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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N° 124

X LEGISLATURA - 1972 16 DE NOVEMBRO

4.ª REUNIÃO PLENÁRIA, EM 15 DE NOVEMBRO

Presidente: Exmo Sr. Luís Supico Pinto

Secretários: Exmos. Srs.
Bento de Mendonça Cabral Parreira do Amaral
João Carlos Dias de Castro Reis

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 45 minutos.
Foi lida e aprovada, a acta da última, reunião plenária.
O Sr. Presidente recordou a actividade da Câmara, nas quatro décadas da sua existência e o espirito com que se tem desempenhada da missão que lhe cabe; homenageou os Dignos Procuradores que o antecederam na presidência da Câmara, bem como todos os Dignos Procuradores que a constituíram; referiu a, actividade na 3.ª sessão legislativa, manifestando reconhecimento pelos Dignos Procuradores que participaram nos trabalhos e, em especial, pelos que desempenharam as funções de relator: saudou os Dignos Procuradores Hermes Augusto dos Santos e José Hermano Saraiva, chamados a outras funções; recordou os Dignos Procuradores, antigos ou em exercício, falecidos, com especial referência para Fernando Emmgdio da Silva e Samuell Diniz; referiu o falecimento do embaixador Pedro Teotónio Pereira, homenageando a sua vida e obra; propôs que se exarasse voto de pesar por estes passamentos; cumprimentou o Chefe do Estado e associou a, Câmara à homenagem que S. Exa. prestou às forças armadas e a todos os portugueses que as ajudam no desempenho da sua missão; referiu o estreitamento das relações entre Portugal e o Brasil, o IV Centenário da Publicação de «0s Lusíadas» e o cinquentenário da travessia aérea, do Atlântico Sul; associou a Câmara e estas comemorações.
O Digno Procurador João Pedro Neves Clara fez algumas observações sobre a inserção das funções da Câmara no sistema polilico-constitucional vigente e também sobre as relações com as actividades económico-sociais corporaticamente integradas.
O Digno Procurador Pedro António Monteiro Maury fez algumas considerações sobre a posição actual e actuante da mão-de-obra nacional.
O Digno Procurador Luis Maria da Câmara Pina [...] algumas considerações sobre a Câmara Corporativa e referiu-se a três acontecimentos da vida nacional: cinquentenário da I Travessia Aérea do Atlântico Sul, comemoração da publicação de «Os Lusíadas» e eleição do Chefe do Estado.
Foram eleitos os Vice-Presidentes da Câmara para a 4.ª sessão legislativa e o 2.º Secretário da Mesa.

Às 15 horas e 15 minutos assumiu a presidência da Mesa o Sr. Presidente da Câmara, secretariado pelos Dignos Procuradores Bento de Mendonça Cabral Parreira do Amaral e João Carlos Dias de Castro Rei.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 16 horas e 16 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Dignos Procuradores:
Afonso de Oliveira Rego.
Agostinho Pereira de Gouveia.
Alberto Américo Campos Aço.
Alberto Andrade e Silva.
Albino Soares Carneiro.
Alexandre Aranha Furtado de Mendonça.
Alfredo Martiniano Carreira da Cunha.
Avaro Mamede Ramos Pereira.
Álvaro Rodrigues da Silva Tavares.
Álvaro Vieira Botão.
Aníbal de Oliveira.
Aníbal de Sousa Azevedo.
António de Agrela Gomes Loja.
António Aires Ferreira.
António Álvares Pereira Duarte Silva.
António Augusto Lopes Pacheco.
António Augusto Peixoto Correia.
António Cândido Figueiredo da Mota dos Santos Beirão.
António Costa Silva Carvalho.
António Ferreira Plácido.

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António Herculano Guimarães Chaves de Carvalho.
António Jorge da Silva Sebastião.
António José de Carvalho Brandão.
António José de Sousa.
António Manuel Pinto Barbosa.
António Martins Morais.
António Miguel Caeiro.
António Miranda Veloso.
António do Nascimento Pinto de Sousa.
António Pereira Caldas de Almeida.
António Pinto de Meireles Barriga.
António de Resende Vaiadas Fernandes.
António da Silva Rego.
António Simões Coimbra.
António de Sousa Pereira.
António Tierno Bagulho.
Armando Gouveia Pinto.
Arnaldo Irio Marques Sequeira.
Arnaldo Pinheiro Torres.
Artur Patrocínio.
Augusto da Penha Gonçalves.
Augusto de Sá Viana Rebelo.
Avelino Meira do Poço.
Avelino de Sousa Campos.
Bento de Mendonça Cabral Parreira do Amaral.
Carlos Augusto Correa Paes d'Assunção.
Carlos Figueiredo Nunes.
Carlos Garcia Alves.
Carlos Marques Mendes.
Carlos Saraiva de Campos.
Casimiro Rodrigues de Carvalho.
Celso Mendes de Magalhães.
David Ferreira de Assunção.
David Jacinto.
Duarte Amâncio Leal.
Edison Passos Pinto de Magalhães.
Eduardo Augusto Arala Chaves.
Emílio de Oliveira Mertens.
Ernesto Fernando Cardoso Paiva.
Fernando de Castro Fontes.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Fernando Gerardo de Almeida Nunes Ribeiro.
Fernando Guedes.
Fernando Ivo Coelho Gonçalves.
Fernando Lourenço Pereira.
Fernando de Melo Costa e Almeida.
Filipe César de Goes.
Francisco Dalva de Sousa Aragão.
Francisco Dias Barata.
Francisco Pereira da Fonseca.
Francisco Xavier Cabral Lobo de Vasconcelos.
Gentil Marques.
Henrique Martins de Carvalho.
Herculano de Amorim Ferreira.
Hugo Mascarenhas.
Inácio de Oliveira Camacho.
Jaime Furtado Leote.
Jaime dos Reis Simões Cordeiro.
Jaime Silva.
João Afonso Ferreira Dinis.
João António de Morais Leitão.
João Carlos Dias de Castro Reis.
João Henriques Dias.
João José Pessoa Trigo.
João Luís de Moura Botelho.
João Manoel Nogueira Jordão Cortez Pinto.
João de Matos Antunes Varela.
João de Paiva de Faria Leite Brandão.
João Pedro Neves Clara.
João Ubach Chaves.
Joaquim Lima Silveira Costa.
Joaquim Marques Alexandre.
Joaquim Trigo de Negreiros.
Joaquim Vicente Sampaio Freire Cardoso.
Jorge Augusto Caetano da Silva José de Melo.
José Abel e Lemos Pedroso Saphera Costa.
José Alberto de Carvalho.
José Alfredo Soares Manso Preto. José Augusto Vaz Pinto.
José Duarte Krus Abecasis.
José Ernesto Brigham da Silva.
José do Espírito Santo Silva.
José Estevão Abranches Couceiro do Canto Moniz.
José Frederico do Casal Ribeiro Ulrich.
José Gabriel Pinto Coelho.
José Honorato Gago da Câmara de Medeiros.
José Maria Caldeira Castel-Branco Mesquita e Carmo.
José Maria Pinto Soares.
José Marques.
José Nicolau Villar Saraiva.
José Rodrigues.
José Sequeira Marcelino. Leão António d'Almeida.
Lourenço Varella Cid.
Luís Borges de Castro.
Luís Maria da Câmara Pina.
Luís Supico Pinto.
Manoel Alberto Andrade e Sousa.
Manuel de Almeida de Azevedo e Vasconcellos.
Manuel Almeida Ferreira.
Manuel Alves da Silva.
Manuel António Fernandes.
Manuel Bernardino de Araújo Abreu.
Manuel Cardoso.
Manuel Cerqueira Pimentel.
Manuel da Conceição Mineiro Pessoa.
Manuel Ferreira da Silva.
Manuel Jacinto Nunes.
Manuel Joaquim Fernandes dos Santos.
Manuel José Dias Coelho da Silva.
Manuel José de Moura.
Manuel Maria da Silva Costa.
Manuel Mendes Leite Júnior.
Manuel Pereira Alves da Silva.
Manuel Ramos de Sousa Júnior.
Mário António Coelho.
Mário Arnaldo da Fonseca Roseira.
Mário Fernandes Secca.
Mário Inácio de Matos.
Mário Luís Correia Queiroz.
Mário Pedro Gonçalves.
Martinho Edmundo de Morais.
Nuno Henrique de Macieira de Vasconcelos Porto.
Pedro António Monteiro Maury.
Pedro Moura Brás Arsénio Nunes.
Raul Lino.
Rómulo Raul Ribeiro.
Salvador Gomes Vilarinho.
Sebastião Maria Vaz de Oliveira Louvada.
Serafim de Jesus Silveira Júnior.
Vasco Manuel Veiga Morgado.
Virgílio Lopes Veiga da Cunha Macieira.
Vítor Manuel Lemos Macedo da Silva.

