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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DIÁRIO D SENADO
3ST-0 88
EM 29. DE JULHO DE 1924
Presidência do Ex.mo Sr. António Xavier Correia Barreto
Secretários os Ex,mo> Srs,
Sumário. — Chamatia e abertura da sessão. Leitura e aprovação da acta. Dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia.—O Sr. Oriol Pena faz considerações acerca do livro do Sr. João Franco Castelo Branco sobre o ex-rei D. Carlos e sobre um caso de burla praticada por um tal Vermorel.
A propósito de palavras do Sr. Oriol Pena usam da palavra os, Srs. Machado Serpa, Mendes dos Reis, Querubim Guimarães e Silva Barreto.
O Sr. Serra e Moura faz considerações sobre um artigo do «Correio da Manhã», relativo a revolucionários civit, dando explicações sobre o a«-sunto o Sr. Presidente. •
O Sr. Querubim Guimarães usa da palavra sobre o assunto, assim como os Srs Silva Barreto e D. Tomás de Vilhena.
Ordem do dia. — Continua a discussão sobre a apresentação do Governo.
Usam da palavra os Srs. Querubim Guimarães, Pereira Osório, Presidente do Ministério (Rodrigues Gaspar), Procôpio de Freitas e Augusto de Vasconcelos.
O Sr. Presidente encerra a s'essão.
Abertura da sessão, às 15 horas e 15 minutos.
Presentes à chamada 25 Srs. Senadores.
Entraram durante a sessão 22 Srs. Senadores.
Srs. Senadores presentes à chamada:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
António Gomes de Sonsa'Varela. António Maria da Silva Barreto.
Francisco Vicente Ramos António Gomes de Sousa Varela
António Xavier Correia Barreto. César Justino de Lima Alves. César Procôpio de Freitas. Constantino José dos Santos. Francisco António de Paula. Francisco José Pereira. Francisco de Sales Eamos da Costa.. Francisco Vicente Ramos. Frederico António Ferreira de Simas. Herculano Jorge Galhardo. João Manuel Pessanha Vaz das Neves. Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.
José António da Costa Júnior. José Duarte Dias de Andrade. José Joaquim Pereira Osório. José Machado Serpa. José Mendes dos Reis. Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Júlio Ernesto de Lima Duque. Manuel Gaspar de Lemos. Roberto da Cunha Baptista. Vasco Gonçalves Marques.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Alfredo Narciso Marcai Martins Portuga1;
Álvaro António de Bulhão Pato.
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Diário das Sessões do Senado
Augusto de Vera Cruz. Duarte Clodomir Patten de Sá Viana. Elisio Pinto de Almeida e Castro. Ernesto Júlio Navarro. João Carlos da Costa. João Catanho de Meneses. Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior. Joaquim Pereira Gil de Matos. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Querubim da Eocha Vale Gaimarães. Raimundo Enes Meira. Rodolfo Xavier da Silva. Rodrigo Guerra Álvares Cabral,. Silvestre Falcão.
Tomás de Almeida Manuel de Vi-lhena (D.).
Srs. Senadores que não compareceram à sessão:
António Alves de Oliveira Júnior.
António da Costa- Godinho do Amaral.
Artur Octávio do Rogo Chagas.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Alpoim Borges do C».nto.
•João Maria da Cunha Barbosa.
João Trigo Motinho.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Joaquim Teixeira da Silva.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Augusto de Sequeira.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Joaquim Fernandes Pontes.
José iNepomuceno Fernandes Brás.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Luís Augusto Simões de Almeida.
Nicolaa Mesquita.
Pedro Virgollno Ferraz Chaves.
Ricardo Pais Gomes.
Vasco Crispiniano da Silva.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Sr. Presidente (às 15 horas e 10 minutos):—Vai proceder-se à chamada. fez-se a chamada.
O Sr. Presidente (às 15 horas e lõ minutos'):—Estão presentes 25 Srs. Senadores.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Leu-se.
O Sr. Presidente:—Está em discussão-Pausa.
O Sr. Presidente: — Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.
Vai ler-se o
Ofícios
Do Ministério da Marinha, satisfazendo o.requerimento n.° 123, de 21 de Maio do corrente ano, do Sr. Afonso Henriques do Prado Castro e Lemps.
Para dar conhecimento ao interessado.
Parecer
Da comissão de faltas, justificando as faltas do Sr. José Machadp Serpa.
Projecto de lei
Do Sr. Francisco de Sales Ramos da Costa, desanexando da freguesia dpMilha-rado, concelho de Mafra, e encprp orando, na freguesia da Malveira as poVoações de Venda do Pinheiro e Asseiceira Pequena.
Para leitura.
Requerimentos
Do cidadão Carlos João Pires de Ma-galhãs Ferraz, pedindo para ser reconhecido como revolucionário piy:[l?
Para a 2." secção.
Do tenente do regimento de infantaria n.° 22 António,Maria de Magalhães,, solicitando que a última amnistia, lhe seja extensiva.
Para a comissão de petições.
Cartas
Do Sr. Elisio Pinto de Almeida e Castro, acpmpanhada 4â atestaçlp mé,cUc.Q> solicitando trinta dias de licença para tratamento em ter-mas,
Para a comissão de faltas.
Do Sr. Ernesto Júlio Navarro, pedindo trinta djas ide. licença.
Para a comissão de faltas.
Representação
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municipais o direito de poderem exigir das empresas mineiras o pagamento do imposto ad valorem pela exportação dos minérios e seus derivados. Para à Secretaria. .
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro da Agricultura sobre a organização e funcionamento dqs diversos serviços do seu Ministério. — César de Lima Alves.
Mandou-se expedir.
Telegrama
Dq engenheiro ^Mendonça, director das Obras Públicas da índia, protestando pon-tra o projecto de lei que manda reintegrar o engenheiro Amorim ^no lugar de director das Obras Púb.licas da índia, ein virtude de estar pendente dp Sjupremo. Tiibunal Para a Secretaria. Antes da ordeq do dia O Sr. Oridl Pena: — Deve aparecer hoje à venda em todas as livrarias da capital um livro notável e de molde a constituir um enorme sucesso de livraria. Para mim, não é o sucesso de livraria o interessante mas sim o facto incontestável de com o aparecimento desse livro a verdade estar a caminho e e.star a chegar! j Chega ao fim de 14 anos de Repúbli-ca, e ao-cabo de 17 anos do atentado máximo que a República produzia, a hora da justiça e a hora do reconhecimento que o país deve incontestavelmente à .memória veneranda do grande rei que foi o Sr-. D. Carlos. Chega também a hora da justiça e a hora de reconhecimento que o país deve ao grande homem público que foi o Sr. João Franco Castelo Branco. Esse livro inclui e publica, com os au- • tógrafos respectivos, 14 cartas de el-rei o Sr. D. Carlos, dirigidas ao seu primeiro Ministro, e em" todas elas se revela e em todas elas se manifesta o alto talento o alto patriotismo e a dedicação pelo seu povo que tinha a grande figura de rei que foi o Sr. D. Carlos. Em todas elas se manifesta também a solidariedade absoluta, a consideração e a estima que ele tinha pelo seu primeiro Ministro, por essa individualidade odiada pela República e molestada pelos repur blicanos, grandiosamente exilada na sua casa da Beira há 17 anos. E a justiça que chega, e quando ela chega é inflexível, serena e jusita. Não é a paixão política que me faz falar; não é á paixão política qu^ me pode .provocar qualquer' palavra mais quente ou mais escaldante. 'Não. É a grande var neração que tenho por essa grandiosa ÍU gura que foi o meu rei, e a grande consideração que tenho pelo homem de talento e de boas intenções, pelo homem de carácter e de vontade, pelo grande parlamentar que foi o Sr. João Franco Oaste-lo Branco. E por isso que, sem o menor intuito de fazer aqui nem um discurso político nem um ataque político, por entender que as retaliações, por mais justas que sejam, não dão vantagem alguma a quem as faz, usei da palavra para chamar á atenção dp Senado para Osso documento de altíssima valia, hoje posto à venda em todas as li r vrarías de Lisboa e- que dentro em pouco deve estar distribuído por todo este'país, por todo o Portugal, que nenhum de nós é capaz de amar com inais carinho e veneração do que o Sr. í). Carlos I, anteriormente Duque de Bragança, que morreu vitimado pela idea nefasta da Repúr blica ou por gente mandada pela República, nesse tristíssimo dia l de Fevereiro de 1908. E a saudade que tenho do grande vulto político, do grande patriota e do grande português, que está distante, absolutamente alheado de tudo e de todos, tratando de lavoura em vez de política, tratando de economia em vez de retaliações políticas, e tratando da sua riqueza particu-r lar, parte integrante da riqueza pública, afastado do descalabro a que os" governos da República têm levado este desgrar çado país, que me leva também a prestar-lhe o culto da minha homenagem. Daqui, desta tribuna, cujos ecos se repercutem mais ou menos por todo o país, pois as notas da imprensa costumam. le: var o eco da nossa voz às últimas aldeias de Portugal, dirijo a esse grande português, a esse eminente homem de Estado, figura de relevo na política portuguesa, a expressão do meu mais comovido respeito.
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Diário das Sessões do Senado
algumas considerações a respeito duma notícia que vi hoje nos jornais, e que se me afigura duma tal incoerência e falta de lógica, que só é possível numa sociedade em desorganização.
Dizem os jornais que um pantomimeiro qualquer que se chama Vermorel burlou, a pretexto de um contrato para um espectáculo público num dos jardins da cidade, a Associação dos Trabalhadores de Teatro, a qual se queixou do facto às autoridades, que mandaram prender esse homem, que pelo nome parece ser estrangeiro, e que estava- hospedado mim dos hotéis de Lisboa.
O facto parece que devia ter importância mínima, muito embora seja de censurar, se o procedynento das autoridades não estivesse em absoluto antagonismo com a impunidade que se concede aos burlões máximos dôste país, os homens que acabam de arrasar a economia nacional, sem respeito nenhum pelo povo, pela economia dos humildes, e sem respeito algum por uma grande parte da riqueza nacional.
Refiro-me, pois gosto de nitidamente dizer o que penso, aos Srs. Álvaro de Castro e Alberto Xavier.
Ao passo que se prendeu aquele homem por uma burla comezinha, insignificante, os dois burlões máximos da política do país continuam à solta, "abrigados pelas suas imunidades parlamentares, e ninguém se lembra de proceder contra eles.
Não faz sentido que um Vermorel, mais ou menos autêntico, mais ou menos pantomimeiro, seja imediatamente colocado debaixo da alçada do governador civil, e os homens que arrumaram a economia, do país e aviltaram o nosso crédito, fazendo-o descer à última escala do desprezo do mundo, continuem sem uma sanção, perfeitamente à solta, abrigados pelas, imunidades parlamentares.
O Sr. Mendes dos Reis :—Sr. Presidente: peço a atenção de V. Ex.a, para as palavras do orador.
Estabelece-se agitação na sala.
O Orador:—Não faz sentido, e digo isto doa a quem doer, que burlões políticos autênticos (Não apoiados], que arrasaram a economia nacional, continuem à solta.
Não apoiados.
Estabelece-se agitação na sala, protestando alguns Srs. Senadores^ com veemência, contra as palavras do orador.
O Sr. Mendes dos Reis:—Sr. Presidente : não se pode consentir que se profiram palavras destas no Senado.
O Orador:—É muito fácil o número defrontar-se e pretender esmagar um único indivíduo; mas factos são factos.
Vozes:— Isto não pode ser. Grande sussurro.
O Sr. Presidente : — Eu peço ao Sr. Oriol Pena que se mantenha dentro das aormas que o Regimento estabelece.
O Sr. Silva Barreto:—A linguagem do Sr. Oriol Pena é imprópria do Senado.
Os Srs. monárquicos têm abusado demasiadamente da tolerância republicana.
O Sr. Querubim Guimarães (em aparte) :— Não apoiado, aqui há direitos.
O Orador:— j Eu gostava de saber se ó o meu ilustre colega daquele lado da Câmara que está a presidir!
Sr. Presidente: não há no que disse o menor desrespeito.
Factos são factos e as palavras servem para os definir.
Não proferi nenhuma frase desrespeitosa.
Não quero mal nenhum a V. Ex.a, Sr. Presidente, pela sua advertência; simplesmente estranho que V. Ex.a .se deixe sugestionar pela berraria.
Os gritos a.mim não me comovem, deixam-me absolutamente tranquilo.
E, Sr. Presidente, sem querer alongar mais o assunto, e sem querer de modo nenhum desacatar qualquer deliberação que V. Ex.a se lembre de tomar sobre esta questão, termino por agora as minhas considerações.
O orador não reviu.
O Sr. Machado Serpa:—Sr. Presidente : todos nós, apesar da nossa idade, de certa maneira já avançada, apesar de sermos uns velhos, temos ainda assim momentos de exaltação.
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Sessão de 29 de Julho de 1924
rã deitar um pouco de água na.fervura, basta que V. Ex.a alvitre o artigo do Regimento que proíbe expressamente referências desagradáveis, não só à Câmara, mas a qualquer pessoa ou entidade que não esteja aqui presente.
Esta disposição é do Regimento, que não permite referências, já não digo injuriosas, porque não houve com certeza da parte do Sr. Oriol Pena o intuito de injuriar, mas desagradáveis, que segundo o espírito, e a -letra do Regimento são proibidas.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:—Tenho sido sempre da máxima tolerância para com os oradores desta Câmara, qualquer que seja o partido que representem.
No que respeita aos Srs. Senadores monárquicos, tenho mantido a mesma tolerância, porque entendo que a República não fica ofendida com os seus desabafos.
E necessário que todos tenham liberdade de exprimir as suas ideias, contanto que o façam em termos correctos.
O Sr. Oriól Pena, por excepção, hoje excedeu-se nos termos que empregou e que Dão são próprios, do Parlamento.
Não deve ser assim.
Deve haver da parte de todos a máxima correcção na exposição das suas opiniões.
O Sr. Mendes dos Reis :—Todos temos tido para com o Sr. Oriol Pena a maior correcção, mas várias vezes S. Ex.a tem empregado aqui expressões que não são das mais próprias do Parlamento.
Hoje S. Ex.a foi muito mais longe.
Talvez V. Ex.a, Sr. Presidente, não ouvisse, mas o Sr. Oriol Pena disse que os Srs. Álvaro de Castro e Alberto Xavier eram gatunos e burlões.
Já na outra Câmara; há dias, se deu um caso idêntico com um Deputado que depois explicou as suas palavras.
Para honra e decoro das individualidades alvejadas, e para prestígio do Senado, peço. a V. Ex.a que convide o Sr. Oriol Pena a retirar as palavras a que me referi.
O Sr. Presidente:—Peço a V. Ex.a; Sr. Oriol Pena, que retire essas palavras que eu não ouvi, porque, se ás tivesse ou-
vido, teria imediatamente convidado V. Ex.a a que as retirasse.
O Sr. Mendes dos Reis: —Se S. Ex.* declara que não as proferiu, eu dou-me por satisfeito.
O Sr. Oriol Pena: — Eu disse há pouco que estava disposto a acatar qualquer resolução que V. Ex.a tomasse sobre este incidente.
Que me conste, nunca até hoje deixei de acatar qualquer observação que V. Ex.a desse lugar'me fizesse.'
Não fiquei completamente a sangue frio quando vi a Câmara tumultuosa querendo impor a V. Ex.a uma directiva.
Revoltei-me contra isso e não sei se proferi alguma palavra mais ou menos própria. Em todo o caso, classifiquei os factos como entendo e julgo.
O Sr. Mendes dos Reis:— Como V. Ex.a vê, o Sr. Oriol Pena reincide.
O Sr. Oriol Pena: —Se S. Ex.a entende português, não pode avançar que eu reincido.
Não me lembro de ter pronunciado a palavra gatuno, mas sé V. Ex.as não aceitam a classificação que eu dei aquém faltou à fé dos contratos, seja a classificação que V. Ex.as quiserem.
O Sr. Presidente: — O Regimento não me dá sanção alguma que eu possa aplicar neste caso, em que o Sr. 'Oriol Pena não está usando da palavra. '
O Sr. Mendes dos Reis: — Se o Regimento não impõe sanção, há outros usos na sociedade que a impõem.
Alguém pedirá a responsabilidade das palavras proferidas.
O Sr. Machado Serpa: — Convidado por V. Ex.a a retirar a palavra que proferiu, o Sr. Oriol Pena declarou que se achava exaltado e que essa exaltação foi tal que não tinha a consciência do que tinha proferido.
Nestas circunstâncias, parece-me que isso não deve ser consignado na acta.
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O Sr: Querubim Guimarães: — Quando entrava nesta saláj ouvi ao Sr. Oriol Pena palavras um pouco ásperas, mas essas palavras não tiveram para mica outra significação que não fosse um comentário a actos públicos e políticos dos Srs. Alberto Xavier e Álvaro de Castro.
De modo nenhum essas palavras vão ofender as pesssoas de uni ou outro.
Se eu entendesse que isso agravava ou ofendia algum desses dois cavalheiros, tor-me-ia aproximado do Sr. Oriol Pena e ter-lhe-ia dito que não devia proceder assim.
Eu dou a minha palavra de honra que foi está a significação que dei a tais palavras.
É preciso que as cousas se ponham no sou devido péi
Burlão, ouvi dizer; gatuno, não, mas mesmo o que ouvi, foi na acepção a que me refiro.
Podem os Srs. Senadores dizer que o Sr. Oriol Pena se excedeuj que é um homem de nervos, concordo. Mas, de resto, com todo este aspecto de fera, S. Ex.a é unia pessoa bondosa dê coração e que nunca teve a intenção de ferir ninguém. Toda a gente o conhece como um homem de bem e Como um homem honesto, sendo incapaz duma incorrecção.
Querer, pois, alguém qilé. as palavras de S. Ex.a tenham um significado de1 embolsar ou meter no bolso dinheiro que pertencia a outros, isso é que não.
Não há ninguém que ptíssa fazer uma tal observação i Parece-me que ò incidente assim sé resolve.
Vozes:—Não apoiado, não apoiado.
O Orador:—Isto a não ser que se queira dar à' questão um aspecto que desde o Início ela não teve. Fica isso à consciência dos Si s. Senadores que assim o entendam. •Tenho dito. O orador não reviu.
C) Sr. Mendes dos Reis (para explicações):— Sr. Presiderite: o caso é bem simples.
Todos nós sabemos que, criticando actos dos Ministros, muitas vezes se fala em burlas. Todavia, D que sucede agora com o Sr. Oriol Pena ó muito diferente.
O Sr. Oriol Pena, criticando actos praticados pelo Sr. Álvaro de Castro, disse duma maveira violenta —o que de resto ostá nos processos de S-. Ex.ae que a Câmara já não estranha—- o seguinte :
Os Srs. Álvaro de Castro e Alberto Xavier são burlões e gatunos.
E um caso muito diferente. E uma ofensa pessoal e directa.
Se as explicações dadas pelo Sr. Querubim Guimarães fossem dadas pelo Sr. Oriol Pena, eu considerava-me s.atisféito.
Se o Sr. Oriol Pena dissesse que não queria de maneira nenhuma atingir a honorabilidade pessoal dos Srs. Álvaro de Castro e Alberto Xavier, estava bem.
Mas S. Ex.a não disse nada disso e portanto os dois insultos subsistem; E em-quanto S; Ex.a o não disserj o assunto não estará liquidado.
O Sr. Oriol Pena:—Ninguém encara com mais tranquilidade, ninguém encara com mais boa vontade^ a situação inglória e áspera que o Sr; Mendes dós Eeis se lembrou de adoptar.
Compreende-se perfeitamente.
Suponho que não, é a sua afeição política. O Sr: Mendes dos- Réis:—Afeição política e afeição pessoais Se eu amanhã ouvisse chamar gatuno a V. Ex.aj lavraria igualmente o meu protesto. O Orador (continuando): — Se eu fizer qualquer acto que possa justificar o epíteto, íaz Vi Ex.a muito mal, e eu não lhe agradecerei. Eu lamento que V.' Ex.a não compreenda português, que eu suponho ainda pronunciar correctamente. Eu tinha dito que me lembrava de íer pronunciado algumas palavras Ou expressões um pouco ásperas, algumas das quais não me lembram porque foram ditas entre o tumulto da Câmara e na exaltação do momento, como gentilmente veio afirmar à Câmara o meu distinto colega Sr. Querubim Guimarães.
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O Sr; Mendes dos Reis: —Se V. Ex.a faz suas as palavras do Sr. Querubim Guimarães^ está bem.
O Orador: —Se eii invoquei as suas afirmações... parece que é lógica essa conclusão; ^
E nada mais tenho a acrescentar.
O orador não reviu.
O Sr; Silva Barreto (parâinvocár o Regimento] i — Sr. Presidente: não tencionava tratar deste insidente, mas como ele tomou um caminho com o qual eu não concordo, resolvi usar da palavra.
Não admito que haja diferença entre gatuno político e gatuno pessoal, entre burlão político e burlão pessoal;
Se de facto as palavras do Senador que infelizmente V. Ex.a não chamou à ordem porque não as ouviu proferir^ foram proferidas, cai sob a alçada do Regimento, e V. Ex.a oúvindó-as chamava-ò à ordenij e caso ele não acedesse retirava-lhe a palavra;
Eu ouvi distintamente deste lado da C«-mara que o Sr. Alberto Xavier, «o preto Xavier, era um burlão como o Sr. Presidente dó Ministério que passou, o Sr. Álvaro de Castro»;
Foi contra estas palavras que eu protestei.
Eu não ouvi a palavra gatuno, mas ouvi a palavra burlão distintamente. Tam distintamente que eu qiie não costumo protestar contra muitas das afirmaçõos injustas que daquele lado da Câmara se têm feito, protestei veementemente.
Eu sinto-me indignado com esta rabu-lice de se querer acobertar palavras com intenções muito diferentes daquelas que as substituem.
• Burlão em toda a parte do- mundo é uma palavra que desprestigia a pessoa a quem ela se dirige, qualquer que seja a sua situação pessoal ou política;
Para mim não há diferença: o burlão político é por natureza burlão, pessoal.
As palavras quando têm um significado corrosivo não o perdem quando se aplicam aos políticos.
,m Eii protesto invocando o artigo 77.° do Regimento.
Não temos o direito de insultar ninguém, e mais fortemente os que não têm assento aqui; mesmo que houvesse que di-
zer alguma cousa sobre a conduta moral, porque as palavras proferidas desta tribuna são ouvidas pelo País.
Não tenho dúvida alguma que as pessoas que foram insultadas hão-de chamar às responsabilidades qu^m as proferiu, que não tem o direito de se esconder debaixo das imunidaues parlamentares.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente : — O Sr. Oriol Pena fez suas as palavras do Sr. Querubim Guimarães.
O Sr. Silva Barreto: — Entendo que o Sr; Senador que levantou esta celeuma deve declarar terminantemente que retira essas palavras que proferiu.
NãO' ouvi isso, e, assim, mantenho o meu protesto.
O Sr. Mendes dos Reis: — Há neste caso o incidente parlamentar e o incidente particular.
O Sr. Oriol Pena fez umas afirmações contra as quais protestei, interrompendo S: Ex.a -
S. Ex.a quis explicar as suas palavras, e mais as -agravou.
O Sr. Querubim Guimarães, vindo em auxílio do Sr. Oriol Pena} observou que não tinha havido a intenção de atingir a honestidade e a honorabilidade dos Srs.. Alberto Xavier e Álvaro de Castro. .
Insisti com o Sr. Oriol Pena para que dissesse se concordava ou não com as pá- " lavras do Sr. Querubim Guimarães, e S. Ex.a disse que sim. Isto é, o Sr. Oriol Pena declara que não quis atingir a ho-norabiHdade e a honestidade pessoal dos Srs. Álvaro de Castro e Alberto Xa-~ vier.
Sr. Presidente : por isso, tendo V. Ex.a também declarado, como presidente do Senado, que não ouviu proferir a palavra «gatuno», e que não consentiria que nem essa palavra nem a de «burlão» figurassem na acta, nem no Diário das Sessões do Senado, eu, parlamentarmente, não podia deixar de me considerar satisfeito.
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Diário das Sessõet do Senado
ôsse mesmo indivíduo honesto pessoalmente.
São, porém, assuntos particulares a dirimir entre as pessoas visadas. Pessoalmente, eu não me consideraria satisfeito.
Tenho dito.
O Sr.Augusto.de Vasconcelos:—Sr.
Presidente: depois de V. Ex.a, do alto dessa cadeira, dizer que considerava o assunto liquidado, eu julgo-que o Senado nada mais tinha que ocupar-se do assunto.
Temos um Presidente nesta Câmara que é respeitado por todos os Senadores, e cujas decisões devem fazer sentença, tanto mais que S. Ex.a foi aqui eleito por unanimidade. Por consequência, sobre o caso nada mais tenho a dizer, a não ser que quem conhece o Sr. Oriol Pena sabe muito bem que S. Ex.a, em certos assuntos em que tome calor, pode esquecer aquilo que ' são frias praxes parlamentares, mas que não pode haver no seu ânimo senão intenções generosas, e, por conseguinte, não pode ter a intenção de magoar seja quem for, quer pessoal, quer politicamente. '
De há muito que eu sou amigo pessoal de S. Ex.a Conheço-o tam intimamente que posso afirmar a V. Ex.a que o julgo incapaz de ofender quem quer que seja.
Mas, a par disso, vejamos o que são os incidentes parlamentares. Nós estamos a assistir por toda a'parte do mando a incidentes violentos que se repetem quási todos os dias; proferem-se expressões que vão muito além das proferidas pelo Sr. Oriol Pena. Acho muito bem que se re-clarqe e se registe na acta que se deram todas as satisfações.
Neste momento eu acho que não deve existir incidente pessoal, visto que as palavras do Sr. Querubim Guimarães, perfilhadas pelo -Sr. Oriol Pena, deram completa liquidação tanto ao incidente político como ao pessoal.
O Sr. Serra e Moura: — Sr. Presidente: pedi a palavra unicamente para protestar contra as afirmações feitas ontem num editorial do Correio da Manhã.
Essas afirmações, além de serem gratuitas, oíendem gravemente o prestígio de V. Ex.a, o prestígio da Câmara e ainda homens de bem, homens dignos, honra-
dos e patriotas, que, acima de tudo, prezam a sua Pátria e o futuro dela. Por consequência, não podem nem devem ser injuriados pela forma como o são aqui.
Diz-se neste jornal o seguinte:
Leu.
j Isto, que se lê em caracteres negros, não é verdade!
No artigo referido, e que me dispenso de ler à Câmara, afirma-se que os revolucionários civis ameaçaram V. Ex.a de o maltratarem, até mesmo de o agredirem, se o projecto que lh.es diz respeito não fosse aprovado nesía casa do Parlamento, e daí ver se V. JEx.a forçado a submetê-lo à aprovação da Câmara, de afogadilho, aproveitando para isso a ausência da minoria monárquica.
Os revolucionários civis são incapazes dum tal procedimento ; mesmo que de entre eles houvesse algum mais exaltado, a tal não se atreveria, porque todos os revolucionários têm por V. Ex.a a mais profunda estima e a maior veneração.
Esses homens nunca se impuseram a ninguém; esses honestos filhos do povo limitaram-se a pedir...
O Sr. Silva Barreto : — Os revolucionários civis pediram-me que patrocinasse o projecto e que as emendas não fossem impressas.
Eu disse que, como tinha o direito de exigir que as emendas fossem, impressas para conhecer do seu teor, o mesmo direito tinham os outros, e portanto votaria que fossem a imprimir as referidas emendas.
E, assim, votei contra o requerimento do Sr. Serra e Moura.
O Orador: — Cumpriram-se as praxes regimentas.
Na ocasião da votação do meu requerimento, a minoria monárquica estava representada pelo Sr. Oriol Pena, que é incontestavelmente um grande homem de bem e por quem eu tenho a mais subida consideração pessoal, estava presente e até votou contra. Apelo para o seu testemunho.
Não houve da parte da Câmara a idea de fazer votar de afogadilho o projecto em questão.
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mal intencionado, e por isso não lhe ligaria sombra . de importância; mas como é da responsabilidade do director dessa folha diária, não posso deixar de aqui lavrar bem alto o meu protesto.
Houve, portanto, a idea de magoar conscientemente, quando nós nunca fizemos agravos desta natureza aos revolucionários monárquicos, e, por isso, em nome dos revolucionários civis .do meu País, devo afirmar por mim e pelos que sempre me acompanharam, que devolvemos os insultos nos revolucionários da «traulitânia», visto que qualquer de nós nunca praticámos os crimes, as infâmias e as atrocidades mais selvagens que a história da humanidade regista e de que foi teatro o Éden do Porto!
0 Sr. Silva Barreto (interrompendo): — ^Sabe V. Ex.a qual foi o último acto
da «traulitânia» no Porto?
1 Quando o pseudo governo monárquico estava já passando a fronteira, publicou um decreto intimando os cidadãos que fossem portadores de notas de valor superior a 20$ a entregá-las na sede do Banco para depois receberem simplesmente a décima parte desse valor!
O Sr. Querubim Guimarães (em aparte)'.— Essas afirmações devem ser feitas à face de documentos.
O Sr. Silva Barreto (continuando): — Eu assumo a responsabilidade absoluta das afirmações que acabo de fazer, porque constam de documentos oficiais.
Passei catorze meses no Porto e passei lá todo o tempo da «traulitânia»; senti por isso toda a infâmia dessa situação.
O jâr. Querubim Guimarães (em aparte)'.— Nesse caso passa V. Ex.a a ser o historiador encartado da «traulitânia».
O Sr. Silva Barreto (continuando): — Talvez tenha mais autoridade para falar neste assunto do que V. Ex.a
O Orador: — Fica, por consequência, lavrado o meu protesto sentido, bem sincero, lamentando que a imprensa do meu PaíSj quo sempre foi nobre e alevantada em todos os seus princípios, use presentemente de processos como este.
E, para terminar, eu vou dizer aos Srs. Senadores representantes da monarquia aqui, uma das passagens do 14 de Maio que ó realmente interessante, e que muito bem demonstra a generosidade dos revolucionários civis republicanos:
Estávamos no aceso da luta; não havia governo. Os revolucionários pretendiam que novamente fosse implantado em Portugal o regime republicano.
Um grupo de revolucionários civis numa das ruas da cidade é abordado por um miserável, que lhe denuncia que ali, num determinado prédio, havia um «ta-lassa», um homem infame, que havia pretendido por várias vezes meter nas masmorras os revolucionários civis republicanos, que havia por várias vezes pretendido amesquinhar-nos.
Este grupo dirigiu-se à casa indicada, subiu ao andar respectivo, batendo à porta. Apareceu-lhes uma criada a quem lhe foi imposto que chamasse seu amo.
A criada respondeu que o seu amo lhe era impossível comparecer ali porque há muito tempo que estava "doente de cama.
Apareceram depois as filhas e a esposa do dono da casa que, interrogadas pelos revolucionários, disseram,: «Os^ senhores estão enganados porque nesta casa não existe esse homem que os senhores procuram, nem nunca aqui morou; é certo que nosso pai é monárquico, mas nunca pretendeu fazer mal aos republicanos. Juramos-lhes de joelhos que ele é um homem de bem. Pelo amor de Deus não o matem...»
A criadar'sabedora de quem tinha sido o miserável que denunciou seu amo, disse: «Mas este homem é o nosso antigo guarda--portão, que foi expulso por ladrão, e agora vingou-se, querendo matar o meu velho patrão, que é digno de todo o respeito e consideração».
As filhas juraram também que era verdade a afirmação que a criada acabava de produzir. Pois muito bem: os revolucionários civis descobriram-se reverentemente, pediram desculpa àquelas nobres criaturas e lovaram à sua frente o autor da insídia, fazendo-o pagar com a vida no último patamar da escada o acto que praticara.
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Diário dai Seêsôe» do Senado
Sr. Presidente: resta-me enviar a V. Ex.a, mais nma vez, os protestos oa minha maior e mais consagrada admiração por V. Ex.a e cumprimentá-lo como um dos homens veneráveis do mea País. q se não só cá dantro, como lá fora, merece o respeito e a consideração de todos.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Eu fui procurado por um grupo de revolucionários civis que pediram a minha protecção para que o projecto de. lei que estava na Mesa do Senado fosse discutido o mais rapidamente possível.
Eu, cono costumo sempre dizer a verdade sôjii a quem for, disse-lhes que nfl.0 me parecia bem que eles quisessem semelhante cousa, porque parecia que era a paga durn frete que pediam.
Depois disso publicaram nos jcrnais uma note,, por sinal mal redigida, en q;ie se dizia que eles retiniam aqui. Ora aqui não podem reunir senão parlamentares., e por isso nuo permiti que se reaniseem.
Depois disso, nomearam uma comissão que veio ter comigo para me dar tocas as satisfações.
Aqui tem V.Ex.a o que se passou.
Como a proposta de lei já tinha parecer, a Câmara aprovou o requerimento de V. Ex.a, entrando por isso em discussão.
O orador não reviu.
O Sr. fasço Marques (para interrogar a Mesa}:— Sr. Presidente: pedia a Y, Ês.a a fineza de me informar se está em pUino vigor o artigo 147.° do Regimento interno do Senado da República no que diz respeito aos serviços ou fcrnecimontos feitos à secretaria do Parlamento.
O Sr. Presidente: — Sim, senhor, está em vigor.
O Orador : — Eu pedi? que ficassem consignadas na acta a minha preguata e a resposta de V. Ex.*
O Sr. Querubim Guimarães ('para expU-ceçõen] i — Br. Presidente : prdi a palavra unicamente para aproveitara ocasião para dizer aciiuo que tencionava dizer f.e porventura estivesse presente após a leitura da acta acerca do assunto em que acaba de falar o Sr. Serra e Moura,
Eu desejava que na acta ficasse consignada a declaração como votaria na sessão em que foi descutido o projecto dos revolucionários civis.
3S í» o fica registada na acta, mas faço a declaração a V. Ex.a de que se estivesse presente quando foi discutido tal projecto eu não o aprovaria.
Quanto às afirmações que vêm. feitas num jornal, citadas pelo Sr. Serra e Moura, admiro-me que S. Ex.a se tivesse indisposto tanto com a leitura desse artigo e não se tivesse indisposto com a leitura dessas notícias que antes tinham sido publicadas, e certamente baseado nessas notícias ô que o jornalista do Correio da Manhã noticiou que os revolucionários se tinham até instalado nos corredores desta Câmara e tinham arranjado uma mesa com secretário, que tomava as suas notas e expedia 'as suas ordens.
Creio que esta notícia vem num jornal do Porto.
Foi simplesmente por ôsse facto e por tor o prazer de averiguar que esses factos não são verdadeiros. Mas foi em virtude dessas informações noutra imprensa, não sei que jornal do Porto, que o Correio da Manhã publicou essa notícia.
E claro que há excesso, sem dúvida nenhuma, e não era pelo facto de a minoria estar presente que o projecto deixaria de ser aprovado. Apenas quero declarar, Sr. Presidente, que se estivesse presente diria que por considerar mau para as nossas finanças, por motivo das despesas que vai trazer para o Estado, eu não dava o meu voto; apenas emitiria u rainha opinião. Mais nada.
Feitas estas declarações, repito, se estivesse presente na sessão em que se discutiu esse projecto, eu não lhe daria o meu voto.
O orador não reviu.
O Sr. Silva Barreto (para explica-— Sr. Presidente: V. Ex.a está lem-, brado da atitude que a Câmara tomou quando a Imprensa Livre publicou umas palavras desagradáveis que nos atingiam.
Foi oficiado ao Sr. Presidente do Mi-ni&tério para castigar esse jornal.
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tèeasâo de $9 de Jutko d& 1924
em questão, porque aqui V, Ex.a não ó atingido na local a que faz referência o Sr. Serra e Moura, e na outra era-o. O orador não reviu.
O Sr. D. Tomás de Yilhena (para explicações] : — Sr. Presidente : eu nada tenho com os artigos desse jornal, mas estou convencido que não houve nada que não devesse ser da parte de V. Ex.a
O projecto entrou em discussão na devida altura ; se nós cá estivéssemos, tínhamo-lo combatido como era natural, mas isso não impedia que ele fosse aprovado.
Quanto ao caso do jornal, 'o que me admira é os senhores republicanos não repararem nos jornais retintamente republicanos, que são aqueles que mais rigorosamente atacam o regime, que pronunciam palavras sobre os seus homens que nós nem por sombras pronunciamos. O que se tem dito dos republicanos e o que se tem escrito nos jornais republicanos é assombroso, quem mais maltrata os republicanos não somos nós os monárquicos, são os republicanos das diferentes divisões, dôsse frémito de ambições desmedidas que estão tratando de apunhalar e de assassinar a República.
O orador não reviu.
ORDEM DO DIA
Continuação da diBcussEo sôfore a apresentação do
O Sr. Querubim Guimarães : — Sr. Presidente : se porventura, me tivesse sido permitido dispor na última sessão de mais alguns minutos, teria concluído as milhas considerações sobre este debate, e certamente nós hoje entraríamos na ordem do dia com a resposta do ilustre Presidente do Ministério aos oradores que sobre a crise se pronunciaram.
Sr. Presidente: não quero de maneira nenhuma cansar ou demorar a Câmara num debate em que já se passou tempo sem utilidade de maior.
Disse eu na última sessão que estava convencido de que o Governo que se constituiu não era aquele que a opinião nacional reclama, nem o que poderia arcar com a solução dos vários problemas
da administração pública, de maneira a que os portugueses pudessem ter confiança e pudessem ver diante de si um futuro próspero e risonho.
Não quere isto dizer que individualmente me não mereçam consideração muitos dos Srs. Ministros, e a circunstância de do Governo fazerem parte três colegas nossos, e aos quais' me ligam relações de cordialidade e estima, é de molde a exprimir a minha consideração a S. Ex.as; esses três Ministros são os Srs. Catanho de Meneses, Xavier da Silva e Bulhão Pato.
Não h,á nestas palavras a simples banal cortesia, quo todos devemos a quem connosco lida e trata.
Ao Sr. (Jatanho de Meneses ninguém pode deixar do lhe reconhecer competência nas lides do foro, tendo também mostrado durante tantas e tantag legislaturas quanto vale a sua competência. -
Os outros Srs. Senadores que fazem parte do Governo são pessoas que, dentro das suas especialidades, têm aquela competência que nenhum de nós lhes pode regatear.
O Sr. Xavier da Silva é um distinto assistente, do Instituto de Medicina Legal. Mas se se disser que S. Ex.a ó a pessoa para ir ocupar a pasta do Trabalho, eu direi que não, o que não quere dizor que uma pessoa com as qualidades de S. Ex.a, com bom sfmso, inteligência e trabalho, não possa fazer trabalho profícuo.
O Sr. Bulhão Pato conhece Moçambique, creio que por lá ter vivido, e isso basta para dar aquela província segurança; mas se nós preguntarmos se S. Ex.a é a pessoa capaz de abraçar, em toda a sua magnitude, o problema colonial, sem desdouro para S. Ex.a, permito-me duvidar.
Quando nós estamos em face de problemas de tam difíceis soluções, como é,' por exemplo, a situação de Angola, sem dúvida que eu mo permito ter dúvidas.
A S. Ex.a não regateio homenagens, que S. Ex.a merece; S. Ex.a é o primeiro a reconhecer que não posso ir mais além.
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Diário das SetsÔe» do Senado
Mas, Sr. Presidente, este assunto tem de há muito, e sobretudo hoje, aspectos que são duma. grande gravidade.
Depois do regime em que se entrou, denominado «dos Altos Comissários», as relações entre estes e o Poder Executivo são de tal ordem, tam complicadas e tarn complexas que pode porventura haver da parte do Poder Executivo intervenções que prejudiquem a autonomia, por muito boa que seja a intenção, ou cortando-lhe essa autonomia, ou o inverso, que também é perigoso, não podendo assim a colónia desenvolver-se como seria para desejar.
É necessário sair deste estado de cousas, pois DÓS assistimos, durante a permanência do Sr. Norton de Matos no lugar de Alto Comissário, à reprodução fiel da administração pública em Portugal.
S. Ex.a levou para lá os mesmos processos, às vezes ainda mais eivados de erros, não se preocupando com os meios, tendo única e exclusivamente em mira os fins.
^ Os grande interesse para a província? Não.
E, coin muito mais autoridade, falou sobre este assunto, na outra Câmara, o Sr. Presidente do Ministério, Rodrigues Gaspar, que tinha deixado ainda não há muito tempo de ser Ministro das Colónias.
S. Ex.a, com aquela compostura e serenidade, como S. Ex.a se apresente, sempre nos debates parlamentares, não conseguiu deixar transparecer qual era a sua opinião, emquanto Ministro, sobre o Sr. Norton de Matos.
Mas quando S. Ex.a se livrou das rés-ponsabilidades do Poder, cm certa altura, foi o primeiro a fazer afirmações que gravemente, digo e repito, o comprometem hoje na sua situação de Presidente do Ministério, perante a nossa representação em Londres, escolhendo o Sr. Norton de Matos, que comprometeu todas as forças vivas de Angola, como se vê através de telegramas; não me parece razoável que se vá colocar uma pessoa nestas condições no cargo de representante dos nossos interesses junto da nossa secular aliada.
Em Inglaterra hão de ver sempre através da figura do Sr. Norton- de Matos a série de atropelos que S. Ex.a cometeu,
que outra coisa não foi a sua administração em Angola.
Sr. Presidente: referi-me na última sessão a esta anomalia verdadeiramente estranha de vermos que um lugar para que se exigem enfim todos aqueles requisitos que se devem exigir a um verdadeiro e bom diplomata esteja confiado a quem não deva ser.
Fica à consciência do Sr. Rodrigues Gaspar o lembrar-se das afirmações que fez quando classificou, com um humorismo muito significativo, de «Sanatório de Londres» a embaixada para onde foi nomeado o Sr. Norton de Matos.
O Sr. Rodrigues Gaspar, que está no Poder, que tem maiores responsabilida-des, consultará a sua consciência e verá se foi injusto, se foi excessivo fazendo as afirmações que fez naquela sessão memorável da Câmara dos Srs. Deputados quando falou em aventureiros políticos e se referiu ao Sanatório de Londres.
Se porventura notar que foi excessivo, depois de consultar a sua consciência, terá de dizer ao País: errei, as afirmações qus fiz não representavam a verdade, fi-las convencido que estava dentro da verdade, mas o exame que fiz da questão veio demonstrar-me qae realmente eu havia sido injusto, e eu entendo que o Sr. Norton de Matos deve continuar no seu lugar.
Mas emquanto S. Ex.a não se penitenciar das afirmações que fez à personalidade do Sr. Norton de Matos, é-me lícito duvidar da idoneidade do nosso representante em Londres, e é grave para o Sr. Presidente do Ministério deixar continuar esta situação. 6
Se é justo que deve haver um grande cuiclado na escolha dos nossos representantes perante as Nações que estão em boas relações com a nossa, muito mais é de exigir ao nosso representante junto da corte inglesa, porque o Sr. Rodrigues Gaspar, que conhece melhor do que eu a nossa história, sabe bem que através de todos os tempos marchámos sempre de braço dado com a Inglaterra.
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manter no trono a dinastia dos Bragan-ças.
Foi assito que se implantou a República.
Sr. Presidente: desejaria saber o que é que o Sr. Kodrigues Gaspar pensa a respeito deste assunto, mas concreta-mente.
É preciso que a Câmara saiba se S. Ex.a mantém ou não mantém em Londres • o Sr. Norton de Matos, a cuja pessoa me não movo, sem dúvida, nenhum qualquer ontro sentimento que não seja este legítimo direito de querer o meu País representado no estrangeiro por quem de direito.
A constituição do Ministério não obedeceu àquelas exigências de carácter nacional.
Referi-me aos colegas nossos que fazem parte do Ministério, e ao referir-me aos outros Srs. Ministros não posso deixar de cumprimentar o general Sr. Abeira da Rocha.
Bastava ter a escola dos velhos tempos, a escola de Mousinho do Albuquerque, para S. Ex.a se afirmar como uma individualidade cumpridora rigorosa dos seus deveres.
Lembro a S. Ex.a, de combinação com o Sr. Presidente do Ministério, o encarar o problema da ordem pública.
E preciso que a ordem pública nas ruas seja filha da ordem pública nos espíritos.
Temos assistido a condescendências lamentáveis da parte dos poderes públicos perante os perturbadores da ordem.
Ainda há pouco o incidente do .Parque Eduardo VII íoi um sintoma verdadeiramente desolador para os que desejam ordem.
Viu-se nesse incidente não só a morte de algumas pessoas; mas a falta de autoridade dos chefes para os subordinados e a falta de respeito dêstfis para os outros.
O problema da ordem tem muitos outros aspectos, e uma das causas que mais contribuem para a indisciplina é a a dificuldade da vida, lançando no espírito grande perturbação.
O povo no seu critério simplista atira com as responsabilidades imediatas para o Governo, que, se não as tem imediatas, tem-as indirectas, porque é assunto que já vem de longe descuidado,. e que hoje por isso mesmo chegou a certa gravidade.
Vivemos há 14 anos num regime de impunidade, que os defensores do regime não querem atender.
Tambéra é certo que a dificuldade da vida vem do agravamento cambial.
Julgou-se que o Sr. Álvaro do Castro não saísse do Governo sem melhorar o câmbio, mas o facto é que a situação piorou.
justou convencido de que o caminho há-de ser árduo para o Messias ou redentor da Pátria Portuguesa.
Mas em matéria financeira, em que nós temos entrelaçado o problema cambial e concomitantemente o problema da carestia da vida, eu não sei qual seja a orientação do Governo, porque este papelinho da declaração ministerial é muito interessante, mas nada diz. E de boa tática-isto, mas o problema é muito grave, etam grave, que já ó lugar comum dizer-se qne «a, hora é de realizações», e já é tempo de nós assistirmos à apresentação dum Ministério em que possamos ter esperanças fundadas.
Gostaria que concretamente se me respondesse a esta pregunta. O Sr. Ministro das Finanças, a quem apresento os meus cumprimentos, é um honesto administrador da Caixa Geral de Depósitos; ó pessoa por quem eu tenho muita consideração.
Mas S. Ex.a ampara-se a uma muleta. .. à muleta do Sr. Velhinho Correia. Mas tenha cuidado S. Ex.a, porque ela já tem passado por tantas transformações, que ela pode vir a ser um cajado nos ombros do contribuinte, o qual tanto há-de pagar que se há de fartar, e depois o ca- . jado cairá não nas costas do Sr. Velhinho Corroia, mas nas do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Velhinho Correia ainda anda a estudar e assim é que apresenta propostas umas em cima das outras, e destruindo-se até umas às outras. Certamente que tantos planos naufragarão.
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novas receitas, porque eu sou contribuinte e o País todo deseja saber em que caminho se vive.
Referi-me na última sessão à necessidade que há de se desenvolver o fomento nacional.
Ea sei sempre qual a resposta que os Governos dão a estes nossos desejos de que o fomento nacional se desenvolva.
•Dizem sempre, e dirão, que não há, dinheiro para isso.
Eu permito-me argumentar que muito dinheiro naveria para obras de fomento, se porventura houvesse aquele cuidado, aquela boa disposição, e aquele amor à causa Tmbliea, se se sacrificassem os interesses dos defensores da República ou clierrtçlas partidárias à causa nacional.
Tem-se esbanjado dezenas de miLhares de contos; portanto não há o direito de dizer que não há possibilidade de se realizar 400:000 contos para melhorar as estradas.
Dezenas de milhares de contos teci sido muito mal gastos, que, se fossem melhor aplicados, dariam para termos boas estradas e grandes elementos de fomento nacional.
A política até aqui seguida tem merecido acres censuras de todos e dos meus correligionários.
Não fazemos essas censuras simplesmente per estarmos no papel de oposição, mas sim porque o regime tem fornecido armas para essa oposição e censuras, censuras que ao regime têm dirigido, mais violentamente até que os monárquicos, os próprios republicanos na imprensa e nos comícios.
São eles, com a autoridade que lhes dá a sua qualidade de republicanos, que nos fornecem a nós, monárquicos, argumentos para dizermos que a administração republicana tem sido uma administração de ruína e de esbanjamento.
Se a República é capaz de modificar o seu sistema de administração, que o faça quanto antes, e eu, como bom português, felicitar-me-ia por isso.
A um outro problema se refere a declaração ministerial: é ao problema do inquilinato, que tem merecido uma atenção muito especial ao ilustre Ministro da Justiça, a quem eu apresento os meus cumprimentos e presto a minha homenagem pelo seu indiscutível valor.
O Sr. Ministro da Justiça tem sem dúvida nenhuma as qualidades e competência exigidas para desempenhar as funções da sua pasta.
S. Ex.a conhece muito bem este problema do inquilinato, mas S. Ex.a tem um vício mau: é que encara a questão por um lado que se me afigura que não será aquele que melhor conduzirá a uma situação de benefício para inquilinos e senhorios.
S. Ex.a encara a questão apenas pelo lado dos interesses dos inquilinos permi-ta-rne que lho diga.
Esta questão não se resolve com aquelas providências que se têm seguido até agora, ô que têm sido apenas simples expedientes, que, nada resolvendo, pelo contrário complicam cada vez mais esta questão, dando em resultado que a dificuldade de se encontrar alojamento é cada vez maior, porque não se deve perder de vista que o capital não tem um juro remunerador.
Portanto desde que deminui a construção, o problema, em lugar de atenuasse, mais se agrava.
Seria interessante, por exemplo —há tanto tempo que este problema do inquilinato anda na discussão em Portugal — que uma parte desse alargamento verdadeiramente extraordinário da circulação fiduciária tivesse sido aplicada à construção de casas, ou ao fornecimento de capital aos particulares.
Esta segunda parte ainda é a preferível, e vou dizer porquê.
Nós sabemos muito bem o que foi a administração dos Bairros Sociais.
Tenho muito pouca confiança na maneira como o Estado administra as suas cousas-, e tcdos nós vimos qual foi o resultado que tiveram as construções de casas baratas.
Por isso entendo que em vez do Estado ir gastar dinheiro, faria melhor emprestando capital aos particulares, como se fez na Suíça, como o Sr. Catanho de Meneses conhece.
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Na Bélgica, destroçada pelos alemães, este problema tomou uma acuidade muito grande.
Mas no emtanto, na Suíça, este problema era bastante grave, e ele resolveu-se por simples disposições de restrição de direito de propriedade transitória. •
Sr. Presidente: não quero dizer que não haja situações transitórias para .as quais é preciso providenciar, mas não devemos perder de vista a necessidade que há de acabar com esses expedientes, pois, continuando com essas medidas de transição, nós agravaremos a situação em vez de a resolvermos.
Refere-se também a declaração ministerial à situação do funcionalismo civil e militar.
Seria por excepção que, nesta sessão deste ano, nós, os parlamentares, nos fôssemos embora sem termos de discutir os orçamentos de subvenção ao funcionalismo, civil e militar.
É sabido que sempre por esta altura nós temos aqui, com certa brevidade, em virtude das dificuldades da vida, de nos pronunciarmos de modo a ser garantida uma receita sem a qual o funcionalismo não pode viver.
,; Então, Sr. Presidente, isto não acaba?
í Porventura são eles os culpados?
Não, mas a vida é que se torna incomportável.
Se, porventura, uma determinada importância serve para a despesa mensal em certo momento, não serve para a despesa dois ou três meses depois.
O que os Governos já há muito tempo deviam ter procurado era ir melhorando gradualmente as condições de vida.
O estar recorrendo constantemente a um aumento de subvenções é um grave erro, que vai ocasionar o aumento dos preços e consequentemente nova subven-çãq é necessário dar ao funcionalismo.
As palavras do Sr. Presidente do Ministério, nesta declaração são aquelas que S. Ex.a não tinha maneira de tirar daqui, mas que não significam nada,
Leu.
Se não é possível reduzir as despesas improdutivas e inúteis, não sairemos deste círculo vicioso em que todos os anos temos de acudir ,à situado $p funcionalismo civil e militar.
Com os meus votos pessoais de respei-
to e consideração pelos Srs. Ministros, eu vaticino ao Governo do Sr. Rodrigues Gaspar uma vida efémera. S. Ex.a é uma pessoa essencialmente inteligente e com-petente^ mas por muita competência, inteligência e boa vontade que tenha —permita-me que lhe diga — está num terreno falso e movediço.
Se não se acautela, muito em breve, e até muito mais depressa do que julga, estará em terra.
Oxalá a sua integridade moral fique incólume.
Se S. Ex.a está disposto a manter aqueles célebres decretos que tanto mal fizeram ao nosso crédito e que tantas perturbações causaram, não só cá dentro como lá fora, que o diga.
O Estado é como um homem; a honra do Estado ó como a honra de um homem, e não pode faltar à fé dos seus contratos nem deixar de pagar aquilo que deve, sem o que a sua honra será profundamente abalada. Eu desejo saber por isso se o Sr. Presidente do Ministério mantém ou não esses decretos. ^0 que é que S. Ex.a tenciona também fazer com relação à prata? Manter esse decreto? (jQual a aplicação que S. Ex.a quere dar a esta prata? <_ aquela='aquela' que='que' mesma='mesma' com='com' de='de' aos='aos' notas='notas' tenciona='tenciona' ex.a='ex.a' nacional='nacional' do='do' devem='devem' antecessor='antecessor' garantia='garantia' portadores='portadores' tirar='tirar' fez='fez' s.='s.' privar-nos='privar-nos' ter='ter' a='a' seu='seu' e='e' facilidade='facilidade' nosso='nosso' património='património' o='o' p='p' eles='eles'> ,;É esta a política que mais convém aos nossos interesses? Muito desejaria que o Sr. Presidente uo Ministério respondesse a essas preguntas e me dissesse concretamente, sem rodeios, qual o destino que quere dar a essa prata.
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À situação ein qUe se encontra o Sr. Norton de Matos hão é de molde a pod r-mOs ter aquela confiança e àquele sossego qúé devíamos ter se pbrvèntlira nos achássemos representados por tílitrá pessoa.
Independentemente das declarações feitas pelo Sr. Kodfigties Gaspar na ourra Câmara, ha Um facto que é incontestável e que anda por aí dó norte a sul e do este a beste.
É o facto de o Sr. Norton de Matos ter sido úiá verdadeiro esbanjador em Angola.
Ainda há pouco ouvi referir um facto que é deveras sintomático. Cinquenta famílias foram contratadas p"elo Sr. Norton de Matos para irehi colonizar parte de Angola, tendo sido depois recambiadas para a metrópole, faltando-se à fé dos contratos e colocando-se essas famílias numa situação precária e difícil.
Nenhuma animosidade me inove contra o Sr. Norton de Matos. Ninguém veja nas minhas palavras se-nãd O desejo qiié eu tenho de que o nosso representante em Londres estivesse a coberto de quaisquer acusações. O meu desejo.seria que O nosso representante ca Corte Inglesa estivesse a coberto" de insinuações e de todas as afirma-coes que só têrtt feito a respeito de ura homem que não se soube manter no seu lugar e que depois de ter feito rebentar a tempestade fugiu do seu 1'Ugar, em vez de mostrar que era a pessoa capaz de salvar a situação e de evitar qiie sobre o País se lançassem insinuações graves, de quê ele é unicamente o culpado. Parece-me que esta situação se não pode, nem devo manter. Sem dúvida cue Londres não é um sanatório para doenças físicas ou morais; e, OU S. Ex.a não é aquele homem que se diz por toda a parte, claramente, e cuinpriu coni os seus deveres de português, que não comprometeu o futuro de Angoláj e então esteja em Londres, porque não há nínguéin, vem português nem inglês, que possa vexnr--nOS, atirando-nOs à cara coin â falta de dignidade moral do Sr. Norton de Matos, ou S. Ex.a é aquilo ijilê se diz e, então, o seu lugar não é ein Londres, mas numa outra parte muito diversa. Para prémio dos seus erros, da sua falta de valor, • da stia má administração e de todas as suas leviandades e esbanjamentos não é moral "qtie se mantenha numa tal situação de destaque um homem que tem atrás de si um passado que a todos escandaliza. Kepito, não é à pessoa do Sr. Norton de -Matos qué-eli me dirijo, é à situação em que se encontra o representante de Portugal em. Londres, depois áe tantas afirmações que se tem feito a respeito desse homem. Termino as minhas considerações mandando para a Mesa urna moção que resume toda a minha maneira de pensar e de sentir sobre o caso da apresentação db Governo. É a seguinte: «A Câmara, considerando que o Governo não Satisfaz nem pode satisfazer as aspirações da opinião pública nem corresponde às mais instantes necessidades do país; Considerando que, perante a crise grave que atravessa em todos os seus aspectos moral, político, económico e financeiro, só um Governo de competências, forte e íntegro, liberto de pressões ou sugestões das clientelas políticas, pode inspirar confiança à Nação; Considerando que da declaração ministerial sé vô que o Governo pretende continuar a obra do seu antecessor, que tanto alarmou a consciência nacional" e que foi repudiada pelo Parlamento como nociva o perigosa, dando assim lugar à queda do Govêruo ánteiior; Considerando que não faz sentido n^m se compreende que em tais condições o Parlamento dê o apoio a um Governo, cuja orientação administrativa é a mesma' daquele que ultimamente derrubou; Considerando que assim, ao contrário do qtie se afirma nas primeiras palavras da declaração ministerial, o Governo não se acia constituído -segundo as normaà constitucionais;
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blico um sentimento de protesto e de revolta bem patente:
A Câmara nega o seu apoio ao Governo, aguarda a constituição, se é possível, de um Governo forte, homogéneo, com programa de imediata realização, concreto e definido, que moralize, ordene e discipline a administração 'pública e restitua ao Estado a confiança que deste se afastou e espera que sejam imediatamente revogados os decretos n.os 9:145, 9:416, 9:437, 9:306 e 9:761, passando à ordem do dia». — (Querubim Guimarães.
O orador não reviu.
O Sr. Pereira Osório: — Sr. Presidente: eu não vou tirar à Câmara senão uns minutos, quando muito.
Segui com atenção o debate político e, cousa curiosa, vi que, anunciando-se grande ataque ao Governo, esse ataque não se deu, porque os Srs. Senadores que entraram no debate e que mais ameaçavam ferir o Governo, eles próprios se. incumbiram de, apreciando um por um os membros do Governo, lhes tecerem elogios, declarando que esperavam trabalho honesto e patriótico.
De maneira que as moções quo alguns desses Srs. Senadores apresentaram são estranhas, porque fazem supor um ataque que realmente não houve.
Felicito, pois, o Sr. Presidente do Governo e os seus colegas pela maneira assaz benévola como foram recebidos, o que é raro suceder nestes casos. 51 Houve, porém, uma nota bem extravagante, que causou estranheza dentro desta Câmara e que me forçou a pedir a palavra pela segunda vez.
E que, realmente, tratando-se dum assunto essencialmente político como é o debato travado a propósito do recebimento do Governo numa Câmara, não se compreende que dum lado dessa Câmara, em que o seu leader manifesta o modo de pensar da corrente que representa, nela se levante uni Senador .desse mesmo lado da Câmara a apresentar uma moção de desconfiança ao Governo, isto é, tomando uma atitude inteiramente oposta àquela que eu, em nome do partido que tenho a honra do representar nesta Câmara, tenho tomado.
A verdade é que esse Sr. Senador, que eu sinto não esteja presente, declarou, com
aquela franqueza que o caracteriza, que falava em seu nome pessoal.
Mas esta declaração nem por isso destruiu a extravagância da sua atitude.
E, caso curioso, é que quem apresentou essa moção de desconfiança, que fazia supor um ataque cerrado ao Governo, rematou por fim por se dirigir a cada um dos seus membros tecendo-lhes elogios, citando mesmo trabalhos que esperava que fossem tratados e solucionados por esses membros do Governo, de maneira que afinal este lado da Câmara, e toda a Câmara esporaria que esse Sr. Senador retirasse a sua moção, que sendo de desconfiança evidentemente que se não contém nas considerações que ele fez referentes a cada um dos Ministros.
Mas a verdade ó que não a retirou, e eu tenho pona de S. Ex.a não estar presente, porque se o estivesse eu dir-lhe-ia que deixava à' sua consciência o encontrar a fórmula de conciliar essa moção com o lugar que ocupa neste lado da Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar):—• Sr. Presidente: eu começo por agradecer aos ilustres leaders do todos os lados da Câmara e a outros Srs. Senadores que fizeram uso da palavra as referências feitas aos membros do Governo.
Tenho em muita consideração o Senado.
Não o digo agora neste momento de modo a que se possa tirar qualquer conclusão diferente do meu pensamento.
Fiz parte desta Câmara durante duas legislaturas, e já por vezes tenho dito as saudades que sinto duma Câmara onde durante esse tempo eu tive ocasião de conhecer os ilustres membros do Senado, e aquelas saudades que sinto desta Câmara onde havia uma delicadeza de sentimentos, uma delicadeza de tratamento, uma deferência para todos, quaisquer que fossem as suas ideas partidárias.
E v.i muitas vezes pôr-se de parte o partidarismo para todos nos interessarmos ,na resolução de problemas que considerávamos de magno alcance.
E por isso que eu tenho muito prazer em rememorar esse tempo.
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Senado' aquela mesma consideração e aquele mssmo respeito com que de aqui saí.
Várias foram as referências feitas a todos os membros do Governo.
De facto c Senado tem na sua prosen-ça uma prova da, minha consideração per ele, ó que na constituição do Gabinete eu vim buscar ao Senado três homens que V.' Ex.aí muito admiram (Apoiados gerais) como homens de muito valor, pessoas de muito estudo e que muito lera dado ao serviço da República.
Muitos apoiados.
Escuso, pois, de fazer a sua apresou-tacão porque V. Ex.as conhec?m-no3 d© perto e ninguém poderá com propriedade, com consciência dizer que, nas SUE.S pastas, qualquer destes Srs. Senadores não são pessoas da mais alta competência para o exercício desses lugares.
Muitos apoiados.
Também à Câmara dos Deputemos , eu fui buscar homens inteligentes, homens que nEo são tam conhecidos desta casa como da outra, pessoas que são conhecidas pela sua grande educação Q republicanismo como possuidores de todas as qualidades para poderem trabalhar nesta hora grave em que se precisa não de palavras mas do acções.
Temos o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, jalo republicano, oficial muito distinto e professor da Escola de Guerra. Conhecendo muito bom, como ccnhece, as nossas relações internacionais, temos o direito de acreditar que ele se desempenhará muito bem do cargo que foi oeirjar.
Apoiados.
Temos o Sr. Ministro do Comercio. Tem dado provas bastantes de qu&.ito vale a ssia actividade, estudo o dedicação.
Não temos, pois, o. direito de <_2uvuai:_ p='p' que='que' de='de' qce='qce' se='se' ocupar.='ocupar.' desempenhará='desempenhará' tudo='tudo' bem='bem' nraito='nraito' ele='ele'>
Apoiados.
Temos o Sr. Ministro da Agricultura. E dos novos. Trabalhador, deu provas brilhantes da sua inteligência dnda ultimamente quando na Comissão do Orçamento foi encarregado de elaborar o parecer Fôbre o'Ministério da Agricultura. Fez um trabalho que revela bem os profundos conhecimentos que tem ao assunto.
Apoiad-Gs,
Outro Sr. Deputado, ó o Sr. Ministro ca Instrução Pública, já conhecido nesta Câmara quando Ministro da Justiça do gabinete de que fiz parte. Altamente inteligente, altamente estudioso, com vastos conhecimentos que garantem a sua competência para o exercício da pasta da Instrução.
Apoiados.
Mas eu não limitei a escolha só às câmaras, fui fura delas buscar uma pessoa que pelas suas qualidades se deve impor h consideração pública.
O tSr. Ministro das Finanças é bem conhecido pela sua acção na Caixa Geral de Depósitos.
Pura resolver a questão financeira é preciisò conhecer sobretudo as condições económicas que se dão no País.
Ora S. Ex.a conhece-as como director da Caixa Geral de Depósitos, e trabalhador, inteligente e conhecedor como é, pode, e estou convencido, há-de fazer uma obra salutar para a República.
Apoiados.
Sr. Presidente: ea talvez por ser militar, mesmo no início da minha vida fui criado sempre com o espírito da disciplina e do respeito, preocupo-me sempre com a questão da ordem, convencido como estou de que não pode haver pro-gres^o, neni trabalho, nem utilidade na administração dum País desde que não seja mantida a ordem.
E assim há a considerar sempre aquela base que ó o exército onde nós vamos encontrar pessoas com características especiais de dedicação com que a República possa contar para manter a ordem quando isso é necessário.
Na pasta da Guerra está uma pessoa competente, com provas brilhantes no comando e em combates, o Sr. Vieira da Rocha.
O Sr. Ministro da Marinha, dedicado à sua arma, é um espírito republicano, que à Marinha dará os seus melhores esforços.
Creio, sem habilidades, ter falado de TDina maneira clara à Câmara sobre a escolha das pessoas que ocupam estes lu-garss.
Eesta-mo agradecer as referências amáveis feitas.
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Não nasceu da propaganda, também não é do tempo em que criança comecei a balbuciar papá e mama.
Nasci pobre; tenho o pergaminho de ser filho de um marceneiro que me deixou a riqueza de um uome honrado. Segui sempre os seus conselhos do respeito por todos, e amando a liberdade.
Vim para Lisboa para poder concluir o meu curso, e tive de dar lições para me sustentar, independente de todos.
O ter de aproveitar as minhas horas de repouso, para angariar pélas lições que dava o necessário para me manter, foi condição propícia para reflectir na vida e ver que -uns gastavam à larga e não conheciam senão .o gozo, ao passo .que a outros custava lhes ter o indispensável.
Observei, pois, estas injustiças várias, e já depois homem, como consequência da revolta contra tamanhas desigualdades, um ideal tive: o ideal republicano.
Vem isto a propósito daqueles que não sendo meus correligionários tiveram palavras amáveis, e que eu disse que recebia como sendo sinceras, porque durante a nrnha vida militar me mantive sempre dentro da disciplina, que me prezo ser sempre disciplinado e discipiinador; nunca fui revolucionário senão uma vez, não como militar, mas como homem público e político, quando foi necessário entrar no Parlamento ; então tomei o compromisso com outros, tendo de reagir de forma que a ditadura acabou, e então lui revolucionário.
Mas, Sr. Presidente, fui também amigo dum camarada, por quem ainda hoje tenho saudades, que foi republicano como eu, e como em certa ocasião, que V. Ex.as se recordam muito bem, diversos republicanos julgavam que ã. República ainda vinha muito longe, foram para o partido regenerador liberal, salvo erro.
Sr. Presidente: tive muitos amigos que me disseram que os acompanhasse; nun-ca^s acompanhei, nunca estive filiado em partido algum da monarquia, mas notavam-se os camaradas como Baptista Ferreira, que, apesar de não seguirmos a mesma idea política, no emtanto, no íim da discussão larga que levávamos muitas noites até de madrugada, ficávamos cada vez mais amigos.
E porquô?' Porque reconhecia a boa fé como estava tratando para o ressurgimento do país, e, como tratássemos de
boa fé, poderíamos ser adversários políticos, mas nunca deixámos de ser amigos.
ji por isso, Sr. Presidente, que, tendo eu na minha vida este facto, em que um, amigo íntimo, discutindo como políticos, nunca duvidámos um do outro, agradeço a sinceridade com que os ilustres Senadores que não pertencem ao meu partido manifestaram a sua simpatia.
Sr. Presidente: agradeço o apoio abertamente 'dado pelo ilustre leader do Partido Democrático, bem como o apontado pela Acção Republicana e o dos independentes agrupados.
Ouvi falar que este' Governo era inconstitucional; eu direi ao Senado em que condições aqui me encontro.
É bom que nos putendamos num meio tam atrabiliário da política, e ó bom que nos entendamos porque não é só o povo que ainda está num .tal atraso de educação que toma como verdadeiro aquilo que dizem os jornais em letra redonda.
Sr. Presidente*, eu tive ocasião de ver. que nas altas camadas sociais se acredita muito no que dizem os jornais; é triste dizer que chegámos a esta conclusão, sabendo nós como se faz o jornalismo. - ,? Em que está a inconstitucionalidade deste Governo?
Havia um bloco que estava dando o apoio ao Ministério presidido pelo Sr. Álvaro de Castro; em certa altura foi votada uma moção na Câmara dos Deputados, em que se entendia que o Governo não estava constituído para as necessidades de momento. Quere dizer, havia que atender para as necessidades da Câmara.
O Sr. Presidente do Ministério é ainda indicado por aqueles que tinham votado essa moção a que formasse novamente Gabinete, dando-lhe, por consequência, o apoio. S. Ex.a não''formou então Gabinete.
Foi indicado o Sr. Afonso Costa, que iião aceitou. Indicado novamente o Sr. Álvaro de Castro, vê-se claramente o apoio sincero que estava dando o Partido Republicano Português..
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Não podia unia parte da Câmara ÍLE.ZCT com qua se dzesse aquilo que estava dependente ííe todos os outros, mas continuava a aplaudir os intuitos de Sr, A.vu-ro de Castro, de fazer reduzir as despesas e aumentar as receitas por forma a conseguir o equilíbrio orçamental, porque era essa a base em que se- tinha formado determinado bloco. Não tendo sido iiaei-to, porque o ,não podia ser, o ponto de vista do Sr. Álvaro de Castro para formai' Govtrno, fui eu indicado polo Pr.rti-do Republicano Português para foruar Governo.
Devo dizer a V- Ex.a que nunca pretendi, nem aunca houve sequer juia conversa peia qual se deduzisse qae eu era pretendente a Oste °cargo. Fi-ij no cumprimento dum dever, o hei-de campii-lo até onde permitirem as minhas íõi\'a:;,
A primtirL, cousa que eu quis íaztjc foi reconhecer sã realmente, poderh coutar com maioria parlamentar que LOS. garantisse deíe^mi-iadas medidas considera Ias indispensúvais para a boa marcíii: grver-nativa, e devo declarar aqui q^e, procedendo às di't::arches necessárias, da parto de ninguém encontrei dificuldades, nenhuma izrpotiçâo me íoí feita.
Foi ne^ia^, condições de liberdade absoluta que pude então constií-iir Ministério.
Eu frito ãste ponto porque aqai c-uvi dizer que G- tinha Ministros qns me haviam sido impostos. Nem Minit-tros, rieo gastas, nada, absolutíimente naia.
Os homens que aqui estão eóíão pela sua devoção republicana e pelas instâncias que fiz.
Não houve, nem podia haver imposição de ninguém.
Sr. Prssicente: eu disse nem pedia haver imposição de ninguém, e eu explicarei a ir j se: é que o Partido 3epubl.cano Portug^ôs, ao dar o seu apoio ao ijlo» co, nenhuma imposição tinha feito o até em ocasiS?3 oem críticas da -viôi ministerial do meu antecessor o meu Partido continuei; a dar o seu apoio ao GOVÍTCO do Sr. Álvaro de Castro e, sendo as^m, justo seria que tivesse agora igualdade de tratamento.
Creio cue este ponto fica bem clarc.
Sr. Presidente: acusa-se a ininha declaração ministerial de ser extraordinariamente 'jnrta, que nada diz.
Sr^Prosidente: eu já tenho concorrido ein diversas situações ministeriais também para dar elementos pura a confecção da declaração ministerial e tenho reconhecido que, por muito que tenha escrito, pouco ou iitida tenho podido fazer, porque faliam outros elementos indispensáveis para pôr em prática tudo quanto se imagina.
Não tem por consequência grande importância.
Nós temos sempre que considerar uma diversidade de problemas, entre os quais há o& primordiais ou fundamentais e problemas secundários.
Resolvidos os primários, passam a ser primários,, então, os secundários.
Tendo apenas sessão até 15 de Agosto, o estando prudentes de discussões vá-riíi-3 iiiodidas indispensáveis à marcha go-vernativ^, com os orçamentos ainda por discutir, £ seria lógico que um Governo quo se formava nestas condições viesse apresentar ao Parlamento uni programa de mcdi( as quo necessariamente exigiria a coucoivência do Parlamento?
Certamente que se diria logo: este homem anda na lua.
Eu não vim aqui para enganar ninguém e por isso reduzi-o ao indispensável neste momento.
Sr.. Presidente: diz-se que este Governo "não pode merecer o apoio da Câmara porque declarou - que vinha continuar a obra do seu antecessor e que a obra de S. Ex.a estava condenada.
Na declaração ministerial, eu não digo quo seguirei pari paxsu a obra de ninguém. Penso que a obra a realizar é do Puís.
Prosseguiremos no caminho do equilíbrio orçamental, comprimindo as despesas e cobrando zelosamente as receitas, pura só poderem verificar as contas do Estado.
Pedir aquelas autorizações que são indispensáveis sob o ponto de vista financeiro.
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se eu vir uma casa a arder, começarei por nomear comissões que vão estudar a forma de destruir o incêndio depressa ou de organizar um corpo de bombeiros, ou a minha preocupação é a lançar água para cima do incêndio?
É a questão de momento. Primeiramente o que urge mais.
Não vi outro ataque ao Governo, porque por ora ainda nenhuma medida dele foi discutida, que pudesse sofrer ataque, — senão pela circunstância de ser a declaração ministerial pequeaa.
Confesso o meu pecado e direi que se pudesse, tê-la-ia ainda reduzido mais.
Falou-se aqui na Câmara numa situação em que eu estava, numa incongruência, porventura, relativa ao nosso embaixador em Londres.
Sr. Tresidente: fui Ministro das Colónias durante perto de dois anos e sabia as dificuldades que iam em Augola, como nas outras colónias.
Tínhamos todos fé, e não só cá, que aquela província prosperaria e no plano iniciado pelo Sr. Norton de Matos, na sua acção e na sua decisão, que devemos confessar são grandes, para levar Angola a uma situação privilegiada.
Contava-se —e S. Ex.a o disse,— que só dentro de seis ou sete anos é que podia vir a começar a frutificar a sua obra.
Quando repentinamente eu soube que ia ser exonerado o Sr. Norton de Matos do cargo de Alto Comissário em Angola eu levantei a minha voz na Câmara dos Deputados chamando a atenção do Governo para o facto, que condenava em absoluto, de ser tirado da administração de Angola o Sr. Alto Comissário e expliquei as razões que me levaram a protestar.
Nada me movia contra o Sr. Norton de Matos, pessoa com quem mantenho as melhores relações, havendo ainda a circunstância de ser meu correligionário.
O que quis. foi mostrar que aqueles actos que considero que entravam a boa marcha da administração republicana, qualquer que fosse a filiação partidária da pessoa que, om minha consciência, tinha andado mal. mereciam da minha parte a mais absoluta condenação, para amanhã não se dizer que- me calava quando se tratava dos meus correligionários.
A resposta que o Sr. Presidente do Mi-
nistério me deu , foi que não o podia fazer, visto que o Sr. Norton de Matos tinha alegíido razões de doença que o im-pediauí de contiáuar exercendo as suas funções em Angola.
Disse, então, que não me constava que Londres fosse um sanatório.
Ora dizendo que não achava razoável, que o Sr. Nortoa de Matos abandonaase ò lugar que 'desempenhava em Angola, não queria dizer, nem ninguém das minhas palavras poderia deduzir, que o Sr. Norton de Matos não tinha qualidades para poder ser nosso embaixador em Londres.'
O que condenei foi que o Governo exonerasse de Angola o Alto Comissário, visto que S. Ex.a já tinha um plano traçado para o desenvolvimento dessa província, criando por consequência, com- essa exoneração, graves dificuldades a essa província.
Quando vim para o Governo estava já nomeado embaixador em Londres o Sr. Norton de Matos e eu não poderia anular essa nomeação visto que ela já tinha o visto e todos os demais requisitos.
Não tinha pois, elemento nenhum, tanto' mais tratando-se dum embaixador em Londres, para anular essa nomeação.
Não há portanto nenhuma contradição. Contradição haveria se eu tendo combatido a exoneração do Sr. Norton de Matos, o exonerasse.
Foi-me também preguntado, e desculpem V. Ex.;is eu não responder a par e passo às considerações do todos os oradores, mas isso levaria muito tempo, foi--me preguntado, disse,,se manteria os decretos relativos à dívida externa, decretos promulgados pelo Governo que me • antecedeu.
Sr. Prosidoníe: as modidas (indicadas por condições especiais) que resolvem o problema financeiro num dado momento, não se anulam sem que outras razões nos aconselhem a fazê-lo.
Prpp;untou-se me também o que pensava acerca da prata.
Eepito o que disee na outra Câmara.
Para mim o grande êrr-o tem sido o não se ter trocado ou vendido essa praia, produzindo ouro.
. Esse tem sido um grande prejuízo para as finanças do país.
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se há-de transformar nas melhores condições possíveis essa prata em ouro.
Sr. Presidente: creio que se fez aqui qualquer afirmação sobre o que, pensava o Governo acerca de matéria religiosa, salvo erro.
Eu devo dizer que o Governo há-de acompanhar com toda a solicitude as relações entre a Igreja e o Estailo, mantendo sempre aquela linha de conduta que se deve manter num' Estado neutral para as diversas correntes religiosas, mantendo a supremacia do Poder Civil acima de tudo.
Eu desgosto-me sempre quando vejo estar a atacar a República tomando como t>ase esta nota de relações entre a Igreja e o Estado.
Eu nunca senti que a República seja um sistema de perseguição a qualquer profissão religiosa.
Muitos apoiados,
Eu tenho do meu ideal republicano a impressão nítida de que o Estado neutral não persegue qualquer que seja a confissão religiosa de cada um, como não obriga a que siga esta ou aquela religião, como não obriga a qualquer deixar de ter uma religião.
É uma questão de consciência do cidadão em que a missão republicana não é outra senão manter a ordem, manter o respeito pelo Poder Civil, mas tendo cada um o direito desfazer o seu culto de modo a não prejudicar a ordem pública,
Eu estive nos Estados Unidos algum tempo e ainda admiro nessa grande República a forma como ali se mantinha a liberdade, completamente estranha à acção governativa, neutral perante essas diversas confissões.
Não se explore com essa questão porque a República não trata de ferir a consciência de ninguém. E mesmo o verdadeiro princípio republicano' libardade de consciência, liberdade de pensar, liberdade de se reunir, liberdade Diz-se que eu tinha tido talvez uma habilidade — cousa que ainda não tinha descoberto em mim— de dizer na outra Câmara que era a hora das esquerdas, dizendo também que era a hora das direitas. Então diz-se que eu andaria ora com a esquerda ora com a direita, Eu não faço distinção entre o modo particular como trato os diversos indivíduos do modo político, porque eu não sou hipócrita. Jíu disse porque ouço' dizer por vezes : hora das esquerdas. Eu disse isto convencido que a hora é das esquerdas. Mas eu explicarei o que entendo por isso. É porque, Sr. Presidente, não pode haver um ideal republicano sem que haja absoluta justiça social. E se nós analisarmos bem a situação actual, havemos de compreender logo que estamos muito longe da verdadeira justiça social. Sei que isso é um objectivo que nunca chegaremos a obter, mas havemos de pró-. curar atingi-lo e aproximar-nos dele tanto quanto possível. Quem pensar reflectidamente há-de reconhecer que há muito que fazer nesse campo e, por consequência, há necessidade de todos nos unirmos e convencermo-nos de que a grande massa sofredora, quando reconhecer que ninguém a atende, virá para a rua. Essa é que é a marcha para a esquerda, a marcha para a satisfação das reivindicações sociais, a marcha ao encontro daquelas necessidades a que me referi. Assim como é a hora dessa marcha para a esquerda, é também a hora das direitas pensarem e concluírem que não é conveniente contrariar essa atitude; antes no seu próprio interesse, lhes convém auxiliá-la porque as regalias que hoje têm, nada ganham com a resistência. Depois destas palavras, ninguém poderá pôr em dúvida o meu pensamento e a orientação do Governo que pretende trabalhar para que saiamos da situação em que estamos. Neste sentido, apelo para o patriotismo do Parlamento, de forma a poder conse-o guir-se o ressurgimento do país e termos mais horas de sossego do que neste período que estamos atravessando. O orador não reviu.
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foi pelo motivo dessa declaração ser pequena que eu fiz tal afirmação.
Ela poderia ser ainda mais pequena e dizer muito.
Eu disse que a declaração'ministerial não dizia nada, porque, na realidade, do que lá está escrito .não se conclui qual a orientação do Governo, o que tenciona fazer, os seus planos, etc.
O Sr. Presidente do Ministério podia ter escrito ainda menos, mas dizer alguma cousa.
Eu fiz uma pregunta à qual S. Ex.a se não dignou responder.
Era o que pensava o Governo acerca do reconhecimento do regime político da Rússia, que como V. Ex.a sabe já foi reconhecido por algumas nações, reconhecimento esse que nos traria algumas vantagens económicas.
Pelo que S. Ex.a acentuou, acerca da sua orientação, parece me que é —digamos assim — incolor.
S. Ex.a não se manifestou claramente, se a sua orientação seria no sentido das esquerdas ou no sentido das direitas, porque isto não são palavras vãs, há na realidade maneiras de xproceder diversas, conforme a orientação seguida.
Sr. Presidente: como V. Ex.a sabe, há muitas reivindicações sociais a satisfazer.
Falou S. Ex.a,' o Sr. Presidente do Ministério, em justiça social.
Eu garanto que não compreendo bem o que S. Ex.a quere dizer com essas palavras, o que talvez seja por acanhamento da minha inteligência.
Gostava que S. Ex.a explicasse claramente o que entende por justiça social; o Sr. Presidente do Ministério, por certo, não se quis manifestar bem claramente no sentido das esquerdas que é de facto aquele em que a corrente corre neste momento, e eu digo a S. Ex.a que com a sua orientação não lhe dou muitos dias AG vida ao seu Ministério, porque, em virtude da acção do Partido Republicano Radical, começa a manifestar-se dentro do seu Partido uma facção nesse sentido, supondo que pode antepor-se à acção do verdadeiro Partido Republicano Radical.
Essa facção há-de causar sérios embaraços à vida do Governo, mas nada prejudicará o Partido Republicano Radical.
O Partido Republicano Radical já con-
seguiu pelo menos que no Parlamento se fale em esquerdismo, em radicalismo.
Eu também gostava que o Sr. Presidente do Ministério me dissesse alguma cousa do que pensa sobre o modo de proceder para atalhar o constante aumento da carestia da vida, que faz com que não haja funcionário público absolutamente nenhum que com o seu simples vencimento possa atender a ela.
Eu referi-me também à' necessidade da remodelação •> dos berviços públicos, de modo a que os funcionários possam ter os seus vencimentos em harmonia com a desvalorização da moeda.
A este respeito nada disse o Sr. Presidente do Ministério.
S. Ex.a, referindo-se à questão religiosa, deixou habilmente de responder às preguntas que lhe foram feitas.
Essas preguntas suponho eu que eram relativamente a um projecto de lei apresentado na outra Câmara pelo Ministro da Justiça, do Ministério passado, Sr. José Domingues dos Santos, que segundo me parece pretende impedir que os padres andem livremente de batina pela rua.
Aí está, Sr. Presidente, uma manifestação de esquerdismo da facção esquerdista do Partido Democrático.
Entendo que a questão religiosa é uma questão absolutamente morta, desde que a Igreja se mantenha no seu lugar, alheia às questões políticas.
A mim tanto me importa que os padres andem de batina como não, e assim é que eu compreendo a verdadeira liberdade.
Tenho dito.
O Sr. Pereira Osório:—Requeiro que a sessão seja prorrogada até terminar o debate político.
Submetido à votação o requerimento, é aprovado.
O Sr. Augusto de Vasconcelos : — Se fosse necessário demonstrar que o Sr. Rodrigues Gaspar era um ilustre parlamentar, bastaria o seu discurso de hoje, que foi brilhante na forma como largo de vistas, para o evidenciar.
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tuação de equilíbrio em que o admirámos.
S. Ex.a tinha um ultimatum de uma das facções da sua maioria, qual era que teria o seu voto se S. Ex.a continuasse a obra do (Governo anterior, e como S. Ex.a sabe que isso produziria no país um verdadeiro pânico, achava-se na contingência ou de perder o apoio de uma parte da sua maioria ou de perder o apoio do país.
Uma grande habilidade; dizer no seu discurso que continuaria a obra do Governo anterior mas que não á seguiria passo a passo. Não sei se isso será bastante para que não sinta abalada a sua maioria. Esta já se ressentiu; Surgiu a questão 'dós governadores civis qiife ao país nada interessa. S. Ex.a disse e disse bem: nas questões financeiras graves é possível que sé hesite perante certas determinações a tomar; uma vez j porém, tomadas não sé podem estar a alterar todos os dias. Evidentemente não pode o Partido Nacionalista exigir de S; Ex;a que amanhã, fosse revogar os decretos que reduziram os juros da dívida externa ou que reduziram os juros de 6 l/í por cento; não era possível fazer-se essa exigência. Mas o que nós lhe pedimos, e que S. Ex.a tem de fazer e o Sr; Ministro das Finanças tem de procurar remediar^ é acudir à situação de descalabro e descrédito criados ao Pais por esses dedretos; Eu tive ocasião de preguntar} há dois ou .três dias, se era verdade que tivesse fracassado o empréstimo para Moçaclbi-que. Se ele fracassou deve ser devido às causas da influência destes decretos e aí tem S. Ex.a um desgraçado sintoma das consequências dessa detestável política, tanto mais detestável quanto não era necessária. O acréscimo das receitas das novas leis tributárias; os resultados que traria a lei do selo, uma sensata compressão de despesas e o aumento de receitas provenientes por exemplo do contrato dos Ta^ baços e outras .operações deste género, poderiam ter conseguido uma marcha rápida para o equilíbrio orçamentai, sem necessidade de recorrer a essa desgraçada política que tam perniciosos resultados tem trazido pára o nosso país e para ò nosso crédito. Nas outras questões de ordem política não demonstrou S. Ex.a menos habilidade; a respeito da questão religiosa expôs S. Ex.a os bons e sãos princípios de respeito por todas as religiões, sendo até S. Ex.a apoiado por todo q Senado. Mas, Sr. Presidente, está pendente da outra Câmara lima proposta para á revogação dum decreto que modificou na Lei da Separação aquelas disposições que mais tinha levantado a consciência dos católicos e uma grandti parte do País. S; Ex;a nada disse sobre o que pensava á respeito da aprovação ou rejeição dessa proposta, e eu, o]ue sou uma pessoa discreta, respeito o seu silêncio ; não insistirei por agora, certo que daqui a, algum tempo hei-de ter o prazer de ouvir Si Ex.a sobre o casoj Quanto às afirmações de S; Ex:a, a respeito da marcha para a esquerda^ também estamos de acordei; no discurso que aqui pronunciei, disse a S. Ex.a que nesse caminho nos encontraremos. Tudo quanto seja melhorar as condições dê vida das classes menos protegidas, reformas operárias5 alargamento da lei dos acidentes de trabalho^ difusão do ensino, de modo que todas as classes da sociedade .possam participar no Governo, e na administração do Estado, nesse caminho encontrar-ine há V: Ex.a e na vanguarda de todos; Sr. Presidente i apresentaram-se várias moções, mas o Partido Nacionalista, que já vincou a sua situação política em face do Governo^ dispensòu-se de aqui o fazer . Nós não podemos apoiar um Governo que saiu duma maioria que nos foi sempre adversa. Uma voz t — Nem sempre; Pelo menos durante 28 dias. O Orador: —É melhor não falar nesse atribulado apoio de 28 dias. Não faiemos nisso;,
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sejain adversos ao regime; daremos portanto o nosso voto tanto à moção do Sr.. Ribeiro de Melo como à do Sr; Joaquim Crisóstomo.
É o que tenho a dizer a V. Ex.a
Tenho dito;
O Sr. Querubim Guimarães: —r Sr. Pro-
sidente: duas palavras apenas.
O Sr. Presidente do Ministério, que eu ouvi com muito agrado, confirmou manifestamente hoje, na resposta aos oradores que intervieram no debate político, os seus créditos de pessoa inteligente.
Sr. Presidente; eu tenho e tive sempre admiração pela inteligência humana. A inteligência se deve muito. A sociedade não podia progredir e a civilização marchar sem o esforço da inteligência. Tenho sempre admiração por ela e, sendo assim, não poderia deixar de ter igual quando demoistrada aqui pelo Presidente do Ministério, Sr. Rodrigues Gaspar. Masá Sr. Presidente, eu tenho muito medo dessa inteligência, porque a inteligência quando tenha ao seu serviço a palavra como instrumento de intuição clara e categórica do pensamento, é sem dúvida uma inteligência que traz bons resultados porque não deixa dúvida alguma no espírito de quem quer que seja; mas quando vejo fazer da palavra aquela arma subtil para em vez de traduzir a sinceridade do que pensa antes traduz aquilo que o pensamento não quere que seja, ficamos, sem dúvida, numa grande perplexidade; e então, concluo que nessas condições a inteligência é uma arma muito perigosa para quem tem de praticar e manifestar em realizações efectivas e imediatas qualquer planoj qualquer orientação.
Sem dúvida que o Sr: Presidente do Ministério se encontra num falso terreno, mas S. Ex.a, com aquela habilidade que todos lhe reconhecemos, habilidade não no sentido pejorativo da palavra, mas no de não desagradar a A nem a B, pronun^ ciou palavras que revestem emfim uma boa doutrina e um acto de cortesia, mas que para um Presidente do Miuisténoj nesta hora sobretudo, ó pouco importante, para não dizer nadai
O GJovêrno, na sua constituição não representa o que as indicações parlamentares impunham. Se S. Ex.a • estivesse à vontade, se tivesse aquela inteira liberda-
de que a um Governo convém; se" esti vesse livre de quaisquer preocupações que inuito e muito devem preponderar no seu espírito, e que tantas vezes o hão-dé desviar daquela linha que é seu desejo seguir j teria alguma esperança na perpetuidade da sua obra.
Mas S; Ex;a nasceu de tal maneira que se me afigura que já está à beira do túmulo.
O Governo está numa situação de tal ordem pelo que respeita à base em que tem de fundamentar a sua acção no Parlamento, quej sem dúvida, ã nós todos salta esta preocupação: é que, dentro de pouco tempo assistiremos a Outra crise ministerial de difícil solução, porventura muito ínais difícil do que a de agora.
Novamente se invocará o patriotismo^ o espírito de sacrifício do grande homem da República que à República deu inuito do seu esforço na propaganda, mas quê na hora bem aflitiva que o país atravessa ainda se não demoveu a vir prestai* o concurso da sua inteligênciaj que é grande, e o país Continua a. assistir a este espectáculo de séries de governos • sem nada de útil nem de produtividade fazerem. í Sr. Presidente: se eu visse que o Gò-vêrnò não tinha a preocupação de Seguir uma linha de conduta de forma a não magoar ou ferir o bloco^ que não ó um bloco de granito mas de areia^ aparentemente forte mas que se desfaz à uni sopro de vento, então, S. Ex.a com a inteligência que todos lhe reconhecemos, poderia fazer qualquer cousa de interessante com a competência, o esforço e bom senso dos colaboradores que tem; mas eu estou convencido de que as suas preocupações hão-de ser tam grandes que há-de sair do Poder sem nada ter feito em benefício do País.
Sr: Presidente: o Sr. Presidente do Ministério, concretamentej não respondeu às-preguntas que eu fiz quando afirmou aqui que o Governo seguia a mesma orientação em matéria política, económica e financeira do Governo anterior.
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que não tem" aquela liberdade que devia ter para desenvolver um plano de administração fora da orientação do seu antecessor.
S. Ex.a tem de ser, sem dúvida, um escravo da obra do Governo anterior e, sendo assim, eu pregunto como é que o Governo reúne as condições necessárias para manter no espírito público Q sossego.
,j Pois porventura compreende-se que um Estado que se vê aflito não tenha outra maneira de resolver o caso, do que faltar à palavra? (i Pois no capítulo relativo às despesas orçamentais não deviam estar acima de tudo, intangíveis, é o termo, aqueles que tinham direitos, aqueles que confiaram na palavra do Estado e lhe deram o seu auxílio numa hora difícil? Não há ninguém dentro dos próprios portugueses capaz de confiar nam devedor que tem na mão o instrumento preciso para inutilizar os contratos que firmou. E preciso, pois, que eu diga que a política do Governo anterior foi uma política de descrédito, que nos'vexou e humilhou. Tenho, Sr. Presidente, de lembrar novamente a frase do Sr. Augusto de Vasconcelos : — Se o empréstimo de Moçambique naufragou, o que porventura será um benefício para a colónia e para a metrópole, o facto é que ele não deixa de ter o aspecto moral, como a imprensa j á referiu, de que os banqueiros ingleses haviam dito que se não podia negociar com um País que não honra os seus compromissos. E ainda que tal não tivesse acontecido, mas amanhã virá a acontecer. Estamos sujeitos a que amanhã lá fora nos atirem com estas palavras: — jNão negociamos convosco, não vos entregamos o nosso dinheiro, porque não temos confiança em vós! Isto, Sr. Presidente, não pode agradar a ninguém. Muito má ,e até anti-patriótica foi a obra do Sr. Álvaro de Castro. A prata.—Eu ouvi a resposta que sobre este assunto o Sr. Presidente do Ministério deu na outra Câmara e que foi quási ipsis verbis a mesma que aqui deu. Concordamos que em certa ocasião e num dado momento se efectuasse essa operação. Mas pregunto: ^ Esse dinheiro serve unicamente para satisfazer as necessidades do Tesouro Público ? Se o destino desse ouro é o mesmo daquele que se tem dado a tantas centenas de milhares de contos da circulação fiduciária, então essa operação é simplesmente ramosa. O Sr. Presidente do Ministério dirá concretamente o que tenciona fazer desse ouro. Ainda com respeito à redução dos juros da dívida externa o Sr. Presidente do Ministério, com aquela habilidade que todos nós lhe reconhecemos, desviou-se do assunto e não definiu o que pensava a esse respeito. S. Ex.a disse: Há actos de administração que as circunstâncias justificam. Conclusão que eu formo: Quando as circunstâncias justificarem um acto contrário àquele que praticou o Sr. Álvaro de Castro pratica-se esse acto. Portanto pregunto eu: jj.Quando é que S. Ex.a entende que essas circunstâncias aparecerão? Relativamente ao nosso embaixador em Londres, o Sr. Eodrigues Gaspar reconhece que está numa situação muito delicada. S. Ex.a quando na Câmara dos Deputados fez um ataque, como eu vi, decisivo e violento aos Ministros que fizeram a nomeação do Sr. Norton de Matos para nosso embaixador em Londres, proferiu palavras e frases que sem dúvida nenhuma fizeram - perder ao Sr. Norton de Matos toda aquela autoridade de que ele precisava para desempenhar uma missão tam delicada.
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um sanatório para doenças físicas ou morais, deixou no espírito de todos que o escutaram a tradução destas palavras.
Quando S. Ex.a disse que Londres n3,o era um sanatório para doenças físicas ou morais queria dizer aquilo que estava no seu pensamento, mas que nem então, nem hoje, tem maneira de enunciar doutro modo.
O que é certo ó que a situação do nosso representante em Londres ó uma situação absolutamente incompatível com a própria dignidade do pais.
Não se compreende que vá para um lugar tam delicado, junto duma corte tam escrupulosa, como a corte inglesa, senão quem esteja rodeado dum. grande prestígio moral, e eu pregunto se esse prestígio moral existe na pessoa do Sr. Norton de Matos.
O Sr. Norton de Matos — disse-o o Sr. Rodrigues Gaspar na outra Câmara — abandonou o seu lugar.
Um homem que fugiu do seu posto, um homem que esboçou os primeiros traços dum plano, que anarquizou a administração pública, que criou à província as maiores dificuldades, Não, Sr. Presidente; o Sr. Rodrigues Gaspar desta vez, como doutras, entende que a palavra foi dada ao homem para encobrir o seu pensamento, mas o que S. Ex.*, no emtanto, não pode é fazer retirar do Diário das Sessões da outra Câmara as palavras que proferiu. Falou também S. Ex.a num ponto que não toquei, mas a que outros oradores se referiram: o problema religioso. S. Ex.a pôs a questão, em palavras, muito bem; o que falta é saber se porventura os seus actos correspondem precisamente às suas palavras de neutralidade. Mas, Sr. Presidente, a neutralidade é uma palavra que só serve para encobrir o pensamento de quem a pronunciou. E, Sr. Presidente, à sombra dessa neutralidade tem-se feito tanta e tanta perseguição às crenças religiosas do país; à sombra dessa neutralidade têm-st criado situações difíceis à própria República. Ainda não há muito tempo veio na imprensa a reprodução das palavras que o antigo Presidente do Conselho de Ministros em França, o Sr. Viviani, teve a coragem de pronunciar quando S. Ex.a atacava, por motivos .de religião, o facto de aquela neutralidade que estava na lei não ser a verdadeira neutralidade que os Ministros manifestavam, e dizendo que ela não era mais que uma habilidade diplomática, que não servia senão para adormecer os tímidos. Disse-o Viviani, Ministro da França, e essa ó que en estou habituado a ver neste país. - . Não me parece que a República se tenha compenetrado da sua missão perante um país que tem as maiores tradições de catolicismo. Mesmo antes, nesse regime em que se entrou' quando era Presidente da República o Sr. António José de Almeida, numa cerimónia oficial com o representante do Sumo Pontífice, nem mesmo nesse regime eu vi que a República se tivesse compenetrado da sua situação e tivesse visto que a grande maioria do país é, sem dúuida nenhuma, portadora de crenças católicas. Postas estas considerações, e sobretudo aqueles três pontos para que novamente chamo a atenção do Sr. Presidente do Ministério, pedindo-lhe desculpa de ser assim tam .importuno, mas faço-o com a melhor das intenções. Que S. Ex.n me diga o que pensa, mas concretamente, sobre esses três pontos: redução de juros da dívida externa, destino, a dar ao ouro da operação da prata. O orador não reviu.
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Diário das Sessões ao Senado
às preguntas que me foram feitas, começando por pedir desculpa de o não ter feito, mas realmente não s.eg"ji os meus apontamentos, e daí o terem falhado alguns pontos.
Q Sr. Procópio de Freitas fezumapre-gunta: o que entendia eu por justiça social.
Eu não empreguei a palavra justiça social como filha da minha imaginaçíio mas sim como uma palavra perfeitamente conhecida, sobretudo pelos republicanos mais avançados, e fiquei realmente admirado que S. Ex.?, que representa aqui o Partido Radical, viesse preguntar uma cousa dessas.
Q Sr. Procópio de Freitas:—V. Ex.a
disse que era a hora da justiça social e eu não compreendi.
O Orador s -r-A justiça social, e eu referi-me a ela depois de ter falado na grande desigualdade que havia nas camadas sociais, o que eu entendo por justiça social é procurar que os de baixo vão subindo sucessivamente sem que os outros que estão em cima desçam.
É essa a justiça social duma forma resumida.
Apoiados.
• É que há muita gente que" entende que ser republicano ó bater muito com as mãos e com os pés, e, se não estão satisfeitos, gritarem bem alto que são radicais.
O Sr. Procópio de Freitas: — <_ p='p' justiça='justiça' as='as' sociais='sociais' social='social' satisfazer='satisfazer' é='é' reivindicações='reivindicações' _='_'>
Então está bem.
Q Orador: T-Nem mais nem menos. Mas isso tudo nos termos.
Preguntaram-me o que pensava o Governo acerca das relações com a Rússia.
Eu devo dizer a V. Ex.a que o pensamento do. Governo é estabelecer todos os convénios que possam interessar à economia.
Se' eles nos apresentarem -propostas que sejam boas para a economia e que não venham bulir com a ordem, serão reconhecidos.
O Sr. Procópio de,Freitas reparou em eu dizer que vamos a caminhar para a esquerda.
V. Ex.a não receie que eu vá invadir p seu terreno.
Risos.
Nem de longe me passou essa idea, e eu não sou político de andar a fazer pror paganda, porque eu sei alguma história... Eu explico.
No tempo da monarquia houve um Presidente do Ministério que arranjou um Ministro, então do Reino, que causou sensação entre os seus correligionários.
Todos se preparavam mais ou menos para o lugar e o Presidente tinha escolhido uma criatura alheia a todas estas cousas que se dizem nas câmaras e antecâmaras.
Ninguém se atrevia a preguntar porque tinha sido aquela escolha, até que um mais ousado fez a pregunta.
S. Ex.a respondeu a sorrir:
«Porque sabe muita história».
Risos.
Eu sei alguma história ...
O que eu digo a V. Ex.a é que pode estar descansado que eu não lhe invado o seu lugar, porque, como militar, sou disciplinado.
O Sr. Procópio de Freitas: -r Não é por V. Ex.a, é por uma facção do seu partido que anda a fazer uma propaganda radical por toda a parte, como se fosse dç meu partido.
Protestos da maioria.
Trocam-se apartes.
O Orador: — O que vaje ó que a Nação já não os acredita.
Protest08} o ruído aumenta.
O. Orador:-r-Tenho de responder ao ilustre leader nacionalista.
Eu não vim aqui desempenhar uma missão por ordem duma facção do meu partido... (Apoiados das esquerdas}, eu estou aqui porque tenho todo o partido atrás de mim.
Muitas apoiados das esquerdas.
Referiu-se S. Ex.a ao empréstimo de Moçambique.
Não tenho conhecimento, até este momento, de que tenha fracassado esse empréstimo.
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De resto, não compreendo que o Sr. Augusto de Vasconcelos acompanhe alguém que não seja da sua confiança. < Se acompanha o Governo na sua marcha, decerto é porque tem nele confiança.
O Sr. Augusto de Vasconcelos:—Não para continuar a obra do Governo anterior.
O Orador:—Ao Sr. Querubim Guimarães devo dizer que ouvi com muita atenção as considerações do seu lindo discurso e agradeço-lhe a forma como tratou os seus vários pontos.
Quanto ao empréstimo de Moçambique, já eu disse o que posso nesta ocasião.
Quanto à prata também eu já disse que deve ser transformada em ouro e quanto ao emprego desse onro é difícil sabê-lojá.
O Sr. Querubim Guimarães : — Amanhã V. Ex.a vê-se na necessidade de recorrer ao expediente de pôr esse ouro no prego, como fazem os estudantes.
O Orador: — Se eu assim fizer, estaremos os dois plenamente de acordo porque será,para acudir a alguma grande dificuldade do País. para pagar alguma dívida.
Circustâncias especiais levam os Governos a tomar determinadas medidas e circunstâncias especiais também os levam a anular essas medidas.
O Governo que me antecedeu era suficientemente patriótico.
Apartes.
O Orador: — Quanto à matéria religiosa da mesma maneira que o Estado não quere prejudicar qualquer religião, também não aceita a interferência desta nas cousas do Estado.
Finalmente quanto à pregunta do Sr. Costa Júnior sobre o que pensava o Governo acerca dos vencimentos ao pessoal dos correios e telégrafos, devo dizer que pensa que tem direito a vencimentos quem esteve ou está no exercício das suas funções.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
Sai o Ministério.
Lida e submetida à votação a moção do Sr. Ribeiro de Melo, é rejeitada.
Lida e submetida à votação a moção do Sr. Joaquim Crisóstomo, é rejeitada.
Lida e submetida à votação a moção do Sr. Querubim Guimarães, é rejeitada.
Entra de novo o Ministério.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Rodrigues Gaspar): — Agradeço à Câmara a prova de confiança que nos acaba de dispensar, e convencido estou de que o Governo fará por lhe corresponder.
O Sr. Presidente :— A próxima sessão ó amanhã, 30, à hora regimental, com a ordem do dia restante.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 30 minutos.