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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
SESSÃO lsT.° 95
EM 13 DE AGOSTO DE 1924
Presidência do Ex.mo Sr. António Xavier Correia Barreto
Secretários os Ex,mo< Srs,
Joaquim Manuel dos Santos Garcia António Gomes de Sousa Varela
Sumário.—:Às 15 horas e 35 minutos, o Sr. Presidente, com 25 Srs. Senadores presentes, declara aberta a sessão. Lê-se e aprova-se a acta. Dà-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. 'Mendes dos Beis pede explicações sobre a questão da pesca, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Marinha.
O Sr. Procópio de Freitas aprecia um diploma referente à Cordoaria Nacional, explicando-lhe o mesmo Sr. Ministro.
O Sr. Herculano Galhardo pede explicações à Mesa sobre a marchados trabalhos parlamentares, prestando-lhas o Sr. Presidente.
O Sr. Silva B.arreto ocupa-se de assuntos referentes ao Arsenal da Marinha, replicando-lhe o Sr. Ministro respectivo.
Ordem do dia. — Discute-se a proposta de lei n." 690, falando os Srs. Ministro do Comércio, José Pontes, Querubim Guimarães, Afonso de Lemos, Procópio de Freitas, Pereira Osório e Roberto Baptista, sendo a proposta aprovada.
Segue-se o projecto n.° 686, sobre funcionários do» Correios e Telégrafos, falando os Srs. Silva Barreto e Machado Serpa.
O Sr. Lima Alves desiste de continuar a sua interpelação.
O Sr. Serra e Moura usa da palavra sobre o projecto n." 686, falando sobre o mesmo projecto os Srs. Querubim Guimarães, Pereira Osório, relator e Ministro do Comércio.
Antes de se encerrar a sessão.—Falam os Srs. Ramos da Costa e Ministro dos Estrangeiros.
Faz-se a convocação do Congresso para amanhã, às 17 horas.
Abertura da sessão às 15 horas, 34 minutos e 12 segundos.
Presentes à chamada 26 Srs. Senado-dores.
Entraram durante a sessão 13 Srs. Senadores.
Faltaram 32 Srs. Senadores.-
Srs. Senadores que responderam à chamada:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
António Gomes de Sousa Varela.
António Maria da Silva Barreto.
António Xavier'Correia Barreto.
Aprígio Augusto de Serra e Moura.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
César Procópio de Freitas.
Constantino José dos Santos.
Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.
Francisco António de Paula.
Francisco José Pereira.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Francisco Vicente Ramos.
Herculano Jorge Galhardo.
João Carlos da Costa.
João Maria da Cunha Barbosa.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.
José António da Costa Júnior.
José Joaquim Pereira Osório.
José Machado Serpa.
José Mendes dos Reis.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Roberto da Cunha Baptista.
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Diário das Sessões do Senado
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal;
Álvaro António Bulhão Pato. •
Augusto de Vera Oruz.
César Jnstino de Lima Alves.
Frederico António Ferreira de Simas.
João Manuel Pessanha Vaz das Neves.
Joaquim Pereira Gil de Matos.
José Joaquim Fernandes Pontes.
Luís Augusto de Aragão e Brito,
Manuel Gaspar de Lemos.
Querubim da Rocha Vale Guimarães.
Tomás de Almeida Manuel de Vilhe-na (D.).
Srs. Senadores que faltaram à sessão:
Aníbal Augusto Ramos de Miranda,
António Alves de Oliveira Júnior.
António da Costa Godinho do Amaral.
António de Medeiros Franco.
Artur Augusto da Costa.
Artur Octávio do Rego Chagas.
Augusto César de Almeida Vasconcel-los Correia.
Elisio Pinto de Almeida e Castro.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Alpoim Borges do Canto.
João Catanho de Meneses.
João Trigo Motinho.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Teixeira da Silva.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Augusto de Sequeira. „
José Duarte Dias de Andrade.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Nepomuceno Feruandes Brás.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Luís Augusto Simões de Almeida.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Nicolau Mesquita.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves. • Raimundo Enes Moira.
Ricardo Pais Gomes.
Rodolfo Xavier, da Silva.
Rodrigo Guerra Alvares Cabral.
Vasco Crispiniano da Silva.
Vasco Gouçalves Marques.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Sr. Presidente (às 16 horas e 30 mi' n^tos): —Vai proceder-se à chamada. vez-se a chamada.
O Sr. Presidente (às 15 horas e 33 mi-artos): — Estão presentes 25 Srs. Senadores.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Leu-se. -
O Sr. Presidente: Pausa.
Está em discussão.
O Sr. Presidente : — Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se o Expediente
Ofícios
Do Juízo de Direito da 3.a Vara da Comarca de Lisboa, solicitando autorização à Câmara para depor como testemunha no dia 1'5 do corrente, pelas 14 horas, o Sr. José Joaquim Pereira Osório.
Para a Secretaria.
Da Câmara dos Deputados, comunicando a aprovação da proposta para a prorrogação da actual sessão legislativa.
Para a Secretaria.
Carta
Do Sr. Raimundo Meira, .declarando não poder continuar na comissão como vog-il do Conselho Colonial.
Para a Secretaria.
Requerimento
Novamente requeiro —estranhando não ter sido ainda satisfeito requerimento tam simples — que pelo Ministério das Finanças me digam em. que lei se funda a Alfândega do Porto para, cumulativamente com os impostos do Estado, cobrar à Câmara Municipal o imposto de consumo.— Júlio Ribeiro.
Projecto de lei
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Sessão de 13 de Agosto de 1924
1924, até o Parlamento discutir uma nova reforma de exercício de farmácia. Para a l.a Secção.
Telegramas
Da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Torres Novas, protestando contra o projecto de lei do Sr. Sorra e Moura acerca da anexação da Barquinha.
Para a Secretaria*
Da Câmara Municipal de Portimão, solicitando a interferência do Senado no sentido de serem acautelados altos interesses nacionais relativos à conferência luso espanhola sobre a pesca.
Idêntica do presidente da Junta de Freguesia de Portimão, do representante dos armadores industriais e comerciantes de Portimão, da Associação Comercial e Industrial de Portimão, da Associação Marítima de Olhão e da Associação Comercial e Industrial de Olhão.
Para a Secretaria.
Antes da ordem do dia
O Sr. Mendes dos Reis: — Sr. Presidente: pedi a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Marinha para chamar a atenção de S. Ex.a para os telegramas que vêm publicados, nos diferentes jornais relativamente à atitude dos povos do Algarve, província que tenho a honra de representar nesta Câmara por motivo dum tratado ou convénio ou acordo que dizem vai fazer-se brevemente e pelo qual se consentiria aos estrangeiros vir buscar às nossas águas o peixe que nos pertence, ficando o Algarve prejudicado numa das suas maiores fontes de riqueza.
O Sr. Costa Júnior (aparte]: — Não é só o Algarve, há outras províncias que também, são prejudicadas.
O Orador: — As minhas considerações referem-se a todp o litoral do país, más não posse deixar de citar especialmente o Algarve, que é quem mais sofre. .
Sr. Presidente: não vejo que razões haja para se nomear uma comissão para se tratar desse assunto; parece-me que não se deve felicitar o Sr. Ministro da Marinha por esse motivo, a não ser que
S. Ex.a se queira habilitar colhendo ainda, se ó necessário, mais elementos de informação para poder repudiar de uma vez para sempre a inj ustificada e irritante pretensão espanhola.
Sr. Presidente: Dão há reciprocidade possível entre nós e a Espanha sobre a pesca. Só nós daríamos compensações, nada recebendo em troca.
Essa pretensão de os nossos vizinhos quererem pescar nas nossas águas é tam ridícula como seria a nossa se pretendêssemos explorar as suas minas de ferro.
Contente-se cada nação com o que tem.
Querer apropriar-se do que a outrem pertence constitui evidentemente um roubo.
A Espanha, se não tem peixe, que o compre, como nós fazemos ao algodão.
O Sr. Carlos Costa (aporte):—Já em 1916 se. quis fazer um convénio, mas não se conseguiu fazer nada porque os espanhóis queriam todas as regalias para eles.
O Orador:—Além disso a nossa indústria „ do peixe em alguns pontos está lutando com dificuldades. E se os espanhóis não podem ter indústrias de conservas que as não tenham.
Sr. Presidente: declaro ao Sr. Ministro da Marinha que estou absolutamente ao lado das pretensões dos algarvios.
O povo está indignado; prevêem-se várias desordens, e é necessário que o Governo faça declarações categóricas de que nada se fará no intuito de se prejudicar o Alvarve e todo o país.
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva): — Sendo esta a primeira vez que uso da palavra depois da apresentação do Governo, aproveito a ocasião para agradecer a todos os lados da Câmara as palavras de cortesia e apreço que tiveram para comigo, palavras estas que muito me sensibilizaram pelo muito respeito e consideração que tenho pelo Senado.
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sobre pesca que possam surgir, com o fim de evitar conflitos futuros, inas não para estabelecer nenhum convénio.
E essa comissão é composta de igual número de membros espanhóis e portugueses, e as suas conclusões não nos devem pertubar, visto que não têm carácter decisivo.
Ainda devo acrescentar que quando se trata de questões como esta que colidem com leis,, nem mesmo os processos têm acção decisiva. Apenas podem formular propostas ao Parlumento, ao qual compete tomar decisões.
Eeferiu-se S. Ex.a a convénios.
Nenhuma comissão pode assinar convénios nem tam. pouco os governos senão quando o Parlamento os aprova ou quando o Poder Legislativo concede ao Poder Executivo tais atribuições.
Nesta questão de pesca eu fui mais longe.
A comissão espanhola apresentou-se no meu gabinete, e eu disse-lhe que o Governo português, querendo corresponder à cortesia do Governo espanhol, acedia à nomeação dessa comissão, mas fiz sentir que a indústria da pesca ó para nós tam importante, que a comissão podia ficar já convencida de que qualquer solução que se pretendesse apresentar, ainda que nas melhores intenções, mas que pudesse prejudicar, no juízo do Governo, os nossos legítimos interesses, quer no. que respeita a armadores quer no que se refere a pescadores, não seria resolvida nesse sentido.
Apoiado».
