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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENAD
SESSA.O 2ST.° SÓ
EM l DE AGOSTO DE 1924
Presidência do Ex,rao Sr. António Xavier Correia Barreto
Secretários os Ex.m08 Srs.
Sumário.— Verificando-se a presença de 25 Srs. Senadores, foi aberta a sessão.
Procedeu-se à Leitura da acta, e, estando em reclamação, o Sr: Medeiros Franco requereu que se inserisse a declaração de que se associaria à manifestação de simpatia feita na anterior sessão ao Sr. José Pontes, vítima dum desastre de automó-vel.
Aprovou-se a acta e tfeu-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — É autorizado o Sr. Silvestre Falcão a depor no tribunal contra o Deputado Sr. Velhinho Correia.
O Sr. Júlio Ribeiro entende que se deve melhorar o fabrico dos fósforos.
O Sr. Augusto de Vasconcelos expõe os trabalhos da, última Conferência Interparlamentar.
O Sr. Oriol Pena faz considerações acerca das colónias, e ô Sr. Ramos da Conta alude às frequentes aterragens, no nosso país, dos aviadores espanhóis. A ambos os Srs. Senadores responde o Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato}.
O Sr. Serra e Moura trata do desprezo a que diz estarem votados ou aviões na alfândega.
O Sr. Cos>a Júnior lamenta que os géneros vendidos nas feiras livres sejam mais caros do que no* mercados.
O Sr. Procópio de Freitas pede providências contra o exagerado aumento do fabrico de aguardente na Madeira. A todos os Srs. Senadores responde o Sr. Ministro da Agricultura (Torres Garcia}.
O Sr. Machado Serpa requere que entre em dis-cuskão o projecto referente a um cabo submarino. Falam sobre o assunto os Srs. Herculano Galhardo, Augusto de Vasconcelos, Ministro do Comércio (Pires Monteiro}, Aragão e Brito e Machado Serpa. Foi rejeitado o requerimento.
Ordem do dia. — Entra em discussão o projecto de lei n." 378 (.\fontijo). Falaram os Srs. Afonso de Lemos, Herculano Galhardo, Roberto Ba//tis ta. Ministro do Comércio (Pires Monteiro) e Procópio de Freiêas. Foi aprovado na generalidade.
Francisco Vicente Ramos António Gomes de Sousa Varela
Antes de se encerrar a sessão.—O Sr
Ferreira de Simas fala acerca do álcool de 'dormideiras.
Os Srs. Costa Júnior e Carlos Costa tratam do regime de águas em Lisboa. Responde o Sr. Ministro do Comércio.
Abertura da, sessão às 15 horas e 16 minutos.
Presentes à chamada 2ò Srs. Senadores.
Entraram durante a sessão 14..
Faltaram 31. .
Srs. Senadores presentes à chamada:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos. ~ Álvaro António Bulhão Pato.
Aníbal Augusto Eamos de Miranda. , António Gomes de Sousa Varela.
António Maria da Silva Barreto.
António de Medeiros Franco.
António Xavier Correia Barreto.
Aprígio Augusto de Serra e Moura.
Augusto César de Vasconcelos Correia.
César Procópio de Freitas.
Constantino José dos Santos.
Francisco José Pereira.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Francisco Vicente Ramos.
Frederico António Ferreira de Simas.
Herculano Jorge Galhardo.
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Diário cias Sessões do Senado
José António da Costa Júnior.
José Duarte Diaa de Andrade.
José Àlachado Sorpa.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Luís Aufrasto de Aragão e Brito.,
Nicolac Xesqujta^
Rodrigo Guerra Alvares Cabral.
Silvestre Falcão.
Entraram durante c<_. p='p' s-issao='s-issao' tag0:_='srs.:_' os='os' xmlns:tag0='urn:x-prefix:srs.'>
o
Alfredo Narciso Marcai M;>rtins Portugal.
Artur Augusto da Costa.
Augusto de Vera Cruz.
César Justino de Lima Alves.
Francisco António de Paula.
João Carlos da Costa,
João Catanho de Meneses.
João Manuel Pessanha V az das Neves.
Joaqui^i Pereira Gil de Matos.
Luís Isocâncio Ramos Pereira. . ~
Querubim da Rocha Vale Guimarães.
Roberto da Cunha Baptista..
Rodolfo Xavier da Silva.
Tornas de Almeida Manuel de Vilhe-na (D.)-
Srs. Senadores que não comperece-
' ram :
António Alves de Oliveira Júnior., António da Costa Godinho cio Amara]. Artur Octávio do Rego Chagas. Augusto Casimiro Alves Monteiro. Duarte Clodomir Patten de Sá Viana. Elísio Pinto de Almeida e Castro. Ernesto Júlio Navarro. Francif^o Xavier Anacleto da Silva. João Alpoim Borges do Canto. João Alaria da Cunha Barbosa. João Trigo Motinho. Joaquin Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Joaquim Teixeira da Silva.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Aagusto Ribeiro de Melo,
José Augusto de Sequeira.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Joaquim'Fernandes Pontes.
José Joaquim Pereira Osório.
José Muzides dos Reis.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Luís Augusto Sjmões de Almeida.
Manuel" Gaspar de Lemos. Pedro Virgolino Ferran Chaves. Raimundo Enes Moira. Ricardo Pais Gomes. Vasco Crispiniano da Silva. Vasco Gonçalves Marques. Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Sr. Presidente (às 15 horas e lô minutos): — Vai proceder-se à chamada. F&z-se a chamada.
O Sr. Presidente (às 15 horas e 20 •minutos) : — Estão presentes 25 Srs. Senadores.
Está aberta a sessão.
Vai ler- se a acta.
O Sr. Presidente : — Está em discussão a acta.
O Sr. Medeiros Franco : — Sr. Presidente': tive conhecimento de que esta Câmara, na última sessão, se associara a uin voto de sentimento pelo desastre sucedido na pessoa ilustre do Sr. José Pontes,
Nào me encontrava presente, e por isso não me associei a esse voto de pesar, que se traduziu numa homenagem ao Sr. José Pontes.
Desejava por isso que ficasse consignado na acta que se me encontrasse presente me teria associado pessoalmente, e porque o não fiz nessa sessão faço-o agora, para que o desastre sucedido ao Sr. José Pontes seja o mais insignificante possível, para que S. Ex..a volte depressa à Câmara e lhe dê aquela colaboração valiosa que lhe costuma dar.
O orador nã,o reviu.
Pausa.
O Sr. Presidente : — Como mais nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada. Vai ler-se o
Ofícios
Do Ministério da Agricultura, satisfazendo ao requerimento n.° 720, de 29 do mês findo, do Sr. César Justino de Lima Alves.
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Sessão de l de Agosto de 1924
Do 2.° juízo, solicitando a autorização da Câmara para depor como testemunha o Sr. Silvestre Falcão no processo instaurado contm o ex Ministro das Fiiian-çaa, Sr. Velhinho Correia.
Para a Secretaria.
Da Junta Geral do Distrito de Aveiro, solicitando do Poder Legislativo a aprovação duma lei que eleve as actuais percentagens.
Para a Secretaria,
Da Câmara dos Deputados, remetendo três propostas de lei relativas aos seguintes assuntos:
Extinguindo a gratificação de efectividade dos sargentos da guarda nacional republicana, nos termos da lei n.° 1:039.
Abrindo um crédito especial de 2:200 contos a favor do Ministério do Interior, destinado a satisfazer os encargos da lei n.° 1:436, de°31 de Maio "de 1923.
Abrindo um crédito especial de 10.600$, a favor .do Ministério do Interior, para reíôrço da verba inscrita no Orçamento sob a rubrica «Investigações e inquéritos».
As três propostas foram enviadas para a T.a
O Sr. Júlio Ribeiro:—Sr. Presidente: o actual Governo, pelo visto, quere conservar as tradições dos seus antecessores, isto ó, por mais que nos cansemos a pedir a comparência dos Srs. Ministros, com o fim de tratarmos de assuntos de interesse nacional, não há maneira de o conseguir.
Sr. Presidente: na última sessão pedi a comparência dos Srs. Ministros do Interior, da Justiça, das Finanças e da Agricultura. Só vejo presente o Sr. Ministro das Colónias, e este, naturalmente porque sendo Senador, está acostumado a encaminhar para aqui os seus passos; apesar de não estar presente o Sr. Ministro das Finanças, quero mais uma vez protestar contra o escândalo da Companhia dos Fósforos, não cumprindo a letra do contrato e expondo à venda apenas fósforos caros de ordinaríssimo fabrico.
Tenho aqui, em sessões sucessivas, protestado contra esse escândalo.
• A resposta do Sr. Ministro das Finanças 'é, invariavelmente, que vai providenciar; mas a verdade ó que essas providências não se fazem sentir. E, das duas uma: ou o Sr. Ministro das Finanças não providencia, não se importando com as reclamações, ou a Companhia dos Fósforos não faz caso algum, tratando com desdém e desprezo o Governo e o comissário do Governo. Parece que não temos junto dessa' Companhia uma autoridade fiscal que obrigue a Companhia ao cumprimento do dever.
^Sabem V. Ex.as como é que a Companhia respondeu aos protestos feitos no Senado ?
iEetirando do mercado os fósforos de
o
dez centavos, deixando só os de vinte centavos em caixas mais pequenas e ainda com a agravante de não prestarem !
Um verdadeiro desafio.
Por isso continuo a protestar pedindo ao Sr. Ministro das Colónias que faça sentir ao Sr. Ministro das Finanças que não estou disposto a ser ludibriado por todos aqueles que dizem que providenciam.
E preciso que isto entre no caminho da moralidade e que se façam cumprir as leis.
É preciso, sim. para que a República se engrandeça e prestigie.
Um regime, que não tem culto'p elas suas leis, é um regime que se dissolve e não tem razão de existir. •
Oxalá, não tenha de voltar a ocupar-me deste fastidioso Assunto.
Tenho dito.
O Sr. ESinistro das Colónias (Bulhão Pato): — Sr. Presidente: transmitirei ao Sr. Ministro das Finanças as considerações de S. Ex.a
Desejo ao mesmo tempo informar V. Ex.a que ò Sr. Ministro das Finanças tem tido um trabalho fatigante ; quási não tem tempo para comer e dormir.
A questão dos tabacos preocupa S. Ex.a além de outros problemas, que está estudando com muito zelo.
Entretanto, comunicarei a S. -Ex.a as considerações do Sr. Júlio Kibeiro.
O orador não reviu,
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Diário das Scâtõet do Senado
reunisse a comissão'interparlamentar do comércio, para lhe dar conta da sessão de Bruxelas deste ano, visto que n5,o desejava fazer essa comunicação pública sem ter para com a> comissão a atenção que devia.
Mas, Sr. Presidente, os factos podem mais que os desojos que. nos animam, pois que tendo de retirar me para fora de Portugal,, tenho de dar conta dessa missão, antes mesmo de fazer reunir a comissão.
Sr. Presidente: a comissão interparla-mentar do comércio começou a trabalhar em 1913, fazendo parte dela seis grupos. As representações foram aumentando, e este ano estiveram já representados oficialmente vinte e dois Estados.
Basta isto para se verificar qual a importância grandiosa por que está passando tal instituição.
A sessão deste ano, como era a do décimo ano, era uma sessão jubilada.
E,calizou-se em Bruxelas por ser a sede do Bureau permanente da conferência.
Uma comissão composta de mais A sessão inaugural, presidida por Sua Majestade o Rei da Bélgica, foi uma brilhante manifestação do seu valor e da sua importância. Teve a delegação portuguesa de se ocupar de diferentes assuntos. Estavam em discussão vários e importantes problemas e entre eles o da questão dos câmbios. Como sempre, a delegação francesa nomeou uma das pessoas mais competentes no assunto'para sustentar na conferência as ideas que sempre vem sustentando. Desta vez coube esse papel ao Sr. Jiile Decamps, representante dos Bancos, cuja-competência não pode ser discutida. Sustentando princípios da sua política monetária, aquele senhor apresentou uma moção qu© representava as ideas da delegação francesa, e as de algumas outras delegações, sobretudo da inglese,. Dizia essa moção: «1.° Que os Governos e os Parlamentos se abstenham de quaisquer novas emissões de papel moeda, quaisquer que sejam os motivos alegados; 2.° Que a realização e a manutenção do equilíbrio orçamental sejam obtidias a todo o custo, unicamente pelo emprego dos recursos normais dos países e'i por uma rigorosa compressão das despesas, procedendo-se por um esforço metódico e perseverante à consolidação e aniorti-zação das dívidas flutuantes ; 3.° Que os títulos representativos;' dos credites das reparações sejam negociáveis no maior número possível de mercados financeiros, concedendo-se as maiores facilidades à sua negociarão; 4.° Que se proceda à regulari/ação por comum acordo das dívidas inter-aliádas, fixando-se equitativamente as condições da sua redução e pagamento». Pareceu-me que os termos rígidos desta moção colidiriam com os nossos interesses, e que era necossário fazer mais alguma cousa para defender os países que, mercê das circunstâncias da guerra è das da paz, têm visto a sua moeda sucessivamente desvalorizada. Eu defendi então a doutrina de que não bastava a compressão de despesas e o aumento de impostos para certos países, visto que eles tinham chegado a uma situação de depreciação monetária que exigia porventura o auxílio do crédito para poderem chegar ao equilíbrio dos seus orçamentos. Defendi a tese que era necessário jalém disso fazer facilidades de crédito a esses países e consegui, muito apoiado pelos delegados dos outros países que estão em situação similar, que o Sr. Decamps a aceitasse e a subscrevesse, ajuntando à moção votada uma conclusão nova que é a seguinte: «Que se façam facilidades de crédito aos países de moeda fortemente desvalorizada, que se mostrem decididos a realizar os esforços necessários para a sua re-constitu:ção financeira, a fim de Ihesj permitir atingirem mais facilmente o indispensável equilíbrio dos seus orçamentos».
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tiessão de l de Agosto de 192Í
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Em outras questões teve de intervir a delegação portuguesa. Assim, numa questão de troca de acordos comerciais e internacionais estava inscrita uma disposição que propunha que se fizesse igualmente a troca livre da mão de obra entre os diferentes países.
O Sr. Ernesto % Navarro propôs uma emenda a essa conclusão prevenindo realmente a nossa.
Também quanto à emigração e à possibilidade que nós temos, eventualmente, de promulgar medidas restritivas que se julgassem convenientes, e ficar por conseguinte com a liberdade e o direito de o fazer, fomos bem sucedidos.
A delegação brasileira opôs-se quanto pôde a que essa emenda fosse aprovada e compreende-se. Interessava-lho que essa disposição ficasse livre, mas a conferência votou a emenda do Sr. Ernesto Navarro, e ainda dessa vez nós conseguimos o que desejávamos.
Interviemos também na discussão da tese referente a produtos alimentares, conciliando .os pontos de vista que estavam divergentes, e finalmente tive que defender um relatório que a conferência me havia encarregado de fazer.
Esse relatório era a tese referente às relações da conferência com a Sociedade das Nações.
V. Ex.as sabem a importância crescente que está tendo a Sociedade das Nações, que é constituída por representantes dos governos, por conseguinte os Poderes Executivos de todo o mundo.
A Conferência parlamentar pelo contrário é representante de parlamentos, na parte comercial bom entendido.
Há evidentemente toda a vantagem em que as duas instituições, uma proveniente dos governos, outra emanada dos parlamentos, se associem e tenham as melhores relações para que as questões a versar, e que interessam a todo o mundo sejam simultaneamente apoiadas pelos representantes do parlamento, e pelos representantes dos governos.
Além de que a Conferência Parlamentar de Comércio tem hoje um Instituto sob a sua dependência: é o Instituto Internacional de Comércio .que tem uma publicação, o seu Boletim, que é a mais interessante .publicação estatística de comércio que hoje se publica no mundo, ó
mesmo de todas as publicações de estatística comercial a única que publica uma estatística de matérias primas.
A Sociedade das Nações publica também um Boletim estatístico mas de importância muito inferior à do Boletim do Instituto Internacional de Comércio.
Haveria portanto uma decidida vantagem de aproveitar os serviços daquele Instituto.
Neste sentido formulei a minha tese que teve a hcmra de ser aprovada por unanimidade em sessão do Conselho Geral, e aprovada depois em sessão plena, sendo considerada como a tese mais importante deste ano em' relação ao futuro da Conferência, tendo-me o Presidente da Conferência conferido a honra de proceder às negociações necessárias para que o entendimento entre a Conferência e a Sociedade das Nações seja o mais estreito possível.
Aqui têm V. Ex.as em breves palavras qual foi este ano a missão da nossa delegação.
Devo dizer que esta foi tratada com significativas provas de deferência.
Assim, no banquete da Conferência que foi presidido, pelo Príncipe Herdeiro da Bélgica, em que estavam presentes o Governo, o corpo diplomático, altos funcionários da Bélgica, e que foi a festa principal do Conferência, foi o delegado português, o encarregado de responder ao discurso do Presidente do Conselho da Bélgica.
Refiro-me a esta circunstância, não porque isso represente uma deferência pessoal, mas porque é evidentemente uma deferência que recaiu sobre o nosso País,, e que eu desejo que fique consignada.
Sr. Presidente: apesar de se terem dado estes factos, apesar de nós termos realmente nessa Conferência uma situação interessante, .apesar de a Conferência Inter-parlamentar de Comércio estar ganhando sucessivamente em importância e em valor, não deixa de haver críticos que se lançam sobre ela.
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Diário daê Sessões ao Senado
A "delegação portuguesa, cujo reltr.ório tinha sido apreciado no Terftpit e cm revistas económicas pela maiá lisonjeira das íormas, foi vítima dos pretendidos gracejos de um português.
Não sei quem foi esse patriota, mas tenho pen.i de o ignorar porque queriu deixar registado o seu acto de se dizer cm Bruxelas, cnde não pôs o pé, para ser o único crítico mordaz da delegação d.) sou país, ali£s cpoiada e lisonjeada'por todos os outros países.
Além de que as críticas à Couíerfncia são ii.íerc-ssantes.
A Conferência emite os sais votos, chega a conclusões e acham os crí''ic3s que, um^ vez emitidos esses votos e chegados às conclusões, automàticarrenta ss converte t sem em leis dos diferentes países.
Não é esse o papel das Conferências, mas sim fazer propaganda dos p r i a d pio s que advogam para que. poucc a pó aço, sejam transformados om lei, o quo vem sucedido com a Conferência luterptirla-mentar dj Comércio. O primei'.'o trabaJio interessante e notabilíssimo que se pridn-ziu sobre & questão dos câmbios foi o do Sn Luãzatti.
Quando r. crise dos cambie? mal despontava, ele previu-a^em ,tod£, a s-ua extensão e apontou os remédics que hoje todos os pdses estão a adoptar. Se-ele tivesse s:do ouvido na oéasiíio em qno produziu o seu trabalho, a ri:iicr'parte dos desastres provenientes da maceira 'como tpir. si.lo tratada a questãc dos câmbios não sp> teria dado.
O que digo com respeito r.os c;1m :>ios digo-o com respeito à concorrência desleal comerciai.
Foi ao após a Conferência do Bordeis de protecção às'marcas regionais que a França pôa ein prática medidas que permitiram a protecção em Franca aos nossos vinhcs co Porto e da Madeira.
A Coifo/ônda Intorparlanunitar de Comércio tem em cada país o S-PÍI co.^ité par]arieir::ir cuo está em relaçc:-u co .; os outros.
Senipi\ '< ue uma questão 'rnporí.iníe se debate n :m país, oa parlamentara de outro pa's podem ir ao Par h:mente do primeiro faz^r valer as suas ideas.
f; Debátrndo-se uma questão comercial em Inglaterra, o facto de uma delegação
parlamentar portuguesa poder ir ao Parlamento Inglês defender as suas ideas não é co asa do importância'?
Se alguém disser que não, eu convencer-me hei de que essa Conferência não serve para nada.
Já se executou isso há pouco tempo, tendo eu ocasião, a pedido do Ministro dos Negócios Estrangeiros de então, de ir a Paris e no Parlamento Francês, perante o comité daquele país fazer- a defesa dos nossos interesses na questão do mo-duís vivendí tendo o prazer de ver apoiada a jiiãtiçr, das nossas reivindicações.
Esse comité representa quatrocentos o tantos parlamentares franceses e deu-me a honra de aplaudir o meu discurso, e sei que esse comité tem realmente feito ins-tâicias junto do Governo para que a questão das nossas relações comerciais com a Fr;.nça :;eo resolva equitativamente*
Isto ó indiferente para o Pais?
Creio bem que não-,
Era isto que eu queria dizer ao Senado para que se. não diga que os delegados portugueses cão se ocupam com calor das missões que lhes são confiadas.
— Muito bem. O orador não reviu.
O Sr. Oriol Pena:—Tinha pedido na última sessão a palavra justamente por ver então presente o meu colega Sr. Bulhão Paio, amável pessoa com quem, desde que temos assento nesta Câmara, tenho tido cordiais relações e pessoa simpá-tica a iodos nós.
Tenho muito prazer em o ver nas cadeiras do Poder pela honra que lhe é feita, decerto aceitou muito gostosamente e faço votos porque nela encontre situações agradáveis.
O Sr. Bulhão Pato, Ministro das Colónias, vai ter que defrontar-se com dois grnvíssi-aos problemas, nas duas Africas rrY-uta! o ocidental, íis nossas duas melhores colónias agora gravemente doentes e, firauccirament:J, enformas do doença iam grave que se podo comp. r£,r a ava-riose no corpo humano; avuriose colonial agmiissima sob o ponto de vista financeiro .
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defrontar com tam grave problema; certamente o não poderá fazer a sós,
.Desejaria muito sinceramente que S. Ex,a se possa rodear de colaboradores capazes constituindo aceríadamente o laboratório necessário para encontrar o tópico eficaz para essas gravíssimas doenças.
As duas colónias estão num estado patológico financeiramente muitíssimo grave ; e tam grave ele é que o menor erro na aplicação do tópico pode levar a consequências ainda mais graves e até irremediáveis. ,
Já, em tempos, aqui apareceu um projecto, para acudir com urgência à Oriental e o Senado, a meu ver muito b em, julgou ver no remédio proposto um revulsi-' vo forte de mais e, vendo risco de fazer perigar o doente tam activa substância, aconselhou moderação uas doses, modificou-as minorando-as, tornando-o mais emoliente e suave. O Congresso não o entendeu assim e optou pela força total desse remédio muito mais enérgico, em dose máxima, cujos efeitos podem passar adiante do. que seria justo, salutar e prudente, tratando-se dum remédio perigoso, quando aplicado, de repente, em alta dose! '
Faço votos para quo S. Ex.", de acordo com os seus colaboradores, encontre um bom caminho e o siga nas finanças coloniais. • ' • Que esses colaboradores trabalhem * zelosamente no laboratório a que me referi. Aí podem, com aplicação e boa vontade encetar a exploração imediata da sério de remédios muito interessantes e já muito numerosos; a dos arseuo-benzóis a que a humanidade já tanto deve.
Aí poderão os colaboradores deS.Ex.a encontrar uma fórmula feliz, possivelmente de resultados imediatos e práticos.
Isso pode levar à cura, ou a grande melhoria no estado patológico das nossas colónias; então seria ocasião de o felicitar por ter encetado esse caminho e conseguido esse brilhante resultado, ligando o seu nome a um produto da série a que bem caberá o nome de patosau. Assim S. Ex.a o possa conseguir com resultados e efeitos indiscutíveis.
Faço muito sinceros votos porque essa cadeira que decerto lhe foi muito agradável aceitar, e ocupar, lhe não cause desgostos, não lhe dê amarguras e não seja
o patíbulo onde pateiem as suas ilusões e a sua grande boa vontade.
O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato):—Sr. Presidente: começarei por agradecer ao ilustre Senador Sr. Oriol Pena as palavras benévolas que S. Ex»a se dignou dirigir-nre.
Não há dúvida alguma que sempre mantive com S. Ex.a e com todos os seus colegas as mais cordiais relações, não recebi senão palavras de afecto.
Mas permita-me S. Ex.a que lhe diga que não compartilho com a sua visão sobre as colónias.
Apoiados.
Moçambique e Angola, direi a S. Ex.a que não estão avariadas, estão prósperas, têm atravessado crises financeiras, como têrn atravessado muitos Estados poderosos, mas não é uma cousa que não se possa resolver.
Moçambique está contratando o seu empréstimo, e espero que, com esse empréstimo, e com as medidas que daí resultarem, há-de ter maior prosperidade.
Angola está um pouco pior que Moçambique, está também tratando do empréstimo em ouro que carece para o seu desenvolvimento.
E uma crise que considero passageira, tenho fé que para nós virão melhores dias pelo que respeita pelas nossas colónias principalmente por estas duas que estão desenvolvendo-se dia a dia.
Apoiados.
Isto é o que tenho observado pelos muitos anos que permaneci nas colónias e pelas estatísticas.
(j V. Ex.a dir-me há qual o país que não tenha crises financeiras?
V. Êx.a sabe que outros países têm atravessado crises financeiras, e mal seria das colónias, que dependesse de mim a resolução das crises.
O Ministro, é apenas o traço de união entre as colónias e ít" metrópole, não tem mais do que dar ordens sobre a orientação a seguir.
De resto o que diz respeito à vida económica e concelhia pertence ao seu conselho, pois como V. Ex.a sabe, as colónias têm os, Conselhos Legislativos, e a metrópole apenas dá a orientação a seguir.
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Diário das Sessões do Senado
O Sr. Ramos da Costa:—Sr. Presidente: as considerações que vou lazer, desejava que fossem ouvidas pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ou pelo Sr. Presidente do Ministério, mas como não estão presentes S. Ex.as, peço ao Sr. Ministro da Agricultura, a fineza de lhe transmitir as considerações que vou produzir.
Consta, pelos jornais que várias vezes, aviões tripulados 'por oficiais espanhóis, atravessam o nosso território e aterram em pontos do nosso país.
Por circunstâncias que não posso ou não desejo explicar, essa aterragem tem--se feito sempre em pontos estratégicos, o que faz supor que essas viagens não são inocentes e cue -têm um fim que escuso de mencionar.
Pedia a V. Kx.a Sr. Ministro da Agricultura, a fineza de transmitir ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ou ao Sr. Presidente do Ministério, estas considerações, que me parece serem de grande valor, porque acima de todas as considerações e acima de tudo isto, está a integridade da nossa Pátria, que deve ser independente, autónoma e livre e não permita que estrangeiros, sejam de que país for, venham ao nosso território, sem o nosso consentimento.
É da praxe e dos costumes diplomáticos, quando qualquer navio visita um porto estrangeiro, antecipadamente o comunique, é por assim dizer um pedido àe licença para essa visita.
Parece-me que nada está estabelecido com respeito a aviões, mas deve-se submeter às mesmas prescrições que há para os navios»
De há muito que os nossos vizinhos. com ' quem devemos ter amistosas relações, tein por várias vezes querido imiscuir-se na nessa administração, por meios indirectos, e com aparências benéficas.
E necessário que nos acautelemos de qualquer surpresa.
O nosso território está cercado por nina linha férrea espanhola, do Minho ao Guadiana, que se pode julgar ingenuamente que é para tráfego comercial simplesmente.
Devemos fazer tudo, para manter a nossa autonomia.
Ainda há pouco os jornais disseram que numa delimitação do concelho de Moúrão,
uma parte do torrão nacional,-bem nosso, tinha passado para Espanha.
j Eu protesto vivamente contra esta extorsão (Apoiados}, que foi admitida por oficiais portugueses!
A delimitação no Alentejo não está feita, porque os nossos vizinhos não têm querido que ela se faça.
Todas as entabulações diplomáticas para' se estabelecer a fronteira, como deve ser, tem ficado sem efeito, ou adiadas para o dia seguinte.
Na restituição de Olivença, isso então nem se fala.
Segundo os tratados, ela pertence-nos. Ali fala-se português, há misericórdia, instituição verdadeiramente nacional, existe o culto do Senhor dos Passos, as ruas assim set denominam e não calles, os palácios têm brazões de fidalgos portugueses, só o domínio é espanhol.
Já não peço para que os nossos compatriotas encarregados de proceder à delimitação resolvam este ponto relativo a Olivença, porque circtanstâncias variadas hão de impedir que tal se faça; mas o que eu peço a V. Ex.a é que transmita aos Srs. Ministro dos Negócios Estrangeiros e Presidente do Ministério o meu desejo de que se não permita que nem mais um torrão da Pátria Portuguesa seja entregue a estrangeiros.
íor isso estou' convencido de que o patriotismo de V. Ex.a, de todo o Ministério, da Câmara e do País levarão a defendê-lo à outrance porque não queremos — e não queremos!— a invasão do nosso território por estrangeiro algum.
Apoiados. •
O Sr. Ministro da Agricultura (Torres Garcia) : — Sr. Presidente: sendo hoje a primeira vez que tenho a honra de usar da palavra nesta casa do Parlamento, eu cumpro o gratíssimo devir de cumprimentar na pessoa ilustre de V. Ex.a esta casa do .Congresso. Estas minhas palavras englobam todos os lados da Câmara.
Ao ilustre Senador que acabou de falar eu direi que ouvi com toda a atenção as suas considerações. " • -
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Negócios Estrangeiros, que são os membros do Governo a quem mais de perto incumbe intervir nestes assuntos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ramos da Costa:—Agradeço a V. Ex.a as suas explicações.
O Sr. Presidente: — Deu a hora de entrar na ordem do dia, mas, como para a discussão dos respectivos projectos é necessário a presença dos tírs. Ministros, interrompo «o antes da ordem» até estar presente o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Serra e Moura: — Sr. Presidente: acabo de saber de fonte limpa, de alguém que me merece todo o respeito por ser creatura incapaz de faltar à verdade, que há cerca de dois meses se encontram expostos ao sol, ao tempo, por consequência a inutilizarem-se por completo, certamente, vinte aviões que vieram de Ingla-' terra e da Bélgica.
A ser verdade como creio que tal se' dê, isso mais uma vez vem provar o desleixo, a incúria que vai na administração do nosso país.
Peço, portanto, a V. Ex.a, visto não se encontrar pivsente o ilustre Ministro da Guerra, a fineza de transmitir a S. Ex.a o que acabo de aGrmar e pedir-lhe que providências spjam dadas tam rapidamente como o caso requere.
Aproveito, Sr. Presidente, estar no uso da palavra, para pedir também a V. Ex.a para fazer transmitir ao Sr. Ministro do' Comércio as considerações que vou fazer e que é o que se diz por aí, relativamente aos armazéns reguladores do Comissariado dos Abastecimentos.
Esses armazéns foram criados não só para evitar que o comércio ganancioso explorasse, como, aliás, tem explorado o público, mas ainda e talvez muito principalmente para que os seus pesos e medi-1 das fossem legais.
Mas o que é certo é que quando se trata de mandar alguém aos armazéns reguladores do Comissariado dos abastecimentos há sempre este aviso em nossa casa:
«Cuidado, porque apesar de lá se vender mais barato, rouba-se descaradamente no peso e nas medidas».
Isto é horrível. Isto é vergonhoso e intolerável.
O Sr. Dias de Andrade (em aparte]: — Esse assunto é com o Sr. Ministro da Agricultura que está presente.
O Orador: — Nesse caso, ainda bem que o Sr. Ministro da Agricultura se encontra presente. Espero que S. Ex.a tomará na devida conta este caso, que interessa a todos.
O aviso a que me reporto por mais de uma vez tem chegado a minha casa.
O Sr. Vicente Ramos (em aparte): — Esses avisos são feitos por quem lhe jião convém os armazéns reguladores.
O Orador : — Não são os comerciantes que previnem.
O Sr. Procópio de Freitas (interrompendo):— Não há dúvida que os armazéns 'reguladores não são escrupulosos no peso.
O Orador : — Conforme os factos por mim apresentados creio que a reclamação é justificada. Além de que, pelo que se ouve aí nas ruas, a respeito dos armazéns, chego à conclusão de que nos armazéns não se vendem os géneros com escrúpulo, visto tratar-se de estabelecimentos do Estado.
S. Ex.a certamente providenciará, estou convencido disso, e dessa forma le-vara um pouco de lenitivo aos lares de todos os habitantes de Lisboa e arredores onde existem esses armazéns reguladores, e assim S. Ex.a presta a todos nós um grande serviço.
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Agricultura (Torres Garcia): — Com respeito aos aviões que se encontram ao abandono, transmitirei ao §r. Ministro da Guerra as considerações que acaba de fazer o Sr. Senador.
No tocante à segunda parte tenho a dizer a S. Ex.a o seguinte:
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Quando cheguei ao Ministério da Agricultura encontrei uma avalanche de queixas e impropérios contra o Comissariado.,
É minha norma não me deixar demover pelo alarido produzido; tenho de estudar o assunto com um bocado de prudência para que os meas esforços possam ser benéficos.
Tomando em toda a consideração as afirmações-de S. Ex.a, vou imediatamente chamar a atenção do Sr. Comissário dos Abastecimentos para os factos apontados, dando as instruções mais severas para qne os armazéns sejam de facto aquele instrumento que devem ser, relativamente ao rigor do peso. Pode isso fazer-se sem intenção. Há muita gente a servir e os invólucros são pesados.
Transmitirei, porém, ao Sr. Comissário dos Abastecimentos o facto, para que se possa agir no sentido desejado.
O ilustre Senador pediu-me para que levasse um lenitivo aos lares necessitados por virtude da carestia da vida.
Devo dizer que farei tudo quanto em mim caiba, para que se dêem ao problema -as soluções que ele possa ter e que podem não ser de decretos ou portarias, mas de bom senso, de medidas tendentes a facilitar a circulação, o transporte de mercadorias com o menor ónus possível até o lugar do consumo e acudindo à produção; mas isto sempre na intençíio de não praticar actos que sejam contraproducentes.
Hei-de escjarecer-me com o próprio Sr. Comissário, porque às vezes pode dizer-se- as cousas com malévolas intenções.
Compreende bem o ilustre Senador qual é o melindre da situação.
Muitas conferências tenho já tido sobre diversos assuntos, mas não posso perder o contacto com os fenómenos, para que não resulte uma situação, quo seria caótica e donde adviria um prejuízo maior do que de possíveis erros. . Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Costa Júnior : — Sr. Presidente: pedi a palavra a fim de chamar a atenção do Sr. Ministro da Agricultura "para vários assuntos, mas primeiramente direi a S. Ex.a que só tenho que felicitar o Sr. Comissário dos Abastecimentos.
Fiz em tempos aqui uma reclamação e. tendo analisado todos os documentos, vi que estava tudo em ordem.
Tenho, pois, da acção do Sr. Comissário dos Abastecimentos a melhor das impressões.
Ora, é preciso saber-se que os indivíduos qne vendem uas feiras livres, como eu vi, vendem os géneros por preços mais elevados ainda do que os da Praça da Figueira.
Chamo a atenção de S. Ex.a para um íacto que se 'deu comigo.
Passando pela feira livre da Graça, preguntei o preço de vários géneros.
O feijão verde era vendido por l $20 e na Praça da Figueira estava sendo vendido por $80. isto é, havia uma diferença de $40 a mais do que na Praça da Figueira.
Preguntei o preço de vários outros géneros e havia uma diferença de {§20 e $30 a rã ais.
Estavam ria feira da Graça 17 carroças em que vinham indivíduos de fora, e em todas essas carroças se vendia mais caro que na Praça da Figueira.
Fui depois à feira do Kato, mas aí a diferença era mais insignificante.
Agora chamo também a atenção para outro assunto, sobre o qual tenciono fazer uma interpelação a S. Ex.a, quando vir que S. Ex.a tem conhecimento do mecanismo do seu Ministério, sobre o trigo e o p£,o, porque a panificação não está cumprindo com os diagramas estabelecidos pela lei.
No pão de segunda estão misturando substâncias panificáveis, é verdade, mas que lhe dá um mau gosto.
E o pão de primeira já não é fabricado com aquela percentagem de farinha de trigo que a lei determina.
A Panificação, de acordo com a Moagem, tem já moagens suas, quere dizer, está-se constituindo um monopólio entre eles, fornecendo o pão de segunda intragável, porque querem assim dar ensejo a um novo aumento de preço do pão. .
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Pois apesar desse preço excessivo que ó atribuído ao trigo, -provarei nessa interpelação, com números, que o pão se podia vender pelo mesmo preço que está e até talvez por um preço um pouco inferior.
A taxa que a Moagem tem dá um lucro, como tem tido ultimamente, que se for convertido em ouro, que será muito superior ao que recebeu antes de 1914.
Provarei a S. Ex.a na minha interpelação que o que digo é a verdade.
Anuncio essa interpelação com a devida antecedência, para S. Ex.a sé informar devidamente e estar por consequência perfeitamente habilitado a responder-me.
Tenho a certeza de que havemos de chegar a uma conclusão benéfica para o povo, mostrando-se assim que a Repúbli-ca não é apenas de meia dúzia de pessoas, mas que foi feita para todos.
Tenho dito.
O orador não reviu,
O Sr. Ministro da Agricultura (Torres Garcia): — S. Ex.a afirmou em primeiro lugar que.encontrou numa feira livre géneros vendidos por preço superior aos do ^mercado da-Praça da Figueira.
É possível.
Tomo na devida consideração o que S. Ex.a disse, mas por minha parte devo afirmar com toda a franqueza que não tenho grandes esperanças na resolução, do Comissariado dos Abastecimentos, de pôr em contacto os produtores de géneros com o público.
Isso deve ser funcção do pequeno comerciante, e a sua acção devia fixar-se em dois ou três géneros de consumo mais intenso, como peixe, azeite e pão.
Esses seriam os elementos reguladores do preço da venda de certos géneros.
Estou convencido que se, por exemplo, se inundasse Lisboa de peixe, a carne aoundaria e, por consequência tornar-se-ia mais barata.
No emtanto, comunicarei a quem de direito o meu ponto de vista que parece ser concorde com o de S. Ex.a
A respeito do preço do trigo disse S. Ex.a que ele teria sido mal fixado, por excesso.
Ora eu devo dizer que para o cálculo do preço do trigo, foi mandada consulta
a 53 sindicatos de produção mais intensa, como por exemplo, Ribatejo, Beja, alguns distritos de Castelo Branco, ete., sendo recebidas 21 respostas.
Ainda foram ouvidos o Sindicato Agrícola do Centro, o Conselho Superior de Agricultura, etc.
Posso'' garantir que os preços apontados pelos sindicatos eram em geral muito superiores a 1$80.
Alguns iam até 2$50.
Resolvi .o caso da seguinte maneira. Primeiro vi qual era a média arimética, e isso deu-me o valor correspondente a 1$80 e qualquer cousa. Depois abandonei esse critério por outro que me pareceu mais de aceitar: não actualizar o preço do trigo, e para isso fui à tabela de 99, o que dava porém um valor incomportável para o preço do pão e mesmo tirar aqueles defeitos que S. Ex.a apontou, pagar um produto sem que o produtor tivesse actualizado todas as suas despesas.
Fui buscar o número representativo da carestia da vida, que o Ministério do Trabalho me indicou como sendo nesta altura, de 25, devido à depreciação da moeda o preço dalguns géneros, multipliquei-o pelo valor inscrito na tabela de Elvino de Brito que protegeu quási durante meio século a lavoura nacional, e deu-me sensivelmente os 1$80, o que me levou a publicar o número 1$80 por quilograma.
Também tive em consideração o preço por que tinha ficado o último carregamento de trigo exótico desembarcado em Lis^ boa, que ficou exactamente por 1(£>80. ""
Entendi que para protegermos efectivamente a lavoura nacional nós devíamos pagar-o trigo nacional por preço superior ao trigo exótico.
O Sr. Costa Júnior: — Mas os Sindicatos não querem assim.
O Orador: — Mas com ornou raciocínio desejo pelo menos ser lógico.
De maneira que, fixando o preço de ls$80 no centro de produção evidentemente que o pago por preço superior àquele que teve o trigo exótico na sua origem, porque chega cá sempre sobrecarregado com vários ónus.
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Também sem inconfidência posso garantir a S. Ex.a que já hoje determinei qual fosse o diagrama a seguir, o preço do pão a seguir como determina a lei, sem alterar o preço do pão de segunda qualidade, sem alterar o preço do pão de primeira .qualidade, e fazendo apenas um pequeno aumento no pão de luxo, de uma quantia insignificante, que nào chega de maneira nenhuma a cobrir o déficit com que fica ês^e pão.
Fui às taxas da Moagem e determinei o preço do pão, mantendo o que é imensamente procurado pelo povo em 1&80, mantendo o preço do pão de segunda em 2$80, e o de luxo, que é de luxo, é que foi um pouco aumentado, contando com as taxas de moagem e panificação, porque a Moagem, ao contrário do que S. Ex.41 disse, nem por isso está a nadar em ouro.
Evidentemente que S. Ex.a pode dizer que isso é agora.
E de futuro?
. O futuro, tenho que confessar que é muito nebuloso.
As taxas ou cotações do trigo têm tendência para a alta p o lavrador, embora a fixação do preço do trigo fosse feita no sentido proteccionista, põe dificuldades na venda.
Nós podemos contar com os centros produtores e um será de fácil alcance, o da América do Norte, e com outros, embora mais distantes, como o da Argentina e õ da Eússia.
Teremos que nos sujeitar à especulação que lá se faz, porque a especulação é internacional.
Tenho-me assegurado de determinadas posições de onde me advirá a possibilidade de jugular dificuldades.
As resistências da Moagem e do lavrador submeto-as eu com uma fórmula que nunca se adoptou em -Portugal que é," quando não houver já trigo no País para farinar ao preço da tabela, ou a Moagem não queira fariná-lo, importar farinha estrangeira.
Apoiados.
Fá-lo hei, evidentemente, se a isso me obrigarem.
Ao lançar o despacho na portaria que mandou publicar a tabela do trigo, escrevi estas palavras.
Neste processo foram ouvidos todos os sindicatos agrícolas, nele falaram as mais
altas corporações representantes da agricultura e o trigo é, pela primeira vez, vendido em condições de autêntica protecção, ficande, portanto, o Governo com autêntica liberdade no assunto.
Estou atento à questão que me não é muito simpática, pois gostaria mais de dedicar-me ao estudo da maneira de levar o País a produzir aquilo de que necessita.
Não se têm podido fazer este estudo porque o Ministério da Agricultura tem estado a tratar da questão das subsistên-cias, que tem um carácter grave para que sou solicitado a dedicar toda a atenção.
O orador não reviu.
O Sr. Herculaáo Galhardo: — Eequeiro, em vista da presença do Sr. Ministro do Comércio, que entre em discussão o projecto de lei n.° 378, que está no fim da ordem do dia. *
O Sr. Presidente:—Não é preciso pôr à votação.
O Sr. Machado Serpa: —Apresento ao Sr. Ministro da Agricultura os. meus cumprimentos, e peco-lhe a fineza de comuni-' car ao seu colega dos Negócios Estrangeiros a seguinte reclamação:
Da Câmara dos Deputados transitou' para esta Câmara um projecto de lei referente a uma companhia alemã que pretendia amarrar numa das ilhas dos Açores um cabo submarino. Quando entrou aqui em discussão, o -leader nacionalista requereu para ser suspensa a discussão, com o fundamento de que sendo uma proposta ministerial não podia entrar em discussão sem estar presente o Governo, especialmente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Sôbrs o incidente falaram vários Srs. Senadores, e afinal resolveu-se cumprir o Kegimento com rigor, retirando da discussão o projecto, com o fundamento de que não podia ser discutido sem estar presente um membro do Governo.
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observações quanto'os organismos administrativos do meu distrito têm uma percentagem a arrecadar.
Mas, como vejo presente o Sr. Ministro do Comércio, lembro então que se consulte o Senado se permite que entre em discussão essa proposta.
O Sr. Herculano Galhardo : — Não estava presente quando, no outro dia, o Sr. Augusto de Vasconcelos chamou a atenção de V. Ex.a para a inconveniência em discutir o projecto sem estar presente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Machado Serpa acaba de apresentar um aspecto do projecto, qual é o da receita que ele pode resultar para o Estado.
Mas é de lembrar que foi convocada a Conferência de Londres, onde temos representação. Nela se discutirão graves problemas de reparações, em que Portugal está Intimamente envolvido. <_ com='com' que='que' como='como' tratar='tratar' uma='uma' em='em' companhia='companhia' pretende='pretende' p='p' assunto='assunto' lado='lado' por='por' se='se' estabelecer='estabelecer' compromisso='compromisso' um='um' outro='outro' alemã='alemã' dum='dum' pois='pois' _='_' agora='agora' vai='vai'>
Sob o ponto de vista internacional é de considerar.
Sr. Presidente: devo dizer a V. Ex.a e à Câmara que não tenho má vontade contra o projecto; pelo contrário, desejo aprová-lo; por minha parte faço essa declaração terminante.
Mas, Sr. Presidente, a Conferência que se está reunindo em Londres mistura intimamente contratos internacionais entre Governos com contratos entre particulares. Desde que se trata de mandar representantes das colónias oficiais, não pode ser indiferente a Portugal fazer um contrato com companhias alemãs, quando nós temos o nosso representante na; Conferência de JUondres.
O Sr. Carlos Costa: — Não esquecendo que nos Açores havia uma companhia alemã, isto era apenas uma renovação.
O Orador: — Repito, Sr. Presidente, não tenho má vontade contra o projecto; mas entre a discussão da Câmara dos Deputados e a discussão do Senado apareceu-nos a Conferência de Londres tendo Portugal sido convidado para assistir a
essa Conferência, não dizendo assim uma cousa com a outra.
O Sr. Machado Serpa (interrompendo): — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer ao ilustre Senador Sr. Herculano Galhardo que já o ano passado, com a aquiescência valiosa de S. Ex.a, foi aprovado um contrato similar entre o Governo Português e a América.
.0 Sr. Herculano Galhardo:—S. Ex.ag
desculpem, mas S. Ex.as estão falando comigo como se eu estivesse em oposição ao projecto.
Não se trata disso.
Se não houvesse nenhum facto de importância internacional, dava o meu apoio, mas como entre a aprovação deste projecto na Câmara dos Deputados e a discussão nesta Câmara aparece este facto da Conferência de Londres, entendo que o projecto não deve ser discutido de ânimo leve, sem a -presença do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
(jComo é que nós estando no meio de uma conferência, como ó a Conferência .de Londres, íamos fazer uma cousa destas? O orador não reviu. - O Sr. Afonso de Lemos: — Sr. Presidente : não sou contra o projecto, mas, como este- assunto tem levantado umas certas dúvidas, fui um dos -que conside-raratíi de natureza melindrosa este projecto. Portanto também concordo em que seja discutido quando esteja presente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e por isso associo-me às considerações feitas pelo Sr. Herculano Galhardo em que assuntos desta natureza devem ser tratados com cuidado, e só com a presença "do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
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O Sr. Procópio de Freitas : — Sr. Presidente : pela lei actual é permitido fabricar-se anualmente na Madeira, 500:000 litros de aguardente, e creio que não seria essa quantidade de aguardente que iria prejudicar a população, alcoolizando-a.
O pior. Sr. Presidente, é que não são só esses 500:000 litros de aguardente que se fabricam anualmente, mas sim, uma quantidade muito superior, que, segundo informações que eu tive, chegou a ser de um milhão e tal o ano passado.
Isto, Sr. Presidente, é que é uma cousa terrível e que é preciso evitar por todas as maneiras, porque causa sérios pre-prejnízos à população madeirense, alcoolizando-u.
A razão de as fábricas de aguardente produzirem quantias muito superiores àquela que podiam fazer em harmonia com o rateio, é a fiscalização não ser feita competentemènte.
Essa fiscalização é feita actualmente por uns indivíduos nomeados na ocasião, creio que pelo director da região agrícola, pessoas que não têm responsabilidade alguma porque não são funcionários públicos, e não estão portanto sujeitos a nenhum regulamento disciplinar.
Chamo a atenção do Sr. Ministro É absolutamente indispensável que se' faça a mais rigorosa fiscalização sobre a • 'produção de aguardente no Funchal de modo que ela não atinja quantidade superior ao que está determinado por Lei. A quantidade de aguardente que se produz a mais .do qne a lei permite prejudica também, segundo informações cne me foram dadas, a quantidade de álcool que ó necessário fazer»se anualmente para o tratamento dos vinhos, porque as fábricas de aguardente sabendo que podem fazer mais aguardente do que aquela que a lei permite, adquirem também maior quantidade de cana de açúcar do que a necessária para o fabrico da quantidade legal de aguardente. Isto sucede todos os anos. Estou convencido de que as canas qie há no Funchal chegam para s3 fabricar a aguardente que a lei permite e para fabricar também o álcool necessário para o tratamento dos vinhos e ainda açúcar, e de que, desde que a lei se compra, não há necessidade alguma de se importar todos os anos melaço para fabrico de álcool, o qual vai também concorrer para inundar o mercado de aguardente, porque parte dele é desdobrado e vendido como aguardente no mercado. Ora, Sr. Presidente, eu como madeirense não posso de maneira alguma calar--me perante Oste perigo iminente em que está a população da Madeira de alcoolizar-se, devido à enormíssima quantidade de aguardente que por lá se põe à venda. Eepito: a quantidade de aguardente permitida por lei não me parece excessiva para a Madeira. O que se fabrica porém a mais é que prejudica altamente a população dessa ilha. É portanto indispensável que se exerça uma fiscalização rigorosa, fiscalização que tem de ser feita por indivíduos que tenham responsabilidades. • Em outros tempos empregavam-se fiscais do selo, mas isso importava numa despesa avultada. Parece-me que a fiscalização se poderá fazer devidamente com soldados da guarda fiscal, mandando para a Madeira o número suficiente para esse serviço. Desejava também chamar a atenção do Sr. Micistro da Agricultura para um outro assunto. Constou-me que alguém, no Funchal, pretende que seja actualizado o imposto sobre o açúcar importado do estrangeiro. Ora eu protesto também 'contra este facto, a ser verdadeiro, porque, se tal se permitisse, isso representaria o aumento do preço da vida, favorecendo-se aqueles que tenham açúcar, na Madeira, proveniente das nossas colónias e que não tendo a concorrência do açúcar vindo do Brasil, viam-se sozinhos em campo, e portanto pediriam por esse açúcar o preço que muito bem quisessem, quando o açúcar proveniente das colheitas da cana da Madeira, tivesse acabado.
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permite, e para que as fábricas produzam o álcool necessário para o tratamento dos vinhos, sem necessidade da importação de melaço.
Espero também que S. Ex.a repudiará, qualquer pedido que lhe seja feito no sentido do aumento do imposto de importação de açúcar, do estrangeiro, no Funchal.
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Agricultura (Torres Garcia): — Sr. Presidente: tem toda a razão o Sr. Procópio de Freitas.
A situação da Madeira, no que respeita aos assuntos que S. Ex.a versou, é pavorosa.
A legislação actual permite que seja fabricada aguardente de cana até 500:000 litros.
°Pelas informações fidedignas que te-" nho, no último ano agrícola foram fabricados 1.500:000 litros, o que deu lugar, como S. Ex.a muito bem-disse, à falta de açúcar indígena, e à falta de álcool para tratamento de vinhos.
E tanto assim é, que um dos assuntos que primeiro tive de resolver, ao chegar ao meu Ministério, foi permitir a importação de melaço exótico, até realizar a quantidade de álcool necessário para esse tratamento, e que andava à roda de 600:000 quando se tinha fixado apenas a produção de 200:000, e ainda isso desdobrado em aguardente pela adição de água.
Aproveitei o ensejo de ter de despachar permitindo a entrada desses mela-ços, para não prejudicar o rendoso e florescente negócio dos vinhos 'da Madeira, pondo pouco mais ou menos com estas palavras:
«A diferença _ relativa ao álcool, pelas instâncias técnicas apontadas, deve basear-se no imoral e abusivo fabrico de aguardente, que representa um atentado contra a integridade física e psicológica dos habitantes da ilha.
Estando na intenção de tomar medidas anormais, determino que este meu despacho seja tomado no sentido de o mais rapidamente possível ser cumprida a lei».
o
Foi-me objectado que os factos se deviam à péssima fiscalização ou à sua falta.
Assim, estou na intenção de mandar cessar a fiscalização, e fazer regressar ao continente os fiscais, entregando o serviço aos agentes da guarda fiscal e da alfândega, poraue, a par de elementos de informação oficial, possuo outros que dizem que o que se fez se conseguiu à custa de artes menos honrosas para a administração pública, não podendo eu, pois, assim deixar de proceder.
O Sr. Ferreira de Simas (interrompendo):—Apontei aqui já as estatísticas rje-lativas ao efeito do álcool na Madeira.
.0 Orador: — Pode S. Ex.a juntar agora a essas, mais a da produção de 1:500:000 litros de aguardente, desdobrando:se ainda muitas dezenas de milhares de. litros de álcool.
Do modo que há necessidade de intervir com toda a energia. A repercussão económica deixando-se de fabricar açúcar e o/facto de se deixar de produzir o álcool que era necessário para uma indusr tria local, como é a do tratamento dos vinhos, são cousas para atender.
Deste modo, o ilustre Senador pode estar descansado de que eu vou intervir no assunto e vou proceder, como acabei de dizer, no que respeita à fiscalização.
Quanto ao segundo assunto a que o ilustre Senador se referiu, sobre o aumento de direitos do. açúcar importado da Ilha da Madeira, o que posso dizer é que tomarei aquela atitude que seja mais consentânea com o interesse geral.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Procópio de Freitas : — Sr. Presidente : rejubilo com a atitude do Sr. Ministro da Agricultura e folgo imenso por ver que S. Ex.a está de acordo com a minha orientação.
Na Madeira é preciso produzir mais açúcar e menos aguardente.
Tenho dito.
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O Sr. Augusto de Vasconcelos (sobre o. modo de votar): — Sr. Presidente: fiz há dias um requerimento para que esta proposta de lei não entrasse em discussão sem estar presente o Sr. Ministro dos Ne-gócios Estrangeiros, que nos informaria da conveniência ou inconveniência que há de neste momento se ir fazer uma concessão a uma companhia alemã.
Pela minha parte, julgo inoportuna esta concessão sem se terem liquidado os casos pendentes das reparações e outros.
Mas, conquanto mantenha esta opinião, respeito, é claro, qualquer outra em contrário.
Julgo em todo o caso essencial que o Governo se pronuncie sobre este assunto.
O orador não reviu.
O Sr. Machado de Serpa : — Sr» Presi-. dente;: eu devo uma explicação ao Sr. Augusto de Vasconcelos.
Não me esqueço, nem me poderia esquecer que S. Ex.a requereu no outro dia que esta proposta só fosse discutida quando estivesse presenteio Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, e não estando presente S. Ex.a, nem o Sr. Ministro, seria uma incorrecção da minha parte requerer que entrasse em discussão esta proposta.
Pedi ao Sr. Presidente dox Senado que diligenciasse a comparência do Sr. Ministro dos Estrangeiros nesta Câmara.
Mas como quer que estivesse presente o Sr. Ministro do Comércio, por cuja pasta especialmente corre o contrato feito entre a Administração dos Correios e Telégrafos e a companhia alemã, ocorreu-me pregnníar se, estando presente o Sr. Ministro do Comércio, poderia continuar a discussão.
Dada esta explicação a S. Ex.a, sinto bastante que S. Ex.a, com a autoridade que tem, com a função política que exerce nesta Câmara, não explicasse a razão por que julga inoportuna a discussão da proposta.
Limita-se a dizer: entendo que não é b momento asado para a proposta entrar em discussão.
E muito autorizada a sua opinião mas não o' explicam as razões por que julga, neste momento, inoportuna a discpssãe da proposta.
O Sr. Augusto de Vasconcelos (em aparte):—Não tenho dúvida nenhuma em .di-
zer as razões que .me levam a ter essa opinião.
Pois então está-se discutindo em Londres e numa comissão em Lisboa a questão das reparações, e quando sabemos que o Governo Alemão nos está negando cousas que nos deve, vamos fazer concessões a companhias alemãs!
Não faz sentido.
Esta concessão da amarração dum cabo é um alto favor; é um penhor que nós temos.
O Orador: — Continuando, escusado ó dizer que'não estou vencido e, salvo o devido respeito, muito menos convencido.
E, agora, Sr. Presidente, creio que não ó deslocada a pregimta: £0 que é que tem a comissão de reparações com a concessão dum cabo submarino?
Não tom na.da.
Tem tanto como teve o contrato feito pelo Governo com outra companhia para amarração de outro cabo.
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«rO que ó que tem o projecto com essa comissão?
Nós não estamos em pé de guerra com a Alemanha; nós estamos já em negociações com ela, e tanto que já temos um modus vivendi com essa Nação, ao passo que os outros aliados ainda o não fizeram.
O Sr. Augusto de Vasconcelos (interrompendo):— Estamos realmente em negociações com a Alemanha e, exactamente por isso, eu não faria concessões a esta Nação senão mediante o pagamento dessas concessões.
Muitos apoiados.
O Orador: — Quem ouvir as palavras autorizadas de S. Ex.a há-de supor que o Governo fez uma concessão gratuita à Alemanha,- mas não fez tal; dá à Alemanha mas recebe da Alemanha.
O Sr. Augusto de Vasconcelos (interrompendo) : — Mas, apesar disso tudo, ainda é um grande favor que lhe-prestamos.
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Isto foi considerado uma medida justa pela Câmara dos Deputados, e já nesse tempo havia uma Comissão de Separações.
Por este projecto se arrastar há muitos meses, não exagero dizendo que o Governo já perdeu muitos milhares de contos.
E pela atitude que vejo na Câmara estou crente de que, se o projecto não é morto de vez vai ficar j ara quando a Comissão de Separações acabar os seus estudos, e como ela não o faz dentro de quinze dias, fecha o Parlamento e ele não será discutido senão no princípio da outra sessão legislativa.
O Sr. Alfredo Portugal: —Faça S. Ex.a com que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros compareça na sessão para se discutir este assunto.
O Orador: — Eu fio-me jaa autoridade do Sr. Presidente do Senado e dos Srs. Ministros.
O Sr. Herculano Galhardo interveio oportunamente, como sempre, na discussão deste projecto, mas estou certo de que se S. Ex.a não tivesse usado da palavra talvez o projecto passasse hoje.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pires Monteiro):—Sr. Presidente: ouvi com a maior atenção as considerações apresentadas preliminarmente pelo Sr. Machado ^erpa acerca da questão que se debate.
Disse S. Ex.a que julgava altamente conveniente aos interesses do País pelo aumento de rendimentos que traduz a concessão, que ó objecto dessa proposta de lei.
Embora a proposta seja apenas assinada pelo Ministro do Comércio e Comunicações, eu, no emtanto, posso declarar a V. Ex.a e ao Senado que o Governo não julga o momento mais próprio, o momento oportuno, para discutir um projecto desta natureza, porque neste momento está se discutindo em Londres a questão das reparações.
E tendo nós direito a uma determinada percentagem nas reparações em espécie, ela ainda não nos foi assegurada plenamente. Temos muito e muito material que
devia já estar em nosso poder, mas que por uma questão que está em litígio entre Portugal e a Alemanha ainda nos não foi entregue.
Suponha S. Ex.a que a Conferência de Londres resolve tomar uma solução que prende todos os países aliados, e Portugal, que tem a honra de estar representado em duas comissões, é obrigado a tomar lugar nessa situação especial que não é a guerra armada mas aquela luta que os países vêm sustentando para obrigar a Alemanha a cumprir o Tratado de Versalhes.
Esta concessão, embora seja uma concessão, representa um favor aos súbditos de um país que está em condições especiais para nós.
O Sr. Machado Slerpa (interrompendo)'.— £ S. Ex.a dá-me licença?
Mas se isso é assim ^não podia o Governo ter olhado para essa questão não deixando a Administração dos Correios e Telégrafos firmar esse contrato?
O Orador: — Como S. Ex.a sabe, a situação internacional está-se modificando dia a dia, e haja em vista os incidentes que se têm dado entre a Inglaterra e a França, e nós temos que necessariamente acompanhar a Inglaterra como nossa aliada antiga que é, e a França como nossa amiga.
Neste momento não acho oportuno dar--se regalias ao Estado Alemão sem ele ter cumprido o tratado de Versalhes.
Cònseqúentemente, eu informo o Senado de que o Governo não julga oportuna a discussão deste projecto de lei.
O orador não reviu.
O Sr. Medeiros Franco: — Sr. Presidente: depois das palavras claras e patrióticas do Sr. Ministro do Comércio, pouco tenho que explicar, embora tivesse pedido a palavra para explicações, ou sobre o modo de votar.
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Diário ãa» Sesêôe* do Seíiado
E sina minha—porque sou açoreano— acompanhar com calor e entusiasmo tudo que representa qualquer cousa de conquista e de benefício para os Açores.
Posto isto, o Sr. Machado Serpa tinha posto a questão sob o ponto de vista nacional, sem. esquecer o ponto de vista particular, concreto e individual, visto que S. Ex.a é um extrénuo defensor do distrito que tam brilhantemente representa nesta Câmara.
Mas ea apoiei S. Ex.a, não só como açoreano,, mas também porque me não esquecia de que existe com a Alemanha um tratado de comércio provisório, é certo, mas um tratado de comércio' em que à Alemanha foi concedida a situação de nação mais favorecida, se bem me recordo, e isto depois do armistício, o que prova que as relações entr"e Portugal e a Alemanha são as que acabo de apontar.
Concordo com a opinião expendida pelo Sr. Ministro do 'Comércio. Só lamento que neste momento, e dada a gravidade da situação, se fizessem afirmações desta natureza. Melhor fora o Sr. Machado Serpa não ter abordado o assunto, ou o Sr. Herculano Galhardo não ter levantado a questão.
O assunto ó grave, ou direi, mais delicado do que gravQ, e essa delicadeza fizeram-na ressaltar os Srs. Herculano Galhardo e Augusto de Vasconcelos.
As declarações feitas por esses dois ilustres Senadores e pelo Sr. Ministro do Comércio eram suficientes para que nós não devêssemos discutir este projecto de lei. E porquê? Pelos termos em que a questão foi posta, pois que, qualquer que fosse a votação desta Câmara, ela poderia parecer um agravo feito àqueles que realmente pretendem conduzir a Alemanha às obrigações a que ela deve ser levada depois de tratado de Versalhes.
Desta discussão resta apenas uma consolação, pela qual eu tenho de dirigir ao Sr. Machado Serpa as minhas felicitações. E que S. Ex.a tem o seu projecto de lei aprovado, porque a forma como foi aplaudido o critério do Sr. Machado Serpa -dá-me a convicção de que o Senado aprovará o seu projecto por unanimidade.
O Sr. Presidente: — Lembro a S. Ex.a de que lhe foi concedida a palavra sobre o modo de votar.
O Orador:—Tem V. Ex.a razão. Vou terminar dizendo que neste momento, e dadas &s explicações tam claras e tam peremptórias do Sr. Ministro do Comércio, que foram precisamente ao encontro das palavras dos Srs. Herculano Galhardo e Augusto de Vasconcelos, e que reflectem nitidamente a opinião geral do Senado, nós nem precisamos de aguardar a vinda do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, visto que a opinião do Governo está dada pelo Sr. Ministro do Comércio.
Além de que, sirva isto de consolação a todos nós, é que se as cousas se complicassem de nada serviria o termos aprovado este projecto de lei.
O orador não reviu»
O Sr. Herculano Galhardo: — Sr. Presidente: prestando a minha inteira homenagem à forma brilhante, calorosa e dedicada como os Srs. Machado Serpa e Medeiros Franco defendem os interesses do nosso querido arquipélago dos Açores— porquê se ele ó de S. Ex.a% também é nosso..„
O Sr. Medeiros Franco: — Muito bem,
muito bem.
O Orador : — ... desejo levantar uma frase que proíeriu o Sr. Medeiros Franco. Disse S. Ex.a: «Melhor fora que o Sr. Machado Serpa não tivesse feito o seu requerimento, e que o Sr. Herculano Galhardo não tivesse posto a questão nos termos em que a colocou».
Tenho pelo Sr. Ministro do Comércio, por qualquer d«s Srs. Ministros, e por todo o Governo, a mais alta consideração, mas eu não precisava de que o Governo aqui viesse declarar que achava inconveniente que se fizesse a discussão deste projecto de lei, porque, antes do Governo, é o Parlamento que representa a nação (Apoiados), e os representantes da nação têm o dever de nunca esquecer os altos interesses da sua Pátria.
Muitos apoiados.
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Estamos ali representados pelo nosso embaixador em Londres, a convite da Inglaterra e da França, o que quere dizer que somos considerados aliados para todos os efeitos.
Portanto, antes das declarações por parte do Governo, eu, Senador, tinha o dever de pôr cobro a esta discussão.
Não posso, por este motivo, aceitar a crítica amarga que foi feita ao meu procedimento.
O orador não reviu,
O Sr. Augusto de Vasconcelos:—Sr. Presidente : como a referência a que acaba de aludir o- Sr. Herculano Galhardo também foi feita à minha pessoa, tenho de intervir igualmente no caso.
Não compreendo a complicação que há nesta questão. Ela ó muito simples.
A Alemauha pede-nos uma concessão, e nós dizemos-lhe que espere; 'vamos ver.
Uma voz : — Mas o projecto já foi votado na outra Câmara.
O Orador: — Precipitadamente, porque não .o devia ser, como precipitadamente já temos feito outras concessões à Alemanha.
Nós devíamos estar discutindo e negociando, e. em vez disso, temos feito favores.
Que os fizéssemos na devida altura estava bem, mas não por emquanto.
Devo dizer ao Sr. Machado Serpa, e tenho muito prazer em lho dizer, que no dia em que estiver regulada a questão das reparações em espécie, en nature, que está pendente e que já devia estar resolvida, porque isso é que não necessita do acordo-geral das nações, estou ao lado de S.. Ex.a para aprovar esta concessão.
O orador não reviu.
O Sr. Aragão e Brito: — Sr. Presidente : trata-se duma questão muito simples. Não vejo, a relação que tem a Conferência de Londres com a apreciação 'deste projecto de lei. •Se se resolvesse na Con-íerência de Londres qualquer represália por par|e doe aliados nós deixaríamos de acompanhar essa represália pelo facto de ter feito esta concessão. O -cabo subma-
rino seria mais um elemento de força na nossa mão.
Já que o Sr. Ministro do Comércio, e muito bem, apelou para o nosso patriotismo, quero dizer que nós, acima de aliados, somos portugueses e não deixamos de corresponder à lealdade devida para com os aliados aprovando o projecto de que se trata.
O orador não reviu.
.Posto à votação o requerimento foi rejeitado.
OEDEM DO DIA
O Sr. Presidente:—Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 378.
Lê-se*
Projecto de lei m.° 378 (Porto do Montijo)
Senhores Senadores.— Renovamos a iniciativa do projecto de lei n.° 533, de 1921, da autoria do Sr. Senador Alfredo Rodrigues Gaspar.
Sala das Sessões do Senado, 23 de Fevereiro de 1923.— Afonso de Lemos — Herculano Jarge Galhardo.
Projecto de lei n.° 583
Senhores Senadores.— O Diário do Governo n.° 123, l.a série, de 15 de Junho último, publica o decreto n.° 6:679, de 14 do mesmo mês, pelo qual é feita a concessão de um porto 'comercial na península de Montijo.
Atendendo a que esta concessão constitui matéria da alçada do Poder Legislativo, sendo portanto inconstitucional, visto que nenhuma lei permite ao Poder Executivo dar concessões desta natureza, tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° E declarado nulo e de nenhum efeito o decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920.
Art. 2.° O Governo mandará proceder desde já a estudos das condições da península do Montijo, sob o ponto de vista da sua utilização para o desenvolvimento do porto comercial de Lisboa e de possível estação marítima das linhas do Sul e Sueste.
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mentes para o aproveitamento daquele local em benefício do interesse económico nacional.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
5 de Agosto de 1920.— Alfredo Rodrigues Gaspar.
Pareceres das comissões de finanças e de fomento
Senhores Senadores.—As vossas comissões de finanças e de fomento, tendo examinado o projecto de lei n.° 533, da autoria do Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar, anulando o decreto n.° 6:079, de 14 de Junho de 1920, em que aprova o projecto dum porto comercial com todas as instalações e dependências necessárias na parte oeste da península de Montijo, pelo prazo de 70 anos, para dar um parecer consciencioso teve de considerar as bases da concessão abaixo transcritas:
l.a O decreto firmado pelo Sr. Presidente da República e por todos os Ministros foi dado depois de serem ouvidos o. Conselho da Administração do Porto de Lisboa e dos Caminhos de Ferro do Estado e a Direcção dos Serviços Hidráulicos, e conforme os pareceres da Procuradoria Geral da República, do Conselho do Estado Maior do Exército e do Conselho Superior de Obras Públicas.
2.a A construção das pontes e cais acostáveis, bem como as dragagens necessárias, os respectivos terraplenos, ruas, vias férreas, armazéns, telheiros, entrepostos, oficinas, central eléctrica, estação de caminho de ferro ligada com a rede do sul, assim como todas as outras obras necessárias para o funcionamento regular dum porto comercial; a instalação de todo o material necessário para o equipamento e bom funcionamento do mesmo porto; os serviços do abastecimento da água, sanitários, de incêndios, assim como a construção de um bairro operário; a conservação em perfeito estado de todas as obras, instalações-e material; todas as expropriações que forem necessárias, assim como indemnizações provenientes da execução dos trabalhos ou da exploração, serão feitas à custa da Sociedade e sem garantia ou subsídio da parte do Estado.
3.a Os edifícios necessários para as es-
tações aduaneiras e postos fiscais de vigilância, q'uartel para a guarda fiscal, estação telégrafo-postal e edifícios para a polícia marítima serão igualmente construídos pela Sociedade nas mesmas condições acima indicadas.
4.a As instalações especiais para as matérias explosivas e Inflamáveis devidamente isoladas - e satisfazendo aos requisitos necessários serão também feitas pela Sociedade igualmente nas condições das bases anteriores.
5.a A concessão é feita sem prejuízo de quaisquer obras que a Administração dos Caminhos de Ferro entenda- dever realizar para o objectivo do estabelecimento da sua gare terminus no Barreiro ou em Cacilhas. • •
6.a'No caso de ser declarado o estado de guerra, todo o material, instalações e serviços «do porto e dependências ficarão imediatamente à disposição da autoridade militar competente.
7.* Todos os projectos de linhas, férreas a construir, ou de alterações nas já construídas, serão submetidos ao exame do Conselho do Estado Maior do Exército para se harmonizarem as necessidades da defesa nacional com as funções económicas que as mesmas linhas são destinadas a exercer.
8.a Logo que tenha expirado o prazo da concessão acima estabelecido, a Sociedade entregará ao Governo, em bom estado de conservação, todas as obras e instalações do'porto que tiver executado com destino às operações de carga e descarga de mercadorias, cais, pontes, docas, material de carga e descarga com todos os seus acessórios estabelecidos na orla marítima do porto, gares de mercadorias, áreas reservadas aos depósitos ferroviários, central eléctrica, oficinas de reparação de material, todas as linhas de serviço servindo • a zona marítima do porto, instalações telegráficas e telefónicas, e, em resumo, todo o material de equipamento do mesmo porto que tiver adquirido, sem que, por isso, tenha direito a receber indemnização alguma.
Todos os provimentos ou materiais de consumo e combustíveis que então a Sociedade entregar ao Governo ser-lhe hão pagos precedendo prévia avaliação.
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projectos das obras e trabalho a executar serão feitos pela Sociedade e por ela apresentados à1 aprovação do Governo.
10.a Os projectos definitivos do primeiro 'grupo de obras necessárias para iniciar a exploração do porto serão apresentados dentro do prazo de 12 meses a contar da data da organização da Sociedade, sendo dado começo à execução de cada obra ou grupo de obras que tenha sido-objecto de uma aprovação dentro do prazo de seis meses após a data da dita aprovação, sendo considerados aprovados, bem como todos os outros projectos a fazer do futuro, quando resolução alguma tenha sido tomada até dois meses depois da apresentação dos mesmos projectos.
As obras a que se refere esta cláusula estarão todas concluídas dentro do prazo de seis anos a contar da data em que tiverem sido começadas.
ll.a Os projectos definitivos das diversas obras não compreendidas no grupo a que se refere a cláusula anterior serão apresentados à medida que se manifestar a sua necessidade, dando-se começo à sua execução dentro do prazo de três meses a contar da data da aprovação dos projectos respectivos, e devondo ficar concluídos dentro dos prazos que tiverem sido fixados ao serem aprovados os ditos projectos, os quais não excederão o termo dos dez anos a partir da data da presente concessão, prazo este fixado para a con-• clusão de todos os trabalnos e cuja eventual prorrogação, em virtude de casos de força maior, em cousa alguma poderá alterar a época fixada para o termo da concessão.
12.a Com a aprovação de cada projecto de detalhe será fixado o prazo para a conclusão da obra respectiva, ficando a Sociedade obrigada ao pagamento de uma multa diária equivalente a l.por 10:000 da importância do orçamento correspondente.
13.a Nenhum trabalho poderá ser iniciado pela Sociedade sem que, pelo Governo, e depois de ouvido o Conselho do Porto dê Lisboa, tenha sido aprovado o projecto respectivo ou que este deva ser considerado aprovado nos termos da cláusula 10.á
14.a Qualquer mudança que se julgue necessário ou conveniente introduzir nos
projectos aprovados será pela Socidade presente à saucção do Governo.
15.a A Sociedade ficará sujeita à fiscalização, por parte do Governo, dos trabalhos de construção e conservação das obras, incluindo as que tenham por objecto o regime e boa conservação do estuário' do rio nas proximidades do porto, devendo ela facultar à mesma fiscalização todos os elementos e proporcionar todas as facilidades para o desempenho da sua missão.
16.a Igualmente á Sociedade ficará sujeita à fiscalização do Governo em tudo que diga respeito à exploração do porto comercial dê Montijo.
17.aAs tarifas da exploração comercial serão fixadas de acordo com o Governo, que sobre elas ouvirá, anteriormente à sua aprovação, o Conselho de Administração do Porto de Lisboa, devendo, pelo que diz respeito às tarifas de carga e descarga, ter-se sempre em atenção as condições muito especiais de modicidade em que tem de fazer-se esse tráfego, e haver prévio acordo com as administrações das vias interessadas, quer terrestres, quer marítimas, tomando mais em consideração que as tariías nunca sejam superiores às estabelecidas para o porto de Lisboa.
18.a Quaisquer sub-concessões, arrendamentos ou outros contratos relativos à utilização de terrenos, construções ou material do porto para fins 'industriais ou outros ligados, com funcionamento do mesmo porto, que a Sociedade deseje fazer, serão previamente submetidos à aprovação do Governo, por intermédio da fiscalização, não podendo tornar-se definitivo sem tal aprovação.
19.a A Sociedade fará um depósito provisório na importância de 30.000$00 em dinheiro ou em títulos da dívida pública portuguesa, para garantir a execução das obrigações contraídas pela presente concessão, transformando-o em definitivo na importância de 300.000^00, constituído por igual forma, logo que comece a exe.-cução dos trabalhos, nos termos da cláusula 10.a
Este depósito poderá ser levantado logo que haja trabalnos executados de valor igual ao dobro do seu quantitativo.
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depósito definitivo, se não cumprir as obrigações desta concessão no todo ou em parte-, eu se se recusar a obedecer à decisão dos árbitros, terá o Governo o direito de declarar rescindida a concessão, a qual ficará de nenhum efeito, perdendo a Sociedade nessas circunstâncias, e conforme os casos, o depósito provisório ou definitivo.
Nestes casos, todas as obras, instalações e material a que se refere a cláusula 10.£, na ocasião existente, serão, depois de conpetentemeute avaliados,, postos em hasta pública, por espajo de seis meses, com as mesmas condições da concessão, e adjudicados a quem maior lanço oferecer, sendo o preço da arrematação entregue à Sociedade depois de deduzidas as despesas que o Governo tiver feito com a fiscalização ou outras.
Se, dentro dos seis meses, não houver arrematante, será a adjudicação feitíi ao Estado sem indemnização alguma.
21.a Se a Sociedade não conservar durante todo o prazo da concessão todas as obras e instalações do "porto e suas dependências, bem como todo o material, em perfeito estado de serviço, ou se for remissa em cumprir as indicações que, para esse fim, lhe forem ordenadas polo Governo poderá este mandar proceder às necessárias reparações de conta da mesma Sociedade.
22.a Ficam exceptuados das disposições das cláusulas 12.a e 20.a os casos de força maior devidamente comprovados.
23.a O Estado reserva-se o direito de resgatar a concessão quando, por motivo de conveniência pública, o julgar conveniente, mediante prévio aviso à Sociedade com antecedência de dois anos e^paga-mento da respectiva indemnização, e desde que tenham decorrido trinta e cinco anos a partir da data estabelecida para a conclusão de todos os trabalhos.
24.a O preço do resgate que abrangerá o especificado na cláusula 10-a em tanto quanto corresponder à época em que o resgate tiver lugar, será determinado tomando o produto líquido obtido pela Sociedade durante os" sete anos que tiverem precedido aquele em que o resgate deve efectuar-se, deduzindo desta soma o produto liquido que correspondr-r ao ano menos produtivo, somado com o m;:is produtivo e tirando a média de s restan-
tes cinco, constituindo esta média a importância da anuidaáe que o Estado pagará à Sociedade durante cada um dos anos que faltarem para terminar o pra/o da concessão.
No preço do resgate não é incluído o valor dos combustíveis e artigos de abasteci menio, que serão avaliados em separado e pagos pelo Governo, na ocasião de serem entregues, pelo preço da avaliação.
2õ.a Todas as divergências que se suscitarem entre o Governo e a Sociedade sobre a execução ou sobre a interpretação das cláusulas da presente concessão, ou sobre qualquer ponto omisso nas mesmas, serão decididas por árbitros, dois nomeados por cada parte. No caso de empate sobre o objecto em questão será nomeado um quinto árbitro a aprazimento de ambas as partes, sendo esta nomeação deferida ao Supremo Tribumil de Justiça quando as duas partes não cheguem a acordo sobre a escolha.
Do estudo de todas estas bases, assim como do ante-projecto do porto comercial do Montijo, e
Considerando que a construção deste porto dará um grande desenvolvimento à riquissima província do Alentejo, tanto na sua parte agrícola, como mineira;
Considerando que ainda este porto vai permitir a constituição duma indústria de trânsito entre o paiz vizinho e os portos da Europa'e vice-versa;
Considerando a enorme receita que advirá aos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, pelo trânsito das mercadorias que .afluirão ao-porto do Montijo;
Considerando o aumento dos direitos de transmissão de propriedade, não só na-área do porto do Montijo como nas-proximidades, devido à valorização desta;
Considerando que necessariamente um estabelecimento desta ordem dará origem à criação de novas industrias na localidade, devido à facilidade de comunicação;
Considerando que necessariamente se estabelecerão armazéns modernos, para a arrecadação de mercadorias, tanto do continente como das colónias e mesmo do estrangeiro, o que certamente aumentará a mntéria colectável;
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pessoal do porto e suas famílias, traz t m-bem um aumento de contribuição predial;
Considerando que o material de construção e utilagem do porto, assim como o material fixo e circulante do caminho de ferro, que a sociedade terá de importar, dará para o Estado uma grande contribuição aduaneira;
Considerando mais que a contribuição industrial e outras que a companhia construtora e exploradora do porto do Mon-tijo terão de pagar ao Estado, são também muito importantes;
Considerando ainda' que a concessão feita consiste essencialmente na autorização para construir o porto comercial do Montijo e para o explorar durante 75 anos, para o que a empresa possue elementos de tráfego indispensáveis, ficando no domínio público e revertendo para a posse do Estado no fim da.concessão;
Considerando que os terrenos expropriados "na zona marginal se acham sem utilização, e que se concede apenas licença para os utilizar temporariamente, continuando porém propriedade do Estado;
Considerando mais que os terrenos a adquirir para as -instalações pertencem a particulares, e os que são do domínio pú-b iço estão nas condições das licenças que costumam ser dadas para construções de cais, pontes, armazéns, etc.;
Considerando que só por medidas de fomento é que o País pode progredir e regenerar- se;
Considerando que nesta concessão foram acautelados todos os interesses do Estado, tornando-a por assim dizer uma continuação do porto de Lisboa;
Considerando que o Governo, que aprovou a concessão na melhor das intenções, ouviu não só o Conselho Superior de Obras Públicas, a que se julgou obrigado pela lei de 26 de Julho de 1912, mas também todas as outras instâncias oficiais já citadas, as quais deram o seu parecer favorável, o que prova o seu zelo e patriotismo;
Considerando porém, que a Constituição Política da Eepública, nos n.os 22.° e 23.° do seu artigo 26.°, declara que só ao Parlamento compete fazer tais concessões: as vossas, comissões de finanças e de fomento, são de opinião que o Congres-
so deve aprovar um bill de indemnidade ao Governo que subscreveu esta concessão, validando por esta forma o decreto n.°. 6:679, de 14 de Junho de 1920, rejeitando, portanto, o projecto de lei n.° 033, da autoria do Sr. Rodrigues Gaspar.— Cristóvão Moniz — Celestino de Almeida (com declarações)—JwZto Ribeiro — João Joaquim fernandes de Almeida — Vasco Marques—José Frederico Velez Caroço — Constando de Oliveira — José de Sousa e Faro—Amaro de 'Azevedo Gomes — Luís Vasconcelos e Sá (com declarações) — João Joaquim André de Freitas—António de Oliveira e Castro ^(com declarações)— Rodrigo Guerra Alvares Cabral, relator.
Porecer da comissão de marinha e pescas
Senhores Senadores'. — A vossa comissão de marinha e pescas, analisando o projecto de lei n.° 033, da iniciativa do Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar, e simultaneamente o decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920, que concedeu a um grupo de indivíduos portugueses a construção e exploração de um porto comercial no Montijo, sob 25 cláusulas e condições expressas no mesmo diploma, considera que a construção do referido porto comercial no indicado local da margem sul do vastíssimo estuário do Tejo e pela forma por que pretendem os concessionários, em nada poderá afectar o regime das águas do porto de Lisboa, nem prejudicar a sua utilização como cousa pública, quer para a navegação usual dos esteiros (calas), ^quer para quaisquer outros fins de exploração das águas permitidas pelas leis em vigor.
A referida construção é da categoria daquelas que se qualificam como sendo uma grande obra de utilidade pública, que, produzindo a intensificação • do comércio de trânsito do liinterland tanto nacional como estrangeiro, vem valorizar consideràvelmente o nosso grande p'ôrto de Lisboa, e grangear a importância enorme que lhe-está assinalada pelas circunstâncias favoráveis da grandeza do seu ancoradouro e do seu estuário, conjugados estes factores com a situação geográfica e com as facilidades de acesso à navegação mundial que naturalmente proporciona.
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atribuições da parte do Governo na promulgação do decreto que se está analisando, visto que todas as estações e organismos qae pelos serviços públicos que lhes estão confiados e pela sua especial competência .deviam ser ouvidos deram sobre o objecto da concessão respectivamente um parecer favorável de ordem técnica, económica, jurídica e militar; e o propósito qae houve da parte do Governo em proceder dentro das normas logais evidencia-se nas cláusulas do decreto da concessão, onde se impõe uma rigorosa fiscalização e intervenção, que atinge mínimos actos que a sociedade que se formar tiver de praticar, não só para a construção como para a exploração do porto futuro.
Portanto, perante as enormes vantagens que o país pode vir a colher de unia iniciativa de tamanha grandeza e importância, e para cujaWecução o Estado nada despende e o Tesouro Público vai auferir bastas receitas que lhe virão da exploração do futuro porto comercial, entende a vossa comissão de marinha que, mesmo que se tivesse dado oficialmente qualquer ^ deficiência, não se deverá pôr peias" à realização de uma obra de tani grande vulto, e que se essa deficiência puder ser atribuída ainda mesmo a falta de prévia sanção parlamentar, segundo a doutrina dos n.os 22.° e 23.° do artigo 26.° da Constituição Política da República, deve o Parlamento resolver essa falta dando ao decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920, agora a sua aprovação, concorrendo por essa forma a dar ao porto de Lisboa a utilização geral que lhe está marcada pelas condições que -a natureza lhe proporcionou.
•Em conformidade com as considerações expostas, a comissão de marinha e pescas não dá a sua aprovação ao projecto de lei n.° 533.
Sala das Sessões do Senado.— Amaro de Azevedo Gomes — Henrique Maria Travassos Valdès—José de Sousa e Faro, re-
Parecer da comissão de obras públicas
Senhores Senadores. - A vossa comissão de obras públicas, à qual foi afecto o projecto de lei n.° 533, da iniciativa do Sr. Alfredo Rodrigues Gaspar, anulando o decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de
1920, que aprovou um projecto de um porto comercial na península do Montijo e autoriza a sua construção e exploração pelo prazo de 75 anos, vem apresentar-vos o resultado dos seus trabalhos.
A construção de um vasto porto comercial na margem esquerda do Tejo, provido de amplos cais acostáveis e de armazéns, e apetrechado com os mais modernos aparelhos de carga e descarga, é considerada pela vossa comissão, como certamente será por todos vós, como uma obra de um enorme alcance económico e de um interesse verdadeiramente nacional. '
Dois são os objectivos que pelo projecto são assinalados a este porto.
Em primeiro lugar destina-se ele a servir e a valorizar a nossa grande província do Alentejo, tam cheia de possibilidades .agrícolas e mineiras, quanto vazia de meios de comunicação e de outras facilidades qae permitam explorá-las. " Em segundo lugar, pretende-se atrair a Lisboa uma parte importante do tráfego de além fronteiras, e nomeadamente da Estremadura espanhola, fazendo simultaneamente do porto do Montijo uma estação marítima de trânsito internacional.
Dos dois objectivos é ao primeiro que a vossa comissão liga a maior importância, porque o sonho de uma Lisboa convertida em cais da Europa não é, em nosso entender, no porto do Montijo que encontrará orna realidade palpável.
Pode ele contribuir para dar corpo a essa idea, permitindo o descongestionamento do actual porto, que não pode já hoje com o tráfego interno que a ele aflui, e que não verá sensivelmente modificadas as difíceis condições em que se encontra com o pequeno acrescentamento que se pensa em dar-lhe, levando-o até para lá do Poço do Bispo.
Mas daí a servir de grande entreposto para as mercadorias que em trânsito tenham de passar por Lisboa, vai uma grande distância.
Ao Alentejo é que verdadeiramente o porto do Montijo interessa.
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pela possibilidade de serem industrializadas dentro do país; incremento da sua agricultura pela maior facilidade de dar saída ao excesso de cereais que produza; maior desenvolvimento do seu comércio pela valorização das suas riquezas e pêlo grande incremento que a sua população rural e citadina liá-de ter; emfim, é a esse grande Alentejo, onde o país deposita uma grande parte das suas esperanças de ressurgimento económico, que o porto do Montijo aproveitará, ficando o seu porto, o que lhe permitirá desenvolver-se e prosperar como todos nós desejamos.
Do processo vê-se que o projecto do porto mereceu uma cuidada atenção das diversas repartições e conselhos que sobre-7 ele tiveram de pronunciar-se, antes de subir à consideração do Sr. Ministro.
Apraz à vossa comissão consignar que esta concessão, que tam grandemente pode influir na economia do país, se não íez sem um consciencioso estudo, levado a efeito pelos diferentes órgãos da pública administração que directa ou indirectamente tinham capacidade oficial para o apreciar, e sobre ela emitirem parecer.
Assim é que foram ouvidos:
O Conselho de Administração do Porto de Lisboa.
O Conselho de Administração dos Caminhos de Ferro do Estado.
O Departamento Marítimo e a Capitania do Porto.
A Administração Geral das Alfândegas e o Comando da Guarda Fiscal.
A Direcção dos Serviços Hidráulicos.
O Conselho do Estado Maior do Exército.
O Conselho Superior de Obras Públicas.
E ainda para o projecto ser apreciado debaixo do ponto de vista legal, transitou também pela Procuradoria Geral da República, que nenhuma objecção fez ao deferimento do pedido.
Foi só depois disto que o Ministro, ou, para melhor dizermos, o Conselho de Ministros, porque todo o Governo assinou o decreto, outorgou a concessão, baseado nos poderes que lhe conforia a lei de 26 de -Julho de 1912.
Nesse decreto, todas as recomendações constantes dos vários pareceres foram cuidadosamente incluídas.
Assim, consignou-se expressamente que a empresa fosse genuinamente portuguesa e que todos os projectos de obras e tari-"fas de exploração fossem sujeitos à apreciação do Porto de Lisboa, como o Conselho de Administração recomendara (cláusulas 13.a e 17.a); determinou-se que em tempo de guerra todo o material, insta-ções e serviços ficariam à disposição das autoridades militares, como o estado maior recomendara (cláusula 6.a).
Do pedido feito pelos concessionários foram excluídas" as áreas destinadas à vila comercial, em harmonia com o parecer da Procuradoria Geral da República.
E não obstante os concessionários não pretenderem um exclusivo, no decreto vem expressamente consignada a liberdade de a Administração dos Caminhos de Ferro do Estado fazer as obras que entender na margem esquerda para o estabelecimento da sua gare terminus (cláusula õ.aj.
A opinião pública, que teve já ocasião de manifestar-se pelos órgãos da imprensa e pelas colectividades representativas das forças vivas da nação, é também claramente favorável ao projecto de concessão.
Todos consideram a obra de interesse verdadeiramente nacional.
Nestas condições, não deve restar dúvida de que a obra deve ser considerada de verdadeira utilidade pública, porquanto a todos se afigura de um indiscutível alcance económico.
Mas vejamos se esse grande empreendimento pode, e se deve ser levado a efeito pelo Estado.
As obras do porto do Montijo são necessariamente muito dispendiosas.
O simples confronto do enunciado dos trabalhos a realizar pelos concessionários, conforme o estabelecido na cláusula 2.a do decreto da concessão, com as obras complementares do porto de Lisboa, aprovadas pelo decreto n.° 5:383, de 5 de Abril de 1919, e as do porto de Leixões, mostram quanto devem ser grandes as somas a despender para que no Montijo se faça um porto comercial moderno.
Para Lisboa, votaram-se 25:500 contos ; para Leixões 30:000.
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tantas obras urgentes de fomento tem. a realizar, dotar o porto do Montijo com as verbas -que ele reclama para desempenhar as múltiplas funções que os seus concessionários lhe atribuem?
A vossa comissão julga que não. iam grandes são as exigências que pesam sobre o Estado; tantas são as obras e os melhoramentos a fazer, e para os quais o Estado não encontra, como no Moctijo encontra, quem a ele se substitua.
Mas ainda que o Estado pudesse dispor de milhares .de contos para bem dotar esta obra, convir-lhe-ia despendê-los ?
Também entendemos que não.
Com este modo de ver concorda o relatório do Conselho de Administração do Porto de Lisboa, quando depois de vár.ias considerações pregunta:
«,;Será esta porém uma solução prática? Poderá p Estado empreender tais obras, que darão lugar a muito avultadas despesas, contemporaneamente com as já muito avul-
1 ""*
tadas que vai realizar na margem norte, e que são indispensáveis para o desenvolvimento e para bom nome do porto de Lisboa ? (iSerá razoável que o Estado não podendo fazer as referidas obras ou, pelo menos, não podendo fazó-las com a necessária brevidade, impeça que por outra forma elas sejam levadas à pratica, e que, portanto, o País'colha os benéficos frutos que delas poderão resultar?»
A idea dos concessionários é nova. Precisamos de atentar bem nisto.
Nem os planos dê ampliação d?, estação do Barreiro, nem os novos projectos da estação de Cacilhas envolvem quaisquer melhoramentos que de perto ou de longe se assemelhem com aqueles que os concessionários vão levar a efeito no Montijo.
È se os funcionários competentes que têm estado à testa da administração dos Caminhos de Ferro e que têm planeado os melhoramentos das gares terminus, não têm incluído neles essas grandes obras, é porque as não julgam necessárias para o intercâmbio marítimo da região trãnstagana.
Num possível porto na península do Moutijo. nunca ninguém mesmo íalara. Esta é que é a verdade. È assim, se o Estado se metesse á fazer obras, apenas
com o intuito de não deixar que uma empresa particular que ás delineou as fizesse, embarcaria numa aventura perigosa!
Podia correr o risdo de perder milhares de contos que nada garante que hão fiquem improdutivos. Podíamos citar, a propósito, o que nos aconteceu com o caminho de ferro da Swazilandia.
Evidentemente os concessionários contam poder criai1 fontes dê riqueza e estimular energias adormecidas para darem vida e actividade ao novo porto onde eles vão enterrar o capital particular. Mas eles tem de fazer tudo; têm de construir o pôrlo e têm de criar-lhe o tráfego.
Vejamos o que a este respeito diz no seu parecer o Conselho de Administração do Porto dê Lisboa: «^Além disso, não disporão os requerentes de meios, de relações, de ligações, de que o Estado não disporá, e que íhe permitam fazer com' que as instalações a executar sê desenvolvam em larga escala, como esperam, intensificando sobretudo o tráfego de trânsito?» O porto cria-ó o Estado por um simples decreto; mas o tráfego dê «trânsito» não se intensifica só à custa deles. A quantidade anual de mercadorias que ectra pelo porto de Lisboa em trânsito para Espanha não vai além dê 2:395 toneladas, segundo informa o conselho dê administração. E mesquinho, como muito bem diz o mesmo concelho. Aumentará? O Estado poucas esperanças poderia alimentar em fazê-lo por uma acção directa, porquanto em Espanha se pensa precisamente em desviar dos nossos portos todo o tráfego'dela, até mesmo aquele que indiscutivelmente cai na esfera dá acção geográfica deles.
A rede ferroviária, daquele país, com linhas correndo ao longo da nossa fronteira terrestre, bem corrobora este intuito; aliás preconizada já em Í8&5 pela grande comissão que no paífc vizinho elaborou o plano geral das linhas à tíons-truir.
,;Mas haverá inconveniente enl deixar fazer aos concessionários um porto quê eles, afinal, inventaram? A vdssa comissão julga que não.
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Séèêâô dê l dê Agosto de 1924
E neste momento mesmo, nos chega a notícia de que e grande nação brasileira entendeu dever adoptar um procedimento igual.
Um telegrama de 19 de Novembro, do Rio do Janeiro, largamente publicado na imprensa, dá-nos a notícia de que um grande sindicato anglo-ainericano, presidido por Parsivél Farúchar, adquiriu a concessão por 99 anos (repare-se bem neste prazo para o coínparar com o de 75 anos do decreto) de parte dos cais do porto de Santa Cruz.
E emquanto nós nos amedrontamos com a possibilidade de o novo porto vir a ser influenciado j)or capitais estrangeiros, impondo-se na cláusula , l.a do decreto da concessão a obrigação expressa de a empresa que se criar ser genuinamente portuguesa, o Brasil hão duvida . entregar um dos seus grandes portos a um sindicato anglo-americano! Os cais do porto de Santos, entregues inicialmente à exploração de M. M. Q-Uinle Gaffreé & C6 por um período dê 39 anos, estão ainda rias suas mãos por ter sido prorrogado por-90 anos o contrato. E quantos outros exemplos se não poderiam citar.
Por todas estas razões cremos bem que hão deve o Estado abalânçaf-se ao° empreendimento, porquanto o bom êxito dele só pode resultar de um conjunto de factores perfeitamente alheios e independentes da sua acção. Se o Estado viesse a realizar no Montijo obra de vulto, ÍQ-ria como certos os encargos dos capitais despendidos, mas outro tanto se não podia dizer dos rendimentos qúé dele lhe poderiam advir. Nas condições actuais, mesmo que os resultados da exploração do porto de Montijo se não mostrassem aleatórios, a interferência do Estado não seria de re-coniendar. Veja-se o que se está passando com a exploração do porto de Lisboa, onde às taxas são qúási proibitivas, é onde um numeroso pessoal absorve já o melhor de 3:000 contos.
Aparecendo, como aparece, quem se proponha fazer as obras, «sem ónus algum para o Estado», sem hesitação se lhe deve conceder autorização para as fazer, dentro das normas e sujeito às prescrições que as repartições técnicas competentes julguem indispensáveis, como aliás está preceituado no decreto dá concessão.
(jEnganar-se.hao os concessionários nos cálculos qiie fazem para a valorização do seu projecto? A economia nacional com isso nada sofrerá.
Mas há mais. No caso presente os concessionários não só nada obtêm do Estado como expressamente consigna a cláusula 2.a do decreto, como oferecem desde logo alguma cousa, como se vê ha cláusula 3.a
Além disso, no fim de 75 ahos de exploração, entregam eles ao Estado o pôr-to com todas as obras quê íiele se fà-ç>m, com todo ó seu apetrechamento, material de carga e descarga e seus acessórios, todo o material de .equipamento do porto, devendo tudo ser entregue em bom estado de conservação (cláusula 8.*).
<_0 com='com' que='que' qiie='qiie' de='de' estado='estado' dispendioso='dispendioso' feito='feito' melhores='melhores' comercial='comercial' porto='porto' moderno='moderno' troca='troca' um='um' complicado='complicado' apetrechamento='apetrechamento' nas='nas' afinal='afinal' e='e' em='em' o='o' p='p' todo='todo' será='será' condições='condições' dá='dá'>
O direito de expropriação das áreas julgadas necessárias ao ínesnio porto;
à licença de ocupação dos terrenos marginais.
A licença de otíupação de terrenos marginais é .dada a todos os que a requerem justificadamente. A margem direita do Tejo, pelas alturas do Poço do Bispo, está cheia de pontes particulares. Ê pelo que diz respeito ao direito de expropriação, que é afinal a .conòessão de maior valia que o Grovêrno deu, ao abrigo dá lei de 1912, não consta à yoesa comissão que os interessados se tenham manifestado contra ela. Eles e só eles teriam o direito de se queixar. O Governo de facto" nada deu.
E que também esses interessados devem estar convencidos de que a concessão de Montijo é de interesse nacional e que com a sua efectivação nenhuns interesses legítimos serão afectados, nem quaisquer direitos são ofendidos. Todos estão de acordo com a grande obra porque todos eles a encaram com o mesmo interesse patriótico.
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Diário 'da» Sessões 'ao Senado
Dissemos, e é verdade, que o porto de Lisboa se encontra congestionado de mercadorias, apesar do seu ainda deminuto movimento comercial.
Sendo Lisboa porto de armamento p ara várias empresas de navegação, precisa de ser largamente abastecido de carvão para os navios dessas empresas tomarem. A carga e descarga de carvão pelos processos primitivos que ainda hoje se usam nele, para vergonha nossa, e que se não vêem já, por exemplo, no nosso porto de Lourenço Marques, nem mesmo em Ponta Delgada, deverá custar qualquer cousa como 5$, importância pouco inferior ao valor do próprio carvão antes da guerra.
Ora esse carvão, que representa ama parte importante do tráfego do porto, pode muito bem passar para o Montijo. A economia de tempo e de dinheiro que com a instalação de modernas aparelhos se conseguirá há-de influir benèfhamente no barateamento dos transportes, quer terrestres, quer marítimos.
A carga e descarga de uma tonelada, empregando processos mecânicos, não deverá custar 1$. O mesmo se pode dizer em relação aos minérios, alguns dos quais não chegam a ter o valor do carvão. A falta de instalação de embarque directo de minérios é que tem feito com que bastantes nossos jazigos se não tenham explorado.
As indústrias metalúrgicas, pela grande falta de carvão,v não se mostram ainda de grande possibilidade no nosso país.
Apesar de sermos um país produtor de cobre, não temos a indústria correlativa por não estarmos preparados para tratar o minério.
Outro tanto acontece com o ferro. A indústria siderúrgica apresenta-se ainda como unia aspiração.
Haja, porém, carvão em abundância e em condições económicas, e essas possibilidades virão.
Se a empresa de Montijo, numa coordenação inteligente de esforços, puder contribuir para a valorização das riqae-zas mineiras que possuímos, e se conseguir trazer ao projectado porto uma grande tonelagem exportável, então as condições modificar-se hão por completo. Os navios que venham em busca dessa tonelagem trarão, sern dúvida, a preços muito
baixos, o carvão e até os adubos que hoje se não conseguem. .
Presentemente a tonelagem de importação excede a de exportação em mais de 500:000 toneladas.
Já em 1914 tal tonelagem, que andara à roda de l milhão de toneladas, excedia em meio milhão as exportações, e em 1919 rcgistaram-se 816:405 toneladas de importação contra 437:660 de exportação, segundo os dados estatísticos que pudemos apurar.
E este desequilíbrio há-de acentuar-se muito mais com o desenvolvimento industrial que se vai acentuando.
Ora se a empresa do Montijo consegue aumentar rapidamente a nossa exportação, elevando-a, ainda que mais não seja, ao nível da importação, acabando com o pesado déficit que o porto de Lisboa actualmente tem, tal facto repercutir-se há imediatamente numa baixa sensível de íretes para aqui.
E se as exportações preponderarem sobre as importações, começaremos a ter o carvão mais barato. E este facto é capital para o estabelecimento das novas indústrias metalúrgicas, e até para o incremento da nossa viação acelerada.
Carvão barato ó a condição primordial de qualquer indústria.
O preço dos adubos também baixará, por isso que os barcos que venham à procura de tonelagem hão-de trazer carga, para o porto por qualquer preço.
Em suma, debaixo deste ponto de vista, as vantagens do estabelecimento da empresa para a economia do país serão da maior importância, e elas por si só justificariam amplamente a acção do Governo fazendo a concessão.
A pretendida obrigação de o Estado construir novas linhas férreas ou dotar as existentes dum matoria! circulante que absorva grandes somas ao Estado, não passa duma lamentável confusão que se fez com a exigência do estado maior do exército, traduzida na cláusula 7.a do decreto de concessão.
O estado maior disse no seu parecer o seguinte: .
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•ração das já construídas devem ser submetidos, pelas vias competentes, ao exame do conselho de estadomaior do exército, para se harmonizarem as necessidades da defesa nacional com as funções económicas que as mesmas linhas são destinadas a exercera.
Esta transcrição desfaz o equívoco. O Estado não contraiu nenhuma obrigação.
Em todo o caso oxalá que o novo pôr-to trouxesse aos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste uma afluência tal de tráfego que exigisse essa enormidade de vagões e de locomotivas de que se falou. Seria essa talvez uma maneira de o Estado poder fazer face ao tremendo déficit dos caminhos de ferro, déficit que está pesando por forma sensível sobre o Orçamento Geral do Estado, não obstante as tarifas de transportes serem já quási proibitivas.
Mas acentuemos que o decreto nem prevê a hipótese de ter de construir novas linhas, nem de adquirir qualquer material circulante* ou de tracção para as existentes.
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A cláusula 7.a do decreto só pode ser desfavorável aos concessionários. Com efeito, se no seu plano de criação de riquezas agrícolas ou mineiras surge a necessidade duma linha férrea, que eles desejem construir, por o Estado o não querer fazer, essa linha terá de ser previamente sujeita ao exame das autoridades militares, que poderão pôr o seu veto, prejudicando assim, embora justifieada-niente, o plano da empresa, em obediência às exigências da defesa nacional.
E com tantas cautelas andou o Governo ao fawr a concessão que não se esqueceu de fixar as condições do resgate da concessão por forma insofismável.
A concessão não representa um monopólio ou um exclusivo. Se o Estado ou se uma empresa particular qualquer quiserem criar amanhã na margem esquerda do Tejo um outro porto comercial, com cais acostáveis, com docas, com armazéns, têm inteira liberdade de o fazer. E se o fizerem, serão outros tantos concorrentes à empresa do Montijo, com vantagem sobre ela de poderem aproveitar já Já sua experiência, e até de poderem beneficiar da riqueza que a empresa do Montijo tenha já criado.
Assim, pode bem dizer-se que o decreto não deixou uma única hipótese por prever.
Disse-se que os concessionários podem converter o porto de Montijo em porto franco.
(j Onde está a cláusula que tal autori-saV A vossa comissão leu e releu o decreto, e não encontrou uma palavra que, mal interpretada ou mesmo um pouco torcida, dê aos concessionários uma tal faculdade.
De -resto, é bem sabido que o porto franco está já criado e localizado no Al-feite.
Ora, se a construção do porto franco não foi até hoje levada a efeito, é porque as vantagens desse empreendimento não são tam sedutoras como se afigura a muitos.
Nas condições actuais, não se vê como um porto francr possa modificar as nossas condições económicas. E quando de futuro o seu estabelecimento se torne recomendável, já se sabe onde deve ficar e as condições em que o Estado o há-de estabelecer.
Relativamente ao objectivo que os concessionários têm de converter o porto de Montijo em estação marítima de trânsito internacional, . não vê a vossa comissão como esse objectivo possa vir a ter um grajnde valor.
'E uma aspiração legítima de todos os portos marítimos ondo se trabalha, ver a sua esfera de acção dilatada o mais possível.
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íftârio âag fSessÒÇâ ao Èenaâo,
de Bade, Wurtemberg e ainda a parte francesa da Alta Sabóia.
Anvers e Roterdão, esses grandes portos da pequena Bélgica e da pequena Eo-landa, criaram-se e prosperaram ú custa do comércio alemão.
Não passaria, talvez, de am modesto presídio, ignorado do próprio país. E Lourenço Marques é hoje do conhecimento mundial. £ Quem não conhece a Delagoa Bay dos portugueses? O que a vossa comissão nilo vê é que haja na Estremadura espanhola possibilidades tam grandes que, atraídas ao Mon-tijo, fizessem dele não já um Anvers ou unVRoterdão, mas simplesmente um porto da importância comercial' de Lourenço Marques como porto de trânsito. Isso é que a vossa comissão não vê, porque falta à Estremadura espanhola um Rand que a valorize. Não consta que qualquer desses grandes portos das nações pequenas tenha sido causa de reclamações diplomáticas por parte das grandes potências "que dêl-les se servem. Por isso não se* compreenderia que o porto de Montijo, servindo o tráfego cia zona hespanhqla, que está dentro da sua esfera geográfica, viesse a ser uma fonte de reclamações diplomáticas por parte daquele país. Já vimos que a sua política ferroviária pretende criar à volta da nossa fronteira terrestre uma muralha que desvie para os- seus portos todo o tráfego que aos nossos se pudesse destinar. As grandes somas despendidas em Huelva e em Vigo não nos deixam dúvidas quanto aos desejos que a Espanha tem de atrair para eles o pouco tráfego de trânsito que ainda vem a Lisboa e a Leixões. Por isso, se alguma cousa houvesse-a recear, era quo do outro lado da fronteira se pusesse quaisquer objecções a que a mercadoria a atravessasse e viesse procurar o porto de Montijo. Mas com-isso nada teria o Estado. E se a faita de facilidades nos nossos portos pudesse servir-de pretexto para reclamações diplomáticas espanholas, 'as deficiências dos portos de Lisboa e de Leixões teriam já dado ampla margem para elas se fazerem. Não. Os receios de uma possível intervenção diplomática não passam de uma objecção sem consistência. Quanto à parte técnica do projecto, foi ela amplamente discutida pelo Conselho Superior de Obras Públicas que a apre-cipu nos seguintes termos: «E nestas condições, e porque o plano geral apresentado, no tocante ao estabelecimento naval de Montijo, não apresenta defeitos de natureza técnica, é este Conselho Superior de Obras Públicas de parecer que ele pode ser aceite». E por isso a vossa comissão se dispensa de lhe íazer qualquer outra referência. De tudo quanto fic& exposto se conclui: 1.° Que não há, de facto, na concessão dada por decreto n.° 6:679, de 14 de Julho de 1920, o menor encargo para o Tesouro, nem o mais insignificante compromisso da parte (Io Estado; 2»° Que o Governo acautelou escrupulosamente todos os interesses do país; 3.° Que o empreendimento se afigura de grande importância: a) Pelo incremento que dará aq nosso tráfego marítimo; b) Pelo abaixamento de fretes que virá a ocasionar; c) Por tornar possível a existência de novas indústrias e permitir um maior incremento das existentes: d) Pelos benefícios clirectos e indirectos que trará à lavoura; 0) Pelo acréscimo de receitas que trará ao depauperação Tesouro. 4.° . Que não obstante o que se diz no número anterior não há possibilidade nem vantagem em as obras do porto de Montijo serorn feitas por conta do Estado;
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trução de um porto na península de Mon-tijo, península até agora pouco menos de inculta e abandonada;
' 6.° Que não há inconveniente em permitir que os concessionários efectivem a sua idea, porquanto em muitos outros se encontram portos importantes, construídos e explorados por empresas parti-
7.° Que a concessão foi dada ao abrigo do disposto na lei de 26 de Julho de 1912.
Por todas estas razões a vossa comissão de administração pública é de parecer que se deve dar por válido o'decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920. que fez a concessão do porto de' Montijo e se deve, portanto rejeitar o projecto de lei n.° 533.
Sala das Sessões, 28 de Abril de 1921.— Amaro de Azevedo Gomes— Cristóvão Moniz— João Joaquim André de Freitas —r José de Sousa e Faro — Rodrigo Guerra Alvares Cabral, relator.
Senhores Senadores.—Em 5 de Agosto de 1920, ao terruiftar no Senado as minhas considerações sobre a concessão do porto do Montijo. tive a honra de enviar para a Mesa o seguinte:
«Senhores Senadores. — O Diário do Govèrno-n* 123, l.51 série, de 15 de Junho último, publica o decreto n.° 6:679, de 14 do mesmo mês, pelo qual é feita a concessão de um porto comercial na península do Montijo. •
Atendendo a que esta concessão constitui matéria da alçada do Poder Legislativo, sendo portanto inconstitucional, visto que nenhuma lei permite ao Poder Executivo dar concessões desta natureza, tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei \ r
Artigo 1.° É declarado nulo e de nenhum efeito o decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920. \
Art. 2.° O Governo mandará proceder desde já 'a estudos das condições da península do Montijo, sob o ponto de vista da sua utilização para o desenvolvimento do porto comercial de Lisboa e de possível estação marítima pás linhas do Sul e Sueste.
§ único. O Governo apresentará ao Parlamento os resultados desses estudos
e as propostas que entender mais convenientes para o aproveitamento daquele local em benefício do interesse económico nacional.
Art. 3:° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões, 5 de Agosto de 1920.— Alfredo Rodrirjues, Gaspar».
O decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920, pelo qual ó feita a concessão da construção e exploração de um porto comercial na península do Montijo, representa um abuso do Poder Executivo e fere os mais altos interesses do Estado, visto que:
I
Na falta de lei que autorize o Poder cutivo a fazer concessões de tamanha importância económica e política, como é ft dos portos comerciais, recorren-so ao subterfúgio de declarar no decreto que é aprovado uni projecto e feita a concessão, tendo em vista'o disposto nos n.os 4.P e 5.° do artigo 2.° e no artigo 4.Q da lei de 26 de Julho de 1912, dando assim a impressão ao público de que a concessão é baseada na lei!
Ora a aprovação de qualquer projecto de obras especificadas na citada lei apenas justifica a expropriação por utilidade pública e urgente, expropriação que só pode ser feita pelo Governo ou pelos municípios, que são os únicos expropriántes legais.
O objectivo da lei de 26 de Julho de 1912 está definido no seu artigo 1.°, que diz:
«As expropriações por utilidade pública regular-se hão pela presente lei e demais disposições que por ela não forem revogadas».
No seu artigo 2.° considera de utilidade pública e urgente todas as expropriações necessárias para diversos fins, que designa e enumera de l a 10.
Especifica pois as obras cuja execução justifica a expropriação por utilidade pública e urgente.
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ÍHário do* Setiôet dó Senado
o !título «Fomento dê riqueza nacionais especifica diversas obras, entre as quai» «zonas para portos francos», e no ri.° 5.° sob o título «Viação pública» indica a construção, melhoramentos e alargamento de estradas, portos e canais.
Como se vê, os n.os 4.° e 5.° de artigo 2.° da lei de 26 de Julho de 1912 nada têm que ver com aprovação de projectos e muito menos com concessões de construção e de exploração de obras, mas apenas indicam as obras para cuja execução é o Governo, ou o município, autorizado a expropriar por utilidade pública.
Cita ainda o decreto o artigo 4.° da mesma lei.
Ora este artigo apenas especifica a quem compete verificar e declarar que uma certa obra está compreendida nas indicadas sob os n.os 1.° a 10.° do artigo 2.°, verificação e declaração que se deduzem imediatamente da aprovação do projecto da obra, sendo esta aprovação dada pelo Governo ou pelos municípios «conforme aquele ou estes sejam os expropriantes», excepfcuan-• do as obras a efectuar fora de Lisboa ou Porto, cuja aprovação será feita pelo Governo.
Admitindo . que um projecto de obras merecesse a aprovação do Governo (e este não podia nem devia merecê-la, como adiante se verá), de tal aprovação apenas se concluiria, segundo a citada lei, que o Governo ou o município, e «só estes», podiam proceder às expropriações por utilidade pública e urgente necessárias à efectivação da, obra projectada/
Note-se, de passagem, que, pela lei 'orgânica dos Serviços Hidráulicos e respectivo regulamento, couipoto a este organismo, entre outros serviços, a execução dos estudos, projectos e obras para a construção, melhoramentos e conservação dos portos, com a sua administração, bem como o serviço de exploração dos portos de mar e a organização dos respectivos direitos a perceber.
Sem lei em- que se baseasse, com o Parlamento aberto, e nas vésperas de abandonar o Poder, o Governo usou de ura subterfúgio, citando a lei das expropriações por utilidade pública, para dar a particulares a concessão da construção e exploração por 75 anos de um porto comercial !
II
O decreto da concessão revoga disposições do Código Civil e disposições fundamentais da lei de l de Dezembro de 1392 que organizou os Serviços Hidráulicos.
As correntes navegáveis e seus leitos, cais e praias até onde alcançar o colo da máxima preiamar de águas vivas, são «cousas públicas», das quais é lícito a todos individual ou colectivamente utilizar --se, cem as restrições impostas pela lei ou pelos regulamentos administrativos (artigo 380.° do Código Civil).
Do mesmo modo a margem ou faixa de terreno adjacente junto à linha de água que se conserva ordinariamente enxuta-e é destinada aos serviços hidráulicos, de policia, ou acessórios da navegação e flutuação e que pode atingir a largura de 50 metros a contar da linha que limita o leito, é propriedade do Estado que indemnizou os proprietários legais dos terrenos juntos das correntes, quando se „ tornou necessária a sua expropriação, e constitui também cousa pública (artigos 1.° e 4.° da lei de l de Dezembro de 1892).
Yê-se, pois que as águas do rio, o leito, praia e margem são cousas públicas e como tais estão fora do comércio, não podendo por isso ser objecto de apropriação ou de posse (artigos 370.°, 372.° e 479.° do Código Civil).
As disposições da lei geral que estatui sobre o domínio público só podem ser derrogadas anulando ou restringindo esse domínio por uma lei especial.
j O decreto concedendo a construção e exploração de um porto comercial na península do Montijo cedeu aos concessionários a posse de cousas públicas (artigo 382.° do Código Civil), das quais só parte reverterá mais tarde à posse do Estado, como se deduz da análise das cláusulas do contrato!
Esse decreto é pois ilegal e atenta contra o Poder Legislativo.
III
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Cessão de l de Agosto de 1924
nários qualquer direito a indemniza-
A concessão com 'as suas cláusulas é um acordo entre o Estado, por intervenção do Poder Executivo, e os concessionários, no qual se transferem direitos e se r estabelecem obrigações.
E pois um contrato. • Ora para que, o contrato seja válido devem dar-se nele as seguintes condições (artigo 643.° do Código Civil):
l.a Capacidade dos contraentes;
2.a Mutuo consenso;
3.a Objocto possível.
Como o Poder Executivo não tem capacidade para alterar as disposições legais, nem estava autorizado por lei a dispor de bens do domínio público, falta ao contrato a primeira condição de validade.
Acresce ainda que é nulo o contraio cujo objecto não seja física e legalmente possível (artigo 669.° do Código Civil), e não podem legalmente ser objecto de contrato :
a) As cousas que estão fora do comércio por disposição da lei, como são as cousas públicas;
b) Os actos contrários às obrigações impostas por lei (artigo 671.° do Código Civil).
E a concessão de que se trata é um acto contrário à lei que estabelece que «os terrenos do Estado só podem ser concedidos por arrendamento ou venda», e em qualquer dos casos «em hasta pública».
Não é pois válido o contrato da concessão do porto do Montijo, em consequência das claras disposições legais, e os concessionários não têm fundamento algum, legal ou moral, para poderem reclamar contra a anulação do decreto da ilegal e ruinosa concessão.
IV
O decreto da concessão revoga o disposto no artigo 3.° da lei de 26 de Julho de 1912, isto é, da mesma lei em que pretendeu fundar-se para dar a concessão.
Diz o artigo citado:
«E reservada' às entidades adjudicantes a faculdade de resgatarem as concessões e privilégios por elas outorgados para a exploração de serviços de utilidade públi-
ca uma vez que o resgate seja declarado de interesse público.
§ único. A declaração de interesse público será feita pelo Poder Legislativo ou pelo referendum dos eleitores da respectiva circunscrição administrativa conforme o expropriante for o Estado ou os corpos administrativos».
Como se vê, a lei de expropriações por utilidade pública garante ao Estado o direito de resgatar a concessão, sem restrição alguma de tempo nem, necessidade de aviso prévio, «logo que o Poder Legislativo declare» que esse resgate é de interesse público.
Pois o Governo, pela cláusula 23.a do decreto da concessão, não só restringiu as vantagens garantidas ao Estado pela lei, mas também condicionou as atribuições do Poder Legislativo.
Diz a cláusula 23.a:
«O Estado reserva-se o direito de resgatar a concessão quando, por motivo de conveniência pública, o julgar conveniente, mediante «prévio aviso à sociedade com antecedência de dois anos e pagamento da respectiva indemnização, e desde que tenham decorrido trinta e cinco^ anos» a partir da data estabelecida para a conclusão de todos°os trabalhos.
V
O decreto da concessão revoga a lei de 12 de Junho de 1913 sobre o estabelecimento de um porto franco em Lisboa.
O decreto, sem falar em concessão de porto, franco, mas referindo-se apenas a «largas áreas para fins industriais», em vez de especificar detalhada e minuciosamente todo -o objecto da concessão, aprova um simples croquis a que chama «projecto relativo a um porto comercial com todas as instalações e dependências necessárias, tendo em vista o disposto nos n.os 4.° e 5.° do artigo 2.° e no artigo 4.° da lei de 26 de Julho de 1912».
j "Nao se pode imaginar forma mais vaga e obscura de enunciar uma concessão!
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fat Sessões do
Em face do Código Civil (artigos 669.° e 671.°), a concessão naqueles teiznos tam vagos, é nula, porque não podem legalmente ser objecto de contraio as cousas ou actos que não se podem reduzir a um valor exigível, e as cousas cuja espécie não é ou não pode ser determinada.
jEm vez de se definir claramente todo o objecto da concessão e tam detalhada-mente que nenhuma dúvida pudesse ser suscitada sobre á sua completa execução, mormente quando é bem sabido que a situação normal entre concessionários e o Estado é a àe questões sempre tendentes a uma maior exploração do Rstado, verificando-se se cada uma das obras está compreendida em algum dos números do artigo 2.° da lei de expropriações por uti- , lidade pública, procedeu-se de modo contrário, fazendo-se a concessão era virtjdy de números desse artigo, dando-se assim aos concessionários a faculdade de fazerem ou deixarem de fazer tudo o que é abrangido por esses números!
Assim muitas obras, de que nem se fala na concessão, são abrangidas no n.° 4.° do artigo 2.° da citada lei que diz: \
«4.° Fomento da riqueza nacienal: lavra de minas e pedreiras, serviço de tran&-portes em comum, exploração de ágaas mínero-medicinais (captagem, engarrafamento e balneários respectivos, parques, casinos, hotéis, avenidas, campos de jogos desportivos, quando necessariamente anexos de qualquer exploração desta na-tureza), aproveitamento de quedas de água para produção de energia, explorações agrícolas (irrigações, adegas e celeiros colectivos, armazéns gerais) «zonas para portos francos».
i Fugindo-se no decreto à especificação do «estabelecimento de um porto franco», e falando-se apenas em «áreas industriais», mas fazendo-se a concessão em virtude do n.° 4.° que abrange entre mui diversas obras, não especificadas na concessão, a dos portos francos, qnis-se dar aos concessionários, veladament3, a concessão do porto franco!
Ora esta concessão é contrária ao disposto, de forma bem clara, em todos os oito artigos e bases da lei de 12 de Junho de 1913, que estabeleceu o processo
a seguir para que se possa -adjudicar por concurso a construção e exploração do porto franco durante um prazo não superior .a u60 anos», sendo á adjudicação feita em harmonia com 17 bases onde tudo se acha definido, como é mester, ern assunto tam importante.
O Governo sofismou a lei das expropriações por utilidade pública.
Os números do artigo 2.° dessa lei não autorizam concessões de qualquer natureza a particulares, mas somente a expropriação por utilidade pública para a execução das obras enumeradas, e esta expropriação é um direito que pertence exclusivamente ao Estado ou às corporações administrativas.
A construção e a exploração., que podem ser ieitas directamente ou por còn-cossões a particulares, e ainda conjunta-mente ou em separado, é matéria administrativa completamente estranha à lei das expropriações.
Acresce ainda a circunstância de quo no croquis (e não projecto) apresentado pelos concessionários, há uma grande extensão de terreno destinado a «áreas industriais > e outra à «bairro operário» e o Governo aprovou tudo conforme diz, «tendo em vista o disposto nos n.os 4.° e 5.° do artigo 2.° da lei das expropriações». Ora estes números não autorizam a expropriação por utilidade pública para «áreas industriais» ou para «bairro operário», mas pelo n.° 4.° é autorizada a expropriação para .«zonas para portos francos».
O decreto devo, pois, ser anulado por violar a lei de 12 de Junho de 1912 que estabeleceu as condições, para a concessão de portos francos.
VI
' O decreto da concessão é inconstitucional.
1.° O decreto revogando diversas disposições do Código Civil e da lei de l de Dezembro de 1802, o artigo 3.° da lei de 2ô de Julho de 191J e a lei de 12 de Junho de 1913, infringiu o n,° 1.° do artigo 26.° da Constituição por ser da competência privativa do Congresso da. República: fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-ías.
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leito, praia e margem do rio na nujpe-sula do Montijo, bem como cedendo a particulares o direito, exclusivo do Estado, de expropriação de terrenos por utilidade pública, regulou a administração de bens nacionais, infringindo assim o n.° 22.° do artigo 26.° da Constituição.
3.° Comparando a extensão de bens 'nacionais abrangidos pela concessão, com a dos mesmos bens compreendidos nas obras e instalações que em virtude da cláusula 8.a só serão entregues ao Estado 7õ anos depois de concluídos os trabalhos, verifica-se que uma grande extensão não regressa à posse do Estado, sendo, assim infringido o n.° 23.° do artigo 26.° da Constituição, pelo qual é da competência privativa do Congresso da República, decretar a alienação dos bens nacionais.
-4.° O decreto concedendo o direito de expropriação da enorme extensão de terrenos na península do Montijo, onde se construirão não £0 as obras necessárias ao regular funcionamento de um porto comercial, mas tanibém um bairro operário, largas instalações industriais, docas de construção, de reparação, etc., etc., tudo exclusivamente a uma sociedade assim privilegiada, infringiu o n.° 26.° do artigo 3.° da Constituição porque só o Poder Legislativo e os corpos administrativos poderão conceder o exclusivo de qualquer exploração cojnercial ou industrial.
Do exposto conclui-se exuberantemente que urge anular e declarar de nenhum efeito Q decreto da concessão do porto do Montijo, por inconstitucional.
Tal é a justificação do artigo 1.° do projecto de lei que tive a honra de apresentar na sessão do Sena.do de 5 de Agosto últiíno.
Demonstrado que o decreto da concessão c|eve. ser anulado por inconstitucional, resta verificar se o Parlamento deve validar a concessão nos termos exarados no mesmo decreto, na hipótese do o Congresso da Kepública ter previamente resolvido, não s.ó' sobre a necessidade da criação de um porto comercial no Montijo, mas também sobre o modo de a efectivar.
Considerandos do decreto da concessão
Os «considerandos» que precedem o decreto da concessão do porto de Montijo a uma sociedade, «justificam» precisamente o procedimento contrário, isto é, «que o Estado é que deve construir e explorar esse pôrtp». ,
Vejamos:'
1.° Se «as actuais instalações do porto de Lisboa, na margem direita do Tejo, não são susceptíveis de ampliação por forma que ele possa satisfazer às necessidades -de um mais intenso tráfego, sobretudo de trânsito»,
não se compreende que a ampliação de ' um todo pertencente ao :Êstado seja entregue a uma entidade particular, criando-se assim no mesmo porto duas administrações, o que é contrário a todos os princípios de uma boa administração.
2.° Se o Estado reconhece que «a construção de um porto comercial no estuário do Tejo, em condições de desafogadamente poder servir a vasta região transtagana de aquém e além fronteira, até onde se possa estender o seu hinteriand, será um factor importantíssimo para o desenvolvimento da dita região»,
de modo algum deve o Estado entregar um tal factor a uma empresa particular, mas-sim dispor dele para melhor tornar eficiente o desenvolvimento das possibilidades das regiões nacionais, e evitar possíveis e mui prováveis conflitos ou pelo menos atritos provenientes de interesses estrangeiros, mormente sendo essa empresa constituída com capitais estrangeiros.
3.° «Se nesta época em que se trava a guerça económica que sucede à guerra pelas armas, nos cumpre valorizar os nossos próprios recursos, contribuindo assina para combater o grande desequilíbrio da nossa balança comercial e preparando o porto de Lisboa para a luta de concorrência dos portos seus rivais, que não descuram o seu desenvolvimento»,
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! ' !
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exploração de qualquer empresa particular.
4.° Se o Estado reconhece que «a pe"-nínsula do Montijo, pela sua vastidão e planura, pelo seu fácil acesso do lado do rio, pelas boas condições em que ali podem ser construídas e 'mantidas obras marítimas e pela sua fácil ligação com a rede ferroviária da região do sui do Tejo, se presta magnificamente ao estabelecimento de um porto comercial, com todos os requisitos, e dispondo ao mesmo tempo de enormes áreas para fins industriais e para o tráfego de mercadorias que demandam muito espaço, como sejam carvões, minérios, cortiças, etc.»
é evidente que tais vantagens devem ser utilizadas pelo Estado, não só para poder ampliar o seu porto, como lhe convém, mas também porque lhe interessa enor-memente, como possuidor da rede ferroviária do Sul e Sueste, o estabelecimento da respectiva gare marítima.
Grave erro seria entregar a exploração de uma parte complementar do porto de Lisboa, a uma empresa particular e possivelmente estrangeira, quando os bons princípios de administração impõem que todos os serviços do porto estejam a cargo de uma só administração autónoma, e não menos errado seria entregar a gare marítima de uma rede ferroviária do Estado, a uma empresa cujos interesses não são os do Estado.
Por todos os motivos é o Estado que deve aproveitar tam especiais vantagens.
5.° Se se reconhece «que a execução do projecto do porto de Montijo trará ao Estado um aumento muito considerável do receitas não só pelo aumento de matéria tributável resultante da criação de novos ramos de comércio e de indústria, como também pelo aumento que promoverá nas receitas da rede dos Caminhos de Ferro do Sul o Sueste, e nas correspondentes ao movimento marítimo do porto de Lisboa»,
realizam-se as condições mais vantajosas e compensadoras para que o Estado toine a seu cargo a construção e a exploração desse complemento- do actual porto de Lisboa, porque tais receitas, ainda acrescidas das provenientes da exploração, po-
derão talvez compensar, pelo menos em parte, os encargos provenientes das importantes quantias «que forçosa e urgentemente tem de despender com o fim de ampliar o porto de Lisboa e de o pôr à altura da função que ele tem a desempenhar» como se diz em outro considerando.
E não se perca de vista que o Estado, construindo o porto do Montijo como complemento do porto de Lisboa e como gare marítima das suas linhas do Sul e Sueste, ficará em excepcionais condições de molhor combinar em conjunto todos os serviços, deminuindo despesas a efectuar, quer no actual porto de Lisboa, quer na gare marítima em Cacilhas.
É uma questão de estudo que, segundo parece, ainda se não fez.
6.° Finalmente o último considerando, «que a construção do porto do Montfjo será feita sem encargo de qualquer natureza para o Estado»,
equivale a admitir o absurdo de que o mais barato é o melhor.
Ato mesmo no caso em que o Estado se visse na impossibilidade absoluta de o construir, o assunto deveria merecer um prévio e aturado estudo.
j Não s<_3 encargos='encargos' só='só' com='com' a='a' de='de' país='país' os='os' reservando='reservando' e='e' sociedades='sociedades' beneficiarem='beneficiarem' criam='criam' o='o' p='p' para='para' elas='elas' exploração='exploração' ouro='ouro' um='um' todos='todos' regueiro='regueiro' _='_' construção='construção'>
<_ corrente='corrente' só='só' moeda='moeda' dispêndio='dispêndio' será='será' ents='ents' em='em' imediato='imediato' encargo='encargo' _='_' o='o'>o quem entrega propriedades e cede direitos privilegiá-rios para fins comerciais e industriais, não teve encargos de qualquer natureza? ^Umas e outros nada valem, nada representam ?
^E as obrigações morais que o Estado contrai pelos termos do diploma da concessão, perante interesses estrangeiros ?
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mais de 20:000.000$ para melhoramento s do porto de Lisboa, e «já depois da publicação do decreto da concessão do porto do Montijo, votou mais 30.000.000)$ para o porto de Leixões!».
Da rápida análise dos considerandos do decreto ressalta claramente a necessidade do Governo mandar proceder desde já ao estudo das condições da península do Montijo, sob o ponto de vista da sua utilização para o desenvolvimento do porto comercial de Lisboa, e de possível estação marítima das linhas do Sul e Sueste, apresentando o Governo ao Parlamento os resultados desses estudos, e as propostas que julgar mais convenientes para o aproveitamento daquele local em benefício do interesse económico nacional. Tal é a doutrina do artigo 2.° e seu parágrafo do projecto de lei que tive a honra de apresentar no Senado. Considerandos do parecer das comissões de finanças e de fomento Sobre o projecto de lei n.° 533, da minha iniciativa, anulando o decreto da concessão, as comissões de finanças e de fomento deram conjuntamente um parecer de que loi relator o Sr. Eodrigo Alvares Cabral. Logo após a publicação no Diário do Governo do decreto da concessão, foi lê-, vantada no Senado a questão da inconsti-tucionalidade desse decreto, e seguidamente os concessionários do porto do Montijo fizeram distribuir um pequeno opúsculo intitulado:^, concessão do porto do Montijo — Da nua legah dade e importância para a economia nacional; e depois, como complemento, uma folha intitulada: Receitas a cobrar pelo Estado como consequência da construção do porto do Montijo ial como foi decretada pelo decreto n.° f>:67,9, de 14 de Junho de 1920. O parecer das comissões de finanças e de fomento do Senado começa por transcrever as 25 cláusulas e condições do decreto da concessão do porto do Montijo, que teve de considerar «para dar um parecer consciencioso», o em seguida apresenta 16 considerandos, no último dos quais conclui «que o Congresso deve aprovar um bill de indemnidade ao Governo que subscreveu esta concessão validando por esta forma o decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920, rejeitando, portanto, o projecto de lei n.° 533 da autoria do Sr. Senador Rodrigues Gaspar». Analisemos os 16 considerandos, que se podem dividir em 3 grupos, sendo o 1.° constituído pelos primeiros 9 considerandos, o 2.° pelos IO.1 a 12.°'e o 3.° pelos 13.° a 16.° Os 9 primeiros considerandos, constituindo "o 1.° grupo, são «na essência e pela mesma ordem de enunciação», todos os 9 proventos que os concessionários, na folha intitulada Receitas a cobrar pelo Estado, dizem deixar para o Estado, aceitando, para a Companhia a formar, todos os encargos. Assim, o parecer considera que & construção do porto do Montijo : 1.° Dará um grande desenvolvimento agrícola e mineiro á província do Alentejo: 2.° Permite a constituição de uma indústria de trânsito entre o país vizinho e os portos da Europa e vice-versa; 3.° Dará enorme re,ceita aos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste pelo trânsito de mercadorias que afluirão ao mesmo porto ; 4.° Valorizará a área e proximidades do porto, do que resultará aumento dos direitos de transmissão de propriedade; 5.° Necessariamente dará origem à criarão de novas indústrias na localidade devido à facilidade de comunicações; 6.° Necessariamente originará o estabelecimento de armazéns modernos para arrecadação de mercadorias tanto do continente como das colónias e do estrangeiro, o que aumentará a matéria colectável; 7.«° Aumentará a contribuição predial com a construção de edifícios para o pessoal do porto e suas famílias; o 8.° Dará uma grande contribuição aduaneira, pela importação de material de construção e de utilagem do porto e de material, fixo e circulante de caminho de ferro; 9.° Dará a contribuição industrial e outras que a companhia construtora e exploradora do porto pagar.
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que tudo deriva da existência do porto quando bsm apetrechado, dispondo de extraordinárias áreas para fiiis comerciais e industriais' e «etc.» (conforme e indicado no esqnema junto ao pedido de concessão), cada tendo que ver com e, entidade construtora e exploradora, ruas apenas com a construção e exploração.
l Mesmo cue uma parte importante das mercadorias £ transitar pelo porto pudesse pertencer aos concessionárioá, infantil seria a conclusão de que o Estado, para obter tais receitas, não pode prescindir do concurso da companhia a formar «pelos concessionários» para a construção e exploração do porto e das partes adjacentes £
O trânsito de mercadorias não obedece a fantasias de produtores ou consumidores, mas sim às condições de rapidez e economia. Mas se obedecesse, não haveria razão para que o Estado, construindo e explorando o porto por sua conta, receasse a falta, de mercadorias daqueles quê, por mero patriotismo, se sacrificavam até reservarem para si os encargos da construção e exploração do porto do Montijo, para darem preferência ao trtin-sito dos seus produtos pelo nosso País. Dispensada a Sociedade de tam grtnde sacrifício^ que o Estado assumiria, maiores seriam ainda as razões de preferência do tráfego das suas mercadorias pelo porto essencialmente português.
Em conclusão, os 9 primeiros considerandos não justificam a concossilo, como se pretende, mas apenas poderiam servir como circunstâncias a atender sobre a conveniência da construção de um pOrío no Montijo.
Seguem-3ô 3 considerandos, formando o 2.° grupo, que igualmente aparecem no pequeno opúsculo A concessão do porto do Montij^ am que os concessionários pretendem mostrar ã legalidade e importância para a economia nacional da concessão que lhes foi dada. São aes:
10.° Que a concessão feita consiste essencialmente na autoriz ição para construir o porto comercial do Montijo e para o explorar durante 75 anos, para o que a empresa possui elementos de tráfego indispensáveis, ficando no domínio público e revertendo para a pqsse do Estado no fim da concessão.
11.° Que os terrenos expropriados na zona marginal se acham sem utilização e que se concede apenas licença para os utilizar temporariamente, continuando propriedade do Estado.
12.° Que os terrenos a adquirir para ' as instalações pertencem a particulares e os que são de domínio público estão nas condições das licenças que costumam ser dadas para construções de cais, pontes, armazéns, etc.
Sem dúvida que é pela concessão que 53 autoriza a construção e exploração do porto por 75 anos, não sendo necessário que a empresa possua ou não elementos de tráfego, mas o que é indispensável, como se viu, é a existência duma lei que autorizo essa concessão, e daí a razão para ser anulado o decreto que pretendeu substituí-la. Basta tratar se da concessão a uma determinada empresa particular, para imediatamente se reconhecer - que o objecto não fica no domínio público, pois de contrário não teria que «reverter para o Estado no fim da concessão».
A autorização para, não só fruir por determinado tempo, mas para transformar e exclusivamente usufruir as margens que são do domínio público, com os direitas, de exclusão e de defesa, e de restituição e da indemnização dos direitos violados, c'onstittii alienação da propriedade, embora imperfeita, se aos con-cecsionários fosse vedada a fruição de parte dos direitos abrangidos pelo direito de propriedade. (Arligoa 2169.°, 2187.°, 2197.°, 2287.°, 2315.°, 2339.° e 2356.° do Código Civil).
Quaisquer que sejam as condições de transformação por que passam os terrenos do Estado, não deixam por isso de sair do domínio público desde que se concede a uma empresa particular o direito de exploração.
Não se pode confundir a «concessão da construção o exploração dum porto», com as simples licenças concedidas pelas Divisões Hidráulicas ou pelo Governo, segundo os casos, para a execução de pequenas obras numa margem, de consequências muito diferentes, e que s"ãosempre concedidas com a declaração expressa do que o são, «sem prejuízo dos direitos dê terceiros). (Artigo 262.° do Regulamento de. 19 de Dezembro de 1892).
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ò próprio Governo não recorreu ao Ke-gulanipnto para a Concessão de licenças pára obras nas margens, mas sim, sem lei que o autorizasse a fazer uma tal concessão, pretendei! apoiar-se na lei de expropriação por utilidade pública!
Mas se se tíatasse apenas duma licença para utilizar terrenos da zona marginal, como dizem os concessionários e repete o parecer no seu 11.° considerando, lamentavelmente, ato se deu menos importância à Construção dum porto comercial do que a duma ponte, pois para aquele bastou a apresentação dum simples esquema, e para está é indispensável que o pedido da licença seja acompanhado da planta parcelar, «em triplicado, em escala nunca menor de 1:1:000, do local oíide sé pretende exòéutar a obra, com todos os detalhes convenientes, e dos alçados, perfis e cortes necessários para fa-zer crtnhecer e apreciar a referida obra. (Artigo 267.b do .Regulamento para a execução dos serviços' hidráulicos de 19 de Dezembro de 1892).
Kote-se ainda que as obras para o me-ihof amento, conservação ou aproveitamento nas águas públicas serão feitas e pagãs pelo Estado, ou pelas empresas ou companhias íjtiè obtiverem «concessão legal dessas obras». (Artigo 14.° da lei orgânica dos Serviços Hidráulicos de l de Dezembro de 1892). , -
. Ora à Concessão falta, precisamente, a legalidade!
O ll.° considerando è incompreensível, por ser um apanhado incompleto do qUe dizem os concessionários em defesa dos seus interesses, no seu opúsculo A concessão do porto de Montijo:
«E Hão se alegue que as obras ocupam uma certa zona de terreno marginal coberto pelas marés, qUe pertence ao domínio público, e que por isso ao Poder Legislativo pertence regular a sua administração.
Esses terrenos estão sem utilização. Concede-sé uina licença para os utilizar temporariamente».
Evidentemente os terrenos do domínio público' não estão «exclusivamente» utilizados por uma sociedade particular, è para o estaremj é que necessário se torto $ intervenção do 1*0der Legislativo.
O 12.° considerando, pelo mesmo motivo, não esclarece o fim que tem em vista. Dizem os concessionários no citado opúsculo:
«Também se não pode alegar que há administração de bens nacionais a regular.
Os terrenos e'm que se vão construir as instalações do porto pertencem a particulares, abs' quais têm de ser expropriados».
Ora a transmissão do direito de expropriação por utilidade pública, que é um privilégio do Estado ou de Corpos Administrativos, só pode fazer-se por intervenção do Poder Legislativo.
Como se vê, também destes1 3 considerandos nada resulta para demonstrar á constitueionalidade do projecto, como pretendem os concessionários, ou que justifique um bill de indemnidade, como pretende o parecer.
Analisemos os 4 últimos considerandos, 13-° a 16.°, que constituem o terceiro e último grupo.
13.° Que só por medidas de fomento é quh o País pode progredir e regenerar-se.
Este considerando é o simples enunciado dum princípio geral cujo final Só é exacto quando as medidas são convenientes.
14.D Que nesta concessão foram acautelados todos os interesses do Estado, tornando-a por assim dizer uma continuação do porto de Lisboa.
A primeira parte deste' considerando pretende por si só justificar o «bill de indemnidade», mas a segunda parte prejudica a pretensão porque, sendo o porto do Montijò a continuação do porto de Lisboa, o interesse do Eptado impunha que fosse ele, e não outrem, que continuasse a obra e mantivesse a exploração do seu primeiro porto, mesmo que isso importasse um grande sacrifício, o que se não dá no caso presente.
O princípio duma única administração para melhorar as condições dum porto, o de Londres, onde as, docas pertenciam a algumas grandes companhias.
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das linhas do Sul e Sueste pertencentes ao Estado.
Ora ainda na própria Inglaterra, onde variam os detalhes da administração dos seus diversos portos, os melhor administrados são os pertencentes a caminhos de ferro que têm o máximo interesse eni aumentar o tráfego das suas gares marítimas como pontos terminus' das suas linhas.
Se no decreto da concessão não houvesse outras circunstâncias capitais pondo bem em evidência que os interesses do Estado, em vez de acautelados, foram alienados, bastariam os dois motivos apontados, para incontestavelmente se concluir que esses mesmos interesses exijem a construção e exploração do porto do Montijo por conta do Estado.
Pela circunstância de se reconhecer no decreto da concessão que o porto de Montijo será um factor importantíssimo para o de|envolvimeuto da região trastagana de «além fronteira», o Estado longe de acautelar os seus naturais interesses cria obrigações que os põem em conflito.
Quando circunstâncias especiais, que se não dão no caso presente, forçassem o Estado a conceder a uma empresa particular a exploração dessa parte do porto de Lisboa, inipunha-se, por todos os motivos, que essa empresa fosse portuguesa de facto, isto é, constituída com capitais portugueses.
E tam evidente era esta exigência, que o decreto da concessão na sua cláusula l.a diz que a sociedade será «genuinamente» portugaesa, procurando assim, pelo "qualificativo, arredar qualquer suspeita sobre a nacionalidade da sociedade.
Mas, como que querendo acentuar mais definidamente o termo empregado, «ge-•nuinamente portuguesa», acrescenta: «e como tal subjeita absoluta e exclusivamente às leis, autoridades e tribunais portugueses». (!)
Ora este esclarecimento vem apagar, por completo, toda a intuição do qmdifi-cativo da sociedade!
; O termo «genuinamente» dá a impressão de que no decreto se exige que a sociedade seja aquilo que, pela aclaração no mesmo decreto, se não exige!
Pelo Código Comercial, (artigo 110.°), até mesmo as sociedades constituídas no «estrangeiro» mas que devam ter sede em
Portugal e nele exercer o seu principal comércio, serão consideradas para a todos os efeitos» como «sociedades portuguesas» e ficarão sujeitas a todas as disposições do Código Comercial.
0 único, necessário e justificável escla-, recimento a seguir ao qualificativo a genuinamente portuguesa», visto não existir 110 Código esse termo, iseria necessariamente, que «as acções da sociedade fossem nominais e pertencentes a portugueses», para que os interesses não só do porto de Lisboa e da gare marítima das linhas do Sul e Sueste, propriedades do Estado, mas da extensa península do Montijo, dentro do Tejo, ficassem «ao menos» nas mãos de portugueses.
(jComo estão acautelados «todos os interesses do Estado», verificando-se que uma concessão de tamanha importância e em tam excepcionais condições é feita a uma empresa que poderá constituir-se com «capitais totalmente estrangeiros», sorrindo-se do impressivo termo «genuinamente portuguesa» ?
Começa o decreto por aprovar o que denomina «o projecto datado de 19 de Agosto de 1919», quando tal desenho é apenas um e~squema de cousas vagas, e que nem poderia ser recebido nas estações oficiais como base do pedido duma simples licença para pequenas obras, por faltarem todos os requisitos impostos pelo Regulamento, como já se indicou.
j Os próprios concessionários, no seu opúsculo A concessão do porto de Montijo, chamam esquema a. esse desenho.
1 Estacões oficiais assim também o classificaram !
Em 1892, conhecidas as dificuldades com que lutava o comércio para efectuar a carga e descarga dos ri avios na zona margina] do Douro, o Centro Comercial do Porto requereu autorização para cons-trmir e explorar por 20 anos um cais acostável.
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0 -belecidas claramente as condições de exploração do referido cais acostável, a Alfândega do Porto apresentou uma contra proposta, e sendo todo o processo enviado à Procuradoria Geral, foi esta de parecer «que não tinha competência, dentro das faculdades do Poder Executivo, para fazer concessões daquela ordem».
; Compare-se este cuidado e procedimento com um simples cais acostável, com os cuidados e procedimentos agora havidos com a construção e exploração dum porto comercial!
£ Como se acautelariam os interesses do Estado, fazendo este concessões indefinidas e imprecisas susceptíveis de futuras discussões, contestações ou pleitos?
^Como se acautelaram os interesses do Estado, dando a uma sociedade o exclusivo da expropriação por, utilidade pública e urgente de vastíssimos terrenos que, sem mais detalhe algum, se dizem destinados a áreas industriais?
Quando há anos se apresentaram várias propostas que, tendo por objectivo aparente a concessão do caminho de ferro para Sintra, miravam principalmente a concessão de terrenos que, empregados em edificações particulares ou em estabelecimentos ,comerciais e industriais, deviam oferecer margem a grandes lucros, o Conselho Superior de Obras Públicas e Minas foi abertamente contrário a todas essas ' propostas, e ponderava que, atendendo à grande importância do porto àe Lisboa, por qualquer aspecto que se considerasse, ou fosse político, comercial ,ou em relação ao serviço militar de mar e terra, considerando a grande influência que poderia ter no futuro engrandecimento e prosperidade do país, visto a sua posição geográfica, excelente e privilegiada no globo, uma vez que dela se tirasse o - partido que devia tirar-se, por todas estas razões «deveria usar-se de toda a circunspecção no modo de dispor dos terrenos marginais».
i Agora na presente concessão vê-se bem claramente como se procedeu a um exame demorado do seu objectivo!
<_ tejo='tejo' de='de' estado='estado' uma='uma' do='do' conquistar='conquistar' destinadas='destinadas' ampliações='ampliações' acautelaram='acautelaram' se='se' enormes='enormes' concedendo='concedendo' isto='isto' também='também' não='não' áreas='áreas' _='_' só='só' como='como' a='a' os='os' e='e' reparação='reparação' futuras='futuras' é='é' estaleiros='estaleiros' m='m' ao='ao' exclusivo='exclusivo' o='o' p='p' _.interesses='_.interesses' extraor-='extraor-' as='as' de.construção='de.construção' sociedade='sociedade'>
dinário, a tudo quanto pode incluir-se num etc. exarado no projecto aprovado pelo > Governo?
Quando a Empresa dos Planos Inclinados em Porto Brandão, cuja concessão lhe foi dada por carta de lei de 30 de Março de 1861, pediu a orla da margem banhada no colo do preiamar desde a extremidade leste dos planos inclinados até Ba-nática para segurança do seu estabelecimento, o Conselho de Obras Públicas foi de parecer que não se cedessem «as praias que deveriam ser públicas e inalienáveis», a não ser em caso especial para objecto de grande utilidade pública.
j Agora um etc. é objecto de grande utilidade pública e não é necessário lei para alienar a propriedade do Estado!
Quando pela carta de lei de 26 de Fevereiro de 1876, foi o Governo autorizado a fazer a concessão da construção e exploração de um muro cais e aterro, e de docas e caminho de ferro na margem direita do Tejo, segundo um projecto com-petentemente elaborado, não sendo concedido à empresa subsídio algum, nem garantia, de juro ou amortização, mas a exploração por determinado tempo, estabeleceu-se claramente que a «quinta parte dos terrenos conquistados ao Tejo seria para o Estado».
í Agora acautelaram-se todos os interesses do Estado, não reservando para ele parte alguma dos terrenos conquistados, nem mesmo garamindo a entrega desses terrenos no fim dos 75 anos de exploração do porto!
(jComo se acautelaram todos os interesses - do Estado, se em v0ez de previamente definir-se com precisão indiscutível todos os elementos constitutivos do objecto da concessão, verificando-se então se esses elementos estavam compreendidos nas várias obras citadas nos n.os 4.° e 5.° do artigo 2.° da lei das expropriações por utilidade pública, se procedeu de modo inverso, isto é, fazendo-se a concessão «tendo em vista o disposto nos n.os 4.° e 5.° do artigo 2.°» da mesma lei, dando-se assim a faculdade de fazer ou deixar de fazer todo quanto .é abrangido por esses números, e omitindo-se deste modo obrigações claramente expressas para se poder exigir o seu cabal cumprimento?
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tempo, a fim de garantir os juros e amortização do capital despendido, tudo quanto foi objecto da concessão deve reverter ao Estado,' findo o prazo da exploração.
Pois basta comparar os termos desta concessão, em qtíe foi aprovado um simples esquema «relativo a um porto comercial com todas as instalações e dependências necessárias», abrangendo uma área de cerca de 1:500 hectares, nãc compreendendo as grandes áreas a conquistar ao Tejç, com o que reverte ao 'Estado em virtude da cláusula 8.a, para se concluir facilmente que os interesses do Estado não só deixaram de ser acautelados, mas foram expressamente alienados !
<_ operário='operário' de='de' particulares='particulares' do='do' domínio='domínio' lei='lei' vastas='vastas' das='das' _2..='_2..' _4.='_4.' utilidade='utilidade' áreas='áreas' propriedades='propriedades' bairro='bairro' virtude='virtude' em='em' público='público' expropriações='expropriações' estão='estão' _5.='_5.' n.08='n.08' obras='obras' explicar='explicar' que='que' explorar='explorar' unia='unia' privilégio='privilégio' números='números' concede='concede' artigo='artigo' por='por' se='se' citados='citados' essa='essa' nos='nos' qae='qae' para='para' urgente='urgente' não='não' pública='pública' expropriar='expropriar' a='a' terrenos='terrenos' e='e' industriais='industriais' _-um='_-um' o='o' p='p' estabelecer='estabelecer' incluídas='incluídas' sociedade='sociedade' posse='posse' coeio='coeio' da='da' disposto='disposto'>
Dir-se há que as «áreas industriais^ designadas no esquema, correspondem NÍIS «zonas para portos francos», incluídas ião n.° 4.° do artigo 2.°, zonas que de facto os concessionários poderão estabelecer, visto que a concessão foi feita nos termos desse número, havendo pois no decreto uma condenável dissimulação!
£ Mas então como se acautelaram todos os interesses do Estado, concedendo a uma sociedade o estabelecimento de uma «zona de porto franco» em Lisboa, postergando as garantias e interesses do Estado, que se acham estipuladas na lei de 12 de Junho de 1913, sobre o porto franco em Lisboa?
Não reverte, porque a cláusula 8.a que estipula o que a sociedade entregará GO Governo, expirado o prazo da concessão, diz: «todas as obras e instalações do pôr-to» que tiver executado com destino às operações de carga e descarga de mercadorias, e aã designação do que se compreende cesto título, não inclui, nem tinha que incluir, a «zona para porto franco» que de facto não se destina às operações de carga e descarga de mercadorias, mas tem um fim muito especial. E assim que foram acautelados todos os interesses do Estado? E os terrenos do domínio público e os a conquistar ao Tejo que perfazem uma vastíssima área destinada a «estaleiros de construção, reparação» e etc., depois da explorarão por 75 anos, reverterão ao Estado ? Também não revertem, porque não são instalações destinadas às operações de carga e descarga de mercadorias, como é estipulado na cláusula 8.a- E não se conclua que «todas» as obras e instalações destinadas às operações de carga e descarga de mercadorias reverterão para o Estado no fim dos 75 anos. Kepare-se que foi introduzida uma importantíssima restrição : «a. sociedade, entregará ao Governo todas as obras e instalações do porto «que tiver executado», com destino às operações de carga e descarga de mercadorias», e como a sociedade pode deixar de c adquirir» o valioso material de equipamento do mesmo porto, concedendo a outrem a exploração desse material, e com todas as probabilidades assim procederá, o Elstado receberá cais e pontes, sem o necessário 'apetrechamento ! Concede-se à sociedade o privilégio de expropriar por utilidade pública e «urgente» urna tam vasta região da parte oeste da península do Montijo, com «tam grande urgência» que estando o Parlamento aberto, o Governo, prestes a abandonar o poder, não lhe submete o assunto, cuja resolução compete exclusivamente ao Poder Legislativo, e, pela cláusula 10.a, dá-se mais de sete anos para a sociedade concluir o «primeiro grupo de obras», necessárias para iniciar a exploração do porto e ainda para cúmulo, sem se definir, em qualquer cláusula, o que constitui esse primeiro grupo de obras !
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j E diz-se que foram acautelados todos os interesses do Estado !
Os concessionários pedem o direito de expropriar por utilidade pública toda a região da península doMontijo, abrangida pelo esquema que juntaram ao requerimento para a construção de um porto comercial com todas as instalações e dependências necessárias, «tudo conforme o indicado no projecto», mas pela cláusula 11.a são apenas obrigados a construir, «não tudo» conforme o indicado no projecto, mas apenas as obras do porto à medida qae se manifestar a sua necessidade, dentro de dez anos, salva a eventual prorrogação, em virtude de casos de força maior!
i Parece que o principal intuito foi conceder-lhes a posse de tam vastos terrenos !
Para o estabelecimento das tarifas de exploração' comercial do porto do Monti-jo, só o Estado deve ser árbitro não só por considerações económicas gerais, mas por lhe pertencer a exploração do porto de Lisboa e as linhas do Sul e Sueste.
Pois pela cláusula 17.a, esgas tarifas serão fixadas de «acordo com o Governo» :
«Devendo ter-se sempre em atenção as condições muito «especiais de modicidade em que tem de se fazer esse tráfego», e haver prévio acordo com as administrações das vias «interessadas», quer terrestres, quer marítimas, tomando mais em consideração que as tarifas nunca sejam superiores às estabelecidas para o porto de Lisboa».
Isto é, perde-se a soberania no principal porto do país, exigindo-se um prévio acordo entre o Governo e administrações estrangeiras, tanto marítimas como terrestres, interessadas naturalmente pelas mais baixas tarifas do porto do Montijo, embora em detrimento Já exploração do porto de Lisboa.
Não havia que temer tarifas de exploração no porto do Moutijo, superiores às do porto de Lisboa, mas o contrário é que prejudica este porto.
E o Estado será forçado a acordar com as outras entidades, porque estranhos lhe lembrarão que aquela cláusula manda atender às condições muito especiais em que tem de se fazer esse tráfego, e nem nos poderemos defender com as despesas
de construção e de exploração do porto que especialmente concedemos a estranhos para a realização desse tráfego, confessando publicamente a nossa incapacidade !
Pela cláusula 19.a, para garantia do cumprimento das obrigações contraídas pela . concessão, a sociedade deposita 300.000$ em dinheiro, ou em títulos da dívida pública, mas este depósito poderá ser levantado logo que haja trabalhos, executados * de valor igual ao dobro do sou quantitativo. As obras efectuadas pela sociedade deviam servir de garantia ao Estado para a execução das obrigações contraídas pela concessão. Pois pela cláusula 20.a, no caso de a sociedade não querer, cumprir o contrato, serão todas as obras a que se refere a cláusula 10.a posteas em hasta pública,-«com as mesmas condições da concessão», sendo o preço da arrematação «entregue à sociedade», depois de deduzidas as despesas que o Governo tiver feito com a fiscalização, ou outras! De modo que o Estado, reconhecendo que na concessão não tinham sido acautelados" os seus legítimos interesses, e devendo retomar a sua liberdade pola falta de cumprimento do contrato da outra parte contratante, é forçado por epta cláusula 20.a a proceder com a mesma incúria a uma nova concessão! j Não há aqui apenas incúria do Governo perante os interesses do Estado! Até mesmo as garantias que lhe estavam asseguradas pela lei geral (artigo 709.° do Código Civil), são invalidadas pelo decreto, pois que, deixando a sociedade de cumprir, as obrigações do contrato, o Estado ter-se-ia por desobrigado e exigiria que a sociedade fosse compelida judicialmente a cumprir aquilo a que se obrigou ou indemnizá-lo de perdas e danos.
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do primeiro contrato, mas ainda a entregar ao delinquente o produto da adjudicação das obras!
<íMasserão à='à' hasta='hasta' foi='foi' terrenos='terrenos' postas='postas' cuja='cuja' em='em' todas='todas' p='p' concedida='concedida' por='por' as='as' nos='nos' sociedade='sociedade' vastos='vastos' efectuadas='efectuadas' utilidade='utilidade' obras='obras' expropriação='expropriação' pública='pública'>
A isto responde cuidadosamente a cláusula 20.a, esclarecendo que, nos casos da sociedade delinquir, só são postas em hasta pública a todas as obras, instalações e material a que se refere a cláusula KXa», isto é, o primeiro grupo de obras necessárias para iniciar a exploração do porto, (j obras que nem mesmo estão definidas na concessão!) ficando por consequência a sociedade com a posse de toda a vasta região, cujo direito de expropriação por utilidade pública lhe foi concedido, e de todas as obras que aí tiver construído e que não fazem parte daquele limitado primeiro grupo de obras necessárias para iniciar a exploração, do porto!
jE ficará de poise dessa região, se à data em que resolveu ialtar ao cumprimento do contrato, não tiver já negociada a utilização dos terrenos por «sub-ccnces-sões, arrendamentos ou outros contratos», conforme está previsto na cláusula 18.a, que a fiscalização do Governo não poderá impedir em face da concessão! (§ 1.° do artigo 178.° do Código Comercial).
j Esta cláusula 20.a anula o direito do Estado à exigência do pontual cumprimento das obrigações da sociedade para com ele, (artigo 702.° do Código Civil), invalida a responsabilidade da sociedade, que falta ao cumprimento do contrato, pelos prejuízos que causa ao Estado (artigos 2393.° e 705.° do "Código Civil), e cede à própria delinquente a indemnização de perdas e danos a que ela era obrigada pela lei geral (artigos 706.° e 707.° do Código Civil)!
jEin resumo, para «salvaguardar todos os interesses do Estado», a cláusula 20.a invalida as «Disposições gerais» dos «Efeitos e cumprimento dos contratos» que constitui a secção I do capítulo 9.° do Código Civil!
Impunha-se o estabelecimento de uma multa ou rescisão do contrato, quando a sociedade não coaservasse em perfeito estado de serviço as obras, instalações, dependências e material do porto, a que se obrigou pela cláusula 2.a, ou quando fos-
se remissa em cumprir as indicações, que para esse fim, lhe fossem ordenadas pelo Governo.
i Pois pela cláusula 21.a, em vez de se estipular a aplicação de uma multa ou a rescisão do contrato, para os casos apontados, concede-se ao Governo o favor de mandar proceder às necessárias reparações por conta da sociedade! j E nem ao menos se deixou ao Estado o direito da indemnização de perdas, e danos que a lei geral estabelece (artigo 711.° do Código Civil), quando um dos contraentes deixa de prestar algum facto, ou não o prestou conforme o estipulado!
j E diz-se que foram acautelados todos os interesses do Estado!
Em qualquer 'ocasião, tendo o Poder Legislativo reconhecido que o interesse público exige o resgate de uma concessão outorgada para, a exploração de serviços de utilidade pública, cumpre ao Poder Executivo proceder imediatamente ao resgate dessa concessão, 'em virtude do disposto no artigo 3.° e seu parágrafo da lei de 26 de Julho da 1912.
i Pois a cláusula 23.a do decreto da con-' cessão' revoga aquele artigo da lei, e ainda que o Parlamento no uso das suas atribuições, reconheça que o interesse público exige o resgate imediato da concessão do porto do Montijo, terá de esperar o interesse público que tenham decorrido 4õ anos a partir da data da concessão, e. para obter «tam rapidamente» esse resgate, ainda é necessário que o Estado tenha previamente avisado a sociedade com antecedência de 2 anos!
j E assim que, não só se respeitou a lei, mas se salvaguardaram todos os interesses do Estado!
A cláusula 24.a deste sibilino decreto, ainda vem auxiliar a «salvaguarda» dos interesses do Estado, já tam bem estabelecida em cláusulas anteriores.
Vimos as condições, não só ilegais mas prejudiciais ao Estado, estabelecidas na cláusula 23.a para o resgate da concessão, parecendo, pois. que se'trata de toda a concessão, isto é. de tudo quanto foi concedido à sociedade por utilidade pública e urgente.
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tiver lugar, será determinado» etc., o que mostra bem o cuidado havido em redigir de modo a facilitar-se o acto da concessão, permitindo a incubação de controvérsia^, como convém a sociedades que pretendem explorar concessões do Estado que, mesmo em contratos claramente redigidos,v tem sido, quási sempre o prejudicado, como a longa prática tem. mostrado!
;0ra o especificado na cláusula 10.a, é apenas o primeiro grupo de obras para iniciar a exploração do porto, obras que? como já se disse, em parte alguma do contrato, se acham claramente designadas!
j Em conclusão, quando por motivo -de conveniência pública, o Estado resolver resgatar a concessão, não só não o poderá fazer senão passados 45 anos após a data da concessão e mediante prévio aviso à sociedade com atecedência de 2 anos, conforme o estipulado jia cláusula 23.a, como, quando o puder fazer, o resgate não poderá abranger tudo quanto o mesmo Estado concedeu como sendo de utilidade pública, mas apenas uma parte dessa concessão,, limitada ao denominado «primeiro grupo, de obras para iniciar a exploração do porto», conforme o estipulado na cláusula 24.a!
Também não deveria passar sem reflexão, o modo de calcular a importância da anuidade que o Estado pagará à sociedade, durante cada um dos anos que faltarem para terminar o prazo da concessão, -pela pouca probabilidade de que o objectivo principal da criação do porto — exploração mineira além fronteira — depois de, pelo menos, 35 anos de exploração, permita contar, por mais 40 anos, com a continuação de igual rendimento, diferindo muito as condições dessa exploração, das inerentes à exploração dos caminhos de ferro de interesse geral.
j Como se vê, esta cláusula 24.a também contribui poderosamente para'salvaguardar todos os interesses do Estado!
Finalmente a cláusula 25.a, alterando as disposições da lei geral, estipula que todas as divergências suscitadas entre o Governo e a sociedade, não só sobre a execução ou sobre a interpretação das cláusulas na concessão, mas sobre qualquer ponto omisso nas mesmas cláusulas (e há tantos!), serão decididos por árbitros nomeados por cada parte, substituindo assim a acção, dos tribunais civis!
j Decisão de árbitros a que pode deixar de obedecer a sociedade, sem o pagamento da devida indemnização, como se vê pela cláusula 20!
Demonstrado, como fica, que os interesses do Estado não foram acautelados mas alienados, não há possibilidade de justificar um bill de indemnidade. Mas vejamos o valor do seguinte con-sideranclo: «15.° Que o Governo, que aprovou a concessão na melhor das intenções, ouviu não só o Conselho Superior de Obras Públicas, mas também todas as outras instâncias oficiais citadas, as quais deram o seu parecer favorável». O considerar que certas instâncias oficiais foram ouvidas e deram os seus pareceres,, favoráveis ou desfavoráveis, não tem valimento algum para que no Parlamento se proponha um bill de indemnidade ao Governo que fez uma concessão ilegal e prejudicial aos interesses do Estado. A lei, ao determinar simplesmente que sejam, ouvidas «as estações oficiais, não obriga o Governo a conformar-se com os respectivos pareceres ou informações, as estações oficiais são responsáveis, perante o Governo,, pela forma como procedem no exercício das suas funções, mas os actos do Governo, baseados, ou não, em pareceres ou informações, são da sua única e inteira responsabilidade. Também se deve acentuar, em abono da verdade, que as instâncias oficiais não foram ouvidas sobre a concessão, como se pode inferir do considerando, isto é, sobre o que o Governo concedeu nas cláusulas do respectivo decreto, mas sim sobre o pedido da concessão, o que é muito diferente.
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Em resumo, a ilegalidade a os prejuízos dos interesses do Estado não resultam dos pareceres das instâncias ouvidas, mas sim, única e "exclusivamente, das cláusulas estabelecidas num decreto, que não é da responsabilidade dessas instâncias, mas do Governo que o referendou.
Contudo, vejamos o grau de exactidão da afirmativa de que todas as instâncias oficiais citadas deram o seu parecer favorável.
As instâncias oficiais citadas no decreto da concessão são: . I) — Conselho de Administração do Porto de Lisboa; .
II) — Conselho de Administração dos Caminhos de Ferro do Estado ;
III)—Direcção dos Serviços Hidráulicos;
IV) — Procuradoria Geral da Kepú-blica;
V) — Conselho do Estado Maior do Exército; •
VI) — Conselho Superior de Obras Públicas.
I) — Parecer do Conselho de Administração do Porto de Lisboa
Acentua que o plano de obras apresentado pelos concessionários não pode «pretender senão dar uma idea do que se pensa realizar» e posto que tecnicamente não haja objecção a fazer no que por em-quanto ó apresentado com relação ao novo porto, a questão tem de ser encarada por outro lado.
Diz que o porto do Montijo poderá vir a ser um concorrente ao que actualmente se chama o porto de Lisboa, porque as • actuais instalações da margem norte são susceptíveis de melhoramentos que lhe aumentarão a capacidade e serão estendidas desde Santo Amaro ao Bom Sucesso e desde Santa Apolónia ao Poço do Bispo, e assim dar-se há satisfação a um tráfego muito mais importante do que o actual, prevendo-se entre o Beato e o Poço do Bispo «a construção cê instalações para embarque de minérios e para desembarque e embarque de carvão», que terão de ser servidas pelas vias férreas da margem do norte.
Que as áreas destinadas a entrepostos na margem norte serão largamente aumentadas, embora se não possa prever a
disponibilidade de terrenos que seja possível destinar a estabelecimentos industriais que pretendam utilizar-se das vantagens das zonas francas.
Que o porto do-Montijo absorverá uma parte do movimento que afluirá à margem norte quando efectuados os projectados melhoramentos e ampliações, o que se deve realizar dentro de pouco tempo.
Que a concorrência do porto do Montijo far-se há também sentir com o projectado Aporto franco que o Estado tem pensado fazer construir no Alfeite.
Que, pelas razões expostas, e porquo razões de outra ordem aconselham a que esteja nas mãos do 'Estado o nosso primeiro porto, o de Lisboa —que é um todo de que o Montijo é um dos elementos— entende o Conselho de Administração do Porto de Lisboa que:
«De preferência a qualquer outra solução, .seria para desejar que o mesmo Estado tomasse a seu cargo a execução das obras a que os requerentes se referem, e a sua exploração directa ou indirecta, ou daquelas que um estado mais detalhado do assunto aconselhasse como convenientes, e suficientes para se alcançar os fins que eles têm em vista. Ficaria assim o novo porto do Montijo, sendo uma das partes do pOrto de Lisboa, subordinado à sua administração, cuja jurisdição seria até ele ampliada».
Termina o parecer, dizendo que na hipótese, porém, de ser feita a concessão, entende o conselho que não devem deixar de ser impostas as três seguintes condi-çdes :
«et) A- de a empresa ou companhia que os requerentes constituírem ser «exclusiva e genuinamente portuguesa», para o que só deve poder emitir «acções nominativas» que não seja permitido serem Q propriedade» senão «de indivíduos portugueses».
b) A de as tarifas a vigorar no novo porto não serem estabelecidas sem ser ouvida a Administração do Porto de Lisboa.
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E acrescenta:
«Como V. Ex.a muito bem c.ompreen-de, são de grande importância estas três condições, não havendo necessidade de se justificarem, tam óbvias elas são, sobrelevando, porém, a da indicada na alínea a), pois se não for possível que o porto de Lisboa esteja, em todo o .seu conjunto, nas mãos do Estado, deve ao menos nas suas partes componentes, em que tal se não verifique, estar nas mãos de entidades portuguesas.
O contrário poderia ser origem de grandes inconvenientes, embaraços e prejuízos futuros, tanto mais que se trata dum órgão vital na vida e na economia do país, como é o porto de Lisboa».
<_ que='que' exposto='exposto' quo='quo' do='do' concessão='concessão' mais='mais' deram='deram' instâncias='instâncias' assunto='assunto' se='se' moutijo='moutijo' favorável='favorável' logo='logo' parecer='parecer' oficiais='oficiais' modo='modo' certamente='certamente' primeira='primeira' à='à' como='como' a='a' pronuncia='pronuncia' seu='seu' e='e' é='é' todas='todas' o='o' p='p' sobre='sobre' importante='importante' as='as' afirma='afirma' instância='instância' consultada='consultada'>
E é de notar que a alínea a), tam preconizada no parecer, foi adulterada na cláusula l.a do decreto da concessão, onde apenas foi transcrito o termo «genuinamente portuguesa», omitindo-se precisamente a condição que o definia, isto é, que as acções fossem nominativas e só pertencentes a portugueses !
Compreende-se que o porto de Lisboa quisesse ser ouvido sôb.re as tarifas do novo porto (alínea b), para evitar que estas lhe fizessem concorrência. E para que não se suscitem dúvidas, diz-se nessa cláusula que se deve tomar mais em consideração «que as tarifas nunca sejam superiores às estabelecidas para o porto de Lisboa». Este parecer, einfrora curto, bastaria por si só para o Governo repudiar a idea de conceder o porto do Montijo a uma sociedade quo pode ser estrangeira (por deliberação do próprio Governo!) e origem de «grandes inconvenientes, embaraços e prejuízos futuros», como muito bem diz a Administração do porto de Lisboa! II) — Parecer do Conselho de Administração dos Caminhos de Ferro do Estado Diz-se neste parecer, mais curto ainda do que o antecedente, que não lhe compete informar . acerca das vantagens da criação dum novo porto comercial em Lisboa, mas que o assunto interessa aos Caminhos de Ferro do Estado, dada a situação desse projectado porto, , «que se tornaria a testa da rede ferroviária do Sul e Sueste». Que o Conselho aplaudiria a «criação» do porto do Montijo «se essa obra não colidisse com outras que esta administração se propõe efectuar em prazo curto, e para o início das quais já está habilitada com os créditos necessários». Esclarece que vai ser construída a «estação de Cacilhas», que será, sem contestação, o «verdadeiro porto da região trans-tagaua», com vastas instalações para carga e descarga de carvão e de minérios, e terraplenos para mercadorias de grande e pequena velocidade, e acrescenta que, «se por einquanto», o porto do Montijo não causa danos aos Caminhos de Ferro do Estado, pode causá-los de futuro se a administração se vir impossibilitada de fazer as obras projectadas ein Cacilhas. E, embora não oponha embargos ao pedido da concessão, acha necessário que, para salvaguarda dos interesses dos Caminhos de Ferro do Estado, ela não. prejudique quaisquer obras que a administração dos mesmos Caminhos de Ferro, em inteira liberdade, se propõe efectuar para realizar no Tejo a Verdadeira gare marítima da rede ferroviária do Sul e Sueste. Como só vê, encara-se neste parecer a concessão do Montijo apenas sob o ponto de vista de estação dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, «que se tornará a testa dessa rede do Estado», não aplaudindo essa obra por colidir com outras a efectuar pelo Estado em Cacilhas, em curto prazo, .e para cujo início já se acha habilitado com os créditos necessários.
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ploração duma testa marítima das linhas do Estado, ~indo o mesmo Estado construir «cutra testa marítima das masmas linhas e no mesmo porto de Lisboa» !
E pondo em evidência que a concessão colide com os altos interesses do Estado, (j Que importa que na cláusula 5.a do decreto da concessão se estipule que ela é feita sem prejuízo de quaisquer obras que a Administração dos Caminhos de Ferro do Estado entenda dever realizar para o objectivo do estabelecimento da sua gare terminus no Barreiro ou em Ca-cilhas, se as condições naturais do Mon-tijo e as especiais da sua exploração, conforme as cláusulas do decreto, tornarão esse porto de facto, embora não o seja de lei, a verdadeira gare marítima das linhas do Estado? Muito se devem rir os concessionários com essas cláusulas, que, não os preju dicando absolutamente em nc,da, representam apenas uni capricho do Estado em fazer uma gare marítima legal, concedendo a uma sociedade particular o estabelecimento duma gare de facto a fazer-lhe vantajosa concorrência! III)—Informação do inspector director dos Serviços Hidráulicos Esta informação foi elaborada considerando o objecto da concessão pedida como compreendido nas disposições da Organização dos Serviços Hidráulicos e dos artigos 260.° e 267.° do respectivo regulamento de 19 de Dezembro de 1892. Contudo, era cumprimento do disposto no § 1.° do citado artigo 267.°, o pedido da concessão não poderia- ter seguimento por lhe faltarem elementos essenciais, tais como a planta parcelar em triplicado, era escala nunca inferior a 1:1000, do loc&l onde se pretende executar a obra, com todos os detalhes convenientes, e dos alçados, perfis e cortes necessários para conhecer e apreciar a referida obra. E é para lastimar que se deixasse ds fazer cumprir essa essencial disposição, porque dessa falta derivam todas as importantes omissões que se notam na concessão ! O chefe da Divisão Hidráulica do Tejo, na sua informação, confirmada pelo ins- pector director dos Serviços Hidráulicos, diz: E depois de acentuar o importante papel que um porto comercial - desempenha no desenvolvimento das regiões por ele servidas e na economia geral, diz: «Além disto, as condições excepcionalmente favoráveis, «únicas no Tejo», que reúne a parte da margem em questão para a instalação dum porto, aconselham a que a sua alienação se não faça «sem as mais sérias garantias». A concorrência que irá fazer ao actual porto de Lisboa, desviando dos seus cais mercadorias que nele entrariam, poderá vir afectar e prejudicar a sua natural evolução. Por estes motivos entendo, pois, «que o Estado d everia de preferência tomar a seu cargo a construção e exploração do pôr-to, que ficaria constituindo uma dependência- do actual porto de Lisboa. Esta seria a solução preferível». S a isto que se chama um parecer favorável à solução oposta adoptada pelo Governo ? Formula depois a hipótese de o Estado encontrar dificuldades financeiras para construir o porto comercial do Montijo.
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de sete anos, segando a cláusula 10.a do decreto da concessão.
Mas partindo dessa hipótese, diz a informação que nesse caso, e com o intento de não entravar o desenvolvimento geral, o Estado pode fazer essa concessão :
«Subordinando-a, para a salvaguarda dos interesses públicos, às condições seguintes :
à) A companhia deverá ser constituíd^ com capitais genuinamente portugueses;
6) Que, finda a concessão, todas as dependências e bemfeitorias passarão para a posse do Estado ,
c) O Estado reserva-se o direito de resgatar a concessão quando por motivo de conveniência pública o julgar conveniente;
d) Impor a conclusão das obras, no todo ou por troços, dentro de prazos de antemão fixados, sob pena do pagamento de multas;
e) Fiscalização do sistema de tarifas».
Pois nem mesmo na hipótese formulada este parecer é favorável, como se afirma no considerando, ao que foi estipulado no decreto da concessão!
Na alínea a) exige-se que o capital da sociedade concessionária seja português, como já fora proposto pela Administração do porto de Lisboa, e o decreto logo na cláusula 1.° pôs de parte essa tam importante condição!
Em vez de se exigir, alínea b), que, finda a concessão, passariam para a posse do Estado todas as dependências e bemfeitorias dentro da área ocupada pelo porto, que abrange «todos os terrenos e aterros a que se refere a concessão», (como foi esclarecido na mesma informação), pela cláusula 8.a só uma reduzida parte dessas dependências e bemfeiíorias é que passará à posse do Estado.
Em vez de se estipular, alínea c), o direito do Estado ao resgate logo que o julgasse conveniente, sem dependência de prazos, direito expresso na mesma lei que serviu de base às expropriações (!), na cláusula 23.a estipularam-se condições altamente prejudiciais ao Estado, contrárias à lei, e favorecendo em extremo os interesses dos concessionários.
A simples comparação das indicações do plano das obras com os dizeres do decreto, na parte em que o aprova, e das
cláusulas 2.a, 10.a e ll.a, mostra que se praticaram importantes omissões, não sendo exigida a conclusão de todas as obras em prazos de antemão fixados, como o preceituado na alínea d).
E, para que a discordância seja total, a fiscalização do sistema de tarifas, preconizada na alínea e), foi transformada, como já se viu, pela cláusula 17.a, em subordinação da nossa autonomia sobre o principal porto do país, a um prévio acôr-' do com administrações estranhas e estrangeiras.
j E bem evidente, quam extraordinária, é a afirmativa feita no considerando de que se fez a concessão com o parecer favorável "de «todas» as instâncias oficiais que foram ouvidas!
Finalmente a informação, referindo-se aos terrenos submergíveis, pertencentes ao Estado, diz que u lei geral estabelece «que os terrenos do Estado só podem ser concedidos por arreadamento ou venda, e, em qualquer dos casos,.em hasta pública», mas é de opinião que, no caso presente, esses terrenos deverão ser objecto duma concessão especial (o que, evidentemente, exigiria uma lei também especial para revogar a lei geral), segundo a qual os terrenos seriam temporariamente cedidos à empresa durante o prazo da concessão, «recebendo o Estado como compensação as obras neles existentes quando expirasse o prazo da concessão».
l Como já se viu pela análise da cláusula 8.a, uma grande parte dos terrenos do Estado, cedidos sem autorização legal (!), não voltam à posse do Estado,' e menos ainda as obras que neles existirem, em compensação da sua cedência para a exploração!
O inspector director dos Serviços Hidráulicos, na sua informação, confirma a do director da Divisão Hidráulica do Tejo, pouco lhe restando acrescentar «ao que por ele, com bom fundamento, é afirmado».
(? Como se pode, pois, afirmar que as instâncias oficiais deram os seus pareceres favorável? ao decreto da concessão?
g E a que fica reduzida, quanto ao Governo, «a prova do seu zelo e patriotismo?».
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cos diz que ao projecto «melhor se chamaria esquema ou esboço», j E é um simples esboço que o Governo considerou como projecto-base duma concessão!
E, para se ver quam escuro é esse «projecto», diz a informação haver nele «uma linha de cais segundo o esteiro que corre ao «longo do lado sul de Aldega-lega, mas nenhuma referência se faz, parecendo que tal linha corresponde a uma previsão de possíveis desenvolvimentos futuros, caso em que, mesmo com a despesa, sem dúvida grande, da dragagem para abertura dum fundo canal de acesso e ao longo daquele esteiro, tal obra seria justificada—se não é este o seu fim, «porventura traduz tal linha ds cais apenas a intenção de», incluídos na concessão apesar de se prever que não será nunca necessário executá-los, c assim servirem para se evitar que outra empresa possa estabelecer-se no esteiro com cais que possam tornar-se concorrentes dos primeiros o. Como quere que seja, para a nossa apreciação não há, nem num nem noutro caso, que tomar em linha de conta os mencionados cais».
j E é a um esboço deste género,, com linhas a que se não faz referência, parecendo corresponder a cousas que poderão estar ou não previstas, ou podendo traduzir intenções reservadas, que o Governo câama projecto, e o aprova para determinar a expropriação" por utilidade pública e urgente, e fazer uma concessão — epara cousas omissas!».
Sobre outra linha de cais, a informa-. cão, fazendo conjecturas acerca da sua adaptação à linha dos grandes fundos do canal, termina assim:
«Isto, segundo informação, pois que a planta hidrográfica que acompanha o esboço abrange apenas uma pequena extensão daquele canal».%
j A informação põe assim claramente em evidência a falta de elementos essenciais nuin projecto de obras tam importantes como são as dum porto, mas tudo se aprova pressurosamente, sabendo-se ou devendo saber-se que, para qualquer obra nos leitos dos rios, o § 1.° do artigo 267.° do Regulamento dos Serviços Hidráulicos exige a apresentação duma planta em triplicado, compreendendo uma
parte do curso de água a montante e jusante do local da obra!
j E deve-se»notar que, mesmo, essa deficiente planta apresentada pelos requerentes ó uma cópia dum trabalho ainda inédito do Ministério da Marinha, sendo, pois, para estranhar que pudesse aparecer como documento num pedido de concessão!
Acerca dos pequenos fundos do canal de acesso ao porto do Montijo, defeito que mais se acentuará no futuro, a informação diz:
«Para a resposta a esta questão não contêm os documentos que acompanham o requerimento dados suficientes».
Sobre a área da concessão diz que, sendo proximamente de 2:360 hectares para 4:800 metros de cais,
«constitui uma enormidade a pVofundida-de média de zona servida de quási 4:920».
Acerca, dos entrepostos indicados no esboço, diz:
«Parece-me manifesto o «exagero» da área dos 250 hectares que lhes é atribuída».
apesar de ter admitido a hipótese de ali se estabelecer um regime de «porto franco», para o que o porto do Montijo oferece facilidades,
cisto uma vez que não se inclua dentro dele a «nova vila comercial».
Sobre a central eléctrica diz:
alsão se fixa a área do terreno necessário para esta instalação, nem a potência que deverá ter, mas deve ser considerável, atendendo a que não terá de servir somente para os aparelhos'propriamente do porto, mas para todas as indústrias o.ue nele venham estabelècer-se».
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Continuando na análise do pedido dos concessionários, diz :
«Além das partes do porto acima enumeradas, o «eshôço» contém mais a nova vila comercial, para 'a qual se destinam 270 hectares. Não se compreende bem a razão por que nas obras que os requerentes se propõem levar a efeito se inclua como de «interesse público» a vila comercial ; em meu entender não constitui ela parte essencial do porto e, por isso, não devem os terrenos para ela necessários ser abrangidos pelo direito de expropriação por -utilidade pública a conceder aos requerentes para o que seja necessário «para o porto».
Parece que neste particular o intento dos requerentes seja o de que, na medida do possível, reverta integralmente para eles o produto da valorização que a obra do porto necessariamente há-de trazer para os terrenos da zona contígua.
Quando se manifeste vida intensa e necessidade de alargamento nas povoações mais próximas por efeito da muita população que no porto trabalhe ou que a ele aflua para ali executar operações comerciais, os terrenos próximos delas aumentarão extraordinariamente de valor e os concessionários, que os terão expropriado pelo seu valor actual «poderão vendê-los com grandos lucros».
A operação seria, na essência,o equivalente á serem tributados nas rendas das casas os habitantes da nova vila, «revertendo o produto desse imposto para os concessionários do porto».
Não direi eu que seja absolutamente injustificada uma tal operação, pois que ó a valorização dos terrenos fruto da iniciativa e do capital dos concessionários,— mas, uma vez que fosse praticada, logo resultaria não poderem os concessionários afirmar, «como em quanto requerentes afirmam», que nada pedem ao Estado; e, sobretudo — e ó este o ponto que julgo bem dever acentuar, — «uma tal operação seria manifestamente contrária ao espírito da lei das expropriações, de 26 de Julho de 1912».
Nesta lei, para os casos períeitamente análogos da expropriação de terrenos e construções para obras que tragam aumento de valorização da propriedade na zona urbana onde tais terrenos e cons-
truções estejam, se estabelece a comparticipação do expropriante e do expropriado no dito aumento de valorização.
Ora é o que se não daria no caso que estou considerando, parecendo-me por isso, «além de desnecessário/ilegal», que se torne ex-tensiva a expropriação por utilidade pública dos terrenos destinados à nova vila comercial.'E até me não repugna admitir que «o mesmo seja entendido quanto aos terrenos destinados ao bairro operário», o qual, se algumas vantagens oferece em que fique, digamos, dentro do recinto do porto,- também oferece «inconvenientes não pequenos», parecendo-me por isso preferível que. fique próximo, sim, mas «fora deste recinto».
E, depois desta informação, o Governo aprova no decreto o «esboço» a que chama projecto, onde vêm indicadas as construções dessa «vila comercial» e do «bairro operário», e no considerando que estamos analisando afirma-se que a concessão tem o parecer favorável de «todas» as instâncias oficiais l
Nota ainda a informação, «para se reter como mais importante», o seguinte:
«Ligados (por meio do ramal de Aldeia Galega) os Caminhos de Ferro do Sul e Sueste com o porto do Montijo, fica este sendo «o verdadeiro terminus marítimo», sobre o porto de Lisboa, da rede ferroviária ao.sul do Tejo».
E, depois de mostrar que nem o Barreiro nem Cacilhas satisfazem àquele fim, acrescenta:
«O porto do Montijo, especialmente pela vastidão dos terrenos que podem considerar-se seus terraplenos, oferece condições altamente vantajosas para nele se estabelecerem as indústrias, digamos, de porto franco, de certos produtos coloniais e, porventura, do Brasil, indústrias de grande importância «internacional»; e, a par destas, outras indústrias de valor regional da maior importância para a economia do País».
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tado, e a do estabelecimento da indústria de «porto franco», contrariamente ao disposto na lei reguladora duma tal concessão!
Apreciando os termos em que a concessão foi pedida, diz a informação:
«Não são «estes termos bem precisos», abrangem, sob certo ponto de vista, «mais ' do que o necessário», sendo por outro lado «omisso», parecendo-me por isso que devem ser interpretados e modificados tendo-se em vista que os termos da concessão dada, «quando o venha a ser, não ofereçam dúvidas, não sejam omissos» pelo meãos no que é essencial e que «não abranja» a concessão «mais do que» em bom direito e em boa razão «deva ser concedido».
Ora basta ver as cláusulas do decreto para surgirem imediatamente dúvidas e omissões em pontos essenciais.
E, continuando a mostrar o exagero da pretensão dos requerentes, diz:
«Sendo, pois, a minha informação no sentido de que os terrenos na península do Montijo a incluir na concessão para ò efeito de, sobre eles, os concessionários poderem exercer o direito de expropriação por utilidade pública urgente, fiquem limitados a leste pela linha N-S, verdadeira tirada pelo moinho de vento da Quinta da Praia, situada a nordeste da povoação do Samouco,...».
j Pois em vez de se tomar a linha indicada para limite leste da concessão, o que já era enorme, tomou-se uma outra, dando muito maior extensão aos terrenos a expropriar!
i E diz-se que se fez a concessão com o parecer favorável de todas as entidades oficiais que foram ouvidas!
Observa a informação que, entre as obrigações «omissas» nos termos do requerimento, mas a acrescentar no diploma da concessão, se inclua a de que todas as sub-concessões, arrendamentos ou quaisquer outros contratos relativos a terrenos, construções ou material do pôr-to, sejam previamente submetidos à aprovação ao Governo, «não devendo nunca os prazos de tais contratos exceder o da concessão».
i Pois na cláusula 18.a «omitiu-se i esta última parte, que limitava o prazo de tais contratos!
Pelo considerando conclui-se que todas as estações oficiais foram favoráveis a que se concedesse a uma sociedade a construção e exploração do porto.
Ora na informação formula-se a seguinte pregunta: «Não carece o Governo, para resolver, de nenhuma informação, pois é ele que melhor conhece se as condições financeiras do País permitem ou não a execução da obra por administração directa ou empreitada, ou se preferível é recorrer ao processo da concessão». i Como se vê, o director dos Serviços Hidráulicos diz que o Governo é que sabe se pode executar a obra ou se é preferível recorrer a uma concessão. O Governo resolve fazer uma concessão e diz-se depois que a fez com o parecer favorável do director dos Serviços Hidráulicos ! E seguidamente, chamo a atenção do Governo para um ponto importantíssimo que lamentavelmente «ninguém considerou,», nos seguintes termos : «Alétn do ponto de vista financeiro, há a considerar «nesta questão o ponto de vista político», mas ainda neste, eu-entendo que não compete a esta direcção informar». Pois parece que não competiu a ninguém estudar o assunto sob esse aspecto! - ^No caso de se estabelecer que haja concessão, pregunta o informante, pode a concessão legalmente ser feita por um decreto, ou carece de lei especial ? E responde : «Não há que eu conheça nenhuma disposição legal reguladora da categoria do diploma das concessões de que estamos considerandon. Ora o Governo só pode decretar em cumprimento da execução de leis, e não, arbitrariamente, substituir-se ao Poder Legislativo.
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artigo 10.° da lei n.° 5:787-1111, de 10 de Maio de 1919, e lei de 26 de Julho de 1912, -ouvidas as estações competentes, deverá por um «decreto do Poder Executivo, ser feita a escolha do local» para o porto do Montijo com os limites para a zona de servidão do mesmo porto» o que importa a declaração de utilidade pública urgente para o efeito da expropriação dos terrenos particulares necessários àquele uso.
E acrescenta :
«Por efeito do decreto da concessão que ao decreto da escolha do local se seguir, «ficará legalmente transferido para o concessionário» o direito de expropriação por utilidade pública sobre os terrenos da zona concedida, «direito que ao Estado pretence» nos termos dos diplo-, mas legais acima citados, artigos 9.° e 10.° dó decreto de 10 de Maio de 1919, e lei de 26 de Julho de 1912».
Ora para que, segundo esta informação, se fizesse «legalmente a transferência do direito do Estado »opara os concessionários, era necessário um decreto de concessão autorizado por uma lei. j E precisamente o que se não fez, juntando-se a «escolha do local» e a «concessão» num mesmo decreto que, tendo força para a primeira não a tem, por falta de lei, para a segunda!
A informação, formulando a pregunta: « «Por analogia porém, com outros casos como este de grande importância e muito semelhantes, como sejam os de aproveitamentos da água para a produção de energia quando excedem I0:000cavalos-vapor entende quê «pode o concurso ser ordenado pelo Ministro». Opinando pois, por analogia, pelo concurso público, a informação indica segui- damente as principais condições a atender na elaboração do caderno de encargos como base de concurso, e mui criteriosamente acentua que «o concurso não pode ter por base unicamente os projectos», pois que deve competir às administrações,' — Governo ou corporações administrativas— fixar o plano de obras de utilidade pública, salientando as grandes vantagens -provenientes da administração poder escolher as melhores disposições que cada prejecto contenha, embora mediante prémios ao seu autor. Assim se procedeu com as obras do porto de Lisboa. E finalmente diz a informação que, para afastar os concorrentes «especuladores de concessões», deve fixar-se no caderno de, encargos a obrigação de um forte depó-4 sito de garantia à ordem do Governo, mantido pelo concorrente preferido, pelo menos até que a concessão entre em franca exploração, podendo então ser reduzido ao mínimo indispensável, afastando o concorrente que não seja sério, por efeito do risco que corre de o perder a favor do Estado, quando suceda não ter meios de realizar a concessão ou de não encontrar a quem a traspasse. j Como se vê pelo decreto da concessão o Governo não quis as vantagens de um concurso público, que aliás a lei claramente estipula para a concessão dos por-to's francos, não se conformou com a exigência de um forte depósito de garantia, como nesta informação lhe foi sugerido, estabelecendo na cláusula l.a que o depósito definitivo será levantado logo que haja trabalhos executados de valor igual ao dobro do seu quantitativo, e por consequência independentemente da entrada em franca exploração, não se reduzindo esse depósito ao mínimo indispensável, mas anulando-o, e nem sequer exigiu que 'todas as obras ficassem constituindo garantia do contrato mas, bem pelo contrário, estatuiu *na cláusula 20.a que, quando os concessionários não quiserem cumprir as obrigações da concessão, ser--Ihes há entregue o preço de arrematação das obras !
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IV—Parecer do conselho superior de Obras Públicas
Apreciando a proposta dos requerentes, (e não as condições estabelecidas na con-cessc^o), este conselho considerou-a sob 4, aspectos :
1.° Económico e financeiro;
.2.° Construção e exploração directamente pelo Estado ou cedidas à indústria particular;
3.° Técnico;
4.° Jurídico e legal.
1.° Sob o ponto de vista económico e financeiro da proposta, diz o parecer que
«o simples confronto, sem crítica, que fazem os requerentes entre o movimento comercial dos principais portes europeus e o do porto de Lisboa não é suficiente para demonstrar que é simplesmente à falta de espaço ou de conveniente apetrechamento do porto que deve atribuir--se a exiguidade do seu movimento comercial e principalmente no tocante ao comércio de trânsito».
E continuando na refutação das asserções dos requerentes, indica as condições especiais dos diversos portos estrangeiros por eles citados, e põe em evidência que
«não existem no nosso País, regiões de intensa produção agrícola, industrial ou mineira que constituam centros de alimentação de consumo comparáveis com os que têm produzido o considerável incremento do tráfego que se nota naqueles importantes portos comerciais europeus».
Analisando .as condições (ia região transtagana, diz que
«não podomos contar que o simples estabelecimento de um porto marítimo, mesmo acompanhado de uma ampliação de rede ferroviária, possa produzir um rápido incremento na riqueza-da região».
Relativamente a
«o desenvolvimento do hinterland dos portos espanhóis que os requerentes apontam como nocivo para o incremento do comércio português, não tem ele em nossa parecer a gravidade que se pretende atribuir-se-lhe:».
Especifica as condições dos portos espanhóis e'diz que
«nunca se pôde imaginar que a esfera de acção desses portos se pudesse estender até abranger parte do território por-
tuguês».
Todavia,
«o sul da província de Badajoz e o norte da de Huelva, não caracterizados por uma grande fertilidade de solo, mas parece que contêm um sob-solo de grande riqueza mineira»,
podem ser servidos pelos portos de Ca-diz ou de Huelva ou também pelo porto de Lisboa, e pregunta:
«c,Constituirá o aproveitamento dessa região o principal objectivo da proposta contida no requerimento?
Como se vê, o Conselho Superior de Obras Públicas, depois de refutar os argumentos dos requerentes, põe em evidência a falta de clareza do fim da sua pretensão e diz:
• «As considerações que anteriormente expusemos do carácter da lentidão que oferece o desenvolvimento da região transtagana, a firmeza com que os requerentes asseveram o aumento de tráfego que provirá da «aceitação da sua proposta*, e principalmente o grande dispêndio das obras que declaram comprometer-se a executar»,
«compromisso que não se estabeleceu no decreto de concessão»
«e (que só para o seu início computam que se elevará a cerca de õ:000 contos), fazem presumir que não são as considerações apresentadas, que apreciámos, as que constituem o essencial motivo determinante da proposta, mas que este consistirá principalmente -. no seu intuito de aproveitar a riqueza mineira da citada região».
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região citada não agradará a Espanha que naturalmente deseja ver os seus portos sempre triunfantes na rivalidade com os portugueses,
«mas a apresentação da proposta nos termos em que é feita, «faz prever que haja negociações entabulados enaO Espanha» ; e a comunhão de interesses de empresas que às vezes se associam para determinados fins de utilidade pública, ven-. cem resistências e conseguem frequentemente mais, do que a simples acção go-vernativa».
E depois de tudo isto, diz o parecer que «a proposta sob este aspecto» mere cê favorável acolhimento, o que de modo algum pode significar voto favorável às cláusulas do decreto da concessão que são desastrosas sob esse mesmo aspecto.
2.° Sobre a utilidade ou desnecessidade de fazer no Montijo uma ampliação às instalações do porto de Lisboa, diz o parecer que o âmbito para as instalações do porto de Lisboa indicado pela comissão de íl883 era muito mais vasto do que o ocupado1 pelas actuais instalações do porto, donde resulta que estas são insuficientes para o movimento comercial, sendo certo que com o empréstimo já autorizado para a execução de diversas obras e equipamento do pôrto> a administração do porto informa que serão estabelecidas instalações para carvões e minérios «que são as mercadorias com cujo tráfego parece que principalmente contam os requerentes para valorizar a ampliação do Montijo» ficando também aumentadas as áreas para entrepostos.
E diz ainda o parecer:
«A facilidade do aproveitamento de amplas áreas na vasta planície do Montijo para a instalação de estabelecimentos industriais, constitui na opinião deste Conselho Superior, uma das maiores senão a mais importante vantagem da ampliação proposta».
Acrescenta que, se em 1883 se não fez referência a instalações marítimas na margem esquerda do Tejo, foi porque se contava com maiores áreas a conquistar na margem direita em grande parte des-
tinadas aos estabelecimentos industriais. E terminando, diz:
«De resto a construção de algumas obras no Montijo poderá dispensar ou reduzir a construção e respectivo dispêndio de algumas instalações já projectadas mas ainda não executadas, na margem direita do rio»..
O que se conclui pois deste parecer é que o Montijo oferece vantagens para ali se proceder à ampliação do porto do Lisboa, sendo económico conjugar as obras a efectuar na margem direita com as que forem necessárias-construir no Montijo.
E é este o objectivo do artigo 2.° do meu projecto de lei.
Sobre a vantagem ou inconveniência dessa ampliação ser construída e administrada por uma sociedade particular, diz o paracer que o Conselho de Administração do Porto de Lisboa é de opinião que a terem de ser executadas instalações no Montijo seria preferível «que a sua construção fosse feita pelo Estado» e que a sua administração fosse directa ou indirectamente subordinada á sua jurisdição, que entende dever ser alargada abrangendo não só as margens mas também o rio que entre elas corre.
O Conselho Superior, como era de esperar, não impugna a avantagem do Estado construir a ampliação do seu principal porto comercial, e com respeito á ampliação de jurisdição lembrada pelo Conselho de Administração dó Porto de-Lisboa, diz:
«Conselho Superior plenamente de acordo a respeito da -sua conveniência e entende até que essa ampliação não se deve limitar à extensão da área em' que ela tem de èxercer-se, mas deve estender-se também aos serviços que devem estar subordinados à sua gerência. O fraccionamento do serviço do porto (pilotagem, polícia, conservação, visitas aduaneiras, iluminação, etc.) por autoridades diversas só causa embaraços ?o comércio, origina demoras e provoca frequentes rivalidades inconvenientes entre os poderes das autoridades dos portos».
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porto de Lisboa a uma entidade estranha, que pode ser «genuinamente» estrangeira, porcue nem ao menos ss quis perfilhar a primeira das três condições que o Conselho de Administração do porto de Lisboa, entendeu que não deviam deixar de ser impostas, na hipótese de ser feita a concessão, e que era a única garantia da empresa representar interesses portugueses !
3) Sob o ponto de vista técnico, o Conselho Superior, pondo em evidência que na margem esquerda do rio a parte compreendida entre a Trafaria e o Montíjo não'é susceptível de um conveniente aproveitamento para a ampliação do porto de Lisboa, diz:
«Ao contrário, a planície do Montijo em situação relativamente próxima do centro comercial de Lisboa, é circundada na parte noroeste, pelo fundo canal de Samora, e oferece uma ampla área plana, própria para o estabelecimento de indústrias; e é este, como já dissemos, o carácter que mais faz sobressair s. vantagem da sua utilização para uma «ampliação do porto de Lisboa».
£ Com que critério se pretende entregar a estrangeiros essa posição única para a amplidão do nosso porto de Lisboa'?
Deve-se notar que os requerentes não apresentaram um projecto de obras, mas,, como já foi notado anteriormente, apenas desenho ou rápido esquema de cousas vagas, que nem deveria ser recebido nas estacões oficiais como base de pedido de uma simples licença para pequenas obras, por lhe faltarem os requisitos especificados no regulamento, e só por um «excepcional» acolhimento pôde ser objecto de pareceres oficiais!
O próprio Conselho Superior de Obras Públicas, referindo-se ao desenho submetido ao seu parecer, classifica-o do seguinte modo: «uma planta intitulada plano de obras e de melhoramentos a rediz ar no Montijo para o estabelecimento áe um porto comercial».
Depois de notar a insuficiência das sondagens hidrográficas, refere-se i'i simples indicação de obras a fazer e diz:
«Também no «desenho» se representa uma linha a marginar a parte sul da pe-
nínsula, até a Vila de Aldeia Galega «e que tanto poderá representar um cais como um revestimento da margem» ; mas nem no requerimento, nem na memória se faz qualquer alusão a estas obras e por isso as não consideramos».
Pois apesar disso, o Grovêrno aprovou o desenho que os concessionários lhe apresentaram, com a tal linha que, em ocasião oportuna, eles dirão o que repre-senta!
E é tudo tam impreciso, que o parecer, ao referir-se às considerações técnicas a atender para o estabelecimento de um porto marítimo, diz:
«São muito deficientes os elementos locais conhecidos para que possa fazer-se a apreciação rigorosa das condições das obras propostas».
Pondo mais em evidência a falta de elementos de estudo da proposta, diz o parecer:
«Quanto a dificuldades e dispêndio com as obras (assunto este que seria para nós de principal, importância se se tratasse de uma construção a efectuar pelo Estado), «não pode este Conselho Superior emitir opinião», porque não estão feitas sondagens que indiquem a constituição geológica do terreno em que as obras terão de assentar; e quanto a fundações, os requerentes apenas na estimativa contida na memória «formularam a hipótese de serem as pontes acostáveis assentes sobre estacaria de "cimento armado ou em ferro».
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Nota o parecer que no requerimento dos concessionários só se faz designadamente referência ao Porto Comercial e Marítimo, mas que na planta se indicam
«instalações que este Conselho Superior entende que não devem ser compreendidas naquela designação».
tais como:
«o estabelecimento de uma vila, as linhas férreas que não sejam necessárias para o serviço interno e sua ligação com a viação geral; o estabelecimento de um bairro industrial; o de um bairro operário, na parte que compreenda habitações que não sejam destinadas para os operários daqueles serviços».
Não obstante esta observação do Conselho Superior, o Governo aprovou a tal planta onde vêm indicadas as instalações que não devem ser compreendidas no porto comercial.
E assim o Governo, apesar de devidamente informado, «aceita e aprova o subterfúgio dos requerentes», concedendo (ilegalmente como já vimos) a estrangeiros o direito de expropriar, por utilidade pública, terrenos destinados a obras não consideradas de utilidade pública pela lei •das respectivas explorações!
Pretenderam os requerentes expropriar a vasta planície do Montijo. Como obtê--lo? j Dizendo que todo o terreno se destinava a um porto ! ; Governo e pretendente acordaram! Tudo se concedeu! -"
Continua o parecer:
«Na parte referente ao porto marítimo, que é a que nos compete apreciar, e que designamos Estabelecimento Naval do Montijo, compreendem: cais de embarque e desembarque com os respectivos terraplenos ; «mas propõe-se o adiamento da sua construção, fazendo-se provisoriamente a sua substituição por pontes acostáveis até que se intensifique o tráfego» ;
e partindo da hipótese que há o intuito de executar as obras por modo progressivo (tendo mesmo algumas o carácter provisório) com o fim de se poder iniciar
rapidamente a exploração do porto, diz que :
«só nestas condições pode ser aceito o sistema transitório das pontes avançadas, aplicável a um tráfego restrito e concentrado; mas que, entre outros inconvenientes, oferece o das dificuldades de acostagem para os navios «sendo muito para desejar, que se não faça esperar muito a época do começo da construção dos cais» que aliás não está designada, no requerimento nem na memória».
j Pois pelas cláusulas do .decreto -da concessão nada se exigiu sobre o começo da construção dos cais acostáveis que poderão ser ou deixar de ser construídos !
i Quere dizer : exige-se a expropriação de terrenos porque se destinam à construção de certas obras, feita a expropriação; não se exige a construção das obras que justificavam á expropriação daqueles terrenos !
Finalmente, diz o parecer que «se não fosse imposta a urgência do início da exploração das obras», a disposição geral projectada não mereceria a aprovação do Conselho Sueperior, e acrescenta:
«A disposição indicada está longe de conformar-se com a que é recomendada como mais conveniente, e que tem sido geralmente adoptada nos. portos que podem dispor de uma extensa linha de cais...»
j Todavia, o plano pôde ser aceito !
4) Depois de se ocupar do aspecto técnico do plano geral ou esboço, pois não foi apresentado um projecto de obras, diz o parecer:
«Há ainda, acerca da proposta, alguns assuntos a considerar, mas para a apreciação dos quais não tem este Conselho Superior de Obras Públicas competência especial. Dará porém sobre elas algumas informações que . porventura poderão ser utilizadas para a apreciação competente, ou para as negociações que acaso tenham de ser estabelecidas acerca dela».
Informando sobre o pedido dos requerentes, diz :
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tinados ao estabelecimento naval; 2i terrenos destinados à instalação do uma vila, de uni bairro operário e de um bairro industrial; 3) terrenos cujo destino não está designado".
O Conselho Superior abrangeu a denominação de estabelecimento naval, os cais de embarque e desembarque, com os respectivos terraplenos, os aparelhos para os serviços de carga e desccrga sobre os cais e pontes, a estação de mercadorias, locais para entrepostos, central eléctrica, oâcinas de reparação de material e locais para diversos serviços acessórios.
Considerando todos estes elementos como partes constitutivas dos portos comerciais e como otais necessários para o exercício da indústria dos transportes, diz o parecer: «por isso tem-se considerado sempre (?) que a aprovação do projecto das obras inclui implicitamente a faculdade de expropriação por utilidade pública» B.
Note-se mais uma vez que GS requerentes não apresentaram um projecto de obras, mas um simples esboço de côa sãs vagas e imprecisas como o próprio Conselho Superior pôs em evidência, o que a expropriação por utilidade pública está regulada pela respectiva lei, que apenas a concede ao Estado ou aos corpos administrativos.
Acerca dos terrenos destinados às instalações de uma vila e de um bairro operário, diz o parecer:
«Há a considerar a questão legai e jurídica de poderem ou não os terrenos ser expropriados por utilidade pública, e, no caso afirmativo, de quanto e por que forma pode ser restringido o direito d E, propriedade individual».
Quanto ao bairro industrial e comercial :
«Parece necessário, além do que fica dito para a vila e bairro operário, aclarar-se também se os requerentes pretendem utilizar os terrenos para directamente exercerem o comércio ou a indústria, ou simplesmente para os arrendar» .
E quanto aos terrenos cujo destino ulterior não está designado, o Conselho Superior foi de opinião:
«Que não há razão alguma que possa alegar-se para justificar a sua expropriação por utilidade pública.
J ulga este Conselho Superior de Obras Públicas que, só depois de esclarecidas e resolvidas estas questões relativas a expropriações, se poderá fixar definitivamente na planta a área que tenha de ser compreendida na concessão».
j Pois apesar deste parecer, o Govêr- Sobra o pedido dos requerentes para que a concessão seja feita nos termos dos n.os 4.° e 5.° do artigo 2.° da lei de 26 Julho de 1912 para o efeito, da última parte do artigo 4.° da mesma lei, diz o parecer: o O n.° 4.° do artigo 2.° só pode ser aplicável ao caso de no porto haver «zonas francas»; e será bastante a indicação única do n.° 5.° se se tratar de um porto «em que n£o haja aquelas faixas» onde as manipulações e transformações das mercadorias carecem de ser feitas com todas as precauções da fiscalização aduaneira para serem evitadas as fraudes. Nem no requerimento nem na planta se faz referência a zonas dosta espécie, e por isso, este Conselho Superior de Obras Públicas julga que nãc estão elas compreendidas no pedido feito; «mas entende também que este assunto deve ser esclarecido, sendo dê parecer que a indicação daquele n.° 4." não deve ser compreendida no contrato que «porventura» haja de fazer-se».
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Pois apesar da clareza da informação, o Governo resolve, «contrariamente ao parecer do Conselho Superior de Obras Públicas, não esclarecer esse assunto, mas sim manter intacto o subterfúgio da indicação daquele n.° 4.° no decreto da concessão, tal como convinha aos interesses dos concessionários!
E em vista disto, com que verdade se afirma que a concessão teve o parecer favorável de «todas» as estações consultadas?
(j E a que fica reduzida a dignidade do Poder Exec«tivo, declarando no decreto que se conformou com o parecer do Conselho Superior de Obras Públicas, quando se verifica que procedeu «contráriamente» •ao mesmo parecer?
No seu requerimento, pediram os concessionários que lhes fosse concedido a construção do porto comercial com todas as instalações e dependências necessárias, na península do Montijo, «tudo conforme o indicado no projecto junto» ao requerimento, «projecto» que, como se sabe, é apenas um simples esquema ou esboço, conteúdo traços sem designação do que representam (como já foi notado neste parecer), e designações tam vagas que as estendem a um «etc.».
Mas, para que lhos ficasse bem assegurada a expropriação da vasta planície, não se contentaram com o pedir a aprovação do tal «projecto» nos termos dos n.05 4.° e 5.° do artigo'2.° da lei das expropriações por utilidade pública, e acrescentaram: «e para os efeitos da última parte do artigo 4.° da mesma lei», que estabelece que, dada a aprovação aos «projectos de obras» e empreendimentos, «fica ipso facto feita a verificação e declaração para os casos de expropriações previstas nos n.os 1.° a 10.° do artigo 2.°» =
Sobre este ponto diz o parecer:
«Para a apreciação competente da parte do pedido que se refere à aplicação da última parte do artigo 4.° da citada lei, tem este Conselho Superior de Obras Públicas a informar que, nos termos em que foi apresentado o «trabalho» dos requerentes, «o não considera como um projecto definitivo».
E por consequência, chama-se a atenção do Governo para a circunstância de
um tal «trabalho» não bastar para a verificação e declaração de expropriações, pois embora possa haver exemplos de s orem previamente aprovados planos ou ante-projectos de «obras de viação», que servem de base à confecção e aprovação de projectos definitivos apresentados posteriormente, nem o esquema apresentado é um ante-projecto, nem as complexas obras de que se trata são do género das de viação, nem o artigo 4.° da lei das expropriações se refere à aprovação de planos ou ante-projectos, ocupando-se única e exclusivamente de projectos.
Pois o Governo, apesar da informação do Conselho Superior de Obras Públicas, «com cujo parecer diz que se conformou», decretou a concessão nos termos preconizados pelos requerentes.
Referindo-se ás obrigações que os requerentes se propõem contrair, o parecer informa:
«Que se indica algumas vezes nos contratos o montante do capital social das sociedades concessionárias, e que é da praxe definirem-se na concessão as cláusulas e condições que garantam os legítimos direitos e interesses do Estado, no tocante à organização e funcionamento dos corpos gerentes das sociedades que os concessionários constituam».
l Pois nem se exigiu que a sociedade se constituísse com capitais portugueses, como propuseram estações oficiais, nem ao menos se atendeu a esta informação!
Relativamente ao começo de construção das obras, o Conselho Superior reputa conveniente:
«Que a época do início dos trabalhos seja referida à data da concessão e não à da apresentação dos projectos definitivos, como algumas vezes se tem feito, dando essa prática origem a delongas e inconvenientes ».
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Não se encontram designadas em qualquer cláusula as obras que constituem o primeiro grupo, e a cláusula 11.a diz:
«Que os projectos definitivos das diversas obras não compreendidas no primeiro grupo serão apresentados à medida qae se manifestar a sua necessidade».
Ficando por consequência a sua execução dependente desta última circunstância.
jCorc que zelo foi este assunto tratado!
Finalmente, acerca da pretencão dos
concessionários para apresentarem suces-
- sivamente os projectos definitivos das
diversas obras à medida das necessidades;
diz o parecer:
«Que em algumas concessões em que se admite que a construção e exploração se façam progressivamente e por etapas, se faz depender o início das etapas da importância, que se fixa, do tráfego ou rendimento a atingir, e que este sistema parece conveniente para a fixação da época em que deve efectuar-se a substituição das pontes pelos cais acostáveis».
Pois no decreto da concessão não se especificaram 'as obras de cada grupo a construir por etapas, permitiu-se que a apresentação de projectos definitivos ficasse dependente da manifestação da sua necessidade, e nada se exigiu sobre a substitmçãc das pontes provisórias pelos cais acostáveis I
l E diz-se que a concessão se fez com o parecer favorável de todas as estações cons altadas!
V) — Parecer da Procuradoria Geral - da República
Como vimos, a Administração do Porto de Lisboa foi contrária à concessão do porto do Montijo a uma empresa particular; a Administração dos caminhos de Ferro do Estado não apoiou uma tal concessão; a Direcção dos Serviços Hidráulicos opina pela construção e exploração por conta do Estado, e na hipótese da concessão a particulares, formula as condições principais a atender na elaboração do caderno de encargos para ser
feita a concessão, mediante concurso público, e entende que a expropriação não não deve abranger toda a área requerida, o Conselho Superior de Obras Públicas também acha exagerada a área pedida. n£o concorda com os termos do pedido da concessão, propõe restrições, e não se considera competente para apreciar as condições de carácter jurídico e legal.
Nem tanto era preciso para que se considerasse prejudicada a pretenção dos requerentes, e fosse adoptada pelo Governo a única solução, defensora dos interesses do Estado, lógica e legal.: autorização parlamentar para construir e explorar, por conta do Estado, as obras julgadas necessárias no Montijo como ampliação do porto de Lisboa e como terminus das linhas do Sul e Sueste.
Mas, eis que surge um curioso despacho do Sr. Ministro do Comércio, onde se torna manifesto o desejo de que a Procuradoria G-eral da República consulte no sentido de poder ser feita a concessão sem concurso público, sugerindo-lhe.até o fundamento para essa orientação!
Eeza assim o despacho:
«A construção e exploração de um pôr-to comercial no Montijo a que se refere o adjunto projecto requerido pelos cidadãos José Francisco da Silva, Augusto da Silva Carvalho, Joaquim Nunes de Morais, João Alexandre Lopes Galvão e Carlos Luís Ahrends, constitui pelo seu objectivo «uma obra do mais alto alcance económico nacional, cuja iniciativa e execução deveria pertencer ao Estado, se em face da situação económica e financeira do País o mesmo Estado podesse tornar praticável e exequível tam grandioso plano.
Não deve porém, o Estado, «porque por circunstâncias de ordem superior o não pode realizar», impedir a realização das grandes obras de fomento tam necessárias à vida da nação».
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Sessão de í de Agosto de 1924
pelo modo mais conveniente aos interesses nacionais?
Quem -autorizou o Ministro a afirmar que «circunstâncias de ordem superior» impedem o Estado de realizar uma tal obra, quando o Parlamento, que posteriormente votou um crédito de 30:000 contos para o porto de Leixões, não negaria 0:000' contos para realizar «essa grande obra de fomento», para cuja construção se concedeu aos requerentes «o prazo de seis anos!
Mas continua o despacho:
«Independentemente de novas cláusulas que, porventura, possam ser aditadas para . salvaguarda ou melhor garantia dos legítimos direitos nacionais, «resta considerar» a hipótese da construcção e exploração do porto projectado ser dada por meio de «concessão a uma einpêsa» ou companhia-a constituir.
Nestes termos, a doutrina dos n.08 4.° e 5.° do artigo 2.° e do artigo 4.° da lei sobre expropriações por utilidade pública de 26 de Julho de 1912 pode ser «considerada» como matéria legal suficiente» para habilitar o Poder Executivo a fazer tal «concessão sem concurso público, com o fundamento da criação de um grande reforço do património nacional (pois que de facto para o Estado reverterá após o termo da concessão, ou antes, quando as conveniência nacionais nos termos da lei aconselhem o resgate) toda a grande ob'ra a realizar?
Em caso afirmativo, o princípio da expropriação 'por utilidade pública «pode e deve abranger toda a área requerida» a que se refere o mesmo projecto?
A Procuradoria Geral da República submeto esta importantíssima consulta, aguardando o seu douto parecer.—Aníbal Lúcio de Azevedo, Minisrro do Comércio e Comunicações».
Como se vê no despacho, pregunta-so se uma certa lei pode ser considerada como «matéria legal» suficiente para o Governo fazer aquilo de que a mesma lei se não ocupa (concessões), sugere-se um «critério» para que a consulta seja favorável à concessão sem concurso público, e .'pergunta-se se um princípio de direito abrange uma área de terreno!
Acerca dos dois pontos sobre que foi consultada, diz a Procuradoria Geral no seu parecer:
«O primeiro consiste em saber-se se a.doutrina dos n.os 4.° e 5.° do artigo 2.° da lei de 26 de Julho de 1912 pode ser considerada como matéria legal suficiente para habilitar o Poder Executivo a fazer tal concessão sem concurso público, visto tratar-se da criação de um grande reforço de património nacional pela grande obra a realizar.
Vejamos:
A lei de 26 de Julho de 1912 com grande largueza de vistas e vizando os mais altos interesses nacionais, determinou que fossem consideradas de utilidade pública e urgente as expropriações necessárias para defesa militar, segurança e salubridade públicas, fomento da riqueza nacional, viação pública, expansão urbana, industrias, melhoramentos e serviços de iniciativa do Estado e dos corpos administrativos e salvaguarda do património artístico.
Especificou a mesma lei o que deve conter-se adentro daquelas expressões e no seu artigo 4.° dispôs que os. projecto* de obras e empreendimentos que determi-,nem tais expropriações seriam aprovados* pelo Governo ou pelos municípios de Lisboa ou Porto, conforme os casos e que, dada a aprovação, fica ipso facto feita a verificação e declaração de utilidade pública para as expropriações previstas nos n.os 1.° a 10.° do artigo 2.°
Resta saber se o projecto das obras e empreendimentos sob consulta estão ou não compreendidos em alguns ou algum dos números do artigo 2.°
Trata-se da construção e da exploração de um porto comercial com todas as instalações e dependências necessárias.
Não falando, como não fala, de «zonas para portos francos», não pode considerar-se compreendido no n.° 4.° do artigo 2.°».
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trariando Í*MS e pareceres, mas bene-icinn-do os concessionários!
Vê-se, e ver-se há ainda, que dos pareceres só se utilizou o que aproveita1;a aos concessionários ou o que não faria, os seus interesses.
Não é pois verdadeiro o considerando de que a. concessão foi feita com o nare-cer favorável das estações consultadas, como nào o é a afirmação no docrtco cê que o Governo «se conformou» com o parecer da Procuradoria GenJ da Ltepú-blica!
Mas continua o parecer :
«Mas acha-se ao abrigo de n.3 5.° do mesmo artigo, visto que este número sob a rubrica a Viação pública» compreende os portos.
«E asbiin teremos que, sendo consideradas de utilidade pública e urgente as expropriações necessárias para o, construção e exploração de portos, ao Governo compete aprovar o projecto de tal obra e empreendimento, ficando coice s sã a provação iptío facto reconhecida e declarada a utilidade pública das expropriações necessárias à mesma obra.
«E, pois, meu parecer que nos termos da lei de 26 de Julho de 1912, o Governo pode fazer a concessão e sem necessidade de concurso público».
Eis a resposta à primeira prrgunta do despacho ministerial, satisfazendo com-pletamente £0 desejo manifestado, e até sem recorrer ao fundamento que o mesmo despacho sugerira!
Não podia, por consequência, o Governo deixar de conformar-se com esta [arte do parecer, fazendo a concessão e seia concurso público.
Mas, o Governo conformando se com esta parte da consulta, aceitou como boa a doutrina expendida. Posto que já demonstrássemos (pp. l e 2), que o decreto da concessão é um abuso do Poder Executivo, e salvo o devido respeito à alta instância consultada, analisemos os termos em q::e s. questão é posta.
Vai ver->o como no próprio parecer da Procuradoria Geral da República se demonstre, claramente que o Gcnêruo r.Ho pode fazer a concessfto pedida nos tormos da lei de 26 de Julho de 1912:
JE mester não confundir «construção de
portos» com «exploração de portos». São duas operações diversas, mui distintas na sua acção e fins, e completarnente independentes.
Mngiéni decerto confunde a construção de am prédio ou o fabrico de um par de botas com a sua habitação ou o seu uso!
Pode o Estado construir um porto por administração directa ou por empreitada, e em qualquer dos casos explorá-lo directamente, com administração mais ou monos autónoma, ou conceder a outrem a sua exploração.
Pela construção do porto, o Estado debita-se; pela exploração, credita-se.
A concessão da exploração é um contrato de locução ou arrendamento, cujo preço ou renda pode consistir em certa soma de dinheiro, ou em qualquer outra cousa, certa e determinada, que o valha.
O Estado concedendo a uma empresa à construção de um porto, contraiu uma dívida para com essa empresa.
,;Pode o Poder Executivo contrair dívidas do Estado, som lei que o autorize? Não pode, evidentemente. Logo, a concessão da construção do porto exige uma lei especial que a autorize. Compete privativamente ao Congresso fixar a despesa da República.
O Estado concedendo a uma empresa a exploração do porto, arrcnda-o pela fornia regulada pela legislação administrativa, e obtém receita, quer em dinheiro, quer em cousa que o valha.
,;Pode o Poder Executivo dispor dessa rpceita para fins não orçamentados, nem legalmente autorizados, como é a construção do porto? Não pode, evidentemente.
Compete privativamente ao Congresso regular n administração dos bens nacionais.
Logo a concessão da exploração, embora como contrapartida da construção do porto, é uma operação que só pode sor efectaada com a devida autorização parlamentar.
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tèessâo de i de Agosto de 1924
No caso presente ninguém a invoca, porque não existe, e daí aquela atribulação do despacho ministerial procurando apoio na Procuradoria Geral da República!
Anulada a pretensão de retinir em uma só duas operações, por sua natureza distintas, vejamos os termos da consulta., •
Como muito bem diz o parecer da Procuradoria Geral da República, a lei das expropriações de 26 de Julho de 1912 especifica as obras e empreendimentos que podem determinar a expropriação por utilidade pública.
O objectivo da lei é mui claramente expresso no seu
«Artigo 1.° As expropriações por utilidade pública regular se hão pela presente lei e demais disposições que por ela não forem revogadas».
Pela lei geral, o direito de alienação é inerente à propriedade, e ninguém pode ser obrigado a alhear ou não alhear, senão nos casos e-pela formy declarados na lei (Código Civil, artigo 2359.°).
Mas ' pode o proprietário ser privado da sua propriedade em cumprimento de obrigações contraídas para com outrem, ou ser expropriado dela por motivos de utilidade pública.
Os casos em que ó permitida a expropriação por motivos de utilidade pública, e o modo de a reduzir a efeito, são regulados por legislação especial (Código Civil, artigo 2360.° e seu § único).
A lei de 26 de Julho de 1912 é, pois. a que especialmente regula os casos em que é permitida a expropriação, e o modo de a reduzir a efeito.
Pelo seu artigo 2.° são consideradas de utilidade pública e urgeute todas as expropriações necessárias para diversos fins designados e enumerados de l a 10, especificando em cada número o que é abrangido na sua designação.
d.Mas, quem verifica se uma dada obra está compreendida em algum dos casos especificados nos n.os 1.° a 10.° do artigo 2.°, e por que modo se declara a utilidade pública e urgente da expropriação necessária para essa obra?
É o objecto do seu
«Artigo 4.° Os projectos de obras e empreendimentos que determinem as ex-
propriações nas áreas dos municípios de Lisboa e Porto serão aprovados peio Governo ou pelos municípios conforme aquel-le ou estes sejam os expropriantes.
Nas restantes cidades e vilas importantes do continente, das ilhas adjacentes ou das colónias, os projectos das obras ou empreendimentos serão aprovados pelo Governo, no prazo máximo de três meses, ouvido o parecer do Conselho Superior de Obras Públicas e Minas. Dada a aprovação, fica ip^o facto feita a verificação e declaração para os casos de expropriações previstas nos n.os 1.° a 10.° do artigo 2.°
Resta saber, como muito bem diz o parecer, se o projecto de obras e empreendimentos sob consulta está ou não compreendido em alguns ou algum dos casos especificados no artigo 2.°
Ora como vimos, o projecto abrange duas operações distintas: a construção de um porto, e a sua exploração, que não estão de facto compreendidas no n.° 4.° do artigo 2.°. e acrescenta o parecer:
«Mas acha-se ao abrigo do n.° 5.° do mesmo artigo, visto que este número sob a rubrica «Viação pública» comprende os portos,».
Vejamos o que diz este número:
«õ.° Viação pública: construção, melhoramento e alargamento de estradas, portos e canais».
A exploração do porto não está compreendida neste número nem em qualquer outro.
Não é, pois, um dos casos em que é permitida a exploração por utilidade pública, nem podia sê-lo. Para construir o porto, uma estríida ou um canal, pode ser necessário adquirir a propriedade particular onde tal construção se efectue, mas a exploração é já o usufruto dessa obra no exercício das suas funções.
Ninguém pode introduzir na lei um caso que nessa mesma lei não está especificado.
O parecer indicando o modo exacto de proceder, no procedimento enganou-se.
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Diário deu Settôet ao Senado
E rião se conclua do disposto no artigo 4.° da lei, que ao Governo cciapete aprovar todo e qualquer projecto.de obras e empreendimentos que determinem expropriações por utilidade pública. ; Tal conclusão seria um absurdo! , £ Porque compete ao Poder Executivo contratar, realizar, empréstimos e outras operações de crédito, fazer a guerra, etc., em nome do Estado, conclui-se que pode exercer essas funções sem autorização do Poder Legislativo? Evidentemente, não. E a ele, e só a ele, que compete a execução do mandato ou resolução do Poder Legislativo, e nada mais.
Assim, para que se possa expropriar por utilidade pública, é indispensável que o projecto das< obras que determinem a expropriação seja aprovado pelo Governo nos casos da sua competência.
Mas para que a aprovação possa ser concedida, é por sua vez indispensável que esse projecto de obra e empreendimento não envolva compromissos, para os quais o Poder Executivo não esteja autorizado.
E se assim não fosse, não faltariam pretextos, à sombra dos numerosos casos justificativos de expropriação por utilidade pública, para o Governo realizar empréstimos e outras operações de crédito, alterar a despesa fixada pelo Congresso, etc., desrespeitando a Constituição!
A simples leitura do artigo 4.° da lei, acima transcrito, mostra claramente que só o Governo ou os municípios são os expropriaates por utilidade pública, e não qualquer particular.
No caso presente o. expropriante é o Governo.
A lei só se ocupa dub casos que, por motivos de utilidade pública, justificam o direito de expropriação pelo Governo ou pelos municípios, e o modo de verificação e de declaração.
Logo não há que citar os termos dessa lei na resolução de um assunto qae lhe é estranho. ,; A construção de portos é um dos casos expressos na lei das expropriações? E um dos casos expressos no n.° 5.° do artigo 2.° Logo se o Governo acha conveniente a construção de um porto no Montijo, e concorda com o projecto de obras a construir para esse fim, aprova o projecto, e ipso facto, fica verificado e declarado que por motivo de utilidade pública e urgente tem o Governo o direito de expropriar os terrenoi particulares necessários à construção das obras projectadas. E nada mais do que isto. (j Pretende o Estado traspassar os seus direitos de expropriante? O modo de transmissão desses direitos, bem como o modo de efectivação das obras, são assuntos completamente alheios à lei das expropriações por utilidade pública, e por consequência não é nela que se encontram fundamentos para outorgar concessões e privilégios de qualquer'natureza, mesmo que sejam para a exploração de serviços de utilidade pública. Em resumo: 1.° A exploração de portos não está compreendida nos casos mencionados na lei das expropriações; 2.° A aprovação do proiecto de obras de construção de portos, caso mencionado na lei das expropriações, apenas dá ao Estado o direito de expropriar os terrenos necessários a essa construção; 3.° A concessão, a urna empresa, do direito de expropriação, exclusivo do Estado, bem como o contrato e sua forma para se efectivar a construção, são assuntos completamente estranhos à lei das expropriações. Vê-se, pois, que não tem fundamento legai o parecer de que «nos termos da lei de 26 de Julho de 1912, o Governo pode fazer a concessão e sem necessidade de concurso público». Procurando justificar-se, continua o parecer : N «E osta minha opinião firma-se ainda no disposto no artigo 3.° da mesma lei que diz a que fica reservada às entidades adjudicantes a faculdade de resgatarem as concessões e previlégios por elas outorgadas para a exploração do serviços de utilidade pública, urna vez que o resgate seja declarado de interesse público^. Este artigo tem de interpretar-se eni harmonia com os antecedentes e consequentes artigos da mesma lei sem o que nela só acharia deslocado.
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vemos ou os municípios, que tenham dado concessões ou previlégios para a exploração de serviços de utilidade pública nos termos da lei de 26 de Julho de 1912, podem resgatá-los nos termos do artigo 3.° e seu § único. E nem na lei citada nem em qualquer outra aplicável se fala em concurso público, mas sim em aprovação, pelo Governo ou pelos municípios, das obras ou empreendimentos. Empreendimentos não são só as obras, mas estas acompanhadas dos fins que têm em vista. O empreendimento, exemplifiquemos no caso em questão, é a construção e a exploração.
Logo o Governo pode dar a concessão pedida *sern necessidade de concurso público» .
Esta conclusão é ilegítima como já vimos, mas pretende-se agora firmá-la no disposto no artigo 3.° da lei das expropriações.
Analisemos pois a nova argumentação.
.Como muito bem diz a Procuradoria Geral no começo do seu parecer (vide p. 44), a lei de 26 de Julho de 1912, com grande largueza de vistas e visando os mais altos interesses nacionais, determinou que fossem consideradas de utilidade pública e urgente as expropriações necessárias para determinados fins, que vêm especificados no artigo 2.°
Mas este artigo 2.° refere-se apenas a obras e empreendimentos «a efectuar», tornando-se por isso necessária e urgente a prévia exploração.
Evidentemente, os serviços de - utilidade pública «já em exploração» não podiam ter cabimento nos casos especificados naquele artigo 2.°
Há porém serviços de utilidade pública cuja exploração é propriedade particular. A concessão e privilégio da exploração de serviços de utilidade pública pode fazer-se a particulares «por adjudicação», segundo as disposições legais aplicáveis. -
Mas pode o interesse público exigir que num dado momento o Estado readquira a exploração desses serviços, e se não tiver sido imposto ao adjudicatário um compromisso nesse sentido, ele só poderá ser privado dessa propriedade por disposição da lei que especialmente regule os casos em que é permitida a expropriação por motivos de utilidade pública.
Para isso, a lei das expropriações de-. termina no seu
«Artigo 3.° E reservada às entidades -«adjudicantes» a faculdade de resgatarem as concessões e privilégios por elas outorgadas para a exploração de serviços de utilidade pública uma vez que o resgate seja declarado de interesse público.
«§ único. A declaração de interesse público será feita pelo Poder Legislativo ou pelo referendum dos eleitores da respectiva circunscrição administrativa conforme o expropriante for o Estado ou os Corpos Administrativos».
j E precisamente porque «este artigo tem que interpretar-se em harmonia com os antecedentes e consequentes artigos da mesma lei», como preconiza o parecer, é que^não há forma de entender-se que «o Governo ou os municípios tenham dado concessões ou privilégios para a exploração de serviços de utilidade pública nos termos da lei de 26 de Julho de 1912»!
,; Pois se a lei é especialmente destinada a regular as expropriações por utilidade pública, como declara no seu artigo 1.°, só admitindo como expropriantes o Estado ou os municípios, como é possível interpretá-la de modo a inverter o seu objectivo, permitindo a transmissão de bens nacionais para particulares?
E porque a lei das expropriações não trata de concessões a particulares, mas sim da transmissão de certa e determina- • da propriedade particular para o Estado ou para os municípios, não há que falar nela, em concurso público, por inaplicável aos casos de que se ocupa.
Pela sua própria natureza, a lei de expropriações por utilidade pública é uma lei de restrições e não j Extraordinária é a conclusão de que o Governo pode fazer a concessão pedida, nos termos dessa lei, «e sem necessidade de concurso público», alegando que nem nessa lei nem em qualquer outra «aplicável» se falarem concurso público! Vejamos o valor desta alegação.
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O próprio artigo 3.° da lei de expropriações, citado no parecer, diz que o resgate das concessões é reservado às entidades «adjudicantes». Ora a adjudicação não é um simples deferimento ou aprovação dum pedido.
Pela lei. e pela razão, só é exproprian-te o Estado ou o Corpo Administrativo. No caso presente é o Estado. Pela expropriação passam os terrenos ao domínio do Estado.
Mas há mais. A concessão é um contrato entre o Estado e particulares, e o concurso público é uma das garautias exigidas pela, Administração do Estado para maior salvaguarda dos seus legítimos interesses.
E assim que, para «a adjudicação de obras o ou fornecimentos em geral, o capítulo IV do'Regulamento Geral de Contabilidade Pública intitulado «Concursos», «exigindo o concurso», estatui sôJ3re os respectivos anúncios prévios, sobre as condições essenciais de qualquer adjudicação, sobre a abertura das propostas e sobre as condições especiais do concurso.
Note-se, para bem evidenciar o «equívoco do parecer» de que o Governo pode fazer a concessão e sem necessidade de concurso, que pelo artigo 64.° do Regulamento Geral da Contabilidade Pública, nenhuma proposta de contrato provisória que tenha por fim a construção de estradas, caminhos de ferro, canais, docas, edifícios públicos, poderá ser apresentada ao Parlamento sem. que o mesmo contrato tenha sido feito por concurso público.
E é tam geral a exigência.do concurso público para a construção de obras, que as únicas restrições são as indicadas uo citado Regulamento Geral:
«Artigo 68 ° O preceito do concurso público não é aplicável no todo ou em parte:
1.° As construções navais feitas nos estabelecimento s do Estado.
2.° As obras que por. sua natureza e importância, não podendo estar sujeitas sem inconveniente a uma concorrência ilimitada, convenha por isso submetê-las a restrições que não admitam ao concurso senão pessoas previamente reconhecidas pelo Governo com os requisitos necessários para as executarem».
Como se vê, só é dispensado o concurso para as construções navais feitas nos estabelecimentos do Estado. Para quaisquer outras obras não é dispensado o concurso, mas apenas limitado, em casos especiais. •
Nem seria admissível que «um contrato de construção e de exploração dum porto» por 75 anos pudesse fazer-se sem autorizarão do Parlamento, quando pelo artigo 71.ó do citado Regulamento Geral, nenhum contrato definitivo de «simples arrendamento» de propriedade imobiliária pode ser celebrado «sem prévia autorização legislativa», quando a renda exceda 500$ anuais e o prazo do arrendamento a 3 anos!
; Vê-se pois que a lei geral da Contabilidade Pública, aplicável à concessão, não só fala em concurso público, mas exige-o !
£ A que fica reduzido o argumento de que nem na lei de 26 de Julho de 1912 nem em qualquer outra aplicável se fala em concurso público?
Continua o parecer:
«A lei de 26 de Julho de 1912 olhando ao interesse público procura facilitar os grandes melhoramentos, os empreendimentos de largo alcance ou de comprovada utilidade geral, animando e impulsionando as iniciativas particulares. Por isso não fala em concurso público, onde muitas vezes o iniciador, o criador duma idea, vê o seu trabalho e despesas perdidos em favor de um terceiro que nada criou e que se aproveita de esforços e da inteligência alheia. Colhe apenas os frutos do trabalho de outrem».
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transmissão de direitos do Estado ou de particulares para particulares.
Quanto às observações acerca de concursos, nada esclarecem a questão sob o ponto de vista legal, nem são de molde a aconselhar a sua anulação, mas podem ser judiciosamente atendidas no estabelecimento das condições do concurso, e com grande vantagem para a Administração do Estado, como propôs a Direcção dos Serviços Hidráulicos. (Vide p. 34). E num longo voo para completar a argumentação diz o parecer: «De resto as larguíssimas e importantíssimas concessões de terrenos para diversos fins nas províncias ultramarinas não são dadas por concurso». Nem as leis para o ultramar são aplicáveis à metrópole, nem essas concessões^ se destinam à construção e exploração de^ portos, mas sim a fins agrícolas, e estão subordinadas aos preceitos da lei geral de 9 de Maio de 1901, decreto de 30 de Outubro de 1902, e ainda a outras disposições legais referentes à cultura do algodão ou especiais para uma dada colónia. Este argumento não tem pois aplicação à concessão do porto de Montijo. O critério do parecer da Procuradoria Geral da República conduz à inconstitu-cionalidade de actos do Poder Executivo. Já o demonstrámos; mas podemos verificar nitidamente as suas consequências em um caso particular desta concessão. O parecer da Procuradoria Geral entendeu que o pedido da concessão não podia considerar-se compreendido no n.°4.° do artigo 2.° da lei das expropriações, porque nesse pedido não se fala de zonas para portos francos. Quere dizer, se no requerimento se falasse na construção e exploração de portos francos, estava o assunto compreendido nesse n.° 4.°, segundo o critério 'do parecer, e como opinou para a construção e exploração do porto, o Governo podia fazer a concessão da construção e exploração do porto franco em Lisboa e sem necessidade de concurso, argumentando do mesmo modo que nem na lei das expropriações nem em qualquer outra aplicável se fala em concurso público, mas sim em aprovação, pelo Governo ou peios municípios, das obras ou empreendimentos. Verifica-se aqui nitidamente o absurdo dum tal critério, porque apesar das zonas francas estarem compreendidas no n.° 4.° do artigo 2.° da lei das expropriações, há a lei de 12 de Junho de 1913 que especialmente regula esse assunto! No artigo 1.° desta lei exige-se o pia-; no completo das obras a executar com todos os seus detalhes. j Pelo critério do parecer, bastaria que no pedido se falasse em zonas francas! No artigo 2.° determina-se que o Governo faça adjudicar, por concurso, a construção e exploração do porto franco, não podendo- ela, em caso algum, exceder o prazo de 60 anos. Pelo critério do parecer não só se faria a concessão sem concurso, mas pelo prazo de 99 anos, como pediram os concessionários, pois que a exploração é um empreendimento que pode ser aprovado pelo Governo nos termos da lei das expropriações, e sem limitação de prazo, porque nela não se fala em prazos! E que a exploração não é um empreendimento cuja aprovação possa ser dada pelo Governo à sombra da lei das expropriações mostra-o claramente a doutrina do artigo 3.°, que fixa as bases em que o Governo é autorizado a fazer a adjudicação. Assim na 2.a base, estabelece-se: «Que1 o Estado «concederá» à empresa adjudicatária «o direito de exploração» do porto franco durante 60 anos, sem subvenção nem garantia de juros, mas cedendo gratuitamente os «terrenos» que forem precisos, «se pertencerem ao Estado, e garantindo a sua expropriação por utilidade pública se pertencerem a particulares».
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ÍHârío 'âas Sessões do Senado
É esta a sã doutrina. O contrário é lançar a Administração Pública na desordem, é o possível cometimento dos maiores abasos, ó violar a Constituição Política da República.
A aiie críticas situações nos poderia levar 11:11 G-ovêrno que adoptasse o critério da Procuradoria Geral sobre a lei das expropriações por utilidade pública., a que mais propriamente se deveria cãamar lei das expropriações dos direitos do Estado por utilidade particular!
Numerosas hipóteses poderiam formular-se acerca da série de obras P empreendimentos especificados no artigo 2.° da lei das expropriações, pondo em evidência as consequências daquele critério. Mas consideremos ainda o mesma assunto : portos.
Suponhamos que um grupo de indivíduos requere ao Governo paca que lhe seja concedido construir um pôrío coin vastas docas de reparação, oicinas, e te., etc., e sua exploração, por 99 anos, como base naval de uma potência estrangeira, citando, entre muitas vantagens que advirão ao Estado, a do «regueiro de curo» que afluirá ao porto.
Pelo critério da Procuradoria Geral. pode fazé-lo, sem dúvida alguma, nos termos da IPÍ a das -expropriações» por utilidade pública de 26 de Julho de 1912. o sem necessidade de concurso público, porque: 1.° O projecto da obra e empreendimento está ao abrigo do n.c 5.° do artigo 2.° dessa lei, que compreende «portos». 2.° Ao Governo compete a aprovação de tal obra e empreendimento. 3.° O artigo 3.° da mesma lei estabelecendo que às entidades «adjudicantss» fica reservada a faculdade de resgatarem as concessões e privilégios por elas outorgados para a exploração de serviços âe utilidade pública, deve entender-se (embora lá se não diga nem possa dodu7.ir-se) que essas concessões foram dadas nos termos da mesma lei de 26 de Jclho de 1912 (embora só trate de expropriações e não da outorga de concessões e privilégios). 4.° Nem na lei citada nem em qualquer outra aplicável se fala em concurso pú- blico, mas sim em aprovação pelo Governo das obras e empreendimentos (que determinem as expropriações). 5.° Deve éntender-se que (muito embora o n.° 5.° do artigo 2.° apenas determine a expropriação, necessária à construção de portos e não para a sua exploração] «empreendimentos, não são só as obras mas estas acompanhadas doa fins que têm em vista. O empreendimento, exemplifiquemos no caso em questão, é a construção e a exploração». (Não importa que competindo ao Governo a aprovação "dos empreendimentos que determinem as expropriações, ele também aprove os que não dete-minem expropriação alguma!). j E assim seria dada a concessão, com as cláusulas em que se acordasse, ficando ainda em reserva o ministerial fundamento da criação de um grande reforço do património nacional! Evidentemente que sim! j Uma dúvida, apenas, surgiria: a da Potência Estrangeira sobre as facilidades do Governo da República Portuguesa! O segundo ponto da consulta versa sobre se a expropriação por utilidade pública pode e deve abranger toda a; área requerida. Como vimos, (p. 38) a estação técnica competente—Conselho Superior de Obras Públicas — entendeu que não deviam0 ser compreendidas no Porto Comercial e Marítimo algumas instalações indicadas na planta, tais como: uma nova vila, certas linhas ferroas, bairro operário, que não seja exclusivamente destinado aos operários do serviço cio porto-, e o estabelecimento do bairro industrial. Estas restrições, evidentemente, contrariavam as aspirações dos requerentes. Sobre este ponto, diz o parecer:
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fere o projecto devem ser consideradas como próprias e necessárias a um porto comercial, e consequeatemeute a expropriação por utilidade pública deve abranger toda a área «que precisa seja para .tais fins.
«Entendo, porém, que deve exceptuar-se da área pedida a destinada à nova vila comercial. .Não se me afigura que uma vila para estranhos, que não para pessoal do porto, seja dependência necessária de um porto comercial, embora seja um me-melàoramento de alta importância».
Esta consulta tem a data de 28 de Abril de 1920.
É notável que em 26 do mesmo mês e ano os concessionários, alegando terem reconhecido que a área de terreno pedida para a construção de um bairro operário era insuficiente, requereram ao Ministro que lhes fosse permitido o alargamento desse bairro no local que no projecto primitivo se destinava a uma nova vila, ligando Aldeia Galega ao Alto da Conceição— precisamente a linha estipulada por eles, no pedido da concessão, como limite leste de toda a área pedida!
Os concessionários, como que sonhando a preparação de consulta que a 12 de Abril fora pedida, yiram que a designa-, cão de Nova Vila Comercial fazia-lhes perder terreno, e então lembraram-se de que não tinham atendido à necessidade de habitação para os agentes técnicos e pessoal superior da secretaria, e por isso pediam o alargamento da área destinada a bairro operário, designação mais segura!
jE veja-se quão sequiosos estavam pela aquisição da vasta região da península do Montijo!
Is ao se trata de obras qne justifiquem a expropriação dos terrenos necessários, mas sim da aquisição de determinada área de terrenos, recorrendo-se às designações , que expliquem a sua expropriação por utilidade pública!
Para justificarem o bairro operário, ao pedirem a concessão, disse-se:
«Para alojar o numeroso pessoal que trabalhe nas p.ontes e nos cais, nas oficinas «e em outros serviços da empresa», muito convém -construir um bairro operário em condições higiénicas e de-salubridade.
No presente plano «reserva-se um-área suficientemente grande» para â consa trução' desse bairro, e escolhe-se o local eminentemente próprio para-ele.
Em área, cobre ele cerca de 80 hectares, com possibilidade de um ulterior alargamento, se tal se tornar necessário».
No seu «plano», como eles próprios classificam, e «não projecto» como foi denominado pelo decreto para se abrigar na lei das expropriações, os concessionários talharam à sua vontade 80 hectares de terreno para a construção do bairro operário que deveria alojar o «numeroso pessoal» empregado em todos os serviços da empresa, e quando, antes de lhe ser dada a concessão, sentem periclitante a aquisição dos «200» hectares abrangidos pelo título de «Nova Vila Comercial», correm pressurosos a pedir que os «80» hectares do bairro operário sejam «alargados» com os «200» destinados a uma vila!
jE tudo isto «bem justificado» por um simples lapso de habitações para-os agentes técnicos e pessoal superior da secretaria!
j E uma ingénua amostra do que sucederia se esta concessão fosse efectivada! Ainda eram aspirantes a concessionários, e já davana esperançosas provas sobre aquela bem conhecida fase das concessões, pedindo, alterando, questionando e por vezes impondo, sempre confiantes na provável benevolência de • governantes, e nunca desatentos à meta: j exploração máxima do Estado!
Notado' este elucidativo incidente, volvamos ao parecer, para concluir.
Posto que se diga no decreto da concessão que o Governo se conformou com o parecer da Procuradoria Geral da Ee-pública, é se afirme no 15.° considerando do parecer das comissões que todas as instâncias oficiais consultadas deram parecer favorável á concessão, vê-se:
1.° Que, também «contrariamente» ao* parecer da Procuradoria Geral, incluíu-se na concessão «zona para porto franco», insistindo-se na citação do n.° 4.° do artigo 2.° da lei das expropriações.
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que a respectiva estação técnica entendera não devorem ser abrangidas, e entre elas a árec, industrial, sem se aclarar previamente, como propôs o Conselho Superior de Obras Públicas, o que pretendiam os requerentes acerca dessa área.
3.° Que, finalmente, mesmo que o Governo se tivesse conformado cora todo o parecer da Procuradoria Geral, não se poderia dizer que ele fora favorável à -concessão decretada, porque a consulta não versou sobre as cláusulas do contrato da concessão, das quais a 23.a «contraria» o disposto no artigo 3.° da lei das expropriações, artigo citado «ujssse parecer», e até põe em contradição o próprio Ministro perante o argumento de q u 3 se servira, ao pedir a consulta, de que a o grande reforço de património nacional reverteria para o Estado» no fim da concessão, ou, antes, quando as conveniências nacionais, «nos termos da lei», aconselhassem o resgate!
VI) Parecer do Conselho do Estado Maior do Exército
O Conselho do Estado Maior do Exército encara o pedido da concessão ape nas sob o ponto de vista restrito à influência que virá a ter na defesa do País, considerando:
1.° A influência imediata derivada da construção e exploração do porto no Mcn-tijo; e
2.° A influência futura, ou que derivará das modificações que virão a ser introduzidas na viação acelerada do nosso País e do País vizinho.
Como não se trata de um empreend;-mento e projecto de obras em que, de uma maneira clara, detalhada e insofismável, se ache definido corapleíameate tudo quanto se pretende fazer não só imediata mas posteriormente, único modo de se poder estudar o assunto sob todos os aspectos e emitir opinião segura acerca das suas consequências, o Conselho do Estado Maior do Exército teve de recorrer a sondagens de expressões, por vezes vagas, insertas na exposição dos requerentes, para reconhecer o fundo de cousas prováveis e consequentes.
Nunca devia ter seguimento nas repartições públicíis uma proposta em tais condições de imprecisão, exigindo-se logo
de início que os requerentes reduzissem a articulados tudo Oquanto pretendiam, acompanhando a sua proposta de um projecto completo das obras a executar, é" com os detalhes indispensáveis ao estudo om que se pudesse apoiar uma aprovação .de cousas'certas e insofismáveis.
Assim, posto que o pedido de concessão não compreenda qualquer alteração na rede de caminhos do ferro, o Conselho do Estado Maior faz r< spigar das peças do processo que essa alteração logicamente se efectuará, e nota que na exposição dos requerentes se faz referência a essas alterações que podem visar mesmo «as linhas do penetração».
Diz o parecer:
«Quom ler com atenção as diversas peças do processo reconhecerá que o porto a construir e a explorar em Montijo não se destina, exclusivamente, a servir a ré-giào transtágana portuguesa. Muito pelo contrário, todos os cálculos se baseiam no alargamento do comércio de trânsito, actualmente montando a insignificante'cifra.
Os concessionários contam, pois, levar a zona sorvida polo novo porto para alem fronteiras. E das importações e exportações espanholas que eles esperam obter resultados compensadores dos capitais empregados.
È de um rápido exame feito sobre a carta, à situação relativa do porto a cons--truir e ias linhas férreas construídas, ver-se há sem grande esforço que as mercadorias espanholas dificilmente serão para aquele porto canalizadas, atento o seu longo percurso por caminho de ferro (Eivas ou Marvão-Abrantes-Setil-Vendas Novas-Aldeia Galega, pois se elevaria extraordinariamente o seu preço.
De resto, na afirmação de que «inicialmente» o ramal de Aldeia Galega bastará para o movimento do porto, «implicitamente se inclui a intenção de um ulterior complemento».
Portanto de supor é que paralelamente à construção das pontes-cais se procure fazer qualquer ligação que encurte o trajecto entre a fronteira e o porto.
Será esta uma das primeiras consequências da exploração do mesmo porto e que consideramos incluída no n.° 1.°
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rações para concluir que modificações importantes hão-de sobrevir na viação acelerada a sul do Tejo; as próprias peças do processo o deixam ver com suficiente clareza.
«No requerimento dos concessionários, dizem eles: «dar facilidade aos nossos portos para que as mercadorias descarreguem e carreguem nas mais económicas condições possíveis e garantir o material circulante para que este transporte seja fácil ..e módico, entre os portos portugueses e as diversas regiões dentro da zona geográfica correspondente a cada porto, tal é o problema que nos propomos resolver.
Ora que a abundância de material circulante importa facilidades de transporte não há a menor dúvida; mas a sua modicidade só se obtém pela aplicação de baixas tarifas ou pelo encurtamento do percurso, quando não pelos dois meios combinados.
Não ficam porém por ,aqui as afirmações dos requerentes ; mais adiante dizem eles, referindo-se às mercadorias em trânsito para o país vizinho ou dali procedentes: «de modo que simplificados e barateados os processos de carga e descarga, alteradas as linhas de penetração onde seja conveniente...».
Como se vê, pensa-se não somente em encurtar trajectos no interior do nosso país; pensa-se em possíveis alteraçães nas linhas de penetração, num intuito muito provável de os encurtar igualmente até a nossa fronteira. .
Se alguma dúvida houvesse ao fazer estas deduções, os seguintes trechos da memória justificativa dos trabalhos a realizar desfariam por completo essas dúvidas.
Ei-los: «A zona marítima do porto precisa ser ligada à rede ferroviária do país. Nem de outra forma se compreenderia a sua função económica. O ramal de Aldeia Galega está naturalmente indicado para desde já assegurar essa ligação que, mais tarde, precisará ser ampliada com novas ligações em harmonia com os progressos que o porto vá tendo, e com as exigências que se forem evidenciando» ; e «a região transtaganá de aquém e de além fronteiras é um vasto território, capaz de um grande desenvolvimento comercial, industrial e agrícola, mas não dispõe nem
de vias de comunicação acelerada suficientes, nem de um porto capazmente equipado que sirva os seus interesses».
Destes dizeres ressalta claramente a previsão da futura construção de novas linhas tanto no nosso país, como no país vizinho, o que justifica as considerações apesentadas no n.° 2.°».
i Por aqui se vê que o empreendimento é bem mais vasto do que parece pelo decreto que aprova o tal projecto!
Ocupando-se seguidamente da influência que a construção e exploração de um porto no Moníijo pode exercer na defesa do país, o parecer mostra as vantagens do estabelecimento, na margem esquerda do Tejo, de facilidades para o rápido embarque e desembarque de pessoal, animais e material pesado, sendo as oficinas, depósitos e outras instalações do pôr-to outros tantos elementos de que em tempo de guerra nos deveremos poder servir, para constituir uma base secundária para as tropas operando ao sul do Tejo, partindo da hipótese que em tal caso o porto ,deve incondicionalmente ser utilizável para as operações militares, e conclui:
«Encarada porém, a questão sob este aspecto da utilização de material e de instalações, convém deixar consignado «que não é indiferente que a empresa á constituir seja ou não genuinamente portuguesa», tanto mais que o material ferroviário é destinado a circular em tempo de paz, talvez mais em território do inimigo provável do que no nosso.
«Aliás o Conselho de Administração do Porto de Lisboa fui levado no seu parecer a formular uma condição expressa neste sentido, «abstendo-nos nós de apreciar as causas que levariam o consultor do Ministério do Comércio a considerar como um desideratum, infelizmente irrealizável, que as obras projectadas fossem executadas e exploradas por conta ido Estado».
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nuínamente portuguesa, não como m decreto foi estabelecido, mas s:.:a como foi formulado pelo Conselho de Adrniaistra-, cão do Porto de. Lisboa, exigindo só que o capital da empresa fOsse pcitugnés.
Com que autoridade se diz no docreío que o Governo se conformou com o parecer do Conselho do Estado Maior do Exército, e se afirma no 15.° consideran-dum do parecer das comissões que a concessão teve o parecer favorável de todas as instâncias consultadas!?
Refere-se depois o parecer à influencia futura sobre a defesa do país. que poderá derivar das alterações a introduzir na rede ferroviária a sul do Tejo, e diz:
«Ora as alterações a introduzir pedem revestir dois aspectos diferentes :
a) Ligações, dentro do nosso país» entre linhas já construídas, e eo. exploração ;
ò) Ligações, dentro do país, das linhas nacionais já construídas Q em exploração com linhas estrangeiras já construídas ou a construir, conduzindo à fronteira.
Quanto à primeira classe de alterações, pode dizer-se, de um modo gnrul, serem convenientes às eperações da defesa; mas o seu traçado não é questão in-diferentBj sob o ponto de vista militar.
No tocante às alterações da segunda categoria, isto é, às que visão, as linhas de penetração, a quostão apresenía-se com uni aspecto mais delicado, como raais tarde veremos.
Os concessionários não se re::erem, em especial, a qualquer ligação da l.a ou da 2.a categoria, mas já o mesmc não sucede com o Conselho Superior de Obras Públicas, que prevê duas ligações cjm o país vizinho:
a) Pek linha de Évora (Casa Branca a Eivas).
ò) Pela liaha do Guadiana (Évora ou Pomarãop.
Depois de frisar, que a linha Zafra--fronteira portuguesa «assumo carácter de grande importância», chame a atonçao para o desenvolvimento da rede ferroviária espanhola nas proximidades da nossa fronteira, que se projecta envolver por completo a uma curtíssima distância,, ao
mesmo tempo que se projecta fazer avan-' çar directamente sobre ela outras linhas que facilmente virão a tornar-se em linhas novas de penetração, e diz:
«Nenhum segredo revestem tais pro-jecios, pois constam claramente das leis de 26 de Março de 1908 e 23 de Fevereiro de 1912.
Na região que mais particularmente nos interessa agora, várias linhas se encontram projectadas, e se. para algumas, poderá encontrar-se fácil justificação em considerações de natureza económica, para outras difícil será encontrá-la; muitos desses camiuhos de ferro são claramente chamados «caminhos de ferro estratégicos», concedendo-lhes garantia de juro, e assim se consideram oficialmente, claro está, os que, independentemente do serviço que prestam a outros interesses gerais, atendem directamente às necessidades da defesa nacional.
O desenvolvimento da rede ferroviária de um país" contribui, sem dúvida, para a sua delosa. Mas presta-se poderosamente a instrumento de agressão, e, quando estiverem construídas as linhas actualmente proje2tadas, que a pouco e pouco têm sido concedidas, não só a Espanha terá uma muito maior liberdade na escolha das suas linhas de invasão á Portugal, como sesrá consideràvelmente reduzido o tempo necessário para. a concentração das suas forças nos locais escolhidos, quer dispondo de mais linhas para os transportes, quer aumentando o rendimento das que forem utilizadas, pela formação de circuitos para evacuação do material vazio.
A linha Zafra-Mourão terá de ser considerada sob estes diversos aspectos. Vem, inais particularmente, constituir uma nova directriz, segundo a qual o inimigo pç dera mover as suas colunas atacantes, e representa mais uma direcção de ataque a que a defesa terá de atender} obrigando-a, portanto, a modificações importantes nos seus planos.
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menta as probabilidades dam grande es forço sobre a península de Setúbal e mar gem sul do Tejo».
E deste modo, o Conselho do Estado Maior, no seu parecer, põe em foco1 «a extrema importância destes assuntos», no que julga cumprir um dever, tanto mais que eles directamente interessam outros em que a sua responsabilidade pode ser comprometida».
Conclui o parecer:
«Entende o Conselho do Estado Maior do Exército:
1.° Que não há inconveniente «imediato», para a dofesa do País. em se conceder a construção e exploração dum porto comerciei! na parte oeste da península do Montijo; antes há vantagem para a mesma defesa».
É evidente que, deste enunciado, não se pode concluir que não há inconveniente em se fazer uma concessão da construção e exploração do porto do Montiio, mas apenas que, não havendo inconveniente «imediato», h ave Io há «de futuro» se se derem as circunstâncias mui ponde-radamonte apontadas nas considerações do parecer, e que nos forçarão, som dúvida, a, uni grande aumento de despesas para salvaguardar a nossa defesa.
«2.° Que deve ficar entendido, como obrigação imposta aos concessionários, que, uma vez declarado o estado do guerra, todo o material, instalações e serviços do porto e anexo* ficam à disposição da autoridade militar competente.
3.° Que a empresa ou companhia a organizar seja «genuinamente» portuguesa e, como tal, sujeita absoluta e exclusivamente, às leis portuguesas».
Também estos dois o últimos articulados do parecer não constituem votos favoráveis à concessão, mas duas exigências.
,;Com que seriadade correspondeu o Governo à exigência de ser a em prosa ou companhia «genuinamente portuguesa»?.
j Inserindo no decreto o termo «genuinamente portuguesa», que, podendo ser uma satislação aos ingénuos, nada representa sob o ponto de vista legal, «omi-
tindo», com perfeito1 conhecimento das nefastas consequências dessa omissão, «a exigência de ser português o capital social», como efa intuitivo e lôra expressamente estabelecida nos pareceres das estações oficiais que souberam ver o alto valor patriótico de tam indispensável medida no caso de o Estado conceder a ou-trem a construção e exploração do porto!
j E diz-se que a concessão, «cajás cláusulas não foram submetidas ao Conselho do Estado Maior», teve o parecer favorável deste Conselho!
Mas, como se não bastasse todo o exposto para bem definir o «alto critério» que presidiu a uma tal concessão, vejamos ainda o que diz êstn parecer seguidamente aos três articulados acima trans-/critos:
«Por iiltimo entende" ainda o Conselho dever chamar a atenção do Governo para a necessidade de que todos os projectos de linhas férreas a construir ou de alteração nas já construídas devam ser submetidas pelas vias competentes ao exame do Conselho do Estado Maior do Exército para se harmonizarem as necessidades da defesa nacional com as íunções económicas que as mesmas linhas são destinadas a exercer.
Assina se dará cumprimento ao- que se acha consignado na Lei Orgânica do Exército, de 2õ de Maio de í911, respeitando as atribuições pela mesma lei conferidas ao Conselho referido e à Comissão Superior de Caminhos de Ferro».
Como se vê claramente, o Conselho do Estado Maior, aproveitando o ensejo de ter falado em caminhos de ferro, lembra a necessidade de se cumprir o que estatui a Lei Orgânica do Kxército sobre esse assunto, mas não inclui nos articulados do , seu parecer qualquer exigência relativa a caminhos de ferro, jpois que, como o fez notar nas considerações acerca deste assunto, «o pedido da concessão não compreende qualquer alteração na rede de caminhos de ferro».
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Pois o alto critério do cone es sor, que não quis evitar que a expropriação da vasta região do Montijo, a construção e a exploração do porto e de outras cousas mais fossem feitas por uma empresa estrangeira, que aprova um pecido de concessão, já de si tam prejudicial aos interesses do Estado, mas que não compreendia qualquer alteração na rede ferroviária, introduz entre as bases do contrato a seguinte cláusula:
«Cláusula 7.a Todos os projectos de linhas férreas á construir, ou de alterações nas já construídas, serão submetidos ao exame do Conselho do Estado Maior do Exército para se harmonizarem as necessidades da defesa nacional com as funções económicas que as mesaias Linhas são destinadas a exercer».
j E assim, quando e como convier aos concessionários, a generalidade desta cláusula servir-lhes há de argumento para justificarem que a concessão abrangeu também quaisquer linhas férreas a construir ou a alterar, acessórias do porto, pois se assim não fosse (como provavelmente diria a Procuradoria Geral) tal cláusula achar-se-ia deslocada no decreto da concessão!
j Tudo se pode esperar desta caixa de surpresas a que só convencionou chamar concessão de um porto! N
\
Finalmente, da análise de todos os pareceres das instâncias oficiais, citadas no decreto da concessão e a que se refere o 15.° considerandum do relator das comissões do Senado, reconhece-se que «não é exacta a afirmação de que todas essas instâncias deram o seu parecer favorável à concessão!».
Termina o parecer das comissões do Senado pelo seu 16.° considerandum, que também encerra a sua opinião sobre o assunto.
Ei-lo:
«Considerando, porém, que a Constituição Política da República, nos n.os 22.° e 23.° do seu artigo 26.°,'declara que só ao Parlamento compete fazer tais conces-as vossas comissões àe finanças e
de fomento são de opinião que o Congresso deve aprovar um bill de indemni-dade -ao Govôrno que subscreveu esta concessão, validando por esta forma o decreto n.° 6:679, de 14 de Junho de 1920, rejeitando portanto o projecto de lei n.° 533, da autoria do Sr. Rodrigues Gaspar..— Cristóvão Moniz— Celestino de Almeida (com declarações)—Júlio Ribeiro — José Joaquim Fernandes de Almeida— Vasco Marques — José Frederico Ve-lez Caroço—Constando de Oliveira—José de Sousa e Faro — Amaro J. de Azevedo Gomes— Vasconcelos Dias (com declarações)— João Joaquim André de Freitas— António de Oliveira e Castro (com declarações) — Rodrigo Alvares Cabral, relator».
i Vê-se pois que as comissões do Senado reconhecem que o Grovêrno cometeu um acto ilegal decretando a concessão do porto do Montijo, propondo por isso um bill de indemnidade, e, citando a infracção dos n.l)S 22.os e 23.° do artigo 26.° da Constituição, reconhecem que o Governo não só regulou a administração de bens nacionais, como também decretou a alienação desses mesmos bens, funções que são da competência privativa do Congresso !
Esqueceram-se porém de dizer que o decreto da concessão não infringiu apenas os n.os 22.° e 23.° do artigo 23.° da Constituição, mas também os n.os 1.°, 3.° e 4.° do mesmo artigo e o n.° 26.° do artigo 3.°, revogando disposições do Código Civil, disposições da lei de l de Dezembro de 1892, disposições da lei de 26 de Julho de 1912, a lei de 12 de Junho de 1913, e disposições do Regulamento Geral de Contabilidade Pública, cue garantem a maior salvaguarda dos legítimos interesses'do Estado!
Mas reconhecendo-se que o Governo cometera abusos, tornava-se indispensável justificar cabalmente, com razões po-dero.sas, ponderosas e excepcionais, a proposta das comissões para que o Congresso aprovasse um bill de indemnidade ao Governo que tam ostensivamente infringira a Constituição!
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; Pespegando-se considerandos sobre considerandos, até perfazerem quinze que preciosamente servissem de base ao dezasseis e último que envolve a proposta do bill de indemnidade!
Não se trata porém da construção de uma pirâmide de blocos, mas do valor intrínseco de cada considerando.
Dêfses quinze considerandos, doze foram fornecidos pelos interessados na concessão, como se mostrou nas pp. lia 14, e que em nada justificam um bill de indemnidade, o 13.° é um simples enunciado de um princípio geral, o 14.° limita-se a afirmar, sjem a mais leve demonstração, que os interesses do Estado foram acautelados e como se provou, pp. l õ a 23, esses interesses não foram acautelados, mas sim alienados, impossibilitando por isso um bill de indemnidade, e o 15.°, passando um atestado de boas intenções ao ao Governo, faz a afirmação de que todas as instâncias oficiais deram o seu parecer favorável à concessão, o que não é exacto, como se mostra detalhadamente nas p p. 23 a 61, analisando um a um todos os respectivos pareceres!
Em conclusão:
I) A anulação do decreto da concessão do porto comercial do Montijo impõe-se como acto de moralidade administrativa;
II) Os altos interesses nacionais exigem que seja o Estado, e não outrem, quem utilize as excepcionais condições da península do Montijo para desenvolver o porto de Lisboa, e possivelmente estabelecer a estação marítima das suas linhas do Sul e Sueste.
Tal é o objectivo do meu projecto de lei que, desagradando notoriamente aos interessados na concessão, coíbe grandes abusos, faz reverter ao Estado os seus incontestáveis direitos e coloca os interesses nacionais acima dos de qualquer empresa, possível e provavelmente estrangeira.— Alfredo Rodrigues. Gaspar.
Projecto de lei n.° 402 (Ponte sobre o Tejo entre Xabregas e Montijo)
Senhores Senadores.—Considerando que é de grande vantagem para o desenvolvimento da riqueza pública a ligação directa e rápida das duas margens do Tejo, nas proximidades do importante centro
comercial e industrial que ó a cidade de Lisboa;
Considerando que é de intuitiva necessidade realizar este grande melhoramento nacional sem destruir as numerosas edificações que existem nas margens do Tejo, desde Belém até Xabregas, o que seria uma perda enorme;
Considerando que as fundações de qualquer Aparte que se pretenda construir, na parte mais estreita do rio, isto é, dó pontal de Cacilhas até a barra, são de mui difícil execução e podem prejudicar para sempre a navegação no mais importante porto de Portugal;
Considerando que a estética do porto de Lisboa, cujo aspecto ó deslumbrante, ficará horrivelmente aniquilada com qualquer construção que se faça na zona indicada ;
Considerando que a ponte que se cons truísse mais a montante não só não prejudicava a beleza do porto, mas ainda lhe dava um aspecto muito agradável à vista;
Considerando que durante a construção da ponte a montante do rio, ou mesmo depois de concluída, qualquer destruição que sofresse por efeito de abalo sísmico, ou de qualquer tentativa de destruição, não modificaria o regime das aguas, nem dificultaria a navegação, o que não se daria se estas mesmas causas se dessem na ponte que se construísse ligando as duas margens entre Cacilhas e Trafa-ria, na margem sul, e Ribeira Velha e Belém, na margem norte, porque os destroços causariam desastres incalculáveis e irremediáveis;
Considerando que o falecido engenheiro Miguel Pais fez importantes estudos sobre este assunto, chegando a elaborar um projecto duma ponte de Xabregas ao Montijo;
Considerando que um projecto actualizando o deste distinto engenheiro, trabalho que já foi apresentado em público, poderá servir de auxiliar valioso para a realização dum melhoramento de tam grandiosa importância;
Considerando que a defesa nacional ficava seriamente prejudicada com uma ponte ao alcance da artilharia naval, ainda mesmo estando os navios fora da barra:
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deração do Parlamento o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É o Governo autorizado a conceder, mediante concurso público, a qualquer entidade ou empresa portuguesa, e pelo prazo de vinte e cinco anos, a construção e exploração duma ponte de dois tabuleiros sobre o Kio Tejo, na direcção Moatijo (norte do ponto trigonométrico 1) e o sítio de Xabregas, sendo um dos tcibuleiros destinado a viaçLo ordinária e o outro a vias férreas servindo para ligação directa das linhas construídas ao norte do Tejo com as do Sul e Sueste; uma gare marítima em Xabregas e cm cães acostarei s.os grau;ies transatlânticos na mesma zona. sob as seguintes bases:
BASE 1.»
Os projectos das obras serão apresentados ao Governo, que sobre eles ouvirá, os conselhos reunidos de obras púb"-icas e minas, e, depois de devidamente aprovados, serão apresentados, juntamente com o parecer do Conselho de Ministros. ao Parlamento para sobre ele *se prenunciar.
BASE 2."
As alterações que convier introduzir nos projectos por qualquer circunstância, depcis de apresentadas, serão apreciadas pelos conselhos moncicnadcs na base l.a, e só depois poderão ser aprovadas. Se o Governo demorar a aprovação ou rejeição por mais de quatro meses consideram-se aprovadas para todos os efeitos.
BASE 3."
' O prazo máximo para a conclusão da ponte e respectivas vias de acesso d< verá ser de cinco anos, contados da data da aprovação dos projectos. Para outras obras o prazo máximo será do dobro, isto é, de dez anos.
BASE 4.a
A ponte terá proximamente 4:500 metros de comprido, perfil horizontal e em planta construída em linha recta. A altura .do tabuleiro inferior, acima do n'ye! das maiores preamares, será de 26 metros para dar livre passagem acs peque-jios barcos qae seguem rio acima»
BASE 5."
O concessionário ou a empresa que se organizar para efectuar estas construções serão considerados portugueses para todos os efeitos e sujeitos exclusivamente às leis portuguesas.
BASE 6.a
O Governo obriga-se a conceder prémios aos concorrentes. O apresentante do projecto que obtiver a primeira classifica-ç2,o-£i Se nenhum dos projectos merecer aprovação', o que não é provável, o Governo abrirá novo concurso entre portugueses e estrangeiros, não podendo a concessão ser dada a estrangeiros, mas somente a adjudicação; se o projfcto aprovado for apresentado por um indivíduo estrangeiro a concessão só será dada à empresa portuguesa que pelo citado indivíduo for organizada, e, 'se a não puder organizar, receberá pelo projecto uma quantia de lO.OOOé, ficando todo o trabalho propriedade do Estado, para'dele se servir, para poder pôr em praça a sua realização por empresa portuguesa. As desposas com os prémios sairão da verba orçamental destinada à construção de estradas. BASE 7.° Os prédios rústicos ou urbanos que forem necessários para a execução destas obras serão expropriados por utilidade publica o urgente, em harmonia com a legislação que vigorar. BASE 8."
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BASE 9.»
A concessão caducará com as regalias consignadas e perda do depósito provisório que o concessionário apresentar para poder ir ao concurso, sem direito a indemnização.
1.° Se a ponte, a estação ou gare marítima e o cais acostável não estiverem concluídos nc praso de 6 anos.
2.° Se a ponte e a gare deixarem de sei exploradas seguidamente durante 6 meses,
BASE 10."
Os indivíddos ou empresas que forem ao concurso para tomarem sobre si os encargos da construção destas obras e respectiva exploração deverão entregar com os seus projectos e propostas, guia do depósito provisório da quantia de 000.000$ em moeda corrente .no País ou em íítulos" do Estado do valor equivalente feito na Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência.
BASE ll.«
O concessionário demonstrará no acto da assinatura do contrato da concessão que se efectuar dentro de um ano a contar da data da notificação de que lhe foi. adjudicada a concessão, que pode dispor dum capital efectivo de 00:000.000$. reforçando o depósito provisório com a quantia de 250.000$ como garantia da concessão.
O depósito no total de 750.000$ ?erá reembolsado pola.seguinte forma: 250.000$ quando os conselhos reunidos de Obras Públicas e Minas ou os seus delegados verificarem que .os trabalhos executados têm valor superior à totalidade do depósito; 2õO..OOO$ quando a ponte e a estação marítima do Xabregãs comecem, a ser exploradas, e os restantes 250.000$ um. ano depois.
Os restantes concorrentes levantarão imediatamente os seus depósitos.
BASE 12."
São considerados casos de força maior: 1;° O estado de guerra no continente europeu da República que obrigue a desviar os operários do trabalho.
2.° A greve dos operários, falta do" comunicações ou outras circunstâncias que inibirem o prosseguimento dos trabalhos e
que o Governo, ouvidas as estações competentes, apreciará.
BASE 13.'
As taxas de exploração serão apresentadas peloc oncessionário, e só depois de aprovadas pelo Governo poderão entrar em vigor.
Art. 2.° Fica' revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões do Senado, em 11 de Abril de 1923.— O Senador, Francisco de Sales Ratnos dá Costa.
O Sr. Afonso de Lemos: — Tenho que rememorar acontecimentos que se deram em outra sessão legislativa que se prendem com este projecto.
Em 15 de Junho de 1920, o Governo de que fazia parte o Sr. Lúcio de Azevedo, como Ministro do Comércio, fez a concessão, a uma companhia, da exploração do porto de Montijo.
Passado tempo, o Sr. Rodrigues Gaspar, que então era Senador, em três ses-'sões consecutivas sendo a última aquela em que terminava a sessão legislativa, pretendeu demonstrar ao Senado que o Governo tinha procedido inconstitucionalmente.
O Senado nessa sessão, depois de ouvir o Sr. Rodrigues Gaspar, tinha que ir votar o projecto de S. Ex.a e dispunha-se, mais ou monos, a fazê-lo, segundo eu previ, sem conhecer bem o assunto.
Por mim, confesso que nessa ocasião estava absolutamente alheio, tanto à concessão que se pretendia fazer, como aos argumentos que apresentara o Sr. Rodrigues Gaspar, considerando inconstitucional essa concessão, e, percebendo que o Senado não estava em condições de ir fazer uma votação sobre uni assunto de tam grande importância, requeri para que o projecto baixasse às comissões, a fim de ser devidamente estudado.
Foi essa apenas a minha intervenção no assunto, porque eu mal sabia onde ficava o Montijo e ainda hoje não sei, nem quero saber quais são-as entidades que se interessam, ou contrariam essa concessão.
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Passaram as férias parlamentares, o Parlamento reabriu e o Sr. Rodrigues Gaspar não tinha sido ouvido pelas comissões, segundo S. Ex.a me declarou.
Quando o projecto chegou à comissão ds comércio, esta entendeu dever nomear uma comissão especial para dar parecer sobre o assunto, comissão que era composta por mim e pelos Srs. Roberto Baptista e Alvares Cabral.
Como eu -e o Sr. Alvares Cabral já conhecíamos o assunto, pedimos ao Sr. Roberto Baptista para o estudar.
Depois, meteram se questões políticas e o Sr. Roberto Baptista "não teve ocasião de estudar o assuuto, e por esse motivo a comissão não pôde apresentar o seu parecer.
Como depois se modificasse o funcionamento do Senado, pelo sistema das secções, foi o projecto enviado á secção de que eu faço parte.
A certa altura, ou e o Sr. Herculano Galhardo resolvemos ressuscitar o assunto e apresentar um projecto de lei renovando a iniciativa do Sr. Rodrigues Gaspar. E assim, a intervenção do Sr. Herculano Galhardo foi análoga à minha, isto é, querer que o assunto fosse ventilado.
O Sr. Herculano Galhardo:—Pouco mais.
O Orador: — Nessa ocasião discutiu-se a questão e reconheceu-se a necessidade de se nomear uma comissão especial, para a estcdar, comissão que foi composta de cinco membros, e da qual eu pedi par& não fazer parte.
Essa comissão também não chegou a dar parecer.
Numa das sessões da secção combinou--se que fosse marcado um dia para a discussão do assunto.
Chegado esse dia, a comissão não tinha podido estudar o assunto, o que não admira, porque basta olhar para o volume do processo para se reconhecer quam di-íícil será fazer esse estudo.
Numa outra -reunião da secção, p presidente submeteu o assunto novamente à discussão, e esta, ponderando o caso, não teve dúvida em que o projecto fosse discutido neste momento, por isso que .tal discussão em nada prejudicava o futuro. Porque a verdade é que se o Governo
entendesse que era necessário manter a concessão feita pelo Sr. Lúcio de Azevedo, fazia-a e vinha depois pedir um bill de iudemnidade ao Parlamento. Mas se, pelo contrário, o Governo entendesse que a concessão não podia ser dada, o projecto caducava definitivamente, porquanto nós reconhecíamos que, não só não havia inconveniente em trazer o projecto à discussão da sessão plena do Senado, como também havia uma conveniênéia especial em que ela se fizesse, pela coincidência de estar presidindo ao Governo o Sr. Rodrigues Gaspar, Senador que em 1920 levantou a questão da inconstitucionali-dade do projecto.
Ora, se no projecto se diz que o Governo mandará estudar o assunto, é esta a melhor' ocasião para encarregar o Governo desse estudo, visto estar no poder o autor do projecto.
Repito : a minha intervenção no assunto, em 19LJ0, fui unicamente no sentido de não deixar que fosse votado de afogadilho um projecto de lei, de que se me afigurava o Senado niio estava absolutamente conhecedor.
Essa minha, intervenção foi a que tive na comissão e na secção, e continuo a não conhecer, como já disse, nem quero conhecer quais as pessoas que possam interessar-se ou contrariar essa concessão.
E, por último, não vejo inconveniente em que o Senado vote este projecto de lei, pelo qual o Governo é autorizado a estudar a península do Montijo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr, Herculano Galhardo: — O Sr. Afonso de Lemos já explicou as razões por que S. Ex.a e eu renovamos a iniciativa.
Além dessas razões,' eu daria também as do Sr. Rodrigues Gaspar.
Considero a anulação do decreto n.° 6:679 como um acto de moralidade administrativa, tal como o considerou o Sr. Rodrigues Gaspar.
Entendo, pois, que. se fez uma concessão má e que, portanto, devia ser anulada.
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rosa receber das mãos do Estado uma concessão.
Não considero o decreto ama imoralidade; só considero o decreto de concessão uma irregularidade administrativa.
O Governo, baseando-se em dois artigos da lei n.° 1:912, relativa a expropria-çõejs por utilHade pública, fez uma conces-' são de construção de um porto, sem ter a mínima base para a íazer.
Se nós consultarmos o proiecto de concossão, encontramos um acto do Ministro qae considero um acto irregular, encontramos um despacho do Ministro, fundamentado numa grande quantidade de pareceres, com esta condição singula-ríssima de pareceres contraditórios, em que umas primeiras consultas resolviam de uma forma, e nas demais consultas se opinava por forma absolutamente contrária. É urgente, por isso, anular-se a concessão.
Creio até que os próprios concessionários já estão convencidos disso, e que receberam uma concessão em maus termos e o conheceram quando diligenciaram financiar a concessão e verificaram que o mercado financeiro lhe punha sérias dificuldades. ,
É de toda a oportunidade anular essa concessão mal feita, embora amanhã o Governo, reconhecendo que de uma concessão pode resultar benefícios para o País, fique com inteira liberdade de trazer ao Parlamento . uma proposta de lei para nova concessão.
O Sr. Afonso de Lemos disse há bocado que não conhecia a península.
Ora o que se dá com S Ex.a dá-se com muita gente em Portugal e ato com muitos Ministros. Se essa doclarayão não é para estranhar no Sr. Afonso de Lemos, qae não tem responsabilidade no Governo, o mesmo não acontece nos Ministros.
A península do Montijo é verdadeiramente a testa do Caminho de Ferro do Sul e Sueste. E quem tiver esta concessão como estiver de posse de Lagos, tem na mão dois pontos estratégicos formidáveis para dispor de toda a linha do Sul e Sueste.
Por isso no artigo respectivo se diz que o Governo mandará fazer um estudo da península.
Dir-se há que este projecto traz despe-
sas com que o Estado não pode neste momento. Mas podemos nós admitir que Portugal continue na situação de não poder consertar estradas, fazer caminhos de ferro, não poder estudar os seus portos e outras medidas necessárias para o seu desenvolvimento ?
Evidentemente, alguma vez havemos de sair deste sistema de política de expedientes, de não resolver cousa nenhuma, como se estes problemas fossem cousas que não pudessem ter solução.
Não julgue alguém que eu estou a propor uma candidatura.
Estou a falar como representante da nação. .
E porque desejo ser um representante da Nação tam completo quanto seja possível, ó que faço a diligência de conhecer os problemas da Nação e de ter fé no futuro do meu país.
Estou convencido que o problema português tem solução.
No dia em que quisermos encarar o problema sob todos os seus aspectos para uma resolução de conjunto, o problema aparecerá fácil de resolver, em vez de ser difícil, mas agora subordiná-lo unicamente ao ponto de vista financeiro, é um erro que não nos conduz a cousa alguma.
Há poucos dias, um homem público de extraordinária competência, o Sr. Bernar-dino Machado, disse numa entrevista, num jornal, que era preciso acabar com a tirania no Ministério das Finanças.
É necessário que os Ministros das Finanças se habituem a não se subordinar ao aspecto mesquinho financeiro do país.
O problema tem de ser encarado duma forma mais alevantada, quem quiser abalançar-se a resolver com alma o problema nacional não deve preocupar-se com aspectos de pouca monta, deve ir para deante.
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HO
Diário das Seiêões do Senado
Sr. Presidente : -quando se fala em economias, iiiuita gente supõe, e muito boa gente, qus a economia está em despedir muitos funcionários.
Tenho uma opinião muito diversa do que devem ser as economias em Portugal; não suponho nem estou convencido, corno muita gente, que haja funcionários a mais; pelo contrário, estou convencido, que 0:3 funcionários serão insignificantes para aquilo que o Estado tem a realizar.
Portanto, Sr. Presidente, não é despedindo funcionários que nós resolveremos o problema.
Poderemos resolver sob o aspecto financeiro e na tesouraria, mas só o resolveremos quando pagarmos todos os seus valores, e ainda há valores de alta competência, se os colocarmos em situação que lhes é devida.
Repito: não sou de opinião de despedir ou reduzir os vencimentos, temos t!e l lies pagar bem; c que precisamos é actualizar a sua competência e dar-lhe valor e não permitir c. continuação de os funcionários serem Acusados de que para nada servem. E necessário que se aplique o funcionalismo público a fazer alguma coisa de útil para o país, mas para isso é necessário que se lhe dê a remuneração necessária, e então teremos pessoal técnico para a montEgera de um porto comercial no Montijo.
Sr. Presidente: entendo que este artigo 2.° deve ser aprovado.
Não quaro alongar-nie em considerações; com a -ainha consideração quis apenas justificar à Câmaras porquo renovei esta inieiativc,.
O orador Kão reviu.
O Sr. Frecópio de Freitas : — Sr. Presidente: é indispensável colocar o porto de Lisboa em condições de satisfazer não só às necessidades comerciais como às necessidades da guerra.
O nosso porto, infelizmente, não sati?-faz actualmente, nem. as necessidades comerciais, nem as necessidades da guerra.
Eu li osso grosso volume qua há clias ine foi distribuído core o projecto do Sr. Rodrigues Gaspar anulando o decreto pelo qual é feita a concessão dum porto comercial DG península de Montijo..
Li os pareceres das várias comissões do Senado, as considerações feitas pelo
Sr. Eodrigues Grspar para provar a in-constitucionalidade do decreto e a desenvolvida critica a esses pareceres»
O Sr. Rodrigues Gaspar aprecia as opiniões de várias entidades técnicas, que foram consultadas acerca do decreto, afirmando qie a opinião de algumas dessas enndades, como por exemplo a Administração do Porto de Lisboa, é diferente da que quereD fazer ver os defensores do decreto. Diz ainda que o projecto do porto foi aprovado sein se saber do que se tratava, visto que na proposta feita apenas havia um pequeno croquis*
Sr. Presidente: é sempre grave faze-rom-so concessões de tal natureza sem profundo estudo, porque à primeira vista podem não se descobrir as consequências que daí podem resultar.
Acho bem que o nosso porto se desenvolva, e que se faça do Montijo um porto satisfazendo a todas as condições modernas.
Suponho qup a carta hidrográfica do Montijo deve estar feita ou quási feita, porque se bem me recordo", houve há poucos anos pessoal da armada empregado nesse serviço.
O facto de o estudo da península do Montijo demandar despesas, não é motivo para que se não faça, porque ó preciso semear-se para se colher* As economias não devem também prejudicar o futuio; há despesas reprodutivas, e despesas deste género slo úteis.
Precisamos de pôr o nosso porto em condições de atrair toda a navegação e não o deixar permanecer como está, dan-do-so o facto de os vapores da Empresa Insulana, por exemplo, não poderem sair na hora própria por não poderem largar da muralha devido ao assoreamento do
Não se compreende que não tenhamos já no nosso porto muralhas onde possam atracar todos os navios. Os navios acorrem onde: mais facilidades lhes dão.
E^tou de acordo eni que se anule o de° creto da concessão, autorizando se o Governo a fazer os estudos necessários para que o porto do Montijo se fuça»
Tenho dito.
O orador não reviu.
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nomeado para fazer parte duma sub--comissão da antiga comissão de obras públicas do Senado encarregada de dar parecer sobre este assunto, tive necessidade de estudar pormenorizadamente a célebre questão do porto de Montijo.
Circunstâncias de ordem vária iuílúram-me de reunir com os meus colegas da sub-coinissão, do forma que não chegámos a apresentar' à .comissão os resultados dos nossos trabalhos.
Esse estudo, porém, feito há dois anos, permite-me entrar na discussão dôste assunto com relativa facilidade.
Nós temos de encarar o projecto de lei n.° 378, sob dois aspectos.
1.° Foi a concessão feita em termos regulares ?
2.° Convém ao Estado Português manter a concessão nos termos em que foi feita ?
Sob o primeiro aspecto em relação ao qual entendo que o problema de,ve ser encarado, não tenho a menor dúvida. A concessão do porto de Montijo foi feita ilegalmente.
É bom que se digam as-cousas empregando os verdadeiros termos.
Ao abrigo da lei que trata das expropriações por utilidade pública, foi ilegalmente feita uma concessão. Isto é claro, evidente e indiscutível. São as próprias comissões do Senado, a do fomento e a de finanças, que dão sobre esta concessão parecer desfavorável. f
É pois o próprio Senado, por intermédio das comissões do fomento o de finanças, que reconhece ser a concessão ilegal.
Portanto, encarado o problema sob esto aspecto, julgo desnecessário fazer, debaixo deste ponto de vista, mais considerações,
Mas, como disse, entendo que o projecto deve também ser encarado debaixo de um outro ponto do vista: se convém ao Estado Português manter ossa concessão.
TY-ndo lido os vários pareceres que acompanham este projecto, pareceres que, são pur vtv.o-í bastanti divergentes, julgo q-ne nor-íto momento, n^m ou. n«'in nenhum dos Srs. Senadores aqui presentes podo com justiça dizer que o Estado devo manter essa concessão.
O Sr. Herculano Galhardo:—Apoiado.
O Orador: — Porque no actual momento e em vista dos pareceres que acompanham o projecto não podemos ter uma opinião segura sobre o assunto.
Sr. Presidente: ditas estas resumidas considerações, julgo que o projecto n.° 378 deve merecer a aprovação do íáenado, porque, no seu artigo 1.°, declara nulo e de nenhum efeito o decreto relativo à concessão do Moutijo, em virtude de esta concessão ter sido feita ilegalmente, e no artigo 2.° prescreve um certo .número de disposições que garantem os superiores interesses do pais.
Sr. Presidente: só depois de realizados os estudos o trabalhos a que se refere o artigo 2.° é que o Estado tem na sua mão os elementos necessários para poder apreciar as propostas mais convenientes para o aproveitamento da península do Mon-tijo=
Só então estaremos habilitados a poder apreciar qualquer proposta de concessão. Antes disso, seria- fazer uma obra muito leviana, e em minha opinião muito arriscada.
Muitos apoiados,
Conheço um pouco, porque tive ocasião, noutros tempos, de efectuar uns levantamentos na península do Montijo, conheço um pouco, disse, esse terreno não só sob o ponto de vista militar como também sob o aspecto das ligações qne oferece com o Alentejo.
'Acho que o dinheiro que o Estado irá gastar nos trabalhos necessários para adquirir os elementos a que só refere o artigo 2.° do projecto 'será sobejamente compensado com as justas condições que imponha para a realização de qualquer futura concessão.
Tenho dito.
Muitos apoiados.
O orador não reviu»
O Sr. Ministro do Comércio e Comuni* cações (Pires Monteiro): — Sr. Presidente : o projecto de lei n.° 378 diz respeito a assuntos que correm pela pasta do Comércio.
Nestas condições, julgo conveniente dizer e definir qual é a minha maneira de pensar sobre o assunto que se debate.
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ÍHário âat èettôet do Senado
ele declara nulo o projecto de lei n.° 6:679.
O artigo 1.° é daqueles que não poderiam deixar de ser. aprovados polo Senado.
Pelo que diz respeito ao artigo 2.°, permita-me V. Ex.a, • Sr. Presidente, e permita-me o Senado que eu faça algumas ligeiras considerações.
Os ilustres Senadores que usaram da palavra sobre o assunto disseram e escla-ceram a Câmara acerca da importância da península do Montijo, e da importância que tem para a economia nacional a realização deste problema.
Referiu-se o ilustre Senador Sr. Her-culano Galhardo à importância que tem a península do Moniijo, e o Sr. Procópio de Freitas às condições em que se encontra o nosso porto e à necessidade que há de-realizar grandes obras que chamarão ao Tejo a navegação, que só pelas condições geográficas de que o nosso porto goza, ela vem ao Tejo, sem todavia dispor daquelas comodidades que nào só ao comércio, como aos turistas são indispensáveis.
Mas, Sr. Presidente, é para este facto que chamo a atenção do Senado: o Estado encontra-se em frente dum problema nacional momentoso.
Esse problema tem vários aspectos, e não o podemos solucionar em todas as suas modalidades. De entre esses vários aspectos, o problema financeiro é aquele que neste momento mais preocupa todos os hornens políticos, que preocupa toda a nação e todos os patriotas que sentem as condições tremendas que pesam sobre a nacionalidade portuguesa.
Há problemas económicos a considerar, como por exemplo o da valorização das nossas imensas riquezas naturais.
Mas, para solucionar esse problema que é o fundamental assim como tantos outros, são precisas possibilidades que nesse momento o Estado Português não tem, essas largas possibilidades, esses largos e proveitosos empregos de capital que traria para o Estado a valorização das riquezas naturais do pais.
Ora demonstrou o Senado, através este artigo, que tem o desejo, que é de todos nós, que o Governo mande proceder a esses estudos, e mostrou esse desejo, porque não pôde constituir uma determina-
ção visto não haverem as possibilidades indispensáveis para a realização destes estuuos.
E evidente que esse desejo é o de todo o Governo, e de todos os homens que pensam no futuro da nossa terra e têm te no seu ressurgimento, mas esse desejo esbarrava contra as dificuldades pelas condições especiais em que o nosso país, neste momento, se encontra.
Mas ainda desejo chamar a atenção do Senado para outro ponto, que é a maneira porventura restrita como está redigido o artigo 2.°
Estudei este problema da península do Montijo, conhecia-o antes de assumir a gerência da pasta do Comércio, sabia o enurme valor que tem a península do Moatijo, e agora, tendo m^ sido dada a honra .de sobraçar a pasta do Comércio, procurei estudar este assunto nos curtos dias que me tCm sido concedidos para estudar os vários problemas pendentes da pasta do Comércio e Comunicações. Ora, devo dizer á V. Ex.a, Sr. Presidente, e devo dizer à Câmara, que entendo para mim que o problema da península do Montijo é mais vasto ainda.
O artigo 2.° demonstra apenas o desejo que o Senado tem de que o Governo estude o enorme valor que essa península tem para a província do Alentejo.
Esse problema está intimamente ligado ao desenvolvimento completo da rede ferroviária do Sul e Sueste.
Essa rede tem hoje já 800 quilómetros e, quando se completar o plano estabelecido da valorização pelas vias de comunicação rápidas, pelos caminhos de ferro, de todo esse nosso rico Alentejo, nós teremos uma rede completa de 1:^00 quilómetros.
Nestas condições julgo que • a valorização da península do Montijo está inteiramente ligada à valorização do porto de Setúbal, ligado ainda ao desenvolvimento do nosso rico porto de Lagos.
Estes três problemas, valorização da rede ferroviária do sul do Tojo, valorização do porto de Setúbal, valorização do porto de Lagos, que por circunstâncias de ordem económica e de ordem militar estuo intimamente ligados ao porto de Lisboa, devem ser encarados no seu conjunto.
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dades que neste momento não temos, re-quere despesas a que neste momento não nos é possível atender.
É pára estes factos e circunstâncias que eu quero chamar a atenção de V. Ex.a, Sr. Presidente, e dos ilustres Srs. Senadores.
Eu, Ministro do Comércio, interpretando o sentir de todo o Govórno, desejaria imediatamente dar execução ao drsojo expresso pelo Senado no artigo 2.° pelas dificuldades que encontra esta medida de valorização económica, medida cujos resultados são absolutamente seguros, cujos resultados são a realização dum plano metodicamente traçado e que não pode obedecer a mero empirismo. „ O Ministro do Comércio desejaria imediatamente cumprir essa disposição, mas não pode porque não encontra os meios materiais necessários para isso.
É esta a primeira parte do artigo 2.° para. a qual chamo a atenção do Senado.
A segunda parte deste artigo é a que se refere à maneira como o problema é apresentado.
Julgo que a redacção, do artigo 2.° deve ser mais ampla e devemos atender ao problema da maneira qun melhor satisfaça ao nosso espírito de portugueses.
O § único do artigo 2.° atende à possibilidade de realizar qualquer concessão, e fá-lo muito bem, determinando claramente que o Governo trará a esta Câmara os estudos e propostas, que melhor concorram para a satisfação do nosso objectivo.
Evidentemente não se exceptua a possibilidade de o Governo trazer ao Parlamento qualquer proposta, que envolva uma concessão.
Seria interessante que, neste momento, o Senado se pronunciasse sobre se julga vantajoso, principalmente sob o aspecto da defesa nacional, atender a propostas desta ordem.
Explicando a minha atitude nesta questão, repito, a micha maior mágoa é não poder mandar realizar os estudos a que o Governo é obrigado.
O orador não reviu.
O Sr. Herculano Galhardo: — Sr. Presidente: foi muito interessante para a Câmara o discurso do Sr. Ministro do Comércio.
Como, porém, das considerações de S. Ex.a nada se conclui contra a oportunidade e conveniência da aprovação do projecto, aspectos sobre os quais ele tem de ser discutido na generalidade, peço a S. Ex.a o Ministro do Comércio licença para me referir às suas considerações na discussão da especialidade, visto que a maior parto das suas considerações se referem ao artigo 2.°
Isto para não demorar, por uma questão de método.
Se S. Ex.a não levar a mal eu responderei às suas considerações quando se discutir na especialidade o artigo 2.°, visto que todos estão de acordo com a aprovação do artigo 2.° e não há nada contra a oportunidade e • conveniência do projecto.
Foi aprovada a especialidade.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Ferreira de Simas: — Sr. Presidente : há talvez dois meses. apresentei um projecto de lei regulando a questão do álcool de dormideiras.
Tendo se dito que o projecto estava na comissão fui lá e disseram-me que já havia sido estudado e estava na secção. Mas não aparece.
O relator parece que até saiu do País.
Peço providências a V. Ex.a
O Sr. Procópio de Freitas: — Tenho a certeza que esse projecto já está relatado e está na secção.
O Orador: — Muito obrigado.
Aproveito estar no uso da palavra para pedir a V. Ex.a, Sr. Presidente, que convide o Sr. Ministro da Instrução a vir a esta Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. Costa Júnior: — Sr. Presidente: chamo a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o quê se está passando em Lisboa com o regime das águas.
A Companhia foi autorizada a aumentar o preço da água para tratar de fazer obras e até'hoje na^a se fez.
Peço a S. Ex.a que em virtude deste inaudito procedimento se faça com que o dinheiro que a Companhia recebeu indevidamente dó entrada nos cofres do Estado.
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Diário das Sessões do Senado
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pires Montiro):— Sr. Presidente: a questão das» águas ern Lisboa p reocupou.---me desde o primeiro momento. . Já a conhecia como toda a gente a conhece, mas não tinha a pretensão da a resolver.
Hoje, felizmente, • o Sr. Carlos Costa falou-me num projecto de lei que foi aprovado pelo Senado e que está na ojtra Câmara, e que1 se liga com esse assunto, tendo eu já tido a honra do mercar uma conferência com ôsse Sr. Senador para tratarmos do assunto com toda a solicitude para ver se é possível solucionar esse problema .dentro do que se possa fazer.
Pelo qne diz respeito ao aumento, ficou estabelecido cue esse aumento era para a realização das obras; creio até que um administrador cteh gado da Companhia já disse que esse dinheiro está depositado para se reparar e fazer a duplicação dos sifões.
Esse dinheiro está garantido.
Quere dizer, se o Governo entender que o Poder Legislativo resolva que esse dinheiro reverta pars os cofres do Estcdc, é fácil de resolver essa operação porque sabe qual o quantitativo atingido por e?sa verba e sabe qual a despesa a fazer para essa obra.
O orador não reviu.
O Sr. Gesta Júnior: — Sr. Presiibnto : já aqui disse que. quando eu era estudante, quere dizer, há viute e tal anos, fui a Campo do Ourique, e ali foram-me mostrados por um professor, que era o Sr, Lou-renço, uns estudos que a Companhia estava fazendo para filtrar as águas; pois até hoje está tudo na mesma; esses estados ainda estão por concluir.
O orador não reviu.
O Sr.. Caries Costa: — Sr. Presidente: tinha pedido a palavra para mo referir a um outro assunto, mas como há pouco se falou sobre o abastecimento de águas, nào quero deixar de dizer alguma cousa sobre este caso, visto que dele'me ocupo há muito.
Disse o Sr. Ministro do Comércio que o problema é difícil de resolver. Pois eu sou de opinião contrária, digo que ó íáeiL, extremamente fácil; temos pelo menos
dnaa soluções, como já tive ocasião de afirmar quando se discutiu o meu projecto sobre poços artesianos.
Uma das soluções ó a energia por parte do Sr. Ministro do Comércio, obrigando a Companhia a cumprir o contrato de 1867.
Uma vez cumprido esse contrato não haveria f u l ta do água em Lisboa.
A segrndu solução é a municipalização dos serviços, acabar-se com o odioso monopólio constituindo unia fonte de receita pira a Câmara Municipal.
O antecessor de V. Ex.a achou simplíssimo o problema; com uma simples penada afsinou uma portaria encarregando uai empregado da Companhia a resolver o ajunto.
Como cisso há dias, se o Governo, em vrz d-3 encarregar um empregado da Companhia tem delegado num funcionário pú-biico os mesmos poderes para obrigar a Companhia a cumprir o seu dever, passadas vinís e quatro horas não havia falta de água em Lisboa.
Se V. Ex.a fizer cumprir o contrato de 1837, estou certo que ú o bastante para haver abundância de água em Lisboa.
O Sr. MOESO de Lemos (interrompendo):— Nas actas das sessões da Câmara K mi?'pal de Lisboa, aí por 1910 ou 1911, podo V. Ex.a encontrar uma proposta feita per mim, como vereador, e aprovada, no sentido da municipalização das águas.
O Oraâcr: —Eu já conhecia essa proposta, porque, quando vim para aqui discutir c meu projecto sobre poços artesianos, procurei colher tudo quanto dizia respeito ao abastecimento de águas.
O outro assunto a que desejo referir--mo dia respeito ao Ministério da Justiça.
~la-3, ccmo o Sr. Ministro dessa pasta n£o ;>cde comparecer a esta sessão, peço ao Sr. Ministro do Comércio o favor de lhe transmitir as minhas considerações.
Os jornais de Lisboa de há três dias anunciavam, não a título do reclamo, mas para chamar a atenção de quem competisse, a venda em hasta pública, no edifício da Boa-IIora, de navalhas, paus, etc., toco esse arsenal que pertence aos fadistas e rufias.
Eu considero isso desagradável.
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Antigamente as navalhas apreendidas aos desorieiros eram queimadas no Terreiro do Paço, numa fogueira pública, e hoje podia fazer-se a mesma cousa, ou então atirá-las ao Tejo.
O Sr. Alfredo Portugal: — Não confie V. Ex.a no que dizem os -jornais. Eu sou juiz da Boa-Hora e posso afirmar a 'V. Ex.a que as armas de fogo apreendidas são enviadas para o Arsenal do Exército, e que as navalhas não são vendidas em leilão.
O Orador:—^Quere V. Ex.a dizer com isso que essas navalhas não foram vendidas?
O Sr. Alfredo Portugal: — Naturalmente não.
O Orador: —Ah! V. Êx.a não afirma!
En não não sei como é que se há-de encarar esse facto; j
Não foi essa a intenção, mas ,o facto não pode deixar de nos ser bastante desagradável.
(jQuem foi que mandou fazer o leilão, e porque o fez?
É o que é necessário apurar, e impedir a repetição.
O Sr. Alfredo Portugal (para explicações}:— Sr. Presidente: pedi a palavra para dar umas explicações ao Sr. Carlos Costa, embora dirigindo-me sempre a V. Ex.a
Também li essa notícia publicada nos jornais, e como juiz que sou posso afirmar a V. Ex.8 e à Câmara que apenas se cumpriu o que determinam as disposições legais quanto a objectos de crimes e, assim, foi feito o leilão referido em harmonia com a lei. Mais nada.
Depois, esses leilões realizam-se de seis em seis meses, porque assim o determina
o decreto n.° 6:812, publicado no Diário do Governo de 9 de Agosto de 1920, l.a série, n.° 152, sendo leiloado o que no mesmo se prescreve.
Não há, pois, intuito algum da parte das autoridades em fomentar o crime.
S. Ex.a o Sr. Carlos Costa foi injusto na sua apreciação, tanto mais que se devia lembrar que os juizes, ou autoridades cumprindo a lei, se alguma censura podem merecer redunda ela em elogio, pois desempenham as suas funções fazendo-a executar.
Pela parte que me toca, e como juiz que sou, jamais me arrependi de cumprir e mandar cumprir os diplomas emanados do Poder Legislativo, ficando assim de bem com a minha consciência.
Antigamente as armas eram enviadas para o Arsenal do Exército, hoje têm o destino que aquele decreto lhes dá,.
Tenho dito.
O Sr. Carlos Costa (para explicações):— Simplesmente para declarar quo não tive o intuito de melindrar a Justiça, e muito menos qualquer dos ilustres magistrados que fazem parte desta Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pires Monteiro): — Sr. Presidente : pedi a palavra para declarar que transmitirei ao Sr. Ministro da Justiça as considerações feitas polo Sr. Carlos Costa.
Pelo que diz respeito ao abastecimento de águas à cidade de Lisboa, não me parece que o assunto seja tam fácil de resolver como S. Ex.a diz, porque até hoje ainda nenhuma das comissões nomeadas para tal fim o conseguiu resolver.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:—A próxima sessão é na têrça-feira, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.,
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e ô minutos.