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REPUBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

SESSO ILsT 11

EM 21 DE JANEIRO DE 1925

Presidência do Ex,mo Sr, António Xavier Correia Barreto

Luís Inocêncio Ramos Pereira

Secretários-os Ex,mos Srs.

Sumário.— Coma presença de 27 Srs. Fena: dores abriu a sessão.-

Leu-se a acta, que foi aprovada, e deu-se conta do expediente.

O Sr. Serra e Moura refere-se a carestia da vida, fazendo largas considerações e pedindo providências.

O Sr. Joaquim Crisóstomo protesta contra a ausência, do Sr. Ministro da Agricultura; refere--se à situação precária de alguns maçiistradoa judiciais em disparidade com o exagero de emolumentos dos escrivães, e trata da ausência de juizes e delegados nas ilhas.

O Sr. Costa Júnior alude à venda do ópio e seus derioados tratando pormenorizadamente do decreto n.° 10:315, que regulamentou a lei n.° 1:637.

A todos os Srs Senadores responde o Sr. Ministro da Justiça (Pedro de Castro).

O Sr. Augusto de Vasconcelos protesta contra a ausência do Governo no Senado,

Encerra-se a sessão.

Abertura da sessão às 10 horas e 20 minutos.

Presentes à chamada 28 Srs. Senadores.

Entraram durante a sessão 16.

faltaram 27.

Srs. /Senadorespresentes à sessão:

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos»

Álvaro António Bulhão Pato.

António da Costa Godinho do Amaral.

António Maria da Silva Barreto.

António de Medeiros Franco.

António Xavier Correia Barreto.

Manuel Pessanha Yaz das Neves

Aprígio Augusto Serra e Moura.

Artur Augusto da Costa.

Artur Octávio do Rego Chagas.

Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.

César Pró copio de Freitas.

Duarte Clodomir Patten de S ú Viana.

Ernesto Júlio Navarro.

Francisco José Pereira.

Francisco Vicente Ramos.

Herculano Jorge Galhardo.

João Manuel Pessanha Vaz das Neves.

Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.

Joaquim Pereira Gil do Matos.

Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.

José António da Costa Júnior.

José Duarte Dias de Andrade.

José Joaquim Fernandes Pontes.

José Joaquim Pereira Osório.

Luís Inocôncio Ramos Pereira.

Nicolau Mesquita.

Rodrigo Guerra Alvares Cabral.

Silvestre Falcão.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.

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Diário das Sessões do Senado

Frederico António Ferreira de S imas. João Carlos da Costa. João Catanho de Meneses. José Augusto de Sequeira. José Joaquim Fernandes de Almeida. Roberto da Cunha Baptista. Rodolfo Xavier da Silva. Tomás de Almeida Manuel cê Vilne-na (D).

Srs. Senadores que faltaram à sessão:

Aiiíbti Augusto Ramos do Miranda. António Alves de Oliveira Júnior. Augusto Casimiro Alves Monteiro. Augusto de Vera Cru/. César Justino de Lima Alves. Francisco Xavier Anacleto ca Silva. João ALpoim Borges do Canto. João Maria da Cunha Barbosa. João Trigo Motinho. Joaquim Manuel dos Santos Garcia. Joaquim Teixeira da Silva. Jorge Frederico Velez Careço. José Augusto Ribeiro de Maio. José Machado Serpa. José Mendes dos Reis. José Nepomuceno Fernandes Brás. Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Júlio Ernesto de Lima Duque. Luís Augusto de Aragão e Brito. Laís Augusto Simões de Almeida. Manuel Gaspar de Lemos. Pedro Virgolino Ferraz Chaves. Querubim, da Rocha Vale Guimarães. Raimundo Enes Meira. Ricardo Pais Gomes. Vasco Crispiniano da Silva. Vasco Gonçalves Marques. Vítor Hugo de Azevedo Co.itinho.

As 15 horas e 15 minutos o .Sr. Presidente marda proceder à chamada. Fez-se a chamada.

O Sr.. Presidente (às 15 horas e 20 minutos}:— Estão presentes 27 Srs. Senadores,,

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Leu-se.

O Sr. Presidente:—Está em discussão. Pausa.

O Sr. Presidente: — Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.

Vai ler-se o

Expediente

Oficio

Da Presidência do Ministério, comunicando que a lei que regula a promoção de tesoureiros da fazenda pública vai ser publicada no Diário do Governo.

Para. a Secretaria.

Requerimentos

De Guilherme de Sousa, Saúl Siiríões Sério, Francisco de Assunção Carreira, Amandlo Junqueiro, José Rodrigues e Manuel dos Santos Melo, pedindo para serem reconhecidos revolucionários civis, ao abrigo da lei n.° 1:691.

Para a comissão de petições.

Requeiro que, pelo Ministério da Instrução, me seja enviada, com^urgência, cópia dos relatórios ou comunicações que o fisca. do Governe junto do Teatro de S. Carlos- deve ter apresentado sobre as condiçÕ3s de funcionamento artístico da actual troupe de ópera cómica.

Igualmente, peço que me enviem o parecer formulado sobre as condições de coniôrto, limpeza e higiene do mesmo teatro, nas actuais circunstâncias, acusadas de muito precárias.

]s!o caso de não existir esse parecer, solicito a informação do subdelegado de saúde ou da Inspecção dos Teatros. — Pereira, OU.

Para a Secretaria a -fim de ser expedido .

Antes da ordem do dia .

O Sr. Serra e Moura: — Sr. Presidente: como da parte do Governo vejo apenas presente o Sr. Ministro da Justiça, que é uma das pessoas mais, ilustres e da maior respeitabilidade, pedia a atenção de S. Ex." para o seguinte:

Sr. Presidente: trata-se da carestia da vida.

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mal-estar, que se vai agravando cada vez mais.

Há dias li num jornal que tinha sido enviado um telegrama para Cezimbra, a fim de não serem enviados para Lisboa mais cabazes de peixe, para que o peixe não barateasse.

Isto ó uma cousa que chega a parecer impossível, pois numa altura em que todos nós reconhecemos que o peixe atingiu um preço absolutamente injustificável, não há sequer uma autoridade que imponha que aos assambarcadores, ou aos indivíduos que pretendem o agravamento da vida se lhes ponha um travão.

Lê-se quási todos os dias nos jornais que toneladas e toneladas de peixe são lançadas ao mar, sem que haja uma autoridade que impeça esse procedimento criminoso.

Sr. Presidente: agora vem agravar ainda mais a vida em Lisboa o preço da carne, pois, quando os vapores vindos da Argentina estão descarregando umas trezentas a quatrocentas cabeças de gado bovino, aparece a notícia de que a carne aumentou mais 1$ em quilograma; a hortaliça neste tempo, que é aquele em que as hortas mais produzem, vai atingindo um preço absolutamente extraordinário, e o Governo, Sr. Presidente, parece adormecido, parece esquecido daqueles que labutam dia a dia pela vida, principalmente neste momento em que uma crise de trabalho avassala todas as classes.

E para este facto, e sem mais comentários, que peço a atenção do Governo, e peço a V. Ex.a, Sr. Ministro da Justiça, se digne transmitir este meu pedido ao Sr. Presidente do Ministério, no sentido .de S. Ex.a pôr em prática, desde já, as medidas que nos anunciou aqui, e que anunciou a todo o País, de modo a acabar este estado lamentável em que vivemos.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Pedro de Castro): — Ouvi com toda a atenção as considerações feitas pelo ilustre Senador Sr. Serra e Moura, e prometo a S. Ex.a que transmitirei ao Sr. Presidente do Ministério e ao Sr. Ministro da Agricultura as considerações que fez sobre a carestia da vida.

