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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 63

ANO DE 1940 20 DE JANEIRO

II LEGISLATURA

SESSÃO N.º62 DA ASSEMBLEA NACIONAL

Em 19 de Janeiro

Presidente o Exmo. Sr. José Alberto dos Reis

Secretários os Exmos. Srs.
Manuel Lopes de Almeida
Gastão Carlos de Deus Figueira

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 47 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado, com emendas, o último número do Diário das Sessões.
O Sr. Presidente declarou ter nobre a Mesa, para serem submetidos à ratificação da Assemblea, diversos decretos-leis.
O Sr. Deputado Angelo César usou da palavra para esclarecer a Assemblea acerca de um ofício do juíz de direito da comarca de figueira de Castelo Rodrigo, dirigido à Mesa, pedindo autorização para que um processo criminal contra aquele Sr. Deputado possa ter seguimento. A Assemblea resolveu, em votação secreta, por unanimidade, negar aquela autorização.

Ordem do dia. - Entrando-se na ordem do dia, prosseguiu a discussão, na generalidade, da proposta de lei sôbre exploração de pedreiras, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Águedo de Oliveira, Camarate de Campos e Antunes Guimarãis.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 46 minutos.

Srs. Deputados presentes à chamada, 64.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão 7.
Srs. Deputados que faltaram à sessão, 11.

Srs. Deputados que responderam à chamada:

Abel Varzim da Cunha e Silva.
Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Alberto Eduardo Valado Navarro.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre de Quental Calheiros Veloso.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Álvaro Salvação Barreto.
Angelo César Machado.
António de Almeida.
António de Almeida Finto da Mota.
António Augusto Aires.
António Augusto Correia de Aguiar.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Maria Pinheiro Torres.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Ribeiro Lopes.
Augusto Cancela de Abreu.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Moura de Carvalho.
Clotário Luiz Supico Ribeiro Pinto.
D. Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho.
Fernando Tavares de Carvalho.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Nobre Guedes.
Francisco de Paula Leite Pinto.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Guilhermino Alves Nunes.
Henrique Linhares de Lima..
João Antunes Guimarãis.
João Botto de Carvalho.
João Garcia Nunes Mexia.
João Luiz Augusto das Neves.
João Maria Teles de Sampaio Rio.
João Mendes da Costa Amaral.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Diniz da Fonseca.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim Rodrigues de Almeida.
Joaquim Saldanha.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Alberto dos Beis.
José Alçada Guimarães.

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José Dias de Araújo Correia.
José Maria Dias Ferrão.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Júlio Alberto de Sousa Schiappa de Azevedo.
Juvenal Henriques de Araújo.
Luiz Augusto de Campos Metrass Moreira de Almeida.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Figueira.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Manoel Lopes de Almeida.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Mário de Figueiredo.
Pedro Augusto Finto da Fonseca Botelho Neves..
Sebastião Garcia Ramires.
Sílvio Duarte de Belfort Cerqueira.
Vasco Borges.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Cruz.
António Hintze Ribeiro.
António Rodrigues dos Santos Pedroso.
Gabriel Maurício Teixeira.
José Pereira dos Santos Cabral.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alfredo Delesque dos Santos Sintra.
Álvaro de Freitas Morna.
André Francisco Navarro.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto Faustino dos Santos Crespo.
Augusto Pedrosa Pires de Lima.
João Garcia Pereira.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Maria Braga da Cruz.
Luiz José de Pina Guimarãis.
Manuel Pestana dos Reis.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 38 minutos. Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 64 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 47 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em discussão o Diário da última sessão.

O Sr. Antunes Guimarãis: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa as seguintes rectificações ao Diário da sessão de ontem:
P. 107, col. 1.ª, 1.56.ª, onde se lê: «Câmara Corporativa, e que foi orientada exactamente pelos princípios», deve ler-se: «Câmara Corporativa, também orientado pelos princípios».
P. 108, col. 1.ª, 1. 63.ª, onde se lê: «taludes verticais», deve ler-se: «taludes quási verticais».
Na mesma página, col. 2.ª 1.1.ª, onde se lê: «proprietários marginais que se promova», deve ler-se: «proprietários marginais nem sempre concordantes que se promova».
Na mesma página e coluna, 1. 2.ª, onde se lê: «codificação, mas tendo», deve ler-se: «codificação, tendo».
Na mesma página, col. 2.ª, 1. 5.ª, onde se lê: «as estradas», acrescentar as seguintes palavras: «e aliviando-os de taxas e formalidades caras e embaraçosas».
Na mesma página e coluna, 1. 38.ª, onde se lê: «encima a velha Citânia, devendo-se», deve ler-se: «encima a velha Citânia do Sabroso, devendo-se».
Ainda na mesma página e coluna, 1. 59.ª, onde se lê: «porque basta para demonstração», deve ler-se: «porque bastam para demonstração».

O Sr. Acácio Mendes:-Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer a seguinte rectificação ao meu aparte da sessão de ontem ao Sr. Dr. Carlos Borges. É na p. 104, col. 1.ª, 1. 63.ª, onde se diz: «Ê que», devem antecipar-se as seguintes palavras: «Tem V. Ex.ª toda a razão, tanto mais», e suprimindo-se a palavra «É».

