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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
SESSÃO 1T.0 41
EM 5 E 9 DE JUNHO DE
Secretários os Ex.m°8 Srs,
mo Sr, António Xavier Correia Barreto
Luís Inocêncio Ramos Pereira
PRIMEIRA PARTE
Sumário. — Chamada e abertura da setsão. Leitura e aprovação da acta. Dá-te conta do expediente.
Antes da ordem do dia.— O Sr. Mendes dos Reis faz considerações relativas a redacção de propostas.
O Sr. Procópio de Freitas requere que entre em discussão a proposta de lei n.? 182.
É lida a proposta e aprovado o requerimento.
O Sr. Ferraz Chaves, requere a discussão dos projectos de lei n.°" 873 e 471.
O Sr. Sousa Varela requere que seja transformado em lei um projecto de lei aprovado o ano passado, e faz considerações sobre o estado em que se encontram as estradas e sobre o trabalho dos campos.
Responde o Sr. Ministro da Instrução.
O Sr. Artur Costa requere a urgência para a proposta 'de lei n.' 890, concedendo pensões às viúvas de João Chagas e oficial Stockler.
E aprovado.
O Sr. Silva Barreto requere a discussão da proposta de lei n." 824, referente ao porto de Viana do Castelo.
É aprovado.
O Sr. Herculano Galhardo requere a discussão da proposta de lei n.° 883.
È aprovado.
O Sr. Francisco.de Paula requere que entre em discussão o projecto n." 881.
O Sr. Pereira Osório- requere a discussão da proposta de lei relativa à ponte de Mosteiro.
O Sr. Medeiros Franco requere a discussão do projecto n.° 645.
O Sr. Afonso de Lemos faz considerações relativas à ponte sobre o rio Mira e entende que o comboio rápido' do .Algarve deve ter uma paragem em Odemira. ^
Responde o Sr. Ministro do Comércio e Comunicações.
O Sr. Costa Júnior fala sobre um castigo aplicado ao inspector íscolar das Caldas da Rainha,
Responde o Sr, Minis, tro da Instrução,
António Gomes .de Sousa Varela
Ordem do dia. — É rejeitado o projecto de lei n.' 873.
Entra em discussão o projecto de lei n." 890.
Usam da palavra os Srs. Ribeiro de Melo, Artur Costa, Joaquim Crisóstomo, Pereira Osório e Afonso de Lemos.
O Sr. Presidente interrompe a sessão.
SEGUNDA PARTE
A sessão reabre às 11 horas e 10 minutos, prosseguindo a discussão da proposta de lei concedendo pensões à viúva de João Chagas e à mãe de João F-iel Stockler.
O Sr. Oriol Pena continua o seu discurso, falando depois os Srs. Ribeiro de Melo, Joaquim Crisóstomo, Artur Costa e Afonso de Lemos, sendo a proposta aprovada. Em seguida é encerrada a sessão.
Abertura da sessão às 15 horas e 20 minutos.
Presentes à chamada 29 Srs. Senadores.
Entraram-durante a sessão 20 Srs. Senadores.
Faltaram 22 Srs. Senadores.
Srs. Senadores que responderam à chamada:
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Álvaro António Bulhão Pato.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Gomes de Sousa Varela.
António Maria da Silva Barreto.
António Xavier Correia Barreto.
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Diário da» Sessões do Senado
Artur Augusto da Costa. Artur Octávio do Rego Chagas. César Procópio de Freitas. Coustantino José dos Santos. Duarte Clodomir Patten de Sá Viana. Ernesto Júlio Navarro. Francisco José Pereira. Francisco Vicente Ramos. Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Pereira Gil de Matos. José António da Costa Júnior. José Augusto Ribeiro de Melo. José Duarte Dias de Andrade. José Joaquim Pereira Osório. José Mendes dos Reis. Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Júlio Ernesto de Lima Duque. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Manuel Gaspar de Lemos. Pedro Virgolino Ferraz Chaves. Rodolfo Xavier da Silva. Silvestre Falcão.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.
António de Medeiros Franco.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
César Justino de Lima Alves.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Elísio Pinto de Almeida e Castro,,
Francisco António de Paula.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Frederico António Ferreira de Simas.
Herculano Jorge Galhardo.
João Carlos da Costa.
João Catanho de Meneses.
João Manuel Pessanha Vaz das Xeves.
Joaquim Manuel dos Santos .Garcia.
Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.
Luís Augusto Simões de Almeida.
Ricardo Pais Gomes.
Rodrigo Guerra Alvares Cabral.
Tomás de Almeida Manuel de Vilhena (D.).
Vasco Crispiniano da Silva.
Srs. Senadores que faltaram à sessão:
Aníbal Augusto Ramos de Miranda. António Alves de Oliveira Júnior.
Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.
Augusto de Vera Cruz.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Alpoim Borges do Canto.
João Maria da Cunha Barbosa.
João Trigo Motinho.
Joaquim Teixeira da Silva.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto de Sequeira.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Joaquim Fernandes Pontes.
José Machado Serpa.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Nicolau Mesquita.
Querubim da Rocha Vale Guimarães.
Raimundo Enes Meira.
Roberto da Cunha Baptista.
Vasco Gonçalves Marques.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
PRIMEIRA PARTE
O Sr. Presidente (às 15 horas e lô minutos):—Vai proceder-se à chamada. fez-se a chamada.
O Sr. Presidente (à* 15 horas e 20 minutos) :— Estão presentes 28 Srs. Senadores»
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Leu-se.
O Sr. Presidente: — Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.
Vai ler-se o
Requerimentos
De Rodrigo de Matos, pedindo para lhe ser aplicada a doutrina da lei n.° 1:158. Para a comissão de petições.
Do Sr. Pedro Rodrigues, pedindo para ser reconhecido revolucionário civil, ao abrigo da lei n.° 1:691.
Para a comissão de petições.
Do Sr. João de Abreu Rato, pedindo para ser reconhecido revolucionário civil, ao abrigo da lei n.° 1:691.
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Sessão dê 5 e 9 dê Junho de 1925
Ofícios
Da l.a vara do Tribunal do Comércio, pedindo autorização ao Senado para ali comparecer o Sr. Augusto de Vasconcelos Correia no dia 19.
Autorizado, para dar conhecimento ao interessado •.
Do juízo de' direito dá 2.a Vara da comarca de Lisboa, pedindo â comparência ali, para depor como testemunha, no dia 16, do Sr. João Catanho dê Meneses.
Autorizado, para dar conhecimento do interessado.
Telegramas
Do professorado dos. concelhos de Ser-nancelhe e Castro paire, protestante contra o decreto n.° 10:776, que extingue as actuais juntas escolares.
Para a Secretaria.
Da Associação 'Cbrdercial de Paredes de Coura, protestando, contra a taxa de 15 por cento para as obras do porto de Viana.
Para a Secretaria.
Dos empregados municipais de Castelo Branco, Arraiolos, Valongó e Marinha Grande, pedindo a imediata votação do projecto de lei equiparando vencimentos.
Pára à Secretaria.
Projectos de lei
Do Sr. Manuel Gáspaí de Lemos, estabelecendo uma nova época de exames em Dezembro de 1925.
Para a l.a Secção.
Do Sr. Santos Garcia, concedendo o -direito de opção aos proprietários de prédios sujeitos à usufruto.
Para a 2.a Secção.
Idem, idem, elevando à categoria de cidade a vila de Estremoz. Para a 2.a Secção.
Do Sr. 'Godihho dó Amaral, criando uma asseiribíêa eleitoral na freguesia de Sangàlhos, concelho de Anadiá."
Para a. 2.d ^Secção.
Pareceres
Da comissão de faltas, considerando justificadas as faltas dos Srs. José Au-
gusto Eibeiro de Melo; Júlid Ernesto de Lima Duque, José Augusto dê Sequeira, Luís Augusto Simões de Almeida, Querubim da Rocha do Vale Guimarães, José Nepomuceiio Fernandes Eras e Jtífcé Machado Serpa. Aprovados.
Da comissão de petições; sobre o requerimento de Romeu Ajax de Ávila Duro.
Mandado arquivar.
Idem, sobre o requerimento do segundo sargento José Elias Lopes.
Deve requerer ao Ministro da Guerra.
Idem, sobre a petição de 28 revolucionários civis.
Para a l.a Secção.
O Sr. Mendes dos Reis (para interrogar a Mesa):— Sr. Presidente: ontem quando reuniu a l.a Secção discutiu-se uma proposta dê lei, tendo eu enviado' para a Mesa várias emendâSj qtiê foram? aprovadas.
A proposta seguiu os seus trâmites e hoje, com surpresa minha, recebi da secretaria a mesma proposta com às emendas para que eu fizesse a última redacção. ;
Não é costumo fazer-se isso; Como é um trabalho da secretaria simplesmente burocrático, que não envolve responsabilidade alguma, parece-me desnecessário estarmos a perder tempo com essas pequenas cousas. Ainda se'compreendia se se tratasse da última e definitiva redacção da proposta de lei'; mas tratando-se dê simples emendas entendo que não ó preciso.
O Sr. Presidente : — Eu devo dizer a V. Ex.a que o ano passado, com á lei do inquilinato, deu-se um engano com a redacção na Secretaria; e por esse motivo a comissão administrativa deu ordens para que não fossem feitas na Secretaria as últimas redacções.
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Diário da» Senões do Senado
inconveniente algum em que a Secretaria faça esse trabalho.
O Sr. Procópio de Freitas (para um requerimento) : — Sr. Presidente: peço a V. Ex.a o favor de consultar a Câmara sobre se permite que na primeira parte da ordem do dia seja discutida a proposta de lei n.° 882, que altera o acto de navegação, e ao mesmo tempo requeiro para o Senado dispensar a impressão dessa proposta de lei.
É aprovado.
O Sr. Ferraz Chaves (para um requerimento) : — Sr. Presidente : peço a Y. Ex.a para consultar a Câmara sobre se permite que entrem em discussão, ria primeira parte da ordem do dia, os projectos de lei n.os 873 e 451.
É aprovado.
O Sr. Sousa Varela: — Sr. Presidente: peço a V. Ex.a para consultar o Senado se permite que, ao abrigo do artigo 32.° da Constituição, seja promulgado como lei o projecto de lei n.° 124, -já aprovado nesta Câmara.
Aproveitando o ensejo de estar no uso da palavra, embora não esteja presente o Sr. Ministro do Comércio, -mas encontrando-se presente o Sr. Ministro da Instrução, eu peço a atenção de S. Es.a para o assunto que vou versar.
Sabe V. Ex.a, Sr. Presidente, e ó do conhecimento do Governo e da Câmara, o estado deplorável em que se encontram as estradas em todo o País, sobretudo na província da Estremadura.
No distrito de Santarém há pontos intransitáveis, principalmente por ocasião das chuvas.
Nesta quadra, as classes trabalhadoras estão passando nma grande crise de falta de trabalho; os operários do meu distrito, que o ano passado nesta época ganhavam entre 15$ e 25$, estão ganhando entre 7$ a 9$.
Com a contribuição do turismo vai-se fazecdo arrecadação nos cofres do Estado de uma verba que é importante.
Em meu entender parecia-me, e muito democraticamente, que todos os concelhos e distritos tinham direito a que essa verba fosse sendo aplicada na reparação das suas estradas.
Atendia-se assim à situação das nossas estradas e atendia-se também àqueles que têm dificuldade em arranjar o pão de cada dia.
Chamo para este facto a atenção de V. Ex.a, pedindo-lhe para, como republicano e homem de bem, chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio a fim de que este assunto, que ó importantíssimo, não seja descurado.
O Sr. Ministro da Instrução Pública
(Xavier da Silva): — Ouvi as considerações do Sr. Sousa Varela, a quem agradeço as palavras amáveis que me dirigiu.
Transmitirei ao titular da respectiva pasta os seus desejos.
Embora o assunto não seja das minhas atribuições, posso esclarecer um pouco S. Ex.a, e assim devo dizer que o Governo, e especialmente o Sr. Ministro do Comércio, está tratando neste momento de atender o problema das estradas, e posso dizer isto porque o caso já foi levado a Conselho de Ministros e aí tratado.
O Sr. Sousa. Varela (para explicações) : —Agradeço ao Sr. Ministro da Instrução a resposta quó me acaba de dar e pela qual vejo que., felizmente, o Governo não descura este importante problema.
O Sr. Artur Gosta: — Sr. Presidente : peço a V. Ex.a que consulte o Senado sobre se concede que entre em discussão, sem prejuízo dos oradores que estão inscritos para antes da ordem do dia, a proposta de lei n.° 890, que concede pensão às famílias de João Chagas e Fiel Sto-ckler.
Essa proposta já foi apreciada pela Secção, que lhe deu parecer favorável, e creio que está no ânimo de todos nós que seja discutida aqui quanto antes.
Lida a proposta na Mesa, foi aprovado o requerimento.
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Sessão de Ô e P de Junko de Í925
Junta Geral do Distrito de Leiria", dispensando-se as formalidades regimentais. Consultada a Câmara, foi concedido.
O Sr. Herculano Galhardo:--Está sobre a Mesa, vindo da 2.a Secção, o projecto de lei -n.° 883, criando a freguesia de Queluz.
Peço a V. Ex.a, Sr. Presidente, que consulte o Senado sobre se consente que ele seja discutido em antes da ordem do dia sem prejuízo dos oradores inscritos ou na ordem do dia, em seguida à votação dos projectos que a Câmara aprovou que fossem discutidos hoje.
Consultada a Câmara foi concedido.
O Sr. Francisco de Paula (para um requerimento}:— Requeiro que entre em discussão o projecto de lei n.° 881, sem prejuízo dos oradores inscritos.
Consultada a Câmara foi concedido.
O Sr. Pereira Osório (para um requerimento):— Sr. Presidente: peço a V. Ex.a a fineza de consultar a Câmara, sobre se permite que em seguida à apreciação dos projectos cuja discussão o Senado já autorizou, se discuta a proposta de lei n.° 86, que diz respeito à ponte de Mosteiro.
Trata-se de uma obra cuja urgência e importância é por todos reconhecida.
Consultada a Câmara, foi concedido.
O Sr. Medeiros Franco:— Sr. Presidente: roqueiro que V. Ex.a consulte o Senado sobre se permite que o projecto n.° 645 (reintegração por distinção do cidadão Artur Marques Monteiro) seja incluído na ordem do dia, sem prejuízo daqueles sobre os quais o Senado se pronunciou já. • Aprovado.
O Sr. Afonso de Lemos: — Sr. Presidente : S. Ex.a, o Sr. Ministro do Comércio, faz parte da Secção do Senado a que eu também me honro de pertencer, assim como muitos dos meus colegas aqui presentes, e deve estar recordado que quando um dos seus antecessores, o Sr. Nuno Simões, trouxe à Secção um projecto de lei, fazendo distribuir do fundo de protecção à marinha mercante, algumas verbas destinadas à reparação de estradas e pontes, e eu propus que desse dinheiro algum fosse também destinado à reparação da ponte
de Odemira, obra essa que já vinha a ser reclamada do tempo da monarquia.
S. Ex.a o Sr. Ministro de então, Nuno Simões, concordou plenamente'com a minha proposta, mandou informar à Secção competente do Ministério, e teve como resposta que era de necessidade urgente fazer essas reparações e que a verba de 30 contos seria o suficiente.
