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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DO SENADO
EM 12 DE AGOSTO DE 1924
Presidência do Ex.mo Sr, António Xavier Correia Barreto Joaquim Manuel dos Santos Garcia
Secretários os Ex.mos Srs.
António Gomes de Sousa Varela
Sumário.— Chamada e abertura da sessão.— Leitura e aprovação da acta. — Dá-se conta do ex-ptdiente.
Antes da ordem do dia.— O Sr. Ribeiro de Afeio insta ^ela realização das interpelações que já anunciou, a variou membros do Ministério.
O Sr. Ministto ilas Co'ôni«s (Bulhão Pato) re-quere a ditcumão da proposta de lei n." 709, o que é aprovado.
Entra em discussão o projecto de lei n." 709.
Usa da /ja/au/a o Sr. Querubim Guimarães.
Responde o Ur. Ministro das Colónias (Bulhão Pai-;.
È aprovada a proposta de le>.
O -Sr. Costa Júnior , f az considerações sobre o reaparecimento de traineiras espanholas na? nossas costas marítimas e sobre associações de socorros ^mútuos.
Responde o Sr. Ministro das Colónias.
Sobre o assunto usa da palavra o Sr. Querubim Guimarães^ que tamhém faz considerações ré ativas a bustos de parlamentares.
Resnonilem o Sr. Presidente e o Sr. Ministro das notfnias.
O Sr. -lúlio Ribeiro fnz considerações relativas a uma noticia sobre a tdea duma missão literária à Alemanha para divulgar a o!>ra de Camões.
Responde o Sr. Minist.ro da Justiça.
O Sr. Ramos da Costa requer e a discussão do projecto de lei n." 715, sendo aprovado o requerimento.
É lido na Mesa, sendo aprovado sem discussão.
O Sr. Aragão e Brito faz considerações relativas a uma lei sobre licenças a funcionários coloniais.
Rexpon.de o Sr. Ministro das Finanças (Daniel Rodrigues}.
O Sr. Aragão e Brito fala num convénio com a Espanha.
Responde o Sr. Ministro dos Estrangeiros (Vi-torino G-odinho).
O Sr. Querubim Guimarães f ala sobre a questão da penca.
O Sr. Pereira Osório pede informações sobre os bairros sociais e o Responde o Sr. Ministro do Trabalho (Xavier da Silva). O Sr. Ministro do Comércio (Pires Monteiro) diz saber ter já vindo da outra Câmara o projecto relativo ao fsalos comemorativos da Grande Gverra. O 'Sr. Mendes dos Reis requere que ele entre em discus-no na próxima sessão, o que é aprovado. O Sr. Ferreira de Simas faz considerações sobre o decreto n." 9:763. tíe*i>onde o Sr. Ministro da Instrução (Abran-ches Ferrão). O Sr. Silva Barreto fala sobre assuntos relativos à pasta da Instiução. O Sr. Ferreira de Simas volta a falar sobre o assunto que tratara antecedentemente. Aos dois últimos oradores responde o Sr. Ministro da Instrução. O St. Alfredo Portugal f az considerações sobre liceus centrais e nacionais. Responde o Sr. Ministro da Instrução. A requ-rimento do Sr. Conta Júnior, entra em discussão na especialidade a proposta de lei relativa aos correiofi e telégrafos. Usam da palavra os Srs. Alfredo Portugal, Aragão e Brito e Ribeiro de Mdo, sendo a discussão interrompida, por ter de se entrar na Ordem do dia. — Continua a interpelação do Sr. Lima Alves ao Sr. Ministro da Agricultvra. Continua no uso da palavra o Sr. Ministro (Torres Garcia), que fala até-ao fim da sessão. O Sr. Presidente encerra a sessão. Abertura da sessão às 15 horas e 18 minutos. Presentes à chamada 24 Srs. Senadores. Entraram durante a sessão 16 Srs. Senadores.
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Diário das Sessões do Senado
Srs. Senadores presentes à chamada:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Álvaro António Bulhão Pato.
António Gomes de Sousa Varela.
António Maria da Silva Barreto.
António Xavier Correia Barreto.
Aprígio Augusto de Serra e Moura.
César Procópio de Freitas.
Constantino José dos Santos.
Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.
Francisco António de Paula.
Francisco José Pereira.
Francisco Vicente Ramos.
João Maria da Cunha Barbosa. .
Joaquim Manuel dos Santos (rareia.
Joaquim Xavier Figueiredo Oriol Pena.
José António da Costa Júnior.
José Augusto Ribeiro de Melo. , José Machado Serpa.
José Mendes dos Reis. -
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Manuel Gaspar de Lemos.
Roberto da Cunha Baptista.
Silvestre Falcão.
Entraram durante a sessão os Srs.;
Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.
Artur Augusto da Costa.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Augusto de Vera Cruz.
César Justino de Lima Alves.
Francisco de Sales Ramos da Costa. 'Frederico António Ferreira de Simas.
João Carlos da Costa.
João Catanho de Meneses.
João Manuel Pessanha Vaz das Neves.
Joaquim. Pereira Gil de Matos.
José Joaquim Fernandes Pontes.
José Joaquim Pereira Osório.
Querubim da Rocha Vale Guimarães.
Rodolfo Xavier da Silva.
Tomás de Almeida Manuel de Vi-Ihena (D.)
Srs. Senadores que não compareceram :
Aníbal Augusto Ramos de Miranda. António Alves de Oliveira Júnior. António da Costa Godiuho do Amaral. ' António de Medeiros Franco.
Artur Octávio do Rego Chagas.
Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
Herculano Jorge Galhardo.
João Alpoim Borges do Canto.
João Trigo Motinho.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Teixeira da Silva.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto de Sequeira.
José Duarte Dias de Andrade.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Luís Augusto Simòes de Almeida.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Nicolau Mesquita.
Pedro VirgoUno Ferraz Chaves.
Raimundo Enes Meira.
Ricardo Pais Gomes.
Rodrigo Guerra Alvares Cabral.
Vasco Crispiniano da Silva.
Vasco Gonçalves Marques.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Sr. Presidente: —Vai proceder-se à chamada.
fez-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes^ 24 Srs. Senadores. Está aberta a sessão. Eram, 15 horas e 20 minutos.
Vai ler-se a acta. Leu-se.
O Sr., Presidente:—Está em discussão a acta. Pausa.
Come ninguém pede a palavra, considera-se aprovada: Vai ler-se o
Expediente
Ofício
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«próximo, na quinta das Peles em Odive-las, a fim de funcionar como perito em uma vistoria.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Justiça, satisfazendo o requerimento do Sr. Procópio de Freitas, em ofício n.° 74, de 30 de Julho último.
-Para a Secretaria.
Projecto de lei
Do Sr. Costa Júnior, proibindo as consultas médicas das associações de socorros mútuos nas farmácias particulares ou suas dependências.
Para a 2.a Secção.
Telegrama -
Do Sr. Tomás de Vilhena, justificando uma falta.
Para a Secretaria.
Antes da ordem do dia
O Sr. Ribeiro de Melo (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejava saber se o requerimento que fiz há dias, pedindo, pelo Ministério das Finanças, me fosse fornecida uma nota do pessoal contratado e dos seus vencimentos para a secção de câmbios, já teve alguma resposta.
O Sr. Presidente:—Ainda ' não veio resposta alguma.
O Orador : — Se V. Ex.a me permite eu faço ainda.uma outra pregunta. Mandei para a Mesa várias notas de interpelação, uma ao Sr. Ministro das Finanças e outra ao Sr. Ministro do Comércio, tendo mandado ultimamente uma nota de interpelação ao Sr. Ministro das Finanças por causa da famosa compra dos títulos da divida externa, feita pela secção de câmbios da Caixa Geral de Depósitos.
Ora eu peço a V. Ex.a, como dirigente dos trabalhos desta casa do Parlamento, que não deixe encerrar esta sessão legislativa sem deixar de marcar esta interpelação.
O Sr. Presidente:—Por emquanto só o Sr. Ministro do Comércio se deu por habilitado. Não sei se terminará hoje a
interpelação feita a S. Ex.a pelo Sr. Lima Alves; no caso de terminar, marcá-la hei para sexta-feira.
O Orador: — Se V. Ex.a consentisse, quando se tiver de apreciar a questão dos duodécimos e das autorizações pedidas pelo Sr. Kodrigues Gaspaj, eu teria ocasião de versar, sobretudo, este assunto da compra dos títulos externos que aqui desejo tratar.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato):—Sr. Presidente: na sessão passada apresentei uma proposta para a qual pedi urgência e dispensa do regimento, a fim de ser discutida antes da ordem do dia "uma proposta de pouca importância, e tanto assim que a Câmara concordou com a urgência ^e dispensa do Regimento. -*-
Todavia, na última sessão não foi possível discutir essa proposta, por se lhe terem anteposto outros assuntos mais importantes.
Por isso renovo o meu pedido para qne entre imediatamente em discussão a proposta de lei n.° 709. É sobre funcionários que desempenham funções junto dos altos comissários.
Posta à votação, é aprovada.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:—Está em discussão a proposta de lei n.° 709. , É a seguinte:
Proposta de lei n.° 709
Artigo 1.° Aos juizes do ultramar que nas colónias desempenharem em comissão temporária junto dos altos comissários o cargo de secretário provincial será contado como de efectivo serviço, para os .efeitos de promoção, abono do terço do vencimento de categoria e passagem à magistratura da metrópole, o tempo que naquelas permanecerem no exercício daquele cargo.
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Diário das Sessões ao Senado
• Art. 2.° Os magistrados judiciais que passarem a exercer a comissão de que trata o artigo antecedente serão colocados no quadro, deixando vago o seu Lugar, e se forem juízos da 2.a instância ficarão, quando terminarem a comissão, agregados à Relação em que serviam até que nela, haja vaga, que preencherão; sendo, porém, de l.a instância,' serão colocados na primeira vega que ocorrer na sua classe.
§ único. Os governos coloniais comunicarão ao Ministério das Colónias a díita em que os magistrados judiciais começarem a exercer as funções de secretário provincial.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 25 de Julho de 1924. — Afonso de Melo Pinto Veloso — Baltasar de Almeida Teixeira.
O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Colónias teve a amabilidade de vir dizer-me quais os intuitos deste projecto, que são aqueles que ele menciona, havendp apenas a ò.cres-centar uma circunstância que S. Ex.a teve a lealdade de me comunicar.
E esse íacto que me leva a não fazer ao projecto uma oposição de maior. Mas eu não posso votar o projecto, isto sem menos consideração para o Sr. Ministro das Colónias nem para com c funcionário a quem diz respeito esse projecto, porque entendo que todos os projectos que tenham um carácter pessoal enfermam de um vício, embora a situação dessa pessoa mereça realmente toda a atenção.
E há mais a circunstância de esse projecto ter uma circunstância nova, porque nas comissões de serviço dos magistrados costumava contar-se o tempo respectivo dessas comissões, para efeitos de antiguidade, e para efeitos de promoção e pás- . sagem à metrópole esse assunto estava condicionado à lei que o regula.