O Sr. presidente da delegação espanhola ouviu estas minhas palavras com atenção e cortesia, e respondeu que da parte do governo espanhol não havia a mínima intenção de prejudicar mas simplesmente o desejo de evitar conflitos futuros no intuito de se conseguir a maior harmonia entre as duas nações vizinhas e irmãs.
Devo dizer que a delegação portuguesa está no firme propósito de não votar a mais insignificante medida que possa por qualquer modo alterar o limite das águas jurisdicionais e permitir que pescadores espanhóis venham pescar nas nossas águas, e o Ministro da Marinha pensa que a reciprocidade de direitos de pesca nHo é admissível, visto que o nosso plateau é ri-
co e o espanhol pobre de pesca, e assim tal reciprocidade seria um prejuízo para nós.
Isto declaro em meu nome e em nome do Governo.
Vozes: — Muito bem.
O Sr. Mendes dos Reis (para explicações):— Agradeço "a resposta do Sr. Ministro da Marinha.
Fico satisfeito com o propósito que tem a nossa delegação de não votar a mais pequena alteração no que está estabelecido, e que possa prejudicar os nossos direitos.
Mas eu vou mais longe ainda. Sou mais radical.
Não compreendo que haja necessidade em se estudar alguma cousa. Não há que estudar.
Cada um contenta-se com o tem e nada mais.
Fique bem claro que eu como todos os parlamentares do Algarve combateremos qualquer medida que possa restringir os direitos que assistem aos nossos pescadores.
Os espanhóis escusam de cá vir, e desde que eles não venham já não haverá conflitos.
Espero as resoluções do Sr. Ministro da Marinha, estando certo que se guardará sempre a honra de Portugal.
O Sr. Procópio de Freitas : — Sr. Presidente: antes de me referir aos assuntos que desejo tratar, agradeço ao Sr. Ministro da Marinha a s aã comparência nesta Câmara, satisfazendo assim um pedido que lhe fiz particularmente.
Sr. Presidente: pelo Ministério da Marinha foi publicado em 2 de Abril de 1924 o decreto n.° 9:564, extinguindo a Fábrica Nacional da Cordoaria.
Este decreto nos seus considerandos diz que foi publicado em harmonia com as autorizações dadas ao Governo pela lei n.° 1:344, e de facto assim é porque se trata neste decreto da extinção dos quadros do pessoal que compunha a Fábrica Nacional da Cordoaria.
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Se assim é, isto está em absoluta contradição com este decreto.
E na realidade, lendo-se este decreto, a conclusão que se tira é que o Ministro quis acabar por completo com a Fábrica Nacional da Cordoaria. ^
Como disse, Sr. Presidente, concordo que este decreto fosse na realidade publicado à sombra da lei n.° 1:344, mas a seguir foi publicado um outro, que é o decreto n.° 9:629, que remodela os serviços da Fábrica do Arsenal da Marinha.
Este decreto é que, apesar de dizer nos seus considerandos que é publicado em harmonia com as autorizações concedidas* ao Governo pela lei n.° 1:344, está em absoluto desacordo com ela.
Essa lei apenas permite ao Governo fazer redução de despesas, redução de pessoal, quere dizer, não permite remodelar serviços.
A remodelação dos serviços é ao Parlamento que pertence fazer.
Mas, como V. Ex.a, vê é o próprio Diário do Governo que no seu sumário diz: «Remodelando os serviços da fábrica do Arsenal da Marinha».
Se se trata duma remodelação não se trata dum decreto feito em harmonia com as autorizações' Concedidas pela lei n.° 1:344, sendo portanto um decreto ditatorial. 0
Mas neste decreto o Sr. Ministro pretendeu dar autonomia aos serviços administrativos do Arsenal, supondo que assim deminuiria a engrenagem burocrática, e que a fábrica do Arsenal ganharia muito com isso.
Segundo um dos considerandos do referido decreto, todas as despesas com o pessoal do Arsenal devem ser feifas pela verba das férias.
Ora eu, Sr. Presidente, lendo este considerando, estaria absolutamente de acordo com o Sr. Ministro da Marinha, tanto mais que isto consta do programa do meu Partido, «interessar os operários nos lucros das fábricas«; portanto, parecia que o Sr. Ministro da Marinha pretendia que, quando se fossem avaliar os lucros da fábrica do Arsenal da Marinha, se distribuíssem esses lucros numa certa percentagem por todo o pessoal que tivesse concorrido para eles.
Isto evidentemente era uma cousa justa e estava em absoluta concordância com o
meu modo de pensar, que é o das esquerdas.
Mas, Sr. Presidente, fiquei admirado quando há dias me mostraram um despacho de S. Ex.a em que dá uma gratificação suplementar ao pessoal superior do Arsenal, aos oficiais.
Ora, Sr. Presidente, não me parece que esteja certo que se vão dar todas estas gratificações a este pessoal dirigente quando afinal não se sabe ainda se o Arsenal deu ou não deu lucros; o que se fez, foi criar uma situação irritante dentro do Arsenal, porque começaram os chefes por servir-se da autonomia, de forma que por um simples despacho obtiveram este aumento de vencimentos, ficando o outro pessoal na mesma.
Não concordo, tanto mais que isto foi criar uma situação de desigualdade entre esses oficiais e os outros oficiais da Armada que continuam com os seus míseros vencimentos.
Além disso, há dois desses oficiais que não têm razão absolutamente nenhuma de receber a nova gratificação: —o engenheiro construtor naval encarregado da Fábrica Nacional da Cordoaria, a quem se dá casa, água, luz, carvão e criado— £0 que é que isto representa hoje Sr. Presidente?—. e um oficial da Administração Naval que faz serviço na Cordoaria Nacional, e que tem também iguais regalias. Estas concessões feitas a estes oficiais constituem hoje um enorme benefício, e portanto nada explica a necessidade da gratificação que lhes foi agora concedida.
Se o edifício da Cordoaria Nacional é considerado numa situação excêntrica, como diz o decreto para querer justificar a concessão de moradia a certo pessoal, o mais que se devia fazer era pagar a esse pessoal a despesa feita em carros, quando em serviço.
Conceder a esse pessoal gratificações iguais às de outro a quem o Estado não dá casa, água, luz e carvão não ó justo.
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nal tinha produzido bastante, e dividisse os lucros provenientes desse trabalho por todo o pessoal que tinha concorrido para ele, tinha S. Êx.a a minha aprovação, porque esse procedimento está absolutamente no meu modo de ver, e no modo de ver daqueles que acompanham a marcha da humanidade. Assim como S. Ex.a procedeu não concordo.
S. Ex.a poder-me há dizer que na indústria particular ganham mais.
Mas isso não é razão, porque na indústria particular não têm as garantias que têm os funcionários do Estado, e além disso, se vamos a estabelecer termos de comparação com outro pessoal, não são só esses oficiais da Direcção das Construções Navais que estão mal pagos, mas duma maneira geral todos os funcionários do Estado.
Ou se paga a todos como deve ser ou então o sacrifício deve' ser dividido por todos, porque assim é a maneira de haver ordem e força moral de quem manda.
As desigualdades de tratamento é que produzem o estado de irritação em que se enconíra uma grande parte da sociedade.
' Creio que o motivo alegado para se querer justificar a gratificação concedida a certos oficiais da Direcção das Construções Navais é o facto de esses oficiais acompanharem o horário fabril. Isto a meu ver não é razão suficiente, porque, se de facto esses oficiais vão mais cedo para o serviço do que os que estão noutras repartições, a verdade é que vão almoçar das 12 às 14 horas, e portanto o número de horas .de serviço é quási p mesmo.
Noutros tempos, os oficiais em serviço no Arsenal que acompanhavam o horário dos operários creio que tinham uma pequena gratificação que acabou quando foram criadas as gratificações de comissão em ten^ mas, mesmo que quisessem fazer reviver essa gratificação e actualizá-la em harmonia com os outros vencimentos dos oficiais, não daria uma quantia tam elevada como a que agora foi concedida.
Desejava também fazer algumas considerações ...
O Sr. Presidente (interrompendo]: — Deu a hora.
Vozes: — Fale. Fale.
O Sr- Presidente: tinuar.
Pode V. Ex.a con-
0 Orador : — Agradeço à Câmara o ter--me consentido que continuasse no uso da palavra.
As considerações que desejo fazer são relativamente ao decreto que o Sr. Ministro da Marinha publicou e que trata da reorganização do Ministério da Marinha.
Em minha opinião este decreto também não foi publicado em harmonia com a lei n.° 1:344, visto que esta lei apenas permitia redução de quadros e não remodelação de serviços. Depois deste decreto apareceu um.outro regulamentando esta reorganização, e é. propriamente a esse decreto que me desejo reforir.
Por essa regulamentação vê-se que S. Ex.a vem afinal de contas tornar a en-t grenagem burocrática mais complicada, porque criou inúmeras direcções gprais, cada uma delas com duas repartições e cada repartição com muitas secções, de modo que o resultado disto tudo é complicar ainda mais a engrenagem burocrática e aumentar as despesas.
S. Ex.a criou novamente o curso naval de ^guerra.
É um curso de sua predilecção. Na verdade S. Ex.a tem produzido algumas obras que demandam muito estudo, mas, praticamente, poucos resultados ou aenhuns nos têm dado. O seu último trabalho, com parte do qual eu concordo, é que tem na verdade uni aspecto mais prático e contém ideas que são exequíveis. O curso naval de guerra é dirigido por oficiais, a quem nós oficiais da Armada jocosamente chamamos lentes de geração espontânea.
Aos oficiais com este curso chamamos também jocosamente palmípedes.
O Sr. Ministro da Marinha organizou novamente o Estado Maior Naval com várias secções, tendo a seu cargo estudos muito interessantes mas de nenhuns resultados práticos. Praticamente essas secções não terão nada que fazer.
Sr. Presidente: é preciso não andarmos na loa e baixarmos à superfície da terra para vermos as cousas como elas na realidade são, e não criarmos serviços que são verdadeira fantasia.
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é, de facto, um oficial que tem estudado e tem grande amor pela Armada, mas permita-me que lhe diga que a meu ver essas suas boas intenções não produzirão os necessários resultados práticos.
Não quero abusar da atenção da Câmara e, se não estivéssemos .no fim da sessão legislativa, mandaria para a Mesa uma nota de interpelação ao Sr. Ministro da Marinha para tratar destes assuntos mais desenyolvidamente.
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva):—O ilustre Senador Sr. Procópio de Freitas'tratou de duas questões: uma que respeita à Cordoaria e outra relativamente à.reorganização do Ministério da Marinha.
Quanto à primeira parte devo dizer sinceramente que, se tomei a deliberação de extinguir a Cordoaria, como fábrica, foi porque ela de facto não correspondia às necessidades dos serviços duma marinha moderna, mas isso não significava que as oficinas úteis não continuassem a subsistir, desde que a sua produção fosse vantajosa.
Quando se publicou ò decreto que estabeleceu a autonomia administrativa do Arsenal da Marinha foram as oficinas da Cordoaria consideradas como uma secção da Direcção das Construções Navais e assim ficou estabelecido que as oficinas que dessem rendimento mantinham-se, e aquelas que o não dessem seriam suprimidas; e é nesta conformidade que essa secção está a funcionar.
, Quanto à questão das gratificações fabris, devo dizer que tenho o maior empenho em imprimir ao Arsenal a necessária vitalidade, mas também reconheço que é impossível manter directores e engenheiros no Arsenal sem estímulos.
Dirigi durante quatro anos uma oficina no Arserial.
Sei bem quanto custa a um chefe ou dirigente de fábrica, em cuja oficina entrou todos os dias às 7 horas da manhã para sair às 5 da tarde, sendo' a vida muito mais exaustiva que a dos oficiais quo se encontram nas repartições do Ministério da Mariaha, cuja entrada é ao meio dia e a saída às 5 horas da tarde.
Até hoje não se tem conseguido fixar os engenheiros construtores à fábrica do
Arsenal porque têm remuneração maior cá fora, quer na indústria particular, quer mesmo em oficinas ou fábricas autónomas do Estado.
Digo mais ao ilustre Senador que eu fiz o confronto entre os engenheiros do Arsenal e os directores dos caminhos de ferro do Sul e Sueste» que é também um serviço autónomo do Estado.
Pois um director deste serviço tem vencimentos totais que orçam por três contos e o do Arsenal apenas auferia mensalmente um conto e quinhentos, números redondos.
Eu, realmente, não tive outro empenho senão, como digo, fixar os engenheiros do Arsenal e dar-lhes algum estimulo, tanto mais que eles ficam obrigados a entrar com o pessoal fabril.
Ora, se eu lhes quero impor novas obrigações, só o posso fazer dando-lhes remuneração suficiente, pois até há pouco não eram obrigados ao horário fabril, & certo que no decreto se faz afirmação que é preciso interessar os operários e engenheiros nos trabalhos; mas tratando-se dum estabelecimento do Estado, que é ao mesmo tempo dono e o único freguês, os lucros resultam apenas na maior economia da produção e se se fosse estabelecer uma percentagem artificial de lucros de forma:, global, sucederia que tais lucros seriam divididos por uma forma proporcional às categorias, não se dando assim incentivo aos operários do Arsenal.
Adoptando o sistema das tarefas con-segue-se interessar o pessoal operário na laboração da fábrica de uma forma proporcional ao seu esforço útil, servindo tal sistema de vantajoso estímulo.
S. Ex.a diz que a fábrica do Arsenal não está ainda com a autonomia desejável.
Respondo: tem razão.
Mas os problemas não se podem resolver dum jacto. A minha intenção é industrializar a fábrica do Arsenal de Marinha ligada com outra fábrica também do Estado, permitindo um conjunto de maior capacidade fabril. Por agora fiz o que pude.
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Diário das Sessões do Senado
não com mais organismos, porque a soma total deles é menor.
Há ama diferença de 54 oficiais para menos.
O ilustre Senador pode dizer que os oficiais estão todos colocados.
Na verdade eu coloquei vários oficiais como adjuntos ao Ministério da Marinha, pois que se podem utilizar no funcionamento de certos serviços, emquanto houver oficiais em excesso.
Tenho dito.
O Sr. Herculano Galhardo (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: vou fazer duas preguntas a V. Ex.a, mas desde já declaro que não tenho nenhuma intenção reservada.
A primeira consiste em V. Ex.a fazer o favor de me dizer a que horas vai começar a ordem do dia.
O Sr. Presidente: — Devo dizer a V. Ex.a que depois do Sr. Procópio de Freitas usar da palavra «para explicações».
A parte «antes da ordem do dia» tem-se prolongado mais, .devido a não se achar presente o Sr. Ministro da Agricultura, para a continuação da interpelação do Sr. Lima Alves.
O Orador: —Essa é a primeira parte. Mas a ordem do dia consta de vários projectos. À primeira preguntajá obtive resposta.
• A segunda pregunta é se V. Ex.a já tem conhecimento da lei n.° 1:648, que é a chamada lei das autorizações ao Governo, publicada no Diário do Governo n.° 180. •
O Sr. Presidente: — Vou verificar.
O Orador: — Sr. Presidente: essa lei é quási impeditiva. De modo que a nossa latitude como parlamentares e até a de V. Ex.a, Sr. Presidente, torna-se muito limitada. O próprio Poder Executivo tem de ter em consideração essa lei, porque ela impede que os Ministros tragam ao Parlamento propostas com aumento de despeisa sem trazerem a receita compensadora. E agora, não é até que seja votado õ Orçamento, é até que seja extinto o déficit.
Eis o que eu tinha a preguntar a V. Ex.a
O orador não reviu.
O Sr. Afonso de Lemos: — jEevejam-se V. Ex.as na sua obra! j E a obra da maioria !
O Sr. Herculano Galhardo: — ; Também ó a dos seus correlegionários da outra Câmara!
Essa lei devia caducar no fim do ano económico.
O Sr. Afonso de Lemos: — Não devia vigorar nunca, para prestígio do Parlamento ! Apresentei uma contrária a ela, que foi rejeitada!
O Sr. - Procópio de Freitas (para explicações) : — Ouvi com toda a atenção ÍYS explicações dadas pelo Sr. Ministro da Marinha, mas devo declarar a S. Ex.a que elas não me convenceram.
Lendo o decreto que extinguiu á Cordoaria Nacional ficámos com a convicção plena que S. Ex.a queria acabar de vez com a Cordoaria Nacional.
Vê-se agora que S. Ex.a já pensa duma maneira diversa e tenciona permitir que continuem a funcionar algumas oficinas da Cordoaria Nacional.
Faço justiça às intenções do Sr. Ministro da Marinha, mas devo declarar a S. Ex.a que é minha convicção que o resultado prático da sua obra não há-de ser o que S. Ex.a supõe.
Haja até uma certa-disparidade entre o regulamento para a execução do decreto que reorganiza os serviços do Ministério da Marinha e esse decreto, porque nesse regulamento já há mais 5 oficiais na Administração Central de Marinha do que consta no decreto da reorganização.
O Sr. Ministro da Marinha (em aparte):— Como adjuntos.
O Orador: — Nos normais já há 5 oficiais a mais.
Emfim tenho muita pena, mas as palavras do Sr. Ministro da Marinha não me convenceram..
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O Sr. Silva Barreto:—É sòmonte para pedir a V. Ex.a que consulte o Senado sobre se permitia que eu falasse.
Fá-lo hei por muito pouco tempo, porque só desejo fazer uma pregunta ao Sr. Ministro da Marinha.
Vozes : — Fale, fale.
O Sr. Silva Barreto: —Desejava que o Sr. Ministro da Marinha me informasse sobre os motivos ou fundamentos da concessão duma gratificação que vai de ôOOáOO a 900(500, mensais, aos oficiais engenheiros e engenheiros maquinistas, com o fundamento de terem muito serviço, não tendo sido abrangidos nesta gratificação os maquinistas condutores Joaquim Manuel Nunes e Luís Francisco Gravata.
Desejava também que me informasse por que razão passaram vários oficiais maquinistas do Arsenal para o Comando G-eral.
Afirmou-me um oficial da Armada, portanto companheiro de V. Ex.% que essa passagem teve por fim evitar que as gra-. tificações fossem divididas por muitos, o que as tornava muito menos valiosas.
São estas as preguntas que eu desejava fazer a V. Ex.a, em virtude de a concessão das referidas gratificações ter causado certo mal-eiàtar entre os que por elas não são atingidos, ficando com os seus magros vencimentos.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva):—Devo dizer que essas gratificações foram instituídas para os dirigentes que íabrilmente dirigem a fábrica conforme o decreto qu§ estabeleceu a autonomia do arsenal, mas ainda assim esses dirigentes ficam em condições inferiores aos engenheiros doutros estabelecimentos autónomos do Estado.
A intenção foi dar aos engenheiros que dirigem os serviços daquela 'fábrica o necessário estímulo, tendo em atenção que esses engenheiros têm um trabalho exaustivo, das 8 horas da manhã às õ da tarde, quando outros oficiais da armada, em serviço diferente, apenas são obrigados a um trabalho que vai do meio dia às 5 horas da tarde.
Eis o motivo do meu procedimento.
O Sr. Mendes dos Reis : — Roqueiro que, emquanto não choga o Sr. Ministro da Agricultura, entre em discussão a proposta de lei n.° 690, que produz aumento de receita.
E aprovado este requerimento.
O Sr. Costa Júnior: — Mando para a Mesa um projecto do lei, para o qual peço urgência.
Requeiro a V. Ex.il que consulte o Senado sobre se permite que, a seguir à proposta de lei a que se referiu o Sr. Mendes dos Reis, e emquanto não vem o Sr. Ministro da Agricultura, continue em discussão o projecto de lei n.° 686.
O Sr. Herculano Galhardo:—Vejo que a ordem do dia está alterada, que vai ser diferente do que estava determinado.
O Sr. Gosta Júnior:—O Senado é soberano.
O Orador: — O Senado não é soberano contra o Regimento. O Senado, que fez o Regimento, pode modificá-lo, mas dentro das praxes regimentais; mandando-se para a mesa uma proposta assinada por 5 Srs. Senadores, a qual é enviada à comissão respectiva, ali discutida e, se for aprovada, faz-se a modificação proposta.
Peço a V. Ex.a que me'diga, em definitivo, o que é a ordem do dia, porque, a meu ver, se a Câmara estiver a funcionar fora do Regimento, não me julgo no dever de estar aqui.
O Sr. Presidente:—A ordem do dia é a que estava marcada.
Não há disposição alguma que proíba aos Srs. Senadores fazerem os requerimentos que entenderem.