No emtanto, peço licença para rebater algumas palavras que S. Ex.a proferiu.

O Governo tem procurado por todos os meios ao seu alcance fazer alguma cousa nesse sentido, e assim já conseguiu uma pequena baixa no pão, assim como em alguns géneros de mercearia. Pelo que respeita ao peixe, devo dizer que já se procede por forma a que as descargas do peixe não dêem lugar a que se atire Tejo fora às toneladas. O peixe já hoje abastece o mercado.

Como, porém, tal assunto não corre pela minha pasta, levarei ao conhecimento do Sr. Presidente do Ministério e do Sr. Ministro da Agricultura as considerações do ilustre Senador.

Tenho dito.

O Sr. Joaquim Crisóstomo (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejava que V. Ex.a me informasse se, tendo sido convidados a comparecerem à sessão os Srs. Ministros da Agricultura e do Comércio, S. Ex.as deixarão de comparecer nesta casa do Parlamento.

O Sr. Presidente : — Não o posso dizer a S. Ex.a

Lembro-me de terem sido avisados os Srs. Ministros da Agricultura e Finanças; o do Comércio, não.

S. Ex.a deseja usar da palavra?

»

O Sr. Joaquim Crisóstomo : — Satisfazer-me-ia plenamente com a presença do Sr. Ministro da Agricultura. Não me parece muito parlamentar esta atitude do Sr. Ministro.

..Sabendo S. Ex.a que alguns Srs. Senadores o desejam ouvir acerca do magno problema da carestia da vida e sobre outros assuntos, que correm pela sua pasta, não me parece, repito, razoável que S. Ex.a tam teimosamente se recuse a comparecer perante o Senado.

A mim, quere-me parecer que este' facto não tem precedentes na história parlamentar.

Todos os homens que têm feito parte do Poder Executivo, sempre que algum Parlamentar, seja Deputado ou Senador, solicitou a sua comparência, têm correspondido ao convite que lhe é feito, justificando a sua ausência • se porventura não podem comparecer.

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administração pública tam importantes e dê tamanha gravidade, que prendam a atenção dcs Srs. Ministros, e os obriguem a trabalhar nos seus gabinetes, impedindo-os de comparecer às sessões. Mas, nesso caso, esses Srs. Ministros :levem usar da delicadeza de o comunicar aos Presidentes das dnas Câmaras.

Está ocupando a pasta da Agricultara uma pessoa que me merece a maior simpatia.

O S:1. Ezequiel de Campos é um homem de valor afirmado e comprovado e, por conseguinte, mais mo ofende e preocupa o S3TL procedimento.

Não se: justificar à priori a razão como S. Ex.a procede, quais os seus pensamentos a respeito da carestia dt. vida. O facto é que tal problema é agravado com a ínlta de trabalho, o que lha dá uma importância muito superior àquela que tinha há seis meses, porque aqueles que trabalhavam sabiam que podiam conseguir elevar os salários para poderem fazer face às suas despesas. Hoje há dificuldade, ou absoluta impossibilidade de adquirir os meios para tal fim. Portanto, o problema da carestia da vida é agravado pelo que exponho.

Diz-se cue o Governo do Sr. José Do-mingues dos Santos tem f. seu favor a opinião pública, porque, sendo da esquerda, está integrado com as justas aspira-"ções do povo. Talvez assim se~a em teoria^, filosoficamente, metafisicamente, mas nr. realidade não o é.

ó Que tem feito o Governo para rosol-vor os dois magnos problemas da falia de trabalho e carestia da vida?

Em matéria de trabalho o Governo ainda não procurou um úcico níeio de atender à situação dos desemprega dês. Parece que apenas forneceu umas 7õ guias a operários que não tinham onde empregar a sua actividade.

^ Será isto resolver o problema da falta de trabalho?

Está pendente de discussão numa das Secções um projecto tendente a abrir um crédito £- favor da continuação das obras 'do Manlcómio Bombarda.

fíPor? será com 4:000 contos que se vai resolver um problema de tal importância ?

Sr. Presidente: V. Ex.a sabe melhor do que eu que o Governo não tem ener-

gia, nem iniciativa para resolver ôste gravíssimo problema.

Era para desejar que os Srs. Ministros, cada um pela sua respectiva pasta, porque o problema da falta de trabalho não se resolve por uma única pasta, é um problema de conjunto que diz respeito tanto à pasta do Comércio, como à do Trabalho, como à das Finanças, procura-sem resolver o problema dos desempregados, o que seria fácil num país em que não há grande massa de operários como no estrangeiro que, duma hora para a outra, se vêem a braços com a fome e com a miséria. O nosso operariado é es-sencialmente agrícola, e essa é a faculdade essencial e fundamental para se conseguir a solução do problema; basta para isso desenvolver ~a produção agrícola aproveitando todas as outras fun-' coes, que lhe estão anexas, e o problema transforma-se-ia completam ente.

Diz-se que em um projecto apresentado pelo Sr. Ministro da Agricultura se facilita a solução desse problema.

Se porventura as medidas que o Sr. Ministro da Agricultura concebeu numa hora feliz da sua vida, mais empíricas do cue reais, mais imaginárias o fictícias do cue concretas, pudessem ter execução, era num país diverso do nosso, com condições diversas daquelas que possuímos, porque, no estado do nosso povo, com os seus usos, costumes e tradições, jamais se poderá pôr em execução o pensamento do Sr. Ministro da Agricultura, jamais conseguiremos obter em poucos dias. me-sés ou anos o que S. Èx.a imagina.

Não quero, dizer com isto que o problema se agravasse, mas o que pos=so garantir é que ele estr.cionaria precisamente na mesma.

Não é de uma hora para outra que se consegue convencer o nosso povo, perfeitamente arreigado às suas tradições de emigrar paro o Brasil e para a'América do Norte, a que vá estabelecer-se nas nossas regiões alentejanas, cultivar extensões mais ou menos largas de terrenos e que viverá aí com um certo bem-estar.

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gente para o planalto de Angola, onde tanto nos convinha lazer a colonização. Apenas ultimamente o Sr. Norton de Matos conseguiu contratar alguns operários, mas esse recratamentOj essencialmente infeliz, pouco ou nenhum resultado deu para a colonização.

Pode A primeira vista parecer que não

'" tem analogia a nossa situação de África e a nossa.situação alentejana, mas o certo ó que não se conseguem resultados ne-nhuus, nem um África nem no Aleutejo. Mas, Sr. Presidente, parece que estou perdendo o meu tempo, porque o Sr. Ministro não comparece. O meu propósito era prolongar tanto quanto possível as minhas considerações, convencido de que íS. Ex.a não deixaria de aparecer na sessão.

.- ^7ejo, porém, que são inúteis todos os meus propósitos, e por isso vou aproveitar o ensejo de estar presente o Sr. Mi-

• nistro da Justiça para expor a S. Ex.a alguns assuntos, que necessitam a sua atenção.

. Há cerca de tros anos que não é possível manter nas suas respectivas comarcas açoreanas magistrados judiciais e do Ministério Público. Nesse número posso citar as comarcas do meu distrito, que são a da Ilha das Flores e a da Ilha do Pico, em que a administração da justiça está confiada a leigos. Mas, Sr. Presidente, ainda pior do que leigos. Pessoas que não primam por cumprir o seu dever, por prestigiar e honrar, embora simplesmente sob o ponto de vista moral (já uão quero que o fizessem sob o ponto de vista técnico, porque lhe faltam os necessários conhecimentos); do que resulta um profundo descrédito para a classe a que me honro de pertencer, assim como o Sr. Ministro da Justiça.