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado pede a palavra sobre o Diário, considero-o aprovado com as rectificações apresentadas.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa para serem submetidos à ratificação da Assemblea os seguintes decretos-leis:
N.º 30:265, publicado no Diário do Governo n.º 9, de 11 de Janeiro de 1940, que autoriza a Câmara Municipal de Grândola u ceder gratuitamente ao Estado uma faixa de terreno com destino à construção de um edifício próprio para a instalação dos serviços dependentes da Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones;
N.º 30:266, publicado no Diário do Governo n.º 10, de 12 de Janeiro de 1940, que autoriza a Câmara Municipal de Valença a ceder gratuitamente ao Estado uma parcela de terreno com destino à construção de um edifício próprio para a instalação dos serviços dependentes da Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones;
N.º 30:267, publicado no Diário do Governo n.º 10, de 12 de Janeiro de 1940, que autoriza a Junta de Freguesia do Cerdal, concelho de Valença, a efectuar com Francisco Manuel Vilar a troca de um terreno baldio por outro indispensável ao alargamento do cemitério paroquial;
N.ºs 30:271 e 30:272, publicados no Diário do Governo n.º 11, de 13 de Janeiro de 1940, que autorizam, respectivamente, as Câmaras Municipais da Golegã e do Barreiro a cederem gratuitamente ao Estado duas parcelas de terreno com destino à construção dos novos edifícios para a instalação dos serviços dependentes da Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones;
N.º 30:273, publicado no Diário do Governo n.º 12, de 15 de Janeiro de 1940, que autoriza a Câmara Municipal do Crato a ceder gratuitamente ao Estado o terreno necessário para a construção de um novo edifício dos correios, telégrafos e telefones naquela vila;
N.º 30:274, publicado no Diário do Governo n.º 13, de 16 de Janeiro de 1940, que torna extensivo aos postos diplomáticos e consulares na Europa que pela sua posição geográfica tenham dificultadas as comunicações a doutrina do n.º 7.º do artigo 25.º da lei de 9 de Setembro de 1908.

Está também na Mesa um ofício do juiz de direito da comarca de Figueira de Castelo Rodrigo informando que o Sr. Deputado Angelo César Machado se acha pronunciado naquele juízo e pedindo autorização à Assemblea para que, nos termos da Constituição, o respectivo processo criminal possa ter seguimento.
V. Ex.ª conhecem o texto da Constituição. A alínea d) do artigo 89.º deste diploma diz que, movido procedimento criminal contra algum Deputado e indiciado este por despacho de pronúncia ou equivalente, o juiz comunicará o facto à Assemblea, que decidirá se

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o Deputado deve ou não ser suspenso, para efeito de seguimento do processo, e o § 3.º do mesmo artigo declara que as imunidades subsistem apenas durante o exercício efectivo das funções legislativas.
O juiz, no seu ofício, observa ou lembra que já pediu essa autorização em Abril do ano passado e que, por não ter recebido nenhuma resposta, nem ter visto qualquer procedimento sobre o assunto, presume que aquele ofício se tenha extraviado.
Como esta comunicação me foi feita em Abril do ano passado, o juiz não tinha de pedir nenhuma espécie de autorização, porque não se estava nessa altura no funcionamento efectivo da Assemblea.
Parece-me que essa resposta não foi dada, mas teria de ser precisamente comunicada nestes termos.
Agora volta o Sr. juiz a pedir autorização para prosseguimento do processo, e eu vou dar a palavra ao Sr. Deputado Angelo César para que ele informe a Assemblea sobre o «terrível» caso de que se trata.

O Sr. Angelo César: - Sr. Presidente: na situação delicada em que me encontro, tenho, necessariamente, de dar à Assemblea que me escuta uma explicação objectiva, esquemática.
Exercendo a minha profissão de advogado na comarca de Figueira de Castelo Rodrigo, em certo processo requeri determinada execução para pagamento de quantia certa.
Essa execução foi embargada e ainda foi de certo modo impedida, se bem me recordo, por qualquer incidente. E quando ela decorria já no momento processual em que se executava o despacho que havia determinado a avaliação do objecto penhorado, os requeridos ou executados vieram interpor recurso do despacho de formulário ou de expediente que havia ordenado essa avaliação.
Foi esse recurso recebido e mandada suspender a execução. Do despacho que assim decidiu, os meus clientes interpuseram recurso para o Tribunal da Relação respectivo.
Aí foi revogada a decisão da 1.ª instância. Em execução do acórdão que assim julgou foi requerido o prosseguimento da execução.
Negou-se, em despacho, o juiz daquela comarca a cumprir esse acórdão, com o fundamento ilegal de que esse mesmo acórdão era objecto de recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça. Como não o podia fazer em virtude de se tratar de um acórdão de execução imediata, foi formulado um requerimento que quási textualmente posso reproduzir:
«Exmo. Sr. Dr. Juiz. - Chegou ao conhecimento dos requerentes que V. Ex.ª havia proferido nos autos identificados o seguinte despacho:
Referiu.
Como é absolutamente imposto por lei expressa, e inequívoca, pede-se a V. Ex.ª que cumpra, o acorda,» cuja execução se requere, e, na hipótese improvável de V. Ex.ª assim o não entender, desde já se requere a V. Ex.ª que se digne mandar passar certidões das peças tais e tais do processo, a fim de com elas se fundamentar e comprovar uma queixa que se pretende apresentar contra V. Ex.ª ao venerando Conselho Superior Judiciário, e, porventura, um pedido de indemnização por perdas e danos. - O Advogado Ângelo César».
Com grande espanto meu, soube mais tarde que o Sr. juiz de Figueira, de Castelo Rodrigo me havia pronunciado, considerando esse requerimento injurioso e solicitando a minha prisão para a comarca do Pôrto.
Realmente veio um ofício precatório, nesse sentido, de Figueira de Castelo Rodrigo para o Porto, onde foi distribuído ao 3.º juízo criminal, que se negou a cumpri-lo, por considerar a solicitação inconstitucional, pois se entendeu aí, e creio que bem, que, dada a minha qualidade de Deputado, eu não podia ser preso, uma vez que, mesmo em período de suspensão dos trabalhos da Assemblea, estava em vigor a respectiva imunidade.
Foi, pois, devolvido esse ofício precatório; decorreu algum tempo, e hoje tenho conhecimento de que é feito, este novo pedido de que a Assemblea acaba de tomar conhecimento.
Creio que fui claro, sincero, esquemático nas minhas explicações, mas terei muito prazer em completá-las, se esta Assemblea assim o desejar.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ªs ouviram a exposição que o Sr. Dr. Angelo César acaba de fazer. Se V. Ex.ªs estão habilitados já a decidir imediatamente, podem fazê-lo, e a decisão só pode ser tomada por escrutínio secreto, visto que diz respeito a imunidades de Deputado; se V. Ex.ªs, pelo contrário, ainda não estão habilitados a tomar a sua atitude, fazem-no sentir, e tomaremos qualquer outra orientação.
Pausa.

