exercer a sua acção como deseja.

Estas perturbações trazem-lhe uma dificuldade de administração enorme.

Hoje de manhã tinha marcado conferências importantes, que não puderam efectuar-se porque tive de estar toda a noite a seguir os acontecimentos, para poder informar o Poder Legislativo e acompanhar os Ministros na sua acção, o que me fez perder um dia de trabalho.

A acção contra o Banco de Portugal, colocando-o no seu lugar, só agora foi iniciada. Nenhum Governo tinha ainda tratado desse assunto. Procuro colocar o Banco na situação de trabalhar e render para o Estado como deve trabalhar e render.

V. Ex.as deitando este Governo abaixo, substituindo-o por outro, têm de lhe votar as medidas necessárias para 6le ter a autonomia que lhe é necessária e que este Governo não tem tido.

Sr. Presidente: não quis deixar de di-

zer estas palavras, que não representam perante o Senado uma defesa dos actos do Governo, porque nós só nos queremos, defender com os próprios actos que estão patentes a toda a crítica de todos os portugueses.,

O Governo vê com prazer a hora em que seja substituído nas cadeiras do Poder, porquanto o seu esforço, mercê de circunstâncias que não vêm ao caso, pode não ter tido aquele alcance que seria para desejar e que seria útil para o regime.

Efectivamente, quando haja desinteli-gências nos republicanos ao ponto de tornar a obra do Governo uma obra iníqua, não há vantagem em suportar esse Governo.

O Sr. Dr. Alberto Xavier, director geral da Fazenda Pública—tenho prazer em dizê-lo aqui e em toda a parte— é um funcionário distinto que presta serviços a qualquer Ministro, seja eu ou qualquer outro. S. Ex.a_, com sacrifício, porque não> ganhou nada com isso, ainda agora foi prestar um serviço de agradecer.

O Sr- Ribeiro de Melo (aparte): —; Fez: o - grande sacrifício em ser director da, Casa d£, Moeda! S. Ex.a defendeu a casa Espírito Santo e a casa Fonseca,- Santos & Viana no caso das 100:000 libras.

O Orador:—Eu digo a V. Ex.a que o Sr. Dr. Alberto Xavier, a quem presto o meu culto, tem dispensado altos serviços à Pátria .e à República.

V. Ex.;t quando quiser fazer acusações, seja a quem for, dirija-se a quem de direito, a qaem possa tomar conta delas, ou seja o Sr. Ministro das Finanças ou seja qualquer outra entidade competente.

O orador não reviu.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Continua em discussão na generalidade a proposta de lei n.° 548. Tem a palavra o Sr. Pereira Osório.

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O

«stá condensada toda a minha opinião e todo o meu modo de ver a respeito dele, e se não fora um Sr. Senador, a quem nós aqui na Câmara prestamos toda a nossa homenagem, ter combatido o projecto, aliás por uma forma que não me parece que admita a menor crítica, foi, repito, essa intervenção em contrário do projecto que provocou da minha parte pedir a palavra e dizer o mais sinteticamente que possa aquilo qae eu penso a respeito do projecto e aquilo que eu penso a respeito do modo de ver de S. Ex.a, que o combateu.

Sr. Presidente: desde que a vida começou a tornar-se difícil e o escudo a desvalorizar- se—isto já vem de há anos — nós temos visto o seguinte: que companhias que tinham contratos com o Estado e com corpos administrativos têm vindo pedindo aumentos de tarifas e alterações dos contratos, justificando esses pedidos não só com a desvalorização do escudo, mas também com o aumento que têm de dar aos seus empregados por causa da carestia da vida. E esses aumentos têm sido feitos nos próprios serviços do Estado, como sucede nos seus caminhos de ferro.

Lembro-me bem que ao Parlamento, o •então Ministro do Comércio, Sr. Jorge Nunes, veio pedir um aumento de tarifas para a Companhia Portuguesa dos Caminhos de Ferro, a fim de poder fazer face não só às despesas sempre crescentes de exploração, mas ainda aos aumentos de vencimento pedidos pelos seus empregados.

O Parlamento cedeu e não vi que o Sr. Herculano Galhardo se revoltasse contra isso, dizendo que com esta medida se desvalorizava o escudo.