O Sr. Herculano Galhardo: — Se eu não estivesse ligado ao chamado projecto do Montijo, já tinha ido passear.
V.. Ex.a, obedecendo à soberania da Câmara, obriga-me se vir ao Senado quando a minha saúde me inibe de cá vir.
Peço portanto a y. Ex.a que registe o meu protesto.
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O Sr. Silva Barreto: — Sr. Presidente: está sobre a mesa, há alguns dias. uma proposta de lei, a n.° 712, que respeita ao abono de rancho às praças da Guarda Bepublicana.
Peço a V. Ex.a que consulte o Senado sobre se permite que na segunda parte da ordem do dia, e depois da interpelação do Sr. Lima Alves, essa proposta ontre em discussão.
Consultado o Senado, foi autorizado,
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente.: — Vai ler-se a proposta de lei n.° 690. E a seguinte:
Proposta de lei n.° 690
Artigo 1.° É criado um selo comemorativo da intervenção de Portugal na Grande Guerra, impresso em quatro cores e com o valor de $10.
§ único. Haverá um selo especial por-teado, de cor diferente, com a verba de $20.
Art.. 2.° A emissão máxima será de seis milhões de selos, incluindo dois milhões com a sobrecarga «Açores» ; este selo será afixado na franquia das correspondências trocadas dentro do continente e nas expedições co continente para as ilhas adjacentes e colónias portuguesas; o selo com a sobrecarga «Açores» será destinado à correspondência expedida destas ilhas para o continente e colónias portuguesas.
§ 1.° A franquia especial com este selo será obrigatória, como estampilha adicional às taxas ordinárias legais no serviço postal e telegráfico, nos dias, 8 e 9 de Abril, 10 e 11 de Novembro de 192o.
§ 2.° Do disposto no parágrafo anterior serão exceptuados os jornais.
§ 3.° A emissão máxima do selo especial de porteado será de dois milhões; este selo será destinado à correspondência não franqueada nos termos deste artigo e será cobrada dos destinatários revertendo 25 por conto da sua venda páVa a Administração Geral dos Correios e Teiégraíbs.
Art. 3.° A correspondência postal, retirada dos receptáculos na primeira tiragem dos dias 10 de Abril e 12. de Novembro de 1923, fica isenta da franquia adicional a que se refere a lei.
Art. 4.° .A Administração Geral dos Correios e Telégrafos requisitará à Casa da Moeda e Valores Selados a quantidade de estampilhas necessárias para a execução desta lei.
Art. 5.° As estampilhas devolvidas à Casa da Moeda e Valores Selados 'por excederem a obrigatoriedade fixada no artigo 2.°, § 1.°, e o resto da emissão continuarão à venda pelo seu valor facial na Casa da Moeda e Valores Selados até completo esgotamento.
Art. 6.° A. escolha do selo comemorativo do selo especial porteado, bem como as depesas da emissão ficam exclusivamente £ cargo da Comissão Central dos Padrões da Grande Guerra.
§ único. O produto líquido da venda reverterá para os fundos da subscrição nacional promovida pela mesma Comissão, atendendo ao prescrito no § 3.° do artigo a.°
A referida Comissão destinará 6 por cento deste produto, em partes iguais, às instituições, também particulares, que têm idênticos objectivos morais, e são: A Liga, dos Combatentes da Grande Guerra e a Casa dos Filhos dos Soldados Portugueses da Junta Patriótica do Norte.
Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, em 3 de Julho de 1924. — Alberto Ferreira Vidal — Baltasar de Almeida Teixeira.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pires Monteiro):— Sr. Presidente: como Ministro do Comércio cumpre-me esclarecer o Senado acerca da conveniência e oportunidade da proposta de lei que foi lida "ca Mesa.
Esta proposta tem por fim aumentar os fandos duma subscrição nacional, lançada por um grupo de oficiais do exército e da armada, combatentes da Grande Guerra.
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a sim tarefa, -basta erguer três padrões: um em França onde combateram as tropas portuguesas, outro em Angola e ainda outro em Moçambique, onde também houve uma campanha contra as forças do adversário. Para o fazer, necessita aumentar os fundos de que dispõe, e para isso se elaborou" esta proposta que não traz o mais ligeiro encargo para o Tesouro, sendo o seu objectivo dar sanção oficial à emissão filatélica dos selos.
Não tem outro objectivo..
Nestas circunstâncias, peço a atenção da Câmara para a proposta.
E faço-o como combatente da Grande Ghierra e ^como Ministro do Comércio por cuja pasta, correm os assuntos postais.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. José Pontes: — Sr. Presidente: longe de mim a idea de discordar do projecto; tenho mesmo a dizer que aplaudo a idea que o-inspirou. Mas, Sr. Presidente, é preciso também que a Câmara se não esqueça dos farrapos da Grande Guerra, que andam por aí pedindo esmola. Ouço dizer, não sei se com verdade, se sem ela, que andam por aí soldados afirmando que têm fome. Por isso, peço ao Sr. Ministro do Comércio se lembre dos seus camaradas que para aí 'se arrastam sem terem com que viver.
O orador não reviu.
O Sr. Querubim Guimarães: —Sr. Presidente : pedi a p'alavra para me associar às palavras que acaba de pronunciar o Sr. José Pontes.
O projecto merece a aprovação do Senado ; mas não me parece que sejam acautelados todos os prejuízos que da guerra vieram, principalmente ao grande número de portugueses a que se referiu o Sr. José Pontes.
Sem dúvida que nós não devemos esquecer os esforços que os nossos soldados fizeram, combatendo ao lado dos aliados; mas não devemos também esquecer o pobre mutilado, aquele que ficou sem condições de vida e sem poder trabalhar.
Por isso, associando-me às palavras sinceras de S. Ex.a desejava que, da parte do Sr. Ministro 'do Comércio, fosse tomada qualquer medida no sentido de que, do produto dos selos que vão cir-
cular, alguma cousa fosse destinado aos mutilados.
Sabemos muito bem quê as circunstân-' cias do Tesouro são más; mas, Sr. Presidente, ainda há poucos dias, na Câmara dos Deputados, se ergueu um grito de protesto, que significava um apelo a todos os Deputados.
Esse grito foi contra o Eegimento daquela casa do Parlamento ; mas, no entanto, soou pelo país fora.
Não podemos e.squecer esses homens porque se sacrificaram pelo país, tornando se inúteis para ganhar a vida.
Faço votos porque a iniciativa parta do Sr. Ministro do Comércio.
Tenho dito.
O orador não reviu,
O Sr. Afonso de Lemos : — Sr. Presidente :' em meu nome e,no do meu partido associo-me também aos 'desejos do Sr. José Pontes.
Parece-me que temos uma forma prática do realizar os desejos de todos.
Há uma proposta de lei, na Câmara dos Deputados, que respeita aos mutilados.
O que devemos é pedir ao Sr. Ministro do Comércio que faça expressar na ou-tra. Câmara a aprovação deste projecto.
E mais prático de que estarmos com lamentações.'
O orador não reviu.
O Sr. Procópio de Freitas: — E-me imensamente simpática a idea que presidiu à elaboração do projecto de lei que está sendo discutido, ao qual dou o meu voto.
Não posso também deixar de apoiar as considerações dos meus ilustres colegas, acerca do estado miserável em que esses homens sacrificados da Grande Guerra andam pelas ruas de Lisboa.
É absolutamente indispensável que a esses homens seja feita justiça completa.
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O Sr. Roberto Baptista: — Pedi a palavra para dois fins: primeiro, piira dizer que dou o meu voto a esta proposta; se-. gundo, para me associar às palavras do Sr. José Pontes.
Não é razoável que o projecto relativo aos mutilados esteja há tanto tempo na outra Câmara, sem ter sido discutido.
Não digo mais sobre este assunto, porque as poucas palavras que proferi são suficientes.
Com relação a esta proposta devo ainda chamar a atenção do Senado para o § único do artigo 6.°, que consigna que 6 por cento do produto líquido das receitas da venda dos selos, que se destina à comissão dos padrões da Grande Guerra, sejam divididos em partes iguais para duas instituições, a Liga dos Combatentes da Grande Guerra e a Casa dos Filhos dos Soldados Portugueses.
Serve, pois, este projecto para perpetuar o esforço da nossa raça nas planícies de Flandres.e em Angola o Moçambique., como também serve para concorrer para duas instituições que devem merucer o nosso carinho. .
O oraçlor não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Pires Monteiro): — Sr. Presidente: agradeço aos ilustres Senadores de todos os lados .da Câmara as palavras de homenagem que prestaram a essa proposta.
Ao ilustre Senador -Sr. José Pontes tenho a dizer que a sua palavra, sempre cheia "de entusiasmo e impregnada de carinho pelos mutilados, carinho esse que tem manifestado desde a sua entrada na Grande Guerra, tem sido de tal maneira sentida, que não podia deixar de impressionar todos aqueles que o rodeiam.
Ouvi a sua palavra cheia de fé no futuro e de amor por aqueles que se sacrificaram pelo bem da pátria.
Aos ilustres Senadores Srs. Querubim Guimarães, Afonso de Lemos, Procópio • de Freitas, Pereira Osório e Roberto Baptista igualmente agradeço as suas palavras e igualmente lhes afirmo que, com o maior interesse e entusiasmo, vou procurar que a outra Câmara dê rapidamente o seu voto ao projecto dos mutilados.
Irei transmitir ao Sr. Presidente do Ministério os apoios tam sentidos e patrióticos que o Senado acaba de fazer neste sentido.
Devo dizer a V. Ex.a que o faço, não sb como Ministro do Comércio, mas também ccmo combatente da Grande Guerra.
A situação em que se encontram hoje os mutilados não advêm da falta de cuidado dos que têm dirigido os negócios públicos, iças, principalmente, provém duma legislação confusa, duma legislação feita um pouco dia a dia e que precisa ser codificada.
Está na Câmara dos Deputados uma proposta de lei que resolve o.assunto e, estou convencido de que, depois do apelo tam sentido que o Senado fez, a outra Câmara resolverá rapidamente o assunto.
Ainda este projecto atende a uma simpática instituição que foi criada em 1916; logo no início da nossa intervenção na Grande Guerra, que é a Casa dos Filhos dos Soldados Portugueses.