Não há dúvida que esse funcionário, não pode vir para cá sem ter metade do tempo de serviço, mas, no que respeita à promoção, há um pouco de anormalidade.
Isso não quere dizer que o facto seja de maior importância; isso a quem mais poderá chocar ó aos respectivos magistrados que venham. a ser prejudicados
por essa situação nova que a lei vai, criar.
Foi unicamente para declarar que não dou o meu voto por uma questão de princípios é que eu pedi a palavra. Não tenho interesse nenhum que se não aprove o projecto; unicamente faço esta declaração porque entendo que a devo f;izer, isto sem quebra de consideração para com o Sr. Ministro das Colónias, que teve. a lealdade de me vir comunicar a que visava o projecto, e srm quebra de consideração para com o respectivo funcionário.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato):—Sr. Presidente: eu não podia deixar de pedir a palavra para agradecer ao ilustre Senador Sr. Querubim Guimarães as palavras de deferência que teve para comigo. . - *
Não há dúvida que esta proposta de lei aproveita apenas a um funcionário, é para o Dr. Moreira da Fonseca, que está actualmente na prjvíncia de Moçambique e que o Alto Comissário pretende que vá auxiliar o seu trabalho de dirigir a província, com o cargo de Secietário do Interior. .
Diz S. Ex.a que isso vai prejudicar os colegas; mas eu entendo que não há prejuízo, porque, assim como elo agora se aproveita da lei, amanhã outro irá aproveitar-se também.
Este funcionário conhece muito bem a província e será um auxiliar de primeira ordem. Foi esta a razão que me levou a pedir a V. Ex.as a fine/a de me deixarem passar este projecto, porque, com essa aprovação, interessa o Governo e interessa o país.
Eram estas as explicações que eu tinha de dar a S. Ex.a, renovando-lhe os meus agradecimentos.
O orador não reviu.
foi aprovado o projecto na generalidade e na especialidade com dispensa da leitura da última redacção, requerida p elo Sr. Costa Júnior.
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nhã as minhas considerações sobre o assunto a que passo a referir-me.
As traineiras espanholas que vinham às nossas águas pescar sardinhas, e as francesas que vinham pescar lagosta, voltam de novo, de forma que dentro em pouco tempo temos as nossas costas completa-meute devastadas.
Eu sei que foram votadas aqui no Senado umas verbas para aquisição de traineiras pura fazer a .fiscalização, mas até à data ainda não apareceu nenhuma.
Recebi agora um telegrama de Peniche em que me pedem que chame a atenção do Governo para esto assunto, porque comoçaram lá a aparecer cardumes de sardinha mortos, porque essas traineiras fazem uso de dinamite e do carbureto que, metido dentro de uma garrafa e deitado ao mar, o contacto com a água. provoca a explosão, faz o mesmo efeito que uma bomba.'
Eu desejava tnmbém que estivesse presente o Sr. Ministro do Trabalho para lhe chamar a atenção para um decreto 'que foi publicado pelo Sr. Lima Duque, ao abrigo das autorizações parlamentares, mas que é indicado como iusconstitucio-rial, e o que é mais inconstitucional agora é que o Sr. Ministro do Trabalho fez outro decreto alterando as disposições desse outro.
Agora outro assunto.
Actualmente dão-se abusos importantes em relação às associações de socorros mútuos que têm consultas nas farmáciasJ
As consultas são dadas nas farmácias e os indivíduos são obrigados a deixar a receita para ser aviada lá, dando lugar a abusos, porque a lei permite ir aviar as receitas onde O indivíduo quiser, dando-se até às vezes o caso de sor receitado um produto que pode ser alterado ou substituído e o farmacêutico faz essa alteração ou substituição mal feita, o que prejudica os doentes.
Por isso eu mando para a Mesa um projecto de lei para o qual peço urgência, proibindo que as associações.tenham consultas nas farmácias, para que a classe farmacêutica, fique livre dessa pressão moral que existe sobre ela.
O orador não reviu,
O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato): — Sr. Presidente, ouvi com toda a
atenção as considerações apresentadas pelo !Sr. Costa Júnior e transmiti-las hei aos respectivos Ministros.
O Governo tem estado preocupado com assuntos urgentes de .forma que não tem poilido tratar de todos.
Esse assunto dos pescadores é dos mais importantes e mais graves que nós temos a resolver. .
Ele está entregue, como V. Ex.as sabem, a um homem de acção e de valor como é o Sr. Ministro da Marinha, um profissional, um marinheiro ilustre, e posso garantir a V. Ex.as com a minha palavra de honra que o Sr. Ministro da Marinha tomará na mais alta consideração as palavras de V. Ex.a
A respeito da questão, °a que V. Ex.a se referiu, do Sr. Ministro do Interior, confesso que não tenho conhecimento, neste momento de tal caso.
Em todo o caso farei chegar ao apreço do Sr. Ministro do Interior as considerações de V. Ex.a
O orador não reviu.
O Sr. Querubim Guimarães: —Sr. Presidente: aproveito as considerações feitas pelo Sr. Costa Júnior, a respeito da pesca, nas costas portuguesas, por barcos espanhóis, para pedir ao Sr. Ministro das Colónias, que está presente, o favor de atender as minhas considerações, e ao mesmo tempo para pedir a S. Ex.a o obséquio de transmitir ao seu ilustre colega da pasta respectiva as considerações que vou fazer.
É claro, Sr. Presidente, que o Sr. Ministro das Colónias sabe muito bem, como nós todos sabemos, o grande prejuízo que à economia nacional tem causado o abuso praticado pelos barcos espanhóis que não encontram nas suas costas a sardinha, prejudicando imenso a nossa indústria piscatória.
A esse respeito o Ministro da Marinha do Governo transacto, que é o mesmo do actual Gabinete, tomou providências muito justas e razoáveis para que esse abuso não continuasse.
Mas constai o, em face do que dizem vários jornais, que está aprazado um acordo entre Portugal e Espanha, sobre este assunto.
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Diário das Sessões do Senado
comissão portuguesa para regular a questão da pesca.
Eu não sei como isso possa ser, tendo bem presente-.o que se passou em 1915 a tal respeito.
Não sei como ó que agora os h espanhóis são os principais interessados nesta questão, porque nós temos costas e peixe, e os espanhóis apesar de terem costas não têm peixe.
Não percebo, pois, para que vem a ser essa comissão que vai ser nomeada.
Não sei mesmo se isso é da iniciativa do Governo transacto, se deste Gabinete. O que sei é que estes factos vêm revelados nos jornais e têm alarmado a nossa indústria piscatória.
Vejo também nos jornais um telegrama de Matozinhos protestando contra essa comissão, e ao mesmo tempo faz-se orna suspeita, que eu sou levado, por este espírito de respeito que devo a todos os portugueses, a repelir.
Diz-se que um português, que faz parte dessa comissão, está ligado de tal ordem aos interesses espanhóis, que o tornam suspeito.
Não se indicam nomes, mas o quê é certo é que esse telegrama regista o facto.
Sr. Presidente: eu chamava a atenção do Sr. Ministro das • Colónias para que, com os seus colegas da Marinha e Estrangeiros, tratassem do assunto e vissem se realmente há uma necessidade imperiosa, que eu reconheço para os espanhóis, mas não para os portugueses, de andarmos a tratar da questão de tal modo, se a comissão está de facto nomeada e se entre elas há alguma pessoa suspeita como se depreende do referido telegrama, e em suma, quais os intuitos do Governo; se este está disposto a fazer concessões aos espanhóis que porventura vão prejudicar o nosso património.
Feitas estas considerações, surgidas pelas palavras do Sr. Costa Júnior, eu chamo a atenção de V. Ex.a, Sr. Presidente, para um assunto que foi o principal para que pedi a palavra.
Desejava saber em primeiro lugar se há qualquer comissão ou entidade adentro dos trabalhos parlamentares, que tenha a função de censor, pois que não conheço lei que tal permita.
Sabe V. Ex.a, Sr. Presidente, que eu em tempos apresentei ao Senado uma pro-
posta para colocação nesta sala do busto de António Cândido. Pois alguém se permitiu cortar a lápis vermelho e a lápis verde, que tais são as cores da bandeira da Eepública, e em quanto ela durar, as da Nação, as palavras que eu tinha escrito na, referida proposta em referência a António Cândido «mais que ninguém tem direito».
Sr. Presidente: permiti-me ir à Secretaria e notei que havia na proposta uma falta de concordância e de dedução lógica.
Tais palavras não significam desdouro para ninguém. ^Pois haverá desdouro para qualquer parlamentar em se dizer que ninguém mais que António Cândido merece um busto? Desejava pois que V. Ex.a, Sr. Presidente, me informasse sobre este assunto. As funções de censura eram antigamente exercidas pelo juízo de investigação criminal. Hoje não s&compreende que haja outra entidade COIQ essas atribuições. Tem V. Ex.a na mão o processo que mandou buscar. A respectiva comissão administrativa diz no seu parecer que não tem fundos para a colocação do busto. Pelo mesmo motivo ainda não foram colocados os bustos de Machado Santos e Anselmo Braam-camp. O pedido que eu faço acerca da colocação rápida do busto referido abrange as propostas referentes aos outros bustos. Também desejava saber se porventura" a comissão administrativa tem dado contas anuais como manda o Regimento. • A nenhum dos dignos membros da comissão administrativa eu atribuo qualquer falta de menos cuidado na aplicação dos respectivos dinheiros. No emtanto como é atribuição do Parlamento conhecer dessa aplicação, parece--me que eu como parlamentar tenho o direito de saber dessa aplicação.
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Há pelo menos deste modo uma aparente contradição nas intenções da comissão, que eu desejava perfeitamente conhecer.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Mandei buscar o processo, e vi com mágoa que S. Ex.a tem razão. Existem dois traços a verde e a encarnado.
Não os fez a comissão administrativa; nem sei quem os fez; mandarei averiguar.
Quanto ao fazerem-se os bustos, a verba inscrita no orçamento para as despesas ordinários não chega já pelo aumento sucessivo dos artigos; daí o não se terem ainda feitos esses bustos.
Sobre as contas, todos os anos a comissão administrativa as apresenta à Câmara dos Deputados; aí são examinadas; porém o que tem acontecido é que não as têm mandado para o Senado.
Mas a comissão administrativa também não sabe o resultado desses exames.
O Sr. Querubim Guimarães: -r- Se a culpa é da Câmara dos Deputados, V. Ex.a, como presidente do Congresso e da comissão administrativa, tem o direito de conseguir que tais contas tenham o destino devido. «
O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato):—Falou S. Èx.a sobre o assunto da pesca.
No que toca ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, eu lhe comunicarei as considerações de S. Ex.a ainda hoje.
O Sr. Júlio Ribeiro: — Sr. Presidente : .não sou nem posso ser contra as missões internacionais que vão tratar de assuntos económicos financeiros ou comerciais, porque estes são de vantagem para b país, tornando a nossa terra conhecida, prestigiando-a.