Esse projecto de lei, converteu-se na lei n.° 1:602, que eu tenho aqui presente e que diz no seu artigo 2.° o seguinte:
Leu.
Estavam portanto as cousas estabelecidas à face da lei, mas o sucessor do Sr. Nuno Simões, Sr. Pires Monteiro, mandou para a reparação dessa ponte apenas a verba de 9 contos.
O facto causou muita estranheza naquela região, e deu lugar a que eu interpelasse o Sr. Pires Monteiro, numa sessão do Senado.
Diz o extracto dessa sessão:
Leu.
É claro que a palavra duodécimos que S. Ex.a então proferiu, não tem valor, podia antes dizer que era uma primeira verba que enviava e depois mandava o resto.
Essa verba colocou a ponte num estado muito pior do que aquele em que estava, como se verifica por o ofício, ~que eu li ontem a V. Ex.a, que me enviou a Câmara de Odemira.
Eu desejava que V. Ex.a, Sr. Ministro me declarasse se estava na disposição de mandar a verba necessária para a reparação dessa ponte.
E sobre este ponto, não canso mais a atenção de V. Ex.a e da Câmara.
Há -outro ponto para o qual eu quero também chamar a atenção de V. Ex.a
Fez-se já a inauguração do rápido do Algarve, e sendo a vila de Odemira, uma terra importantíssima, não só por si, maa porque ó a cabeça de um concelho, talvez o maior de Portugal, não se compreende que esse rápido não tenha lá uma paragem.
Espero que V. Ex.a tomará as devidas providências para que esse comboio tenha lá uma paragem.
O Sr. Ministro do Comércio, Ferreira de Simas, prometeu mandar continuar imediatamente as obras de reparação na ponte de Odemira, em harmonia com a lei n.° 1:602.
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Diário das Sessões ao Senado
O Sr. Ministro do Comércio e Ccmurii-cações (Ferreira de Simas) —Sr. Presidente : quanto ao caso citado pelo Sr. Senador Afonso de Lemos, da reparação da ponte de Odemira, é claro que eu não tenho mais do que fazer cumprir a lei, e direi ao Sr. administrador geral das estradas que a pequena verba que ficou das despesas necessárias para satisfazer quanto possível o plano geral de construção de estradas que se vai iniciar.
No caso de haver saldo, será destinada uma parte para a ponte de Odernira.
Com respeito à paragem do comboio rápido, devo dizer que teve lagar ontem o primeiro comboio rápido, tendo feito o trajecto perfeitamente à tabela, creio que em seis horas.
Vou apresentar o caso à Administração Geral dos Caminhos de Ferro do Estado, mas a verdade é que se um comboio rápido em lugar de parar só em cruzamentos de linhas, parar em cidades e depois em vilas, passamos a não ter am comboio rápido, mas sim um omnibus.
Não sei as circunstâncias especiais em que está a vila de Odemira.
É possível que se justifique perfeitamente a paragem nessa vila e que assim seja de atender o pedido da Sr. Afonso de Lemos.
O orador não reviu.
O Sr. Afonso de Lemos (para explicações) :—Pedi a palavra para agradecer as explicações dadas pelo Sr. Ministro do Comércio, e espero que S. Ex.a mande executar as obras da ponte de Odemira, devendo porém 'frisar a S. Ex.a que não poderá ser qualquer pequenina verba parecida com 9 contos.
Oferece presentemente aquela ponto um grande perigo e não será fazendo am pequeno conserto qu.e esse perigo desaparecerá.
Tem áe ser feito um concerto como deve ser. tanto mais que a verba de 30 contos, não me parece que seja ums, cousa tam grande que não possa ser dispensada para aquele fim.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Ferreira de Simas) (interrompendo):— Mas, deixe-me V. Ex.a dizer, só uma pequena parte é que se poderá gastar até o fim do ano económico.
O Orador: — Mas isto está dentro duma lei especial que fez a transferência da verba para o capítulo de reparações urgentes, em que esta foi também considerada. Está, pois, dentro dos 1:600 contos que foram destinados a essas reparações.
Vai hoje ser discutido o projecto que se refere à aquisição de material para reparação da ponte de Mosteiro, que isenta de direitos.
Não creio que para a ponte de Odemira isso seja preciso, porque se trata duma peqiena rep*\ração; mas se V. Ex.a en-teode que é preciso fazê-lo, seria bom incluir nesse projecto qualquer disposição de modo a garantir que o material para essa reparação esteja nas mesmas condições.
O orador não reviu.
O Sr. Costa Júnior : — Começo por agradecer ao Sr. Ministro da Instrução e ao Sr. Ministro da Guerra a amabilidade qne tiveram em comparecer hoje nesta Câmara, em atenção ao meu pedido.
Com o Sr. Ministro da Guerra, como sei qua S. Ex.a tem muitos assuntos importantes e urgentes a resolver, tratei já particularmente, mas não deixo, no em-tanto, de agradecer a sua amabilidade em aqui ter vindo.
Ao Sr. Ministro da Instrução agradeço também, chamando a atenção de S. Ex.a para um assunto que julgo que não tem sido devidamente tratado pela repartição a que compete no Ministério de S. Ex.a
Devo declarar previamente que-não tenho nenhuma má vontade pelo director dessa repartição, antes, pelo contrário, sou seu amigo e colega.
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de 5 e 9 de Junho dê 1925
fessores continuam a fazer o que querem.
Esse funcionário, que nunca foi castigado, foi-o agora, e devo dizer eonscien-temente que se estivesse no lugar do Sr. Ministra teria castigado esses dois professores por não estarem numa situação legal, ou então a respectiva Direcção Geral ó que devia ser castigada.
Para fazer uma pequena história do assunto, eu peço liceuça para ler a circular n.° 7, de 6 de Maio de 1924, da Direcção do Ensino Primário Normal:
Leu.
Como V. Ex.a vê, Sr. Ministro, a res^ pectiva repartição, por circular, que ainda não foi revogada, determinou que os inspectores escolares fizessem o horário das suas escolas em harmonia com a lei n.° 1:764, que determinava que deixava de ser considerado como feriado a quinta-feira de cada semana.
Muito bem. Este Sr. inspector estabeleceu o seu horário para todas as escolas do círculo. .
E preciso notar que -nesse círculo havia dois professores que eram ao mesmo tempo professores 'das escolas normais primárias superiores, o que ó contrário ao estatuído na carta orgânica de 9 de Setembro de 1908, que no seu artigo 40.° diz o seguinte:
Leu.
E ainda preciso notar que estes dois lugares não podem ser acumulados, pois que a mesma carta orgânica, no seu artigo 41.°, diz o seguinte:
Leu.
Como V. Ex.* verifica, Sr. Ministro, isto não pode ser, e tanto que por despacho ministerial' de Junho de 1922 foram mandados optar por um dos lugares. Não o fizeram, e ainda mais, como o horário tornava impossível a acumulação, dirigiram-se à Inspecção- Geral, sem ser por intermédio do inspector respectivo, protestando contra esse horário, e a repartição diz o seguinte neste ofício de 14 de Janeiro de 1925:
Leu.
E, pois, o próprio Sr.- director geral que diz que eles se deviam dirigir por intermédio dessa repartição, e ainda mais que as acumulações são legais, o que vai contra a deliberação do Ministro que considera incompatíveis os dois lugares, e
contra o estabelecido na carta de lei de 9 de Setembro de 1908, que delega nos inspbctores a organização dos horários respectivos.
O referido inspector, baseado nestas circunstâncias, manteve o seu horário, o que lhe valeu receber do Sr. inspector gera.1 o ofício n.° 26, de 21 de Maio de 1925, da Direcção Geral do Ensino Primário Geral, que diz o seguinte:
Leu.
Em primeiro lugar, não ordenou que o modificassem. Em segundo lugar:
»Leu.
o Quere dizer, estes dois funcionários continuaram a dirigir-se ao Sr. Ministro sem ser por intermédio do inspector, como manda a lei, isto é, não seguindo os meios legais.
Pois esses requerimentos, que o Sr. director geral devia imediatamente devolver, com a ordem do se dirigirem pelos meios legais, foram presentes a S. Ex.a-o Ministro, dizendo que o inspector não tinha cumprido uma ordem dessa repartição, o que levou V. Ex.a a mandá-lo sindicar.
• Parece, pois, que na Direcção Geral existe uma má vontade contra este inspector, que é um funcionário zeloso e trabalhador.
• Existe tanta má vontade que não castigava nem levava ao conhecimento do Ministro estes 'factos irregulares praticados pelos professores, em quanto que este funcionário, que não fez mais do que cumprir com o que está estabelecido, para bem do ensino, ó castigado.
O Sr. Silva Barreto: — «jV. Ex.a dá-me licença ?
Têm sido expedidos ofícios e circulares mandando optar os professores primários por um dos lugares e a razão é manifesta, é porque o professor primário tem de serviço seis horas por dia e o professor das escolas primárias superiores tem três horas.
<_:Como que='que' de='de' nove='nove' fazer='fazer' p='p' horas='horas' por='por' professor='professor' às='às' ó='ó' pode='pode' das='das' serviço='serviço' um='um' dezasseis='dezasseis' dia='dia'>
E certo que houve uma determinação que não foi respeitada.
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Diário das Sessões ao Senado
cão, que vem confirmar a minha afirmação.
A direcção geral não tem cumprido a lei.
Se eu tivesse particularmente tratado deste assunto com o Sr. Ministro da Instrução imediatamente se resolveria o caso, mas entendi tratar do assunto em público para mostrar que os Governos da Kepú-olica estão sempre prontos a cumprir a lei.
E isso que quero que se saiba em todo o País.
O orador não reviu,
O Sr. Ministro da Instrução (Xavier da Silva): — Sr. Presidente : começou o ilustre Senador Sr. Costa Júnior por me fazer referências elogiosas que muito agradeço. Essas referências estenderam-•se também ao Sr. director geral do ensino primário, e, a estas últimas, quero eu juntar as minhas porque, como Ministro, não tenho até hoje, até este momento, qualquer motivo para me arrepender de qualquer despacho dado sobre a informação daquele funcionário. O assunto em discussão é ainda uma confirmação das minhas palavras.
O Sr. Costa Júnior está mal elucidado sobre o caso. Mostraram-lhe um ofício de que S. Ex.a leu apenas a primeira parte porque, possivelmente, a pessoa que lho deu esqueceu-se de pôr nela a segunda parte, que eu lerei à Câmara ao momento oportuno.
Traía-se de dois professores que foram envolvidos numa sindicância por acusações de um inspector escolar.
Não conheço pessoalmente o inspector e não tenho, tam pouco, de fazer-lhe agravo ou insinuação alguma, porque não tenho motivos para tanto.
O facto é que esses dois professores, por efeito da sindicância, foram reintegrados no seu lugar pois não se lhes encontrou culpabilidade.
Eealmente houve um ofício, mandado às escolas e dirigido aos inspectores, delegando neles uma faculdade, a da elaboração dos horários. Era uma simples faculdade, o que quere dizer n2,o seriam eles as últimas pessoas a ser ouvidas ou a deliberar.
A direcção geral não abdicava dos seus direitos, podendo, sempre que o en-
sino o exigisse por conveniente, ou sempre que o julgasse útil, corrigir ou alterar esses horários.
Ora eu vou ler a V. Ex.as os documentos que revelam um caso muito estranho e curioso.
Sr. Presidente: o Sr. Costa Júnior disse que estes dois professores se dirigiram por vias ilegais ao Ministro da Instrução, sem que tivessem cumprido a ordem do director geral que manda que todos os professores se dirijam por intermédio da respectiva inspecção.
Que este abuso, a falta do cumprimento da ordem não foi punida, e, no emtanto, o inspector foi castigado por não ter cumprido outra da mesma direcção,
Vou mostrar como S. Ex.a labora num erro.
Queira S. Ex.a ouvir o requerimento que esses dois professores fizeram ao Ministro da Instrução.
Leu.
Vê-se que no mesmo dia em que esses professores regressavam à escola lhes modificaram o horário.
Continua lendo.
Quere d&er o horário foi alterado não para todas as escolas, mas somente para a escola destes professores.
Continua lendo.
O Sr. Costa Júnior (interrompendo): —
O Orador: — O Sr. Costa Júnior: — E de 9 de Maio. O Orador: — Mas. disse V. Ex.a que estes documentos são de 12 de Janeiro. Ora diz S. Ex.a: «a direcção geral a estes professores que se dirigiram directamente ao Ministro não lhes disse nada». Eu vou ler a V. Ex.as o despacho da direcção geral. Leu. Como V. Ex.a vê censuraram-nos imediatamente, consuraram os professores pelo seu acto.
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Sessão de õ e 9 de Junho de 1925
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O Orador: —Ê uma admoestação. Disse mais S. Ex.a:e a direcção geral que .mandou para lá um ofício em que nem sequer se lhes dizia qual era o novo horário. • .
Continua lendo.
Per aqui já S. Ex.a vê que ela lhes comunicou qual era o horário, das 10 ás 4.
O Sr. Costa Júnior:—,rV. Ex.a dá-me licença?
Não foi isso que eu disse.:
O que disse foi o seguinte: o horário começava às 10 horas e os professores como são obrigados a 6 horas de serviço. ..
O Orador: — Então descul-me Y. Ex.a mas não foi isso que entendi.
Continua lendo.
Depois diz S. Ex.a: «e portanto estes professores prevaricaram novamente ; tornaram-se a dirigir ao Sr. Ministro da Instrução sem ser por intermédio da ins-peção»,
Eu passo a ler a V. Ex.a o segundo requerimento.
Deste S. Ex.a não teve conhecimento.
Leu.
O Sr. Costa Júnior: — Esse requori-mente seguiu por Leiria, não foi pelas Caldas .da Bainha.
Orador: — É porque o inspector das Caldas cia Rainha está sendo sindicado pelo inspector geral e com frequência deixa as Caldas pai;a vir ato Lisboa.
O Sr. Costa Júnior:—éQue data tem esse requerimento, .pode-me V. Ex.a di-•zer? . . ..-.'.,
O Orador: — É de 12-de Maio. ,
. Estes professores em 12 ,dè Janeiro reclamaram à Inspeção Geral.
Em 14 de Janeiro foi enviado ao inspector o ofício para ele. modificar o horário, e elo não se.-importou com a ordem, não lha comunicando. ' !.
A 12 de Maio ainda -os professores reclamavam. • .•
Qiiere dizer, passaram .quási seis . me-sos sem ser cumprida- a -ordem da dire-ção geral onde só dizia que-às 10-hor.as
deviam começar as aulas e não às 9 e rneia como esse inspector deliberava.
Sr.-Presidente :• ainda agora o Sr. Costa Júnior afirmou que, talvez, o Sr. Director Geral não mo tivesse levado todos os documentos.
Eu tenho de fazer a afirmação de que S. Ex.a me levou todos os documentos, prestando assim justiça ao sou carácter.
' O Sr. Costa Júnior: —<_:Levou-lhe p='p' leu.='leu.' oste='oste' documento='documento' também='também'>
O Sr. Presidente: —Eu tenho que pro-venir o Sr. Costa Júnior que isto não é uma 'interpelação, o que temos de entrar na ordem do dia.
O Orador : — Se a Camará me desse licença, eu,desejava continuar á falar pnr-que se trata' da defesa de dois profes&o-.res e & justiça tem do fazer-se não só ;ios grandes mas também aos modestos funcionários.
Vozes: — Fale, fale.
. O Orador: — A Direcção Geral dizia:
Leu.-
N'o momento • cm que o requerimento foi feito estava nas Caldas da Eainha c inspector sindicante.
O.Sr. Costa Júnior: — Não
mandá-lo pela inspeção . . .
quiseram
O Orador:—E inuifo bem porque hnn-'ve um tetnpo em que este inspector esteve suspenso por .efeito da sindicância.
O'SK Costa Júnior:;—Mas negse tem-pp não estava.. • .' •
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. ,O-Orador:---Eusdevo dizer a V. Ex:s /que o. funcionário..em questão, inspector que eu aliás não .conheço, adulterou e.so-tíiegou-as ordens áç -seu superior hierár-. quico. -;•- .• •• i . • •• . • • :• "•-
- Deveria ter osso funcionário cumprido •a,-ordem da Direcção Geral, primora-'mente,"O*depois reclamava se ajulgj^.-e
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ordem t eomo persistiu na sua atitude an-terioc.
Qutanto à questão da acumulação, direi que. não, foi,eu que coloquei os professores da» escola primária superior nem tam pouco conheço a questão; essa imposição que S-.. Ex.a leu, ainda não foi trazida ao mea conhecimento.
Entretanto, antecipadamente digo que se continua em vigor a carta de lei de 1.908, acho muito estranho que professores tenham estado a receber os seus vea-cimontos, visando-lhes a contabilidade as folhas bem como o conselho superior de finanças. Em caso idêntico de acumulações estão o Sr. Queiroz Veloso que sendo professor é director geral do ensino superior, sucedendo cousa semelhante com o Sr. Costa Cabral.
Muitos outros funcionários acumulam.
O Sr. Silva Barreto (interrompendo): — Eu- condeno tais acumulações.
Uma fei há que permite que um dlrec-tar geral, um chefe de repartição do Ministério da Instrução, possa exercer o magistério e apareça nas1 repartições quando bem queira.
Aqui está a razão por que a Direcção Geral mandou aos professores da instrução primária, que, quando fossem professores das escolas primárias superiores, optassem por um dos lugares. Ora, só estes é que não optaram, quando há um despacho ministerial que os manda optar. S". Ex.* condena o inspector por que não. cumpriu uma simples ordem, e não condena os professores. £ Então V. Ex.a condena o inspector porque não cumpriu uma ordem do director e nâa condena o professor que não acatzrea a despacho ministerial de 19.22 impondo 01 dever de optaren? ? Eh, S&. Ministro,; não sabia que este assunto ia ser tratado nesta Câmara pelo Sr., Casta Júnior. Sfr quando S. Ex.a começou a falar s^bre-, ele é que lhe preguntei a que se referia e até lhe disse, que me parecia : que não tratasse da questão, visto haver um processo de sindicância pendente, e seria talvez melhor aguardar -que esse processo se concluísse para então se tratar . com o Sr. Ministro da Instrução e ver se realmente assistia ou não justiça ao inspector e aos professores. Mas, visto que se entrou na apreciação do assunto, eu preguuto a V. 'Ex.a o seguinte : A lei relativa ao ensino primário geral estabelece que os respectivos professores dêem G horas de aula por dia, devendo essas aulas começar às 9 horas; é Como é que podem dar 9 horas de aulas a seguir, somente com o pequeno intervalo que medeia entre umas e outras aulas ? V. Ex.a, que ó um médico distinto, compreende perfeitamente que isto é materialmente impossível. O Sr., Costa Júnior (interrompendo) : — r Se V. Ex.a me dá licença, vou ler a cir-'cular que ainda está em vigor. . Leu. O Orador: — ., . . E, no emtanto, o inspector, em Janeiro, mandava começar as aulas às 9,30, quando ela lhe dizia que começasse, às 10. do Sr. Silva Barreto. O Orador: — Sobre o caso a que se referiu o Sr. Silva Barreto eu devo dizer que o meu despacho é de 15 de Maio e o documento em que oúnspector faz as suas reclamações — e não ,as fez quando o director geral lhe mandou cumprir o horário — e nessa altura é que podia reclamar ; esse documento é de 29 de Maio. • De maneira que, como disse a V. Ex.a, não tive tempo de estudar detidamente o caso porqíie o assunto só hoje passou da direcção geral para as minhas mãos e ainda sem qualquer parecer.
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ORDEM DO-DIA
Entra em discussão a proposta de lei n.° 673. É a seguinte:
Artigo 1.° Aos actuais delegados do Procurador da República, cuja primeira -nomeação se tenha efectuado na vigência do artigo 110.° do regulamento do Ministério Público, de 24 de Outubro-de 1901, é -restituída a faculdade, que o mesmo artigo lhes conferiu e os decretos n.os 3:786, de 24 de Janeiro de 1918, e 3:950, de 16 de Março -do mesmo ano, revogaram, de renunciarem ao direito de candidatos à magistratura ju.dicial, podendo usar dela no prazo 'de trinta dias, a contar da publicação da presente lei.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em •contrário.
Posta à votação, foi rejeitada.
Entra em discussão o projecto de lei ».° 890.
Artigo 1.° É concedida-à viúva e filho, •emqnauto menor, do cidadão João Pinhei-TO Chagas, uma pensão mensal de 300$. sendo aplicável a esta pensão, par a. efeitos de melhoria, o disposto no artigo 2." ''o decreto n.° 10:250, de 5 de Novembro d 3 1924..
§ 1.° Logo'que o filho atinja a maior idade, a sua parte reverterá, para a viúva do referido João Chagas; e, no caso do falecimento desta, reverterá a sua parte-a favor daquele, emquanto durar a sua menoridade.
§ 2.° Esta pensão será paga a partir •da data do falecimento do referido João Pinheiro Chagas.-
Art. 2.° Igual pensão é concedida à mãe •do capitão de fragata João Fiel Stockler.
Art. 3.° E também concedida à viúva e aos tfês filhos menores do falecido jornalista António França Borges, D. Amélia França Borges, António França Bor-.ges, Maria Antónia França Borges e Eduardo França Borges, a pensão men--sal de 300$, à qual serão aplicadas as disposições do artigo l-°» e será paga a -contar da publicação da presente lei.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em •contrário.
Sala das Sessões da l.a Secção, 4 de Junho de 1925.—.0 Presidente, Francisco de Sales Ramos da Costa. — O Relator, Artur Costa.
O Sr. Ribeiro de Melo : — A Câmara • deve estar lembrada que no ano de 1924 ficou determinado, e por mais de uma votação, que o'Senado se oporia, não direi sistematicamente, .mas de um modo geral, à concessão de qualquer pensão.
Assim foi que ficaram por discutir várias propostas de pensão e entre elas, salvo erro. uma a favor.da viúva e filhos do falecido jornalista França Borges.
Eu desejava que V. Ex.a, Sr. Presidente, me informasse se em aditamento a esta proposta que agora se discute está um artigo concedendo pensão à viúva e filhos de França Borges e se na Secretaria, desta Câmara exis.tem propostas de pensão que não chegassem a ter-discussão por virtude da deliberação do Senado a que há pouco me referi.
O Sr. Presidente: -r- Esta proposta tem um artigo final concedendo uma pensão à viúva e filhos de França Borges.
Com respeito à segunda pregunta, só poderei informar V. Éx.a mandando pre-guntar à Secretaria o que há relativamente a propostas de pensões que o Senado não tenha apreciado.
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O Orador: — Não é preciso.
Voto contra a proposta em discussão, fiel ao principio que me tem levado, por mais de uma vez, a levantar a minha voz contra a concessão de pensões àquelas pessoas que, ^ou por via ministerial ou ainda por via partidária, foram consideradas como dignas de tais mercês.
A proposta em discussão refere-se também à viúva de João Chagas.
Não me parece que o Sr. João Chagas tenha vivido num estado -tal de pobreza que mereça dos cofres exaustos da Nação nma pensão para a sua. viúva.
Também não me parece, e nisso não» vai nenhuma manifestação de desrespeito pela' memória de João Fiel Stockler, de quem fui amigo' que esse oficial da armada tivesse -deixado a família na pobreza, pois ele devia ter o seu montepio, cuja cotização lhe era descontada nos seus vencimentos, a fim de acautelar o futuro da sua- viúva, se porventura era casado, ou o de sua:mãe e irmãs, se elas estavam a seu cargo.
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coes do prestar assistência a tantas e tantas famílias?
Ppr este andar, dentro de pouco tampo, todos nós outros seremos pensionistas do Estado.
^ Pode acaso continuar o Estado de braços abertos para conceder tantas e tantas pensões?
£Õomo é que o Estado pode equilibrar as suas finanças e dar boas contas dos negócios que lhe estão confiados se continuarmos desta maneira?
^Não tinha João Chagas, que foi um grande jornalista republicano e um dos maiores precursores da República, conhecimento de que a vida não 6 eterna, e não sabia ele que logo dobrado o cabo cios 50 anos, mais ano menos ano a morte nos espreita?
Segundo vejo nos jornais há um testamento feito por ele em que lega h saa viúva e filhos uma parte dos seus bens. Se lia, Sr. Presidente, um testamento, alguma cousa existe, e parece-me que havendo alguma cousa a dispor como seja a propriedade das suas obras, como é que o Estado vai acudir aflitivamente a essa família que parece não estar em condições de precisar do Estado uma esmola, que pensão não é outra cousa senão uma esmola?
^Pode o Sr. Ministro da Marinha informar-me se o Sr. João Fiel Stockler como oficial superior da Armada tinha direito a legar à. mãe determinada verba do seu montepio?
O Sr. Ministro da Marinha (Pereira da Silva) ('interrompendo): — ,;V. Es.adá-me licença ?
A pensão,que pertencia ao comandante Sr» João Fiel Stockler pode legalmente ir para sua mãe, mas essa pensão não é suficiente para garantir a decência e as •necessárias condições do vida a essa so-nhora, não estando ainda em relação com os serviços prestados por esse otiejal.
O Orador : — Muito obrigado, Sr. Ministro da Marinha, pelas informações prestadas.
Melhor procederia o Estado republicano se tratasse de actualizar as .ponsões a que têm direito as famílias dos oficiais do exército o da marinha no caso de morte inesperada como esta.
E desagradável, até mesmo ingrato para mim, que sou republicano, ter de pronunciar estas palavras, mas faço-o porque entendo que o Estado não está em' condições económicas e financeiras, sobretudo financeiras, de poder acudir à situação daqueles "ou das famílias dos que-não souberam a seu tempo acautelar devidamente o futuro.
Trata-se Sr. Presidente, de um homem, que foi Ministro plenipotenciário de Portugal em. Paris durante muitos anos, ^que-não aceitou um Governo inconstitucional sendo ssparado do serviço por esse actor mas que depois recebe integralmente todos os vencimentos como se estivesse no. lugar, dum homem —grande homem, não* pretendo deminuir o seu valor como precursor da Kepública, nem tenho sentimentos que me levem a fazer isso—que ocupou os mais altos cargos e que, ainda depois de deixar de ser nosso plenipotenciário em Paris, recebe como recompensa bera justa e merecida, um alto lugar re-muneradíssimo na Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses*; como é que-a dor nacional pode neste momento actuar sobre o nosso espírito para que concedamos uma pensão à sua família?
£ Quem nos. diz a nós quais as indagações que se fizeram, quais as informações que chegaram até à Presidência do Ministério, até junto do autor da proposta, • sobre o estado financeiro da família' do falecido Sr. João Chagas para podermos perante elas aquilatarmos comjustiça das necessidades que demandam a aprovação-desta proposta de lei?
Se porventura há alguém aqui dentro que conheça a sua situação financeira, que saiba que a família ficou com recursos insuficientes para se manter honradamente que o diga.
Emquanto o não fizer, emquanto a Câ>~ raara não possuir elementos para ajuizar-dessa situação" financeira eu negarei o-meu voto a essa proposta embora antecipadamente reconheça quo de nada vale o* meu procedimento, visto encontrar-me desacompanhado, sem que esta minha atitude revele qualquer má vontade contra o falecido que deve ser respeitado por todos os portugueses.
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°Se o Sr. Ministro da Marinha, que já -por -várias vezes tem assistido, e sobretudo no ano passado, a discussões sobre propostas de pensões tanto a civis como -a militares" e, salvo erro, pela pasta da Marinha, reconheceu que era insuficiente a pensão dum .oficial da aumada l°gada, jpela sua morte, à sua família, direito que 'devo ser respeitado por todos nós portugueses e sobretudo por todos nós republicanos, porque ó que até hoje S. Ex.a o "Sr. Ministro da Marinha não remediou o mal trazendo uma proposta de lei que actualizasse as pensões de modo a evitar a sua exiguidade?
O Sr. Ministro da Marinha não pôde ou não quis fazê-lo e vem agora a declarar-nos, que a pensão que de direito pertence à mãe do Sr. Fiel Stockler não chega para acudir às suas mais instantes necessidades.
Muito bem. ' .
Não seria então melhor sustarmos a discussão desta proposta de lei até que o Sr. Ministro da Marinha traga ao Congresso da República uma lei que remedeie, quanto aos militares, esta deficiên--cia de pensões?
Tratando-se de pensões às famílias dos .precursores da República ou daqueles que pelos seus grandes • actos o a pelos seus ..grandes gestos praticados publicamente se revoltaram com o ideal no coração .para proclamarem a República as minhas • .palavras podiam ser censuradas se porventura fossem proferidas em desatenção ~à proposta ministerial.
Mas não. É que a discussão destas pendões se tem misturado de tal forma quo nós temos aqui votado, como aliás o Congresso da República também o tem feito, pensões adrede, a troche-moche, única^ -e simplesmente para satisfazer a sentimentalidade piegas de um determinado número de pessoas e ainda para acudir, • de momento, a necessidades a que nem 'sempre se acode da melhor maneira, porque se não têm feito aquelas investigações .precisas e necessárias que habilitem a Câmara a conceder essas pensões única, e siiríplesmente a quem as mereça/ e sobretudo a quem delas necessite, ou esta-imos em presença do facto concreto para •o qual temos de olhar com o coração apiedado, sabendo que a família do Sr. .João Chagas está num estado de pobreza
e indigência quo carece da pensão do Estado. Neste caso o meu coração ainda não está tam endurecido que lhe recuse o meu voto. ;,
O Governo' está representado pelos Srs. Ministros da Marinha e do Comércio; eles devem estar habilitados a dizer à Câmara se na ocasião da confecção desta proposta de lei íoram feitas as investigações necessárias, colheram-se todos os informes de modo a poder de cabeça levantada pedir aos seus concidadãos representados nas casas do Parlamento por nós, uma pensão para a família de João Chagas. Se é para armar ao efeito, se é para se dizer que mais uma homenagem é prestada à memória do ,Sr. João Chagas — e tantas lhe são devidas ainda — desde que se não reconhecesse a necessidade imperiosa da sua família ela não podia ser concedida com decoro, ombridade e nobreza. . "- •- O Sr. João Chagas, saberia, se vivo fosse, repelir este benefício do Estado Português porque, a sua família, tem meios para se sus tentar,1 não carece do auxílio do Estado. Ainda me lembro de, em criança, ouvir falar nos oficiais de galão branco que vieram do constitucionalismo e caminharam pela vida além, durante muitos anos, fazendo parte do exército português. A República, para em tudo sjer igual ao constitucionalismo —não ao constitucionalismo alevantado e nobre de Mousi-nho da Silveira, por exemplo, mas ao constitucionalismo de muitos Presidentes • de Ministério que têm merecido as mais cruéis alusões— lembrou-se de, na primeira sessão das Câmaras Constituintes, declarar beneméritos da Pátria todos aqueles que contribuíram para a'proclamação, da República, isto da maneira mais vaga e mais descabida que' se podia ter feito e numa hora em que a Eepública estava gloriosamente abraçada à consciência1'da nação.