O Sr. Presidente: -Estão presentes 149 Dignos Procuradores.
Está aberta a reunião.

Eram 15 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura da acta da última reunião plenária.
Foi lida.

O Sr. Presidente: - Os Dignos Procuradores sabem que a acta lida, como é costume, representa o resumo do que se passou na última reunião plenária; o relato integral foi então publicado nas Actas da Câmara Corporativa, n.° 79, de 16 de Novembro do ano findo, oportunamente distribuída pelos Dignos Procuradores.
Submeto os dois documentos à votação da Câmara.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como os Dignos Procuradores nenhuma objecção fizeram, considero-os aprovados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Dignos Procuradores: Iniciam-se hoje os trabalhos da última sessão legislativa da X Legislatura. Com a actividade do corrente ano completar-se-á um ciclo particularmente fecundo da vida da Câmara Corporativa, chamada com muita frequência a examinar, estudar e dar parecer sobre numerosos textos legislativos, alguns dos quais assumem a maior importância como instrumentos destinados à regulamentação da vida colectiva, ou até como documentos de uma evolução política caracterizada sempre pela atenção às realidades e pela observância dos valores fundamentais que se acham inscritos na Constituição e constituem a essência ideológica do Regime.
Irão assim contar-se, no termo desta sessão legislativa, quatro décadas, sobre a data em que a Câmara Corporativa surgiu pela primeira vez no quadro das instituições superiores do Estado. Não é este o momento adequado para fazer um balanço da obra produzida. As colecções do Diário das Sessões da Assembleia Nacional e das Actas da Câmara, que apenas reúnem pareceres finais e as memórias dos actos públicos, são suficientemente expressivas para dar a medida de quanto se realizou e, sobretudo, do estilo com que se trabalhou. Tarefas colectivas que sintetizam o labor das secções constituídas por pessoas de diversa formação e de sectores muito diferentes das actividades nacionais, os pareceres da Câmara apresentam contudo algumas características que a todas se podem considerar comuns: as mais salientes são, penso eu. independência das atitudes assumidas, sempre tão avessas às oposições sistemáticas como às congratulações oportunistas; a absoluta isenção, que sempre se verificou quer no plano dos interesses materiais, quer no das inclinações ideológicas; a objectividade no exame dos problemas, e o esforço de levar tão longe quanto possível o estudo das questões que com eles se relacionam, o que, em muitos casos, fez dos pareceres documentos inovadores, cuja consulta se tomou indispensável aos especialistas de mais de um domínio da ciência, da política e da técnica.
A importância e merecimento da obra realizada pela Câmara Corporativa desde o início do seu funcionamento das instituições por duas ordens de razões. As primeiras são as que se relacionam com o acerto da sua instituição. Restaurado em 1933 o funcionamento das instituições parlamentares, houve a preocupação de complementar a actividade do orgão da representação nacional com o trabalho de um outro órgão, especialmente incumbido da discussão informativa e correctiva dos textos submetidos ao debate da Assembleia Nacional. Por esta forma se evitarem muitos dos vícios revelados pelas anteriores experiências parlamentaristas e se pôde conferir ao trabalho de preparação e discussão da lei uma seriedade e uma objectividade que até então se não haviam verificado. A necessidade à qual se procurou fazer face pela criação da Câmara Corporativa constituía uma verdadeira carência, e por isso o novo órgão correspondia, como de facto correspondeu, a uma necessidade autêntica.
Mas existem outras razões que se impõe salientar. Quero referir-me em primeiro lugar à extrema dignidade e inteligência com que a Presidência da Câmara Corporativa foi exercida por quantos, antes de mim, ocupavam este lugar. Recordo hoje os nomes dos Presidentes que me antecederam, o General Eduardo Marques e os professores Domingos Fezas Vital, José Gabriel Pinto Coelho, Marcelo Caetano e Costa Leite (Lumbrales). Para todos vai o meu pensamento neste momento, com saudade para os que morreram, com respeito para os que felizmente, estão vivos.
Por mim nada mais tenho feito ao longo dos quinze anos que já levo de Presidente da Câmara Corporativa por voto generoso dos membros desta Casa, senão tentar suprir as minhas insuficiências e limitadas possibilidades através de um trabalho aturado e sério, buscando servir com zelo e dedicação, não recusando sacrifícios, e procurando, em todas as emergências, ser independente. recto e imparcial.
Estou certo de que a mim se seguirá quem esteja à altura de retomar uma tradição que, se não pode manter, ao menos me esforcei por não deslustrar.
E é, igualmente, acto de justiça referir-me a todos os antigos e actuais Procuradores, porque foi a sua actividade dedicada, a sua capacidade de trabalho em grupo, a sua presença e colaboração sempre prontas, mesmo nos momentos em que a pressão das tarefas exigia fadiga e sacrifício, foram essas qualidades, exercidas num quadro de trabalho silencioso e num ambiento do mais cordial entendimento, que constituíram o melhor alicerce do prestígio que esta Casa podo alcançar e manter ao longo destas quase quatro décadas da sua actividade.
Os actos muitas vezes repetidos acabam por formar tradições. E é já quase uma tradição, nestas palavras iniciais de cada sessão legislativa, fazer breve referência à actividade da Câmara no ano anterior e aos principais acontecimentos que, ao longo dele. se verificaram na vida nacional.
Tal como em outros períodos legislativos, o ano que terminou caracterizou-se, pelo elevado número de propostas e projectos de lei submetidos ao exame e informação da Câmara. Foram emitidos pareceres; a propósito do projecto de proposta do lei acerca da defesa da concorrência; da proposta de lei sobre a autorização das receitas e despesas para 1972 e respectivo aditamento; da proposta de lei sobre organização judiciária; do projecto de proposta de lei acerca do fomento industrial : do projecto do decreto-lei relativo ao regime de condicionamento do plantio da vinha; do projecto de decreto-lei sobre o estabelecimento das normas aplicáveis às sociedades comerciais: da proposta de lei referente ao emprego de trabalhadores estrangeiros: da proposta de lei sobre a revisão da Lei Orgânica do Ultramar: da proposta de lei sobre prestação de avales por parte do Estado; dos projectos de decreto-lei sobre prestação de subsídios ou gratificações previstos nas normas reguladoras dos contratos individuais de trabalho, e sobre o restabelecimento da co-educação no ensino primário e sua instituição no ciclo preparatório do ensino secundário, e, finalmente, da proposta de lei referente ao registo nacional de identificação. Para todos os Dignos Procuradores que tomaram parte nestes trabalhos vai o meu reconhecimento, que é particularmente vivo àqueles que, pelos seus pares, foram escolhidos como relatores, e sobre os quais recaiu o trabalho

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(...) mais árduo, por vezes só possível mercê de exemplar espírito de devoção às funções decorrentes dos mandatos.
Em consequência da remodelação ministerial de Agosto último, a Câmara Corporativa viu-se privada da colaboração do Digno Procurador Dr. Hermes Augusto dos Santos, chamado a ocupar o cargo de Secretário de Estado da Indústria. Também recentemente foi tomada pública a designação do Digno Procurador Dr. José Hermano Saraiva para embaixador de Portugal em Brasília e do Dr. Fernando Gerardo de Almeida Nunes Ribeiro para governador civil de Beja.
Foi notável a colaboração que estes Dignos Procuradores deram à Câmara, O Dr. Hermes dos Santos relatou brilhantemente o parecer sobre a proposta de lei referente no fomento industrial; o Dr. José Saraiva deixa o seu excepcional e multiforme talento ligado ao estudo e elaboração de muitos dos nossos pareceres, e o Dr. Fernando Nunes Ribeiro deu excelente contribuição aos trabalhos a que foi chamado a intervir.
Para todos eles vão as nossas respeitosas e amigas saudações, com os votos de merecido êxito no exercício dos altos cargos para que foram nomeados ou em que vão servir proximamente.
Desde a última reunião plenária faleceram ao Dignos Procuradores em exercício António Osório de Castro, Fernando Emygdio da Silva, Francisco José Vieira Machado, Francisco Xavier de Morais Pinto Malheiro, João Moitas Diniz, José Firmino Henriques, Miguel José de Bourbon Sequeira Braga e Samwell Diniz, e os antigos Procuradores Alexandre de Almeida, António Sobral Mandes de Magalhães Ramalho, António Maria Santos da Cunha, João Gonçalves Valente, Júlio da Cruz Ramos, Manuel Rodrigues Carpinteiro, Manuel da Silva Abril Júnior e Maria Luiza Ressono Garcia.
São nomes do maior relevo no mundo da política, da cultura, da técnica e da economia, e todos eles souberam servir a Câmara com competência, devoção e independência.
Entre os que a morte levou não se poderá estranhar que mencione especialmente os nomes do Prof. Fernando Emygdio da Silva, meu mestre e de inúmeras gerações na Faculdade de Direito, professor, académico e conferencista do maior valor; do Dr. Francisco Machado, personalidade vigorosa de estadista e de administrador, a quem o Governo e o ultramar ficaram a dever serviços inestimáveis, e do Sr. Samwell Diniz, que me deu, durante alguns anos, a mais preciosa e leal colaboração como 2.º secretário da Mesa.
Faleceu ontem e vai a enterrar esta tarde o embaixador Dr. Pedro Teotónio Pereira. Estava doente desde há alguns anos, sofrendo de um mal progressivo e incurável, mas nada fazia supor um fim tão próximo para uma vida que valeu a pena ser vivida porque constituiu um grande exemplo e foi altamente frutuosa para a Nação.
Primeiro Subsecretário de Estado das Corporações, Ministro do Comercio e Indústria, Ministro da Presidência, agente especial do Governo Português junto do Governo do generalíssimo Franco, embaixador em Espanha, no Brasil, nos Estados Unidos da América e em Inglaterra, Deputado à Assembleia- Nacional, Procurador à Câmara Corporativa, membro vitalício do Conselho de Estado, o Dr. Pedro Teotónio Pereira foi um homem superior e um grande português. Teórico do corporativismo, impulsionador da nova ordem corporativa, homem de vistas largas, criador de coisas grandes e novas, corajoso e rápido na acção, desinteressado, livre do pecado das ambições pessoais e das mesquinharias e rivalidades de campanário, ele foi um chefe em toda a acepção palavra, que serviu brilhantemente o País até ao limite das suas forças como um dos primeiros entre os melhores.
É com profunda emoção e a maior saudade que me curvo perante a memória do Dr. Pedro Teotónio Pereira, nesta Câmara Corporativa que ele ajudou a criar e tanto lhe ficou devendo.
Interpretando o sentimento da Câmara, manifesto às famílias enlutadas a nossa profunda mágoa e proponho se exare na acta um voto de pesar.
De entre os factos de maior projecção ocorridos durante o ano anterior e não directamente ligados à vida da Câmara, apenas farei referencia aos que se me afiguram do superior transcendência.
O primeiro é o da reeleição do Sr. Almirante Américo Tomás para a chefia do Estado.
Todos os Dignos Procuradores recordarão ainda as palavras da mensagem proferida na sessão conjunta da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa após ter prestado juramento como Chefe do Estudo. As dificuldades e contradições do tempo em que vivemos, os imperativos basilares que hão-de presidir à vida nacional foram aí apontados, a todos os portugueses, com limpidez inexcedível e impressionante sinceridade.
«Em nome da Pátria, que represento e consubstancio», afirmou então S. Exa., «é meu dever saudar desta tribuna, com toda a gratidão, os militares de terra, mar e ar que, ao longo de mais de uma década, têm sido exemplos sublimes e constantes de coragem, de abnegação e de amor ao seu país, saudação que envolvo todos os restantes portugueses, pretos ou branco;, que em Angola, em Moçambique ou na Guiné tom auxiliado devotadamente a acção dos militares».
E, um outro passo da mensagem:

A união multiplica a força, e nós carecemos dela, tonto como noutros momentos difíceis da nossa história, para vencer a crise em que nos debatemos. Unidos, conseguiremos defender-nos e progredir e, portanto, vencer - e continuar Portugal. [. . .] Se o meu apelo for ouvido, o que espero, se todos nos conservarmos perfeitamente unidos naquilo que fundamentalmente interessa à nossa terra, como é mister, deixaremos - todos - de nos sentirmos orgulhosamente portugueses, úteis à Pátria, em que nascemos e queremos constantemente progressiva e eterna.

Dignos Procuradores: Creio não me enganar quando penso que interpreto o sentimento unânime de todos os membros da Câmara Corporativa ao associar-me, com profunda sinceridade e emoção, ao voto e ao apelo do egrégio Chefe do Estado. Voto de solidariedade e homenagem às forças que, com intrépida firmeza, mantêm a bandeira da Pátria e os estandartes da civilização em todas as frentes; apelo de unidade a todos os portugueses, sem distinção de raça, de crença ou de ideologia, para que todos, abertos a tudo quanto nos une, surdos às insídias que dividem, possam, na unidade dos sentimentos fraternos, desbravar os caminhos em que a vida nacional há-de prosseguir e encontrar as respostas construtivas aos problemas e incógnitas que o tempo presente nos propõe.
O segundo facto a mencionar é o do estreitamento das relações de amizade entre Portugal e o Brasil. As duas nações lusíadas estiveram simbólicamente unidas em momentos de grande intensidade espiritual por ocasião das cerimónias de trasladação dos restos mortais do imperador Pedro I, que foi em Portugal el-rei D. Pedro IV.
Suponho que não tem precedente nem paralelo um tal episódio das relações diplomáticas entre duas

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(...) nações soberanas. O príncipe que nos destinos de ambas presidiu com a sua memória celebrada em uma e outra. E o penhor dos seus despojos consagra simbolicamente a profunda unidade de d uns nações que encontram na história o alicerce das convergências que as reúnem no presente e dos objectivos que as aproximam no futuro.
SS. Exas. o Presidente da República e o Presidente do Conselho deslocaram-se ao Brasil no quadro das cerimónias da trasladação, e as suas presenças, para além de constituírem a representação condigna do significado de tão singular momento histórico, foram mais um elo a robustecer a força da amizade entre Portugal e o Brasil.
Finalmente devo assinalar que decorre este ano o 4.º centenário da publicação da primeira edição de Os Lusíadas, efeméride que coincide com o cinquentenário da primeira travessia, aérea do Atlântico Sul, com a qual as asas portuguesas puseram mais perto as nações lusíadas dos dois lados do Atlântico.
As comemorações nacionais destes acontecimentos transcendem em muito o simples festejar de episódios gloriosos da história pátria. Mais que uma obra literária de génio, o poema de Camões é o cântico nacional em que se consagra a ideia de Nação, tal como hoje a sentimos, Nação dividida pela distância geográfica, mas unida pela força de uma vontade que o volver dos séculos só robusteceu. Quando relê Os Lusíadas, o homem de hoje apercebe-se da sua vocação de sempre; e é nas estrofes de Camões que ele encontra a expressão mais exacta de uma concepção nacional que, a partir da ocidental praia lusitana, enraizou nas vastas parcelas do mundo onde hoje se fala a língua portuguesa e se desfralda a bandeira de Portugal. Do mesmo modo, a viagem aérea do 1022 tem um sentido que se não confina à voragem épica dos aviadores que a realizou: se é certo que foi uma empresa temerária, produto da vontade férrea e do saber de Gago Coutinho e de Sacadura Cabral, o feito honrou o nome de Portugal e abriu novos rumos à navegação aérea, em sequência das proezas dos portugueses de antanho na descoberta dos novos mares e das novas terras até então desconhecidos.
Suponho poder afirmar em nome de todos que é neste espirito que a Câmara Corporativa comunga no júbilo nacional das comemorações.
Dignos Procuradores: Declaro abertos os trabalhos da 4.ª sessão legislativa da X Legislatura da Câmara Corporativa na certeza de que os mesmos serão profícuos para lustre desta Casa e proveito do País.

O Sr. Pedro Neves Clara: - Sr. Presidente. Dignos Procuradores: Ao pedir a palavra a V. Exa., Sr. Presidente. sou fundamentalmente motivado por esta finalidade: aproveitar o início dos trabalhos da última sessão legislativa para fazer algumas observações sobre a inserção das funções desta Câmara no sistema político-constitucional vigente e também sobre as suas relações com as actividades económico-sociais corporativamente integradas.
Antes de mais, porém, ao mesmo tempo que manifesto quanto honrado me sinto pelo facto de há largos anos ser membro desta Câmara, cumpro o grato dever de prestar justa homenagem ao seu Presidente.
Acima das diferenciadas e por vezes divergentes solicitações dos interesses representados nesta Câmara, tem-se erguido a figura do Dr. Supico Pinto que numa constante e lúcida acção coordenadora, em delicadas intervenções moderadoras, tem constituído garantia de trabalho eficaz e construtivo permanentemente desenvolvido no quadro das exigências do interesse nacional. E assim tem sucedido, mercê da sua esclarecida inteligência e bom senso, invulgar sensibilidade política e sentido das realidades.
Queira V. Exa., Sr. Presidente, aceitar uma sincera homenagem que se radica em firme admiração, fruto exclusivo de elementares exigências do sentimento de justiça, e a que por isso mesmo é alheia a amizade que generosamente me tem sido dispensada e de que muito me honro.
Numa ininterrupta sequência têm vindo a fazer parte desta Câmara homens representativos dos mais altos valores e expoentes na nossa vida política, económica e social, que por isso nela não podiam deixar de vincar o rasto dos seus reconhecidos méritos e qualidades. E assim tem efectivamente sucedido. Ninguém ignora [...] é reconhecido por toda a gente de boa fé, o alto nível e seriedade dos estudos e trabalhos que aqui têm sido realizados, como ninguém põe em dúvida a profunda contribuição que através dos mesmos tem sido dada para a resolução dos mais diversos problemas, com incidências em todos os sectores, da vida nacional.
Não obstante terem por aqui passado homens de divergentes ideários políticos, pode asseverar-se com verdade que esta Câmara, procurando movimentar-se numa perspectiva fundamentalmente de ordem técnica, conseguiu o difícil resultado de fazer superar as unilateralidades de diferentes correntes de pensamento, polarizando-as e operando a respectiva síntese num simples contexto de exigência do bem comum.
Sendo as coisas assim, não é de mais repetir como é sumamente honroso fazer parte de um órgão por tal modo prestigiado.
Reportando-me à ideia corporativa, desejaria fazer ainda breve apontamento. Não se trata, evidentemente, de algo com preocupações de índole doutrinária, de natureza jurídica ou política, mais apenas, muito singelamente, de notas avulsas que constituem parte do produto da reflexão de quem vive permanentemente absorvido pelas solicitações da acção prática e, portanto, com escassa margem de disponibilidade de tempo e de espírito para a especulação teórica e abstracta.
De há tempos a esta parte que se sente, que se fala e, digamos, que se reconhece a necessidade de um desejável sentido de evolução. Procura-se aperfeiçoar sistemas, completar estruturas, eliminar distorções, acelerar processos. Admite-se a existência de erros, o que se assinala porque, não obstante constituir elementar imposição do senso comum, nem sempre tem sido orientação praticada. No plano do Governo, poucos sito os seus membros que não tenham manifestado o desejo de recuperar atrasos, esforçando-se por tomar medidas adequadas ao desenvolvimento e progresso dos sectores cuja orientação lhes está confiada.
No plano das coisas corporativas, igualmente tem sido evidenciado o propósito de preencher lacunas, remediar omissões e fazer evoluir as instituições. Ainda recentemente o Decreto-Lei. n.º 390/72 de 13 de Outubro, procurou definir o estatuto geral dos organismos corporativos intermédios (federações e uniões).
Dentro de tal orientação e linha de pensamento, certamente que se não deixará, como se impõe, de meditar de novo determinados aspectos da estrutura e funções dos organismos corporativos de cume - as corporações. Só coisa diferente seria de estranhar.
Tratar-se-á, aliás, de simples corolário e aplicação das ideias dadas como boas no relatório da proposta de lei do Governo, através da qual se procurou providenciar no sentido de dar cobertura jurídica à constituição das corporações. Efectivamente, nesse relatório logo se apontou a necessidade de estar bem atento ao desenvolvimento da actividade dos novos organismos a constituir, por modo

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(...) a adaptá-los «progressivamente às necessidades que lhes cabe satisfazer» e levá-los «à defesa equilibrada dos interesses que integram», com a preocupação do assegurar o bem comum.
E que, como nesse relatório igualmente se assinalou, qualquer sistema político-social, mesmo quando alicerçado nas realidades da vida, não é coisa que se possa erguer de uma só vez, de um jacto e como um bloco, mas antes, diversamente, «se vai desenvolvendo e aperfeiçoando com o rodar dos anos e o esforço dos homens».
Decorridos dezasseis anos sobre o momento em que tais considerações foram feitas, ocorre naturalmente perguntar se as corporações carecem de aperfeiçoamento estrutural que lhes facilite a realização dos respectivos fins ou se as suas estruturas continuam a ser adequadas às necessidades actualmente sentidas.
A resposta a esta pergunta supõe, além do mais, que se tenham bem presentes os propósitos e finalidades associados aos mais altos organismos do sistema corporativo, ponto sobre o que é particularmente elucidativo aquilo que um determinada emergência escreveu o Prof. Marcelo Caetano:

... é a corporação que logrará legitimamente obter uma parcela do poder público para organizar, regulamentar, disciplinar, as actividades que reúne e engloba, punindo os seus desmandos, arbitrando as suas pendências, gerindo o seu património comum, representando-as na vida política e fazendo-as valer na legislação do Estado.

E também merece ser retida estoutra afirmação do actual Presidente do Conselho:

... a associação profissional e a corporação são o reduto em que o homem defende a sua personalidade e no mesmo tempo encontra o ampara necessário para multiplicar as suas forças na luta da vida moderna.

Deixando de parte outras incidências da concepção e propósitos atribuídos às corporações pelo Prof. Doutor Marcelo Caetano, recolho e assinalo como significativos pontos de referência extraídos do que fica transcrito, de um lado, a ideia de que é legítimo as corporações obterem «uma parcela do poder público» e, de outro lado, a ideia de que devem ser encaradas como constituindo o «último reduto em que o homem defende a sua personalidade e encontra o amparo necessário para multiplicar as suas forcas na luta da vida moderna».
Reportando-me ao primeiro dos referidos aspectos, pode pôr-se em relevo desde, logo a relativa falta de audiência directa das corporações, falta repetida e insistentemente lamentada nos mais variados sectores e emergências.
Direi, no entanto, que a pretendida audiência sempre será insuficiente, do ponto de vista dos princípios e no plano prático, para assegurar um mínimo razoável de participação no poder público, com significativos reflexos mis fundamentais actividades da legislação e administração do Estado.
Certamente que é altamente vantajoso o diálogo directo, regular e permanente entre o Governo e as corporações. Aliás, a defesa da iniciativa privada e a esperança que o Chefe do Governo nela deposita exige, como pressuposto indispensável, esse diálogo, que é o meio adequado e eficaz do mútuo esclarecimento e veículo de recolha de elementos, de enriquecimento de conhecimentos, com vista a decisões oportunas e ajustadas as realidades.
Por isso mesmo, ignorar a necessidade de tal diálogo é, do ponto de vista humano, frustrar o dirigente corporativo e, do ponto de vista institucional, aniquilar uma das dimensões que justificam a existência das corporações.
Mas se, como acentuei, a audiência das corporações não pode, só por si, concretizar adequada participação no Poder Público, também cumpre reconhecer, de outro lado, que essa participação, a nível mais profundo, não pode ser encarada na perspectiva individual das corporações, cada uma naturalmente ura tanto propensa a certa unilateralidade de juízos de apreciação, reflectindo o contexto específico e sectorial em que se insere.
Não pode mesmo ignorar-se realidade sociológica dos chamados grupos de pressão que em quaisquer quadros político-sociais sejam eles capitalistas ou liberais, fazem reflectir a sua força nos próprios órgãos institucionalizados de interesses.
Tais grupos como alguém observou, sugerem a ideia de «lutas travadas para tomar as decisões dos Poderes Públicos conforme nos interesses ou às ideias de qualquer categoria social».
Ora, tomando conhecimento absoluto da sua existência e até do seu mérito, pelo sentido de desenvolvimento que muitas vezes encerram, parece mais realista encará-los do frente, tratá-los com verdade e canalizar as forças de que são portadores para em conjunto servirem o bem comum.
Pois rotulemos os seus representantes, identifiquemos estes com os interesses que servem, em vez de, fingindo ignorar a sua existência, recearmos a sua influência em actos do Governo na tentativa de orientar o Poder, em atitude de certo modo semelhante à dos partidos que o tentam conquistar.
De qualquer modo, a aspiração à mencionada participação, com mais relevante significada, só se entende, por conseguinte, num plano em que possam ser confrontados os pontos de vista de todas as corporações na procura de soluções equilibradas em que sejam, ponderados todos os interesses e solicitações em causa, numa constante preocupação do respeito pelas superiores exigências do interesse público.
Tal síntese de solicitações e interesses não pode deixar de fazer-se no âmbito de um órgão próprio, que entre nós não necessita de ser inventado porque já existe precisamente, esta Câmara Corporativa.
Aliás, as exigências inafastáveis dos interesses económico-sociais são de tal ordem que, mesmo nos sistemas políticos que as pretendem ignorar em termos de organização, acabamos por encontrar assembleias consultivas de representação orgânica, como o Senado, previsto na Constituição Bávara do 1946, a Câmara Económica Superior da Benânia (Constituição de 1947), o Conselho Nacional de Economia e Trabalho da Itália (1943) ou o Conselho Económico e Social da Constituição Francesa de 1958, órgãos que citamos a título exemplificativo. A par destes, ainda encontramos assembleias deliberativas de representação orgânica, como o Senado Irlandês (1937), as Cortes Espanholas (1966), os vários Concelhos, Económico, da Educação e Cultura, para os Assuntos Sociais e da Saúde, da Organização Política prevista na Constituição Jugoslava de 1963, para não citarmos outras.
Nào nos permite o tempo que analisemos em profundidade as várias soluções adoptadas e apontadas.
No nosso caso o sistema corporativo é apresentado como meio de fazer a síntese equilibrada e eficaz das divergentes solicitações dos vários sectores da produção.
Dentro de cada sector essa síntese deve atingir a sua plenitude no plano mais elevado do sistema - ou seja nas corporações.

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No rigor lógico das coifas, a articulação dos interesses e solicitações que elas representam deveria reflectir-se no campo político, através de um órgão com esta mesma natureza política; por outras palavras: este órgão, no nosso caso a Câmara Corporativa, deveria ser dotada a traves de uma efectiva e operacional força política. Entende-se, todavia, que por não ser possível esperar a conciliação de interesses particulares ou mormente por considerações mais uma vez de natureza pragmática, que não vem ao caso pormenorizar, que neste campo a lógica não pode frutificar com todas as consequências que lhe estariam associadas. Mas, se se deve concluir que na realidade se não pode ir tão longe, parece, no entanto, certo e seguro que, embora tão só no plano consultivo, deve esta Câmara ter oportunidade de concretizar todas as virtualidades de acção subjacentes às estruturas que nela se integram.
Ora, tem de reconhecer-se que a circunstância de, em relação mesmo aos grandes problemas nacionais, não ser obrigatória a consulta, da Câmara não só amputa as suas potencialidades de acção, como pode deixar a descoberto a adequada tutela de legítimos interesses que no seu âmbito obtiveram o justo equilíbrio. Essa consulta daria, por outro lado, aos diversos sectores da Administração o sentido de urgência que a vida moderna das actividades exige nos mercados competitivos onde operam e reduziria a inércia, burocrática, ou de outro tipo, que atrasa a promulgação da legislação.
Melhor dito, o conhecimento público, através de consulta à Câmara, constituiria, quanto a nós, factor de aceleração de providências cuja urgência, face aos anseios de desenvolvimento, se não compadece com a quebra de ritmo ou de alteração de prioridades efectuada pelo Governo.
Certo, e com júbilo o acentuamos, que se tem notado uma evolução no sentido de lhe dar mais constante audiência, ao que, aliás, não deve sor alheio o facto, acima assinalado, de ao longo do período da sua existência ter demonstrado a sua alta capacidade de dar efectivas e válidas contribuições para o profundo esclarecimento dos problemas sujeitos á sua apreciação.
Em todo o caso, coerentemente com o que atrás afirmámos e correndo o risco de parecermos ambiciosos, julgamos que tal orientação deve ser estabilizada e institucionalizada, para o que se afigura dever ser tomada obrigatória a sua audiência em relação a todos os problemas ligados às actividades económico-sociais, quer ao conjunto, quer no que, embora de aspecto sectorial e nào seja adequado estudar em audiência directa, seja susceptível de provocar problemas de articulação a, nível global.
Sr. Presidente, Dignos Procuradores: A admiração que temos por esta Câmara levou-nos a louvar inicialmente as suas qualidades e as dos seus pares. E se em relação à primeira nada mais temos a dizer, teremos em relação a W. Exas. de acrescentar a da bondade de que acabam de dar provais pelo favor da vossa atenção.

O Sr. Pedro António Monteiro Maury: - Sr. Presidente, Dignos Procuradores: Quero em primeiro lugar saudar V. Exa. Sr. Presidente, o todos os Dignos Procuradores, que nesta Câmara representam os mais variados interesses nacionais.
Quero também augurar o maior rendimento e proveito aos trabalhos que hoje iniciamos.
Quero finalmente, testemunhar aos dirigentes do Ministério das Corporações e Previdência Social, que na- governação têm posto o melhor do seu esforço e do seu valimento, todo o meu apreço pelo extraordinário dinamismo que têm imprimido às suas múltiplas e profícuas acções e pedir-lhes que mantenham o mesmo espírito atento e disponível para a continuação do indispensável diálogo entre as duas forças - o capital e o trabalho.
E foi nesta linha de preocupações, que nos motivam e credenciam como representante do sector do trabalho nesta Câmara, que trazemos à consideração de W. Exas. umas tantas reflexões que nos pareceram oportunas de aqui pôr em comum, no momento em que se iniciam os trabalhos do último período da X Legislatura.
Po binómio que enunciámos, queremos destacar um factor que determina o justo equilíbrio entre os seus termos: o trabalhador.
Não faremos uma análise profunda do problema, que exigiria uma entrada em linha de conta com elementos de vária ordem, que o local e a ocasião não justificam. Faremos, apenas, umas tantas considerações sobre a posição actual e actuante da mão-de-obra nacional.
É frequente atribuírem-se aos problemas dos trabalhadores razões de ordem, puramente material. Ora, tais problemas não são apenas de ordem financeira, são muito mais profundos, tocando em aspectos de realização pessoal e humana com incidências especiais na própria dignificação individual, na vida espiritual, intelectual e moral e no enquadramento familiar do trabalhador. Para lá da formação no seio da família, completada pela formação e informação obtidas na escola e na oficina, cabe aos sindicatos, sem abandonarem a sua faceta reivindicativa, proporcionar aos trabalhadores a indispensável formação técnica - e por que também não a moral? - para a participação activa destes na vida sindical, empresarial e nacional.
Desejaríamos ver comprometidos nestes mesmos objectivos os sindicatos de todos os sectores, e não apenas alguns, os mais bem dotados ou de maior número de sócios. A tarefa não deve ser apenas de alguns, por muito grandes e bem apetrechados que se encontrem. E não nos convençamos que, isoladamente, se possa levar a efeito essa preparação, tão necessária à reforma das estruturas. Haverá que trabalhar em conjunto, com planos prévia e cuidadosamente discutidos e analisados, a nível nacional e com a perfeita noção de que, acima dos interesses parciais, existe um interesse colectivo que é de todos nós - a Nação. E nesta ordem comunitária de interesses, de deveres e de direitos que a reivindicação, a formação e a inserção dos trabalhadores na sociedade se devem processar.
E quando as partes intervenientes numa convenção colectiva de trabalho se debruçam em volta de uma mesa, e não de cada lado dela, quer na fase inicial da negociação, quer, posteriormente, na da conciliação, quer ainda na da arbitragem, para se alcançar um articulado válido e dignificante para ambas, estas não se deverão esquecer que estão a dar, em partes iguais, a sua contribuição para o bem comum, isto significará que, a par da mais justa e equitativa distribuição da riqueza, se pensou no indispensável incremento da produtividade, como meio desencadeador de toda uma política de justiça social e bem-estar económico.
Vem a propósito referir, como apontamento, como se tem processado a política de incremento da regulamentação das condições de trabalho que a Secretaria de Estado do Trabalho tem vindo a desenvolver. Celebraram-se no ano de 1971 cerca de 90 contratos colectivos de trabalho e 30 acordos colectivos de trabalho e promulgaram-se 20 portarias de regulamentação de trabalho. Em 1972, e até ao fim da 1.ª quinzena de Outubro, já haviam sido homologadas cerca de 70 convenções colec-

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(...) tivas de trabalho e promulgadas 10 portarias de regulamentação de trabalho.
E se estes números nào bastassem como indicativo do muito que se tem levado a termo neste domínio, acrescentaríamos a notícia do número de adesões, portarias de alargamento de âmbito e despachos normativos, que têm vindo a dinamizar nestes últimos dois anos toda a política de trabalho, como factor do desenvolvimento nacional.
Só num contexto de bem-estar social se podem verificar, numa linha harmónica de comportamento, níveis de salários de tendência ascensional, como tivemos ensejo do verificar em 1971 nos vários sectores da actividade económica. E é de referir que essa progressão de salários foi mais acentuada na agricultura do que na indústria e nos transportes, conforme mostram os índices publicados pelo Instituto Nacional de Estatística.
Essa elevação dos salários dos trabalhadores rurais continuou a intensificar-se durante o ano de 1971, tendo o índice do salários (variação em percentagem) alcançado +14,8 para o pessoal masculino, contra +13,6 em 1970. Nesta, variação terão, certamente, influído as transferências de mão-de-obra para os centros urbanos e a emigração para o estrangeiro, que, no entanto, decresceu em 1971, conforme se pode verificar pelo exame dos elementos das contas públicas desse ano, apresentadas pelo Ministério das Finanças.
Quanto aos salários dos profissionais da indústria e dos transportes, o índice referente a Lisboa mostrou um abrandamento ( +10,7 em 1971, contra +11,8 em 1970). No Porto nào se verificou qualquer abrandamento; pelo contrário, a taxa de acréscimo passou de +10,5 em 1970 para +13,3 em 1971.
E, se estes acréscimos não tiveram a devida protecção, tal facto parece dever atribuir-se ao agravamento do custo de vida, que, até agora, foi impossível deter. Esperemos que as medidas anunciados pelo Sr. Ministro das Finanças e Economia consigam fazer sustar a inflação.
«Nós, em Portugal», disse o Sr. Prof. Marcelo Caetano em 15 de Julho de 1970, «queremos sindicatos activos, grémios operosos, corporações prestigiadas, queremos que se melhore o aperfeiçoe cada vez mais a distribuição da riqueza e dos seus lucros, mas não podemos agir imprudentemente. Porque, se não tivermos em conta as possibilidades das empresas, em particular, e da economia nacional, em geral, arriscamo-nos a obter efeitos contrários aos desejados. Aquilo que foi primeiro apresentado como grande vitória pode ser depois um factor de crise e de aflição.
Todos compreenderão, perfeitamente, que para o Governo não há nada mais agradável do que espalhar benefícios entre os cidadãos e facilitar a satisfação dos seus desejos. Se em certos casos os governantes aparecem a travar entusiasmos, a proferir palavras de moderação e a dizer mesmo, com firmeza, que não pode ser, não é por maldade dos homens, mas porque lhes é forçoso atender a muitos aspectos que os interessados esquecem e que impõem essa prudência e essa decisão.
Não falo já - continua a afirmar o Sr. Presidente do Conselho - naqueles casos em que certos agitadores põem a correr pretensões exageradas, cuja satisfação eles sabem perfeitamente ser impossível, apenas com o intuito de criar mal-estar e revolta no seio de uma classe.
O bom senso dos trabalhadores portugueses saberá distinguir entre o que é justo e o que não passa de pretexto subversivo.»
E ao bom senso - dizemos nós - se há-de continuadamente fazer apelo, e cada vez mais, quer para a conveniente formação de dirigentes corporativos - gremiais e sindicais - , quer para a valorizarão individual de todos os que trabalham, para que possamos, nesta arrancada do social, contar com elementos válidos, competentes e abertos ao diálogo, que se impõe que venha a existir entre todos, homens conscientes da sua posição na sociedade, que possuam urna formação e informação autênticas e positivas, que os leve ao sentido profundo do dever, permitindo que sejam, efectivamente, gestores dos seus bens.
E que, além da gestão dos organismos primários, pedra basilar de toda a organização social, convirá não esquecer a representação dos seus dirigentes nos organismos de grau superior e na previdência, onde ó indispensável contar-se com elementos do qualidade que possam assegurar uma boa gestão das instituições, não só no campo administrativo, tão necessário ao bom alinhamento das estruturas, mas também no campo financeiro.
Dos representantes dos organismos primários, diremos que não devem limitar-se no mero assento nas reuniões das direcções das Instituições do seguro social. Devem afectiva e conscientemente acompanhar o estabelecimento das suas estruturas, inserindo-se nos circuitos do trabalho, dando um contributo válido, com o seu saber e experiência, para a esquematização e organização dos serviços. Só assim poderão, quando da deliberação, como directores, tomar posição em defesa dos interesses que representam. E para que essa gestão seja profícua, em defesa dos interesses dos beneficiários activos hoje, e reformados amanhã, não devem os seus representantes permanecer alheios à aplicação dos fundos das instituições, mas preocuparem-se com a rentabilidade do património com vista à melhoria dos benefícios imediatos e a médio e longo prazo.
Para isso há que formar e informar esses dirigentes levando-os à frequência de cursos, de seminários e de colóquios especializados, para que, além de uma constante e permanente actualização, tomem conhecimento dos mais elementares princípios de gestão. Só deste modo a gerência muitas instituições, que hoje vivem, por vezes, os soluços e orientadas por quadros administrativos meramente burocráticos, passaria efectivamente a ser um todo articulado e harmónico dentro da organização social.
As instituições de previdência, com os seus orçamentos de gerência e de investimentos próprios, deveriam ter como que empresas públicas, enquadradas num planeamento geral, mas sempre condicionadas ao principio de que cada instituição tem a sua própria dimensão e os seus próprios problemas.
Chegámos ao fim das nossas reflexões. Aqui as deixamos à consideração desta Câmara, de seu nome próprio Corporativa, porque nela têm assento os homens das corporações.
Terminamos com uma afirmação: «Renovação na continuidade». palavra de ordem, tantas vezes evocada. Pois também aqui a apontamos, não como mera citação, mas como palavra cheia da vida que desejaríamos ver insuflada nos homens e nas instituições que, para continuarem vivos, necessitam de vida renovada.

O Sr. Luís Maria da Câmara Pina: - Sr. Presidente, Digníssimos Procuradores: A Câmara Corporativa é um verdadeiro órgão de representação nacional.
Instituição em funcionamento permanente. «Câmara para reflexão», como alguém lhe chamou, habilitada já pela Constituição a sugerir ao Governo, durante a sessão legislativa da Assembleia Nacional, as providências que

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(...) julgue convenientes ou necessárias, congregação de personalidades especialmente representativas das actividades da Nação e dos seus profundos interesses sociais, não pode hoje ser considerada, estàticamente, apenas como um agregado de técnicos que informam com independência científica, porém isolados no domínio próprio, os problemas que lhe são postos, mas antes, dinâmicamente, como um sistema de células diferenciadas, de pequenas «faculdades», designadamente organizadas, em função de cada caso concreto, centradas na secção que representa o interesso dominante, empenhadas no exame multifacetado das questões, a fim de aconselharem a solução que melhor conjugue a realidade com o propósito.
Constitui assim, um autêntico corpo político, por nele se integrarem, na sua individualidade, mas em articulação harmoniosa, os elementos estruturais da Nação.
Portugal vive claramente, em regime de República Corporativa.
De resto, nota-se no Mundo certa tendência para a representaçào, em assembleia própria, de interesses sociais organizados, mesmo sem curar de discutir se formam corporações e, neste caso, qual o número sociològicamente admissível.
Recentemente, em Outubro findo, o presidente da Comissão da Defesa Nacional dá Assembleia Nacional francesa reconheceu publicamente a necessidade de se reformarem em profundidade as instituições políticas, aliás com pontos de semelhanças com as nossas, que, todavia, lhes são muito anteriores, e apresentou um projecto em que na parte que directamente nos interessa, se preconizava a transformação do Senado numa «assembleia económico-social» que representaria os meios «sócio-profissionais».
Não terá, por ora, viabilidade esta reforma, mas o projecto foi aprovado par 80 Parlamentares - e a ideia da transformação do Senado já havia sido aceite pelo general De Gaulle.
A actividade da nossa Câmara Corporativa, que na 1.ª quinzena de Novembro comporta 215 Procuradores, dos quais 75 por cento são eleitos e 25 por cento nomeados, quase todos estes defendendo interesses públicos sem representação especificamente orgânica, abrangeu na presente legislatura os grandes problemas, quer no campo nacional, quer no campo internacional, que levaram o Governo a definir novas linhas de acção - e traduziu-se em pareceres que se distribuem: pelo sector económico, 44,1 por cento; pelo sector político, 35,1 por cento; pelo sector militar, 2,3 por cento, e pelo sector cultural, 18,6 por cento, cobrindo assim todo o espectro dos diplomas que lhe foram submetidos.
E, pois, digno e justo e razoável que a Câmara Corporativa, sempre tão empenhada em analisar as grandes questões nacionais e tão atenta a explicitar o alcance e as repercussões das providências legislativas, se reúna de quando em vez em plenário e, em encontro de todos os Dignos Procuradores, examine, sugira, aponte alguns dos caminhos que melhor permitirão atingir os altos objectivos nacionais.
E é salutar que no início de cada sessão legislativa, como norma, se efectue uma reunião plenária pública em que, na expressão feliz do Doutor Marcelo Caetano, a Câmara se apresente como corpo político perante a Nação.
E dentro desta ordem de ideias e neste enquadramento patriótico que me permito destacar no ano corrente, e como estímulo da sessão legislativa que hoje se inicia, três acontecimentos fudamentais: o cinquentenário da primeira travessia aérea do Atlântico Sul, a comemoração da publicação de Os Lusíadas e a eleição do Chefe do Estado.
1. A primeira travessia aérea do Atlântico Sul ilustra, nos nossos dias, e repete o dom de os Portugueses abrirem novos caminhos no Mundo.
Foi uma lição, ao vivo, do que pode a competência, a tenacidade, o destemor, do que consegue a firmeza na marcha para o objectivo, do que exalta e faz triunfar os homens, cora sentido de missão - lição que, no tempo, levou a delírios de entusiasmo a mocidade das duas margens do rio Atlântico.
Urge que essa lição seja continuamente ensinada aos jovens de hoje - que a devem trazer no espírito e no coração e, por sua vez, transmitir.
Vivíamos nós, os Portugueses, em época de apagada a vil tristeza: no ano de 1922 talvez só tivéssemos motivos de descrença - dominava a mediocridade mole com assomos de violência descontrolada.
Gago Coutinho e Sacadura Cabral não se deixam contaminar pelo desalento do ambiente.
Sonham com um feito glorioso: a travessia aérea do Atlântico Sul por ninguém ainda tentada.
E despertam virtualidades e potencialidades insuspeitadas.
Organizam a sua viagem com meticulosidade, prevendo, calculando, ensaiando - não se fiando em improvisações ou acasos felizes. Trabalham com espírito científico. Procedem como os grandes navegadores portugueses de Quatrocentos e de Quinhentos: estudam e experimentam. Preparam-se afincadamente, atentos a todos os pormenores.
E reunidas as condições de humana certeza, lançam-se na aventura - conscientes do risco mas confiantes no êxito.
Nacionalmente ganharam horas o que anos iam perdendo.
Cabe realçar agora novo aspecto do empreendimento.
Não é por acaso que a travessia aérea do Atlântico Sul se faz de Lisboa para o Rio de Janeiro. Ela podia ser tentada entre outros dois pontos quaisquer - talvez até mais favoráveis sob o ponto de vista das condições técnicas do voo e da resistência do frágil hidroavião.
Mas não importava apenas uma solução, puramente científica, do problema da travessia aérea: importava uma solução portuguesa, uma solução em que se conjugassem interesses científicos e interesses nacionais.
Lisboa e Rio de Janeiro eram os dois pólos da comunidade luso-brasileira e o avião reforçou o que os navios já materialmente haviam ligado: apertou-se mais a teia de sentimentos e tradições, de pensamento e de linguagem, de crenças e ideais, que envolve os dois países, e avivou-se mais a convicção de que Portugal e o Brasil, irmanados com inteligência, poderiam vir a ser, à escala mundial, um factor de progresso, um centro de decisão, um pólo de civilização.
Gago Coutinho e Sacadura Cabral são exemplo para Portugueses e Brasileiros, inscrevem-se na galeria dos varões ilustres, revelam as qualidades mais nobres do homem.
E do seu feito ressaltam, como estrelas a guiarem-nos o caminho, a consciência na preparação e na organização, a audácia reflectida, que é a prudência, o dom total da vida a um ideal - que é deles e da Nação.
2. O 4.° centenário da publicação de Os Lusíadas.
A publicação de Os Lusíadas marca um cume na história da Nação Portuguesa.
O poema, no seu valor literário, como pura obra poética, alinha na maior altura do que a Humanidade tem pro-

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(...) duzido em poesia e maravilhosamente caracteriza, exprime e revela esse fluir de emoção que é a essência da própria, poesia.
Abre novas portas para a sensibilidade do tempo, rasga janelas que enchem de luz a Europa, anuncia o homem moderno, o luso-tropical, e aos ciardes da nossa epopeia profetiza um mundo novo, o «mundo que o Português criou».
Dessa época da Renascença, em que tudo vibra em frémitos criadores, só Camões, sobranceiro príncipe de poetas, transpõe os séculos e vive em modernidade e em universalidade a sua exaltação épica.
Atestam-no singelamente, sem tormentos de exegese literária, as múltiplas edições de Os Lusíadas que se fizeram e continuam ainda a fazer-se em todos os continentes e em todas as línguas, do latim ao dinamarquês e sueco, do francês ao inglês e alemão, do polaco e do holandês ao chinês, ao russo, ao japonês.
E é de notar que é tal a força de irradiação do poema, que a primeira tradução aparece em espanhol, em 1580, logo seguida por duas outras, também em espanhol e por espanhóis, em 1591 e 1595 - num período em que não se vê que convenha a Castela realçar aos olhos das suas gentes à fama dos feitos e das glórias dos Portugueses.
Mas, para além da opulência cultural do poema, que é imensa, inexaurível e rutilante, o que mais importa talvez sublinhar perante a Câmara é a sua característica de «documento da nação», de autêntico, «foral da nação», que se reveste de inestimável valor para a Pátria Portuguesa.
Nascido o Estado por decisão e vontade de alguns homens bons do Condado Portucalense, avivada a solidariedade das populações e alargado e fixado o território, aparecida uma língua própria em menos do um século decorrido da independência, agitam-se as primeiras aspirações colectivas e adquire-se a consciência de estar em marcha uma empresa comum; a crise de 1383-1385 manifesta e faz triunfar, o que hoje chamaríamos «sentimento nacional»; os Descobrimentos e a expansão, o contacto com novas gentes e o povoamento, de novas terras, ao serviço de Deus, criam o sentido de missão - e a Nação surge, afirma-se e resplandece.
Estreitam-se os laços de fraternidade humana: o mandamento é que, nas cinco partes do Mundo, cada homem, gentio, ou cristão, possa ver em cada português um semelhante:

Que por irmão te tenha e te conheça.

Dilatam-se os empreendimentos, os compromissos, as garantias. Arrisca-se a aventura. Difunde-se a língua. A nada se recusam ou poupam os Portugueses, a tudo se' atrevem mas
[...] nenhum grande trabalho os tira
Daquela Portuguesa alta excelência
De lealdade firme e obediência.

A Nação engrandece-se, refulge - e recorta, gloriosa, a sua presença no Mundo.
Os Lusíadas contam, exaltam e publicam este afazer quotidiano - que é a teia da Nação; inscrevem deveres e sujeições; obrigam para o futuro. São, em verdade, o foral da Noção Portuguesa.
3. A eleição do Chefe do Estado é em todas as repúblicas, um facto de importância capital pleno de significado e de múltiplas incidências.
Durante o período eleitoral faz-se uma reflexão sobre todos os acontecimentos provocados pelas forcas políticas, uma autêntica revisão de vida, e definem-se posições que levam à mudança ou à confirmação da orientação que estava a seguir-se.
O Chefe de Estudo eleito será o garante da nova linha de acção - o responsável pela criação das condições para que ela abra outro caminho ou prossiga na direcção geral do caminho anterior.
Nos países em que a eleição se faz por sufrágio directo, o encontro das opiniões, a contestação dos procedimentos, o desencadear das paixões, provocam uma agitação e uma intranquilidade que, por vezes, paralisam o funcionamento normal da governação ou levam o governo do dia a tomar atitudes mais favoráveis ao interesse de facção do que ao interesse real do Estado.
Nos países em que a eleição se faz por intermédio de um colégio eleitoral, a oposição das ideias, a discussão das personalidades, o choque dos desacordos, decorrem em ambiente mais sereno e mais propicio n» trabalho regular da máquina do Estado.
Em Portugal, cujo território se compreende na Europa, na África, na Ásia e na Oceânia, não aparece adequada a eleição do Chefe do Estado por sufrágio directo: um colégio eleitoral, como o que a Constituição prescreve, traduz mais fielmente o diagrama das linhas de força do conjunto, dá uma imagem mais nítida da colectividade, é mais responsável - a representação da Nação é mais profunda e mais verdadeira.
Na eleição para a chefia do Estado, que se realizou no dia 25 de Julho passado e em que a Câmara, como tal, participou, o colégio eleitoral era composto por 669 eleitores: foi eleito o Sr. Almirante Américo Tomás com 95,5 por cento de votos - o que representa praticamente uma unanimidade.
A Nação pela voz dos seus legítimos representantes confirmava a directriz da política a seguir e manifestava confiança absoluta na isenção, na inteireza, na fidelidade da personalidade escolhida e na sua entrega total aos deveres e às imposições do cargo.
O seu juramento perante a Assembleia Nacional e a Câmara Corporativa em sessão conjunta, sobretudo quando afirmou com veemência «sustentar e defender a integridade e a independência da Pátria Portuguesa», soou como uma certeza a que os factos haviam de obedecer - e todos nós sentimos que o juramento ligava os Portugueses numa causa comum.
Estávamos perante um chefe.
Mas estávamos também perante um homem, um português, simples, directo, verdadeiro.
A Câmara perdoar-me-á que destaque, na mensagem que o Chefe de Estado dirigiu à Nação em 9 de Agosto último estas palavras tão impregnadas de sinceridade e tão reveladoras de uma consciência límpida:

Continuarei fiel ao meu pendor para a bondade, sem hesitar no uso da firmeza, quando ela se torna necessária. E não olvidarei que a bondade não significa abdicação, nem a firmeza implica, necessariamente, violência.

Por mim, que creio firmemente que uma longa permanência na chefia do Estudo é uma condição de paz, de tranquilidade na ordem, no dizer de Santo Agostinho, a reeleição do Sr. Almirante Américo Tomás confirma-me na esperança de que Portugal está no caminho certo.
A Noção é uma exigência permanente - na tensão do esforço, na fidelidade aos objectivos, na constância do ideal.
A Câmara na Sessão transacta, teve sempre presente no seu espírito a situação no ultramar - e para ela sempre elevou o seu pensamento.

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No início desta sessão legislativa a limiar dever prestar homenagem aos que se batem, nos que lutam, tios que sofram por militar portuguesa a terra português"- aos que este em guerra para montar a paz.

Portugal desde os seus começos de pais e independente caldeou variadas, incorporações ou gentes diferentes, com muitos povos cruzou o seu sangue: a Nação Portuguesa resultou destas múltiplas relações, marcadamente na sua flexibilidade e adaptabilidade.

Relacionar é. sem dúvida, unificar.

E se "a união faz ser", no conceito do Pére Teilhard de Chardin a verdadeira união também diferencia e por consequência não sirrpreondi1, antes se considera sinal de vida e que não surpreende que Portugal faz ser, e é, os elementos componentes e manifestem com características mais própria" ou vinguem tem traços mais específicos, embora todos em vivência portuguesa.

Numa era, de blocos, de comunidades de federações a Nação Portuguesa. representa à escada humana num uma solução original e grandiosa - que como tal é imprescindível à comunidade luso-brasileira para a converter num dos grandes centros de decisão no mundo.

Mas a Nação Portuguesa e hoje uma nação contestada.

Não se negue o facto sem razão, sem base, sem justificação, a afirmação permanente.

Quando a última Guerra Mundial tudo abalou e algo fez ruir ... ilegível.

Então amigos e inimigos, aqueles talvez escandalizados pelo êxito da solução portuguesa, estes por sanha destruidora, lançaram à Nação um repto - e é a esse repto que temos vitoriosamente de responder, em plebiscito quotidiano.

A última geração consumiu-se a arrumar e a administrar o País que a geração precedente havia limpado do desvario político, da irresponsabilidade, da desorientação.

Há gerações que na sua queda arrastam as pátrias mas também há gerações que num arranque as salvam.

Cabe às gerações presentes, sobretudo à mocidade de aquém e além-mar, o sonho, quantas vezes a realidade é melhor do que o sonho!, de encher de portugalidade o espaço português e de projectar no inundo um Portugal próspero, em contínua promoção social, COPSO, triunfante.

A empresa é portentosa - mas a Pátria reclama-a.

Lancemo-nos ã tarefa sem hesitações, com entusiasmo, em doação total - e "que os muitos, por ser poucos, não temamos" é certeza patente que, se formos mudos, todos seremos bastantes.

Vai no peito e na raça.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, vai passar-se;

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Nos termos regimentais, vai proceder-se à eleição do 1.º e 2.º vice-presidente da Câmara corporativa. Eleger-se-á também o 2.º secretário da Mesa, cargo vago pelo passamento do Digno Procurador Samuel Diniz.

Vou interromper a reunião por cinco minutos.

Eram 17 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: -Está reaberta a reunião. Vai proceder-se à chamada para: a votação.

Faz-se a votação.

O Sr. Presidente:-Está terminada a votação. Vai proceder-se ao escrutínio. Convido para escrutinadores os Dignos Procuradores Armando Gouveia Pinto e Inácio de Oliveira Camacho.

Procedeu-se ao escrutínio.

O Sr. Presidente: - Vou dar a conhecer o resultado das eleições. Deram entrada na urna 135 listas, e foi eleito com 135 votos, para 1.º vice-presidente o Digno Procurador Luis Frederico do Casal Ribeiro Ulrich; para 2.º vice-presidente foi deito, com 131 votos, o Digno Procurador Luís Maria da Câmara Pina: para 2.° Secretário foi eleito, com 133 votos, o Digno Procurador Pedro António Monteiro Maury.

Se mais ninguém deseja fazer uso da palavra, vou encerrar a reunião.

Pausa.

Está encerrada a reunião. Eram 18 horas.

Dignos Procuradores que faltaram à reunião:

Adelino da Palma Carlos.
Adérito de Oliveira Sedas Nunes.
Afonso Rodrigues Queiró.
Aires Francisco Nicéforo de Sousa.
Alberto Sena da Silva.
Albino André.
Álvaro Braga Vieira.
André Delaunay Gonçalves Pereira.
Aníbal Barata Amaral de Morais.
Aníbal da Cunha Belo.
António Afonso Amaral.
António Augusto Pessoa Monteiro.
António Duarte.
António Jorge Martins da Motta Veiga.
António Júlio do Castro Fernandes.
António Maria de Mendonça Lino Netto.
António Rodrigo Luís Gonzaga.
Armando Estácio da Veiga.
Armando Manuel de Almeida Marques Guedes.
Armando Pires Tavares.
Arsénio Luís Rebello Alves Cordeiro.
Bernardo Viana Machado Mendes do Almeida.
Carlos Eugênio de Magalhães Corrêa da Silva.
Carlos Krus Abecasis.
Datuel Duarte Silva.
Diogo Freitas do Amaral.
Domingos Maurício Gomes dos Santos.
Eduardo Mendes Barbosa.
Eugênio Queiroz de Casko Galdas.
Fernando de Carvalho Seixas.
Fernando Casimira Pereira da Silva.
Fernando Manuel Gonçalves Pereira Delgado.
Fernando Nuno Martins da Cunha.
Francisco José Martins Mendes Furtado.
Francisco de Paula Leite Pinto.
Francisco Xavier Barreto Caldeira Castel-Branco.
João Mendes Ribeiro.
Joaquim Belford Corrêa da Silva (Paço d´Ârcos).

Página 1554

1554 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 124

Jorge Brum do Canto:
Jorge Olímpio Adrião Sequeira.
José de Andrade Soares.
José Fernando Nunes Barata.
José Filipe Mendeiros.
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Silve José de Mello
José de Mira Sousa Carvalho.
José de Oliveira Marques.
Lúcio Craveiro da Silva.
Ludgero Duarte de Oliveira.
Luís Augusto Ribeiro da Silva.
Luís Avellar de Aguiar.
Manuel António Lourenço Pereira.
Manuel Duarte Gomes da Silva.
Manuel Gomes Varela Fradinho.
Manuel Joaquim Telles.
Manuel José Gonçalves Grilo.
Miaria de Lourdes Pintasilgo.
Mário Jorge Bruxelas.
Paulo Arsénio Viríssimo Cunha.
Vasco Lopes Alves.

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

PREÇO DESTE NÚMERO 4$80

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