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REPÚBLICA PORTUGUESA
ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 110
IX LEGISLATURA - 1968 23 DE NOVEMBRO
Projecto de decreto-lei n.º 7/IX
Regulamentação das relações colectivas de trabalho
1. De há muito só tornou usual na estruturação do direito do trabalho a distinção entre as «relações individuais» e as «relações colectivas», abrangendo estas últimas os chamados «conflitos colectivos» Para efeitos de regulamentação, correspondem às primeiras os contratos individuais de trabalho e às segundas as convenções colectivas
Quer os contratos individuais, quer os convenções colectivas, obedecem, em geral, na suo. negociação e estruturação, aos princípios fixados na lei, sendo-lhes normalmente vedado contrariar qualquer norma preceptiva ou proibitiva, bem como incluir disposições que importem para os trabalhadores tratamento menos favorável do que o legalmente previsto
O Decreto-Lei n.º 47 032, de 27 da Maio de 1966, constitui actualmente o diploma fundamental do direito português no domínio da regulamentação jurídica do contrato individual de trabalho Quanto às convenções colectivas, o seu regime continua a basear-se no preceituado pelo Decreto-Lei n.º 86 178, de 6 de Março de 1947
Como é natural, têm exigências muito diferentes RS negociações conducentes a celebração dos contratos individuais e as que visam à celebração das convenções colectivas no primeiro caso, a negociação é conduzida pelo próprio interessado, com vista à satisfação de interesses que são tombem exclusivamente seus, ao passo que na contratação colectiva a negociação é orientada total ou parcialmente pelos órgãos representativos dos interessados e com visto ao estabelecimento de normas de aplicação obrigatória, susceptíveis de abranger toda uma categoria profissional ou actividade
A celebração dos contratos individuais não apresenta hoje, na generalidade dos sistemas jurídicos, qualquer dificuldade, tanto pelo que respeita às formalidades a observar, como pelo que toca ao respectivo conteúdo. Contribuem para isso a longa tradição jurídica da negociação individual e a preocupação crescente, sobretudo nas últimas décadas, de exacta pormenorização dos direitos e obrigações que integram a relação de trabalho A evolução que sob este aspecto continua a verificar-se não prejudica a afirmação feita, já que essa evolução se relaciona mais com o conteúdo ou objecto da relação do que com as correspondentes formalidades e garantias
O mesmo não sucede com a chamada «contratação colectiva», cujo aparecimento e aceitação estão Intimamente ligados a consagração e evolução dos regimes sindicais de representação orgânica, dos quais constitui como que uma emanação
Não pode, por isso, falar-se a seu respeito em longa tradição, embora a intensidade com que a experiência da representação sindical tem sido vivida nos últimos tempos lhe comece a emprestar já foros de aceitação que a legitima como sistema natural de resolução dos conflitos colectivos
Entre os principais dificuldades que à contratação colectiva se opõem, constam os obstáculos inerentes à celebração, em geral derivados da diversidade de força económica e, portanto, contratual das partes, e toda a problemática ligada às garantias relacionados com o cumprimento, aperfeiçoamento e revisão das convenções celebradas
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Para superação dessas dificuldades, recorrem os sistemas a meios diferentes, consoante o conteúdo ideológico das suas determinantes doutrinárias ou o maior ou menor progresso da sua evolução jurídica
E assim, ao lado de regimes que continuam a considerar a contratação colectiva como o meio resultado de um jogo de forças flutuantes, para o que se considera legítimo o recurso a todos os meios de acção directa, ainda que violentos, designadamente as paralisações de actividade (greve e lock-out), outros sistemas há que, por mais ou menos expressa, encaram já a contratação colectiva como um simples meio de coordenação pacífica de interesses, desempenhando nos conflitos colectivos papel semelhante ao que compete aos contratos individuais nas relações de igual natureza Para os sistemas que aceitam este entendimento, a contratação colectiva tem de ser, naturalmente, acompanhada por instrumentos adequados à resolução pacífica dos conflitos, de modo a evitar a sua degeneração em contraste violento. Recorre-se, para o efeito, em geral, à existência de órgãos arbitrais de conciliação, que, com a garantia do Estado, procuram objectivar em soluções equitativas os aspectos acerca dos quais as partes não conseguiram chegar a acordo
Apreciada a questão pela perspectiva histórica, pode dizer-se que se alcançou tal entendimento por uma via semelhante àquela que percorreram, os conflitos individuais
Com efeito, do mesmo modo que, de início, os conflitos individuais de interesses tiveram na «justiça privada» a sua forma normal de solução, sistema que confiava às próprias partes o direito de impor, se necessário pela força (individual ou do agrupamento social a que cada um pertencia), a resolução das divergências existentes, também nos conflitos colectivos natural é que se tivesse começado por aceitar idêntica fórmula de «justiça privada», confiando igualmente aos interessados a sua resolução
Como é sabido, porém, à medida que as estruturas jurídicas e políticas se foram aperfeiçoando, o sistema da «justiça privada» nos conflitos individuais foi substituído pela «justiça pública», em que o Estado chamou a si a pacificação dos diferendos através dos tribunais, não permitindo que os. particulares façam justiça por suas próprias mãos (salvo em casos excepcionais)
Idêntica orientação se tem observado no domínio dos conflitos colectivos, onde cada vez mais se vem impondo a orientação de que a fórmula da intervenção directa das partes deve dar lugar a órgãos jurisdicionais de competência institucionalizada
E não são apenas razões de natureza jurídica que aconselham tal orientação no mesmo sentido depõem, objectivos de ordem social e política a maior justiça e equidade das soluções assim encontradas junta-se a garantia da paz & da ordem, que só desse modo ficará convenientemente assegurada, com a legitimidade inerente à ponderação de todos os interesses em presença
Esta tem sido também a orientação desde o início preconizada entre nós pelo Estatuto do Trabalho Nacional, e nela reside, outrossim, a justificação das determinações legais relativas à proibição dos meios violentos de resolução dos conflitos colectivos e a marcada tendência de lodo o sistema para canalizar a pacificação desses conflitos através dos organismos corporativos. Pode dizer-se que ao nosso sistema apenas tem fartado a exacta individualização dos órgãos arbitrais e de conciliação que a sua estrutura pressupõe, obrigando temporàriamente a recorrer a fórmulas indirectas de intervenção conciliadora
De qualquer modo, foi-se acumulando uma experiência que hoje pode considerar-se concludente e susceptível de permitiu já a consagração de fórmulas legais mais expressas e de mais acentuada expressão orgânica, com vista à criação dos referidos órgãos arbitrais e concomitante processo de conciliação
Essa a finalidade do presente diploma legal, que apresenta como principios inovações as seguintes
2. Sistematização da regulamentação das relações colectivas do trabalho - O desejo de ordenação das matérias segundo uma determinada lógica, em ordem à sua unidade sistemática, constituiu a primeira preocupação do legislador
Domina essa orientação o objectivo da resolução pacifica dos conflitos, e daí a maior relevância atribuída ao esquema de conciliação e arbitragem.
Nas suas linhas gerais, é a seguinte a sistematização adoptada determinação do conceito de convenção colectiva, modalidades que pode revestir e limites, sujeitos que nela podem participar, modo e prazos de negociação, ausência de acordo, conciliação e arbitragem, adesão às convenções celebradas, penalidades e sanções pelo seu não cumprimento, publicação e entrada em vigor
Dentro dessa orientação, o capítulo I destina-se à definição genérica do papel que caba às convenções colectivas, com individualização do quadro legal a respeitar pela negociação, isto é, os aspectos que lhe estão vedados e aqueles a que deve atender em determinados domínios considerados essenciais Aí se determina, por exemplo, que as convenções não podem incluir disposições que importem para os trabalhadores tratamento menos favorável do que o previsto na lei, como não podem igualmente contrariar o direito reservado ao Estado de coordenar e regular a vida económica da Nação, etc.
Do mesmo modo, estabelece-se que em matéria de regulamentação da I enumeração do trabalho se deverá atendei, além do mais, às necessidades do trabalhador, à produtividade, às possibilidades das empresas, ao nível do desenvolvimento económico do País, etc.
