O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 283

REPÚBLICA PORTUGUESA

ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

VIII LEGISLATURA - 1963 22 DE MARÇO

PARECER n.º 9/VIII

Proposta de lei n.º 18/VIII

Revisão da Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1953

(Lei Orgânica do Ultramar Português)

a Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 108.º da Constituição, acerca da proposta de lei n .º 18/VIII, sobre a revisão da Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1958 (Lei Orgânica do Ultramar Português), emite, pela sua secção de Interesses de ordem administrativa (subsecção de Política e administração ultramarinas), com os Dignos Procuradores agregados Afonso Rodrigues Queiró, António Armando Gonçalves Pereira, António Jorge Martins da Mota Veiga, António Júlio de Castro Fernandes, António Trigo de Morais, Armando Manuel de Almeida Marques Guedes, Carlos Krus Abecasis, Fernando Andrade Pires de Lima, Joaquim Trigo de Negreiros, José Gabriel Pinto Coelho, Manuel Jacinto Nunes, Paulo Arsénio Viríssimo Cunha e Rui Enes Ulrich, sob a presidência de S. Exa. o Presidente da Câmara, o seguinte parecer.

I

Apreciação na generalidade

1. As codificações das bases geram do regime de governo e administração ultramarina, que em Portugal se têm sucedido desde 1986, tiveram sempre compreensívelmente vida ameaçada pela evolução das ideias respeitantes,, em particular, ao problema das relações entre a administração central ou metropolitana (considerada a expressão no seu mais amplo e compreensivo sentido) e a administração das várias parcelas territoriais do nosso ultramar, e ao problema da extensibilidade às províncias ultramarinas da generalidade das normas e instituições de direito administrativo metropolitano. Tão depressa se modificaram as concepções dominantes a este respeito, tão depressa entraram em crise os princípios sobre estes dois pontos em cada momento perfilhados, logo se lançou mãos à obra de alterar, modificar ou substituir tais codificações, em correspondência com os ensinamentos que entretanto ganharam o favor e a adesão quer da doutrina quer de mais ou menos amplas correntes de opinião. Não é outra a explicação para a sucessão das leis orgânicas do ultramar desde 1886 a 1953, o esboço da qual é feito com rigor e exactidão no relatório da proposta de lei ora submetida a Câmara Corporativa para efeitos de parecer. A orientação inicial destas codificações, após o triunfo d n revolução liberal, consistiu em se uniformizar o governo, a administração e o direito administrativo respeitantes a todas as províncias ultramarinas pelo figurino metropolitano Estas não constituiriam mais, a final de contas, do que autarquias e circunscrições territoriais, de índole essencialmente administrativa, praticamente sem

Página 284

284 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

qualquer relevo constitucional administradas em moldes fundamentalmente idênticos aqueles de acordo com os quais eram administradas as autarquias e circunscrições metropolitanas correspondentes - com mais ou menos centralização ou mais ou menos descentralização, conforme as ideias que a este respeito tivessem momentaneamente primazia na metrópole.
Seguiu-se a esta a orientação de especializar o regime geral de governo e administração das províncias ultramarinas, em termos, porém, de, pela latitude ou pela flexibilidade das suas fórmulas e disposições, facultar um segundo grau de especialização, traduzido em seguida num estatuto orgânico particular de cada província, elaborado tendo em conta o seu grau de desenvolvimento e as suas características e condições peculiares. O acento tónico das codificações inspiradas nestes moldes deixou de residir na uniformidade assimiladora e na integração da administração ultramarina, ao nível ministerial, nas várias Secretarias de Estado metropolitanas, para passar a situar-se na diversificação não apenas em relação ao conjunto do ultramar mas também e sobretudo em relação a cada uma das suas parcelas. Esta diversificação acarretou consigo uma desintegração dos serviços ultramarinos de cada um dos departamentos metropolitanos em que estavam incluídos, para passarem a estar coordenados por uma Secretaria de Estado especializada na administração do ultramar. Mas acarretou mais do que isso, posto que a acentuação da especialidade do condicionalismo de cada território requereu uma transferência de poderes dessa Secretaria metropolitana para órgãos locais, de natureza individual (governadores, comissários régios, altos comissários) e de natureza colegial (conselhos de governo e conselhos legislativos), cuja actuação ficou submetida a um frouxo contrôle da sua parte. Na medida em que neste sistema se desconcentraram e descentralizaram poderes públicos executivos e legislativos que até aí, por força da lei fundamental, haviam pertencido exclusivamente a órgãos metropolitanos, foi preciso dar à administração do ultramar um especial assento constitucional.
Num terceiro momento, tornou-se necessário estabelecer para o ultramar um regime geral de administração e de governo que, se, por um lado, continuou a ser um regime especial em relação ao da metrópole, passou, por outro lado, a ser rigorosamente uniforme para todas as províncias (no sentido de que não haveria estatutos orgânicos para cada uma delas). Esta orientação legislativa minimizou as diferenças de meio social e outras que antes tinham conduzido a uma legislação orgânica plural e haviam justificado uma política de desconcentração de poderes e de descentralização em relação a cada uma das províncias. Nesta lógica, reforçou os poderes do Ministro que na metrópole tinha o encargo específico dos assuntos ultramarinos, em prejuízo dos governadores e dos conselhos e assembleias locais Mais precisamente concentrou-se em Lisboa e nas mãos de um Ministro especializado o mais importante das funções legislativas e executivas referentes ao ultramar, considerado em conjunto ou em cada uma das suas parcelas; eliminaram-se assembleias legislativas territoriais, que ficaram reduzidas a categoria de simples órgãos consultivos do governador no exercício das funções legislativas que a ele exclusivamente ficaram cabendo em matérias, aliás, de índole técnica e de interesse muito caracterizadamente local, outro tanto sucedeu com os corpos administrativos provinciais, que foram convertidos em conselhos de governo, de composição só ou predominantemente burocrática, com funções exclusivamente consultivas.
Até que se chegou à Lei Orgânica do Ultramar Português (Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1953, com alterações introduzidas pela Lei n.º 2076, de 25 de Maio de 1955, pelo Decreto-Lei n.º 42 515, de 19 de Setembro de 1969, e pelo artigo 32.º do Decreto n.º 44 736 de 28 de Novembro de 1962) e se adoptou um regime geral de governo e administração ultramarina em que puderam sei tidas em conta todas as experiências do passado, realizadas na base das orientações que vêm de ser sumàriamente esboçadas, aproveitando de cada uma delas o seu contributo positivo.
Foi assim que se reputou adequado lebreira ao sistema de uma lei orgânica básica sobre o regime geral de governo e administração das províncias ultramarinas, de conteúdo suficientemente lato e elástico paia justificai u sua integração por estatutos político-administrativos especiais para cada província. E, se se conservou nas mãos do Ministro do Ultramar uma ampla competência legislativa e executiva, a verdade é que se procurou que ela ficasse restrita a limites razoáveis, ou seja, às matérias que representassem interesses superiores ou gerais da política nacional no ultramar ou fossem comuns a mais de uma província ultramarina. Quanto aos assuntos que interessassem exclusivamente a cada província, entregou-os a referida Lei Orgânica à competência dos respectivos órgãos locais - ao governador e a um conselho em que haveria ir representação adequada as condições do meio social os de natureza legislativa e ao governador exclusivamente (com a possibilidade e eventualmente com a obrigação de ouvir um adequado conselho, de atribuições exclusivamente consultivas) as de natureza executiva. Finalmente, à mais antiga orientação assimilacionista e uniformizadora, o legislador de 1953 foi em particular buscar a instituição de serviços públicos nacionais, ou seja, de organizações unitárias de meios pessoais e materiais, unificadas na metrópole e nas províncias ultramarinas, destinadas à realização de fins comuns a uma e outras (colocando-se, assim, neste ponto, de acordo com exigências geralmente reconhecidas hoje nas próprias federações de estados, em que o desenvolvimento económico e a facilidade das comunicações têm levado de vencida as tradições localistas, de acordo com as quais as organizações de serviços públicos se situavam no passado predominantemente ao nível «estadual», e não ao nível federal.) Assim como os «direitos dos estados» cedem cada dia mais perante os «poderes federais» no duelo federal versus state administration, assim também ao legislador de 1953 pareceu que a pretensão de um home rule absoluto das províncias ultramarinas em relação aos serviços que nelas gerem interesses públicos deveria em muitos casos ceder o passo a uma directriz da moderna ciência da administração, que é claramente no sentido de robustecer e alargar o quadro dos serviços públicos de gestão uniforme e unificada a partir de um centro ao nível do qual se integram, em detrimento dos serviços locais desintegrados.

2. Passados que são apenas cerca de dez anos sobre a entrada em vigor da Lei Orgânica do Ultramar Português, suscita-se, com a proposta de lei em exame, o ensejo de a aperfeiçoar e portanto quanto possível de acordo com o condicionalismo sempre em evolução nas províncias ultramarinas. Não se suscita, porém, nem poderia, naturalmente, suscitar, ante claros e vinculantes preceitos constitucionais, ante os imperativos da história e ante as exigências do bom senso, o problema de mudar radicalmente de rumo.

Página 285

22 DE MARÇO DE 1963 285

Não que falte quem sugira novas orientações, novos rumos. Temos aí quem nos ensine o sistema prático o necessariamente eficaz de administrar o ultramar para o abandonarmos a curto prazo. São os que falam de uma «autonomia progressiva», que desembocaria, quando Deus quisesse, na plena soberania das várias parcelas territoriais da parte ultramarina da Nação. Não vêem eles sento uma das determinantes de ordem geral da evolução política dos povos «colonizados» - a propensão para a independência ou o pendor para o «nacionalismo» dos povos do «terceiro mundo». Não atentam, pelo que respeita ao ultramar português, nem na diversidade dos casos e das situações, nem na radical carência de meios humanos e materiais para que essa independência se consolide e não seja mais do que pura forma, nem na fundamental necessidade, que há-de acabar por ser reconhecida, de se não largar mão de mais territórios, que em caso de uma outra guerra seriam indispensáveis no plano estratégico e no plano económico, entregando-os a forças neutralistas ou declaradamente hostis ao Ocidente, nem, por último, na tendência nova e característica da nossa época, que é a da formação de grandes espaços económicos unificados, de grandes espaços não só económica, mas politicamente integrados, tendência que fez ou fará esbater a virulência dos «nacionalismos». E sobretudo crêem que a secessão política nos permitiria manter nos territórios abandonados, no futuro, uma presença espiritual e económica que se não vê possa ser, nessas condições, exercida por um país com a estrutura que a metrópole possui, em concorrência com quem em qualquer desses domínios fàcilmente nos eliminaria e afastaria.
A estes, que se colocam para além das imposições de todos os estatutos fundamentais da Nação desde 1822, contrapõem-se, com objectivos e recomendações diametralmente opostas, os que consideram essencial e indispensável, para salvar a estrutura unitária do Estado português, retomar a orientação abandonada na lei orgânica de 1881 e, consequentemente, uniformizar não só a organização da administração e do governo das províncias ultramarinas e da metrópole, como também, de um modo geral, todo o direito público e privado, que, assim, deveria passar a ser sistematicamente comum à metrópole e ao ultramar.
Este movimento de ideias, caracterizado por um forte idealismo e por um vincado portuguesismo, parte de um mais ou ou menos patente erro de diagnóstico sobre os perigos que para a unidade política nacional pretensamente decorrem, quer da especialização da administração e do governo das províncias ultramarinas, quer da especialidade das leis que lhes dizem respeito, quer ainda da descentralização ou desconcentração, em particular, dos poderes legislativos em órgãos provinciais Os que o encabeçam recusam-se - é o termo - a reconhecer a legitimidade de se tirarem quaisquer consequências das diferenças de condicionalismo geográfico, étnico, humano, cultural e económico que inegavelmente se verificam entre a metrópole e o ultramar e, dentro do próprio ultramar, entre as suas várias parcelas territoriais. Consideram que por sobre tudo isto se deve passar, que se deve fechar os olhos a estas realidades - e se deve legislar, em matéria de organização do governo e da administração ultramarina, e em tudo o mais que diga respeito ao ultramar, como se tais diferenças não existissem ou fossem realmente de considerar irrelevantes.
Atentar em toda a larga série de dificuldades de ordem prática, de ordem técnica e de ordem política que se levantam a esta política uniformizante e integradora é, para estes portugueses, estar-se ainda apegado a uma política «autonomista de associação» que teria sido importada e passada aos direitos, vinda de França, por alturas do último quartel do século XIX, exactamente por uma geração até agora indevidamente exaltada e sobrestimada.
Não é difícil diagnosticar neste movimento de ideias a presença de influências francesas da corrente dos que, além-Pirenéus, proclamaram a praticabilidade de uma política de «departamentalização» ou de «integração», em especial em relação à Argélia. Como quer que seja, o que á especialmente de assinalar é que é injusta e menos exacta a sua apreciação sobre o alcance e intenções da doutrina dos homens da geração de António Enes, de Mouzinho e de Eduardo da Costa, e, sobretudo, que é completamente falho de realismo pressupor que a unidade política da Nação se serve melhor ou só se pode mesmo servir deixando de contemporizar com o condicionalismo geográfico e sociocultural dos territórios ultramarinos. Pelo contrário trata-se de uma regra de ouro, elementar mas eterna, de sabedoria política, que a tais condicionalismos, quando suficientemente vincados, não pode deixar de se atender. O abandono desta regra pagar-se-ia, uma vez mais, exactamente pelo preço da frustração na realização dos objectivos que os partidários de um «integracionismo» sem reservas desejam ver alcançados.
Uma terceira corrente, no combate que move aos integracionistas e aos seus patentes exageros, acaba, por sua vez, por resvalar no que podemos chamar uma espécie de «autonomismo tácito» ou «implícito», que lógica e necessariamente antecederia de pouco uma autonomia caracterizada - porta aberta ou antecâmara, por sua vez, como sempre e em toda a parte for e é, para a outorga ou conquista do estatuto de estadualidade ou de plena soberania. A lógica é, neste domínio, correspondente as lições da mais recente história. A atribuição a um território de um «poder legislativo» em relação a todos os seus negócios, sem controle do Poder Central, e a instituição de um «poder executivo» praticamente independente, quer do executivo da metrópole, quer do seu representante no território, constituem sempre, inevitavelmente, o princípio do fim. Aliás, o próprio facto de às recomendações deste tipo se associar a de se eliminarem ou restringirem ao mínimo os serviços públicos de âmbito nacional, por pretensamente incompatíveis com uma coordenação das autoridades locais, denuncia a coerência imanente e o sentido objectivo de uma tal corrente de ideias - sem embargo de se fazer justiça aos que nela se enquadram, devendo os seus desvios doutrinários imputar-se ao ardor e às exigências da polémica anti-integracionista que conduzem. E só como pensamento objectivo que a tese que nos suscita este apontamento dá margem a reparos - porque a ortodoxia e o portuguesismo dos que a emitem não pode estar em causa nem nunca esteve em dúvida.

3. De um modo geral, podem sintetizar-se assim os princípios dominantes da proposta de lei sob apreciação:

1) Desconcentração da competência executiva do Ministro do Ultramar, investindo-se os governadores em alguns dos seus actuais poderes, de alcance e interesse mais caracterizadamente locais (sobressaindo especialmente a transferência para os governos ultramarinos da competência ministerial actual em matéria financeira),
2) Reforço do carácter representativo dos órgãos colegiais legislativos das províncias,
3) Alargamento da participação das províncias ultramarinas nas grandes assembleias ou corpos político-legislativos do Estado,

Página 286

286 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

4) Desburocratização do Conselho Ultramarino, peia participação na sua composição de representantes das províncias;
5) Garantia de uma representação regional adequada em todos os órgãos consultivos de âmbito nacional;
6) Aumento do grau de descentralização local, no âmbito de cada província

Esta Câmara entende que a orientação que inspirou a codificação de 1958 continua, de um modo geral, adequada à evolução das províncias ultramarinas, mas que se tornam convenientes e são possíveis algumas correcções e adaptações que ponham a Lei Orgânica mais de acordo com alguns dos princípios constitucionais hoje vigentes designadamente levando os princípios da descentralização, quer provincial, quer local, e o da integração (este, por sua vez, explicitado pela Lei Constitucional n.º 2100, de 29 de Agosto de 1959) até adquirirem toda a execução de que são susceptíveis sem contrariarem, respectivamente, a unidade política da Nação e os interesses específicos e particulares de cada um dos territórios de além-mar. A Câmara Corporativa colaborará, na análise a que vai proceder da proposta na especialidade e nas conclusões com que fechará este parecer, na procura da mais feliz harmonização destes dois princípios, que são, aliás, duas constantes da história da nossa administração ultramarina (em relação às quais naturalmente se verificaram, em cada época, desvios ou más interpretações). Tem-se a impressão de que as alterações que se sugerem ao texto da proposta não lhe retiram o alcance e o significado que o Governo lhe atribuiu e pretendeu que tivesse - e que, bem vistas as coisas, se vai até, na realidade, pelo menos em alguns pontos, mais longe do que o que vem proposto.

4. Esta proposta é mais um índice da solicitude e do carinho com que a velha metrópole encara os problemas de toda a ordem respeitantes à parte ultramarina da Nação. Atenta a todos os seus problemas e dificuldades, a metrópole aqui está uma vez mais, a procurar resolvei-os que se suscitam no plano da sua organização política e administrativa - com a mesma generosidade e espírito de solidariedade sempre comprovados, mas sobretudo bem documentados no último decénio.
A metrópole, na verdade, não tem sido avara, designadamente no concurso das suas possibilidades financeiras, ao desenvolvimento económico e social das províncias e à defesa do ultramar.
Os resultados desta política aferem-se por vários índices, de que só se deseja evocar os referentes à intensificação dos investimentos por efeito da execução dos planos de fomento, ao povoamento europeu e à expansão das exportações de Angola e de Moçambique, sendo ainda de notar que na defesa do ultramar contra as cobiças externas o tesouro metropolitano tem suportado vultosos encargos.
A metrópole - seria ingratidão esquecê-lo e mesmo só não o destacar devidamente - tem desmonstrado bem, pelos sacrifícios a que se tem sujeitado, como concebe e como pratica o princípio da unidade moral e política da Nação. Não tem apelado para a sua «individualidade» ou «personalidade» própria nem chamado a atenção para a «individualidade» é «personalidade» de cada província para se isentar do fardo dos sacrifícios e dos encargos e até do holocausto das vidas: tem sabido servir a grande, a nobre, a elevada ideia da unidade da Nação!
Ao apresentar esta proposta de lei, o Governo procurou, mais uma vez servir esta ideia - e a Câmara não lhe regateia nem colaboração nem apoio.

II

Exame na especialidade

Artigo 1.º

Base VII

5. A Câmara Corporativa entende que não tem qualquer alcance prático a inclusão na Lei Orgânica de uma norma segundo a qual «as províncias ultramarinas terão representação adequada na Assembleia Nacional». Trata-se, por um lado, de qualquer coisa de tão manifesto que se não compreende que haja necessidade de o proclamar em lei; e, por outro lado. o preceito proposto pode levar a supor que as províncias estão hoje prejudicadas quanto ao número de representantes que enviam à Assembleia Nacional. Ora esta Câmara não está segura de que. em termos de justiça relativa, as províncias ultramarinas tenham naquela Assembleia uma representação deficiente, sobretudo se se tiver em conta que essa representação se deve pautar pela densidade da população com capacidade eleitoral activa dos círculos eleitorais e que a Assembleia Nacional não é um órgão com competência normal para legislar para o ultramar. De qualquer maneira, repugna admitir que o legislador, de todas as vezes que remodelar a lei eleitoral a que se refere o § 1.º do artigo 85.º da Constituição, não se cinja à directriz de adequar os círculos eleitorais à necessidade de dar à generalidade da população portuguesa a representação proporcionalmente mais justa. Não se vê, portanto, conveniência em deixar isso expresso, pró memória, na Lei Orgânica, pela mesma razão que não é aconselhável dizer se coisa idêntica em relação à representação da metrópole em qualquer texto de direito metropolitano.
Se, em vez de constituir uma directriz para o legislador ordinário, a ter em conta quando se modificar a lei eleitoral, o preceito proposto pretende lembrar ao legislador constitucional a conveniência de alargar, na altura própria, a composição da Assembleia Nacional, a conclusão da Câmara Corporativa não pode ser diferente. Não pode, efectivamente, deixar de se considerar anómalo que, numa lei de hierarquia inferior à da lei constitucional, cuja função é desenvolver e pormenorizar o pensamento do estatuto fundamental, se incorporem disposições cujo destinatário seja justamente o órgão legiferante que tem competência para comandar ou orientar a actuação do legislador ordinário. Esta espécie de proconstituição de um futuro é eventual preceito constitucional não parece ter sentidos útil.
Seja, porém, como for, o facto de a Câmara Corporativa desaconselhar a inclusão na Lei Orgânica de uma tal directriz legislativa não significa que se não deva chamar a atenção do Governo para a conveniência de proceder a inquérito sobre a densidade da população com capacidade eleitoral activa em cada um dos círculos eleitorais do ultramar, ante os critérios por que ela se afere nos termos da legislação eleitoral de aplicação comum à metrópole e às províncias ultramarinas e tendo em conta as reformas legislativas de Setembro de 1961. Com base nessa indagação, o Governo procederá oportunamente, se for caso disso, por forma a dar representação mais adequada às províncias ultramarinas na Assembleia Nacional.

6. O problema da representação do ultramar na Câmara Corporativa tem aspectos diferentes dos respeitantes ao problema da sua representação na Assembleia Nacional.
Esta Casa parlamentar não é nem pode ser chamada a dar o seu parecer sobre a maior parte dos diplomas legislativos e regulamentares aplicáveis nas províncias ultra-

Página 287

22 DE MASCO DE 1963 287

marinas. Escapa, nucessàriamente, à sua competência consultiva toda a actividade legislativa e regulamentar da competência dos órgãos provinciais e escapa-lhe normalmente a actividade legislativa e regulamentai da competência do Ministro do Ultramar. A Câmara Corporativa tem de ser ouvida sobre as propostas de lei do Ministro du Ultramar apresentadas à Assembleia Nacional no âmbito da competência reservada deste órgão em matéria de legislação ultramarina (Constituição, artigo 150.º, n.º 1.º) e, fora desta hipótese, poderá ser ouvida pelo Governo ou mesmo pelo Ministro do Ultramar no âmbito da sua competência legislativa respectiva (n.ºs 2.º e 3.º do citado artigo 150.º) ou da sua actividade regulamentar referida ao ultramar.
Daqui resulta que a participação desta Câmara na actividade de produção normativa é necessariamente muito maior em relação à metrópole do que em relação no ultramar.
Terá sido, antes de mais, a consciência deste facto que terá levado o legislador a não equiparar na Câmara a representação metropolitana e a representação ultramarina.
No mesmo sentido terá concorrido a circunstância de se não considerar praticável o sistema de convocar para participarem sistematicamente nos trabalhos das suas secções e subsecções os representantes das autarquias locais e dos interesses sociais ultramarinos, obrigando-os a frequentes e porventura largos estágios na metrópole, afastados das obrigações das suas actividades e cargos.
O legislador viu-se, assim, conduzido a optar pela solução de fazer representar o ultramar na Câmara Corporativa por um número restrito de Procuradores designados pelo Conselho Corporativo, devendo a escolha deles recair em pessoas de superior competência e com comprovado conhecimento das questões de administração ultramarina. Hoje, esses Procuradores constituem a 5.ª subsecção da secção de Interesses de ordem administrativa (Política e administração ultramarinas).
Esta Câmara reconhece que o sistema actualmente em vigor em matéria de representação do ultramar na sua composição não é satisfatório. Parece-lhe que a orientação a seguir, era tal problema, deverá ser a de dar representação as autarquias locais e aos interesses sociais das províncias ultramarinas nas suas várias secções e subsecções. A presidência da Câmara, no uso das suas atribuições normais, fará a convocação das secções, subsecções e Procuradores que deverão intervir no estudo das propostas e projectos, conforme o âmbito de aplicação dos diplomas em que são destinados a converter-se em a natureza do interesse das matérias a regular.
A forma de dar execução a esta ideia parece dever ser a de o Governo alterar o actual diploma legal sobre a constituição da Câmara Corporativa, definindo, nos termos, convenientes, a composição das várias secções e subsecções, e ficando para os estatutos político-administrativos das províncias a regulamentação da matéria respeitante no processo de designação dos procuradores das respectivas autarquias locais e interesses sociais, de acordo com esse diploma legal.
A Câmara Corporativa entende, pois, que é desde já possível ao legislador ordinário modificar a sua constituição, em termos de dar representação adequada às autarquias locais e aos interesses sociais das províncias ultramarina (e não, como na proposta de lei só diz, as províncias ultramarinas), reservando-se a matéria do processo de designação dos respectivos Procuradores para o estatuto do cada uma delas. De acordo com esta conclusão, sugere uma nova redacção para o projectado preceito.
Simplesmente, pensa-se que o lugar mais próprio para inscrever na Lei Orgânica esta nova norma é, não a base VII, mas a base XIII. Na base VII apenas se enunciam os órgãos centrais da administração ultramarina, quer deliberativos, quer consultivos. Tudo o que se julgou oportuno dispor na Lei Orgânica, em matéria de organização dos colégios consultivos centrais, consta da secção IV do seu capítulo III, de que a base XIII faz parte. Impõe-se seguir, mais uma vez, esta orientação sistemática e proceder também assim com a Câmara Corporativa, a que se refere precisamente a referida base XIII.

7. Quanto à proposta de que na composição do Conselho Ultramarino entrem vogais representantes das províncias ultramarinas, há, antes de mais, que recordar que não seria esta uma inovação na história deste alto corpo consultivo. O sistema já foi, digamos assim, experimentado, primeiro no Conselho Colonial, a partir de 1911, e depois no Conselho Superior das Colónias, no período de 1926 a 1928. Os representantes do ultramar no Conselho eram designados, pela legislação de 1911, por sufrágio indirecto, de base censitária, e passaram, a partir do 1926, a ser eleitos por sufrágio geral e directo.
A experiência não deu grande resultado. O Conselho deixou de ser o que sempre fora, um sereno e objectivo órgão de estudo e de consulta do Governo, uma espécie de Conselho de Estado do Ultramar, para passar a ser uma espécie de parlamento do conjunto do ultramar, paralelo ao parlamento geral da Nação e em parte fazendo duplo emprego com ele. E por isso que esta Câmara põe as suas reservas ao que ora vem proposto e prefere sugerir que se legisle em termos de fazer do Conselho Ultramarino, enquanto órgão consultivo, uma espécie de «câmara corporativa» do ultramar no seu conjunto, para o que será necessário dispor que nele estejam representados os interesses sociais das províncias ultramarinas.
Com estas reservas, a Câmara aconselha a adopção da proposta do Governo. Sugere, porém, que a matéria seja versada na base XIV, e não na base VII, pelas razões atrás invocadas em relação à Câmara Corporativa.

8. A proposta do Governo, juntamente com o Conselho Ultramarino, refere-se também aos órgãos consultivos do âmbito nacional, advogando que nestes haja igualmente a devida representação das províncias.
A ideia do Governo deve ser, não rigorosamente que deva havei, em tais órgãos, representantes aos províncias (o que implicaria haver neles, correspondentemente, representantes da metrópole), mas antes que, na composição que para eles nos respectivos diplomas orgânicos se estabeleça, só deverá atender a um critério de adequada distribuição regional, por forma que aí tenham assento e participação elementos radicados nas várias parcelas do território nacional, conhecedores qualificados dos problemas e interesses particulares das diferentes regiões do País. Sem uma, composição baseada em semelhante critério, dificilmente se pode esperar de tais órgãos que desempenhem devidamente as suas funções consultivas.
Uma directriz destas, endereçada, afinal de contas, ao legislador, será tão naturalmente observada, independentemente da sua explícita consagração, que esta Câmara duvida da necessidade ou da simples utilidade de ela ser estabelecida na Lei Orgânica. Tanto é assim que, ainda recentemente, o legislador criou, na Presidência do Conselho, um órgão consultivo do «âmbito nacional» - a Comissão Consultiva de Política Económica -, o espontaneamente dispôs que na designação dos seus vogais se deverá realizar uma equilibrada representação da actividade económica dos diferentes territórios nacionais (Decreto-Lei n.º 44 652, de 27 de Outubro de 1962, artigo 29.º, § 1.º). A Câmara, no entanto, não vê razões su-

Página 288

288 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

ficientemente fortes para se opor à ideia. Simplesmente, entende que o assunto deve ser tratado, não na base VII, mas sob a forma de uma nova base, que ficaria sendo a última da secção IV do capítulo III, relativa aos órgãos consultivos do Governo.

Base X

9. No que respeita a esta base, pretende o Governo ver nela introduzidas três alterações. Uma, relativa à alínea c) do n.º I, traduz-se em retirar aos conselhos legislativos ou de governo (conforme os casos) a competência consultiva que nessa alínea hoje se lhes atribui no processo de feitura dos estatutos político-administrativos, outra cifra-se na supressão da actual alínea j) do n.º I, em cujos termos cabe hoje ao Ministro do Ultramar, no exercício da sua competência legislativa, a solução das divergências entre os governadores-gerais e os conselhos legislativos, ou entre os governadores de província e os conselho de governo, sobre a oportunidade, conveniência ou legalidade das providências legislativas por esses conselhos aprovadas, a terceira consiste em também se outorgar aos órgãos legislativos das províncias ultramarinas competência para a regulamentação da composição dos quadros privativos ou complementares dos seus serviços públicos e do recrutamento, atribuições, vencimentos, salários e outras formas de remuneração do pessoal desses quadros, hoje atribuída exclusivamente ao Ministro do Ultramar, embora seja susceptível de ser delegada nos órgãos legislativos, a título temporário ou permanente.
A Câmara vai sucessivamente analisar cada uma destas alterações.

10. Segundo o direito vigente, a competência legislativa do Ministro do Ultimara para elaborar o estatuto político-administrativo de cada província ultramarina exerce-se ouvido previamente o seu conselho legislativo ou de governo, conforme os casos. Pretende-se agora que ela seja exercida ouvindo-se previamente o respectivo governador e o Conselho Ultramar mo em sessão plena.
Considerada a nova estrutura que se pretende dar ao Conselho Ultramarino, em que passará a haver representação das províncias ultramarinas, não parece de repudiar. A ideia de ele ter de ser necessariamente ouvido pelo Ministro do Ultramar antes de exercer a sua competência em tal matéria. E compreende-se que o parecer deva sei dado pelo Conselho em sessão plena, que não apenas pela respectiva secção, dada a transcendente importância que revestem os diplomas em causa.
Também parece aconselhável que o governador seja ouvido pelo Ministro do Ultramar sobre o estatuto da respectiva província. Tratando-se naturalmente de pessoa com experiência da administração da província e conhecedor, portanto, dos problemas próprios dela, o seu conselho não pode deixai de ser do maior interesse para o Ministro, no exercício da sua competência em tal matéria.
Não tem, pois, esta Câmara objecções a opor ao que a este respeito vem proposto pelo Governo.

11. Da apreciação que a esta Câmara merecerá a proposta do Governo em matéria de competência dos órgãos legislativos das províncias ultramarinos se depreenderá que não se torna necessária a eliminação da alínea f) do n.º I desta base. Apenas se torna necessário modificá-la.

12. O sistema que o Governo propôs quanto à matei ia hoje regulada pelo n.º II desta base consiste fundamentalmente em conferir uma competência paralela ao Ministro do Ultramar e aos órgãos legislativos provinciais para a
disciplinar legislativamente. A competência do Ministro decorrerá das alíneas d) e g) do n.º I, a competência dos órgãos provinciais fundar-se-á na nova redacção proposta pelo Governo para o n.º II.
Crê-se que o sistema não oferece inconvenientes especiais.

Base XI

13. Faz o Governo um certo número de propostas quanto a base XI, cujo sentido geral é o de se transferirem do Ministro do Ultramar para os governadores das províncias ultramarinas certas competências administrativas. A primeira dessas propostas de alteração refere-se ao n.º I, 5.º, alínea c).
Pelo direito vigente, cabe ao Ministro do Ultramar autorizar as obras, planos de urbanização e planos de fomento custeados por receitas extraordinárias ou pelo excesso das receitas ordinárias previstas para o respectivo ano.
Com a eliminação dessa alínea o Governo não pretende, porém, retirar ao Ministro do Ultramar a competência exclusiva que este ora possui de autorizar tais obras e planos (salva a possibilidade de delegação dela). De outro modo não se compreenderia o que vem proposto com referência à segunda parte do n.º II da base LXI. O alcance da eliminação da alínea em causa parece ser que tais matérias deixarão de pertencer necessariamente ao Ministro para poderem pertencer-lhe em parte e em parte poderem ser atribuídas aos governadores, conforme se dispuser nos estatutos político-administrativos das províncias ultramarinas ou em outras leis (o que se tornaria possível ante o disposto na base XI, n.º I, 11.º).
É natural que a repartição das competências entre o Ministro e os governadores venha a ter por base o valor das obras e dos planos. A ser assim, não tem a Câmara objecção a opor à alteração proposta.
Apenas lembra que será oportuno que nos estatutos político-administrativos ou nas leis que versarem o assunto se consagre a possibilidade de o Ministro delegar os seus poderes em tais matérias, sob pena de se retrogradar em relação ao sistema hoje vigente, num sentido ainda mais centralizador.

14. Modificação particularmente significativa e importante é também a que o Governo sugere com relação ao n.º I, 6.º. Dentro de uma orientação geral descentralizadora, deseja-se agora que, em vez de orientar e fiscalizar a organização e a execução dos orçamentos das províncias ultramarinas, o Ministro do Ultramar passe simplesmente a fiscalizar essa organização e essa execução.
Depois que, reagindo contra uma exagerada autonomia financeira das províncias ultramarinas, que conduziu a toda a sorte de abusos e desregramentos, ainda na memória de muitos, pela sua gravidade, o legislador se decidiu a enveredar pela instituição de um contrôle do Ministro do Ultramar aos actos em que se exprime o exercício dessa autonomia, várias têm sido as modalidades que esse contrôle tem revestido. Os rigores e disciplinas iniciais foram sendo progressivamente atenuados, como se pode ver, por exemplo, no parecer desta Câmara n.º 35/V. No momento actual, consagra-se um sistema, digamos, misto o Ministro do Ultramar substitui-se à província no que respeita ao estabelecimento da previsão de certas receitas e à programação de certas despesas (n.º II da base LVIII) e exerce uma espécie de «tutela directiva» no que respeita às restantes receitas e despesas e de um modo geral em matéria de organização e execução do orçamento (base XI, n.º I, 6.º), por último, exerce uma «tutela inspectiva», fiscalizando a forma como se procede

Página 289

22 DE MARÇO DE 1963 289

na província a essa organização e execução (mesma base XI, n.º I, 6.º).
Deixando agora de lado o problema de saber se o Ministro deve continuar a poder substituir-se aos órgãos provinciais na organização de certos capítulos do orçamento de cada província - que será tratado quando se analisarem as alterações propostas pelo Governo em relação à base LVIII -, consideremos de momento apenas a questão de saber se se pode retirar ao Ministro do Ultramar a sua competência tutelar directiva em matéria de organização e de execução do orçamento de cada província. A este respeito, a Câmara apressa-se a dizer que não vê particulares inconvenientes na supressão dessa competência. E que, apesar da eliminação dela, não se destroem todos os meios de que o Ministro dispõe para garantir a ordem financeira das províncias e, através desta, a realização do interesse geral. O Ministro conserva, na verdade, o poder de anular, revogar, suspender ou reformar as decisões tomadas pelos governos ultramarinos em tal matéria (base XI, n.º III) - e nem outro alcance se compreende que tenha a competência fiscalizadora que o Governo pretende continuar a deixar nas mãos do Ministro do Ultramar, a não ser justamente o de fornecer os pressupostos do exercício dos poderes a que se refere a base XI, n º III, citada.
A Câmara Corporativa não encontra, portanto, motivo sério para não recomendar a aprovação da alteração proposta pelo Governo para a base XI, n.º I, 6.º.

15. Desde que o Governo propõe que passe a competir exclusivamente aos governos das províncias ultramarinas a organização e execução do orçamento, sob contrôle inspectivo do Ministro do Ultramar, desde que, portanto, esses governos passam a ter responsabilidade primordial na gestão financeira das respectivas províncias, seria incoerente conservar ao Ministro a competência que hoje tem, nos termos da base XI, n.º I, 7.º, para autorizar transferências de verbas e aberturas de créditos, sem embargo de já hoje poder fazer delegações dessa competência (base XI, n.º II).
A Câmara sugere, no entanto, que, para proceder às aberturas de crédito e às transferências de verbas, o governador deva ouvir o conselho de governo (paralelamente com o que sugerirá em relação à organização do orçamento).
Não se diga, em contra da proposta, que é perigosa a transferência, sem reservas, desta competência para os governadores, alegando que estes poderão facilmente enveredar por uma política imoderada de realização de despesas sem previsão orçamental e de modificações indesejáveis do plano de administração fixado no orçamento. A administração central conserva nas suas mãos as armas próprias para reprimir abusos ou actuações atrabiliárias em tal domínio, posto que poderá utilizar os poderes que lhe são conferidos pela base XI, n.º III, e, assim, anular, revogar, reformar ou suspender as aberturas de créditos e as transferências de verbas que bem entender.
Parece, entretanto, à Câmara que, estando consagrada, em favor do Ministro do Ultramar, a competência hierárquica ou quase hierárquica de anulação, revogação, reforma e suspensão das decisões não constitutivas de direitos dos governadores das províncias ultramarinas, não se torna necessário inscrevê-la em novo preceito, como se fez na proposta do Governo, com referência especificada às autorizações de transferências de verbas e do aberturas de créditos. Afigura-se-lhe isso desnecessário, uma vez que se não pode contestar a natureza não constitutiva da tais decisões dos governadores. A única coisa necessária é a inscrição de um preceito em que se diga exclusivamente que os governadores deverão comunicar imediatamente ao Ministro do Ultramar as decisões que tomarem nesta matéria, com a respectiva justificação.

16. E óbvia a necessidade de se alterar o actual n.º IV da base XI. Apenas se objecta que não parece adequado falar-se em «Subsecretários de Estado do Ultramar». Melhor será dizer «Subsecretários de Estado do Ministério do Ultramar», ou simplesmente «Subsecretários de Estado», por não poder supor-se que se quer aludir a outros que não os do Ministério do Ultramar.

Base XV

17. A referência aos Subsecretários de Estado como possíveis presidentes da conferência dos governadores ultramarinos é determinada pela actual organização do Ministério do Ultramar e não dá naturalmente origem a qualquer reparo.
Já o mesmo se não pode dizer da outra alteração proposta para o n.º II desta base. Com efeito, à Câmara não parece aconselhável pôr lado a lado, a participarem na conferência em pé de igualdade com os governadores e as demais entidades que nela tomam parte, os secretários provinciais.
A Câmara é de parecer que eles deverão poder ser convocados a participar nos trabalhos da conferência, mas entende que não se lhes deve reconhecer direito de voto O seu papel será apenas de elucidação - e é natural que neste plano a sua contribuição seja particularmente útil.
Uma vez que a Câmara Corporativa se pronunciará adiante pela subsistência do cargo de secretário-geral, sugere que este funcionário possa participar na conferência com o mesmo estatuto que se propõe para os secretários provinciais.

Base XVIII

18. O Governo propõe que as comissões dos governadores das províncias ultramarinas poderão ser prorrogadas por períodos sucessivos de dois anos, e não de quatro anos, como até aqui.
Dão-se para esta alteração, no relatório da proposta de lei, certas razões que são de acertar.
A Câmara limita-se a sugerir uma outra formulação, mais aproximada da ordenação actual desta base. Nestes termos, o n.º II não seria alterado e no n.º IV dir-se-ia que a comissão dos governadores poderá ser renovada por períodos de dois anos em decreto publicado até 30 dias antes de ela terminar.

Base XIX

19. Uma nova redacção para esta base tornar-se-ia realmente necessária se se concordasse com as propostas do Governo quanto à supressão do cargo de secretário-geral e dos conselhos de governo nas províncias de governo-geral. Mas esta Câmara não poderá concordar com estas alterações na administração provincial - e, por isso, não sugere a alteração que o Governo propõe para a base XIX. A base deverá manter a actual redacção.
Aliás, o texto proposto pelo Governo, mesmo quando o seu conteúdo fundamental merecesse aprovação, teria de ser retocado. Nele se consideram, conjunta e indistintamente, a falta de governador e os suas ausências da província, de um lado, e os seus impedimentos temporários e ausências da sede do governo, mas em território da província, por outro, dizendo-se quem o substituirá enquanto o Ministro do Ultramar não designar um encarregado do governo. Ora durante o impedimento temporário do governador ou na sua ausência da sede do

Página 290

290 ACTAS DA CAMARÁ CORPORATIVA N.º 33

governo, mas em território da província, não haverá naturalmente que nomear um encarregado do governo. Seria ainda de ponderar a questão de sabei se, na falta de encarregado do governo, o substituto do governador nas províncias de governo simples deverá ser o chefe de serviços de administração civil ou, quando existisse, o secretário-geral, posto que o Governo deseja ver criada a possibilidade nessas províncias de se instituir tal cargo. Finalmente, não é clara a razão por que na base sob consideração se deixaria de dizer qual a forma especial que deve revestir a designação dos encarregados de governo.

Base XXIII

20. Propõe o Governo, antes de mais, a eliminação do cargo de secretário-geral nas províncias de governo-geral. Justificar-se-á, realmente, que se termine com a existência deste órgão?
Na feição que, por último, veio a assumir, o secretário-geral é um funcionário de carreira, cuja permanência no cargo não é, em princípio, afectada pela sucessão dos governadores Tem competência própria na direcção dos serviços da secretaria-geral e na superintendência e coordenação das direcções de serviços. Além destes poderes próprios, poderá exercer poderes delegados nas províncias de Angola e Moçambique os governadores podem delegai nele as funções respeitantes ao expediente geral ou ao domínio da administração política e civil. Nesta última medida, o secretário-geral, tal como os secretários provinciais, surge-nos, para utilizar terminologia técnica, como um órgão secundário do governo-geral.
Já em 1953, na discussão parlamentar sobre o contra-projecto de proposta de lei que veio a converter-se na actual Lei Orgânica do Ultramar Português, não faltou quem contrariasse a ideia de fazer subsistir o cargo de secretário-geral e se mostrasse favorável à de os governadores-gerais serem coadjuvados apenas por secretários provinciais. Salientou-se, em apoio deste desígnio, que a permanência do secretário-geral em relação à transitoriedade do governador pode gerar nele uma tendência para lhe criar dificuldades, dado que não é da confiança política do governador e o substituirá ou poderá substituir na hipótese da sua exoneração, e que o cargo se não poderia justificar pela continuidade que emprestaria à administração pública da província, visto que o governador-geral só poderá delegar no secretário-geral, em Angola e Moçambique, as funções respeitantes ao expediente geral e ao domínio da administração política e civil, e nunca as restantes, que são em muito maior número.
A tais objecções se respondeu, salientando que não é de presumir a falta de espírito de colaboração do secretário-geral em relação ao governador, havendo, de resto, sempre forma de forçar as pessoas a cumprirem com o seu dever, quando mais não seja substituindo-as por outras, e que u continuidade da administração provincial é efectivamente assegurada pelo secretário-geral, não obstante lhe não poderem ser delegadas todas as funções executivas, na medida em que ele tem necessariamente contacto com todas elas, por lhe caber superintender e coordenar todas as direcções de serviços e por lhe poderem ser, e em regra serem, delegadas as funções respeitantes ao expediente geral do governo provincial.
A Câmara Corporativa considera perfeitamente pertinentes e de todo convincentes estas considerações Sobretudo, não encontra, na proposta do Governo, fórmula que adequadamente substitua a dos secretários-gerais para se garantir a continuidade do governo provincial. Chama mesmo a atenção para que o regime actual das nomeações em comissão de serviço não coloca os secretários-gerais tão fora como isso da confiança dos governadores-gerais (et base XLI, n.º II, da Lei Orgânica do Ultramar Português e artigo 87.º do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino). Nestas condições, a Câmara emite o parecer de que deve persistir, nas províncias de governo-geral, o cargo de secretário-geral.

21. Em Angola e Moçambique pode haver, neste momento, além do secretário-geral, quatro secretários provinciais (base XXIII, n.º II, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 42 515, de 19 de Setembro de 1959). Podem os respectivos governadores-gerais delegar neles as suas funções executivas, exceptuadas as de administração financeira, que só pelos governadores podem ser exercidas, e as respeitantes a administração política e civil e ao expediente geral, que, como vimos, só podem ser delegadas no secretário-geral.
Os secretários provinciais são, segundo-o direito vigente, agentes da confiança do governador-geral, uma vez que, embora nomeados e exonerados pelo Ministro do Ultramar, este só o pode fazer sob proposta daquele.
Uma diferença que se nota entre o sistema actual e o que vem proposto consiste em que o governador-geral passaria a ter, em vez de um máximo de cinco agentes coadjutores (um secretário-geral e quatro secretários provinciais), tantos quantos os que fossem previstos no estatuto político-administrativo da respectiva província.
Não tem a Câmara nada a objectar a esta nova fórmula. À medida que Angola e Moçambique se vão desenvolvendo, a acção governativa é cada vez mais desproporcionada às possibilidades de um único homem, por mais dotado que seja em resistência física, em capacidade intelectual e em preparação técnica. Dia a dia se impõe mais que os governadores-gerais destas províncias se possam rodear de uma equipa ampla de agentes especializados em quem possam delegar o despacho dos vários ramos de serviço. Quantos hão-de ser os secretários provinciais em cada uma dessas províncias? E realmente preferível deixar a resposta a esta pergunta para os estatutos político-administrativos, após a ponderação do caso particular de cada uma das províncias de governo-geral por parte das entidades que têm a este respeito que dizei a última palavra, o Ministro do Ultramar, o Conselho Ultramarino e os governadores-gerais interessados.
Segundo a Lei Orgânica, na sua versão em vigor, é inteiramente claro o que os secretários provinciais exercem as suas funções com base numa delegação de poderes que em seu favor é feita pelo governador-geral.
E de admitir que a proposta governamental não tenha querido afastar-se deste sistema, dado designadamente o texto do n.º II da base sob consideração na redacção sugerida pelo Governo. Parece, na verdade, que, ao contraporem-se aí as funções executivas exercidas directamente pelo governador às exercidas sob a responsabilidade dele por intermédio dos secretários provinciais, no fundo se terá querido justamente dizer que estes últimos exercem funções do governador, que este neles delegue. Os secretários provinciais seriam, portanto, agentes em quem o governador delega parte dos seus poderes executivos.
Se este é o pensamento da proposta, há então que dar-lhe uma expressão mais adequada, de modo a não ficarem dúvidas sobre o estatuto com base no qual os secretários provinciais exercem a sua competência.
Para isso, não só é necessário dizei-se francamente que o título da competência dos secretários provinciais é a delegação do governador-geral, como se requer também definir o regime da delegação, em termos de ela ser uma autêntica delegação de poderes e não, como diria Hauriou (Precis de Droit Administratif, 11.ª edição, p 47), uma

Página 291

22 DE MARÇO DE 1963 291

«delegação de poder público», ou seja uma transferência definitiva de funções dos governadores para os secretários provinciais, feita na Lei Orgânica e, com base nela, nos estatutos político-administrativos (o que, aliás, contrariaria o artigo 155.º da Constituição).
Segundo o texto em vigor da base XXIII, a delegação é bem uma delegação de poderes, feita pelo governador. Na redacção proposta pelo Governo a delegação não será rigorosamente feita pelo governador, uma vez que as atribuições dos secretários provinciais seriam fixadas pelo estatuto político-administrativo de cada província, isto é, por um diploma legal (da competência do Ministro do Ultramar). A delegação seria assim feita não pelo governador, mas por uma lei de que ele não seria o autor.
Uma tal solução afectaria a autoridade do governador, na medida em que este viria, assim, a encontrar-se perante um colégio de secretários provinciais que exerceria um poder rigorosamente seu, porque lhe fora atribuído pela lei. É certo que, na hipótese de discordância com a orientação de qualquer deles, o governador poderia propor superiormente a sua exoneração - mas esta poderia tardar ou não ser mesmo concedida, em consequência de o Ministro não se mostrar sensível às queixas que lhe fossem dirigidas. A posição do governador sairia inconvenientemente diminuída se a delegação de poderes não fosse feita por ele próprio.
Certamente que não foi este o intuito da proposta governamental. Assim, para corresponder aos que não deixarão de ter sido os desígnios do Governo, entende a Câmara que a redacção da base deve ser alterada.

22. Na proposta diz-se que a organização, as atribuições e as denominações dos secretários provinciais serão definidas no estatuto político-administrativo de cada província, cabendo a cada secretário provincial normalmente a gestão de um conjunto de serviços, que constituirá uma secretaria provincial.
Consideradas as reflexões atrás formuladas, a Câmara entende que deverá ser das atribuições legislativas, reservadas ou privativas do governador-geral dispor sobre tais pontos. Noutras palavras o governador-geral ou cada governador-geral editará, em diploma legislativo da sua competência exclusiva, as normas respeitantes a estes pontos - podendo, evidentemente, essas normas por ele ser revogadas ou modificadas em qualquer momento. Pode, entretanto, consignar-se na Lei Orgânica que as delegações se devam fazer em relação a conjuntos de serviços que constituirão secretárias provinciais.

23. No modo de ver da Câmara, a lógica estrita imporia que as funções dos secretários, provinciais cessassem com o termo da comissão ou a exoneração dos governadores que houvessem proposto a sua nomeação. Tal decorre do facto de eles não terem funções próprias, antes simplesmente delegadas, bem como de eles serem e deverem continuar a ser agentes da exclusiva confiança política do governador-geral. Simplesmente, também se reconhece que uma tal solução teria inconvenientes de certa gravidade a saída do governador provocaria um vácuo governativo intolerável, por um período que pode não ser de dias apenas, prolongando-se por semanas ou meses. Os secretários provinciais podem «solidarizar-se» com o governador que sai ou, de qualquer modo, não desejar servir com outra pessoa - e o recrutamento de uma nova equipa pode não se fazer de uma hora para a outra.
Salvando os princípios e atendendo a estas considerações, a Câmara sugere que na lei se consigne que os secretários provinciais em funções à data do termo da comissão ou da exoneração do governador-geral se presumem da confiança do seu substituto, mantendo-se no exercício delas até à data da posse do novo governador-geral, salvo se entretanto forem exonerados.

24. A Câmara entende, por outro lado, que a directriz proposta para ser observada na escolha dos secretários provinciais deve ser omitida. Ela reflecte, com efeito, um preconceito contra aqueles que possuem, em matéria de administração em geral e de administração ultramarina em especial, uma formação exclusivamente científica e um manifesto o exagerado apreço por aqueles cuja formação é de ordem predominantemente prática, adquirida ao contacto com a experiência e com os realidades.
Melhor parece deixar liberdade de opção entre todos aqueles que, a qualquer título, se mostrarem particularmente aptos para o exercício de funções governativas, de colaboração com os governadores-gerais.

25. - Está-se de acordo em que se inclua na base XXIII um número correspondente ao n.º VI proposto pelo Governo. Se não é legítimo duvidar-se de que os actos praticados por delegação pelos secretários-gerais e provinciais são contenciosamente impugnáveis, já poderia discutir-se se o privilégio de foro que na base XX se estabelece em favor dos governadores e encarregados do governo se aplicaria também àqueles.
Como resulta das sugestões feitas pela Câmara sobre a subsistência dos secretários-gerais, esse novo número deve abranger não só os secretários provinciais mas também esses secretários-gerais.

26. A Câmara Corporativa, tendo em conta as observações antecedentes, entende conveniente sugerir para a base em exame uma redacção diferente da proposta pelo Governo, que se incluirá nas conclusões do presente parecer.

Base XXIV

27. Como se mostrou no parecer desta Câmara n.º 35/V, sobre o projecto de proposta de lei n.º 517, o texto actual da Constituição consagra uma fórmula de repartição da competência legislativa para o ultramar segundo a qual os governadores das províncias ultramarinas têm funções legislativas nas matérias que interessem exclusivamente à respectiva província e não sejam da competência dos órgãos legislativos metropolitanos ou centrais. Simplesmente, essa competência deverão os governadores exercê-la de colaboração, em princípio, com um conselho em que haverá representação adequada às condições do meio social (Constituição, artigo 152.º).
Não nos esclarece este texto constitucional sobre qual a natureza da intervenção que o referido conselho há-de ter no exercício das funções legislativas do governador. Como se mostrou no citado parecer, o legislador constitucional deixou, muito de caso pensado, ao legislador ordinário duas vias a este respeito uma seria a de institua, em cada província, apenas um órgão legislativo, que seria então necessariamente o governador, exercendo este a sua competência mediante prévia consulta de um conselho, constituído em obediência aos mencionados requisitos, cujos votos ou pareceres não seriam para ele vinculantes, outra seria a de o legislador ordinário instituir, ao lado do governador, um outro órgão legislativo (possibilidade facultada pelo artigo 151.º), que seria justamente tal conselho, por forma que os actos legislativos provinciais acabariam por ser, normalmente, a união de duas actividades paralelas e homogéneas, realizadas por dois órgãos diversos, com o mesmo fim imediato a produção de determinadas normas jurídicas.

Página 292

292 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

Pois muito bem verifica-se que a Lei Orgânica vigente utilizou apenas a segunda solução. Assim.
Nas províncias de governo-geral há um conselho legislativo, constituído com respeito pelos requisitos do artigo 152.º da Constituição, que colabora com o governador no exercício das funções legislativos. Se este conselho estiver reunido ordinária ou extraordinàriamente, a legislação provincial é, em princípio, o resultado da colaboração de duas vontades paralelas - a do governador e a desse conselho. Havendo divergência entre um e outro, o governador não é obrigado a converter em lei a vontade do conselho. A decisão será então tomada pelo superior hierárquico ou quase hierárquico do governador o Ministro do Ultramar. No intervalo das sessões ordinárias do conselho legislativo, e não estando este reunido em sessão extraordinária, poderá o governador publicar diplomas legislativos, ouvido outro conselho, designado conselho de governo.
Nas províncias de governo simples a Lei Orgânica estabeleceu, a este respeito, um regime paralelo ao das províncias de governo-geral, tomando aqui o conselho de governo o lugar do conselho legislativo e a secção permanente o lugar do conselho de governo.
Em suma, no sistema da Lei Orgânica o conselho legislativo não pode impor, em caso nenhum, a sua vontade à do governador. As duas vontades, a do governador e a do conselho legislativo, têm, em princípio, valor jurídico igual. Excepcionalmente, a vontade do governador pode sobrepor-se à do conselho legislativo, evitando que as suas resoluções se convertam em lei.

28. A proposta, quanto a esta base, orienta-se num sentido que comporta, se não real, pelo menos potencialmente, certos perigos para a unidade política do Estado Português, consagrada explicitamente no artigo 5.º da Constituição, na medida em que admite que certas resoluções de uma assembleia política própria de uma parcela do território nacional se podem impor, ao cabo de um certo processo, ao órgão que no território representa o Governo da Nação.
É certo que as hipóteses em que tal poderá acontecer serão raras e que não ficam prejudicados os meios a que, como ultima ratio, é possível recorrer para repor as coisas no seu devido pé, restabelecendo-se o primado da autoridade do Poder Central representativo da unidade política nacional (base X, n.º III).
De toda a maneira, não parece à Câmara que deva transigir-se, por pouco que seja e mesmo que a alteração tenha, no final de contas, um alcance de momento apenas formal, com um princípio que de algum modo sacrifique outro, básico e para nós sagrado, que é o princípio da unidade política do Estado Português.
A Câmara não duvida um momento de que esteve fora das intenções da proposta pactuar, no mínimo, com uma orientação contraposta a uma norma fundamental como é a da unidade do Estado. E, aliás, nessa convicção que chama a atenção para a conveniência de se redigir esta base em termos de não transparecer nenhum compromisso, mesmo só formal, com uma solução que possa representar a menor quebra daquela norma fundamental.
E curioso notar-se que os textos legislativos votados pelos «conselhos regionais» das Regiões italianas, na medida em que sejam reputados, pelo respectivo comissário do governo central, ofensivos do interesse nacional ou do interesse da legião, podem ser reapreciados por um órgão central do Estado, no caso particular pelo Parlamento de Roma, valendo em último termo o voto deste órgão, e não o do órgão legislativo da região.
Em relação ao seu ultramar, Portugal está, no parecer desta Câmara, um pouco como a Itália em relação às várias comunidades repartidas pela península italiana, com características étnicas, culturais e económicas amplamente diferenciadas umas em relação às outras. Também nós reconhecemos utilidade e justiça em reservar as províncias ultramarinas uma espécie de autonomia regional, compatível com o carácter unitário e indivisível do Estado Português - autonomia que compreende, além do mais, um certo poder legislativo, destinado especialmente a permitir o realização do interesse provincial ou regional, a prossecução dos fins da comunidade provincial ou regional. Ora a indivisibilidade e unidade do Estado Português, como as do Estado Italiano, não seriam preservadas se não se reservasse em último termo, a órgãos políticos centrais a competência para definirem o interesse nacional e, inclusive, o interesse provincial ou regional. A indivisibilidade e a unidade são compatíveis com a descentralização legislativa em sentido estrito, mas já não são compatíveis com a independência legislativa, ainda que confinada a interesses locais.

29. A Câmara Corporativa, por outro lado, entende que é de pôr o problema de saber se é compatível com a Constituição a proposta do Governo no ponto em que consagra a solução de serem entregues à arbitragem do Conselho Ultramarino, reunido em sessão plena, as divergências que se suscitem entre o governador e o conselho legislativo acerca da legalidade ou da constitucionalidade dos textos votados por este órgão e de o governador dever conformar-se com a decisão dele. Poderá sustentar-se que, se o governador fica estritamente obrigado a dar expressão legislativa formal à resolução do Conselho Ultramarino, o que no fundo sucede é serem conjuntamente legisladores em tais casos o conselho legislativo da província e o Conselho Ultramarino. Ora a Constituição - dir-se-á - não consente que outros órgãos metropolitanos, além dos indicados no seu artigo 150.º, possam exercer funções legislativas em relação ao ultramar. Em todo o caso, a Câmara inclina-se para que a intervenção do Conselho Ultramarino, numa hipótese destas, não é, afinal de contas, uma intervenção de que resulte a criação de normas jurídicas não é, noutras palavras, uma intervenção que redunde numa actividade materialmente legislativa. Traduzir-se-á antes numa decisão de índole jurisdicional de uma controvérsia entre dois órgãos com relevância constitucional. Estamos aqui, por assim dizer, perante uma forma de justiça constitucional, que bem pode ser consagrada por lei ordinária, paralelamente, aliás, com o que sucede quando nesta Lei Orgânica se atribui ao Conselho Ultramarino competência para apreciar a inconstitucionalidade orgânica ou formal de certos diplomas de direito ultramarino.

30. Depois do que se acaba de expor, não se vê melhor solução do que recomendar uma redacção nova para a base em apreciação, em que se combinariam elementos da redacção actual e da redacção proposta pelo Governo, por forma a satisfazer, em toda a medida compatível com a Constituição, e portanto com as exigências da unidade política da Nação, a conveniência de descentralizar a função legislativa em órgãos representativos das províncias ultramarinas.
Nesta ordem de ideias, não haveria que alterar os n.ºs I e II da base XXIV na sua actual redacção. No n.º III dir-se-ia que o governador-geral mandará publicar as disposições votadas pelo conselho legislativo, para que sejam cumpridas, sob a forma de diploma legislativo, dentro dos quinze dias seguintes àquele em que o projecto votado estiver pronto para a sua assinatura. No n.º IV estabelecer-

Página 293

22 DE MARÇO DE 1963 293

-se-ia que no caso de o governador-geral considerar inconstitucionais ou ilegais as disposições votadas, enviá-las-á ao conselho para nova apreciação. Se este as aprovar por maioria de dois terços do número legal dos seus vogais, será o projecto de diploma enviado ao Conselho Ultramarino, que decidirá, em sessão plena, devendo o governador conformar-se com o que este resolver. No n.º V dispor-se-ia que o governador-geral, tratando-se de diploma da sua iniciativa, poderá não o publicar, informando o conselho de que passou a não considerar oportuna a sua publicação. Tratando-se de diploma de iniciativa de vogais do conselho, o governador-geral, se considerar as disposições votadas contrárias ao interesse nacional ou ao interesse da província, submeterá logo o assunto a resolução do Ministro do Ultramar ou solicitará que as disposições votadas sejam objecto de nova resolução do conselho. No primeiro caso, o Ministro, ouvido, nos termos gerais, o Conselho Ultramarino, poderá determinar que o governador-geral publique, total ou parcialmente, as disposições votadas pelo conselho legislativo, ou legislar sobre o assunto nos termos que entender mais convenientes No segundo caso, se as disposições forem aprovadas por maioria de dois terços do número legal dos vogais, o governador mandá-las-á publicar. Finalmente, no n.º VI dispor-se-ia que no intervalo das sessões ordinárias do conselho legislativo, não estando este reunido em sessão extraordinária, quando haja sido dissolvido e nos casos em que a lei lhe atribua competência reservada, poderá o governador-geral publicar diplomas legislativos, ouvido o conselho de governo.
De passagem, não quer a Câmara deixar do esclarecer que interpreta a base em apreciação, na sua redacção actual, como proibindo ao governador legislar, durante as sessões legislativos ou estando o conselho legislativo reunido extraordinàriamente, sem qualquer limitação. E só no intervalo das sessões legislativas, ou não estando o conselho legislativo reunido em sessão extraordinária, que o governador pode, segundo o direito vigente, publicar diplomas legislativos, ouvindo o conselho de governo.
Por outro lado, será de boa prática, para obedecer ao espírito do preceito constitucional (o qual, de um modo geral, confere ao governador funções legislativas, a exercer em regra conforme o voto de um conselho em que haja representação adequada às condições do meio social), que o governador convoque o conselho legislativo para reunir extraordinariamente com a frequência necessária para que se não possa dizer que o governador legisla em regra sem o voto conforme desse conselho.
Finalmente, a Câmara acentua desde já que não está de acordo com a instituição, ao lado do conselho legislativo, de um conselho económico e social, pelo que, no n.º VI da base XXIV, com a redacção que sugere, continua a haver lugar para se falar da audição do conselho de governo.

Base XXV

31. Foi esta Câmara de opinião, no seu parecer n.º 35/V, que não é aconselhável a criação de duas assembleias - corporativa uma, de representação territorial-individualista a outra. E não é recomendável - acrescenta-se agora - porque, impondo o artigo 152.º da Constituição que haja no conselho de harmonia com cujo voto o governador normalmente legisla «representação adequada às condições do meio social», torna-se imperioso que esse conselho tenha uma composição mista, de representantes das autarquias locais e dos interesses sociais nas suas várias modalidades e de representantes dos círculos eleitorais, isto é, de todos os elementos estruturais da Nação no âmbito de cada província. A não ser que se tenha concebido o proposto conselho económico e social com uma parcial duplicação do conselho legislativo, o que não é legítimo supor-se, temos de conclua que o Governo pensou numa representação territorial-individualista para este conselho, a qual, portanto, não corresponde a ideia que dele fez no artigo 152.º o legislador constitucional.

32. A assembleia em questão deve, pois, ter natureza electiva, mista de representação orgânica e de representação territorial. Foi já nesse sentido, aliás, a proposta do Governo em 1952 (projecto de proposta de lei n º 517, corroborada pelo parecer da Câmara Corporativa n.º 85/V. Deverá, pois, acabar-se com as categorias dos vogais natos e dos vogais nomeados para o conselho legislativo. Não se torna necessário justificar a supressão dos vogais nomeados. Quanto à dos vogais natos, explica-se ela, que mais não seja, porque a Câmara Corporativa (que, como já se deixou incidentalmente dito, não tenciona propor o desaparecimento dos conselhos de governo nas províncias de governo-geral) é de opinião que os vogais do conselho de governo possam assistir às sessões do conselho legislativo e tomar parte nas respectivas discussões, nos termos de direito hoje em vigor.

33. A Câmara entende, depois do que acaba de expor, que a base em discussão deve manter o actual n.º I. No n.º II dir-se-ia que o conselho legislativo é uma assembleia de representação adequada às condições do meio social da província, constituído por vogais eleitos quadrienalmente entre cidadãos portugueses que reunam os requisitos de elegibilidade indicados na lei. No n.º III consignar-se-ia que o estatuto de cada uma das províncias de governo-geral fixará o número de vogais do seu conselho legislativo e regulará a eleição, de modo a garantir adequada representação aos colégios de eleitores dos círculos em que o território da província for dividido, às autarquias locais e aos interesses sociais da província, nos seus ramos fundamentais.
Concorda a Câmara Corporativa com que se reserve para o estatuto político-administrativo de cada uma das províncias de governo-geral a fixação do número de vogais do respectivo conselho legislativo. Quanto ao mais a que se refere o n.º II da base XXV, na redacção proposta pelo Governo, aludir-se-á na apreciação que vai sucessivamente fazer-se da base XXVI.

Base XXVI

34. Na vigente base XXVI o legislador dispôs sobre o local das reuniões do conselho legislativo, sobre a presidência desse órgão, sobre alguns dos poderes desta, sobre a iniciativa legislativa e sobre a participação nas reuniões desse conselho dos vogais do conselho de governo, devolvendo quanto às demais regras sobre o funcionamento do conselho legislativo para o que a este respeito se dispuser no estatuto político-administrativo da respectiva província.
Não diz a proposta a quem, de futuro, caberá a presidência do conselho legislativo, quando actualmente se diz que ela cube ao governador-geral ou a quem suas vezes fizer.
A Câmara entende que não é aceitável omitir-se na Lei Orgânica uma disposição sobre este ponto, dada a sua particular importância.
Reputa-se conveniente que ao governador-geral, ou a quem legalmente o substitua, continue a pertencer a presidência do conselho legislativo. Simplesmente, não deve criar-se-lhe, ou antes, manter-se-lhe, o encargo de estar sempre presente às suas, reuniões e trabalhos. Deverá

Página 294

294 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

admitir-se, portanto, que ele possa ser substituído. Já hoje, é certo, essa possibilidade está consagrada na lei (n º I da base XXVI). A Câmara, em todo o caso, entende que deve atribuir-se ao próprio conselho a designação deste substituto. Assim, deverá dispor-se que o conselho elegerá entro os seus membros um vice-presidente.
A Câmara entende, porém, que, em qualquer caso, ao secretário-geral e aos secretários provinciais por incumbência do governador deve ser facultado comparecerem no conselho para aí sustentarem as propostas, do governo-geral ou para fazerem as comunicações e darem os esclarecimentos que entenderem, em matéria de política e administração da província.
Por outro lado, a Câmara concorda com que se inscreva na Lei Orgânica e precisamente na base XXVI um preceito sobre a duração das sessões ordinárias do conselho legislativo. A proposta é no sentido de que sejam duas essas sessões, com duração anual não superior a três meses. Entende, no entanto, a Câmara que se deve dispor que o governador-geral, quando o julgar conveniente, pode prorrogar até um mês o funcionamento efectivo do conselho. Aliás, coisa semelhante se encontra já estabelecida nos estatutos político-administrativos.
Como já houve ocasião de salientar, somando-se os intervalos das sessões legislativas em, no mínimo, oito meses em cada ano, só poderá dar-se leal cumprimento ao disposto no artigo 152.º da Constituição se os governadores-gerais convocarem extraordinariamente os conselhos legislativos com razoável frequência. Os estatutos político-administrativos deverão disciplinar esta matéria convenientemente, e para eles a este respeito deverá justamente devolver a presente base.
Em matéria de iniciativa legislativa, a solução da proposta tem conteúdo idêntico ao do actual n.º III da base XXVI, nada havendo a objectar-lhe.
Como já se disse noutro lugar deste parecer, a Câmara entende que deve subsistir o n.º IV desta base.
Finalmente, concorda a Câmara com que se reserve para o estatuto político-administrativo de cada província a generalidade das disposições sobre o funcionamento do respectivo conselho legislativo. Entre elas se contarão, naturalmente, diga-se de passagem, as respeitantes à constituição de comissões para o estudo das propostas apresentadas ao conselho.
Considerando o que se acaba de expor, haverá que propor uma outra redacção para esta base. Dela, deve dizer-se, não constará um preceito como o do n.º II da redacção do Governo, uma vez que será incluído na base XXIV, conforme a redacção proposta pela Câmara.

Base XXVIII

35. O conselho económico e social, cuja criação nesta proposta se prevê, não pode, dada a sua composição, considerar-se como satisfazendo aos requisitos enunciados no artigo 132.º da Constituição. Basta atentar em que nele, em matéria de representação, só a haverá das actividades económicas, não se prevendo representação pròpriamente dita das autarquias locais, nem dos interesses sociais, nem, finalmente, dos cidadãos eleitores. As funções que na proposta só lhe atribuem, para serem exercidas durante o processo de formação da vontade legislativa, realizá-las-á o próprio conselho legislativo, desde que se consagre a composição mista, de representação meio orgânica meio territorial, que esta Câmara entende dever dar-se-lhe. Nada impedirá, então, que, em comissões especializadas, de que façam parte os representantes das autarquias e dos interesses sociais da província, se faça um estudo preliminar das propostas apresentadas ao conselho, exactamente com a mesma feição daquele a que essas propostas seriam sujeitas na referida «segunda câmara» ou «câmara de reflexão».
De qualquer modo, não se percebe bem porque é que na proposta se distingue entre as actividades económicas da província e os demais interesses sociais (administrativos, morais, culturais e sociais), prevendo-se que as primeiras tenham no conselho os seus representantes, enquanto as outras os não terão. Segundo parece, as pessoas especialmente versadas nos problemas administrativos, morais, culturais e sociais da província, a que a proposta se refere, participariam no conselho a título pessoal e não como representantes dos interesses sociais da província, uma vez que, na proposta, elas surgem contrapostas aos representantes das actividades económicas.
A Câmara Corporativa pronuncia-se pela subsistência da actual base XXVIII, entendendo que se devem manter nas províncias de governo-geral os conselhos de governo, como órgãos utilíssimos que são para assistirem aos governadores no desempenho dos suas funções executivas.
Põe-se, no entanto, a questão de saber se não deverá remodelar-se a composição destes conselhos, eliminando os dois vogais nomeados e pondo no lugar deles representantes das autarquias locais e dos interesses sociais da província nos seus ramos fundamentais de ordem administrativa, moral, cultural e económica, um por cada ramo.
Seria esta uma forma adequada de levar até ao governo-geral, para este a ter em conta no exercício das suas atribuições executivas, a voz dos interesses da província, na sua autenticidade. Essa voz confrontar-se-ia, no conselho, com a experiência administrativa que naturalmente reside nos outros vogais, ou seja, nos vogais natos - e chegaria ao governador convincente, ponderada e moderada.
Crê a Câmara Corporativa que esta fórmula é superior à que vem proposta pelo Governo, a qual faz do seu conselho económico e social um órgão com funções não só legislativas como também consultivas no plano administrativo. Demonstrada a impossibilidade de atribuir supremacia ao conselho legislativo sobre o governador e de o conselho económico e social desempenhar as funções que o artigo 152.º da Constituição prevê, provada, portanto, assim, a necessidade de o condenar como «segunda câmara» legislativa, não deverá haver empenho nem conveniência em, apesar de tudo, o fazer tomar o lugar do actual conselho de governo.
A Câmara vai mesmo mais longe, pois crê que a solução que apresenta constitui uma feliz fórmula de transacção entre a estrutura actual dos conselhos do governo, que os reduz à categoria de órgãos consultivos estritamente burocráticos, e a concepção que já fez deles, em certa altura, corpos administrativos, de feição só ou predominantemente representativa e deliberativa. Esta solução, «a meio caminho» entre aquelas duas, seria um passo significativo e razoável no sentido da descentralização provincial, que se julga poder ser dado sem inconvenientes.

Base XXIX

36. Na lógica dos reparos feitos e das sugestões formuladas em relação à base anterior, a Câmara Corporativa propõe a conservação da base XXIX com a sua actual redacção, salvo no que toca a substituição, aí prevista, dos vogais nomeados, posto que estes, como se viu, deverão ser suprimidos.

Página 295

22 DE MARÇO DE 1963 295

Base XXX

37. Pelas mesmas razões expressas com referência à base antecedente, esta Câmara pronuncia-se pela sobrevivência da base XXX, tal como hoje se encontra redigida.
Deve salientar-se, entretanto, que a inclusão de uma alínea com a redacção da alínea b) do n.º II da proposta não poderá verificar-se, pois tal preceito foi justificadamente eliminado do texto actual da base XXX pela Lei n.º 2076, de 25 de Maio de 1955.

Base XXXI

38. A Câmara está ao corrente de necessidades que justificam a solução de se prever a possibilidade de criação de um lugar de secretário-geral nas províncias de governo simples. O governador deve poder ser aliviado das obrigações do despacho de todos os assuntos, deve poder dedicar-se ao estudo dos grandes problemas da província e deve poder contactar intensamente com os populações, para auscultar as suas aspirações e ouvir a sua voz. É certo que já está habilitado, pelo direito vigente, a delegar nos cheios de serviços a solução dos negócios administrativos que por eles devam ser tratados. Mas não pode qualquer destes desempenhar as funções de coordenação e de representação que, pelo menos em certas províncias, se torna conveniente serem desempenhadas por uma «segunda figura».
Desde que se previu, quanto aos governadores-gerais, que estes não poderão delegar as suas atribuições financeiras, deve seguir-se, em relação aos governadores das províncias de governo simples, a mesma orientação - razão por que se concorda com o que o Governo propõe neste ponto.
Por último, há a observar que se não impõe a alteração sistemática proposta pelo Governo, que consiste um transferir a matéria do actual n.º III desta base para uma base nova, que seria a base XXXIV

Base XXXII

39. A Câmara Corporativa concorda com a instituição de conselhos legislativos nas províncias de governo simples.
Se bem se interpreta o pensamento da proposta, os conselhos em causa teriam uma composição mista de vogais eleitos e de vogais oficiais natos.
Nada se diz, porém, sobre a constituição da parte electiva dos conselhos. No modo de ver da Câmara, hão-de observar-se aqui, integralmente, as directrizes sugeridas com referência à designação dos vogais, dos conselhos legislativos, das províncias, do governo-geral (base XXV), devendo, portanto, neles ter representação as autarquias locais, os diferentes interesses sociais e os eleitores da província.
Deixa, assim, de justificar-se que haja, nos conselhos em questão, vogais nomeados. Pelo direito vigente, os vogais nomeados destinam-se a dar «representação» aos organismos e sectores da população nacional de considerável importância na economia e na vida pública da província, quo não tiverem voto nos colégios eleitorais. Quanto a tais organismos, na fórmula proposta pela Câmara, passariam a ser representados por vogais eleitos. Fica de parte apenas a representação da comunidade chinesa em Macau. A Câmara inclina-se para que se continue a usar a fórmula da alínea c) do n º III da actual base XXXII, ficando assim reservado para o estatuto político-administrativo dessa província prescrever sobre o sistema de designação dessa representação.
Entende a Câmara, por outro lado, que nos conselhos legislativos das províncias de governo simples hão-de poder figurar vogais natos. As condições do desenvolvimento social e o meio humano de cada uma destas províncias são diferentes - e porventura em alguma ou algumas delas não só poderão facilmente constituir assembleias de natureza integralmente electiva, em termos de caber esperar-se delas um rendimento aceitável e uma actuação plenamente responsável. É certo que às suas reuniões deverão poder assistir e deverão poder tomar parte nas respectivas discussões os vogais do outro conselho da província, que virá a chamar-se conselho de governo, do qual farão parte os vogais natos que, de acordo com a proposta, entrariam a fazer parte do conselho legislativo. Simplesmente, nesta qualidade, esses vogais não terão direito de voto - e é isso que em alguns casos se pode tornar inconveniente.
Ficará, assim, para os estatutos político-administrativos estatuir sobre se na respectiva província hão-de ou não fazer parte do conselho legislativo vogais natos.
De acordo com o exposto, terá de remodelar-se a redacção proposta pelo Governo para a base XXXII.

Base XXXIII

40. A Câmara Corporativa é de parecer que nesta base se diga simplesmente que é aplicável ao conselho legislativo das províncias de governo simples o disposto na base XXVI.

Base XXXIV

41. A devolução que na redacção proposta pelo Governo se fez para a base XXIV é feita na contraproposta desta Câmara pela base XXXI, e a que nessa redacção se faz para a base XXVI é, por sua vez, na contraproposta da Câmara, feita na base XXXIII.
Como conteúdo adequado para esta base XXXIV elege a Câmara Corporativa uma devolução paia a base XXVII, cuja aplicação aos vogais dos conselhos legislativos das províncias de governo simples e n estes mesmos conselhos se toma indispensável ante as funções que estes órgãos desempenham.

Base XXXV

42. Esta Câmara concorda com a instituição de um segundo conselho, em cada uma das províncias de governo simples, que tome o lugar da actual «secção permanente do conselho de governo».
Parece-lhe igualmente muita bem que do conselho de governo fiquem a fazer parte o secretário-geral, quando o haja, o delegado do procurador da República da comarca da capital da província e o chefe da repartição provincial dos serviços de Fazenda e contabilidade, como vogais natos. Em vez do secretário-geral, quando o não houver, deverá fazer parte desse conselho o chefe dos serviços de administração civil. Apenas se sugere que do conselho façam parte os elementos militares que os estatutos político-administrativos indicarem, a título de vogais natos. A presença destes elementos no conselho é indispensável, quer para elucidarem os outras vogais dos aspectos militares a ter em conta na administração da província, quer para eles próprios terem em conta, na sua actuação, os exigências da administração civil, com que no conselho se familiarizarão.
Para que o conselho de governo não fique tendo uma composição exclusivamente burocrática, propõe o Governo que nele entrem, três vogais eleitos pelo conselho legislativo. Esta Câmara sugere uma fórmula diferente, para dar carácter representativo ao conselho de governo, nele

Página 296

296 ACTAS DA CÍMARA CORPORATIVA N.º 36

participariam representantes das autarquias locais e dos interesses sociais das províncias, cujo mandato seria de dois anos - por simetria com o que sugere para os conselhos de governo das províncias de governo-geral.
Nada deverá obstar a que os vogais eleitos, membros do conselho de governo, sejam eventualmente membros eleitos do conselho legislativo, pois não se vê por que se haverá de consignar esta incompatibilidade, designadamente sabendo-se que será restrito o campo de recrutamento dos representantes a estes dois conselhos.
A diferença de duração do mandato, num e noutro caso, resulta de que, sendo a participação no conselho de governo, dada a sua permanência, mais onerosa para os seus membros, não é justo obrigá-los a permanecer em funções por um período de quatro anos.

43. Diz-se na proposta, em referência às atribuições dos conselhos de governo, que lhes competirá assistir aos governadores no exercício da função legislativa e emitir parecer nos casos previstos na lei e em todos os assuntos relativos ao governo e administração das províncias que lhes forem apresentados pelos governadores. Desde que, porém, na base XXXI, na redacção sugerida pela Câmara, se remete para a base XXXIV e portanto também para o seu n.º VI, não haverá necessidade de se dizer, nesta base XXXV, que o conselho de governo assistirá ao governador no exercício da função legislativa. Também isso se não dirá na base XXVIII, a respeito dos conselhos de governo das províncias de governo-geral - e, todavia, por força do mencionado n.º VI da base XXIV, esses conselhos assistirão ao governador-geral no exercício da função legislativa, no intervalo das sessões ordinárias do conselho legislativo, não estando este reunido em sessão extraordinária ou tendo ele sido dissolvido. Julga a Câmara que as coisas deverão decorrer nos mesmos termos nas províncias de governo simples.
Em matéria de atribuições consultivas no plano administrativo, entende a Câmara Corporativa que a formulação mais adequada para as definir é aquela nos termos da qual lhe competirá o desempenho das funções consultivas enunciadas na base XXX, com referência ao conselho de governo das províncias de governo-geral.

44. Na proposta remete-se inteiramente para os estatutos político-administrativos das províncias em matéria de regras de funcionamento dos conselhos de governo. A Câmara aprova a ideia.

Base XXXVI

45. A proposta do Governo não pretende introduzir nesta base uma directriz nova, em matéria de serviços públicos nacionais, quer dizer, de serviços públicos de administração provincial integrados na organização geral da administração de todo o território português.
Mantém-se o princípio de que por via de regra os serviços públicos ultramarinos constituem organizações próprias de cada província, directamente subordinados ao governador, e, por intermédio deste, ao Ministro do Ultramar - princípio que se encontra inscrito no n.º I desta base. Mas acrescenta-se isto, que não constava dela os serviços nacionais serão os «necessários para a boa gestão dos interesses comuns de todo o território do Estado Português». Vejamos se esta alteração se justifica.
A Câmara tem, antes de mais, dúvidas sobre se o n.º I da base em análise, tal como se encontra redigido e como o Governo propõe se mantenha, estará hoje de perfeito acordo com a segunda parte do artigo 134.º da Constituição, introduzida pela Lei constitucional n.º 2100, de 29 de Agosto de 1959.
Com tal texto procurou-se, não apenas estabelecer constitucionalmente a possibilidade de qualquer das províncias ultramarinas vir no futuro a integrar-se na administração metropolitana (possibilidade já consagrada no n.º II da base V, mas sem apoio constitucional visível), mas também, como resulta dos trabalhos preparatórios da revisão constitucional de 1959, estabelecer uma directriz de política legislativa no sentido de se «continuar na senda aberta com a integração dos serviços de meteorologia, dos serviços aéreos e dos serviços de vigilância, pela forma eficaz como se fez».
Se, pois, o alcance do artigo 134.º, segunda parte, da Constituição é duplo, e é o que vimos de explicitar, não é mais possível manter o n.º I da base XXXVI com uma redacção que poderia de algum modo inculcar o carácter excepcional dos serviços públicos nacionais, cumprindo alterá-lo no sentido de nele se dizer apenas que os serviços de administração provincial tanto podem ser provinciais como nacionais.
Ora muito bem Feitos estes reparos e redigido neste sentido o n º I da base XXXVI, compreende-se que se deva procurar para o pensamento expresso na proposta uma formulação que esteja mais de acordo com a referida directriz constitucional.
Sem dúvida nenhuma que deverão lógica e também constitucionalmente ser constituídos como serviços nacionais os que giram ou sirvam para gerir interesses comuns a todo o território nacional. Estará nestas condições, por exemplo, o serviço público da defesa nacional.
Parece, porém, que a directriz constitucional apontada impõe algo mais do que isso - impõe que se utilize e sistema organizatório dos serviços públicos nacionais sem (...) que e até onde razões de ordem técnica ou as especiais características e o particular condicionalismo de cada província não imponham como mais adequada e mais tendosa a solução dos serviços públicos estritamente provinciais. O legislador ordinário, na organização dos serviços públicos, deve, portanto, explorar, digamos assim, a solução integracionista ou uniformizadora até onde ela seja susceptível de ser percorrida e utilizada sem prejuízo. Só depois deste limite prático e constitucional é que se abre o campo natural da especialização da administração pública ultramarina.
Tudo ponderado, a Câmara entende que a directriz que a este respeito a proposta governamental pretende ser consagrada no n.º III da base em estudo deve ser aceite, com as convenientes adaptações de redacção.

46. Na segunda parte do proposto n.º III, entende o Governo que se deve dispor que a natureza e extensão dos serviços nacionais serão regulados por diplomas especiais, donde constarão as regras que assegurem o seu normal funcionamento era efectiva colaboração dos departamentos interessados.
Não encontra a Câmara Corporativa neste texto conteúdo essencialmente diferente do do n.º VI da base IX, no qual o Governo não propôs que se tocasse. O texto deste n.º VI viria, assim, a fazer duplo emprego com o texto agora proposto. Basta aquele para que se legitime toda a legislação que se queria editar no sentido de coordenar, quanto aos serviços nacionais, os comandas aos vários departamentos metropolitanos funcionalmente competentes com a intervenção do Ministério do Ultramar e especialmente com a intervenção dos governos ultramarinos. Há reparos ao statu quo nesta matéria - e sugestões que se fazem de vários lados. Trata-se de pormenores de organização em que não é fácil nem oportuno

Página 297

22 DE MARÇO DE 1963 297

a Câmara entrar agora. Uma coisa, no entanto, se impõe sublinhar é que tal legislação especial não pode transcender um certo limite imperativo, que é este não sejam os serviços nacionais organizados em termos de constituírem simulacros ou noções de autênticos serviços nacionais, frustrando a ideia que está na base da sua consagração, como categoria à parte, em 1958, na Lei Orgânica do Ultramar Português. E não teremos autênticos serviços nacionais de todas as vezes que o comando e orientação superior deles caiba ao Ministro do Ultramar, e não ao Ministro funcionalmente competente. Não há prova nem justificação para o ponto de vista de que tais organizações seriam mais eficientes se fossem especiais de cada província, desintegradas das correspondentes organizações metropolitanas. Os serviços nacionais, dentro das actuais condições de fácil comunicação entre a metrópole e o ultramar, beneficiam altamente da especialização técnica dos sei viços metropolitanos em que se integram, dos seus meios e capacidade e da sua experiência.

47. A Câmara Corporativa, por último, não concorda com que a directriz que se contém hoje na primeira parte do n.º II desta base fique sendo restrita, como o Governo propõe, nos serviços provinciais. Como se mostrou no parecer n.º 85/V, a doutrina deste número é válida em relação aos serviços provinciais propriamente ditos e em relação às parcelas provinciais dos serviços públicos nacionais.

48. A partir do tudo quanto acaba de ser observado, a Câmara Corporativa sugere para a base XXXVI uma redacção diferente da proposta pelo Governo.

Base XXXVII

49. Limita-se a proposta, quanto a esta base, a eliminar o seu n.º I, isto é, a suprimir nas províncias de governo-geral a secretaria-geral. Havendo esta Câmara, no lugar próprio, desaconselhado a supressão do cargo de secretário-geral nas referidas províncias, tem também de desaconselhar logicamente agora a eliminação do serviço ou órgão correspondente.

Base XL

50. A única alteração que o Governo sugere para esta base vem justificada no relatório da proposta de lei.
Não convencem as razões invocadas aí. A Câmara tem a impressão de que a solução desejada tem inconvenientes para a unidade administrativa do ultramar, considerado no seu conjunto, o que ainda seria o menos. O pior, porém, é que ela criará provavelmente sérios obstáculos ao recrutamento do pessoal administrativo nas províncias de governo simples. A Câmara não se sente, assim, inclinada a advogar este enriquecimento dos quadros privativos à custa dos quadros comuns.

Base XLI

51. O Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, aprovado pelo Decreto n.º 40 708, de 31 de Julho de 1956, regulou a matéria das nomeações em comissão de serviço, nos seus artigos 35.º e seguintes - mas nada do que dos seus preceitos consta se mostra incompatível com o que se encontra regulado na Lei Orgânica. O que esse estatuto contém é uma disciplina mais minuciosa da matéria.
A Câmara afigura-se-lhe, em face disso, que a alteração a introduzir no n.º V desta base deve consistir apenas em se reproduzir o artigo 38.º daquele referido diploma legal, que reza assim «as nomeações em comissão apenas conferem os direitos e impõem os deveres correspondentes aos cargos durante o prazo da sua duração, sem prejuízo, porém, da contagem do tempo para efeito de antiguidade e aposentação». A isto seguir-se-ia o texto actual do referido n.º V.

Base XLVI

52. A Câmara Corporativa sugere que se aproveito o ensejo para estabelecer as bases de uma reforma da divisão administrativa das províncias ultramarinas. Julga-se, em primeiro lugar, oportuno eliminar definitivamente as «circunscrições administrativas», reminiscências do período da ocupação e expressão de uma forma autoritária da administração local comum. Não que se tenham demasiadas ilusões sobre a possibilidade de estender a vida municipal, de índole colegial e representativa, a todo o território ultramarino. Em todo o caso, convém abrir mais francamente a porta e apontar mais deliberadamente o rumo para aplicação da fórmula municipalista na vida local das províncias. Por outro lado, a Câmara entende que a «assimilação», em matéria de administração local comum, deve levar também, como na metrópole, a considerar os concelhos divididos em freguesias. Pela lei actual, os concelhos podam compor-se de freguesias. Na redacção que ora se propõe para a base em apreciação os concelhos formam-se (sempre) de freguesias, correspondentes a agregados de famílias que, dentro dos concelhos, desenvolvem uma acção social comum por intermédio de órgãos próprios, na forma prevista na lei. Também a vida administrativa paroquial será, ou poderá ser, em muitos e muitos casos, rudimentar e embrionária, ou não coincidir mesmo com o tipo da vida paroquial normal. Valerão, porém, aqui as mesmas razões apontadas pai a o alargamento da rede dos concelhos.
Ao lado da divisão administrativa autárquica haverá uma outra, instituída para fins de administração centralizada. Teríamos, assim, que os concelhos poderiam ser divididos em bairros (no caso das cidades de mais de um certo número de habitantes) ou ter áreas atribuídas a postos administrativos, com fins de organização e protecção do povoamento Onde o justifiquem a grandeza ou a descontinuidade do território e as conveniências da administração, os concelhos agrupar-se-iam em distritos (tal como hoje já sucede). Eliminar-se-ia a disposição do actual n º III da base em análise, no seguimento da revogação, em Setembro de 1961, do Estatuto dos Indígenas Portugueses da Guiné, Angola e Moçambique, de 1954, pois não é legítimo manter uma divisão administrativa especial para efeitos de realização de uma política que deixou de poder realizar-se.
Persistiria, por último, a directriz inscrita no actual n.º VI.

53. Propõe o Governo que ao actual n.º VI se acrescente um novo período, correspondente a uma nova directriz em matéria de relações entre a administração central da província e a administração local.
Antes de mais, entende-se dever chamar a atenção para um aspecto de ordem sistemática. Crê a Câmara Corporativa que o lugar próprio para se consignar na Lei Orgânica uma directriz como esta não é a base XIVI será antes a base L, justamente dedicada a incluir os princípios fundamentais em matéria de relações entre as autarquias locais e o governo da província.
Certas restrições incidentais à administração local alimentaram e fizeram avultar no ultramar a ansiedade por se verem restauradas as autonomias locais, em bases representativas e descentralizadas.

Página 298

298 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

A ideia da reestruturação dos corpos administrativos em termos de se lhes dar mais carácter representativo, nada há a opor. O que não pode é ir-se no ultramar para a solução de fazer designar por eleição os presidentes desses órgãos, não só porque tal solução não tem paralelismo na metrópole como também porque a «ciência da administração» não fornece grandes apoios para uma semelhante viragem.
Com estas reservas, a Câmara advoga a aprovação da referida directriz, que, com alterações convenientes de redacção, será formulada como n.º I da base L, modificando-se consequentemente a numeração restante.

BASE XLVII

54. A Câmara propõe nova redacção para esta base, designadamente em função das alterações que sugeriu em relação à base antecedente.
No seu modo de ver, a base em apreciação deve consignar, como vem proposto e é direito vigente, que no distrito a autoridade superior é o governador de distrito. Como consta da proposta, devem eliminar-se os intendentes administrativos, já que as intendências são suprimidas. No concelho, no bairro e no posto administrativo deverá dizer-se que a autoridade será aí exercida, respectivamente, pelo administrador do concelho, pelo administrador de barro e pelo administrador de posto. Na freguesia a autoridade caberá ao regedor. Em cada regedoria, grupo de povoações ou povoações haverá a autoridade que a lei e o costume estabelecerem.

BASE XLVIII

55. A primeira inovação que se pretende introduzir nesta base respeita às juntas de freguesia, que entraram a fazer parte do elenco dos corpos administrativos das províncias ultramarinas.
Esta Câmara no seu parecer n.º 35/V, várias vezes citado, pronunciou-se por que se deveria consagrar, em todo o território nacional, esse tradicional órgão da administração paroquial - mas a sua sugestão não foi então seguida. Agora que o problema se põe de novo, a Câmara Corporativa entende dever insistir na sua ideia expressa em 1952 no referido parecer. Consequentemente, sugere-se que se instituam juntas de freguesia nas freguesias urbanas e rurais - com excepção, quanto a estas, daquelas onde houver conselhos ou organismos a quem por lei ou tradição pertença a gerência de certos interesses comuns dos habitantes, pois, neste caso, poderão ser-lhes confiadas as atribuições das juntas de freguesia nos termos que a lei definir. Assim se articularão as instituições consagradas pelo uso local com as do tipo importado da metrópole. Uma atitude semelhante já se adoptou no Estado da Índia com relação às gãocarias.
Esta orientação conduz à eliminação das juntas locais. Quanto às comissões municipais, subsistirão para funcionarem nos concelhos em que não puder constituir-se câmara, por falta ou nulidade da eleição ou enquanto o número de eleitores inscritos for inferior ao número estabelecido. O que se propõe quanto a esta e às bases anteriores implica a remodelação da base XLIX.

56. Outra inovação respeita à instituição de «juntas distritais».
No pensamento do Governo não está que o distrito passe a constituir uma autarquia local (n.º I da base XLIX) e a junta distrital um corpo administrativo. Tanto que se diz dela que se limitará a coadjuvar o governador de distrito no exercício das suas funções. E certo, em todo o caso, que na proposta se diz também que a junta terá, além de funções consultivas, funções deliberativas - como sucedia com as juntas provinciais, antes da Lei Orgânica, acontecendo que a Reforma Administrativa Ultramarina expressamente as qualificava como corpos administrativos. Reconhece-se, porém, que não será impossível (longe disso) atribuir às juntas distritais competência deliberativa sem que o facto importe a sua qualificação como corpos administrativos.
A ideia de se instituírem juntas distritais resulta, segundo parece, de se pretender associar à administração distrital, constituída por uma extensa série de competências, distraídas da esfera de funções executivas do governador de província e atribuídas aos governadores de distrito na medida em que respeitem o interesse e tenham amplitude predominantemente distrital, os representantes do próprio distrito. Assim se combinam e associam os dois processos de técnica organizatória a desconcentração e a descentralização.
A Câmara Corporativa considera a fórmula encontrada como uma fórmula feliz - e por isso recomenda a sua aprovação. No entender dela, as juntas distritais deveriam ter uma constituição moldada na dos conselhos de governo, com membros natos e membros electivos, e deveriam ser presididas pelo governador de distrito.
A Câmara deixará isto consignado no texto de substituição, que proporá nas conclusões deste parecer.

BASE LVIII

57. No seu parecer n.º 35/V a Câmara Corporativa teve ocasião de descrever, nas suas linhas gerais, a evolução que sofrera até então o problema da autonomia financeira das províncias ultramarinas.
Não vai, por isso, traçar de novo esse esquema evolutivo.
O sentido da proposta em estudo é o de se entregar inteiramente aos órgãos provinciais a organização do orçamento, incluindo a avaliação definitiva dos receitas extraordinárias e a fixação das despesas da mesma espécie - matérias que, pelo regime legal vigente, pertencem fundamentalmente ao Ministro do Ultramar.
Como já houve ocasião de acentuar, o Ministro do Ultramar pode continuar a exercer um adequado contrôle da ordem financeira nas províncias ultramarinas, posto que se lhe conservam latos poderes de fiscalização e do superintendência, pode restringir a autonomia financeira de qualquer das províncias em circunstâncias excepcionais e por último, mantém um poder considerável em matéria de autorização de empréstimos das províncias. Por outro lado, diz-se-nos que o novo sistema já foi experimentado com êxito no Estado da Índia. Em face disto, é caso realmente para levar a experiência às demais províncias.
Em todo o caso, e para afastai quaisquer dúvidas, há-de dizer-se na lei que ao diploma votado pelo conselho legislativo será aplicável o disposto na base XXIV sobre publicação dos projectos de diploma votados pelos conselhos legislativos, em geral. Correspondentemente, deverá também dispor-se que o governador organizará o orçamento, não de acordo com o diploma que foi votado, mas de acordo com o diploma que foi finalmente aprovado ou publicado.
Deverá ainda dizer-se, como se diz na base em vigor, que o orçamento deverá ser votado pelo conselho de governo. E recorde-se que atrás, no lugar próprio, se sugeriu que o mesmo deverá dispor-se paralelamente em relação às transferências de verba e às aberturas de créditos, pelos quais a organização do orçamento vem, afinal de contas, a ser alterada. Ficará isto consignado no n.º II da base LXIII.

Página 299

22 DE MAREIO DE 1963 299

Base LXI

58. A primeira parte do que vem proposto quanto ao n.º II. desta base justifica-se por ser realmente necessário adaptar este preceito às alterações propostas em matéria de órgãos legislativos das províncias de governo simples.

Base LXIII

59. Segundo o n.º IV desta base, em vigor, as despesas da administração provincial serão ordenadas pelos governadores ou pelo Ministro do Ultramar, nos termos da Lei Orgânica e dos diplomas especiais que regulam a execução do orçamento das despesas. No parecer desta Câmara n.º 85/V deu-se a explicação desta repartição de competências, que parece dever continuar a verificar-se enquanto vigorar o Decreto n.º 17 881, de 11 de Janeiro de 1930. Há, no entanto, despesas que não carecem de ser ordenadas - e isto, de por si, já justificaria que se alterasse a redacção em vigor.

60. A eliminação do n.º V desta base é consequência necessária da supressão da competência do Ministro do Ultramar para orientar a execução dos orçamentos (agora estabelecida na base XI, n.º I, 6.º), supressão proposta pelo Governo, como na devida altura se anotou.

Base LXVIII

61. O problema da apreciação da inconstitucionalidade das normas de direito ultramarino não tem tido solução pacífica, nem de lege lata nem de lego ferenda. As controvérsias a que tem dado origem no primeiro destes planos podem, por último, ver-se sintetizadas na Revista do Legislação o de Jurisprudência, ano 89, 1956-1957, pp 58 e segs o 77 e segs.

62. Designadamente, depois que foi decretada a assimilação da organização judiciária das províncias ultramarinas à da metrópole (V o Decreto n.º 43 898, de 6 de Setembro de 1961, a Lei n.º 2113, de 11 de Abril de 1962, e o Decreto-Lei n.º 44 278, de 18 de Abril do mesmo ano), deixou de ser legítimo argumentar-se contra a solução da extensão u todos os órgãos judiciários ultramarinos da competência para apreciar da inconstitucionalidade material das normas jurídicas. Por outro lado, não se descortina que a solução proposta tenha mais inconvenientes no ultramar do que na metrópole, no plano do interesse da uniformidade na aplicação do direito. Desta sorte, não é legítimo pretender-se que a solução consagrada no corpo do artigo 123.º da Constituição tenha sido pensada ou possa hoje ser considerada como pensada pelo legislador constitucional como aplicável exclusivamente ao direito e aos tribunais metropolitanos.
A Câmara Corporativa concorda, portanto, com a ideia de atribuir aos tribunais do ultramar competência para apreciarem a inconstitucionalidade material das normas jurídicas, nos termos do corpo do artigo 123.º da Constituição.
Um reparo, entretanto, se tem de fazer à redacção do n.º I desta base, proposta pelo Governo. Ela refere-se apenas a inconstitucionalidade material dos diplomas legais - e é evidente que não podem ser esses, restritamente, os diplomas cuja inconstitucionalidade material há-de poder ser apreciada pelos tribunais do ultramar. Convirá, por isso, melhorar essa redacção.

63. Não pode haver dúvidas de que a norma do § único do artigo 123.º da Constituição é aplicável não só aos diplomas de direito metropolitano como também aos diplomas de direito ultramarino. Assim, reputa-se como incontestável que a inconstitucionalidade orgânica ou formal das regras de direito ultramarino constantes de diplomas promulgados pelo Presidente da República só poderá ser apreciada pela Assembleia Nacional e não pelos tribunais ultramarinos. A solução consagrada nesse § único é, a todas as luzes, de direito constitucional comum à metrópole e ao ultramar.
Aliás, tal solução está expressamente perfilhada por um texto de direito constitucional especial para o ultramar, que é o § 3.º do artigo 160.º da Constituição.
Simplesmente, este § 8.º vai mais longe e considera igualmente subtraídos ao controlo dos tribunais ultramarinos os diplomas legais aplicáveis ao ultramar que não tenham sido promulgados pelo Presidente da República. Ele abrange, na verdade, os diplomas legislativos ministeriais e as portarias legislativas do Ministro do Ultramar, a que se refere o § 1.º do mesmo artigo 150.º.
Segundo parece, a devolução que no referido § 3.º do artigo 150.º se faz para o § 1.º do artigo 123.º não se refere à parte deste preceito em que se traçam os limites a que se estende o regime de controle meramente político da inconstitucionalidade, mas sim, antes e apenas, a parte dele em que se consagra ou fixa esse regime. E, na verdade, o próprio § 3.º que circunscreve, quanto ao direito ultramarino, os limites a que se estende tal regime, é ele, por outras palavras, que nos diz quais são os diplomas cuja inconstitucionalidade orgânica ou formal não pode ser jurisdicionalmente apreciada e só o pode ser pela Assembleia Nacional.
A redacção proposta para o n.º II da base LXVIII não mostra que se tenha feito do § 8.º a devida interpretação, carecendo, por isso, de ser remodelada.

64. Resta analisar a solução proposta pelo Governo para o problema da fiscalização da inconstitucionalidade orgânica ou formal de outros diplomas, diferentes dos considerados até aqui Serão eles:

a) Diplomas genéricos, sem a forma de decreto regulamentar, expedidos pelo Ministro do Ultramar ou eventualmente por outros Ministros,
b) Diplomas legislativos emanados dos órgãos legislativos das províncias ultramarinas,
c) Diplomas regulamentares emanados dos governos das províncias ultramarinas e de quaisquer autoridades ou entidades públicas das províncias, com competência normativa.

A Constituição vem sendo interpretada pelo legislador ordinário, desde 1933, com a Carta Orgânica, no sentido de o corpo do artigo 123.º não ser aplicável a tais diplomas de direito ultramarino e, portanto, no sentido de que os tribunais do ultramar não podem deixar de aplicar, nos feitos submetidos a julgamento, esses diplomas, quando afectados de inconstitucionalidade orgânica ou formal. O legislador ordinário partiu, efectivamente, sempre do princípio de que se impunha uma interpretação restritiva deste preceito constitucional, em termos de ele se considerar como não tendo pretendido abranger a inconstitucionalidade orgânica ou formal dos diplomas de direito ultramarino não promulgados pelo Presidente da República.
Considerou-se como improvável que o legislador constitucional tivesse pretendido, em especial, deixar aos tribunais ultramarinos a possibilidade de recusar a aplicação de quaisquer diplomas emanados do Ministro do Ultramar, a pretexto de que esses diplomas caberiam na com-

Página 300

300 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

potência dos órgãos legislativos ou executivos da província respectiva, e de negar a aplicação de diplomas locais, legislativos ou regulamentares, com a invocação de que os órgãos provinciais não eram constitucionalmente competentes para os editar. Com certeza que o legislador constitucional não terá pretendido dar aos tribunais do ultramar uma tal oportunidade de negarem a autoridade do Ministro e dos governadores e de resolverem os conflitos de atribuições normativas entre eles. A interpretação segundo a qual o controle da inconstitucionalidade orgânica ou formal de tais diplomas estaria realmente confiado pela Constituição a todos os tribunais Ultramarinos teria como consequência atrair estes para um campo que é menos adequado a sua intervenção fiscalizadora.
Partindo desta interpretação restritiva do artigo 128.º da Constituição, quer o legislador da Carta Orgânica, no artigo 199.º deste diploma, quer o legislador da Lei Orgânica, na base LXVIII, entenderam poder licitamente estabelecer, para o controle da inconstitucionalidade orgânica ou formal de tais diplomas, um regime inteiramente divergente do estabelecido no corpo do artigo 123.º da Constituição para a fiscalização da inconstitucionalidade orgânica ou formal de diplomas metropolitanos não promulgados pelo Presidente da República. (Tal preceito, na verdade, não se refere apenas à inconstitucionalidade material das regras de direito metropolitano e ultramarino).
Consistiu ele em confiar exclusivamente ao Conselho Ultramarino o julgamento da inconstitucionalidade em questão, retirando a competência para tanto aos tribunais do ultramar, perante os quais o problema da inconstitucionalidade de suscitar. O Conselho funcionaria em tais casos como uma espécie de «tribunal constitucional».
A Câmara Corporativa, verificando que o n.º III da base em análise, na redacção agora proposta, está na linha tradicional de interpretação do artigo 128.º da Constituição, e que não há lazão para nos afastarmos dessa interpretação nem da solução que vem sendo legislativamente seguida desde a Carta Orgânica a este respeito, dá a sua concordância à orientação desse novo n.º III.

65. Não se pronuncia a proposta sobre o processo ou meio de impugnação dos diplomas inconstitucionais perante o Conselho Ultramarino. Como se sabe, as possibilidade teóricas a este respeito são duas ou se admite uma acção ou recurso directo destinado a obter a declaração de inconstitucionalidade, ou se admite apenas, uma excepção ou incidente de inconstitucionalidade. A proposta também nada nos diz acerca dos efeitos da decisão proferida sobre a inconstitucionalidade pelo Conselho Ultramarino anulação ou validação do diploma erga omnes, ou simples inaplicação? São pontos estes que, pela sua suprema importância, não devem ser omitidos na Lei Orgânica. A Câmara não vê razão para se alterar sobre tais pontos o direito vigente.

Base LXXXI

66. A alteração proposta consiste apenas em também se fazer referência nesta base às escolas superiores que o Estado poderá manter no ultramar. A Lei Orgânica vai consagrar, assim, uma política em vias de execução em relação a Angola e Moçambique. A Câmara apraz-lhe recordar que no seu parecer de 1952, n.º 85/V, recomendou a inscrição na Lei Orgânica então em preparação de uma norma segundo a qual o Estado, quando se tornasse aconselhável, poderia criar nas províncias ultramarinas escolas superiores. Esta ideia foi desaprovada, vindo o n.º II desta base a ficar com a redacção que ora se pretende modificar naquele sentido.
Deve aproveitar-se o ensejo para pôr o n.º II desta base de acordo com a lei actual em matéria de graus de ensino e de escolas e para eliminar a referência ao idioma vernáculo, por ser inapropriada.

Base LXXXVIII

67. Não é fácil descortinar o alcance das modificações de redacção que o Governo propõe para o n.º II desta base. Tudo se traduz em dizer «dos órgãos metropolitanos» em vez de «de órgãos metropolitanos» e em se substituir a forma «carecem de conter» pela forma «deverão conter».
Parece indiferente, quanto ao primeiro ponto, utilizar qualquer das duas redacções. Quanto ao segundo, o caso é diverso a forma actual de dizer é superior à proposta.
Não se impõe qualquer remodelação formal do referido texto.

Base XCII

68. Não há pràticamente nada a objectar à redacção proposta para esta base. Justifica-se, em especial que fique dependente de condição suspensiva a aplicação do novo regime sobre a administração financeira das províncias ultramarinas nos termos propostos. Com o que se não concorda é com a forma como tal providência é expressa. Não faz, na verdade, grande sentido dizer, como se diz em II, c), que as bases LVI a LXIV continuarão em vigor na actual redacção até ser publicada a lei da administração financeira das províncias ultramarinas, quando é certo que destas bases só a LVIII, a LXI e a LXIII se destinam a ser agora alteradas. Assim, o que se deverá dizer é que estas três bases continuarão em vigor durante este período.

Artigo 2.º

69. O sistema recentemente instituído para a criação de um «mercado comum» nacional, com o seu mecanismo adequado de pagamentos, está necessariamente associado à ideia de que é preciso considerar globalmente o desenvolvimento harmónico e equilibrado de todo o território português de aquém e de além-mar. A integração não pode ser concebida apenas num aspecto da economia nacional - o das trocas e dos pagamentos -, mas em todos os que contendem com o problema fundamental do desenvolvimento.
Uma política desta ordem só pode ser definida pelo Governo Mas na sua definição ele deve ter a cooperação das autoridades responsável e das actividades económicas das províncias ultramarinas, prestada através da sua participação nos órgãos consultivos que for oportuno utilizar e instituir. Está nestas condições a Comissão Consultiva de Política Económica, criada pelo Decreto-Lei n.º 44 652 de 27 de Outubro de 1962, em que participarão «representantes» dos interesses e dos sectores, de actividade das diferentes «regiões» do País e que terá entre os seus vice-presidentes possivelmente, um governador de província ultramarina. Segundo se crê, será por outro lado, remodelado e ampliado, para poder intervir num plano verdadeiramente nacional, quanto ao crédito, o Conselho Nacional de Crédito.
A primeira das bases que o Governo neste artigo 2.º da proposta pretende ver incluídas na Lei Orgânica encontra-se na linha de pensamento do Decreto-Lei

Página 301

22 DE MARÇO DE 1963 301

n.º 44652 e justifica-se, portanto, perfeitamente .A sua colocação na lei é que não pode ser a sugerida pelo Governo. Ela deverá, de preferência, surgir como um número novo, o penúltimo da base LXX.

70. Definida pelo Governo (mais rigorosamente, nos termos do Decreto-Lei n.º 44 652, pelo Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos) a orientação a observar em matéria de desenvolvimento equilibrado dos territórios do espaço português, cumprirá aos governos ultramarinos elaborar os planos de fomento territoriais e executá-los. Para assistir aos governadores nessa elaboração e nessa execução está prevista a criação, em cada uma das províncias ultramarinas, sob a dependência directa do respectivo governador, de um serviço ou comissão de planeamento e de integração económica (decreto-lei citado, artigo 51.º). A segunda das duas novas bases propostas não é mais do que a elevação ao plano da Lei Orgânica de uma ideia que já encontrou tradução naquele diploma. Nada, pois, há que objectar a inclusão de tal preceito na Lei Orgânica, a não ser que, em vez de constituir uma base nova e autónoma, ele deverá aparecer como um número, o último, da base LXX.

Artigo 3.º

71. Foi julgado, em Setembro de 1961, que chegara o momento de terminar com o especial regime transitório do protecção e defesa de importantes grupos humanos de três das províncias ultramarinos, estabelecido no Estatuto dos Indígenas Portugueses das Províncias da Guiné, Angola e Moçambique. Isto explica que se revoguem agora as bases LXXXIV e LXXXV.

72. Merece também apoio a ideia de se revogar a base LXXXVI. No ultramar, por força, além de outros diplomas, principalmente do Código do Trabalho Rural, aprovado pelo Decreto n.º 44 309, de 27 de Abril de 1962, há em matéria de direito laboral, inteira equiparação entre todos os sectores populacionais.
Desde que se instituiu e consagrou a assimilação de todos os trabalhadores do ultramar português, deixou de ser lícito manter-se o regime especial esboçado na base LXXXVI. Esta base deve, portanto, desaparecer.

73. O Governo não propôs, certamente por lapso, nem a supressão, nem qualquer alteração da base LXXXII da Lei Orgânica. Parece, porém, que essa base não se deve manter. Se ela se legitima perante o Acordo Missionário com a Santa Sé, não se justifica perante a orientação assimilacionista que se entende perfilhar.
Recorda-se, por isso, ao Governo a conveniência de tomar as medidas de ordem constitucional e regimental necessárias para que a Assembleia Nacional possa revogar esta base.

Artigo 4.º

74. Não se trata de o Ministro do Ultramar mandar fazer uma nova publicação da Lei n º 2066, donde constem as alterações que venham a ser-lhe agora introduzidas - visto o fazer publicar as leis ser da competência do Presidente da República. Do que se trata é de, pelo Ministério do Ultramar, se fazer publicar uma edição oficial da Lei Orgânica do Ultramar Português, inserindo no lugar próprio as alterações que lhe foram introduzidas depois de 1953 e as que lhe forem agora feitas. Foi assim que se procedeu com a Constituição Política, por força do artigo 5.º da Lei n.º 1963, de 18 de Dezembro de 1937.
É uma fórmula parecida com a deste artigo que se deve agora adoptar para o presente artigo 4.º.
Note-se que o Governo fez a edição oficial, prevista naquele artigo 6.º, publicando-a no Diário do Governo O mesmo se deveria fazer agora com a Lei Orgânica.

III

Conclusões

75. Em conclusão, a Câmara Corporativa sugere para a proposta de lei a seguinte redacção.

Artigo 1.º: As bases X, XI, XIII, XIV, XV, XVIII, XXIII, XXIV, XXV, XXVI, XXVIII, XXIX, XXXI XXXII, XXXIII, XXXIV, XXXV, XXXVI, XLI, XLVI, XLVII, XLVIII, XLIX, L, LVIII, LXI, LXIII, LXVIII, LXX, LXXXI e XCII da Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1953, passam a ter a seguinte redacção:

BASE X
I-..................................................................
a)..................................................................
b)..................................................................
c)..................................................................
d)..................................................................
e) O estatuto politico-administrativo de cada uma das províncias ultramarinas, ouvido o respectivo governador e o Conselho Ultramarina em sessão plena,
f)..................................................................
g)..................................................................
h)..................................................................
i)..................................................................
j) A solução por via legislativa das divergências entre os governadores e os conselhos legislativos sobre a oportunidade e conveniência das providências legislativas por esses conselhos aprovadas,
l)..................................................................
II) São autorizados os órgãos legislativos das províncias ultramarinas a expedir diplomas reguladores da composição, recrutamento, atribuições e vencimentos, salários e outras formas de remuneração do pessoal dos quadros privativos ou complementares dos seus serviços públicos, observando-se sempre os limites postos pelas leis que definem a organização geral do respectivo ramo de serviço.
III-................................................................
IV -................................................................
V -................................................................
VI -................................................................

BASE XI

I-..................................................................
1.º.................................................................
2.º.................................................................
3.º.................................................................
4.º.................................................................
5.º.................................................................
a)..................................................................
b)..................................................................
6.º Fiscalizar a organização e a execução dos orçamentos das províncias ultramarinas, nos termos legais,
7 º Autorizar os governos das províncias ultramarinas a negociar acordos ou convenções com os governos de outras províncias ou territórios, nacionais ou estrangeiros, neste último caso com a concordância do Ministro dos Negócios Estrangeiros,

Página 302

302 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

8.º Ordenar inspecções, sindicâncias e inquéritos, para fins disciplinares ou outros, a todos os sei viços públicos do ultramar em que superintenda, quer do Estado, quer dos corpos administrativos e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa,
9.º Superintender e fiscalizar as empresas de interesse colectivo, nos termos da Constituição, da presente Lei Orgânica e de outras leis,
10.º Exercer as demais funções que por lei lhe competirem.
II - O Ministro do Ultramar tem a faculdade de delegar nos governadores das províncias ultramarinas, a título temporário ou permanente, o exercício dos poderes referidos no n.º 1.º para contratar funcionários e conceder licenças registadas e também os referidos na segunda parte do n.º 2.º.
III-................................................................
IV - Para os efeitos do número anterior, os governadores deverão imediatamente comunicar ao Ministro do Ultramar as autorizações de transferências de verbas e de aberturas de créditos que decidirem, com a respectiva justificação.
V - Aos Subsecretários de Estado compete, dentro dos termos da delegação que lhes foi dada pelo Ministro, decidir, de acordo com a orientação deste, os assuntos da sua competência executiva.

BASE XIII

I - O Governo poderá consultar a Câmara Corporativa sobre diplomas a publicar ou sobre propostas de lei a apresentar à Assembleia Nacional, uns e outras aplicáveis ao ultramar.
II - As autarquias e os interesses sociais das províncias ultramarinas terão representação na Câmara Corporativa. O processo de designação dos respectivos Procuradores será regulado no estatuto politico-administrativo e de cada província, de acordo com o que se dispuser na lei orgânica da Câmara Corporativa.

BASE XIV

I - O Conselho Ultramarino é o órgão permanente de consulta do Ministro do Ultramar em matéria de política e administração ultramarinas.
Nele estarão representados os interesses sociais das províncias ultramarinas.
II - A organização e as atribuições do Conselho Ultramarino serão definidas em lei especial.

BASE XV
I -...............................................................
II - As reuniões da conferência não são públicas e a elas presidirá o Ministro do Ultramar ou um dos Subsecretários de Estado. Poderão assistir, com direito de voto, além dos governadores das províncias ultramarinas, o secretário-geral do Ministério e os directores-gerais e, quando convocados mas sem direito de voto, os secretários-gerais e os secretários provinciais.

BASE XVIII
I -................................................................
II -................................................................
III-................................................................
IV - A comissão dos governadores poderá ser renovada por períodos de dois anos em decreto publicado até 30 dias antes de ela terminar.
V -................................................................

BASE XXIII

I -................................................................
II - Nas províncias de Angola e Moçambique poderá haver o número de secretários provinciais que nos respectivos estatutos político-administrativos foi fixado, nomeados e exonerados pelo Ministro do Ultramar, sob proposta do governador-geral, e equiparados a inspectores superiores de administração ultramarina. Os secretários provinciais em funções a data do termo da comissão ou da exoneração do governador-geral presumem-se da confiança de quem assumir as funções governativas, mantendo-se no exercício dos seus cargos até a posse do novo governador, salvo se entretanto foi em exonerados.
III-................................................................
IV -................................................................
V - As delegações referir-se-ão normalmente a um conjunto de serviços, que constituirá uma secretaria provincial, e sei ao feitas era diploma legislativo da competência privativa do governador-geral. Deste diploma constarão igualmente a denominação e a organização das societárias.
VI - É aplicável ao secretário-geral e aos secretários provinciais o disposto nas bases XX e XXI quanto à responsabilidade civil e criminal e à fiscalização contenciosa dos seus actos.

BASE XXIV

I -................................................................
II -................................................................
III - O governador-geral mandará publicai as disposições votadas pelo Conselho Legislativo para que sejam cumpridas, sob a forma de diploma legislativo, dentro dos quinze dias seguintes àquele em que o projecto votado estiver pronto para a sua assinatura.
IV - No caso de o governador-geral considerar inconstitucionais ou ilegais as disposições votadas, enviá-las-á ao conselho paia nova apreciação. Se este as aprovar por maioria de dois terços do número legal dos seus vogais, será o projecto enviado ao Conselho Ultramarino, que decidirá em sessão plena, devendo o governador conformar-se com o que este resolver.
V - Tratando-se de diploma da iniciativa do governo-geral, o governador poderá não o publicar, informando o Conselho de que passou a não considerar oportuna a sua publicação.
VI - Se se tratar de diploma da iniciativa de vogais do Conselho, o governador-geral, caso considere na disposições votadas contrárias ao interesse nacional ou ao interesse da província, submeterá logo o assunto a resolução do Ministro do Ultramar ou solicitará que as disposições votadas sejam objecto de nova resolução do Conselho. Na primeira hipótese, o Ministro, ouvido, nos termos gerais, o Conselho Ultramarino, poderá determinar que o governador-geral publique, total ou parcialmente, as disposições votadas pelo Conselho Legislativo ou legislar sobre o assunto nos termos que entender mais convenientes. Na segunda hipótese, se as disposições forem aprovadas por maioria de dois terços do número legal dos vogais, o governador mandá-las-á publicar.
VII - No intervalo das sessões ordinárias do Conselho Legislativo, não estando este reunido em sessão extraordinária, quando haja sido dissolvido e nos casos em que a lei lhe atribua competência reservada, poderá o governador-geral publicar diplomas legislativos, ouvido o Conselho de Governo.

Página 303

22 DE MARÇO DE 1963 303

BASE XXV

I -.................................................................
II- O Conselho Legislativo é uma assembleia de representação adequada às condições do meio social da província, constituído por vogais eleitos quadrienalmente entre cidadãos portugueses que reunam os requisitos de elegibilidade indicados na lei.
III - O estatuto politico-administrativo da cada uma das províncias de governo-geral fixará o número de vogais do seu Conselho Legislativo e regulará a eleição de modo a garantir adequada representação dos colégios de eleitores do recenseamento geral dos círculos em que o território da província foi dividido, das autarquias locais e dos interesses sociais nas suas modalidades fundamentais.
IV-.................................................................

BASE XXVI

I - O Conselho Legislativo funcionará na capital da província e será presidido pelo governador-geral ou por quem suas vezes fizer, com a faculdade de, quando assim o entender, se fazer substituir por um vice-presidente eleito pelo Conselho.
II - O Conselho Legislativo terá duas sessões ordinárias em cada ano, com duração total de trás meses, e as sessões extraordinárias que forem convocadas polo governador-geral, nos termos que serão regulados no estatuto politico-administrativo de coda província. O governador-geral poderá prorrogar até um mês o funcionamento efectivo do Conselho.
III-................................................................
IV -................................................................
V - Os secretários provinciais e o secretário-geral poderão comparecer, por incumbência do governador, perante o Conselho Legislativo para sustentarem as propostas de que o governo-geral tenha tido a iniciativa ou para aí fazerem as comunicações e darem os esclarecimentos que entenderem necessários.
VI - As demais disposições sobre o funcionamento do Conselho Legislativo serão estabelecidas no estatuto politico-administrativo da respectiva província.

BASE XXVIII
I -.................................................................
II - Compõem o Conselho de Governo os vogais seguintes:
Secretários provinciais e secretário-geral, comandante militar, comandante naval, comandante da região aérea, procurador da República, director dos Serviços Provinciais de Fazenda e Contabilidade, como vogais natos, e um representante das autarquias locais e de cada um dos interesses sociais da província, eleitos por dois anos, conforme se dispuser no estatuto politico-administrativo da província.

BASE XIX
I -.................................................................
II- Os vogais natos do Conselho serão substituídos nas suas faltas, ausências ou impedimentos pelos directores de serviços designados pelo governador-geral e, quando não houver designação, pelos seus substitutos na função pública.
III - O estatuto politico-administrativo da província incluirá as demais normas respeitantes ao funcionamento do Conselho de Governo.

BASE XXXI
I -.................................................................
II - O governador pode ser coadjuvado por um secretário-geral, a quem competirá o exercício dos funções executivas que nele sejam delegadas pelo governador.
III-................................................................
IV - A competência do governador em matéria de administração financeira não pode ser delegada.
V - Aplicam-se aos governadores os preceitos da base XXIV respeitantes aos governadores-gerais.

BASE XXXII

I - Nas províncias de governo simples funcionará, com atribuições legislativas, um Conselho Legislativo.
II - O Conselho Legislativo é uma assembleia de representação adequada às condições do meio social da província, constituída por vogais eleitos quadrienalmente que reunam os requisitos de elegibilidade indicados na lei. No estatuto politico-administrativo de cada província poderá estabelecer-se que do Conselho façam também parte vogais natos.
III - O estatuto politico-administrativo de cada uma das províncias de governo simples fixará o número de vogais do seu Conselho Legislativo e regulará a eleição de acordo com as directrizes fixadas no n.º III da base XXV desta lei.
IV - E aplicável, quando os eleitores não escolherem os seus representantes ao Conselho Legislativo, o disposto no n.º IV da base XXV.
V - Em Macau será dada representação à comunidade chinesa, nos termos que forem regulados no seu estatuto politico-administrativo.

BASE XXXIII

E aplicável ao Conselho Legislativo das províncias do governo simples e disposto na base XXVI da presente lei.

BASE XXIV

E aplicável ao Conselho Legislativo das províncias da governo simples e aos seus vogais o disposto pá base XXVII da presente lei.

BASE XXXV

I - Junto do governador, e por ele presidido, funcionará um Conselho de Governo, com atribuições consultivas permanentes.
II - Compõem o Conselho de Governo os vogais seguintes:
O secretário-geral, quando o houver, o delegado do procurador da República da comarca da capital da província, o chefe dos serviços de administração civil quando não haja secretário-geral, o chefe da repartição provincial dos serviços de Fazenda e contabilidade, como vogais natos, e representantes das autarquias e dos interesses sociais da província em número fixado no respectivo estatuto politico-administrativo, cujo mandato será de dois anos. Farão também parte do Conselho as autoridades militares que forem indicadas neste estatuto.
III - Ao Conselho de Governo compete o desempenho das funções consultivas atribuídas na base XXX ao Conselho de Governo das províncias de governo-geral.
IV - O governador pode discordar da opinião do Conselho e providenciar como entender mais conveniente, nos termos do n.º III da base XXX.

Página 304

304 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

V - O estatuto político-administrativo de cada província incluirá as normas respeitantes à eleição dos vogais e ao funcionamento do Conselho de Governo.

BASE XXXVI

I - Os serviços públicos da administração provincial podem estar integrados na organização geral da administração de todo o território português ou constituir organizações próprias de cada província, directamente subordinadas ao governador e, por intermédio deste, ao Ministro do Ultramar.
II - Quer os serviços nacionais, quer os serviços provinciais propriamente ditos, devem corresponder em cada província ao seu estado de desenvolvimento e às circunstâncias peculiares do seu território.
III - Haverá os serviços nacionais que forem necessários para a boa gestão dos interesses comuns a todo o território português e aqueles cuja criação não seja desaconselhada por motivos de ordem técnica ou pelas características e condicionalismo próprios de cada território, de acordo com estes princípios, a natureza e a extensão dos serviços nacionais que hão-de funcionar em cada província sei5o regulados por diplomas especiais.
IV - A natureza e extensão dos serviços provinciais propriamente ditos serão regidos pelo estatuto da província, guardados o princípio consignado no n.º II desta base e as normas de organização do respectivo ramo de serviço vigentes no ultramar.
V - Os serviços provinciais podem, nos casos previstos na lei, para efeitos de recrutamento de pessoal, coordenação de métodos, utilização de laboratórios ou outras formas de assistência técnica, funcionar como prolongamento dos correspondentes serviços metropolitanos.
VI - Todas as organizações de serviços públicos, incluindo os concedidos, das províncias ultramarinas terão em vista as necessidades supremas da defesa do território, procurando adaptai-se a elas e facilitar a missão das instituições militares.

BASE XLI

I -................................................................
II -................................................................
III-................................................................
IV -................................................................
V - As nomeações em comissão apenas conferem os direitos e impõem os deveres correspondentes aos cargos durante o prazo da sua duração, sem prejuízo, porém, da contagem do tempo para efeito de antiguidade e aposentação. São-lhes aplicáveis, além do mais que a lei dispuser, as regras seguintes:
1.ª.................................................................
2.ª.................................................................
3.ª.................................................................
4.ª.................................................................
5.ª.................................................................

BASE XLVI

I - Para os fins da administração local, as províncias ultramarinas dividem-se em concelhos, que se formam de freguesias, correspondentes aos agregados de famílias que desenvolvem uma acção social comum por intermédio de órgãos próprios, na forma prevista na lei.
II - Os concelhos poderão ser divididos em bairros e era postos administrativos.
III - Onde o justifiquem a grandeza ou a descontinuidade do território e as conveniências da administração, os concelhos agrupam-se em distritos.
IV - A divisão administrativa de cada uma das províncias ultramarinas acompanhará as necessidades do seu progresso económico e social.

BASE XLVII

No distrito a autoridade superior é o governador de distrito. No concelho no bairro e no posto administrativo a autoridade é exercida, respectivamente, pelo administrador do concelho, pelo administrador de bairro e pelo administrador de posto. Na freguesia a autoridade caberá ao regedor. Em cada regedoria, grupo de povoações ou povoação haverá a autoridade que a lei e o costume estabelecerem.

BASE XLVIII

I - Nas províncias ultramarinas a administração dos interesses comuns das autarquias locais está a cargo de câmaras municipais, comissões municipais e juntas de freguesia.
II - No distrito haverá uma junta distrital, composta de vogais natos e de vogais eleitos, à qual caberá coadjuvar o governador no exercício das suas funções. Esta junta disporá de competência consultiva e deliberativa.
III - A câmara municipal e o corpo administrativo do concelho, de natureza efectiva. Tem foral e brasão próprios e pode usar a designação honorífica ou título que lhe forem ou tiverem sido conferidos. E presidida pelo administrador do concelho ou por um presidente designado pelo governador, nos termos do estatuto respectivo, o qual, neste caso, poderá ser remunerado. O presidente é o órgão executor das deliberações da câmara, nos termos da lei.
IV - Poderá haver comissões municipais nos concelhos em que não se puder constituir câmara, por falta ou nulidade da eleição ou enquanto o número de eleitores inscritos for inferior ao número estabelecido.
V - A junta de freguesia é o corpo administrativo da freguesia, de natureza electiva. Nas povoações ou grupos de povoações rurais onde houver constituídos organismos ou conselhos a quem por lei ou tradição pertença a gerência de certos interesses comuns da família poderão ser-lhes confiados as atribuições das juntas de freguesia, nos termos que a lei definir.

BASE XLIX

Os concelhos e as freguesias são as autarquias locais propriamente ditas e constituem pessoas colectivas de direito público, com a autonomia administrativa e financeira que a lei lhes atribuir. A sua personalidade jurídica mantém-se, mesmo quando geridos por órgãos transitórios ou supletivos.

BASE L

I - As relações entre os órgãos governativos e os órgãos da administração local serão organizadas por forma a garantir uma efectiva descentralização, sem
prejuízo, porém, da eficiência dessa administração e dos seus serviços públicos.
II - A vida administrativa das autarquias locais está sujeita à fiscalização do governo da província, directamente ou por intermédio do governador do dis-

Página 305

22 DE MARÇO DE 1963 305

trito, onde o houver, e a inspecção pelos funcionários que a lei determinar, podendo a mesma lei tornar dependentes as deliberações dos respectivos corpos administrativos da autorização ou da aprovação de outros organismos ou autoridades.
III - As deliberações dos corpos administrativos das autarquia» locais só podem ser modificadas ou anulada» noa casos e pela forma previstos na lei.
IV - Os corpos administrativos de eleição podem ser dissolvidos pelo governo da província, conforme a lei determinar. As comissões e juntas nomeadas podem ser livremente demitidas.

BASE LVIII

II - O governador apresentará, antes do início do ano económico, ao Conselho Legislativo, uma proposta de diploma em que serão definidos os princípios a que deve obedecer o orçamento na parte das despesas do quantitativo não determinado por efeito de lei ou contrato preexistente. De harmonia com o diploma que for publicado, o governador organizará o orçamento, que, depois de votado pelo Conselho de Governo, mandará executar.
III - Quando, por qualquer circunstância, o orçamento não possa entrar em execução no começo do ano económico, a cobrança dos receitas, estabelecidas por tempo indeterminado ou por período que abranja a nova gerência, prosseguirá nos termos das leis preexistentes e, quanto as despesas ordinárias, continuarão provisòriamente em vigor, por duodécimos, o orçamento do ano anterior e os créditos sancionados durante ele para ocorrer a novos encargos permanentes.

BASE LXI

I-.................................................................
II - A iniciativa dos empréstimos pertence ao governador, com autorização do respectivo Conselho Legislativo. Relativamente porém, a obras e planos que forem da competência do Ministro do Ultramar, poderá este providenciar acerca do respectivo financiamento, por sua iniciativa ou mediante proposta do governador, ouvido neste cano o Conselho Legislativo ou o de Governo.
III-................................................................
IV -................................................................
V -................................................................

BASE LXIII

I -................................................................
II -................................................................
III - As verbas autorizadas para certa despesa não podem ter aplicação diversa do que estiver indicada no orçamento. O governador poderá, porém, autorizar aberturas de créditos ou transferências de verbas, com o voto do Conselho de Governo.
IV - As despesas da administração provincial serão ordenadas nos termos da presente lei e dos diplomas especiais que regularem a execução dos serviços da Fazenda.
V - O tribunal administrativo de cada província fará a fiscalização judicial do orçamento das despesas, nos termos e na medida que a lei determinar. A fiscalização administrativa cabe ao Ministério do Ultramar, que a fará por meio de inspecções e pelo visto das entidades competentes, e aos governadores.

BASE LXVIII

I - A inconstitucionalidade material das normas jurídicas será, nas províncias ultramarinas, apreciada pelos tribunais de conformidade com o disposto no corpo do artigo 128.º da Constituição.
II - A inconstitucionalidade orgânica ou formal dos diplomas promulgados pelo Presidente da República, bem como dos diplomas legislativos ministeriais e portarias do Ministro do Ultramar a que se refere o § 1.º do artigo 150.º da Constituição, só poderá ser apreciada pela Assembleia Nacional e por sua iniciativa ou do Governo, determinando a mesma Assembleia os efeitos da inconstitucionalidade, sem ofensa porém das situações criadas pelos casos julgados.
III - Sempre que nos tribunais das províncias ultramarinas se levantar um incidente de inconstitucionalidade orgânica ou formal de qualquer outro diploma, quer por iniciativa das partes, quer dos magistrados, se o tribunal entender que a arguição tem fundamento, subirá o incidente em separado ao Conselho Ultramarino, para julgamento.
IV - Recebido o processo, seguir-se-ão os trâmites legais e no final será lavrado acórdão sobre a inconstitucionalidade do diploma, mandando-o observar ou determinando que se não aplique.
V - A conclusão do acórdão do Conselho Ultramarino será telegràficamente comunicada à província ou províncias interessadas, a fim de que, uma vez publicada no respectivo Boletim Oficial, se lhe dê cumprimento.

BASE LXX

I -................................................................
II -................................................................
III - As províncias ultramarinas participarão na elaboração de programas gerais tendentes a assegurar o desenvolvimento contínuo e harmónico da sua economia, compatível com o equilíbrio global da balança de pagamentos e a estabilidade do valor da moeda.
IV - Em cada província ultramarina haverá uma comissão ou serviço de planeamento e integração económica, que funcionará na dependência directa do governador.

BASE LXXXI

I -................................................................
II - O Estado manterá, como lhe parecer conveniente, nas províncias ultramarinas, escolas de qualquer grau de ensino e centros de investigação científica. Nas escolas primárias é autorizado o emprego do idioma local como instrumento de ensino da língua portuguesa.
III-................................................................
IV -................................................................
V -................................................................
VI -................................................................

BASE XCII

I - Serão revistos de acordo com os preceitos da presente lei:
a) A organização do Ministério do Ultramar;
b) Os diplomas orgânicos dos diferentes ramos de serviço público no ultramar, incluindo a revisão da Reforma Administrativa Ultramarina;
c) A Lei Orgânica e o Regimento do Conselho Ultramarino;
d) O Estatuto do Funcionalismo Ultramarino;
e) O estatuto político-administrativo de cada uma das províncias ultramarinas, ouvido o respectivo governador e o Conselho Ultramarino em sessão plena

Página 306

306 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 36

II - Enquanto não forem publicados os diplomas complementares desta lei, continuarão em vigor as disposições vigentes Especialmente será observado o seguinte:
a) Continuam a funcionar os Conselhos Legislativos e de Governo nos termos da lei actual até que estejam constituídos os que os substituem,
b) Continuam os governadores e demais autoridades no exercício da competência actual até que se definam as suas atribuições,
c) Continuam em vigor, na actual redacção, as bases LVIII, LXI e LXII enquanto não for publicada a lei especial sobre administração financeira das províncias ultramarinas.

Art. 2.º No fim da secção IV do capítulo IV incluir-se-á uma nova base com a seguintes redacção:

BASE XVI-A

Nos diplomas orgânicos de todos os órgãos consultivos de âmbito nacional dispor-se-á que na sua composição hão-de entrar elementos radicados nas províncias ultramarinas, de acordo com um critério de distribuição regional equitativa.

Art. 3.º São revogadas as bases LXXXII, LXXXIV, LXXXV e LXXXVI da Lei Orgânica do Ultramar Português.
Art. 4.º O Governo, pelo Ministro do Ultramar, fará publicar uma edição oficial da Lei Orgânica do Ultramar Português, inserindo no lugar próprio as alterações introduzidas pela presente lei.

Palácio de S. Bento, 21 de Março de 1963

Albano Rodrigues de Oliveira
Álvaro Rodrigues da Silva Tavares
Francisco José Vieira Machado
Vasco Lopes Alvos
António Jorge Martins da Motta Veiga
António Júlio do Castro Fernandes
Fernando Andrade Pires de Lima
Joaquim Trigo de Negreiros
José Gabriel Pinto Coelho
Manual Jacinto Nunes
Paulo Arsénio Viríssimo Cunha
Afonso Rodrigues Queiró, relator

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×