Vi depois diferentes classes e até os próprios parlamentares pedirem subvenções e aumentos de vencimento alegando a mesma desvalorização do escudo e a ca-.restia da vida. Foram atendidas essas diferentes classes e o Sr. Herculano Galhardo não disse que isso equivaleria à desvalorização do escudo.

Quando se tratou das medidas de finanças foi votada uma lei pela qual foi consentido aos proprietários um aumento de rendas e não vi também que o Sr. Her-cuiano Galhardo dissesse que se não podia dar esse aumento .porque isso.iria desvalorizar ainda mais o escudo.

Ainda há bem pouco tempo se votou aqui a lei do inquilinato em que também são permitidos aumentos de rendas e não vi aqui falar em que esses aumentos concorram para a desvalorização do escudo, antes se disse ser necessário votar esses aumentos de rendas em consequência da mesma desvalorização do escudo.

^Corno é que se contraria agora o projecto dizendo que é o próprio Parlamento que está a concorrer para a desvalorização do escudo?

Antigamente, quando a nossa moeda estava ao par com o padrão-ouro e se faziam contratos sobre prédios rústicos atendia-se sempre à produção desses prédios, de maneira que se calculava a quantidade de géneros que constituiria a renda, a qual era reduzida a dinheiro pelo preço corrente dos géneros, qaando isso mais convinha ao senhorio, que não era prejudicado porque a estabilidade desse preço era, salvo pequenas variantes, constante.

Sucede, Sr. Presidente, que essa produção dos prédios rústicos tem vindo aumentando de uma maneira extraordinária.

Assim é que antes da guerra era corrente para o norte, principalmente no Minho, onde a produção é maior, a medida de milho vendia-se a $48 e $50. Depois veio crescendo e já se vende milho a 24$ a medida.

<_ que='que' a='a' géneros='géneros' alguma='alguma' e='e' dê='dê' lhe='lhe' dos='dos' senhorio='senhorio' do='do' aumento='aumento' justo='justo' o='o' p='p' se='se' compensação='compensação' será='será' então='então' custo='custo' terá='terá' não='não' participar='participar' direito='direito'>

í Como é que quem se opõe ao presente projecto acha'que é justo ^o rendeiro estar a locupletar-se com o que pertence ao proprietário? <_ que='que' senhorio='senhorio' aumento='aumento' próprio='próprio' justo='justo' rendas='rendas' veja='veja' por='por' então='então' parlamento='parlamento' um='um' contribuições='contribuições' nas='nas' nega='nega' suas='suas' lhe='lhe' é='é' pequeno='pequeno' o='o' p='p' este='este' aumentadas='aumentadas' as='as' vê='vê' agora='agora'>

Eu não posso conformar me com tal doutrina e sobretudo que ela se vá filiar e que tenha por consequência a desvalorização do escudo. A desvalorização do escudo íem-se dado e os proprietários dos prédios rústicos continuam a receber as mesmas quantias .em dinheiro.

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em rigor, seria a mesma, visto que lhe pagaria a mesma quantidade de géneros que, ao fazer-se o contrato de arrendamento, servia de base para ser fixada a renda a dinheiro.

Por conseguinte, não vejo que um projecto tam simples e que dá satisfação em parte aos direitos dos proprietários .rústicos, possa merecer a má vontade ou antipatia da parte de alguém.

Tenho também sobre a propriedade os conceitos modernos — e estou convencido que, neste ponto, sou tam radical corno o ilustre Senador que combateu o projecto— porque, como S. Ex.% vou até a expropriação por utilidade pública, quando, por exemplo, o senhorio de ama propriedade a deixa ao abandono, concorrendo assim para o agravamento da vida, o Estado tem direito de intervir indo até a expropriação por utilidade pública, se ele se recusar a cultivá-la.

Apenas resta esta classe de proprietários qae ainda não obteve a menor satisfação às suas justas reclamações.

O projecto é de uma simplicidade extraordinária e se é um pouco extenso é devido a estabelecer o processo a seguir para a sua execução. Há nele uma disposição Que poderá levantar dúvidas, é aquela que se refere aos íoros em géneros, para o efeito da sua remissão.

Lê.

Não tenhamos ilusões: por mais que façamos para a valorização do escudo só ao fim de muito tempo isso se conseguirá e, portanto, afigura-se-me justo qne se dê também um certo aumento aos foros para o efeito da sua remissão, evitando que se faça. como está sucedendo, por importâncias ínfimas, visto que os foreiros aproveitam a circunstância de essa remissão ser obrigatória.