No capítulo II entra-se na regulamentação das convenções, começando por individualizar a quem compete a sua negociação e outorga e qual o âmbito da sua obrigatoriedade
Seguidamente, e ainda dentro do mesmo capítulo, aparece regulamentada toda a matéria respeitante ao processo e formalidades da negociação e outorga, bem como ao conteúdo da convenção
O capítulo III trata da tentativa de conciliação como consequência normal e obrigatória da situação criada pela ausência de acordo, indicando-se com o rigor possível as formalidades a que a mesma deve obedecer, os prazos dentro dos quais deverá ter lugar e as entidades a quem competirá
Pode suceder, porém que também a tentativa de conciliação não conduza a resultados satisfatórios, impondo-se então o recurso a novo expediente, que, segundo o diploma em causa, se traduzirá na obrigatoriedade de uma decisão arbitrai Esse o objectivo do capitulo IV, do qual constam, além do mais, a forma de constituição do órgão de arbitragem, os prazos, modo de funcionamento e força vinculativa das respectivas decisões Reside neste capítulo o aspecto mais essencial do sentido inovador de todo o diploma, que só por si bem justificaria a sua publicação
Segue-se, no capítulo V, a regulamentação da possibilidade de adesão às convenções por parte das entidades e organismos que não tenham participado na sua outorga e, no capítulo VI, o regime dos chamados despachos de
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regulamentação do trabalho, a proferir pelo Governo na ausência ou impossibilidade de convenção colectiva e sempre que os superiores interesses da economia e justiça social o justifiquem Matérias, uma e outra, de regulamentação já consagrada no sistema actualmente em vigor, embota por forma menos rigorosa
Finalmente, os capítulos VII e VII são dedicados as normas de fiscalização e penalidades e às disposições finais, merecendo especial relevo, de entre estas últimas, os preceitos relativos à determinação da data da entrada em vigor das convenções e despachos
3. Além da inovação que u simples sistematização representa, outros aspectos de sentido mais ou menos renovador justificam também uma referência, designadamente os relacionados com as seguintes matérias:
Objecto das convenções - De assinalar, a este respeito, o maior rigor com que se procura determinar os limites dentro dos quais se deve movimentar a negociação, individualizando quer os assuntos que a convenção não deve conter, quer os aspectos da relação de trabalho sobre os quais da não poderá deixar de se pronunciar
Incluem-se no primeiro objectivo as normas já mencionadas relativas ao gratamente menos favorável ao trabalhador, ao direito reservado ao Estado de coordenar e regular a vida económica da Nação, a regulamentação das actividades económicas e ainda à proibição de limitar a liberdade de trabalho ou impor a obrigatoriedade de filiação sindical.
Inserem-se na segunda preocupação, além dos preceitos também já sublinhados relativos aos factores a que se deve atender na regulamentação da remuneração do trabalho (necessidades do trabalhador, produtividade, possibilidade das empresas, desenvolvimento económico, etc. ), todas as normas constantes da secção II do capitulo II, que procuram enumerar das matérias a incluir, tanto quanto possível, nas cláusulas das convenções (âmbito e vigência, admissão e carreira profissional, direitos e deveres das partes, prestação do trabalho, retribuição, suspensão, cessação do contrato de trabalho, previdência, higiene e segurança, formação profissional, etc.)
Sujeitos - Quanto ao regime jurídico das partes, verifica-se não só uma mais cuidada individualização dos sujeitos que podem intervir na negociação e outorga das convenções (consagrando-se a distinção já clássica entre os «contratos» e os «acordos», consoante a convenção seja celebrada apenas por organismos corporativos ou por organismos sindicais e empresas), como também a marcada intenção de pôr termo a certas dúvidas ou incertezas do regime vigente, particularmente pelo que concerne a capacidade de negociação dos organismos corporativos intermédios (uniões e federações), cujo reconhecimento recebe expressa consagração legal
Negociações - Pode dizer-se que actualmente esta matéria da negociação se encontra inteiramente confiada às partes, sem quaisquer normas específicas de regulamentação
E conhecidos são os inconvenientes que daí derivam, geralmente traduzidos em excessivas demoras, injustificadas exigências ou ilegítimas recusas de negociação
O novo diploma procura, na medida do possível, pôr termo a esses inconvenientes, estabelecendo normas u que as negociações devem obedecer Estão neste caso os preceitos que obrigam a fundamentar devidamente as propostas e contrapropostas (qualquer que seja o seu conteúdo) e os que estabelecem prazos para a apresentação destas últimas e para a própria negociação no seu conjunto De salientar, por exemplo, que a ausência de resposta a uma proposta de negociação equivale a uma aceitação.
Também sob este aspecto as inovações introduzidas se podem considerar muito significativas
Conciliação - A obrigatoriedade da tentativa de conciliação quando a negociação não conduza a acordo constitui, como já se referiu, outra dos inovações importantes do presente texto, e nela muito se confia para a resolução pacífica dos conflitos
Em princípio, essa conciliação, para cuja realização se estabelece igualmente prazo, deve sei efectuada ou pela entidade designada na convenção que está a ser revista, ou pela corporação respectiva, e só em caso extremo pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência
Acrescente-se a este propósito que, embora não consagrada expressamente na lei, a tentativa de conciliação através das corporações tem do já muito utilizada nos últimos tempos, sendo de justiça reconhecer que algumas importantes convenções devem a sua assinatura a essa intervenção
Arbitragem - Complemento natural da tentativa de conciliarão, a arbitragem aparece no novo diploma como a inovação mais expressiva, pelas virtualidades que nela se contêm de definitiva resolução dos conditos Daí a importância que no texto legal lhe é atribuída e o cuidado posto na sua regulamentação
Em princípio, a arbitragem terá lugar quando da tentativa de conciliação não tenha resultado acordo, competindo a sua realização a um órgão constituído por três árbitros, dois designados por cada uma das partes e o outro (que presidirá) designado pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência de entre entidades de reconhecida competência, estranhas ao Litígio
Os árbitros poderão ser coadjuvados peritos e a sua decisão será tomada por maioria, ficando a respectiva obrigatoriedade dependente de homologação ministerial
Como já se acentuou, o processo de arbitragem constitui o objectivo essencial do diploma, em vista do qual todo ele foi concebido, pondo-se assim termo a uma situação legal, como a vigente, onde a preocupação legislativa de resolução pacífica dos conflitos se mostrava de certo modo inconsequente, por falta de um meio institucional com verdadeira capacidade de decisão, já que como tal não pode legitimamente considerar-se a faculdade de intervenção do Governo através dos despachos normativos de regulamentação do trabalho
Das duas soluções possíveis, o recurso à via judicial (v g tribunais de trabalho) ou à via arbitral, o legislador optou por esta última, dado o seu maior poder de adaptação ao condicionalismo técnico das intervenções e decisões a proferir, a semelhança, de resto, com o que sucede em muitos outros sistemas jurídicos
Entrada em vigor - Merece, finalmente, também uma referência a orientação consagrada no novo diploma com vista a determinação da data da entrada em vigor das convenções, decisões arbitrais e despachos de regulamentação do trabalho, que em princípio deverá coincidir com a data do Diário do Governo ou do Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, onde primeiro forem publicadas Nada impede, porém, que outra data seja estabelecida, reportando essa entrada em vigor a um momento ulterior, ou, se se tratar de salários e outros benefícios de natureza pecuniária, a um momento anterior (retroactividade)
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Estes OB aspectos mais salientes do presente texto legal, que pelo seu significado e alcance social bem justificam a amplitude e cuidado posto na sua regulamentação, pois deles muito se espera para a resolução dos mais graves conflitos sociais do nosso tempo - os conflitos emergentes das relações colectivas de trabalho
Nestes termos
Usando da faculdade conferida pela lª parte do n º 2 º do artigo 109 º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte
Regulamentado das relações colectivas de trabalho
(Regime jurídico das convenções colectivas e despachos de regulamentação do trabalho)
CAPITULO I
Disposições gerais
Artigo l º - l Sem prejuízo da regulamentação fixada na lei, a disciplina das relações colectivas de trabalho deve ser estabelecida em convenções colectivas de trabalho ou, na falta de acordo entre os interessados, por meio de decisões arbitrais
2 Sempre que o exijam os superiores interesses da economia e da justiça social, bem como na ausência de organismos corporativos que representem determinado sector de actividade económica ou profissional, essa disciplina poderá ser objecto de despacho de regulamentação de trabalho
Art 2 º As convenções colectivas, as decisões arbitrais e os despachos de regulamentação não podem contrariar normas legais preceptivas ou proibitivas, nem incluir qualquer disposição que importe para os trabalhadores tratamento menos favorável do que o previsto na lei
Art 3 º - l Às convenções colectivas e às decisões arbitrais é vedado
a) Contrariar de qualquer modo o direito reservado ao Estado de coordenar e regular superiormente a vida económica da Nação e de fiscalizar a observância das leis sociais;
b) Estabelecer qualquer espécie de regulamentação das actividades económicas,
c) Limitar a liberdade de trabalho e de escolha da profissão,
d) Impor a obrigatoriedade de filiação sindical
2 O disposto nas alíneas c) e d) aplica-se igualmente aos despachos de regulamentação
Art 4 º Na regulamentação da remuneração do trabalho tomar-se-ão em consideração, designadamente
a) As necessidades do trabalhador, de harmonia com a idade e a categoria profissional,
b) A natureza e o risco do trabalho prestado,
c) A produtividade do trabalho,
d) As possibilidades das empresas,
e) O nível de desenvolvimento económico-social do País,
f) Os interesses económico-sociais ao nível nacional,
g) As tendências dos níveis de remunerações praticadas em profissões similares e em outras actividades e regiões,
h) O valor da alimentação, habitação e de quaisquer outros elementos da retribuição paga em prestações não pecuniárias
Art 5.º - l O regime jurídico do trabalho estabelecido por qualquer dos modos indicados no artigo l º não pode ser afastado pelos trabalhadores, nem pelas entidades patronais, nos contratos de prestação de trabalho que entre si celebrem, salvo para estabelecer condições mais favoráveis aos trabalhadores
2 As entidades patronais não podem reduzir as remunerações ou outras condições de trabalho mais favoráveis que viessem praticando até à data do novo regime fixado por qualquer dos modos referidos no artigo l º do presente diploma
CAPITULO II
Convenções colectivas de trabalho
SECÇÃO I
Disposições gerais
Art 6 º - l As convenções colectivas de trabalho podem ser celebradas
a) Entre organismos corporativos representando entidades patronais e trabalhadores,
b) Entre empresas e organismos corporativos representando trabalhadores
2. A convenção designa-se «contrato colectivo de trabalho» quando é celebrada entre organismos corporativos e «acordo colectivo de trabalho» quando é celebrada entre organismos corporativos e empresas
3 A convenção revestirá dupla natureza quando nela outorgarem organismos gremiais e empresas
Art 7.º Podem outorgar nas convenções colectivas
a) Os grémios e suas uniões e federações, representando as entidades patronais, ou estas próprias consideradas singularmente,
b) Os sindicatos, Casas do Povo e Casas dos Pescadores e suas uniões e federações, representando os trabalhadores
Art. 8 º - l As convenções colectivas obrigam todas as empresas e todos os trabalhadores representados pelos organismos outorgantes, bem como, quanto aos acordos, as entidades patronais signatárias e aquelas que aos mesmos acordos venham a aderir.
2 As convenções colectivas celebradas por federação ou uniões terão o âmbito de aplicação correspondente aos organismos federados ou unidos que lhes tiverem dado a sua aprovação
Art 9 º As partes outorgantes nas convenções colectivas de trabalho têm obrigação de velar pela sua execução e colaborar no seu aperfeiçoamento e oportuna actualização
SECÇÃO II
Negociação e outorga das convenções colectivas de trabalho
Art 10.º - 1 A negociação e outorga das convenções colectivas de trabalho compete às direcções dos organismos corporativos e a administração das empresas que nelas intervierem
2 Se o organismo corporativo for um grémio, a outorga depende de aprovação pelo respectivo conselho geral ou, na sua falta, pela assembleia geral.
3 Se o organismo corporativo for uma federação ou uma união, a outorga depende de aprovação da direcção da maioria dos organismos federados ou unidos.
4. Uma representante da secção feminina dos organismos .«indicais interessados deverá acompanhar as nego-
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dações sempre que na convenção colectiva se pretenda inserir cláusulas sobre o trabalho de mulheres.
5 Sempre que as circunstâncias o justifiquem, a iniciativa das negociações poderá partir das corporações ou do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, bem como serem acompanhadas por estes organismos no seu desenvolvimento
Art 11º Às contenções colectivas conterão, tanto quanto possível, cláusulas sobre as seguintes matérias
I) Âmbito e vigência da convenção,
II) Admissão e carreira profissional,
III) Direitos e deveres das partes;
IV) Prestação de trabalho;
V) Retribuição do trabalho,
VI) Suspensão da prestação de trabalho,
VII) Cessação do contrato de trabalho,
VIII) Trabalho de mulheres, trabalho de menores, trabalho de idosos e diminuídos,
IX) Órgãos de colaboração,
X) Previdência e abono de família,
XI) Higiene e segurança no trabalho,
XII) Formação profissional,
XIII) Sanções,
XIV) Relações entre as partes outorgantes, XV) Disposições transitórias
Art. 12 º - 1. A proposta de negociação para celebração ou revisão de uma convenção colectiva de trabalho deverá ser devidamente fundamentada e será enviada pelo organismo que dela toma a iniciativa aos organismos e entidades com os quais pretende negociar.
2 Quando uma das partes outorgantes da convenção colectava de trabalho for constituída por mais de um organismo corporativo ou empresa, a proposta de revisão deverá, tanto quanto possível, ser subscrita por todos
3. Deverão ser enviadas cópias da proposta de negociação à respectiva corporação e ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência
Art. 18 º - 1 Os organismos corporativos, no caso de convenções, e as empresas, tratando-se de acordos, são sempre obrigados a responder à proposta de negociação, em termos devidamente fundamentados.
2 A resposta a que se refere o número anterior, quer contenha uma aceitação, uma contraproposta ou uma recusa, deverá ser enviada, dentro do prazo de sessenta dias, à parte proponente.
3 Dentro do mesmo prazo deverão ser enviadas cópias da resposta a corporação e ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência
4 Salvo o caso de prorrogação aceite pela parte proponente ou, na falta de acordo, devidamente autorizada pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, a falta de resposta dentro do prazo a que se refere o n.º 2 equivale à aceitação da proposta
Art. 14 º - l A negociação da convenção colectiva de trabalho deve ficar concluída nos seis meses seguintes à recepção da resposta a proposta de negociação.
2 Uma prorrogação, nunca superior ao período de tempo mencionado no número anterior, poderá ser estabelecida mediante autorização do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência
Art. 15.º - l As convenções colectivas serão remetidas em projecto ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência para o efeito de revisão
2. A revisão terá por objectivo a verificação da legalidade do conteúdo pactuado, e, sem prejuízo da autonomia contratual, a sua comparação com a regulamentação de profissões idênticas ou similares
Art 16.º No acto da outorga as partes deverão assinar tantos exemplares da convenção colectiva de trabalho quantos os outorgantes e mais dois Cada outorgante ficará com um exemplar, devendo os restantes, um dos quais redigido em papel selado, ser enviados ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, para efeitos de homologação, publicação e arquivo
Art. 17 º A eficácia das convenções colectivas de trabalho depende ao sua homologação pelo Ministro das Corporações e Providência Social
CAPITULO III
Conciliação
Art 18 º - 1. No caso de a negociação das convenções colectivas terminar sem acordo, bem como no caso de recusa a negociar, as partes deverão tentar obrigatoriamente a conciliação, salvo desistência fundamentada da parte proponente.
2 Para o efeito do disposto no número anterior, a parte proponente indicará por escrito as questões controvertidas e as razões invocadas em defesa dos pontos de vista controvertidos.
3 O documento referido no número anterior poderá ser substituído por um auto lavrado por acordo entre as partes, devendo um ou outro ser enviado, após a sua elaboração, à corporação respectiva e ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, qualquer que seja a entidade que, nos termos do artigo seguinte, proceda à conciliação
Art 19.º A conciliação a que se refere o n.º l do artigo anterior poderá ser realizada
a) Nos termos estabelecidos pela convenção colectiva em revisão,
b) Pela corporação que represente os principais interesses em causa, na falta ou no silêncio da convenção colectiva,
c) Pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, se não existir corporação, houver mais do que uma ou for impossível a sua intervenção
Art. 20º A tentativa de conciliação deverá realizar-se dentro do prazo de sessenta dias, a contar da data da nota ou do auto a que se referem os n.º 2 e 3 do artigo 18 º
Art 21º - l Finda a tentativa de conciliação, lavrar-se-á um auto de conciliação ou não conciliação, mencionando-se neste caso as razões por que as partes não chegaram a acordo
2 O auto de não conciliação deverá ser enviado à corporação no prazo de dez dias, se tiver sido outra entidade a tentar a conciliação
3 Do mesmo auto, em igual prazo, será sempre dado conhecimento ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência
CAPITULO IV
Arbitragem
SECÇÃO I
Procedimento arbitral
Art 22 º - l Sempre que da tentativa de conciliação não tenha resultado acordo, proceder-se-á obrigatoriamente, dentro do prazo máximo de trinta dias, à nomeação de árbitros
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2 O prazo a que se refere o número anterior conta-se
a) A partir da data do auto de não conciliação, quando esta for realizada pela corporação,
b) Findo o prazo de dez dias a que se refere o n.º 8 do artigo anterior, nos casos em que não tiver sido este organismo a entidade que tentou u conciliação
3 Para os efeitos do presente artigo, o processo deverá ser remetido ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, que promoverá todos as diligências necessárias
Art. 23.º - 1 A arbitragem será realizada por três árbitros independentes, dos quais o árbitro presidente será designado pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência e os árbitros vogais escolhidos um por cada uma das partes.
2 A designação do árbitro presidente deverá sempre incidir sobre entidade estranha aos interesses em litígio o de reconhecida competência técnica
3 Se uma das partes se recusar a escolher o seu árbitro, a designação será feita pela direcção da corporação respectiva
4 Havendo varios sindicatos ou grémios interessados nas negociações e não havendo acordo sobre a escolha do árbitro, a designação cabeia igualmente à direcção da corporação
Art. 24 º Os árbitros poderão ser coadjuvados por peritos, promover todas as diligências que entenderem convenientes e solicitar aos sei viços competentes do Estado e dos corpos administrativos, aos, organismos corporativos e de coordenação económica, as empresas e aos trabalhadores todos os elementos de informação de que necessitem
SECÇÃO II
Decisão arbitral
Art. 25.º - 1. A decisão arbitral deverá ser dada no prazo de trinta dias, a contar da data cia nomeação dos árbitros
2 Quando as circunstâncias o justificarem, o prazo referido no número anterior poderá ser prorrogado mediante automação do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência
Art. 26 º - 1 Quando não houver unanimidade entre os árbitros, a decisão será pronunciada por maioria, devendo constar da decisão o voto do árbitro vencido
2 A decisão arbitral será sempre justificada, o mesmo devendo suceder com o voto de vencido
Art. 27 º A decisão arbitral deverá, tanto quanto possível, inserir normas sobre as matérias a que se refere o artigo 11 º
Art. 28 º A decisão deverá ser comunicada ás partes e enviada ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência para efeitos de homologação, publicação e arquivo
Art. 29 º As cláusulas da decisão arbitrai e o regime de trabalho delas resultante não poderão abranger senão os trabalhadores e as entidades patronais representadas pelas partes que intervierem no litígio
Art. 30 º A decisão arbitrai, depois de homologada pelo Ministro das Corporações e Previdência Social, ficará a valer, para todos os efeitos, como convenção colectiva de trabalho
Art. 31 º O pedido do celebração ou revisão de uma convenção colectiva de trabalho considerado inoportuno na decisão arbitral só poderá ser renovado passado um ano após a decisão
CAPITULO V
Adesão as convenções colectivas de trabalho
Art. 32.º - 1 Os organismos corporativos e as empresas podem aderir às convenções colectivas de trabalho, produzindo essa adesão os mesmos efeitos da outorga.
2 A adesão deve ser requerida à Direcção-Geral do Trabalho e Corporações e só produz efeitos a partir do despacho que a autorizar
Art. 33.º - 1. Quando a adesão for solicitada por um organismo corporativo representante das entidades patronais ou por empresas, antes de proferido o despacho serão sempre ouvidos os organismos sindicais que hajam outorgado na convenção
2 De igual modo devei ao ser ouvidos os organismos gremiais ou as empresas quando a adesão for solicitada por sindicatos, suas uniões ou federações
CAPITULO VI
Despachos de regulamentado de trabalho
Art. 34.º - 1 Ao Ministro das Corporações e Previdência Social compete tomar a iniciativa dos despachos de regulamentação do trabalho referidos no n.º 2 do artigo 1.º
2 Os despachos poderão abranger todas as matérias susceptíveis de regulamentação em convenção colectiva, excepto nos casos em que a lei expressamente dispuser o contrário
Art. 35 º - 1 Os despachos de regulamentação do trabalho serão sempre precedidos dos estudos e inquéritos adequados, realizados pelos serviços competentes do Ministério das Corporações e Previdência Social ou por comissões técnicas nomeadas pelo Ministro, das quais poderão fazer parte representantes dos organismos corporativos interessados
2 Quando os despachos respeitem a empresas concessionárias dos serviços públicos, ou actividades sujeitas por lei a fiscalização especial do Governo, ou ainda quando a regulamentação a estabelecei se venha a reflectir, por forma acentuada, em serviços do Estado, das comissões técnicas deverão fazer parte representantes dos Ministérios interessados
Art. 36 º O Ministro das Corporações e Previdência Social poderá determinar, por despacho, a aplicação de todas ou parte das disposições de uma convenção colectiva ou decisão arbitral em vigor a actividades ou profissões idênticas ou similares não abrangidas por essa convenção ou decisão
CAPITULO VII
Fiscalização e penalidades
rt. 37 º - 1 Sem pi e juízo das sanções especialmente previstas na lei ou nas convenções colectivas de trabalho e despachos de regulamentação aplicáveis aos trabalhadores e às entidades patronais, as infracções por parte destas últimas às respectivas cláusulas serão punidas com multa de 200$ a 500$ por cada trabalhador em relação ao qual se verificar a infracção
2 As infracções às cláusulas que estipulem ordenados ou salários serão punidas com multa, que poderá ir até o montante das importâncias em dívida, quer respeitem à totalidade dos ordenados ou salários estabelecidos, quer apenas a uma parte destes, não podendo, em qualquer dos casos, a multa ser inferior a 300$
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3 Conjuntamente com as multas serão sempre cobradas as indemnizações que forem devidas aos trabalhadores prejudicados
4 As multas referidas no n º l podem ser elevadas ao dobro por meio da convenção, decisão arbitral ou despacho
Art 38 º - l Quando, no decurso de seis meses, se verifiquem por parte da mesma entidade patronal duas ou mais infracções idênticas punidas pelo presente diploma, observar-se-á o seguinte
a) A segunda e terceira infracções serão punidas com o máximo do multa,
b) As infracções posteriores serão punidas cora o dobro do máximo da multa
2 Sem prejuízo do estabelecido no número anterior, a multa será acrescida de metade do seu montante sempre que a infracção diga respeito a cláusulas que estipulem ordenados ou salários
Art 39 º - l Sempre que, no caso de violação de cláusulas de convenções colectivas, despachos de regulamentação de trabalho e decisões arbitrais, a entidade patronal use de coacção, falsificação, simulação ou qualquer meio fraudulento, será punida com multa de 2000$ a 50 000$.
2 Serão punidos com a multa de 1000$ a 10 000$ os netos preparatórios das infracções previstas no número anterior, quando a tal se limitem
Art 40 º Para o efeito de graduação das multas, atender-se-á à natureza e gravidade da infracção, a situação económica do infractor e ao número total de trabalhadores normalmente ao serviço deste
Art 41 º As multas previstos neste diploma e nas convenções colectivas de trabalho, nos despachos de regulamentação do trabalho e nas decisões arbitrais constituem receita das instituições de previdência dos trabalhadores abrangidos pelas referidas convenções, despachos e decisões, com destino aos respectivos fundos de assistência e na falta delas, ao Fundo Comum das Casas dos Pescadores, ao Fundo Nacional do Abono de Família ou ao Fundo Comum das Casas do Povo, consoante os casos e a natureza das actividades
CAPÍTULO VIII
Disposições finais
Art 42 º Os despachos de regulamentação de trabalho, as convenções colectivas e as decisões arbitrais, depois de homologados pelo Ministro das Corporações e Previdência Social, serão publicados no Diário do Governo ou no Bolaram do Instituto Nacional ao Trabalho o Previdência, cujos exemplares servirão de prova autêntica sempre que não se exibam os documentos originais
Art 43 º - l Os despachos de regulamentação de trabalho e os convenções colectivas e decisões arbitrais devidamente homologadas entrarão em vigor na data da publicação no Diário do Governo ou no Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Providência, conforme tenha sido feita em primeiro lugar naquele ou neste, salvo se outra data for estabelecida
2 As actualizações salariais e outras prestações de natureza pecuniária poderão ser acordadas ou determinadas para data anterior à da publicação
Art 44º Ficam revogados o Decreto-Lei nº 36173, de 6 de Março de 1047, o Decreto-Lei n º 32 749, de 15 de Abril de 1943, o Decreto-Lei n º 44 784, de 7 de Dezembro de 1962, e demais legislação complementar
Art 45 º O Ministro das Corporações e Previdência Social fixará por despacho os regras a observar pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência na aplicação das disposições do presente diploma
O Ministro das Corporações e Pie vidência Social, José João Gonçalves e Proença
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA