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REPÚBLICA PORTUGUESA
ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA
N.º 117 VI LEGISLATURA 1957 23 DE ABRIL
PARECER N.º 53/VI
Proposta de lei n.º 49
Organização da defesa civil
A Camará Corporativa, consultada, nos termos do artigo 103.º da Constituição, acerca da proposta de lei n.º 49, sobre a organização da defesa civil, emite, pela sua secção de Interesses de ordem administrativa (subsecção de Defesa nacional), a qual foram agregados os Dignos Procuradores Albano Rodrigues de. Oliveira, Álvaro Salvação Barreto, Carlos Afonso de Azevedo Cruz de Chaby, Jorge Augusto da Silva Horta, José Augusto Vaz Finto, José Frederico do Casal Ribeiro Ulrich, José Penalva Franco Frazão, José de Queirós Vaz Guedes e Vasco Lopes Alves, sob a presidência de S. Ex.ª o Presidente da Camará, o seguinte parecer:
I
Apreciação na generalidade civil e a sim Importância actual
Em épocas de paz e em todos os tempos a defesa civil tem sempre surgido sob a forma de reacção, da sociedade, na ânsia de salvar vidas, de poupar estragos.
Mas, se encararmos a possibilidade de uma guerra e as condições em que é licito supor que ela venha a desenrolar-se, havemos então de considerar como extraordinariamente se avoluma a sua importância.
Ora, Portugal, muito embora a Constituição preconize a arbitragem como meio de dirimir litígios internacionais, poderá, mau grado seu, ver-se envolvido num
estado de guerra, quer actuando em legítima defesa contra ataque adversário, quer ainda por força de compromissos internacionais assumidos no âmbito da O. N. U. e- da N. A. T. O., para salvaguardar os interesses da humanidade e da milenária civilização cristã que abraçou e pelo Mundo foi espalhando.
Indiscutível, portanto, a premência da organização em moldes eficazes da defesa civil do território.
Na última conflagração mundial - na qual Portugal se não viu envolvido por graça de Deus e mercê de uma superior e clarividente acção do nosso Governo - foi já então verificada a intenção de a conduzir sob a forma denominada de (guerra total». De facto, as ofensivas iniciais dos alemães, conjugando as acções da aviação com as de importantes massas de blindados, na chamada «guerra-relampago», eram orientadas no sentido de serem atingidas e desorganizadas as retaguardas do adversário, prejudicando o indispensável alimento do esforço de guerra e espalhando o pânico entre os populações, tudo tendente a provocar a derrocada.
Vimos ainda os bombardeamentos maciços lançados contra Londres e, mais tarde, contra Berlim e outras cidades alemãs, produzindo montes de ruínas e de vitimas, sob o esmagador e mortífero peso da metralha.
Entretanto, a ciência, possibilitando ao homem a utilização da energia nuclear -suplantando em alto grau todas as outras formas de energia até então aplicadas-, colocava a actual geração .numa posição extremamente delicada, conferindo-lhe, como afirmava Churchill, «possibilidades ilimitadas de progresso ou meios ilimitados dê destruição».
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Após experiências efectuadas em Los Alamos - Julho de 1945-, foram lançadas duas bombas atómicas, que explodiram a algumas centenas de metros do solo sobre as duas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki.
Na primeira, destas cidades foram maiores os efeitos produzidos. Num circulo de 3200 m de raio tudo ficou queimado e arrasado, sob o duplo efeito térmico e de choque; como efeito retardado, novas vitimas se verificaram, motivadas pelas radiações nucleares.
O general Carpentier, focando as «repercussões trazidas pelas armas atómicas», classificou de «aterradora a gama dos projécteis nucleares ... desde a bomba nominal, com efeitos comparáveis à explosão de 20 000 t de T. N. T., até à bomba H, equivalente a 3000 mt de T. N. T. e mais ainda. For outro lado, é apresentado o canhão atómico, com o calibre de 280 mm, atirando um projéctil táctico que corresponde, para um só obus, ao mesmo resultado de 40 000 obuses de 10o mm, equivalendo ao tiro de 5 artilharias divisionárias durante uma hora ou de 300 bombardeiros carregados cada um com 5 t de bombas».
Ora, é um facto que a intervenção destas armas torna ainda mais evidente e real aquela noção de guerra total, por isso que tornou possível, com a facilidade dada pelos actuais raios de acção dos aviões modernos, com velocidades aumentando quase inconcebivelmente, e até mesmo por outros processos, a tentativa de por um ataque nestes moldes se obter a destruição do potencial humano, industrial e económico do adversário, ao mesmo tempo que das suas instalações e forças militares.
Contra uma agressão destas não se descortina uma centraparada que não seja aquela proveniente duma frutuosa colaboração no campo internacional, a exigir, por sua vez, uma consciente e firme preparação nacional.
O Governo assim o entendeu e a Assembleia Nacional o ratificou, promulgando a recente lei sobre a organização geral da Nação para o tempo de guerra. Conforme é definido nesta lei e se diz no relatório que antecede a proposta de lei em apreciação, da defesa civil é elemento essencial para por com a antecipação possível a coberto do perigo que ameaça toda a vida. da Nação aqueles elementos pessoais e materiais que são penhor, mesmo durante o período de crise grave, da sua sobrevivência».
Uma população com uma profunda preparação psicológica, orientando a longo prazo a forma de vida dos aglomerados, em que cada um, com aquele mínimo de conhecimentos práticos, saiba onde, como e quando deva actuar, está trabalhando em defesa civil e poderá, em conjunto de esforços, consciente e proveitosamente opor-se à vontade do adversário, evitando o pânico, salvando vidas e bens, promovendo a manutenção de tudo quanto é imprescindível à vida da Nação.
Nessa população cada um está sendo útil à Pátria, a si e ao seu semelhante.
E, porque assim é, consideramos actualmente a defesa civil com uma muito grande importância, como, aliás, assim também o entende a N. A. T. O., que em sua recente reunião a considerou em paralelo com a defesa militar, estabelecendo para ela um processo de controle -revisão anual- semelhante ao já utilizado para a defesa militar.
B) O que Importa á defesa civil e n que se tem Já feito em Portugal
Em síntese, poderá dizer-se que cabe à defesa civil preparar, organizar e por em execução as medidas tendentes a fortalecer o espirito de vitalidade e resistência da população, formando a coesão em face do perigo, tornar possível o exercício das actividades essenciais e reduzir as baixas e os danos no sector civil da Nação, quer resultem duma luta armada, quer de grave emergência em tempo de paz.
Ora, para cumprimento da sua missão, a defesa civil tem de orientar-se segundo disposições e processos de actuação, que julgamos conveniente analisar, ainda que sumariamente, comparando o que entre nós se tem realizado com a acção que se tem desenvolvido noutros países que, quer por mais experimentados na última guerra mundial, quer por exigência da sua especial situação geográfica, com presteza e confiança se têm devotado aos problemas da defesa civil.
No decurso desta análise iremos anotando as bases da proposta de lei em apreciação que digam respeito aos aspectos visados.
Conforme se apresenta no relatório que antecede a proposta de lei, pelo Decreto-Lei n.º 31 956, de 4 de Abril de 1942, foi a responsabilidade deste importante aspecto da defesa nacional entregue ao cuidado da patriótica organização da Legião Portuguesa, que, com o maior zelo e manifesto proveito para o Pais, dele se tem diligentemente ocupado». De facto, já pela ideologia que informa a Legião Portuguesa, já pela sua estruturação, a estender-se por todo o Pais e absolutamente adaptável à defesa civil, como ainda pelo trabalho já desenvolvido neste âmbito, afigura-se-nos absolutamente lógico o que na proposta de lei é estabelecido na base II.
Em todos os países se tem feito sentir a indispensabilidade de uma activa e bem orientada propaganda no sentido de se obter a necessária preparação psicológica.
É que a defesa civil nem sempre é bem compreendida. Uns crêem ainda, e apesar de tudo, que as armas atómicas não serão utilizadas, pelo cataclismo que representam; outros, apoderados de um inexplicável espirito fatalista, alegam que será inútil aplicar quaisquer medidas, por ineficazes. Ora, uns e outros não têm razão, por isso que há muito de eficaz que a defesa civil pode por em acção perante um bombardeamento atómico, e, por outro lado, nem todas as regiões se apresentarão como objectivos atómicos, e então nessas e contra os chamados bombardeamentos clássicos grande eficácia poderá obter-se da defesa civil.
Entre nós, a enorme vantagem, mesmo necessidade, de uma boa propaganda afigura-se-nos indispensável por duas razões:
Não termos estado sujeitos à dura prova dos horrores da guerra;
Sermos excessivamente amantes do improviso e avessos, por índole, a tudo quanto se ligue a organização.
A Legião Portuguesa não se tem poupado a esforços no serviço da propaganda, por meio de publicações, conferências, locuções pela rádio, afixação de cartazes e até com a própria realização de exercícios, processos estes que são também, mais ou menos, os seguidos nos outros países.
A Inglaterra adopta profusamente estes mesmos meios, lançando campanhas especiais na Primavera e no Outono, que concluiu serem as melhores para o fim em vista, e todos os anos reserva a essa campanha a Semana da defesa civil.
Terá interesse, por certo, referirmo-nos ao que foi o esforço empregado pela Holanda durante o ano que' antecedeu à organização dos seus serviços de defesa civil. A preparação do público foi lançada em colaboração com a imprensa, o cinema e as redes de radiodifusão.
Aos directores dos principais jornais quotidianos foi facultada durante alguns dias a conveniente documen-
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tacão, e depois, e durante esse ano, a imprensa, publicando cerca de 4000 artigos, manifestou bem o seu apoio à causa. A organização da defesa civil financiou a produção de dois filmes - O Exemplo de Londres, que foi projectado em 250 cinemas, e De Um Vizinha a Outro, consagrado propriamente ao recrutamento. Naqueles locais onde se verificava a necessidade de uma maior concentração de esforços - regra geral, as grandes cidades - lançou mão da campanha que denominou de visitas preparadas, previamente anunciadas pelas autoridades e por artigos publicados na imprensa quotidiana e nos pequenos jornais dessas localidades, e realizada por recrutadores preparados por formação e documentação especiais.
Estas visitas foram seguidas de reuniões de informação e de propaganda directa.
Um inquérito posterior realizado entre os voluntários admitidos, para recolher ensinamentos sobre o valor dos processos de propaganda utilizados e as razões que haviam levado cada um a inscrever-se na defesa civil, mostrou que, regra geral, vários, e não só um, dos meios utilizados haviam decidido os voluntários à inscrição; no entanto, foi concluído claramente que os contactos pessoais, por meio das visitas preparadas, bem concebidas e bem executadas, se revelaram incontestavelmente como o melhor meio de obter adeptos.
O estipulado na base XXII da proposta de lei dá longa margem à intensificação daquela propaganda de doutrinação da população, que se reputa indispensável à sua preparação psicológica.
Na emergência de um ataque aéreo é indispensável a montagem dum dispositivo que se destine a recolher os informes necessários e a promover a difusão do aviso de alerta à população, para que tome as medidas de precaução ou protecção tornadas convenientes e previamente determinadas.
Ao assunto se refere a proposta de lei nas suas bases XIV e XV, preceituando que o desencadeamento dos avisos de alerta é regulado de acordo com a aeronáutica e o comando de segurança interna e prevendo que, desde o tempo de paz e em ligação com a aeronáutica militar, seja organizado o corpo de observadores terrestres, beneficiando de informações prestadas por serviços organizados de alguns organismos e mesmo por voluntários, pertencendo a preparação moral e técnica do corpo à Legião Portuguesa, em ligação e segando a orientação técnica da aeronáutica militar.
Este acordo com as forças aéreas é, aliás, normalmente seguido por todos os países, onde graduados especializados da defesa civil em tempo de guerra seguirão constantemente a evolução da situação junto dos centros de operação ou dos centros de controle por 'radar, para transmitirem o informe colhido ao comando da defesa civil, o qual, por sua vez, promoverá a sua disseminação pelas regiões ameaçadas. Dada a importância que reveste o alerta a população, compreende-se que seja desejável, e portanto aconselhado pela N. A. T. O., o estabelecimento duma rede nacional de alerta, cobrindo o conjunto do Pais, e que seja posta à disposição da defesa civil uma rede de comunicações.
A proposta de lei na sua base m prevê a necessidade de planear no escalão nacional o sistema de alerta e vigilância do espaço aéreo e a esse planeamento cremos que se tem dedicado já um ponderado estudo.
Supomos em execução a primeira fase do sistema de alerta destinado a Lisboa e uma estação experimental foi já estabelecida no Entroncamento.
Pelo que respeita à rede de comunicações, o assunto será resolvido em ligação com o serviço público dos correios, telégrafos e telefones por estatuto a estabelecer, em harmonia com o disposto na base XIV da proposta de lei.
Por certo será então devidamente considerada a alta importância das comunicações, atendendo a que em tão momentoso assunto não são de admitir as perdas de tempo.
Por isso na Noruega, onde há um posto de rádio por cada três habitantes, está prevista a utilização do sistema de radiodifusão para o alerta e na Dinamarca, além de todas as cidades estarem providas de sereias fixas, cujo funcionamento é desencadeado por telecomando, a defesa civil dispõe ainda de uma importante reserva de sereias móveis, com volume sonoro idêntico ao das accionadas por electricidade.
E é ainda para se ganhar o mais possível na antecedência dos informes que a N. A. T. O. preconiza o plano internacional, muito especialmente quando se trate de alertas respeitantes ao aparecimento de poeiras radioactivas, em inglês chamadas fallout, em francês retombées radioactives e que em português poderemos chamar precipitação radioactiva - partículas radioactivas resultantes de um rebentamento nuclear e arrastadas, pelo vento a longas distancias.
É por isso que na Inglaterra se ventila a troca de informações sobre a precipitação radioactiva entre nações aliadas, em modalidade praticamente análoga à usada na troca de informações meteorológicas, admitindo-se na Noruega que estas informações do serviço meteorológico poderão permitir a determinação das zonas prováveis de precipitação radioactiva procedendo a observações prolongadas sobre a direcção dos ventos, a alta altitude e nas diferentes épocas do ano, e difundindo diariamente boletins sobre a direcção e intensidade dos ventos a diferentes altitudes.
Nesta ordem de ideias, acordos sobre alerta estão concluídos, e até mesmo já aplicados em exercícios, entre os Estados Unidos da América e o Canadá.
A Bélgica também já coopera com o Luxemburgo e espera que essa cooperação se estenda à Holanda.
Na proposta de lei igualmente se traduz, na sua base III, este pensamento de colaboração internacional no campo da defesa aérea.
Uma população alertada deve abrigar-se. O problema dos abrigos avulta de forma tal que na última reunião da N. A. T. O. foi concluído que não poderia haver uma defesa civil eficaz sem abrigos, visto que, para uma bomba de 5 a 20 megatões, as perdas a registar numa população não abrigada orçariam em 92 a 98 por cento, enquanto que regularmente abrigada essas perdas não excederiam 40 por cento. Classificadas as zonas em quatro categorias -livre, de perigo moderado, fortemente perigosa e de evacuação -, acordaram em que a sobrevivência das populações nas zonas de perigo moderado e fortemente perigosas está intimamente ligada à existência de abrigos, visto considerar-se necessário que nestas zonas as populações permaneçam nos abrigos as primeiras quarenta e- oito horas após o bombardeamento ou a queda de precipitação radioactiva. Depois deste período a actividade das populações continua-a ser extremamente condicionada. A sua permanência ao ar livre, função da intensidade das radiações, é limitada, julgando-se que na zona de perigo moderado só ao fim de dois meses se poderá fazer, a vida normal, enquanto na zona fortemente perigosa só tal se poderá fazer ao fim de um ano ou talvez mais.
Importa, portanto, permitir à população que disponha de um abrigo, de resistência apropriada, em que se proteja, na iminência de um ataque aéreo ou quando em zona julgada em perigo das acções de precipitação radioactiva.
Ao encarar-se a possibilidade de uma nova conflagração, com a utilização de ataques nucleares, admite-se
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que os objectivos desses ataques não se alarguem muito além daqueles considerados como prioritários e que, além dos meios aliados de produção e de lançamento das armas atómicas, serão:
As sedes dos governos aliados;
Os centros industriais e de comunicação servindo directamente ao esforço de guerra;
Os grandes complexos portuários;
Os aglomerados principais a cuja destruição corresponderiam as mais graves consequências, não só sobre o esforço de guerra, mas também sobre o moral das populações civis.
Em todos os países, e consoante os princípios acordados na N. A. T. O., se vem dedicando a maior atenção a este importante aspecto da defesa civil.
Assim, na Inglaterra colhem-se elementos informativos sobre o local, capacidade e grau de protecção das caves e dos túneis situados no pais e susceptíveis de servir como abrigos.
Na Alemanha a lei da defesa civil prevê a construção de abrigos colectivos nas cidades mais importantes, medidas de protecção para as fábricas construídas de novo e a existência de abrigos em todos os edifícios das cidades com mais de 10 000 habitantes e, pelo que respeita a urbanização, que no seu estudo seja atendida a protecção contra os ataques aéreos, dada a grande importância representada pela redução da vulnerabilidade dum aglomerado.
Na Noruega reconheceu-se a necessidade de se construírem em túneis abertos em rocha os abrigos destinados aos centros de comando e os depósitos a situar em locais considerados mais expostos. Os abrigos públicos são, de preferência, construídos de igual modo, mas podem, em certos casos particulares, situar-se nos subsolos dos edifícios com construção de betão armado.
Cada abrigo deve, obrigatoriamente, ser protegido por uma camada de betão armado com 1 m de espessura e ainda ser estanque aos gases e equipado com ventiladores munidos de filtros especiais. Estes abrigos são concebidos de maneira a poderem ser utilizados, na medida do possível, em tempo de paz, como entrepostos, garagens, parques de estacionamento, etc. Quanto a abrigos particulares, incumbe ao proprietário de cada imóvel dotá-lo dos necessários para os seus locatários; assim, nas casas recentes e naquelas antigas que são transformadas devem ser construídos abrigos permanentes de concepção robusta, em virtude de decisão governamental. Evidentemente que estes citados abrigos são garantidos, pela sua construção, para o perigo da precipitação radioactiva, mas, em geral, só existem nas cidades. No campo quase todas as habitações possuem uma cave excelente, tornada necessária pelo clima, e que poderá constituir um apreciável abrigo contra a precipitação radioactiva.
Na Holanda reconheceu-se a necessidade da construção de abrigos destinados aos trabalhadores considerados de presença indispensável naquelas zonas a evacuar, por constituírem admissíveis objectivos de ataques atómicos. A população, no quadro das medidas de autoprotecção, é instruída sobre a construção de abrigos familiares, que, com meios considerados simples, poderão oferecer uma razoável protecção contra os efeitos da precipitação radioactiva.
Na Dinamarca os abrigos públicos são construídos isoladamente, em forma de galeria, ou dispostos nos edifícios novos com estrutura de betão armado, ou ainda em construções subterrâneas, que, em tempo de paz, são também utilizáveis como entrepostos, garagens, etc. Não estarão estes abrigos à prova de um golpe directo de uma bomba, mas dão protecção suficiente contra os efeitos do sopro duma bomba clássica, contra os desmoronamentos, os estilhaços e os projécteis de pequeno calibre, contra a asfixia e a intoxicação, contra as inundações provenientes da rotura de condutas, etc., assim como contra os riscos de incêndio e da radioactividade. Tom paredes e tectos de betão armado (25 em a 40 cm) e uma cobertura de terra de 60 em a 100 cm, conforme a espessura do betão.
Quanto aos abrigos privados, desde 1 de Junho de 1950 que a sua construção é imposta nas caves de todos os novos edifícios que, nas zonas da defesa civil, abriguem mais de duas famílias ou mais de dez empregados. A protecção nestes abrigos não será tão eficiente como nos abrigos públicos, mas será, todavia, bastante suficiente contra as ruínas, os estilhaços e os projécteis de pequeno calibre e, em certa medida, contra as radiações radioactivas. A parte superior dos abrigos e protegida contra o risco do desmoronamento e munida de uma placa de betão armado com, polo menos, 20 em de espessura, devendo as paredes ter a espessura de 40 em ou de 25 cm, conforme forem de betão simples ou betão armado. As despesas estão a cargo dos proprietários, que deles se poderão utilizar em tempo de paz, desde que em curto prazo possam converter-se em abrigos, por meio de chapas, de pára-estilhaços para as janelas, portas, etc.
Embora não tenha feito ainda uso desta determinação, a direcção da defesa civil tem o direito de exigir que as caves dos edifícios construídos anteriormente àquela data de 1 de Junho de 1950 sejam convertidas em abrigos.
Destinado á protecção de certas obras de arte existentes em museus, bibliotecas, etc., foi construído um abrigo seguro e especialmente reforçado e outro idêntico se está construindo.
Pelo que respeita a abrigos contra os efeitos da precipitação radioactiva, os Canadianos são encorajados a seguir o principio que consiste em cada um cuidar de si tendo em vista que a sobrevivência constitui o fim a atingir e que aqueles abrigos são concebidos em ordem de simplicidade e de custo' pouco elevado.
Em Itália estão-se construindo 500 abrigos subterrâneos, a maior parte em túneis, podendo acolher cada um, em média, cerca de 1000 habitantes.
Acrescentemos, por fim, que durante a recente Conferência de Florença, com a representação de doze países, Israel comunicou que, por lei, cada casa de habitação ou empresa deve ter um abrigo, e, assim, não são concedidas licenças de construção se não estiver previsto um abrigo nas condições prescritas. Nos casos de antigas construções a dotar de abrigos, o pagamento dos respectivos encargos é dividido, sendo 50 por cento suportados pelos proprietários e os outros 50 por cento repartidos pelos locatários proporcionalmente ao número de quartos ocupados e a pagar conjuntamente com a renda do mós.
Depois deste breve apontamento da forma como em alguns países se encara este aspecto da defesa civil, vejamos o que entre nós se tem passado.
Não será, por certo, de admitir em Portugal muitos objectivos a classificar de prioritários para um ataque atómico, mas, se, por desgraça de que Deus nos defenda, uma conflagração se desencadear e nos vejamos nela envolvidos, Lisboa, pela sua situação geográfica, pelas instalações fabris e depósitos de carburantes que a cercam e, principalmente, pela excelência do seu porto, reservado certamente a grande utilização, não se tornará um apetecido objectivo?
No entanto, verificamos que, nestas últimas décadas, se construiu, por assim dizer, uma nova cidade, em que muitos edifícios novos dispõem de caves, mas não foram tomadas providências para que estas possam ser utili-
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zadas como abrigos: algumas, porém, ainda são susceptíveis duma adequada adaptação.
Nas próprias obras do metropolitano não foram encaradas na sua construção providências especiais no sentido de, em casos de emergência, poderem as suas instalações ser utilizadas como abrigos.
Referimo-nos ao caso de Lisboa, mas cremos que idênticas considerações se poderiam apresentar para as restantes cidades e outros aglomerados populacionais, bem como para centros industriais ó outros de importância, como possíveis objectivos de ataques aéreos, mesmo não atómicos.
Parece que, de facto, ia sendo tempo de serem estudadas disposições para que o problema dos abrigos passasse a ser tomado em consideração, já nas edificações a construir, já nas normas a que deva obedecer, de futuro, a localização dos centros industriais e populacionais. Ao assunto se refere a base XXX, em relação à qual se propõe uma alteração de redacção no capitulo do presente parecer que trata do problema na especialidade.
Alertada e abrigada, a população, necessário se torna organizar, equipar e prover, em pessoal instruído e treinado, a um serviço de defesa civil, bem compreendido e eficaz, que disponha de efectivos suficientes para fazer face, na medida do possível, às consequências dum ataque aéreo, qualquer que ele seja, não esquecendo que as próprias populações civis devem concorrer para a sua própria protecção.
Impõe-se, assim, a organização de alguns serviços, devidamente chefiados, tais como: de vigilância, de luta contra incêndios, de salvamento, de primeiros socorros, de auxilio social, de desobstrução, de detecção dos efeitos das agressões químicas e biológicas, de descontaminação, de neutralização de projécteis não explodidos e ainda de auxiliares de postos de comando.
A organização destes serviços implica, por um lado, prover ao equipamento e meios de transporte suficientes para os serviços e, por outro, organizar o recrutamento do pessoal, notando-se que a idade e a aptidão física são de primordial importância em certas missões. Deverão ser tomadas disposições para assegurar convenientemente a instrução da totalidade do pessoal susceptível de ser utilizado e a formação dos indispensáveis instrutores. Convirá prever cursos especiais para o pessoal encarregado de dirigir as operações de defesa civil, como também prever os planeamentos que exigem uma mobilização rápida do pessoal, do material e dos meios de transporte e, bem assim, o concernente a meios de. transmissão e também a postos de comando, depósitos e outras instalações- necessárias aos serviços, convenientemente protegidas e situadas em zonas de menor risco de serem destruídas ou sofrerem graves danos em caso de ataque.
Tudo isto é, mais ou menos, o estabelecido, preconizando ainda a N. A. T. O. que, duma maneira geral, os serviços deverão ser organizados em base local, com reservas (colunas móveis) nas condições que melhor se adaptem a cada pais. E, de facto, ó nesta modalidade que, na generalidade dos países da N. A. T. O., os serviços estão organizados.
Assim, na Holanda, além dos serviços locais de defesa civil, prevê-se a organização de «grupos móveis», com médicos, enfermeiros e enfermeiras, pessoal dos primeiros socorros e motoristas das viaturas de transporte do pessoal e material e motociclistas. Uma parte destes grupos mantém-se em serviço permanente e estacionada na periferia; outra só com pequeno núcleo permanente, a completar com pessoal de primeiros socorros quando em situação de emergência. Estes grupos mantêm ligação com a Cruz Vermelha.
Na Dinamarca as e colunas móveis são consideradas como um dos elementos essenciais da organização da defesa civil. Os efectivos compõem-se de homens do contigente que serve com o pessoal das forças armadas, susceptíveis de serem chamados em período de treino e, em caso de emergência, serem mobilizados, reunindo-se então em centros previamente determinados.
Um certo número de mulheres serve voluntariamente nas colunas.
A instrução é norteada primeiramente num treino-base, no escalão de secção, seguido de um treino especializado no escalão de coluna e, por fim, em exercícios combinados de larga escala. Estas colunas estão dotadas com material apropriado, como seja: bombas de incêndio, veículos de salvamento e de reparação, compressores e grupos de iluminação, guindastes, bulldozers, camiões com material de pontes, furgões-rádio, camiões para construção de linhas, camiões para transporte de material sanitário, ambulâncias e cozinhas rolantes. Contam com viaturas de requisição, que em caso de mobilização se juntam em pontos de reunião previstos.
Na Noruega os efectivos locais dos serviços da defesa . civil são doseados da seguinte forma: luta contra os incêndios (cerca de 30 por cento); salvamento ligeiro (cerca de 20 por cento); salvamento pesado (cerca de 10 por cento); luta contra os gases e a radioactividade (cerca de 10 por cento);- policia (10 por cento); reparação das instalações dos serviços públicos (7,5 por cento); observação e transmissões (12,5 por cento).
É idêntica e uniforme em todo o país a organização dos serviços. Pelo que respeita a colunas móveis, cada uma é constituída por uma brigada de bombeiros, uma secção de policia e um grupo de cozinheiros.
Os serviços da defesa civil adquiriram camiões e viaturas a utilizar pelas colunas móveis (a ceder às forças locais para execução de exercícios), bem como outros artigos de material, em quantidade e qualidade que classificam de muito importantes.
Quanto a recrutamento de pessoal, alguns países, como a Noruega, estabelecem a possibilidade de todos os homens ou mulheres poderem ser mobilizados nos serviços da defesa civil, desde que não sejam mobilizados pelas forças armadas. Porém, na generalidade dos países da N. A. T. O. esse recrutamento baseia-se no regime de voluntários, assumindo especial importância os trabalhos de divulgação e propaganda a que já nos referimos.
Recrutado o pessoal, há que instrui-lo não só nos princípios basilares da defesa civil, como ainda naqueles específicos do serviço a que seja destinado, instrução esta que, sob o aspecto de autoprotecção, deverá também estender-se a toda a população, para que, em caso de necessidade, saiba o que fazer e como fazê-lo, e até mesmo porque só com uma população suficientemente preparada e instruída será fácil manter a necessária disciplina em todas as circunstâncias, inclusive nos longos períodos que tenha de manter-se em abrigo, na certeza de que preparar e fornecer ensinamentos será até processo seguro de evitar o desencorajamento.
Além da necessidade de actuação destes serviços na defesa local -segundo foi informado na recente Conferência de Florença, a U. R. 8. S., até ao fim de 1956, contava com 2600 brigadas de defesa civil-, apresenta também um interesse essencial a manutenção dos serviços públicos, por isso que será o seu bom funcionamento que assegurará às populações sinistradas condições de vida aceitáveis e, por outro lado, permitirá a continuidade das actividades industriais necessárias à sobrevivência das populações e até à própria manutenção do esforço de guerra.
Nos Estados Unidos da América os serviços públicos têm sido encorajados a passar em revista o conjunto do sen sistema, a fim de determinar os pontos fracos, assim como as modificações, os melhoramentos e as medidas
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de dispersão que se imponham para que as instalações funcionem de maneira satisfatória em caso de emergência.
Cada serviço público designa um membro da sua organização para fazer parte dos serviços técnicos, de maneira a estarem representados no serviço local da defesa civil.
Necessário será também que nas empresas industriais e na generalidade dos serviços públicos sejam constituídas unidades de defesa civil, destinadas a assegurar a sua manutenção e a protecção do próprio pessoal, unidades estas assistidas tecnicamente pela organização da defesa civil e apoiadas mesmo pelos seus serviços locais.
Assim, em diversos países do N. A. T. O., tais como França, Holanda, Dinamarca, Noruega, Inglaterra, Estados Unidos e outros, estão elaborados programas para a manutenção dos serviços públicos, estabelecendo-se, em linhas gerais:
Protecção, no local próprio ou na proximidade imediata dos respectivos lugares de emprego, do pessoal técnico indispensável ao funcionamento os serviços;
Organização de um sistema de equipas de reparações (em particular reparações de urgência) e protecção do pessoal em seus locais de reunião; Constituição de reservas de materiais destinados a substituir aqueles destruídos ou danificados.
m especial cuidado é atribuído para aqueles serviços públicos considerados essenciais - água, gás e electricidade.
Alguns países apresentam-se já em condições de vantagem. É o caso da Noruega, onde, pelo que respeita a água potável, é privilegiado o serviço na maior parte das cidades, com reservatórios afastados e a certa altitude, pelo que a água chega na pressão natural, dispensando bombas e outras instalações vulneráveis; somente as canalizações, enterradas a 2 m de profundidade, podem ser afectadas, mas os serviços da defesa civil estarão a postos para esta eventualidade, bem como para prevenir toda a sabotagem.
Pelo que respeita à corrente eléctrica, também a Noruega, onde o consumo médio por pessoa é um dos mais elevados do Mundo, está em condições de vantagem, porquanto, actualmente, um terço da sua energia eléctrica provém já de centrais subterrâneas.
Ainda a este respeito, julgamos de certo interesse apontar que na Dinamarca, além do serviço auxiliar, análogo ao da protecção às fábricas, se preconiza:
Para a distribuição da energia eléctrica, uma alimentação de socorro e o estabelecimento de linhas permitindo alimentar a rede de distribuição com outras centrais eléctricas;
Para a distribuição de gás, a possibilidade de condução provisória de gás para as empresas de importância vital, importando proceder a divisão da rede em sectores isoláveis por dispositivos apropriados;
Para a distribuição de água, a subdivisão da rede de distribuição em sectores isolados e organização de um sistema de socorro de aproveitamento de água potável, a partir de fontes particulares e por meio de reservatórios móveis.
Pelo conhecimento que nos é dado ter, podemos classificar de meritório o trabalho desenvolvido pela Legião Portuguesa nestes variados aspectos a que nos vimos referindo e que interessam à organização da defesa civil.
De facto, através da escola nacional e das escolas regionais vem formando os- indispensáveis instrutores, como também, em curso operacional, vem preparando aqueles destinados a funções de chefia de comando operacional. Um importante número de cursos básicos tem feito funcionar com voluntários da população civil das áreas dos seus comandos distritais, muito vindo assim a contribuir para a difusão daquelas noções elementares da defesa civil nos diferentes ramos dos seus serviços operacionais, o que constitui também um apreciável trabalho de doutrinação entre essas populações.
Com estes elementos voluntários, de ambos os sexos, habilitados com o curso básico e que, na sua quase totalidade, tomaram mesmo parte em exercícios de exemplificação prática e treino, e ainda com aqueles outros elementos do escalão da defesa civil da Legião Portuguesa, pode considerar-se como bem encaminhada a organização dos serviços operacionais.
Por outro lado, a Legião Portuguesa tem estabelecido contacto com vários serviços públicos, e, através de cursos especiais, tem vindo a ser prestada assistência técnica a delegados desses serviços, em passo muito importante para a constituição dos serviços de cooperação.
E assim a organização da defesa civil, informada nos princípios da autoprotecção, da ajuda mútua, do apoio e do apoio móvel, tem sido intentada pela Legião Portuguesa em todos aqueles vários e importantes aspectos a que aludimos.
A proposta de lei, através das suas bases II, III, IV, V, X, XIV, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXI, XXII, XXIV, XXV e XXVI, promulga as necessárias disposições para que àqueles considerados aspectos seja dado o desejado desenvolvimento e para que a Legião Portuguesa, com aquele entusiasmo e dedicação de que tem dado sobejas provas, consiga que, dentro em breve e como é mister, a organização da defesa civil- entre nós se coloque em Siralelo com a dos outros países nossos associados da . A. T. O., que a este magno problema tom evidenciado dedicar apreciável atenção.
O estabelecimento de planos de dispersão e de evacuação foi considerado em reunião da N. A. T. O. como duma extraordinária importância e ainda que esses planos deveriam fixar as regiões - alvos prováveis, onde seria, portanto, desejável reduzir o povoamento em relação ao tempo de paz, determinar os sectores destas regiões cuja população poderia ser evacuada ou dispersada e prover à organização dos respectivos serviços. Deveriam ainda ser regulados, de maneira satisfatória, todos os problemas de detalhe respeitantes, entre outros, a alojamento,. reabastecimento em viveres, água e aquecimento.
E, assim, estes planos vêm sendo preparados nos diferentes países.
Nos Estados Unidos dizem respeito a mais de metade da população, prevendo-se medidas de evacuação em toda a parte onde a permita a antecedência do alerta. Os sectores de recepção dos evacuados estão a ser devidamente preparados.
Na Noruega entenderam que a ameaça das armas nucleares tornou necessários novos planos de dispersão, elevando para 50 por cento a percentagem da população a evacuar nas dez cidades mais importantes. Porém, para contrabalançar as dificuldades de recepção, renunciaram à dispersão de 30 por cento nas cidades de mais de 10000 habitantes.
Na Dinamarca está previsto o planeamento da evacuação, voluntária ou obrigatória, de grupos importantes da população de algumas cidades e regiões em caso de hostilidade declarada ou iminente.
Estes planos, de uma maneira geral, dirão respeito a:
Criação dum sistema de alerta, permitindo informar rapidamente a população das determinações relativas à evacuação;
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Transporte dos enfermos;
Designação dos pontos de reunião, em regra próximo das saldas das cidades a evacuar;
Implantação de postos de socorros escalonados ao longo do itinerário, onde os evacuados possam obter alimentos, água e toda a ajuda necessária e possível de obter;
Alojamentos nas regiões de recepção, com aproveitamento, pelo menos a princípio, dos grandes edifícios (escolas, hotéis, câmaras, etc.).
Para a execução deste plano prevê-se a colaboração dos serviços de evacuação da defesa civil com os serviços normais de policia.
Pela base IX do decreto sobre a organização geral da Nação para o tempo de guerra, serão normalmente delegados pelo Presidente do Conselho no Ministro da Presidência os poderes de coordenação e de direcção relativos à preparação e execução de assistência às populações,- problema este que reputamos Intimamente ligado e com a maior importância ao das evacuações, ao qual na proposta de lei se referem as bases I, III e XIII.
Também este importante problema da defesa civil não tem sido descurado pela Legião Portuguesa, antes, e dentro das suas possibilidades, foi devidamente encarado e até mesmo exemplificado num interessante exercício de evacuação parcial da cidade de Viseu, o qual, certamente, terá proporcionado a colheita de úteis ensinamentos.
Propriamente pelo que se refere a refugiados, afigura-se-nos que esse é um problema de carácter internacional, tal como foi considerado em acordos estabelecidos entre os Estados Unidos da América e o Canadá, acordos esses já mesmo experimentados praticamente em alguns exercícios realizados.
Se, de facto, é problema a considerar sob o ponto de vista internacional, supomos que ele se ajustará ao preceituado na base III da proposta de lei.
C) Necessidade da publicação da lei
Finda a última guerra mundial, surge-nos uma Europa depauperada e dividida, por linha de separação demarcada através do território da Alemanha vencida, em dois blocos internacionais.
O bloco oriental é constituído pela Rússia e por aqueles países que, situados para além dessa, linha separatória, lhe estão firmemente subjugados sob o peso da maior tirania de todos os tempos.
E, se outras não existissem já, provas insofismáveis dessa tirania ainda há bem pouco tempo foram dadas quando, em nome de uma liberdade apregoada pela voz dos canhões e pelo matraquear dos engenhos de guerra, foi impedida às populações da Hungria aquela tão natural e ambicionada liberdade de ... serem húngaros.
Descida a «cortina de ferro» sobre aquela linha separatória, é assim que, para além dela, vivem as nações na maior das opressões.
E, numa desmesurada ambição de expansionismo, mascarada em pretensa ideologia política, a U. E. S. S. intenta assenhorear-se de todas as zonas de influência estratégica e económica, desencadeando também, e com tal fim, problemas de pseudo-racismo e anticolonialismo.
A Organização das Nações Unidas, intentada com os melhores desejos de alicerce seguro de uma paz duradoura e firme, depressa se viu coarctada nos seus propósitos pela utilização sistemática do veto da Rússia em tudo que, porventura, lhe não agradasse aos seus inconfessados desígnios.
E breve, em vez daquela desejada paz, passou-se a viver num ambiente chamado de «guerra fria», em que, entre curtas passagens de fugidias e ilusórias promessas de paz, lança a Rússia a ameaça constante duma nova guerra, por certo a mais atroz de todos os tempos, que tudo faria ruir nos escombros de um Mundo em fogo. Foi então que, ante esta ameaça e num espirito de defesa colectiva, se formou a Organização do Tratado do Atlântico Norte, para, com o esforço de todos os países nela associados, se prover à defesa da sua própria existência como povos livres e, com ela, da sua civilização.
E, ante a hipótese de que os territórios dos membros europeus da N. A. T. O. pudessem vir a ser utilizados como bases de armas atómicas das forças americanas, logo a rádio de Moscovo lança nova ameaça - e esta dos próximos últimos dias - sobre a Dinamarca, a Noruega, a Holanda, a Alemanha Ocidental e a Grã-Bretanha, não deixando de acrescentar que suma bomba soviética sobre o campo de Soesterberg - onde os Americanos tencionam instalar uma base militar - será suficiente para reduzir a escombros Amsterdão, Haia, Utreque, Amersfoort e toda a área entre estas cidades», para tornar a ameaça mais impressionante e de molde a reactivar aquela «guerra fria ou guerra de nervos».
Portugal, embora desejando verdadeira e sinceramente a paz - aquela paz, nos homens e nos espíritos, que tem tornado possível, nestas últimas décadas, um portentoso esforço de ressurgimento -, mas fiel aos seus princípios de sempre, norteados pela civilização cristã em que se criou e tornou grande, não se negará, dentro das suas possibilidades e mesmo com o maior dos esforços, ao cumprimento dos compromissos assumidos naquela organização internacional.
Por isso foi considerada oportuna, mesmo de necessidade urgente, a promulgação da Lei da Organização Geral da Nação para o Tempo de Guerra.
Ora, como nesta organização se abarca a defesa militar e a defesa civil - cuja importância actual, no que lhe importa, desejámos acentuar -, implicitamente se nos afigura oportuna, e mesmo de manifesta urgência, esta proposta de lei que o Governo submete à apreciação das Câmaras.
D) Economia da proposta
1. Apresenta-se a proposta de lei dentro daquele espirito nacional, orientado no superior desejo de colaborar para a paz e progresso da humanidade, ao mesmo tempo que salvaguardando os bens morais e materiais, promovendo a sua defesa em qualquer emergência, não excluindo mesmo a da guerra, em que, por força de ataque directo ou em virtude de compromissos assumidos, o País se veja envolvido.
2. A salvaguarda dos bens morais e materiais da Nação constitui dever sagrado para todos os portugueses, e, porque assim é, obrigação se torna para todos o conhecimento perfeito de, em casos de emergência, saber como dever empregar o seu voluntarioso esforço na quota-parte que lhe compita na grata missão de se salvar, à sua família, ao seu semelhante, de evitar o pânico, que dificultaria a defesa e a própria acção do Governo.
É que a defesa civil não se coaduna com a improvisação, por melhores e mais arreigados que sejam os sentimentos de altruísmo, abnegação e humanitarismo.
Antes lhe importa o estabelecimento de disposições legais orientadas no princípio da previsão e adaptáveis aos indispensáveis planeamentos.
3. Ao enunciarmos, em apreciação na generalidade, ainda que duma maneira muito rápida, como supusemos que a natureza do trabalho nos impunha, a forma como
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se tem preconizado a orientação da defesa civil, as medidas e processos que a tal respeito é mister adoptar, fomos indicando, simultaneamente, as bases da proposta de lei que, correspondendo ao passo tratado, apresentavam a disposição legal para o equacionar e resolver.
Precisamente pela complexidade do problema da defesa civil, envolvendo, a par das populações, a interveniência de tantas colectividades e serviços, instituições com personalidade jurídica própria e organismos afectos aos diversos ramos da Administração do Estado, impunha-se a criação de uma direcção superior para a sua organização geral, como também a de um comando para a sua execução e, em sequência e ligados a este conceito de unidade, aqueles outros da responsabilidade e da coordenação.
Atendendo a que a defesa civil, além da estreita colaboração que, em certos aspectos e como j á vimos, deve manter com as forças militares, e mesmo ainda porque no âmbito da defesa nacional se situam as actividades da defesa civil, parece-nos absolutamente lógico que a organização geral da defesa civil se realize sob a superior direcção do Ministro da Defesa Nacional (base li).
No entanto, aquela complexidade a que aludimos justifica que ao Ministro da Defesa Nacional se dê a competência de, quando tal julgue conveniente, convocar um conselho restrito, para assim recolher as informações necessárias e concernentes ao estudo, desenvolvimento, resolução e coordenação dos problemas concretos relativos à defesa civil (base IX).
Mas, existindo assuntos em que têm intervenção diferentes Ministérios, e atendendo à hipótese de não se chegar a acordo para-a sua resolução, necessário se torna estabelecer o modo de os resolver. Julgamos o Conselho Superior da Defesa Nacional, com os poderes de direcção e de coordenação que lhe estão outorgados, o organismo competente para solucionar esses assuntos.
Assim também deverá ao mesmo Conselho competir a apreciação das directivas e planos gerais que digam respeito à defesa civil (base VIII).
Dado que a preparação, organização e execução da defesa civil compete essencialmente à Legião Portuguesa (base n), ratificando-se assim o que já havia sido disposto pelo Decreto-Lei n.º 31956, de 4 de Abril de 1902, não deveria deixar de ser atribuído o comando da organização geral da defesa civil ao comandante-geral da Legião Portuguesa, conforme se indica na base x, que também estabelece a sua competência no que respeita ao planeamento, organização e preparação, coordenação com organismos participantes ou colaborantes na defesa civil e, em caso de guerra ou de emergência grave, a responsabilidade do comando operacional.
4. O principio da descentralização do comando também se verifica na proposta de lei.
De facto, impunha-se essa descentralização, especialmente pelo que importa aos aspectos operacional e administrativo, e, consequentemente, uma organização territorial da defesa civil.
Nesta divisão territorial julga-se dever atender, por um lado, à divisão territorial civil e militar do Pais e, 1 por outro, à própria organização territorial da Legião Portuguesa.
É este ajustamento que se realiza através das bases XI, XII e XIII.
5. Necessária ainda a disposição legal para, nos termos da Lei da Organização Geral da Nação para o Tempo de Guerra, se prover às exigências próprias da defesa civil, por meio de mobilização, parcial ou total, das pessoas e bens, envolvendo direitos concernentes a recrutamento de pessoal, a prioridade, em determinadas circunstancias, das comunicações de relação e de qualquer natureza, a servidões a impor a organismos ou empresas, a requisição de material, equipamento ou instalações.
Ora esta mobilização, parcial ou total, deve obedecer a planos preestabelecidos de harmonia com os princípios consignados na lei, importando, pois, que se proceda ao recrutamento das pessoas e bens que interessam à organização e preparação da defesa civil desde o tempo de paz e de acordo com a autoridade militar (bases XXVII, XXVIII e XXIX).
6. As parcelas do território português, espalhadas por diferentes continentes, legalmente e a sintetizar o alto espírito nacionalista que a todos estreita e firmemente une no mais acrisolado amor pátrio, constituem um todo que é a Nação.
Assim, como é óbvio, os princípios em que assente a organização da defesa civil, nos termos desta proposta de lei, serão de aplicação a todo o território nacional de aquém e além-mar.
Na aplicação desses principies às províncias ultramarinas haverá que prever os ajustamentos indispensáveis a adaptar as condições especiais da organização, quer política, quer administrativa, dessas províncias (base VI).
7. A proposta de lei está estruturada em trinta bases, repartidas por seis títulos:
TÍTULO I - Dos princípios fundamentais.
TÍTULO II - Da estrutura orgânica da defesa civil.
TÍTULO III - Dos órgãos superiores de direcção e inspecção.
TÍTULO IV - Dos elementos da organização nacional da defesa civil do território.
TÍTULO V - Da doutrinação e instrução.
TÍTULO VI - Disposições diversas.
Julgamos que esta repartição adoptada se afigura bem ajustada e, portanto, admissível.
E) Conclusões
Esta Câmara, ao examinar na generalidade a proposta de lei em apreciação, considera-a:
De notável merecimento e alto interesse nacional;
De grande oportunidade, digamos mesmo urgência;
Informada dos princípios ajustados;
Contendo as disposições necessárias para regular os diversos aspectos concernentes à defesa civil; Estruturada em bases concisas, mas sem que tal
prejudique a indispensável clareza.
Nestas condições, e sendo mínimos e não afectando a economia ou o equilíbrio da estrutura da proposta os ajustamentos ou modificações que se julga necessário efectuar, a Câmara dá-lhe a sua concordância na generalidade e passa ao
II
Exame na especialidade
TITULO I
Nada a objectar.
BASES I, II E III
Nada a objectar.
TÍTULO II
Nada a objectar.
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Bases IV, V e VI
Nada a objectar.
TÍTULO III
Nada a objectar.
BABES VII, VIII, IX, E X
Nada a objectar.
TÍTULO IV
Nada a objectar.
SECÇÃO 1
Nada a objectar.
BASE XI
O n.º 8 desta base estabelece que o chefe da circunscrição regional será, normalmente, o comandante distrital da Legião em cajá área está localizada a sede da região ou comando militar.
As competências do comandante da circunscrição regional e do comandante da zona distrital (comandante distrital da Legião) são estabelecidas respectivamente nas três alíneas da base XII e no n.º 1 da base XIII.
Verifica-se que estas competências são bastante diferenciadas e, portanto, a. acumulação normal daquelas funções só pode justificar-se, ao que cremos, por uma imperiosa necessidade de economia de comandos, o que representa, de facto, razão forte para ser desejada.
No entanto, afigura-se-nos que, na prática e em determinadas circunstancias, talvez aquela acumulação não seja possível ou, pelo menos, venha a levantar dificuldades à execução dos respectivos comandos.
Pelo exposto se sugere a substituição do termo anormalmente pela frase «sempre que possível», que nos parece melhor a ligar a ideia da vantagem com u da possibilidade.
Outrossim se sugere que, por unificação de terminologia - «chefe» na base XI e «comandante» na base XII - se substitua a palavra «chefe» por «comandante».
O n.º 3 desta base XI passaria, assim, a ter a seguinte redacção:
3. O comandante da circunscrição regional, sempre que possível, será o comandante distrital da Legião em cuja área está localizada a sede da região ou comando militar.
BASE XII
Nada a objectar.
BASE XII
Trata-se nesta base de apresentar a competência, dentro da respectiva área de jurisdição, dos comandantes de zonas distritais e de sectores concelhios e da constituição, junto de cada comando de zona distrital, duma comissão distrital de defesa civil, presidida pelo governador civil; como autoridade mais qualificada do distrito.
Parece-nos terem cabimento os seguintes reparos:
1.º Indica-se a competência dos comandos mas referência alguma se faz sobre quem exerça esse comando. Ora, pelo estabelecido no n.º 2 da base li, julgamos natural que a descentralização do comando (n.º l da base XI), atribuído ao comandante-geral da Legião Portuguesa (base x), seja efectivada através dos comandos da mesma Legião seus subordinados, o que mesmo, aliás, se deve inferir do estabelecido no n.º 3 da base XI.
2.º Assim como se faz destrinça entre a orientação e coordenação da organização local da defesa civil e a organização e preparação dos meios reservados ao apoio das operações de defesa no Âmbito regional ou nacional (apoio fixo ou apoio móvel), assim também julgamos dever ser feita destrinça entre propriamente aquela organização local da defesa civil e o estabelecimento da articulação dos meios destinados ao apoio mútuo.
3.º Afigura-se-nos também lógico, que, dentro da necessária descentralização e continuidade do comando, figure no articulado desta base uma disposição idêntica à da alínea b) da base X, dentro dó nível respectivo de comando, ao qual se não deve excluir a possibilidade de agir por iniciativa própria, de que assumirá inteira responsabilidade, em face de determinadas circunstancias de emergência, como seja, por exemplo, ante qualquer calamidade, mesmo em tempo de paz, que não permita delongas, antes exija uma acção pronta e decidida.
4.º Indica-se o funcionamento junto de cada comando da zona distrital duma comissão distrital de defesa civil, mas não se menciona qual a função desta comissão. É certo que pelo disposto na proposta de lei, mormente nas suas bases II e IV, como também pelo que nesta base XIII se apresenta como competência dos comandantes de zonas distritais e de sectores concelhios, e até mesmo pela própria constituição da comissão, se deverá inferir que Lhe seja. atribuída a responsabilidade :
Da obtenção daqueles recursos julgados necessários para, postos à disposição do comandante de zona distrital, por este ser orientada, coordenada e organizada a defesa local, a ajuda mútua e, se necessário, o apoio fixo ou móvel;
De promover entre todos os organismos susceptíveis de fornecer aqueles recursos a mais estreita quanto indispensável cooperação.
Parece-nos, portanto, que nesta base se deva indicar esta função a que se destina a comissão distrital de defesa civil.
Polo que deixamos exposto, sugere-se para esta base XIII a seguinte nova redacção:
1. Os comandantes de zonas distritais e de sectores concelhios serão, respectivamente, os comandantes distritais e os comandantes locais da Legião Portuguesa, competindo-lhes, dentro da respectiva área de jurisdição, em execução de planos preestabelecidos ou no cumprimento de ordens recebidas:
a) Orientar e coordenar a organização local da defesa civil;
b) Estabelecer a articulação, conforme as circunstâncias, dos meios destinados a apoios mútuos;
c) Organizar e preparar todos os meios reservados ao apoio das operações de defesa no Âmbito regional ou nacional, quando lhes forem solicitados; a) Em caso de guerra ou de. grave emergência, assumir o comando- operacional.
2. Em cada zona distrital funcionará uma comissão distrital de defesa civil, responsável não só pela obtenção dos recursos julgados necessários, como também pela estreita cooperação que à defesa civil interessa da parte de todos os organismos intervenientes.
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Desta comissão farão parte o governador civil, que presidirá, o presidente da camará municipal da sede do distrito, o comandante distrital da Policia e outras entidades, oficiais ou particulares, cuja presença seja julgada normal ou eventualmente necessária.
Às reuniões desta comissão poderá assistir o comandante da zona distrital, sempre que se julgue conveniente.
SECÇÃO II
Nada a objectar.
Bases XIV E XV
Nada a objectar.
SECÇÃO III
Nada a objectar.
BASES XVI, XVII, XVIII, XIX E XX
Nada a objectar.
SECÇÃO IV
Nada a objectar.
BASE XXI
Nada a objectar.
TÍTULO V
Nada a objectar.
BASES XXII, XXIII, XXIV, XXV E XXVI
Nada a objectar.
TÍTULO VI
Nada a objectar.
BASE XXVII
Nada a objectar.
BASE XXVIII
Ao apresentarmos, em apreciação na generalidade, o problema das evacuações, já então nos referimos à importância que lhe tem sido dispensada em reuniões da N. A. T. O.
Nalguns países a evacuação é considerada com um duplo aspecto: voluntário e obrigatório.
Porém, em recente reunião da N. A. T. O., ao assentar-se na classificação, a que também nos referimos, das zonas -livre, perigo moderado, fortemente perigosa e de evacuação -, concluiu-se que nas zonas deste ultimo tipo a evacuação deveria ser obrigatória, o que, aliás, parece absolutamente justificável.
Reconhecendo-se, então, que, por imposição das circunstâncias ou como medida prevista de precaução, pode o Governo considerar necessário obrigar a evacuar aquelas zonas a classificar de ameaçadas, entende-se que nesta proposta de lei deverá ficar previsto o direito que lhe assiste de assim proceder.
Sugere-se, portanto, uma nova alínea c) para esta base XXVIII, com a redacção a seguir apresentada, e a passagem a alíneas d) e e) das que estavam, respectivamente, indicadas como alíneas c) e d):
c) O direito do Governo de fazer abandonar pela população civil as zonas ameaçadas, retendo nelas as pessoas que ali interessar conservar.
BASE XXIX
Apenas alterada a sua redacção, nos termos seguintes :
1. A organização nacional da defesa civil do território procederá, desde o tempo de paz, de acordo com a autoridade militar e sem prejuízo do direito preferencial que a esta cabe, ao recenseamento das pessoas e recursos que interessam à organização e funcionamento da defesa civil.
BASE XXX
O n.º 2 da base XXX estabelece que «a partir da data da publicação da presente lei, todas as edificações a construir nas áreas de urbanização de Lisboa e Porto e nos centros ou pontos particularmente sensíveis para a vida da Nação, como tal considerados pelo Conselho Superior da Defesa Nacional, mediante proposta do Secretariado-Geral da Defesa Nacional, deverão obrigatoriamente dispor de uma cave habitável em que possam recolher-se todas as pessoas residentes ou que no prédio trabalhem, com as condições de segurança estabelecidas de acordo entre o Departamento da Defesa Nacional e o Ministério das Obras Públicas».
Embora se compreenda bem o objectivo em vista e as indiscutíveis vantagens .que adviriam, para a segurança das populações em causa, da adopção de tal principio, não se poderá deixar de considerar, contudo, o grande agravamento que dai resultaria para o custo da construção, com inevitável repercussão nas rendas dos prédios, isto precisamente num momento em que este problema apresenta grave acuidade, uma vez que a disposição adoptada abrangeria também as casas económicas, de renda económica, etc.
Não temos elementos para ajuizar do que custará uma cave para poder alojar cinquenta pessoas -hipótese dum prédio com rés-do-chão e cinco andares, direito e esquerdo, e uma média de quatro pessoas por unidade locativa. Mas talvez não exageremos se reputarmos um possível agravamento de 20 por cento nas condições de arrendamento de cada inquilino.
Convém ainda atentar no custo das próprias escavações, necessárias à construção de caves, quando o subsolo for rochoso ou contenha água - casos respectivamente verificados no Porto e na zona baixa de Lisboa-, como também no problema respeitante a esgotos, dado que, na maioria dos casos, teriam de ser elevados mecanicamente para atingirem os níveis dos colectores públicos.
Por outro lado, sabe-se que os princípios informativos do Decreto-Lei n.º 34472 tinham o objectivo de evitar que fossem habitadas aquelas dependências a isso não destinadas, pelo que a maioria das caves existentes, consideradas habitáveis, estão longe de satisfazer às condições julgadas indispensáveis para poderem servir de abrigo.
Trata-se, portanto e a nosso ver, de um problema extremamente grave, pelo que se entende dever ser ele revisto e estudado, antes de se legislar.
Nesta ordem de ideias, sugere-se que a base XXX seja alterada, passando a ter a seguinte redacção:
Em diploma especial, referendado pelos Ministros da Defesa Nacional, do Interior, das Obras Públicas, da Economia e das Comunicações, serão estabelecidas as normas a que deverá obedecer a localização de novos centros industriais e populacionais, e bem assim as medidas a adoptar para a criação de abrigos destinados às populações dos centros ou pontos particularmente sensíveis à vida da Nação.
III
Conclusões
A Camará Corporativa, por tudo o exposto, entende ser de aprovar a proposta de lei submetida à sua apreciação, com as alterações que sugeriu, ou seja nos termos seguintes.
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TÍTULO I
Dos princípios fundamentais
BASE I
Sem alteração.
BASE II
Sem alteração.
BASE III
Sem alteração.
TÍTULO II
Da estrutura orgânica da defesa civil
BASE IV
Sem alteração.
BASE V
Sem alteração.
BASE VI
Sem alteração.
TÍTULO III
Dos órgãos superiores de direcção e inspecção
BASE VII
Sem alteração.
BASE VIII
Sem alteração.
BASE IX
Sem alteração.
BASE x
Sem alteração.
TÍTULO IV
Dos elementos da organização nacional da defesa civil do território
SECÇÃO I
Organização territorial da defesa civil
BASE XI
1. A organização territorial tem por fim permitir a descentralização da acção do comando, designadamente nos aspectos administrativo e operacional, e deve, em principio, respeitar a divisão territorial militar e a divisão administrativa do Pais.
2. Ao território de cada região militar e de comando militar das ilhas adjacentes corresponderá, numerada pela mesma ordem, ama circunscrição da defesa civil. As circunscrições serão subdivididas em zonas distritais e estas em sectores concelhios.
3. O comandante da circunscrição regional, sempre que possível, será o comandante distrital da Legião em cuia área está localizada a sede da região ou comando militar.
BASE XII
Sem alteração.
BASE XIII
1. Os comandantes de zonas distritais e de sectores concelhios serão, respectivamente, os comandantes distritais e os comandantes locais da Legião Portuguesa, competindo-lhes, dentro da respectiva área de jurisdição, em execução de piemos preestabelecidos ou no cumprimento de ordens recebidas:
a) Orientar e coordenar a organização local da defesa ;
b) Estabelecer a articulação, conforme as circunstâncias dos meios destinados a apoios mútuos;
c) Organizar e preparar todos os meios reservados ao apoio das operações de defesa no âmbito regional ou nacional, quando Viés forem solicitados;
d) Em caso de guerra ou de grave emergência, assumir o comando operacional.
2. Em cada zona distrital funcionará uma comissão distrital de defesa civil, responsável não só pela obtenção dos recursos julgados necessários, como também pela estreita cooperação que à defesa civil interessa da parte de todos os organismos intervenientes. Desta comissão farão parte o governador civil, que presidirá, o presidente da câmara municipal da sede do distrito, o comandante distrital da Policia e outras entidades, oficiais ou particulares, cuja presença seja julgada normal ou eventualmente necessária.
Às reuniões desta comissão .poderá assistir o comandante da zona distrital, sempre que se julgue conveniente.
SECÇÃO II
Sistema de alerta e rede de observação terrestre
BASE XIV
Sem alteração.
BASE XV
Sem alteração.
SECÇÃO III
Serviços especiais de defesa civil
BASE XVI
Sem alteração.
BASE XVII
Sem alteração.
BASE XVIII
Sem alteração.
BASE XIX
Sem alteração.
BASE XX
Sem alteração.
SECÇÃO IV
Colunas móveis
BASE XXI
Sem alteração.
TÍTULO V
Da doutrinação e instrução
BASE XXII
Sem alteração.
BASE XXIII
Sem alteração.
BASE XXIV
Sem alteração.
BASE XXV
Sem alteração.
BASE XXVI
Sem alteração.
TÍTULO VI
Disposições diversas
BASE XXVII
Sem alteração.
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BASE XXVIII
A mobilização das pessoas e bens destinados u defesa civil envolverá:
a) O direito do Governo de afectar u organização nacional da defesa civil do território o pessoal abrangido pelas disposições consignadas na lei sobre obrigações gerais, recrutamento e serviço na defesa civil;
b) O direito de prioridade absoluta em relação ao uso das- comunicações de - relação, públicas ou privadas, de qualquer natureza, em proveito das missões de alerta e de observação terrestre de aeronaves inimigas. Igual prioridade poderá ser estabelecida durante os exercícios em tempo de paz, quando devidamente autorizada em Conselho de Ministros;
c) O direito do Governo de fazer abandonar pela população civil as zonas ameaçadas, retendo nelas as pessoas que ali interessar conservar;
d) As servidões a impor às instituições, organismo», estabelecimentos ou empresas públicos ou privados que particularmente interessem à organização nacional da defesa civil do território e às medidas de execução .impostas pela necessidade de protecção às populações e ao património material e moral da Nação;
e) A requisição de material, equipamento e instalações necessários.
Base XXIX
1. A organização nacional da defesa civil do território procederá, desde o tempo de paz, de acordo com a autoridade militar e sem prejuízo do direito preferencial que a esta cabe, ao recenseamento das pessoas e recursos que interessam à organização Q funcionamento da defesa civil.
2. Para o efeito do número anterior, as entidades oficiais e privadas de quem o pessoal dependa ou que usufruam os bens não poderão recusar as informações o facilidades necessárias à elaboração do mesmo recenseamento.
BASE XXX
Em diploma especial, referendado pelou Ministros da Defesa Nacional, do Interior, das Obras Públicas, da Economia e das Comunicações, serão estabelecidas as normas a que deverá obedecer a localização de novos centros industriais e populacional, e bem assim as medidas a adoptar para a criação de abrigo» destinados às populações dos centros ou pontos particularmente sensíveis à vida da Nação.
Palácio de S. Bento, 16 de Abril de 1957.
Fernando Quintanilha e Mendonça Dias.
José António da Rocha Beleza Ferraz.
Albano Rodrigues de Oliveira.
Álvaro Salvação Barreto.
Jorge Augusta da Silva Harta.
José Frederico do Casal Ribeiro Ulrich.
Vasco Lopes Alves.
Carlos Afonso de Azevedo Cruz de Chaby, relator.