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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DIÁRIO DO SENADO
isr.° B e
EM 15 DE -JULHO DE 1925
Presidência do Ex.mo Sr. António Xavier Correia Barreto
Secretários os Ex.mos Srs.
Sumario.—A sessão abre às 15 horas e 25 minutos, com 25 Srs. Senadores presentes.
Aprova-se a (teta, e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Afonso de Lemos protesta contra a intervenção da autoridade na eleição da Misericórdia da Vidigueira.
Responde-lhe o Sr: Ministro do Interior.
O Sr. Procôpio de Freitas requere n discussão dum projecto de lei.
O Sr. Ferreira de Simas protesta por não se cumprir a lei que regula o funcionamento das tabernas. •
O Sr. José de Sequeira insta por documentos que pediu pelo Ministério do Comércio.
O Sr. terra e Moura refere-ss à precária si- ' iuação dos guardas fiscais reformados e outros assuntos, replicando-lhe o Sr. Ministro do Interior.
O Fr. Carlos Costa prepunta se a Companhia das Aguas já entregou na Caixa Geral de Depósitos a quantia de cerca de 4:000 contos, que de há muito ali deoia ter dado entrada.
O Sr. Ministro do Comércio responde negativamente.
O Sr. Mendes dos Beis protesta contra o f acto de, apesar de ter sido revogado pela Câmara dos Deputados, ainda se estarem afazer nomeações à iombra do decreto que reorganizou a policia.
Responde-lhe o Sr. Ministro do Interior.
O Sr. Procôpio de Freitas requere que se prolongue o espaço de tempo destinado ao «antes da ordem do. dia».
Falam sobre o assunto os Srs. Mendes dos líeis e Catanho de Meneses, sendo o requerimento rejeitado.
Ordem do dia. — Vota-se uma emenda ao projecto de lei n,° í/37.
É aprovada.
Prossegue a discussão do projecto de lei n.» 867,. continuando o Sr. Hibeiro de Melo no liso da palavra.
Falam mais os Srs. Herculano Galhardo, Afon-*o de Lemos, Ernesto Navarro, Procópio de Frei~
Luis Inocêncio Ramos Pereira António Gomes fle Sousa Varela .
ias, Alvares Cabral, 'D.. Tomás de Vilhena, Augusto de Vasconcelos e o Sr. Min-'stro do Comércio, sendo a proposta aprovada na generalidade.
Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Prorópio de. Freitas ocupa-se de assuntos respeitantes à Madeira, replicando-lhe o Sr. Ministro da Agricultura.
Abertura da sessão, às 15 horas t 25 minutos.
" Presentes à chamada 25 Srs. Senadores.
Entraram durante a sessão 23 Srs. Senadores.
Paliaram à sessão 23 Srs. Senadores.
Srs. Senadores presentes à chamada.:
Afonso Honriques do Prado Castro e Lemos.
Álvaro António de Bulhão Pato.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Gomes de Sousa Varela-
António Maria da Silva Barreto
António Xavier Correia Barreto. .
Artur Octávio do Rogo Chagas.
Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.
César Procópio de Freitas.
Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco José Pereira.
Francisco Vicente Ramos.
Frederico António Ferreira de Simas.
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Diário das Sessôe» do Senado
João Carlos da Costa.
João Maria da Cunha Barbosa.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Duarte Dias de Andrade.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Joaquim Fernandes Pontes.
José Mendes dos Reis.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Rodrigo Guorra Alvares Cabral.
Silvestre Falcão.
Srs. Senadores que entraram durante a sessão:
Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.
Aprígio Augusto'de Serra è Moura.
Artur Augusto da Costa.
Augusto (Jasimiro Alves Monteiro.
Augusto de Vera Cruz.
César Justino de Lima Alves. . Constantiuo José dos. Santos.
Domingos Frias de Sampaio e Melo. ' Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Francisco António de Paula.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
João Catánho de Meneses.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia,.
Joaquim Pereira Gil de .Matos.
José António da Costa Júnior.
José Augusto, de Sequeira.
Luís Augusto Simões de Almeida. =. Manuel Gaspar de Lemos.
Roberto da Cunha Baptista.
Rodolfo Xavier da Silva.
Tomás de Almeida Manuel de Vi-Ihena (D.).
Srs. Senadores que não compareceram à sessão:
Aníbal Augusto Ramos de Miranda.
António Alves de Oliveira Júnior.
António do Medeiros Franco.
Francisco Xavier Anaclòto da Slva.
João Alpoim.Borges do Cento.
João Manuel Pessanha Vaz das Xe-ves.
João Trigo Motinho.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim .Teixeira da .Silva.
Joaquim Xavier de Figueiredo Oríol Pena.
Jorge Frederico Velez Caroço.
JOGO Joaquim Pereira Osório.
José Machado Serpa.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Nicolau Mesquita.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Querubim da Rocha Vale' Guimarães.
Raimundo Enes Meira.
Ricardo Pais, Gfomes.
Vasco Crispiniano da Silva.
Vasco Gonçalves Marques.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Sr. Presidente (às lõ horas e. 20 mi-mitos):—Vai proceder-se à chamada. fez-se a chamada,
O Sr. Presidente (ás 15 horas e 25 minutos) : — Responderam à chamada 25 Srs. Senadores.
Est:í aberta a sessão. l
Vai ler-se a acta.
Leu-se.
O Sr. Presidente: — Está em discussão. Pausa.
O Sr. Presidente,: — Como' nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se .aprovada.
Vai ler-se o . .
Expediente
* Cartas
Do Sr. Ernesto Júlio Navarro, pedihd' crna nota discriminada das suas falias,. Para a Secretaria.
Do Sr. Augusto Vera Cruz, justificando as suas faltas.
Para a comissão de infracções e faltas.
Do Sr. Vasco Gonçalves Marques, justificando as suas faltas.
Para a comissão de infracções -e faltas, cem o respectivo atestado.
Ofícios
Da Câmara dos Deputados, enviando as propostas de lei: N - ' ' ,
N.° 960, autorizando o Conselho de Arte e Arqueologia a-alugar a igreja de Santa Clara-a-Velha (Coimbra).
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N.° 962, discriminando quais os revolucionários civis abrangidos pela lei n.° 1:691.
Para a 2.a Secção.
N.° 964, subsidiando com 100 contos o •Comité Olímpico Português. Para a l.a Secção.
Requerimentos
Do Sr. Jaime de Matos Caldas e Quadros, pedindo para ser reconhecido revolucionário civil.
Para a comissão de petições.
Do Sr. Kaúl Augusto dos Santos, pedindo os documentos que entregara ao •Congresso da Kepública.
Para a Secretaria, para entregar mediante recibo.
Do Sr. Carlos Augusto Antunes, pedindo para ser reconhecido revolucionário •civil.
Para a comissão de petições.
Projectos de lei
Do Sr. Costa Júnior, concedendo^ y?-rias regalias aos oficiais do exército e armada.
Para a 2" Secção.
Do Sr. Santos Garcia, concedendo determinadas regalias aos funcionários do Ministério da Agricultura.
Para a 2.a Secção:
Antes da ordem do dl t
O Sr. Afonso de Lemos (para um negó-<ÀQ que='que' de='de' tratar='tratar' tag0:pedi='urgente:pedi' interior.='interior.' tempo='tempo' muito='muito' do='do' à.='à.' assunto='assunto' para='para' leva='leva' um='um' não='não' mas='mas' palavra='palavra' a='a' opinião='opinião' preciso='preciso' ouvir='ouvir' sr.='sr.' o='o' p='p' sobre='sobre' câmara='câmara' ministro='ministro' qual='qual' xmlns:tag0='urn:x-prefix:urgente'>
llecebi há poucos dias da Vidigueira uma nota sobre a eleição da Mesa da Misericórdia.
Passados os oito dias, a Mesa eleita foi tomar posse, e ontem recebi uni telegrama informando-me de que a autoridade admi-nist rativa tinha querido desapossar a referida Mesa.
" Era isto\ que eu queria comunicar ao Sr. Ministro do Interior, visto tratar-se de violências praticadas por uma autoridade administrativa.
O Sr. Dias Andrade: — É uma violência sem nome.
O Sr. Ministro do Interior (Germano
Martins):— Na < exposição que acaba de fazer o Sr. Afonso de Lemos há dois pontos importantes.
Um é o que diz respeito propriamente à eleição, e com esse não tenho eu nada nem o próprio Poder Executivo, visto que quanto a protestos que • possa ter havido, é ao tribunal que compete conhecer da validade da eleição. • Quanto ao segundo posto, o que diz respeito à- interferência do delegado do Governo, que segundo o que S. Ex.a acaba de dizer exorbitou das suas funções,' devo informar que também recebi ontem um telegrama dizendo que o delegado dó Governo se tinha colocado de uma maneira arbitrária ao lado de uma das partes que se degladiam nessa eleição para a Misericórdia da Vidigueira.
O Sr. Afonso de Lemos (interrompendo): — Não se trata propriamente de uma das partes, visto que foi a maioria dos irmãos da Misericórdia, em virtude do delegado do Governo não deixar fazer a eleição no lugar próprio, que se reuniu em Outro sitio e procedeu à respectiva eleição.
O Orador: — Eu digo «de uma das par-tfs» porque nfío me compete apreciar de que lado está a maioria.-.
Quando recobi esse telegrama imediatamente mandei oficiar ao governador civil de Beja para que informasse acerca da acusação que era feita. Afirmo que procederei de harmonia com a? informações que me chegarem. •
O orador não reviu.
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Diário das Sessões do Senado-
Portanto, não se trata bem de uma das partes litigantes em que a autoridade se possa ter posto ao lado de unia contra outra.
O Sr. Ministro do Interior (Germano Martins): — Tendo falado há pouco pela primeira vez nesta Câmara, esqueceu-me de saudar V. Ex.a como um dos meus melhores amigos, como uma pessoa que merece o resoeito de todos os republicanos. Na pessoa de V. Ex.a, Sr. Presidente, reu saúdo.todos os Srs. Senadores.
É exactamente o ponto a que o Sr. _ Afonso de Lemos se referiu que constitui uma das acusações contra o delegado do Governo, que interveio a favor de uma das partes litigantes. A intervenção desse delegado só poderia dar-se por factos que mostrassem a necessidade da intervenção. E o que eu vou averiguar.
O orador não reviu.
O Sr. Afonso de Lemos : — Agradeço as explicações do Sr. Ministro do Interior, e, visto que ele se dirigiu a V. Ex.a e ao Senado fazendo lhe os seus comprimentos, também eu dirijo cumprimentos a S. Ex.a
O Sr. Procòpio de Freitas:—Keqneiro a V. Ex.a que consulte o Senado sobre se permite que, na ordem do dia, a seguir ao projecto que está em discussão, seja discutido o projecto n.° 912.
É aprovado este requerimento.
O Sr. José Pontes: — Eequeiro a V. Ex.a que consulte o Senado sobre se consente a discussão, antes da ordem do dia e sem. prejuízo dos oradores inscritos, da prcwiosta de lei n.° 940.
Ê aprovado este requerimento.
« O Sr. Ferreira de Simas: — Solicito do Sr. Ministro do Interior que faya cumprir o decreto de repressão do uso de bebidas alcoólicas. Esse decreto determina que as tabernas estejam fechadas às 21 horas e que os menores não tenham ali entrada.
Publicou-se um regulamento em que das 21 se passou para as 22 horas e estabeleceram-se penalidades para quem não cumprir.
Pois o Sr. governador civil permitiu-se saltar por cima da lei, concedendo que as
tabernas estejam abertas até à uma hora, da noiíe, que crianças entrem nelas, etc.-
Eu creio que S. Ex.a faz isso com» muito boa intenção, parn obter dinheiro-destinado à pobreza. Mas ele não pode saltar por cima da lei e contribuir assim para o descalabro da raça e para o desenvolvimento de toda a casta de deboche, o que acontece naturalmente estando-abertas as tabernas, os clubes e outros estabelecimentos semelhantes.
O Sr» governador civil não pode dar essas licenças. Estão publicados a lei e o-regulamento e é preciso que sejam cumpridos.
S. Ex.a que arranje essas receitas mas não saltando por cima da lei.
O Sr. Mendes dos Reis : — É curioso-que Y. Ex.a, tendo estado até há pouco? no Ministério, não tivesse procurado fazer-cumprir a lei.