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lecção dos verdadeiros beneméritos da República, daí veio essa legião enorme de revolucionários civis que têm sido reconhecidos pelo Parlamento e que o Parlamento ainda há-deo reconhecer em maior escala para ficar bem com os seus Srenti-mentos de justiça.-
0 homem que se chamou Almirante Cândido dos Eeis soube dar cru exemple aos revolucionários de fancaria que. metendo-se em revoluções, não têm -a coragem e força moral precisa para procurarem o remédio para a sua situação no cano da sua pistola.
O Almirante Cândido dos Eeis, julgando vencido o movimento revolucionário, cumpriu a sua palavra porque, horas antes, tinha dito àqueles que não confiavam no triunfo da revolução que assumia a responsabilidade do movimento sob pena de dar um tiro nos miolos.
O Almirante Cândido dos Eeis, na, avenida que hoje tem o seu nome e que então tinha o nome de avenida D. Amélia, sacou da arma e porque era leal e um verdadeiro republicano como visse perdida a causa republicana desfechou a sua pistola no ouvido e desaparece do convívio de todos os seus admiradores e correligionários, ^^lma aquela que podia servir de travão a todos os latrocínios dentro da própria Eepública e dos grandes desvarios dos próprios republicanos.
Eu, Sr. Presidente, entendo que tendo o Senado aprovado uma pensão à f r. ruí lia do almirante Eeis, bem como aquela concedida ac médico Miguel Bombarda e a tantas outras que poucas horas antes da implantação da Eepública perderam a sua vida, não fez mais do que praticar um acto de justiça.
* Nós, nas Constituintes e depois outros legisladores, votámos para todos os hor mens que contribuíram para a implantação da Eepública uma pensão.
Sr. Presidente: chegou o momento em que uma figura' grande da revoluj£o de 31 de Janeiro, e que também na revolução de 5 de Outubro ocupou um lugar de destaque, desapareceu do número dos vivos.
O G-ovêrno apresentou uma proposta de pensão de estado pcira a sua viúva e filhos órfãos.
As circunstâncias em que o Governo da Eepública apresentou ao Congresso
esta proposta não são precisamente as mesmas e idênticas àquelas em que nas-Constituintes se votaram aquelas pensões que há pouco citei,- nessa altura não podemos averiguar se a fortuna pessoal do almirante Eeis permitia ou não que o Estado acudisse às necessidade da sua família, porque dava-se como una preito de-homenagem da nação republicana ao homem que fora o expoente máximo da revolução de 3 de Outubro de 1910.
Era por -assim dizer uma homenagem praticada em nome daquelas virtudes cívicas do Sr- almirante Cândido dos Eeis, e nunca por .averiguarmos se a sua íamí-lia estava ou não em condições de poder espsrar do Estado um auxílio.
Agora o caso ó diíerente: vamos acudir ao estado da família.
Se é isto, abençoado sentimento este do Govôrno republicano, que acode com 'o sou dinheiro aos necessitados e aflitos.
Mas, se não é, e disso receio eu muito, não me capacito de' que possa efectivamente haver um alto funcionário da Eopú-blica ao qual não faltariam jamais os amparos e auxílios do Estado que depois de uma longa vida deixa a família mergulhada na maior indigência e miséria.
<_:_ p='p' rontra='rontra' votando='votando' deminuímo-nos='deminuímo-nos' nós='nós'> Não, Sr. Presidente, só nos engrandecemos, só abraçamos bem o ideal democrático quando o ncsso voto é seguro e certo de que vamos acudir à miséria, à fome num lar que em quanto.foi vivo o seu chefe foi feliz e ditoso. Mas. Sr. Presidente, palavras leva-as o vento, e ou gostaria que, sem o sopro frio ds. campa do Sr. João Qhagas, as minhas palavras ficassem vinculadas nos anais cesta casa do Parlamento, sem sombra do menor desrespeito, da menor desconsideração para com o homem que em vida só chamou João Chagas.
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sisto nelas, ó porque reconheço, Sr. Presidente, que não se fez o necessário inquérito que se impõe em todas as questões-de ordem pública que obrigasse os Governos, como os parlamentares; como até aquelas pessoas que têm a seu cargo a defesa dos dinheiros do Estado torna necessária, que de certo .-modo dissesse à Câmara que efectivamente era necessário-mais para1 mitigar a fome que espreita O' lar da família de João" Chagas e Fiel-Stockler que como um rasgo de homenagem a prestar à memória de João Chagas e Fiel Stockler, o quási desconhecido da intelectualidade da •Najão, porque era um grande republicano, mas um modestíssimo oficial da armada.
João Chagas foi tudo quanto quis' dentro de Portugal.
Como - jornalista foi efectivamente dos mais brilhantes e não''é este o momento de íazer o seu panegírico porque ele foi feito e tam superiormen-te pelos representantes dos partidos que têm assento-no Senado que a minha pálida palavra mal ficaria ao lado das proferidas por esses meus dignos Pares.
E se eu então não me levantei para lhe prestar ,a minha homenagem como cidadão e republicano é porque entendo que se deviam separar as homenagens a prestar: de um lado dois nomes, um, precursor da República, „ revolucionário de 31 de Janeiro, outro, alma .revolucionária de 5 de . Qutubro; do outro lad Esta-é que era a homenagem simples e pura dos espíritos republicanos. As homenagens -aos precursores da República aparte com todo o .brilho e grandeza, porque só assim- nós perpetuaríamos a sua memória, pasmando da cidade para o campo e para a província o respeito por estes dois grandes mortos. " Mas não se fez assim. • E isto não é censura, é apenas um ligeiro reparo que eu faço e que agora tem mais cabimento do que se porventura fosse levantado nessa sessão comemorativa. ' Lembro-me, Sr. Presidente, porque fui dos habitues • das galerias das duas casas do Congresso, que toda a vez que se per- petuava a memória dum grande morto, que' 'fora grande- cidadão ou alto funcionário, que, pelas suas virtudes cívicas, tivesse realmente registada a sua passagem pelas secretarias do Estaúo, uma folha de serviços digna . de comemoração nacional, essa comemoração era feita com tal elevação e" tal grandeza que nós, os assistentes, ficávamos sabendo bem a vida inteira que esses homenageados tiveram e íamos lá para fora transmiti-la aos nossos amigos. • Mas, Sr. Presidente, a hothenagem prestada pelas Câmaras a esses dois grandes republicanos, um1 representante do 31 de Janeiro e outro1 do 5 de Outubro, foi pode dizer-se, uma -manifestação empoçada, sem a elevação nem a grandeza devidas 'a esses- homens. Ainda se as investigações feitas pelo Governo nos indicassem que as famílias das pessoas a que me retiro estão num estado de pobreza que carecem do auxílio do Estado,' compreendia-se uma proposta desta natureza. £ Pode o Sr. Ministro do Comércio, que naturalmente assistiu ao Conselho de Ministros em que o Sr. Ministro das Finanças levaria a sua proposta, dizer-nos se a laboração dessa" proposta foi .decalcada nas informações recebidas de pessoas de reconhecida idoneidade, dizendo que a família do malogrado -João Chagas tinha -ficado em condições financeiras precárias? • ' ' ';> Ou não estaria o Sr. Ministro do Comércio presente a esse Conselho de Ministros,1 e por 'acaso • estaria o seu colega da Marinha,' e teria ouvido ou tomado •conhecimento das informações dadas ao Sr.. Presidente do'Ministério? • O Sr. Ministrchda Marinha (Pereira da Silva): — O Sr. Presidente do Ministério declarou na Câmara dos Deputados que a 'viúva de João Chagas ficava em precárias circunstâncias, e se o disse ó porque tinha as necessárias informações parajus-tificar essa pensão.
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11 Fí o é de S. Ex.a, mas que foi colhida no (Socorrer das considerações que fez o Sr. IVtísidente do Ministério no acto da apresentação da sua proposta de lei.
Se assim ó, eu dou por findas as minhas considerações. Mas, Sr. Presidente, mio envolvendo isto menos respeito pela informr.ção que acaba de ser dada pelo Sr. Ministro da Marinha., eu atrevo-me a formular o seguinte requerimento:
«Roqueiro que à Câmara do Senado sejam concedidas as informações a que procedeu o Sr. Presidente do Ministério e-Ministro das Finanças, como autor da proposta de lei «m discussão a respeito do estado financeiro da viúva e filhos do malogrado cidadão João Chagas, e eu aguardo essas (informações, que devem s -r compulsadas por todo o Senado, suspendendo-se a discussão desta proposta».
Não digo o mesmo em relação à proposta do pensão à família de João Fiel Stockler, porque já sei que a pensão n que a família têin direito é muito exígua o não garante a subsistência da mãe e irmã do malogrado oficial. Mas, para que se não possa fazer especulação com o caso, en incluo esta proposta relativa a Fiel Stockler no requerimento que acabo de apresentar à Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
'• O Sr. Artur Costa: — Sr. Presidente: começo por declarar que rejeitei o requerimento do Sr. Ribeiro de Melo para que se suspendesse a discussão desta proposta de lei, não só porque o Sr. Ministro da Marinha já tinha informado a Câmara acerca do assunto que levantou os reparos de S. Ex.a, mas também porque, tendo o Sr. Presidente do Ministério apresentado esta proposta de lei à Câmara, nós temos obrigação e o dever de acreditar que S. Ex.a o fez depois dê ter ponderado as circunstâncias das famílias dos ilustres republicanos a quem foram propostas as pçnsões.
Acompanho, até certo ponto, as considerações do Sr. Ribeiro de Melo.
Efectivamente era bem necessário que os homens públicos que ocupam situações de destaque e prestam serviço à República, ao mesmo tempo que os prestam, se
lembrassem um pouco do futuro das suas famílias, criando-lhes seguros de vida, montepios ou qualquer outro meio de garantia, de forma que .soubessem que, depois de mortos, as fainilias não ficavam em circunstâncias precárias.
Era isso o que desejava, "c faço os maiores votos para que o Governo ou o Parlamento estude uma providência que ponha termo a estas dificuldades, e que não nos obrigue a ter de' votar pensões às famílias de cidadãos que prestaram serviços à Pátria o à República.
Nós estamos em face de factos concretos, estamos em face de situações que não têm solução alguma senão esta que foi ' proposta.
O Sr. Ribeiro de Melo discutiu já largamente a situação em que, porventura, S. Ex.a supôs que estavam as famílias dos falecidos republicanos João Chagas o Fiel Stockler.
Eu não fui fazer investigações sobro a situação económica em que se encontram essas famílias, porque entendo que não é a minha função, e ainda porque entendo que é muito melindroso, que é, até certo ponto mesmo, um pouco tocante que nós, os parlamentares, queiramos inquirir ^se uma ou outra família de mortos ilustres tem ou não o suficiente, ou mais do que o suficiente, para poder viver.
Estou bem certo de que p Sr. Presidente do Ministério colheu discretamente, sim, mas colheu, as informações necessárias para poder apresentar a proposta de lei concedendo uma, pensão à viúva e filho de João Chagas — que é a única do iniciativa ministerial — porque a proposta relativa à pensão à mãe de João Fiel Stockler surgiu da Câmara dos Deputados e íoi apresentada por um Deputado nacionalista, sendo acolhida por toda a Câmara, sem excepção, porque a respeito desse republicano não havia dúvida nenhuma sobre a sua fortuna.
O Sr. Ribeiro de Melo fundamentou as suas considerações a respeito da pensão à família de João Chagas no facto de esse grande jornalista ter deixado no testamento que legava a sua esposa a parte de que podia dispor: a metade da meação.
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acentuar, de propósito, para esclarecer o -assunto: é aquela em que João Chagas diz que deixa a sua esposa a sua casa e a propriedade literária das suas obras à sua família.
Por informações que tenho e que eu não garanto, quando João Chagas escreveu a palavra «-cltsa» não se referiu à palavra «prédio», mas simplesmente ao re--cheio da sua casa.
Eu, infelizmente, vivo em uma, casa arrendada, mas, se amanhã tivesse de.fa--zer o meu testamento, diria também a «minha casa». "
João Chagas não teve, com certeza, muito tempo para fazer fortuna no lugar •que exerceu em Paris-
Em primeiro lugar —e bem o sabe o Sr. Eibeiro de Melo. visto sor também diplomata— porque os diplomatas portugueses não são os mais bem pagos de todas as nações, pois que têm despesas de representação muito importantes, a que não podem fugir, o todos nós sabemos -que a nossa legação em Paris exige largas despesas.
Poderia, talvez, João Chagas ter acumulado algumas centenas ou alguns milha-Tes^de francos. o
E possível, mas certamente que essas 'economias não foram era quantidade suficiente para que a família possa . vi-~ver.
Relativamente à pensão à mãe de João Fiel Stockler, ainda ontem, na sessão da 'Secção em . que, se discutiu este assunto, •eu ouvi dizer ao Sr. Ribeiro de Melo que •essa senhora vivia há muito de um auxílio directo desse republicano.
Essa senhora já deve ser de avançada ;idade, e por isso não me parece que. nós devamos continuar a esmiuçar esse assunto.
O Sr. Ribeiro de Melo foi informado, creio eu, pelo Sr. Herculano Galhardo de que, por proposta da Secção, tinha .sido acrescentado .um artigo à proposta, vpelo qual é concedida uma pensão à viú-•va e aos três filhos de França Borges.
Não discutiu S.. Ex.a esse aditamento •e sei bem que não o fez por menos consideração pela memória de França Borges, mas sim porque, em relação aos presumidos haveres de França0 Borges, não havia duas opiniões eni Portugal.
França Borges, que viveu durante anos dentro de um jornal que fundou, viveu sempre com muitas dificuldades (Apoiados), e tantas eram elas que, em muitos sábados, França Borges teve necessidade de empenhar -os seus anéis ou outra$ jóias, quando as tinha, para pagar aos empregados desse jornal.
Republicanos houve que prestaram algum auxílio ao jornal que França Borges fundou, O Mundo, mas a verdade é que a situação desse jornal foi sempre q, inais aflitiva.
Apoiados.
Não qbstanto, França Borges nunca pediu nada à República.
Apoiados.
Tendo combatido no seu jornal o subsídio aos parlamentares, quando a Constituição da República estabeleceu que os Parlamentos recebiam subsídio, França Borges nunca a recebeu.
Apoiados.
No final da sua vida, França Borges foi aconselhado a ir procurar alívios à doença que o minava, na Suíssa, mas, lembrando-se que tinha três criancinhas, além do sua mulher, França .Borges respondeu um pouco secamente que não podia ir para a Suíssa, porque não tinha os fundos suficientes para fazer esse tratamento.
Foram-lhe oferecidas algumas importâncias pelo« amigos, não dadas, mas emprestadas, e França foi para a Suissa, deixando à família um jornal que vivia aflitivamente e 'algumas dívidas, a última das quais foi contraída pelo tratamento naquela República.
Por tudo isto, eu digo que, se há pensão que seja justa, é esta a conceder à ,familiâ de França Borges, pois que se todos os homens públicos e, .em geral, todos os cidadãos devem preparar o seu futuro e o das suas famílias, França Borges foi, talvez, daqueles que não pôde atender ao futuro dos seus filhos, porque ele não podia sequer fazer face às despesas do seu jornal.
Sr. Presidente: entendo que devemos votar as pensões às famílias desses três republicanos.
Eles ficam bem ao lado uns dos outros, porque bem trabalharam e se sacrificaram pela República e pela Pátria.
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O Sr. Joaquim Crisóstomo: — Sr. Presidente : coerente com os princípios que tenho sustentado, não voto o projecto de lei em discussão.
Assisti às homenagens prestadas pelo Senado à memória do grande republicano que foi João Chagas.
O meu silêncio representou uma anuência a tudo quanto se disse em abono desse grande patriota. Mas de nós reconhecermos as grandes qualidades de republicano, as inexcedíveis virtudes cívicas de João Chagas, ato ao ponto de votarmos de olhos fechados, sem conhecermos o que votamos, uma pensão à esposa, vai para mim uma grande distância.
Sempre combati todos os projectos de lei concedendo pensões.
Fiz apenas excepção para as viúvas de António Granjo, de Carlos da Maia e de outros, atenta a gravidade da situação das suas famílias e da ca.usa que determinou as suas mortes, e mais porque, quando votei ossas pensões,' identifiquei-me com a vontade nacional, quando lhe dei o meu voto não fiz mais do que integrar-me no modo de pensar da nação, que eu desejo sempre traduzir.
Perante o projecto do lei que agora se discute, o caso muda absoluta e inteiramente.
O Congresso da Kepública faz leis, no ponto de vista constitucional, mas as leis surgem dos costumes, dos hábitos, das tendências.
Para que uma lei constitua um verdadeiro diploma, uma verdadeira regra para as questões sociais, é necessário que a corrente da opinião pública a perfilho, a adopte ou a peça.
Até aí há somente a vontade do Parlamento, mas nunca há a consagração de uma aspiração nacional. 1 Eu, representando o país, sou obrigado a identificar-me com o seu pensamento, Com os seus sentimentos e com a sua acção.
Se porventura se tivesse levantado na imprensa, nos comícios, • nas associações, ou por qualquer forma onde se manifesta a actividade humana, uma corrente de opinião no sentido de ser concedida uma pensão a qualquer das famílias a que -este projecto de lei se refere, embora tivesse de transigir com a minha opinião pessoal, eu tinha que sancioná-la e que a votar.
Mas morreu João Chagas e no dia seguinte decreta-se que os seus funerais-fossem nacionais e que O dia do 'seu enterro fosse considerado de luto nacional, não deixando que a opinião pública se manifestasse sobre a forma como se devia consagrar esse morto ilustre. E é agora o Sr. Presidente do Ministério que vem apresentar uma proposta de lei à Câmara dos Depatados e neste momento ao Senado estabelecendo uma pensão a favor da viúva e filão de João Chagas.
Afigura-se-me cedo de mais porque não-há provas, não há indícios, não há elementos para que nós possamos julgar, aquilatar ou avaliar das condiçfies de fortuna em que ficou a viúva desse, como já. disse, grande patriota.
É cedo demais para nos pronunciarmos.
• Esto projecto não passa de um projecto de afogadilho.
Aproveitou-se o momento ,de estar a opinião pública sobre a impressão de uma morto, para se vir pedir uma pensão, embora simpática, mas discutível no momento ,
Não está o País em condições de dar alimentos e pensões a ninguém porque tem o seu orçamento bastante desequilibrado,
Disse o Sr. Artur Costa que tinha melindres em entrar na averiguação de saber se a viúva ficava em boas ou más condições. .
Eu não penso como S. Ex.a Eu aqui sou representante do País, sou Senador e-tenho o dever de defender os interesses-do Estado.
' Tenho, pois, o direito de investigar para formar o meu juízo, e depois proceder de-harmonia com a minha consciência.
Sabe-se que, quando morrem homens que o supriram lugares de destaque, imediatamente se sabe as condições de fortuna,
• Até hoje ainda ninguém, absolutamente-ninguém, me disse nem li em nenhum jornal qae a situação de João Chagas ao-tempo da sua morte era precária.
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Quanto vale a sua casa no Estoril?
Dêmos de barato 100 contos.
Das suas obras, podem vir por exemplo 400 contos.
Fica assim a viúva com uma fortuna conhecida de 500 contos.
É pouco?
Sim, para quem tem 30:000 ou 40:000 contos é uma insignificância, mas, para uma pessoa que queira viver modestamente, já ó o suficiente.
Demais, dizem os livreiros que as suas. obras já publicadas e ainda as inéditas devem orçar por um valor aproximado a 800 contos.
Será exagero, mas o que é certo é que perante estes factos esta pensão representa uma liberalidade para com uma pessoa °quo a não necessita.
O Si?. Presidente do Ministório, se es- . tivesse presente, podia fornecer-nos alguns elementos do informação que nos habilitassem a votar com consciência este assunto, mas antes do termos esses elementos não a podemos votar com a convicção do que olhamos aos in-terêsses da Nação e merecemos a confiança daqueles que nos confiaram o mandato para nóá dispormos dos dinheiros do Estado-
Em primeiro lugar, há que averiguar se a viúva de João Chagas tem ou não recursos para viver modestamente, e, no caso de se nrovar que esses recursos são muito insignificantes, então vamos a vo-tai^essa pensão.
Este sistema das pensões já não é de hoje, vem do longe.
Um dos primeiros actos da Constituinte foi votar uma pensão a Machado Santos, e êlc aceitou.
As pensões estão nas tradições ,da República.
Mais duma vez tenho ouvido censurar violentamente e com absoluta razão a pensão concedida nessa data a Machado Santos.
Pensões são uni favoritismo quando concedidas àqueles que delas não necessitam, e foi tanto, maior esse favoritismo quando menos necessitam delas os quo recebem. ' . ' -
Nos outros países, especialmente na França e na Itália, que têm pontos de contacto connosco, quando se pretende homenagear um homem público depois da sua morte, não é concedendo pensão às
famílias que se procede, não ó distribuindo dinheiro do Estado, cão é agravando a situação do Tesouro.
Um ilustre republicano, que fez parte das Constituintes, o Sr. Nunes da Mata, escreveu Jhá pouco tempo um -livro em que dedica um. capítulo-especial às pensões. • .
Demonstra aí à evidência que, durante os tempos em que exerceu as funções parlamentares, recebeu centenas de cartas de pessoas .que invocavam os seus serviços à República, a fim dele apresentar projectos de pensões às suas famílias.
Faz também uma exposição de figuras notáveis francesas e italianas que morreram em circunstâncias precárias, sem que . os respectivos Estados tivessem concedido pensões algumas.
Pelo contrário, prestaram-lhes grandíssimas homenagens por meio de sessões .solenes em academias, teatros, reuniões, pondo os seus nomes em ruas, orguendo--Ihes cstátua"s, etc.
Ora diz-so quo o Sr. João Chagas em. vida não ganhava o suficiente para fazer largas economias.
São apenas conjecturas, porque há pessoas que ganham pouco e economizam inuito, o outras que, ganhando muito, desbaratam muitíssimo.
Isso dependo das regras do economia que houvessem adoptado e como elas fazem parte da vida particular e íntima dês-se republicano ilustre, nós não temos possibilidade alguma de aquilatar das suas condições do fortuna, estamos portanto, em presença de uma mera hipótese : ^João Chagas morreu rico, morreu remediado ou morreu pobre?
Cre:o que, nesta assemblea que se compõe de tantos membros, alguns dos quais tiveram relações pessoais com João Chagas, não há uni único quo espontaneamente nos venha dizer-que esse homem, nos ulmos tempos, lutava com dificuldades, não podendo a viúva ter uma existência livre de quaisquer preocupações.
Poder-se há dizer:'trata-se'de uma manifestação, apenas, pelo seu grande valor, trata-se duma afirmação de simpatia e consideração pelo seu nome.
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natureza, e todas elas, para mim, valerão mais sob o ponto de vista nacional do que. uma pensão de alguns milhares de escudos anuais à sua viúva.
Piá, Sr. Presidente, uma outra pensão à mãe do Sr. Fiel Stuckler.
Estamos, parece-me, nas mesmas circunstância? em que estávamos em relação a João Chagas.
O Sr. Álvares Cabral:—Não apoiado.
O Orador:—Estou nas mesmas circunstâncias ein que estava, quando falava a respeito de João Chagas.
Eu ouvi dizer ou, por outra, sei quê o Sr. Fio] Stockler foi um dos revolucionários do 5 de Outubro.
De então para cá perdi de vista o Sr. Stockler e se porventura S. Ex.a prestou, relevante* serviços à causa republicana, no dia 5 de Outubro, é certo que posteriormente se isolou dessa causa.
O Sr. Ribeiro'de Melo:—Isolaram-no.
O Oradcr: — Eu sei. como V. Ex.a e a Câmara sabem, que há republicanos IQUÍ--to ilustres e históricos, do tempo da propaganda, que, depois do 5 de Outubro, continuaram a acarinhar a sua idea republicana, continuaram a prestar todo o seu valimento, todo o seu trabalho a favor das novas instituições.
Desnecessário seria citar nomes.
Posso, por exemplo, citar o nome de V. Ex.a, Sr. Presidente, do Sr. Aronso Costa, do Sr. Brito Camacho, do Sr. António José de Almeida o tantos outros.
Mas o Sr. Fiel Stockler nunca m&iis tornou a figurar como uma pessoa de destaque nos meios republicanos, ocupando postos importantes ou prestando serviços de grande nomeada que lhe dessem direito, não digo já à consideração nacional, mas pelo menos a despertar na opinião pública o interesse pela sua individualidade.
Nestas circunstâncias seria justo que se dessem pensões às famílias de todos aqueles que figuraram, que pegaram em armas, que se colocaram ao lado dos revolucionários do 5 de Outubro.
Parece-me que esses motivos teriam de ser muito grandes e que o Estado Português não está em condições monetárias
de poder favorecer as famílias daqueles-que no dia 5 de Outubro combateram a Monarquia e se puseram ao lado da República.
^Esta pensão à mãe do Sr. Fiel Stockler será por motivo do S. Ex.a ser um oficial de marinha qne ocupava um lugar dos ds maior destaque aessa ocasião?
A lei é igual para todos. Se a lei reconhece e favorece segundo os méritos de cada um havendo de dar uma pensão à mãe do Sr. Fiel Síockler, suponhamos de 100)5!, nós tenhamos de dar também pensões a muitos milhares de viúvas e filhos órfãos daqueles que se sacrificaram em 5 de Outubro, em vez de 100$ seria 30$, 40$ ou 50$, conforme a sua categoria.
Sr. Presidente : uma lei deve ser sempre feita com carácter geral, não deve ser feita para se dar uma pensão ao rni-tar JL ou B, deve ser para todos aqueles que se julgarem à sombra dessa lei.
Há tempo, a Câmara votou um projecto concedendo pensões às famílias das autoridades públicas, dos médicos sanitários e de tantos outros funcionários que exercem profissões arriscadas.
Estilemos todos de acordo quanto aos funcionários policiais, apenas discordamos quanto aos de saúde, mas o que é certo é que se fez uma lei; foi votada e publicada; hoje regula em todo o País.
Para pensões desta natureza o que há a fazer também é uma lei geral, para que não se estaja to aos os dias a, pedir pensões, umas muito justas mas que o Estado não pode pagar, e outras que são muito discutidas e que ainda muito menos o Estado pode pagar.
Ora, se eu entendo que a pensão relativa a João Chagas não tem razão de ser, também entendo que a pensão à mãe de Fiel Stcckler não tem razão de ser.
Penso de forma diversa quanto a Franca Borpes.
Apoiados.
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blica e ao País com mira numa compensação, e grande, não tem nenhum valor ou importância para mim. Isso suo serviços mercenários, e eu só aprecio serviços ' desinteressados.
_ Têm-se votado, com prodigalidade, pensões a desenas de pessoas, muitas delas que não precisavam, outras que precisavam mas que não tinham razão para as receber e, entretanto.,. tem sido posta de parte a pensão a favor da família de França Borges.
Ontem fiquei surpreendido ao ler uma carta a esse respeito, do Sr. Germano Martins, publicada no Diário de Noticias, porque supunha que já tinha sido concedida essa pensão por ter tido notícia de que havia sido apresentado na Câmara dos Deputados um projecto nesse sentido. Só há alguém com razão e justiçaaquem se deve dar uma pensão ó à viúva e às filhas de França Borges.
França Borges teve uma vida.arrisca-• da e de trabalho pela República e, se João Chagas, depois da implantação deste
'.regime, prestou serviços, não deixou também de os prestar, até pouco antes de morrer, França Borges, e todos esses ser-
- viços foram prestados desintoressada-mente. Mais: de, uma vez França Borges escreveu no Mundo que ainda não tinha recebido um -único favor das novas instituições nem um único ceitil dos cofres do Estado.' ' • .-.-•.
° Quando toda a gente, no dia 6 de Outubro ie 1910, enchia os Ministérios a pedir empregos, a f.azer pressões e coacções no sentido de vagarem lugares "para os irem ocupar, quando, muitos invocavam a circunstância de terem gasto .dinheiro -na propaganda republicana, para se. imiscuírem na administração da Re-
. pública e irem .ocupaf lugares para que, na maioria, não tinham competência, França Borges continuava no seu jornal a perder dias e noites em trabalhos de propaganda no propósito de que a- República fosse consolidada e se tornasse querida e estiniâda pelo povo.
Embora eu, pelos meus princípios, não vote esta pensão, aceito-a e estranho que há mais tempo não. se tivesse votado sendo para isso necessário que aparecesse num jornal uma carta do Sr. Germano Martins e no Senado aparecesse a figura categorizada do Sr. Artur Costa a lem-
brar a situação daquela senhora e de suas filhas. • T
Por isso, Sr. Presidente, eu tenho pena de que no mesmo projecto se reunam três pessoas a quem se quere dar pensão: João Chagas, Fiel Stockler e França Borges, porque, se à primeira vista pode parecer que França Borges vai a reboque^ de João Chagas, eu entendo o contrário; .que João-Chagas é que vai a reboque de França Borges.
Isto no campo dos princípios verdadeiramente republicanos. ,..
Estou convencido de que o Senado vota o projecto na generalidade e na especialidade. Não me proponho levantar-lhe obstáculos.
Se uso- da palavra por largo tempo é porque desejo frisar pontos de doutrina, fazer afirmações concretas, definir situações, .e, muitas vezes se me é permitido reduzir as minhas considerações, é certo - que em muitos casos se me afigura mais proveitoso dar-lhes o desenvolvimento que se coaduna com o meu modo de pensar.
Vou terminar dizendo o seguinte: Concordo com a opinião do Sr.'Ribeiro de Melo quanto a sustar-se a discussão deste projecto, para que o Presidente do Ministério venha aqui dar sobre elo as suas explicações, não por, mim, porque S. Ex.a não mo convence, apesar da muita consideração que tenho por si, porque em certos pontos de doutrina eu sou irredutível, mas para que o País possa melhor apreciar a discussão do Senado.
Nós aqui julgamos, mas' lá fora somos julgados, e, para que as instituições parlamentares se prestigiem, é necessário-que o País .concorde com as suas delibé?-rações, as aplauda e as aprove.
O País muitas -vezes está silencioso, fingindo que dormita, ínas está acordada e o pior é que .muitas "vezes expande-se demasiadamente. E, para que* o País fosse bem informado, para que ele pudesse avaliar da justiça com que procedemos, conviria que o Sr. Presidente do Ministério aqui viesse fazer .um relato da situação das pessoas a quem a pensão aproveita. . . O orador não reviu.
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•que a sessão seja prorrogada até se votar «sta proposta.
Q Sr. Ribeiro de Melo:'—Vejo-me constrangido a discordar do requerimento, do "Sr. Artur Costa.
Se bem que desejasse usar da palavra •sobre a generalidade, mais uma vez única •o simplesmente paru informar S. Ex.a a, algumas consas que me parecem que devem sor ponderadas pela Câmara do Senado, nós sabemos que a praxe de V. Ex.a, Sr. Presidente, ó levar a prorrogação "da sessão ato ii hora regimental, encerrando cni seguiria a sessão o que nos priva do usar da palavra.
Tenho dito.
Foi aprovado o requerimento do Sr. Artur Costa.
O Sr. Pereira Osório:—Sr. Presidente: é com muita mágoa e tristeza que eu entro neste assunto levantado pelo nosso ilustre colega o Sr. Ribeiro de Melo.
Esperava que daquele lado da Câmara se levantasse esta questão, esta oposição à, proposta em discussão, mas não que fosse o Sr. Ribeiro de Melo, velho republicano que aqui está sempre defendendo com calor inexcedivel os republicanos.
É estranho que ainda numa sessão de há dois dias ou três, se homenageasse duas das figuras a que se refere esta proposta, e agora por uma questão que parece insignificante se venha deprimir os efeitos dessa justa homenagem.
O Sr. Ribeiro de Melo (em aparte):— Não apoiado.
O Orador:—Não é que esta proposta não po^sa ser discutida, mas é que eu •entendo que o Sr. Ribeiro de Melo só-o podia fazer se viesse à Câmara munido de elementos para dizer: esta proposta com relação ao Sr. João Chagas o a ao Sr. Stockler, ou aos dois em conjunto, não deve ser aprovada porque a família ficou com meios para viver.
Não devia vir fazer proguntas ao Governo, porque devemos fazer-lhe a justiça de que se apresentou esta proposta, foi por estar convencido, como realmente o está, de que as famílias das pessoas visadas niÀo dispõem de rneios.
O Sr. Artur Costa (interrompendo): — V. ,Ex.a da-me licença?
E simplesmente para um esclarecimento.
Na Câmara dos Deputados o Sr. Presidente do Ministério manifestou-se do acordo com a pensão à íamília do Sr. Stuckler o ontem na secção do Senado concordou que fosse incluída nesta proposta a pensão à família do Sr. França Borges.
O Orador: — Estranho bastante que S. Ex.a viesse trazer estes íactos deploráveis que. a todos nó*s, os velhos republicanos, nos colocam mal sem, ao mesmo tempo, trazer os elementos necessários para assim poder fundamentar as suas afirmações.
Ora, ea devo dizer que do testamento se não pedem tirar conclusões de que ele deixasso fortuna.
Não tinha casa, pois vivia em casa alugada, mas admitindo que a casa fosso dele, eu pregunto: ",J em que isso influía no caso ?
Ou viveriam nela a viúva e filhos e nenhum rendimento produziria, ou dá-la-iam de arrendamento e a renda seria para pagar outra em que fossem viver.
Não me consta, nem a ninguém, que o Sr. João Chagas tivesse capitais ou quaisquer bens imobiliários.
A pen&ão, em grande parte dos casos, representa uma como que consideração, uma homenagem, nada mais, porque é sempre menos na economia da família do que as receitas do homenageado pelos empregos que exercia o trabalho que produzia.
Dizem que ele tinha uma biblioteca que valia muito dinheiro. Mas já ouvi dizer que era intenção dele legá-la ao Estado.
V. Ex.a, Sr. Ribeiro de Melo, que pertence ao corpo consular, acha possibilidade de um Ministro, que teve de fazer uma vida, dispendiosa, possa arranjar fortuna ? Nilo me parece. Já no tempo da monarquia eles quando morriam não deixavam nada.
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suas Cartas políticas e o 31 de Janeiro, tudo isso, embora fosse reeditado, mão renderia grande importância, por íer perdido a oportunidade.
Portanto, parece-me que a pensão à-viúva e filhos de João Chagas não devo ser regateada.
E o que digo a respeito de João Chagas, digo cm relação a João Fiel Stoc-tíler.
^0 que é que pode juntar um oficial de o marinha ?
Esse oficial foi um republicano e nm dos revolucionários à quem a República muito deveu para a sua implantação, sendo, depois desse facto uma figura apa-' gada por apenas se dedicar ao seu meti er.
£ Há, portanto, alguém que, de boa fé, possa afirmar que João Chagas e João Stockler deixaram fortuna?
O que mais me entristece é que se combata a concessão da pensão à viúva de João Chagas, quando as razões que mili-tam em seu favor-são idênticas às que se podem alegar em defesa da viúva e filhos $e França Borges.
O Sr. Afonso 'de Lemos:— Sr. Presidente : entendo q Apoiados. Alguma cousa faltou para evitar a repetição destas discussões, e essa alguma cousa parece-me que é uma comissão- especial 'para-tratar destes assuntos, ou então aproveitar a comissão de petições, para, quando'se dê um caso destes, essa comissão encarregar-se de colher, duma forma mais ou menos velada, todos os elementos que possam realmente'elucidar o Senado para se fazer uma votação quá-si sein 'discussão, porquo é desagradável estarmos a fazer discussões tam largas como esta, que quási que vexam a família e a memória daqueles que faleceram. Eu sinto-me até vexado com esta discussão, e1 se pedi a palavra foi para fazer estas considerações, e, não tendo elementos para poder apreciar se o Sr. João Chagas deixou ou não meios de fortuna, entendo que é meu dever fornecer elementos a respeito de João Fiel Stockler. Era filho de Miguel Stockler, que todos os ve-hos republicanos conheceram e que tinha uma casa do pequeno comércio na-Rua dos Bacalhoeiros, que era frequentada pelos velhos republicanos. Ali se fizeram sessões secretas de carácter revolucionário, trataram-se assuntos doutra ordem, ali só discutiam os jornais que deviam -ser publicados, da sua-algibeira saiu muitas vezes o dinheiro que-faltava quando se tratava de publicar o-Mundo e os jornais do Sr. João Chagas, para1 bem da República. Quando rebentou a República teve necessidade do ir para África. Chegou lá e morreu com as febres. Quem é o filho dó Miguel Stockler? João Fiel Stockter, oficial do marinha, meu correligionário, revolucionário de !> de Outubro, e que péla sua modéstia,.no mais alto grau, nunca procurou ser outra-cousa senão simples oficial de marinha, n e sempre soube ser, já em serviços em África, comandando uina canhoneira, já no Oriente: Mais nada foi,- ' , Eu.conheço a mãe de João Fiel Stoc-^[ler, que hoje é uma velhinha que tem,, creio, 76 ou 78 anos. Vivia apenas daquilo1 que o filho,- sol-J teiro, lhe'podia fornecer. São estes os elementos que posso fornecer à Câmara. Como já disse, prefiro e proponho que-quando Houverem assuntos desta natureza a tratar a comissão de petições seja encarregada de colher as informações necessárias para os podermos votar sem mais discussão. O orador não 'reviu» 'Ô Sr. Ribeiro de Melo:—Não posso lamentar ter sido eu a pessoa que levantou • aqui a discussão sobre a pensão .às famílias consignadas na proposta He lei que se discute, e não lamento porque hão é meu1 propósito vexar ou deminuir nenhum dos falecidos. Trata-se apenas dum princípio que bastas vezes afirmei quando, sentad > naquele lado da Câmara, tantas vezes me levantei a protestar .contra as pensões, a que cheguei a chamar êxodo. Não quis discutir nenhumas dessas pensões porque não tinha elemento-, "--rã isso, tendo incorrido, todavia,, na censura
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do Sr. Pereira Osório, que foi feita com toda a delicadeza, porque nem doutro modo ela seria aceita.
..Não tenho elementos' para poder avaliar a fortuna deixada por um dos homenageados com essa proposta; refiro-me a,o Sr. João Chagas.
EQ nunca fui das pessoas que privaram com S Ex.a e conviveram de. perto com ele. Fui talvez dos poucos republicanos que, tendo por ele uma grande admiração, nunca' se aproximaram de S. Es.% porque também não era fácil a aproximação com o Sr. João Chagas.
Era preciso efectivamente ser-se republicano ou ser-se português altamente cotado, de grande desembaraço político ou de alto coturno jornalístico para se poder familiarizar com S. Ex.a
Vindo porém ao Senado uma proposta de lei que diz respeito à sua família, eu posso fazer aqui repercutir o sentimento duma grande opinião pública que sabia quanto afastado vivia da pessoa de João Chagas embora não vivesse afastado dos seus artigos jornalísticos. Esses, Sr. Presidente, estavam ao alcance de todos os republicanos; eram baratos e todos podiam cobrar neles a .energia e a força de *vontade para combater o regime deposto.
Mas deixemos asso, Sr. Presidente.
Está incluída na mesma proposta a pensão à mãe do republicano de sempre e revolucionário de 5 de Outubro João Fiel Stoekier, a essa velhinha* como lhe chamou o Sr. Afonso de Lemos.
A essa pensão eu fiz apenas pequenos reparos justamente para que se não dissesse que havia arriere pensée ou parti-pris nas minhas palavras.
Preguntei ao Sr. Ministro da Marinha o que havia a respeito da pensão a que tinha direito c A do Sr. João Chagas, se V. Ex.as a levarem para o campo pessoal, eu tenho o direito de a discutir e de lhe fazer os meus reparos. & Porque é que nessa proposta de lei está o filho e não se fala da filha dêsso ilustre extinto? O Sr. Artur Costa: — E porque está casada. O Sr. Joaquim Crisóstomo:—Não está tal casada. O Orador: — Isto apenas para demonstrar e provar que a proposta não foi feita, não foi confeccionada com aquela ponderação que se fazia mester e que devia ser peculiar ao Governo ou ao' apre-sentante da proposta. O facto* de virem dizer-nos que o Sr. João Chagas morreu pobre pode ser acreditado por nós mas a opinião simplista do povo é que não o acredita, porque não pode morrer pobre quem vivia nos aposentos do mais rico e luxuoso hotel de Portugal. Porque não - pode morrer pobre quem foi autor de tantas obras, quem foi jornalista e quem era possuidor duma biblioteca de alta valia.. Diz-me V. Ex.a, Sr. Presidente, e dir--me b á o Sr. Pereira Osório com toda a sinceridade, em que eu piamente acredito, que o Sr/ João Chagas não tinha bens de raiz. 4. • Mas não são recursos somente os bens de raiz, os valores também o são e é importante o que representa uma biblioteca escolhida, seleccionada por mão de mestre, por mão de artista, biblioteca cujo valor nos veríamos embaraçados, para cal-eular. Não seria tarefa íácil nem para os meus méritos nem para os de muitos dos meus pares. Mas conhecido como era que o ínclito cidadão João Chagas era possuidor duma biblioteca de alto valor, houve entendidos que lhe atribuíram o valor de 1:000 contos. ' Se isso1 é verdade eu pregunto s.e com 1:000 contos e com um bocado de" lápis não podemos fazer as contas de que esse. capital, não em livros mas em outros rendimentos, dá um juro suficiente para a manutenção desafogada da sua viúva e filhos» Mas dêmos isso de barato e vamos agora considerar que o Governo quere prestar homenagem a este ínclito cidadão. Está no seu direito e fá-lo com o apoio da Nação republicana. ^Mas não seria muito melhor comprar essa biblioteca duma só vez e num só' lote, evitando assim que verdadeiras preciosidades se dispersem por leilões?
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Para que ama lei seja respeitada por toda a Nação é, preciso que. sirva a todos por igual "e não, seja feita ao sabor das conveniências pessoais ou dos amigos,, como no caso em questão.
Se a viúva de João Chagas se pode manter com metade da pensão destinada para ela e para o filho,
O testamento de João Chagas tornou--se público, veio nos jornais e todos sabem que'ele reconheceu e legitimou dois filhos, um dos quais do sexo feminino.
Se quiser ainda esmiuçar mais esta questão, chegaremos à- conclusão de que esta filha de João Chagas teve necessidade de, se empregar na casa Gfandela. Portanto, precisa da assistência do Estado em homenagem à memória de seu pai.
Lamento que, nesta • proposta de lei, se inclua o nome do Sr. Fiel Stockler, porque a pensão que, lhe diz .respeito não teria discussão, a não ser para pôr em evidência o seu grande esforço e o seu amor à República e à Pátria e, ,sobre-tudo} o sofrimento moral que este homem havia de ter suportado venào-se abandonado dos poderes públicos: Homens da categoria de Fiel Stockler bem merecem das instituições republicanas e dos poderes públicos. . ,/
Houve momentos em que até lhe foi negado o comando de um navio — o Sr. Procópio de Freitas o poderá informar — o que lhe daria mais algum dinheiro a para juntar aos parcos vencimentos que recebia como. oficial da armad.a.
Mas esses comandos,, que são de. confiança e que em melhores mãos nunca podiam ser depositados pelo Governo da República, foram-lhe "negados.
Lamentamos, a morte destes grandes republicanos qae nunca se lhes deu os lugares que eles deviam ocupar, e lamento também que o tenente da armada Cabeçadas esteja esquecido no Ministério da Marinha, que ó um revolucionário de. 5 de Outubro, homem justo, e acen.tuadamente democrático.
A esses. há-4e chegar um dia em que lhes havemos de fazer justiça e todos havemos de reconhecer que todos aqueles que deixaram as suas famílias na miséria
'foi porque os poderes públicos não concederam a estes homens lugares de destaque, que são mais remunerados.
O Sr. Presidente: — Como já passou o * quarto de hora, W Ex.a fica com a palavra reservada.
O Orador: — Sr.. Presidente: .dou por findas as minhas considerações, declarando que estas -minhas palavras sobre as pensões às famílias dos velhos republicanos João Chagas e Fiel Stockler não envolvem qualquer desrespeito, e quanto à .pensão à família do -jornalista França Borges, já o ilustre Senador Sr. Artur Costa fez o favor de dizer por mim aquilo que eu entendia dever dizer. -. O orador não reviu.
O Sr. Pre.sidente (às 19 horas e 10 minutos}:— Interrompo a .sessão até têrça-.-feira, .9, à hora regimental. .;
SEGUNDA PARTE
- As 15 horas e 10 minutos de 9 .de Ju-nlio, • o Sr. Presidente declara reaberta a
O Sr. Qricl Pena: — Sr. Presidente: mais uma vez me encontro na «deliciosa* situação :de estar, só neste lado: da Câmara! . -..
Q Sr. Ribeiro de Melo (interrompendo):— Vale mais só, do que, mal, acompanhado.
O Orador:—Agradeço muito o favor das- suas .palavras, mas preferiria 'esta-r t acompanhado.
Não-jne é agradável achar-me nesta situação, quando sinto estar em desacordo com a estrema esquerda, com o centro, c.om a direita,- com os independentes, possivelmente com o meu próprio grupo, e ficarei naturalmente, no fim descontente até comigo mesmo.
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Naturalmente existe nesta assembleia, o talvez em V. Ex.a mesmo, a impressão de que, por culpa destes oradores, não chegou a ser votado na última sessão o projecto de lei do que nos estamos ocupando.
Pretendo demonstrar que a culpa não foi deles.' T
O Sr. Ribeiro de Melo na sua extensa oração, produzida com o brilho e entusiasmo de sempre, disse-nos grandes verdades e fez apreciações com algumas das quais toda a gente podo concordar plenamente.
Embora mo permita discordar do alguns dos princípios expostos, isso não tira de modo algum valor ao sou arra-soado nem vai do encontro às intenções manifestadas por S. Ex.a
O mesmo se podo dizer das considerações eruditas feitas debaixo de outro ponto de vista pelo Sr. Joaquim Crisóstomo que muito sinto não ver por ora presente.
Jii natural que S. Ex.a daqui a pouco entre na saia, mas já então terei naturalmente terminado as minhas considerações por não desejar de modo algum fa:igar a Câmara e procurarei ser breve.
Muito embora queira tocar vários pontos por ine parecerem interessantes e acentuar bem uma posição que desejo fique explícita, não em nome do grupo que represento mas em meu nome pessoal, só nesta situação vou produzir as minhas considerações.
• Sabe-se que o Governo e a esquerda da Câmara, com muito carinho por este projecto, tem muita vontade de o ver votado rapidamente, parecendo esta estar contrariada pela demora na votação, atribuída às considerações demoradas dos Srs. - Ribeiro de Melo e Joaquim Crisóstomo.
Cuido não tenha razão a maioria.
Tiveram muito que ouvir e aprender na exposição do Sr. Ribeiro de Melo, e muito que ouvir e aprender tiveram nas considerações demoradas e sensatas do Sr. Joaquim Crisóstomo.
Não são eles a causa da demora.
Também não é a causa da dpmora a falta de ter vindo aqui o Sr. Presidente do Ministério com aquela ternura com que costuma expor os seus desejos e levar atrás de si a maioria, e em virtude ia atenção e deferência o amizade, tantas vezes conf ssada aqui pelo Sr. Ribeiro de
Melo, naturalmente também S. Ex.a, e com ele o Sr. Joaquim Crisóstomo, se deixariam comover e seriam, mais breves e-resumidos nas suas considerações.
Creio efectivamente que desdft que o" Sr. Vitorino Guimarães aqui viesse com aquMo ligeiro sotaque tam característico-das províncias do,norte e que dá lugar a, chamarem-lhe, talvez com intenção pejorativa, «o Bitorino», mas ao-meu ouvido 6 agradável por achar interesse especial nesse modo de dizer, e falando com aquo-la sua habitual ternura plangente o com lágrimas na voz, que parece vir do estômago, não suponho que quando S. Exa. só enternece esteja a pensar na alimentação-própria mas ao transmitir aos seus colegas da esquerda o seu sentimenfo a voz. e as lágrimas do S. Ex.a vêm do estômago, e não deve parecer muito estranha a expressão, visto haver vozes da 'cabeça,, do nariz, do peito, e toda a gente poder traduzir ou determinar a impressão recebida com as palavras que lho ocorrem, talvez o Sr. Vitorino Guimarães tivesse conseguido que o Sr.. Ribeiro de Melo se -deixasse enternecer e para lhe ser agradável, quando S. Ex.a lhe pedisse com muito carinho e ternura para não demo; rar o expediente, o nosso colega tivesse deininuído muito o tempo da sua exposição, abreviando-a.
O Sr. Ribeiro de Melo: — Mal me conhece V. Ex.a, pelo visto.
O Orador: — E -com o Sr. Joaquim Crisóstomo poderia tõr acontecido a mesma cousa.
Mas a culpa não foi de nenhum destes senhore*.
O Sr. Ribeiro de Melo falou bastante mas acabou a tempo ainda de o Sr. Joaquim Crisóstomo falar também perto de uma hora e ainda ficou tempo para as votações se mais ninguém iàlasse.
O culpado foi o Sr. Pereira Osório quando, pretendendo esclarecer as intenções do projecto, pronunciou palavras, frases, que me fizeram bolir os nervos por me parecerem inoportunas e descabidas, e me levaram a fazer-lhe um aparte, procurando esclarecê-las.
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siderando-os descabidos e dizendo só os esperaria nesses termos feitos por nós, monárquicos da extrema direita.
Pareceu^me absolutamente inoportuno' lembrar-se o Sr. Pereira Osório, sem qualquer de nós ter ainda aberto o bico, de querer pôr as palavras do Sr. Kibeiro de Melo, apesar de nada terem de inconvenientes, serem muito bem deduzidas e, em parte, muito bom fundamentadas, na boca ou nas intenções da minha humilde pessoa ou na do Sr. D. Tomás de Vilhe-
na, ausente ia nessa altura.
^Xi
Esses esclarecimentos levaram-me a pedir a palavra, e portanto a maior parte da responsabilidade de V. Ex.a, o Governo e a maioria não terem visto acatada a sua vontade de verem'-'votado este projecto sem-demora deve-se ao Sr. Pereira Osório, que foi depois secundado, também com grande espanto meu, pelo Sr. Artur Costa, fazendo o papel de Cardeal Diabo, e, contra, o seu-costume, requerendo a prorrogação da sessão até se votar o projecto.
Ficávamos assim condenados, e V. Ex.a em primeiro lugar e todos nós os já assim um pouco brancos como S. Ex.a, a termos aqui uma sessão arrastada por a noite fora, sem necessidade, sem utilidade.
V. Ex.* não esteve pelos ajustes e fez muito bem e aqui lho agradeço, fazendo assim protelar a discussão, marcando a continuação para daí a três dias até terminar a reunião do Congresso Democrático, sendo de tal causador e responsável o Sr. Artur Costa, que não costuma ser apagador nem dilatador, e se lembrou agora de exercer essas "funções ou'por simples capricho ou para ser agradável ao Sr. -Pereira Osório.
A responsabilidade de este projecto não ser votado com a presteza desejada pelo Governo e pela maioria da Câmara cabe integralmente, sem a menor dúvida, aos Srs. Pereira Osório e Artur Costa.
Se assim não fosse, seS-'Ex.asnão"têHi, por assim dizer, provocado este lado da Câmara, o seu único representante nesse momento não teria pedido a palavra, o projecto seria votado sem a minha intervenção e V. Ex.as teriam sido dispensados de vir hoje aturar-me, com muita paciência e nenhum deleite, durante alguns minutos e teriam assim, prestado a sua de-
sejada homenagem, quê melhor fora não ser tam discutida e V. Ex.as hão-de votar; sendo tudo quanto o meu grupo,' agora reduzido ao número- um, faça absolutamente indiferente à votação.
Atacar o projecto ou defender o projecto ; votar branco ou votar preto: para o resultado final é absolutamente indiferente !
Gosto de falar verdade, de ser sincero, de ser justo.
i Se a intenção do Governo, se a intenção do Partido Democrático, se a intenção em geral dos republicanos desta casa era prestar homenagem a essa figura que foi João 'Chagas e trata p projecto, devemos confessar ''ter ela saído chocha desde o princípio.
Não teve brilho, deram-lhe um carácter de desperdício escusado, absolutamente desnecessário.
Foi feita em virtude de procedimentos ilegais, criando-se situações, tomando-se deliberações, assinando-se decretos, onde — no meu entender, nó'entender de muito boa gente— se vêem assinaturas que não estão ali legitimamente. • - O decreto n.° 10:808, publicado no Diário do Governo n.° 118 da l.a série, logo à cabeça é assinado pelo Sr. Gomes, em primeiro lugar!
O Sr. Manuel Teixeira Gomes renunciando, som ninguém lho pedir, por sua absoluta vontade, por seu livre alvedrio aos seus altos poderes, não tinha de consultar o Congresso.
O acto é positivo e foi definitivo, o que está.perfeitamente justificado, e foi logo nitidamente, absolutamente, sentido por toda a gente quê imagina ter ainda um resto de lógica no espírito.-
Desde o primeiro momento foi perfeitamente esclarecido na sua forma jurídica, num artigo publicado no ministerialíssimo Diário de Noticias assinado pelo Sr. Alberto Xavier, Deputado e pessoa muito inteligente. : \
É na verdade admiravelmente bem deduzido, revelando uma grande competência jurídica, sendo extraordinário, até, que, sendo o autor um pouco escuro de pele, escreva com tanta clareza que não deixa dúvidas no espírito de quem lê.
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bem, publicado recentemente no Século do dia 6.
O Sr. Teixeira Gomes assinando isto como que dá um mau carácter a este decreto.
O Sr. Júlio Ribeiro (em aparte):—Não apoiado.
O Orador:— V. Ex.a pode ter a opinião que quiser.
Não sou um jurista; refiro factos, muito embora os tenha sentido muito antes dos juristas os terem apontado e criticado.
Comecei por dizer que sentia que com as minhas considerações iria desagradar a todos os lados da Câmara, e talvez, até a mini próprio, mas no uso pleno das regalias que me confere o estatuto desta Câmara, heiíde fazer o que suponho ser justiça com toda a firmeza. .
O próprio Governo devia ter reconhecido isso, tendo-se declarado o feriado nacional para depois, por outro diploma, cortarem pelo meio o feriado e o ce-creto.
Francamente, um decreto de feriado nacional, limitando-o à cidade de Lisboa, é ridículo. É nacional ou não é?
É alfacinha ou que é? £É lisboeta, ou é de todo o país?
Mas há mais. O feriado foi decretado por 24 horas;. para o dia todo!
Que homenagem é esta?! Não me custa nada a crer, compreendo perfeitamente que republicanos empoleirados no Poder pelo bambúrrio de õ de Outubro queiram festejar os seus precursores. Não me repugna nada! Acho um facto natural, legítimo, justificado no seu ponto de vista. E se tivéssemos de nos revoltar contra isso, era melhor que nos tivéssemos prevenido a tempo e não os tivéssemos deixado saltar para o poleiro. • j Quando se trata de uma homenagem faça-se ao menos com decência! O Sr. João Chagas foi, indubitavelmente uma das pessoag que mais mal fez à mo- narquia e, portanto, melhor fez à República ! Compreendo, por isso, perfeitamente a idolatria de V. E:ç.as pela sua figura e pela sua memória; mas não quero deixar de salientar haver desacordo absoluto entre essa idolatria e a manifestação externa da mesma. Não me causa estranheza que lhe façam todas as homenagens. Uma das cousas que ontem mais incomodaram o Sr. Ribeiro de Melo foi a hipótese de riqueza que o Sr. João Chagas tivesse, Não quero discutir isso. Não sei se tinha., se não tinha fortuna. Ouvi dizer que o Sr. João Chagas, republicano dos mais antigos, nos seus tem^ pôs de rapaz, tinha trabalhado um pouco na imprensa monárqaica e, antes de 31 de Janeiro, assentara arraiais no partido republicano, onde foi jornalista de combate dos mais distintos e dos mais nocivos para nós. Era sobretudo notável e muito nocivo para nós como panfletário — j essa ó a sua especial característica de escritor! Não me custa nada dizer isto, não me julgo deminuído um ceitil na minha economia nem um milímetro na altura, porquê é a expressão da verdade. Querem-lhe prestar homenagem? Façam-no! ; d. Mas para que foram juntar a este projecto dois nomes que se prestam a pa^ lavras de crítica?! Vejo aqui na minha nota que se juntou o nome do Sr. França Borges. O Sr. França Borges, antigo redactor do Mundo — não me consta tenha sido funcionário público — seguiu o seu caminho com a mira num ideal seu, servindo^ -se dos processos que entendeu. A República e o,s republicanos devem--Ihe sem dúvida reconhecimento pelos-actos do demolição praticados no regime que tenho a honra de representar aqui. Está muito bem, façam-na, é justo. Fizeram-lhe uma estátua que continua encerrada num tapume na antiga Praça do Príncipe Real, tendo dado o nome de França Borges a esse lindo jardim.
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dra, mármore ou bronze num dos mais formosos jardins da capital o que talvez valorize inais o jardim com o contraste ou a figura do Sr. França Borges. , Isso não mo irrita. Serviu o seu ideal, ideal antagónico do meu, foi vencedor; £ querem-lhe manifestar o. seu reconhecimento ? Façam-no, não me interessa.
O Sr. Fiel Stockler — serei muito breve por querer simplesmente mostrar não me passarem despercebidos certos factos — não recebeu qualquer prova de consideração, de reconhecimento ou de respeito, nestes 15 anos, nem .da República, nem do Partido Democrático, que é a cristalização máxima da República...
O Sr. Ribeiro de Melo:—Apoiado.
O Orador: — j
Agora depois de morto aproveitam este ensejo, e como S3 trata de fazer homenagem a uma grande figura da República de toda a gente reconhecida como tal, juntaram-lhe também o seu nome.
Mas o Sr. Fiel Stockler era oficial de marinha. Marinha e exército não têm desculpa, quando assumiram essa atitude que ele também assumiu—Deus lhe tenha a alma em paz — praticaram uma acção com nome leio cm português ?, V. Ex.as não são parcos em lho atribuir quando não lhe quadram as cousas!
Ainda outro dia atiraram o apodo de traidores, em todos os tons, em todos os seus jornais, contra homens que quiseram fazer um movimento militar de protesto contra o desgoverno em que anda a Na-
O Sr. Ribeiro de Melo:—Não apoiado.
O Orador: — - O Sr. Ribeiro de Melo:—Nem com uma cousa nem com outra. O Orador:— As intenções, .para mim não têm dúvida, eram. portuguesíssimas, animadas do maior carinho pelo seu País tanto como nós podemos ter, tanto como V. Ex.a pode ter dentro do seu ideal. Não posso esquecer que quando se tratou de ver a situação aflitiva,de pessoas com modestas pensões da Monarquia, sempre modestíssimas e muito parcamente distribuídas, e afectava a Sr.a D. Joana Hintze Ribeiro e a Sr.a D. Maria José Mousinho, a própria maioria, bem convencida de serem justíssimas as pensões .e de estarem essas senhoras na- .miséria, não hesitou e votou-as. A miséria era verdadeira, continua a ser verdadeira.. Mas na miséria disse-se também qutí está a mãe do Sr. Fiel Stockler. Foi isso aqui afirmado, creio., pelo Sr. Ribeiro de Melo. O Sr. Afonso de Lemos (interrompendo):— Fui eu que fiz essa afirmação. O Orador:—Sim, V. Ex.a também. Pois esqueçamos as culpas do filho em homenagem^ ao desgosto que talvez com essas culpas ele teria-dado à mãe, E, visto que falei na mãe de. um e falei no nome de Mousinho, sempre quero dizer a V. Ex.as que Mou sinho, de es-„ tirpe fidalga, era , português de «antes quebrar que torcer», e era-o porque lhe vinha nos vínculos- do sangue dos dois lá-, dos. . • . Filho de José 'Diogo Mousinho, engenheiro distintíssimo do seu tempo, que era um^ homem de coragem e de abnegação. É desconhecido, porventura, da Câmara o acto de José Diogo Mousinho no naufrágio junto à. praia de Peniche, em que ele, já entrado em anos. e não havendo a bordo quem. se atirasse à água para tra.zer um fio <_-de a='a' veio='veio' terra='terra' despiu='despiu' e='e' entalou='entalou' trazê-lo='trazê-lo' o='o' p='p' dentes='dentes' se='se' _-nos='_-nos' chicote='chicote' socorro='socorro'> Por aí se alou o cabo de vaivém,, e toda essa gente.pôde ser salva.'. .A mãe. a Sr.a Dr.Maria Emília Pereira da Silva, era um tam alto espírito, uma inteligência tam lúcida e um carácter tam límpido que, quando o filho foi elevado ao alto cargo de aio dos príncipes, agarrou-se, com lágrimas, como eu estou a sentir na voz, à minha própria mulher e disse esta frase modelar: «Maria, sobe muito alto e muito depressa o meu filho, para que a descida não seja uma desgraça».
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jbiário das Sessões ao Senado
panheiro -das estúrdias de Coimbra, João Gaivão, João de Mascarenhas Manuel de Mendonça Gaivão, outro fidalgo de tradi- • cão, de velha estirpe algarvia, de sangue puro.
Não tem mistura de sangue semita nem no corpo nem na alma.
Esse homem, cunhado de Mousiimo, capitão de artilharia, coberto de bons e leais serviços, hoje a mourejar pela vida nos sertões de África, ao serviço da Companhia de Moçambique, segundo creio, no dia da implantação da República, teve o gesto galhardo de abandonar o seu lugar, atirando fora os seus galões, atirando com a espada, afirmando, altivamente, «estar velho para fazer novo juramento».
Comparem V. Ex.as a atitude nobilíssima desse rapaz, sem fortuna, carregado de filhos, fazendo isto, com essa miséria moral dos adesivos que V. Ex.as põem nos cornos da lua e carregam de benesses, alojando-os em lucrativos lugares de administração pública.
Veio isto por incidente, a propósito da irritação em mim provocada pela inconsciência com que de ânimo leve e extrema facilidade se dispõe, nas duas casas do Parlamento, dos dinheiros públicos, por isto, por aquilo, para este, para aquele, porque são compadres e porque são bons republicanos.
Ora, se declarei, com toda a sinceridade, não me incomodarem as homenagens feitas por republicanos a outros republicanos, entendo dever protestar quando os dispêndios se- fazem inutilmente, e nem sequer condizem com as homenagens prestadas ou projectadas.
A facilidade em dispor dos dinheiros públicos é grande nas duas casas do Parlamento, mas não encontrei igual facilidade quando, para acudir a uma calamidade pública, urgentemente, propus ou pedi aos meus colegas desta Câmara que dessem do seu bolsinho o que pudessem, e ninguém me respondeu, nem um só mostrou desejo de colaborar comigo, e afinal de contas me vi inteiramente desacompanhado e só.
Nem o meu voto, nem os votos deste lado da Câmara, podem influir na votação, marquei a minha, maneira de ver, disse livremente a minha opinião, e vou terminar com a declaração de me abster de votar, deixando a Câmara em inteira
liberdade de resolver como entenda, se não votar por unanimidade, como ó natural venha a suceder.
O Sr. Ribeiro de Melo: — Sr. Presidente: o artigo 1.° da proposta de lei em discussão não satisfaz inteiramente ao espírito de homenagem que o Governo da República quis prestar à memória de João Chagas; não satisíaz pelo seguinte: porque, tendo este ínclito cidadão reconhecido, pela sua declaração, uma filha natural, está ela fora da alçada do artigo 1.°, porque este artigo concede apenas uma pensão á sua viúva e seu filho do sexo masculino.
Nestas condições, lembrei-me de propor uma substituição ao artigo 1.°
Mas, para que de futuro a repartição competente não sinta embaraços na distribuição desta pensão, eu incluo um § 1.° no artigo, estabelecendo a maneira como deve ser distribuída esta pensão, a qual será dividida em duas partes: dois terços para a viúva e filho e o terço restante para a filha.
Assim é que me parece estar certo e ser, sobretudo, justo..
E, como o Senado timbra e pretende ser justo e equitativo ao acudir à necessidade, à miséria da família de um homem que foi grande dentro da República e soube ser grande em todos os lugares e até no seu viver —porque foi dos mais faustosos ein grandeza que se podem marcar adentro dos arraiais republicanos — a pensão assim distribuída obedece &o princípio de justiça que o Senado quere estabelecer,
Sr. Presidente: é notável que o Parlamento se lembre ainda sobre o corpo quente de João Chagas de trazer ao Parlamento uma proposta desta natureza, quando, ao fazê-la, não devia também esquecer aqueles servidores das instituições republicanas que notavelmente arriscaram toda a sua vida pelo advento da República, e, enquanto saúde tiveram, lhe concederam todas as forças e energia.
Refiro-me, neste momento, Sr. Presidente — e isto simplesmente para encurtar razões e não protelar mais a discussão da proposta— a José Antunes.
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do 5 de Outubro de 1910, nomeado servente da Caixa Geral de Depósitos.
Sucede que este modesto serventuário do Estado cegou dos dois olhos e, por tal, foi obrigado a pedir a sua demissão de serventuário da Caixa Geral de Depósitos. E pediu-a em termos de não restar a menor dúvida, porquanto se fez acompanhar de um atestado módico, em que se mostra e prova a sua cegueira.
Foi afastado desta comissão de serviço, encontra-se na maior indigência e, como chegou agora o momento de se acudir a todos os necessitados, justo ó que mais um venha honrar o rol já grande, incomensurável, dos pensionistas do Estado.
Atrevo-me, portanto, a mandar, para a Mesa um artigo novo, em que se concede uma pensão a José Antunes.
E, Sr. Presidente, para encurtar razões e, sem mais considerações, dou por terminadas e por findas aquelas palavras que representam e significam um protesto, não contra as pessoas a que se referem as pensões, mas única e simplesmente contra a maneira como elas são concedidas.
Isto já ficou vincado na última sessão em que se falou a este respeito: deve haver de futuro o maior dos cuidados e sobretudo da parte do Governo e dos proponentes em se averiguar do estado financeiro das respectivas famílias, de modo a que o Senado não tenha, relutância em votar as propostas de pensões que tenham de passar„ por esta casa do Parlamento.
Foram lidos e admitidos uma proposta de substituição e um artigo novo deste senhor.
São os seguintes:
Artigo 1.° É concedida à viúva e seus dois filhos, emquanto o do sexo masculino for de menor idade e o do sexo feminino se conservar no estado de solteiro, a pensão de 300$00 escudos mensais, sendo . aplicável a esta pensão, para efeitos de melhoria o disposto no artigo 2.° do decreto n.° 10:250, de 5 de Novembro de 1924.
§ 1.° Esta pensão, acrescida de melhoria, será dividida em duas partes, sendo "dois terços para a viúva e filho menor e o terço restante para a filha
§ 2.° Logo que q filho atinja a maior j e no caso do falecimento da viúva,
a sua parte reverterá -para a irmã, desde que esta se mantenha no estado de sol-• teira.
§ 3.° Esta pensão será paga a partir da data do falecimento do referido João Pinheiro Chagas. — Ribeiro de Melo.
Para a l.a Secção.
Artigo novo. É concedida ao cidadão José Antunes, ex-servente contratado da Caixa Geral dos Depósitos e revolucionário civil reconhecido pelo Congresso, uma pensão mensal de 300$0.0, sendo aplicável a esta pensão, para efeitos de melhoria, o disposto no artigo -2.° do decreto n.° 10:250, de 5 de Novembro de 1924.— Ribeiro de Melo.
Para a l.a Secção.
O Sr. Joaquim Crisóstomo: — A leitura do artigo que se discute deixou-me a impressão de que quem o redigiu desconhece as condições, sobretudo familiares, em que viveu João Chagas. Estabelece esse artigo uma pensão .para a viúva do falecido e também para um filho do mesmo. Nada determina quanto à sua filha.
De duas, uma, Sr. Presidente: ou quem fez o artigo e apresentou a proposta igno-rav.a que João Chagas tinha uma filha ou quem fez a proposta segue princípios tam rígidos de moral que não lhe permitem conceder protecção aos filhos naturais, só a concedendo aos filhos legítimos.
Seja qual for a causa que determinou, a meu ver, essa falta, não posso felicitar o autor da proposta.
Se desconhecia que João Chagas tinha uma filha era obrigado a sabê-lo, porque o Governo dispõe dos necessários elementos de informação para conhecer da vida daqueles a quem entende que o Estado deve assistência.
Não ó de ânimo leve que um Presidente do Ministério, um Ministro das Finanças, ou qualquer outro Ministro apresenta propostas desta natureza.
Previamente tem de formar um juízo, tem de investigar e só depois duma cuidadosa, duma ponderada investigação é que se devia considerar e julgar habilitado a vir ao Parlamento pedir medidas desta natureza.
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Diário àas Seisões do Senado
reito à protecção da sociedade, eu permito-me reprovar esse critério, porque as leis da natureza não distinguem entre filhos naturais e legítimos.
Se a sociedade entendeu que devia criar unia moral jurídica para legalizar a forma como os filhos sucedem aos pais fá-lo sob um ponto de vista muito diverso daquele que nós devemos ter em atenção ôm tiiomentos desta natureza.
O instinto de cohsérvação é itoato em todos nós e, consequentemetite, a sociedade" deve protecção não só aos filhos legítimos como aOs ilegítimos.
Ainda o nosso Código Civil para o facto cia legítima distingue etítre filhos legítimos e perfilhados anterior ou posteriormente ao casamento.
Eu não entendo esse critério.
Desde o momento tjtie ds filhos sejam perfilhados ou legitimados" em virtude de decisões judiciais devem para todos os efeitos,, a inpu ver, suceder em partes iguais aos legados dos pais.
Eu não me alongo em considerações sôbfe este assunto porque tinha de encarar a questão sob o ponto de vista da filosofia de direito, e teria de me referir a numerosos tratadistas, Uns que reprovam em absoluto o direito de herança, outros que o justificam por formas muito diversas e critérios muito variados. Este capítulo das sucessões é uma das partes do direito civil mais sujeita a diversas interpretações, mas a sua discussão não é própria neste momento; era mais cabida numa academia de sciências.
Qualquer que seja o caso o direito de hefança ó igual tanto pára uns como para outros.
É possível, como na última sessão afirmou aqui o Sr. Artur Costa, que houvesse alguém que estivesse ha presunção de que essa filha de João Chagas estava casada e, conseqúentemente, teria o marido para a protegei e dispensava a protecção da sociedade.
IVtas ett já conhecia este assunto e amda depois da última sessão procurei informar-me mais circunstanciadamente e cheguei ao conhecimento de qtie a filha de João Chagas esteve durante largo tempo empregada nos Armazéns Gràndèla, onde recebia um insignificante ordenado, mas por a casa Graúdela ter despedido muitos empregados, ficou sem ganha-pao,
sem recursos, ficando de um momento para o outro sem uma situação definida na sociedade e assim se encontra presentemente.
É hoje pretendente a um lugar na Caixa Geral d£ Depósitos, já apresentou o seu requerimento e tom algumas esperanças de ali ser colocada.
A sua pretensão é muito modesta porque esse emprego não pode render mais de 450$ mensais.
Se se quere elevar o nome de João
Ciagas parece-me, Sr. Presidente, que a
' Câmara não pode recusar a sua filha o
bem estar que vai concedei à sua viúva
e ao seu filho.
Ttírnár-se-ia mais injusto se porventura esse bem estar viesse a contrastar com a situação dá filha do ilustre morto.
Nestas circunstâncias, não voto o artigo pelas razões que apontei na última sessão, porque estou convencido dê que as pensões só se dão quando a opinião pública as reclama, é no caso presente ainda não hotive ensejo de se manifestai* essa opinião.
Se porventura a pensão visa a homenagem ao noriíe de João Chagas, essa homenagem deve não só dizer respeito à sua viúva, mas aos seus filhos, especialmente uma filha que não tem qualquer emprego público ou colocação particular.
Se não votd o artigo tal como está ou com qualquer emenda. Entendo que a Câmara, por coerência, não deve deixar de incluir nessa pensão todos os filhos do extinto.
O orador não rebiu.
O Sr. Artur Costa:— Se na secção se não introduziu uma emenda ao artigo 1.° nesse sentido, foi porque havia a informação de que a filha de João Chagas estava casada.
Agora o Sr. Joaquim Òrisóstomo informa que essa senhora está solteira, e parece que S. Ex.a julgou que a exclusão dessa senhora resultava do facto de ser filha ilegítima, em relação a seu irmão.
Por acaso tenho informações de que ambos estão na mesma situação jurídica.
Ora, eu não faço distinção nenhuma entre filios legítimos e ilegítimos, e desejaria até que no Código Civil se fizesse uma alteração nesse sentido.
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para a Mesa uma emenda e essa emenda tem que ser apreciada na Secção, reservar-me hei para dizer, quer aí, quer na sessão plena do Senado, o que se me oferecer sobre o assunto. O orador não reviu.
O Sr. Afonso de Lemos:—As explicações que eu queria dar já foram dadas pelo Sr. Artur Costa.
Efectivamente quando este assunto baixou à Secção, fomos informados de que a filha de João Chagas era casada, razão por que a Secção excluiu esse nome.
Melhor informado o Senado, estou convencido de que não haverá dúvida em se votar a proposta do Sr. Ribeiro de Melo.
Mas como este caso tem de voltar à Secção, ela ponderará devidamente o as-, sunto.
Também em nome deste lado da Câmara declaro que votamos a proposta do Sr. Eibeiro de Melo, com respeito a José Antunes, íuncionário que cegou em serviço da Caixa Geral de Depósitos.
O orador não reviu.
Entrou em discussão o artigo 2.°
foi aprovado.
Entrou em discussão o artigo 3.°
O Sr. Ribeiro de Melo:—Na parte referente à viúva e filhos de João Chagas, há um parágrafo que diz: «Esta pensão será paga a partir da data do falecimento do referido João Pinheiro Chagas».
Mas na parte respeitante à mãe de Fiel Stockler, não se "diz isso.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:—O § â.° do artigo 1.° também é aplicável ao artigo 2.°
As leis porém devem ficar o mais claras possível e por isso na Secção pode propor-se um parágrafo novo a este artigo, a fim de não poder haver dúvidas.
S. Ex.a não reviu.
Posto à votação o artigo 3.°, foi aprovado.
Posto à votação o artigo 4.°, foi aprovado.
O Sr. Presidente :—A nova sessão é às 16 horas e'meia, sendo a ordem do dia os projectos que a Câmara concordou que fossem discutidos com dispensa de impressão.
Está encerrada a sessão.
Eram 16 horas e 20 minutos.
Os REDACTORES: