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REPÚBLICA PORTUGUESA

ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 128

VII LEGISLATURA 1961 6 DE ABRIL

PARECER N.º 39/VII

Projecto de proposta de lei n.º 526/VI

Reforma da Previdência Social

A Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 105.º da Constituição, acerca do projecto de proposta de lei n.º 526, elaborado pele Governo sobre a reforma da previdência social, emite, pela sua secção de Crédito e seguiras (subsecção de Seguros), com os Dignos Procuradores, agregados, Afonso de Melo Pinto Veloso, Afonso Rodrigues Queiró, António Avelino Gonçalves, António Jorge Martins da Mota Veiga, António Sebastião Goulard, António da Silva Rego, António Vitorino França Borges, Armando Gouveia Pinto, Augusto Cancella de Abreu, Domingos Cândido Braga da Cruz, Fernando Andrade Pires de Lima, Francisco Manuel Moreno, Guilherme Braga da Cruz, João Militão Rodrigues, João Ubach Chaves, Joaquim Trigo de Negreiros, Jorge Augusto da Silva Horta, José Albino Machado Vaz, José de Almeida Ribeiro, José Augusto Vaz Pinto, José Gabriel Pinto Coelho, José de Mira Nunes Mexia, José Pires Cardoso, José Seabra Castelo Branco, Luís de Castro Saraiva, Luís Gordinho Moreira, Manuel Alberto Andrade e Sousa, Manuel Duarte Gomes da Silva, D. Maria Luísa Ressano Garcia e Pedro António Monteiro Maury, sob a presidência de S. Es." o Presidente da Câmara, o seguinte parecer:
SUMARIO

PARTE I

Apreciação na generalidade

INTRODUÇÃO

§ 1.º Objecto e alcance da proposta (n.ºs l e 2).
§ 2.º Ò relatório da proposta. Os trabalhos preparatórios (n.ºs 3
e 4).
§ 3.º Método a seguir na apreciação da proposta (n.ºs 5 a 7).

CAPITULO I

Os sistemas de protecção contra os riscos sociais no limiar da segunda guerra mundial

§ l.º Antecedentes históricos (n.º 8).
§ 2.º O seguro social obrigatório:

A) Preliminares (n.ºs 9 e 11).
B) Campo de aplicação (n.º 12).
C) Eventualidades cobertas (n.º 13).
D) Prestações (n.º 14).
E) Receitas (n.º 15).
F) Equilíbrio financeiro (n.º 16).
0) Estrutura administrativa (n.º 17).

§ 3.º A assistência social (n.ºs 18 e 21).
§ 4.º O seguro facultativo (n.ºs 22 e 28).
§ 5.º Síntese deste capitulo (n.º 24).

CAPITULO II

A política contemporânea de segurança social

§ l.º A guerra e o movimento no sentido da segurança social (n.ºs 25 a 80).
§ 2.º O conceito de segurança social (n.ºs 81 e 82).
§ 3.º Princípios fundamentais da segurança social;

A) Razão de ordem (n.º 33).
B) Campo de aplicação (n.ºs 34 a 37).
C) Eventualidades (n.ºs 38 e 39).
D) Prestações (n.ºs 40 a 44).
E) Receitas (n.ºs 45 a 48).
F) Equilíbrio financeiro (n.º 49).
G) Estruture administrativa (n.ºs 50 a 55).
H) Síntese dos princípios da segurança social (n.º 56).

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§ 4.º Segurança social e economia nacional (n.º 57):

A) Efeitos económicos da recolha de contribuições (n.ºs 58 e 59).
B) Efeitos económicos da acumulação de fundos (n.º 60).
C) Efeitos económicos da outorga das prestações (n.ºs 61 a 63).

CAPITULO III

O sistema português

§ l.º Elementos Princípios orientadores (n.ºs 64 e 65).
§ 2.º O sector da previdência social obrigatória:

A) Preliminares (n.º 66).
B) Campo de aplicação (n.ºs 67 a 70).
G) Eventualidades e prestações (n.ºs 71 a 75).
D) Receitas. Custo do sistema (n.ºs 76 a 80).
E) Equilíbrio financeiro (n.ºs 81 e 82).
F) Estrutura administrativa (n.ºs 83 e 86).

§ 3.º Os sectores da saúde e assistência (n.ºs 87 a 91).
§ 4.ª O sector do seguro facultativo (n.ºs 92 e 98).
§ 5.º A coordenação superior do sistema (n.º 94).
§ 6.º Síntese deste capítulo (n.º 95).

CAPITULO IV

A proposta de lei

§ 1.º Preliminares (n.º 96).
§ 2.º Campo de Aplicação (n.ºs 97 e 98).
§ 3.º Eventualidades (n.ºs 99 a 102).
§ 4.º Prestações (n.º 103).
§ 5.º Receitas (n.º 104).
§ 6.º Equilíbrio financeiro (n.º 105).
§ 7.º Estrutura administrativa (n.º 106).
§ 8.º Conclusões sobre a apreciação na generalidade (n.º 107).

PARTE II

Exame na especialidade

CAPITULO I

Classificação e regime geral das instituições de previdência

Base I (n.ºs 108 a 111).
Base II (n.ºs 112 a 114).
Base III (n.ºs 115 e 116).

CAPITULO II

Das caixas sindicais de previdência

Base IV (n.ºs 117 a 119).
Base V (n.º 120).
Base VI (n.º 121).
Base VII (n.º 122).
Base VII (n.º 123).
Base IX (n.º 124).
Base X (n.º 125).
Base XI (n.º 126).
Base XII (n.º 127).
Base XIII (n.º 128).
Base XIV (n.ºs 129 a 132).
Base XV (n.º 138).
Base XVI (n.º 134).
Base XVII (n.º 135).
Base XVIII (n.º 136).
Base XIX (n.º 137).

CAPITULO III

Das caixas de reforma ou de previdência

Base XX a XXIII (n.º 138).

CAPITULO IV

Disposições gerais e transitórias

Base XXIV (n.º 139).
Base XXV (n.º 140).
Base XXVI (n.º 141).
Base XXVII (n.º 142).
Base XXVIII (n.º 143).
Base XXIX (n.º 144).
Base XXX (n.º 145).
Base XXXI (n.º 146).

PARTE III

Conclusões
N.º 147
PARTE I
Apreciação na generalidade

Introdução.

§1.º

Objecto e alcance da proposta

1. É intento do Governo, segundo as palavras com que abre o relatório do projecto de proposta de lei em exame, efectuar «a remodelação da estrutura e do regime financeiro da previdência social dos trabalhadores
portugueses».
A enunciação deste, programa assinala os dois temas principais que constituem o objecto da proposta, e desde logo permite entrever a importância de que a mesma se reveste. Mas a apreensão do seu integral significado e alcance requer mais algumas explanações.

2. A reforma da estrutura do seguro social vigente - que, em síntese, se faz consistir na descentralização administrativa dos seguros a curto prazo, através de. caixas regionais, e na concentração dos seguros diferidos numa instituição nacional -, bem como a mudança- do regi-me de equilíbrio financeiro - mediante a introdução de um sistema de capitalização mitigada no financiamento das pensões -, representam meios técnicos que o Governo pretende utilizai- no conseguimento de determinados fins político-sociais, em matéria de previdência obrigatória.
Ora, são esses fins que, na realidade, exprimem o alcance da proposta, sendo certo que, para atingi-los, poder-se-ia eventualmente recorrer a processos técnicos diferentes.
Do relatório da proposta depreende-se que as finalidades em vista com as reformas sugeridas são essencialmente as seguintes:

a) Alargar o campo de aplicação do sistema de previdência - isto é, o número e o âmbito os seus beneficiários;
L) Ampliar o esquema de eventualidades cobertas - em especial com a instituição do seguro-maternidade e a protecção na tuberculose ;
c) Melhorar o nível e a eficiência dos benefícios - designadamente através do internamento hospitalar, da articulação do seguro-doença com o de invalidez e da valorização das pensões de reforma.

De todas estas finalidades, apenas a segunda aparece referida no articulado da proposta (base IV).
A explicação do facto estará, porventura, em se haver entendido constituírem matéria regulamentar as normas

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destinadas à concretização daqueles objectivos, tendo em vista o princípio consignado no artigo 92.º da Constituição, segundo o qual as leis devem restringir-se à aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos.
Deixando para outra oportunidade a apreciação deste critério, cumpre por agora salientar quanto a simples indicação de tais finalidades revela ter u proposta um alcance bem mais largo do que aquele que poderia inferir-se do seu objecto imediato.
Por outras palavras: o projecto do Governo não visa simplesmente, a remodelar certos aspectos técnicos do seguro social, mas, com base nestes, procura obter melhorias substanciais em todos os capítulos do nosso sistema de previdência obrigatória.
Deve acrescentar-se que as medidos preconizadas, embora interessando ao conjunto da organização da previdência, e, portanto, a «todos os trabalhadores portugueses», consoante se lê no preâmbulo da proposta, dizem sobretudo respeito ao sector das caixas de previdência isto é, aos trabalhadores da indústria, comércio e serviços.

§2.º

O relatório da proposta. Os trabalhos preparatórios

3. A proposta vem acompanhada de extenso e fundamentado relatório, no qual se expõem, com esclarecido critério, os princípios legais e o sentido de evolução do sistema de previdência vigente, bem como as razões justificativas das reformas apresentadas.
Representou aquele relatório valioso contributo para o estudo que à Gamara Corporativa coube realizar. De grande utilidade se mostrou igualmente a consulta dos trabalhos preparatórios da proposta, cuja elaboração foi essencialmente cometida a Direcção-Geral da Previdência e Habitações Económicas, com activa participação dos respectivos serviços actuariais.
O exame desses trabalhos (revela terem os mesmos sido precedidos de longa e fecunda actividade doutrinária por parte do Conselho Superior da Previdência Social, criado em ficas de 19461.
Elaborou o Conselho, por iniciativa própria ou a solicitação do Governo, diversos estudos de relevante interesse para o aperfeiçoamento e consolidação do sistema português de seguro social. Apreciável número deles obteve consagração legislativa2. Da execução doe respectivos diplomas se entendeu dever depender a anterior revisão global da orgânica administrativa e do regime financeiro da previdência3.
Em fins de 1952 estavam praticamente concluídos pelos serviços da referida Direcção-Geral os estudos de maior importância para a reforma em perspectiva, quer quanto ao alargamento do esquema de eventualidades - nomeadamente à maternidade e à tuberculose-, quer no tocante à remodelação da estrutura administrativa e da regime financeiro.
Mas a elaboração do projecto de diploma, de que resultou a proposta de lei em apreciação, só em 1957 veio a ultimar-se4.

1 Decreto-Lei n.º 35 896, de 8 de Outubro desse ano. Além de funções consultivas do Governo, em mataria de seguro social, ao Conselho foi atribuída competência para «promover, por iniciativa própria, o exame das questões que interessem ao aperfeiçoamento e ao desenvolvimento da organização da providência social em todos os seus aspectos e propor as providências que julgar convenientes» [decreto citado, artigo 2.º, alínea b)].
No período inicial a que nos reportamos o Conselho era presidido pelo Subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social é tinha a seguinte composição: vice-presidente, Dr. Manuel Rebelo de Andrade; vogais, director-geral da Previdência e Habitações Económicas, inspector judiciário, chefe dos serviços actuariais, inspector-chefe da previdência social, representantes das Juntas Centrais das Casas do Povo e doa Casas dos Pescadores e cinco pessoas de reconhecida competência nas matarias do previdência social (decreto citado, artigo 3.º). O Conselho foi recentemente reorganizado pelo Decreto-Lei n.º 43 183, do 23 de Setembro de 1960, passando a denominar-se Conselho Superior da Previdência o da Habitação Económica.
2 Referem-se, entre outros, os seguintes diplomas: Decreto-Lei n.º 37 426, de 23 de Maio de 1949 (regime de transferências e seguro continuado); Decreto n.º 37 739, de 20 de Janeiro de 1950 (reorganização ao Fundo Nacional do Abono de Família); Decreto n.º 37 749, de 2 de Fevereiro do mesmo amo (remodelação do regime do subsidio por morto); Decreto-Lei n.º 37 750 e Decreto n.º 37 751, de 4 do mesmo mês e ano (reorganização das Casas dos Pescadores); Decreto n.º 37 762, de 34 de Fevereiro desse ano (remodelação do regime da seguro-doença).
3 Em Janeiro de 1051 o vice-presidente do Conselho Superior da Previdência apresentou ao Ministro das Corporações algumas dúvidas s sugestões quanto à orientação a seguir na revisão dos problemas do nosso seguro social. Aí se focavam, entre outros, os aspectos referentes aos métodoss de financiamento (sugerindo-se uma fórmula que já se aproximava da contida na actual proposta de lei), à inscrição dos trabalhadores independentes, ao esquema de eventualidades e benefícios (alvitrando-se o alargamento à doença prolongada e a tuberculoso) e a estrutura administrativa (propondo-se já nesse momento a separação entre os seguros a longo prazo e os de curto prazo, assim como a centralização dos primeiros numa caixa nacional e st descentralização dos segundos em caixas regionais e de empresa).
Por um discurso do então Ministro das Corporações, com data de 4 de fevereiro de 1052 (publicado no Diário das Sessões n.º 223, ano de 1953; pp. 997 e seguintes, em anexo I à resposta ao aviso prévio do Sr. Deputado Manuel Cerqueira Gomes), depreende-se que em fins daquele ano de 1951 fora constituída, «com carácter particular», uma comissão destinada a examinar «alguns aspectos fundamentais da previdência social». Acrescentava-se, porém, que ata & dato do discurso «nenhuma reunião se fez a convite dos membros da comissão», e que em Agosto de 1952 se nomeara outra comissão (esta com carácter oficial), a qual apresentou a primeira parte dos seus trabalhos.
4 Posteriormente à apresentação da proposta (28 de Maio do 1057), tem o Ministério das Corporações e Previdência Social publicado numerosos diplomas sobre previdência social, os quais, sem prejudicar o conteúdo daquela proposta, documentam assinalado esforço no sentido do desenvolvimento do sistema português de seguro obrigatório. À lista dos mais importantes á a seguinte: Decreto-Lei n.0 41 286, de 28 de Setembro de 1957 (regula a constituição, atribuições e funcionamento das Federações de Casas do Povo); Decreto-Lei n.º 41 595, de 23 de Abril do 1958 (inclui no esquema normal de prestações do seguro-doença das caixas sindicais e das caixas de reforma ou de previdência o internamento hospitalar para cirurgia geral) ; Decreto-Lei n.º 41677, de 14 de Junho de 1958 (aprova, para ratificação, a convenção geral entre Portugal e a França sobre segurança social) ; Decreto-Lei n.º 41 890, de 30 de Setembro de 1958 (torna extensivo ao provimento dos cargos de presidentes da direcção das caixas sindicais e das caixas de previdência com entidades patronais contribuintes o disposto no Decreto-Lei n.º 37 743, de 23 de Janeiro de 1960; Portaria n.º 17 118, de 11 de Abril do 1959 (aprova as normas da Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais) ; Portaria n.º 17 068, do 11 do Abril de 1960 (prorroga por um ano a Campanha referida na Portaria n.º 17 118) ; Decreto-Lei n.º 43 183, de 23 de Setembro' de 1960 (reorganiza o Conselho Superior da Previdência Social, que passa a denominar-se Conselho Superior da Previdência é da Habitação Económica) ; Decreto-Lei n.º 43 184, dai mesma dato. (altera o regime do abono de família para os trabalhadores por conta de outrem); Decreto-Lei n.º 43 186, da mesma data (regula as condições em que as instituições de previdência podem afectar os seus capitais a concessão de empréstimos aos beneficiários ou sócios para construção ou aquisição de habitações próprias); Decreto-Lei n.º 43 187, da mesma data (altera o regime legal sobre alienação, troca ou oneração dos valores das instituições do previdência); Decreto n.º 43 189, da mesma data (aprova a tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho o doenças profissionais); Portaria n.º 17 963, da mesma data (regula u concessão do subsídios de casamento, nascimento o aleitação aos beneficiários das caixas do abono de família e dag caixas de previdência com abono integrado); Portaria n.º 17 964, da mesma data (amplia o esquema da assistência farmacêutica pela Federação de Caixas de Previdência - Serviços Médico-Sociais); Portaria n.º 17 965. da mesma data (fixa o quantitativo das pensões mínimos de velhice a pagar pelas caixas sindicais e pelas caixas de reforma e de previdência) ; Portaria n.º 17 966, da mesma data (torna extensiva aos reformados, por invalidez ou velhice, dos caixas sindicais e das caixas de reforma e previdência, a assistência médica e medicamentosa assegurada aos restantes beneficiários); Portaria n.º 17 967, da mesma data (manda constituir a Federação de Caixas de Previdência - Obras Sociais)....

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4. Não se estranhe ter a proposta sido precedida de tão dilatada preparação.
A previdência constitui, sem dúvida, o sector mais melindroso e complexo de toda a legislação social. As suas técnicas não têm longas tradições em nenhum país e continuam, hoje ainda, a alimentar divergências e dúvidas entre os especialistas.
E, para além das técnicas, põem-se graves problemas de natureza ética, política, económica e social, que o ordenamento da previdência sobretudo quando visto à luz das modernas concepções de segurança social - necessariamente suscita.
Compreende-se assim que a revisão de um sistema de seguro social seja, em nossos dias e em qualquer país, tarefa de extrema complexidade e, por isso mesmo, de longa gestação. Haja em vista, por exemplo, os casos da Inglaterra e da Suécia. Naquela, as propostas apresentadas em 1942 no relatório Beveridge somente em 1945 começaram a converter-se, com diversos modificações, em diplomas legislativos, cuja publicação se escalonou até 1948. Na Suécia, a recente reforma do sistema nacional de pensões (portanto de âmbito restrito) levou nada menos de onze anos a estudar e a submeter ao referendo5.
A demorada elaboração da proposta de lei sujeita ao exame da Câmara Corporativa revela, pois, além do mais, o cuidado e a ponderação que o Governo pôs na sua feitura.
Já, todavia, pode parecer susceptível de reparo que, muito embora o Governo tenha dado ampla divulgação à proposta6 e haja decorrido longo tempo sobre a data da sua apresentação, poucas ou nenhumas observações ou alvitres, dignos desse nome, chegassem, entretanto, a esta Câmara ou viessem à luz da publicidade.
Também esta atitude não deve causar admiração. Afirmou-se, com inegável procedência, que se «toda a gente fala da previdência social com a mesma desenvoltura com que trata de outros graves problemas da vida social, . .º. poucos são ainda os que se debruçaram sobre ela para poderem equacionar os problemas ... Quando se procura a razão da queixa e o processo de resolução ficam silenciosos ou tentam uma vaga explicação»7.
Acrescente-se não ser o facto privativo do nosso país. O carácter acentuadamente técnico de que em regra se revestem os estudos sobre seguro social, não obstante as suas incidências profundamente «humanas», explica que, cada vez mais, em toda a parte, semelhantes estudos tendam a ficar relegados aos especialistas.
Nota, com razão, Lucas Beltrán que só excepcional, mente algum autor, como Beveridge, consegue fazer vibrar a opinião pública com os seus trabalhos nessa matéria8.
§ 3.º

Método a seguir na apreciação da proposta

5. A necessidade e oportunidade das reformas preconizadas na proposta vêm amplamente justificadas no relatório ministerial.
Aí se põem em foco, com base em abundantes elementos de facto revelados pela experiência, os inconvenientes do sistema actual, seja no aspecto das limitações do esquema de eventualidades e benefícios, seja no tocante à complexidade da orgânica administrativa, seja ainda na rigidez dos métodos de financiamento, impeditivos de melhorias nas prestações, sobretudo nos seguros a longo prazo.
Poderia a Câmara Corporativa limitar-se a apreciar a proposta em idêntico plano - verificando a procedência dos inconvenientes apontados e examinando depois a aptidão e suficiência das medidas propostas para ocorrer a tais inconvenientes.
Em suma, poderia a Câmara efectuar o seu estudo exclusivamente à luz da experiência nacional do funcionamento do sistema, isto é, das circunstâncias de ordem interna que; ao cabo de 25 anos, tornam necessária uma reforma da previdência social.
Sucede, porém, que este quarto de século não foi um período qualquer da existência dos povos. Durante ele, assistiu a humanidade a um dos maiores cataclismos da história, gerador de extensas e profundas transformações em todos os sectores da vida.
Nos domínios económico e social, as estruturas nacionais - não apenas dos países que intervieram no conflito, mas, por inevitável contágio, de todos os mais - sofreram o impacto da humana reacção contra as misérias e sofrimentos causados pela guerra.
O traço mais saliente dessa reacção, no aspecto económico, foi, sem dúvida, a tendência generalizada para a intensificação dos ritmos de crescimento. Semelhante política mostrou-se decisivamente favorecida pelos progressos espectaculares das técnicas da produção e dos transportes, e pela descoberta de uma nova fonte de energia - a energia nuclear.
Por seu turno, no terreno social, ao acréscimo da produtividade e das riquezas e à recordação das privações e angústias do tempo da guerra, correspondeu uma fortíssima aspiração de melhoria do nível de vida das populações, essencialmente através de duas ordens de medidas:

a) A distribuição equitativa dos resultados da produção, de modo a fazer deles participar, em maior proporção, as camadas sociais mais desfavorecidas;
b) A protecção eficaz contra as eventualidades susceptíveis de pôr em risco a vida e a conservação dos meios de existência.

Os progressos da industrialização e o fenómeno da concentração das instalações fabris perto dos grandes centros, provocando a criação de um crescente proletariado urbano e a dispersão das famílias, contribuíram para tornar particularmente sentida por essas camadas sociais a necessidade de protecção económica contra as contingências da vida. A relativa estabilidade oferecida pelo meio familiar e pelas comunidades rurais substitui-se a insegurança do meio industrial, em que o operário para viver depende exclusivamente do seu braço e do seu salário.
Mas o problema da insegurança da vida e dos meios de existência, no mundo de hoje, não é de modo nenhum privativo do trabalhador subordinado. O pequeno proprietário ou explorador rural, o artífice, o modesto capitalista, comerciante ou industrial, o profissional livre, o artista - e até as pessoas que conseguiram alcançar fortuna - estão igualmente sob a ameaça da instabilidade dos condições económicas, gerais, da incerteza sobre o futuro valor das suas poupanças, dos próprios riscos que para a vida humana representam certas formas do progresso técnico. Ninguém
5 Ver, a este respeito, Bureau International du Travail, Informations sociales, 15 de Março de 1958, pp. 250 e 251.
6 Recorda-se que na altura da publicação da proposta o Ministro das Corporações tomou a iniciativa, da promover várias reuniões com dirigentes comparativos e representantes da imprensa e da rádio, durante os quais foi lido e apreciado o (relatório da proposta (ver Ministério dos Comparações e Previdência Social, Reforma da Previdência Social, edição da Junta da Acção Social, p.p. 21 e seguintes).
7 Discurso do Ministro das Corporações e Previdência Social, no Diário das Sessões, citado, p. 997, col. 2.º
8 Lucas Beltrán, in Moneda y crédito, Madrid, Março de 1959, p. 122.

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pode, nas condições actuais da existência, considerar-se economicamente imune contra as contingências do futuro.
Em especial, no aspecto das eventualidades capazes de pôr em risco a vida e a integridade física - por outras palavras, no capítulo da defesa da saúde - o extraordinário encarecimento dos meios de combate à doença, com as novas técnicas de diagnóstico e terapêutica, constitui, por si só, factor importantíssimo de insegurança económica, pois a generalidade das- pessoas não pode, hoje em dia, suportar, ao menos sem penoso sacrifício dos seus meios de subsistência, as despesas de uma doença grave ou prolongada.
Assim se compreende que, em nenhuma época como a presente, as aspirações de segurança social se manifestem por forma tão intensa e, sobretudo, tão universalmente sentida.
Como disse Walter Eucken, «a exigência de segurança é um problema universal. Em cada época a insegurança revela-se de maneira distinta. Mas, hoje, a necessidade de segurança cresceu em medida desconhecida até agora na história. E é problema que não afecta esta ou aquela camada social, mas sim todos os grupos, simultânea ou alternadamente, interessando em maior ou menor, escala a toda a gente».
Pode acrescentar-se - reproduzindo afirmações do bispo de Bérgamo ao encerrar a XXIII Semana Social dos Católicos Italianos - que o sentido da história se desenvolve na direcção da segurança social e que será inútil qualquer oposição ao gradual reconhecimento do direito que todos têm de ver garantido o necessário para que a sua vida exterior seja conforme à sua dignidade interior9.
6. Cabe agora perguntar: porquê estas reflexões sobre o fenómeno da segurança social a propósito do método a seguir na apreciação da proposta de lei em causa?
A resposta é simples. Aquele fenómeno deu lugar, na generalidade dos países, a novas concepções em matéria de protecção contra os ruços específicos da vida social -, que não podem ignorar-se ou esquecer-se ao estudar os problemas suscitados pela revisão de um dos sectores directamente responsáveis por essa protecção.
Assim, para além do exame da proposta sob o ângulo restrito do condicionalismo de ordem interna que porventura a justifica, importa verificar em que medida a forte corrente, que hoje em dia agita as políticas nacionais no sentido da «segurança social», eventualmente aconselha a revisão dos métodos e finalidades que informam a proposta do Governo.
O relatório ministerial, embora reconhecendo os perigos inerentes aos sistemas de segurança social integral (n.º 75), considerou «dispensável» mais larga referência ao movimento internacional da segurança social (n.º 77).
Não o entende assim esta Câmara, e antes crê haver todo o interesse - sem embargo de as dificuldades da sua tarefa se verem assim extremamente acrescidas - em que a proposta seja também examinada à luz dos modernos conceitos da segurança social, sem dúvida um dos grandes imperativos do nosso tempo, a cuja força actuante não podem furtar-se as políticas nacionais, e, portanto, também a do Estado Português.
Isto, evidentemente, sem perder de vista o» princípios ético-políticos que orientam o nosso sistema, bem como as possibilidades do País.
Já em Fevereiro de 1946 o Presidente do Conselho afirmava:

A política social que nos surge como marca inconfundível da época presente postula melhor aproveitamento e mais justa distribuição das riquezas, e nem um nem outra serão possíveis sem sujeição a planos, que em muitos casos transcenderão o nacional para se situarem no domínio mundial 10.

7. A conveniência de integrar o estudo da proposta no quadro mais vasto que acaba de delinear-se impõe determinada razão de ordem na sequência deste parecer.
Assim, num primeiro capítulo serão expostos, sucintamente, os sistemas de protecção contra os riscos sociais no limiar da segunda guerra mundial, que constituíram os antecedentes da política contemporânea de segurança social.
A explanação das linhas gerais desta política e dos princípios basilares que a informam será dedicado o capítulo seguinte.
Num terceiro capítulo far-se-á breve análise e apreciação do sistema português.
Por último, à luz do resultado desses estudos, será então possível abordar, num quarto capítulo, os problemas de carácter geral suscitados pela proposta de lei.

CAPITULO I

Os sistemas de protecção contra os riscos sociais no limiar da segunda guerra mundial.

§ 1.º

Antecedentes históricos

8. A acção, individual ou colectiva, no sentido de ocorrer as consequências dos riscos sociais - a doença, a invalidez, a velhice, a morte e tantos outros - é de todos os tempos.
O espírito de caridade e de solidariedade humana - que o cristianismo elevou a regra fundamental da vida - e, por outro lado, o instinto natural de previsão, desde sempre conduziram os homens, os grupos e o próprio Estado a- procurarem meios de protecção contra as vicissitudes da existência.
A beneficência, o socorro mútuo, a poupança privada, a assistência pública, representam as formas atra-
9 W. Encken, Fundamentou de Política Económica, tradução espanhola, Madrid, 1956, p. 444; S. E. Revma. Mons. Adriano Bernareggi, «Cristianesimo Sociale», Discorso di Chiusura, in Atti della XXIII Settimana sociale dei cattolici italiani, Bologna, 1949, pp. 243-244. No mesmo sentido: W. Bõpke, l'economie mondiale aux XIXª et XXº siècles, Genève, 1959, pp. 11 e seguintes; o Bureau International du Travail, L'OIT face à l'évolution du monde, Rapport du directeur général à la 42ème session de la Conférence Internationale du Travail, Genève, 1958, p. 72. Cf. infra, n.ºs 34 e seguintes.
10 Salazar, Discursos e Notas Políticas, vol. IV, p. 206. Dois anos antes -Maio de 1944- dissera: «Parece-me seguro que na resolução de muitos problemas que interessam à vida de cada nação se hão-de fazer sentir as ideias dominantes e as realidades, sobretudo económicas e sociais, que a guerra revelar e a paz confirmará. A interdependência doe povos e o peso das grandes economias nacionais já no passado vedavam a muitos deles a pretensão de ama diaba autónoma de só conduzir a moagem das ideias e dos processos correntes. Assim será mais acentuadamente amanhã, se à colaboração espontânea nascida do jogo dos simples interesses particulares acrescer uma fórmula qualquer de mais estreito entendimento ou cooperação no estudo e satisfação das necessidades do Mundo». (Discursos, IV, p. 56).
E em Dezembro de 11056 reafirmava o mesmo pensamento: «O período que aí vem passar-se-á sob o signo do económico e do social - isto é, vai assistir-se a um esforço gigantesco porá o desenvolvimento e criação de inovas riquezas e em esforço igualmente serio para uma distribuição equitativa» (vol. V, p. 521)

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vés das quais, ao longo da história, se foi dando realização prática a esse mesmo anseio que, em nossos dias, inspira a política de e segurança social» - expressão nova de um velho ideal.
Durante séculos, esses processos de auxílio ou prevenção foram valendo aos males e insuficiências dos indivíduos. Mas a situação modificou-se, rápida e profundamente, com o advento do industrialismo e do capitalismo liberal, no decurso do século XIX.
As condições de existência da nova classe operária, que ia absorvendo camadas cada vez mais extensas da população, a frequência das crises económicas e tecnológicas, que lançavam milhares de famílias no desemprego e na miséria, o aumento generalizado dos acidentes e da morbilidade, por efeito das más condições de higiene e segurança do trabalho, da alimentação insuficiente, da habitação indigna de seres humanos - tudo isso evidenciou, então, a insuficiência das formas tradicionais de auxílio para combater esses males.
O próprio erário público não dispunha, na generalidade dos países, de recursos para dotar suficientemente as verbas da assistência oficial.
O Estado viu-se assim obrigado a intervir por outros meios. O primeiro de que lançou mão foi o da afirmação legal do principia da responsabilidade patronal, para o caso dos acidentes de trabalho e das doenças, profissionais.
For outro lado, ao movimento associativo das classes trabalhadoras correspondeu uma expansão do mutualismo na protecção contra os riscos sociais.
As associações operárias de socorros mútuos revelaram-se, no entanto, impotentes para resolver satisfatoriamente as situações de carência que se deparavam aos trabalhadores e suas famílias. Em primeiro lugar, os sócios eram quase sempre uma minoria em relação ao número total de assalariados. Depois, o equilíbrio financeiro das associações não assentava, regra geral, em bases técnicas e, ao cabo de algum tempo, por virtude do acréscimo de encargos, a maior parte delas via-se impossibilitada, de solver os seus compromissos.
Em contrapartida, tais associações tiveram o enorme mérito de introduzir dois princípios fundamentais que, mais tarde, haveriam de estar na base do seguro social. O primeiro foi o da necessidade de intervir antes da verificação dos riscos, criando os meios necessários para lhes fazer face - ao contrário do espírito de reparação que inspirava a beneficência e a assistência. O segundo consistiu na apreciação objectiva dos factos que condicionavam a concessão dos socorros, instituindo a certeza de um direito, e não apenas uma mera expectativa sujeita a avaliações discricionárias 11.
Apesar das suas deficiências iniciais, o movimento mutualista foi subsistindo, alargou-se mesmo a outros classes da população, e adquiriu estabilidade no aspecto financeiro quando passou a trabalhar de acordo com as técnicas do seguro, mediante o recurso à ciência actuarial (seguro social facultativo).
Não conseguiu, porém, salvo raras excepções, superar a sua primeira fraqueza - a da reduzida proporção dos associados relativamente à população total e mesmo ao conjunto da classe trabalhadora.
Tal circunstância, aliada ao propósito de aliviar o erário público dos encargos crescentes com a assistência, levou o Estado a adoptar uma segunda ordem de medidas neste campo - compelindo ao seguro certas classes da população para determinadas eventualidades.
Assim surgiu o seguro social obrigatório, que havia de constituir, até nossos dias, a forma mais eficiente e generalizada de defesa contra os riscos sociais 12.

§ 2.º

O seguro social obrigatório

A) Preliminares

9. O seguro social obrigatório utiliza fundamentalmente as técnicas do seguro privado: predeterminação dos riscos e das prestações, adequação das receitas aos encargos segundo as regras do cálculo actuarial, reconhecimento do direito aos benefícios verificadas as condições previstas, independentemente da situação económica do segurado.
Distingue-se do seguro contratual principalmente em não fazer variar o prémio (contribuição) consoante a avaliação individual do risco, pois a extensão do sistema a largas camadas da população, isto é, a própria natureza social do seguro, permite compensar entre si os riscos desfavoráveis e favoráveis e, assim, tipicizar as contribuições de modo genérico para todos os sujeitos à obrigação do seguro.
Os primeiros seguros sociais obrigatórios foram, como é sabido, instituídos na Alemanha, de 1883 a 1889. Apesar das condições particularmente favoráveis que entoo reunia este país - designadamente a prosperidade da sua economia e a rede excepcional de- associações de socorros mútuos, na sua maioria de base corporativa -, deve-se à férrea energia do chanceler Bismarck a determinação de instaurar com carácter obrigatório regimes de seguro colectivo contra os riscos sociais.
Abrangiam tais regimes, inicialmente, a doença, os acidentes de trabalho, a invalidez e a velhice. No que se refere aos beneficiários, eram restritos aos trabalhadores da indústria. Mais tarde, em 1911, foi criado o seguro por morte e codificada a legislação alemã sobre seguros sociais.
Nesse ano- de 1911, um outro país - a Inglaterra - introduziu o seguro contra o desemprego, para certo número de ramos industriais. Foi o segunde passo decisivo na história do seguro social obrigatório.
De então até ao limiar da segunda guerra mundial não mais cessaram de expandir-se, na generalidade dos países com certo grau de desenvolvimento económico e social, os regimes de previdência obrigatória, principalmente sob a influência do modelo germânico.
As diversidades nacionais traduziam-se, não tanto nos princípios e processos técnicos, em que se verificava apreciável unidade, mas Antes nos tipos de eventualidades cobertas, no âmbito dos beneficiários e no nível das prestações. Para essas diversidades contribuíam factores próprios de cada país - maxime o volume do rendimento nacional, a estrutura da economia predominantemente industrial ou agrícola, o desenvolvimento do sindicalismo, bem como as tradições históricas e os princípios ético-políticos dominantes 13.

10. No campo internacional, iniciou-se, a partir de 1919, uma actividade sistemática com vista à progres-

11 Ver, a este respeito, Augusto Venturi, I fondamenti soientifici della sicurezza sociale, Milano, 1954, pp. 54 e 55.
12 Sobre todo este número podem consultar-se: Paul Duraud, La politique contemporaine de sécurité sociale, Paris, Dalloz, 1953, pp. 31 e seguintes; J. Doublet et G. Lavau, Sécurité sociale, Paris, Presses Universitaires de France, 1955, pp. 15 e seguintes; A. Venturi, ob. cit., pp. 1-78.
13 A. Venturi, ob. cit., pp. 79-101; Carl A. Farman, «Le développement dans le monde des prestations de sécurité sociale», in Bulletin de l'Association Internationale da la Sécurité Sociale, Novembro de 1956, pp. 467 e seguintes.

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siva melhoria das condições de vida e de trabalho das classes operárias, na qual vieram naturalmente a incluir-se as questões ligadas ao seguro social.
Coube semelhante missão à Organização Internacional do Trabalho, criada pelo Tratado de Versalhes.
Nas suas sessões de 1921, 1925, 1927, 1933, 1934 e 1935, a assembleia .dos países membros daquela Organização - a Conferência Internacional do Trabalho - aprovou cinco convenções e quatro recomendações sobre reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais (com base no princípio da responsabilidade patronal), assim como doze convenções e oito recomendações em matéria de seguros sociais obrigatórios - na doença, invalidez, velhice, morte e desemprego -, para os assalariados da agricultura, indústria e- comércio, e ainda para os profissionais livres e trabalhadores domiciliários e do serviço doméstico 14.
A influência que estes instrumentos internacionais exerceram no progresso das legislações positivas sobre seguro social foi, sem dúvida, relevante, quer nos países que ratificaram uma ou mais dessas convenções, quer mesmo nos restantes.

11. Na expansão do seguro social cumpre também não esquecer a influência da doutrina social católica, em especial da contida sobre a matéria nas encíclicas Rerum Novarum (1891), de Leão XIII, e Divini Redemptoris (1937), de Pio XII.
Na primeira, o Santo Padre aponta a necessidade de "prover de modo especial, a que em nenhum tempo falte trabalho ao operário; e que haja um fundo de reserva destinado a fazer face não sómente aos acidentes súbitos e fortuitos, inseparáveis do trabalho industrial, mas ainda à doença, à velhice e aos reveses da fortuna" 15.
Na Divini Redemptoris, Pio XII fala da necessidade, para assegurar a justiça social, de criar "instituições de seguros públicos ou privados para o tempo da velhice, da doença e do desemprego". E na alocução de 13 de Junho de 1943 aos trabalhadores, sobre a questão social, afirma ser "dever do Estado promover o bem comum com instituições sociais, tais como as sociedades de seguros e previdência social" 16.
Também o Código Social de Malines, no seu artigo 137.º, alínea 6), reconhece: "O regime legal dos seguros sociais tende a implantar-se. E necessário que ele se generalize ..." 17.

B) Campo de aplicação

12. O processo histórico que conduziu à instauração do seguro social obrigatório fez com que a generalidade das legislações, no limiar da última guerra, considerassem como sujeito, por natureza, da obrigação do seguro o trabalhador subordinado, isto é, o trabalhador por conta de outrem.
Dentro dessa qualificação geral, os trabalhadores da indústria foram a categoria desde início abrangida pelo seguro e, por isso, a que sempre manteve, em todos os países, mais larga proporção de beneficiários.
Seguiram-se-lhes os empregados dos serviços públicos e do comércio.
Relativamente aos trabalhadores da agricultura, a penetração do seguro social foi muito mais lenta, por várias razões. Primeiro, porque se entendeu estarem porventura menos sujeitos a determinados riscos - v. g:, o desemprego (salvo o sazonal), os acidentes, as doenças profissionais. Segundo, porque se confiava na protecção contra a falta de meios de existência que, de modo geral, proporcionavam as tradições comunitárias e a maior estreiteza dos laços familiares nos meios rurais. Enfim, porque as formas dominantes da relação de trabalho e a estrutura rudimentar das empresas agrícolas tornavam assaz difícil a cobrança de contribuições devidas pelos patrões e pelos trabalhadores, em razão da variabilidade dos períodos de trabalho prestado.
A estas razões podia acrescentar-se a escassa resistência económica da maioria das explorações agrícolas para suportarem contribuições que abrangessem todos ou mesmo parte dos ramos do seguro obrigatório.
Tais fundamentos explicam que, em 1939, a quase totalidade dos sistemas nacionais não incluísse no seu âmbito os trabalhadores agrícolas.
As dificuldades de inscrição dos trabalhadores domiciliários, e bem assim dos ocasionais, quer por não fazerem parte, em princípio, dos quadros das empresas, quer pela instabilidade dos períodos de ocupação, conduziram igualmente a excluir .uns e outros da tutela do seguro.
Não menos importante era o problema dos trabalhadores independentes (artífices, profissionais livres, pequenos proprietários ou exploradores agrícolas, pequenos comerciantes e industriais, etc.). A natureza da relação jurídica, considerando-os estranhos à categoria de trabalhadores subordinados, implicou, por via de regra, o seu afastamento do seguro social nas legislações anteriores à guerra, não obstante se reconhecer que, na maioria dos casos, as condições económicas e sociais daqueles trabalhadores eram idênticas, se não piores, dado o baixo nível e a instabilidade dos seus rendimentos, do que as dos empregados e operários. Mas as dificuldades encontradas em efectivar a respectiva contribuição para o seguro, agravadas pelo facto de na falta de auxílio do Estado, os independentes terem de suportar a totalidade da contribuição, levaram a maioria das legislações a mante-los fora do âmbito do seguro social.
O critério das possibilidades económicas implicava ainda - em cerca de uma quarta parte dos sistemas nacionais por alturas da guerra - a exclusão dos trabalhadores subordinados com remunerações superiores a determinadas importâncias.
A razão do facto estava em se considerar que a obrigação do seguro só se justificava relativamente aos trabalhadores mais modestos, presumindo-se que os restantes tinham possibilidade de por seus próprios meios, prover à cobertura dos riscos sociais 18.

14 São as seguintes as convenções referidas no texto: n.º 12 (reparação dos acidentes de trabalho na agricultura, adoptada na sessão de 1921; n.ºs 17 (reparação dos acidentes de trabalho), 18 (doenças profissionais) e 19 (igualdade de tratamento nos acidentes de trabalho), adoptadas em 1925; n.ºs 24 (seguro doença na indústria) e 25 (seguro doença na agricultura), adoptadas em 1027; n.ºs 35 a 40 (seguros velhice, invalidez e morte, na agricultura, indústria, comércio, profissões livres, trabalhadores domiciliários e domésticos), adoptadas em 1933; n.ºs 42 (doenças profissionais-revisão) e 44 (seguro-desemprego), adoptadas em 1934; e n.º 48 (conservação de direitos às pensões pelos migrantes), aprovada em 1935. Ver Conférence Internationale du Travai], Conventions et recommendations, B. I. T., Genève, 1949.
15 Leão XIII, Rerum Novarum, ed. União Gráfica, Lisboa, 1945, p. 57.
16 "Divini Redemptoris", in A Igreja e a Questão Social, 3.ª edição, União Gráfica, Lisboa, 1945, p. 227; Encycliques et Messages Sociaux, Textes choisis et préface par Henri Guitton. Paris, Dalloz, 1948, p. 224.
17 Código Social de Malinfís, pelo Cardeal Mercier. tradução de Silva ï)ias, Pró Domo, Lisboa, 1945, p. 105.
18 Sobre a matéria deste número veja-se: A. Venturi, ob. cit., pp. 165 e seguintes; P. Durand, ob. cit., pp. 54 e seguintes.

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C) Eventualidades cobertas

13. 1) A eventualidade - ou risco social 19 - de acidente de trabalho foi a primeira a ser objecto de seguro e a mais difundida nas legislações. Em 1939, nada menos de 58 países possuíam regimes ida protecção contra aquele risco. Muitos mantinham ainda o primitivo sistema da responsabilidade patronal,, embora prevendo a transferência - facultativa em alguns deles, obrigatória ma maioria - para entidades seguradoras de carácter privado (empresas de fins lucrativos, mútuas, etc.) admitidas a tomar esse seguro.
Era, porém, nítida, já então, a tendência para integrar aquele risco no regime próprio dos seguros sociais.
2) O seguro contra as doenças profissionais representou o lógico complemento da defesa contra os sinistros no trabalho, mas a sua introdução foi posterior.
3) No capítulo dos riscos profissionais, o desemprego involuntário, nas suas várias modalidades (friccionai, tecnológico, sazonal), foi dos últimos a ser objecto de seguro social e o que menos se generalizou. Em 1940 apenas 21 países tinham legislação que abrangia esse risco, e em 7 deles o regime era o de seguro facultativo subsidiado pelo Estado.
4) Dos riscos não profissionais, a doença é certamente o de mais fundas e extensas repercussões, quer pelo seu objecto específico - ameaça contra a vida e a integridade física -, quer pelas consequências económicas, quer ainda pela sua frequência.
Por isso, o seguro-doença foi o primeiro ramo organizado em bases técnicas a estender-se à generalidade dos países. De início restrito à indemnização pecuniária pela perda do salário, foi-se pouco a pouco alargando às próprias prestações sanitárias, tendo em vista reduzir, na medida do possível, os encargos do seguro com os subsídios em dinheiro.
O seguro-doença incluía normalmente todas as formas ou estados mórbidos, excepto os provenientes de acidente de trabalho e moléstia profissional, cuja protecção cabia ao respectivo sector. É excepcional o caso de se criar um ramo de seguro para determinada doença, como sucedeu em Itália com a tuberculose.
5) O seguro-maternidade abrange as consequências da gravidez, parto e puerpério, pressupondo a existência de normas de protecção do trabalho feminino, designadamente .quanto à dispensa do serviço durante certo período, antes e depois do parto.
Na maior parte das legislações, o seguro-maternidade ligou-se ao de doença, dadas as suas afinidades técnicas, sobretudo no aspecto das prestações.
6) Ao passo que os riscos ate agora enunciados têm, em princípio, consequências de duração temporária, a invalidez representa um estado de incapacidade permanente, embora porventura não definitivo.
Na generalidade dos regimes de seguro social, o conceito de invalidez indemnizável reportou-se, não à simples perda da integridade física ou mental, nem à impossibilidade de exercício da profissão ocupada no momento da verificação do risco, mas à incapacidade genérica para desempenhar qualquer actividade profissional correspondente às aptidões do segurado (elemento qualitativo), considerando-se em estado de invalidez se essa capacidade genérica ficou reduzida de metade, para algumas legislações, ou de dois terços para outras (elemento quantitativo). Estas percentagens referem-se, em princípio, à remuneração normal de um trabalhador da categoria profissional a que o segurado pertencia.
7) No que respeita à velhice, o seguro visou, não a reconhecer direito ao repouso, como já se tem sustentado, mas a compensar a redução ou perda da capacidade de ganho resultantes da idade.
É óbvio que tal redução ou perda não se verifica, para todas as pessoas, no mesmo momento. Mas os inconvenientes práticos de fazer depender a determinação desse risco, em relação à totalidade dos trabalhadores idosos, da avaliação do grau de incapacidade - problema que o seguro invalidez não pode evitar, mas que no caso da velhice seria de solução prática incomportável- fizeram com que todas as legislações fixassem um limite de idade, a partir do qual a incapacidade se presume.
Na fixação deste limite, a maior parte dos sistemas legislativos adoptava os 65 anos para os homens e os 60 anos para as mulheres. Alguns países estabeleciam idades mais elevadas - 67 e 70 anos para os homens, 62 e 65 anos para as mulheres.
Em nenhum país o limite de idade implicava, porém, a reforma compulsiva, salvo para os funcionários públicos.
8) O seguro por morte tem por fim ocorrer às consequências de ordem económica que o falecimento do chefe de família acarreta para as pessoas que vivam a seu cargo e estejam nas condições previstas na lei.
Aquelas consequências são de dupla natureza: por um lado, acarretam um dano emergente, constituído pelas despesas imediatamente ocasionadas pelo falecimento, e, por outro, um lucro cessante, representado pela perda de rendimentos que a morte do segurado determina para os seus familiares.
9) Por último, os encargos de família (casamento; nascimento, sustento e educação dos filhos) - considerados como eventualidade generalizada que afecta os meios de existência e é, portanto, susceptível de se acomodar à mecânica do seguro social- foram, na ordem cronológica, o último ramo deste seguro a ser incluído nos sistemas nacionais.
Em 1939, apenas quatro países possuíam um regime legal genérico de concessão de abonos de família: a Bélgica, a França, a Espanha e a Nova Zelândia 20.

D) Prestações

14. Relativamente aos benefícios, concedidos quando da verificação dos riscos sociais, o exame do direito comparado anterior à guerra pode reduzir-se aos seguintes pontos: natureza das prestações, método da sua determinação, condições de outorga, possibilidade de revisão de prestações subjectivadas.
1) Quanto à natureza das prestações, é próprio do seguro que estas consistam essencialmente em dinheiro (prestações pecuniárias ou económicas) para todos os riscos.

19 Acerca dos conceitos de "risco social" e "encargo social" consultem-se: P. Durand, ob. cit., pp. 14-16; Doublet et Lavau, ob. cit., p. 11.
A expressão "rosco social" (parece poder ser entendida - e coimo tal é empregada no texto - em sentido suficientemente amplo de modo a abarcar todas as eventualidades ou contingências especificas da vida social capazes de afectar a saúde e a suficiência dos meios de existência e, portanto, também os chamados "encargos sociais", como, por exemplo, os encargos familiares. A expressão "encargos sociais" não tem significado unívoco - é (utilizada frequentemente para indicar o custo que os sistemas de protecção contra os riscos sociais representam para as empresas ou. para a economia geral. Parece, pois, preferível não usar tal expressão coimo referida às eventualidades cobertas pelo seguro social. Ver a este respeito: G. Mazzoni, "Le caracterer relatif de la distinction entre risque et besoin", Bulletin de l'Association Internationale de Ia Sécurité Sociale, Junho- Julho de 1953, pp. 307 e seguintes; Venturi, ob. cit., p. 115.
20 Veja-se, a propósito de todo este número: B. I. T., La Securité sociale, Genève, 1958, pp. 32 e seguintes; A. Venturi, ob. cit., pp. 115-163.

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Pelo que toca à doença, à maternidade, aos acidentes de trabalho e às doenças profissionais, o seguro social foi conduzido, como já se aludiu, à atribuição simultânea de prestações em espécie - "bens" e "serviços". Destes últimos, os mais importantes são os de assistência médica. A concessão de "bens" respeitou sobretudo à administração de meios terapêuticos (v. g., medicamentos, aparelhos de prótese). Como exemplo de prestações em espécie "mistas", refere-se o internamento em estabelecimentos hospitalares e análogos, que alguns países começavam então a incluir nos seus esquemas de seguro obrigatório.
2) Na determinação da medida das prestações em dinheiro, utilizou-se um de dois critérios principais:

a) Manter quanto possível o nível de vida do segurado;
b) Garantir apenas o "mínimo vital", em função de orçamentos familiares-tipo ou do standard dos trabalhadores não qualificados.

O primeiro critério foi, pode dizer-se, o adoptado pelo comum das legislações antes da guerra e implicava, naturalmente, prestações proporcionais aos ganhos do segurado. Regra geral, consistiam em percentagem dos ordenados ou salários, salvo para os encargos familiares, em que o abono era fixado em determinado quantitativo por pessoa a cargo, embora normalmente este variasse consoante os escalões de remuneração dos trabalhadores.
Quanto ao segundo critério, apenas se conhece um país - a Nova Zelândia - que praticava, anteriormente a 1939, um regime de prestações uniformes. Mas o seguro neo-zelandês abrangia já a totalidade da população e estava, como veremos, articulado com um sistema geral de assistência pública.
Pelo que toca aos benefícios em espécie, a sua fixação assentava fundamentalmente em critérios respeitantes ao equilíbrio financeiro do seguro e, na maioria dos casos, limitavam-se à assistência médica.
3) Das condições gerais de atribuição dos benefícios, referem-se as três mais significativas:

a) Exigência do pagamento de certo montante de contribuições ou das correspondentes a determinado período;
b) Limite de duração das prestações temporárias (em dinheiro e em espécie);
c) Obrigação de o segurado participar no custo de algumas prestações sanitárias.

Todas estas condições se fundavam essencialmente em motivos de ordem financeira e, sobretudo a última, também na necessidade de prevenir abusos por parte dos beneficiários.
4) Por último, quanto às possibilidades de revisão de prestações já subjectivadas, o problema interessa concretamente às de natureza vitalícia (pensões de invalidez, velhice e sobrevivência).
Em duas hipóteses pode justificar-se essa revisão. A primeira, para o caso das pensões por acidente de trabalho e invalidez, é a da modificação sensível do grau de incapacidade do segurado, de modo a impor o reajustamento ou a suspensão da pensão até aí recebida. A segunda interessa a todas as pensões e é a da diminuição do seu valor real por efeito da depreciação da moeda.
A faculdade de revisão, no primeiro caso, foi acolhida pela generalidade das legislações. Quanto ao segundo, antes da guerra sòmente uma lei inglesa de 1923 (Workmen's Compensation Act) admitiu essa faculdade dentro de certos limites 21.

E) Receitas

15. Na determinação dos meios financeiros destinados a fazer face às prestações do seguro, importa considerar, essencialmente, dois aspectos: a origem e a base de incidência.
1) Pelo que toca às fontes de receita, os sistemas de seguro social, no período a que nos reportamos, distinguiam, de um lado, o ramo dos acidentes e doenças profissionais, regra geral sustentado apenas pelos empresários; de outro lado, as restantes formas de seguro, em que os meios financeiros eram fornecidos por patrões e trabalhadores, normalmente em partes iguais e, por vezes, com a participação do Estado.
A quotização dos segurados, além de ser, pode dizer-se, da própria essência do seguro, considerou-se indispensável para que o trabalhador tivesse a consciência de participar no custo de uma organização de que ele era o destinatário.
A contribuição patronal entendeu-se necessária para a obtenção de recursos suficientes, dadas as escassas possibilidades económicas dos empregados e operários, sobretudo dos de mais modestas remunerações. Além de que o empresário era também indirectamente interessado na melhoria de condições de saúde dos seus trabalhadores, as quais naturalmente se reflectiam na produtividade do trabalho.
Enfim, a participação do Estado foi justificada por duas ordens de razões:
1.ª A necessidade de fazer face a eventuais deficits do sistema, sobretudo no capítulo das pensões, em que mais dificilmente se justificava a intervenção patronal;
2.ª O interesse que o Estado tinha no desenvolvimento do seguro social, como processo de melhorar o nível sanitário e produtivo da população trabalhadora e de aliviar os encargos com a assistência e a saúde públicas.
A maior parte dos sistemas legislativos antes da guerra adoptava a fórmula tripartida na origem das receitas.
2) Relativamente à base de incidência, o método tradicional das legislações, naquele período, era o de contribuições ou quotas sobre as remunerações dó trabalho, na forma de percentagens.
O único país que adoptava então a fórmula de um imposto sobre o rendimento com destino ao seguro social era a Nova Zelândia.
Na maioria dos sistemas legislativos, as quotizações sobre ordenados e salários tinham um limite máximo ou plafond, ao qual eram também referidas as prestações pecuniárias 22.

F) Equilíbrio financeiro

16. Os métodos técnicos utilizados para .assegurar o equilíbrio entre o fluxo de receitas e o de despesas, actuais e futuras, do seguro social podem assim classificar-se:

a) Repartição:

1) Pura ou ex post;
2) Antecipada ou ex ante.

21 Sobre este número: Venturi, ob. cit., pp. 181 e seguintes; B. I. T., ob. cif., pp. 35 e seguintes; P. Durand, ob. cit., pp. 259 e seguintes.
22 Veja-se: B. I.. T., "Les problèmes généraux de l'assurance sociale", Etudes et documents, série M, n.º 1, Genève, 1925. pp. 65 e seguintes; B. I. T., La sécurité sociale, cit., pp. 128 e seguintes; Venturi, ob. cit., pp. 202 e seguintes; P. Durand. ob. cit., pp. 317 e seguintes.

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b) Capitalização:

1) Individual;
2) Colectiva.

c) Sistemas mistos.

a) O sistema de repartição ex post, que consiste em distribuir por todos os segurados, no fim de cada exercício, o encargo dos benefícios já. concedidos, foi o inicialmente adoptado palas associações de socorros mútuos de base empírica.
As manifestas desvantagens de semelhante método lê varam} desde cedo, a calcular ex ante o custo provável das prestações e mais despesas no exercício futuro, e a repartir esse custo pelos contribuintes. Se, findo o o exercício, se verificava ter o cálculo pecado por defeito procedia-se a uma revisão das quotas para o período seguinte, de modo a preencher o déficit, ou reduziam-se as prestações vindouras. Na hipótese contrária, o excesso de receitas servia para constituir um fundo de reserva destinado a cobrir futuras insuficiências.
Este método foi adoptado, com base na técnica actuarial, pela generalidade dos sistemas, para a cobertura dos riscos a curto prazo, isto é, a que correspondiam prestações temporárias ou pagas por uma só vez. Era o caso da doença, da maternidade, da incapacidade temporária por acidente de trabalho ou enfermidade profissional, do desemprego, dos encargos familiares.
O método da repartição considerou-se, porém, inadequado para a cobertura de eventualidades a longo prazo que exigiam prestações vitalícias - pensões por acidente, doença profissional, invalidez, velhice, sobrevivência.
Nestes casos, como o montante global das prestações vai subindo de ano para ano, dado o natural acréscimo do número de pensionistas, acréscimo que tende a manter-se durante longos períodos, o sistema da repartição implicaria agravamentos constantes das contribuições para fazer face às despesas crescentes.
b) O método da capitalização propõe-se obviar a tal inconveniente. As contribuições vão-se acumulando durante período relativamente longo, de modo a formar um capital. Este cresce por virtude das novas contribuições e do juro dos dinheiros já arrecadados. Ao verificar-se a eventualidade, aquelas contribuições e os rendimentos do capital constituído vão ocorrer ao pagamento das pensões. As contribuições podem ser inscritas numa conta individual para cada segurado, determinando-se em face dela o montante da respectiva pensão (capitalização individual), ou reportar-se, em conjunto, a cada geração de segurados (capitalização colectiva).
Este sistema, que implica para cada segurado o estabelecimento de um período mínimo de capitalização durante o qual não se abre o direito às prestações (período de garantia), tem, em contrapartida, a vantagem de manter indefinidamente estável a contribuição para o seguro.
E, nos países com penúria de capitais para o seu desenvolvimento económico, proporciona a disponibilidade de valores susceptíveis de favorecer esse desenvolvimento, mediante aplicações reprodutivas.
Como principais inconvenientes apontam-se-lhe dois. Primeiro, quando aplicado o grandes massas de população, a dificuldade e o extremo melindre na administração dos vultosíssimos capitais acumulados. Segundo, a quebra progressiva do valor real desses dinheiros e, correlativamente, das prestações que eles se destinam a assegurar, por efeito do inevitável fenómeno da depreciação monetária, particularmente sentido nos nossos tempos após as duas guerras mundiais.
c) Procurou-se obviar aos defeitos da repartição e da capitalização mediante fórmulas mistas, que combinavam, em proporção maior ou menor, elementos de ambos os sistemas.
Mas a generalidade das legislações, por alturas da última guerra, ainda adoptava essencialmente a capitalização para o financiamento dos seguros diferidos 23.

C) Estrutura administrativa

17. O último ponto a examinar, nesta rápida síntese do seguro social obrigatório ao eclodir a segunda guerra mundial, é o que respeita aos órgãos a quem os sistemas legislativos confiavam a gestão do seguro.
Convém referir o exame a um duplo critério: o da natureza jurídica e o do campo de acção.
1) Sob o ponto de vista da natureza jurídica, os órgãos administrativos do seguro social podiam ser:

a) Empresas privadas:
De fins lucrativos;
Mútuas;
) Instituições autónomas de direito público;
c) Estado e autarquias locais.
a) A gestão por empresas privadas de fins lucrativos sòmente se verificou, com certa generalidade, nas legislações que tornavam obrigatória a transferência da responsabilidade por acidentes de trabalho e doenças profissionais para companhias de seguros.
Fora deste caso, não há exemplo de empresas privadas a administrar seguros sociais, salvo o das approved societies inglesas, às quais o National Insurance Act de 1911 confiava a gestão daqueles seguros, sistema que acabou em 1946 com a legislação publicada após o relatório Beveridge.
As sociedades mútuas de seguros (entre empresas ou entre trabalhadores) conheceram sucesso, sobretudo nos países anglo-saxões, como oportunamente se anotou, mas a sua acção dizia sobretudo respeito ao seguro social facultativo, a que adiante faremos referência.
b) Era da própria essência do seguro social obrigatório, tendencialmente dirigido à totalidade da população trabalhadora, que a sua administração fosse confiada a entidades de direito público - na maior parte dos casos organismos autónomos a quem o Estado atribuía certa fracção dos seus poderes.
Isto não impedia que a iniciativa da criação desses organismos pudesse provir dos próprios interessados ou dos seus corpos representativos. E também se mostrava princípio geralmente aceite o de na sua administração participarem representantes dos interessados, designadamente das empresas e dos trabalhadores.
Alguns autores distinguiam, nesses organismos, dois tipos: os de natureza corporativa e os de natureza institucional.
O primeiro era, sobretudo, o tipo das comunidades ou corporações alemãs (Genossenschafte, Koerperschafte), de patrões ou de trabalhadores, que, nos fins do século passado, constituíam larga rede de associações mútuas de seguros e às quais Bismarck cometeu, como referimos, a administração dos seguros sociais, tornando obrigatória a filiação.
O segundo representava " tipo comum à generalidade dos países. A instituição surgia por acto estadual, se bem que mediante iniciativa particular, e detinha

23 A. Venturi, I fondamenti scientifici della sicurezza sociale, cit., pp. 217 e seguintes; René Monin, Problèmes de la retraite - Débat capitalisation repartition, Paris, 1958; P. Durand, ob. cit., pp. 306 e seguintes.

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autonomia administrativa, embora dos seus corpos directivos fizesse parte um representante do Estado.
c) Enfim, podia o próprio Estado ou as autarquias locais assumir directamente a gestão do seguro social.
Semelhante fórmula representou, no entanto, caso esporádico na evolução, do sistema. Além da Bulgária antes de 1914, a administração estadual sómente foi adoptada em alguns países para os riscos de invalidez e velhice (Alemanha) e desemprego (Inglaterra).
2) No ponto de vista do campo de acção, os órgãos gestores do seguro tinham, consoante os casos, por base:

a) A profissão;
b) O ramo de actividade;
c) A empresa;
d) A circunscrição territorial.

Os dois primeiros tipos eram igualmente susceptíveis de abranger uma ou mais circunscrições ou todo o país.
A adopção de um ou outro destes tipos de estrutura dependeu, sobretudo, de circunstâncias inerentes ao processo histórico de desenvolvimento do seguro social em cada pais.
As instituições de base profissional ou por actividades foram as que tiveram prevalência, além do mais porque sobre essa base se haviam constituído, nos países da Europa Ocidental, as associações precursoras do seguro obrigatório 24.

A assistência social

18. Ao Lado do seguro social obrigatório, a assistência social (do Estado, das autarquias locais, de instituições públicas e particulares) desempenhou, sobretudo a partir da segunda metade do século XIX e até nossos dias, uma função de particular relevo na protecção contra os riscos sociais.
Nos países anglo-saxões, manteve-se o princípio de que a assistência aos necessitados incumbia sobretudo ao Estado e às autarquias (caso das por laws inglesas), ao passo que nos países latinos a acção pública se limitou a integrar a assistência de origem privada.
Noutros países - como, por exemplo, nos Estados Unidos da América do Norte, na Austrália, na Nova Zelândia, na União da África do Sul -, a assistência pública foi erigida em sistema básico de defesa contra a generalidade dos riscos sociais.
Mas, na maior parte dos sistemas legislativos em que se expandiu o seguro obrigatório, a assistência, tanto oficial como particular, assumiu apenas carácter supletivo e complementar, quer no aspecto do campo de aplicação - visando a proteger camadas sociais ainda não, ou não inteiramente, abrangidas pelo seguro -, quer no aspecto das eventualidades - procurando ocorrer a contingências ainda não incluídas nos esquemas do seguro social, ou insusceptíveis de se acomodarem ao respectivo mecanismo.
19. No que se refere ao âmbito dos beneficiários da assistência, pode dizer-se que ele abrange, em princípio, todos os que se mostrem carecidos de auxílio.
Esta constitui, aliás, a característica essencial da assistência e a que mais nitidamente a distingue daquilo que constitui a essência do seguro social.
Como já se frisou, o seguro reconhece um direito às prestações, uma vez verificados os eventos previstos nos termos regulamentares, independentemente da situação económica dos segurados. A assistência, inspirada tradicionalmente no espírito de caridade e socorro, considera beneficiários, exclusivamente, as pessoas em relação, às quais verifique não disporem de meios suficientes para ocorrer às consequências dos riscos sociais (means test). E, por outro lado, não reconhece um direito aos benefícios que outorga.

20. A assistência procura ocorrer à generalidade dos riscos sociais, embora possa atribuir a uma ou outra entidade ou instituição ramos diversos da sua actividade protectora.
No tocante às prestações assistenciais, podem elas dividir-se em duas grandes categorias: o internamento em estabelecimentos próprios (hospitais, sanatórios, manicómios, orfanatos, hospícios, asilos, etc.) e a assistência domiciliária.
Esta última concede prestações em espécie (alimentação, vestuário, funeral, sepultura, etc.) ou subsídios em dinheiro.
A atribuição das prestações assistenciais está. porém, sujeita à condição geral acima referida: a efectiva necessidade delas por parte do assistido, mediante prévia apreciação discricionária pela entidade assistente.
Para os subsídios pecuniários , a sua concessão é, em diversos países, ainda objecto de verificação a posteriori - a do efectivo dispêndio do dinheiro na satisfação das necessidades para que o subsídio foi solicitado.
Uma forma de prestação pecuniária da assistência pública, que teve sucesso em diversos países, foi a das chamadas pensões não contributivas, introduzidas pela primeira vez na Dinamarca em 1891 e sete anos mais tarde na Nova Zelândia.
Tratava-se, na maior parte dos casos, de pensões de reforma por velhice, pagas pelo Estado aos indivíduos que preenchessem determinados requisitos. Mas nem neste caso se podia falar em direito à assistência, pois o princípio do means test continuava a ter inteira aplicação.
O sistema das pensões .não contributivas foi pouco a pouco desaparecendo das legislações. Na Dinamarca, e na Noruega substitui-se-lhe um regime de seguros obrigatórios. Na Inglaterra, Austrália e Nova Zelândia cedeu o passo a sistemas modernos de segurança social.

21. Os meios financeiros da assistência pública são, como é óbvio, as receitas gerais do Estado ou das autarquias, bem como as provenientes de taxas, impostos ou donativos especialmente destinados a fins assistenciais.
Os organismos de assistência particular têm receitas próprias, essencialmente constituídas por comparticipações e importâncias pagas pelos assistidos ou pelas entidades que legalmente a estes se substituam; rendimentos de bens próprios; donativos e subsídios do Estado, das autarquias e de outras entidades públicas ou particulares.
As verbas inscritas nos orçamentos do Estado e mais órgãos da assistência pública, assim como as possibilidades financeiras das instituições particulares, condicionam, naturalmente, o volume global das prestações a conceder e a medida de cada uma destas 25.

§ 4.º

O seguro facultativo

22. No quadro dos sistemas de garantia contra os riscos sociais, e com respeito ao período considerado, o

___________________

24 Sobre esta matéria: ª Venturi, ob. cit., pp. 225 e seguintes; B. I. T., "Les problèmes généraux", cit., pp. 88 e seguintes.
25 P. Durand, ob. cit., pp. 49 e seguintes; Venturi, ob. cit., pp. 34 e seguintes; B. I. T., La sécurité sociale, cit., p. 11; Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 3 e seguintes.

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seguro social de natureza facultativa desempenhou, na generalidade dos países, tal como a assistência social nos países latinos, uma função adjuvante e complementar do seguro obrigatório.
a) A sua estrutura revestia normalmente a forma de mutualidades, cujo âmbito associativo era muito variado.
Aqui interessam-nos especialmente as instituições de que faziam parte patrões e trabalhadores ou só trabalhadores - de uma empresa, de várias empresas, de todo um ramo da actividade económica, de uma ou mais profissões.
A criação dessas instituições obedecia a um duplo objectivo: proteger grupos não incluídos no seguro social ou aos quais este cobria apenas algumas eventualidades; melhorar as prestações concedidas pelo seguro obrigatório.
b) Dentro do próprio seguro obrigatório, também o direito comparado revelava formas de inscrição facultativa.
Na verdade, com frequência as leis previam que determinadas categorias de pessoas não incluídas obrigatoriamente no seguro ou que, por virtude da modificação do seu status profissional ou social, deixavam de estar sujeitas a essa obrigação, pudessem continuar inscritas a título facultativo, mediante determinadas condições quanto ao futuro esquema de eventualidades e benefícios e ao pagamento de contribuições.
Por vezes essa faculdade dizia respeito aos próprios beneficiários obrigatoriamente inscritos, e tinha em vista conceder-lhes prestações superiores às do esquema base obrigatório.
Os grupos de pessoas admitidas ao seguro continuado a título facultativo variavam muito de país para país. A categoria mais frequentemente visada por esse regime era a dos trabalhadores independentes com rendimentos inferiores a certo limite.
O caso de mais ampla aplicação do sistema de adesão facultativa no domínio do seguro social obrigatório era o da lei alemã sobre- pensões de invalidez, velhice e sobrevivência, que admitia a inscrição voluntária a todos os nacionais residentes no país ou no estrangeiro de idade não superior a 40 anos.
c) A terceira e última modalidade de seguro social facultativo era a respeitante à transferência não obrigatória da responsabilidade patronal por acidentes de trabalho e doenças profissionais, a que já noutro lugar aludimos e se adoptava em certo número de países.

23. As instituições dê seguro facultativo cobriam normalmente um ou mais dos riscos objecto do seguro obrigatório, e as suas prestações tinham análoga natureza.
No que respeita aos meios financeiros, a fonte por excelência era a quotização dos associados.
Em alguns países, as associações de seguro facultativo, que reunissem certas condições, recebiam subsídios do Estado. Era, por exemplo, o caso das caixas de seguro contra o desemprego na Suíça, que, segundo uma lei de 1943, uma vez reconhecidas como de utilidade pública, podiam ter subvenções do Governo Federal.
Quanto ao regime financeiro, a generalidade destas instituições, dado o seu limitado campo de aplicação e a variabilidade do número de associados, forçosamente havia de adoptar o sistema da capitalização individual 26.

§ 5.º

Síntese deste capítulo

24. Convém agora resumir as características dominantes do sistema de protecção contra os riscos sociais no limiar da segunda grande guerra, que. se percorreram ao longo deste capítulo.

a) Quanto às formas gerais de organização:

I) Na maior parte dos países, designadamente - nos países latinos: sistemas de seguro social, obrigatório, completados pela assistência social e pelo seguro facultativo.
II) Nos países anglo-saxões: em regra, sistemas de assistência pública, a que se adicionavam instituições de seguro voluntário.
b) Quanto ao campo de aplicação:
Países do grupo I - limitação do seguro obrigatório a determinadas classes da população, normalmente aos trabalhadores por conta de outrem.
Países, do grupo II - protecção não limitada a determinados grupos sociais, mas restrita, em princípio, às pessoas necessitadas, mediante a verificação da carência (means test).

c) Quanto às eventualidades:

Países do grupo I - predeterminação e definição legal dois tipos de eventualidades e riscos cobertos pelo seguro obrigatório; variabilidade da extensão do esquema de eventualidades, conforme os países.
Países do grupo II - protecção pela assistência da generalidade dos riscos sociais, sob a condição do estado de (necessidade do interessado.

d) Quanto às prestações:

Países do grupo I - fixação regulamentar das prestações a conceder, uma vez verificados os riscos nas condições previstas; ligação estreita entre contribuições pagas e benefícios; limite de duração das prestações temporárias (especialmente nos casos de doença e desemprego); impossibilidade de revisão das prestações vitalícias subjectivadas, para efeito de reajustamento ao valor da moeda.
Países do grupo II - indeterminação dos benefícios, regra geral outorgados conforme as necessidades do assistido e as possibilidades financeiras da assistência.

e) Quanto aos meios financeiros:

Países do grupo I - quotizações (percentagens) sobre ordenados e salários, pagas por patrões e trabalhadores, em partes iguais ou na maior parte pelos primeiros; participação do Estado no custo do sistema ou no de alguns ramos do seguro.
Países do grupo II - receitas gerais do Estado e das autarquias; ou imposto especial para a assistência pública.

e) Quanto ao equilíbrio financeiro:

Países do grupo I - capitalização pura nos seguros a longo prazo; repartição ex ante, com pequenas reservas, nos restantes ramos do seguro.
Países do grupo II - repartição dos encargos por toda a população mediante os impostos.

____________

26 ª Venturi, ob. Cit., pp. 112-114 e 178-179; P. Durand, ob. Cit; pp. 67 e seguintes

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g) Quanto à estrutura administrativa:

Países do grupo I - multiplicidade de instituições de base profissional, económica ou empresarial, para todos ou para alguns ramos do seguro.
Países do grupo II - gestão dos serviços de assistência pública pelo Estado e pelas autarquias.

CAPÍTULO II

A política contemporânea de segurança social

§ 1.º

A guerra e o movimento no sentido da segurança social

25. Noutro lugar (supra, n.° 5) já se aludiu à extraordinária mutação do clima económico-social gerada pela guerra de 1939-1945, e às profundas e extensas aspirações de segurança social que ela veio suscitar em todos os povos e em todas as latitudes.
Podem encontrar-se sinais precursores deste movimento, antes do conflito, nos trabalhos de alguns especialistas 27 e nas legislações de dois países - os Estados Unidos e a Nova Zelândia. O primeiro, em 1935, e o segundo, em 1938, haviam promulgado novos sistemas de protecção social. Pela sua inspiração e pelas técnicas utilizadas, mais do que pela extensão das garantias instituídas, tais reformas constituíram uma antecipação das concepções sistemáticas que iriam surgir neste domínio após a guerra.
O Social Security Act americano de 1935, embora não abrangesse no seu âmbito os agricultores, os trabalhadores independentes e os funcionários públicos e, nas eventualidades, não cobrisse a doença nem a invalidez, ficou assinalado por ser o primeiro diploma a consagrar a expressão «segurança sociais, e por ter o mérito de se integrar num conjunto de medidas de combate ao desemprego e de incentivo ao desenvolvimento económico.
O sistema neo-zelandês, a que já no capítulo anterior se fizeram algumas alusões, veio estender a protecção a toda a colectividade nacional e ao conjunto dos riscos sociais. Financiado por um imposto de 7,5 por cento sobre o rendimento, que permitia efectuar uma larga compensação nacional, não punha limite de duração às prestações temporárias (doença, maternidade e desemprego).

26. Cita-se, porém, como primeira afirmação solene do princípio da segurança social, a mensagem do presidente Roosevelt ao Congresso dos Estados Unidos, em 6 de Janeiro de 1941, sobre as quatro, liberdades essenciais em que devia assentar o mundo futuro - entre as quais figurava a libertação da necessidade (freedom from want).
Em 12 de Agosto desse mesmo ano era assinada a Carta do Atlântico, cujo ponto 5.° consignava o propósito de «estabelecer a mais completa colaboração entre todas as nações no domínio económico, a fim de assegurar melhores condições de trabalho, uma situação económica mais favorável e a segurança social».
E o ponto 6.° preconizava «o estabelecimento de uma paz que proporcione a todas as nações os meios de viver em segurança no interior das suas fronteiras, e conceda aos habitantes de todos os países a garantia de poderem acabar os seus dias ao abrigo do medo e da miséria».
A Conferência Internacional do Trabalho, na sessão realizada em Nova Iorque em Outubro seguinte, aprovou uma resolução sobre as bases da reconstrução social no pós-guerra, a qual deveria assentar «na melhoria das condições de trabalho, no progresso económico e na segurança social».
Foi, contudo, na 1.ª Conferência Interamericana para a Segurança Social, realizada em Setembro de 1942, em Santiago do Chile, que se formulou, pela primeira vez, um conceito preciso, embora genérico, de segurança social. A declaração votada nessa conferência afirma: «Todas as nações devem criar, manter e acrescer o valor intelectual, moral e físico das suas gerações activas, preparar o caminho das gerações vindouras e sustentar as gerações eliminadas da vida produtiva. É este o significado da segurança social: uma economia genuína e racional dos recursos e valores humanos».
Extraordinária ressonância teve, dois anos depois, a, célebre Declaração de Filadélfia, adoptada na sessão de Abril-Maio de 1944 da Conferência Internacional do Trabalho, sobre os princípios que devem inspirar a política social dos estados membros.
Depois de asseverar, na sua base II, que «uma paz duradoura não pode assentar senão na base da justiça social», a Declaração reconhece a obrigação solene de cada país promover a efectivação de programas tendentes a realizar, entre outros objectivos, «a extensão das medidas de segurança social com vista a garantir um rendimento de base a todos aqueles que tiverem (necessidade dessa protecção, assim como cuidados médicos completos» [base III, alínea f)].
Nessa mesma sessão histórica, aprovou a Conferência duas recomendações: uma sobre a garantia dos meios de existência (n.° 67) e outra acerca das prestações médicas (n.° 69).
A primeira declarava que «todo o regime de garantia dos meios de existência deveria aliviar a necessidade e prevenir a indigência, restabelecendo em nível razoável os meios de existência perdidos por efeito da incapacidade de trabalho (incluindo a velhice), da impossibilidade de obter um emprego remunerado ou da morte do chefe da família». E enumerava depois as eventualidades e prestações que aquele regime deveria incluir.
A segunda recomendação estabelecia os princípios gerais em matéria de serviços médicos curativos e preventivos, designadamente no que toca ao campo de aplicação desses serviços (que deveriam englobar todos os membros da comunidade nacional), à sua administração e coordenação com os serviços gerais de saúde, e ao seu financiamento.

27. Entretanto, aparecera em Inglaterra o célebre relatório apresentado ao Parlamento, em Novembro de 1942, por Sir William Beveridge 28.
O relatório Beveridge pode considerar-se o primeiro plano de segurança social (plan for social security, conforme a sua própria designação) estruturado segundo as concepções modernas. Foi precedido de inquéritos sistemáticos, efectuados em todo o país de 1935 a 1939, os quais revelaram a dispersão orgânica e a complexidade administrativa do sistema anterior, a par de insuficiências de defesa contra os riscos sociais em extensas zonas da população.
Era objectivo final do plano Beveridge o de instituir garantias eficientes em todas as contingências susceptíveis de provocar interrupção ou perda da capacidade de ganho - to make want under any circumstances unne-

27 Por exemplo: A. C. Pigou, Económica of welfare, Londres, 1930; Joseph Cohen, «Social Security and Social Movements», Sociology and social research, Março-Abril de 1939, pp. 312 e seguintes.

28 Social insurance and allied services, Report by Sir William Beveridge, London, H. M. Stationery Office, 1942.

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cessary. E acrescentava-se: a Um momento revolucionário na história do Mundo é ocasião para modificações profundas, não para remendos" 29.
Tendo em vista a consecução daquele objectivo, propunham-se essencialmente cinco ordens de medidas:
a) Generalização quanto às pessoas, estendendo a todos os membros da colectividade a protecção contra os riscos sociais, por forma a dar realização efectiva ao princípio da solidariedade nacional e à política de redistribuição de rendimentos;
b) Alargamento do esquema de eventualidades, de modo a incluir, além das previstas no regime anterior (doença, maternidade, invalidez, velhice, morte, desemprego), também os encargos familiares (casamento; nascimento, sustentação e educação dos filhos) e a situação das mulheres casadas;
c) Fixação de prestações mínimas iguais para cada grupo da população, classificada em seis classes conforme a sua situação social: trabalhadores por conta de outrem; patrões e trabalhadores por conta própria; donas da casa; pessoas em idade activa sem ocupação remunerada; pessoas que ainda não atingiram a idade activa; pessoas que já a ultrapassaram;
d) Unificação administrativa de todos os serviços de segurança social, sob a direcção de um único departamento (Ministério da Segurança Social). Instauração para as prestações sanitárias de um serviço nacional de saúde e reabilitação subordinado ao Ministério da Saúde;
e) Unificação das contribuições para todo o esquema, incluindo o serviço de saúde, numa taxa global, paga semanalmente mediante a aposição de um só selo num único documento (all benefits in the form of a single stamp on a single document).
O relatório Beveridge suscitou extraordinário movimento de interesse na opinião mundial e exerceu profunda influência na revisão das legislações dos diversos países, assim como na própria actividade dos organismos internacionais 30.

28. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de Novembro de 1948, insere no seu artigo 22 os seguintes princípios: "Toda a pessoa, enquanto membro da sociedade, tem direito à segurança social; e deve poder obter a satisfação dos direitos económicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, tendo em conta a organização e os recursos de cada país".
Esta declaração tem o interesse de pôr justamente em relevo uma ideia que está na base da moderna concepção de segurança social: a fie que esta deve realizar-se graças ao esforço de toda a colectividade, através de um vasto sistema de compensação nacional, sem contudo perder de vista as possibilidades de cada país e a necessidade da cooperação entre os Estados.

29. Sob a influência deste largo movimento de ideias, as legislações da generalidade dos países sofreram, a partir da guerra, remodelações mais ou menos extensas no capítulo da protecção contra os riscos sociais.
Referem-se algumas das mais significativas.
A Bélgica foi o primeiro país a introduzir modificações sensíveis na sua legislação, até aí essencialmente baseada sobre os seguros sociais de natureza facultativa. Um decreto-lei de Dezembro de 1944 instituiu o seguro obrigatório na doença e na invalidez, alargou o regime do abono de família e lançou as bases do seguro contra o desemprego. A protecção na velhice e ma sobrevivência foi revista e ampliada em 1955 (para os assalariados), 1956 (para os trabalhadores independentes) e 1957 (para os empregados) 31.
A Inglaterra deu, como já se disse, execução à generalidade das propostas contidas no relatório Beveridge, através de leis publicadas em 1945 (abono de família), 1946 (seguro nacional e serviço nacional de saúde) e 1948 (assistência nacional), posteriormente modificadas por diversas vezes 32.
Em França publicam-se, de 1945 a 1948, os textos basilares que instituíram um vasto sistema de segurança social para os trabalhadores por conta de outrem e respectivos familiares, na agricultura, indústria, comércio e serviços, assim como para diversas categorias de trabalhadores independentes. Diplomas posteriores ampliaram e aperfeiçoaram o sistema: em 1953 e 1956 para as pensões de invalidez, velhice e sobrevivência; em 1951 para a assistência no desemprego, e em 1955 para o seguro-doença. Em Dezembro de 1956 um código da segurança social compilou todas as disposições publicadas desde 1945 33. Vários decretos de Maio de 1960 introduziram importantes alterações ao regime vigente.
Na Itália, logo em 1944 se constituiu uma comissão para a reforma da previdência e da assistência social. A legislação vigente de seguro social foi objecto de várias remodelações por diplomas de 1950 (maternidade), 1952 (invalidez, velhice e sobrevivência), 1954 (doença) e 1955 (abono de família) 34.
A República Federal da Alemanha procedeu, a partir de 1952, à revisão e ampliação das suas leis de seguro social, designadamente no que respeita à maternidade (1952), aos subsídios familiares (introduzidos em 1954), ao desemprego (1956) e às pensões de invalidez, velhice e sobrevivência, cujo regime foi reformado em Fevereiro de 1957 e estendido aos agricultores por conta própria em Julho desse mesmo ano 35.
A Áustria promulgou em Setembro de 1955 uma reforma geral do seguro social, abrangendo os acidentes de trabalho, a doença e a maternidade (subsídios e amplas prestações sanitárias), a invalidez, a velhice e a sobrevivência. Anteriormente, diplomas de 1949 haviam reorganizado o abono de família e o seguro-desemprego.
Duas leis austríacas de Dezembro de 1957 instituíram um regime de seguro-pensões para os trabalhadores por

29 Social insurance and allied services, pp. 6 e9.
0 As propostas do relatório alcançariam, de modo geral, consagração Legislativa em Inglaterra, através de diplomas publicados de 1945 a 1948. A principal divergência consistiu em não se ter aceite a constituição do Ministério da Segurança Social, mantendo-se a separação entre os serviços administrativos das prestações de seguro (Ministry of National Insurance) e os de assistência (National Assistancc Board). Ver P. Durand, ob. cit., pp. 386-388.

31 Istituto Nazionale della Previdenza Sociale, Sintesi dei principali sistemi previdenziali del mondo, Roma, 1960, p. 15; U. S. Department of Health, Education and Welfere, Social security programs throughout the world, 1958, Washington, U. S. Goverment Print office, 1958, pp. 2, 34, 60, 70 e 78; Doublet et lavau, ob. Cit, pp. 552 e seguintes.
32 B. I. T., Systèmes de sécurité sociale, Grande-Bretagne, Genève, 1957; Sintesi del principali sistemi previdenziali del mondo, pp. 45 e seguintes; Social security programs throughout the world, pp. 28, 58, 66, 76 e 91; Doublet et Lavau, ob cit., pp. 537 e seguintes.
33 Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 88 e seguintes; Sintesi del principali sistemi previdenziali del mondo, pp. 35 e seguintes; Social security programs throughout the world, pp. 12; 40, 62, 72 e 81.
34 Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 561 e seguintes; Social security programs throughout the world, pp. 16, 46, 64, 73 e 85.
35 Doublet et Lavau. ob. cit., pp. 546 e seguintes; Social security programs throughout the world, pp. 12, 40, 62, 72 e 82; B. I. T., informations sociales, 15 de Setembro de 19.57, pp. 252 e seguintes; 3 de Maio de 1957, pp. 398 e seguintes.

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conta própria na indústria e na agricultura. E em Setembro de 1958 outra lei modificou o seguro doença e aumentou as respectivas prestações 36.
Na Suíça, leis federais de 1946, 1951 e 1952 alteraram os regimes, respectivamente, do seguro-invalidez, velhice e sobreA7ivência, do seguro-desemprego e cio abono de família para os trabalhadores agrícolas.
Em Dezembro de 1956 foi ampliado o sistema do seguro-pensões (velhice e sobrevivência) e em 19 de Junho de 1959 as câmaras federais aprovaram uma nova lei sobre o seguro-invalidez, que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 1960 e consagra primordial interesse à readaptação dos inválidos 37.
Os países escandinavos (Dinamarca, Noruega e Suécia), que possuíam já sistemas bastante completos de segurança social, essencialmente baseados em regimes de assistência pública, introduziram diversas melhorias nos seus esquemas de eventualidades e prestações. Assim, por exemplo, a Dinamarca reviu todo o seu regime de pensões em 1956 e, recentemente, em 1959 e em Junho de 1960. Nesta última data foi também alterado o seguro-doença. A Noruega procedeu igualmente é remodelação do seu regime de subsídio na doença (L956) e de pensões (H957). A Suécia submeteu ao referendo uma reforma de seguro-pensões em 13 de Outubro de 1957 38.
A Rússia modificou por diversas vezes, depois da guerra, o seu sistema unitário de segurança social, cuja direcção central e financiamento incumbem ao Estado, em conexão com os imperativos dos planos de desenvolvimento económico. Foram especialmente revistos os regimes de pensões por acidentes de trabalho, doenças profissionais, invalidez, velhice e morte, em 1956 39.
A Grécia promulgou em 1951 uma lei geral de segurança social, modificada em 1953. E dois anos depois publicou nova lei sobre o seguro-doença e a defesa da saúde dos trabalhadores agrícolas.
Os Estados Unidos reajustaram frequentemente o seu Social Security A et de 1935. Os principais diplomas posteriores são de 1939, 1946, 1950, 1952, 1956, 1958 e 1960. Ao lado dos regimes de seguro, que respeitam, sobretudo, à velhice e sobrevivência, o sistema abrange uma vasta rede de serviços de assistência pública - para o desemprego, invalidez e encargos de família e de serviços públicos de saúde 41.
A Nova Zelândia, precursora, como vimos (supra, n.º 24), dos modernos sistemas de segurança social com a sua lei de 1938, modificou esta por diversas vezes, no sentido do aperfeiçoamento das suas disposições e do alargamento e actualização dos benefícios. A última reforma é de 1956 e diz respeito aos acidentes de trabalho e doenças profissionais 42.
O Brasil publicou, em 1 de Maio de 1954, um decreto contendo o regulamento geral das instituições de seguro social, com vista a uniformizar o seu regime administrativo. E está actualmente em estudo um projecto de lei que prevê medidas de coordenação e colaboração entre os diversos organismos de previdência, que ficariam subordinados ao Ministério do Trabalho 43.
Por último - last Irnt not Icast -, a Espanha, cujas leis fundamentais de previdência social datam de 1938 (abono de família), 1939 (velhice e invalidez) e 1942 (doença e maternidade), introduziu em 1954 um regime de seguro contra o desemprego tecnológico. Um decreto de 18 de Outubro de 1957 alargou as prestações do seguro-doença aos trabalhadores ocasionais na agricultura e pecuária. E um decreto de 5 de Setembro de 1958 instituiu o Serviço Nacional da Segurança Social Agrícola.
Recentemente, o Governo Espanhol incumbiu o Instituto Nacional de Previsión de elaborar um plano geral de segurança social, no qual será inteiramente reestruturado o sistema vigente 44.

30. No campo internacional, a elaboração de normas jurídicas sobre a segurança social coube à Organização Internacional do Trabalho.
Nas suas 34.ª e 35.ª sessões (Genebra, 1951 e 1952) a Conferência Internacional do Trabalho redigiu e aprovou uma convenção (n.º 102) acerca da norma mínima da segurança social.
Aí se regulam as prestações básicas que os países que ratificarem a convenção devem assegurar, nas seguintes eventualidades: doença, maternidade, desemprego, acidentes de trabalho e doenças profissionais, velhice, invalidez, sobrevivência e encargos de família.
Prevê-se, além disso, a igualdade de tratamento para os residentes não nacionais, bem como os casos de suspensão das prestações, a origem dos meios financeiros e, ainda, a participação de representantes das pessoas protegidas, das entidades patronais e das autoridades públicas, na administração dos regimes de segurança social.
Em 1 de Janeiro de 1961, a convenção tinha sido ratificada por dez países: República Federal da Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Grécia, Israel, Itália, Noruega, Inglaterra, Suécia e Jugoslávia 45.

_________________

43 Carmelo M. Lago, Planificacion de la seguridad social, Organización Iberoamericana de Seguiridad Social, Madrid, 1959, pp. 168-170.
44 Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 566 e seguintes; B. I. T., Informations sociales, 1 de Abril de 1958, p. 304; 1 de Maio de 1959, p. 381; Garmeio M. Lago, ob. cit., p. 166.

38 Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 572 e seguintes; Social security programa throughout the world;- Sintesi. dei prinoipali sistemi previdenziali dei mondo, pp. 30, 53, 69 e seguintes; B. I. T., Informations sociales, 15 de Novembro de 1956, 15 de Março de 1957, 15 de Abril de 1958 e 1 de Fevereiro de 1961.

39 Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 558 e seguintes; Social security programs throughout the world, pp. 28, 56, 76 e 90; Sintesi dei principali sistemi..-previdenziali dei mondo, pp. 77 e seguintes.
45 Ver: B. I. T., Conférence Internationale du Travail, 34ème session, rapport IV (1), Objectifs et normes mínima de la sécurité sociale, Genève, 1950; e rapport IV (2), Genève, 1951; idem, 35ème session, Norme minimum de la sécurité sociale, raport V, a), (1), Genève, 1951, e rapport V, a) , (2), Genève 1952.

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Outro instrumento jurídico internacional sobre a matéria é o projecto do código europeu de segurança social, cuja proposta de elaboração foi apresentada pela Comissão dos Problemas Sociais, criada pela Assembleia Consultiva do Conselho da Europa na sua primeira sessão (Agosto-Setembro de 1949).
Dificuldades de ordem política, mais do que de natureza técnica, por virtude da necessidade de harmonização prévia das políticas. económicas e sociais dos países da O. E. C. E., têm impedido a publicação do código.
Cumpre referir ainda a fecunda actividade doutrinal e informativa da Associação Internacional de Segurança Social (A. I. S. S.), com sede em Genebra, que agrupa as organizações nacionais gestoras de um ou mais ramos de segurança social: instituições públicas, mutualidades, departamentos ministeriais. Conta actualmente, em 62 países - entre os quais Portugal -, 160 organismos membros, representando perto de 350 milhões de pessoas abrangidas por regimes de protecção contra riscos sociais.
O seu objectivo essencial é o de promover, no plano internacional, o desenvolvimento da segurança social e o aperfeiçoamento dos seus métodos técnicos e administrativos.

§ 2.º

O conceito de segurança social

31. Percorridos os marcos mais salientes que assinalam a génese e o desenvolvimento da política contemporânea com vista à a segurança social», importaria agora extrair, da mole já imponente de doutrinação 47 e de realizações, certos princípios fundamentais que exprimissem as grandes linhas de rumo dessa política.
Isso se tentará fazer no parágrafo seguinte. Antes, porém, parece conveniente utilizar aquelas mesmas ideias e factos para atribuir um sentido unívoco à expressão «segurança social» -ao menos para os efeitos do presente trabalho -, sendo certo que frequentemente a ela se ligam os mais diversos significados.
A «segurança social» define-se pelo seu fundamento (ético-político), pelos seus fins (sociais) e pelos meios (técnicos) adequados à realização, desses fins.
O fundamento ético-político da segurança social assenta, como escreve Venturi, no reconhecimento do dever que incumbe à sociedade de intervir, a favor do indivíduo e da família, quando se verifique desequilíbrio grave entre as necessidades individuais e familiares e os meios de as satisfazer - causado por eventualidades ou riscos que determinem uma de duas ordens de consequências:

a) Interrupção, redução ou cessação dos réditos que proporcionam os meios de existência;
b) Necessidade de suportar encargos para os quais o rédito normal deve presumir-se insuficiente 48.
Aqueles «riscos» ou «eventualidades» devem ser típicos, isto é, definidos com precisão, nos seus elementos estruturais, pelo sistema jurídico.
A categoria acima. agrupada sob a alínea a) dizem respeito os eventos seguintes:

1.º Causadores de interrupção dos réditos - doença; maternidade; acidente ou doença profissional de que resulte incapacidade temporária sem desvalorização; desemprego;
2.º Causadores de redução dos réditos - acidente de trabalho ou doença profissional de que resulte desvalorização; morte do chefe de família quando as pessoas a seu cargo tenham outras fontes de rendimento;
3.º Causadores de cessação dos réditos - invalidez; morte do chefe de família quando as pessoas a «eu cargo não possuam outros meios de subsistência.
A categoria sob a alínea ?;) abrange: o tratamento da doença e a reabilitação; o casamento; a maternidade ; a sustentação e educação dos filhos, bem como a sustentação de outros familiares a cargo do chefe de família.
Os fins da segurança social estão em relação directa com os seus fundamentos e visam:

a) À prevenção dos riscos;
b) À reparação ou eliminação das respectivas consequências.

Por último, os meios a utilizar pela segurança social hão-de, logicamente, ser aptos à consecução daqueles fins: meios de "prevenção e meios de reparação ou eliminação.
Os meios de prevenção próprios da segurança social abrangem todas as medidas directamente ligadas à profilaxia das doenças; à organização de serviços de medicina do trabalho; à prevenção de acidentes e doenças profissionais.
Os meios de reparação ou eliminação das consequências dos riscos sociais consistem, por um lado, em «rendimentos de substituição» - prestações em dinheiro - e, por outro lado, em prestações em espécie - bens, serviços- essencialmente destinadas ao tratamento da doença e à reabilitação dos doentes.

32. Se se, encarar a política de segurança social sob o ângulo mais restrito do trabalho - considerado como fonte por excelência de obtenção dos meios de vida pode dizer-se que essa política se define em três bases:

1.ª A segurança social significa, em primeiro lugar, a segurança do trabalho, isto é, a garantia do direito ao trabalho e da estabilidade no emprego. Pressupõe uma organização da economia e do mercado do trabalho capazes de promover o equilíbrio regular entre a oferta e procura de mão-de-obra - o que implica, além do mais, a existência de uma rede completa de estabelecimentos de orientação e formação profissional, assim como de serviços de colocação.
2.ª Não basta garantir a segurança do trabalho. E preciso que o emprego proporcione remuneração adequada às necessidades do trabalhador e da sua família.
O salário suficiente representa, pois, outra condição basilar de toda a política de segurança social.
3.ª Assegurado o emprego e o salário, importa depois velar pela conservação a capacidade de trabalho e de ganho, através dos meios preventivos enunciados, e ocorrer às consequências da interrupção, redução ou perda dessa capacidade, bem como à necessidade de suportar encargos incomportáveis para os réditos normais, mediante as formas de reparação também já referidas.

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Em sentido estrito, a política de segurança social tem especificamente em vista este terceiro e último elemento - como resulta do que acima se expôs -, embora na sua concepção actual o não restrinja no trabalhador 49.

§ 3.º

Princípios fundamentais da segurança social

A) Razão de ordem

33. Caracterizados os elementos definidores do conceito de segurança social, cumpre agora enunciar os princípios gerais que exprimem as grandes linhas de orientação da política de segurança e se inferem da doutrina e das tendências dominantes nos sistemas legislativos.
Para esse efeito seguir-se-á uma razão de ordem paralela à adoptada no capítulo I deste parecer, abordando sucessivamente: o campo de aplicação da política de segurança, as eventualidades cobertas, o esquema de prestações, a origem dos meios financeiros, os métodos de equilíbrio financeiro e, por último, os sistemas de administração.

B) Campo de aplicação

34. Neste primeiro aspecto, o princípio que se infere do direito comparado, a partir da guerra, e corresponde aliás ao próprio conceito de segurança social há pouco definido, é o da tendência para a generalização do âmbito dos beneficiários - com vista a abarcar progressivamente toda a colectividade nacional.
É o chamado princípio da universalidade.
A mesma regra implica, ainda, que a protecção s>e estenda não apenas aos nacionais, mas também aos estrangeiros residentes no país, sem discriminação.
Considera-se, assim, como sujeito do direito à segurança social, não o trabalhador - mas o homem.
Decerto que o trabalho é a forma essencial de obtenção dos meios de existência, e, por isso, insegurança social deve ser, antes de tudo, como acima se frisou, a segurança do trabalho - quer dizer, a garantia da conservação da capacidade de ganho pelo exercício de uma actividade profissional, ou da reparação das consequências da perda ou redução dessa actividade.
Mas, hoje em dia, por virtude da extrema complexidade e instabilidade da vida, a insegurança económica, até há pouco considerada como inerente apenas ao trabalhador subordinado, estendeu-se a extensas camadas da população - consoante já noutro lugar se pôs em foco.
Pelo que toca especialmente à defesa da saúde, o fenómeno assume -ainda maior acuidade, pois à quebra dos meios de existência alia-se aqui a, ameaça contra a vida e a integridade física.
Por outro lado - diz-se - a limitação do sistema de segurança aos trabalhadores por conta de outrem cria, de certo modo, um privilégio de classe, nefasto ao são equilíbrio social, e às próprias necessidades da economia.
No aspecto social, tal privilégio introduz uma forma discriminatória, que favorece a proletarização do trabalhador independente, do artífice, do pequeno proprietário - desprotegidos contra as contingências da vida e cujos recursos não são, de modo geral, superiores aos de muitos assalariados. Contribui-se, assim, para a dissolução progressiva das classes médias, ao invés da política que se afigura como a mais conveniente, se se quiserem contrariar as tendências colectivizantes da nossa época.
Sob o ponto de vista económico, o restringir-se a segurança social a uma parcela da população, que suporta o custo do sistema, não permite efectuar uma compensação nacional desse custo, nem uma justa e eficaz distribuição de rendimentos. Só estendendo a todos o direito è segurança, pode exigir-se que todos também contribuam, conforme as respectivas possibilidades, para assegurar o funcionamento do sistema.
A generalização da segurança traduz ainda na ordem política, uma forma concreta de realização do. princípio da solidariedade nacional.
Dir-se-á que, para as situações não abrangidas por um sistema de segurança de base laborai, existem a assistência e, o seguro facultativo. Mas aquela tem o próprio limite das suas possibilidades financeiras e está na dependência de apreciações discricionárias: não garante o direito a uma protecção suficiente. Além de que a exigência de provar a necessidade do auxílio, sobre ser para muitos uma humilhação, constitui, no fundo, um incentivo à imprevidência e um obstáculo à poupança. Por seu turno, o seguro facultativo pressupõe um forte instinto de previdência que não está, em parte alguma, generalizado.
O princípio da universalidade deve, porém, entender-se em termos hábeis. Antes do mais, representa essencialmente, um ideal, para que se caminha; sem querer significar que em todos" os países ele possa vir a ser rapidamente atingido.
Na sua realização tendência!, esse princípio pode comportar duas fases ou prosseguir um de dois objectivos, correspondentes aos dois conceitos, há pouco examinados (n.ºs 31 e 32), da política de segurança social:
a) Abranger no sistema todos os que desempenhem uma actividade profissional (trabalhadores por couta de outrem e por conta própria) e respectivas famílias;
b) Incluir todos os residentes, independentemente da situação económica ou modo de vida.
Entre estas duas modalidades, as- diferenças de ordem quantitativa .não são muito relevantes, pois a primeira deixa de fora .estratos sociais relativamente pouco numerosos. E noto-se que a protecção contra certas eventualidades - desemprego, acidenteis de trabalho, doenças profissionais - é, por natureza, restrita aos trabalhadores dependentes.

35. Há, no entanto, um ramo da segurança relativamente ao qual o princípio da universalidade exprime uma solicitação imperiosa dos nossos tempos. É o que se refere â prevenção, tratamento e reabilitação, no caso de doença. Numa palavra à defesa da saúde.
A doença põe em risco a integridade física, e o direito a esta representa uma garantia individual que a generalidade das constituições políticas explicitamente consagra. Por isso, o direito à saúde, que é afinal simples reflexo do próprio direito à vida e à integridade pessoal, inscreve-se, na actualidade, como «um dos direitos fundamentais dê todo o ser humano, sem distinção de raça,

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49 Cf. infra, n.º 34. Sobre o conceito, e os elementos da segurança social podem ver-se: P. Durand, ob. cit. pp. 14 e seguintes; Alan B. Fisher, Progrès éconamique et sccurité sociale, tradução francesa, Paris, De Medíeis, 1947, pp. 33 e seguintes; Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 5 e seguintes; André Getting, La sécuritc sociale, Paris, P. U. F., 1957, pp. 11-13; F. Netter, Notions es-senticllcs de sécuritc sociale Paris, Sirey, 1951, pp. 2a e seguintes; B. I. T., La sécuritc socialc, Genòve, 1958, pp. 13 e 14; Evelino M. Burns, Social sccurity and public policy, New York, 1950, pp. 4 e 5; José Gascon y Marin, Los pla-nes de scguridad social, Madrid, 1944, p. 19; Carmelo M. Lago, ob. cit., pp. 15 e seguintes; P. Laroque, «Lê plan francais de sécurité sociale», Re-vue F rançais e du Travail, Abril de 1946, pp. 9 e seguintes; e «De lassurance sociale à Ia sécurité sociale», Rgvue Internationale du Travail. Junho de 1948, pp. 623-625.

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de religião, de credo político, de condição económica e social»50.
«Todos os homens -escreve o falecido reitor da Universidade Católica de Milão,Fr. Dr. Agostino Gemelli - são iguais perante a doença; todos tem o mesmo direito aos meios necessários para defender a saúde; todos têm idêntico direito a utilizar os meios de prevenção»51.
A regra da universalidade implica, pois, neste aspecto, a extensão progressiva dos serviços sanitários de um sistema de segurança a toda a população.
Levanta-se aqui o problema da medicina colectiva ou social. Não se compadece, evidentemente, com a índole nem com o âmbito deste parecer o debate do assunto. Mas vale a pena ouvir, a tal respeito, embora referidos especialmente ao caso italiano, os luminosos ensinamentos do Prof. Gemelli, a quem acompanhamos de perto nas linhas seguintes.
Não é necessário planificar a medicina - diz Gemelli - para fazer com que ela corresponda às exigências do nosso tempo; mas também não se deve considerar a profissão médica como a entendia a concepção individualista do século passado.
Nos dias de hoje a medicina colectiva desenvolveu-se extraordinariamente, em detrimento da medicina individual. Os progressos do diagnóstico e da terapêutica, exigindo a cooperação de técnicas especializadas e cada vez mais complexas, colocaram o médico isolado em condições de manifesta inferioridade nos meios de acção. A medicina passou a ser essencialmente uma actividade de grupo e o hospital assumiu posição de primeiro plano na organização sanitária.
Estas profundas transformações dos conceitos da saúde como direito fundamental do indivíduo, que à sociedade cumpre garantir, e da medicina como técnica de equipa, implicam novos deveres por parte dos doentes, dos médicos e da própria comunidade.
Quanto aos doentes, é necessário educá-los. Todos, seja qual for a sua Condição social, devem persuadir-se de que no hospital podem encontrar tudo, o que é necessário para, o seu tratamento eficiente. A ideia do médico pessoal ou familiar - cuja, escolha tantas vezes se baseia em factos completamente estranhos à competência profissional - tende gradualmente a desaparecer. No hospital, O doente não é entregue aos cuidados de certo médico, porque dele lhe fizeram boas referências, mas a um corpo clínico designado mediante severas provas de aptidão e dirigido por profissionais experimentados. O elemento de confiança, que a moderna medicina psicossomática põe em relevo, nada tem a ver com o médico pessoal.
No que respeita aos médicos, cumpre reconhecer que nas Faculdades de Medicina não se ensina a função social do médico nem a sua contribuição para a segurança social. Cada médico sómente considera a sua actividade individual em face do doente, e um dos males da, medicina contemporânea está em que, para a maior parte dos médicos, o enfermo é um «cliente». As exigências da vida reclamam que o médico tenha todos os dias certo número de «clientes». Importa reformar estas concepções. É necessário abrir aos jovens licenciados possibilidades de justa retribuição e garantias de acesso. Naturalmente, não poderão comprar logo um
automóvel ou viver com largueza. Mas lima carreira hospitalar convenientemente organizada proporciona um futuro - que o sistema, tradicional não garante.
Enfim, há deveres essenciais da comunidade social em matéria de defesa da saúde. O princípio já acima se assinalou: - todas as pessoas, seja qual for a sua situação social ou económica, são iguais perante a doença; todas têm, o mesmo direito ao uso dos meios de tratamento e de prevenção.
Para realizar este objectivo - conclui Gemelli - torna-se imprescindível -, antes do mais, pôr em funcionamento uma rede hospitalar e de dispensários suficiente. Isso exige meios financeiros vultosos - e cumpre não perder de vista as possibilidades consentidas pela economia nacional. Mas é evidente que, no terreno da defesa da saúde, mais do que em qualquer outro, se torna mister dar expressão prática ao preceito da solidariedade entre todos os elementos da Nação52.
Não se diga que tudo isto equivale a «socializar» a medicina, a transformar o médico num funcionário ao serviço da comunidade, Medicina colectiva não é sinónimo de colectivização da assistência médica. Função social da medicina não significa burocratizarão da clínica. De modo nenhum se pretende que o Estado integre a classe médica num serviço público, nem que se impeça a livre escolha do médico pelo doente. Pretende-se, isso sim, sejam criadas as condições necessárias para que todos - independentemente da sua fortuna ou posição social - possam tornar efectivo o direito à saúde, tendo ao seu dispor uma organização que assegure, não apenas a prevenção sistemática das doenças, mas também, aos que a ela quiserem recorrer, meios completos e eficientes de tratamento e de recuperação para a vida activa. Trata-se de dever indeclinável da sociedade para com o indivíduo.
Nada disso, porém, contende com a livre escolha do médico, nem com o recurso à medicina curativa privada para todos aqueles que continuem a dar-lhe preferência.

36. Exposta a doutrina, vejamos agora as realizações53.
O primeiro país a dar efectivação completa ao princípio da universalidade para todos os riscos sociais foi a Inglaterra, através das leis baseadas no relatório Beveridge, a que se aludiu.
Alguns anos antes (1938), como também vimos, já a Nova Zelândia tinha estendido a todos os residentes, (excepto para o subsídio pecuniário na doença) a protecção contra os riscos sociais.
Nos restantes países, a tendência para a generalização do âmbito de beneficiários varia consoante as eventualidades cobertas, e a natureza - em dinheiro ou em espécie - das prestações.
a) Assim, no que respeita às prestações sanitárias na doença e maternidade, o sistema está generalizado a toda a população nos seguintes países: Austrália, Canadá (hospitalização) Islândia, Noruega, Suécia e Rússia.
Para os subsídios pecuniários nas mesmas eventualidades, nenhum país (nem a Inglaterra ou a Nova Zelândia) aplicou por ora o princípio da universalidade. A concessão do subsídio é normalmente restrita aos trabalhadores por conta de outrem (empregados e assalariados). Somente a Inglaterra abrange, neste aspecto, os trabalhadores independentes, mas o seguro é

50 Preâmbulo da Constituição da Organização Mundial de Saúde, aprovada em 22 de Julho de 1946 pela, Conferência Internacional da Saúde e ratificada por Portugal por Carta de 18 de Junho de 1948 (Diário do Governo n.º 151, 1.ª série, de 1 do Julho de 1948).
51 Fr. Agostino Gemelli, «La difesa della salute in un sistema di sicurezza sociale», Atti della XXIII Settimana Sociale del Cattolici Italiani, Bologne, 1949, p. 227.
52 Fr. Agostino Gemelli, ob. cif., pp. 209 e seguintes.
53 As referências pormenorizadas ao nosso país constam do capítulo III deste parecer.

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voluntário para os que aufiram rendimentos superiores a determinado montante.

Em 1959, cerca de 350 milhões de pessoas beneficiavam, nos diversos países, de regimes de protecção na doença e na maternidade.
b) Invalidez, velhice e sobrevivência. - A concessão de pensões nestes riscos está alargada a todos os residentes nos seguintes países: Austrália, Canadá (só velhice), Dinamarca (Só velhice e invalidez), Finlândia (invalidez, velhice e subsídio por morte), Inglaterra, Islândia, Israel (sem invalidez), Holanda (velhice), Nova Zelândia, Noruega, Suécia e Suíça (sem invalidez).
A protecção é comum a todos os trabalhadores, incluindo os independentes: na Áustria, Bélgica, Checoslováquia, França, República Federal da Alemanha, Luxemburgo, Estados Unidos da América e Uruguai.
São excluídos os trabalhadores rurais na maior parte dos países da América Central e do Sul, na Grécia, Japão e Turquia. Na Rússia estão fora do sistema geral os trabalhadores ocupados nas cooperativas agrícolas (kolkhoses), ou seja a grande maioria dos trabalhadores rurais. Só em 1958 foram estabelecidas normas para a constituição de caixas de socorros mútuos nos kolkhoses.
No conjunto mundial, o número de pessoas ao abrigo de regimes de protecção na invalidez, velhice e morte, andava, em 1959, ao redor de 200 milhões.
c) Riscos profissionais (acidentes de trabalho e doenças profissionais, desemprego). - Nestes sectores o princípio da universalidade sómente rege, como já se notou, para os trabalhadores por conta de outrem.
Relativamente aos acidentes e doenças profissionais, algumas legislações não incluem os trabalhadores agrícolas: v. g. Argentina, Bolívia, Canadá, Grécia, Estados Unidos, Venezuela e Vietname.
Pelo que toca ao desemprego, dos vinte e seis países que têm um sistema de cobertura deste risco, excluem os trabalhadores agrícolas os seguintes: Canadá, República Federal da Alemanha (contratados a longo prazo), Grécia, Japão, Luxemburgo, Espanha, Suíça, União da África do Sul e Estados Unidos da América.
d) Encargos familiares. - O sistema está generalizado a toda a população nos seguintes estados: Austrália, Canadá, Dinamarca(com limite de rendimento), Finlândia, Islândia, Irlanda, Nova Zelândia, Noruega, Suécia, Rússia e Inglaterra.
Abrangem todos os trabalhadores, incluindo os independentes: Bélgica, República Federal da Alemanha, Luxemburgo, Holanda e Uruguai.
Dos trinta e oito países com regimes de abono de família, sómente quatro, além de Portugal, excluem os trabalhadores agrícolas: Argentina, Marrocos, Polónia e Vietname 54.

37. Do rápido escorço que acaba de fazer-se, a propósito da execução do princípio da universalidade, verifica-se que a maior parte das exclusões (não referindo certos grupos mais restritos, como os trabalhadores domésticos e os ocasionais) diz sobretudo respeito a duas categorias: os trabalhadores, independentes (incluindo, designadamente, pequenos proprietários, rendeiros e parceiros rurais, pequenos artífices, comerciantes e industriais; artistas; profissionais livres) e os trabalhadores da agricultura.
As razões do facto continuam a ser as mesmas que já referimos a propósito dos sistemas de seguro social obrigatório (supra, n.º 12), embora a partir da guerra o número de países que praticavam uma ou outra daquelas exclusões tenha vindo progressivamente a reduzir-se.
No caso dos trabalhadores autónomos, à inexistência de um salário e à impossibilidade de quotizações bipartidas, acresce frequentemente a própria resistência dessa classe a sujeitar-se à inclusão obrigatória no sistema de segurança social 55.

C) Eventualidades

38. Ao definir o conceito de segurança social, frisou-se ser da sua essência a garantia contra determinados eventos típicos ou riscos, cuja classificação sistemática também se deixou feita (supra, n.º 32).
Sem dúvida que a política de segurança deve visar progressivamente à protecção contra todas essas eventualidades. E nem é outra a tendência revelada pelo direito comparado.
Daqui se deduz um segundo princípio fundamental dessa política - o principio da compreensividade.
Além daqueles riscos fundamentais, outros certamente podem e devem porventura- vir a ser acolhidos num sistema completo e orgânico de segurança social.
Para tanto, é mister, porém, tratar-se de eventos que reunam as condições de generalidade e tipicidade próprias dos riscos sociais, cabendo ao sistema jurídico definir os caracteres próprios de cada novo risco a englobar no sistema de segurança.

39. Pode fazer-se uma ideia de conjunto da tendência para a realização do princípio da compreensividade, por parte dos sistemas legislativos, através do quadro que seguidamente se insere.
Nele se compara, para os diversos riscos, o número de países com regimes de protecção, em 1940 e em 1960 56.

QUADRO I

[Ver quadro na imagem]

D) Prestações

40. Pelo que toca às prestações em espécie, ou, mais concretamente, às prestações sanitárias, quer de carácter preventivo (medicina preventiva, geral, me-

54 Sobre a matéria deste número: Social security programs, cit., Sintesi dei principali sistemi, cit.; Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 531 e seguintes; B. I. T., Annuaire des Statistiques du Travail, 1960, pp. 464 e seguintes.
55 Ver a respeito do princípio da generalização da segurança social: P. Durand, ob. cit., pp. 244 e seguintes; A. Venturi, ob. cit., pp. 327 e seguintes; A. Zelenka, Princípios fundamentales de la seguridad social, Organización Iberoamoricana de Seguridad Social, Madrid, 1959, pp. 12 e seguintes; Cari H. Farman, «Le développement dans lê monde dês prestations de sécurité sociale», Bullctin do VAssociatioii Intcrnat.ion.alc de Ia Sécurité Sociale, Novembro de 1956, pp. 467 e seguintes, e Outubro-Novembro de 1957, pp. 454 e seguintes.
56 Social security programs, cit., p. v. Ver também: A. Venturi, ob. cit., pp. 278 e seguintes; Carl A. Farman, art. cit., e A. Zelenka, art. cit., log. cit.; B. I. T, Informations Sociales; Annuaire des statistiqites du travail, 1960.

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dicina do trabalho, profilaxia de acidentes e doenças profissionais, etc.), quer de natureza reparadora (tratamento de doenças e reabilitação) - nenhuma dúvida de que a regra atrás examinada da tendência para a universalidade da sua concessão implica que elas sejam iguais (no sentido de igualdade de direitos) para todas as pessoas abrangidas pelo sistema de segurança social.
São expressos neste sentido os preceitos já referidos da Recomendação de Filadélfia e da Convenção sobre a norma mínima de segurança social, aprovadas pela Conferência Internacional do Trabalho.
Nos termos deste último instrumento, as prestações médicas devem compreender, pelo menos (artigo 10.º):

a) Em caso de doença:

1) Medicina geral e visitas domiciliárias;
2) O tratamento de especialistas, nos hospitais ou fora deles;
3) Os produtos farmacêuticos essenciais, sob receita médica;
4) A hospitalização, quando necessária.

b) Em caso de gravidez e parto:

1) Os cuidados pré-natais e a assistência durante o parto e o puerpério, por médico ou parteira diplomada;
2) A hospitalização, quando necessária.

Acrescenta-se que o beneficiário ou o chefe de família podem ser obrigados a participar no custo dos serviços médicos, dentro de limites razoáveis, e que as prestações devem tender a preservar, restabelecer ou melhorar a saúde da pessoa protegida, assim como a sua aptidão para o trabalho (artigo citado, n.ºs 2 e 3).
Os beneficiários dos sistemas de segurança social têm direito a prestações médicas correspondentes, pelo menos, àquele esquema, nos seguintes países: Austrália, Áustria, Bélgica, Bulgária, Canadá (hospitalização), Checoslováquia, Chile, Dinamarca, Espanha, França, República Federal da Alemanha, Grécia, Hungria, Inglaterra, Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Luxemburgo, Holanda, Nova Zelândia, Noruega, Polónia, Roménia, Rússia, Suécia, Suíça e Jugoslávia.
Em oito destes países, como vimos, as prestações sanitárias suo comuns a toda a população.

41. No que se refere aos benefícios pecuniários, já o problema apresenta outras dificuldades.
A prestação uniforme para cada tipo de risco, e para a totalidade dos beneficiários ou para certos grupos em que estes sejam classificados (sistema inglês), tem de calcular-se, conforme é sabido, em função do mínimo vital, tomando por base determinados orçamentos familiares-tipo ou outros elementos.
Como mérito desta fórmula costuma apresentar-se o de estimular a poupa nos e o recurso ao seguro facultativo para melhorar o "mínimo nacional".
Em contrapartida dir-se-á que dada a variedade infinita de réditos da população activa de qualquer país e o carácter sempre um tanto teórico com que se avalia o "mínimo vital", é perfeitamente possível que a prestação correspondente ao mínimo fixado seja porventura superior aos ganhos médios de determinados indivíduos ou grupos - designadamente se estes viverem em regime de subemprego, como sucede, com frequência, no trabalho rural.
A prestação de segurança "social" transforma-se então num incentivo à ociosidade - é "anti-social".
Por isso a Convenção Internacional sobre a norma mínima, de segurança social inclinou-se para o sistema das prestações em função dos ganhos (artigo 65,º).
Não obstante aqueles inconvenientes o sistema foi, como vimos, consagrado pela legislação inglesa, embora mitigado através do agrupamento da população em seis classes.
Para as pensões de velhice, o sistema da pensão nacional mínima, independentemente do rendimento ou situação social, foi perfilhado pela Nova Zelândia, Canadá, Finlândia, Dinamarca, Israel. Holanda, Noruega e Suíça. Nestes três últimos países, porém, o quantitativo da pensão varia consoante o volume de contribuições pagas.
Deve acrescentar-se que, na Inglaterra, a lei de 1959 sobre o seguro nacional prevê a concessão de pensões complementares da pensão mínima nacional, variáveis em função das quotizações pagas pelo segurado 57.
As objecções postas à prestação pecuniária uniforme não têm a mesma relevância em matéria de encargos de família. Aqui o regime generalizado é o de abonos, por cada familiar a cargo, de montante igual para todas as classes de beneficiários. Considera-se que o abono se destina a fazer face a despesas essenciais, cujo custo não apresenta diferenças sensíveis de classe para classe.

42. O princípio genérico que, em matéria de prestações, cumpre extrair do conceito de segurança social e das tendências da legislação contemporânea - é o da eficácia.
Significa o princípio da eficácia que os benefícios, concedidos devem corresponder, em qualidade e quantidade, às necessidades dos beneficiários, proporcionando uma protecção adequada e suficiente. Obstáculos de ordem económica ou financeira podem impedir a aplicação integral daquele princípio, mas,, sob o ponto de vista social, é preferível sacrificar a inclusão de um certo risco no sistema de segurança do que conceder prestações inadequada" ou insuficientes.
O mesmo princípio implica que as prestações se mantenham enquanto persistirem as consequências do risco a que respeitam, sob reserva apenas das condições necessárias (período de espera, por exemplo, na doença) para prevenir abusos.
Lê-se a este respeito em estudo recente: o Se o sistema abrange subsídios de doença - que argumentos de ordem social podem justificar a sua supressão :a partir de certo momento, ainda que o interessado continue impossibilitado de trabalhar e sofra de incapacidade permanente, sendo certo que a sua situação económica e a da família pioram à medida que a incapacidade se prolonga? A introdução do seguro doença conduz logicamente ao alargamento da protecção mediante pensões de invalidez" 58.
Põe-se aqui o problema da doença longa e o da sua articulação com a invalidez, tanto no aspecto da indemnização pecuniária como no dos serviços de tratamento - e reabilitação.
A tendência para eliminar o limite de duração nas prestações temporárias, nomeadamente nos serviços médicos e no subsídio de doença, é característica comum às legislações recentes de segurança social.
Estão neste caso a Austrália, a Bulgária, o Canadá (hospitalização), o Chile (para a tuberculose e doenças cardiovasculares), á França, a Inglaterra, a Nova Ze-

57 Ministry of Pensions and National Insurance, Provision for old age. The future áevelopment of the national insurance scheme, London, H. M. Staticnery Office, Cmnd. 538; Revue Internationale au Travail, "Lévolution du systeme national de pensions en Grande-Bretagne", Maio de 1960/pp. 527 o segs.
58 A. Zelenka, ob. cif., p. 12.

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lândia, a Noruega (para certo número de doenças), a Roménia, a Suécia, a Suíça (tuberculose), a Rússia e a Jugoslávia.

43. Outra linha geral de orientação do direito comparado nesta - matéria, também inspirada no princípio da eficácia, é a que visa a atribuir natureza familiar à maior parte das prestações, sobretudo às pensões. O quantitativo destas faz-se variar conforme a composição do agregado familiar do .pensionista.
No capítulo das pensões de velhice nota-se, além. disso, o pendor dos sistemas legislativos para estimularem o prolongamento da vida activa, mediante o carácter não compulsivo da reforma e a concessão de melhorias substanciais nos elementos de formação das pensões a. partir de determinada idade.
Por outro lado, em relação à generalidade das prestações, verifica-se a tendência para não fazer depender, rigidamente, a sua atribuição do pagamento anterior de um dado volume de contribuições, mas tão-sómente de determinado prazo de inscrição ou, em alguns sistemas, apenas de certo tempo de residência -no país.
O fundamento do direito aos benefícios passa, assim, á residir essencialmente no trabalho, isto é, no exercicio de uma actividade profissional, ou na simples residência, e não já na entrada de receitas - ao contrário do que sucedia no regime de "seguro", o qual fazia depender a prestação do prévio desembolso da contraprestação correspondente.

44. O mesmo princípio da eficácia das prestações "ponta outro traço dos modernos sistemas de segurança. É o da conservação do valor real dos benefícios perante as variações do custo da vida.
O princípio diz, sobretudo, respeito, como noutro lugar se referiu, aos benefícios, vitalícios ou de longo prazo (pensões) já subjectivados.
A regra do ajustamento automático ou semiautomático das pensões em. curso ao poder de compra da moeda - normalmente em função de índices do "custo da vida"- tem obtido consagração cada vez mais generalizada.
A introdução desta fórmula, é facilitada nos sistemas financiados pelo imposto, e bem assim quando o regime financeiro é o de repartição ou um regime misto em que - a repartição predomina.
Em todos estes casos, porém, é obviamente necessário acrescer as receitas na proporção do aumento da despesa.
No sistema de capitalização pura, a revalorização dos benefícios, sem agravamento de contribuições, sómente é viável na medida em que o rendimento dos capitais acumulados, graças à natureza das suas aplicações, acompanhe a variação dos preços. Fora desta hipótese, aliás difícil de se verificar em escala apreciável, apenas por meio de fontes de receita estranhas ao sistema (v. g. subvenções do Estado) será possível, naquele regime, reajustar as pensões ao valor da moeda.
Na actualidade, aplicam regras de adaptação automática (indexação) das pensões ao custo da vida os seguintes países: Bélgica (desde 1955: índice dos preços de retalho), Chile (desde 1952: índice dos salários), República Federal da Alemanha (desde 1957: índice dos salários), Finlândia (desde 1956: índice dos preços), França (desde 1948: índice dos salários) e Holanda (desde 1956: índice dos preços e dos rendimentos). Estão em estudo projectos de indexação na Inglaterra (em função dos salários e dos preços) e na Suécia, (em função dos ganhos).
O princípio da revisão por afeito de variações sensíveis do custo da vida foi também inscrito na Convenção Internacional sobre a norma mínima de segurança social (artigo 65, n.º 10) 59.

E) Receitas

45. Nesta matéria, e pelo que toca à origem dos meios financeiros da- segurança social, o princípio geral cios modernos sistemas legislativos é o da solidariedade ou compensação nacional do custo do sistema.
O princípio foi naturalmente levado às suas últimas consequências nos países em que o sistema de segurança, ou um dos seus ramos, se estendeu à totalidade da população: todos contribuem, directamente, por meio de taxas ou contribuições especiais, ou indirectamente, através dos impostos gerais, para o financiamento do sistema.
Se a protecção contra os riscos sociais se limita à população trabalhadora, as receitas são, como é óbvio, principalmente Constituídas por contribuições das empresas e dos empregados e operários, e ainda dos trabalhadores por conta própria, quando ao abrigo do sistema.
Ao lado das contribuições, a participação do Estado encontra-se, na quase totalidade dos países, normalmente ligada a um ou outro ramo do sistema de segurança.

46. Relativamente à base de incidência dos meios financeiros, a fórmula tradicional da percentagem sobre os ordenados e salários tende a perder importância, à medida que o ordenamento da segurança social vai alargando o seu campo de aplicação.
Quando todos ou determinados ramos de eventualidades abrangem o conjunto do agregado nacional - designadamente no caso das prestações sanitárias - os sistemas de financiamento, praticados pelas legislações são essencialmente dos seguintes tipos:

Taxa uniforme, per capita, para todos, ou para cada agrupamento de beneficiários;
Imposto especial sobre o rendimento;
Receitas gerais do Estado.

O regime das quotizações sobre salários e ordenados - próprio dos sistemas de seguro social restrito aos trabalhadores subordinados - tem sido objecto de variadas críticas.
Diz-se, em primeiro lugar, que ele representa uma forma de injustiça social, na medida em que, gravando com uma taxa proporcional os ganhos dos trabalhadores, vai onerar em maior grau os de salários mais baixos, em virtude do princípio da utilidade marginal. Tem assim o inconveniente dos impostos degressivos o qual se torna ainda mais saliente quando existe um limite superior (plafond) para a incidência das contribuições.
Depois, quanto às empresas, invoca-se a circunstância de as levar a reduzir o pessoal para diminuir os encargos sobre o custo de produção constituídos pelas. taxas sobre os salários. E, por outro lado esses mesmos encargos obstam frequentemente a que as empresas melhorem as remunerações dos seus trabalhadores.
Alega-se, ainda, que o sistema implica uma desigualdade de tratamento entre os vários ramos da actividade

58 A este respeito: E. Liefmann-Keil, "L'indéxation des prestations de sécurité sociale". Revue International du Travail, Maio de 1959, pp. 528 e seguintes; B. I. T., Objectifs et normes minina de sécurité sociale, Rapport IV. (1), Coriférence Internationale du Travail, 34 éme session, Genève, 1950.

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económica, onerando em medida maior aqueles que exigem mais larga proporção de mão-de-obra.
Enfim, a contribuição sobre os salários vai integrar-se nos elementos do custo de produção e, por consequência, tende a repercutir-se sobre os preços, desde que as condições do mercado o não impeçam. Então o peso financeiro do sistema de segurança social vem a ser, em última instância, suportado pelos consumidores, de que os trabalhadores são a grande maioria. O inconveniente acentua-se sobretudo no caso de se tratar de bens de consumo inelástico, isto é, destinados a satisfazer necessidades primárias ou generalizadas.
Quanto ao sistema da taxa uniforme, per capita, deve dizer-se que nele resulta ainda mais nítido o inconveniente da degressividade, apontado à contribuição sobre os salários. Tal sistema implica, logicamente, a concessão de prestações também uniformes. É, como se viu, o sistema inglês.
A fórmula do imposto pessoal sobre rendimento pode, como adiante se verá (§ 4.º deste capítulo), proporcionar melhor justiça distributiva, na repartição dos encargos da segurança social, e satisfazer mais amplamente os objectivos de redistribuição dos rendimentos. Mas a sua aplicação só se mostra admissível, à face dos princípios, desde que as prestações financiadas por esse sistema sejam comuns à generalidade da população.
Adoptam o financiamento pelo imposto sobre o rendimento, para um ou mais ramos da segurança social, os seguintes países: Austrália, Canadá, Checoslováquia, Dinamarca, Finlândia, Holanda, Noruega, Nova Zelândia e Suécia.
Por último, o financiamento por força exclusiva das receitas gerais do Estado tem o grave defeito de nele se perder a noção do custo do sistema, dando lugar à permanente insatisfação dos destinatários, e à tendência para se exigirem benefícios cada vez maiores.
O problema da incidência das contribuições para a segurança social assume aspectos particulares em relação aos chamados trabalhadores independentes.
Dada a impossibilidade de quotização bipartida e a ausência de ordenado ou salário, a fórmula geralmente adoptada é a de uma taxa sobre o rendimento, determinado pelos métodos usuais do direito fiscal ou por outro processo (República Federal da Alemanha, Estados Unidos, Israel, Suíça). Alguns países admitem a inscrição, à escolha do segurado, em um dos vários escalões de rendimentos previstos, aos quais correspondem, prestações pecuniárias proporcionais.
Quando o sistema abrange os trabalhadores rurais e equiparados, o método de financiamento apresenta também sérias dificuldades. A propósito dos seguros sociais tivemos ocasião de abordar o problema (supra n.º 12).
As legislações posteriores à guerra mantiveram, naquele sector, ,as fontes tradicionais, designadamente: quotas dos segurados, fixas ou variáveis com o salário; contribuições dos patrões, em regra percentagens sobre o rendi mento colectável ou o valor locativo das propriedades; subvenções do Estado; taxas sobre certos produtos agrícolas.

47. Pelo que toca, ao nível das contribuições, dir-se-á que ele depende:
a) Do esquema de eventualidades;
b} Do nível das prestações;
c) Das possibilidades económicas de cada país e das respeitantes às actividades abrangidas.
O princípio, orientador na. matéria deve ser o de procurar uma distribuição equitativa do custo do sistema.
Cumpre ter sempre presente que o funcionamento da segurança social não deve criar obstáculos ao desenvolvimento da economia e do rendimento nacionais, dos quais depende a sua própria base financeira.
Ao delinear o esquema de eventualidades, ao estabelecer as condições e o montante dos benefícios, assim como ao determinar o nível dás receitas e, consequentemente, o regime financeiro, deverá - como recomenda Zelenka - conceder-se às considerações de ordem económica tanta relevância como às de natureza social.
O melhor sistema não é necessariamente aquele que concede prestações mais vantajosas, mas sim aquele que outorga os máximos benefícios compatíveis com as exigências da economia geral e as de cada sector interessado 60.

48. Para concluir estas considerações esquemáticas sobre o problema das receitas da segurança social, incluem-se seguidamente dois quadros estatísticos.
O primeiro indica as percentagens sobre ordenados e salários, em países que adoptam aquele método de financiamento. Todos eles, excepto dois (Itália e Portugal), adicionam a essas receitas participações do Estado. Em alguns, tal participação tomou mesmo à sua conta um ramo completo do seguro (v. g., serviços de saúde, invalidez, desemprego).

QUADRO II

Receitas da segurança social

Ver Tabela na Imagem]

a) Não inclui o (mandamento do seguro do acidentes de trabalho o doenças profissionais, a cargo exclusivo do empresário.
(b) Não inclui os acidentes de trabalho o doenças profissionais, num as receitas para os montepios laborates e para o regime de plus familiar. Neste último as per contagens vão do 10 a 20 por cento dos salários.

Fontes: Istituto Nazionale dela Previdenza Sociale, Sintesi dei principali sistemi previdenziali del mondo. cit.; Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 546 e seguintes.

O segundo quadro revela qual o peso que as receitas da segurança social representam sobre o rendimento nacional, em certo número de países.

60 Sobre os vários problemas concernentes às receitas da segurança social ver, entre outros: B. I. T., Le financement de la sécurité soviale, Conférence Regionale Européenne, 1955, Rapport III, Genève, 1954; A. Zelenka, Princípios fundamentales, cit., pp. 14 e seguintes; H. Fars, Aspects financiers des ansurances sociales, Congrès de l'Institut International des Finances Publiques, 6ème session, 1950, pp. 269, e seguintes; P. Durand, Le financement de la sécurité sociale en Franco, Congrès cit., p. 339; e La politique contemporaine, cit., pp. 276 e seguintes; B. I. T., La sécurité sociale, cit., pp. 128 e seguintes; Doublet et Lavau, ob. Cit., pp. 307 e seguintes; A. Venturi, ob. cit., pp. 380 e seguintes; Association Internationale de la Sécurité Sociale, La sécurité sociale des travailleurs indépendants, Xème Assemblée Générale, Vienne, 1951, Rapport II, Genève, 1952; Revue Internationale du Travail, "La sécurité sociale dans l'agriculture", Fevereiro e Março de 1950.

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QUADRO III

Receitas da segurança social (a)

ver Tabela na Imagem]

a) Inclui as receitas do Estado e dos serviços autónomos destinadas à saúde, previdência e assistência.
Fonte: B. I. T., Le Coût de la Sécurité Sociale, Genève, 1958, pp. 161 e seguintes. As cifras deste quadro devem -como recomenda o B. I. T. - ser consideradas com as reservas inerentes a todas as comparações estatísticas internacionais, em virtude de os cálculos incidirem sobre dados que frequentemente não são da mesma natureza. Quanto a Portugal, é de notar que nas receitas da segurança social não se incluíram, por exemplo, as dos serviços e organismos autónomos oficiais de saúde e assistência fora da alçada do respectivo departamento, nem as do Fundo de Desemprego e as relativas às. instituições particulares de assistência e associações de socorros mútuos. Em contrapartida, o montante do rendimento nacional português utilizado para 1954. (produto nacional bruto ao custo dos factores) é inferior ao que resulta, do apuramento posteriormente publicado pelo Instituto Nacional de Estatística.

F) Equilíbrio financeiro

49. Nesta matéria, o princípio geral que em nossos dias tende a inspirar os sistemas de segurança é o da solidariedade entre as gerações, em paralelismo com a regra de solidariedade nacional que caracteriza a recolha de meios financeiros 61.
Nos sistemas tradicionais de seguro social, prevalecentes no limiar da última guerra, viu-se ser ainda dominante o regime da capitalização.
A evolução posterior, pondo em foco os perigos deste regime em face de depreciações monetárias rápidas e acentuadas - coma aquelas que as consequências do conflito provocaram em grande número de países -, conduziu os técnicos e os governos a procurarem orientar o financiamento dos sistemas de segurança social para o método da repartição.
O problema interessa especialmente, como também se observou, às prestações de velhice, invalidez e sobrevivência.
A tendência parece ser para o abandono da capitalização pura, sem limites no tempo - que punha exclusivamente a cargo de cada geração de segurados a constituição das suas próprias pensões -, estabelecendo-se planos de repartição, com a formação de certo volume de reservas, que garantam durante períodos razoavelmente longos (cinco a dez anos, em média) o execução dos compromissos assumidos - presentes e futuros -, tendo em conta as perspectivas da evolução demográfica.
Antes do termo de cada período, os cálculos actuariais são revistos no sentido de se prever quais as alterações necessárias - nas receitas ou nas despesas (esta última, hipótese de carácter mais teórico do que prático) - para manter o equilíbrio financeiro no período imediato.
A conveniência de não provocar agravamentos bruscos de contribuições de um período para outro aconselha a fazer os cálculos com a prudência e a margem necessárias para que a formação das reservas compense em cada período, quanto possível, a necessidade de tais agravamentos. Não poderão, todavia, evitar-se as dificuldades inerentes à revisão de contribuições em períodos de depressão económica, precisamente quando mais intenso se torna o recurso ao seguro, pela maior incidência de certos riscos (v. g. desemprego, doença). Trata-se, em suma, de regime misto entre o do prémio constante e o da repartição simples, que admite gama extensa de soluções intermédias, conforme se procure maior estabilidade dos prémios, ou contribuições mais baixas no período inicial.
O problema põe-se, tanto nos sistemas cujos meios financeiros provêm de percentagens sobre réditos do trabalho, como nos que são financiados por meio de impostos especiais sobre o rendimento. Esbate-se apenas nos casos - aliás raros - em que o sistema de segurança está integrado, na sua totalidade ou maior parte, no orçamento do Estado.
Note-se, por último, que, na escolha do método de equilíbrio financeiro, as razões de decidir não podem ser exclusivamente de ordem técnica ou de índole social, mas devem ter em vista, acima de tudo, as circunstâncias de natureza política, económica, e até psicológica, próprias de cada país - v. g. extensão do sistema de segurança, grau de desenvolvimento económico, situação do mercado de capitais, necessidade de financiar planos de fomento, etc.
Na actualidade, apenas quatro países praticam, aia Europa e Médio Oriente, o método da capitalização pura, sob a forma "colectiva" - a Bélgica, o Luxemburgo (artífices), a Turquia e Portugal.
A repartição - simples ou com pequenas reservas - é adoptada nos países cujos sistemas de previdência são exclusiva ou predominantemente financiados pelas receitas estaduais - Dinamarca, Irlanda, Polónia, Checoslováquia, TI. R. S. S., Inglaterra, Austrália, Canadá e Nova Zelândia -, bem como na França. Áustria, Islândia e Jugoslávia.
Nos restantes, funcionam regimes mistos, com as características genéricas acima resumidas e com maior ou menor predomínio de um ou outro dos dois métodos clássicos. Na República Federal da Alemanha, por exemplo, o equilíbrio financeiro é assegurado durante períodos de dez anos, devendo poder dispor-se, no fim de cada período, de montante igual às despesas de um ano. Fórmulas semelhantes vigoram na Itália, Suíça, Luxemburgo (operários), Israel, Irão, Espanha, Grécia, Japão e Estados Unidos 62.

61 Ver, por exemplo, Hans Achinger e outros, Los seguros sociales, tradução espanhola, Ediciones Eialp, S. A. Madrid, 1956, p. 243; Venturi, ob., cit., p. 395.

62 É abundantíssima a bibliografia sobre as questões que suscita o regime financeiro. Citam-se apenas: A. Zelenka, "Quelques remarques ser le regime financier", Conférence International des Actuaires et Statisticiens de la Sécu-rité Sociale, Bruxelles, 1956, tomo III, pp. 376 e seguintes; e "Gestione finanziaria dell'assicurazione pensioni", Previdenza sociale, Novembro-Dezembro de 1958; René Monin, Problèmes de la retraite - Débat capitalisation-répartition, Paris, 1958; B. I. T., Sécurité sociale, cit. pp. 118 e seguintes; Institut International de Finances Publiques, Aspects financiers des assurances sociales, 6ème session, Mónaco, Setembro de 1950; P. Durand, ob. cit., pp. 306 e seguintes; Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 331 e seguintes; A. Venturi, ob. cit., pp. 399 e seguintes; Association Internationale de la Sécurité Sociale, L'Assurance-vicillesse, XIIIème Assemblée Générale, Londres, Maio de 1958, Rapport III, Genève, 1958, pp. 80 e seguintes.

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C) Estrutura administrativa

50. O primeiro problema quê se põe, em matéria de estrutura administrativa de um sistema moderno de segurança social, é o do lugar, que nela cabe às formas de organização tradicionalmente utilizadas na defesa contra os riscos sociais - o seguro obrigatório, a assistência social, o seguro facultativo -, cujas linhas genéricas examinámos no capítulo anterior deste parecer. Para alguns, semelhantes formas são as mesmas a que a política de segurança social terá de recorrer para. aplicar aos nus próprios dessa política os meios técnicos adequados.
Segundo esta tese, a segurança social deverá realizar uma sistematização orgânica desses métodos, integrando num plano de conjunto os sistemas de seguro e de assistência. O seguro social obrigatório será o instrumento fundamental de efectivação da política de segurança. A assistência, designadamente na sua forma pública, representará o método supletivo e complementar dessa política - visando a ocorrer a casos especiais que se mostrem carecidos de auxílio, por não haver direito às prestações do seguro obrigatório, ou por se tratar de contingências não cobertas por este 63. Outra tese, mais recente, entende que a política de segurança social, para corresponder verdadeiramente ao fundamento e aos fins que informam o seu actual conceito, deve realizar-se através de um ordenamento unitário - essencialmente diverso dos métodos clássicos do seguro e da assistência.
Quanto ao seguro social - diz-se -, embora tendo de comum com ele a função de cobrir as consequências de determinados riscos, a política de segurança distingue-se sobretudo pela. posição que no seu ordenamento assume o Estado. Enquanto, no seguro, o Estado se limita a usar do seu poder de império para tornar obrigatória a formação de organismos e a inscrição de contribuintes e beneficiários, pertencentes a determinados grupos sociais, a quem incumbo normalmente o financiamento e a gestão do sistema, a segurança social impõe ao Estado muito mais largas responsabilidade".
Diferenças ainda mais fundas separam, na tese em exame, a segurança da assistência pública. Ao passo que a, outorga, dos benefícios assistenciais pressupõe prévia avaliação das necessidades do requerente através de acto administrativo discricionário e depende das possibilidades financeiras da entidade requerida, na segurança social o Estado assume obrigações definidas para com os indivíduos, aos quais é reconhecido o direito a determinadas prestações uma vez verificados os eventos previstos.
Para esta concepção, a política, de segurança social, na sua pureza, não utiliza como instrumentos de realização nem o seguro obrigatório nem a assistência pública. Tendencialmente dirigida ao conjunto da colectividade nacional, exige, logicamente, a criação de um serviço público instituído pelo Estado e financiado pelo imposto, sem embargo de o mesmo poder ser gerido por instituições dotadas de autonomia administrativa.
A colectividade nacional assumiria, nesta concepção, a natureza de uma grande mutualidade seguradora, e a atribuição das prestações far-se-ia na base de princípios de justiça distributiva, e não de justiça comutativa, como no seguro social 64.

51. Mais do que duas teses em presença, crê-se que estas fórmulas representam, antes, duas fases na evolução da política ide segurança social.
A primeira é a que corresponde às realidades presentes, na quase totalidade dos países.
A segunda pressupõe: 1.º a possibilidade dá aplicar todos os ramos da segurança ou, ao menos, um deles, à generalidade da, população; 2.º a concessão das prestações independentemente do tempo ou volume de contribuições pagas; 3.º o financiamento do sistema pelas receitas públicas ou por um imposto especial; 4.º a administração pelo Estado ou por organismos de direito público.
O único país em que pode dizer-se haver sido instituído um sistema de segurança, para o conjunto dos riscos sociais, sob a forma de serviço publico, foi a Inglaterra. É certo que, tanto no relatório Beveridge como na legislação que se lhe seguiu, se fala em "seguro nacional" (national insurance). Mas - nota justamente Alan T. Peacock: - é difícil encarar o sistema inglês como de genuíno "seguro", pois, "não existindo qualquer ligação directa entre prémios e riscos, ele assume, antes, a natureza de um serviço público financiado por um pool-tax e pelos impostos gerais" 65.
Nos restantes países, sòmente pode falar-se em "serviço público" quanto aos ramos da segurança social que reunam os requisitos acima, enunciados.
Estão neste caso, para os serviços de saúde, os países, atrás referidos, em que as prestações médico-sociais são comuns à generalidade da população, sem outra condição que não seja o eventual pagamento de certos bens ou serviços prestados: Austrália, Canadá (hospitalização), Islândia, Noruega, Nova Zelândia, Rússia e Suécia.
No que respeita às pensões, têm serviços públicos de "pensões nacionais", além da Inglaterra: o Canadá, a Dinamarca, a Finlândia, Israel, a Nova Zelândia e a Suécia. Na Holanda, Noruega, Suíça e na lei inglesa de 1959 sobre pensões complementares o sistema é mais propriamente de "seguro nacional", pois o quantitativo das pensões varia proporcionalmente ao número de anos de contribuição.
Nenhum país estabeleceu, para o subsídio de doença, o regime de serviço público nem o de seguro nacional. A fórmula generalizada continua a ser, na maior parte das legislações, como se referiu, o seguro obrigatório para determinados grupos sociais (trabalhadores por conta de outrem, em todos ou só alguns ramos de actividade; trabalhadores independentes). Em certo, número de países, aquele subsídio é concedido principalmente sob o regime de assistência pública 66.

52. A propósito das várias formas de organização dos sistemas de segurança, e quanto ao emprego do mé-

63 Neste sentido: B. I. T., Approaches to social security, Genève, 1948. pp. 83 e seguintes; Gascon y Marin, ob. cit., log. cit.; P. Laroque, Revue Internationale du Travail, Junho, 1948, cit. É também a orientação de Beveridge, National insurance and allied services, Report, cit., pp. 120 e 121: "A Plan for social security is outlined below, combining three distinct methods: social insurance for basic needs; national assistance for special cases; voluntary insurance for additions to the basic provision".

64 É a tese sustentada por A. Venturi, ob. cit., pp. 270 a 274, e 596 e seguintes. Em sentido semelhante: P. Durand, ob. cit., pp. 162 a, 165; Manuel de Torres, Teoria de la política social, Madrid, Aguilar, 1949, pp. 212 e seguintes; Prof. Eugenio Minoli, "Dal principio assicurativo contratuale alla sicurezza sociale", Atti della XXIII Settimana Sociale dei Cattolici Italiani, Bolonha, 1949, pp. 56 e seguintes; J. Perez Leñero, Fundamentos de la seguridad social, Biblioteca de Ciências Sociales, Madrid, 1956, pp. 147 e seguintes.
65 Alan T. Peacock, "The finance of British national insurance", Institut International de Finances Publiques, 6ème session, Mónaco, Setembro de 1950, p. 341.
66 Sobre este número: Social security programs, cit., passim.

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todo do "seguro social", tem-se levantado o problema de saber se determinadas prestações são susceptíveis de se acomodar tecnicamente ao mecanismo do seguro.
A questão interessa especialmente às prestações médicas.
Afirma-se que a transformação estrutural da medicina na actualidade, o encarecimento e complexidade crescentes dos meios de prevenção, tratamento e recuperação e, além disso, as modificações profundas que a própria morbilidade acusa em nossos tempos (rápida cura de certas doenças até ha pouco mortais, intensificação extraordinária de enfermidades outrora raras) fazem com que seja cada vez de mais difícil aplicação, na outorga de prestações sanitárias, o método do seguro social, que exige um mínimo de previsibilidade de eventos e de gastos.
Em estudo publicado pela Associação Internacional, de Segurança Social 67 observa-se que "a administração dos cuidados médicos pelo seguro social dá frequentemente lugar a particularismos que não se coadunam com a orientação da política da saúde em geral. Como o seguro não dispõe, em regra, da totalidade dos meios sanitários, os seus serviços clínicos têm o carácter de serviços incompletos, que não abarcam o complexo da protecção sanitária do segurado. A integração das prestações médico-sociais no seguro pode ser muito útil a este, mas nem sempre está em condições de permitir que os respectivos serviços possam caminhar no mesmo ritmo da medicina moderna, particularmente no domínio da investigação é da terapêutica, pelo facto de estas exigirem despesas de equipamento elevadas e quadros especializados".
Por seu turno, o relatório sobre o seguro-doencá apresentado, à 13.ª assembleia geral daquela Associação (Londres, Maio de 1958), insere os seguintes passos (p. 3): "O acréscimo constante das despesas do seguro-doença provoca, de um lado, a desproporção entre os direitos dos segurados e as taxas das contribuições e, de outro lado, a tendência para uma intervenção crescente do Estado. Em virtude destes factos, a noção de seguro esbate-se e o direito às prestações funda-se cada vez mais na necessidade destas. (...) Os dados do problema das prestações sanitárias são, na maior parte, exteriores ao seguro social, e isso explica que este não possa tomar, por si próprio, as providências requeridas para obter soluções satisfatórias".
Os receios suscitados quanto à perspectiva de acréscimos constantes do custo das prestações médicas, e à consequente imprevisibilidade de gastos, levou a Repartição Internacional do Trabalho, a empreender, em data recente, cuidadoso estudo do problema.
As conclusões do trabalho - que abrangeu quinze países, da Europa, Am eriças e Oceânia, com variados sistemas de segurança social - são esclarecedoras. Apontam-se as mais significativas:

1) Salvo em dois dos países estudados - França e Itália -, a evolução da despesa global com as prestações sanitárias não revelou tendência expansiva, e sim acentuada estabilização. Na Inglaterra, a curva é nitidamente descendente nos últimos anos;
2) Em todos os países examinados - quer o sistema fosse o de seguro social completado com a assistência pública, quer o de serviço nacional de saúde - o custo dos cuidados médicos por habitante, expresso em percentagem da capitação do rendimento nacional por pessoa activa, situou-se entre 1,75 e 2;
3) Em percentagem do montante do rendimento nacional o custo global das prestações sanitárias, em nove dos quinze países referidos, variou entre 3,6 e 4,5;
4) Tais encargos revelaram-se proporcionalmente mais onerosos nos países com serviços médico-sociais pouco desenvolvidos, chegando, por vezes, o custo por habitante a ser mais elevado do que naqueles que dispunham de estrutura sanitária completa;
5) Os serviços de internamento hospitalar são, de longe, os mais dispendiosos, representando cerca de metade do custo total. Nos países com regimes de seguro social restrito aos trabalhadores dependentes, as contribuições patronais e operárias não podem suportar por si só o financiamento daqueles serviços;
6) A limitação no tempo do direito às prestações sanitárias não parece trazer baixa sensível do seu custo 67a.

Os resultados deste estudo servem, antes do mais, para pôr em relevo um princípio fundamental, em matéria de serviços sanitários, que anda frequentemente esquecido. É que o custo desses serviços não é um custo novo, quando eles passam a ser prestados por intermédio de um sistema de seguro social ou de um serviço público de saúde. Na hipótese de tais organizações não existirem, é sempre a economia nacional que, em última análise, tem de suportar - através das famílias, das empresas, da assistência particular e pública - os encargos com o tratamento dos seus doentes e inválidos. Simplesmente, dada a tradicional insuficiência destes meios de combate à doença, o respectivo custo exprime-se, sobretudo, por elevadas quebras de produtividade - resultado do número maior de dias de trabalho perdido, do baixo rendimento dos trabalhadores deficientemente tratados, do peso morto de milhares de indivíduos não recuperados para a vida activa.
O maior custo monetário dos sistemas de seguro ou de serviço público é afinal mera aparência, pois a falta desses regimes pode ficar na realidade muito mais cara à economia nacional.
Do mencionado estudo internacional cumpre ainda, concluir não serem razões de ordem financeira que tornam) porventura, inadequado o método do seguro na cobertura das prestações sanitárias. É, acima de tudo, o imperativo do nosso tempo, atrás posto em relevo (supra, n.º 35) - de a sociedade dever assegurar a todos condições idênticas de defesa da saúde e de combate à doença-, que parece conduzir à preferência pelo sistema do serviço publico na concessão daquelas prestações.
Isto, porém, não significa que o serviço público de saúde implique a gestão estadual, antes tudo aconselha seja confiado a organismo administrativa e financeiramente autónomo, em cujos, corpos gerentes haja representantes de contribuintes e beneficiários. Para tanto, deverá o serviço ser sustentado .por receitas próprias, provenientes de imposto especialmente afecto

67 Z. Petrovic, "La coordination et la collaboration entre les différentes branches de la sécurité sociale", Bulletin de l'Association Internationale de la Sécurité Sociale, Novembro de 1956, pp. 461 e seguintes.

67a B. I. T., Le coût des soins médicaux - Études et documents, nouvelle série, n.º 51, Genève, 1959, pp. 94, 96 a 98, 160-161 e 187 a 192. Ver também: Laura E. Bodsner, "Quelques observations ser les causes du déficit des services de soins médicaux", in Bulletin de l'Association Internationale de la Sécurité Sociale, année XIII, Avril-Mai 1960, pp. 228 e seguintes.

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a esse fim, além da participação, em certa medida, dos utentes no custo dos serviços, prestados.
Mas a organização de um serviço público de saúde reclama, necessariamente, a disponibilidade de meios materiais e humanos - instalações, equipamento, pessoal médico e auxiliar - em condições e volume suficientes para atender a toda a população do País. E assenta no pressuposto de que a economia nacional pode suportar o esforço financeiro correspondente.
Enquanto tais condições não se verificarem, deverão manter-se os serviços sanitários do seguro social, pois este constitui ainda o método técnica e socialmente mais apropriado para o alargamento progressivo daqueles serviços ao comum da população, procurando entretanto coordenar-se, por forma eficiente, a actividade dos sectores responsáveis pelo seguro e pela saúde publica.
Não seria admissível, à face dos princípios, a integração dos serviços médicos do seguro social, como tais, no departamento responsável pela saúde pública, sob pena de se confundirem prémios de seguro e receitas do Estado, com todos os inconvenientes de ordem financeira e social daí resultantes.
O funcionamento de um serviço nacional de saúde implica, por definição, o abandono do regime do seguro, devendo, consequentemente, as prestações sanitárias deixar de fazer parte do respectivo esquema.
Adiante (n.º 94) ter-se-á ocasião de examinar mais detidamente o assunto à face do caso português.

53. Do exposto resulta que, no estádio presente dos sistemas nacionais, a política de segurança social utiliza, essencialmente, três formas ou métodos de realização:

a) O seguro social obrigatório;
b) A assistência social;
c) O serviço público.

Nos países em que predomina, o primeiro método - países latinos, Alemanha Ocidental, Suíça, Áustria, Grécia - a assistência social (pública e particular) assume função integradora e supletiva.
Podem ainda aditar-se o "seguro social facultativo", como instrumento complementar daquela política na generalidade dos países, e o regime da "responsabilidade patronal" para os acidentes de trabalho e doenças profissionais, nos países em que não é ainda obrigatória a transferência para o seguro (v. g., Bélgica, Irlanda, Líbano, Síria, Paquistão, Portugal, e diversos da América Latina).
No emprego dos referidos processos de organização, a política de segurança deve orientar-se por outro princípio fundamental, que hoje se tornou também uma constante da legislação e da prática na generalidade dos países.
Esse princípio é o da unidade.
Representa lógico corolário, não apenas do conjunto de princípios anteriormente examinados - universalidade do - sujeito, compreensividade do objecto, eficácia das prestações, solidariedade nacional dos meios financeiros no espaço e no tempo -, mas, acima de tudo, do próprio conceito de segurança social, como sistema unitário de meios e fins.
Só uma acção coordenada, dentro de um plano de conjunto, pode assegurar a articulação harmónica dos meios aos fins da política de segurança, e a execução progressiva dos princípios que a norteiam.
Desta regra essencial da unidade decorrem duas consequências principais:
A primeira é a de que as diversas formas de organização ou meios de ordem superior que estruturam o sistema de segurança - o seguro social, a assistência,
o serviço público - devem ser partes integrantes de um todo, e isso impõe a coordenação estreita dos respectivos planos de acção.
A segunda consequência é a de que, dentro, de cada um daqueles sectores, a estrutura, administrativa deve obedecer também ao critério da unidade orgânica e da acção coordenada.
Importa examinar mais de perto cada uma destas duas ordens de consequências.

54. O processo histórico de formação dos modernos sistemas de segurança social, tal como o percorremos sumàriamente no capítulo i deste parecer, explica que, em certos países, a direcção superior dos sectores do seguro social obrigatório, da assistência e dos serviços públicos conexos se mantenha distribuída por departamentos independentes.
É o sistema ainda prevalecente nos países latinos, entre os quais Portugal, e também na Grécia, Turquia, Irão e Israel.
A coordenação entre os vários departamentos obtém-se normalmente, com maior ou menor eficiência, através de dispositivos legais que visam a estabelecer a ligação de certos serviços e a evitar sobreposições de esferas de acção, ou mediante acordos entre os serviços e organismos interessados.
A fórmula de uma comissão interministerial foi proposta no relatório Beveridge para assegurar a coordenação entre o Ministério da Segurança Social, responsável pela administração dos subsídios e pensões, e o Ministério da Saúde Pública, a que ficava confiado o serviço nacional de saúde.
A separação entre o departamento encarregado do serviço de prestações pecuniárias, incluindo as de natureza assistencial, e o sector das prestações médicas foi a fórmula adoptada, não só pela Inglaterra, mas por alguns dos países que organizaram serviços de saúde completos para o comum da população (Austrália, Nova Zelândia, Rússia).
Noutros países preferiu-se a solução, sem dúvida mais perfeita, de confiar o conjunto dos serviços de segurança social a um só Ministério, responsável por toda a política social. É, por exemplo, o caso da Áustria (Ministério Federal da Administração Social), do Canadá (Ministério da Saúde e Bem-Estar), do Chile (Ministério da Saúde, Previdência e Assistência), da Dinamarca (Ministério dos Assuntos Sociais), do Egipto (Ministério dos Assuntos Sociais), do Equador (Ministério da Protecção Social e do Trabalho), dos Estados Unidos da América (Departamento da Saúde, Educação e Previdência), da Holanda (Ministério dos Assuntos Sociais e Saúde Pública), da Islândia (Ministério dos Assuntos Sociais), do Japão Ministério da Saúde e Bem-Estar), do Peru (Ministério da Saúde, Previdência e Assistência Social); da Noruega e da Suécia (Ministérios dos Assuntos Sociais) 68.

55. O outro plano em que se projecta o. princípio da unidade administrativa é o que respeita a cada sector individualmente considerado.
Como se viu, tanto as instituições de seguro social como as de assistência particular tiveram, na maioria dos casos, origem associativa. As primeiras, sobretudo, nasceram por iniciativa de organizações profis-

68 Veja-se: W. Beveridge, Social insurance and allied services, cit., pp. 6, 11, 22 e 23, 67 e seguintes, 145 p. seguintes; P. Durand, ob. cit., pp. 382 e seguintes; A. Venturi, ob. cit., pp. 406 e seguintes; Social security programs, cit.: Z. Petrovic, "La coordination entre les différentes branches de la sécurité sociale", cit., pp. 458 e seguintes.

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sionais ou patronais, de mutualidades, e, ao longo dos anos, conservaram na essência idêntico campo de acção. Mesmo quando provieram de acto dos poderes públicos, frequentemente o Estado lhes atribuiu também índole profissional ou lhes fixou o âmbito de toda uma actividade económica. E ainda, por vezes, essas instituições administravam apenas um ou outro ramo do seguro.
Semelhante processo histórico deu lugar à multiplicidade dos organismos, dificultando os esforços no sentido de imprimir unidade à política de segurança e integral o sistema num plano de conjunto.
Pelo que toca em especial ao seguro obrigatório, os inconvenientes de o sistema assentar exclusivamente em instituições de base profissional ou por sectores de actividade são, sobretudo, de ordem técnica e de ordem social.
Antes do mais, a organização profissional ou económica impede a compensação dos bons e maus riscos, que é da essência do seguro. Assim, umas instituições terão de suportar, em certas profissões e indústrias, riscos mais frequentes ou onerosos, o que exige maiores receitas do que nas restantes - porventura excessivas para os segurados - ou a diminuição dos benefícios, sem o que a instituição estará condenada ao déficit.
Ora, estas consequências são contrárias ao sentimento de igualdade de sacrifícios e vantagens que está na base de uma sã justiça social.
Para obviar a tal inconveniente, utiliza-se, por vezes, o sistema da compensação financeira entre instituições, ou o do alargamento do respectivo âmbito a categorias profissionais ou actividades diferentes - o que equivale, na prática, a desvirtuar o princípio do campo de acção profissional ou económico.
Do ponto de vista administrativo, a organização deste tipo acarreta a fragmentação da actividade sanitária do seguro social e a sobreposição de instalações e serviços. Isso contraria a gestão económica do sistema, dá lugar a conflitos de competência entre as instituições e estimula a fraude por parte dos beneficiários.
A disparidade de contribuições e benefícios entre instituições tem ainda outro efeito nefasto: o de provocar deslocações de trabalhadores para certas zonas, sem correspondência com acréscimos de procura de mão-de-obra nas actividades aí instaladas. É, por exemplo, um dos factores do êxodo rural, quando: as instituições próprias dos meios agrícolas concedem benefícios inferiores às dos meios urbanos.
Estas circunstâncias, além de outras, levaram a considerar preferível, para o seguro obrigatório, uma organização de base que obedeça a um princípio unitário e de compensação intersectorial.
Nesse sentido, a fórmula geralmente tida por mais satisfatória é a do âmbito geográfico, sem prejuízo da coordenação orgânica do sistema no seu conjunto.
A natureza própria das prestações a curto prazo (serviços sanitários, subsídios de doença, maternidade, desemprego e abono de família), exigindo contactos frequentes e directos entre a entidade que concede a prestação e o beneficiário, impõe uma acentuada- descentralização dos serviços.
A descentralização, porém, não deve obstar, por um lado, à unidade administrativa dos vários ramos do seguro (sem prejuízo da respectiva contabilidade separada) e, por outro lado, à compensação geral do custo do sistema. Estes dois aspectos têm de ser coordenados no plano nacional.
No tocante ao seguro-pensões (invalidez, velhice, sobrevivência), o contacto com os interessados é necessário no momento da subjectivação do direito à pensão.
Já o pagamento periódico desta pode ser assegurado a distância (cheque, vale do correio, etc.).
Nas pensões de invalidez, exige-se ainda, de vez em quando, a verificação ido estado do inválido e, iras de velhice, a prova ide vicia, em regra feita mediante a apresentação do pensionista.
Trata-se, no entanto, de contactos relativamente pouco frequentes, susceptíveis de serem assegurados pelos mesmos órgãos periféricos que administram os outros ramos do seguro.
A compensação nacional do custo do sistema implica, neste sector dos seguros diferidos, não só a existência de um Órgão integrador no plano nacional, mas a própria centralização dos meios financeiros.
Escusado acentuar que semelhante organização não proíbe, antes aconselha, que as instituições territoriais disponham de certa autonomia administrativa e financeira, sem embargo da necessária observância dos princípios da unidade orgânica e da compensação nacional. E que nos respectivos corpos gerentes, assim como nos do órgão central, intervenham delegados dos contribuintes e beneficiários, designados pelos seus organismos representativos.
A estrutura que acaba de resumir-se diz naturalmente respeito à organização básica do seguro social, destinada à concessão de benefícios generalizados e, por isso mesmo, correspondentes a certos níveis considerados mínimos. Acima destes, deve reconhecer-se às empresas e aos organismos económicos e profissionais o direito de criarem instituições de inscrição obrigatória, com vista a melhorar os esquemas de base, observadas as condições legais.
A tal respeito é eloquente o caso inglês, posto em relevo na proposta de lei apresentada ao Parlamento sobre as pensões de velhice, de que resultou a citada lei de 1959 sobre o seguro nacional. Foi extraordinário o desenvolvimento, em Inglaterra, aios últimos anos, das instituições de base empresarial ou corporativa (ocupational sehemes), criadas por iniciativa dos interessados para completar o esquema nacional de base.
No que se refere aos sectores da assistência social e dos serviços públicos de segurança, quando existam, é evidentemente válido o mesmo princípio da unidade de direcção e coordenação, sem prejuízo da necessária autonomia que deve ser reconhecida às respectivas instituições e organismos, e da ampla descentralização dos que se destinem a assegurar as prestações sanitárias 69.

H) Síntese dos princípios da segurança social

56. À semelhança do que se fez no final do capítulo i, a propósito dos sistemas de protecção social no limiar da última guerra (supra, n.º 24), julga-se útil resumir neste momento as tendências gerais em que se enquadra a moderna política de segurança social:

a) Quanto ao campo de aplicação:

Tendência para a progressiva generalização dos sistemas de segurança social a todos os residentes no país ou, pelo menos, a todos os que exerçam uma actividade profissional (trabalhadores por

69 Ver: B. 1. T. La sécurité sociale, cit., pp. 145 e seguintes; P. Durand, ob. cit., pp. 242 e seguintes e 349 e seguintes; Alan B. Fisher. ob. cit., pp. 133 e seguintes; Revue Internationale du Travail, "Les tendances de la sécurité sociale", cit., Julho de 1949, pp. 41 e seguintes, A. Venturi, ob. cit., pp. 412 a 414; Ministry of Pensions und National Insurance, Provision for Old Age, cit., pp. 7-8.

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conta de outrem e independentes) e respectivos familiares (princípio da universalidade); Carácter mais imperioso daquela tendência no tocante à defesa da saúde (prestações sanitárias).

b) Quanto às eventualidades:

Tendência para cada sistema nacional abranger na protecção todos os riscos específicos da vida social (princípio da compreensividade);
Manutenção da regra da definição legal dos tipos de eventualidades abrangidas pelo sistema de segurança (tipicidade).

c) Quanto às prestações:

Seja qual for a sua natureza, devem assegurar uma protecção adequada e suficiente (principio da eficácia).
Aplicações deste princípio:

1) Quanto às prestações em geral - tendência para não limitar a sua duração enquanto se mantiverem, as consequências da eventualidade a que respeitam, e para não condicionar rigidamente a concessão ao pagamento anterior de certo volume ou tempo de contribuições;
2) Quanto às prestações médicas - organização de serviços de defesa da saúde (prevenção, tratamento e reabilitação) completos, eficientes e iguais para todos os grupos sociais abrangidos pelo sistema;
3) Quanto aos subsídios em dinheiro - tendência para que eles representem certas fracções dos réditos anteriores à verificação do risco, quer em função do salário, quer de classes de rendimento;
4) Quanto às pensões - regra idêntica à dos subsídios «m dinheiro ou, em certos países, fixação de pensões mínimas nacionais uniformes; tendência geral para atribuir carácter familiar às pensões e para admitir o reajustamento das subjectivadas às variações sensíveis do custo da vida.

d) Quanto aos meios financeiros:

Propensão, para substituir o sistema das quotizações sobre salários por impostos especiais sobre o rendimento, quando um ou mais ramos da segurança se estendem à generalidade da população (principio da solidariedade nacional).

c) Quanto ao regime de equilíbrio financeiro:

Tendência para passai do regime de capitalização pura ao de repartição mitigada, mediante prémios escalonados por períodos relativamente longos - cinco a dez anos (princípio da solidariedade entre as gerações).

f) Quanto à estrutura administrativa:

1) Nas formas gerais de organização - evolução previsível no sentido de os regimes de seguro social, até agora dominantes na maior parte dás legislações, e os de assistência pública, prevalecentes noutros países, cederem gradualmente o lugar à organização de serviços públicos, na medida em que seja possível alargar um ou mais ramos de eventualidades e prestações ao comum da população, sem dependência do pagamento anterior de certo volume ou tempo de contribuições e da situação económica dos beneficiários. Aquela evolução é mais instantemente reclamada no caso das prestações médicas e pensões de velhice;
2) Na orgânica institucional - tendência generalizada, para a unificação administrativa e a coordenação central do sistema, quer no sector sob a forma de serviço público, quer nos de seguro social ou assistência pública, com ampla descentralização, sempre que necessário (princípio da unidade);
No sector do seguro obrigatório, o princípio implica a unificação das instituições na base geográfica, coordenando-se, no plano nacional, a administração e o custo do sistema - sem prejuízo da criação de instituições de base empresarial ou corporativa destinadas a melhorar os esquemas da organização nacional ou a enquadrar certos grupos sujeitos a condições particulares.

§ 4.º

Segurança social e economia nacional

57. Todo o sistema de segurança social, na medida em que determina, por um lado, a absorção de amplos meios financeiros e, por outro, a outorga de prestações (dinheiro, bens, serviços) igualmente vultosas, exerce profunda influência Sobre a economia nacional, quer no aspecto da produção, quer no da distribuição e consumo da riqueza.
Importa, por isso, examinar, ainda que de modo sumário, as relações entre a política de segurança social e a economia - tendo em vista o sistema de economia de mercado.
Convém focar, separadamente, os efeitos económicos:

a) Da recolha do contribuições;
b) Da acumulação de fundos;
c) Da outorga das prestações.

A) Efeitos económicos da recolha de contribuições

58. 1) No aspecto da incidência dos meios financeiros, põe-se em primeiro lugar a que respeita às quotizações sobre salários pagas pelos trabalhadores.
O encargo constituído por essas quotas equivale, no fundo, a um imposto sobre o rendimento e pode, em maior ou menor grau, ser transferido para a empresa, consoante as condições do mercado de trabalho e a posição relativa das organizações sindicais (patronais e operárias).
Se a procura exceder a oferta de mão-de-obra, ou os organismos representativos dos trabalhadores dispuserem de maior força contratual, é de prever que uma parte, ao menos, das contribuições, operárias seja repercutida sobre as empresas.
No caso contrário, não haverá transferência, e o encargo será integralmente suportado pelos trabalhadores - aliás, a hipótese que mais frequentemente se verifica.
Relativamente às contribuições sobro salários a cargo das empresas, podem elas repercutir-se sobre os trabalhadores, implicando uma diminuição dos salários ou impedindo a sua melhoria, assim como podem incorporar-se no custo de produção e assumir, neste caso, a natureza de um imposto indirecto sobre o consumo. O primeiro efeito está condicionado pelos mesmos factores acima examinados para as contribuições operá-

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rias. O segundo traduz-se por uma maior ou menor elevação dos preços de venda, consoante as condições do mercado dos respectivos produtos e a elasticidade da procura. Em semelhante caso, a entidade que, de facto, paga as contribuições para a segurança social é o consumidor.
Este último fenómeno, dada a sua generalidade, requer, porém, mais algumas reflexões.
De modo esquemático, pode dizer-se que, se se trata de produtos de procura rígida (bens primários ou de consumo generalizado) e não sujeitos a tabelamento, o peso daquelas contribuições é, em princípio, integralmente suportado pelo comprador, mas o consumo desses bens não sofre redução sensível.
Se, ao invés, a procura reveste certa elasticidade, são de esperar contracções do consumo e, então, uma parte do ónus das quotizações ficará a cargo das empresas que não consigam escoar suficientemente a sua produção. Numa segunda fase, pode o fenómeno repercutir-se sobre os trabalhadores, se as empresas não conseguirem reajustar os seus custos sem reduções sensíveis nos efectivos de mão-de-obra.
Esta última consequência é, no entanto, susceptível de ser compensada, em certa medida, por virtude dos acréscimos de consumo que o fluxo, das prestações de segurança social proporciona ao mercado.
2) A outra forma, hoje progressivamente adoptada, de recolha de meios financeiros para a segurança social, é, como vimos, a do imposto especial sobre o rendimento.
Na parte a cargo dos beneficiários, as repercussões desta modalidade de financiamento não divergem muito das das quotizações sobre salários. Vão incidir principalmente sobre a procura de certos bens e serviços, na medida em que o imposto provoque redução dessa procura pelos contribuintes. De outro lado, porém, a outorga de prestações fará incrementar o consumo de outros bens e serviços. O resultado final será uma alteração das curvas de oferta e procura, com os inerentes reflexos na produção.
Relativamente às empresas, o imposto sobre o rendimento com destino à segurança social, se incidir em rendimentos líquidos, ou seja, nos lucros efectivamente realizados, não constitui elemento do custo marginal e, portanto, não irá repercutir-se sobre os preços. Sòmente a longo prazo e dadas certas circunstâncias - v. g., tributação desigual de lucros entre vários ramos de actividade de molde a provocar transferências de capitais - aquele imposto pode, através de uma redução da oferta nas actividades desfavorecidas, provocar encarecimento rios preços de venda.
Já um imposto, não sobre rendimentos líquidos, mas sobre lucros presumidos, é susceptível de repercutir-se sobre os preços e ter, por consequência, os mesmos inconvenientes que acima apontámos às contribuições patronais sobre os salários.

59. Considerando agora a economia nacional no seu conjunto, deve dizer-se que a recolha de meios financeiros tem, como pressuposto e como limite, o nível do rendimento nacional.
O ónus representado pelas contribuições para a segurança social não deve acarretar obstáculo ao regular desenvolvimento do produto nacional, sendo certo constituir este a própria fonte onde se alimenta o sistema de segurança.
Designadamente, não poderá aquele ónus, pelo seu nível excessivo, contrariar o espírito de iniciativa do empresário, a justa compensação do capital, a formação da poupança e o estímulo ao aperfeiçoamento da organização técnica e económica das empresas, no sentido do acréscimo da produtividade e da redução dos custos.
A percentagem que as receitas da segurança social representam sobre o rendimento nacional pode variar, e varia, efectivamente, de Estado para Estado, conforme resulta das cifras que noutro lugar se inseriram (supra, n.° 48). Isso depende, essencialmente, do grau de desenvolvimento económico de cada país e da extensão dos respectivos programas de segurança social. Mas, no fundo, o que interessa é que essa percentagem não se agrave em ritmo mais acelerado do que o correspondente ao acréscimo do produto. E, quanto ao seu valor absoluto, é evidente que os países com baixo rendimento nacional não podam aplicar a fins de segurança a mesma proporção desse rendimento que os países ricos e economicamente evoluídos.
A política de segurança deve, pois, ser concebida e executada de modo a acompanhar, e não a preceder, a elaboração e aplicação dos planos de desenvolvimento económico.

B) Efeitos económicos da acumulação de fundos

60. O problema da aplicação dos valores acumulados pela segurança social e dos seus efeitos na economia põe-se exclusivamente em países que conservam o regime financeiro da capitalização pura, ou outro com forte proporção de reservas.
Os reflexos económicos desses capitais consistem, de modo geral, em pressões deflacionistas, sendo certo implicarem uma poupança forçada e uma recolha de meios de pagamento em montante superior ao representado pela outorga das prestações.
Isso sucede nomeadamente na parte em que tais dinheiros estejam investidos em acções e obrigações de empresas privadas, pois à produção acrescida que esses capitais promovem não corresponde, caeteris paribus, incremento generalizado de meios de pagamento.
Sòmente na medida em que os mesmos fundos, quando aplicados em títulos do Estado, sejam utilizados por este em despesas de consumo, pode aquele efeito deflacionista ser contrariado.
É claro que semelhante efeito tem inconvenientes para a regular expansão económica quando ultrapasse certos limites ou se mantenha por períodos longos, como é próprio dos regimes de capitalização. Mas, por outro lado, não deve esquecer-se que, nos países com penúria de capitais e necessidades prementes de desenvolvimento económico, a acumulação de fundos da segurança social permite, em apreciável medida, financiar programas de fomento, e, portanto, repercutir-se favoràvelmente em toda a economia nacional.
Em contrapartida, torna-se necessário evitar que a desacumulação de reservas, resultante da tendência, hoje marcada, para substituir aqueles regimes por outros em que predomina a repartição, seja feita bruscamente, a fim de prevenir reflexos inflacionistas - regra geral mais nefastos do que os contrários.

C) Efeitos económicos da outorga das prestações

61. Resta aludir aos influxos que a concessão das prestações de segurança social determina na economia.
Enquanto a recolha e aplicação dos meios financeiros se repercute mais directamente no domínio da produção de bens e serviços e no do volume de emprego, o recebimento de prestações - em dinheiro e em espécie - tem efeitos simultâneamente sobre a produção, a distribuição e o consumo.
É no aspecto da produção que principalmente incidem as críticas sobre os reflexos danosos da segurança

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para o desenvolvimento da economia e para o equilíbrio social.
Afirma-se que, quanto mais se alarga a protecção contra os riscos sociais, mediante amplos benefícios dispensados pelos sistemas de segurança, tanto mais se contribui para debilitar a iniciativa, enfraquecer o sentido da responsabilidade individual, perante as vicissitudes da vida, estiolar o sentimento de previdência e o espírito de poupança.
A degradação destas qualidades - acrescenta-se - é fatal para a economia, porque conduz inevitàvelmente à diminuição do rendimento nacional. E os primeiros a sofrer as consequências serão precisamente os que se procura defender através da segurança social.
Mas o argumento não convence. Como nota o Prof. Francesco Vito, o rendimento- nacional depende, sem dúvida, da iniciativa individual, do gosto pelo risco, do espírito de aforro - mas depende também de outras qualidades do homem. E, nestas, destacam-se as que dizem respeito u conservação da capacidade de trabalho, ao estado de saúde a à libertação da incerteza sobre o dia de amanhã.
É mister não esquecer que o nível da produtividade, e portanto também o do rendimento nacional, está em relação directa com as energias físicas e morais de cada povo.
Ora um sistema de segurança social visa, justamente, não só a libertar o homem da preocupação de que os seus meios materiais desçam abaixo do limite compatível com a dignidade humana ou a própria existência, mas ainda a defender a saúde, proteger a maternidade, tratar a doença e recuperar os indivíduos para a vida activa.
Se o primeiro objectivo pode, nalguns casos, ser acompanhado de consequências negativas, não há razão para supor - e a experiência assim o demonstra - que os resultados positivos de um sistema equilibrado de segurança não compensem largamente aquelas consequências.
Diz-se, por vezes, que nos países menos desenvolvidos é necessário aplicar o máximo volume de capitais em «investimentos produtivos». Esquece-se que o homem é o «capital» mais precioso. Os investimentos na saúde, assim como na instrução, não são apenas o pressuposto do desenvolvimento dos recursos naturais - são condição essencial para o incremento da capacidade produtiva.
Ouçamos as palavras do Prof. Vito: «A segurança social não é inimiga do progresso económico, nem representa obstáculo à formação dó rendimento nacional. Pode eventualmante agir de modo desfavorável sobre o comportamento de alguns indivíduos; mas correctivos oportunos permitem neutralizar tais efeitos. E repare-se, afinal, que o espírito de iniciativa, a energia para afrontar os riscos e a propensão para o aforro requerem, eles próprios, um mínimo de segurança» 70.
Deve acrescentar-se que, no concernente ao espírito de poupança individual, a experiência do comum dos países onde vigoram sistemas completos de segurança social demonstra não terem esses sistemas obstado à formação regular do aforro. Este depende sobretudo da confiança na estabilidade da moeda.

62. Vejamos agora os efeitos da outorga das prestações de segurança social sobre a distribuição dos bens económicos.
Na medida em que o valor dessas prestações é recebida, na sua maior parte, por grupos sociais de baixa capitação de rendimentos, cuja contribuição para a segurança foi de montante sensivelmente menor, pode supor-se que o sistema é susceptível de determinar uma redistribuição vertical (ou pessoal) de riqueza, em benefício daqueles mesmos grupos.
Para isso, porém, seria necessário que os encargos da segurança sobre a produção não viessem a repercutir-se sobre os preços dos bens de consumo, pois, de outro modo, as classes mais desfavorecidas vêem ó benefício resultante das prestações anulado, no todo ou em parte, pelo agravamento do custo da vida - o que equivale a elas próprias pagarem, por via indirecta, o custo dessas prestações.
Nesta hipótese, que é, aliás, a que mais frequentemente se verifica, haverá, sobretudo, uma redistribuição horizontal, dentro de cada grupo (dos activos para os inactivos, dos sãos para os doentes, dos solteiros para os que têm encargos de família, etc.), ou, mais propriamente, oblíqua, na medida em que não sejam de todo eliminadas certas transferências entre grupos com diferentes escalões de rendimentos. Semelhante redistribuição, embora socialmente útil, não modificará por forma sensível o panorama da repartição dos rendimentos.
Não é outro, como se viu, o resultado das contribuições patronais sobre os salários, na medida em que elas se incorporam no custo de produção, e no preço pago pelo consumidor. O financiamento mediante uma contribuição sobre os lucros líquidos das empresas pode, de algum modo, impedir aquela consequência.
A incidência de taxas sobre produtos agrícolas com destino à segurança social apresenta a mesma desvantagem de se traduzir por acréscimos dos preços, com a agravante de ir onerar, em regra, bens de procura rígida e generalizaria, cujos consumidores são, na grande maioria, as classes de menores rendimentos.
Em França, onde a segurança social é custeada essencialmente por intermédio de contribuições salariais e taxas sobre produtos da terra, as estatísticas revelam não se haver obtido sensível redistribuição de rendimentos entre a classe trabalhadora e as restantes. Como se lê num estudo recente, «os limites à generalização da segurança social, a não progressividade das quotizações, a existência de um plafond para estas, a participação crescente do Estado no financiamento de certos regimes..., tem tido como consequência a manutenção, senão o abaixamento, da parte do rendimento nacional distribuído aos trabalhadores a partir da guerra» 71.
Também em Inglaterra, não obstante a generalização do sistema de segurança social, o financiamento mediante taxas fixas, embora diferenciadas por agrupamentos da população, não tem determinado uma apreciável redistribuição vertical. Esta conseguiu-se, sobretudo, por meio da política fiscal e dos impostos progressivos sobre o rendimento 72.

70 Prof. Francesco Vito, «Sicurezza sociale e reddito nazionale», Atti della XXIII Settimana sociale dei cattolici italiani, cit., pp. 90 a 93.

71 Doublet et Lavau, ob. cit., p. 444. No mesmo sentido: Raymond Barre, Économie politique, Paris, Presses Universitaires de France, 1956, vol. II, pp. 228 e seguintes; Alain Barrère, Politique financière, Paris, Dalloz, 1950, pp. 511 e seguintes.
72 Veja-se Alan T. Peacock, Income redistribution and social policy, London, Jonathan Cape, 1954, p. 157, que apresenta o seguinte quadro relativo à «Working class», com rendimentos anuais até 499 libras:

Milhões de libras

[ver tabela na imagem]

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Cumpre, pois, concluir que o efeito de redistribuição da segurança social, com os métodos clássicos de financiamento, opera principalmente no sentido horizontal, dentro de cada grupo, e só em medida muito limitada provoca transferências entre os vários escalões sociais de rendimentos.

63. Por último, as prestações sociais exercem uma influência apreciável sobre a orientação do consumo.
Os subsídios em dinheiro e as pensões substituem, em certa medida, os salários e têm, naturalmente, a mesma aplicação destes, isto é, a de se destinarem a despesas de consumo.
As prestações em espécie, especialmente as de carácter sanitário, vão em grande parte favorecer a procura de certos produtos - v. g. medicamentos, aparelhos de prótese e ortopedia, artigos para radiografias e análises, etc.
Além disso, as prestações médico-sociais constituem um factor de acréscimo das despesas com serviços clínicos, embora aqui também com um efeito simultâneo de redistribuição horizontal dentro da classe médica.
No ponto de vista geral, a acção estimuladora do consumo global que as prestações sociais proporcionam é factor importante de estabilidade da economia 73.

CAPITULO III

O sistema português

§ 1.º

Elementos. Princípios orientadores

64. O sistema português de protecção contra os riscos sociais (na metrópole) compõe-se essencialmente de quatro elementos:

a) Uma organização de seguro social obrigatório - a presidência social 74;
b) Um sector d(c) serviços oficiais de sanidade geral e acção hospitalar;
c) Uma organização de assistência social (oficial e particular);
d) Um conjunto de instituições de seguro facultativo, no qual se pode incluir o regime de responsabilidade patronal pelos riscos profissionais.

65. Este complexo de elementos - correspondente às várias formas de organização dos sistemas de segurança social referidas no capítulo anterior, embora acuse, entre nós, como se verá, deficiências de coordenação orgânica, obedece na sua contextura a determinados princípios comuns de natureza ético-política - designadamente no que. diz respeito à posição do Estado, dos corpos sociais e dos indivíduos no sistema de segurança.
Tais princípios podem assim enunciar-se, sumariamente:
1.º A defesa contra os riscos específicos da vida social incumbe, em princípio, à iniciativa privada dos indivíduos, das famílias, dos corpos sociais -, que a lei considera como "o mais fecundo instrumento do progresso e da economia da Nação" (Estatuto do Trabalho Nacional, artigo 4.º).
2.º Ao Estado incumbe, porém, suprir e integrar as faltas e insuficiências da acção privada nesse domínio, cabendo-lhe, designadamente, "coordenar, impulsionar e dirigir todas as actividades sociais" (Constituição, artigo 6.º, n.º 2.º), "definindo e fazendo respeitai-os direitos e garantias impostos pela moral, pela justiça ou pela lei" (idem, artigo 6.º, n.º 1.º), entre os quais "o direito à vida e integridade pessoal" e "o direito ao trabalho" (idem, artigo 8.º n.ºs 1.º e 1.º-A). No mesmo sentido, compete ao Estado "defender a saúde pública", assegurar a "defesa da família", "proteger a maternidade" e "zelar pela melhoria das condições das classes sociais mais desfavorecidas, procurando assegurar-lhes um nível compatível com a dignidade humana" (idem, artigo 6.º, n.ºs 3.º e 4.º, e artigos 12.º e 14.º, n.º 2.º).
3.º A larga acção supletiva, coordenadora e directiva do Estado, embora confira natureza pública aos serviços e organismos por ele criados, não implica necessariamente a gestão oficial. Por um lado, a lei atribui aos interessados o financiamento e a participação na vida administrativa das instituições de previdência, mesmo quando criadas por iniciativa estadual. Por outro lado, considera dever fundamental do Estado o de autorizar, promover e auxiliar a formação de organismos de natureza privada com fins complementares de previdência ou assistência (Constituição, artigos 16.º e 41.º; Estatuto do Trabalho Nacional, artigo 48.º, § 1.º; Lei n.º 1884, artigo 9.º e 1.2.º; Estatuto da Assistência Social, base III).
Destes princípios, mormente do segundo, infere-se que, no sistema português de protecção contra os riscos sociais, cabem ao Estado funções de primacial relevo em tudo quanto importe ao conjunto do agregado nacional.
É assim que, na organização da previdência social, o Estado impõe a obrigatoriedade do seguro (Estatuto do Trabalho Nacional, artigo 48.º, § 2.º; Lei n.º 1884, artigo 3.º) ; toma a iniciativa da criação ou do alargamento de âmbito de certas instituições (Decreto-Lei n.º 32 674, de 20 de Fevereiro de 1943, artigo 1.º; Decreto-Lei n.º 23 051, de 23 d e Setembro de 1933, artigo 1.º, § 2.º; Decreto n.º 37 751, de 4 de Fevereiro de 1950, artigo 1.º); orienta e fiscaliza superiormente a actividade de toda a organização (Lei n.º 1884, artigo 14.º).
Em matéria de saúde e assistência social - o Estado dirige a respectiva política., toma a seu cargo os serviços de sanidade geral e outros que o interesse público aconselhe a manter sob a sua alçada, como a organização hospitalar de base, e orienta, tutela e inspecciona todos os organismos, instituições e serviços de saúde ou assistência (Estatuto da Assistência Social, bases III e XXXI; Lei n.º 2011, de 2 de Abril de 1946, base XIX).
A posição assumida pelo Estado Português no conjunto das actividades ligadas à segurança social traduz-se, na prática, por uma acentuada relevância dos serviços, organismos e instituições do sector público e semipúblico (seguro social), em confronto com os de natureza particular, se se tomar por base a importância dos meios materiais disponíveis, que naturalmente se reflecte no valor das prestações outorgadas.
Assim, no sector do seguro social, enquanto as instituições de previdência obrigatória - excluindo && do funcionalismo público - arrecadaram, em 1959, receitas no montante de 2 259 348 contos e gastaram em benefícios concedidos e outras despesas 1 248 172 con-

73 Doublet et Lavau, ob. cit., pp. 442 e 443; Revue Internationale du Travail, "Stabilité economique et sécurité sociale". Maio de 1958, pp. 489 e seguintes.
74 A expressão "previdência social" foi utilizada pelo legislador de 1933-1935 para distinguir o regime então instaurado do de "seguros sociais obrigatórios", de 1919, que na maior parte nunca chegou a ter execução. Mas o termo possui um sentido lexicológico mais amplo do que o de "seguro", pois abrange, além da "reparação", a própria "prevenção" dos riscos. No direito positivo português, tem, contudo, o significado restrito de "seguro social".

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tos, as de seguro social facultativo (associações de socorros mútuos) tiveram no mesmo ano 97 709 contos de receita e 81 640 contos de despesa 75.
No sector da saúde pública e assistência social, as despesas de funcionamento e investimento dos vários departamentos dó Estado naquele ano. (segundo o mapa n.º 15, anexo ao Relatório da Conta Geral do Estado de 1959) somam 701 700 contos. Adicionando-se a esta cifra os recursos próprios dos organismos e estabelecimentos oficiais de saúde e assistência não incluídos no orçamento do Estado (356 418 contos, segundo a previsão para 1.960), atinge-se valor superior a 1 milhão de contos, ao passo que os réditos privativos das instituições particulares de assistência andam ao redor das quatro centenas de milhares de contos 76.

§ 2.º

O sector da previdência social obrigatória

A) Preliminares

66. A organização de previdência-social, cujas bases foram lançadas em 1933 pelo Estatuto do Trabalho Nacional (artigos 34.º, 48.º e 49.º), e completadas, dois anos depois, pela Lei 11.º 1884, de 16 de Março de 1935, abrange três ramos 77:

1) Indústria, comércio e serviços;
2) Agricultura;
3) Pesca.

Como era natural, pretendeu-se que a previdência obrigatória constituísse a base por excelência do sistema de protecção contra os riscos sociais, à semelhança do que sucedia na generalidade dos países.
A assistência social deveria assumir, em relação à previdência, uma função supletiva e complementar (Estatuto da Assistência Social, base VI, n.º 2).
São estes os princípios legais, mas, na prática, apenas os sectores do comércio, indústria e serviços acusam expansão satisfatória do seguro social, com um índice de cobertura da respectiva população activa de cerca de 70 por cento. Na pesca, a notável obra de protecção realizada, que abarca praticamente toda a comunidade, piscatória, utilizou sobretudo fórmulas assistenciais. Na agricultura, os obstáculos que, em toda a parte, dificultam a sua inclusão na previdência obrigatória revelaram-se, entre nós, particularmente acrescidos, não permitindo que o índice de cobertura da população rural pelas Casas do Povo tivesse do além de um quinto, nem que os respectivos benefícios sé situassem, na maior parte dos casos, acima, de níveis modestos. Tudo isso só verá melhor na alínea seguinte.

B) Campo de aplicação

67. Indústria, comércio e serviços. - O princípio legal é o de que a previdência obrigatória devo abranger tendencialmente, "em realização progressiva", todos os trabalhadores, quer por conta de outrem, quer por conta própria. É o que expressamente se consagra no artigo 48.º do Estatuto do Trabalho Nacional.
Os familiares a cargo do chefe de família são igualmente incluídos para efeitos de assistência médica e medicamentosa (Decreto n.º 37 702, de 24 de Fevereiro de 1950, artigo 15.º, e Portaria n.º 17 964, de 23 de Setembro de 1960).
Em 31 de Dezembro de 1959, o número global de beneficiários das caixas sindicais e das caixas de reforma ou de previdência era de 8(53 723 e o de familiares de 833 509 78.
Que proporção representam estas cifras em referência ao total da população activa nos três ramos acima considerados?
O quadro seguinte fornece alguns dados elucidativos:

QUADRO IV

População segurável e população segura (1959)

(Estimativa)

[Ver Tabela na Imagem]

Fonte: Instituto Nacional de Estatística, Recenseamento Geral da População, 1950, t. III, vol. 1.º; Anuário Demográfico, 1959; Organização Corporativa e Previdência Social, 1959. As estimativas sobre a população segurável são provisórias e baseiam-se no censo de 1950, considerando as categorias sócio-profissionais de "empregados", "assalariados", "isolados" e "pessoas a cargo, do chefe de família". Tomou-se uma taxa de crescimento da população de 1950 para 1959 idêntica à da população total. Na realidade, esta taxa deve ser um pouco superior nas indústrias e serviços e inferior no sector primário, por efeito das deslocações da população activa deste para aqueles, numa economia em expansão como a portuguesa. A categoria "isolados" supôs-se coincidir em larga medida com a de "trabalhadores independentes" ou "por conta própria", abrangida em princípio pelo seguro (artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 32 674, de 20 de Fevereiro de 1943). A estimativa sobre o número de familiares segurados no sector "agricultura, silvicultura e pecuária" assentou nos escassos dados de que foi possível dispor e deve considerar-se com as necessárias reservas. Na "pesca", a população activa registada pelo censo (32 336) é sensivelmente inferior ao número de sócios efectivos das Casas dos Pescadores (54690 em 1959). A razão da divergência parece estar no facto de muitos indivíduos se dedicarem temporariamente à pesca e terem sido imputados pelo censo a outras actividades. Não se dispõe de elementos relativos ao número de familiares neste sector.

Tomando por base este apuramento, conclui-se que o número de empregados e assalariados das indústrias, comércio e serviços, abrangidos pela previdência obrigatória em 1959, representava 69,7 por cento do total daqueles sectores (ou 79,4 não incluindo a categoria "isolados").
Relativamente às pessoas de família a cargo, a percentagem baixa para 61,8 (ou 70,4, excluindo os familiares dos "isolados").
Estão fora da previdência, por despachos ministeriais, os trabalhadores considerados adventícios, os in-

75 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa F, Previdência Social, 1959. Não se incluem as receitas e desposas das Casas do Povo e das Casas dos Pescadores (82 240 contos, no total), nem as do seguro de acidentes de trabalho (381422 contos de prémios).
76 Receitas próprias dos organismos e serviços autónomos e não autónomos de saúde e assistência integrados nos vários Ministérios, segundo o mapa n.º 2 do preâmbulo do Orçamento Geral do Estado para 1960 e o desenvolvimento anexo respeitante aos Hospitais Civis de Lisboa. Não compreende o Findo de Desemprego nem os corpos administrativos. Para as instituições particulares de assistência: elementos fornecidos pela Direcção-Geral da Assistência relativamente a 1958, últimos apurarados. Neste ano somaram 414 575 contos.
77 Excluindo o do funcionalismo público, que se rege por diplomas especiais.
78 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Previdência Social, 1959, cit. Além dos familiares abrangidos pelas caixas sindicais e de previdência (para efeitos de acção médico-social), há 147 502 pessoas beneficiadas com abono de família pelas respectivas instituições.

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dependentes e ainda os familiares do patrão que trabalhem sob as ordens deste, mas não remunerados 79.
Quanto aos trabalhadores independentes, deve acrescentar-se que algumas categorias das. chamadas profissões livres (médicos, advogados, engenheiros, despachantes de alfândega) encontram-se abrangidas por instituições de previdência obrigatória.

68. Agricultura. - Em 1959 existiam 555 Casas do Povo, com 250 786 sócios efectivos: (trabalhadores rurais e equiparados) e 182 620 sócios contribuintes (produtores agrícolas) 80.
Aqueles 251 000 beneficiários representavam, com respeito à população activa segurável, no sector primário, em 1959, segundo o quadro acima, uma proporção de apenas 19,6 por cento. Quanto aos familiares, a percentagem desce para 16,9 por cento.
Acresce que mais de metade dos sócios efectivos (54,6 por cento) está concentrada em quatro distritos - Braga, Portalegre, Évora e Beja.
O regime legal em vigor considera como beneficiários, não apenas os trabalhadores rurais por conta de outrem, mas também os que "deles se não diferenciem nitidamente em situação material ou modo de vida" e ainda "os produtores agrícolas que não possam ser contribuintes por os seus bens e rendimentos não serem suficientes para lhes assegurar situação diversa do comum daqueles trabalhadores" (Decreto-Lei n.º 30710, artigo 1.º, § 1.º).
Quer dizer: aqui a previdência protege, em princípio, também os trabalhadores por conta própria, embora mediante prévia consideração das suas condições económicas...
Às famílias dos beneficiários pode igualmente ser extensiva a assistência médica prestada pelas Casas, do Povo 81.

69. Pesca. - As 28 Casas dos Pescadores existentes em 31 de Dezembro de 1959 tinham 54 690 sócios efectivos (pescadores ou equiparados, por conta de outrem ou por sua conta) e 4317 sócios contribuintes - os armadores ou proprietários de embarcações de pesca.
Como, à face das disposições vigentes, nenhum pescador pode exercer o seu mister sem estar inscrito na Casa do respectivo centro piscatório, a organização abrange, neste domínio, praticamente toda a população trabalhadora.

70. Como há pouco se frisou, excepto nos ramos da indústria, comércio, e serviços, e sem embargo dos esforços perseverantes do Governo e da organização corporativa, o campo de aplicação do seguro obrigatório permanece ainda distante, não apenas do correspondente ao princípio da universalidade, mas sequer do âmbito tendencialmente marcado pelo Estatuto do Trabalho Nacional.
Nos sectores secundário e terciário, embora os resultados obtidos possam considerar-se, em larga medida, satisfatórios, estão ainda fora do seguro, além dos trabalhadores independentes, diversas manchas de empregados e assalariados.
As dificuldades, quanto aos independentes, são conhecidas e já por diversas vezes assinaladas ao longo deste parecer. Adiante teremos ocasião de apreciar a fórmula, que a proposta de lei sobre a reforma da providência adopta a tal respeito.
Pelo que toca aos trabalhadores subordinados, os obstáculos à cobertura integral têm principalmente derivado ou de se tratar de actividades não organizadas corporativamente, ou de profissões cujo regime de trabalho não foi objecto de regulamentação, ou, enfim,, de condições desfavoráveis resultantes de irregularidade do emprego (trabalhadores ocasionais ou adventícios). Também a este propósito a proposta de lei encerra algumas orientações que a seu tempo serão examinadas.
Na agricultura o panorama, é ainda bastante sombrio. Embora o sistema abranja aqui uma fracção (entre nós apreciável) de trabalhadores por conta própria - artífices e pequenos produtores rurais -, menos de um quinto da. população activa agrícola se encontra ao abrigo do seguro, e apenas para uma parte das eventualidades.
Não renovaremos a enunciação dos óbices que em toda a parte se opõem ao seguro social da gente do campo (supra, n.º 12). Tais dificuldades mostram-se entre, nós agravadas pela extrema pulverização da propriedade em certas zonas e pelo baixo rendimento, unitário médio das explorações em todo o País, não falando já do nível dos salários e da irregularidade do emprego de grande parte dos trabalhadores agrícolas.
Acresce que, a face da legislação vigente, o alargamento do campo de aplicação da previdência ao sector agrícola está, no fundo, dependente da ampliação da rede de Casas do Povo, embora o diploma que regulou a organização de federações destes organismos (Decreto-Lei n.º 41 286, de 23 de Setembro de 1957) admita, "sempre que circunstâncias especiais o aconselhem", a possibilidade de as federações serem incumbidas de realizar os objectivos legais das Casas do Povo fora das zonas onde estas existem (artigo 6.º).
Como sair do ponto em que nos encontramos? Adiante tentaremos debater o problema.
Quanto ao sector da pesca, as perspectivas são incomparavelmente mais animadoras. Aqui a evolução deverá ser, simplesmente, no sentido de se adoptarem fórmulas próprias do seguro, em lugar de benefícios ainda em parte de carácter assistência!.

C) Eventualidades e prestações

71. Indústria, comércio e serviços. - O regime geral das instituições de previdência adopta, quanto a estes ramos, o seguinte esquema de eventualidades: doença, invalidez, velhice, morte e encargos de família 82.
O artigo 48.º do Estatuto, do Trabalho Nacional e o artigo 4.º da Lei n.º 1884 referiam também o desemprego involuntário, mas o § 2.º deste artigo acrescentava que a protecção contra esse risco deveria fazer-se "nos termos determinados em diploma especial".
Este diploma nunca chegou a ser publicado. O "auxílio" aos desempregados continuou até hoje a ser feito, segundo o regime instaurado por decreto de 1932 83, através de um fundo administrado pelo Comissariado do Desemprego, organismo autónomo integrado no Ministério das Obras Públicas.

79 Ver, sobre o assunto, relatório da proposta de lei, n.º 23.
80 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Previdência Social- 1959; cit.
81 Regulamento do Fundo de Previdência das Casas do Povo, aprovado por despacho do Subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social de 14 de Dezembro de 1940 (Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, ano VII, n.º 23), artigo 6.º
82 Lei n.º 1884, artigos 4.º e 10.º; Decreto n.º 37 749, de 2 de Fevereiro de 1950; Decreto-Lei n.º 35 410, de 29 de Dezembro de 1945, artigo 1.º.
83 Decreto n.º 21699, de 19 de Setembro de 1932, e legislação complementar. Ver Auxílio aos Desempregados, edição da Imprensa Nacional, Lisboa, 1939.

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O Fundo de Desemprego é constituído:
1) Pela taxa de 3 por cento sobre quaisquer remunerações pagas na indústria, comercio e serviços, cabendo 1 por cento ao patrão e 2 por cento ao pessoal;
2) Pela taxa de 2 por cento sobre a importância da contribuição predial paga pelos proprietários rústicos e urbanos 84.
As receitas globais do Fundo, em 1959, foram de 277 779 contos, números redondos.
Relativamente à maternidade, a lei equipara o parto à doença para efeitos de assistência médica (Decreto n.º 25 935, artigo 7.º, § único), ficando o pagamento do salário a cargo da entidade patronal (Lei n.º 1952, artigo 17.º, e convenções colectivas de trabalho).
Quanto à sobrevivência, o artigo 22.º da Lei n.º 1884 tão-sòmente previa que as instituições existentes, cujo esquema incluísse aquela eventualidade, continuassem a conceder as respectivas pensões. Estão neste caso apenas cinco caixas de previdência - do pessoal ferroviário, da marinha mercante, dos transportes colectivos do Porto e dos empregados da assistência - em relação aos trabalhadores que já tinham direito aos respectivos benefícios quando da reforma dos regulamentos, nos termos da citada Lei n.º 1884.
Enfim, os riscos de acidentes de trabalho e doenças profissionais continuam também fora do seguro social, a coberto do regime da responsabilidade do patrão, facultativamente transferível para o seguro comercial, ou, na hipótese negativa, com a obrigação de caucionar essa responsabilidade, salvo prova de capacidade económica para tomar o risco por conta própria (Lei n.º 1942, de 27 de Julho de 1936, artigos 11.º e 12.º).

72. Ao esquema normal de eventualidades, que acaba de resumir-se, correspondem as seguintes prestações:
a) Em dinheiro - prestações em relação com os ordenados e salários, e, nas reformas, também com o tempo de contribuição, pela forma seguinte:

Doença - subsídio igual a 60 por cento do salário, durante 270 dias. Condições de atribuição: um ano de inscrição e pagamento de contribuições correspondentes a oito dias no terceiro mês anterior à baixa; período de espera de seis dias úteis 85.
Invalidez - pensão de 2 por cento do ordenado ou salário médio por cada ano de contribuição, com o limite de 80 por cento. Condições: período de garantia de dez anos; revisão por virtude de modificação do estado físico ou de ocupação remunerada; reembolso das contribuições para os que se invalidem antes de completado o período de garantia; inexistência de pensões mínimas.
Velhice - pensão aos 65 ou 70 anos, conforme as instituições, calculada nos mesmos termos da de invalidez. Condições: período de garantia e faculdade de reembolso idênticos à invalidez; prova anual de vida; pensão mínima de 300$ mensais, não podendo exceder 60 por cento, do salário médio dos últimos 15. anos de contribuição; manutenção do abono de família recebido quando da passagem à situação de pensionista; recusa do direito à pensão mínima quando o beneficiário receba proventos suficientes de outra profissão 86.
Morte - subsídio igual, em regra, a seis meses da remuneração média dos últimos dez anos, pago por morte do segurado, por uma só vez, às pessoas indicadas na lei. Período de garantia de três anos 87.
Encargos de família - abono por cada descendente ou ascendente a cargo, pago mensalmente conforme as tabelas de cada instituição, em regra diferenciado por grupos de remunerações; subsídio de casamento (500$), nascimento (200$) e aleitação (50$ por filho durante os primeiros oito meses) 88.

Além das prestações correspondentes ao esquema normal de eventualidades, as instituições de previdência exercem uma acção de assistência, concedendo subsídios pecuniários para melhorar os benefícios regulamentares, ocorrer, a eventualidades fora do esquema ou auxiliar pessoas que não possam inscrever-se como beneficiários. A concessão destas prestações depende da verificação de situações de comprovada necessidade, que as direcções das instituições julguem atendíveis (Decreto n.º 25 935, artigo 80.º; Decreto n.º 28 321, artigo 83.º).
Em 1959, as instituições de previdência e abono de família pagaram 918 324 contos de subsídios pecuniários, assim distribuídos 89:

QUADRO V

[Ver Tabela na Imagem]

) Em espécie (acção médico-social):
Na doença - assistência médica (clínica geral e especialidades), medicamentos e elementos de diagnóstico; internamento hospitalar para cirurgia geral. Condições: as mesmas do subsídio, sem período de espera; limite de 270 dias para a assistência medicamentosa; comparticipação do segurado nos medicamentos manipulados e especialidades, bem como no internamento hospitalar.
Na maternidade - assistência médica e medicamentosa durante o parto.
Na invalidez e velhice - assistência médica e medicamentosa aos reformados nas mesmas condições dos restantes beneficiários 90.

84 Decreto n.º 21 699, artigos 1.º, 20.º e 22.º Da taxa de 2 por cento sobre as remunerações do pessoal, 0,5 por cento reverte para o fundo "Contribuições de doentes" das caixas de previdência (Decreto-Lei n.º 37 246, de 23 de Maio de 1949, artigo 6.º).
5 Decreto n.º 37762, de 24 de Fevereiro de 1950, artigos 3.º e 4.º
86 Decreto n.º 25935, artigo 40.º; Decreto n.º 28321, artigo 39.º; Portaria n.º 17965, de 23 de Setembro do 1960.
87 Decreto n.º 37749, de 2 de Fevereiro de 1950; despacho ministerial de 9 de Julho de 1958.
88 Decreto-Lei n.º 33 512, de 29 de Janeiro de 1944; Portaria n.º 17 963, de 23 de Setembro de 1960.
89 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Previdência Social - 1959, cit.
90 Decreto n.º 37762, artigos 2.º e 6.º a 14.º; Decreto n.º 41595, de 23 de Abril de 1958. Nos termos deste último diploma, celebrou-se um acordo entre a Federação de Caixas de Previdência - Serviços Médico-Sociais e a Direcção-Geral da Assistência, com data de 30 de Maio daquele ano, a que também aderiram 66 estabelecimentos particulares (entre 145 solicitados para o efeito). Pela cláusula III do acordo, "o número

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No mesmo ano de 1959, o valor das prestações médico-sociais outorgadas pelas instituições de previdência, federadas e não federadas, atingiu 181 570 contos. O número de consultas foi de 3 209 075 e o de tratamentos 6 270 951 91.

73. Agricultura. - O esquema obrigatório abrange: 1) assistência médica; 2) subsídio pecuniário na doença; 3) subsídio por morte.
A assistência médica inclui as visitas domiciliárias, o parto, os tratamentos e as intervenções de pequena cirurgia. Não tem limite de duração.
O subsídio na doença, com um período de espera de três dias, é de 40 por cento do salário nos primeiros trinta dias e de 30 por cento nos sessenta dias imediatos.
Quando as condições económicas do beneficiário o justifiquem e as possibilidades financeiras ida instituição o permitam, isto é, em regime já não de seguro mas de assistência, prevê-se a melhoria daquelas percentagens até 60 e 40 por cento, respectivamente.
O subsídio por morte foi fixado no mínimo obrigatório de 150$.
Para além deste esquema, as Casas do Povo podem outorgar outros benefícios, designadamente subsídios de invalidez, mas em regime assistencial, ou seja, na dependência das condições económicas da instituição e do interessado 92.
Por despacho ministerial de 19 de Março de 1958, foi homologado um acordo geral, entre a Junta Central das Casas do Povo e a Federação dos Serviços Médico-Sociais, para a coordenação dos serviços de assistência médica das Casas do Povo e das instituições de previdência da indústria, comércio e serviços abrangidas por aquela Federação.
Nos termos desse acordo, umas e outras instituições poderão utilizar, reciprocamente, conforme se mostre mais conveniente, as respectivas instalações e serviços clínicos e administrativos. A Federação comparticipará no funcionamento dos serviços das Casas do Povo de que aproveite, mediante contribuição em dinheiro ou em espécie, designadamente mobiliário e material sanitário ou químico-farmacêutico.
Em Dezembro de 1960 vigoravam 208 acordos com diversas Casas do Povo, distribuídos por 18 distritos, em execução daquele acordo geral. Em consequência desses acordos, o número de sócios efectivos daqueles organismos e respectivos familiares com assistência médica elevava-se, na referida data, a 429 615 93.
O custo da assistência sanitária e dos subsídios pecuniários concedidos pelas Casas do Povo foi, em 1959, de 22 918 contos, assim discriminado:

QUADRO VI

[Ver Tabela na Imagem]

74. Pesca. - Em princípio, o esquema de eventualidades e prestações previsto nas disposições legais em vigor não é obrigatório. Depende, na sua extensão e nos seus quantitativos, das possibilidades financeiras das instituições 94. Mas a lei reconhece, em contrapartida da obrigação de inscrição e de quotizações, o direito a determinadas espécies de benefícios: é o caso das prestações sanitárias, das pensões de reforma (pescadores do bacalhau e arrasto) e do abono de família (pescadores do bacalhau, arrasto, atum e cetáceos).
As prestações normalmente concedidas abrangem: assistência médica; subsídios de natalidade, de doença e por morte; pensões de invalidez e reforma; abonos de família.
O custo global destes benefícios, no ano de 1959, alcançou 12 456 contos.
Por seu turno, a Junta Central das Casas dos Pescadores concedeu, no mesmo ano, benefícios assistenciais no valor de 4047 contos, além de 4853 contos de abonos de família e 1116 contos de pensões de reforma 95.

75. Descrito Sumariamente o plano de eventualidades e prestações do seguro obrigatório, convém fazer neste momento o resumo das suas lacunas mais salientes.
Quanto às eventualidades, e pelo que toca ao sector da indústria, comércio e serviços, o esquema pode considerar-se relativamente satisfatório. As faltas dizem respeito à maternidade (subsídio), ao desemprego, à sobrevivência (salvo os casos especiais mencionados) e aos acidentes de trabalho e doenças profissionais.
Na agricultura e na pesca, os riscos cobertos sob a forma de seguro são bastante mais restritos, embora na pesca os benefícios concedidos para além do esquema normal sejam apreciáveis.
Cumpre fazer decididos esforços no sentido de ir estendendo progressivamente a estes dois sectores o regime do seguro obrigatório, em lugar da protecção outorgada com carácter assistencial. Como se dizia no parecer desta Câmara sobre a proposta de lei relativa ao Estatuto da Assistência Social, "a previdência é a fórmula de justiça que o trabalhador reclama. Só ela fará que a solução das dificuldades a que todos por humana fraqueza estamos sujeitos se torne ... certeza resultante do exercício de um direito conquistado pelo trabalhador - em vez de hipotético deferimento de uma súplica atendida como por favor" 96.

total de diárias a pagar pela Federação não deverá exceder, em cada ano, vinte vezes o número de doentes que no mesmo ano tenham sido internados". A concessão de medicamentos manipulados e especialidades é regulada pela Portaria n.º 17 964, de 23 de Setembro de 1960. Segundo informação prestada pela Direcção-Geral da Previdência, algumas caixas não federadas concedem também internamento hospitalar para fins diversos da cirurgia geral, incluindo a sanatorização, no que despenderam, em 1959, um total de 2765 contos. A concessão de assistência médica e farmacêutica aos reformados está prevista na Portaria n.º 17 966, de 23 de Setembro de 1960.
91 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Previdência Social, 1959, cit.
92 Decreto-Lei n.º 30 710, de 29 de Agosto de 1940, artigo 9.º; Regulamento do Fundo de Previdência das Casas do Povo, artigos 2.º, 3.º, 11.º e seguintes; Regulamento dos Serviços, de Invalidez das Casas do Povo (Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, ano IX, n.º 6, e ano XIII, n.º 8).
93 Informações prestadas pela Direcção-Geral da Previdência e Habitações Económicas com base em elementos fornecidos pela Junta Central das Casas do Povo. Segundo a mesma fonte, encontram-se concluídos os estudos para, no distrito de Bragança, se abranger toda a população rural pelo regime dos referidos acordos. Para o efeito vão funcionar nesse distrito 121 postos clínicos da Federação e das Casas do Povo.
94 Lei n.º 1953, base II, alínea c); Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 37 751, artigo 10.º
95 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Providencia Social-1959, cit.
96 Diário das Sessões, n.º 48, de 25 de Fevereiro de 1944. P. 106,

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Relativamente às prestações, convém apreciar separadamente: 1) os subsídios; 2) as pensões; 3) as prestações médico-sociais.
1) Os reparos que podem fazer-se aos subsídios concedidos pela previdência social dizem respeito não propriamente aos seus quantitativos - pois eles dependem do nível de salários -, mas às condições da sua atribuição, designadamente aos limites de duração do subsídio de doença.
Como se viu, a tendência geral do direito comparado é para a manutenção do subsídio enquanto durarem as consequências do risco, pois de outro modo o seguro não atinge o seu objectivo social, sendo certo que, à medida que a doença se prolonga, cada vez são mais precárias as condições de existência do segurado e da família.
O problema interessa sobretudo às doenças de longa duração, como a tuberculose, o reumatismo, as doenças cardiovasculares. Implica lògicamente a articulação do seguro-doença com o de invalidez. Verificada a impossibilidade de cura e a incapacidade permanente para o exercício da profissão, o segurado deve passar a beneficiar de uma pensão de invalidez.
A solução está naturalmente na dependência dos meios financeiros, e em especial da possibilidade de aplicar a estas prestações maior percentagem das receitas.
2) Nas pensões, o sistema português de seguro social revela as insuficiências que o relatório da proposta de lei põe excelentemente em relevo 97.
O esquema em vigor, na generalidade dos casos, não consente que: as pensões alcancem aquele nível mínimo considerado necessário para assegurar ao pensionista uma fracção razoável dos seus ganhos anteriores, de modo a proporcionar-lhe meios de vida suficientes:
Também aqui o problema está estreitamente cingido ao regime financeiro e será abordado na devida altura. Por agora apenas se dirá que o método da capitalização pura e a desactualização das bases técnicas adoptadas quando da instauração do sistema - relativamente aos índices de mortalidade e invalidez e aos da evolução demográfica - não consentem melhorias de pensões, e as próprias reservas matemáticas constituídas, não obstante o seu volume, revelar-se-iam insuficientes se se fizesse a revisão daquelas bases. Outra lacuna a apontar ao sistema de pensões é a falta de norma geral que admita a possibilidade do seu reajustamento às variações sensíveis do custo da vida, hoje tendência generalizada na legislação estrangeira (supra, n.º 44). A modificação do regime financeiro sugerida na proposta de lei poderá, eventualmente, como teremos ensejo de ver, facilitar a resolução do problema.
3) Relativamente às prestações sanitárias, as deficiências avultam sobretudo em dois aspectos:
1.º Insuficiência de meios terapêuticos, sobretudo no que respeita à hospitalização;
2.º Baixo limite de duração da assistência farmacêutica.
De modo geral, pode dizer-se que estas deficiências resultam principalmente, de duas causas:

Escassez de disponibilidades financeiras;
Deficiência de coordenação entre o seguro e os serviços oficiais de saúde.

Quanto ao primeiro factor, e pelo que respeita à previdência do comércio, indústria e serviços, a escassez provém, não tanto do nível das quotizações, mas, sobretudo, do regime financeiro adoptado, que não consente aplicar à cobertura das prestações sanitárias maior parcela de receitas. Como se verá, esta parcela situa-se, na generalidade das caixas, ao redor de 3 por cento dos salários, ao passo que nos países com miais largos benefícios médico-sociais as receitas inerentes são muito superiores. Em França, por exemplo, andam perto dos 8 por cento das remunerações, e em Espanha dos 7 por cento. Noutros países é o Estado que participa de modo substancial no custo do seguro-doença, como sucede na Bélgica, onde tal comparticipação atinge 50 por cento do total das quotizações dos segurados, além da contribuição patronal.
A revisão em perspectiva do método de financiamento do seguro social português, que é um dos objectivos da (presente proposta de lei, permitira decerto ocorrer a este instante problema.
Já na previdência da agricultura a questão repousa decisivamente na falta de contribuições suficientes. O regime de acordos entre a Federação dos Serviços Médico-Sociais e as Casas do Povo (supra, n.º 73) irá, sem dúvida, consentir apreciáveis melhorias, mas tem a natural limitação de ser, em princípio, inaplicável aos meios estritamente rurais, onde não haja beneficiários do seguro na indústria, comércio e serviços.
Quanto ao segundo factor - dificuldades de conexão entre os departamentos da previdência e da saúde -, adiante se dirá como o problema deve, no parecer desta Câmara, ser encarado (infra, n.º 94).

D) Receitas. Custo do sistema

76. Indústria, comércio e serviços. - As contribuições para a previdência são constituídas por percentagens sobre os ordenados e salários, cujo total, na maior parte das, instituições, é de 20,5, cabendo à empresa 15 e os restantes 5,5 ao trabalhador.
O conjunto das instituições de previdência e de abono de família cobrou, em 1959, um total de 1 704 365 contos de contribuições 98.
Não existe qualquer participação directa do Estado nestes sectores. Indirectamente, porém, pode dizer-se que o Estado participa no custo do sistema através da manutenção dos serviços de orientação superior e fiscalização das instituições de previdência-designadamente dos que constituem a Direcção-Geral da Previdência e Habitações Económicas e o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica, cujos orçamentos de despesa pára 1961 não excedem, no total, 5748 contos.

77. Agricultura. - As receitas das Casas do Povo têm essencialmente três origens: 1) quotas dos sócios contribuintes e efectivos; 2) subsídios do Fundo Comum das Casas do Povo; 3) subsídios, donativos e outros rendimentos.
As quotas dos contribuintes - produtores agrícolas - incidem sobre o rendimento colectável que serve de base à contribuição predial, segundo taxas variáveis, conforme a região. No Sul são normalmente progressivas e vão de 1 por cento a 7 por cento daquele rendimento. No Norte e em zonas agrícolas pobres a percentagem pode não exceder 0,5 por cento.
As taxas são determinadas, em regra, por acordos entre os grémios da lavoura e as Casas do Povo, sujeitos à homologação ministerial.
As quotas dos sócios efectivos - trabalhadores rurais e equiparados;- revestem, pode dizer-se, carácter simbólico e situam-se entre 1$50 e 3$ mensais.

97 Relatório citado, n.º 49.
98 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Previdência Social - 1959, cit.

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O Fundo Comum destina-se especialmente a participar no custo da acção de previdência e é alimentado: 1) pelo produto de taxas sobre o trigo, o vinho, o arroz, o azeite, a cortiça, a resina e a lã; 2) pela dotação do Estado por cada Casa do Povo que se constituir - 20 000$; 3) por uma contribuição anual do Fundo de Desemprego; 4) pelos donativos, heranças ou legados que lhe sejam atribuídos 99.
Em 1959, as receitas de quotização somaram 30 141 contos.
As receitas do Fundo Comum, no mesmo ano, foram de 12 096 contos 100.

78. Pesca. - Os meios financeiros das Casas dos Pescadores são essencialmente constituídos por: 1) Quotas dos sócios; 2) subsídios dos organismos representativos de empresas de pesca; 3) produto de quinhões e partes de pesca; 4) subsídios do Estado - Ministério da Marinha - para fins de previdência; 5) dotação do Estado - 20.000$ - por cada Casa dos Pescadores que se constituir.
As quotas dos sócios contribuintes são proporcionais à tonelagem das embarcações ou navios utilizados na pesca. As dos pescadores e equiparados são pagas, em regra, sob a forma de percentagem do produto da venda do pescado, cobrada pela autoridade fiscal.
Em 1959, os réditos globais das Casas dos Pescadores somaram 18 541 contos. E a Junta Central arrecadou
21 462 contos (receitas gerais, serviço de abono, de família e fundos de reforma).

79. Que observações suscitam os métodos de percepção de meios financeiros do nosso sistema de previdência?
No que respeita ao sector da indústria, comércio e serviços, o problema que pode pôr-se é o de saber se deve manter-se o sistema das contribuições sobre os salários, ou se, dados os inconvenientes noutro lugar apontados (supra, n.º 46), deverá encarar-se a sua modificação.
A fórmula do imposto sobre o rendimento tem, como se referiu (n.º 58), a vantagem de dificultar a repercussão sobre os preços e, portanto, sobre o consumidor. Não cria obstáculos à elevação de salários. E facilita a inclusão no seguro dos trabalhadores por conta própria. Mas, como também se fez notar, a sua adopção sòmente se afigura legítima - dado tratar-se de imposto - quando o sistema de segurança ou,, pelo menos,, um dos seus. ramos se, estenda à generalidade da população - e não é esse ainda os caso português.
Na agricultura e na pesca, o sistema vigente já perfilha um regime indirectamente orientado para a tributação do rendimento, embora utilizando índices manifestamente deficientes, como a contribuição predial (agricultura) ou os resultados brutos da exploração (pesca).
Na agricultura, principalmente, urge rever o sistema actual, que dá lugar a disparidades de critérios e a injustiças, procurando ao mesmo tempo caminhar para um sistema de compensação nacional, não apenas entre a lavoura, mas entre esta e os restantes sectores, à medida que se amplie o campo, de aplicação do seguro social agrícola a uma ou mais eventualidades.
As possibilidades económicas, sempre mais escassas e contingentes, das explorações agrícolas, não poderão, certamente, dispensar essa compensação intersectorial - aliás da maior justiça, sendo certo que a agricultura compra à indústria e ao comércio os produtos já sobrecarregados, em certa medida, com os encargos para a previdência.
Quanto aos trabalhadores por conta de outrem, não parece, porém, viável outra fórmula que não seja a percentagem sobre os Salários, a qual, aliás, já constitui, na sua essência, como também se observou, um imposto sobre o rendimento. O inconveniente da degressividade, que a percentagem uniforme suscita, poderia atenuar-se mediante taxas variáveis por escalões.

80. Importa aludir agora ao outro ângulo do problema dos meios financeiros - o do seu nível ou quantitativo -, por outras palavras, ao custo do sistema.
Vimos noutro lugar (n.º 48, quadro II) quais as percentagens sobre ordenados e salários, com destino ao seguro social, praticadas em certo número de países da Europa e da América. Todas elas se situavam em níveis bastante mais altos do que o nosso - na maior parte para cima dos 30 por cento das remunerações, sem tomar em conta a participação do Estado.
Mostrou-se depois (quadro III) qual a proporção que as receitas, totais para a segurança social (incluindo as próprias do Estado) representavam sobre o rendimento nacional. Também aí a posição portuguesa - 7,2 por cento - estava em plano sensivelmente inferior ao da generalidade dos países. O facto explica-se, não apenas pela taxa moderada das contribuições sobre os salários, mas pelo campo de aplicação bastante circunscrito do nosso seguro obrigatório - além das limitações resultantes da circunstância, oportuna mente auferida (nota ao mesmo quadro), de no cômputo daquelas receitas, segundo a fonte citada, se haverem omitido parcelas importantes.
A actualização da aludida percentagem, com referência a análogas bases de cálculo, revela que, entre 1954 e 1959, ela se manteve ao redor dos 7,2, o que significa não ter o ritmo de acréscimo das receitas da segurança social excedido, entre nós, o do produto nacional bruto ao custo dos factores, no período indicado.
Já o mesmo não sucede com a capitação por habitante, em Portugal, das mencionadas receitas, a qual regista, nesse período, Um aumento de 360$30 para 455 $60, em. virtude de o crescimento demográfico ter sido mais lento do que o do produto 101.
Pode ainda calcular-se, dentro do País, qual a percentagem que as receitas pára a previdência obrigatória representam sobre o produto de cada um dos sectores respectivos.
As cifrais, em relação a 1959, apresentam os seguintes resultados:

QUADRO VII

Produto nacional e contribuições para a previdência

[Ver Tabela na Imagem]

(a) Estatísticas Financeiras - 1959 (Instituto Nacional de Estatística).
(b) Organização Corporativa e Previdência Social - 1959 (Instituto Nacional de Estatística).
(c) Excluindo "administração pública e defesa" e "serviços se saúde e educação".

99 Decreto-Lei n.º 28859, de 18 de Julho de. 1938, artigo 5.º; Decreto-Lei n.º 30 710, artigos 3.º, 4.º, 13.º e 17.º
100 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Previdência Social - 1959, cit.
101 Ver B. I. T. Le côut de la sécurité sociale, cit. p. 168.

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Na agricultura, a baixíssima percentagem apurada resulta, antes do mais, da escassa rede de Casas do Povo e do consequentemente diminuto campo de aplicação da previdência obrigatória, em correspondência com o nível também minguado das prestações.
A pesca é a actividade com percentagem mais elevada, o que não significa de modo nenhum alta, mas corresponde sobretudo ao seu campo de aplicação generalizado.
O sector das actividades secundárias e terciárias não se pode dizer que esteja a suportar, neste aspecto, um peso de encargos parafiscais excessivo. Ao contrário, e como aliás se confirma pelos mais índices atrás recolhidos, esse peso é relativamente modesto em confronto com a generalidade dos países.
Cabe aqui uma observação importante a respeito deste confronto. Num momento em que, na Europa, sé assiste a uma tendência, cada vez mais traduzida em fórmulas concretas, para estreitar a cooperação económica - relativamente à qual o nosso país assumiu já posição definida, através da adesão à Associação Europeia de Comércio Livre - não parece fácil subtrairmo-nos a uma aproximação maior também no aspecto dos encargos sociais.
É de prever que o movimento de integração europeia implique, mais tarde ou mais cedo, uma política de harmonização de custos, cujas incidências, no aspecto da segurança social, se afiguram inevitáveis.
Assim, pois, não apenas imperativos de ordem interna afirmam, a necessidade de alargar o campo de aplicação e o nível das prestações de segurança social, mas também as coordenadas da política económica externa parece assinalarem idêntico rumo.

E) Equilíbrio financeiro

81. No sistema português de seguro social, os problemas respeitantes aos processos técnicos de equilíbrio financeiro interessam apenas aos sectores secundário e terciário.
Na agricultura e pesca, o regime de financiamento assenta essencialmente em fórmulas de repartição. Como o princípio aí dominante é o de limitar os benefícios às possibilidades das instituições, o equilíbrio entre receitas e despesas obtém-se empiricamente, ajustando em cada ano o montante global das prestações a conceder ao nível das receitas previstas.
No concernente aos ramos da indústria, comércio e serviços, a quota global de 20,5 por cento dos salários distribui-se, em regra, assim 102:

Doença:
Subsídio ................... 1,0
Acção médico-social ........ 3,0
Contribuições de doentes ... 0,5
4,5
Abono de família .............. 7,0
Reformas ...................... 7,0
Morte ......................... 1,0
Administração ................. 1,0
20,5

A doença (prestações em dinheiro e em espécie) e o abono de família são financiados pelo método de repartição ex ante, com um pequeno fundo de reserva para o subsídio de doença, de montante aproximado às despesas de um ano. No abono de. família funciona um sistema de compensação nacional, através do Fundo
Nacional de Abono de Família, que permite ocorrer a eventuais déficit s.
Deve acrescentar-se, quanto à doença, que, não obstante a percentagem geral das receitas que lhe está afecta ser a indicada acima, o custo deste seguro varia sensivelmente de instituição para instituição, por efeito sobretudo de circunstâncias inerentes às profissões e actividades abrangidas e ao esquema de benefícios médicos. O relatório ministerial refere variações entre 0,21 e 3,11 por cento dos salários para o subsídio, e entre 0,3 e 9,48 porcento para as prestações sanitárias, em 1955..
ÀS reformas por invalidez e velhice e ao subsídio por morte, aplica-se ainda o regime de capitalização pura, à taxa técnica de 4 por cento ao ano. E o sistema que resulta do disposto na Lei n.º 1884 (artigos 6.º e 11.º). O prémio médio de 7 por cento dos salários para as pensões desce para 6 por cento quando a reforma é aos 70 anos.
Em certo número de instituições, que adoptaram planos de reforma mais favoráveis, o prémio é naturalmente superior [v. g., carvões (9,3 por cento), cimentos (10,8 por cento), descasque de arroz (9 por cento), jornalistas (9,7 por cento), Carris de Ferro de Lisboa (12 por cento)] 103.
Os valores acumulados somavam, no final de 1909, a quantia de 8 670 919 contos.
A sua aplicação era a seguinte 104:

QUADRO VIII

Valores das instituições de previdência

(Em 31 de Dezembro de 1959)

[Ver Tabela na Imagem]

82. O relatório da proposta de lei insere, a respeito dos métodos de equilíbrio financeiro, um esclarecido estudo, quer sobre as razões ponderosas que levaram, quando da instauração do sistema de previdência social em 1935, a adoptar o regime de capitalização para as prestações vitalícias, quer sobre os inconvenientes que, na fase actual do sistema, teria a manutenção de tal regime na sua pureza.
As conclusões desse estudo afiguram-se inteiramente procedentes.
Não só as bases técnicas em que então se fez repousar o esquema - designadamente os índices de mortalidade e natalidade - se mostram hoje inteiramente desactualizadas pelo alargamento progressivo da duração média da vida e pela baixa dos índices de natalidade, como ainda o regime de capitalização pura não permite a

102 Os Seguros Sociais em Portugal, edição do Ministério das Corporações e Previdência Social, 195.9, pp. 18 e 22.
103 Os Seguros Sociais em Portugal, cit., p. 22.
104 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa e Previdência Social - 1959, cit., pp. 55 e 67. Segundo informação prestada pela Direcção-Geral da Previdência, a designação "Outros" do quadro acima engloba, fundamentalmente: numerário em caixa, contribuições do mês de Dezembro, cheques a depositar, contribuições em dívida, juros e dividendos a receber, bem como o valor não amortizado de móveis, utensílios e semoventes.

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melhoria do nível das pensões indispensável para assegurar um mínimo de protecção social na invalidez e na velhice.
Quando nos referirmos concretamente às reformas sugeridas pela proposta de lei, no capítulo seguinte deste parecer, teremos oportunidade de apreciar a solução encarada a tal respeito.

F) Estrutura administrativa

83. Indústria, comércio e serviços. - Os princípios consignados no Estatuto do Trabalho Nacional - segundo os quais a previdência social deveria erguer-se "em. realização progressiva", sobre a "organização do trabalho" (artigo 48.º), designadamente através de contratos colectivos (artigo 34.º) - conduziram, logicamente, à estrutura diferenciada do sistema, por sectores profissionais: "caixas sindicais", quando resultantes de convenção colectiva de trabalho, e "caixas de reforma ou previdência", para os trabalhadores de determinada profissão, ramo de actividade ou empresa, em zonas não organizadas corporativamente.
Em 31 de Dezembro de 1959 existiam 68 dessas instituições, além de 16 caixas de abono de família, ou seja um total de 84 organismos.
Como se vê do relatório da proposta de lei, a primitiva estrutura de base sindical foi-se pouco a pouco desfigurando, em virtude de sucessivos alargamentos de âmbito e fusões, e passou a assentar de preferência na categoria económica, isto é, no ramo de actividade, o qual naturalmente englobava múltiplas profissões. Por sua vez, o campo de acção, inicialmente distrital, ampliou-se, em grande número de .caixas, a todo o País ou a vários distritos. E criaram-se mesmo caixas indiferenciadas, de âmbito regional.
As caixas de empresa (31 actualmente) têm naturalmente estrutura pluriprofissional.
Além disso, duas federações de caixas (cimentes e carvões) e quatro federações de serviços comuns (Serviços Médico-Sociais, Habitações Económicas, Serviços Mecanográficos e Obras Sociais) completam o sistema do seguro obrigatório na indústria, comércio e serviços 105.

84. Agricultura. - Cada Casa do Povo tem o seu âmbito circunscrito, em princípio, a uma freguesia rural, mas excepcionalmente pode abranger mais de uma freguesia 106.
O Decreto-Lei n.º 41276, de 23 de Setembro de 1957, previu a criação de federações de Casas do Povo, em regra distritais, tendo em vista, entre outros fins, o de firmar "acordos com os diferentes serviços do Estado, as autarquias locais, os organismos e instituições de previdência e assistência particular, em ordem à plena realização dos fins. das Casas do Povo".
Como organismo coordenador no plano nacional existe a Junta Central das Casas do Povo, que o Decreto-Lei n.º 34373, de 10 de Janeiro de 1945, instituiu com aquela fim alidade, e ainda com a ide administrar os dinheiros do Fundo Comum.

85. Pesca. - A esfera de acção das Casas dos Pescadores é a da capitania ou delegação marítima, do respectivo Centro piscatório (Lei n.º 1953, base I).
A coordenação superior destes organismos e a gerência do Fundo Comum foram confiadas à Junta Central das Casas dos Pescadores, à qual também incumbe a organização dos serviços de reformas e abono de família dos pescadores 107.

86. Pelo que respeita ao sector da indústria, comércio e serviços, a evolução verificada na estrutura das instituições, pela multiplicidade de grupos profissionais incorporados nas diversas caixas segundo os mais variados critérios 108, não favoreceu a realização satisfatória dos princípios da unidade e da simplificação administrativas, que, como vimos, orientam hoje em dia
os modernos sistemas de segurança social.
Lê-se a tal respeito no relatório da proposta de lei:

Os variados títulos dá integração nas caixa(r) de previdência ... conduzem a numerosos conflitos de competência entre as instituições e impõem a intervenção frequente de despachos para resolver esses conflitos, já pela formulação de critérios de aplicação geral, já mediante decisões tomadas no plano casuístico. As dúvidas respeitantes ao âmbito das instituições reflectem-se perniciosamente nas relações das caixas com as empresas e com os beneficiários, provocando, por vezes, atrasos na entrega das contribuições ou dos benefícios, com deploráveis consequências. Tudo isto tem afectado, frequentemente, o prestígio das caixas e originado diversas perturbações, que se torna necessário eliminar através de medidas apropriadas 109.

Além disso, e designadamente no seguro-doença - que exige, por natureza, estreitos contactos entre a instituição e o beneficiário -, as caixas de âmbito nacional ou pluridistrital convertem a organização numa entidade estranha e distante, e amiúde provocam queixas e incompreensões. O problema tem especial acuidade nas prestações sanitárias.
Pelo que toca ao seguro-pensões, as mudanças de actividade profissional ou económica, ou até de local de trabalho, levantam inúmeros problemas de transferência de reservas matemáticas e outros, que complicam em extremo a vida administrativa, das caixas.
Já tivemos ensejo de pôr em relevo (supra, n.º 55) os inconvenientes, verificados na generalidade dos países, de fazer assentar a estrutura de todo o sistema de seguro obrigatório no critério profissional ou da actividade económica - o qual parece ter antes o seu lugar próprio como fórmula integradora e complementar do ordenamento nacional de base geográfica.
A proposta de lei contém a tal respeito uma solução que a seu tempo será examinada.
No sector rural, o princípio da unidade administrativa pôde ter realização mais satisfatória, dada a estru-

105 Veja-se o relatório da proposta de lei (n.ºs 18 a 20) e mapas anexos n.ºs 1 a 4. A Federação Obras Sociais foi criada pela Portaria n.º 17 967, de 23 de Setembro de 1960.
106 Decreto-Lei n.º 28 859, artigo 2.º .
107 Lei n.º 1953, base V; Decreto-Lei n.º 37 750, artigo 2.º
108 Pode citar-se, como exemplo, entre outros, o da Caixa de Previdência dos Operários Metalúrgicos e Metalomecânicos, cujo âmbito é um mosaico variegado de profissões, a maior parte das quais nada tem a ver com a metalurgia ou o trabalho de metais. Nos termos do artigo 2.º do regulamento da Caixa, esta abrange "os empregados, técnicas e operários ao serviço de entidades que explorem no continente as indústrias metalúrgicas e metalomecânicas, mineiras, de brinquedos e utilidades, de refinação de açúcar, de escovas e vassouras, extractivas e transformadoras de lousa, de broxas e pincéis, de oleados e pergamóides, de limpeza de chaminés, de prótese ortopédica, o pessoal representado pelo Sindicato Nacional dos Carpinteiros Navais, Calafates e Ofícios Correlativos do Distrito e Porto de Lisboa, o das empresas que tenham ao seu serviço trabalhadores representados pelo Sindicato Nacional dos Electricistas, bem como todos os que estejam, ou venham a estar abrangidos por despacho ministerial proferido nos termos do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 32 674, de 20 de Fevereiro de 1943".
109 Relatório cit., n.º 32.

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tura territorial das Casas do Povo e a afinidade estreita das actividades agrícolas. A criação de um organismo central coordenador e, mais recentemente, a possibilidade da constituição de federações distritais, permitem corrigir muitas das dificuldades que, neste aspecto, se suscitaram na organização de previdência do comércio e da indústria. Falta, todavia, estabelecer a necessária coordenação entra a agricultura e aqueles sectores, num plano orgânico e solidário de segurança social - embora sem prejuízo dás necessidades e limites próprios da sociedade rural.
Na organização de previdência da pesca não se levantam problemas de unificação administrativa, e até os de eventual coordenação com os mais sectores apresentam aqui aspectos diferentes, dado o carácter muito peculiar das actividades e meios piscatórios.

§ 3.º

Os sectores da saúde e assistência

87. O Estatuto da Assistência Social (Lei n.º 1998, de 15 de Maio de 1944) consagra o princípio de que "as actividades de assistência serão exercidas em coordenação com as de previdência, por forma a favorecer o desenvolvimento desta ..." (base VI, norma 2.ª).
Daqui resulta que a organização de assistência desempenha, em relação à de seguro social obrigatório, uma função complementar - visando a proteger camadas sociais não abrangidas pelo seguro ou a cobrir eventualidades e encargos que excedam os esquemas da previdência obrigatória.
A outra regra fundamental nesta matéria é a de que, embora o Estado tome, em princípio, a iniciativa no desenvolvimento da política assistencial, á sua função na prestação da assistência é normalmente supletiva das iniciativas particulares (Estatuto, base III).
O mesmo preceito admite, no entanto, que em determinados sectores a posição do Estado seja dominante, quer por se tratar de serviços que necessariamente lhe pertencem - é o caso da defesa da saúde pública, por força de disposição constitucional -, quer pela complexidade, e superior interesse público de. outros serviços, como por exemplo os da organização hospitalar de base (Lei n.º 2011, de 2 de Abril de 1946).
A actividade sanitária destina-se a assegurar os serviços de salubridade e higiene geral, e, bem assim, a organizar a profilaxia e a luta contra as doenças sociais mais generalizadas - v. g., a tuberculose, o sezonismo, o cancro, as doenças infecciosas, as doenças e anomalias mentais (Estatuto, bases III e VII).
A organização hospitalar visa as actividades curativas e reabilitadoras da doença, especialmente sob a forma de internamento e concentração de meios terapêuticos. A complexidade, extensão e custo de uma estrutura hospitalar de base, estendida a todo o País, aconselhou a cometer ao Estado, na maior parte, a iniciativa e a manutenção de uma organização dessa natureza (Lei n.º 2011, base XIX).
Para além destes objectivos de interesse geral, vigora o princípio, acima expresso, da intervenção supletiva do. Estado e das autarquias na protecção contra os riscos sociais, por intermédio de actividades de natureza assistencial,

88. No que respeita ao campo de aplicação, o sector da defesa sanitária e o da acção hospitalar do Estado têm a natureza de serviços oficiais e, como tal, dirigem-se à generalidade dos indivíduos, independentemente da sua condição económica ou social. A obrigação de pagar, no todo ou em parte, o custo da
assistência prestada não retira aos serviços aquela natureza.
A actividade assistencial stricto sensu também, em princípio, não visa grupos sociais determinados, ao contrário do que sucede no seguro. A necessidade de provar a carência do auxílio solicitado, que ë própria daquela actividade, nada tem a ver com o campo de aplicação da assistência, mas sim com os requisitos de outorga das respectivas prestações.
Aqui, pois, tem aplicação legal o princípio da universalidade, o que não quer dizer que tenha aplicação efectiva.
Na realidade, quanto aos serviços de sanidade geral, é ainda sensível a carência de meios de acção (em pessoal e material) com que lutam, designadamente os que dependem da Direcção-Geral de Saúde, não obstante as respectivas dotações orçamentais terem vindo a ser reforçadas de ano para ano. Em 1958 gastaram-se 39 126 contos 110. O orçamento para 1961 inscreve 49 521 contos.
Relativamente à rede hospitalar do Estado, também são conhecidos os limites que impedem, na prática, a utilização desses serviços pelo comum da população do País.
O número de camas dos hospitais civis existentes em 31 de Dezembro de 1959 era de 20 879, o que corresponde a cerca de 23 camas por 10 000 habitantes. Se se considerar a totalidade de camas no conjunto dos estabelecimentos de saúde do País, nesse ano - 47 108 -, aquela média sobe para 52, quando já em 1951 a Itália dispunha de 80, a França de 112 e a Inglaterra de 117 111.
Com respeito aos médicos, basta referir o número dos que se encontram ocupados em estabelecimentos oficiais - 1586 - para imediatamente se avaliar a extrema carência dos serviços 112. Claro que o número total de médicos no País é bastante superior. Mas a sua distribuição apresenta-se irregularíssima - 67 por cento estão concentrados nos distritos de Lisboa, Porto e Coimbra, onde a média é de 1 clínico para 660 habitantes, ao passo que no resto do País há 1 médico para 2800 pessoas. As condições actuais da medicina hospitalar não estimulam, antes contrariam, a modificação desse estado de coisas. Além disso, fora dos grandes centros, verifica-se sobretudo carência de médicos especializados, embora também de clínicos gerais, e aqueles faltam igualmente nas principais cidades 113.
Pelo que toca à enfermagem, a míngua de pessoal é, porventura, ainda mais flagrante. A média geral cifra-se em uma unidade por 1600 habitantes, registando-se concentração paralela à dos médicos nos três distritos mencionados.

89. No capítulo das eventualidades a que ocorre o conjunto dos sectores da saúde e assistência, pode dizer-se que estes abarcam, em princípio, a protecção contra a generalidade dos riscos sociais, sem a predeterminação típica que caracteriza o seguro.
Como diz o Estatuto, "a assistência social propõe-se valer aos males e deficiências dos indivíduos, sobretudo pela melhoria das condições morais, económicas ou sanitárias dos seus agrupamentos naturais" (base I).
no Assembleia Nacional, Parecer sobre as Contas Gerais do Estado, 1958, vol. i, p. 275.

110 Assembleia Nacional, Parecer sobre as Contas Gerais do Estado, 1958, vol. I., p. 275.
111 Anuário Estatístico de 1959, pp. 51 e 53; Dr. Miller Guerra "A Política da Saúde", Boletim da Assistência Social, ano 16.º, Julho a Dezembro de 1958, p. 335.
112 Dados fornecidos pela Direcção-Geral da Assistência, em relação a 1957.
113 Dr. Miller Guerra, artigo citado, pp. 305 e seguintes.

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6 DE ABRIL DE 1961 1295

As prestações assistenciais são, na essência, dos mesmos tipos das do seguro social - em espécie e em dinheiro. Mas, no sistema português de assistência, as primeiras têm, de longe, a função primordial.
Consistem aquelas prestações em: 1) serviços de profilaxia (vacinações, medidas de higiene geral); 2) internamento em estabelecimentos de prevenção, tratamento ou reabilitação (hospitais, maternidades, sanatórios, manicómios, etc.); 3) internamento em estabelecimentos de assistência especializada (creches, orfanatos, asilos, recolhimentos, etc.); 4) serviços de assistência médica e medicamentosa (postos de consulta, clínicas, dispensários); 5) outras prestações em espécie (lactários, refeitórios, auxílios em vestuários, etc.).
Quanto às normas a que obedece a atribuição das prestações, importa referir as duas mais salientes.
A primeira diz respeito à preferência a dar às prestações de natureza preventiva ou recuperadora sobre as meramente curativas (Estatuto, base I, n.º 1.º).
A segunda refere-se à necessidade de inquérito assistencial (base VI, n.º 4.º), destinado não só a verificar o grau de insuficiência económica do assistido (means test), mas a adaptar as prestações ao condicionalismo próprio de cada caso.
As despesas efectuadas em 1958 pelos organismos e estabelecimentos oficiais e pelas instituições particulares de saúde e assistência (excluindo, portanto, os gastos directos do Estado) foram as seguintes 114:
Contos
Organismos e estabelecimentos oficiais .... 603 768
Instituições particulares ................. 425 798
1 029 566

90. Às receitas da organização portuguesa de saúde e assistência já se fez alusão, ao referir a posição relativa do Estado e das actividades particulares nesses sectores (supra, n.º 65).

91. Resta aludir à estrutura administrativa da .mesma organização, designadamente no aspecto da sua coordenação e direcção superiores.
As instituições e estabelecimentos de assistência particular - entre os quais se destacam as Misericórdias, de tradições seculares no País, regulam-se por estatutos, compromissos e regulamentos aprovados pelo Governo. As Misericórdias competem funções de coordenação da assistência local, mormente no campo da assistência materno-infantil e hospitalar (Estatuto, base XVII).
No plano nacional e para os ramos principais da assistência, a acção dos organismos particulares é coordenada por institutos oficiais com autonomia administrativa 115.
Os serviços, institutos e estabelecimentos de saúde e assistência pública dependem das Direcções-Gerais de Saúde e da Assistência, conforme se trate de assegurar a coordenação da actividade sanitária e profiláctica, ou de dirigir e coordenar a acção dos estabelecimentos hospitalares e mais instituições de assistência.
Pelo Decreto-Lei n.º 41 825, de 13 de Agosto de 1958 (artigo 1.º), foi criado o Ministério da Saúde e Assistência, para o qual foram transferidos os serviços de saúde pública e assistência, até então dependentes do Ministério do Interior.
E o Decreto-Lei n.º 42 210, de 13 de Abril de 1959 (artigo 3.º), instituiu o Conselho Coordenador do Ministério da Saúde e Assistência, presidido pelo Ministro.
Deve acrescentar-se que muitos serviços, estabelecimentos e actividades sanitárias, assistenciais e de previdência, no domínio oficial, estão dispersos por vários Ministérios.
Citam-se, entre outros: no Ministério da Justiça - a Federação das Instituições de Protecção à Infância; no Ministério do Interior - os partidos médicos, municipais e os serviços de assistência e previdência da Guarda Nacional Republicana e da Polícia de Segurança Pública; no Ministério das Obras Públicas - é Comissariado do Desemprego; no Secretariado da Defesa Nacional - os Serviços Sociais das Forças-Armadas; no Ministério da Educação Nacional - os serviços de saúde escolar, a Obra das Mães pela Educação Nacional, o Instituto Bacteriológico Câmara Pestana, o Instituto Português, de Oncologia, o Instituto de Oftalmologia Dr. Gama. Pinto e o Instituto Dr. António Aurélio da Costa Ferreira; no Ministério do Exército os hospitais militares; no Ministério da Marinha - o Hospital da Marinha; no Ministério, do Ultramar - o Hospital do Ultramar e o Instituto de Medicina Tropical.
Além disso, referimos há pouco a acção de assistência das instituições de seguro social obrigatório, para além dos seus esquemas regulamentares. E pode ainda dizer-se que os organismos corporativos (grémios, sindicatos, suas federações e uniões) possuem, no geral, fundos destinados à concessão de subsídios assistenciais.

§ 4.º

O sector do seguro facultativo

92. Ao lado das instituições de seguro obrigatório, em que se pretende assentar a estrutura fundamental do sistema português de protecção contra os riscos sociais, e da organização de saúde e assistência, que representa o seu complemento de mais larga extensão, cumpre referir o sector das instituições de seguro facultativo - as associações de socorros mútuos.
A sua acção reveste inegável interesse, justamente na medida em que tais instituições desempenham uma dupla finalidade - melhorar, para certas pessoas abrangidas pela previdência obrigatória, o esquema-base de eventualidades e prestações que esta. proporciona; garantir protecção contra determinados riscos sociais a pessoas não sujeitas à obrigação do seguro.
Vimos nos capítulos anteriores o desenvolvimento que lá fora tiveram as instituições de seguro facultativo, nomeadamente sob a forma de mutualidades.
Entre nós, as associações de socorros mútuos têm dilatadas tradições - o seu primeiro diploma regulador data de 1890 -, mas nunca lograram grande projecção no País 116.
Em 31 de Dezembro de 1959 existiam 201 instituições deste tipo, abrangendo 511 375 filiados.
As suas receitas - essencialmente constituídas por quotizações e rendimentos de bens próprios - são, todavia, escassas, não tendo ultrapassado 97 769 contos naquele ano.

114 Elementos fornecidos pela Direcção-Geral da Assistência. Não são ainda disponíveis os apuramentos relativos a 1959.
115 Instituto Maternal, Instituto de Assistência à Família, Instituto de Assistência aos Menores, Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos, Instituto de Assistência aos Inválidos, Instituto de Assistência Psiquiátrica, Instituto de Assistência aos Leprosos e Instituto do Sangue (Decreto n.º 85 108. de 7 de Novembro de 1945, artigos 113.º e 114.º; Decretos-Leis n.ºs 36 450, 41 498 e 41 759).
116 Regem-se actualmente pelo Decreto n.º 19 281, de 29 de Janeiro de 1931, e legislação complementar.

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O regime financeiro das associações baseia-se predominantemente na capitalização. Os valores acumulados somavam, na referida data, 774 854 contos, a maior parte - cerca de 60 por cento - aplicados em títulos. Relativamente às prestações concedidas - em que se destacam as pensões de sobrevivência, com um total de 2õ 554 contos - o seu quantitativo global, em 1959, foi de 59556 contos, assim distribuídos 117:

QUADRO IX

[Ver Tabela na Imagem]

As associações de socorros mútuos estão subordinadas ao Ministério das Corporações, e Previdência Social e sujeitas à fiscalização do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência (Lei n.º 1884, artigo 14.º).

93. Ainda, no que se refere ao seguro facultativo, importa aludir ao instituto do "seguro continuado".
Aos beneficiários da previdência social obrigatória que, por terem deixado de exercer determinada profissão, por mudança de residência ou local de trabalho, ou por outro motivo, deixem de estar sujeitos à obrigação do seguro, é facultada a continuação deste para os riscos de invalidez, velhice; e morte 118.
Os indivíduos que requeiram o seguro continuado obrigam-se ao pagamento das contribuições totais correspondentes às modalidades em que ficam inscritos.
Õ regime do seguro facultativo incorporado nas próprias instituições de seguro obrigatório é, como vimos, fórmula adoptada em diversos sistemas legislativos para abranger na protecção do seguro certas categorias sociais difíceis de sujeitar à obrigatoriedade - como, por exemplo, os trabalhadores independentes ou aqueles cujos rendimentos excedam determinado limite (supra, n.º 22).
O desenvolvimento do espírito de previdência, que a utilização das formas de seguro facultativo necessariamente pressupõe, constitui um problema de educação que, aliás, não tem sido descurado 118a.

§ 5.º

A coordenação superior do sistema

94. Foram oportunamente examinadas as fórmulas segundo as quais o problema da coordenação superior dos sistemas de segurança social tem sido resolvido nos diversos países (supra, n.º 54).
Entre nós, o princípio está consignado em vários diplomas, destacando-se no Estatuto da Assistência Social a base vi, norma 2.ª, já citada, segundo a qual "as actividades de assistência serão exercidas em coordenação com as de previdência, por forma a favorecer o desenvolvimento desta ...".
O problema assume particular acuidade no que toca às prestações médicas.
A organização médico-social do seguro obrigatório tem, na orgânica vigente, o seu complemento nos serviços oficiais de saúde e nos estabelecimentos de assistência particular. Em diversos aspectos - salvo no do internamento - as duas organizações são, de certo modo, concorrentes.
A ausência de articulação entre elas pode, efectivamente, dar lugar a abusos e fraudes por parte dos beneficiários, a conflitos de competência, a desperdício de recursos e meios de acção - numa palavra, a mau rendimento das duas organizações, que, neste aspecto, visam idêntica finalidade - a defesa da saúde.
O diploma legal que regulamentou o seguro-doença (Decreto n.º 37 762, de 24 de Fevereiro de 1950) estabeleceu, a tal respeito, regras concretas de coordenação dos serviços de previdência e de assistência, com base em um sistema de acordos entre os dois departamentos, para efeitos de consultas médicas, elementos de diagnóstico e internamento hospitalar [decreto citado, artigos 7.º, n.º 1.º, alínea b), 9.º e 10.º, alínea a)].
Na prática, porém, apenas em matéria de internamento para cirurgia geral foi possível celebrar o acordo de âmbito geral já referido entre os Serviços Médico-
-Sociais e a Direcção-Greral da Assistência.
A experiência do sistema pode considerar-se satisfatória, pois a percentagem de doentes internados relativamente aos pedidos de internamento subiu de 44,7 no 2.º semestre de 1958 (período inicial do acordo) para 70,6 em 1959 e 79,7 em 1960. Os casos de não internamento resultaram de falta de vagas nos hospitais 119.
Várias disposições legislativas, além das referidas acima, têm procurado instaurar diferentes formas de coordenação entre os sectores da previdência e os da saúde e assistência 120.
Nenhuma delas, no entanto, se mostrou exequível para alcançar o objectivo em vista.
A solução, por vezes preconizada, de integrar no Ministério da Saúde e Assistência os serviços médico-sociais das instituições de previdência não é de seguir- desde que do esquema do seguro social façam parte as prestações sanitárias.
O seguro pressupõe - repete-se - a predeterminação dos grupos sociais. abrangidos e o pagamento de prémios destinados especificamente a assegurar determinados benefícios. A integração do seguro-prestações médicas no âmbito de um departamento do Estado, cuja actividade, no aspecto sanitário, visa o conjunto da população do País, significaria, necessariamente, como já atrás se frisou, a confusão entre as receitas do

117 Instituto Nacional de Estatística, Organização Corporativa o Previdência Social - 1959, pp. 82 e 83.
118 Decreto-Lei n.º 38 775, de 5 de Junho de 1952.
118a A este propósito não deve deixar de assinalar-se o esforço formativo e de divulgação que vem sendo realizado pelos órgãos executivos do Plano de Formação Social e Corporativa - a Junta de Acção Social, o Centro de Estudos Sociais e Corporativos e o Instituto de Formação Social e Corporativa através dos meios de acção a que se refere a base X da Lei n.º 2085, de 17 de Agosto de 1956.
119 Informações prestadas pela Direcção-Geral da Previdência e Habitações Económicas. As cifras são as seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

120 Citam-se, entre outras: Estatuto da Assistência Social, alínea c) da base XXI e n.º 2 da base XXII; Decreto-Lei n.º 32 674, de 20 de Fevereiro de 1943, artigo 31.º; Decreto-Lei n.º 35 108, artigos 12.º, § único, 15.º, n.º 13.º e § 5.º, 24.º, § 2.º, 27.º, 29.º, 34.º e 68.º; Lei n.º 2 036, de 9 de Agosto de 1949, bases XVI e XXIV; Lei n.º 2044, de 20 de Julho de 1950, bases III, IV, n.º 1, e XIV; Deoreto-Lei n.º 39 805, artigo 1.º, § 7.º, e Decreto-Lei n.º 41 286, de 23 dê Setembro de 1957, artigo 5.º, n.º 4.º

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seguro e as receitas gerais do Estado afectas àquele departamento.
Os segurados passariam a ter a convicção - que, aliás, corresponderia à realidade - de que uma parte das suas contribuições teria como destinatários outras pessoas. Sentir-se-iam lesados na sua bolsa e nos seus direitos, sobretudo na hipótese - também muito verosímil nas condições actuais - dê estes direitos se não poderem efectivar por carência de instalações, de pessoal, ou por outras dificuldades.
Urna fórmula intermédia, também frequentemente defendida, consistiria em transferir para o departamento da Saúde os serviços médico-sociais da previdência - mas não as competentes receitas. As caixas pagariam àquele departamento (ou às instituições dele dependentes) os serviços prestados aos seus beneficiários, desde que respeitassem a eventualidades abrangidas pelo seguro.
Semelhante fórmula, que implicaria o pagamento, total ou parcial, por "acto médico" ou "unidade de serviço" (consulta, tratamento, análise, radiografia, intervenção cirúrgica), ainda que na base de tabelas moderadas, tem-se revelado, na maior parte dos países que a adoptaram, incompatível com uma sã administração financeira do seguro social.
Conforme se lê no aludido relatório sobre o seguro-doença apresentado à Assembleia de Londres da Associação Internacional de Segurança Social, "são principalmente os regimes que aplicam o sistema do pagamento indirecto ou do reembolso, e .não dispõem de instituições próprias para prestação dos serviços médicos, que ficam expostos, durante períodos mais ou menos longos, a estados dó desequilíbrio financeiro 121.
O pagamento, pelo seguro, de serviços prestados aos segurados por estabelecimentos públicos ou particulares de saúde deve, pois, ser regulado por acordo entre os sectores ou organismos interessados, no qual se definam, além do mais, os limites dos direitos dos beneficiários, em obediência às disposições legais e regulamentares que regem os esquemas do seguro.
O método dos acordos pode também servir para efectivar outra forma de colaboração entre os dois sectores, adoptada em alguns países: a da participação da previdência em investimentos destinados a construir e apetrechar serviços dependentes do departamento da Saúde, designadamente os da rede hospitalar. A essa participação deverá, logicamente, corresponder a representação da previdência na administração dos estabelecimentos assim instalados.
Dir-se-á que todos estes problemas desapareceriam se os cuidados médicos, em lugar de serem concedidos como prestações de um seguro, passassem a ser assegurados através de um serviço público, embora com gestão autónoma (cf. supra, n.ºs 51-52).
Para tanto, porém, seria necessário observar, pelo menos, as condições já atraís referidas: 1.ª, que esse serviço fosse comum a toda a população, sem dependência do status social ou económico; 2.ª, que fosse custeado por imposto especial, pois não se afigura socialmente recomendável que o devesse ser por força das receitas gerais do Estado; 3.ª, que a economia nacional pudesse suportar o esforço financeiro correspondente.
A primeira condição pressupunha a existência de um equipamento médico-sanitário suficiente e apto para atender às necessidades de todo o agregado nacional.
A segunda condição implicava que do esquema de benefícios do seguro social deixassem de fazer parte as prestações médicas. Haveria então que resolver,
entre outras, duas questões basilares: a da indemnização a pagar ao seguro pela transferência das suas instalações médico-sociais para o serviço nacional; e a ao controle das baixas, para efeito de processamento do subsídio de doença ou de maternidade, por meio de articulação entre as instituições de previdência e o serviço de saúde.
Enfim, a condição posta em terceiro lugar suscita o problema do custo do serviço nacional de saúde a criar.
Não é possível, com base nos elementos estatísticos existentes, organizar uma estimativa rigorosa a tal respeito.
A própria determinação da despesa global, actualmente realizada com o conjunto das prestações sanitárias, apenas pode fazer-se por aproximação, dada a carência de dados suficientes.
Computa-se aquela despesa ao redor de 1 250 000 contos anuais, com a seguinte distribuição (números redondos):
Contos
Estado e organismos oficiais de saúde 122 ....... 650 000
Seguro social, obrigatório 123 .................. 200 000
Instituições particulares e associações
de socorros mútuos 124 .......................... 400 000
1 250 000

A esta cifra corresponde o custo, por habitante, em 1959, de 138$. Tal encargo representa, em função do rendimento médio por pessoa activa, estimado para o mesmo ano em 16 840$, a percentagem de 0,8;
Relativamente ao montante do produto nacional ao custo dos factores, no referido ano, aquele custo global situa-se em 2,2 por cento.
Ora, do estudo internacional atrás mencionado (n.º 52), acerca do custo dos cuidados médicos em quinze países, apurou-se que a respectiva capitação oscilava entre 1,75 e 2 por cento do rendimento médio por pessoa activa e o total das despesas entre 3,6 e 4,5 por cento do rendimento nacional.
Quer dizer: o custo das prestações sanitárias em Portugal não excede cerca de metade do "laqueie conjunto de países.
Evidencia-se, ainda, que a incidência do sector do seguro social neste custo é apenas de 16 por cento. Se se considerarem sòmente os serviços médico-sociais da Federação e das caixas não federadas, aquela percentagem desce para 14,6.
Dada a reduzida proporção das prestações sanitárias da previdência na despesa global, pode admitir-se que

121 A. I. S. S., L'Assurance-maladie, "Rapport", cit., p. 19.
122 Nas despesas do Estado consideraram-se as realizadas directamente com serviços de saúde pelas Direcções-Gerais de Saúde e da Assistência, num total "de 44 605 contos, segundo o Orçamento Geral do Estado para 1960. Quanto aos organismos oficiais, utilizaram-se as previsões de despesa dos serviços e estabelecimentos de carácter sanitário dos vários Ministérios, segundo o mapa n.º 2 do preâmbulo daquele orçamento e os desenvolvimentos anexos relativos à Misericórdia de Lisboa (na parte imputável a actividades sanitárias) e aos Hospitais Civis. O montante global apurado foi de 605 659 contos. Não compreendo; os corpos administrativos.
123 I. N. E., Organização Corporativa e Previdência Social - 1959, cit. Inclui, além das caixas de previdência e sua federação,- as Casas do Povo, as Casas dos Pescadores e a Junta Central das Casas dos Pescadores. O total dos gastos em 1959 foi de 199 655 contos.
124 Relativamente às instituições particulares de saúde G assistência, as despesas realizadas com auxílios em espécie, incluindo a acção médico-social e hospitalar e a parte proporcional nas despesas de carácter administrativo, segundo elementos fornecidos pelo Ministério da Saúde e Assistência para 1958, somaram 379 373 contos. No tocante às associações de socorros mútuos, a despesa realizada em 1959 com assistência médica e farmacêutica, conforme o quadro IX (supra, n.º 92), foi de 15 539 contos.

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os desperdícios provenientes de eventuais sobreposições de serviços vão, sobretudo, incidir nos dois outros sectores - o que confirma que a necessidade dê coordenação se faz sentir, em primeira linha, dentro de cada sector.
Do exposto parece poder concluir-se que o custo de um serviço nacional de saúde em Portugal - partindo do princípio de que seria necessário duplicar as despesas actuais para trazer as prestações desse serviço ao nível internacional - deveria situar-se à volta de 2 500 000 contos, isto é, em cerca de 4 por cento do produto nacional.
Supõe-se não ser viável ir a curto prazo para tal solução, salvo quanto ao sector da medicina preventiva e sanidade geral, em que nada obsta se mantenha e aperfeiçoe o regime de serviço público já em vigor, sob a* alçada do Ministério dá Saúde e Assistência.
No mais, enquanto a fórmula da organização nacional de saúde nos aspectos curativo e recuperador não for exequível, o que se mostra sem dúvida imperioso e urgente é coordenar de modo eficaz os departamentos responsáveis pelos serviços sanitários oficiais e pelo seguro-prestações médicas.
A instauração de um só Ministério para todos os sectores da política social ou, pelo menos, da segurança social poderia revelar-se porventura como solução mais orgânica e eficiente, à semelhança do que acontece em grande número de países (cf. supra, n.º 54).
Afastada, por ora, esta via, torna-se, pelo menos, indispensável criar um órgão, ao nível ministerial, encarregado de definir as directrizes gerais da política de coordenação e assegurar a sua execução efectiva.
Ao nível dos serviços, aquela política deverá realizar-se, sobretudo, através de acordos negociados entre os departamentos, organismos e instituições interessados, desenvolvendo-se e aperfeiçoando-se a prática já em vigor, de harmonia com as directrizes que vierem a ser estabelecidas na matéria.

§ 6.º

Síntese deste capítulo

95. Antes de passar à apreciação da proposta de lei sobre a reforma da previdência social, importa fazer a síntese dos principais pontos em que o sistema português reclama estudos e providências adequados à sua necessária expansão e aperfeiçoamento, com particular referência ao sector do seguro obrigatório, tendo em vista as observações formuladas ao longo do presente capítulo.

A) Quanto ao campo de aplicação da previdência social:

1) Não obstante os esforços realizados, sobretudo a partir da guerra, o seguro social obrigatório, na metrópole, apenas nos sectores da indústria, comércio e serviços atingiu expansão satisfatória.
2) A insuficiência de protecção pelo seguro reveste especial acuidade no sector primário (agricultura, silvicultura e pecuária), onde o índice de cobertura é apenas de um quinto.
3) Nos sectores secundário e terciário há, sobretudo, que encarar o efectivo alargamento do seguro aos trabalhadores por conta própria.

B) Quanto às eventualidades:

4) Na indústria, comércio e serviços, a previdência obrigatória não inclui a maternidade (salvo para as prestações médicas durante o parto), a sobrevivência (excepto em casos especiais), o desemprego, os acidentes de trabalho e as doenças profissionais.
5) Na agricultura e na pesca, o esquema é mais restrito e a sua organização baseia-se essencialmente em moldes assistenciais.

C) Quanto às prestações:

6) Na indústria, comércio e serviços, e pelo que toca às prestações em dinheiro, os principais reparos dizem respeito: ao limite de duração do subsídio de doença; à falta de articulação entre a doença e a invalidez; às bases de cálculo das pensões; à natureza puramente individual destas; e à impossibilidade do seu reajustamento perante variações sensíveis do custo da vida.
7) Quanto às prestações médico-sociais, e para os mesmos sectores, as observações consistem: na falta de uma organização de medicina preventiva, especialmente de medicina do trabalho; na carência de hospitalização em clínica médica e especialidades; nos limites de duração da assistência medicamentosa.
8) Na agricultura: escassez acentuada de todos os benefícios, nomeadamente das prestações médicas (não incluem medicamentos, elementos de diagnóstico, nem internamento) e do subsídio por morte; curto limite de duração do subsídio na doença; concessão das restantes prestações sob a forma de assistência.

D) Quanto aos meios financeiros:

9) Na agricultura: insuficiência do actual nível de quotizações; necessidade de revisão do sistema de contribuição patronal.
10) No que se refere ao custo do sistema relativamente ao rendimento nacional: posição favorável do País em relação à maior parte das nações da Europa Ocidental; conveniência de atender, neste aspecto, às implicações do movimento de integração europeia.

E) Quanto ao equilíbrio financeiro:

11) Na indústria, comércio e serviços: necessidade de substituir a capitalização, como método de financiamento das pensões, por um regime misto, que permita distribuir parte apreciável das receitas e melhorar o esquema de eventualidades e benefícios, sem comprometer o equilíbrio do sistema e as necessidades da economia nacional.

F) Quanto à organização administrativa:

12) Na indústria comércio e serviços: necessidade de unificar o sistema e ocorrer aos inconvenientes da organização de essência profissional ou económica, através de instituições do base geográfica (distrital para as prestações temporárias; nacional para as pensões).
13) Posição complementar das instituições de natureza empresarial ou corporativa, sem prejuízo da compensação geral do custo do sistema.

G) Quanto à coordenação superior do sistema:

14) Indispensável assegurar, por forma eficaz, a coordenação orgânica entre os principais sectores que integram o sistema português

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de protecção contra os riscos sociais: a previdência, os serviços oficiais de saúde (sanidade geral e organização hospitalar) e a assistência stricto sensu. O problema reveste particular importância no que respeita às prestações médico-sociais. Sugere-se a criação de um órgão, ao nível ministerial, encarregado de estabelecer as directrizes e assegurar a execução da política coordenadora. Ao nível dos serviços, a coordenação deverá efectivar-se principalmente através de acordos entre os departamentos e organismos interessados.

CAPITULO IV

A proposta de lei

§ l.º

Preliminares

96. E chegado o momento de nos debruçarmos sobre ò projecto de proposta de lei a que respeita o presente parecer.
Num plano de generalidade, importa apreciar em que medida ele vem ao encontro das necessidades reveladas pelo sistema português de protecção contra os riscos sociais, tendo em vista a análise que acaba de fazer-se e as solicitações do nosso tempo postas em relevo no capítulo sobre a problemática da segurança social.
Nessa apreciação seguir-se-á uma razão de ordem paralela à dos capítulos anteriores.

§ 2.º

Campo de aplicação

97. A primeira observação geral diz respeito ao campo de aplicação da proposta, e é a seguinte: todo o conjunto de medidas projectadas refere-se principalmente ao sector da previdência obrigatória na indústria, comércio e serviços.
Há, é certo, algumas alusões às Casas do Povo e às Casas dos Pescadores, na classificação das instituições de previdência [base I, n.º 2, alíneas a) e b)] e na sua definição (base II, n.º 2), bem como à cooperação a prestar pelas caixas regionais de previdência às Casas do Povo (base XVIII).
Nenhuma providência concreta se encara, porém, quanto à necessidade de alargar, directamente, o âmbito da previdência à nossa gente do campo.
Ao meio rural interessam, sobretudo, por corresponderem às necessidades mais instantemente sentidas, a concessão de prestações médicas e o seguro-invalidez.
A referida base XVIII fala, como se disse, de cooperação a prestar pelas caixas regionais «na assistência médico-social aos trabalhadores rurais e na protecção às famílias dos mesmos trabalhadores, devendo celebrar-se entre umas e outras os convenientes acordos, para utilização recíproca dos respectivos serviços».
Mas esta fórmula não parece conter solução inteiramente satisfatória para o problema - a menos que as caixas de previdência passem a instalar serviços médicos em zonas onde não tenham beneficiários ou estes sejam escassa minoria relativamente aos trabalhadores agrícolas.
As duas organizações - caixas de previdência e Casa do Povo - têm, no regime, actual e no da proposta, campos de aplicação diferentes e, por isso, - repete-se - tais acordos não podem, sem forçar o enquadramento e os princípios vigentes, estender-se aos meios estritamente rurais.
Não menos premente é o problema da invalidez do trabalhador campesino. O meritório esforço realizado neste capítulo pelas Casas do Povo tem os estreitos limites já assinalados.
É certo quê - como se referiu - as federações de Casas do Povo podem, nos termos da respectiva lei orgânica, realizar por si os objectivos destes organismos nas zonas onde eles não existam (cit. Decreto-Lei n.º 41286,. artigo 6.º). Mas semelhante fórmula - além de ser susceptível de contrariar o alargamento da rede de Casas do Povo, uma vez que os serviços das federações se lhes substituem para todos os fins - tem o grave óbice de não favorecer a compensação financeira entre o sector agrícola e os restantes (indústria, comércio, serviços), efectuada através das caixas regionais de previdência e da instituição central de pensões - compensação que, conforme se frisou (n.º 79), parece indispensável para suprir as limitadas possibilidades da economia agrária, além de representar um imperativo de justiça distributiva e de solidariedade nacional.
Julga-se, assim, ser solução mais prática e eficaz a de integrar progressivamente os trabalhadores rurais e equiparados nas caixas regionais de previdência para o seguro-prestações médicas e, logo que possível, na Caixa Nacional de Pensões para o de invalidez.
Não constituiria impedimento a essa integração o facto de ela se fazer apenas nas referidas modalidades, por isso que, tanto as instituições regionais como a nacional, deverão ter, para cada ramo de seguro, contabilidades separadas.
O enquadramento dos trabalhadores agrícolas na organização geral de previdência, longe de tolher, antes estimularia o desenvolvimento da rede de Casas do Povo, pois estas seriam os órgãos periféricos das caixas regionais e da caixa central para a verificação dos direitos dós beneficiários, cobrança de receitas e concessão das prestações. E, do mesmo passo, libertar-se-iam aqueles organismos da maior parte das preocupações financeiras que os assoberbam, facultando-lhes mais largas perspectivas no prosseguimento dos seus restantes objectivos institucionais.
Acresce que tal enquadramento é condição sine qua non da futura inclusão, adiante preconizada (infra, n.º 102), dos riscos de acidentes e doenças profissionais no sistema da previdência social, pois o regime actual do seguro privado já abrange, para esses riscos, os trabalhadores do campo.
Restringindo-se o seguro, na fase inicial, apenas às prestações sanitárias e à invalidez, o seu custo não acarretaria acréscimo incomportável de encargos para a lavoura. Apontou-se, no capítulo anterior (n.º 80) o encargo diminuto que o sector agrícola - no seu conjunto, é claro- tem suportado para a previdência. Não deve esquecer-se, como já se salientou, que o custo do seguro social não é um custo novo, pois de qualquer modo -directamente, pelo encargo que muitos patrões agrícolas decerto têm suportado e continuariam a suportar, ou indirectamente, através da parte que nas contribuições do Estado e das câmaras se destina à assistência- sempre a lavoura teria de arcar, em grande parte, com as consequências da enfermidade ou da invalidez dos seus trabalhadores.
Logo que os resultados da execução destas, medidas e do novo regime financeiro da previdência o permitissem, seria do maior interesse encarar o alargamento do esquema de prestações em benefício da população rural, designadamente no que se refere ao abono de família.

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98. Outro problema relativo ao campo de aplicação diz respeito aos chamados trabalhadores independentes ou, pára usar a terminologia da proposta (base I, n.º 3), das «pessoas que, sem dependência de entidades patronais, exercem determinadas profissões, serviços ou actividades».
A fórmula encarada para a inclusão destas categorias no seguro é a da criação de um tipo especial de instituições - caixas de reforma ou de previdência - com um esquema de eventualidades limitado à invalidez, velhice e morte (base xx).
A questão interessa aqui especialmente aos trabalhadores por conta própria na indústria, comércio e serviços. No meio agrícola, como é sabido, os trabalhadores autónomos, cujo teor de vida se não distinga do comum dos rurais, estão, em princípio, ao abrigo das Casas do Povo, e assim continuariam amanhã no âmbito das caixas regionais de previdência.
Ora, tivemos ocasião de referir (supra, n.º 34), quanto, hoje em dia, é precária a situação dos pequenos artífices, industriais, comerciantes e outras pessoas que trabalham por sua conta nos sectores secundário e terciário.
Sem dúvida que a protecção contra a invalidez, a velhice e a morte já constitui para esses grupos sociais inestimável benefício. E, sob tal aspecto, a medida preconizada na proposta só merece aplausos.
Mas, como também nos foi dado observar, o risco que, nos tempos actuais, mais frequentemente se verifica, e constitui gravame quase sempre incomportável para a economia familiar dessas classes - além de ameaçar a própria vida -, é o risco de doença e, neste, sobretudo, o custo dos cuidados médicos.
Nenhum programa de seguro social, por muito limitado que seja, pode actualmente prescindir da cobertura da doença, ao menos no aspecto curativo.
Parece, pois, deverem os trabalhadores independentes ser admitidos ao seguro-doença nas caixas regionais, na modalidade de prestações em espécie, pagando a respectiva capitação ou, de preferência, uma quota em função dos rendimentos sobre que descontem para as reformas.

§ 3.º

Eventualidades

99. A proposta contém a este respeito as seguintes providências, quanto aos trabalhadores por conta de outrem:
a) Inclui desde já a maternidade no esquema normal dos seguros a curto prazo (base IV, n.º 1) ;
b) Prevê um regime especial para a protecção da tuberculose (base IV, n.º 2);
c) Projecta a inclusão do desemprego involuntário nos termos que vierem a ser determinados (base IV, n.º 4).
No concernente à maternidade, quê já beneficiava de serviços médicos durante a gravidez e o puerpério, pretende-se agora conceder subsídio pecuniário nos mesmos termos do de doença - o que se afigura inteiramente desejável.
Quanto à tuberculose, deve esclarecer-se que não se trata de doença excluída do actual esquema de eventualidades. As caixas de previdência concedem subsídios e prestações sanitárias aos tuberculosos nos termos regulamentares, além de outros benefícios por força dos respectivos fundos de assistência.
Encara-se no projecto a concessão de subsídios pecuniários nessa doença, certamente por tempo superior aos 270 dias do regime actual.
Do relatório da proposta (n.º 59) vê-se que, em matéria de cuidados sanitários para além dos limites vigentes, se conta com a colaboração do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos.
Sem dúvida que desta coordenação de esforços, na medida em que seja possível efectivá-la por forma satisfatória para ambos os sectores, sómente poderão advir vantagens.
Pela Lei n.º 2044, de 20 de Julho de 1950, que aprovou as bases da luta contra a tuberculose, os encargos da assistência, prestados pelos estabelecimentos e serviços dependentes daquele Instituto aos beneficiários das caixas de previdência, serão regulados por acordo entre o mesmo organismo e as instituições interessadas (base XIV, n.º 4).
Encontra-se em vias de conclusão o primeiro acordo celebrado nos termos 4este preceito, o qual visa, fundamentalmente, os serviços de vacinação, radiorrastreio e tratamento em regime ambulatório. Não inclui, por ora, a sanatorização, nem a recuperação profissional do doente (125).
A concessão de subsídio pecuniário aos tuberculosos representa benefício de fundamental relevância, pois, como se nota no relatório ministerial, a muitas vezes os trabalhadores não aceitam a sanatorização ou regressam prematuramente à sua actividade profissional, para não deixarem a família abandonada à sua sorte e talvez na miséria por falta de salário».
A única dificuldade está em que, na tuberculose, o tratamento incompleto ou deficiente pode dar lugar à reactivação da doença e, por isso, sem uma conexão estreita entre as duas ordens de benefícios -o subsídio e a acção médica - não são de esperar resultados satisfatórios. Ora, pelo sistema projectado, enquanto o subsídio passará a constituir um direito do beneficiário e a ser garantido enquanto durar a doença, a concessão das prestações sanitárias, para além dos limites do acordo em perspectiva, continua a ficar dependente das possibilidades dos fundos, de assistência das instituições.
Torna-se, assim, necessário encarar, logo que possível, o alargamento deste regime, por forma a garantir, sob as condições convenientes para prevenir abusos, ò tratamento e a recuperação completos do trabalhador.

100. A inclusão do desemprego involuntário nas eventualidades a cobrir pelo seguro social constava já, como vimos, das primeiras leis que introduziram o sistema vigente.
Projecta-se agora dar realidade a um propósito que data de um quarto de século.
Da ineficácia e completa desactualização do regime actual, como sistema de «combate ao desemprego», não pode sequer duvidar-se.
O próprio relatório do diploma que criou o Comissariado do Desemprego (o citado Decreto n.º 21 699, de 1932) dizia textualmente:
O presente decreto não se destina a criar uma nova modalidade permanente de utilização da mão-de-obra. Condensa meia dúzia de tentativas para atenuar a crise da hora que passa ...
Pela forma como organizou o Comissariado, quis o Governo vincar-lhe a natureza de órgão transitório; e a sua mais alta e delicada missão será ir preparando, desde o primeiro dia do seu funcionamento, as condições da sua extinção ...

125 Informações prestadas pela Direcção-Geral da Previdência e Habitações Económicas. Segundo a mesma fonte, algumas caixas não federadas têm concedido sanatorizações dentro das possibilidades dos seus fundos de assistência, no que despenderam, em 1950, cerca de 167 contos.

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Isto escrevia-se em 1932 ... Passou a crise que o diploma se destinava a combater, passaram vinte e nove anos e o «órgão transitório» transformou-se em permanente....
É fácil mostrar, em poucas linhas, como essa «meia dúzia de tentativas», aliás ditadas por um pensamento sempre actual -o de «dar trabalho» aos desempregados, em vez de «subsídios»-, deixaram de ter significado como meios de protecção contra o desemprego.
O decreto de 1932 classifica todos os trabalhadores em quatro grupos: I) empregados de comércio e escritório; II) trabalhadores de qualquer ofício, exceptuada a construção civil; III) pessoal da construção civil; iv) trabalhadores rurais e outros sem profissão definida (126).
A respectiva colocação, quando desempregados, deve ser feita nas seguintes actividades:
Operários e aprendizes do grupo III e trabalhadores urbanos do grupo IV - Obras de melhoramentos urbanos e de águas e saneamento;
Rurais do grupo IV - Arborização de serras e dunas, correcção, florestal de bacias hidrográficas e regularização de correntes; arborização e policiamento de estradas; obras de melhoramentos rurais.
Quanto aos desempregados dos grupos I é II, apenas se admite, em princípio, a possibilidade da sua requisição, por serviços públicos ou empresas privadas, em regime de «trabalho subsidiado» 127.
Daqui se infere imediatamente que só quanto aos grupos III e IV se prevê a ocupação em determinados trabalhos públicos. Para os restantes fica apenas a expectativa da requisição.
Ora, relativamente à abertura de trabalhos públicos, nenhuma dúvida de que, por seu intermédio, é possível promover a elevação do nível de emprego. Mas o que já não pode aceitar-se é que, tratando-se naturalmente de obras de interesse geral, elas sejam custeadas, embora parcialmente, por descontos sobre os salários - principal fonte de receita do Fundo de Desemprego -, em vez de sê-lo pelas receitas gerais do Estado. Acresce que os principais contribuintes daquele Fundo -os trabalhadores dos grupos I e II:- pouco ou nada beneficiam do sistema.
Demais, nenhumas garantias existem de que a comparticipação em obras vá efectivamente ocupar os desempregados dos grupos III e IV, pois nem sempre há trabalhos públicos a efectuar nas zonas onde o desemprego se verifica.
Quanto aos «subsídios de trabalho», o número de indivíduos a beneficiarem deles, em 31 de Dezembro de 1959, era apenas de 3897, e o montante dos subsídios não excedia 36 277 contos (128).
Nesse mesmo ano, a receita global do Fundo de Desemprego atingiu 277 779 contos, e as despesas de comparticipações em obras foram de 132 734 contos (129).
A fórmula do «subsídio de trabalho» suscita também as mais fundadas objecções. É que, de duas uma: ou a ocupação do trabalhador corresponde a uma necessidade real do serviço ou da empresa requisitante, e então deve aquele ter direito à remuneração integral paga pela entidade que o ocupa, ou não corresponde e, nesse caso, trata-se de uma fórmula artificial de resolução do problema - que pode ter muito de beneficência mas é com certeza antieconómica.
Para além destes meios de acção -comparticipação em- obras publicas e subsídios de trabalho-:. sabe-se que o Comissariado tomou a meritória iniciativa de manter centros de trabalho e aperfeiçoamento profissional, com os quais despendeu, em 1959, perto de 4243 contos, e entregou ao Instituto de Assistência à Família e ao Fundo Comum das Casas do Povo para assistência a desempregados e subsídios de invalidez a trabalhadores rurais, 30 855 contos.
Mas o sistema repousa essencialmente nas duas fórmulas acima enunciadas, cuja ineficácia, no ponto de vista do combate ao desemprego, e cuja inconveniência no aspecto de justa distribuição dos encargos, se revelam evidentes a todas as luzes.
Deve concluir-se daí que a solução consiste em instaurar, tão rapidamente quanto possível, um seguro social contra o desemprego, conforme se prevê na proposta de lei?
Vimos noutro lugar (supra, n.º 13) que o seguro-desemprego se desenvolveu sobretudo durante os anos de depressão económica que se seguiram à crise mundial de 1929-1930. Depois da guerra, apenas cinco países - Austrália (1944), Grécia (1945), Japão (1947), Uruguai (1944) e Espanha (1954) - introduziram aquele seguro. E no conjunto dos seguros sociais representa, ainda hoje, o ramo menos praticado - apenas por 26 países.
Como se dê numa publicação recente da Repartição Internacional do Trabalho, o seguro-desemprego é um dos mais difíceis de organizar e administrar. Pressupõe, como condição prévia, a existência de um serviço de emprego e colocação eficiente e experimentado, a articular estreitamente com o seguro. Exige, depois, um trabalho de verificação sistemática, em cada caso, das condições de atribuição das prestações, bem como da subsistência do estado de desemprego involuntário, a fim de evitar a fraude e o estímulo à ociosidade.
Por outro lado, tem pouca utilidade se a grande massa da população activa é de trabalhadores não diferenciados. A maioria pios países em que funciona aquele seguro tem uma economia essencialmente industrial com uma mão-de-obra altamente qualificada (130).
Deve ainda dizer-se que o seguro-desemprego não pode ocorrer a todas as formas de desocupação, designadamente à do desemprego maciço ou generalizado, imputável à insuficiência ou instabilidade da procura global em relação à oferta de bens de consumo e de equipamento.
O seu campo de acção deve restringir-se às restantes formas de desemprego --friccional e estacional-, bem como ao subemprego que caracteriza os países pouco industrializados em que a densidade da população, com referência à superfície de terras cultiváveis, é excessiva - como sucede em certas regiões do nosso país.
De qualquer maneira, um seguro contra o desemprego não pode funcionar isoladamente. Implica, antes do mais, o planeamento de uma política de desenvolvimento económico com vista a assegurar altos níveis de emprego. E requer, além disso, como há pouco frisámos, a organização de serviços de estudo, do mercado do trabalho, de formação e reeducação profissional e de colocação, eficientes, distribuídos por todo o Pais e intimamente coordenados com o seguro.
A necessidade desta .coordenação levou, em certos países, a atribuir ao próprio serviço de emprego a verificação do direito aos benefícios do seguro e o pagamento dos subsídios.
Em suma, crê-se que a criação do seguro contra o desemprego, entre nós, pressupõe, numa primeira fase, a organização, sob a alçada do Ministério das Corporações e Previdência Social, dos serviços acima enuncia-

126 Decreto n.º 21 699, artigo 44.º
127 Decreto n.º 21 699, artigo 47.º
128 Elementos fornecidos pelo Comissariado do Desemprego.
129 Idem.
130 B.I.T., La sécuritè sociale, cit., p. 95.

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dos, nos quais se deve transformar, quanto antes, o actual Comissariado do Desemprego.
Numa segunda, fase, que não deveria ser retardada, proceder-se-ia à instauração do seguro, tendo em vista, além do mais, a articulação estreita com aqueles serviços, nos termos acima referidos (131).

101. Relativamente à sobrevivência, nenhuma alusão contêm as bases da proposta de lei.
Apenas no relatório ministerial se observa que a inclusão de pensões de sobrevivência no esquema normal das caixas «está estreitamente ligada aos problemas respeitantes à execução do seguro de reforma e seu regime financeiro» (n.º 28, in fine).
Compreendesse perfeitamente a prudência com que o Governo se propõe encarar este aspecto do seguro social. As pensões de sobrevivência, pelo número de eventuais destinatários e pela duração dos benefícios, são prestações de custo elevado.
E já se acentuou, neste trabalho, ser preferível sacrificar um ou outro ramo de eventualidades do que conceder prestações insuficientes ou inadequadas (supra, n.º 42).
Por outro lado, os problemas de ordem moral suscitados pelas pensões de sobrevivência, sobretudo os respeitantes às viúvas dos segurados, requerem também ponderada e cuidadosa regulamentação.
Nenhuma destas dificuldades, porém, é intransponível, e sem dúvida que a protecção das famílias cujo sustento depende exclusivamente do trabalho do seu chefe- é objectivo do mais largo alcance social.
Espera-se, pois, que a revisão do regime financeiro da previdência portuguesa permita encarar, em futuro próximo, a inclusão da sobrevivência nas eventualidades cobertas pelo seguro social.

102. A proposta é por igual omissa quanto ao problema dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais, com vista à sua integração naquele seguro.
O regime vigente, como atrás se aludiu, funda-se ainda no princípio da responsabilidade patronal, com a transferência facultativa para companhias privadas dê seguros.
Na prática, essa transferência acha-se feita em relação à grande maioria dos casos.
A importância total de prémios líquidos pagos às empresas seguradoras no ano de 1959, para a cobertura daqueles riscos, foi de 331 422 contos (132).
Já na altura da segunda guerra mundial, como se viu (supra, n.º 13), a tendência das legislações nacionais era no sentido da integração do seguro-acidentes nos sistemas de seguros sociais. Actualmente, na Europa, só a Bélgica (apenas para os acidentes), a França para os trabalhadores da agricultura, a Irlanda e Portugal, que saibamos, mantêm o regime do seguro privado de carácter facultativo. Noutros países (Dinamarca, Finlândia, Holanda e Espanha) o seguro é compulsivo, mas pode ser efectuado em empresas privadas ou em mútuas das entidades patronais. Nos restantes países - a grande maioria - o sistema exclusivo é o do seguro, social obrigatório.
As razões aduzidas para dar preferência a esta última fórmula são as que seguidamente se resumem.
A tomada do risco por sociedades comerciais com fins lucrativos encarece naturalmente o custo do seguro. E, como diz Venturi, à consciência pública parece chocante que um regime de protecção social, tornado coactivo pelo Estado em benefício de grupos económicamente débeis, constitua objecto do comércio de seguros (133).
Alega-se, em contrário, que, tratando-se de riscos que acarretam responsabilidade civil, cujo ónus recai sobre o empresário, eles escapam por natureza ao âmbito do seguro social. Mas o argumento envolve uma petição de princípio, pois o problema que se põe é justamente o dê saber se a regra «da responsabilidade objectiva do empresário pelos riscos profissionais é de conservar como fundamento da protecção do trabalhador contra tais eventualidades, ou se, dada a natureza inquestionavelmente social daqueles riscos, a sua cobertura deve passar a fazer-se em regime de seguro social obrigatório.
Nenhuma dúvida pode, na verdade, suscitar-se quanto ao carácter social dos riscos de acidentes e doenças profissionais, dada a sua generalidade, a sua estreita conexão com as condições de execução do trabalho na economia contemporânea e os seus efeitos no ponto de vista da privação ou redução dos meios de existência.
A única dificuldade que, em alguns países, se experimentou, quanto à integração daqueles riscos no seguro social, foi a resultante do nível geralmente mais elevado das prestações atribuídas pela lei nos sinistrados, relativamente aos demais beneficiários do seguro. A evolução posterior, no sentido de melhorar e tornar mais eficientes os benefícios da previdência obrigatória, esbateu em grande parte tais diferenças.
Mas a protecção social daqueles riscos não envolve apenas o aspecto da indemnização pelas suas consequências, e sim, simultaneamente, o problema da prevenção dos sinistros e doenças, e o da reabilitação profissional dos sinistrados.
O primeiro destes problemas está directamente relacionado com a estruturação de uma rede de serviços de medicina do trabalho nas empresas.
Em Portugal continuamos, nesta matéria, salvo iniciativas isoladas de alguma empresa mais importante, praticamente no zero.
À medicina do trabalho tem, aliás, campo de acção bastante mais vasto do que o da prevenção dos acidentes e doenças profissionais. Visa, de modo geral, a proteger os trabalhadores contra todas as ameaças à sua saúde, resultantes do trabalho ou das condições em que este se efectua, e a velar pela adaptação física e mental do operário à tarefa que lhe é destinada (134).
Por outro lado, a protecção contra os acidentes e as doenças do trabalho requer, simultaneamente, o funcionamento de serviços de reabilitação e reeducação profissional, a fim de restituir à vida activa, na mesma ou noutra profissão, o trabalhador diminuído por efeito da doença ou do sinistro sofridos.
Também, neste aspecto, a acção do Estado e das companhias seguradoras tem sido, entre nós, praticamente inexistente.
Quanto ao sector oficial, a Lei n.º 1942, de 27 de Julho de 1936, pela qual ainda hoje se rege a matéria de acidentes e doenças profissionais, mandava criar,

131 Veja-se, sobre toda esta matéria: B. I. T., Lês systèmes dassurance-chômage, Genève, 1955; Social security programs throughout the world, p. XVIII; Dr. António Júlio de Castro Fernandes. A Segurança dos Trabalhadores através do Seguro Social, Lisboa, 1947, p. 77; Dr. Luís Vaz de Sousa, Desemprego e Seguro Social, comunicação ao IV Congresso da União Nacional, separata do Boletim da Assistência Social, Janeiro-Junho, 1957.
132 Anuário Estatístico de 1959, p. 94.
133 Venturi, ob. cit., p. 74.
134 Veja-se B. I. T., L`organisation dês serviçes de médecine du travail dans Vèntreprise, Conférence Internationale du Travail, 43 ême session, Rapport IV, Genève, 1959.

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em anexo aos tribunais do trabalho, «um serviço especial de readaptação» (artigos 41.º a 43.º). Nunca se cumpriu este programa.
Sabe-se estar em vias de realização, pela Misericórdia de Lisboa, a construção e o apetrechamento de um centro de readaptação de diminuídos físicos, que constitui a primeira achega de vulto para tão agudo problema.
Quanto às companhias seguradoras, não consta que, até ao presente, tenham promovido, ao menos com carácter de generalidade, a reabilitação dos sinistrados a quem pagam indemnizações ou pensões (135).
Há, pois, necessidade de rever é sistema e, através do alargamento da previdência social, bem como da organização de serviços de prevenção e recuperação eficientes, proporcionar às vítimas de acidentes e doenças profissionais a protecção a que têm direito, e à economia nacional maior produtividade do trabalho - evitando a perda de inúmeros dias de labor e trazendo para a vida activa, tantos inválidos recuperáveis. Crê-se que só uma organização obrigatória, de natureza pública ou quase pública, como a da previdência, poderá mobilizar os meios técnicos e financeiros necessários para assegurar, à escala nacional, a consecução de tais objectivos.
No aspecto da reparação, cumpre ainda notar que um sistema de compensação nacional, como o inerente à previdência obrigatória, fará decerto baixar o custo administrativo do seguro contra aqueles riscos. Os mesmos serviços que concedem os subsídios ou as prestações sanitárias nas restantes eventualidades passam a concedê-los também nos casos de acidentes e doenças do trabalho.
Enfim, dir-se-á que, no sentido da integração dos acidentes e doenças profissionais na previdência social, se pronunciou já a Câmara Corporativa, ao emitir parecer sobre o Estatuto da Assistência Social.
Aí se escreveu: «O desemprego, a invalidez, a velhice, a doença, os acidentes no trabalho, a falta do chefe de família, são riscos que devem estar cobertos pela previdência social (130).

§ 4.º

Prestações

103. Toda a revisão da matéria de prestações do seguro obrigatório foi, de modo geral, deixada pela proposta para os diplomas que hão-de regulamentar as bases da lei.
Apenas em relação à tuberculose se prevê a concessão de subsídios pecuniários.
Ora, como vimos noutro lugar (supro, n.º 42), o problema das doenças prolongadas - com a inerente necessidade de alargar os limites de duração do subsídio pecuniário e das prestações em espécie- é hoje uma constante da generalidade dos sistemas de segurança social.
Esse problema implica, por seu turno, consoante também se observou, o da articulação do seguro-doença com o de invalidez.
O relatório ministerial contém a este propósito considerações muito esclarecidas e pertinentes, que mostram bem como o Governo tem nítida consciência do problema.
Espera-se que, na futura regulamentação da lei, e sobretudo após os resultados da execução do novo regime financeiro (infra, n.º 105), seja possível encarar a protecção generalizada dos casos de doença longa e a sua conexão com o seguro na invalidez.
Igualmente se confia em que, nessa regulamentação, possam ser atendidas outras necessidades de revisão do sistema de prestações, que se deixaram assinaladas no capítulo III deste parecer - nomeadamente as que dizem respeito às pensões de reforma.
Que é esse o pensamento do Governo infere-se, sem sombra de dúvida, do relatório da proposta, designadamente do que se lê nos n.ºs 56 a 61.

§5.º

Receitas

104. A este respeito, consta do relatório da proposta o seguinte passo (n.º 56):

Todas as reformas em perspectiva serão orientadas no sentido de fazer desenvolver os esquemas de prestações das caixas, evitando, todavia, qualquer agravamento dos encargos financeiros das empresas e dos trabalhadores.

As palavras que acabam de sublinhar-se suscitam algumas dúvidas e requerem certa interpretação.
Como se verá melhor do parágrafo seguinte, a proposta encara a modificação do regime de equilíbrio financeiro, mediante a substituição do sistema de prémio médio, próprio da capitalização pura, por outro de prémio escalonado por períodos, com base nos balanços técnicos (base VIII).
Ora tal sistema não é, em princípio, compatível com quotizações invariáveis, embora porventura as reservas constituídas e a evolução dos dados demográficos e outros, em que assentam as previsões, consintam, de um período para o seguinte, a manutenção dessas quotizações. Mas a hipótese mais verosímil é a da sua alteração, em face dos resultados das gerências e das perspectivas futuras.
Assim, o referido passo do relatório deve entender-se no sentido de que, em futuro imediato, isto é, nos próximos cinco ou dez anos, se prevê não ser necessário qualquer agravamento de contribuições, dado o volume de reservas acumuladas e a prudência com que certamente serão calculadas as novas bases técnicas do seguro-pensões.

§ 6.º

Equilíbrio financeiro

105. Do relatório da proposta de lei (n.os 43 a 52), mais do que das suas normas (cf. base VIII), infere-se qual a mudança que se pretende introduzir no regime de equilíbrio financeiro do sistema português de previdência.
Em síntese, pode dizer-se que à capitalização pura, a prémio constante, implicando crescimento das reservas ainda por largos anos até se atingir o estado estacionário, se projecta substituir um sistema misto, que permita distribuir imediatamente maior parcela do produto das contribuições, mantendo ao nível actual, ou até

135 É claro que as observações formuladas no texto visam a falta de uma organização permanente e generalizada de medicina do trabalho e de prevenção de acidentes e doenças e não esquecem que á Portaria n.º 17 118, de 11 de Abril de 1959, do Ministério das Corporações e Previdência Social, aprovou as normas da «Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais» - iniciativa de inegável interesse, mas, por natureza, transitória. O n.º 1 da referida portaria fixou para a campanha a duração de um ano, prorrogado por igual período pela Portaria n.º 17668, de 11 de Abril, de 1960. No que respeita às companhias de seguros deve também referir-se a recente criação, pelo respectivo grémio, de um centro, de prevenção de acidentes.
136 Diário das Sessões n.º 48, de 25 de Fevereiro de 1944, p. 105.

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reduzindo em certa medida, o volume de capitais acumulados.
Trata-se de uma fórmula de capitalização mitigada ou de repartição por períodos, mediante contribuições revistas no termo de cada período, cuja concretização se deixou também para disposições complementares da lei.
Ao percorrerem-se as linhas gerais dos modernos sistemas de segurança social, no capítulo II deste parecer, houve ensejo de observar que é justamente aquele o sentido em que, na actualidade, tendem a orientar-se as legislações nacionais nos países em que o seguro não é financiado exclusiva ou predominantemente pelas receitas públicas.
Em algumas reformas recentes do regime de pensões, como as dos Estados Unidos, da República Federal da Alemanha e da lei inglesa de 1959 sobre o sistema nacional de pensões, prevêem-se expressamente os índices de acréscimo das contribuições entre os vários períodos.
A solução concreta do problema é em extremo complexa, pois, acima dos dados técnicos, estão os problemas de ordem política, económica e social que a revisão do regime financeiro da previdência forçosamente suscita.
No aspecto político-económico, é indispensável conciliar a necessidade de maior repartição de benefícios e de desmobilização parcial de reservas com as repercussões na procura global, sobretudo de bens de consumo, resultante de acréscimos de poder de compra dos beneficiários, que podem provocar pressões inflacionistas.
A paragem ou diminuição do volume de capitais acumulados tem, por seu turno, reflexos na programação económica, pois não será possível continuar a dispor na mesma medida desses capitais como fonte de financiamento de futuros planos de fomento. E necessário que isso não afecte o ritmo de desenvolvimento do País, a fim de que o volume da oferta global possa acompanhar as consequências do incremento da procura acima previsto.
Em contrapartida, os factores de ordem político-social que conduzem à remodelação do regime financeiro merecem consideração relevante, pois dizem respeito à garantia de meios de existência suficientes e dignos a massas crescentes de trabalhadores, que atingem a idade da reforma ou se invalidam de modo irrecuperável para a vida activa.
A conveniência de tomar como base de cálculo das pensões o último período da actividade profissional,- e não além de dez anos, a fim de que aquelas representem efectivamente uma parcela razoável dos ganhos anteriores - implica dever repartir-se mais ampla proporção das contribuições e das reservas.
Vem depois o problema de manter, na medida do possível, o poder de compra das pensões já em curso. Um sistema de capitalização atenuada, na medida em que desde logo distribui parte apreciável das receitas, as quais vão subindo em valor nominal à medida que a moeda porventura se deprecie, permitirá, em maior ou menor grau, ajudar à resolução daquele problema.
Trata-se de aspecto de primacial interesse, que não deixará certamente de ser também considerado na futura regulamentação da caixa nacional de pensões, em conformidade com a preocupação hoje dominante nesse sentido na maior parte dos países.
Ao mesmo tempo, o sistema misto que se projecta irá permitir dispor de maior parcela de receitas para ocorrer às eventualidades a curto prazo, designadamente à doença e à maternidade.
Na doença, e quanto às prestações em dinheiro, espera-se seja possível, como há pouco aludimos, pôr a coberto do seguro não apenas a tuberculose, mas outras enfermidades de duração prolongada.
Relativamente às prestações médicas (preventivas, curativas, recuperadoras), admite-se que o novo regime financeiro permita também o indispensável alargamento de benefícios.
Também a propósito de todas estas questões fundamentais, e não obstante tratar-se de uma das duas pedras angulares da reforma - a revisão do método de equilíbrio financeiro -, nenhuma disposição ou princípio genérico se contém nas bases da proposta donde se possa inferir qual a fórmula que concretamente irá adoptar-se a tal respeito.
O próprio relatório ministerial limita-se a debater, aliás com muita proficiência, o problema, e a pôr diversas hipóteses de solução, sem contudo se pronunciar concretamente por nenhuma delas.
Quando do exame na especialidade, ter-se-á ocasião de voltar ao assunto.

§ 7.º

Estrutura administrativa

106. A profunda remodelação que, sob este aspecto, a proposta visa a introduzir na orgânica do sistema português de previdência, para os sectores da indústria, comércio e serviços (bases I, XI a XIV e XX a XXIII), está amplamente fundamentada no relatório, e com ela concorda, na generalidade, a Câmara Corporativa.
Trata-se, em suma, de substituir a actual estrutura, na sua maior parte baseada, por motivos de ordem histórica já referidos, no critério profissional ou no de grupos de actividades económicas mais ou menos afins, por outra fundada essencialmente no critério geográfico.
Pretende-se assim dar realização aos princípios da unidade orgânica e da simplificação administrativa, que, como se viu, representam em nossos dias coordenadas dominantes dos sistemas de segurança social.
Para os trabalhadores subordinados, e quanto às eventualidades a curto prazo - doença, maternidade, encargos de família -, adopta-se a fórmula da caixa regional, que normalmente terá por base o distrito. Para os riscos diferidos - velhice, invalidez, morte - constituir-se-á uma caixa nacional.
As duas organizações - regional e nacional.- serão convenientemente articuladas, de modo que o pagamento de pensões, a verificação do estado de invalidez e a prova de vida sejam feitos por intermédio da instituição regional ou, eventualmente, da agência local respectiva. A caixa nacional terá, sobretudo, função centralizadora, a fim de evitar as operações de transferências e cancelamentos, e, bem assim, as sobreposições de benefícios.
Por seu turno, no domínio que lhe é próprio - o dos seguros imediatos -, a actividade das caixas regionais será coordenada por uma federação nacional, que, além do mais, ficará incumbida de promover a compensação nacional do custo do sistema, mediante a ventilação de saldos de gerência.
Relativamente aos trabalhadores independentes, pre-vê-se a criação de outro tipo de instituições, cujo âmbito de acção será variável, consoante os grupos sociais abrangidos, e cujo esquema de eventualidades apenas compreende os riscos a longo prazo - invalidez, velhice e morte.
Já noutro lugar se fez alusão à necessidade de proteger esta categoria de trabalhadores também quanto à doença, no que se refere não ao subsídio mas às prestações médicas (supra, n.º 98). Os trabalhadores por conta própria deviam ser abrangidos pelas caixas régio-

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nais, pagando a contribuição correspondente ao custo daquelas prestações, sobre a mesma base de rendimentos que servir de incidência à quota para o seguro-pensões.
Outra observação suscitada pela estrutura em projecto diz respeito à conveniência de se estabelecer a coordenação, não prevista na proposta, entre a caixa nacional de pensões e as caixas de seguros diferidos não integradas no esquema nacional, a fim de salvaguardar os direitos de beneficiários que devam transitar de uma para outra categoria de instituições.
Nenhum outro reparo de ordem geral suscita a orgânica em perspectiva, cujas linhas fundamentais coincidem com as que, em páginas anteriores, vimos corresponderem às tendências dominantes do direito comparado e às necessidades sentidas pelo sistema nacional de previdência.
Escusado salientar que aquela estrutura não deve impedir a subsistência ou a criação de instituições de previdência obrigatória, de base corporativa ou empresarial, destinadas a melhorar os benefícios do esquema geral, ou a enquadrar certos grupos sujeitos a condições particulares.

§ 8.º

Conclusões sobre a apreciação na generalidade

107. Do que fica exposto neste capítulo, conclui-se inserir a proposta de lei em apreciação, de uma maneira geral, providências que correspondem a necessidades sentidas com vista ao futuro aperfeiçoamento e expansão do seguro obrigatório em Portugal.
Tais providências afiguram-se, no entanto, incompletas em vários aspectos, de que se salientam os seguintes:

a) Quanto ao campo de aplicação - a proposta é restrita fundamentalmente aos sectores da indústria, comércio e serviços. Nenhuma medida de ordem geral se encara com respeito à necessidade de alargar, directamente, a protecção contra os riscos sociais aos trabalhadores da agricultura, pelo menos nos dois aspectos que correspondem às necessidades mais instantemente sentidas pela nossa gente do campo - a concessão de prestações médicas e a de pensões de invalidez. Idêntica observação, relativamente àquelas prestações, se formula para os trabalhadores por conta própria;

b) Quanto às eventualidades cobertas - não inclui a sobrevivência,- nem os acidentes de trabalho e doenças profissionais. A integração destes riscos no âmbito do seguro social deve ser encarada progressivamente, à medida que as circunstâncias o permitam, assim como a organização de serviços de medicina do trabalho e de reabilitação, até agora inexistentes ;
c) Quanto às prestações - nenhum, princípio geral se insere no tocante à doença longa e à sua articulação com á invalidez, assim como à revisão das bases de cálculo das pensões, à natureza familiar que deve procurar atribuir-se na determinação destas, e ainda à possibilidade do seu reajustamento perante variações sensíveis do custo da vida;
d) Quanto ao método de equilíbrio financeiro - não se refere explicitamente, nas bases da proposta, qual a fórmula que vai adoptar-se, designadamente a duração dos períodos de equilíbrio, no decurso dos quais serão mantidas estáveis as contribuições;
e) Quanto à estrutura administrativa - não admite a possibilidade de inclusão, nas caixas regionais e na caixa nacional de pensões, dos trabalhadores rurais e equiparados e dos independentes, ao menos para os efeitos acima referidos;
f) Quanto à coordenação superior do sistema, - nenhuma regra geral ou princípio director se insere na proposta a tal respeito.

As observações que acabam de resumir-se - e as mais que, ao longo deste parecer, se deixaram anotadas - em nada diminuem o mérito, a oportunidade e o alcance do projecto do Governo, os quais a Câmara Corporativa teve ensejo de pôr no devido relevo em diversos passos do presente trabalho.
Tais reparos apenas pretendem exprimir, tão fielmente quanto possível, as aspirações dos corpos sociais e das actividades representadas nesta Câmara, quanto ao futuro desenvolvimento do nosso seguro obrigatório e à necessidade da sua integração num plano orgânico e coordenado de protecção contra os riscos -sociais, no qual os vários sectores interessados - previdência, saúde, assistência - tenham o seu lugar precisamente definido, e que permita ir alargando e aperfeiçoando o sistema vigente, em ritmo paralelo com o crescimento económico do país.
Assim, e na convicção de que o Governo não deixará de ter em conta as observações formuladas, a Câmara Corporativa dá a sua aprovação, na generalidade, à proposta de lei em causa.

PARTE II

Exame na especialidade

CAPITULO I

Classificação e regime geral das instituições de previdência

BASE I

108. Faz-se nesta base a classificação das instituições de previdência em quatro categorias.
A l.ª categoria compreende, segundo o preceito, as instituições de previdência, de inscrição obrigatória, dos trabalhadores por conta de outrem, as quais se subdividem nos seguintes tipos:

a) Caixas sindicais de previdência;
b) Casas do Povo;
c) Casas dos Pescadores.

A primeira observação que cumpre formular diz respeito à referência aos «trabalhadores por conta de outrem», como critério definidor desta categoria de instituições.
Por um lado, o facto de na categoria em causa se incluírem as Casas do Povo e as Casas dos Pescadores torna semelhante referência pouco rigorosa, pois destas instituições fazem parte, como beneficiários, nos termos da lei; não apenas os trabalhadores por conta de outrem, mas também trabalhadores independentes (pequenos produtores agrícolas, artifices, marítimos que trabalham por sua conta) [Decreto-Lei n.º 30710, artigo 1.º, § 1.º; Lei n.º 1953, base II, alínea b)]. E o n.º 2 da base II da proposta confirma aquele mesmo âmbito.
Por outro lado, sugeriu-se neste parecer (supra, n.º 98) a conveniência de vir a ser determinada a inscrição, nas caixas regionais, de trabalhadores por conta

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própria, da indústria, comércio e serviços, para o efeito da atribuição das prestações, sanitárias do seguro-doença.
O segundo reparo tem em vista o adjectivo «sindicais», nas caixas referidas sob a alínea a).
No sistema da proposta, tal expressão afigura-se inadequada. As caixas sindicais da organização vigente receberam essa designação pelo facto de terem a sua origem em convenções colectivas, negociadas entre dois organismos «sindicais», e por ser, consequentemente, «sindical», isto é, «profissional», o seu âmbito.
Mas, na economia da proposta de lei, semelhante termo deixou de justificar-se quando aplicado a caixas dê âmbito regional ou nacional. Parece, pois, preferível eliminá-lo.

109. Tais considerações levam a propor se adopte como critério para a classificação desta l.ª categoria de instituições, não a natureza da relação jurídica de trabalho, mas, antes, o conjunto de eventualidades cobertas, de modo que a essa categoria corresponda o esquema geral da organização de previdência obrigatória.
Para isso, a alínea a) da disposição em exame deverá ser desdobrada nos dois tipos a que se refere a base XI da proposta, limitando-se, para os seguros a longo prazo, a uma só - a caixa nacional - a instituição destinada a assegurar o esquema de base.
Em face do exposto, o n.º 2 passaria a ter a seguinte redacção:
2. A l.ª categoria compreende as instituições de inscrição obrigatória, destinadas a assegurar o esquema geral de eventualidades e prestações da organização de previdência, e classificadas nos seguintes tipos:

a) Caixas de previdência e abono de família;
b) Caixa Nacional de Pensões;
c) Casas do Povo;
d) Casas dos Pescadores.

A definição do campo de aplicação dos dois primeiros tipos será feita na devida altura.

110. O n.º 3 desta base ocupa-se da 2.ª categoria de instituições, a qual seria formada pelas «caixas de reforma ou de previdência, considerando-se como tais as instituições de inscrição obrigatória das pessoas que, sem dependência de entidades patronais, exercem determinadas profissões, serviços ou actividades».
A aplicação, do critério classificador acima perfilhado leva logicamente a reservar esta 2.ª categoria de instituições para os esquemas especiais de seguros ia longo prazo, destinados a determinadas profissões, serviços ou actividades, cujo condicionalismo particular aconselhe a situar fora do regime geral das instituições da l.ª categoria.
Propõe-se o seguinte texto para este n.º 3:

A 2.ª categoria pertencem, as caixas de reforma ou de pensões, considerando-se como tais às instituições de inscrição obrigatória destinadas a garantir esquemas especiais de seguros diferidos em benefício de pessoas que exerçam determinadas profissões, serviços ou actividades e não devam ser abrangidas por instituições da l.ª categoria.

111. Quanto aos n.ºs 4 e 5 da base em apreciação, nenhuma observação sugerem.

BASE II

112. O n.º 1 desta base deve passar a ter uma redacção que se harmonize com as emendas sugeridas para a base I.

Ficaria assim:

As caixas de previdência é abono de família, a Caixa Nacional de Pensões e as caixas da 2.ª categoria regem-se pelas disposições da presente lei e pelos regulamentos que vierem a ser publicados em sua execução.

113. Relativamente ao n.º 2, é mister prever a possibilidade de os trabalhadores rurais, e equiparados, virem a ser obrigatoriamente abrangidos pelas caixas regionais dê previdência, para o efeito da concessão de uma ou mais espécies de prestações do esquema normal de eventualidades, designadamente das prestações sanitárias, conforme noutro lugar (supra, n.º 97) se propôs.

Nesse sentido, deveria acrescentar-se o seguinte:

A realização dos mencionados objectivos poderá ser assumida, no todo ou em parte, pelas caixas regionais de previdência, previstas na base XIII, determinando-se, para esse efeito, à medida que for julgado conveniente, a inclusão dos referidos trabalhadores e equiparados em uma ou mais das modalidades de seguro do esquema daquelas instituições.

114. Quanto ao n.º 3, a frase final -«sem prejuízo da sua gradual integração no plano de previdência social a que se refere a base seguinte»- parece dever entender-se como referida apenas às instituições da 4.ª categoria, exprimindo assim uma orientação inteiramente desejável.
No tocante às associações de socorros mútuos, o que resta fazer - e se disse, a propósito dessas instituições, no capítulo III (n.º 93) - é sobretudo fomentar a educação do espírito de previdência, a fim de que nas associações se inscrevam, voluntariamente, .todos os. que não estão abrangidos pelo seguro- obrigatório, ou aqueles que, já sendo beneficiários deste seguro, desejem melhorar as respectivas prestações.
Como também se frisou, o seguro obrigatório deve assegurar, em princípio, apenas benefícios - têm-se em vista as prestações pecuniárias-^ que permitam manter certos níveis mínimos de existência, conforme a condição de cada beneficiário. Acima desses mínimos, deve haver a possibilidade de recurso ao seguro facultativo, que assim desempenha uma utilíssima função complementar - na medida em que esta não seja preenchida por instituições de previdência obrigatória de base corporativa ou empresarial (infra, n.ºs 127, 130 e 131).

BASE III

115. Consigna-se no n.º 1 o princípio fundamental de que «compete ao Governo ordenar no plano nacional as realizações da previdência social e determinar os seus objectivos, bem como sancionar a actuação das corporações para a organização e aperfeiçoamento das instituições de previdência».
No ponto de vista doutrinário nada há a observar. A posição do Governo no ordenamento da previdência está de harmonia com os princípios ético-políticos do Estado Português, que atrás examinámos (n.º 65).
Escusado será acrescentar que semelhante competência deve ser exercida dentro dos princípios definidos na lei, isto é, mediante diplomas regulamentares, ou no uso da faculdade legislativa do Governo, através de decretos-leis.
Convém, no entanto, aproveitar a disposição para incluir uma referência -largamente justificada na parte geral deste parecer - à necessidade de coordenação das realizações da previdência com as dos mais sectores responsáveis pela execução da política de segurança social.

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Pelo que diz respeito à intervenção das corporações, está a mesma prevista na base V da Lei n.º 2086, de 22 de Agosto de 1956, que diz serem «atribuições da corporação ... e) promover a organização e o desenvolvimento da previdência ....»
Julga-se mesmo preferível a fórmula desta lei, embora ampliada a todos os organismos corporativos, II tento o disposto na alínea a) da base V da proposta.
Este n.º 1 parece deslocado. A importância de que se revestem os princípios nele contidos aconselha a que passe a constituir a base I, sob o título «Disposições gerais».
Alvitra-se, pois, a redacção seguinte:

BASE I

Compete ao Governo regular, no quadro nacional, os objectivos e as realizações da previdência, coordená-los, num plano de conjunto, com os restantes sectores da política de segurança social, designadamente os da saúde e assistência, bem como sancionar a intervenção dos organismos corporativos na organização e desenvolvimento das instituições de seguro obrigatório.

No tocante ao problema da coordenação intersectorial, a que se refere esta base na redacção agora proposta, entende-se ser aqui a altura própria para concretizar a sugestão feita oportunamente (n.º 94, in fine) da criação, ao nível ministerial, de um órgão encarregado de definir e assegurar a execução da política coordenadora.
Propõe-se para esse órgão a designação de «Conselho de Segurança Social», em correspondência com o texto desta base I e a terminologia adoptada no presente parecer.
As funções de superior orientação da política coordenadora, que são cometidas ao conselho, levam, naturalmente, a colocá-lo sob a chefia do Presidente do Conselho de Ministros.
Em face do exposto, preconiza-se a introdução de uma nova base - II -, com o seguinte texto:

BASE II

1. A coordenação prevista na base anterior será orientada pelo Conselho de Segurança Social, constituído pelo Presidente do Conselho de Ministros, que presidirá, e pelos Ministros da Presidência, Finanças, Corporações e Previdência Social e Saúde e Assistência. .
2. Sempre que os assuntos submetidos à apreciação do Conselho interessem a outros Ministérios, serão convidados a participar nos trabalhos os respectivos Ministros.
3. A competência e as regras de funcionamento do Conselho serão definidas em diploma especial.

116. Relativamente ao n.º 2 da base III da proposta, o seu conteúdo não suscita qualquer observação, mas crê-se nada ter a ver com o n.º l, e antes dever incluir-se como n.º 6 da base I, que passaria a III.

CAPITULO II

Das caixas sindicais de previdência

BASE IV

117. De acordo com o que se sugeriu a propósito da base I, o título do capítulo II, que antecede esta base IV, deveria passar a ler-se:

Das caixas de previdência é abono de família e da Caixa Nacional de Pensões.
Pelas mesmas razões, o n.º 1 ficaria assim:

1. As caixas de previdência e abono de família destinam-se a proteger os segurados e os familiares a seu cargo na doença e na maternidade, bem como a promover o salário familiar pela concessão de abono de família.

118. Quanto ao n.º 2, o «regime especial» de protecção à tuberculose, a que alude o preceito, deve ser objecto de diploma legal, quê poderá consistir em simples decreto regulamentar.
Neste n.º 2 a designação «caixas sindicais» deverá ser substituída por «caixas de previdência e abono de família».
O n.º 3 é de eliminar em vista do aditamento introduzido no n.º 1.
Relativamente ao n.º 4, que passa a n.º 3, a inclusão do desemprego involuntário no esquema da previdência deve igualmente ser objecto de diploma legal.
Propõe-se o seguinte texto:

3. Entre os fins de previdência das mesmas instituições será inchada a protecção no desemprego involuntário, nos termos que forem determinados em diploma especial.

O n.º 5 (agora 4) não suscita, qualquer objecção.

119. A alteração sugerida para o n.º 1 desta base implica o aditamento de um novo preceito, que passaria a constituir a base VI, definindo o objecto próprio da caixa nacional de pensões:

BASE NOVA

A Caixa Nacional de Pensões destina-se a proteger na invalidez, na velhice e por morte, os segurados e seus familiares.

BASE V

120. O corpo desta disposição (que tomaria o n.º VII) deverá dizer «caixas de previdência e abono de família e Caixa Nacional de Pensões», em lugar de «caixas sindicais».
Na alínea a) confere-se às corporações, bem como aos restantes organismos corporativos, competência para criar aqueles dois tipos de caixas por meio de convenções colectivas de trabalho.
Duas observações. A primeira é a seguinte: como, pela base VI da proposta, as caixas só se consideram constituídas depois de aprovados, por alvará, os seus estatutos, e como a competência para tal aprovação pertence ao Governo, não parece exacto dizer-se que a «criação» cabe às corporações e aos mais organismos corporativos,-mas tão-sòmente a «iniciativa» dessa criação.
A segunda observação diz respeito à referência às «convenções colectivas de trabalho»- como meio de criação de caixas. A fórmula não parece entender-se como referida à estrutura regional de base, em que se pretende integrar as caixas de previdência, completada, no plano nacional, com uma caixa, de pensões.
A convenção colectiva destina-se, em princípio, a regular condições de trabalho e tem, como âmbito próprio, o dos organismos profissionais que nela outorgam.
Decerto que, por meio de convenções colectivas, se poderá ir alargando o círculo de beneficiários das caixas regionais, mas, nessa hipótese, não é a convenção que cria a caixa: esta já existe, e a convenção limita-se a promover a integração na caixa de novos grupos de trabalhadores.

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Ao contrário, na criação de instituições de previdência de base corporativa - abrangendo certos ramos profissionais ou económicos - , podem as convenções colectivas desempenhar uma função muito importante.
Além disso, é manifesto que, atento o seu âmbito, tanto a criação da Caixa Nacional de Pensões como a da federação de caixas de previdência e abono de família, a que se refere a base XIII, devem pertencer ao Ministério das Corporações e Previdência Social.
Do que fica descrito, resulta dever a base V (agora VII) passar à ter a redacção seguinte:

1. A iniciativa da criação das caixas de previdência e abono de família compete:

a) As Corporações, bem como aos Grémios e Sindicatos nacionais e suas Federações e Uniões;
b)Aos interessados, guando não existam organismos corporativos que os representem, ou a instituição diga respeito ao pessoal de uma empresa ou grupo de empresas;
c) Ao Ministério das Corporações e Previdência Social.

2. A criação da Caixa, Nacional de Pensões e da federação referida na base XIV incumbem ao Ministério das Corporações e Previdência Social.

BASE VI

121. Nota-se apenas a necessidade de substituir «caixas sindicais de previdência» por «caixas de previdência e abono de família e «Caixa Nacional de Pensões», o incluir a federação prevista na base XIII da proposta.

BASE VII

122. Quanto ao n.º 1:
De harmonia com as observações feitas em base? precedentes, o texto deste número seria alterado pela seguinte forma:

1. As caixas de previdência e abono de família e a Caixa Nacional de Pensões abrangerão obrigatoriamente, como segurados, os trabalhadores das profissões ou actividades definidas nos diplomas da sua constituição, ou integradas por virtude de convenções colectivas ou despachos de alargamento de âmbito.

Acrescentar-se-ia um novo n.º 2, com este teor:

2. Poderá ser autorizada ou determinada a inscrição. obrigatória, nas caixas de previdência e abono de família, de pessoas que, sem dependência de entidades patronais, exercem, certas profissões, serviços ou actividades, para o efeito da- concessão de uma ou mais espécies de benefícios do esquema regulamentar das mesmas instituições, mediante o pagamento das contribuições respectivas.

No tocante aos n.ºs 2, 3 e 4, que passariam, respectivamente, a 3, 4 e 5, nenhuma objecção suscitam, salvo quanto u designação das instituições, tendo em vista as bases anteriores.
O n.º 4 (agora 5) deve, naturalmente, restringir-se às caixas de previdência e abono de família.

BASE VIII

123. O n.º l desta base regula, na parte inicial, os meios financeiros que hão-de constituir as receitas normas das caixas de previdência e de pensões. Na segunda parte insere o princípio que permitirá a remodelação do regime de equilíbrio financeiro da previdência - a que oportunamente se fez a devida alusão (supra, n.º 105).
Nada se prevê explicitamente quanto à duração dos períodos de equilíbrio, no decurso dos quais hão-de permanecer estáveis as contribuições para as caixas, dentro do regime de capitalização mitigada a instituir.
E certo que o n.º 3 da base XV da proposta determina a elaboração de balanços actuariais, pelo menos de cinco em, cinco anos. Mas esta obrigação não se mostra articulada com o disposto na base agora em exame, e não significa, necessariamente, ao que parece, que o ajustamento das contribuições, paru o efeito desta última disposição, se haja de fazer com idênticos intervalos.
O preceito definidor da matéria deveria, em princípio, ser inserido na proposta de lei - em face do resultado dos estudos que o Governo decerto - já possui -, mas nada obsta a que seja objecto de diploma regulamentar.
Assim, quanto á presente base, a Câmara não propõe qualquer emenda, salvo no que diz respeito à designação dás instituições e á conveniência de, sobre a matéria da base, ser ouvido o Conselho de Segurança Social.
Relativamente aos n.ºs 2 e 3 desta base nenhuma anotação se julga útil fazer.

BASE IX

124. Trata-se da reprodução do artigo 20.º da Lei n.º 1984, regulamentada pelo artigo 32.º do Decreto n.º 25 935 e pelo artigo 31.º do Decreto n.º 28 321.
Como oportunamente se notou, a matéria relativa às prestações a conceder pelas caixas foi deixada pela proposta para os diplomas regulamentares desta lei. Parece, no entanto, ser conveniente consignar aqui tal orientarão, bem como aludir à fixação de limites mínimos, além dos máximos, a que tais prestações hão-de obedecer. E ainda, dada a importância que as condi--coes gerais de atribuição dos benefícios da previdência revestem, no aspecto da coordenação com os mais sectores da segurança social, afigura-se vantajosa a audiência do Conselho de Segurança Social sobre o assunto.
Assim, propõe-se para esta base a redacção que segue:
As condições gerais de atribuição das prestações a conceder pelas caixas de previdência e abono de família e pela Caixa Nacional de Pensões, bem como os respectivos limites máximos e mínimos, serão estabelecidos em diploma regulamentar, ouvido o Conselho de Segurança Social.

BASE X

125. Ocupa-se este preceito dos isenções fiscais de que hão-de beneficiar os caixas de previdência e de pensões.
A primeira anotação que se entende dever fazer é relativa u falta de inclusão do imposto complementar.
Pela legislação vigente, as instituições de previdência obrigatória apenas gozam de isenção do referido imposto até à. importância de 60 000$.
Os encargos com o imposto complementar pago pelas instituições de previdência, foram, em 1959, de 1371 contos.
Deverá contar-se, no entanto, com sensível agravamento em futuro próximo, por virtude do imposto que virá a recair sobre os rendimentos das casos de venda económica, construídas ao abrigo da Lei n.º 2092, quando terminar o período de isenção da contribuição predial.
Esse ónus levará naturalmente a rever as rendas estabelecidas, a fim de salvaguardar a taxa de juro a que o investimento deve obedecer.

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Não têm as instituições de previdência, como é evidente, quaisquer fins lucrativos. Os rendimentos do seu património estão afectos à realização dos fina de protecção social que são da essência das mesmas instituições.
No fundo, as caixas de previdência são meras depositárias de fracções de salários ou rendimentos, cuja acumulação e emprego reprodutivo permitem o pagamento das prestações quando da verificação dos eventos previstos.
Por outro lado, é finalidade própria do imposto complementar a de promover mais equitativa distribuição de réditos. Ora isso mesmo constitui, como se viu, um dos objectivos fundamentais da segurança social.
Aliás, já em relação às associações de socorros mútuos se estabeleceu, nos termos do artigo 4.º do Regulamento do Imposto Complementar, a isenção do mesmo tributo no tocante aos rendimentos provenientes da aplicação de capitais.
Em face do exposto, parece inteiramente fundamentado que as instituições de previdência obrigatória sejam isentas do referido imposto, já porque os pressupostos da respectiva tributação se não verificam quanto a elas, já porque os seus valores têm, por imperativos do ordem técnica e social, de proporcionar rendimentos a determinada taxa de juro, e a sua obtenção pode vir a ser prejudicada pela incidência, daquele imposto.
Assim, sugere-se seja aditada ao n.º l desta base n seguinte alínea:
g) Do imposto complementar pelos rendimentos provenientes da aplicação de capitais em títulos ou bens imobiliários:

A segunda anotação interessa à alínea c) e refere-se a falta de menção das «transmissões de imobiliários resultantes da união ou fusão de instituições» - que já beneficiam de isenção do imposto sobre as sucessões e doações, segundo a alínea d) desta mesma base, e só por lapso não foram incluídas na isenção de sisa..
Propõe-se o correspondente aditamento na alínea em causa.

BASE XI

126. O conteúdo desta base ficou integrado nas bases III, V e VI, segundo a nova redacção atrás proposta. E, pois, de suprimir o respectivo texto neste lugar.

BASE XII

127. A concordância da Câmara Corporativa com o critério regional na organização destas caixas consta da apreciação na generalidade (supra, n.º 106),.
Relativamente às caixas de base empresarial ou corporativa, também no mesmo lugar se deixou expresso o pensamento da Câmara. Entende-se que a criação destas instituições deve, em princípio, ter um objectivo, integrador ou complementar da organização geral de previdência, sem prejuízo da sua participação no mecanismo basilar da compensação nacional do custo do sistema.
Na economia da proposta, este mecanismo é assegurado, quanto às caixas de previdência (regionais ou privativas), por intermédio da federação prevista na base seguinte..
Não se vê, por isso, inconveniente em manter, na essência, o preceito da base XII (que passaria a XIV), apenas com ligeira modificação destinada a actualizar o seu conteúdo:

As caixas de previdência e abono de família serão organizadas em base regional, sem prejuízo da manutenção de caixas privativos de uma empresa ou grupo de empresas, de certo ramo de actividade económica, quando, mediante parecer do Conselho Superior .da Previdência e da Habitação Económica, se verifique oferecer tal enquadramento vantagens sociais.

BASE XIII

128. Quanto ao n.º 1: estabelecem-se aqui os indispensáveis princípios da coordenação e compensação nacional entre as caixas de previdência (regionais, empresariais, corporativas) para os seguros de doença e maternidade.
A primeira anotação refere-se à frase «... coordenar a acção médico-social ...», e é a seguinte: a função coordenadora da Federação não parece deva limitar-se à acção médico-social, mas estender-se a toda a actividade das caixas regionais. Só assim poderá ser eficiente e salvaguardar o princípio da unidade orgânica e administrativa do conjunto.
Entende-se, pois, que aquela frase deve dizer: «... coordenar a acção das instituições federados ...».
O segundo reparo diz respeito à expressão s... promover a compensação financeira ...». Afigura-se não dever a Federação, também aqui, confinar-se a «promover», cumprindo-lhe antes «efectuar» a própria compensação.
Terceiro ponto: não se prevê que a compensação financeira possa vir a ser extensiva a seguros de análoga natureza por ora não incluídos nos esquemas das caixas de previdência - por exemplo: os de tuberculose, desemprego, acidentes de trabalho e doenças profissionais. Ë necessário admitir desde já essa possibilidade.
Quanto ao abono de família, sabe-se que ele dispõe de um fundo próprio de compensação. Dada a natureza específica do abono e o nível actual dos seus quantitativos, parece prudente manter o respectivo equilíbrio financeiro fora do regime de compensação nacional das restantes prestações a curto prazo.
Relativamente ao n.º 2, deve o princípio ser extensivo a todo o esquema das caixas de previdência, e não apenas a doença, pois a unidade de inscrição e de outorga de benefícios é regra, basilar de boa ordem administrativa.
Quanto ao n.º 4, nada se julga útil acrescentar ao que se deixou anotado no § 5.º do capitulo III da primeira parte deste parecer, relativamente à coordenação interdepartamental, do sistema.
Do exposto resultam os seguintes textos para os n.ºs l e 2 desta base:

1. As caixas de providência e abono de família constituirão uma federação nacional, destinada a coordenar a acção das instituições federadas e a efectuar a compensação financeira dos seguros que façam ou venham a fazer parte do seu esquema regulamentar.
2. Todas as prestações do esquema das caixas de previdência e abono de família terão concedidas por uma só instituição a cada segurado & seus familiares.

BASE XIV

129. Constitui esta base outra peça fundamental da nova estrutura administrativa em que se pretende enquadrar o sistema do seguro obrigatório.
Oportunamente tivemos ocasião de apreciar as razões que aconselham a centralização dos seguros a longo prazo (n.º 55).
O n.º l nenhuma observação sugere.

130. Quanto ao n.º 2, importa notar que o estabelecimento de esquemas superiores em benefício dos se-

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gurados de algumas caixas de previdência - designadamente de certas profissões, ramos de actividade ou empresas - deve implicar a existência de contabilidades separadas para os referidos esquemas, os quais hão-de funcionar em regime de capitalização e sem participarem na compensação nacional. Trata-se de evitar que possíveis deficits desses regimes suplementares sejam cobertos à custa das receitas destinadas ao esquema-base. E, por outro lado, também não seria razoável que eventuais superavits de tais esquemas revertessem em proveito de grupos que para eles não. contribuíram.
Sugere-se ainda que, sobre o estabelecimento dos esquemas superiores, seja ouvido o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica, como se previu para a criação de caixas de previdência privativas (base XII).
Este n.º 2 passaria a rezar assim:

2. A Caixa Nacional de Pensões assegurará um esquema de prestações comuns a todos os segurados das caixas de previdência e abono de família que nela devam ser inscritos,. sem prejuízo do possível estabelecimento de esquemas superiores, com contabilidade própria, em benefício dos segurados de algumas daquelas caixas, ou de certas categorias profissionais, mediante a correspondente contribuição suplementar e depois de ouvido o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica.

131. Convém preencher outra lacuna, dentro da matéria da base XIV. Ë a que respeita à possibilidade de inscrição dos indivíduos a que se refere o n.º 2 da base II, agora IV (trabalhadores rurais e equiparados), e das pessoas mencionadas no n.º 2.º da actual base IX (trabalhadores independentes da indústria, comércio e serviços), na Caixa Nacional de Pensões, apenas para um ou outro ramo de seguro a longo prazo - o de invalidez, por exemplo, conforme se sugeriu -, desde que previamente ao abrigo de caixas regionais de previdência.
Para tanto, torna-se necessário aditar um n.º 3, cuja redacção poderia ser a seguinte:

3. Relativamente aos trabalhadores e equiparados, a que te refere a segunda parte do n.º 2 da base IV, e às pessoas mencionadas no n.º 2.º da base IX, quando abrangidos por caixas regionais nas condições ai previstas, poderá ser autorizada ou determinada a sua inscrição na Causa Nacional de Pensões, para o efeito de beneficiarem, de um ou outro ramo de seguro a longo prazo, mediante o pagamento das contribuições respectivas.

132. Ao expor os fundamentos que aconselham a centralização dos seguros diferidos (n.º 55, citado), frisou-se a necessidade de articular a respectiva instituição central com a organização dos seguros a curto prazo, a fim de dar realização plena ao princípio da coordenação de todo o seguro obrigatório, no plano nacional.
Essa articulação é também indispensável para assegurar a ligação entre os seguros de doença e de invalidez.
E, ainda, torna-se manifesta a conveniência de a instituição central utilizar, sempre que necessário, as caixas regionais, que actuariam como órgãos periféricos para o efeito do pagamento das prestações e, eventualmente, para a prova de vida ou a verificação do estado da invalidez, a fim de salvaguardar a comodidade dos beneficiários é a eficiência do funcionamento do sistema.
Ora, a respeito de todos estes pontos fundamentais, nenhum dispositivo se insere na proposta.
Para tanto, poderia prever-se que fosse o mesmo o corpo dirigente das duas instituições, ou, pelos menos, que funcionassem em reunião conjunta quando se tratasse de coordenar as respectivas actividades.
Em suma, alvitra-se a inclusão de nova base, assim redigida:

BASE NOVA

1. Será assegurada a coordenação entre a Federação das Caixas de Previdência é a Caixa Nacional de Pensões, com vista a estabelecer a conveniente articulação dos vários ramos do seguro social.
2. A Caixa Nacional de Pensões poderá utilizar os serviços das caixas de previdência, quer para a verificação do direito dos segurados às prestações
e para o pagamento destas, quer em todos os mais casos necessários ao bom funcionamento do sistema e à comodidade dos contribuintes e beneficiários.

BASE XV

133. Nada a observar quanto ao fundo. A redacção deverá adaptar-se, na designação das instituições, à terminologia proposta neste parecer.

BASE XVI

134. .Nada a observar.

BASE XVII

135. Convém prever a existência de vice-presidentes da direcção e do conselho geral, destinados a coadjuvar os presidentes e a substituí-los nas suas faltas e impedimentos. Para isso, no n.º l deve acrescentar-se «e vice-presidentes, quando os haja», a seguir à palavra «presidentes».
Falta, por outro lado, regular a constituição dos corpos gerentes da federação de caixas, de que trata a base XIII.
Parece que, neste caso, deveria a direcção ter, além do presidente e do vice-presidente nomeados pelo Ministro, certo número de representantes das direcções das caixas federadas, com a composição paritária a que se refere o n.º 2 da base. O conselho geral seria constituído por representantes de todas ou da maior parte das mesas caixas.
Assim, no n.º l haveria que incluir também aquela federação.
E ao n.º 2 seria de aditar o seguinte:

No caso da Federação, os vogais serão designados pelas caixas federadas e deverão ter idêntica composição paritária.

BASE XVIII

13.6. A cooperação prevista nesta base, entre os caixas regionais e as Casas do Povo e suas federações, deve entender-se, logicamente, em articulação com o aditamento atrás proposto ao n.º 2 da base II.
Assim, uma vez determinada a inclusão, numa caixa regional, dos trabalhadores rurais e equiparados da respectiva área, para o efeito da concessão dos benefícios correspondentes a um ou outro ramo do seguro (designadamente das prestações médico-sociais), as Casas do Povo terão de funcionar como órgãos locais daquelas caixas, assegurando, sempre que possível, o serviço das prestações, a verificação do direito a estas e, eventualmente, a cobrança de certas receitas.

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Em tal hipótese, a cooperação prevista na base é, mais do que um objectivo desejável, uma peça fundamental no funcionamento equilibrado do sistema.

BASE XIX

137. No n.° 1 reafirma-se a orientação, consagrada, na legislação vigente, de que a falta de cumprimento, das obrigações impostas pelos estatutos das caixas às entidades patronais constitui transgressão punível.
Entende, porém, a Câmara ser a altura de corrigir o desvio dos princípios que, em matéria de dívidas de contribuições, tal orientação representa.
De harmonia com a orientação tradicional do nosso direito - e designadamente do direito tributário - a dívida de contribuições constitui mero ilícito civil e não deve acarretar responsabilidade penal.
Acresce que os créditos das caixas de previdência em matéria de contribuições são, nos termos da lei em vigor (Código de Processo nos Tribunais do Trabalho, artigo 10.°, n.° 5.°), cobráveis por meio, de execução, que é processo rápido. E gozam de privilégio mobiliário geral (artigo 14.° do Decreto-Lei n.° 38 538, de 24 de Novembro de 1951).
Além disso, o agravamento da dívida proveniente dos juros de mora, cuja regulamentação a proposta reserva, para o Governo, há-de certamente constituir sanção bastante para levar os contribuintes a cumprir pontualmente ás suas obrigações.
Deverá, pois, a redacção da base sofrer as alterações necessárias para definir a orientação exposta.
Conviria, por outro lado, prever-se, como é hoje em dia frequente nas legislações estrangeiras, que a falta de pagamento das contribuições, quando imputável às entidades patronais, não prejudica o direito às prestações por parte dos beneficiários, desde que estes tenham, o tempo de inscrição regulamentar e a instituição possua elementos comprovativos da prestação de trabalho durante o período a que respeita aquela falta.
Sugere-se que este princípio - correspondente, aliás, a uma elementar solicitação de justiça - seja introduzido em novo número da presente base.

CAPITULO III

Das caixas de reforma ou de previdência

BASES XX A XXIII

138. Como ficou dito a propósito do n.° 3 da base I da proposta, a 2.ª categoria de instituições de inscrição obrigatória - a que respeita o presente capítulo - destina-se a proporcionar esquemas especiais de seguros a longo prazo em benefício de certos grupos (trabalhadores dependentes, por conta própria, profissionais livres, etc.) que reúnam determinadas condições e não devam ser abrangidos por instituições da 1.ª categoria.
Trata-se de profissões ou actividades cujo particularismo - origem das receitas destinadas ao seguro, condições de prestações do trabalho, natureza peculiar das empresas - aconselha a manter fora do esquema geral e a financiar em regime de capitalização, por não beneficiarem de seguros a curto prazo e mesmo nos diferidos adoptarem apenas um ou outro ramo. É o caso dos jornalistas, dos profissionais de espectáculos e de algumas empresas.
Além da alteração das designações, incluindo a do título deste capítulo, de harmonia com o que se sugeriu a propósito da base I, a única anotação que importa fazer é a que diz respeito à necessidade, já observada, de assegurar a articulação entre as caixas da 2.ª categoria e a Caixas Nacional de Pensões, a fiou de salvaguardar os direitos dos beneficiários.
Esse objectivo poderia traduzir-se no aditamento de um n.° 3 à base XXI, com o seguinte teor:

3. Promover-se-á a conveniente coordenação entre as caixas de reforma ou de pensões e a Caixa Nacional de Pensões, para o efeito da manutenção dos direitos de segurados que, por mudança das condições de exercício das suas profissões ou actividades, devam passar de uma para outra categoria de instituições.

Na base XXIII (que passa a XXV) haverá que ajustar à nova numeração as referências a preceitos anteriores e acrescentar, nestas, a primeira parte do n.° 1 da base VIII (agora X), pois é indispensável dizer qual a origem das receitas das caixas de reforma ou pensões, necessariamente constituídas por «contribuições dos segurados e, quando seja caso disso, também «das entidades patronais».
Convirá também aplicar a estas caixas os n.ºs 2 e 3 da mesma base VIII, bem como a alínea a) da base V (agora VII), pois nada impede que os organismos corporativos tomem a iniciativa aí prevista relativamente às caixas de reforma ou de pensões.

CAPITULO IV

Disposições gerais e transitórias

BASE XXIV

139. Trata-se de um aperfeiçoamento da redacção do artigo 20.° do Decreto-Lei n.° 32 674, de 20 de Fevereiro de 1943, que punia com multa, aliás do mesmo quantitativo, os dirigentes das instituições irregulares, mas não proibia explicitamente a constituição e o funcionamento dessas instituições. Na prática o resultado era idêntico ao que se busca com este preceito, pois o artigo 22.° daquele diploma já determinava a liquidação e partilha das instituições irregulares, quando não fosse possível regularizá-las.
Crê, todavia, a Câmara que se poderá melhorar ainda a redacção agora proposta e, nesse sentido, retocou ligeiramente o preceito, conforme se verá das conclusões deste parecer.

BASE XXV

140. A regra estabelecida nesta base deve ser extensiva, por motivos óbvios, às próprias prestações em espécie, designadamente quando estas consistam em bens económicos, como é o caso dos medicamentos. Propõe-se, assim, que a expressão «pensões ou subsídios» seja substituída por «prestações».

BASE XXVI

141. Nada a observar.

BASE XXVII.

142. Deverá substituir-se «caixas sindicais» por «caixas de previdência e abono de família e caixas de reforma ou de pensões».
Nenhuma outra observação.

BASE XXVIII

143. À parte a alteração das designações das caixas, julga-se conveniente prever a possibilidade de as caixas de 2.ª categoria se dissolverem, quer por fusão com outras (é o caso, por exemplo, de os respectivos segurados passarem a beneficiar do esquema da caixa nacional), quer por simples liquidação (v. g. no caso de

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se tratar de grupo fechado que tende a extinguir-se). A competência para decidir por uma ou outra forma de dissolução deve caber ao Ministério das Corporações e Previdência Social, ouvidos os interessados, quando seja caso disso, e o Conselho Superior da Previdência.

BASE XXIX

144. O princípio de que a integração das pensões, nas caixas do pessoal das empresas concessionárias de serviços públicos, constitui encargo inerente à exploração, vem já da Lei n.° 1884 (artigo 22.°).
O mesmo quanto à regulamentação especial das caixas do pessoal dos caminhos de ferro (§ único do artigo 22.°, citado).
Nada a acrescentar.

BASE XXX

145. Haverá apenas que harmonizar a designação das caixas com a terminologia das bases anteriores.

BASE XXXI

146. O disposto no final desta base, segundo o qual compete ao Ministro das Corporações a determinar... a criação de novas caixas...», deve entender-se sem prejuízo dos princípios firmados nas bases V e VI da proposta (agora VII e VIII).
Quer dizer: ao Ministro, nos termos desta última base, compete aprovar os estatutos das caixas de previdência e abono de família e da Caixa Nacional de Pensões, bem como os das caixas de reforma ou de pensões, por força do disposto na base XXIII (agora XXV).
Mas isso não prejudica a faculdade de iniciativa na criação das instituições, a qual, além de caber ao Ministério, pertence também aos interessados e aos organismos corporativos, ao abrigo da citada base V.
Sendo assim, não se vê necessidade daquela parte, final da base em apreciação, que deverá, preferivelmente, ser substituída por outra em que se diga que ao Ministro compete determinar as condições e a oportunidade de integração das caixas existentes na nova estrutura prevista na proposta de lei.

PARTE III

Conclusões

147. A Câmara Corporativa, após ter detidamente estudado o projecto de proposta de lei sobre a reforma da previdência social, cuja oportunidade e alcance lhe apraz, uma vez mais, pôr em relevo - sem embargo das observações de ordem geral formuladas a seu respeito no capítulo IV da parte I deste parecer -, entende ser aquela proposta de aprovar, com a redacção seguinte, na qual se imprimiram em itálico as alterações e aditamentos introduzidos:

CAPITULO I

Disposições gerais

BASE I

(N.° 1 da base III da proposta)

Compele ao Governo regular, no quadro nacional, os objectivos e as realizações da previdência, coordená-los, num plano de conjunto, com, os restantes sectores da política de segurança social, designadamente os da saúde c assistência, bem como sancionar a intervenção dos organismos corporativos na organização e desenvolvimento das instituições de seguro obrigatório.

BASE II

(Nova)

1. A coordenação prevista na base anterior será orientada pelo Conselho de Segurança Social, constituído pelo Presidente do Conselho de Ministros, que presidirá, e pelos Ministros da Presidência, Finanças, Corporações e Previdência Social e Saúde e Assistência.
2. Sempre que os assuntos submetidos à apreciação do Conselho interessem a outros Ministérios, serão convidados a participar nos trabalhos os respectivos Ministros.
3. A competência e as regras de funcionamento do Conselho serão definidas em diploma especial.

CAPITULO II

Classificação e regime geral das instituições de previdência

BASE III

(Base I e n.° 2 da base III da proposta)

1. São reconhecidas quatro categorias de instituições de previdência social, nos termos seguintes:
2. A 1.ª categoria compreende as instituições de inscrição obrigatória, destinadas a assegurar o esquema geral de eventualidades e prestações da organização de previdência, e classificadas nos seguintes tipos:

a) Caixas de previdência e abono de família;
b) Caixa Nacional de Pensões;
c) Casas do Povo;
d) Casas dos Pescadores.

3. À 2.ª categoria pertencem as caixas de reforma ou de pensões, considerando-se como tais as instituições de inscrição obrigatória destinadas a garantir esquemas especiais de seguros diferidos em benefício de pessoas que exerçam determinadas profissões, serviços ou actividades e não devam ser abrangidas por instituições da 1.ª categoria.
4. Pertencem à 3.ª categoria as associações de socorros mútuos, considerando-se como tais as instituições de previdência de inscrição facultativa, capital indeterminado, duração indefinida e número ilimitado de sócios, tendo por base o auxílio recíproco.
5. Constituem a 4.ª categoria as instituições de previdência do funcionalismo público, civil ou militar, e demais pessoas ao serviço do Estado e dos corpos administrativos, criadas ao abrigo de diplomas especiais.
6. Ouvido o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica, poderá ser ordenada ou permitida a mudança de categoria de qualquer instituição de previdência ou ainda a sua união ou fusão com outras, quando se verifiquem vantagens de ordem social ou económica.

BASE IV

(Base II da proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família, a Caixa Nacional de Pensões e as caixas da 2.ª categoria regem-se pelas disposições da presente lei e pelos regulamentos que vierem a ser publicados em sua execução.
2. As Casas do Povo e suas federações, e as Casas dos Pescadores, são organismos corporativos constituídos ao abrigo de legislação especial e em cujos fins institucionais se inclui o de realizar os objectivos da previdência social, em benefício dos trabalhadores por eles representados e das demais pessoas residentes na respectiva área, equiparadas, nos termos da mesma legislação, àqueles trabalhadores.

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A realização dos mencionados objectivos poderá ser assumida, no todo ou em parte, pelas caixas regionais de previdência e abono de família, previstas na base XII, determinando-se, para esse efeito, à medida que for julgado conveniente} a inclusão dos referidos trabalhadores e pessoas equiparadas em uma ou mais das modalidades de seguro do esquema daquelas instituições.
3. As associações de socorros mútuos regulam-se pela legislação que lhes é aplicável, e as instituições da 4.º categoria continuam a reger-se pelos respectivos diplomas especiais, sem prejuízo da sua gradual integração no plano de previdência social a que se refere a base I.

CAPITULO III

Das caixas de previdência e abono de família e da Caixa Nacional de Pensões

ASE V

(Base IV da proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família destinam-se a proteger os segurados, e os familiares a seu cargo, na doença e na maternidade, bem como a promover o salário familiar pela concessão de abono de família.
2. A protecção na tuberculose será objecto de diploma especial, competindo de início às caixas a concessão de subsídios pecuniários nos impedimentos resultantes daquela doença.
3. Entre os fins de previdência das mesmas instituições será incluída a protecção no desemprego involuntário, nos termos que forem determinados em diploma especial.
4. Poderão ainda estas caixas prosseguir (nitros objectivos de previdência quando devidamente autorizadas pelo Ministro das Corporações e Previdência Social, ouvido o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica.

BASE VI

(Nova)

A Caixa Nacional de Pensões destina-se a proteger, na invalidez, na velhice e por morte, os segurados e seus familiares.

BASE VIII
(Base V da proposta)

1. A iniciativa da criação das caixas, de previdência e abono de família compete:

a) As corporações, bem como aos grémios e sindicatos nacionais e suas federações e uniões;
b) Aos interessado!, quando não existam organismos corporativos que os representem, ou a instituição diga respeito ao pessoal de uma empresa ou grupo de empresas;
c) Ao Ministério das Corporações e Previdência Social.

2. A criação da Caixa Nacional de Pensões e a da federação referida na base XIV incumbem ao Ministério das Corporações e Previdência Social.

BASE VIII
(Base VI da proposta)

As caixas de previdência e abono de família, e sua federação, e a Caixa Nacional de Pensões têm personalidade jurídica e consideram-se legalmente constituídas depois de aprovados por alvará os seus estatutos.

BASE IX
(Base VII da proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família e a Caixa Nacional de Pensões abrangerão obrigatoriamente, como segurados, os trabalhadores das profissões ou actividades definidas nos diplomas da sua constituição, ou integradas por virtude de convenções colectivas ou despachos de alargamento de âmbito.
2. Poderá ser autorizada ou determinada a inscrição obrigatória, nos caixas de previdência e abono de família, de pessoas que, sem dependência de entidades patronais, exercem, certas profissões, serviços ou actividades, para o efeito dá concessão de uma ou mais espécies de benefícios do esquema regulamentar das mesmas instituições, mediante o pagamento das contribuições respectivas.
3. O âmbito das caixas de previdência e abono de família criadas a requerimento dos interessados será o estabelecido nos respectivos estatutos.
4. A obrigatoriedade de inscrição como segurados é extensiva aos sócios das empresas que, ao serviço destas, mediante remuneração e subordinados à administração respectiva, exerçam profissões abrangidas pelas caixas.
5. Ouvido o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica, poderá ser determinado o alargamento do âmbito das caixas de previdência e abono de família, quando o justifiquem motivos de ordem social ou económica.

BASE X
(Base VIII da proposta)

1. As receitas normais das caixas de previdência e abono de família is da Caixa Nacional de Pensões serão constituídas por contribuições dos segurados e das entidades patronais, sancionadas ou estabelecidas pelo Governo e periodicamente revistas com base nos balanços actuariais, mediante parecer do órgão consultivo a que se refere o n.º 6.º da base III e ouvido o Conselho de Segurança Social.
2. A dívida de contribuições às mesmas caixas prescreve pelo lapso de cinco anos, a contar do último dia dó prazo estabelecido para o seu pagamento.
3. Extingue-se pelo lapso de um ano o direito a reclamar a reposição de contribuições indevidamente pagas às referidas caixas pelos segurados ou pelas entidades patronais.

BASE XI
(Base IX da proposta)

As condições gerais de atribuição das prestações a conceder pelas caixas de previdência e abono de família e pela Caixa Nacional de Pensões, bem como os respectivos limites máximos e mínimos, serão estabelecidos em diploma regulamentar, ouvido o Conselho de Segurança Social.

BASE XII
(Base X da proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família e a Caixa Nacional de Pensões gozam das isenções seguintes:

a) Da contribuição industrial;
b) Do imposto sobre a aplicação de capitais, secção B, e do imposto sobre a aplicação de capitais, secção A, este em relação aos capitais mutuados, nos termos da lei de cooperação das instituições de previdência e das Casas do Povo na construção de habitações económicas;
c) Do imposto do selo, incluindo o de averbamento, nos seus diplomas, estatutos ou regu-

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lamentos, livros de escrituração, atestados, certidões, certificados, guias de depósito ou de pagamento e recibos de contribuições e quotas que tenham de processar no exercício das suas funções, bem como de quantias que devam ser cobradas simultaneamente com as multas, e nos recibos que os segurados ou beneficiários passarem por quaisquer quantias recebidas no uso dos seus direitos;
d) Do imposto sobre as sucessões ou doações, quanto a mobiliários e imobiliários para instalação da sede, serviços de utilidade social e casas económicas para habitação de trabalhadores, e quanto aos títulos referidos nas alíneas a) e b) da base XVIII assentados às caixas, bem como quanto à transmissão de quaisquer valores mobiliários ou imobiliários resultante da união ou fusão prevista no n.º 6 da base III;
e) Da sisa pela aquisição de prédios na parte destinada à sua instalação e à de serviços de utilidade social, de casas económicas para habitação de trabalhadores, assim como pela transmissão de imobiliários resultante da união ou fusão a que se refere o n.º 6.º da base III;
f) Da contribuição predial devida pelos prédios mencionados na alínea anterior, nos termos da legislação referida na alínea b) ;
g) Do imposto complementar, pelos rendimentos provenientes da aplicação de capitais em títulos ou bens imobiliários.

2. E aplicável aos títulos referidos na alínea d) desta base o disposto no § 3.º do artigo 84.º do Decreto n.º 31090, de 30 de Dezembro de 1940, salvo se com n sua alienação se tiver em vista proporcionar habitação a trabalhadores.
3. As referidas instituições, quando instaladas em edifício próprio, gozam da regalia de despedir no fim do prazo do arrendamento qualquer dos seus inquilinos, se necessitarem da parte por eles ocupada para as suas instalações ou serviços.

BASE XIII
(Base XII da proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família serão organizadas em base regional, sem prejuízo da manutenção cie caixas privativas de uma empresa ou grupo de empresas, ou de certo ramo de actividade económica, quando, mediante parecer do Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica, se verifique oferecer tal enquadramento vantagens sociais.
2. O âmbito das caixas regionais de previdência e abono de família será referido às profissões exercidas pelos trabalhadores da sua área, e o dás caixas de actividade ou empresa compreenderá o pessoal normalmente ao serviço das empresas interessadas.
3. Os trabalhadores, a quem deva ser aplicável o regime de abono de família e a quem não tenham sido tornados extensivos os demais benefícios das caixas de
previdência, serão inscritos, para efeito da concessão e abono de família, nas caixas regionais da área das empresas a que prestam serviço.

BASE XIV
(Base XIII de proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família constituirão uma federação nacional, destinada a coordenar a acção das instituições federadas e a efectuar a compensação financeira dos seguros que façam, ou venham, a fazer parte do seu esquema regulamentar.
2. Todas as prestações do esquema das mesmas caixas serão concedidas por uma só instituição a cada segurado e seus familiares.
3. Quando se mostre conveniente que alguma caixa, quer regional, quer de actividade ou de empresa, se incumba de conceder aquelas prestações aos segurados de outra caixa, serão celebrados entre as instituições interessadas os necessários acordos, sujeitos a homologação ministerial, sob proposta da federação prevista no n.º l desta base.
4. A Federação das Caixas de Previdência e Abono de. Família competirá a representação das mesmas caixas nos acordos a efectuar com os serviços de saúde e as instituições ou estabelecimentos de assistência social, para a utilização recíproca de serviços ou instalações.

BASE XV
(Base XIV da proposta)

1. A Caixa Nacional de Pensões, a que se refere a base vi, assegurará um esquema de prestações comuns a todos os segurados das caixas de previdência e abono de família que nela devam ser inscritos, sem prejuízo do possível estabelecimento de esquemas superiores, com contabilidade própria, em benefício dos segurados de algumas daquelas caixas, ou de certas categorias profissionais, mediante a correspondente contribuição suplementar, e depois de ouvido o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica.
3. Relativamente aos trabalhadores e equiparados a que se refere a segunda parte do n.º 2 da base IV, e às pessoas mencionadas no n.º 2 da base IX, quando abrangidos por caixas regionais nas condições cá previstas, poderá ser autorizada ou determinada a sua inscrição na Caixa Nacional de Pensões, para o efeito do beneficiarem de um ou outro ramo de seguro a longo prazo, mediante o pagamento das contribuições respectivas.

BASE XVI
(Nova)

1. Será assegurada a coordenação entre d Federação das Caixas de Previdência e Abono de Família e a Caixa Nacional de Pensões, com vista a estabelecer a conveniente articulação dos vários ramos do seguro social.
2. A Caixa Nacional de Pensões poderá utilizar os serviços das caixas de previdência e abono de família, quer para a verificação do direito dos segurados ás prestações e para o pagamento destas, quer em todos os mais casos necessários ao bom funcionamento do sistema e à comodidade dos contribuintes e beneficiários.

BASE XVII
(Base XV da proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família e a Caixa Nacional de Pensões terão, além dos fundos disponíveis correspondentes aos seus objectivos estatutários, um fundo de reserva destinado, nas primeiras, a garantir a instituição contra qualquer emergência imprevista, e, na segunda, a assegurar a cobertura actuarial dos seus compromissos.
2. As caixas de previdência e abono de família terão ainda um fundo de assistência, constituído mediante receitas independentes das contribuições ordinárias e que se destinará a permitir a prestação de socorros extraordinários aos segurados e seus familiares.
3. A Caixa Nacional de Pensões elaborará balanços actuariais, pelo menos de cinco em cinco anos.

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BASE XVIII
(Base XVI da proposta)

1. Os valores das caixas de previdência e da Caixa Nacional de Pensões só poderão ser representados em dinheiro ou aplicados em:
a) Títulos do Estado ou por ele garantidos;
b) Acções ou obrigações de empresas ou entidades que o Conselho Económico julgue oferecerem a necessária segurança e revestirem interesse essencial para a economia da Nação;.
c) Imóveis para instalação ou rendimento;
d) Investimentos de carácter social, através da construção de habitações económicas e da concessão de empréstimos aos segurados e às respectivas empresas, bem como às Cosas do Povo, para atender às necessidades de habitação dos trabalhadores e suas famílias.

2. Para os fundos de assistência poderão ser autorizadas outras formas de aplicação consentâneas com os seus objectivos.
3. O limite máximo dos valores globalmente aplicados, nos termos das alíneas b) a d) do n.º l desta base, será de 50 por cento do total, podendo autorizar-se que, para a fixação do montante a aplicar em investimentos de carácter social, se considerem as valores prováveis a acumular no período máximo de cinco anos.
4. As aplicações previstas nesta base e a alienação dos imóveis e títulos das caixas dependem de autorização do Ministro das Corporações e Previdência Social.

BASE XIX
(Base XVII da proposta)

1. A gerência das caixas de previdência e abono de família e sua federação e a da Caixa Nacional de Pensões será confiada a direcções, assistidas de conselhos gerais, cujos presidentes e vice-presidentes, quando os haja, serão nomeados pelo Ministro das Corporações e Previdência Social.
2. Os vogais dos mesmos corpos directivos representarão em número igual os beneficiários e os contribuintes, incumbindo a sua designação aos respectivos organismos corporativos de entre os seus associados inscritos na instituição. No caso da Federação das Caixas de Previdência e Abono de Família, os vogais serão designados pelas caixas federadas 6 deverão ter idêntica composição paritária.
3. Nas caixas privativas do pessoal de uma empresa ou grupo de empresas caberá a estas a designação directa dos seus representantes.
4. Os membros das direcções e dos conselhos gerais são civil e criminalmente responsáveis pelas faltas e irregularidades cometidas no exercício das suas funções.

BASE XX
(Base XVIII da proposta)

As caixas regionais de previdência e abono de família cooperarão com as Casas do Povo e suas federações na organização da assistência médico-social aos trabalhadores rurais e na protecção às famílias dos mesmos trabalhadores, devendo celebrar-se entre, umas e outras os convenientes acordos para utilização recíproca dos respectivos serviços.

BASE XXI
(Base XIX da proposta)

1. A falta de cumprimento das obrigações impostas pelos estatutos das caixas de previdência e abono de família e da Caixa Nacional de Pensões às entidades patronais constitui transgressão punível com multas de 100$ a 3000$, salvo se mais graves sanções estiverem previstas por lei.
2. O disposto no número anterior não se aplica às contribuições e mais quantias em dívida às referidas caixas, para cuja cobrança coerciva é competente o processo executivo regulado no Código de Processo nos Tribunais do Trabalho.
3. A partir da data em que tenham expirado os prazos estabelecidos para o pagamento das contribuições, serão estas acrescidas de juro de mora, a cargo das entidades responsáveis, nos termos que forem determinados pelo Governo, revertendo a importância do juro para as caixas a que as mesmas contribuições furem devidas.
4. A falta de pagamento de contribuições, quando imputável às entidades patronais, não prejudica o direito às prestações por parte dos beneficiárias, desde que estes tenham o tempo de inscrição regulamentar e a instituição possua elementos comprovativos da prestação de trabalho durante o período a que respeita aquela falta.
5. O julgamento, das transgressões referidas no n.º l desta base é da competência dos tribunais do trabalho e as multas correspondentes reverterão para o fundo de assistência da caixa interessada.

CAPITULO IV

Das caixas de reforma ou de pensões

BASE XXII
(Base XX da proposta)

As caixas de reforma ou de pensões destinam-se a proteger os segurados e os seus familiares na invalidez, na velhice e por morte.

BASE XXIII
(Base XXI da proposta)

1. As caixas de reforma ou de pensões terão, além da reserva matemática, destinada a assegurar a cobertura actuarial dos seus compromissos, um fundo de garantia para prevenir qualquer emergência imprevista.
2. Podem ainda as mesmas caixas ter um fundo de assistência, nos termos previstos no n.º 2 da base XVII.
3. Promover-se-á a conveniente coordenação entre as caixas de reforma ou de pensões e a Caixa Nacional de Pensões, para o efeito da manutenção dos direitos de segurados que, por mudança das condições de exercício das suas profissões ou actividades, devam passar de uma para outra categoria de instituições.

BASE XXIV
(Base XXII da proposta)

1. A gerência das caixas de reforma ou de pensões será confiada a uma direcção assistida de um conselho geral, cujos membros serão designados, pelos segurados ou pelos organismos corporativos que os representem.
2. Nas caixas de reforma ou de pensões para classes representativas de interesses espirituais poderão os respectivos superiores hierárquicos designar os presidentes daqueles corpos directivos.

BASE XXV
(Base XXIII da proposta)
É aplicável às caixas de reforma ou de pensões u disposto nas bases VIII, XI, XII e XVIII, nas alíneas a) e b)

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da base VII, e nos n.ºs 3 e 5 da base IX, primeira parte do n.º 1 e n.ºs 2 e 3 da base X e 3 da base XVII.

CAPITULO V

Disposições comuns e transitórias

BASE XXVI
(Base XXIV da proposta)

1. Depende de autorização do Governo a constituição e funcionamento de quaisquer sociedades, associações, caixas, fundos ou instituições que se comprometam, mediante pagamento regular ou irregular de quantias fixas ou variáveis, a conceder benefícios pecuniários ou de outra natureza, no caso de se verificarem factos contingentes relativos à vida ou saúde dos interessados, Ti sua situação profissional ou aos seus encargos familiares.
2. Os directores, gerentes ou administradores das instituições constituídas ou em funcionamento sem a autorização exigida no número anterior incorrem na pena de multa até 5000$, sem prejuízo da aplicação de outras sanções previstas por lei. As instituições mencionadas, quando não seja possível regularizá-las de acordo com a presente lei, serão dissolvidas.

BASE XXVII
(Base XXV da proposta)

As prestações devidas aos segurados ou sócios das instituições de previdência social e seus familiares não podem ser cedidas a terceiros nem penhoradas, mas prescrevem a favor das respectivas instituições pelo lapso de um ano, a contar ido vencimento ou do último dia do prazo de pagamento, se o houver.

BASE XXVIII
(Base XXVI da proposta)

1. As instituições de previdência compreendidas nas 1.º, 2.º e 3.º categorias referidas na base m estão subordinadas ao Ministério das Corporações e Previdência Social e sujeitas à fiscalização dos serviços respectivos, deles recebendo as instruções e directivas convenientes no seu aperfeiçoamento e consolidação.
2. As mesmas instituições são obrigadas a prestar aquele Ministério os elementos estatísticos ou informações por ele requisitados.

BASE XXIX
(Base XXVII da proposta)

1. As caixas de previdência e abono de família só se dissolvem por fusão com outras. As caixas de reforma ou de pensões podem dissolver-se por fusão com outra» ou por simples liquidação, conforme for determinado pelo Ministério das Corporações e Previdência Social, duvidou os. interessados e o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica.
2. Em caso de liquidação das instituições das 2.º e 3.º categorias referidas na base III serão os seus haveres, pagas as dívidas ou consignada a quantia necessária para o seu pagamento, divididos entre os segurados ou sócios, na proporção das reservas matemáticas, com ressalva do disposto nos números seguintes.
3. Se as reservas matemáticas não forem praticamente determináveis, os haveres da instituição serão partilhados pêlos segurados ou sócios na proporção das contribuições ou quotas por eles pagas, ou, se estas forem desconhecidas, em quinhões iguais.
4. Não se encontrando segurados, sócios ou pensionistas com direito à partilha, serão aqueles haveres aplicados, ouvido o Conselho Superior da Previdência e da Habitação Económica, a favor de outras instituições de previdência, conforme se mostrar socialmente mais vantajoso.

BASE XXX
(Base XXVIII da proposta)

A designação dos vogais das direcções e conselhos gerais das caixas de previdência e abono de família e sua federação, e da Caixa Nacional de Pensões, bem como a dos membros dos corpos directivos das .caixas de reforma ou dê pensões, continuam sujeitas à homologação do Ministro das Corporações e Previdência Social.

BASE XXXI
(Base XXIX da proposta)

1. Nas instituições de previdência obrigatória rio pessoal das empresas concessionárias de serviços públicos, a integração das pensões constitui encargo inerente à exploração desses serviços.
2. As caixas de previdência do pessoal dos caminhos de ferro serão reguladas por diploma especial.

BASE XXXIX
(Base xxx da proposta)

1. Fica revogada a Lei n.º 1884, de 16 de Março de 1935.
2. As caixas sindicais de previdência e as caixas de reforma ou de previdência e respectivas federações, actualmente constituídas, continuam a reger-se pela legislação complementar da referida Lei n.º 1884 em tudo aquilo que não contrarie as disposições do presente diploma.

BASE XXXIII
(Base XXXI da proposta)

O Governo publicará os regulamentos necessários à boa execução desta lei, competindo ao Ministro das , Corporações e Previdência Social determinar as convenientes alterações dos estatutos e regulamentos, das caixas sindicais e de reforma ou de previdência e respectivas federações, actualmente constituídas, bem como as condições e a oportunidade de integração das instituições existentes no sistema da presente lei.

Palácio de S. Bento, 14 de Março de 1961.

António Bandeira Garcês (votei, vencido, o parecer na parte que se refere aos acidentes de trabalho e pelo que exponho):
a) O seguro de acidentes de trabalho não pode classificar-se como seguro social. Trata-se de um seguro caracterizadamente privado, essencializando-se o seu âmbito na cobertura da responsabilidade patronal pelos riscos profissionais.
Essa responsabilidade, que evoluiu e se processou semelhantemente à que resulta dos riscos de viação, constitui, como ela, um departamento do instituto de responsabilidade civil.
A industrialização da segunda metade do século XIX, implicando, pelo emprego da máquina, unia maior frequência e uma maior gravidade de acidentes, deu-lhe grande projecção social e exigiu-lhe adequada e peculiar regulamentação.
Idênticas circunstâncias, devidas a causas paralelas - a motorização -, se viriam a verificar no século XX com a responsabilidade pelos acidentes de trânsito.

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6 DE ABRIL DE 1961 1317

Elas, porém, não alteraram a natureza das responsabilidades nem o conteúdo dos seguros.
b) Para a cobertura dos riscos de acidentes de trabalho adoptaram-se dois regimes - o da empresa livre (sociedade anónima ou mútua) e o monopólio estatal.
Poucos, países preferiram este último, inclinando-se quase todos para o primeiro.
Com a segunda guerra mundial gerou-se um movimento no sentido da solução estatal que conseguiu adeptos, movimento que se não restringiu aos seguros de acidentes de trabalho, pois se estendeu a outras actividades.
De inspiração declaradamente socializante, ou até comunizante, culminou ele, em França, com a vaga das nacionalizações que abrangeu o Banco de França, os grandes bancos, as grandes companhias de seguros, os caminhos de ferro, as minas de hulha, as empresas produtoras de energia eléctrica, a Renault, as fábricas de armamento e outras.
Na Grã-Bretanha, com os trabalhistas, nacionalizou-se o Banco de Inglaterra, os transportes, as minas de carvão, e pretendeu-se nacionalizar a indústria de aço e ... algumas companhias de seguros.
Os acidentes de trabalho não podiam escapar. Em França, ditou-se o monopólio, mas dele se excluíram os trabalhadores agrícolas, que continuaram a ser cobertos pelas empresas privadas.
No resto do continente, não se falando nos povos que ficam para lá da «cortina de ferro», não houve alterações.
O caso britânico situa-se à parte. Não se extinguiu o seguro privado de acidentes de trabalho, que continuou e subsiste. Planeou-se, sim, a socialização da medicina, interessando a toda a população. Ela prevê os acidentes, sejam ou não de trabalho. Na hipótese de acidente de trabalho a vítima pode optar pela execução da responsabilidade patronal, de harmonia com o Workmen's Compensation Act, ou pela protecção do National Health Service.
É curioso - e esclarecedor - notar que, mormente nos últimos anos e sem embargo de os operários comparticiparem nas despesas do National Health Service, se acentuam, e de forma bastante sensível, as suas preferências pela execução da responsabilidade patronal.
Na América do Norte, os critérios divergem de estado para estado, mantendo uns a liberdade, enquanto outros adoptam o monopólio. A diversidade permite estabelecer confrontos entre o comportamento dos dois sistemas, e dos. estudos feitos ressalta a superioridade do sistema privado - maior eficiência, maior elasticidade e adaptação e menor custo.
Põe-se em contraste o funcionamento lento e rotineiro, eivado de burocracia, das caixas públicas com o dinamismo e n constante aperfeiçoamento a que a emulação da concorrência obriga as empresas particulares.
c) Entre nós a responsabilidade patronal pelos acidentes de trabalho só assume estrutura própria com a Lei n.º 83, de 24 de Julho de 1913, a que se seguiram os Decretos n.ºs 4288, de 9 de Março de 1918, e 5637, de 19 de Maio de 1919, podendo, no entanto, afirmar-se que a sua generalização apenas se efectivou após a Lei n.º 1942, de 27 de Julho de 1936.
Para a cobertura, sempre o legislador português - em 1913, em 1918, em 1919 e em 1936- se decidiu pela empresa privada.
O regime tem resultado e as críticas que lhe dirigem baseiam-se, regra geral, em deficiência de informação, pois fala-se em discussões contenciosas, mas a verdade é que as estatísticas demonstram sei- ínfima a proporção dos casos que chegam a essa fase.
Na parte expositiva do parecer aconselha-se a incorporação dos acidentes de trabalho, quando as circunstancias o permitam, na previdência. Sob roupagem pretensamente inocente, sugere-se uma forma de nacionalização. Ela ressente-se
da mesma inspiração socializante - isto com o devido respeito- que, em França, concluiu pelo monopólio estatal.
De resto, essa tendência tem-se infiltrado insidiosamente na organização da previdência e manifesta-se em variados aspectos, incluindo o da terminologia.
Nos diplomas iniciais, na teorização que rio esquema se fez, nas exposições doutrinárias que o fundamentaram, procurou-se afastar qualquer ilação de paralelismo com os seguros sociais, evitando-se o uso de uma terminologia que conduzisse a confusões.
Em 1948 muda-se de orientação e aceita-se a nomenclatura socializante. À previdência passou a chamar-se «seguros sociais» e aos beneficiários «segurados», o que, além de comprometer desvio, representa um erro de técnica jurídica. Segurado foi sempre, desde as velhas Regulações das Casas de Seguros até aos códigos comerciais e aos diplomas de 1907 e 1929, aquele que firma o contrato de seguro com um segurador.
A situação jurídica do trabalhador garantido pela previdência (ou pelo seguro social) é diferente - não segurado, mas beneficiário.
A integração na previdência levaria mesmo, sob pena de ilogismo, ao absurdo de os trabalhadores terem de suportar, em parte, o pagamento de uma responsabilidade que compete as entidades patronais.
d) Pêlos que preconizam a nacionalização, ela encontrar-se-ia em melhores condições que o seguro privado para fomentar a medicina do trabalho. Também, neste sector, a, realidade não confirma a asserção. Apesar das dificuldades com que depara, afigura-se que o seguro privado sobreleva, nas suas realizações, a previdência.
Hospitais privativos, clínicas e postos bem equipados, cirurgiões, traumatologistas e oftalmologistas cuidadosamente recrutados, rastreios radiológicos, congressos, brochuras e outras publicações, tudo isto se tem feito desde que em 1936, com a entrada em vigor da Lei n.º 1942, se difundiu o seguro de acidentes de trabalho.
No que respeita à prevenção, criou o seguro privado, pelo seu grémio. - o Grémio dos Seguradores - o Centro de Prevenção de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, cuja actuação, não espectacular mas de permanência e regularidade, se credita de meritória. Aliás, antes dele, as companhias, individualmente, a vinham praticando.
Igualmente o seguro privado se não mostrou alheado da recuperação. Sobre o problema se debruçaram os seus dirigentes, estruturando um centro que se desdobraria em três fases - a hospitalar, a de reeducação e a de recolocação. Vi-

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cissitudes a eles estranhas não permitiram que a iniciativa prosseguisse, ao mesmo tempo que se anunciava a montagem, pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, de um organismo com idêntica finalidade.
Em conclusão e resumo:
O seguro de acidentes de trabalho, sendo tini seguro de responsabilidade patronal, não pode :considerar-se um seguro social.
De entre os dois sistemas da sua cobertura o da empresa privada tem-se classificado nitidamente superior, mais barato e muito mais eficaz do que o de monopólio estatal.
Aos princípios que informam a orgânica social e económica da Nação, assim como às suas leis fundamentais - Constituição e Estatuto do Trabalho Nacional -, repugnam, quaisquer fórmulas nacionalizantes.
Alberto Sobral.
António Júlio de Castro Fernandes.
Afonso de Melo Pinto Veloso (reitero a minha inteira adesão ao texto, legislativo proposto pela Câmara Corporativa, em conclusão do notável relatório que o precede.
Quanto a este, apenas reservo juízo definitivo relativamente à sugestão de futuro monopólio do Estado sobre os seguros por acidentes no trabalho. Não pude certificar-me de que as vantagens apontadas superem os óbvios inconvenientes da estatização e burocratizo cão desta indústria).
António Avelino Gonçalves.
António da Silva Rego.
António Vitorino Franca Borges.
Armando Gouveia Pinto.
Domingos Cândido Braga da Cruz.
Francisco Manuel Moreno.
Guilherme Braga da Cruz.
João Militão Rodrigues.
João Ubach Chaves.
Joaquim Trigo de Negreiros.
Jorge Augusto da Silva Horta.
José Albino Machado Vaz.
José de Almeida Ribeiro.
José Augusto Vaz Pinto.
José de Mira Nunes Mexia.
José Pires Cardoso.
José Seabra Castelo Branco.
Luís de Castro Saraiva.
Luís Gordinho Moreira.
Manuel Alberto Andrade e Sousa.
D. Maria Luísa Ressono Garcia.
Pedro António Monteiro Maury.
António Jorge Martins da Motta Veiga, relator.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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