O Orador: — Interferi junto do Sr. Ministro do Interior nesse sentido. Parece-que o Sr. governador civil é um estado-dentro do Estado, porque atropela a lei. continuamente para conseguir dinheiro.
ííão pode ser. Protesto energicamente.
Estando presente o Sr. Ministro do Interior, solicito' de S. Ex.a o favor de-transmitir ao Sr. Ministro do Comércio esta minha pregunta: se a Caixa Geral. de Depósitos já recebeu a quantia de cerca de 4:000,contos, entregues pela Companhia das Aguas, que é dinheiro do Estado e não há nada que justifique que ainda1 não tenha sido entregue.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Costa (interrompendo): — Posso afiançar que ainda não foi nem será entregue.
. O Sr. Ministro do Interior (Germano Martins):— Gostei da vivacidade com que-foi tratado este assunto ,da lei seca por parte dos Srs. Senadores. Eu também sou partidário dessa lei.
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-ser Senador. É preciso efectivamente desenvolver a raça.
Deu-me V. Ex.a uma notícia que eu nilo -conhecia. Eu não sabia que essa lei não -é cumprida, mas vou procurar que o seja.
V. Ex.a pode estar certo do que empregarei os melhores esforços para que .as crianças não entrem nas tabernas e para que estas fechem à hora marcada na , lei.
Como disse, eu ignorava completamente •esto assunto, mas, desde que V. Ex.;i chama a minha atenção e declara que isso já vem-um pouco de longo, eu asseguro que vou procurar que se proceda conformo a .lei. ' .
O orador não revia.
O Sr. Carlos Costa (interrompendo]: — "Há cerca de um mês fiz eu idêntica reclamação ao antecessor de V. Ex.a
O Sr. Ministro do Interior de então -ouviu o Sr. governador civil e ficámos, •afinal de contas, na mesma.
O Orador: — Quanto à verba da Companhia das Aguas, eu transmitirei ao meu < colega as considerações de V. Ex.a -
O Sr. Serra e Moura:—Há largos me-.-ses que eu venho aqui tratando da situação miserável em que se encontram os guardas fiscais reformados.
O meu ilustre colega nesta Câmara, Sr. Júlio Ribeiro, também me tem acom-_panhado nestes protestos, mas o que é certo é que, muito embora o Sr. Ministro -das Finanças ou, por outra, os Srs. Ministros das Finanças que têm passado jpelas cadeiras do Poder, nos tenham afirmado que vão dar providências imediatas •e ordens rigorosas para quo esses servidores do Estado recebam o que de direito têm a receber, até hoje, Sr. Presidente, ainda nada receberam l
Sr. Presidente: não é só este facto, mas outros muitos casos têm demonstrado •que nós aqui no Senado temos menos voz, ou por outra, temos a voz ínais apagada do que alguns humildes protestantes -por esse País além, e assim vamos vendo desaparecer dia a dia, hora a hora os direitos incontestáveis que temos perante .a Constituição.
Os Srs. Ministros ouvem as nossas
reclamações. Os Srs. Ministros fingem atendê-las, respondem-nos com palavras bonitas, convencendo-nos, como criaturas muito educadas, de que estão de boa fé e no propósito firme de resolverem a questão justa que aqui lhe indicamos, mas o que é certo é que os Srs. Ministros sucedem--se uns aos outros, e nenhum faz casa dos assuntos que lhes indicamos, ou, se o faz, como já tive ocasião de dizer, os directores dos Ministérios, que mandam mais do que eles, o que é vexatório para. S. Ex.as e vexatório para nós, resolvem •precisamente o contrário, o tudo fica na mesma!
Mais de uma vez en tenho afirmado e comprovado quo ,há leis que têm sido .desrespeitadas, leis que foram aqui votadas nesta casa do Parlamento em benefí--cio desses desgraçados servidores do Estado, e, no e m tanto, lá porque um Sr. director geral do Ministério das Finanças ou alguém não quere atender estes velhos republicanos, porque aqui é que está o gato—permita-me V. Ex.u o termo — continuam por ês'se País fora a estender a mão à caridade, quando afinal o Estado lhes devo subsídios e ordenados de muitos meses..
Isto assim não podo continuar sem o nosso mais veemente protesto, muito embora convencido de quo esse protesto feito aqui deste lugar equivale a fazê-lo do deserto!
Lamento não ver presente o actual Sr. Ministro das Finanças, para me dirigir a S. Ex.a, mas espero que os seus colegas presentes lhe transmitam esta minha justa reclamação.
Sr. Presidente: infelizmente, não se trata só desses servidores do Estado, vai mais além, vai até aos reformados das colónias.
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Diário das Sessões do Senado-
direito de lhe recusar as pensões a que têm direito.
.Chega a parecer que não estamos vivendo em governo de República democrática, mas sim em regime de soviets. ;Ist.o ultrapassa todos os bons princípios duma república digna e honrada! Está provado quo muitos Ministros que vão às cadeiras do Poder não operam de motupróprio mas sim sob a alçada de meia clúzia de pessoas que os obrigam a desrespeitar não só a lei, como todos os republicanos que contribuíram para a implantação do regime, e que se sentem humilhados com a prática de processos como estes que venho tratando, e que, de facto talvez não sejam da exclusiva responsabilidade dos respectivos ministros, mas do outros que trabalham na sombra.
Não foi para isto que se implantou a República em Portugal . . .
O Sr. Ferreira de Simas: — Eu operei sempre de rnótn-próprio, nunca fuj obrigado a trabalhar por mando de ninguém, nunca me habituei a isso.
O Orador: — Sr. Presidente: en protesto mais uma ve Se de nada servirem os meus protestos, fica ao menos a minha consciência tranquila por ter cumprido um dever. Aproveito a ocasião de estar presente o Sr. Ministro do Interior para ire dirigir a S. Ex.a mais uma vez sobre o que se passa no concelho' de Alenquer. Um homem foi ali espancado por uni bando de caceteiros quando pretendia socorrer outro homem, que polo mesmo bando de caceteiros tinha sido surpreendido num caminho. Disse ontem qtie esse homem estava morrendo. Efectiv;imente está provado o que afirmoi, porque o homerr. morreu, infelizmente. O  Sr.  delegado do Governo em Alea- quer, segundo me informam, não procedeu como devia, e por consequência eu mais urna vez chamo a atenção do Sr. Ministro do Interior, para que meta na ordem essa autoridade, que não sabe, ou não quere, cumprir o seu dever. O Sr. Ministro do Interior (Germano-Martins): — As considerações que V. Ex.a acaba de fazer, respeitantes aos meus colegas, eu as transmitirei. Quanto ao caso de Alenquer, devo dizer a V. Ex.a que espero hoje aqui no Parlamento o delegado do Governo para 'então proceder como julgar de justiça. O Sr. presidente da Relação de Lisboa acusa-o das decisões do Poder Judicial não terem sido acatadas por ele. Se isto é verdadeiro não o posso consentir. A eleição da Misericórdia foi anulada, no d;a 3, e no dia 5 o delegado do Governo, segundo a acusação, quis dar posse a et?sã Mesa, cuja eleição fiuha sido anulada. Isso não pode ser de modo algum. Na minha orientação, nos meus princípios republicanos, entendo que o Poder Executivo pelos seus delegados tem de-acatar as resoluções do Poder Judicial. Se o facto apontado for verdadeiro, ea demitirei imediatamente o delegado do-Governo em Alenquer. Mi o que tenho a dizer a V. Ex.a. O orador não reviu. O Sr. Serra "e Moura (para explicações):—Sr. Presidente: a resposta que o Sr. Ministro do Interior acaba de dar, vem roais uma vez comprovar aquelas convicções que todos os republicanos e-todo o País têm por essa figura que merece a maior simpatia, respeito e consideração. Agradeço as informações que acaba de me dar, e espero que S. Ex.a fará cumprir aquilo que acaba do expor. Tenho dito. O Sr. Carlos Costa: — Sr. Presidente: quando pedi a. palavra, não sabia que o-Sr. Ferreira de Simas abordava o mesmo assunto.
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Sessão de 15 de Julho de 1920
Peço ao Sr. Ministro do Comércio, o lavor de me informar a respeito do cumprimento da portaria n.° 4:443 que manda entrar a Companhia das Aguas com a quantia de 3:000 e tal contos e os respectivos juros, na Caixa Geral de Depósitos; dinheiro esse que1 a Companhia tem guardado ato hoje indevidamente, num banco particular.
Peço a V. Ex.a que me informe sobre este assunto, pois estou convencido,.até prova em contrário, que a Companhia não entrará com esse dinheiro.
Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para declarar que, sem o menor intuito de incomodar V. Ex.a, eu me ocuparei diariamente deste assunto, aqui no Senado, para ver se assim o público -se interessa por este problema.
Tenho dito.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Gaspar de'Lemos): — Sr.-Presidente: a quantia a que-S. Ex.a se refere ainda não deu entrada nos cofres do Estado. ;
Só ontem à .noite tive ocasião de começar a estudar o assunto, que na verdade é bem complexo. ' '•-.-',
Examinei a portaria a que S. Ex.a se refere -e estou inteiramente' convencido que a Companhia tem obrigação de depo-' sitar esse dinheiro.
E nesta orientação hei-de empregar todos os meus esforços e toda a minha boa vontade.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos Costa (para explicações): — Sr. Presidente: agradeço ao Sr. Ministro do Comércio as suas considerações.
Aproveito a ocasião para declarar a. V. Ex.a que a insistência com que eu trato este assunto é apenas fundada no desejo -de prestar um serviço ao público.
Não tenho qualquer outro interesse. .
O Sr. Ferreifa de Simas :—Sr. Presidente: pedi a palavra para dar à Câmara um esclarecimento que julgo importante.
Essa quantia que a Companhia deve depositar'nos cofres do Estado é destinada a obras que são para o Estado.
Ora progunte eu:  e o contribuinte; que paga mais um tanto por metro cubico para ter água em abundância? -. Eu bem sei que esse Banco é' sólido, não havendo portanto nada a recear daí.. Mas o que é facto é quê é um mau precedente.' Se a Companhia entende que por qualquer motivo não deve entrar com esse dinheira, deposite-o primeiro'na -Caixa Geral de Depósitos e depois reclame. O Sr. Carlos Costa: — Sr. Presidente: eu disse que estava convencido de que a Companhia não entraria com esse dinheiro. E bom que diga quais-as razões porque faço tal afirmação. Reservava essa notícia, talvez um pouco sensacional para o Senado, para quando prosseguisse a minha interpelação sobre as águas, .mas é conveniente que eu a traga já a público. A minha interpelação iniciou-se no dia 24 de Junho próximo passado. Quando terminou a sessão recebi a cópia dum convite que tinha sido dirigido a todas as pessoas que compõem' a comissão técnica, criada pelo decreto n.° 8:634, e esse convite dizia p; seguinte: «Havendo uma importância considerável destinada .a melhoramento do abastecimento .de águas à cidade de Lisboa, proveniente da receita pára .isso criada -na alínea b] do § 1.° do artigo 1.° do decreto n.° 8:634, de 1.0. de Fevereiro de 1923, e sendo da maiox conveniência o estudo da sua aplicação pela comissão nomeada em portaria de 31 de outubro de 1924, pede-se a comparência de V. Ex.a à reunião que terá lugar às L5 horas de -25 de Junho». , .           .           .. Essa importância considerável .é representada pelos três mil e tantos contos a que eu me referi; por. qualquer espírito santo de orelha, ou por qualquer conclusão tirada da minha interpelação, foi obrigada a Companhia a pensar na forma de proceder para não ficar sem a posse dOsse dinheiro; e; assim, ela promoveu indirectamente a reunião da comissão, para que:lhe fossem atribuídos os três mil' e tal coiitos.
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Diário das Sessões do Senado
O Orador: — Isso não qúere dizer que a Companhia não tivesse insistido para lhe ser dada essa verba a fim de ser empregada em algumas obras, e eu posso dizer quais elas eram: trata-se da substituição .das máquinas dos Barbadinhos.
A Companhia pretendia obter uma parte importante desses três mil e tal contos para que, quando eu aqui reclamasse a entrega desse dinheiro nos cofres da Caixa Geral de Depósitos, a resposta fosse : isso não pode ser porque foram empregados em melhoramentos indicados pela comissão técnica, nos termos do decreto n.° 8:634 e já estão encomendados materiais, cujo pagamento se efectuou com esse dinheiro. Como eu conheço o facto, trago-o à apreciação da Câmara e do Sr. Ministro do Comércio, para avaliar a razão por que disse ser muito possível que a Companhia fizesse todas as diligências para não entregar os três mil e tal contos.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Gaspar de Lemos): — Os três mil e tal contos são destinados a obras, mas essas obras são indicadas pela comissão técnica, de maneira que a Companhia não tem o arbítrio dessas' obras.
O Sr. Carlos Costa (interrompendo): — É certo que a comissão ó que sanciona, mas a Companhia é que diz o que se deve fazer.
E para confirmação do que afirmo basta. ver 'como está constituída a comissão. A Companhia é que reclama as obras a fazer.
O Sr. Ferreira de Simas (wn aparte):— Isso é uma injustiça que V. Ex.a faz à comissão. A Companhia não tem ninguém na comissão.
O Sr. Carlos Costa: — Mas a Compa-' nhia é que diz quais as obras que se devem fazer e a comissão sanciona.
O Orador: — Eu não sei o que tem sido. O. que me parece que deve ser, e que quem tem a determinar as obras é a comissão técnica e a Companhia tem de se sujeitar às snas determinações. De forma que não me parece que haja razão para os receios manifestados, por V. Ex.a
O Sr. Carlos Costa (interrompendo): — Posso garantir a V. Ex.a que não tem sido assim.
Até agora a Companhia é que tem indicado as obras a fazer. .->
O Orador: — Nem sei quem compõe essa comissão técnica. Como tudo se tem passado não sei. Se tem sido mal a culpa não é minha.
O orador não reviu,
O Sr. Mendes dos Reis:—Pedia a V. Ex.a, Sr. Presidente, que chamasse a atenção do Sr. Ministro do Interior. Entre alguns decretos que foram anulados pela Câmara dos Deputados, depois da queda, do último Governo, figura o decreto referente à polícia.
Esse decreto extraordinário é o estupendo decreto que, como V. Ex.as sabem, se permite nomear entidades que podem até promover a promulgação de leis, decreto que cria dois chorudos lugares de inspector e adjunto, não esquecendo o magnífico serviço de automóvel p erma? nente, viajatas pelo país, eic.
Esse decreto, revogado pela Câmara dos Deputados, está há mais de quinze dias no Senado. E pena que a Secção respectiva não se pronunciasse ainda sobre ele» Mas o' que ó profundamente lamentável é que estando esse decreto revogado se estejam, fazendo nomeações à sombra dele.
Seria pelo menos correcto quando um decreto estivesse anulado por uma das Câmaras à sombra deste não se praticasse mais acto nenhum.
Consta-me, e de boa fonte, que apesar de anulado se continuam a fazer nomeações.
Eu peço ao Sr. Ministro do Interior as explicações necessárias nesse sentido, para dar as mais terminantes ordens para-que tal abuso acabe.
ívão atribuo a responsabilidade do acto ao Sr: Ministro do Interior, porque estou absolutamente certo de que S. Ex.a não sancionaria tais imoralidadas.
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Sessão de 15 de Julho de 1925
. No- rigor do direito, lá pelo facto de uma Câmara ter revogado um decreto, ele não/ deixa de ter validade.
É claro que me consta que já algumas nomeações se fizeram a respeito desse decreto.
O Sr. Mendes dos Reis:— Depois da anulação do decreto., . =.
O Orador:-7-Já pedi informações, mas ainda as não. tenho; quando as tiver, trago-as aqui a V. E.x.a
E a propósito das apreciações feitas ao decreto, devo dizer perante p Senado que entendo que junto do Ministério .do Interior deve haver algum inspector geral de polícia ou uma pessoa com qualquer outro título que possa ter, perante o Ministro, a responsabilidade dos, seus actos e a. responsabilidade das informações que lhe dá e a quem o Ministro possa transmitir as ordens que devem ser dadas às diferentes secções da polícia.
Tenho esta opinião, tiào porque conheça bem a orgânica desses serviços —-há pouco tempo é que a conheço T— mas olhando aos interesses da ordem que-estão confiados ao Ministério do Interior. . É-prec;so que haja alguém, com competência e idoneidade que-possa tomar perante o Ministro do Interior as obrigações que lhe competem na direcção desses serviços.
Já me foi chamada a atenção particularmente sobre este, facto, e devo dizer que se todos os argumentos fossem como esse da promulgação, de leis, poucos .argumentos haveria.
O- Sr. Ribeiro de .Melo:
tante.
Era o bas-
O Orador:—V. .Ex.a, Sr. Bibeiro de Melo, não é um jurista. Essa repartição fará o expediente' da promulgação 'das leis; quem as promulga é o Parlamento.
Pregunte V. Ex.a.a um jurista, qualquer, e verá que essa opinião é um fogo, fátuo, não tem realidade prática.
As leis vêm do Parlamento, passam pelas repartições competentes, e vão para o Diário do Governo ; o Ministro quere fazer um decreto,, dá os seus apontamento^, e a repartição dá-lhe o devido, destino.
Isto é o expediente.
Se todos .os argumentos -íôssem dessa natureza, não tinham valor 'algum.
O Sr. Ribeiro' de Melo (interrompendo):— V. Ex.a. pode fazer uma proposta de lei reorganizando esses serviços.
O Orador: — Quando se discutir o projecto hei-de expor as minhas ideas.
Sr. Presidente': eu disse ao ilustre Senador Sr. Mendes' dos Reis que não podia acompanhá-lo em- todas as considerações que S. Ex.a.fez a respeito do decreto; algumas delas podiam dispensar-se, mas outras, como, por exemplo, este meu parecer que efectivamente junto do Ministro do Interio.r é preciso que haja alguém que tome a responsabilidade dos serviços dá'polícia, 'todos 'os Ministros que passarem por esta cadeira hão-de dar-me razão.
O orador não reviu.
' O Sr. Mendes dos Reis : — Sr. Presidente: começo por agradecer ao Sr'. Ministro do Interior as explicações que S. Ex'.a. acaba de dar.
Sr. Presidente: com esse decreto aumenta-se a despesa,' entre outras razões, porque se aumentam 'funcionários superiores', alguns com direito á" automóveis om ' serviço' permanente,' ã viagens pelo país, o que custa muito dinheiro e .ó desnecessário.
Disse o Sr. Ministro.do Interior que a entidade Ministro do Interior precisa de .ter a seu lado alguém que o informe sobre o ,quo se passVna polícia.
. Então pregunto eu : .^ para que serve o governador civil-?
. E uma, autoridade.da sua confiança, e por cons.eqiiência por intermédio dele deve ter todas .as .informações necessárias.
Sr. Presidente: nada tenho contra os funcionários 'superiores; dá-se até a circunstancia, de ser amigo de um deles, mas não estou,.de acordo com.a nomeação desses funcionários, nem com as. extraordinárias regalias que Ihçs são .concedidas.
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reservando-me para, na ocasião oportuna, provar o que afirmo.
O Sr. Procópio de Freitas:—Sr. Presidente : pedia a V. Ex.a para consultar o Senado sobre se permite que o antes da ordem do dia fosse mais longe a fim de os Srs. Senadores que pediram a palavra para quando estivessem presentes os Srs. Ministros, a pudessem utilizar.
Eu tinha pedido a palavra ontem, para quando estivesse presente o Sr. Ministro da Agricultura, e V. Ex.a hoje deu a palavra a alguns Srs. Senadores que a pediram momentos antes.
O Sr. Presidente :—V. Ex~.a não tem razão de queixa, porque antes de V. Ex.a têm a palavra pedida nada menos de cinco Srs. Senadores.
Consulto a Câmara sobre o desejo de V. Ex.a
O Sr. Mendes dos Reis (sobre o modo de votar):Sr. Presidente: o pedido do Sr. Procópio de Freitas é absolatamente justo.
E tam raro os Srs. Ministros darem--nos o prazer de vir ato aqui que, quando, porventura, aparecem, justo é que os Srs. Senadores possam tratar dos assuntos que às diferentes pastas respeitara.
O Sr. Catanho de Meneses (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente: embora não tenha aqui presente a disposição do Regimento que diz respeito a este caso, estou convencido de que ele determina que haverá uma hora para antes da ordem do dia e, desde o momento que assim o determina —e salvo melhor opinião —, parece-me que se não pode alterar o Regimento, senão .pelo modo legítimo.
V. Ex.a resolverá como entender.
O Sr. Presidente: — Como se trata de mn requerimento, ponho-o à votação, e o Senado resolverá.
Posto o requerimento à 'votação, o Senado rejeitou-o.
-O Sr. Presidente:—Vai entrar-se na
ORDEM DO DIA
Sem discussão, ê aprovada a redacção da Secção à proposta de lei n,° 937.
O Sr. Presidente: — Continua em discussão, na generalidade, a proposta de lei n.° 866.
Tem a palavra o Sr. Ribeiro de Melo-
O Sr. Ribeiro de Melo: — Sr. Presidente: depois de ter ouvido o Sr. Herculano Galhardo, que provocou explicações também dos representantes do Partido Nacionalista, embora não pertença aos «gagas» de então, que votaram aquela alínea 7z)? do projecto de lei em discussão, parece--me que é de aceitar a doutrina do Sr. Herculano Galhardo, que não aceita, sobretudo, as disposições do artigo 9.°
E o caso, Sr. Presidente, que a estar proposta de lei n.° 866 se lhe pode atribuir também o carácter político, porque, em regra, nós assistimos à discussão e apresentação de propostas que têm aquilo-que vulgarmente se chama sobrescrito, que nós, nesta Coroara de ponderação e* de revisão, temos.de fazer errar o endereço, tal qual como sucede nos correios e-telégrafos, quando o endereço não é bem legível ou bem compreendido, sendo & correspondência nessas condições, lançada a unia caixa chamada alçapão, onde fica: depositada.
Parece-me, Sr. Presidente, que a proposta de lei n.° 866 merecerá também: ser recolhida nesse fabuloso alçapão, não-dos correios e telégrafos, mas parlamentar, pois acho interessantes as explicações-que o Sr. Afonso de Lemos, acorrendo-à chamada que lhe fizera o Sr. Herculano Galhardo, deu ao Senado.
S. Ex.a, segundo eu ouvi, disse que tinha votado contra a alínea Ji) do projecto aqui mencionado e do qual foi relator o Sr. Herculano Galhardo, a pedido, do então Ministro das Finanças.
O Sr. Herculano Galhardo (interrompido):— Eu não era relator, mas leader do* Partido Ropublicano Português, e o Sr. Ministro das Finanças de então pediu-me-que na qualidade de leader requeresse a urgência e dispensa do Regimento para, se discutir o projecto.
Aí parou a minha intervenção.
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-entrasse em discussão, imediatamente, -aquele projecto ou proposta de lei que, entre outras cousas, pela sua alínea h) •dava ou atribuía a cifra de 3:000 contos ,para levantar o nível da linha do Estoril. Protestou, então, a minoria do Partido Unionista, que, por felicidade, lá está «hoje, também representado aqui pelas mesmas pessoas dentro do Partido Nacionalista.
O Sr. Afonso de Lemos (interrompendo}:— Eu disse ontem que o projecto -que então veio ao Senado estabelecia, na alínea h), que o Estado fizesse as despesas que legitimamente devia fazer a Companhia, por isso que o contrato que tinha feito com a Companhia Portuguesa •obrigava a fazer, a essa Companhia, es--sas despesas.
Não só me opus a essa alínea, mas -consegui que o Senado se pusesse a meu lado, incluindo o Sr. Herculano Galhardo.
Agora, tratava-se de uma lei geral, permitindo que, durante cinco anos, hou--vesso isenção de direitos para determinados artigos.
Nada tinha que ver com- o assunto de -então.
O Orador (continuando}:—Agradeço.a Y. Ex.:i a explicação, que, aliás, era desnecessária.
Se não fosse a intervenção que na -apreciação desta proposta tiveram os Srs. Herculano Galhardo e Afonso de Lemos, declaro que não daria a minha opinião ^ôbre o assunto, nem falaria sobre tal ^projecto. ,
Mas as palavras de V. Ex.a e aquelas aqui proferidas pelo Sr. Herculano Galhardo trouxeram ao meu espírito uma dúvida que desejo esclarecer.
Se essa dúvida continuar existindo depois das considerações que aqui forem ieitas, eu, na minha qualidade de Sena-'dor independente, declaro que dou o meu voto contrário à aprovação da proposta. -Se porém eu não tiver razões para que -essa dúvida subsista dar-lhe hei o meu voto favorável, pois aprecio, a electrifica-•ção da linha de Cascais pelo espírito de comodismo, e pelas vantagens que se me oferecem como passageiro da linha e cor jno admirador'd as belezas que ela contém.
Mas. das explicações trocada? entre as
Srs. Afonso de Lemos e Herculano Galhardo, resultou para o meu espírito uma forte dúvida, embora, o Sr. Herculano Galhardo não tivesse sobrescritado para ninguém as suas considerações, porque não faz isso parte dos seus sentimentos de parlamentar.
Apoiados.
E assim ocorre-me preguntar à minoria nacionalista, que neste momento está empenhada em dar uma votação favorável a esta proposta de lei n.° 866, se a Companhia Estoril quando fez >o contrato com a Companhia Portuguesa para tomar a linha de Cascais e electrificá Ia, não calculou quais os encargos que lhe adviriam assim como as dificuldades de numerário para poder efectivar esse contrato.
Isto é uma pregunta que faz a voz simplista do público que não vê as cousas através dos altos conhecimentos de engenharia nem das conveniências das sociedades - anóninu s, mas vê-as unicamente polo lado mais fácil e simples, como é aquele que eu vejo, ou seja a comodidade que advirá com a electrificação dessa linha.
>O Sr. Afonso de Lemos (interrompendo):— V. Ex.a dá-me licença?
A Sociedade Estoril quando assinou o contrato com a Companhia Portuguesa obrigou-se a íazer a electrificação da linha de Cascais e a explorá-la.
Depois, com o tal projecto que aqui foi discutido vinha ver se obtinha do Estado a modificação, à custa deste, de uma parte da linha, que ela era obrigada a fazer.
Com respeito a V. Ex.a dizer que a minoria nacionalista está empenhada em votar esta proposta, eu devo dizer que ela está apenas analisando a proposta e só se reconhecer que há qualquer cousa que possa favorecer ilegitimamente a Sociedade Estoril pode V. Ex.a ter a certeza de qne não votaremos.
Trata-se porém de uma medida de ca-ráter geral. ,
Beneficia com. ela essa companhia? É uma cousa com que nada temos.
O Orador: — As sociedades anónimas que se organizam para a exploração de caminhos do ferro devem saber e contar
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é que aparece aqui o artigo 9.° para a qual o Kr. Herculano Galhardo chamou o. atenção do Senado?
Logo após urna revolução, e bem grande ela foi, houve uma. empresa industrial, a maior talvez, que existe no país, qae tinha para despacho, e a bordo de una navio, muitas toneladas de material de caminho de ferro pelas quais pagaria direitos de ç§60 por quilograma. Hccveum dês pacho ministerial pela pasta das finanças, registado pelo Director Geral das Alfândegas, que baixou a importância dos direitos de j560,para é_02.
Sabe V. Ex.a quanto ganhou essa empresa? Cerca de 2:000 contos. ,;Tinha ou não este despacho um sobrescrito end- recado . a uma alta empresa que explorava a maior indústria de Portugal?
Não há dúvida. .
Como o público conhece casos destes, amanhã, quando tenha, conhecimento da aprovação da proposta de lei em discussão, preguntará se o Senado estaria atento a esta discussão ou se-desejaria tam-. bem assinar o sobrescrito dirigido â uma sociedade anónima.
Pesa-me muito trazer casos destes à discussão desta1 Câmara porque, numa liora tam aflitiva como é esta, num transe tam doloroso, desejaria antes fazer calar a minha voz, não protestando nem levantando acontecimentos tam sensacionais. . .
Se fosse levado pelo afecto ou ainda pela admiração, não teria que entrar na discussão e limitar-me-ia a dar o meu voto em sinal de agradecimento e adio i facão pelas pessoas que dirigem essa empresa.
Mas o legislador deixou os afectos, deixou o coração e os agradecimentos nos domínios familiares e vem.aqui defender • os iaterêsses do Estado e sobretudo os interesses do país. > E estes de maneira .nenhuma ficam acautelados nem defendi-,dos desde.que se aprove .esta proposta de lei. .
O Sr. Herculano Galhardo provou-o inteligentemente, não mencionando a .cifra em que seriam lesados 03 cofres do Estado . com o não pagamento dos direitos alfandegários do material eléctrico destinado à electrificação da linha de Cascais. • •
O Sr. Eerculano Galhardo, afinando >o seu costumado bordão, defende toda a
compressão de despesas e sobretudo defende o aumento das receitas,'e deve dizer-se com sinceridade que defende os seus pontos de vista com cretério e brilho; é um bordão do Sr* Herculano Galhardo já muito nosso conEecido e que merece toda a nossa consideração.
Mas se o Sr. Herculano Galhardo não tivesse feito as considerações que fez poder-se-ia dizer que S. Ex.a tinha aparado no caminho o tal sobrescrito.
Já não é o meu porque tratei o assunto no seu aspecto político.
O pensamento do Sr. Herculano Galhardo foi outro que não o meu e provou à evidência que as receitas gerais do Estado eram afectadas .com a aprovação desta lei.
O Sr. Herculano Galhardo (em aparte):— De.ve V. Ex.a acrescentar: e sem que daí adviesse nenhum benefício para o País.
O Orador:—Não sendo arauto do povor porque não tenho qualidades para isso, mas sendo apenas arauto de uma pequena grei de republicanos que estão apostados em defender à outrance a moralidade do próprio regime, em todos.os actos administrativos da República, não podia ficar silencioso, deixando publicar esta proposta de lei, sem dizer .qoais os seus inconvenientes, e por que razão ela tem sido tam bem acompanhada na Câmara dos Deputados e parece sê-lo também no Senado, promovendo-se a sua,discussão o mais rà-pidameate possível.
. Tem vivido eni situação . desafogada que lhe permite dispensar o favor do Estado.
No Anuário. Comercial vemos a constituição dos corpos gerentes de empresa» várias de tal forma feita que .leva o desânimo a todos os republicanos.
Assim vemos monárquicos -.de braço dado c Dm republicanos.
Vemos os Ulrichs declaradamente monárquicos, em cujos salões se ostenta o re-trato.de D. Manuel, governadores do Banco Ultramarino, -possuidores .nos seus cofres de cartas, .as mais'afectuosas, firmadas per republicanos da mais elevada categoria. • .
A 'Sociedade Estoril não deixa de estar na mesma situação. . >'
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auxiliar as grandes empresas e as sociedades anónimas,, o faça em condições tais que não se lhe atire qualquer pedra.
A propósito vou -chamar a atenção do Sr. Ministro do Comércio para o seguinte facto : sabe o Sr. Ministro do Comércio que a famosa frota mercante dos transportes marítimos tem sido vendida a pouco e pouco. .
Na proposta de lei respectiva, uma das •condições estipuladas- era o permitir ao arrematante, por falta de numerário fazer o pagamento em anuidades, com o juro •de 10 por cento sobre o capital a pagar'.
Sucede que houve arrematantes que não pagaram logo tudo, e o Estado reclamou coin justo direito o pagamento dos iuros nas anuidades.
Ora, o Estado se reclamou esses juros é porque precisava deles.
Se porventura os dispensasse era para fazer movimentar a frota mercante.
Também a Holanda,.devido à crise da indústria dos estaleiros, pagou integralmente aos estaleiros o preço dos vapores e depois os vendeu em prestações a determinadas firmas.
Isto se faz para aumentar a frota mercante e para evitar uma crise da indústria local.
A Dinamarca faz a mesma cousa, e a Inglaterra, hoje como sempre, dá todas as facilidades aos compradores de navios.
Mas nem por isso, pelo facto de dar facilidades, deixa de haver a falência de muitas companhias de navegação, sobretudo nos últimos tempos.'
Como é que o Estado, estando tam disposto a largar mão de uma verba tam importante como é esta, que deixariam de pagar as sociedades que exploram ou se propõem explorar- determinadas linhas férreas, não o faz também para outras que mais vantagens trazem, porque nãp há nada melhor para o comércio e indústria e propaganda de uma nação do que o aumento constante e permanente do seu pavilhão marítimo.
' Esta é das leis económicas que eu aprendi na escola e que fui constatando como uma verdade nos "quinze anos de vida prática que tenho atravessado.
O Sr. Ministro do Comércio que está atento à discussão desta proposta de lei, porque correm pelo seu Ministério as fatí-
dicas letras do alfabeto T M E, a pronunciar-se favoravelmente pelo artigo ,9.° tem de se pronunciar pela questão que eu aqui trouxe.
O Sr. Ministro do Comércio tem de atender a todos aqueles que fretaram navios e que individualmente não podem ficar 'com o encango do juro de 10 por ceuto que é uma usura porque o Estado não os deveria obrigar à pagar um juro superior ao juro legal que é de 5 por cento.
Há poucas horas o Sr. Procópio de Freitas, nosso ilustre colegas pretendeu chamar a atenção do Sr. Ministro da Agricultura para o decreto n.° 10:864 que aumenta o imposto do açúcar na Ilha da Madeira.
Cá temos outro sobrescrito, Sr. Presidente, não do Parlamento que dele não teve conhecimento a não ser depois de publicado no Diário do Governo, nem para a sua confecção contribuiu, mas da Direcção Geral das Alfândegas e portanto do Ministério das Finanças.
Ele serve simplesmente para poder satisfazer os interesses mais que comerciais porque são verdadeiramente absorventes, duma determinada firma que foi uma das causas principais que/ fizeram rolar a coroa dos Braganças. É essa questão que está a reviver na elevação de direitos imposta pela-Direcção Geral da Alfândega.
Dir-se há que é apenas uma meia dúzia de pessoas que se interessa por este caso.
, Se fosse assim bem era para essa mal administrada instituição.
É porque uma insignificante minoria está apostada em perturbar toda a acção republicana dentro desse Ministério e sobretudo fazer com que dessa repartição saiam despachos ministeriais, que venham confundir o valor moral do regime com a valiosa moral dos homens.
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se fez a redução do imposto aduaneiro, não há razão para que o Senado vote a demi-nirição de receitas, sobretudo para berie-ftar uma Companhia ou qualquer empresa.
Só vejo nm lado prático, e esse lado prático é aquele que me pode interessar em toda a sua plenitude emquanto estiver exercendo o mandato o ter um passe gratuito para poder andar livremente na linha de Cascais, e mais vantagem terei se porventura amanhã estiver elec-trificada a linha. E a única vantagem que poderia ter, mais nada.
Quem. podia ter vantagens eram outros senhores e esses outros são aqueles que fazem parte do conselho administrativo dessa empresa, são os do seu conselho fiscal, são os da administração e direcção^.
Esses sim, porque só houver aumento de passageiros, certamente a empresa 0:1 sociedade anónima arrecadará maior receita e portanto mais dividendo poderá distribuir pelos seus accionistas e maior ordenado poderá dar aqueles que bem a administram.
Sr. Presidente: se não fosse o ilustre Senador Sr. Herculano Galhardo ter aqui levantado os seus reparos sobre esta proposta e se o ilustre Senador S. Afonso de Lemos também não tivesse esclarecido a Câmara, tenho'a certeza de que. esta proposta n.° 866 já ontem tinha sido aprovada, mas hoje é impossível.
j Quanto en avalio a dignidade e o sentimento dos inens colegas! P0or mim estou convencido de que esta proposta de lei n.° 866 morreu para sempre; não mais o Senado da República pode apreciar uma proposta de lei n.° 866, tal como está confeccionada e como transitou da Carcará dos Deputados para o Senado.
Só o que é pena é que não seja -provado o artigo 5.° que representa uma dívida que a República tem a pagar àquela região, porque ela foi dinamitada pelos inimigos co regime, pelas hostes de Paiva Couceiro e de outros.
E ocorre no momento pregnntar se continuam em vigor aqueles célebres decretos com força de lei que mandam aumentar as contribuições aos indivíduos reconhecidamente monárquicos c que contribuíram para essas revoluções pare, que por esse excesso sejam fcibs as repara-
ções nessa ponte de Mosteiro e em outras-cousas.
Nunca se fez nem se há-de fazer, o que não querc dizer que não haja uma comissão-composta dum general do exército, dum-, parlamentar e dum director da Contabilidade, que reúne no Ministério das Finanças quatro, cinco e seis vezes por mês-unicamente para assinar a acta da sessão anterior que é para justificar o pagamento do subsídio ao director da l.a Repartição, Oliveira o Silva 400)5 mensaisr. para o general Abel Hipólito uma importância idêntica e para o parlamentar Tavares de Carvalho uma importância não inferior.
E quem sabe isto?
Todos os republicanos que se interessam pela República, e os funcionários que sofrem o vexame de processar folhas-de pagamento para uma comissão que não produz nada, que não é útil nem para> a República nem para o País, antes pelo contrário enlameia 'o regime, envergonha, a administração republicana.
A ponte de Mosteiro, uma vez que foL arredada íi hipótese da sua reparação -à. custa do excesso das contribuições, tinha agora esta aberta do artigo 5.° desta, proposta para ser restaurada, e como seria agradável para o Senado votar esse artigo que se destina exclusivamente à. restauração dessa ponte...
Aos *que se interessam por esta proposta, eu direi aquilo que me tem sido aconselhado a mim noutras vezes: Tragam V. Ex.as à Câmara-um projecto de-lei, peçam a dispensa do Regimento, re-queiram a reunião extraordinária da Secção respectiva para apreciar essa proposta, porque não importa ao Senado que se viole o Regimento, porque do todos os lados da Câmara seria aclamado aquele-parlamentar que trouxesse um projecto-de lei para a restauração da ponte de Mosteiro.
E dito isto enterremos de uma vez para. sempre o projecto de lei n.° 866, nós que somos Senadores a quern negam o carácter político conforme as conveniências do Poder Executivo, ou dos parlamentares que se agarram às conveniências mesqui-. nhãs de manter um Governo -no Poder.
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coes do povo e que somente nos prestigia- .
Sr. Presidente: o Sr. Herculano Galhardo frisou bem o prejuízo que as'receitas do Estado sofreriam se porventura íôsse aprovado o artigo 9.°
Disse-o com clareza e de uma maneira que não pode deixar dúvidas no espirito de ninguém.
Mas além disso, Sr. Presidente, sabe-se positivamente, acertadarnente, que uma proposta .de lei que se transforme amanha em diploma legal não pode de maneira nenhuma, sem levantar,um grande conflito, ter efeito retroactivo..
E et.ta tem:no, porque desde 1923 uma determinada .companhia levanta da alfândega, sob caução, o material que.está aplicando nas suas obras.
Sr. Presidente: se essa companhia, que é rica, tem sempre levantado da alfândega, sob caução, o seu material é porque está convencida da fraqueza do Parlamento para ser votado o artigo 9.°
E se assim é, que o meu protesto seja aqui levantado, e erguido bem alto, de modo a não haver dúvidas que também um Senador independente protestou contra a disposição do artigo 9.° bem como contra todos os outros que representem um favor a uma companhia.
Na hora em que o Estado tiver de distribuir favores, outras classes, que não estas das sociedades anónimas, estão em número l para os poderem receber com justiça e galhardia.
Mas, Sr. Presidente, estes favores.àqueles que têm dinheiro, 'quê podem fazer umas determinadas obras, ultrajam a consciência republicana, aviltam o Poder Legislativo e ennegrecem até o Governo se porventura puser em execução uma.lei aprovada pelo Parlamento.nas condições desta.
Sr. Presidente: palavras sem eco têm sido aquelas que eu aqui tenho levantado no Senado, em todas as campanhas, como. por exemplo naquela que eu fiz contra os Transportes Marítimos do Estado.- -
Tudo. tom desaparecido desse organismo^ menos o director geral.. :
Esse .passeia pelas ruas de Lisboa em automóveis luxuosíssimos, dopois de se ter dito aqui pela boca do Poder Executivo, dopois de .se ter proclamado aqui no Parlamento que tinha havido roubos.
Pois bem, Sr. Presidente, ninguém foi preso, ninguém foi condenado; antes pelo contrário todos estão em liberdade e o director dos Transportes Marítimos do Estado,, que dantes só tinha o seu soldo-de' oficial da armada, passeia de automóvel pelas ruas da cidade.
Sr. Presidente : há-de chegar a hora ern que o povo há-de fazer justiça e em que-as responsabilidades do Poder Executivo-por estes actos cometidos hão-de ser chamadas ao tablado público; virão-responder por esses actos de má administração, pois não -se podem defender nem-livrar desta acusação pública e peremptória quando não aparece um só culpado que esteja expiando .nas cadeias portuguesas aquelas tremendas e volumosas dissipações dos-dinheiros do Estado por intermédio dos Transportes Marítimos do Estado.
Tanto essa como a dos Bairros Sociais-e outras que são a vergonha da Kepú-blica, hão-de vir a lume um dia.
Nessa hora mal irá aos governantes-que mal se tenham desempenhado da sua função, não castigando e punindo aqueles-que \eram responsáveis por uma parte da riqueza do Estado.
Sr. Presidente : não voto a proposta de lei n.° 866.
-Podia muitas, mais,.razões apresentai* sobre este assunto, podia trazer aqui ao conhecimento do Senado os clamores de uma parte da opinião republicana, que set revolta contw este estado de cousas.
Mas não. quero; e não quero porque? não ó meu intuito demorar o estudo da proposta 'de lei n.° 866.
Depois do que foi dito o afirmado pelo-Sr. Herculano Galhardo e do que foi dito-também: pelo representante, neste, momento, do Partido Nacionalista, Sr. Afonso-de Lemos, e, sobretudo, por aqueles que aqui declararam que assumiam inteira^ responsabilidade, não há- o direito de se--votar esta proposta.
Se .a votássemos, nós íamos servir apenas ' aquela ;política e os interesses-daqueles que' estuo dentro da administração-destas empresas..
Tenho dito.
O..orador -não reviu.
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sinceridade, no propósito de dar explicações e de não ir contra o Regimento falando pek terceira vez.
As explicações que tenho a dar a V. Ex.a e ao Senado 'são, porventura, mais longas do que seria o meu desojo, visto que as devo a mais de um Senador e devo também explicações àqueles Sr s. Senadores que não sei bem quem são mas •que deram apoiados «, afirmações que contrariavam as minhas.
,;() que é esta proposta?
Esta proposta, conforme disse ontem, é um simulacro de medida de fomento destinada a mascarar a disposição do artigo 9.°
Quer dizer, esta proposta de lei vale, principalmente, pelo artigo 9.°, para não dizer exclusivamente pelo mesmo artigo.
Tem outro enxerto, que é o artigo õ.°, que se refere à ponte de Mosteiro.
Sr. Presidente: £ Porque é que se sustenta que esta proposta de lei se poderia considerar medida de fomento?
Porque em todos os seus articulados se revela que o seu autor teve, evidentemente, o pensamento de apresentar na Câmara dos Deputados um projecto interessante sobre este ponto de vista, o que se revela pelo pequeno relatório, mas lúcido, que antecede a proposta. O seu autor desconhece propriamente a técnica do assunto que estava tratando e principalmente a economia dele.
Quere dizer, o auto.r do projecto desconhece a técnica e a economia deste assunto .e só assim se explica que tivesse apresentado um projecto de lei para vigorar durante 5 anos, como se a electrificação dos nossas linhas férreas e a exploração dos jazigos carboníferos se pudesse fazer em cinco anos.
Esta lei, reconhece o seu autor, não era para ter execução imediata; para ter execução imediata era o artigo 9.°, esse sim!
A Companhia quando encomendou o material no estrangeiro sabia muito bem quais eram os encargos que tinha de satisfazer, mas concebeu a esperança de qae por via do Orçamento se poderia pôr ao abrigo dessas despesas; o Sr. Eibeiro de Melo compreendeu isto admiravelmente, e pô-lo também admiravelmente ao Senado, quando há pouco falou.
Disse eu que não era a primeira vez,
e agora é a explicação que eu dou ao Sr. Afonso de Lemos, que esta Companhia principalmente beneficiava pelas disposições do artigo 9.°; veio ao Parlamento £.0 abrigo de qualquer projecto de lei e tentou fazer passar disposições que a beneficiassem à custa do Estado.
Em 1919, como já "disse ao Sr. Afonso de Lemos vinha ela abrigada com uni projecto de empréstimo ao Porto de Lisboa, e onde âe incluía uma verba de 3:000 contos destinada exclusivamente à modificação da linha entre o Cais de So-dré e Alcântara.
Então, o Sr. Afonso de Lemos em seu nome pessoal e em nome do Partido que representava nesta Câmara — foi a sua declaração muito clara e expressa— combateu o projecto nesta parte unicamente, e quanto à parte propriamente do empréstimo do porto de Lisboa concordava com ela.
Quanto a essa alínea h), a tal que destinava 3:000 contos para modificação da linha férrea entre o Cais de Sodré e Alcântara, S. Ex.a era intransigente e entendia que o Senado não devia aprovar tal disposição.
Re&ta dizer que essa concessão dos 3:000 contos não era inteiramente desin-teressante para o-Estado visto quo alguma cousc beneficiava, pois construído o projectado viaduto, ficava uma porção de terreno que a Companhia cederia ao Pôr-to de Lisboa.
Pois agora trata-se- de. um presente maior, porque não sabemos até onde irá a isenção de direitos,- sem que daí resulte a mínima parcela de benefício para o Estado.
Argumenta-se que é uma medida de largo alcance, que beneficiaria a cidade, etc. Mas já o era em 1919, e as razões que o Sr. Afonso de Lemos tinha naquela ocasião para combater o benefício que se pretendia conceder a uma empresa são as mesmas qae existem hoje, poisjá naquele tempo se tratava de uma linha destinada a beneficiar a cidade de Lisboa, etc., etc.
Se S. Ex.a era então contra o presente de 3:000 contos à Companhia, com muito mais razão tem S. Ex.a que sê-lo agora, visto que se trata de fazer um presente que nós não sabemos a qnanto monta.
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trata de um alto benefício para a cidade, que a valoriza, etc.
~Mas as razões que S. Ex.a hoje apresenta para defender o seu ponto de vista são as mesmas que o Sr. Afonso de Ler rnos apresentava outrora ^para o combater. • ;
Conheço o carácter do Sr. Afonso de Lemos, que é ainda o do vereador intemerato- de antes da República, que se levantava- sempre contra todos os potenta: dos.
A impressão • produzida neste lado da Câmara pelas considerações dos Srs. Afonso de Lemos e Celestino de Almeida foi tam grande quê eu me dirigi ao Sr. Rego Chaves, pedindo-lhe para acatar o ponto de vista da oposição, o que S. Ex.aM'ez.
Diz o Sr. Afonso de Lemos que o aspecto da questão é outro; mas não é assim, embora pareça.
A política aduaneira tem andado aos tombos por mais de uma vez.
Se a Companhia dó Estoril, como outra qualquer, queria ser favorecida pela retroactividade do artigo 9.°, tivesse utilizado como devia esta disposição da lei, mas não o fez porque prefere os caminhos a que se referiu há pouco o Sr. Ribeiro de Melo.
E preciso que & República não seja isto. •
É por isso que eu ontem tomei calor na, discussão.
Pode, mas digam-me se é no momento em que temos um déficit formidável, em que não pagamos aos servidores dó'Estado coino devemos, e em que deixamos muita cousa abandonada, por falia de receitas, que devemos usar da política d'a redução de impostos:.
Ou não temos a cabeça no seu'lugar ou estamo& a enganar-nos a nós meamos.
Referiu-se o Sr. Presidente do Ministério, se não foi aqui, foi'noutra qualquer parte, à estabilização do câmbio.'
Falar hoje em estabilização de câmbio é cousa pouco própria há -boca de homens de Estado. "• •
O câmbio Tião se estabiliza e menos se estabiliza quando se não tem o Orçamento equilibrado.
Para se chegar à estabilização da nossa moeda, o que é cousa muito diferente, a
primeira cousa que tem ;todo o Governo a lazer é equilibrar o Orçamento.
Não basta dizer-se que vamos comprimir despesas; é, preciso que claramente calculemos as despesas necessárias. •
Para que serve estarmos a dizer que comprimimos despesas se não fazemos estradas, se não abrimos escolas, se temos um exército onde há oficiais é técnicos do maior valor, que estão impossibilitados de prestar à Nação aquilo que lhe devem, por impossibilidade material de falta de verba?
v .Não temos política militar, política de estradas, política de caminhos de ferro, •política hidráulica, de instrução, porque não temos dinheiro, e vamos fazer a concessão de-isenção de direitos, para beneficiar companhias particulares. •
<ílsso p='p' admissível='admissível' é='é' presidente='presidente' sr.='sr.'>
Eu tenho de dar algumas explicações.
Devo-as ao Sr. Augusto de Vasconcelos, que ainda bem que vejo aqui na minha frente, e devo-as também'ao Sr. D. Tomás de Vilhena, meu velho amigo, por causa de um apoiado de S. Ex.a não para mini, mas contra rnim.
Quando eu falei em ricos, podia alguém concluir que tenho antipatia pelos ricos.
Não tenho.
Não me importo- absolutamente nada com eles. : • • '•
- Mas no regime actual, h^stè regime liberal em que para felicidade de muita gente vivemos, ser rico não é crime, é uma cousa absolutamente -permitida.
É rico quem quere, é mais rico do que este aquele que- quero, é menos rico o que o quiser sei-, e pobre também quem quiser e pode também ser mais ou menos •pobre do que-aquele'outro. r • Eu não sou rico, mas digo a V. Ex.a, Sr. Presidente, que não sou rico, porque não quis ser rico.
Se quisesse ser rico, 'era rico.
Portanto não-tenho nada que me queixar, neBa tenho espécie nenhuma de antipatia pelos-ricos.
O que eu digo é'que há uma política de
ricos,' e há urna política (fé pobres, e da-
~das' às minhas afirmações anteriores,'eu
• prefiro ir para a política dos- pobres, ;de 'protecção aos pobres.
• -Quando digo pobres,-eu não mo refiro aos mendigos.
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Pobres chamo eu àqueles que trabalham constaotemente e que nem sequer têm assegurado, não digo já o futuro, mas o próprio presente, e o bem-estar da sua família.
A esses é que eu chamo pobres.
Eu sei que é essa também a sua opinião, Sr. Presidente, e a da maioria da Nação, o ao aíirmar-se, como se afirma para aí, que pelo facto de haver ricos o país está cm regime de prosperidade, eu não aceito essa teoria.
A riqueza dos particulares não representa a riqueza da Nação, a não ser quo os particulares ricos sdjam como os da América, onde os ricos entendem que foi da sociedade que receberam a sua riqueza e que portanto devem à sociedade uma parto dela. É por isso vulgar vê-los restituir à sociedade toda a sua fortuna, metade ou uma parte da mesma fortuna.
Sr. Presidente: assim também eu queria ser rico; e só o meu país íôsse assim eu talvez tivesse feito a diligência do ser rico para ter o sumo prazer de distribuir depois toda a minha riqueza pelos estabelecimentos de instrução e beneficência, por tudo o que fosso útil à colectividade.
Como, se eu o fizesse, em paga o muito que poderia ter era alguma comenda, que é objecto de que eu faço tanto caso como dos ricos, entendi que era melhor ser pobre, porque assim pode-se sempre tratar das questões sem que digam, como é costume entre nós, num país de maldizentes como é o nosso, sem que digam «que estamos a tratar de nós».
^No caso presente trata-se de beneficiar o povo?
Nã,o senhor. Então para quê? Para valorizar unicamente as propriedades que existem de Alcântara a Cascais, porque por este meio o Estado faz a concessão de alguns 1:000 contos sem pedir absolutamente nada em troca. Compreendia-se que o Estado fizesse uma concessão a uma empresa particular, exigindo como contrapartida qualquer cousa que representasse benefício público. Podíamos entrar nesse caminho. i Mas medidas de fomento desta ordem merecem   ser ponderadamente estudadas, não podem ser votados às cegas. Só repararmos no que se passou na Cá mara dos Deputados verão quo este projecto nem levou uma hora a discutir e eu tenho falado com Srs. Deputados que me têm dito que nenr sabiam que ele tinha passado! <_ que='que' de='de' a='a' país='país' medida='medida' podemos='podemos' represente='represente' uma='uma' estudar='estudar' do='do' qualquer='qualquer' sr.='sr.' o='o' nós='nós' p='p' cousa='cousa' afonsso='afonsso' disse='disse' riqueza='riqueza' então='então' que-='que-' lemos.='lemos.' não='não' fomento='fomento'> Podemos; mas havemos de fazê-lo se-guramouto e com os técnicos o ecónomos necessários para nos elucidarem convenientemente, quando não arriscamo-nos a fazer as maiores barbaridades. E só podemos entrar nesse caminho das concessões no dia em que tivermos o orçamento equilibrado. Esta explicação devia eu à Câmara, parecendo-me que a única cousa que se deve aprovar é o artigo relativo à ponto de Mosteiro, visto quo o Estado pode ter a ponte feita em menos tempo e mais barata. Pelo contrato que está presente no Conselho Superior de Finanças estabe-lece-so a alternativa, o Estado isentando de direitos ou não. Acho preferível o primeiro caso, porque o Estado assim deixado receber com uma mão mas pagará menos com a outra. Tem esta vantagem. Continuo portanto com a mesma opinião e estou certo que os meus correligionários me acompanharão; o projecto só pode ser aprovado na parte relativa à ponte de Mosteiro. O orador não reviu. O Sr. Afonso de Lemos: — Sr. Presidente: quando há pouco o Sr. Ribeiro de Melo, falando acerca deste projecto, disso que a minoria nacionalista parecia dese-]osa que ele fosse aprovado, eu imediatamente respondi com estas palavras: «o projecto está em discussão e a minoria nacionalista entra nessa discussão». Que nem da parte do Sr. Augusto de Vasconcelos, nem da minha, nem de qualquer Senador nacionalista há o intuito de favorecer qualquer pessoa ou empresa.
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diferentes do que discutimos quando nos referimos à alínea h isentando a Companhia Estoril do que ela se tinha obrigado a pagar, quando tomou posse da linha de de Calcais à Companhia Portuguesa. Esse assunto não se relaciona com um projecto como este, de carácter genérico, que pode servir a várias empresas.
E agora pedi a palavra para explicações para dizer isto e para declarar ao Sr. Herculano Galhardo que estou convencido de que o meu ilustre leader não fará disto uma questão fechada, e nestes termos como eu entendo que o Sr. Augusto de Vasconcelos, defendendo ontem o projecto o fez por o considerar obra de fomento, obra de fomento quo o Sr. Herculano Galhardo entende que deve ser feita por uma forma mais ponderada.
Ele defendeu esse critério e eu também o defenderia; mas desde, o momento que este projecto possa envolver qualquer cousa que possa servir uma empresa, não.
E andou bem o Sr. Herculano Galhardo explicando-o porque eu vou dar a agradável notícia a S. Ex.a que rejeito o projecto.
O orador não reviu.
O Sr. Ernesto Navarro: — Pedi a palavra para esclarecer a conclusão a que ontem cheguei quando disse que o projecto devia ser rejeitado, mesmo na generalidade.
Hoje melhor informado e sabendo o ponto em que se encontra o assunto relativo à ponte de Mosteiro, eu entendo que há vantagem em aprovar esse artigo.
Como aqui já foi explicado a reconstrução da ponte de Mosteiro terá um preço menor ou maior conforme for isento ou não de direitos o material respectivo.
Se fosse só isto seria indiferente, visto que era um Ministério a pagar é outro a receber a importância dos direitos.
Mas o que há de facto também é a demora na conclusão da obra se não houver isenção de direitos.
Os preços apresentados na adjudicação foram dois. No caso da isenção de direitos a ponte é construída na sua maior parte lá fora e o material vem já preparado, fazendo-se aqui só a montagem. No caso contrário, não havendo isenção de direitos, como o material fabricado paga
mais direitos do que o material em bruto, a casa tendo mais interesse em fazer a obra aqui do que lá fora, resulta daí uma.grande demora na execução da ponte, coco. prejuízo de todos os interesses públicos.
Por'isso eu julgo que é interessante ainda, apesar do projecto estar dependente do visto do Conselho Superior de Finanças, aprovar o artigo relativo à isenção de direitos para a ponte de Mos-toiró com um parágrafo de maneira a acautelar os interesses do Estado.
Quando entrarmos na especialidade eu mandarei para a Mesa essa emenda ao artigo 5.°
Quanto ao resto o assunto está devidamente esclarecido pelos oradores que. i em falado por forma contrária ao projecto, e só devo acrescentar que não me consta que a Empresa Estoril tivesse feito um único pedido a este respeito ao Estado ou que o Estado o tivesse rejeitado.
E se ainda o não fez é porque não pré cisava dele.
A fiectrificação, seja ou não votada a isenção, efectiva-se no mesmo prazo, não há dificuldades a esse respeito, visto que o material está encomendado, e dentro deste ano a electrificação, da linha será um facto.
Por consequência, só beneficiariam com a votação desta, proposta determinadas empresas, que meteriam nos seus cofres algumas centenas de contos, sem sequer os ter solicitado.
Tenho dito.
O Sr. Procópio de Freitas : — Sr. Presidente : eu sou daqueles que pensam que para se sair da rua situação financeira em que nos encontramos temos, acima de tudo, dê equilibrar o Orçamento a todo o-transe, exigindo que paguem para os cofres do Estado todos os que o podem fazer, e lamentável é que a tempo e hora» se não tivessem exigido, as respectivas contribuições a todos esses que à custa da guerra enriqueceram quási momentaneamente.
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e reprovo tudo o que seja beneficiar empresas que se organizem para proveito exclusivo daqueles que as constituem.
Sr. Presidente: nós temos por esse país além muita, riqueza inaproveitada; temos, por exemplo, bastantes quedas de água que podiam ser aproveitadas como fontes de energia eléctrica para o estabelecimento de indústrias e caminhos de ferro, o que viria aumentar a riqueza do país.
Há muito tempo que advogo a necessidade de se dar toda a facilidade a empresas -que porventura se formassem para explorar essas riquezas; mas, Sr. Presidente, pela longa discussão que tem tido esta proposta do lei, vejo que ela, na realidade, tem um sobrescrito especial, que pretende favorecer uma empresa, & Sociedade do Estoril, que não considero nas -condições daquelas que necessitam dos benefícios do Estado, e, portanto, não lhe dou o meu voto.
Tenho dito.
O Sr. Álvares Cabral: —Pedi a palavra para dizer a minha impressão sobre esta proposta de lei.
Ouvi com muita atenção as considerações feiras pelo ilustre Senador Sr. Her-culano Galhardo, e até nalguns pontos do seu discurso tive ocasião- de apoiar S. Ex.% mas devo dizer também que, duma maneira geral, entendo que as indústrias novas, e entre elas a do turismo, precisam, tal como sucede às crianças, aadar pela mão aos seus primeiros passos, e quando mais tarde se encontram desenvolvidas, e podem dispensar esse auxílio, trabalharem para coadjuvar os seus progenitores.
Sr..Presidente:  Visa a facilitar a construção de centrais eléctricas, ao aproveitamento de jazigos carboníferos pobres; todos sabem que em. Portugal há pocca hulha, o que abunda mais são os jazigos de lignites e antra cites. Conheço no nosso país vários jazigos de lignites que se não exploram por falta de .transporte. Porque é mais barata a hulha vinda de fora do que a exploração dos nossos carvões pobres quando eles se aeham colocados em sítios de difícil acesso. Havendo caminhos de «.ferro especiais para as minas o produto poderá competir. Temos de olhar com bastante cuidado para o desenvolvimento do turismo; que pode ser a forma de nós equilibrarmos as nossas finanças. Os economistas italianos, devido ao seu aturado estudo, chegam à observação de que .o capital entrado na Itália pelo turismo é mais importante que o que entra por via de todas as outras indústrias. Ora, entendo que o melhor era que este projecto voltasse à Secção para ser remodelado por forma que não fosse alterado na sua essência. Diz aqui o artigo 8.° que será o Minis-tério do Trabalho que fiscalizará .os materiais a empregar. Não compreendo por que se fala aqui no Ministério do Trabalho, quando ó certo que tanto as indústrias eléctricas como a fiscalização dos caminhos de ferro pertencem- ao Ministério do Comércio; calculo que só por engc.no se poderia ter feito taL Na altura devida eu terei ocasião de mandar para a Mesa rama emenda. O Sr. D. Tomás de Vilhena:—Não aparece no Anuáno Comercial o meu nome em qualquer corpo gerente dalguma indústria;-isto digo a propósito do qne notou o Sr. Kibeiro de Melo. Não tenho interesse algum neste projecto. Eu não quero defender o caso da me-nayere que poupa muito na comida que dá aos seus filhinhos, para depois gastar rios de dinheiro na farmácia e no canga-Iheiro. Eu não vou para aí. Se há alguma semente que possa ser produtiva em matéria de -administração, é exactamente a de o Estado íavorecer tanto quanto possível o desenvolvimento do fomento nas suas variadas manifestações. Esta é que é a minha tese. Claro está que esta orientação tem de ser encaminhada em termos hábeis para não favor recôr espécie alguma de especulação.
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Sessão de 15 de Julho de 1925
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É ama lei divina; mas é preciso não a sofismar, como se : tem feito por vezes, aproveitando-a para estabelecer a guerra entre as classes. A guerra aos ricos para favorecer os pobres nunca .deu resultado •algum: perde o pobre e perde o rico. E vice-versa.
O Sr. Herculano Galhardo:—V. Ex.a, que há pouco classificou a teoria a que se está referindo de lei divina, deve ter presente á parábola do camel'o e do'fundo da agulha. •
Foi Cristo que disse que era mais difícil um rico entrar no céu que um camelo passar pelo fundo duma agulha.
. O ;• Orador: — Isso é o rico mau, não é o rico bom.
O Sr. Herculano Galhardo : — Cristo não fez, distinção.
O Orador: — O rico bom há-de entrar também no céu, e cheio de benemerên-cias, por ter compreendido o seu papel na sociedade.
O mal é, sempre que se trata disto haver quem promova a guerra de classes, umas contra as outras. E a guerra ao luxo. O luxo mal entendido é tudo quanto há de pior, mas aquela ostenta-ção-.que há em todas as sociedades, mesmo nas democracias mais puras, é necessária e indispensável à vida das mesmas sociedades, porque dela vive muitíssima gente.
Há um banquete brilhantíssimo, £ V. Ex.a imagina que quem rejubila, quem se refastela é quem assistiu ao banquete? Não senhor; é o pasteleiro.
<íV. p='p' com='com' baile='baile' rejubilam='rejubilam' pessoas='pessoas' quantas='quantas' sabe='sabe' um='um' ex.a='ex.a'>
Não são aqueles muitas vezes que tomam parte no baile, mas sim muitos dos que não dançam e entre os quais podem contar-se até aqueles pobres rapazitos que andam na rua abrindo as portinholas das carruagens. , ,
O Sr. Herculano Galhardo: — Pois, Sr. D. Tomás de Vilhena, hei de trazer-lhe a carta do grande cardeal Mercier, que a V. Ex.a deve merecer todo o respeito, na qual Gle condena, mas condena por todas as formas, o luxo.
É o grande cardeal Mercier, é o das meias de seda.
O Orador: — Desde o momento em que se. queira reduzir a vida social à sua expressão mais simples, a maior parte da humanidade não terá nada que fazer e daí a ociosidade, que é a mãe de todos os vícios.
A maior parte da humanidade é interessada nos usos e costumes, e por isso se todos voltássemos à antiga, isto é, a andar de tanga e pele de carneiro, voltaríamos ao tempo do Pai Adão.
O Sr. Ribeiro de Melo: —Num dia de calor como hoje, não era mau de todo.
O Orador: — Feitas estas considerações declaro que não tenho dúvida em votar este projecto de lei na generalidade, reservando-me para, na especialidade, dizer mais alguma cousa sobre ele.
O orador não reviu.
O Sr-. Augusto de Vasconcelos: — Sr. Presidente: fraca idea daria eu da minha inteireza moral' se, porque alguns Srs. Senadores demonstraram, ou pretenderam demonstrar, que este projecto de lei ia aproveitar a tal ou qual empresa, eu declinasse o meu voto. Isso seria uma cobardia, que sou incapaz de praticar.
Afigura-se-me que este projecto de lei favorece os interesses do Estado e portanto dou-lhe o meu voto.
Julgo que o interesse do Estado é votar e fazer votar auxílios a estas iniciativas que visam a trazer para o Estado melhoramentos tais que são grandes fontes de receita.
O Sr. Ernesto Navarro: — Quando essas empresas carecem desse auxílio!
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Diário das Sessões do Senado
Há ainda um outro ponto de vista que não quero deixar passar sem o meu reparo: ó que a maneira de apreciar estas iniciativas, pela forma' como o foram por alguns Srs. Senadores, prova a descrença e a falta de crédito nessas fontes de receita, que, de resto, são enormes.
Ora quem comparar o trajecto que se poda fazer do Estoril a Sintra, Cabo da Eoca e Cascais e. se lembrar do que aí se pode fazer de belo e de brilhante, com a formosa estrada da Turbie. . . que vai de Monte Cario a Nice, poderá verificar facilmente "que aquela região tem condições naturais mais belas e mais preciosas para .fazer dela um passeio incomparável, do que as que possui a região onde foi construída a estrada a que há pouco me referi, que é uma das maravilhas da Europa.
Certamente que nessa pequena região do nosso país há elementos naturais muito mais belos do que lá. fora, e sendo assim ^ porque se não há-de dar a essas iniciativas o pequeno amparo que elas pedem?
O Sr. Ernesto Navarro: — ; Mas não se pediu cousa nenhuma!
O Orador:—Está bem! Mas apresenta-se um projecto de lei nesse sentido, eu dou-lhe o meu voto, sem querer saber se alguma empresa pediu ou n£o' o auxílio do Estado.
, Eu não vou entrar na discussão dos ricos e dos pobres, o1 que entendo é que-empresas deste género favorecem mais os pobres dos que os ricos.
O Sr. Herculano Galhardo:— ;Não diga V. Ex.a isso!
O Orador: — Se se favorecer de algum modo o' preço das passagens, são certamente os pobres os que mais aproveitam com esses melhoramentos.
O Sr. Ribeiro de Melo : — j Lá vem o meio tostão da Companhia  O Orsáor: — Nós estamos cam distantes de atrair os turistas a Portuga], que O' que sucede é os piqufttos que trazem turistas em grande número e quo tocam no porto de Lisboa, só por poucas horas aqui permanecem.    • O Sr. Herculano Galhardo : — j É porque não há jogo!              " - O Orador: — Devo dizer a V. Ex.a que não me repugna nada que se regulamente 0   jogo.   Nas .estações francesas  joga-se sob um   regulamento   que traz  enormes proveitos para o Estado. O Sr. D. Tomás de Vilhena (em aparte]:— Nesse capítulo não estou de acordo com V. Ex.a Eu sou uni adversário intransigente do jogo. O Ordor:— Mas isso é u-má outra questão. O que valia a pena, realmente, era aproveitar todos estes meios de aumentar a riqueza nacional e de explorar oma-cousa que ó tam interessante em Portugal: as condições naturais do nosso País., Os turistas1 passam porv Portugal e vão-se imediatamente embora'. Se houvessem estações coino os Estoris, verdadeiramente civilizadas, os turistas ficavam aqui uns dias, sobretudo no inverno, deixando em Portugal muitos milhares de libras. Assim chegam de manhã, vão-se embora à tarde, e vão dizendo de nós: 1 que povD este tam selvagem que não sabe aproveitar as suas riquezas naturais! Aqui têm V. Ex.as porque dou o meu voto ao projecto, sem querer saber se1 ele aproveita a A ou a B. O Sr. Ribeiro de Melo : — As considerações que fiz não visavam a provocar aquelas que o Sr. Augusto do Vasconce-:os acaba de produzir. Não o chamei à barra, porque sou om dos seus mais sinceros admiradores, porque acredito piamente na sua sinceridade inconcussa, e porque sou também dos que não esquecem o seu trabalho' na propa--ganda do ideal republicano.
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Sessão de 16 de Julho de 1925
reito oão, quanto a mim, porque S. Ex.a o tenha defendido de maneira a convencer-nos da utilidade da sua aprovação.
As considerações que S. Ex.a apresentou são aquelas que todos nós sentimos individualmente. _ v -
A electrificação da linha de Cascais, sem dúvida alguma, vem trazer-nos á comodidade e conforto de que até agora estava desprovida. Se amanhã electri-ficada fosse a via, mais rápidas seriam as 'comunicações e talvez até mais baratas, o que seria um benefício. Mas, do que não resta dúvida, é de que o transporte, pelo menos, seria muito mais cómodo.
Mas não se trata disso; trata-se apenas de saber, e de mais a mais aquele famoso exemplo do r.aminho de ferro que vai dar a Nice veio reforçar a opinião dns pessoas que não aprovam esta proposta de lei, se esse benelício tem de ser conseguido à custa do cerceamento das receitas do Estado.
S. Ex.a sabe muito bem que essa maravilha, a que S. Ex.a se referiu, não foi feita com diminuição das receitas do Estudo, antes pelo contrário.
Houve uma grande vantagem para o Estado e para os poderes públicos com aquele novo caminho de ferro, porque lhes veio trazer uma receita enorme.
Não se isentou de impostos o material empregado nesso caminho de ferro.
Ora, Sr. Presidente: se esta Companhia que pretende fazer a exploração desta linha está em condições de a poder fazer por si, <_ que='que' nas='nas' pedir='pedir' de='de' suas='suas' estado='estado' necessidade='necessidade' uma='uma' aduaneiras='aduaneiras' ao='ao' _.='_.' p='p' receitas='receitas' há='há' diminuição='diminuição' vir='vir' _='_'>
Que ela peça ao Estaco que lhe dispense todas as facilidades para levar a cabo esse empreendimento,, está bem.
O Estado, por todas as suas repartições, deve auxiliar todas as empresas que pretendam beneficiar este país, evitando demoras longas >nas repartições públicas, etc.
Estes são os favores que o .Estado pode dispensar, o que não deve negar à Companhia do Es-toril. Mas ir até ao ponto de se lhe mandar entregar o material que ela importa, isentando-o do pagamento de direitos é um benefício que o Estado não está em condições de poder conceder-'
O que pode é dar-lhe o maior número de facilidades.
O Sr. Álvaro Cabral: — E teria só a lucrar com isso.
O Orador : Para' mim é muito mais apreciável .ter magníficos hotéis na ivgião •do Estoril, ter magníficas casas de recreio que eu frequentaria sem deniinuir a minha qualidade de Senador e sobretudo de cidadão.
Prrtiro beneficiar de todos esses confortos, e louvar as pessoas que levaram a efeito essa obra de progresso para uma povoação, a ficar desprovido deles. < E com este intuito, nós sabemos bem que a indústria do jogo, que entre nós não está regulamentada, é pelo menos consentida na Madeira.
E à frente dessa empresa está um homem que todos nós admiramos, que os jornais elogiam,, que é o Sr. Vieira de Castro.
S. Ex.a sendo um grande industrial que tem explorado com vantagem várias indústrias, não teve pejo, antes pelo contrário, em subsidiar a indústria do jogo no Funchal.
Á colónia inglesa é quem sustenta aquele grande hotel chamado Ritz Hotel.
Há outros; mas esse é o mais caro e luxuoso, e é esse que vive da indústria do jogo.
Eu que faço esta afirmação, é porque já participei das suas comodidades. Evidentemente que isto não envergonha a população .daquela bela ilha -da Maíloira. nem o Estado Português ou as suas leis.
tal facto tem acaso beneficiado a vida na Madeira?
Não, 'porque a vida no Funchal é uma das mais caras do território português.
O Sr. Álvares .Cabral (interrompendo) : — . Fui sempre assim, não é de agora esse facto.
O Orador: — Se foi sempre assim deve--se concluir que a Madeira não beneficiou da especulação da indústria do jogo nem dos grandes .benefícios que atraem o turismo.
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transporte de terra para os navios on vice-versa se faz em pequenos barcos sem comodidades.
Até hoje, apesar de haver essa grande indústria do jogo e essa grande atracção do turismo, ainda não se fez o porto do Funchal, dizendo-so até que isso ainda está sendo apreciado por uma repartição qualquer do Ministério do Comércio.
Se com esta especulação, quer do jogo quer da grande indústria do turismo, não tem beneficiado a Madeira, a sua própria população também nada tem beneficiado porque vive hoje com mais dificuldades  O Sr.Álvares Cabral (interrompendo}:—  O Orador: — For virtude da minha pró-fissão eu tenho passado pelos países mais civilizados do mundo o sei o quanto me sinto bem quando encontro as comodidades que desejo. Mas também sei que os diferentes países não têm despendido um. centavo, porque tudo é explorado em regra pelas companhias, que se organizam •em grandes trusts, e são eles que financiam essas operações. Ora o favor que se pretende conseguir com esta proposta de lei vai além das disponibilidades do Estado, e se V. Es:.as querem sacrificar ainda mais o Estado português em benefício de duas ou três sociedades, ea declaro que praticam uma má obra. A não ser que V. Ex.as me demonstrem, que o Estado está em condições de dar uma parte das suas receitas em benefício  •Mas julgo muito difícil poderem demonstrar isso. Interrupção do Sr. Alvares Cabral. O Orador:—Por mais que V. Ex.a queira, ainda mesmo reforçado com a sua categoria de ex-vereador da Câmara Municipal de Lisboa, eu compreendo o turismo tam bem ou melhor do que V. Ex.a o compreende, mas a verdade é que ainda não vi argumentos que me levassem a tomar uma atitude diferente daquela que assumi em relação a esta proposta. O orador não reviu. O Sr. Álvares Cabral:— Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer que tenho as maiores esperanças na indústria do tu- rismo em Portugal. O Sr. Ribeiro de Melo:— Tem-nas toda a gente que tenha dois dedos do testa. O Orador:— Pela maneira como S. Ex.a falou, parecia querer significar que o desenvolvimento que o turismo tom tido ultimamente na Ilha da Madeira nada tem favorecido a sua população, quando afinai não é assim. Efectivamente .a melhoria cambial naquela ilha não tem dado os resultados que era de esperar, como de resto não tem trazido para o cofitinente de Portugal «m maior desafogo na vida. MÊS se nós repararmos que está calculado que cada turista gasta em média 10 libras e que dessas 10 libras advém para o Estado 20 por cento, imagine V. Ex.a o que poderá dar o turismo em Portugal se lhe dermos facilidades para ele se poder desenvolver. Era isto simplesmente que eu queria dizer em resposta às considerações do Sr. Ribeiro de Melo. N O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Gaspar de Lemos): —Sr. Presidente : não posso deixar de usar da palavra a propósito da discussão deste projecto de lei, visto que V. Ex.amè convidou a vir ao Senado assistir à sua discussão, evidentemente por indicação desta Câmara, e só por isso, visto que me parece que este assunto corre mais pela pasta das Finanças do que pela* do Comércio, pois se refere ,a uma isenção de direitos. Mas eu não podia, quando mais não fosse por uma questão de delicadeza, deixar de vir aqui dizer alguma cousa sobre o assunto. Não tomo posição especial em relação a esto projecto de lei. Evidentemente uma boa política aduaneira a estabelecer deve ser assente em bases de estudo e de informação, que eu cão vejo instruírem este projecto de lei.
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Grande Guerra se criaram novas indústrias, reviveram outras e outras desaparecerão em breve, tornando-se, portanto, necessário apalpar bem a nossa situação industrial, para se poder estabelecer um critério do generalidade a que devem obedecer estas medidas.
Eu não quero saber se este projecto de lei visa ou não beneficiar uma empresai Mas se há uma empresa de qualquer natureza que precisa de ser beneficiada, eu desejaria que ela viesse dizer claramente o que necessitava.
Era mais regular, mas nem por isso tenho ressentimento algum contra essas empresas, sejam elas quais forem. Se se dedicam a uma actividade legítima, ^porque não havemos de beneficiá-las?
Na discussão que se fez, parece-me que o turismo foi um pouco maltratado, O turi íno é um ramo de atividade muito interessante na vida económica dos tempos mod -mós. Os turistas nem sempre, são ricos, muitas vezes são pessoas que vêm gastar as suas economias, muitas vezes são pessoas que vêem trazer-nos ouro, praduto do seu trabalho, em troca do trabalho nosso, são pessoas que vêem ao nosso País tonificar-se e distrair-se utilmente.
Preocupo-me pouco com os assuntos de turismo; estou, porém, nesse caminho pela mão do Sr. Ernesto Navarro, porque S. Ex.a, quando Ministro do Comércio, me convidou a fazer parte de uma comissão organizadora do respectivo regulamento e me pediu para que me interessasse, na minha terra, pela política do turismo.
O turismo não se faz só com hotéis e estradas, faz-se com os mil elementos que servem para levantar o País.
Aqui tem V. Ex.as o que penso sobre o projpcto.
Pelo que diz respeito especialmente à ponte de Mosteiro, louvo-me nas informações que tenho e parece-me que há vantagem em se' conceder a isenção de direitos para os materiais.
Não quero terminar sem dizer ao Sr. Ribeiro de Melo, a respeito da sua alusão à exorbitância do juro de 10 por cento, que essa taxa está estabelecida numa lei. Essa taxa foi fixada numa .época diferente da actualj de maior dificuldade. Hoje já é uma taxa elevada em relação à taxa actual de desconto das institui-
coes de crédito, mas . não está na minha alçada, é ao Parlamento que compete alterá-la. ,
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ribeiro de Melo (para um requerimento):— Roqueiro que se suspenda, a discussão desta proposta até poder comparecer o Sr. Ministro das Finanças.
E rejeitado o requerimento.
Ê aprovada na generalidade a proposta de lei em discussão.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Procópio de Freitas: — Sr. Presidente: a quesião dos açúcares da Madeira é em Portugal, todos o sabem, uma velha questão. A Monarquia fechou o largo ciclo da sua existência embrulhando-se em escuras questões, entre as quais a questão Hinton, que cresceu a ponto de alcançar no seu trono o próprio Rei.
Bem avisados andariam os políticos se beneficiassem das lições do passado. Mas infelizmente parece que nem sempre essas lições estão ao seu espírito presente. Os factos demonstram.
Sr. Presidente: nó Diário do Governo de 24 de Junho último vem publicado um decreto, o n.° 10:864, o qual diz fundamentar-se «nas reclamações instantes da indústria nacional» e se valida da autorização concedida pela base 5 a da lei n.° 1:335, de 15 de Agosto de 1922.
Não vou propriamente discutir a legalidade das disposições inovadoras em matéria .tributária, que aliás se julgou necessário reforçar, ouvindo o Conselho de Ministros, declarando-o no decreto expressamente e firmando-o com as assinaturas de todos eles, desde a do Sr. Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães à do Sr. Francisco Coelho do Amaral Reis.
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rcitos estabelecidos para o continente por este decreto.
Por este decreto?
Não seria mais simples se dissesse: ,;os açúcares importados no arquipélago da Madeira, ficam ;sujeitos aos direitos estabelecidos para o continente pelo artigo antecedente? Não parece que o decreto n.° 10:864, o qual só refere não somente a açúcar e a glicose, a maltose, lactose e leuulo se, mas ainda a chapéus" de palha e suas imitações, chapéus de plucia de seda e de voludo, a chapéu a não especificados, etc., não parece, Sr. Presidente, que o decreto tenha primitivamente só três artigos., e que aquele que abrange a Madeira, quanto a açúcares, ali foi, como já disse, sub-reptíciamente introduzido? Deixo a V. Ex.a e à Câmara o julgar o facto., porque eu pretendo somente neste momento limitar-me à defesa dos interesses da minha terra; confiando em que o actual ministério se apressará a revogar o singular artigo a que estou aludindo, qae vem tyibatar o açúcar importada na Madeira em mais $50 em cada quilograma. Acentuarei todavia que, pelo menos no corrente ano, o imposto com que o Governo brindou os madeirenses produzirá aos industriais açucareiros daquela ilha um beneficio de muitos contos, a não ser que se julgue a Madeira um paraíso tal que os industriais açucareiros, ao abrigo de uma pauta proteccionista de improviso decretada, não ousem aproveitar-se dela •para os seus fins comerciais/ que evidentemente o decreto quis proteger, pois, em caso contrário, se só se levasse «m vista o aumento dos rendimentos do Estado, simultaneamente se tributaria o açúcar importado e o açúcar produzido na Madeira. Sr. Presidente: eu não pretendo exceder os limites de uma serena advertência e 'es limites da hora... Por isso abrevio. O regime dos açúcares da Madeira é um regime excepcional, representa am privilégio necessário a bem da causa pública. Alterá-lo, revogá-lo, ainda mesmo quando ponderosos motivos o aconselhassem, era ucaa cousa grave, que só o Parla- mento, a meu ver, poderia considerar; mas alterá-lo por um simples decreto, sub-reptício artigo, numa ocasião em' que a Madeira atravessa uma enorme crise, afi-gnra-se-me uma crise gravíssima. Não pcsso deixar de chamar para ela a atenção da Câmara e do Governo, como para um verdadeiro atentado. Confesso que somente agora ao chegarem da Madeira os primeiros clamores, eu tomei dele conhecimento; pois o decreto me tinha passado despercebido no testamento— no testamento, não posso deixar de frisá-lo — do Ministério transacto. E não íoi só a mim que o decreto passou despercebido; nenhum dos parlamentares eleitos pela Madeira até hoje a ele se referiu. E tal é o aspecto suspeito desta questão dos açúcares, que não tardaria quem malèvolainente viesse a notar o facto como uma deminuição moral para todos nós. Não tenho,.não tive nunca, negócio nem negócios; varro a minha testada, certo de que não ficaria desacompanhado dos meus colegas e meus patrícios. E termino, Sr. Presidente: p^ decreto, em primeiro lugar, é, latamente, a supressão do regime dos açúcares da Madeira; em segundo lugar envolve um escandaloso presente aos industriais açucareiros da Madeira, sem que de momento beneficie em cousa alguma os cultores da cana, e em terceiro lugar é um novo encargo tributário lançado ao povo madeirense— pois qae o açúcar importado do estrangeiro é que faz a correcção do preço do mercado— exactamente quando mais penosa se torna a sua vida alanceada de tantas dores, sob a pressão de embaraços financeiros que profundamente perturbam a vida económica da ilha, e de crises de trabalho qae ameaçam trazer a fome, a miséria extrema a tantos lares. As minhas palavras, Sr. Presidente, são um protesto; espero que seja ouvido. As minhas palavras são uma reclamação; espero que seja atendida. Tenho dito.
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Sessão de 15 de Julho de 1925
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Ministério da /Agricultura, visto que a cargo desse Ministério estão todos os regimes especiais a quê se sujeitam as diferentes produções do País: vinícola, açu-, careira, etc.
S. Ex.a disse uma verdade.
As instâncias competentes .do Ministério da Agricultura não informaram absolutamente nada, nem tiveram qualquer intervenção na organização desse decreto.
Os industriais interessados não recla-,maram perante o Ministério da Agricultura, nem foi ouvido por esse Ministério o Conselho Técnico Aduaneiro.
Vou procurar saber, pelo Ministério das Finanças, o que' consta do processo respeitante a este decreto, para que possa ajuizar do valor dessas reclamações e verificar se alguma cousa consta a respeito da matéria a que se refere o artigo 2.°
Farei todas estas investigações cem toda a rapidez, a fim de que eu possa
avaliar do que se passou e da situação do açúcar madeirense neste momento, para verificar se de facto há alguma cousa que imponha um proteccionismo desta natureza.
Se em minha consciência eu entender que essas reclamações são de aceitar, poderei manter o princípio apenas de protecção, porque me é agradável proteger por este processo. •
Vou procurar identificar-me com a questão e na próxima sessão darei os esclarecimentos necessários a S. Ex.a
Mesmo antes pode S. Ex.a procurar-me no Ministério.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente:—A próxima sessão é na sexta-feira próxima, à hora regimental.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas.