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REPÚBLICA PORTUGUESA

ACTAS

DA

CÂMARA CORPORATIVA

N.º 100

VI LEGISLATURA 1956

31 DE DEZEMBRO

Projecto de proposta de lei n.º 521

Instituto Nacional de Sangue

A partir do descobrimento dos grupos sanguíneos, a hemoterapia atingiu, por toda, a parte, desenvolvimento proporcional à importância das suas aplicações, posta, em relevo uns últimas conflagrações mundiais. Ás suas técnicas foram-se definindo e aperfeiçoando em consequência de um esforço de investigação científica sobejamente documentado em profusa bibliografia e em sucessivas reuniões internacionais. Generalizou-se a prática de transfusão de sangue, que adquiriu a categoria de método terapêutico de valor primacial, com base em complexa e delicada investigação científica.
Entretanto, suscitavam-se inúmeros problemas de ordem prática, difíceis e complexos. A solução deles depende, em cada país, da extensão do emprego do sangue no tratamento de doentes e sinistrados. Como qualquer outro agente terapêutico, é preciso dispor dele em quantidade suficiente, sem que isso prejudique a qualidade, e em condições que excluem a especulação, que cria encargos incomparáveis, se não proibitivos.
Também entre nós se pôs, com carácter alarmante, o problema do dador de sangue, em que se situa o elemento nuclear de qualquer sistema de colheita, de sangue.
Da ideia altruísta da dádiva de sangue, gratuita e generosa, evolucionou-se para uma exploração mais ou menos mercantil, em que a ganância de alguns vai afogar a espontânea dedicação de outros.
As características actuais do problema, podem sumariar-se assim:

a) Insuficiência do volume de sangue disponível, muito inferior às necessidades reais;
b) Tendência acentuada para a comercialização do sangue;
c) Preço excessivamente elevado;
d) Adulteração da qualidade;
e) Anarquia dos dadores de sangue;
f) Falta de coordenação dos serviços de transfusão, tanto oficiais como particulares;
g) Concorrência que entre eles se estabelece na procura de sangue;
h) Dificuldade de estudo rigoroso das várias fontes de sangue e das técnicas de o utilizar como medicamento.

São fenómenos complementares a inconveniente acorrência de dadores às instituições dotadas de quais largos meios financeiros que melhor pagam o sangue e o inquietante acréscimo de despesa para os serviços hospitalares, cujas receitas dificilmente conseguem suportar as incidências gravosas de semelhante estado de coisas.
Por outro lado, nada se encontra previsto quanto às medidas a adoptar em caso de emergência para, garantir as disponibilidades excepcionais que então se exigem.
Em suma: o sangue é pouco, caro e, por vezes, pouco estudado para ser aplicado com segurança.
Para pôr termo a esta situação e com base no estudo a que se procedeu, elaborou-se a presente proposta de lei.
No aspecto orgânico, sugere-se a criação do Instituto Nacional de Sangue, integrado na estrutura da assistência pública e enquadrado nos organismos coordenadores de assistência. Atribuem-se-lhe amplas funções de

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coordenação, orientação e fiscalização, a par das responsabilidades de investigação científica e divulgação educativa, ao mesmo tempo que se lhe confia a manutenção de um estreito contacto com os serviços militares relacionados com a preparação e utilização terapêutica do sangue.
Ao Instituto incumbirá, igualmente, organizar o cadastro dos fiadores de sangue, procedendo à sua identificação e fiscalizando as doações, remuneradas ou não.
Tudo se deverá orientar no sentido do estímulo à dádiva de sangue, em ordem a multiplicar os dadores voluntários e a combater a comercialização que hoje por toda a parte se observa, tão certo é ter a experiência demonstrado a possibilidade de se conseguir tal objectivo.
Requer esta larga propaganda, por todos os meios adequados de publicidade, ao mesmo tempo que exige, no ponto de vista moral, garantia efectiva de que não será desperdiçado-o sangue generosamente oferecido, nem constituirá objecto de lucro, e de que a sua aplicação obedecerá às normas de uma boa economia terapêutica.
A reposição do sangue, designadamente pelo próprio ou pelos seus familiares, o chamado «banco de sangue», constituirá mais uma fonte de abastecimento.
Para todos os problemas pendentes se procurou a solução mais conforme com as nossas realidades, aproveitando o que já existia e tendo sempre em vista a moderação dos encargos.
O êxito dependerá necessariamente da compreensão e civismo da população e fia boa vontade com que esta providência vier a ser acolhida pela opinião pública.
Propondo a criação do Instituto e as regras elementares da disciplina aplicável às instituições, que coordena e nos próprios dadores de sangue, o Governo submete à apreciação da Assembleia. Nacional uma matéria que tem hoje a mais alta importância e que por isso não podia passar despercebida na articulação na nossa assistência social.

BASE I

É criado o Instituto Nacional de Sangue, órgão de coordenação da assistência dependente do Ministério do Interior, através da Direcção-Geral da Assistência, (lóbulo de personalidade jurídica e autonomia técnica e administrativa, que se regerá pelo disposto neste diploma e nos artigos 113.º a 117.º do Decreto-Lei n.º 35 108, de 7 de Novembro de 1945.

BASE II

Compete ao Instituto:

.º Coordenar, orientar e fiscalizar todas as actividades de carácter civil, oficiais e particulares, relacionadas com a colheita, preparação e fornecimento de sangue, derivados e similares para serem empregados como agentes terapêuticos;
2.º Colaborar com os serviços da Defesa Nacional e dos Ministérios do Exército e da Marinha, com vista a estabelecer a cooperação nos assuntos da sua competência;
3.º Estudar os problemas que o emprego de sangue suscita na medicina, procedendo ou estimulando os trabalhos de investigação;
4.º Promover a formação do pessoal técnico, a padronização do material e a normalização das técnicas de base;
5.º Assegurar a industrialização de derivados de sangue e produtos de substituição;
6.º Proceder à colheita de sangue e garantir a sua preparação, conservação e distribuição;
7.º Organizar o cadastro dos dadores de sangue e proceder à sua identificação;
8.º Fornecer sangue em situações de emergência;
9.º Fazer a propaganda intensiva da dádiva voluntária de sangue;
10.º Elaborar de acordo com as directrizes da Defesa Nacional os planos a pôr em execução em caso de guerra ou de grave alteração de ordem pública.

BASE III

O Instituto tem sede em Lisboa, delegações no Porto e Coimbra e subdelegações nas sedes dos hospitais regionais ou ainda em outras, localidades onde o Ministro do Interior julgue conveniente a sua acção.
As delegações ficam a cargo de delegados privativos.
As subdelegações funcionarão em estreita colaboração com as Misericórdias e ficam a cargo dos delegados de saúde distritais ou de médicos especialmente designados para esse fim.
Deverão instalar-se postos de colheita de sangue e ser criadas para o mesmo efeito brigadas móveis.

BABE IV

A direcção do Instituto é exercida por um director e um adjunto, que o coadjuva e substitui nas suas faltas e impedimentos e que terá especialmente a seu cargo a parte administrativa, sendo um e outro de livre nomeação do Ministro do Interior.

BASE V

Junto da direcção do Instituto funciona um conselho técnico com funções consultivas, presidido pelo director e de que fazem parte representantes:

a) Da Direcção-Geral de Saúde;
b) Da Direcção-Geral da Assistência;
c) Da Direcção dos Serviços de Saúde Militar;
d) Da Direcção dos Serviços de Saúde Naval;
e) Da Direcção-Geral da Educação Física, Desportos e Saúde Escolar;
f) Dos Hospitais Civis de Lisboa;
g) Da Ordem dos Médicos;
h) Da Cruz Vermelha Portuguesa.

BASE VI

Os serviços de sede compreendem;

a) Serviços administrativos;
b) Serviços técnicos;
c) Serviços de fiscalização;
d) Serviços de propaganda.

BASE VII

Constituem receita do Instituto:
1.ª As dotações orçamentais que lhe forem consignadas;
2.ª Os rendimentos provenientes da sua actividade;
3.ª Os subsídios, doações, heranças ou legados de que for beneficiado.

BASE VIII

São despesas do Instituto as que resultarem do normal desempenho da sua actividade.

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BASE IX

Ao pessoal do Instituto são aplicáreis as regras de provimento e disciplina estabelecidas para os organismos de coordenação da assistência.

BASE X

À actividade particular de colheita, industrialização, fornecimento e aplicação terapêutica de sangue, derivados e similares fica sujeita à inspecção e fiscalização do Instituto.

BASE XI

Deverá sempre diligenciar obter-se a reposição do sangue consumido.
A compensação dos dadores de sangue só poderá representar uma indemnização por prejuízos sofridos, cujos limites serão fixados pelo Instituto.

BASE XII

São criados o diploma e medalha de mérito de dador de sangue, para galardoar a dedicação inerente à dádiva de sangue.
As condições da concessão serão fixarias em regulamento.

Lisboa, 17 de Dezembro de 1956. - O Ministro do Interior, Joaquim, Trigo de Negreiros.

Rectificação

Nas Actas da Câmara Corporativa n.º 95, de 12 de Novembro, o 98, de 5 de Dezembro de 1956, onde se lê: «Projecto de proposta do lei n.º 519», deve ler-se: «Projecto do proposta de lei n.º 520».

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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