Ao que eu não posso ser favorável é que, nas circuntâncias desgraçadas em que o pais vive, se esteja a esboçar uma missão artística para ir à Alemanha, como vejo no Diário de Noticias.
Convidado o nosso ministro naquela terra, Sr. Veiga Simões, pela Faculdade Eomânica da Universidade de Berlim a fazer uma conferência acerca da vida e do significado da obra de Camões, S. Ex.a
julgou-se incompetente para isso e disse que um plano mais vasto e mais belo de expansão espiritual se efectivaria, insinuando que iria de Portugal uma comissão para tratar de tão interessante assunto.
Se a situação da vida nacional fosse desafogada, nada mais brilhante e de mais valor moral do que dar a conhecer ao mundo a Bíblia Santa dos portugueses, mas escolhendo quem se devia escolher, e não os que quisessem ir.
A missão a que se referem agora será constituída por dez membros, em regra desafectos ao regime, ou sem a menor simpatia pela República.
Seria chefiada —é o que diz o jornal— pelo Sr. Dr. Eugênio de Castro, pessoa por quem tenho alta simpatia, consideração ,e admiração, um dos príncipes dos poetas portugueses, mas que sei cordeal-mente adverso às instituições.
Sendo assim, Sr. Presidente, não compreendo porque é que esta missão não devia ser chefiada por um republicano, como, por exemplo, é o Sr. Augusto Gii ou João de Barros que, quanto a mim, não são inferiores (Apoiados) e estão bem à altura de tão interessante e patriótico •ensinamento.
Dando de barato que os etcs. deste artigo não se refiram a pessoas, e que sejam só os enumerados nesse jornal, e dando de barato também que cada membro dessa missão gaste 10 libras diárias, nós temos por dia uma despesa de 15 contos, verdadeiramente incomportável com a nossa situação.
Chamo portanto a atenção do Sr. Ministro da Justiça para este facto, a fim de se dignar comunicá-lo.ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros, estando no entanto convencido de que se trata apenas dum balão çle ensaio e que o Governo não pensa em semelhante* cousa.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Dr. Catanho de Meneses): — Não posso informar nem V. ,Ex.a nem o Senado sobre o que há a respeito do assunto a que V. Ex.a se referiu.
Bem pode ser, e creio que assim é, que a notícia não seja exacta.
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lhor boa vontade e conhece bem as circons-tâncias que afligem o Tesouro Português para não se alargar em despesas que seriam inúteis.
Comunicarei ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros as observações feitas por V. Ex.% mas parece-me que posso assegurar ao Senado que essa notícia não tem nada de verdadeira.
O orador não reviu.
O Sr. Ramos da Costa : — Sr. Presidente: é para V. Ex.a consultar a Câmara sobre se permite que entre já em discussão a proposta de lei n.° 715, que é nem mais nem menos do que cm esclarecimento a uma outra proposta que aqui foi votada, sobre os deficits das Misericórdias.
Esta proposta, que eu apresento, é somente para fazer uma rectificação de datas.
Posto à votação o requerimento, foi aprovado.
foi lida na mesa, e, posta à discussão na generalidade e especialidade, foi aprovada.
É a seguinte:
Proposta de lei n.° 715
Artigo 1.° O actual ano económico a que se refere o final do artigo 1.° da Jei n.° 1:641, de 29 de Julho de 1924, é o ano económico de 1923-1924;
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da Repiblica, em 4 de Agosto de 1924. — Alberto Ferreira Vidal — Baltasar de Almeida Teixeira.
O Sr. Aragão e Brito: — Sr. Presidente: já tive ocasião de falar quando estava presente o Sr.-Ministro das Finanças.
Tinha pedido a palavra para quando estivesse presente, o Sr. Ministro das Colónias.
Se S. Ex.a pudesse vir agora a esta Câmara seria um grande favor.
Sr. Presidente: eu pedia ao Sr. Ministro o favor do transmitir ao Sr. Ministro das Colónias as considerações seguintes: — acabo de receber um telegrama do
ilustre Senador Sr. Anacleto da Silva, eleito por Macau, e colonial distinto, que, alarmado com uina notícia publicada no jornal,, de que ia ser suspensa uma lei promulgada pelo Congresso da República, que beneficia os coloniais filhos das colónias do gozo duma licença com direito a vir à metrópole,— pede para dizer ao Sr. Ministro das Colónias que julga exorbitante qualquer medida que S. Ex.a ponha em prática suspendendo essa lei.
Em meu nome e dos Senadores independentes tenho a dizer que efectivamente o Poder Executivo tem uma autorização para deixar de pôr em execução leis que tragam aumento de despesa. Mas não ó o caso. As colónias têm autonomia financeira e os seus.filhos vêm à metrópole com despesas suas. É claro que a l«'i diz que é só quando a colónia esteja florescente.
O ilustre Senador a que me refiro pôs todo o seu carinho em defesa da lei a que me refiro; ela é o seu orgulho e não se vá agora por uma lei que é de mais a mais considerada como ditatorial, aniquilar todo o seu esforço.
Nós, Senadores independentes, damos a S. Ex.a todo o apoio e solidariedade para que tal medida seja suspensa, se ó que o Sr. Ministro das Colónias a tenciona publicar.
E já que estou no uso da palavra pedia ao Sr. Ministro das Finanças para pre-guntar ao seu colega dos Estrangeiros se acha conveniente fazer-se um convénio com a Espanha; independentemente de com ela se fazer um tratado de comércio julgo conveniente que o Sr. Ministro dos Estrangeiros venha explicar isto ao Senado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Daniel Rodrigues):— Sr..Presidente: ouvi com atenção as considerações feitas pelo Sr. Ara-gâo e Brito.
Eu transmitirei ao Sr. Ministro das Colónias as suas palavras, e estou certo de que S. Ex.a não deixará de as ponderar, para proceder conforme for de justiça.
Por mim, nada posso dizer sobro o assunto.
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O Sr. Aragão e Brito (para explicações): — Sr. Presidente: eu pedia â atenção do Sr. Ministro dos Estrangeiros.
Tinha eu acabado de pedir ao Sr. Ministro das Finanças para lazer o favor de preguntar a V. Ex.a se achava conveniente fazer se um convénio com a Espanha, independentemente de com ela se fazer um tratado de comércio.
O Sr. Ministro dos Estrangeiros (Vito-riuo Godinho): —Em respostaà pregunta concreta feita pelo ilustre Senador Sr. Aragão e Brito, e sabendo, eu que já outros Srs. Senadores se referiram a este assunto, cumpre-me declarar o seguinte:
Encontra-se em Portugal uma delegação' espanhola para de acordo com uma delegação portuguesa, e podemos dizer esto trabalho quá^i depende directamente do Ministério da Marinha, organizar uma comissão mixta a pedido, principalmente de Espanha, não para fazer um convénio sobre a pesca, mas para se estudar a forma de evitar determinados incidentes de pesca.
JK unicamente o objectivo desta comissão; é uma comissão de estudo, não se trata, como já disse, de realizar um convénio de pesca.
São estas as explicações que devo dar a V. Ex.a, que estou certo deverão calar no ânimo de V. Ex.a
O orador não reviu.
O Sr. Querubim Guimarães: — Fui eu
um dos Senadores que trataram aqui da questão da pesca e eu pedi ao Sr. Ministro das Colónias para transmitir a V. Ex.a, Sr. Ministro dos Estrangeiros, as minhas considerações.
Eu tinha dito que estranhava que se reunisse uma comissão composta de delegados espanhóis e portugueses para regular a questão da pesca, e que não sabia como isso podia ser, em vista do que se passou em 1915, a tal respeito.
Não sei como é que agora os espanhóis são os principais interessados, porque nós tomos costas e peixe, e os espanhóis, apesar de terem costas, não têm peixe.
Não percebo para que vem a ser essa comissão que vai ser nomeada; não sei mesmo se isso é da iniciativa do Governo transacto se deste Governo.
O que sei é que isto vem revelado nos jornais.
Notei também que num jornal vinha um telegrama de Matozinhos que se referia a esse assunto importantíssimo, em que havia um dos membros da comissão que está ligado de tal forma aos interesses espanhóis que o tornam suspeito.
Pelas declarações de V. Ex.a vejo que não se trata de convénio algum de pesca.
Agradeço a V. Ex.a o vir aqui sossegar o meu espírito, devendo declarar-lhe que estou satisfeito com as suas declarações, porque não se tratava de um convénio cie pesca com a Espanha.
O orador não reviu.
O Sr. Pereira Osório: — Aproveitando estar presente ò Sr. Ministro do Trabalho, pedi a palavra para 'ver se S. Ex.a já pode dizer à Câmara qualquer cousa a respeito do assunto que muito tem interessado o Senado, os quais são a liquidação dos Bairros Sociais e o caso do Lazareto.
O Sr. Ministro do Trabalho (Xavier da Silva): — Em resposta à pregunta feita pelo ilustre Senador Sr. Pereira Osório, devo informar o Senado, no respeitante ao Lazareto, que visitei esse estabelecimento e bem triste impressão me deixou a visita ao edifício, onde encontrei uma devastação completa, mais parecendo uma devastação de vândalos do que de homens do século XX.
Até foram deitadas abaixo dependências do Lazareto, como eram algumas casas de arrecadação de lenha e dfi carvão, no único intuito de aproveitarem o seu madeiramento para queimar e cosinhar rancho.
Desapareceram janelas, portas, portões e até as respectivas cantarias, tendo desaparecido todo o mobiliário e utensílios, alguns dos quais, como pratos, guardanapos, toalhas e lençóis, me informaram terem sido levados para o hospital da Estrela.
Esta formidável e criminosa devastação — é bom saber-se— teve lugar em pleno dezembrismo, após a entrega do estabelecimento à Cruzada Nun'Alvares, que pela exactidão do nome não poderá perder, como pelas acções praticadas, condenáveis e indignas.
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investigação, que ainda o não tem concluído.
Não tenho conhecimento oficial do que se passa com esse processo, mas creia "v". Ex.a qus empregarei todos os meus esforços para que'os autores deste atentado contra os valores do Estado sejam rigorosa e inexoravelmente punidos.
Quanto aos Bairros Sociais, devo dizer, Sr. Presidente, que há uma lei que autoriza o Governo a negociar os Bairros Sociais da Ajuda. Covilhã, Alcântara e Porto coin as câmaras municipais, no caso de os terrenos estarem expropriados ou pagos, e que a Câmara Municipal de Lisboa não quis nem os da Ajuda nern os de Alcântara.
A Câmara da Covilhã quere os terrenos e as construções que já estão feitas, como são as aberturas de duas avenidas e alguns alicerces de prédios.
O Governo está em transacção com essa Câmara, para lhe entregar, o mais rapidamente possível, os respectivos terrenos e alicerces, ficando, porém, à Câmara os direitos e encargos que estão hoje enfeudados ao Governo, e pelos quais ela se tornará responsável.
Relativamente aos terrenos da Ajuda, Alcântara e Porto, mas, especialmente, aos dois primeiros, o Governo, por um dos números dessa lei a que fiz referência, está autorizado—em vir ta de de a Câmara os não querer— a negociar a sua entrega aos respectivos proprietários.
Ora os proprietários do terreno do bairro da Ajuda, quando esse terreno entrou na posse do Estado, combinaram que cada metro quadrado fosse avaliado em 70 centavos.
Hoje querem para entram a sua posse, que lhes paguem os juros acumulados desde essa época, ascendendo esta verba à quantia de 200 contos, aproximadamente.
Entendia eu — e disto dei conhecimento ao G-ovêrno— que não podia negociar uma tal transacção.
Eis o estado da questão, pelo que respeita aos terrenos da Ajuda.
No tocante aos do bairro de Alcântara, o caso agrava-se, porque esses terrenos foram avaliados a 2$50 o metro quadrado e os juros acumulados dão uma quantia superior ao valor do terreno.
De. maneira que entendi também que não podia transaccionar a entrega do ter-
reno pagando ainda uma quantia superior ao seu custo.
Julgo que não é honesto ou, pelo menos, não é defender os interesses do Estado o transaccionar nestas condições.
Quanto ao bairro do Arco do Cego, depreende-se da lei que o Governo tem obrigação de continuar as suas edificações até a sua conclusão.
Sr. Presidente: das muitas visitas que tenho feito aos diversos estabelecimentos dependentes da minha pasta, 'a do bairro do Arco do Cego foi uma das mais dolorosas.
Vi cousas que se me deixaram, como republicano, perfeitamente magoado, me produziram, como homem, o efeito dum verdadeiro assombro.
Confesso que, sendo médico, seria incapaz, se alguém ine desse o encargo de fazer a planta de um bairro, de a traçar, . por vezes, com mais incompetência do que a constada nalguns pontos.
Perdoe-se-me a imodéstia, mas eu digo a razão-por que faço estas afirmações.
Há uma avenida principal, que ó uma das ruas mais largas do bairro —porque as restantes são quási semelhantes às nossas vielas daMourariae Alfama— e nesta avenida principal, a que pode chamar-se o coração do bairro, os prédios são orientados de maneira que as retretes estão voltadas para ela!
Quanto aos prédios, uns estão quási completamente construídos; outros a mais de meia construção; e outros têm apenas os chamados esqueletos de madeira e alicerces respectivos.
Aos que estão quási concluídos, devido à falta de telhados, de caixilhos das janelas ou de vidros, a chuva entra francamente por ali dentro e destrói tudo, de modo que muitos sobrados começam a arruinar-se.
Estes prédios foram todos construídos sem esgotos e canalizações e sem que se tivesse atendido ao elementar raciocínio de os edificar sobre um terreno onde, previamente, se procedesse à construção de colectores e esgotos.
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Só a ligação do seu colector com a do pertencente à Avenida Almirante Eeis, único, dos da vizinhança, com a suficiente capacidade, estava orçada, há tempo já, em 5:000 contos.
Entendi eu -que não devia moralmente servir-me das atribuições que me dava a lei para continuar a construção do bairro sem francamente informar a Câmara da situação em que tudo se encontra.
Na Câmara dos Deputados apresentei uma proposta de lei que sintetiza o meu modo de pensar e na qual peço autorização para o Governo, à maneira do que fez com o bairro social da Covilhã e com os terrenos da Ajuda e Alcântara, ficar autorizado a negociar a adjudicação do bairro do Arco do Cego, de preferência à Câmara Municipal, e a levar por diante as expropriações.
Até hoje ainda a Câmara se não pronunciou.
Uma outra- lei me autoriza a que eu faça um empréstimo de 5:000 contos na Caixa Geral de Depósitos para atender às reparações necessárias tendentes a defender os edifícios do bairro do Arco do Cego dos efeitos da invernia.
Entendo eu que se não deve ir gastar esse dinheiro a pôr coberturas em esqueletos de madeira já quási apodrecidos na sua totalidade. Era ir desperdiçar mais dinheiro a resguardar o que está já absolutamente perdido.
Mais urgente será tapar os prédios quási construídos, pôr-lhes os +elhados, os caixilhos das janelas, portas, etc.
Mas infelizmente tenho de confessar que estou impossibilitado de realizar esses benefícios, perdendo-se-o momento oportuno desta estação de verão.
Como não pretendo gastar toda a verba autorizada, e mesmo para facilitar a operação, mandei entabular negociações com a Caixa Geral de Depósitos para uns empréstimos mensais de 200 contos, que mais não seria preciso em cada mês para despesas e salários. Porém a Caixa de Depósitos respondeu que não estava habilitada neste momento a fazer qualquer empréstimo.
Mais um inverno passará sobre aqueles edifícios, e não sei em que condições eles ficarão; suponho avizinhar-se o seu prejuízo'to tal.
Sr. Presidente: parece-me ter falado
com clareza bastante para elucidar o ilustre Senador Sr. Pereira Osório e o Senado da Eepública. Disse.
O Sr. Pereira Osório : — Agradeço ao Sr. Ministro do Trabalho as explicações claras e francas e cheias de probidade que deu à Câmara.
Estou convencido de que o Senado 1em a certeza que está ali um homem que sabe defender bem os interesses do Estado (Apoiados) e oxalá que se conserve naquele lugar a tempo de poder evitar os possíveis abusos que adviriam da execução da lei, e que S. Ex.a muito bem não quere aproveitar.
O Sr. Ministro do Trabalho (Xavier da Silva):—Agradeço essas palavras devidas mais à amabilidade de S. Ex.a Cumpro apenas o meu dever.
O Sr. Ministro das Colónias (Bulhão Pato): — Quero dizer ao Sr. Aragão e Brito que eu estava para responder a S. Ex.a quando me vieram chamar da Câmara dos Deputados para ali defender um projecto.
Quando voltava, encontrei o Sr. Ministro das Finanças que disse que já tinha falado.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pires Monteiro): — Fui informado de que já está no Senado um projecto vindo da outra Câmara, relativo à criação dum selo comemorativo da guerra.
Devo esclarecer que do projecto não advirá qualquer encargo para o Estado.
Essa emissão é entregue a uma comissão chamada dos Padrões da Grande Guerra, que tem a incumbência patriótica de levantar padrões em França, Angola e Moçambique, nos sítios onde as nossas tropas combateram.
O Sr. Mendes dos Reis: — Requeiro a V. Ex.a que esse projecto entre amanhã em discussão antes da ordem do dia.
Aprovado.
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trículas nas escolas primárias superiores, desejava saber se S. Ex.a tem tenção de cumprir o decreto n.° 9.:763. * Para mostrar o que ele tem de monstruoso, basta lê Io:
Leu.
Desejava também pedir ao Sr. Ministro da lastrução que me informasse da razão por que foi publicado o decreto estabelecendo as condições dos exames de admissão à Escola Primária Superior, visto que no dia 10 de Abril deste ano foi publicada a lei n.° 1:579, em que estão estabelecidas as condições exactas que S. Ex.a também estabeleci-u no seu decreto e, mais, rudimentos de francês.
Era de isto que eu desejava que S.. Ex.a me informasse.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Miirstro da Instrução (Abranehes Ferrão):— Sr. Presidente: sobre as considerações que foram feitas acerca das escolas primárias superiores devo dizer que realmente não poderia contbrmar-me de maneira nenhuma em manter o que estava, porque mantinha uma monstruosidade. As escolas primárias superiores nào têm finalidade de espécie nenhuma, tendo sido criadas atendendo-se mais a condições de ordem material dos seus professores do que às do ensino.
Há escolas primárias superiores que gastam 100 contos tendo uns 8 ou 10 alunos, gastando, portanto, o Estado mais com a instrução desses alunos do que se lhea mandasse um professor a casa.
Ora" eu pregunto ao ilustre Senador Sr. Ferreira de Simas se, nestas condições, en podia manter o que estava.
Pelo Ministério da Instrução foi nomeada uma comissão encarregada de fazer uma espécie de remodelação dessas escolas. Aguardo esses trabalhos para depois proceder como for mais conveniente para os interesses da Eepública e do ensino.
Aí tem S. Ex.a o que posso dizer sobre o assunto.
Quanto ao segundo ponto não percebi bem o que me foi preguntado. Creio que foi quanto aos exames de admissão. Eu vou informar-me e pode S. Ex.a estar certo de que a lei há de ser cumprida.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Silva Barreto: — Aproveito a ocasião de estar presente o Sr. Ministro da Instrução para chamar a atenção 'de S. Ex.a para um pretenso regulamento, decreto ou outra publicação, que anda na imprensa como elixir milagroso.
Quando Ministro da Instrução o Sr. Hel-der Ribeii o teve a gentileza de me convidar a uma conferência sobre assim tos do seu Ministério, gentileza a que eu, como era de meu dever, correspondi com igual gentileza. S. Ex.a depois de trocar várias impressões sobre pontos do Ministério da Instrução, especialmente no que respeita ao ensino normal primário, pedia-me que fizesse uma revisão a este regulamento de 401 artigos. Eu, como disse, respondi a essa gentileza da lembrança de S. Ex.a com aturado estudo do 3 dias e 3 noites, tendo revisto uns duzentos e tantos artigos.
Sr. Presidente: depois de ter revisto estes duzentos e tantos artigos informei S. Ex.a e, ou fosse pela minha informação ou não, o que é certo é que S. Ex.a entcmdeu que devia fazer aquilo que em meu entender devia fazer.
Sr. Presidente: não quero cansar mais a atenção da Câmara; como disse, revi duzentos e um artigos e verifiquei que êsle regulamento é, como muitos outros, um regulamento à vara larga, onde há disposições de lei contra lei e então incide isto que ó mais extraordinário: é que impondo a lei que as juntas escolares devem tsr para presidente o vereador do Pelouro da instrução, e, quando não, o Presidente da Comissão Executiva, aqui por esta disposição da lei.manda que seja um inspector escolar.
Mas a gravidade não está em alterar a lei, em nomear um inspector que não r«iine, as juntas escolares não. reúnem, o secretário e o presidente não aparecem, a Câmara não se faz representar, de maneira que se dão estas ir/egularidades: as juntas escolares fazem folhas de professoras duas, três e mais vezes, porque muitas são devolvidas pela contabilidade porque não as sabem fazer de simples despesas de vencimento dos professores, uma cousa horrível!
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Eu tenho a maior consideração pela função do professorado primário, mas cada um no seu lugar.
V. Ex.a sabe bem e sabe a Câmara que é difícil encontrar nas sedes dos concelhos quem tenha aquela autoridade, aquele prestígio, aquela cultura para presidir a uma Junta Escolar, de que fazem parte, nas sedes de concelho e distrito, pessoas da mais olovada categoria.
Isto é um escárneo.