Sei que S. Ex.a é um excelente Procurador da Eepública no Porto, e que não perde a ocasião de meter na disciplina os que lhe estão subordinados, e por isso merece o meu respeito e a minha admiração, mas esse critério que

• S. Ex.a adopta para os seus subordinados do Porto queria eu ver agora aplicado também aos demais.

Periodicamente, a propósito de cada despacho, são colocados nas Ilhas do Pico o .das Flores juizes e delegados.

Eles deixam aproximadamente esgotar

o prazo para tomarem posse, 60 dias, e vêm pedir uma prorrogação.

Pois quási todos os Srs. Ministros dá Justiça de há dois ou três anos têm concedido essa prorrogação.

Há todo o propósito de demorar a partida dos funcionários judiciais para aqui serem colocados.

Assim, um funcionário nomeado em Janeiro, que devia ir para ali por todo o mês de Março, poucos dias antes pede prorrogação do praze.

E-lhi; concedida, e depois tica por cá.

Nomeia-se o que lhe há-de suceder, mas com este acontece o mesmo. ,

Daqui resulta que comarcas há, como a das Flores, que está entregue a uma família, que, como portuguesa que é, não procede com absoluta imparcialidade e só deixa influenciar pelas suas tendências políticas.

Espero que o Sr. Ministro da Justiça acabe com tal situação.

E preciso que se não prorroguem mais os prazos.

Há tempos era costume dizer-se que os Srs. Ministros não tinham autoridade moral bastante para obrigar um funcionário a ir para os Açores, porque o Estado abonava-lhes para pnssagein uns 100$ ou 2(jQfl>, quando a viagem custava muito mais do que isto»

Mas hoje esta situação mudou; vão sem despender um único escudo do seu bolso, recebem ali mais ííõ por cento dos vencimentos que os do continente e o tempo das suas funções tem para a contagem mais 25 por cento.

São vantagens de apreciar.

Os Açores não são terras más, nem para causarem horror.

São terras civilizadas como as do continente, e talvez, em comparação com algumas, um pouco superiores.

Mas quem não quere para ali ir, renuncia às suas funções e pede a sua exoneração, porque a carreira da magistratura judicial não é uma carreira de gozo e de alegria; ela deve ser desempenhada como um verdadeiro sacerdócio.

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fre, como eu tenho sofrido, verdadeirss privações.

Podia deixar de me alongar em considerações, porque estou convencido < ue os argumentos por mina aduzidos calam no ânimo do Sr. Ministro da Justiça.

Mas; Sr. Presidente, não fax mal repe-, tir estas observações para qua S. Es/" se abroquele e assim possa resistir principalmente à acjão do meio em ene viemos.

Em Portugal é sempre difícil exercerem-se funções públicas, sem que a cada hora e ti cada momento se esteja rodeado de pedidos e muitas vezes — ^orque o homem é fraco e a natureza nem sempre pode resistir— quando vemo& cue aãc há prejuízo de terceiro, temos de condescender.

Se, porventura, o Sr. Ministro já assim pensa, ;;stas minhas considerações servirão p ar r. tornar mais rija, ziiais ícrte a sua têmpera dê não transigir com pedidos da iiatLreza daqueles que aponto:. As consequências são prejudiciais para a classe da magistratura, como são lambem funestas pi::-» os povos das terras oace os magistrados, em vez de exercerem a& suas funções, andam gozando do prazo para tomarem posse do seu lugar e envidam esforços para mais prorrogações.

Voa í gora chamar a ate:ijão do Sr. Ministro õa Justiça para um assunto qae diz respeito à tabela dos emolumentos dos salários ;udiciais.

Esse diploma foi publicado en resultado dume, autorização parlamentar.

Era eatao Ministro da Justiça o nosso ilustro colega Sr. Catanho d3 Mer.eses.

Pelas informações que tenho, se: que S. Ex.a dedicou o melhor da sua inteligência o da sua atenção a esse diploma, no propósito de publicar uma obra tão perfeita quanto possível.

Mas COÍLO num diploma da natureza desta tabela, tam vasta, tam completa, ó sempre fácil escapar qualquer erro on qualquer doutrina menos rigorosa, vou expor dois pontos 'com os quais estou oir manitestii e absoluta discordância.

Um vtíx consignado no í-rtigo 17.°, n.° 1.°, alínea ò), e diz respeito às rubricas nos livros de escrituração das sociedades comerciais.

Até a vigência da tabela, os livros dos comerciantes e sociedades eram rubricados, afora Lisboa e Porto, pelos juizes

das respectivas comarcas, sem se exigir qualquer documentação relativa à entidade que pretendia legalizar os seus livros.

Agora exige-se a todos a apresentação de uma certidão que mostre que estão registados no Tribunal do Comércio.

Não entro na apreciação da conveniência, ou inconveniência desta medida e até me inclino no sentido de a achar justa; mas o que contesto ao Governo é a competência para a publicar num diploma desta natureza.

Tive o cuidado de colaborar na lei n.° 1:631, que autorizou o Governo a reformar a tabela.

Passaram-se sessões sobre sessões, nesta casa do Parlamento, em que todos nós demos o melhor da nossa inteligência o actividade a esse trabalho a fim de que ficasse tam perfeito, quanto fosse possível. .

IsTão encontrei ali qualquer termo, que pudesso autorizar o Governo a modificar a doutrina do Código Comercial que obriga as sociedades comerciais, assim como os comerciantes, a terem unia escrituração legalizada.

O Sr. Catanho de Meneses (interrompendo)".—V. Ex.a encontra no Código Comercial uma disposição em virtude da qual as sociedades não podem ser consideradas como tais em relação a terceiros, se não forem registadas. Daí resulta a necessiiade de se lhes exigir, quando pedem a rubrica nos seus livros, que mostrem a sua legitimidade com a certidão do registo,

O Orador: — Discordo de S. Ex.a, o que não me impede de aceitar as suas considerações.

Mas passemos a outro ponto.

Km princípio foi estabelecido na lei n.° 1:631 que os emolumentos dos funcionários seriam duplicados.

Onde na tabela de 1922 se fixava os emolumentos de l escudo, por exemplo, na tabela futura vigoraria um emolumento de dois escudos, isto é claro para os oficiais de justiça, porqae para os magistrados simplesmente foi aumentado na parte respeitante ao funcionário e não na parte respeitante ao Estado.'

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que fixa o emolumento que lhes compete pelo mapa de partilhas.

Na tabela de 1922, o escrivão tinha pelo mapa de partilhas um emolumento igual ao juiz. Foi uma melhoria considerável em relação à tabela de 1896.

Esta melhoria porém não a acho injusta, porque se um juiz tem de estudar um inventário, em algumas hipóteses, e em outras o seu trabalho é muito insignificante porque se limita a mandar verificar a partilha pela forma como indica o curador dos órfãos ou qualquer interessado.

Por isso não me impressionou esta melhoria.

Mas nós vemos agora uma anomalia considerável na nova tabela. E que o escrivão já não tem tanto como o que compete ao juiz, mas sim o dobro, o que ó sem dúvida um exagero considerável, e que não podia estar na mente nem no espírito do legislador. Foi decerto um lapso.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Pedro de Castro): — Ouvi com toda a atenção o Sr. Joaquim Crisóstomo, e quanto ao facto de não estar presente o Sr. Ministro da Agricultura devo dizer que isso é devido a motivos de força maior e nunca por desconsideração, ou por falta de respeito para com esta casa do Parlamento.

Levarei ao conhecimento de S. Ex.a as considerações quê acaba de fazer o Sr. Senador que falou e estou certo de que o Sr. Ministro da Agricultura virá aqui dar as necessárias explicações.

Relativamente aos magistrados, que são colocados nas ilhas e ao facto de, por vezes, serem prorrogados os prazos para tomarem posse dos seus cargos, devo dizer que só ainda lavrei dois despachos nesse sentido, e dei-os não por sugestão de qualquer pessoa, mas porque aos requerimentos estavam juntos atestados comprovativos de doença, que os impedia de embarcar.

O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo):— Esses atestados são graciosos. Eu se estivesse no lugar de S. Ex.a mandava inspeccionar esses magistrados por médicos do meu Ministério.

O Orador : — S. Ex.a está a lançar uma suspeita. '

Devo declarar que não tive, nem tenho motivos para lançar suspeíções sobre os signatários desses atestados, e como a lei me permite prorrogar o prazo para esses magistrados embarcarem, prorroguei-o.

Relativamente às tabelas, o Sr. Cata-nho de Meneses deu algumas explicações com as quais concordo inteiramente, e até acrescentarei o seguinte. E que S." Ex.a exigindo a certidão de registo da conservatória não fez mais que regulamentar uma parte do Código. Comercial, estando autorizado por lei a fazê-lo.

Referiu-se S. Ex.a à questão de os escrivães receberem quatro vezes mais.

O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo):— Mas V. Ex.a pode rectificar a tabela, pois já foram feitas duas rectifica-

O Sr. Medeiros Franco:—Mas essas rectificações foram feitas a erros que saíram publicados. '

Troç,am-se explicações entre os Srs. Medeiros franco, Catanko de Meneses, Joaquim Crisóstomo e Ministro da Justiça.

O Orador:—Devo dizer ao Sr. Joaquim Crisóstomo que não posso-fazer essa rectificação, porque não fui eu o Ministro que usou da autorização; além disso, como S. Ex.a sabe, nos termos da lei não se pode usar segunda vez de uma autorização.

O Sr. Catanho de Meneses (interrompendo}-.— V. Ex.a, Sr. Joaquim Crisóstomo, sabe tam bem como eu que as leis são promulgadas pelo Sr. Presidente da República, e uma rectificação só pode dar-se quando haja qualquer diferença entre o original assinado pelo Sr. Presidente da República e a publicação. Desde que isso não se dê, carece uma promulgação e portanto é necessário uma nova lei.

O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Isso é verdade, mas a prática não é essa.

O Orador: — V. Ex.n que traduza então a sua idea num projecto, e estará, tiido remediado.

Tenho dito.

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O Sr. Costa Júnior: — Sr. Presidente: pedi a palavra a fim de .chamar a atenção do Gí-overno para o decreto n.° 10:335 que regulamenta a lei n.° 1:687.

A lei 3.° 1:687 é aquela q-ao o Parlamento votou em conformidade com uma deliberação da Sociedade das Nações, sobre o ó;:iot cocaína, morfina e seus compostos.

O regulamento desta lei segue de perto o que está feito nas outras Nações, mas lia uma parte em que diverge, tem uma disposição que não existe em mais nenhum, qual seja a obrigação imposta ao farmacêutico de ter um livro especial em que tem de inscrever os medicamentos receitado? pelo médico, que contenham qualquer desses produtos, ou dos seus derivados, c mais ainda o nome e morada da pessoa para quem é receitado o medicamento.

Ora o doente pode dar ao médico ura liome e morada errados, e quando a fiscalização vai verificar e não encontra o nome e morada consignados nesse livro fica imediatamente o farmacêutico .sob a alçada da lei.

<íE que='que' de='de' cocaína='cocaína' rigor='rigor' fazer='fazer' xarope='xarope' tanto='tanto' medicamentos='medicamentos' por='por' para='para' tomar='tomar' doente='doente' até='até' um='um' mal='mal' sem='sem' como='como' inteiro='inteiro' e='e' exemplo='exemplo' preciso='preciso' lhe='lhe' frasco='frasco' o='o' p='p' tolu='tolu' será='será' podo='podo'>

E o resultado é o seguinte: como a lei não obriga os farmacêuticos a ter esses produtos, eles recusam-se a "aviar essas receitas que lhes podem causar vexames o multas que vão até 1.000$ e ;mais.

As fórmulas medicinais em que entram o ópio, a cocaína e a morfina são hoje às centenas, desde o simples xarope até as injecções, pílulas e punções/ 3 essa medida vai dar lugar a sérias complicc.çòes.

Eu, como médico, declaro dosde j á que nunca a um doente meu pregantarei onde mora, porque guardo o meu segredo profissional, e mesmo, como todos sa« bem, até o médico num atestado não ó obrigado a dizer do que sofre o doente, se esto não quiser.

Agora suponham V. Ex.as que há um doente atacado duma doença que não quere que se saiba, e o médico receita-lhe, por exemplo, 5 ou 6 ampolas d 3 Pantopou,

que se empregam muito para as dores, preguntando-lhe ao mesmo tempo o nome e a morada.

Vai depois a fiscalização a essa casa e pregunta: <_:onde p='p' emprega='emprega' ó='ó' qae='qae' medicamento='medicamento' _='_' esse='esse'>

Essa fiscalização pode ir para público dizer qno o senhor fulano, ou a. senhora fulana tem esta ou aquela doença.

Entendo que é preciso cuidado com os formulários, quo os médicos receitam onde entre a cocaína, a morfina ou o ópio, porque podem produzir envenenamentos ; mas, dosde que a receita tenha o nome do médico a responsabilidade é dele, não é preciso morada, nem nome do doente.

Em Portugal h'á sempre o costumo de ir além do que devia ser. Sei, porém, que a pessoa encarregada destes serviços é competentíssima.

Estou convencido de que esse regulamento foi feito por um empregado da repartição na ocasião em que o Sr. Dr. Eicardo Jorge se encontrava no estrangeiro representando o nosso País, em" qualquer missão. Por isso tenho a certeza de que logo que chegue se chamarmos a atenção de S. Ex.a para este caso, e será o primeiro a entender que o regulamento deve ser modificado.

Charno, por isso, a atenção de S. Ex.a para este cas*o, pedindo para transmitir ao Sr. Ministro do Trabalho as minhas considerações a fim de que seja modificado o regulamento na parte que julgo vexatória, tanto para os médicos como para os farmacêuticos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Pedro de Castro): —Pedi a palavra para dizor ao ilustre Senador Sr. Costa Júnior que transmitirei ao Sr. Ministro do Trabalho as considerações que acaba de fazer, certo de que as tomará na devida conta,

O Sr. Costa Júnior: — Muito obrigado a S. Kx.a

O Sr. Augusto de Vasconcelos: —Sr.

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Cessão dê 21 de Janeiro de 1920

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A presença de S.- Ex.a nesta Câmara é-nos sumamente agradável porque S. Ex.a é possuidor duma primorosa educação, e o só temos que nos louvar pelo sua presença; mas como o Sr. Pedro Costa, infelizmente, não pode responder pelas diferentes pastas, não posso deixar de protestar contra este sistema seguido pelo Governo, do dizer ao Sr. Ministro da Justiça: «faz favor de ir ao Senado e aturo lá aqueles massadores». Ora nós, Sr. Presidente, ó que não estamos dispostos a aturar esta situação,

Se o Sr. Presidente do Ministério e os

seus colegas do Governo não estão resolvidos a comparecer nesta Câmara, nós estamos dispostos a fazer-lhe sentir que não toleramos esta atropelo dos nossos direitos. Tenho dito.

O Sr. Presidente': — A próxima sessão é na sexta-feira, à hora regimental, sendo a ordem do dia o projecto de lei n.° 798.

Está encerrada a sessão, Eram-16 horas e 32 minutou.

O REDACTOR—Albano da Cunha*

Discurso proferido oa sessão ii.° 5, em II e i2 de Dezembro de 1924, e agora intejjfolmeiite pubUd

O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Pré* sidento: a hora' vai adiantada e eu não quero de modo nenhum prolongar e dilatar esto debate político. Sobretudo depois de ter usado da palavra por este lado da Câmara o ilustre leader Q meu pre'.ado amigo Sr. D. Tomás deVilhena, escusado seria pronunciar-me de qualquer modo a respeito da declaração ministerial e apresentação do Governo.

Mas há deveres de tal ordem e de tal maneira gratos ao meu coração que me inibem de ficar silencioso ao apresentar--se o Governo, fazendo parte dele um velho amigo meu e querido • condiscípulo, o Sr. João de Deus Ramos.

Essa circunstância, sobretudo, é que me demoveu do propósito em que estava de não usar da palavra. Tal encargo ti-nho ficado, e muito bem, do Sr. D. Tomás de Vilheua, nosso leader e pessoa que todo este lado da Câmara respeita e admira, pelo seu brio, pelo seu carácter, pela sua inteligência, predicados que aliás todo o Senado lhe reconhece. Também é certo, que algumas das considerações que aqui foram produzidas pelo ilustre Senador democrático, o Sr. Herculano Galhardo, me levam a usar da palavra, embora reduzindo o mais possível o que tinha a dizer.

Além disso, desejaria também que o

Sr. Presidente do Ministério respondesse concretamente e precisamente a algumas preguntas sobre pontos que sobremaneira interessam e que eu não vejo bem definidas na brilhantíssima... declaração ministerial, que já aqui foi considerada, ainda que com uma pontinha de ironia, uma verdadeira peça literária, pelo nosso ilustre colega Sr j Ferraz Chaves. Peça literária não sei se será, e não admira que o soja se atentarmos em que faz parte do Governo o poeta João de Barros...

O que ela é, sem dúvida nenhuma, é uma verdadeira peça pregada ao Pais pelo Sr. José Domingues. Muita parra e pouca uva. Muitas palavras, muitas promessas, mas muito poucas afirmações concretas e de possível realização imediata.

Sr. Presidente: anjtes porém de principiar a fazer as minhas considerações desejo apresentar ao Sr. João de Deus Ra-mos os meus cumprimentos, que não traduzem de maneira nenhuma uma felicitação pelo. encargo que tomou, mas que significam, sem dúvida, uma afirmação de muita estima e da muita, consideração o apreço em que tenho o seu espírito o o seu carácter.

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bela camaradagem, afirmando-se um espírito lúcido, um carácter leal, um coração bondoso, não traindo nunca os deveres de lealdade e solidariedade que só impõem co:no o melhor brasão a. honrar por todos os académicos.

•ODo mesmo modo S. Ex.a t?m afirmado pela vida fora as nobres qualidades que revelou em estudante, entregando-se do alma e coração, com pertinácia e desvelado carinho, a uma obra que é iniciativa sua e que, sendo de incontestável utilidade para o país, ó extremamente simpática a todos os respeitos.

Refiro-me aos Jardins-Escclas João de Deus, modelos de graça, de 'delicadeza e de ternura pela educação infantil.

Ainda ia poucos dias, a propósito de um projecto apresentado ne3~a Câmara pelo Sr. Gaspar de Lemos, eu tive ocasião de me pronunciar sobre o assunto na reunião de secção e de me referir ao Sr. João de Deus Ramos corn palavras de admiração e respeito pelo seu esforço em prol dessa sua tam interessante iniciativa.

É assim, sob .esse ponto de vista, que eu aprecio a individualidade do Sr. João de Deus Ramos e muito o considero.

S. Ex.a já no nosso tempo de Coimbra se dedicava, com fervor a esse belo apostolado, ao mesmo tempo que se empenhava na difusão do método de leitura de João de Deus, em homenagem Aquele que muito respeito e muita baiidace merece ao seu coração de filho e que, sem dúvida nenhuma, jamais esquecerá também na memória de todos os portugua sés, porque foi um cos mais belos espíritos da uossa terra, e como grande poeta aquele que melhor soube encarnar o lirismo nacional e compreender a alma deste povo. cheia de sonho, de doçura, de simplicidade.

Aí ainda, na velha cidade universitária, o Dr. João de Deus' Ramos trocava os ócios e os prazeres da sua vida asaié-mica, a que naturalmente leve, o ardsr da mocidade, por um trabalho obstinado e profícuo de incontestável utilidade pública e de enternecedora homenagem à memória de seu Pai.

Procurava espalhar pelo País o uso do método de leitura criado e imaginado por João de Deus, explicando-o e praticai:.do-o sempre cue as circunstâncias lho permitiam, contribuindo assim para o desen-

volvimento da instrução, o que o torna credor da gratidão do País.

O método João de Deus é possível que não corresponda hoje às exigências da moderna sciência pedagógica. Ouço aos técnicos essa afirmação. Mas o que é certo é que não deixa por isso de ser um útil instrumento de combate ao analfabetismo e uma obra puramente nacional que precisaria de ser protegida e amparada, ao menos pelo muito respeito que devemos à memória do grande lírico.

O Dr. João de Deus Ramos, para a difusão do método de seu Pai, criou as escolas móveis e os jardins-escolas, tam graciosos, tam gentis, tam cheios de encanto, em toda a fresca e florida simplicidade da elegante arquitectura de Raul Lino, onde as criancinhas recebem os primeiros contactos com a luz do espírito e a sua alma desabrocha para os primeiros passos na vida.

Assisti à inauguração do primeiro desses jardins-escolas, eín Coimbra, e ali tive ocasião de ver o entusiasmo que inundava a alma de João de Deus Ramos. Muito poucos existem, desses jardins-escolas, no País, o que ó para lamentar, atenta a utilidade e a beleza desses interessantes estabelecimentos de instrução. O que representou de esforço,"de dedicação, de tenacidade, a fundação em Coimbra desse jardim-escola João de Deus ó fácil de avaliar num País de tam frouxa iniciativa como o nosso.

E RO nos lembrarmos de que João de Deus Ramos era um estudante, ainda bastante moço, mais é digno de realce e de louvor pelo empreendimento a que meteu hombros com ta.nto êxito.

Esses jardins-escolas deviam multiplicar-se ein Portugal, pois, representando uma iniciativa genuinamente portuguesa, são uma obra duplamente simpática e patriótica, pelo nome que evocam de João de Deus e pelos magníficos resultados práticos que podem dar. Mas de cousas mínimas não cura o pretor.. . O Estado esquece essas instituições, como esqueceu já também o próprio João de Deus. Sempre assim foi na nossa terra.

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fervor, desde a sua mocidade, que eu tenho apreciado S. Ex.n e me acostumei a admirá-lo desde os tempos de Coimbra.

Mas, como Ministro, santo Deus, isso .nunca.

Kstá absolutamente deslocado nesse lugar e, para felicidade sua, convenço-me bem do que curta será a sua passagem pelas bancadas do Poder, como igualmente o foi da outra vez quando S. Ex.a sobraçou a pasta da Instrução Pública.

Dentro em breve ir-se há embora do Ministério, aborrecido com tudo e com todos e mais uma vez convencido de que ó inútil toda a boa vontade o bom desojo de servir o País perante o imprevisto e a constante intriga dos bastidores da política. .

O carácter do Sr. João de Deus liamos .não se compadece com as tricas partidárias, nem com as pugnas de galináceos entre «bonzos» e «canhotos»... que lhe tolherão por completo a iniciativa no que de interessante e útil'poderia fazer dentro do seu Ministério.

Ir-se-há embora dentro eui breve, embora tenha do ;deixar ainda por algum, tempo no Poder o Sr. José Domingues dos Santos.

Aí fica o vaticínio, que é fácil de fazer. Para isso basta , atentar em que o Dr. João de Deus Ramos, sendo republicano de sempre, podia ter sido muita cousa já neste País e nesta República, na sua grande generalidade do pigmeus querendo passar por grandes homens.

Podia ter-se cumulado já, a 14 anos de regime redentor... de misérias para tanto revolucionário civil e dedicado defensor, de grossas benesses, que a cada passo o Estado republicano despeja no regaço-dos seus filhos dilectos.

João de Deus Ramos nem sequer arranjou uni banco para se sentar .à lauta mesa do Orçamento.

Tem sido sempre um homem modesto, de simples aspirações e com uma instintiva repugnância pelas cousas da política. Apenas foi Ministro uma vez para não aquecer o lugar como por acaso tornou agora a sê-Io para voltar, dentro de pouco tempo, para a tranquilidade da sua casa e para os seus habituais labores em que mais útil pode ser ao País.

São esses, pelo menos, os votos que

faço cm atenção à velha amizade e estima que tributo ao meu antigo condiscípulo.

Vejamos agora qual é a situação do (íovôrno perante o proclamado apoio da maioria.

A esse respeito algumas considerações me sugere o discurso do Sr. ilerculano Gralhardo, que levou duas sessões a dizer que decididamente ali estava para apoiar o Governo e com um apoio leal, franco <_ p='p' sincero.='sincero.'>

Tanta insistência do ilustre Senador da maioria, deve "certamente atribuir-se ao receio em que está de que não lhe tomem tais afirmações muito ao pé da letra . . .

Realmente nunca vi em outras situações ministeriais anteriores, e igualmente organizadas com elementos do Partido Democrático, tam clangorosa dedicação como a que agora o Sr. Galhardo oferece a .este Governo.

É caso para. fazer desconfiar o Sr. Presidente do Ministério. . .

Se S. Ex.a conta caminhar com o auxílio de tal. muleta, está .bem. servido.

Em breve irá ao chão.

Não esqueça o Sr. Presidente do Ministério que logo no início do seu discurso o Sr. Herculano Galhardo íoi dizendo que o -Governo não ora do seu Partido, mas sim do bloco, como querendo-significar que o programa ministerial, afinal, não é o. do Partido Republicano Português e, não o sendo, tem o ilustre Senador os seus movimentos livres, não tendo compromissos a respeitar e não sendo, portanto, obrigado a dar-lhe aquele «incondicional apoio» a que se presta sempre uma sólida e compacta maioria.

Deve ainda lembrar-se o Sr. José Domingues dos Santos do que o seu t dedicado» correligionário, segundo as suas próprias palavras, «se descolou» abinitio do encargo de defender e apoiar certas passagens e afirmações da declaração, ministerial, o que é,, sem dúvida, a porta de saída para uma boa dose de pancadaria., quando seja oportuna.

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inscrevendo no «passivo» toda a responsabilidade das grandes realizações económicas e financeiras que o Ministério se propõe fazer — estradas, caminhos de ferro, irrigação, aproveitamentos hidráulicos, divisão da propriedade inculta, planos coloniais, tratados de comércio, etc., etc., ©te. ... e anotando apenas no «activo». . . a pcesia do Sr. Ministro dos Estrangeiros.

Realmente o Sr. Galhardo tem razão. Aquela peça literária, que a declaração ministerial, invulgar sem dúvida neste género de literatura, é com certeza obra de poeta.

Ali, vé-se logo, anda o dedo de Sr. João de Barros, que já nos maus tempos de Coimbra se entregava, e com êxito, ao convívio das musas.

Para de tal se ficar convencido, basta ler aquele «luminoso» trecho de entrada da famosa declaração, quando se fak. em. restabelecer o equilíbrio:

«O das classes, melhorando as condições de vida às medianas e pobres; o das profissões, devendo crescer as produtivas e deminuir as onerosas ou especuladoras; o das terras aráveis, corrigindo-se os extremos da propriedade excessiva e insuficiente; o das próprias ideas, devendo triunfar as de coesão, de solidariedade e de moral superior, decorrentes da períei-ta compreensão duma finalidade comum».

i Que belo cântico de harmonia celestial!

j E digam lá que os poetas se se não entendem com a política!

O Governo vai longe com a ajuda do Sr. João de Barros e o apoio do Sr. Her-culano Galhardo. Sobretudo com a apoio deste ilustre Senador.

A amizade do Sr. Galhardo ao Governo faz-me lembrar aquela desinteressada e sincera amizade que serviu de tema a uma popular peça de teatro, onde o nosso Chaby tem um dos seus mais notáveis trabalhos de interpretação.

A peça tem um título sugestivo que não reproduzo para não melindrar o Sr. Galhardo.

O principal personagem, que o CLaby soberbameníe encarnava, era duma pequena terra da província muito conhecida pela tradicional manufactura das suas

rendas e pelo monopólio de certa classe de «amigos» . . . que tanto a têm celebri-zado.

Tinha ele aqui em Lisboa um compadre e amigo a quem queria muito e tanto que lhe propôs um negócio da China — dar-lhe marcos, de que estava cheio, e que estando baixos de valor tinham de subir, e receber em ^troca libras, de que estava falto, e que, estando altas de valor v teriam de baixar.

E- claro, dizia o tal amigo de. . . que em tal negócio só ele perdia e mais ninguém, porque, desfazendo-se de moeda que devia valorizar-se, ficava em troca com outra, cuja desvalorização tinha de ser um facto, de futuro.

Pois o Sr. Galhardo é tam amigo do Governo comp o tal amigo e era do compadre de Lisboa.

Sr. Presidente: analisando-se a declaração ministerial fica-se com a impressão de que o Sr. José Domingues dos Santos já não ó bem aquele fogoso esquerdista que tomou sobre si o encargo de reformar a sociedade política e económica, como prometeu lazer à ala extremista dos correligionários de que se proclamou o chefe.

Vê-se que as responsabilidades do Poder já atenuaram bastante os primeiros impulsos do seu radicalismo e que as lições dos outros povos, da Inglaterra cmn a queda do trabalhista Macdonald e da França com a nova atitude de Herriot perante as ameaças bolchevistas, não deixaram de lhe ser úteis.

Há pontos da sua declaração ein que se acena, sem dúvida, à fácil popularidade das massas incultas e revolucionárias, mas outros aí se encontram que não repugnam inteiramente à consciência e ao modo de pensar dos conservadores.

No género mqyonnaise nada há que dizer à declaração. É completa.

O que eu gostava de saber é com o que conta o Sr. José Domingues dos Santos para dar execução a esse seu mirabolante programa, pois, para o mesmo se realizar, será preciso, como muito bem aqui diijse o Sr. D. Tomás de Vilhena, um bom quarto de século pelo menos,.

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Quere governar constitucionalmente e de mãos dadas com o Parlamento.

Assim o disse já; mas se o disse não o pratica, pois já fez ditadura. Como todos os políticos, afinal, do meu País.

Em cada político português, por mais que o queira encobrir, alberga-se a alma dum ditador. É por isso que me rio sempre quando ouço protestar contra as ditaduras, como se essa revolta não fosse apenas contra as ditaduras dos outros e toda a gente não gostasse de impor a ditadura própria.

Não tenho ôsse horror pela ditadura dos outros que a tantos «puristas»... constitucionais faz afligir em homenagem aos princípios...

Acho-as salutares, por vezes, às ditaduras, quando oportunas, não como sistema normal de Governo, mas como indispensável elemento de reacção política contra desmandos e licenciosidades perturbadoras.

Pela" história fora, se muitas ditaduras representaram um abuso do Poder, tantas outras se impuseram como recurso supremo e único para a salvação dos povos.

0 perigo não está na ditadura; o perigo está n.o ditador, quando a ambição e a vaidade o desvairam e salta a meta que separa o legítimo interesse público da simples satisfação do amor próprio e do orgulho pessoal.

1 E que diferença entre a ditadura às claras e a ditadura mascarada! O que uma tem de grande, de nobre, de heróico, tem a outra de mesquinho e insignificante. w

Os que têm a coragem de se afirmar ditadores e o proclamam alto e bom som, libertando-se assim às claras, decididamente e terminantemente, das peias constitucionais, para assumir as graves res-ponsabilidades duma ditadura sem disfarces, merecem toda a minha admiração.

Têm por vezes a grandeza dos verdadeiros heróis e, arriscando a vida, caem (|uási sempre varados pelas balas dos inimigos ambiciosos que se sentem feridos no seu orgulho ou nos seus intorês-

Os outros, os ditadores de máscara, são banalíssimos e insignificantes ditadores que se escudam em pretensas auto-

rizações parlamentares que indevidamente invocam para p_ôr em prática propósitos tantas vezes deshonestos.

í Para quê, esse falso amor à Constituição?

Pobre Constituição que tantas vezes tem sido desprezada e calcada aos pés pelos seus mais ardentes defensores . . .

<_:_ só='só' constitucionalmente='constitucionalmente' e='e' governar='governar' dos='dos' josé='josé' sr.='sr.' o='o' p='p' domingues='domingues' propõe-se='propõe-se' _='_' santos='santos'>

Pois não é verdade. Já fez ditadura, -como disse, abusando duma autorização parlamentar que de modo algum lhe dava esse direito — a da lei n.° 1:540 — para publicar o célebre decreto n.° 10:301 sobre a mobilização das acções dos bancos e companhias que tenham contratos com o Estado, com os quais o Ministro das Finanças, com dispensa de todas as formalidades legais, poderá realizar as operações de transformação que julgue necessárias e úteis.

Isto é pura ditadura disfarçada com o dominó e a máscara duma autorização parlamentar que para isso não existe, visto dizer respeito apenas à regulamentação do comércio de cambiais e à melhoria da situação cambial.

Ver-se há de futuro o que pretende o Governo fazer com a tal mobilização das "acções e se realmente isso esconde ou não um propósito de assalto republicano a postas e a benesses que ainda não tinham servido para atafulhar a giiela voraz dos serviddres do regime.

Sr. Presidente: na sua declaração ministerial, o Sr. Presidente do Governo afirma que o problema português é essencialmente de ordem moral e social.

Concordo.

£ Mas onde está a razão desse mal?

Isso é que não diz o Sr. José Domingues dos Santos.

<_ que='que' crise='crise' debelar='debelar' os='os' social='social' e='e' remédios='remédios' português='português' convenientes='convenientes' em='em' problema='problema' assim='assim' do='do' solucionando-se='solucionando-se' moral='moral' o='o' p='p' essa='essa' para='para' quais-='quais-' ministério='ministério' define='define' presidente='presidente'>

Não os indica o Governo. x

Sem dúvida que estamos em face de uma tremenda crise, a crise da ordem, a crise da autoridade, a crise das consciências.

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rística do povo português, tudo isso parece subvertido, esmagado pela sobreposição de baixos egoísmos e ruins paixões.

Trausiormou-se a moral, s; mornl colectiva e a própria moral individual.

A guerra se tem ido ido buscar a causa de todos esses males.

Pobre guerra!

j Como ela tem as costas largas para aguentar com todas as responsubilida-des!

Sem dúvida que foram grandes as perturbações que ela trouxe, nem o contrário seria de admitir em face de tam grande cataclismo, que marca na história uma época c inicia um novo ciclo.

Mas n César o que é de Cési.r.

Não atropelemos a verdade, responsabilizando por tudo a guerra; não nos escudemos nela para justificar todas as loucuras, todos os esbanjamentos, todos os latrocínios que têm caracterizado a administração do regime.

A obra da República nesse ponto tom sido absolutamente deletéria e iião se atire sobre a guerra com culpas cjie apenas pertencem a ôste regime e a mais ninguém.

A República perturbou a ordem económica atacando a propriedade, a ordein social atacando a família, a ordem moral atacando a religião.

Desde o seu início, nada mais fez que demolir, destruir anarquizar.

AÍ tem o fruto dessa detestável sementeira.

A transigência do regime, por exemplo, coin os elementos perturbadores da ordem social, ainda agora só revela com a permissão da propaganda subversiva, a dentro cie estabelecimentos do Estado.

1,0 Sr. Presidente do Governo sabe porventura o que se passa no Limoeiro, onde funcionam escolas sindicalistas frequentadas pelos presos, que ali estão e se fazem. conferências de propaganda comunista? i

Tem no Ministério o director ao Li-inoeiro, o Sr. Pestana Júnior, que sobraça a pasta das Finanças.

Pois informe-se S. Ex.a com esse seu colega.

o Sr. Presidente do Governo o .que é o socorro vermelho? Não

Pois eu vou dizer-lhe o que é, o para Isso socorro-me de um dos seus órgãos a Entalha, que sendo o jornal dos comunistas está actualmente defendendo o Governo.

Foi aí, que ó boa fonte e insuspeita3 que eu fui colher a notícia da propaganda revolucionária a que me reíeri e das escolas sindicalistas que funcionam no Limoeiro o ai também encontrei a descrição do socorro vermelho, que é uma instituição de solidariedade rev.olucionúria.

Eu leio ao Sr. Presidente do Governo, para S. Ex.a tícar inteirado do que se passa.

Leu.

Já vê o Sr, Presidente do Ministério que ou não invento.

Vou buscar a informação a lugar seguro, ao próprio órgão comunista.

^ Como qnere pois o Sr. Presidente do Ministério que não haja uma grande crise da ordem, quando os poderes públicos assim transigem com os principais fautores da desordem, com os mais perigosos agitadores e por pusilanimidade não opõem um dique sério à onda anárquica que avança, cerrando os ouvidos, pelo contrário, aos protestos contra n propaganda, dissolvente que alastra?

4 O que será do futuro de Portugal quando os seus destinos estão assim confiados a mãos tam fracas?

Não se iluda o Sr. José Domingues dos Santos com a lealdade desses seus amigos de momento.

Ponha os olhos na França e veja a situação a que levaram Herriot alianças dessa natureza.

éCoEiÔ1 se compreende que o Estado possa oncontrar apoio nos seus próprios inimigos ou que a ordem possa florescer à sombra da anarquia?

E evidente o paradoxo.

Um outro ponto da declaração ministerial, Sr. Presidente, me merece referência.

Pretende o Sr. Presidente do Governo acabar com os monopólios e nomeadamente com o dos fósforos e o dos tabacos.

Como consumidor poderei achar ópti« mo. É de crer pelo menos que, em regi-mo de livre concorrência, o produto seja mais bem manufacturado e de preço mais acessível.

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te convenionte para os interesses do Estado ?

,íOu quererá o Governo voltar à régie e assim ir buscar a esse sistema de administração directa a receita que pelos contratos vigentes cobra do monopólio "dos tabacos e dos fósforos, acrescida do rendimento que ato hoje têm auferido as duas companhias concessionárias?

Lembre-se o Governo do que são as administrações do Estado; não se esqueça dos Transportes Marítimos, dos Bairros Sociais e de outros serviços públicos não entregues à exploração particular, todos deficientes e irregulares, como o dos caminhos de ferro, por exemplo, e - muitos outros de tal maneira organizados que só têm servido para arruinar o Tesouro Público e para cobrir de vergonha o País.

£ Como pensa o Grovêrno evitar os inconvenientes dessa saída em massa para a rua de milhares de operários até hoje pagos pelas companhias detentoras dos monopólios?

O Governo não deve ignorar que a crise do trabalho, como consequência da crise de produção que o retraimento do consumidor cada vez agrava mais, começa a tomar proporções assustadoras.

Há fábricas paralisadas; há fábricas que reduziram a metade a sua capacidade produtora.

Como consequência despediram muitos assalariados ou reduziram muitíssimo o seu numero. Em Gaia, vi eu, há poucos dias ainda, grupos de operários e operárias sem trabalho pedindo esmola, não se andando meia dúzia de metros que não se encontre gente dessa estendendo a mão à caridade pública. Isto de dia; de noite assaltam-se os transeuntes, é a informação que tenho.

O Governo precisa de olhar para o problema com todo o cuidado e atenção.

É fácil gritar contra os monopólios para agradar à pleb.e inculta. Com essas e outras objurgatórias de igual natureza se fez a campanha republicana antes de 5 de Outubro e de tal modo se desnortearam as massas populares, falando-lhes aos sentidos e não à razão, que muito boa gonte julga ainda que o automático aparecimento do maná celestial depende apenas da extinção dos monopólios.

Pois o remédio não é tam eficaz como se julga.

Na passagem do regime dos monopólios para o da liberdade, se se não previnem convenientemente todos os acidentes possíveis, pode o Estado sofrer prejuízo grave.

Fala-nos também a declaração ministerial das reparações devidas pela Alemanha e do crédito dos 3 milhões de libras.

Quanto a este declara o "Governo que nunca mais se utilizará dele.

Vê-se assim que essa operação, em tempos tam reclamada pelos homens do regime como sendo uma verdadeira prova de confiança da finança inglesa na administração republicana, não passou de um. simples artifício para ficarem afinal a cargo do Estado responsabilidades que não lhe deviam pertencer.

No emtanto seria interessante saber se tal crédito já está esgotado ou não, ou qual a margem que há ainda para à sombra dele se fazerem novas operações.

Concordo neste ponto plenamente com o Sr. Herculano Galhardo, pois só tendo-se essa informação detalhada e rigorosa nós poderíamos avaliar da sinceridade do Governo.

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Onde a declaração ministerial nos deixa absolutamente satisfeitos é na parte respeitante às colónias.

Começa por dizer que a catorze anos de regime ainda não apareceu um plano de administração colonial.

Está certo.

A República só tem feito estragar c que de bom nos legou a monarquia.

Mas perante tal afirmação fica-se julgando que o plano é agora apresentado finalmente por este Governo.

E quando a gente se dispõe a felicitar por tal iniciativa o Sr. José Domingues dos Santos, depara com a resolcção do Sr. Ministro das Colónias, de mandar pedir um relatório a todos os governadores coloniais, sobre o que mais convém à respectiva colónia, para só no fim de tudo isso o Sr. Ministro ficar habilitado a elaborar um plano que deve ser admirável.

Não desdenho da competência de Sr. Carlos de Vasconcelos, mas achava melhor que S. Ex.a não fosse tam modesto e se resolvesse a inserir logo na declaração ministerial o esboço ao menos desse piano que até hoje nenhum dos seus antecessores se lembrou de apresentar.

Assim como está, ó mais um zero a acrescentar aos anteriores.

Sr. Presidente: muito me tenho alongado em considerações sobre a declaração do Governo que está em debate.

Não quero abusar por .mais tempo da magnanimidade da Câmara.

Mas não posso terminar sem me referir a umas palavras da declaração que bastante me impressionaram.

O Governo promete iniciar ura ciclo de desenvolvimento da agricultura e da pó voação na metrópole e no ultramar.

Acho bem, sobretudo a povoação... embora para isso se exijam dos membros do Governo fortes requisitos cae não sei se todos possuem.

Nós já tivemos um rei (Sancho II) que a história cognominou de Povoador.

Agora, em plena República, na um Governo que pretende disputar ss palavras a esse monarca da primeira dinastia.

Nesse mesmo capítulo porém, e para o mesmo efeito, acrescenta o Governo que o Estado reivindicará, pelos convenientes meios jurídicos, áreas importantes de terras,

Reivindicará?

As palavras não são indiferentes em documento de tanta responsabilidade como a declaração ministerial.

Deve-se ser prudente e cauteloso e não é de crer que o Sr. Presidente do Ministério, que é um bacharel formado em direito, desconheça a significação jurídica da palavra reivindicar.

A reivindicação ó em linguagem forense a restituição ao legítimo dono do que por outro lhe foi usurpado.

Mias então estamos em frente duma fórmula colectivista.

<_:_0 p='p' de='de' domingues='domingues' lenine='lenine' apologista='apologista' é='é' dos='dos' josé='josé' doutrina='doutrina' da='da' sr.='sr.' santos='santos'>

^Não considera a propriedade como um direito subjectivo e individual e considera-a apenas como função social, sendo o proprietário um simples detentor como o afirmou já o Sr. Afonso Costa?

Se assim pensa, .que o diga claramente.

Se niio quere dar essa significação às às suas palavras, então deve suprimir da sua declaração a palavra reivindicar.

Expropriar sim ó função do Estado, garantida pela lei. mas sob o expresso reconhecimento do direito do expropriado, em troca do qual se paga a respectiva indemnização.

Sr. Presidente: vou terminar mandando para a Mesa uma moção que representa o modo de pensar deste lado da Câmara, a respeho da declaração ministerial e dos propósitos do Governo.

Entende a minoria monárquica que este Ministério é mais um da longa série dos que se têm constituído nesta República e que será tal e qual como os outros, con^ tinuandc a administração dos dinheiros do Estado a ser tumultuaria e inconveniente para os altos interesses da Nação.

O programa apresentado é composto de rnirabolâncias e mais nada, pois bem sabe o Sr. Presidente do Ministério que impossível lhe seria pôr em execução o que promete, a não ser que previamente se tivesse assegurado de uma permanência no poder que não está nos nossos hábitos e sobretudo quando, como acontece com S. ~3x.a, não há apoio sólido na maioria parlamentar.

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sentar, em nome da minoria monárquica, é á seguinte:

Moção

A Câmara, considerando que o Governo não satisfaz as justas exigências da opinião nacional e que apenas servirá para continuar a obra dos Governos anteriores, nefasta em todos os ramos de admi-" nistração pública, onde a coberto de res-

ponsabilidades pela segurança de uma constante impunidade, se têm praticado esbanjamentos e delapidações que afectam grandemente o Tesouro Público e o próprio bom nome de Portugal, passa à ordem do dia.

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