Espero, Sr. Presidente, que, d fidas estas breves explicações, o projecto merecerá a aprovação desta Câmara.

Tenho dito.

O Sr. Herculano Galhardo : — Sr. Presidente: cumpre-me responder aos oradores que falaram, defendendo o projecto, depois do meu ataque, Srs. Oriol Pena, D. Tomás de \rilhenâ e Pereira Osório.

Em primeiro lugar devo dizer mais uma vez a V. Ex.a que tenho pena do me não-fazer compreender. Ou falo mal a minha línguti ou falo uma linguagem que não é a de S. Ex.as Tenho esta impressão. Talvez isto seja um ponto de vista também a aceitar, isto sem de modo nenhum demi-nuir o valor de S. Ex.as

Os Srs. Oriol Pena e D. Tomás de Vi-Ihena viram no meu discurso um ataque à propriedade e a esse propósito voltaram novamente com aquela afirmação que é já estribilho na boca de S. Ex.as, de que sou um revolucionário, um discípulo deste e daquele, etc., etc.

Mas, Sr. Presidente, eu não afirmei nada contra & propriedade.

Sustentei que a doutrina'da valorização do escudo, de que dependia o custo da vida, era a que nos devia preocupar a todos e que não compreendia como é que a proposta poderia concorrer para essa valorização. Mais nada eu disse.

Ora bem. Em primeiro lugar vou dizer a S. Ex.as que se esqueceram da minha atitude perante as propostas de lei de que falaram.

Não combati nenhuma proposta de lei de melhoria de situação, porque eu não a considero corno concorrendo directamente para a desvalorização do escudo.

Uma cousa é aprovar uma melhoria de situação e outra cousa ó a maneira de a aprovar.

O que S.'Ex.as se esqueceram de dizer foi que, quando da proposta para melhorar as classes ferroviárias, eu não a ataquei, antes a/defendi calorosamente.

E porquê?

Porque eu não compreendo qae possa haver gente que trabalhe e que não coma.

Para se trabalhar ó necessário comer.

Em tais circunstâncias tenho de defender sempre a melhoria de situação das classes que trabalham. E amanhã, om virtude da vida encarecer dia a dia, eu te-riho de defender a melhoria de situação aos funcionários públicos, visto o que ganham não estar em relação com o custo da vida.

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Cessão de B de Junho de ÍÔÈ4

O Sr. Pereira Osório: —,? Quando do empréstimo do Sr. Vitorino Guimarães V. Ex.a combateu-o?

O Orador: — A resposta ao aparte do Sr. Pereira Osório está dada pelo próprio parecer assinado por mim.

Leia-o e verá que não defendi a proposta.

A.ssim, poupo à Câmara alguns minutos de uma exposição que era fatigante e inconveniente.

Não combati, não combato, nem combaterei melhoriaSvde situação; o que posso é combater a forma como se fazem essas melhorias.

Defendi a lei n.° 1:355, que tratava de melhorar os ferroviários, mas combati o artigo 25.° porque eram os Poderes Públicos os primeiros a concorrer para a desvalorização da moeda nacional.

Se V. Ex.a quiser aprovar esta proposta, com o artigo 1.° redigido desta forma, eu combato-a, porque nós não podemos ir colocar os proprietários rústicos em situação diferente daquela em que se estão colocando os proprietários urbanos.

Assim vamos dar aos proprietários dos prédios rústicos uma situação dê privilégio. Adopte se um coeficiente de 8, 7, 5 ou o que.V. Ex.a quiser, e a isso nada terei que dizer.

Eu não posso acompanhar V. Ex.a na sua atitude, porque não quero que em Portugal se siga a política financeira da Alemanha, que poderá ser muito boa para ela, mas que era ruinosa para nós. Essa teoria não é para empregar em Portugal, porque não temos a capacidade de produzir que tem a Alemanha.

Portanto, Sr. Presidente, nós temos de adoptar uma doutrina diferente e tem de ser cautelosa.

O Sr. Pereira Osório (aparte) — Não nos convence.

O Or_ador:— Quando nós falamos é porque estamos convencidos, ou então queremos enganar os outros. Eu não falo quando suponho que não tenho razão; mas, quando suponho que a tenho, falo. Creio que não há mal nenhum nisso. A minha opinião não resultou só da leitura, resultou também de ter ouvido os gran-

des mestres economistas da Conferência Inter Parlamentar, quê muita gente julga que nãtf presta para nada.

Efectivamente, tenho ouvido esses grandes mestres, e as doutrinas que eles sustentam procurei trazê Ias para Portugal. Se o país não quiser considerar como bons os resultados averiguados, será ou porque o portador é mau ou porque a doutrina não presta. A culpa não é minha.

Trocam-se apartes entre o orador e o Sr. Pereira Osório.

O Sr. Pereira Osório (aparte):—V. Ex.a dá-me licença?

Declaro pela minha honra que não possuo em Portugal um palmo de terra, que não tenho nenhum prédio urbano ou rústico, que não pertenço a nenhuma companhia que possua propriedades. Por conseguinte não me move o interesse pessoal nesta questão.

O Orador: — Veja V. Ex.a se tento ou não razão para dizer que não me percebe. Ku também declaro que não estou filiado em nenhum cowolot, que não desejo demolir a propriedade e ,que não desejo praticar outros crimes semelhantes, por virtude de ter uma doutrina contrária à de V. Ex.a

Esta declaração creio ser tam precisa como a declaração feita pelo Sr. Pereira Osório.

Concordo que devemos colocar os proprietários dos prédios rústicos nas mesmas condições em que colocámos os proprietários dos prédios urbanos, isto é, adoptando-se coeficientes e nunca substi-tituindo a moeda corrente por ouro, que outra cousa não era substituí-la pelo pagamento em géneros.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Lima Alves: — Não sou dos que mais faltam às sessões, mas tive a infelicidade de faltar quando se iniciou este debate. Tive, contudo, o prazer de ainda ouvir alguns dos Srs. Senadores.

Eu declaro que sou partidário das doutrinas defendidas pelo Sr. Pereira Osório, e contra as do Sr. Herculano Galhardo.

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o dat SenOet 'ao Senaâô

venda, se adoptasse o princípio dos coeficientes.

Não sou nada contrário a estes princípios, simplesmente eu não vejo presente nenhum projecto de lei, nem presente nenhuma proposta que me leve a discutir estes princípios.

Estamos perante um projecto de lei que substitui parte do pagamento era dinheiro, parte em géneros.

E possível que, quando se discuta na especialidade, seja presente qualquer proposta de emenda.

Se assim for e se esse coeficiente for aquele que S. Ex.a demonstrou, se for justo, eu não terei dúvida em mudar de orientação e dar o meu voto ao princípio defendido pelo Sr. Eterculano Galhardo. Por em quanto não o posso dar.

O intuito do projecto é remunerar mais justamente o proprietário rural, que não está livre para poder arrendar como queira as suas propriedades, mas sim sujeito a um aforamento mais ou menos completo.

Esses proprietários encontram-se nas mesmas condições em que se encontravam os funcionários públicos e outros serviços, de quererem comer e de não ter dinheiro para comer.

Ora, todos os proprietários rurais que estejam hoje a receber uma renda que está desvalorizada vinte vezes, podem estar nessas condições e estão-no com certeza.

Os que aqui estamos dentro, uns funcionários públicos, outros Senadores, outros proprietários, estamos a receber vencimentos muito superiores àqueles que recebíamos, justamente a pretaxto da desvalorização da moeda.

£ E poder-se há exigir que os proprietários que estavam há vinte anos numas condições, ainda hoje estejam nelas"?

Não pode ser. Sr. Presidente.

E em nome da justiça que eu dou o meu voto entusiasmado à presente pro-posia.

Há muitos proprietários que estão livres de arrendar a quem quiserem e como quiserem a.s suas propriedades. Conheço um.

Tinha um arrendamento feito por determinado prazo; acabou esse arrendamento é o rendeiro quis continuar com ele. Então o proprietário disse o seguinte ao rendeiro : a renda quando nós fizemoà o con-

trato era tanto; hoje essa renda equivale á tauto; portanto, se quiser continuar tem de pagar tanto. E o rendeiro aceitou.

Sr. Presidente: eu ainda estabeleço, e é um caso que é possível dar-se, uma outra hipótese.

Suponham V. Ex.-a e a Câmara que amanhã uma propriedade é, por faleci-cimento do seu proprietário, dividida em duas partes perfeitamente iguais.

Dos herdeiros, um quis valorizar a sua parte em géneros e o outro env dinheiro.

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E que um, cuja renda tivesse sido estabelecida a dinheiro, receberia agora em dinheiro e o outro receberia trinta e seis vezss a mesma renda,.

Por consequência, todas estas razões imperam no meu espírito para dar, com toda a consciência e com toda a convicção, o meu voto a este projecto de lei.

O Sr. Herculano Galhardo: — Por essa teoria e com essa argumentação, V. Ex.a tem de me dar razão quando eu disser que agora se deve pagar em géneros o equivalente ao que os funcionários públicos compravam em 1914, com os seus vencimentos e com que sustentavam as suas casas e suas famílias.

Mas, como não é prático o Estado distribuir géneros, pagará em escudos o correspondente ao que os funcionários públicos recebiam em 1914.

E da mesma fornia quando amanhã aparecer um portador da dívida pública e disser: o meu avô comprou estes papéis, informaram-me que rendiam tanto, mas vocês dão-me só tanto, e por isso eu quero que me dêem o que eu devo receber.

Nessa ocasião, V. Ex.a terá enterrado, por completo, a Pátria Portuguesa.

O Orador: —' Aetualizande-se as^recekas e as despesas tudo se equilibra.

O Sr. Herculano Galhardo: —Essa é u política da Alemanha, mad que nós não podemos realizar.

O Orador:-—Não me parece que isso seja a ruína da Pátria.

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ser que, na especialidade, surja qualquer proposta do Sr. Herculano Galhardo ou de outro Sr. Senador, determinando coeficientes e que eu entenda que são justos.

O Sr. Tomás deVilhena: — Sr. Presidente: uma cousa que me faz uma certa impressão à cabeça é estar a ver osta insistência num espírito tam elevado, tam claro e tam brilhante corno é o do meu querido amigo Sr. Herculano Galhardo, ao afirmar que a regularização das ren-dâs para as propriedades rústicas vinha trazer o descrédito do escudo.

j Isto é espantoso! A gente ouve isto e custa lhe a acreditar quo 3ste pensamento surja de um cérebro tam bem organizado e tam cheio de cultura!

A desvalorização do escudo resulta dum sem número de razões e de factos que nós temos aqui apresentado. Mas aquilo que, incontestavelmente, mais contribui para essa desvalorização, é justamente a falta de confiança. Ê uma questão de ordem moral.

Ora exactamente tudo quanto possa equilibrar mais a economia nacional, e este projecto de lei é destinado a isso, não faz senão ajudar a valorização do escudo, porque, quando o proprietário esteja convencido de que ele é senhor das suas propriedades, quando o proprietário que tiver terras em Portugal, que tiver vinhas, que tiver olivais, se convencer que essas terras lhe podem dar um lucro razoável, os capitais não irão lá para fora, ficarão cá a beneficiar as suas propriedades, e daqui resultará, sem dúvida a valorização do escudo. Mas quando o proprietário vir que as suas terras não dão nada, e que as colheitas não produzem o suficiente para pagamento das contribuições, £0 que é que ele faz?

Manda os seus capitais lá para fora, e assim o escudo vai cada vez ficando mais baixo.

Tenha S. Ex.a a certeza de que a desvalorização do escudo vem da falta de confiança.

Ora ,êste projecto de IPÍ, que é tudo quanto há de mais justo, vem procurar proporcionar um môlhor equilíbrio à economia nacional. E para que a Câmara veja quanto esse equilíbrio é sensível, eu voa contar-lhe uma caso concreto, que

posso garantir, sob minha palavra de honra, que é absolutamente verdadeiro.

Como é sabido, e já há pouco o disse o Sr. Pereira Osório3 nos prédios rústicos as rendas fazem-.se por uma porção de medidas de qualquer género.

Um proprietário do norte tinha a sua propriedade alugada por 600$ anuais.

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Mas o facto de ele querer receber em dinheiro, valeu-lhe o Estado carregar-lhe com uma décima de 1.100$.

Isto é a condenação à morte do proprietário.

E é com um regime destes que se chamam antipatriotas àqueles que escondem o seu dinheiro, como se o direito de morrer pudesse ser proclamado por nós.

Todavia, para quo este projecto seja perfeitamente justo, não deve ser só metade da renda em géneros, mas a renda toda.

Mas ainda há outra causa. E a aplicação dos coeficientes.

Esta aplicação dos coeficientes seria muito difícil, porque não ostá nos costumes rústicos,' em que a renda é paga em géneros.

Só o preço baixa é sempre a mesma renda. São sempre as mesmas medidas. A renda está sempre actualizada e por isso não há necessidade de estar cons-tantemente a levantar a renda.

O que é justo e razoável é que a renda paga em géneros, costume este que ainda é mantido em muitos pontos de Portugal, continue a sê-lo, porque nesses lugares, onde a renda é cobrada por essa forma, vivem na melhor harmonia proprietários e caseiros. .. .,,.„•,.,

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Dídrio das Sessões ao Senaáó

Um caseiro paga 20 medidas, outro paga 50 medidas e outro paga 18.

Tenho lá um rendeiro que é o terceiro neto dum antigo rendeiro, que paga 12 medidas de centeio, ou seja tanto como pagava o seu antepassado.

E aqni tem a Câmara como neste regime se vive como Deus com os anjos.

O Sr. Herculano Galhardo: — Pois vá V. Ex.a e outros proprietários fazendo isso, mas não se ponha na lei, porque aí é que está o perigo.

O Orador: —

O orador não reviu.

O Sr. Medeiros Franco: — Sabemos, Sr. Presidente, que proprietários há cujos prédios, por documentos autênticos, estavam arrendados a dinheiro e por isso esses proprietários não recebem as suas rendas actualizadas, sofrendo, portanto, gravíssimos inconvenientes; cão têm forma de satisfazer as suas necessidades urgentes, porque a única fonte de receita que tinham passou para o arrendatário, recebendo eles apenas, em dinheiro desvalorizado, uma pequena parcela.

Mas há um ponto que foi posto aqui pelo ilustre Senador Sr. Herculano Ga-Hardo, que eu acho muito interessante, e que eu bem desejaria votar, de preferência à doutrina consignada no artigo 1.° desta proposta.

E porquê?

Porque pela doutrina do Sr. Herculano Galhardo se acautela o escudo.

Porque assim, se bem que a renda se vá actualizando, o que é certo é que a redacção deste artigo nos mostra uma grande desconfiança na nossa moeda.

É neste ponto que a política preconizada pelo Sr. Herculano Galhardo é preferível à que vem consignada na proposta de lei.

De resto, Sr. Presidente, nós, nesta proposta de lei, já adoptámos o critério apontado pelo Sr. Herculano Galhardo, escolhendo um coeficiente para multiplicar pelas rendas.

Entendo que a adopção do princípio

de um coeficiente aplicado às rendas era preferível à doutrina do uma cota parte dos "géneros que a propriedade produz, para o pagamento de uma cota parte da renda que ao proprietário é devida.

O critério adoptado no artigo 1.°, diz--se, ó o mais justo, e assim parece à primeira vista.

Mas o preço dos géneros que a propriedade produz tem-se elevado numa proporção perfeitamente desigual com,a mão de obra, e o' arrendatário que tenha de pagar uma determinada renda, vê agora cerceado, e em muito, o seu labor, porque há géneros cuja produção custa muito mais cara e cujo preço não;'acompanhou a mão de obra. Por consequência, para que o proprietário possa pagar aquilo que primitivamente correspondia às medidas, é necessário que o arrendatário tenha aquilo que é indispensável para cobrir a diferença.

Eu não estou habituado, porque não fiz operação nenhuma sobre a aplicação do artigo 1.°, para dizer se nos termos em que ele está redigido causará prejuízos aos senhorios e aos arrendatários.

Eu vejo êí-te perigo: é que para se fazer um determinado número de medidas o arrendatário pode ter que despender tudo que legitimamente lhe pertencia para poder pagar ao senhorio.

O Sr. Machado Serpa: —

O Orador: — E pela tarifa camarária.

Suponhamos um contrato realizado em 1850, para 10 alqueires de terra. Para cada alqueire de torra foi feito o contrato à razfto de 10$. Este projecto de lei ó aprovado tal qual está redigido. É assim metade da renda é paga em dinheiro, outra metade em géneios. Mas a determinação do quantitativo em géneros passa a ser feita ao tempo em que o contrato foi celebrado, pela tarifa camarária.

Suponhamos que a tarifa camarária para o trigo em 1850 era de 300 réis por cada alqueire.

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senta o número de unidades em cereal, que o arrendatário tem que pagar ao senhorio.

Isto ó claro como água.

O Sr. Machado .Serpa: — Como eu interrompi V. Ex.a, na convicção errónea, certamente, de que este valor era referido ao trigo, devo declarar que adopto de muito bom grado a interpretação que V. Ex.a dá a este artigo, mas sem dúvida a redacção tem que ser modificada.

O Orador:—Eu interpreto assim, e julgo que penso como o autor da proposta de lei.

Eu queria apenas chamar a atenção do Senado para o perigo que pode resultar da má interpretação na votação deste artigo, porque pode suceder que a mão de obra se valorize numa proporção grande relativamente ao preço do género, e o arrendatário, para obter um determinado género, vai despender uma importância em dinheiro, maior do que a que iria despender se a redacção do artigo fosse conforme V. Ex.as a interpretavam.

Certamente o senhorio não deve ser explorado em benefício do arrendatário, nem se deve permitir quo este explore indevidamente o senhorio. Isso evita-se pela multiplicação do coeficiente, com a vantagem de a Câmara dar assim mais uma vez uma demonstração patriótica do seu desejo de valorização do escudo.

Acho muito bem, Sr. Presidente, a multiplicação por um coeficiente para efeito de pagamento de foros.

Todos conhecem pessoas que só têm foros a dinheiro, que .estão precisamente nas mesmas condições de vexame e de sacrifício em que vivem os donos de prédios urbanos que não tenham outra cousa ; os funcionários públicos, que recebiam um determinado vencimento e que tiveram necessidade de o ver multiplicado por um factor, para assim fazerem face ao agravamento da vida; os portadores de títulos, etc. E a ninguém é lícito deixar-se morrer de fome. Façamos tudo quanto se possa fazer, mas primeiro viver.

Por isso eu entendo que aqueles senhorios que vivem exclusivamente dos seus íoros em dinheiro têm todo o direito de reclamar que o pagamento dos mesmos

foros seja feito na base de multiplicação por um determinado coeficiente.

Só assim haverá justiça.

Não sei. JÚVL pensei no coeficiente 10, mas tive, como tenho sempre, os meus escrúpulos de consciência, apesar de não ser senhorio absolutamente de nada; mas, emfim, sou legislador, sou parlamentar. Represento aqui a nação. Já não quero dizpr que represento o distrito de Ponta Delgada, onde os contratos de enfiteuses mais largamente se exercem.

Há muitos foros a dinheiro, e os senhorios, apesar de serem os donos do prédio, não têm nada.

Mas eu preguntei a mim mesmo se o coeficiente 7 era bastante, ou se seria preciso elevá-lo a 10 ou baixá-lo a 5. É que há foros que estão sujeitos a laudé-mio e outros que o não estão.

Desde 1867 para cá os foros não estão sujeitos a laudémios, mas anteriormente estavam, e o laudémio pode ser de vintena, de centena ou de quarentena.

O senhorio tem uma grande vantagem quando, da transmissão da propriedade, porque recebe o laudémio tantas vezes quantas são as transmissões.

Tudo, isto são factores para os quais eu chamo a atenção do .Sr. relator, na certeza de que eu, intervindo na discussão deste projecto de lei na generalidade, dou-lhe o meu voto na generalidade, preferindo, todavia, uma propbsta de percentagem, se por acaso não se alcançar um coeficiente que possa, de certa forma, evitar os inconvenientes que eu apontei.

O orador não reviu.

O Sr. Pereira Osório : — Sr. Presidente: os pontos de vista sustentados pelo Sr. Medeiros Franco provêm ds S. Ex.a não ter atendido a que são diferentes as situações reguladas pelos artigos 1.° e 4.°

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Diário das Sessões dó Senado

4 Porque é que no § 4.9 se adopta o coeficiente ?

É porque a remissão é feita por vinte anos, e nesses vinte anos podem melhorar as condições de vida. e então se se tivesse feito o cálculo como se fez no primeiro caso, que era pelo valor actual dos géneros, ele receberia hoje ima quantia razoável, mas que amanhã poderia ser exagerada, desde que se valorizasse o escudo.

São diferentes as situações, e por isso ficam justificados os dois critérios adoptados para cada uma.

Com respeito às considerações feitas pelo Sr. Herculano Galhardo, há ume, a que eu respondo, certo de que S- Ex.a não a íez com o sentido perjuratório — nem erL, capaz disso, nem eu lho merecia, nem tam pouco aquele lado da Gamara.

É quando disse que eu estava cora as direitas ou as direitas comigo.

Não me importa de estar sojfi com quem for, desde que esteja a deíender princípios que considero justes. . É-me indiferente, e até estimo que a meu lado estejam os lados da Câmara mais conservadores.

Isso em mim não modifica em nada o meu critério.

S. Ex.a não está aqui, e eu lamento, porque ainda queria dizer mais alguma cousa, L qae ele com certeza procuraria responder; mas como não está, e não gosto de dizer cousas na ausência, lirnito--me a afirmar que nas palavras proferidas pelo Sr. Medeiros ÍYanco não há nada que possa prejudicar o projecto: a única cousa que poderá sor modificada é o coeficiente do § 4.°, que passará a 7, 8 ou 9, conforme a Câmara achar justo.

De reste, não me parece que tenham peso e que convençam algumas dc,s suas considerações no sentidp de se modi£ear o que está neste projecto.

O Sr. Lima Alves: — O Sr. Hercnlano Galhardo hipnotizado com receio da desvalorização do escudo inverteu simplesmente os termos da questão.

Não é por darmos uma garantia maior ao proprietário restituindo-lhe assim uma parte da tranquilidade da vida e da confiança aã sua propriedade, que nós desvalorizamos o escudo.

A maior desvalorização do escudo é que agrava a tranquilidade da vida, perturba completamente as funções sociais e as funções de relação entre proprietários e rendeiros.

Não chego a ver mesmo como é que o espírito lucidíssimo do Sr. Herculano Galhardo se deixou obcecar a. este ponto.

E no argumento que S. Ex.a empregou fazendo referência à dívida consolidada nacional, e dizendo que era necessário também pensar nela e actualizá-la, muito_ prazer tive em o ouvir.

O Sr. Oriol Pena: — Sr. Presidente: não contava usar da palavra segunda vez na discussão da generalidade deste projecto.

Pedi a palavra, mesmo já nm pouco tardiamente, para responder a algumas considerações do Sr. Medeiros Franco, e a uma observação ou argumento que o Sr. Herculano Galhardo, com grande espanto meu, apresentou há pouco, quando ainda agora falava, e o ouvi emitir essa opinião.

A Câmara poderá estar lembrada de que, por mais de uma vez apontei esse facto —tenho muito prazer em ver o Sr. Galhardo ser da mesma opinião— quando afirmei que seria justo, honesto e equitativo, actualizar-se, ou poder-se actualizar, melhorando-a, a precária situação dos pobres portadores de títulos da dívida interna.

Quanto ao Sr. Medeiros Franco, a quem contei já particularmente qualquer cousa- a respeito de factos do meu conhecimento, suponho S. Ex.a não'esteja a ver a questão com a lucidez precisa nos alvitres que expôs a respeito da actualização de rendimento.

Gomo a hora vai adiantada, não quero demorar as minhas considerações e termino por aqui para ter o prazer de ouvir o Sr* relator do projecto sobre o ponto de vista em que, de leve agora toquei^

Disse.

O Sr. Herculano Galhardo (para um requerimento) ; — Sr. Presidente: requeiro votação nominal para a generalidade dês-te projecto.

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Em seguida foi feita a chamada para a votação nominal, sendo aprovado por 22 Srs. Senadores e rejeitado por 6.

Disseram aprovo os Srs. :

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.

Aníbal Augusto Ramos de Miranda.

António Maria da Silva Barreto.

António de Medeiros Franco.

António Xavier Correia Barreto.

Artur Augusto da Costa.

César Justino de Lima Alves.

Francisco de Sales Kamos da Costa.

Francisco Vicente Ramos.

João Catanho de Meneses.

João Manuel Pessanha Vaz das Neves.

Joaquim Pereira Gil de Matos.

Jarge Frederico Velez Caroço.

José Duarte Dias de Andrade.

José Joaquim Pereira Osório. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Querubim da Rocha Vale Guimarães. Raimundo Enes Méira. Rodrigo Guerra Alvares Cabral. Tomás de Almeida Manuel de Vilhe-na (D.).

Vasco Gonçalves Marques.

Disseram rejeito os Srs.:

César Procópio de Freitas.

Ernesto Júlio Navarro.

Francisco José Pereira.

Herculano Jorge Galhardo.

Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.

Joaquim Manuel dos Santos Garcia.

O Sr. Presidente :—A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e õõ minutos.

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