Sr. Presidente: essa casa sustenta 51 órfãos, todos filhos de soldados que morreram na Grande Guerra, ou mutilados da guerra.
Essa cassa ó ajudada e dirigida superiormente pela Junta Patriótica do Norte, que fez a melhor e mais eficaz propaganda da nossa intervenção na guerra.
Essa Junta, com o auxílio de algumas .senhoras das mais distintas, tem criado criancinhas que têm recebido todo o conforto e assistência material.
Por consequentemente, agradecendo ao Senado as palavras que acabo de ouvir, afirmo que o projecto atende aos mutilados e atende aos filhos dos soldados mortos e dos mutilados da Grande Guerra.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Não está mais ninguém inscrito. Vai votar-se.
feita a votação na generalidade, é aprovado. Passando-se à especialidade são apro-vados,. sucessivamente e sem discussão, todos os seus artigos. '
A requerimento do Sr. Pereira Gil, é dispensada a leitura da última redacção.
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O Sr. Silva Barreto: — Sr. Presidente: o artigo 1.° não é mais do que uma amnistia. Tanto na Secção como nesta Câmara, ninguém com mais desenvolvimento e com maior estudo tratou deste assunto do que eu.0 Certamente com mais proficiência muitos outros o fizeram, mas com mais preparação e com mais vontade de acertar ninguém se ocupou dele.
Estudei largamente esta questão, estudei as bases iniciais, que foram presentes à Câmara dos Deputados e depois as modificações dessas bases, apresentadas pelo Ministro, no Senado.
Sr. Presidente: disse na Secção ao Sr. Ministro de então e ao Sr. Presidente do Ministério que as alterações a essas bases tinham sido organizadas em harmonia com os conselhos dos técnicos; e portanto, com todos os elementos que tinham competência especial, como técnicos que eram, para elaborar bases que fossem justas.
Procurou-se, sobretudo, uma maior eficiência dos serviços e uma grande economia.
Hoje, já se pode dizer que torneio compromisso de não abordar o duro aspecto da questão na sessão plena, por isso não convir à ordem e à disciplina.
Foi a pedido do Sr. Presidente do Ministério de então e do Sr. Ministro do Comércio que não tratei da questão, por-quo diziam que, aprovando-se as bases tais como elas tinham sido propostas para substituição das iniciais, evitava-se uni conflito grave entre os telégraíb-postais, evitando-se a greve e os seus enormes prejuízos.
E eu provei na Secção, com dados de contabilidade, oficiosos mas que podia considerar oficiais, dados esses que o Ministro confirmou, que as bases apresentadas ao Parlamento alteravam de tal maneira os serviços dos correios e telégrafos, que passariam a não se bastar. E seudo serviços autónomos, o Estado não era obrigado a cobrir o déficit que, nessa altura; provei que já era de 7:000 contos.
Tomei o compromisso a que me referi já, porque os Srs. Ministros me disseram que as minhas afirmações podiam porventura ocasionar a greve, e eu, Sr. Presidente, declarei que não se evitava a greve, porque ela se dava fatalmente, desde que fossem aprovadas não as basess do início, mas as que as vieram, substituir.
Falei como um livro aberto, e falei porque eu sabia que não havia meio de evitar a greve.
Eu vou dizê-lo: — a disciplina, quando .não vem do alto, alastra, é como mancha de azeite. Quando os dirigentes não sabem ser disciplinadores, não sabem fazer disciplina com a cabeça, com a inteligência— não é a disciplina que se faz em nome da .,palavra «ordem», que é como quem diz «violência», que pode frutificar. A violência não consegue nada em serviço nenhum, a violência desmoraliza, e a autoridade imposta pela violência não dá autoridade, não incute disciplina, demonstra a incompetência do superior. Foram os superiores dos Correios e Telégrafos que deram origem à indisciplina que lavrou no pessoal. Foram os altos cargos dos Correios e Telégrafos que levaram o pessoal à indisciplina, à desordem e à greve, embora greve classificada de «braços caídos». E certo que não foram todos os funcionários dos Correios e Telégrafos que fizeram a greve dos braços caídos, mas, em-qucinto se não reage contra a rebeldia, a responsabilidade é tanto de .quem manda como de quem obedece. O Governo, perante essa greve, apelou para o patriotismo dos telágrafo-postais, apelou para os sentimentos republicanos desses funcionários do Estado, e o Estado não é Estado sem funcionários, e os funcionários do Estado não são funcionários sem o Estado. Ambos, Estado e funcionários, são uma e a mesma cousa; os funcionários do Estado que fazem greve contra o Estado fazem greve contra si mesmos. Mas a Kepúblíca tem sido duma tal tolerância, tem sido tam amiga dos funcionários, que eles muitas vezes faltam ao cumprimento dos seus deveres, e o Estado, sempre benevolente, passa uma esponja por cima de faltas que muitas vezes têm colocado o Estado em precárias circunstâncias. £_E, afinal, a quem devemos pedir res-pousabilidades desta greve?
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puseram aos seus subordinados, para que saíssem das repartições, porque se o não fizessem seriam mal considerados pelos seus colegas.
Sr. Presidente: quando a República fala em disciplina, quando os Partidos, o Governo e os Poderes Constituídos falam na. disciplina que deve ser imposta a todos os que recebem do Estado benesses, favores e serviços, vemos que nem sempre esses serviços correspondem às necessidades do Estado.
Eu me explico mais claramente.
O Estado proíbe expressamente qne os funcionários públicos se associem, porque "os funcionários públicos associam-se sempre contra alguma cousa e contra alguém.
Que aqueles que têm interesses económicos a defender, que têm interesses económicos ou financeiros a resolver, usem do direito de associado e do direito à greve, está bem, é princípio consignado pela República.
Mas que se consinta que funcionários públicos se associem para íratar, não dos seus interesses legítimos, mas de interesses contrários aos do Estado, só numa República bolchevista pode adrnitir-se. E nós ainda não estamos em República bolchevista.
Se há uma lei que proíbe expressamente que os funcionários públicos se associem, e se a idea de associação é sempre contra alguém, porque o espírito de associação não tem outro fim, quando trata de interesses económicos, senão sal-, vaguardar certos interesses contra outros contrários, eu preguuto se o Estado pode admitir que haja associações de funcionários públicos para acautelarem os seus interesses contra os do próprio Estado.
E sucede o que temos visto atnivés de três ou quatro greves. Os correios e telégrafos, de braço dado com funcionários inferiores, .que já receberam o devido castigo, perturbaram a vida da nação, para serem depois abandonados pelos seus subordinados. E ainda bem, Sr. Presidente, porque foram os funcionários inferiores q P e deram na anterior grave o exemplo da disciplina e da ordem (Muitos apoiados), ao passo que os funcionários superiores se serviram deles como escudo, pois é sabido que no pessoal menor está a grande maioria dos funcionários republicanos.
Os funcionários superiores pensaram, ao declarar a greve, que se serviriam dos funcionários menores para se defenderem daquilo a que chamavam a prepotência e as violências do Poder.
Violências do Poder?
c; Porventura o Poder usa de violências quando quere que os funcionários do Estado cumpram o seu dever?
Violências há quando o Estado não cumpre as leis. V. Ex.a sabe e sabe a Câmara que dois ou três dias depois de declarada a greve de braços caídos, o Poder Executiuo expediu uma ordem ou, antes, um pedido, convidando —vejam .em que situação* se colocou o Poder — os funcionários dos Correios e Telégrafos & que se apresentassem, porque seriam recebidos com todas as honras.
,?E como responderam os dirigentes dos Correios? . ^/"""^
Não me esqueço destas cousas e creio que ninguém desta Câmara as deve esquecer.
Nas reuniões dos telégrafos-postais, que o Governo sempre tolerou, o prestígio da Câmara e do Poder Executivo andaram de rastos pela lama.
Mas a verdade é, Sr. Presidente, que nós, quando os poderes não cumprem com o que devem, temos sempre maneira de os .fazer chamar à compreensão dos seus deveres.
Com mágoa, ouvi achincalhar os poderes do Estado nessas reuniões, a que presidia um segundo oficial, quando havia grevistas mais graduados. Esse segundo oficial, como velho republicano que é, constituía como que uni escudo do pessoal maior, à sombra do qual o Estado foi constantemente ofendido.
Não nos esqueçamos disto.
Eu sou apologista —já o disse mais de uma vez— das associações de classe dos funcionários públicos, mas sob a condição de os estatutos serem aprovados pelo Estado, não podendo essas colectividades tratar de assuntos que não fossem propriamente do interesse • das classes. De contrário, o Estado pode dissolver a associação e pedir a responsabilidade aos seus corpos dirigentes, quando eles se afastem 'dos seus fins.
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Vou concluir as minhas considerações.
Sinto que no artigo 1.° não estejam salvaguardados os-direitos dos funcionários dos Correios e Telégrafos que não aderiram à greve.
Eefiro-me em especial aos funcionários das contabilidades, que não anuíram às solicitações e ameaças que lhes fizeram.
Discordo da interpretação jurídica do Sr. Alfredo Portugal quando afirma que neste artigo são considerados todos os funcionários como grevistas, quando, em minha consciência, não podem ser abrangidos todos por essa classificação, visto qu'e nem todos 'foram grevistas.
O Sr. Serra e Moura (aparte) i —V. Ex.a dá-me licença?
<_. p='p' que='que' força='força' considera='considera' foram='foram' expulsos='expulsos' funcionários='funcionários' ex.a='ex.a' aqueles='aqueles' armada='armada' grevistas='grevistas' pela='pela'>
O Orador: — Já implicitamente respondi a esta observação, quando algures afir- -mei que os funcionários dos Correios e Telégrafos foram convidados a retomar o serviço por meios suasórios, tendo até o seu administrador geral e alguns oficiais superiores sido encarregados oficiosamente de solicitar o regresso ao serviço de todos os funcionários. E o Governo, depois de esgotados todos estes meios, rebaixando quási o poder, resolveu publicar um decreto intimando os funcionários dos Correios e Telégrafos a reassumir as suas funções no'prazo de 3 dias, sob pena de serem demitidos.
^ Como responderam esses funcionários a esse decreto?
£ Retomaram os seus lugares, foram para as estações tomar conta do serviço?
Não. Responderam que iam para a sua associação, tendo o Governo sido obrigado a encerrar essa associação por causa dos insultos dirigidos às instituições.
Aqui está a resposta que dou a A7". Ex.a
^ Porventura eram muitos os funcionários que • queriam assumir as suas funções ?
Muitos, eu o sei, tenho vários amigos nos correios, porque fui no magistério uma espécie de judeu errante; tenho, como muita gente, não só relações de carácter político, como relações pessoais, e daí as solicitações, cartas e pedidos de
muitos funcionários dos Correios e Telégrafos, que me pediam para quo empregasse todos os meus bons ofícios, julgando eles porventura que eu tinha valimento dentro do meu partido, para solucionar esse conflito, para evitar a greve, que tudo indicava que se viesse a dar.
Eu, dentro do meu partido, sou um soldado como qualquer outro e a ilusão deles é que os levava a supor que eu conseguiria uma situação de que não saíssem mal nem o Governo nem os telégrafo--postais.
Mas a questão chegou a um estado de irritação tal, que não permitiu que os mais educados conseguissem com os seus bons ofícios evitar que houvesse o que houve.
Sr. Presidente: lamento que o Estado tivesse tantos prejuízos e apenas peço ao Sr. Ministro do Comércio, que me dizem ser um espírito disciplinador, e que deve exigir de todos o cumprimento dos seus deveres,' que mantenha a ordem e a disciplina, tam necessária nos serviços públicos, porque para manter a ordem e a disciplina bastam apenas bom senso e uma compreensão clara dos deveres de cada um.
O orador não reviu.
O Sr. Machado Serpa:—Pelo ilustre Senador Sr. Ribeiro de Melo, foi enviada para a Mesa uma proposta de. substituição, que creio ter sido submetida ao Senado e admitida, e por isso deve estar em discussão com o projecto.
O Sr. Costa Júnior-(aparte): — Não senhor. Essa proposta não está em discussão com o projecto.
O7 Orador : — Não deve essa proposta ir à Secção, porque, desde que continua a discussão da proposta, qualquer deliberação aqui tomada pode invalidar a deliberação da Secção.
Ir uma proposta para a Secção e continuar em discussão o projecto não vale de nada.
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O Orador:—Eu bem sei que nada se vota. ,;Se assim é, para que sorve discutir '?
O Sr. Presidente:—^Entãp. se qualquer. Sr. Senador quiser apresentar uma proposta sobre este artigo, não tem esse direito ?
O Orador: —Mas para isso bastava cue fosse lido o artigo e quem quisesse mandasse as suas emendas.
Melhor fora suspender a discussão, receber na Mesa as propostas que"os Srs. Senadores quisessem enviar, e reenviar isso tudo para a Secção.
Tanto mais que tendo eu lido, embora rapidamente, a proposta do Sr. Ribeiro de Melo — tudo isto vem de termos de discutir estes assuntos de afogadilho — reconheci ser ela que contém a verdadeira doutrina»
O Sr. Presidente (interrompendo): — Se a doutrina é t>oa ou má a Secção e o Senado é que hão-de deliberar; por eniquan-to essa proposta não está em discussão.
O Orador. — <_ p='p' à='à' de='de' então='então' proposta='proposta' melo='melo' referir--me='referir--me' ribeiro='ribeiro' do='do' não='não' sr.='sr.' posso='posso'>
O Sr. Presidente: — Não pode porque ela foi admitida mas ainda nSo foi posta à discussão»
O Orador:—Está bem, Sr. Presidente. ,;Para que havemos de discutir a readmis-são de funcionários que já foram readmitidos V
• Em meu entender devem. E sabem porquê? Porque, nas greves, a maior parte dos grevistas ó levada para esse campo por motivos alheios à sua vontade, por motivos de camaradagem, porque ninguém que está dentro duma classe tem coragem de contrariar os desejos dessa classe, qce neste caso são do interesse de todos. Nos meus tempos de Coimbra, a «briosa» declarava a chamada parede. Havia muitos estudantes «ursos» que não gcstavam das «paredes», para ir alardear para as aulas os seus conhecimentos; e, no omtanto, rendiam-se à evidência dos factos e não iam às aulas. Ficavam a estudar como «ursos» em casa. <_ p='p' a='a' rompiam='rompiam' não='não' parede='parede' porque='porque'> <_ p='p' que='que' por='por' não='não' queriam='queriam'> Não. Recordo-me perfeitamente que dos conflitos havidos entre o corpo discente e docente da Universidade, um se deu de carácter agudo, por um motivo de «lana-caprina», de gramática, digamos. Mas foi o bastante para que a Universidade, possuidora duma regalia de foro que não tinha outra instituição do mundo, instaurasse processo aos estudantes, metendo-os na cadeia. Então, os estudantes publicaram vários manifestos ao país, explicando a razão que lhes assistia e, portanto, o vexame que o corpo docente lhes fazia, assinando assim: o Toda a academia assina». Houve então um estudante que veio com uma carta para urn jornal de Lisboa, dizendo que não tinha autorizado a inclusão do seu nome entre as assinaturas do manifesto. Estava no seu direito. Mas um dos dirigentes da academia, nome saudosíssimo, Eduardo de Abreu, entenJeu que não era bastante retirar a esse estudante a camaradagem e entendeu que devia inutilizar a sua pasta de quintanista, macuiando-a com um pingo de sangue das faces do protestante. ,;Isto dá-se só entre estudantes e rapaces? ° Não. Os dirigentes do movimento dos Correios e Telégrafos eram, segundo ouvi di-zer, do pessoal superior. Então parece que melhor fora estabelecer a doutrina de que os que foram coagidos à greve nada sofressem, ou que sofressem o castigo de não receberem os seus ordenados durante o tempo que não trabalharam os dirigentes dessa greve. jVao apoiados.
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O Sr. Presidente: — V. Ex.a fica com a palavra res'ervada, visto que a hora já vai adiantada.
•a.
O Orador: —Não, Sr. Presidente, dou por terminadas as minhas considerações. O orador não reviu.
O Sr. Lima Alves: —Sr. Presidente: desisto da palavra sobre a minha interpelação ao Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Serra e Moura: — Sr. Presidente: o conflito telégrafo-postal deu-se evidentemente por culpa do Governo.
Os empregados telégrafos-postais não declararam a greve, - foram empurrados para ela. „
É diferente, é muito diferente'do assunto que se debate.
Foi um grupo de carteiros, ou cousa que o valha, denunciar ao gabinete do Sr. Ministro do Comércio, Nuno Simões, que o pessoal maior havia declarado a greve de braços caídos.
Sr. Presidente: o Ministro do Comércio, sem, como devia, chamar o Sr. Administrador dos Correios e Telégrafos, mandou que imediatamente a força pública invadisse as centrais de Lisboa e Pôr-to, expulsando delas todos os empregados que lá se encontravam. Esta é a verdade, que é contrária ao disposto no artigo 42.° da organização de 10 de Maio de 1919.
Ora, afirmei eu que foram expulsos os empregados pela força pública...
O Sr. Gaspar de Lemos: —
O Orador: — Sim, senhor. Invadindo dessa forma as atribuições do Administrador Geral, visto que só a ele competia requisitar a força pública...
Vários apartes.
O Orador: — Em muita parte foram expulsos os empregados das suas repartições pela força pública, que assumiu os lugares que eles desempenhavam.
Nas ambulâncias deu-se o seguinte caso : quando o pessoal maior ia a tomar conta dos seus serviços, foi surpreendido por praças do exército, que diziam ir superintender naqueles serviços.
Os empregados, naturalmente melindrados por este estranho caso, não consentiram, entregando-lhes então o serviço a seu cargo, como era natural.
No Porto o Sr. director dos correios, quando pretendia entrar no seu gabinete, foi impedido de o fazer pela força pública, que nem sequer o deixou ir à sua secretária buscar uns papéis que ali tinha.
Por essas províncias fora sucedeu o mesmo: a força pública invadiu as instalações telégrafo-postais, nem mesmo permitindo que algumas pessoas das famílias dos empregados continuassem ali a residir.
Expulsaram-nas dali.
Por consequência, os empregados telé-' grafo-postais foram obrigados a ir para a greve.
No Porto deram-se casos extraordinários. O pessoal menor apupa os empregados superiores de pistola aperrada e dando vivas à revolução social, insultam--se senhoras, pretende-se agredir alguns funcionários.
Em Lisboa algumas senhoras são infamem ente vexadas.
Parece-me que este projecto extranho nunca deveria ter vindo ao Parlamento, tanto mais que o Parlamento não contribuiu, directa ou indirectamente, para o conflito; deveria ter ficado no arquivo da Presidência do Ministério.
Agora vai o Governo atirar para o Parlamento o odioso desta lei, caso seja aprovada.
Não posso dar o meu voto ao projecto, porque entendo que o que se pretende fazer é muito injusto.
De resto, ainda há mais.
Estando em greve o pessoal telégrafo--postal durante setenta dias, logo que retomou o trabalho todos os serviços de maior responsabilidade, acumulados em todas as direcções, foram postos em dia num prazo apenas de três ou quatro dias, continuando, dessa data por diante, a ser feito com toda a regularidade.
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O Sr. Presidente : — O que está em discussão não é o artigo 2.°, é o artigo 1.°
O Orador: — Nesse caso reservarei o resto das minhas considerações para quando se discutir o artigo 2.°
O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente: lido o artigo l.6 do projecto de lei em discussão, eu concluo que estamos a tratar de um caso que já se tornou efectivo antes da sua aprovação e da respectiva publicação.
Se, porventura, não estou em erro, já há bastante tempo que os funcionários telégrafo postais se encontram ao serviço, apesar de a disposição que estamos a discutir dizer que os funcionários em greve se podiam apresentar ao serviço três dias antes da publicação da lei.
De maneira que nós estamos discutindo sem necessidade a primeira parte do artigo 1.°
De facto, bem ou mal, o Poder Exe-cctivo permitiu que, antes da publicação da lei, os funcionários telégrafo-postais que tinham sido demitidos do serviço voltassem a ocupar os seus lugares.
A segunda parte do artigo trata, nada mais nada menos, de aliviar as responsa-bilidades do pessoal maior e menor que, directa ou indirectamente, se achava envolvido na greve. Isto significa simplesmente uma amnistia, sem este nome.
Sr. Presidente: estamos em Portugal numa situação bastante delicada, por termos abusado extraordinariamente das amnistias, a propósito de tudo e por tudo. •
A facilidade com que se decretam amnistias, por muito interessantes que sejam as reclamações dos amnistiados, por muito que seja o direito qtíe Ines assista, por muita razão sentimental que se alegue para defendermos essas amnistias, o que é certo é que, no seu aspecto social, esse facto representa e tem uma significação muito perigosa.
Compreende V. Ex.a, Sr.. Presidente, que, contando com a magnanimidade dos poderes públicos e do Poder Legislativo, j quantas criaturas propensas à desordem social nenhuma dúvida põem na prática de actos nocivos à ordem! • No que respeita a delitos praticados, quer por civis,... quer por militares, nós
estamos examinando com confrangimento uma situação que se não pode permitir que continue, que ó a de todos os criminosos, todos os transgressores, contarem com a magnanimidade dos poderes públicos.
É um princípio bem assente que, sem o rigor da disciplina, não pode haver uma sociedade bem organizada.
Eu que sou e que me prezo de ser muito conservador, não posso deixar de trazer ao Senado este aspecto social da questão, que é interessante pôr em relevo.
Nós, ou seja o Poder Legislativo, do qual fazemos parte, temos gravíssimas culpas na concessão de amnistias, porque com elas mais temos contribuído para a anarquia da sociedade portuguesa.
Várias são as causas de ordem moral que têm concorrido para essa anarquia. Sem dúvida nenhuma, mas a concessão de tantas amnistias é uma das que a meu ver mais têm feito desenvolver a anarquia a que temos assistido.
Frisados estes pontos, que são de princípios e que eu desejo bem marcar nesta minha posição, compete-me, acerca do caso, fazer umas breves considerações.
Não quero, de modo nenhum, que a classe telégrafo-postal veja nas minhas palavras senão o rigor de princípios que eu desejo afirmar.
Sou o eprimeiro a querer que essa classe ben ficie de qualquer disposição que saia do Podei1 Legislativo. Mas ainda Jhá pouco o Sr. Silva Barreto, referindo--se à maneira de enquadrar nesta disposição o pessoal menor, afirmou que se tratava duma questão de interpretação e que não podia caber dentro de uma interpretação esta maneira de ver, porquanto o pessoal menor não estava enquadrado nesta disposição de amnistia.
É clara e expressa a letra do artigo em discussão, aliviando a responsabilidade de todo esse pessoal, incluindo o menor, e é até provável que a amnistia, ou a magnanimidade do Poder Legislativo, o vá atingir principalmente.
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geral, porque em todos os países lavra um grande desnorteamento; é lamentável, digo, que estejamos vendo funcionários do
Estado em greve.
a quem é que devemos atribuir a responsabilidade deste estado de cousas? Sem dúvida nenhuma à permissão de leis que legalizaram estas greves. £ Pois não assistimos nós, ainda não-há muito tempo, a uma greve de todo o funcionalismo?
Não é portanto de admirar que uma secção desse funcionalismo, de mais a mais tratando-se duma secçáo que se encontra em condições difíceis, como de um modo geral se encontra todo o funcionalismo, quanto aos meios para fazer face à carestia da vida, não é de admirar, digo, que uma secção desse funcionalismo se tivesse declarado também em greve.
A extensificação, permita-se-me o termo, dos serviços públicos, o desbaratamento de muitos milhares de contos com um funcionalismo excessivo, que bem podia ser reduzido, é que faz com que a sua situação seja realmente precária.
éiNão temos vindo assistindo, n os finais das sessões, a esse espectáculo lamentável e doloroso de o funcionalismo civil e militar reclamar, de mãos postas, dos poderes públicos, que lhe seja melhorada a sua situação?!
Não extensifiquemos os serviços públicos e consequentemente os funcionários públicos, antes devemos circunscrevê-los, dentro de uma boa administração, a um número mais limitado, e então veremos como o problema se resolve duma forma mais fácil. Mas o que aconteceu com os funcionários tel£grafo-postais aconteceu já com todos os demais funcionários públicos. ^ E o que deu lugar à greve? Foi a péssima administração dos poderes do Estado. Estar em greve é mau, mas aquele sentimento de solidariedade a que, há pouco, se referiu o Sr. Machado de Serpa é muito paVa atender. ^Porventura não haveria muitos funcionários que desejariam voltar ao serviço? Havia, tal vez; <_ de='de' apartes.='apartes.' solidariedade='solidariedade' sentimento='sentimento' entendido='entendido' _.='_.' o='o' p='p' por='por' um='um' mal='mal' não='não' mas='mas' fizeram='fizeram'> O Orador: — Será um princípio interessante o da liberdade da greve, mas, se não condicionarmos os princípios dentro da prática das cousas, a um abuso desses corresponde outro abuso, que é o da ditadura. Tem sido censurado o procedimento do pessoal maior por se manter tanto tempo em greve, perturbando os serviços públicos, mas não atribuamos toda a responsabilidade ao pessoal maior. Apesar de não se ter verificado, como se disse aqui, qualquer falta do pessoal menor, é de olhar à circunstância de se ter posto ao lado da força armada, aparentemente dentro dá disciplina, é preciso que isso se não esqueça, e portanto contra os seus superiores, com quem depois ao regressarem ao serviço teriam de colaborar. Veja-se este aspecto da questão. Acho bem que se relevem de quaisquer faltas as entidades que directamente ou indirectamente se envolveram na questão. Ponha-se fecho sobre o assunto, já que tantas vezes, noutros assuntos, o temos feito. A respeito de amnistias, já não sabemos os que são bons e os que são maus, porque nada consta sobre notas de culpa, tantas aquelas têm sido» Veja, V. Ex.% Sr. Presidente, a que nos leva este constante sistema de amnistias, a que nos temos entregado. Unicamente por este facto, e sem querer de modo nenhum prejudicar a classe telégrafo-postal com as minhas palavras, mas • simplesmente dentro dos princípios e querendo que as minhas palavras fiquem registadas, é que eu pedi a palavra, e desejo e desejaria que todos os poderes do Estado, e sobre tudo o Poder Legislativo, bem compenetrados dos seus deveres e da situação em que se encontra a sociedade portuguesa, por tantas razões indisciplinável, pusessem cobro a tantas facilidades e a tantas generosidades. O orador não reviu,
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lado da Câmara aproveite todos os ense-jos para falar contra a lei que reconhece b direito à greve.
Mas nunca veio tam pouco a propósito como agora trazer para a tela da discussão tal assunto, visto que esse diploma se%ão refere, antes pelo contrário, exclue do direito à greve os funcionários públicos.
Mas o que é extraordinário é que aquele lado da Câmara esqueça tam facilmente as greves que se deram no tempo da monarquia !
Eu assistia algumas dessas greves, que duraram muito tempo e em que as autoridades entravam em acordos com os grevistas.
A Kepública não fez mais do que legalizar fenómenos sociais que se iain tornando frequentes e que eram inevitáveis.
O Sr. Querubim Guimarães: — j Era já a vigência da República !
O Orador: — Então ó porque V. Ex,a reconhece a força da República ainda sob o regime monárquico, porquanto muitos anos antes da s aã implantação já era a Republica que governava.
E que a monarquia já não tinha prestigio nem poder para governar.
Peitas estas considerações, e restringindo-me ao artigo 1.° em discussão, eu devo dizer que, desde que os funcionários telégrafo-postais entraram de novo ao serviço, é necessário legalizar a sua reentrada, visto que todos tinham sido demitidos por um decreto com força de lei.
O Sr. Sá Viana:—E muito bem!
O Orador:—Daí a necessidade de fazer votar este projecto de lei.
Diz-se que êspes funcionários estiveram em greve, mas greve forçada.
Em primeiro lugar, cumpre-me dizer que aqueles que tal afirmação fazem são mais papistas do que o próprio Papa, porque o pessoal maior, com grande publicidade, declarou que nEo estava em greve, mas em atitude de protesto.
Ora, eu devo lembrar que, após essa declaração feita nos periódicos pelo pessoal maior, foi publicado um decreto permitindo a volta ao serviço a todos os fnn-cionários que o quisessem retomar. ~
Voltaram alguns, o que mostra a possibilidade de todos que quizessem, poderem retomar os lugares, se não houvesse o propósito de se manterem numa atitude de hostilidade.
Por conseguinte, em atitude de protesto ou em greve, o que é certo é que foram todos demitidos, excepto aqueles que, ao abrigo do primeiro decreto, que foi publicado após a -declaração da greve, entraram ao serviço.
Mas diz-se: praticaram-se faltas, delitos, crimes que precisam de ter a sanção cor-pondente, e, por conseguinte, no dizer do Sr. Querubim Guimarães, o projecto em discussão representa uma verdadeira amnistia.
Seja como S. Ex.a quiser, mas o que lhe digo é que é absolutamente indispensável fazer votar este projecto para evitar vinganças e retaliações, visto que durante os acontecimentos tivemos ocasião de ver a falta de harmonia entre o pessoal maior e o menor, atribuindo-se culpas um ao outro.
Ora se a isto juntarmos os pedidos dirigidos ao Parlamento por um e outro pessoal para não serem relevados das culpas que tiveram nos acontecimentos, teremos a justificação máxima do projecto, para evitar que dentro de serviços tam importantes fique um fermento que facilite a execução de represálias nos processos disciplinares que houvesse de instaurar-se, do que resultariam graves peejuízos para o serviço e disciplina.
Para evitar tais inconvenientes é que é preciso passar uma esponja sobre faltas de disciplina, de modo a evitar processos onde a cultura das paixões encontraria terreno apropriado para se desenvolver.
Sr. Presidente: a isto reduzo as minhas considerações, tendo mostrado a necessidade e vantagem da aprovação do projecto para que os serviços telégrafo-postais voltem à sua normalidade.
O orador não reviu.
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em face da chamada greve telógrafo-pos-tal.
O Governo, ao tomar posse, no dia 6 de Julho passado, encontrou os serviços tolégrafo-postais entregues à Direcção de Transportes do Ministério da Guerra, encontrou conseqiientemente o serviço numa situação anormal.
E o Governo deu tanto relevo a este facto, ele era de tal forma significativo e perturbara de tal maneira a vida económica da Nação, que entendeu que na sua declaração ministerial deveria incluir o desejo, a aspiração, de que os serviços telégrafo-postais rapidamente se normalizassem.
Teve o Governo de normalizar a situação e ela só podia provir da entrega desses serviços ao Ministério do Comércio e Comunicações.
Para normalizar essa situação não podia o Governo proceder, e não podia proceder porquanto o Parlamento tinha chamado a si a resolução deste conflito, visto que já tinha aprovado na Câmara dos Deputados e já se encontrava aprovado na generalidade nesta Câmara o projecto de lei que está em discussão, da autoria do Sr. Deputado Pina de Morais.
Julgou o Governo que não lhe cabia interferir num assunto que outro Poder, o Legislativo, queria e mostrava desejo de resolver.
Nestas condições, o Governo procurou, pelo Ministério do Comércio, todos os meios de normalizar a situação, que não se podia manter, tanto mais que, embora a dedicação, o zelo e a disciplina dos oficiais e praças que acidentalmente se tin-. ham encarregado desses serviços, como são serviços duma técnica difícil, eram prejudicados por culpa de pessoas ainda hoje desconhecidas, por actos contínuos de destruição de linhas, de derruba-mento de postes telegráficos, o que não permitia o funcionamento tam regular quanto podia ser, entregue a pessoas pouco experientes no seu funcionamento.
O Governo tinha desejo de normalizar a situação, mas o Governo não podia chamar os funcionários que tinham sido despedidos, porque isso dependia do Poder Legislativo.
Mas ainda há a acentuar que na semana que decorreu entre -7 e 12 de Julho, isto é, na primeira semana que o Governo as-
sumiu a gerência das diferentes pastas^ os actos da chamada sabotage recrudesceram, dando-se uma grande actividade na destruição do material telégrafo-pos-tal.
Nas estações que estavam convenientemente guardadas, nas linhas -emfím, em vários pontos do país, era difícil exercer aquela vigilância constante que a situação exigia, e era difícil, pode dizer-se mesmo impossível, porque a extensão quilomé-• trica das linhas era muito grande para se realizar a vigilância devida.
Mas, Sr. Presidente, no dia 15 de Ju»-nho o Ministro do Comércio teve conhecimento que um corpo de 39 dirigentes enr viava uma representação ao Sr. administrador geral dos Correios e Telégrafos, representação que esse funcionário superior me v.eio apresentar, preguntando-me ao mesmo tempo se o Governo aceitaria entrar em transigências.
Dado o aspecto que a questão tinha tomado, julguei que deveria ouvir os Srs. Presidente do Ministério e Ministro da Guerra.
Keúnimo-nos depois em conferência e apreciámos essa representação.
Efectivamente, a representação que, certamente, o Senado conhece, porque íoi publicada em todos os jornais, era redigida em termos da maior correcção e demonstrava-nos até o desejo que os funcionários tinham de normalizar os serviços dos Correios e Telégrafos.
Aceite essa representação pela declaração de que todo o pessoal se apresentaria, realizaram-se as negociações necessárias entre o Ministro do Comércio e o Ministro da Guerra para que a normalização dos serviços se fizesse o mais rapidamente possível.
No dia 7 de Julho fez-se, efectivamente, aquilo a que podemos chamar a «transmissão de poderes», que se fez segundo um plano metódico, não havendo em todo o país a mais leve perturbação. A medida que os funcionários se iam apresentando, e alguns estavam bastante afastados, a apresentação era feita com a maior cordura e correcção.
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, Tive ocasião de visitar a Administração Geral dos CorreicTs e Telégrafos; fui ao Porto, visitei os serviços centrais e tive a mesma impressão de que havia o desejo de corrigir os defeitos e os erros que se poderiam ter cometido anteriormente.
Neste momento também presto homenagem ao espírito republicano dos correios e telégrafos; por mais duma vez os tenho encontrado com o maior amor pela Eepública e pelo prestígio das instituições.
Mas essa aceitação do pessoal não era feita sem condições. O Ministro do Comércio estava preso duma deliberação possível da Câmara; o Ministro do Comércio, como membro do Poder Executivo, não podia de qualquer forma esquecer esta dependência dos Poderes.
O Ministro do Comércio não esqueceu que o Poder Executivo tinha pendente de discussão a proposta de lei a que nos estamos referindo e, conseqúentemente, tinha que impor condições à aceitação do pessoal.
Essas condições ficaram claramente ex> pressas no ofício que dirigi ao Sr. Administrador dos Correios e Telégrafos.
Não podia o Governo tomar atitude diversa da que adoptou. Não está nas atribuições do Poder Executivo CODceder amnistias, o que compete privativamente, pela Constituição, ao Congresso da Kepú-blica.
E não podia, Sr. Presidente, por uma questão de moralidade, ir pagar vencimentos àqueles que não trabalharam, quando houve prejuízos muito graves, produzidos pela perturbação dos serviços dos Correios e Telégrafos.
Nestas circunstâncias é que o Governo se encontrou e foi assim que o Governo julgou corresponder àqueles desejos tam claramente expressos, tam sinceramente indicados na sua declaração ministerial.
O Governo poder-se-ia colocar noutra atitude, porque podia aplicar rigorosamente a lei das greves, que proíbe que qualquer funcionário0 público use desse ' direito: e muito justamente o deve proibir, porque o funcionário público não está nas mesmas condições dos outros cidadãos.
Mas o Governo não quis aplicar essa lei, por factos que V. Ex.as compreendem e sentem.
Se o Governo o fizesse, os funcionários em greve, depois de demitidos,, só pode-
riam ser admitidos novamente passados seis meses da sua.demissão.
O Sr. Presidente:—V. Ex.a fica com a palavra reservada, visto que ainda tenho que dar a palavra a cinco Srs. Senadores.
O Orador:—Eu termino já, Sr. Presidente.
E a estes funcionários, novamente admitidos, não se poderia dar vencimentos a que eles não tinham direito.
O Sr. Costa Júnior: — O Orador: — Eu não queria precipitar os acontecimentos, mas devo dizer, visto que V.; Ex.a mo pregunta, que o Ministro -do Comércio e o Governo todo, já definir ram a sua atitude. Pelo que respeita ao § único do artigo 10.°, o Governo confia absolutamente no Senado; a resolução que o Senado tomar será a que julgar mais conveniente ; é essa que o Governo adoptará. O ilustre Senador Sr. Querubim Guimarães, quando se referiu a este assunto, disse, e eu concordo plenamente com as suas palavras, que s Pelo que respeita à segunda parte, o Governo evidentemente não faz uma questão da confiança pagar ou não pagar aos funcionários, mas o Governo julga altamente prejudicial à moralidade pagar-lhes o tempo em que eles não trabalharam. Tenho dito. • Muitos apoiados. O orador foi muito cumprimentado. O orador não reviu. Antes de se encerrar a sessão
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Como ainda não obtive resposta e S. Ex.a está presente, repito-as, esperando que S. Ex.a se digne responder.
A primeira refere-se à circunstância de os aviões tripulados por oficiais espanhóis aterrarem de vez em quando no nosso país, apesar da convenção internacional publicada no Diário do Governo.
É um documento diplomático assinado por representantes de várias nações onde não vejo o nome da Espanha, e por isso os aviões não podem aterrar em Portugal sem violação dos compromissos internacionais.
O segundo ponto é o que respeita à delimitação da fronteira no concelho de Mourão,-que encontrou protestos por parte da população portuguesa, ao mesmo tempo que esse facto foi alvo de grande regozijo nas povoações fronteiriças espanholas, o que prova que elas foram beneficiadas.
Este caso está liquidado, mas bom será que outros semelhantes não se repitam.
Ao sul do concelho de Mourão há um território que dizem que está registado na respectiva conservatória como português, e andam por lá colocando umas cruzes demarcando uma linha que tem por fim dividir aquele território em duas partes, uma para Portugal, outra para a Espanha.
Eu peço a V. Ex.a que empregue todos os esforços para que tal não se faça:
É preciso conservar esse território, que é reconhecidamente português e que nos querem tirar.
Aproveito esta ocasião para dizer a S. Ex.a quê a questão da pesca é das mais interessantes e merece especial cuidado. Os nopsos pescadores reclamam justiça e estou convencido de que S. Ex.a nessa questão garantirá aos portugueses o direito de pescar nas suas águas, não permitindo que estrangeiros venham tirar-nos o que é nosso.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vitorino Godinho): —Eiu resposta às observações do Sr. Eamos da Costa, tenho a pedir-lhe desculpa de não ter vindo há mais tempo ao Senado ouvir S. Ex.a
O que se passa com a aviação espanhola é um mero incidente da navegação
aérea, que não tem importância de maior; pode S. Ex.a estar descansado.
Com respeito à questão da fronteira de Mourão, tenho a dizer que uma parte da delimitação foi já sancionada em 26 de Fevereiro deste ano.
Tive ocasião de apresentar a vários parlamentares da região a planta da divisão que tinha sido feita e todos concordaram em que se tinha procedido equitativamente.
Com a segunda parte não se preocupe S. Ex.a porque as cruzes que lá andam a pôr não representam cemitério algum.
Pode S. Ex.a estar certo de que hão--de ser rigorosamente observados todos os instrumentos que existem e que mostram o nosso direito e aquilo que de justiça nos pertence.
A esse respeito posso dizer que os trabalhos provisórios que me foram apresentados não receberam a minha aprovação e mandei proceder a uma revisão desses trabalhos de maneira a dar-se ao país aquilo que eu julgo ser uma justa e inteira satisfação.
Quanto à' questão dá pesca, já ontem fiz aqui declarações categóricas.
Está reunida uma comissão de carácter internacional que tem por objectivo estudar a forma de evitar a repetição de incidentes de pesca. .
Não se trata de propor bases para um convénio. Os interesses do país serão absolutamente salvaguardados e, dentro deles, serão salvaguardados também os interesses da classe piscatória.
O orador não reviu.
O Sr. Ramos da Costa: — Agradeço as explicações que me deu o Sr. Ministro e estou certo que o seu patriotismo terá todo o cuidado em manter a dignidade e os interesses nacionais.
.O Sr. Presidente:—Em face dum ofício da Câmara dos Deputados, convoco o Congresso, em sessão conjunta, para amanhã às 17 horas.
A próxima sessão do Senado será no dia 15 com a mesma ordem do dia, e mais a eleição de urn vogal para o Conselho Colonial.
Está levantada a sessão.
Eram 19 horas.