O Sr. Presidente: - O silêncio de V. Ex.ªs parece indicar que estão esclarecidos; no entanto vou consultar a Assemblea.
Consultada a Assemblea, foi aprovado que se toma/ase uma decisão imediata e por escrutínio secreto.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ªs escrevem, em cada boletim de resposta, a palavra «Deve» ou as palavras «Não deve», entendendo-se que quem escreva «Deve» vota no sentido de que devem suspender-se as imunidades parlamentares, para o efeito de o procedimento prosseguir, e que quem escreva «Não deve» vota em sentido oposto.

O Sr. Carlos Borges: - Talvez fosse melhor pôr «Suspensão» e «Não suspensão».

O Sr. Presidente: - Como V. Ex.ªs queiram; a idea a exprimir é esta: se deve ou não deve ser suspensa a imunidade parlamentar.

O Sr. Cancela de Abreu: - Talvez baste pôr «Sim» ou «Não».

Vozes: - Sim, talvez seja melhor.

O Sr. Presidente: - Suspendo a sessão por alguns minutos para depois se proceder à votação por escrutínio secreto.
Eram 16 horas e 3 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 16 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação.
Procede se à chamada para a votação.

O Sr. Presidente: - Designo para escrutinadores os Srs. Deputados Abel Varzim e Carlos Moreira.
Procede-se à votação.

O Sr. Presidente: - Votaram 64 Srs. Deputados e os votos entrados na uma foram também em número de 64.
Pausa.

O Sr. Presidente:-Todos os Srs. Deputados declararam que «Não deve ser suspensa a imunidade» e, neste sentido, vai ser feita a respectiva comunicação.
Pausa.

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O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão, na generalidade, a proposta de lei n.º 30, relativa à exploração de pedreiras.

O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: talvez nesta hora de funda emoção colectiva para o mundo ocidental o tema que se discute hoje - o regime jurídico das pedreiras - não seja de molde a preocupar inteiramente uma Câmara política, a qual nem é uma academia de jurisprudência nem uma oficina de técnicos. Mas tem a sua razão nacional, o que quere dizer o seu interesse colectivo predominante, que se projecta no futuro, e o seu valor económico, que pode já hoje considerar-se inestimável.
Esclarecidos plurimamente os (problemas respeitantes a este assunto pelo» pareceres de dois grandes mestres de direito pátrio - o Dr. Rui Ulrich e o Dr. Machado Vilela -, mão escondo o enleio espiritual de encontrar o ensino do professor Machado Vilela impregnado, como há vinte anos, da mesma elegância intelectual de sempre.
Postos em foco no seu aspecto de vibratilidade de opinião os vários problemas aqui focados ontem, o Sr. Carlos Borges, reivindicando a unidade de competência e jurisdição, o Sr. Melo Machado, que, como os bons autores, considera a expropriação um processo apenas defensável quando ele representa uma absoluta necessidade social, o Sr. Botelho Neves, que se aplicou a defender a noção jurídica tradicional de propriedade, e o Sr. Antunes Guimarãis, que focou as repercussões d« ordem económica sobre o regime da propriedade rústica, pouco ficou portanto à minha parte. Mas permita-me V. Ex.ª, Sr. Presidente, que, em todo o caso, acrescente aqui alguma cousa.
Na vida económica interna da Nação e na sua balança do comércio, a indústria das pedreiras começa a ter uma posição relevante; são nada menos do que 6:000 contos de valores importados pelo estrangeiro, o que é uma cifra importante para o País, ainda que estejamos longe, como é claro, das cifras atingidas pelo vinho do Porto, pelos resinosos e pela cortiça. Mas em alguns anos essa cifra era apenas de alguns contos de réis.
Claro que, como se diz no parecer da Câmara Corporativa, u País é rico em substâncias litóides, porém não tanto como podem induzir certos escritos e certas afirmações vindas a público. Ou por falta de exploração ou por deminuição do seu emprego ou por uma menor aplicação, o que é certo é que o confronto do País com a vizinha Espanha e com a França revela uma notável modéstia. E já não quero falar da Itália.
Contudo, os valores para a economia nacional têm uma importância grande nos conflitos de interesses e são estes que exigiram e exigem a intervenção do legislador.
O nosso subsolo não é rico. Faltam, como se sabe, a hulha, q ferro, os metais finos, os metais preciosos. Os preços unitários também são inferiores ou, por outra, são bastante mais altos - quero dizer - do que na maioria dos países, devido ao baixo teor dos produtos, devido à sua qualidade relativamente inferior, devido também e ainda às dificuldades da extracção.
Por outro lado, para o cálculo comercial do valor dos produtos há sempre que acrescentar unia média, como qualquer cousa de 200 quilómetros de frete; e estes são na economia portuguesa ruinosos.
He que acrescentar ainda que na exploração do solo e subsolo português têm aplicação capitais estrangeiros que representam para esta o encargo de um dividendo ou de um juro.
Tanto a exploração de minas como de pedreiras são dominadas profundamente por uma noção ou conceito económico que se chama renda mineira.
Todas estas explorações estão sujeitas a uma lei bem conhecida e que é constantemente aplicada, chamada lei da produtividade.
Claro está que muitas vezes quando a produtividade é decrescente esta vai até ao esgotamento.
Este conceito fundamental da renda mineira parece-me interessante para o exame dos problemas jurídicos e legislativos naturalmente correlacionados.
Há em primeiro lugar uma certa renda paga ao proprietário, paga ao dono da pedreira, e paga, em regra, pelo explorador, quando ele não é o proprietário originário.
Sôbre isto acrescenta-se em regra uma renda variável, uma percentagem suplementar, naturalmente relacionada ao valor e importância das mercadorias ou dos produtos extraídos, portanto em ligação com o preço da venda dos respectivos produtos.
Mas há ainda, como disse, uma percentagem respectiva do frete, que acompanha o acesso do produto, da mercadoria, desde a saída da mina até ao mercado geral da sua utilização.
São todos estes elementos que compõem a renda mineira na sua aplicação prática, no seu desenvolvimento da vida económica.
Portanto, noções que não podem ser perdidas de vista presidem à grande definição dos interesses, presidem ao jogo dos interesses em luta ou em conflito e indicam, portanto, de certa maneira, qual o sistema defensável de legislação para um país que tem determinadas condições de rendas mineiras.
Portanto, o panorama social daqui derivado vem a ser o seguinte: um proprietário possuído de um certo amor ao seu terreno e, portanto, considerando intangível a sua propriedade, quer no aspecto jurídico, quer no aspecto económico, ou então uni proprietário que não se importa de ceder os direitos de uso e fruição respectivos, contanto que seja pago de uma determinada renda, que ele naturalmente reivindica cada vez maior, e, ao lado dessa renda, um lucro da empresa; além disso, um explorador marginal ansioso por chegar ao limite máximo da sua produtividade, por empregar depressa todos os capitais investidos, por indiferença ao esgotamento contido na mina, uma comunidade nacional que vê desentranhar-se em riqueza o seu solo e que não quere que as gerações próximas arrebatem tudo às gerações futuras.
Além disto, e nos tempos que correm, uma massa de homens desempregados precisa de ocupação, precisa de emprego, e a ela interessa o desenvolvimento mais latitudinário possível da iniciativa particular. Muita gente procura na mina trabalho, uma ocupação que é necessariamente violenta, humilde, obscura, arriscada, brutal!
Na luta económica, portanto, há várias categorias, choque de interesses, entre o passado, o presente e o futuro, cheias de inquietação para os homens de negócio e até para os jurisconsultos, que são uma espécie de meios .filósofos e meios técnicos.
Não resta dúvida alguma de que o Estado tem de intervir, tem de corrigir as iniciativas particulares, mas tem também de suprir a iniciativa onde ela falta, porque ela não é possível onde ela deveria desenvolver-se por uma forma menos satisfatória.
O Estado não pode alhear-se dás riquezas que são susceptíveis da exploração da riqueza geral do solo e, por outro lado, tem de considerar interesses antagónicos, díspares, estabelecendo uma trajectória firme.

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Mas o Estado deverá ser o senhor das minas e pedreiras? A autonomia económica das pedreiras deve existir mesmo nos países mais ciosos do temperamento nacional.
De resto o Estado não tem a flexibilidade necessária para actuar nessas explorações e da sua experiência resulta sempre um recurso nacional superior, porque mais tempo, mais capital, mais pessoal, mais formalismo, caracterizam a intervenção do Estado, sempre com menos resultados das iniciativas das empresas particulares.
Sobre estas realidades económicas, assentam em regra três sistemas jurídicos fundamentais: o sistema, jurídico da acessão, o sistema jurídico da ocupação e o sistema jurídico da Concessão.
Pelo sistema jurídico da acessão, proprietário da superfície é o proprietário das substâncias minerais encontradas no solo, qualquer que seja u profundidade em que ela se encontra e em que o proprietário ignora a existência dessa riqueza.
Este princípio na aplicação às pedreiras é bastam e defensável, dada a sua visibilidade e afloramento à superfície; é um sistema culminante das legislações mineiras da América do Norte e da Inglaterra, com grandes restrições.
Pelo sistema da ocupação pertencerá ao seu descobridor a propriedade da pedreira ou mina; é o achador, o que primeiro ocupa a respectiva mina ou pedreira, que passa a ser seu dono.
O terceiro sistema, da concessão, consiste em o Estado atribuir a um concessionário á propriedade, com a obrigação, de a explorar, mas é a administração que diz quando e por que forma a pedreira ou mina podem ser exploradas.
Diz ainda o meio que há-de ser usado aia sua exploração e determina também, com certo arbítrio, qual é, a pessoa indicada para exercer a mesma concessão. É a legislação francesa, até uma certa época.
Claro, que o sistema da acessão é o mais lógico, para a transmissão jurídica da propriedade como direito absoluto e de conteúdo intangível. Conserva, porém, as minas, em muitos casos, inexploradas e evita com isso um grande lucro social.
Acresce quê, quando atribuída ao proprietário a exploração do respectivo prédio, desenha-se como insuficiente e tecnicamente incapaz, imperfeita, por regra geral, por não haver um empresário qualificado para uma exploração de tal natureza.
É claro que o sistema da ocupação é um poderoso estimulante em países novos e inexplorados, mas é anacrónico e inadaptável às necessidades da Europa Ocidental, bem como a países que têm uma forte densidade populacional. Não tem fácil aplicação às pedreiras que são descobertas por toda a gente.
O sistema da concessão, sim, é elástico, mas tam complexo e variável na sua forma nos diferentes sistemas legislativos que, desde que a propriedade tem de ser atribuída ao Estado, não faz sentido que dele se não tirem todas as suas consequências lógicas. E não se percebe que o Estado vá dar ao concessionário o que pode guardar inteiramente para si.
O que seria, lógico, portanto, nesta altura era o monopólio, que alivia ò contribuinte geral, mas a exploração do. subsolo não se acomoda muito a esta. maneira de ser.
Na legislação francesa apareceu ultimamente um sistema condensado apenas nestes caracteres: minas são riquezas nacionais, mesmo que exploradas por um particular concessionário; todos os direitos, portanto, pertencem à Nação e só ela é que pode deles dispor; o explorador é, pois, uma espécie de usuário, que dispõe de um direito real, mas que não está inteiramente definido.
O sistema português não sê pautava por nenhum destes títulos. O decreto de 30 de Maio de 1852 estabelecia que o aproveitamento dos jazigos devia ser feito, regra geral, pelo proprietário ou por outrem com o seu consentimento podendo, no entanto, este consentimento ser suprimido pela autoridade quando o mesmo aproveitamento se destinasse à indústria fabril Ou às obras públicas. E o Dr. Manuel Rodrigues, no seu trabalho que serviu de tese ao seu brilhante doutoramento, escreveu: só excelente regime que há setenta anos regia a exploração».
Regra geral, o nosso sistema preceitua quê a propriedade da pedreira pertence ao proprietário do solo. sendo, porém, o seu uso regulamentado, isto é, sujeito, portanto, a fiscalização governativa, podendo a Estado, em certos casos, impor que o seu aproveitamento seja feito de uma forma, intensiva e racional.
O sistema previsto na proposta não se decide por nenhuma das formulações tradicionais, pois adopta, num conjunto de interesses e num conflito de competências, uma atitude de prudência e de equilíbrio, defendendo a propriedade no seu aspecto de intangibilida de e considerando a expropriação como um acto que deve ser condicionado pela lei.
Mas a indústria de que falei, ã das pedreiras, tem riscos sérios no começo da sua vida, e isso implica algumas considerações que me parecem bem cabidas neste momento.
Por um lado, os trabalhos de pesquisas e os contratos da exploração feitos no começo deste negócio particular podem muito bem conduzir a um resultado nulo economicamente ou então a um resultado antieconómico, quere dizer: a um fracasso.
Por outro lado, a lei consigna o princípio do direito eminente do proprietário e defende-o na medida cio possível, e até onde aquele o pode fazer valer, quando não esteja, amarrado a um contrato absolutamente firme com o explorador da pedreira, uma vez que este seja uma entidade diferente do proprietário.
Portanto o caso tem interesse para o País, que deve ser fortemente industrializado. A cabeça do Império está ainda por organizar sob o ponto de vista económico e tem um reservatório demográfico importante; que vai dar na próxima geração um salto grande para a frente, e que tem de obedecer à necessidade económica de o País preparar o seu futuro pelas suas próprias mãos.
Devia talvez ainda pôr em relevo o que há de importante na teoria económica da expropriação, mas isso foi ontem foçado com bastante cautela, e até fazendo referência a casos naturalmente relevantes.
De todas estas considerações suponho poder tirar as seguintes conclusões: a proposta vem trazer um contributo para uma maior certeza do direito; procura a adaptação de um regime legal às necessidades modernas da economia portuguesa; introduz precisões e rigores de ordem técnica, em matéria económica e não pode negar-se que há nela uma preocupação decrescente na delimitação do desenvolvimento de conflitos de interesses.
Lamento portanto apenas, perante as considerações feitas e de harmonia com o meu ponto de vista muito particular, que se não desse um predomínio ainda maior ao aspecto económico de toda esta questão das pedreiras, o que seria não só interessante mas bastante vantajoso para uma industrialização como é a que já deu um benefício à balança comercial portuguesa.
Tenho dito.

O orador não reviu.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

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O Sr. Camarate de Campos: - Apenas umas breves e sintéticas considerações sôbre a proposta de lei n.º 36, da autoria do Sr. Ministro do Comércio.
O diploma de 21 de Junho de 1927, que é o diploma neste momento em vigor sôbre a exploração de pedreiras, já não se harmoniza com as necessidades económicas da vida actual, porque não corresponde aos factos e às realidades desta época, e, assim, são tantas as demandas que há nos tribunais que nós temos de chegar a esta conclusão: é que o decreto de 1927 já não define nem caracteriza convenientemente, quer os interêsses dos proprietários do solo, quer os interêsses dos exploradores das pedreiras.
Desta sorte, bem fez o Sr. Ministro do Comércio em apresentar à Assemblea Nacional uma proposta reguladora do assunto.
Entendo, no entanto, que esta proposta devia ser mais ampla; devia também abranger a riqueza mineira, visto que a ligação entre a riqueza mineira e a riqueza das pedreiras é bastante íntima. Há uma grande interdependência entre os interêsses ligados às minas e às pedreiras. Êsses interêsses estão, pois, intìmamente ligados. E tanto é assim quanto é certo que, quer na proposta ministerial, quer no douto parecer da Câmara Corporativa, quando se tratou de definir o que sejam pedreiras, houve necessidade de envolver nessa definição o que se determina quanto às leis que tratam das minas.
É quási por exclusão que se define o que sejam pedreiras.
Eu bem sei, e por todos é sabido, que quer entre nós quer lá fora se considera a riqueza mineira como uma riqueza do Estado, quando é certo que quanto às pedreiras se considera uma riqueza do dono da propriedade onde estão integradas.
Mas a verdade é que os interêsses são mais ou menos idênticos.
Na proposta do Sr. Ministro do Comércio considera se a exploração do pedreiras como um contrato de arrendamento. No parecer da Câmara Corporativa considera-se a exploração de pedreiras como um contrato de compra e venda de bens móveis.
Salvo melhor juízo, e sempre com a devida consideração, parece-me que a exploração das pedreiras não se enquadra nem se pode enquadrar no contrato de arrendamento, como também não se pode enquadrar no contrato de compra e venda de bens móveis.
Com efeito, se o contrato de arrendamento é aquele pelo qual alguém transfere a outrem, por certo tempo e mediante determinada retribuição, o uso e fruição do imóvel, nós temos de concluir que, na verdade, a exploração das pedreiras não se enquadra no contrato de arrendamento, visto na exploração das pedreiras desaparecerem, durante e por virtude da exploração, os bens que fazem parte do contrato, pois são consumidos, quando é certo que no contrato de arrendamento uma das obrigações do arrendatário é entregar o imóvel nas condições em que o recebeu.
Por conseguinte, terminado êste contrato, quási que desaparece o objecto do mesmo.
Também se me afigura que o contrato de exploração de pedreiras não se pode enquadrar no contrato de compra e venda de bens móveis, pois que se o contrato de compra e venda é aquele pelo qual alguém transfere a outrem determinada. cousa, corta cousa, por certo preço, a verdade é que a cousa não está determinada, a cousa não está certa; e assim, é evidente que não podemos meter êste contrato, de exploração de pedreiras na definição que sempre teve, desde a publicação do Código Civil, o contrato de compra e venda.
Parecia-me da maior conveniência que a êste contrato de exploração de pedreiras nem se chamasse de arrendamento, nem se chamasse de compra e venda de bens móveis; não se enquadrasse em nenhum dos contratos especialmente definidos no Código Civil, e que fosse um dos tais contratos sem nome de que os nossos mestres muito nos falaram.

O Sr. Carlos Borges: - V. Ex.ª dá-me licença?... Também ninguém lhe chama contrato de arrendamento.

O Orador: - É na proposta.

O Sr. Carlos Borges: - Na proposta não se chama assim; sujeita-se em certas modalidades às regras de contrato de arrendamento, que são precisamente as que mais se ajustam com a natureza dêsse contrato, embora V. Ex.ª não lhe queira chamar contrato de arrendamento.
O que está no parecer da Câmara Corporativa é que o contrato se chame do compra e venda de bens móveis, o que equivale a chamar móvel a um rochedo incrustado no solo. E chamar-se móvel a um rochedo incrustado no solo é o mesmo que chamar volátil a um peixe que ande no fundo dos mares ... (Risos).

O Orador: - Êste assunto tem determinada importância na vida prática, não já porque, e com referência ao contrato de exploração de pedreiras, vai estabelecer bastante confusão nos tribunais, mas porque de futuro, e mesmo em casos que não digam respeito à exploração de pedreiras, logo começam a ampliar-se as disposições já definidas sôbre contratos de compra e venda e sôbre contratos de arrendamento.
Na proposta ministerial, Sr. Presidente, diz-se que não é legalmente possível expropriar pedreiras em propriedades sujeitas ao regime florestal. A Câmara Corporativa, modificando um pouco o que vem na proposta ministerial, diz-nos que não se devem expropriar pedreiras situadas em propriedades sujeitas ao regime florestal, mas que, ouvidos os técnicos do Ministério do Comércio e do da Agricultura, se poderá resolver se, na verdade, se devem ou não expropriar pedreiras que estejam situadas em propriedades sujeitas ao regime florestal. Mas não mo parece bem nesta parte a proposta do Sr. Ministro do Comércio, assim como não acho também bem o parecer da Câmara Corporativa. E não acho bem, Sr. Presidente, em primeiro lugar, porque não sendo possível expropriar pedreiras que estejam situadas em propriedades sujeitas ao regime florestal, nós temos de concluir que, principalmente no sul do País, não é possível explorar as pedreiras da maior parte das propriedades, porque a maior parte delas se encontra sujeita ao regime florestal e assim estava descoberta a forma de evitar que se expropriassem pedreiras no Alentejo, pois bastava que houvessem nas propriedades duas ou três centenas de árvores para se requerer ao Ministério competente que as propriedades fôssem sujeitas ao regime florestal para estar prejudicada a proposta ministerial.

O Sr. Carlos Borges: - E então era completo: ficavam as árvores, a caça e as pedreiras.

O Sr. Nunes Mexia: - Mas na proposta de lei em discussão está previsto o procedimento a seguir neste caso. Uma vez ouvidos os técnicos do Ministério do Comércio...

O Orador: - Já lá vou. Efectivamente, no douto parecer da Câmara Corporativa está estabelecido que nas propriedades sujeitas ao regime florestal, desde que os técnicos, quer do Ministério do Comércio, quer do Ministério da Agricultura, entendam que a conveniência económica aconselha a exploração da pedreira, se faça a expropriação.
Também não concordo com esta parte do parecer. E não concordo por esta singela razão: é que ficam entregues a funcionários direitos e obrigações importan-

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tíssimos, quer por parte dos proprietários, quer por parte dos exploradores das pedreiras, e sem controle absolutamente nenhum, porque no parecer da Câmara Corporativa não se diz quem é que resolve. Diz-se apenas: ouvido o parecer dos técnicos do Ministério.
Ora, parece-me que isto é pouco.
Diz-se também na proposta, e é confirmado pelo parecer da Câmara Corporativa, que o direito à exploração das pedreiras se pode transmitir por título oneroso ou por título gratuito.
Não se sabe bem o que é que se transmite.
Se a Câmara Corporativa teve necessidade, para separar o contrato de exploração de pedreiras do contrato de compra e venda, de nos dizer que êste contrato é pago em prestações anuais, eu pregunto: quando há a transmissão, qual é o valor intrínseco dos direitos do explorador da pedreira?
Não sei como é que se pagará o imposto sucessório de um valor que não se sabe qual é.
Êsse valor, Sr. Presidente, é portanto indeterminado.
Na base IX da proposta trata-se da suspensão da lavra das pedreiras. Segundo a proposta do Sr. Ministro do Comércio, a suspensão da lavra da pedreira por mais de três meses implica a caducidade do direito da exploração da mesma pedreira, excepto quando, por motivos de fôrça maior ou justificados, o Sr. Ministro do Comércio entenda que não deve considerar caduca a lavra da pedreira.
A Câmara Corporativa modifica a base, e no seu parecer diz que a caducidade só se dá passados seis meses, e o Sr. Ministro do Comércio poderá, também por motivo de fôrça maior, alongar o prazo, mas só até um ano.
Não me parece razoável, Sr. Presidente, o parecer da Câmara Corporativa, porque acho melhor que se não marque prazo para se reputar caduca a lavra das pedreiras. E porquê? Um ano passa depressa e pode haver pleitos judiciais que demorem mais do que o tempo marcado no parecer.
Muito embora na proposta do Sr. Ministro do Comércio se fixe o prazo de três meses, que é curto, no parecer o aumento do prazo não pode ir além de um ano; numa ou noutra hipótese os prazos são curtos e daí podem advir prejuízos sérios e graves.
Como já disse, um ano passa depressa e terminado o ano o Sr. Ministro do Comércio não pode aumentar o prazo, se fôr votado o parecer da Câmara Corporativa, em face do qual o prolongamento não. pode ir a mais de um ano.
Parece-me, portanto, que a proposta do Sr. Ministro do Comércio nesta parte está melhor que o parecer da Câmara Corporativa, visto que pela proposta daquele Sr. Ministro não há limitação para prorrogação.
Eis as considerações que entendi dever fazer sôbre a proposta de lei n.º 36, que reputo, de facto, importante, visto que ela vai colidir com interêsses, quer da propriedade, quer dos exploradores das pedreiras.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Antunes Guimarãis: - Sr. Presidente e meus senhores: é ainda na generalidade que ouso tomar o tempo precioso desta Assemblea Nacional, mas tenho a justificar a minha subida a esta tribuna a circunstância de que, se tomo êsse tempo precioso, é para tratar de um assunto incontestàvelmente precioso também, qual é o do aproveitamento duma riqueza natural, de que a economia ainda não conseguiu tirar o proveito a que tem todo o jus, como fonte de receitas e base de aproveitamento da nossa mão de obra, como seria necessário em momento tam crítico como o que atravessamos.
Se as nossas pedreiras, especialmente as de mármore, alabastro e certos granitos; forem convenientemente aproveitadas,- considerável seria o valor resultante para a Nação. Basta ver o exemplo de outras nações que, com mármores não superiores, e muitas vezes inferiores, aos nossos, têm conseguido abastecer mercados de outros países com preço remunerador, garantindo, assim, a actividade de muitos braços dos seus naturais.
Ora em Portugal, se a natureza foi pródiga em jazigos de bons mármores e alabastros com que dotou o nosso território, a sua situação não é favorável, como sucede com os grandes jazigos marmóreos e alabastrinos do norte, daquelas regiões trasmontanas, de paisagem severa mas grandiosa - jazigos que se estendem desde perto de Bragança até alturas de Vimioso, muito próximos da fronteira, e assim a grande distância dos nossos principais centros de actividade e de portos de mar, e com os jazigos mais ricos do sul, de magníficos mármores na região alentejana, também situados junto da fronteira, nos concelhos de Estremoz, Vila Viçosa e outros. Ora tanto uns como outros sofrem, de carência de transportes, e aqueles de que dispõem são por preços exagerados.
Isto demonstra que tudo o que o Govêrno pretende conseguir através dos preceitos, bem oportunos e inteligentes, desta proposta de lei, não o obterá se, simultâneamente, não cuidar de outro problema basilar, mas que ainda não foi convenientemente atendido em Portugal: a política dos transportes baratos.
É absolutamente urgente que, para valorização não só das nossas pedreiras, unas de muitas outras riquezas do solo e subsolo, o Govêrno cuide de transportes baratos, de forma a que todos esses produtos possam chegar em condições de preço acessível aos principais centros consumidores de Portugal, especialmente Lisboa e Pôrto, mas, o que se mostra indispensável, em condições de atravessarem os mares, para concorrerem vantajosamente com produtos doutras origens nos mercados estrangeiros.
E apresentadas estas considerações, ainda de ordem geral, mas focando êste aspecto especial da política dos transportes baratos, que tenho a certeza de que ao Govêrno merecerá atenção muito particular, tomarei ainda algum tempo a V. Ex.ª para justificar mais desenvolvidamente do que me foi possível ontem fazer a minha opinião sôbre alguns dos pontos acêrca dos quais me permiti apresentar propostas de emenda.
Notei, por exemplo, que a Exma. comissão de estudo, a quem devo a honra de ter perfilhado, de uma maneira geral, os alvitres que ali apresentei sôbre alguns pontos que não tinham sido directamente focados no parecer da douta Câmara Corporativa, manifestou certa discordância com a redacção da minha primeira proposta, em que se exceptuam «os trabalhos de exploração de água», mas que a referida comissão pretende restringir «a exploração de água com objectivos agrícolas».
A minha redacção e, como V. Ex.ªs vêem, muito mais lata, visto referir-se a «exploração de águas», e não apenas «para usos agrícolas». É certo que no meu espírito estava presente a necessidade de atender à lavoura, que sempre precisou de água abundante para as regas, mas que, mercê do emprêgo de adubações químicas, não pode dispensar o concurso de grande quantidade de água para colher vantagens, e não prejuízos, da utilização de adubações preconizadas pela nova técnica agrícola.
Se apresentei esta proposta de emenda com a redacção lata a que me referi é porque entendo, meus senhores, que os trabalhos de exploração de água, de técnica diversa da seguida nas pedreiras, devem estar afectos a repartições diferentes. Evidentemente, não os quero privar da orientação do Estado e da assistência das

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suas repartições especializadas. Deve estar na memória dos ilustres colegas que fizeram parte da 1.ª legislatura que, ao discutir-se aqui o importante diploma sôbre aproveitamentos hidroagrícolas, apresentei à Assemblea uma proposta de alteração, mo sentido de tornar extensivos todos os benefícios da assistência técnica do Estado e dos benefícios de financiamentos feitos a longo prazo e com taxas, de juro baixíssimas às iniciativas dos particulares. Êsses benefícios em muito contribuiriam para o êxito da política hidroagrícola, levando a todos os recantos do nosso território.
Sr. Presidente: eu sabia que era fundamental o aproveitamento de pequenos mananciais de água, os quais viriam a valorizar, sobremaneira, todas as regiões agrícolas onde a água é absolutamente indispensável.
A Assemblea Nacional não julgou então oportuna a aprovação dessa minha proposta de emenda; mas ela está no meu espírito, como está no espírito de toda a gente, e há-de chegar a oportunidade de tam benéfico princípio ser adoptado pelo Govêrno.
A Assemblea sabe que as águas das chuvas se infiltram no solo e se depositam no subsolo em grande quantidade. São verdadeiros reservatórios de que a lavoura terá de viver durante o período das grandes secas.
Ora, meus senhores, se tais reservatórios forem sangrados aqui e ali por minas, levianamente feitas, sem a assistência de competentes, pode dar-se o caso de, quando chegar o verão, estarem os referidos depósitos subterrâneos esgotados, por se terem escoado durante o inverno e primavera.
Hoje, sem se recorrer a minas de abastecimento de nascentes permanentes, pode obter-se água na época própria, isto é, no período das regas, abrindo poços, os quais, mercê das vantagens técnicas que a ciência nos proporciona com o aperfeiçoamento de bombas de grande rendimento e de motores a preços reduzidos, poderão substituir, em certas regiões e vantajosamente, as minas, que acabariam por esgotar os mananciais de água que dêles brotaria dia e noite e em períodos em que as regas não são precisas..
Entendo, por isso, que êsse problema tem de ser muito, bem estudado, não sendo incluído no diploma das pedreiras, que, como disse, é absolutamente distinto do da exploração de águas, e ser afecto a uma repartição especializada que oriente o assunto em toda a sua extensão - água para regas, para abastecimento do público e usos industriais -, mas por forma a prestar toda a assistência aos proprietários, sem taxas e formalidades dispensáveis e isenta de excessos burocráticos.
E, porque é assunto de importância capital para a economia da Nação, já foi devidamente considerado na lei dos aproveitamentos hidroagrícolas, que levou à criação, de organismos especializados, os quais, como disse, poderiam, juntamente com financiamentos vantajosos, auxiliar toda a lavoura portuguesa na rude luta para a conquista da água.
Tem êste problema das águas de regas outros aspectos, que mereciam largas considerações, mas eu, porque o tempo não permite larga exposição, apenas tomarei alguns, minutos, a V. Ex.ª
Entendo que se impõe a publicação de um novo Código de Águas. Sei que há estudos importantes, feitos por uma comissão de ilustres, professores e engenheiros, mas que ainda não lograram servir de base a uma proposta de lei sôbre tam momentoso assunto.
E o certo é que poderia conseguir-se maior aproveitamento para a lavoura, mesmo sem grandes obras, mas aproveitando melhor a água existente.
Por exemplo, é manifestamente anacrónica a distribuição de águas de rega e mina como presentemente é feita em certas regiões do País, porque não se adapta ao ciclo vegetativo das novas culturas. Numa grande parte do norte a distribuição de águas no verão ainda é orientada pelas exigências da cultura do milho alvo, que foi substituída pela cultura do milho importado da América, de onde também se importou a batata e outras espécies que a nossa lavoura cultiva. As andadas de água no verão não coincidem com as necessidades da lavoura, como não se atende à necessidade de certas culturas da primavera, tais como as batatas.
Outro caso: há levadas derivadas de rios que foram construídas para irrigação de determinadas áreas então arroteadas, áreas insuficientes para utilização de braços e alimentação do povo, e que poderiam com algumas alterações irrigar zonas maiores, mas não há lei que tal permita. Ora a população vai aumentando ao contrário do que sucede em outros países, em que o índice de natalidade chega a ser ameaçador.
Trata-se, pois, de um tema, o do melhor aproveitamento das águas dos rios, que merece toda a atenção dos governantes. E livre-se a lavoura de certos canais que privam a terra de umidade, daquela «seção» a que os lavradores aludem com prazer, porque chega a dispensar as regas.
V. Ex.ªs leram no Diário das Sessões uma das minhas propostas com que procuro evitar que se malbarate á terra portuguesa, como sucede com certas explorações de pedreiras ou de outros materiais empregados nas estradas e outras obras públicas. Deve evitar-se quando possível estragar a terra, e proceder de maneira que ela produza o mais possível. Um palmo de terra que seja, da terra portuguesa, faz ,falta, porque a população cresce, com ela crescem as necessidades, sendo preciso que a terra portuguesa, além de constituir domicílio dos portugueses e de lhes proporcionar trabalho, alimente suficientemente todos os habitantes.
Mas a terra portuguesa está a definhar; tende para a esterilização. A falta de águas, conjugada com a falta de adubos orgânicos e, até certo ponto, com o abuso dê fertilizantes químicos, tem levado várias áreas de terreno quási que a tornarem-se estéreis..
É assunto que o Govêrno deveria olhar com atenção. Importa que se cultive a terra de uma forma conveniente, fazendo para isso propaganda, como, aliás, já tem sido feita por engenheiros agrónomos do Ministério da Agricultura e outros, aos quais devemos lições muito proveitosas.
E é preciso também aproveitar tudo o que seja possível para fertilizar as nossas terras, indo buscar ao mar as suas preciosas algas, aproveitando também o azote do ar (indústria só viável com grandes centrais de energia eléctrica - lá está inaproveitável o potencial do rio Douro -, e não com pequeninas centrais alimentadas por lagos pitorescos, mas que afogaram muita terra produtiva s outros campos de actividade) e, finalmente, tudo que possa concorrer para garantir trabalho, a fim de que todas as classes possam viver condignamente e serem felizes.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Como a hora vai adiantada e não há mais ninguém inscrito para entrar na discussão da proposta na generalidade, considero encerrado o debate na generalidade e a discussão na especialidade será a ordem do dia da sessão de amanhã.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 46 minutos.

O REDACTOR - Costa Brochado.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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