Nào comparecem os membros da Junta, a Junta não funciona e .nós vamos dar a impressão maior de anarquia do que aquela que já hoje reina nos serviços públicos, e nomeadamente nos de instrução pública.
Ainda agora corre um inquérito coutra o chefe da Contabilidade, e e~u posso afirmar que a principal base da acusação volta-se contra quem acusa. Quere dizer: o tempo que os professores primários estão sem receber os seus vencimentos deriva da incompotôncia da grande maioria .das Juntas Escolares que não sabem fazer foliais e fazem uma politiquice tara humildezinha, tam de repelir dentro duma democracia que é necessário dar-se um golpe de morte nas Juntas Escolares, e dar-lhe apenas uma função, quando muito, de carácter técnico, sobre consultas de questões de origem pedagógica. (Apoiados).
E para terminar eu direi q>ie este regulamento não é outra cousa senão o espelho do que se faz no Ministério da Instrução Pública, contra o qual eu tenho sido aqui um rebelde, mas um rebelde de justiça, porque os serviços daquele Ministério são tudo quanto há mais desordenado.
Ainda hoje eu continuo a afirmar aquilo que tenho dito: há funcionários que vão lá quando querem, saem quando querem, e sempre recebem.
E é justamente porque os mais graduados não cumprem 'com os seus deveres qne o Ministério da Instrução Pública está no estado em que se encontra. Vamos ao Mmistério as 13, às 14, às 15, e em regra as repartições estão abandonadas do empregados, porque os mais graduados não vão senão quando querem, à hora que querem e saem quando muito bem querem.
O regulamento daquele Ministério, como em regra o regulamento de todos os Ministérios, obriga perante o Ministro os directores gerais, peraute o director ge-
ral o chefe de repartição, perante este todos os outros funcionários.
Cumprindo o regulamento entrava tudo na ordem.
O Sr. Helder Ribeiro, qu^ quis prestigiar" aquele Ministério, mas não o conseguiu, íez esta cousa simples: mandava buscar os livros à hora do ponto e fechava-os no seu gabinete.
No primeiro dia contou l, 2, 3 funcionários que lá não estavam e mandou fazer o desconto— não sei se o chegaram a fazer.
V. Ex.a está a ver: os funcionários no dia seguinte, visto que lhe foi cortado o vencimento, apareceram à hora de fechar o ponto e daí a minutos os funcionários mais graduados já estavam fora do Ministério.
E porquê?
Porque o Ministro não chama à responsabilidade o director geral, porque este não chama à responsabilidade o chefe de repartição, e o chefe não'chama os outros funcionários.
E é muito fácil chamar à responsabilidade os directores gerais e cumprir o regulamento.
Se o Ministro da Instrução Pública mandar uma ordem de serviço dizendo que os directores gerais não se podem ausentar do seu serviço sem que o Ministro respectivo lhes dê licença, metendo--os em proceeso disciplinar quando essa ordem não seja cumprida, está cumprido o regulamento.
Agora o Ministro a fazer de polícia não pode ser.
Há muito que dizer sobre o Ministério da Instrução Pública, e eu tenho particularmente muito que dizer a esse respeito; por isso peço ao Sr. Ministro da .Instrução a fineza de vir por esta Câmara mais amiúde porque notas de interpelação0 não tenciono mandá-las, porque umas duas ou três que mandei para a Mesa e sobre as quais fiz considerações deram um resultado nulo; por isso eu prefiro de ora em diante tratar dos assuntos do Ministério em 10 ou 15 minutos porque assim talvez sejam mais úteis as considerações que porventura t<_-nha p='p' a='a' fazer.='fazer.'>
O orador não reviu.
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cão e informo S. Ex.a que a íei a que me referi é a lei n.° 1:579, de 10 de Abril de 1924, publicada no Diário do Governo n.° 78, do mesmo, dia.
Eu direi a S. Ex.a em resposta às suas considerações que a instrução primária superior tem sofrido grandes ataques, não pela sua organização, que é tudo quanto há de mais razoável, mas pelo número de escolas que se abriram, porque, cono V. Ex.a disse, só escolas concelhias há 29 que nem constam do Orçamento.
São pagas pelo fundo do instrução primária e este está tam desfalcado, que' nem o Sr. Ministro pode imaginar e tendo nós ainda três milhões de analfabetos! Os alunos saem tam caros, como mandar ir o professor a casa.
Eu espero, pois, que o Sr. Ministro da Instrução tomará o assunto na devida consideração, não deixando pôr em execução a lei, que se diz demais a mais que é inconstitucional.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Instrução Pública (Abranches Ferrão): — Sr.- Presidente : relativamente às últimas considerações feitas pelo Sr. Ferreira de Simas, eu vou examinar o que há sobre o caso dos exames de admissão às escolas primárias superiores.
Devo dizer que tenciono tratar tais escolas com o maior carinho, porque reconheço a função que elas de futuro podem vir a exercer.
Apoiados.
No que respeita ao regulamento que serviu de base ao ataque feito pelo Sr. Silva Barreto, devo' dizer que ele só existe na cabeça de S. -Ex.a; o regulamento de ensino primário não existe.
Nem o meu antecessor o publicou,'nem eu o publiquei.
S. Ex.a combateu afinal contra moinhos de vento.
O dizer S. Ex.a que há uma comissão e há, encarregada de codificar toda a legislação concernente ao ensino primário, não adianta para o caso. O sen trabalho julgo que nem sequer foi apresentado ao então Ministro Helder Bibeiro.
O Sr. Silva Barreto (interrompendo):— Perdoe V. Ex.a, mas foi e esteve para
ser publicado, tendo-o tido o Sr. Helder Ribeiro nas suas mãos. Não quero fazer a afirmação de que eu concorresse para o relatório não ser publicado, mas foi-me só- • licitado o meu parecer.
Por mim não. dou competência a qualquer pessoa para articular, e o articulado em questão é tudo quanto há de mais' vergonhoso.
O Orador:—Continuo entretanto a dizer que V. Ex.a lutou contra moinhos de vento. O regulamento ainda não foi publicado, exactamente porque eu reconheço que a legislação do ensino primário geral é um caos e precisa de ser modificada e codificada em parte.
Eu disse que tinha muito prazer em que me apresentassem o seu trabalho, mas eu prezo-me também de ter cabeça e de ter o meu critério.
Nunca assinei um decreto, como Ministro da República, sem saber o que ele era, sem o estudar e sem dar sobre ele o meu parecer.
O facto de o regulamento a que S. Ex.a se referiu — que eu não conheço e que ainda não li— ter os defeitos que S. Ex.a apontou ou muitíssimos mais, não pode levar o Sr. Silva Barreto a acusar-me por isso, visto que esse regulamento não foi perfilhado pelo Ministro da Instrução.
O que S. Ex.a pode dizer é que o Ministro da Instrução tinha intenção de modificar ain decreto, o que constitui uma necessidade absoluta; isso está"bem.
E tanto assim é que S. Ex.a disse que os professores não cumpriam com os seus deveres.
Isso ó inteiramente exacto.
Relativamente a este ponto, creio que o Sr. Silva Barreto poderá estar descansado, porquanto esse projecto de regulamento ainda não foi aprovado.
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se um doente que estivesse às portas da morte, e lhe fossem ministrados remédios de tal modo fortes que, ou ele morria mais depressa, ou conseguia salvar-se.
Quanto às ordens de serviço que S. Ex.a, entende que deviam ser dadas, devo dizer que elas já foram expedidas.
Já determinei que os chefes de repartição que fazem às -vezes de directores gerais, quando hajam de dar informações sobre qualquer assunto, não se limitem a dizer «V. Ex.a resolverá», mas que devem dizer as razões em que se deve basear o despacho.
Determinei também . que eles tinham obrigação de estar nas suas repartições às horas regulamentares, só podendo ser dispensados quando o Ministro a tal autorizasse.
Dei ainda ordem para que o livro do ponto fosse trancado na devida • altura pelos directores gerais ou chefes de repartição que fizessem as suas vezes.
Essas ordens estão portanto dadas, e eu estou convencido de que serão cumpridas, porque, se o não forem a bem, serão a mal.
Aqui tem o Sr. Silva Barreto o que se me oferece dizer em resposta às suas considerações, e pela minha resposta pode S. Ex.a verificar que eu, sem ser uma pessoa muito radical, procedi duma maneira mais radical do que outras pessoas que, com uma aparência muito mais radical, são de um grande conservantismo.
E com isto não me quero referir ao Sr. Silva Barreto.
O Sr. Silva Barreto : — O meu radicalismo limita-se a querer que a leis e cumpra, porque infelizmenente nesta República poucos são os que cumprem a lei.
E eu falo assim porque, dentro da minha repartição, sou um exemplo vivo do cumprimento da lei.
O Orador: — No Ministério da Instrução trata-se de tantos assuntos- e as leis estão de tal forma baralhadas que, a não ser uma pessoa com um espírito jurídico, quási é impossível não fazer cousas esquisitas e confusas.
Emfim, do que S. Ex.a pode estar certo é que tudo quanto eu assinar só o será depois de ter estudado e de ter formado
o meu juízo sobre 'o assunto, e todas as pessoas que têm trabalhado comigo sabem bem que assim é. O orador não reviu.
O Sr. Alfredo Portugal (para explicações) : — Sr. Presidente: começo por agradecer a V. Ex.a a sua gentileza, tendo feito o possível para que o Sr. Ministro da Instrução viesse ao Senado, a fim de ouvir as considerações que eu vou fazer, assim como agradeço também a S. Ex.a a sua comparência, endereçando-lhe os meus melhores cumprimentos, muito sinceros, por novamente fazer parte do Governo, sobraçando a pasta da Instrução Pública. E S. Ex.a, que ocupou já, por duas vezes, a pasta da Justiça, com grande brilho e muita competência, estou certo que vai fazer agora também um belo lugar na pasta que dirige.
Sr. Presidente: permita-me V. Ex.a que'eu, dirigindo-me ao Sr. Ministro da Instrução, faça umas considerações que entendo serem imensamente necessárias, visto aproximar-se a época das matrículas nos liceus, acerca de vários diplomas, de recente publicação alguns deles.
O antecessor de V. Ex.a, o Sr. Helder Eibeiro, meu muito respeitável e bom amigo, fez publicar um decreto que tem o n.° 9:677, de 13 de Maio último, em que se determina que diversos liceus centrais passem à categoria de nacionais, se suprimem alguns deles e se estabelece que o curso complementar de letras deixe de existir noutros.
Sobre o primeiro ponto regula o artigo 1.° do decreto citado e sobre o último o artigo 2.°
Por este artigo 2.° acaba-se com o curso complementar de letras em vários liceus do país.
Em Lisboa, por exemplo, esse curso foi extinto nos liceus de Gil Vicente, Pedro Nunes e Camões, e, por exclusão de partes, fica existindo, única e simplesmente, no liceu de Passos Manuel!
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de instrução secundária, como é fácil demonstrar.
Sei que foi apresentado na Câmara dos Deputados, se bein me recordo pelo Sr. Baltasar Teixo rã, um projecto de lei tms-peridendo este decreto.
Desejo ouvir o Sr. Ministro da Instrução sobre se mantém ou não este decreto e, portanto, polo que respeita ao curso complementar de letras, as matrículas serão feitas apenas no liceu de Passos Manuel.
Todavia, permita-se-me que eu. no pouco tempo que tenho para explanar este assunto, faca ainda a V. Ex.a, ÍSr. Ministro, o seguinte reparo: pelo decreto n.° 9.5€3, de 14 de Abril' último, foram aumentadas exc -ssivamente, actualizando as, as propinas de matrícula respeitantes aos alunos dos liceus e ainda as indemnizações por trabalhos práticos e diversos emolumentos.
Tudo isso é receita dos liceus.
Como é que, actualizando-se essas importâncias, e não se pagando aos professores os ordenados actualizados, pois o coeficiente port que recebem é o de 10 vezes o de 1915, ,;êsse aumento não é suficiente para poder continuar nos vários liceus centrais o curso complementar de letras?
Além disso, aquele decreto é de 13 de Maio, pois no dia seguinte, a 14, aparece um outro, onde se estabelece como.princípio, não sei se de compressão de despesas, que as horas semanais obrigatórias para es professores efectivos dos liceus seriam- de 14, isto é, mais duas do que era estatuído pelo artigo 227.° do decreto n.° 7:558, de 18 de Junho de 1921.
Tudo isto. nos leva à conclusão que desnecessário seria desorganizar os serviços de instrução secundária, dificultando-a para muitos, alunos e pais destes.
Se foram actualizadas as propinas, se se aumentaram duas horas ao tempo de serviço qne os professores efectivos dos liceus podem prestar durante a semana, se não se actualizaram os ordenados destes, que estão na torça parte dessa actualização, ou menos ainda, não sei a que veio tal- decreto, a não ser para desorganizar e complicar os serviços de instrução, e acarretar más vontades contra tais medidas e contra os homens que as decretam.
Não poderei eu em tam curto espaço de tempo demonstrar isto a V. Ex.a
A extinção do curso complementar de letras- em três liceus de Lisboa só pode dar em resultado uma acumulação grande de alunos no único em que fica existindo e, daí, o desdobramento desse curso em várias turmas e \arios professores, que complicarão mais e mais esses serviços, pelos seus métodos diferentes, sem que a compressão de despesas seja alguma cousa apreciável.
Espero, pois, e imensamente desejo que o Sr. Ministro da Instrução me diga, para sossego de todus, se está no propósito de suspender esse decreto n.° 9:fc77, de 13 de Maio último, se fará o possível para que soja ainda aprovado nesta sessão legislativa o projecto de lei apresentado na outra Câmara pelo Sr. Baltasar Teixeira, pelo qual esse decreto é revogado ou suspenso, ou se tenciona modificá-lo do modo a permitir se que esse curso passe para mais alguns liceus,-além do de Passos Manual.
Aguardo uma resposta de V. Ex.a que venha satisfazer-me e a todos aqueles quo de mim se têni acercado, falando me deste assunto que eu reputo de grande importância para o ensino e para a instru-
O Sr. Ministro .da Instrução Pública
(Abrariches Ferrão):— Sr. Presidente: antes de mais nada agradeço ao Sr. Alfredo Portugal as palavras amáveis que me dirigiu, palavras quo aliás não correspondem aos meus méritos, mas que significam só a amizade que S. Ex.a me dedica e que PU também nutro por aquele ilustre Senador.
Teve S Ex.a dúvidas sobre se o decreto publicado pelo meu antecessor é ou não lei do país.
Evidentemente que sim, emquanto não for modificado.
E eu devo dizer qne, embora entenda, duma maneira gorai, que o Ministério da Instrução não é na verdade aquole por onde se devem fazer largas economias, no emtanto acho que se devem reduzir as despesas, sem prejuízo para o ensino.
Estou convencido de que nós tínhamos um luxo demasiado de liceus com cursos de letras, etc.
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concordar em absoluto com a medida tomada pelo meu antecessor.
No tocante ao facto de estar estabelecido que o curso complementar de letras em Lisboa seja ministrado apenas num liceu, devo dizer que ó possivel que eu faça qualquer modificação nesse ponto, mas não me pareceu ainda oportuno fazer inserir a minha atenção sobre o assuato, porque, tendo surgido no Parlamento um projecto de lei que anula êsso decreto do meu antecessor, referente aos liceus e escolas primárias superiores, entendi que devia sobrestar no assunto até resolução do Parlamento.
Por einquanto, o Parlamento ainda nada resolveu e provavelmente nada resolverá até 15 do corrente. Mas se tal se der, eu vou incidir a minha atenção sobre o assunto para. o resolver da melhor forma.
O Sr Alfredo Portugal: — Lembro a S. Ex.a que estão próximas as matrículas.
O Orador: — Até o fim de Agosto o assunto há-de ser resolvido. O orador não reviu.
O Sr. Costa Júnior: — Sr. Presidente : requeiro que seja consultado o Senado sobre se consente que entre em discussão' a proposta de lei relativa aos Correios e Telégrafos, emquanto não comparecer na sessão o Sr. Ministro da Agricultura.
Consultada a Câmara, /oi aprovado o requerimento.
O Sr. Presidente: — Como o projecto já foi aprovado na generalidade, vai entrar em discussão na especialidade.
Vai ler-se o artigo 1.°
Leu-se.
O Sr. Alfredo Portugal: — Sr. Presidente: na generalidade dou o meu voto a esta proposta, todavia preciso fazer uma declaração que é exactamente igual à que sempre tenho feito quando se discute algum projecto de amnistia.
O § úuico do artigo 1.° desta proposta de lei é, nada mais nada menos, do que uma concessão de amnistia. E sobre este ponto sabe V. Ex.a. Sr. Presidente, e sabe o Senado qual a minha maneira de pensar.
Entendo, e assim o tenho entendido desde longos anos, que é conveniente que as amnistias sejam concedidas depois de se saber a quem cabem responsabilida-des, pois não acho vantagem alguma em que esse a°cto de magnanimidade possa indistintamente, nivelando-os, abranger indivíduos culpados e inocentes. E assim afigura-se-me que um inquérito rigoroso é sempre conveniente para todos, se torna sempre necessário.
Esto artigo e parágrafo põe em igualdade de condições os que transgrediram e os que cumpriram a lei.
Por isso, Sr. Presidente, repito: era conveniente o .inquérito para se saber quais os que transgrediram e assim os que devem ser punidos, os que cumpriram e nada precisam que lhes seja perdoado.
Não direi nada mais sobre o assunto porque é meu costume não protelar as discussões, nem fazer obstrucionismo em questões em que entro, ou em quaisquer outras.
O Sr. Aragão e Brito : — Este artigo 1.° não tem já razão de existir.
Não mando uma emenda porque o Sr. Ribeiro de Melo consta me que já a tem redigida.
Concordo em parte com a doutrina do Sr. Alfredo Portugal.
Se o inquérito se não mantém e são todos amnistiados, não sei como é que devemos manter a doutrina do artigo 2.°
O Sr. Ribeiro de Melo:—Não estive na sessão em que foi apresentada a proposta de lei n.° 68(3, porque se estivesse teria manifestado a opinião contrária à proposta.
É uma tamanha monstruosidade que não faz senão abdicar os funcionários públicos que pertencem àquele ramo de serviço e que leva o Parlamento a fazer passar uma esponja sobre a falta cometida.
Sr.'Presidente: este projecto ó um enjeitado e portanto fez bem o Sr. Aragão e Brito em assumir a legitimidade.
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num decreto com força de lei. admitiu ao serviço determinados funcionários; íalta apenas saber uma cousa: é se se deve ou não pagar a esses funcionários.
O Sr. Pereira Osório (interrompendo): — V. Ex.a desculpe me, mas isso trate, o artigo 2.° e o que nós estamos a discutir é o artigo 1.°
O Orador: — Está no artigo 1.°
, 4
O Sr. Pereira Osório: — E que V. Ex.a não reparou; no artigo 2.° 'é cue se trata de pagar ou não aos funcionários.
O Orador: — O que devo dizer é o seguinte: é que tudo isto é uma mistificação; ó por assim dizer uma entrudada, porque os funcionários dos correios e telégrafos., que se lançaram em greve não podiam ser os responsáveis pelos prejuízos em que são -acoimados pela seguinte razão : é que foi empurrada pelo coronel Sr. Frei-ria e por toda a gente que recebe as suas ordens.
Sr. Presidente: o coronel Sr. Freiria prestou um mau serviço à República. S. Ex.a entrou nas repartições, não direi só de Lisboa, mas da maior parte da província, e obrigou os funcionários a abandonares seus lugares.
Sr. Presidente:
Ouvi dizer que havia necessidade de afastar do serviço determinados funcionários dos correios e telégrafos, e por isso fora lançar-se uma enorme corporação à frente°de revolucionários e grevistas.
Na minha terra há, porque é uma cabeça de concelho, uma repartição de correios e telégrafos, os funcionários daquela repartição não-fizeram greve, mas foram intimados pela força pública a abandonar o seu lugar, e inclusivamente a casa de residência.
Isto sucedeu em quási todos os concelhos e cidades do país; foram portanto, arbitrariamente afastados.
Foi o Sr. coronel Freiria, com a aquiescência do então Sr. Ministro do Comércio, Sr. Is uno Simões, que é um homem inte-
ligente e que teve o cuidado de afastar a questão de si, que o ordenou.
Esta questão dos correios e telégrafos com o Estado não se teria dado se o Sr. Administrador Geral tivesse empregado os sous esforços no sentido de a solucionar. Mas o Sr. António Maria da Silva, que tem o condão de se não íazer compreender por ninguém, não se interessou como podia pelo assunto.
Eu mando para a Mesa, Sr. Presidente, uma emenda ao projecto, visto que entendo que ele não deve ser aprovado como está, a fim de que a Secção a possa estudar.
E a seguinte:
Proposta de lei u.° 686
Artigo 1.° Reentra definitivamente na posse dos direitos consignados no decreto n.° 5:736, de 10 de Maio de 1919, o pessoal dos correios e telégrafos ausente do serviço por qualquer período decorrido entre 9 de Maio e 18 de Julho do corrente ano. — Ribeiro de Melo.
O orador não reviu.
Para a 2.a Secção,
»
O Sr. Presidente: —V ai ler-se a proposta às substituição ao corpo do artigo 1.°
Lida na Mesa a proposta, foi admitida.
ORDEM .DO DIA
Continuação da interpelação do Sr. Lima Alves ao Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Ministro da Agricultura (Torres Garcia): — Sr. Presidente: depois de ter feito as considerações de carácter geral sobre a parte vaga ou generalidades do Sr. Lima Alves, declarei que ia entrar na exposição que S. Ex.a fez a propósito das direcções gerais e do que de interessante havia sobre o assunto.
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sáveis eram grandes. S. Ex.a aludiu em primeiro lugar à instalação desafogada em Sintra.
Ora, S. Ex.a devia ser o primeiro a concordar que ha veria-imensa dificuldade em fazer voltar as cousas à antiga situação. Essa escola têm hoje instalações para o internato, laboratórios e está modelar-mente armada, como S. Ex.a reconheceu, tambóm no que respeita a estábulos, otc., que não encontraria na sua'antiga instalação.
Estando instalados outros serviços que pertencem ao Ministério da Guerra, hoje já não há possibilidade da escola se instalar nas proximidades >çle Sintra.
E não queira V. Ex.a ver aqui qualquer apego à minha qualidade de Deputado por Coimbra.
Coimbra estima muito a sua Escola do Agricultura, mas ela está instalada nos seus subúrbios; a economia da cidade pouca aproveita com a sua estada lá, e não é motivo das minhas considerações a qualidade de interessado no desenvolvimento e progresso de Coimbra.
V. Ex.a não deve fundamentar-se na falta de terrenos onde se possa fazer a grande experimentação de máquinas agrícolas, culturas em grande, porque a Escola tendo alguma cousa poderia usar terrenos que os proprietários lhe facultariam. V. Ex.a tem de fundamentar as insuficiências que notou na falta de dotações, próprias, porque são absolutamente insignificantes, quási irrisórias
Na última reforma feita nesta Escola talvez V. Ex.a pudesse encontrar motivos de menos deferência porque não concordo inteiramente com ela.
Antigamente, até a reforma de 1919, -creio eu, a escola formava os regentes agrícolas; era uma escola técnica.
Hoje foi estabelecido um curso que eu cão sei bem classificar dentro da terminologia profissional agrícola, é uma escola que faz um curso secundário de instrução geral como os liceus, tendo apensas umas cadeiras técnicas quê lhe dão uma característica agrícola e devemos portanto encontrar o bom termo para a sua classificação chamando-lhe Liceu Agrícola.
Não me horroriza o termo, porque desde há muito defendo a idea de que os liceus portugueses não deviam todos eles corresponder a um plano único para todo o
País; nós devíamos abandonar o critério clássico que orienta os liceus correspondendo ao estabelecimento de instrução geral literária e scientífica que se destina à classe média.
Foram assim estabelecidos nos primeiros tempos, da Kevolução Francesa e nós ainda mantemos essa classificação, tendo subsidiariamente a'função de preparar pa-.ra o ingresso, dos cursos superiores.
As modalidades diferentes que apresenta o nosso País, sob o ponto de vista económico, deve dar a cada liceu um fácies apropriado, facilmente adaptável às necessidades locais, e fazendo ingressar neles a generalidade dos cidadãos portugueses. *
Não vejo, com imensa pena, que a Escola Nacional de Coimbra tenha enveredado por esse caminho e de facto seja um Liceu Agrícola.
Mas por um lado esta organização garantiu-lhe a frequência que tinha perdido, 120 alunos, e mais teria se o seu internato tivesse capacidade para receber mais alunos.
O que fazer?
O Ministério da Agricultura; não pode aumentar-lhe as instalações; no que diz respeito a terrenos eles são hoje caríssimos; os terrenos de Coimbra cobrem-se hoje a notas, e nós estamos absolutamente falhos de meios financeiros para fazer isso.
O que podemos fazer é interessares proprietários de Coimbra no progresso da Escola, de forma que lhes 'facultem os seus terrenos para que os alunos, orientados por professores da especialidade, saiam com os conhecimentos técnicos necessários, e que IKes faltam neste momento.
V. Ex.a atacou depois a idea expressa por mim no relatório de que nós temos escolas técnicas suficientes.
Como nós temos de entrar em linha de conta para determinar a suficiência ou insuficiência das escolas agrícolas com a extensão territorial do País, não há dificuldade em demonstrar que nós temos, comparadamente, tantas escolas agrícolas como os países que tratam ^ a fundo do problema agrário, como por exemplo a França, a Espanha, e mesmo a América do-Norte.
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cultura, que fazem com que a nossa população ignore absolutamente todos os pro-cossos e p'receitos agrícolas.
E poderíamos aproveitar eventualmente, no sentido de propaganda, certas escolas.
Na Faculdade de Sciências há por exemplo a 3.a Secção de Sciências Naturais que ensina, como disciplinas fundamentais, a botânica, a zoologia, mineralogia, geografia física, química curso geral, e física curso geral, sciêucias tam coope-radoras da agronomia.
£ Porque é que nessa Secção não se poria um curso livre de agiicultura geral, com tendência de difusão de ensinamentos de carácter geral, que levassem ossos diplomados a poderem suíicientemente aplicar ao cultivo da terra e à propaganda, entre as populações, desses ensinamentos?
E eu afirmo que isto não é novidade em Portugal, e realmente não é, porque em 1781 Vaudel veio a Portugal instalar-se na Universidade de Coimbra e criou na Faculdade de Filosofia, que então iniciava os seus1 passos, a cadeira de agricultura, e foi até a zootecnia, paleografia, etc.
MaSj Sr. Presidente, assim fez a América do Norte. V. Ex.a sabe que a origem d,as universidades americanas são as antigas escolas de tecnologia de agricultura, que vierem depois a. constituir as Universidades, e ainda hoje a vida de muitas Uni-. versidades americanas se faz à volía dos seus institutos técnicos.
Eu poderia, e já o escrevi uma vez, dizer a V. Ex.a que as Universidades americanas, todas elas, têm uma escola de agricultura.
Mas na França dá-se a mesma cousa e a tendência francesa é de abandonar os clássicos estabelecimentos de ensino.
V. Ex.a, por exemplo, não ignora que a Escola Politécnica é uma revivescência; que. a Escola Normal Superior é outra.
Abandonam esses cursos para se lançarem na criação de Institutos, para ensinar a agricultura, a química, £, física agrícola, etc.
V. Ex.a tem em Nancy o melhor e mais acreditado Instituto de Agronomia.
V. Ex.a encontra depois nas várias Universidades de França essas escolas de Agricultura. • Como já disse a V. Ex.a, tinha até in-
dicados todos os cursos de agronomia existentes nestas condições em França, na Inglaterra e na Alemanha, numa publicação que fiz, aqui há dois anos.
E V. Ex.a vê que esse ensino não se considera incompatível com o ensino universitário.
E títnto assim é que no estatuto universitário de 1911 lá vem, como incluída no quadro da Universidade de Lisboa, a Agronomia.
Nunca se fez não sei porquê, e por isso também não tem trazido contrariedades de maior.
O ensino de Agronomia em Coimbra decaiu, porque teve de ceder o seu lugar a uma doutrina nova, que quási nasceu ao mesmo tempo, e que foi a criação da escola da especialidade em Lisboa.
Os diplomas de Coimbra nunca tiveram um reconhecimento oficial por aí além.
Mas o que eu afirmei era uma cousa muito simples: é que como complemento das sciências que se ensinem na terceira secção das Universidades se fizesse um curso sem pretensões técnicas e que se fizesse ao'mesmo tempo uma boa e acf-r-tada propaganda. E isto pode-se muito bem fazer.
Desde já devo declarar a V. Ex.a, Sr. Presidente, e ao Senado, que a estas horas já tenho entabuladas negociações com a 'Faculdade de Sciências de Coimbra para que um \professor da especialidade que esteja à altura do renome intelectual daquele estabelecimento vá aí fazer um curso livre de Agronomia e de Economia Rural. ,
Sou por um plano de conferências a fazer na Universidade, sem encargo para o Estado.
£ Diz S. Ex.a que isso contraria a orientação pedagógica das escolas da especialidade?
Eu digo que não. Presto um altíssimo serviço ao meu País fazendo interessar toda uma população universitária no problema.
Assim um engenheiro agrónomo distinto vai ali durante um ano lectivo fazer''umas conferencias o mesmo que seja apenas um indivíduo que aproveite, nós alguma cousa já teremos lucrado.
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também alguma cousa de prático pode ensinar na sua aldeia.
As minhas intenções em nada prejudicam o Instituto Superior de Agronomia.
Entendo que uma escola superior de agronomia é suficiente para as necessidades do País.
Não se pretende duplicar tal ensino, mas ninguém pode impedir que se use de todos os recursos técnicos para que se faça uma propaganda em favor da terra.
Apesar de haver escolas elementares de agricultura, pensou se em introduzir na escola primária superior uma cadeira de tecnologia agrícola, conforme as necessidades do meio em que esse tipo de escola exercia as suas funções.
Não se efectivou esse pensamento, e por isso mesmo é que esse tipo de escolas Cílll.
Fizemos das escolas primárias superiores uma espécie de pequenos liceus.
Tendo pertencido a uma comissão que tratava da remodelação do ensino primário superior, lá advoguei a idea de que devia haver uma cadeira de tecnologia agrícola de acordo com as necessidades agrológicas da rogião.
Embora julgasse que eram suficientes as escolas'que existiam, o que entendia é que eram escassos os meios que elas possuem para poderem exercer a sua acção, e que esses meios tinham de ser dados imediatamente porque as nossas escolas de agricultura têm unia fase meramente experimentativa, pois não nos devomos esquecer que^ as escolas de agricultura são escolas de demonstração e de propaganda constante.
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Foi por essa razão que S. Pjx.a me encontrou agarrado entusiasticamente aos fundos de fomento agrícola o de instrução agrícola.
£ Pois como é que se podem fazer técnicos, sem uma perfeita preparação? Julgo que é impossível.
Mas disse S. Ex.a que os fundos de fomento agrícola e da instrução agrícola são fundos secretos.
Estou perfeitamente de acordo com essa opinião, pois entendo que da sua aplicação se devia dar conta, e se eu em principio os defendo é porque eles são os únicos instrumentos que eu encontro no
Ministério da Agricultara que me dão azo a fazer qualquer cousa de útil.
Afirmou S. Ex.a que no Ministério da Agricultura se gastavam quantias enormes, sem critério administrativo ou sciên-tífico.
. Ora a Direcção Geral de Agricultura que acabou em-1918, gastava em 1914 a importância de 1:246 contos. Pelo orçamento proposto actualmente o Ministério da Agricultura gasta 17:000 contos, isto é, menos de 16 vezes o que se gastava em 1914.
Suponho que o Sr. Lima Alves exagerou em muito as suas afirmações. Esses fundos especiais são hoje as andas com que ainda se podo fazer alguma cousa.
Diz S. Ex.a que -não ó esta a.melhor íorma.
E eu também digo a mesma cousa.
Disse ainda S. Ex.a que, se eu queria fomento agrícola e'actividade nos agricultores, recorresse ao imposto para reforçar a verba do fomento agrícola.
O imposto está esgotado.
As verbas mais importantes de que dispunha o fomento agrícola eram a contribuição sobre a diferencial do trigo exótico e a sobretaxa das exportações.
A contribuição sobre 'o trigo exótico já acabou e a cobrança das sobretaxas de exportação é feita pelo Ministério das Finanças.
De maneira que estamos em face desta situação: é que o fundo de fomento agrí-col-a que chegava para o que era útil, dispensável e até para o que era inútil, hoje não pode fazer absolutamente nada.
E eu então proponho esta cousa que supunha que era mesquinha: — ir a todos os proprietários de terras em Portugal e pedir-lhes 2$00 para esse fundo porque da sua obra todos aproveitavam.
E o processo era a estampilha, porque é o meio mais rápido e mais seguro da cobrança do imposto, estampilha essa que era colada e inutilizada no talão da contribuição predial rústica.
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quer o da importação, quer o da exportação.
Fui lá também lançar um imposto de 10$00 em cada despacho alfandegário, , quer de exportação quer de importação, que hoje em dia é menos do que aquilo que se paga ao carregador para ir fazer o despacho.
• Eu fui tam pequeno, tam mesquinho, que tudo isto somado daria, quando muito, entre 6:000 e 7:000 contos.
E eu com o fundo de fomento agrícola, com uma receita garantida de 6:000 contos por ano, podia em meio século realizar o problema da transformação económica do país.
Lembre-se 'V. Ex.a, Sr. Lima Alves, que 6:000 contos eram uma anuidade de juro e amortização em 25 anos dum capital de 60:000 contos, e apesar de tudo hoje ser pesado a ouro, com 50:000 contos em 25 anos ou sejam 120:000 contos em 50 anos, eu podia de facto, de verdade, mudar a face dos acontecimentos no campo agrícola.'
V. Ex.a não quere, mas um Ministro da Kepública tem de se libertar das funções de despachar o expediente para. tratar -a sério dos assuntos fundamentais da pasta que dirige.
Apoiados.
V. Ex.a diz: — a junta de fomento agrícola tinha pela sua lei orgânica de publicar os balancetes trimestralmente e nunca os publicou.
Eu tenho os seguintes:
Leu.
De maneira que por aqui se vê que os balancetes estão todos no Diário do Go-vêrno e as contas de gerência aprovadas, como manda a lei, pelo Conselho Superior de Finanças, e V. Ex.a tem-os aqui ao seu dispor.
Agora se V. Ex.a me disser que as verbas da Junia de Fomento Agrícola são exageradas, eu concordo, e prometo fazer qualquer cousa que determine a aplicação dessas verbas.
Uma das verjbas que sofreu uma crítica mais acerba da parte do Sr. Lima Alves íoi a do célebre caso do engenheiro inglês.
Pelo pouco que eu conheço dos assuntos agrícolas e da intensidade que tem sido dada pelas academias, pelas associações, e. pelos institutos a esses assuntos,
eu verifiquei sempre que o problema agrícola, em Portugal, é o problema da hidráulica agrícola.
Bem ou mal organizada, a estação agrária central mantém uma estação de hidráulica agrícola.
Através dessa estação, começou a fazer-se alguma cousa no campo da actividade.
Havia ante-projectos, havia memórias fecundas e laboriosas, mas ante-projectos 'e projectos detalhados que pudessem concorrer para se entrar imediatamente na sua execução não havia nem há nada.
E assim verificou-se, numa determinada altura, que era conveniente vir a Portugal uma alta autoridade no assunto, para que ela indicasse uma directiva geral de um procedimento a tomar. E não houve favoritismo. Neste caso deferido eu, aqui e em toda a parte, os funcionários que'intervieram no assunto.
Em 26 de Março de 1924 dirigia-se a Direcção Geral do Ensino Agrícola ao Ministério dos Negócios Estrangeiros para que, por intermédio da nossa Legação em Londres, averiguasse se haveria em Inglaterra um técnico de reconhecido valor que pudesse vir a Portugal fazer um reconhecimento sobre hidráulica agrícola.
Em resposta, o Ministério dos Negócios Estrangeiros dizia, em 15 de Março de 1924:
Leu.
E em 2 de Aril de 1924 era respondido o seguinte:
Leu.
Já S. Ex.a vê que não foi o Ministério da Agricultura que procurou o engenheiro inglês, mas sim o Ministério dos Negócios Estrangeiros que foi encarregado, através da nossa Legação em Londres, de fazer um contrato com uma pessoa especializada no assunto.
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Ora, pregunto eu: ^Uma pessoa desta categoria, e inglesa, podia vir a Portugal vencendo menos do que aquilo por que foi contratada? Não vinha.
Essa remuneração é considerada por todos como uma remuneração modestíssima. E digo modestíssima, porque, quando toi do centenário da independência do Brazil, foi publicada uma revista intitulada A Nação, escrita em todas as línguas, em que se diz o seguinte:
Leu.
A quantia é modestíssima, porque para o Pará foi um engenheiro inglês ganhar 50 libras por dia.
,2 Quem pagou os transportes e automóveis, quem paga as viaturas? — Pre-gunta o ilustre Senador.
Tenho a dizer: — Não pagou ninguém; foram os lavradores e outras pessoas da região que custearam as despesas.
Também S. Ex.a disse que um funcionário — e eu sei a que funcionário se referia — tinha recebido ajudas de custo.
A isso oponho o mais terminante desmentido.
. Disse • ainda o ilustre Senador que foi um desvario gastar-se tanto e tanto dinheiro e que eu já tinha sido consultado para que o engenheiro venha a Portugal.
É certo que eu disse: —Venha, venha quanto antes.
Ficou tam entusiasmado o Sr. engenheiro Macdonald, que chegado a Lon-rés fez publicações nas revistas da especialidade tam interessantes e de tal maneira que, pelo que essa propaganda representa em face dos capitais ingleses que podem ser chamados ao nosso país, — ela vale muito mais que todas as libras que nós lhe demos.
Nos seus relatórios há referência aos canais de irrigação de Santarém, de Vila Franca, Ganha, Vale do Mondego, Baixo Guadiana, região do Fundão, etc., sempre, é claro, com o aspecto dum reconhecimento rápido e expedito.
Reconheço que se deve continuar esta obra e declarei, pois, que viesse o engenheiro, soara chegarmos a alguma cousa de pratico e abandonarmos as palavras.
Também o ilustre Senador se referiu à estação de ensaio de máquinas agrícolas. Esta estação não pode ser aquilo que S. Ex.a> diz. Ali não se fornece trabalho de ninguém que não seja pago por quem.
o recebe. Essa estação vive só à custa das suas receitas.
,; Quem é que instruiu em Portugal os condutores de 210 máquinas mecânicas?
Foram os mecânicos da Estação de Ensaio de Máquinas.
Diz V. Ex.a, mas foram trabalhar a Montalegre, que fica nos confins de Trás- ' -os-Montes.
Se lá foram foi para empregar qualquer máquina.
Eu vi trabalhar as charruas em Coimbra; eu sei que lavraram as terras duras do Ribatejo, eu sei que elas têm ido trabalhar a muita parte.
Evidentemente que têm de ir lavrar todas essas regiões e, evidentemente, que tem de se gastar muito dinheiro.
Com certeza que V. Ex.a não as quere para que elas estejam no stand do campo de ensaio de máquinas.
Se assim não fosse nós não tínhamos realizado a função que ao Ministério da Agricultura compete, função de orientação daquele -Ministério, à qual V. Ex.a me parece absolutamente estranho.
,1 Pois então não é razoável,'não é necessário fazer-se uma propaganda dos melhores processos?
E como se faz essa propaganda, se não indo aos centros onde uma, duas e três vezes se experimentem as máquinas, visto que a rotina das massas populares não lhes deixa perceber a vantagem dessas máquinas.
A este propósito devo dizer também que os serviços de ensaio de máquinas são pagos por quem os recebe.
Sobre os Abastecimentos concordou S. Ex.a que realmente os serviços estão mal.
E estão inal porque estão divididos por uma quantidade enorme de organismos, como são a Manutenção Militar, a Direcção Técnica do Comércio Agrícola (Leu}. e todos estes órgãos estão interferindo no mesmo, assunto, e isto é a causa de perturbações graves.
Hei-de fazer aquilo que puder.
Poupou V. Ex.a à sua crítica e até dirigiu palavras elogiosas aos serviços florestais e agrícolas.
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Sobre a Direcção Geral dos Serviços Pecuários apelou V. Ex.a para mim para que tomasse medidas que são absolutamente necessárias aos trabalhos de profilaxia.
Tem-me V. Ex.a ao seu dispor para esse efeito. Mas se não contar com as disponibilidades do Fundo de Fomento Agrícola, não posso fazer nada.
O órgão de acção é o Instituto de Patologia Veterinária.
(JÕomp hei-de dotá-lo suficientemente para que se sacrifiquem tantos animais como é preciso, se eu não tenho dinheiro para os alimentar, se não tenho instalações para os meter?
V. Ex.a sabe que os soros e vacinas contra a peste que devasta a raça suína exigem o sacrifício de imensos exemplares, pulas dificuldades técnicas da cojhei-ta de soros e eu hoje não tenho dinheiro, (i como é que eu hei-de fazer isso sem ir ao Fundo de Fomento Agrícola?
Nilo sei.
A respeito da questão de zootécnicos e veterinários, não entro nela, porqce V. Ex.a não me pode exigir conhecimentos desta especialidade, para pronuneiar--me sobre se o agrónomo é que deve dirigir os serviços zootécnicos ou o veterinário ; isso é uma questão para ser resolvida pelos Conselhos Superiores do Ministério.
Suponho eu que tantos uns como outros poderão lá estar, desde que- tenham competência.
V. Ex.a é contrário à concentração dos reprodutores na Estação Zootécnica Nacional, dizendo que em Espanha encontrou os reprodutores disseminados por diferentes regiões.,
Mas se isto acontece assim em Portugal é devido à pouca extensão do nosso
terreno, e não podemos ir buscar para termo de comparação a Estação Zootécnica de Eambouillet, porque não temos um barão de Rothschild que nos dê o dinheiro.
Demais os terrenos que dão as pastagens da nossa Estação Central estão sendo todos os anos alagados pelo Tejo, tendo eu até já pensado em mudá-la para outro ponto. .
Termino as minhas considerações, dizendo a V. Ex.a que o problema é tam grande que o ponho acima das minhas forças, mas com os ensinamentos que colhi na prelecção de V. Ex.a, com o conselho de todos os experimentados e especialistas, eu tentarei fazer na pasta da Agricultura uma obra que possa estar em equação com as dificuldades do momento.
Não penso numa nov(i organização, porque não tenho idcas no espaço; o que vou tentar é fazer esta render o máximo. Ou rende ou não rende.
Se não render pode V. Ex.a chamar--nie impotente para vencer a situação, e não espore V. Ex.a que eu faça reformas porque o prejuízo máximo é reformar à outrance sem que se deixe aos regimes estabelecidos o tempo necessário para frutificarem.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Vezes: — Muito bem., Muito bem.
O Sr. Presidente:—A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a mes-.ma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram W horas e 5 minutos.