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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

N.º 116 ANO DE 1942 29 DE JANEIRO

II LEGISLATURA

SESSÃO N.º 111 DA ASSEMBLEA NACIONAL

Em 28 de Janeiro

Presidente o Exmo. Sr. José Alberto dos Reis
Secretários os Exmos. Srs. Carlos Moura de Carvalho
Castão Carlos de Deus Figueira

Nota. - Foi publicado um suplemento ao Diário das Sessões n.º 113, que contém a» contas da Junta do Crédito Público referentes ao ano económico de 1940.
Referentes ao Diário dos Sessões n.º 115 foram também publicados dois suplementos: o 1.º insere uma informação da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola em satisfação do requerimento do Sr. Deputado António Augusto Aires e prestação de esclarecimento» necessários ao aviso prévio apresentado pelo Sr. Deputado Francisco de Melo Machado; do 2.º consta o parecer da Câmara Corporativa sobre a proposta de lei n.º 267, autorizando o Governo a criar um imposto sobre os lucros extraordinários de guerra.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o último número do Diário das Sessões.
O Sr. Deputado Antunes Guimarãis usou da palavra sobre o racionamento da gasolina.
O Sr. Deputado Joaquim Saldanha ocupou-se, com louvores, das últimas dotações feitas pelo Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações à obra de construção dos edifícios prisionais.
O Sr. Deputado Camarata de Campo» usou da palavra para chamar a atenção do Governo e dos caminhos de ferro para os novos horários dos comboios.

Ordem do dia. - Entrando-se na ordem do dia, foi dada a palavra ao Br. Deputado Melo Machado para realizar o seu aviso prévio sobre hidráulica agrícola.
O Sr. Deputado António Aires requereu a generalização do debate, usando então da palavra os Srs. Deputados António Aires e Belfort Cerqueira.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 37 minutos.

Srs. Deputados presentes à chamada, 54.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão, 3.
Srs. Deputados que faltaram à chamada, 13.

Srs. Deputados que responderam à chamada:

Abel Varzim da Cunha e Silva.
Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Alberto Eduardo Valado Navarro.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre de Quental Calheiros Veloso.
Álvaro de Freitas Morna.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
António de Almeida.
António de Almeida Pinto da Mota.
António Augusto Aires.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Hintze Ribeiro.
António Maria Pinheiro Torres.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Ribeiro Lopes.
Augusto Cancela de Abreu.
Augusto Faustino dos Santos Crespo.
Augusto Pedrosa Pires de Lima.
Carlos Mantero Belard.
Carlos Moura de Carvalho.
D. Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho.
Fernando Tavares de Carvalho.
Francisco Cardoso de Melo Machado.

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Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
João Antunes Guimarãis.
João Botto de Carvalho.
João Garcia Nunes Mexia.
João Garcia Pereira.
João Luiz Augusto das Neves.
João Maria Teles de Sampaio Rio.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Rodrigues de Almeida.
Joaquim Saldanha.
José Alberto dos Reis.
José Alçada Guimarãis.
José Dias de Araújo Correia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Maria Dias Ferrão.
José Pereira dos Santos Cabral.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Júlio Alberto de Sousa Schiappa de Azevedo.
Juvenal Henriques de Araújo.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Figueira.
Manuel Pestana dos Reis.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama Van-Zeller.
Sebastião Garcia Ramires.
Sílvio Duarte de Belfort Cerqueira.
Vasco Borges.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Rodrigues dos Santos Pedroso.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Ulisses Cruz de Aguiar. Cortês.

Srs. Deputados que faltaram â sessão:

Alberto Cruz.
Alfredo Delesque dos Santos Sintra.
Álvaro Salvação Barreto.
Angelo César Machado.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Guilhermino Alves Nunes.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Maria Braga da Cruz.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz José de Pina Guimarãis.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 16 horas e 4 minutos.
Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 54 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estuem reclamação o Diário da última sessão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto não haver reclamações, considera-se aprovado o Diário.
Foi recebida na Mesa, enviada pela Presidência do Conselho, uma informação «Ia Junta Autónoma rias Obras de Hidráulica Agrícola que se relaciona com o aviso prévio do Sr. Deputado Melo Machado e que foi publicada em suplemento ao n.º 115 do Diário das Sessões. Tem a palavra para antes da ordem do dia o Sr. Deputado Antunes Guimarãis.

O Sr. Antunes Guimarãis: - Finalmente ... Com o Ano Novo entrámos em regime de racionamento de gasolina, mas, graças a previdência governamental, sem precisarmos de eliminar da circulação quaisquer veículos.
Mas tanto a fórmula adoptada como o critério da sua execução merecem reparos e deveriam sofrer modificações imediatas.
Um pouco de história pregressa não vem fora de propósito.
Tendo a guerra irrompido ao começar de Setembro de 1939, somente dois anos decorridos, isto é, a 23 de Agosto de 1941, apareceram no Diário do Governo as primeiras providências sobre o problema, as quais se cifraram em restrições um tanto arbitrárias.
Contudo, a urgência do caso fora salientada, logo após o início do grande conflito internacional, pelo presidente da direcção do Automóvel Clube de Portugal, que, na inteligente previsão das dificuldades que não deixariam de assoberbar-nos, oficiara, com data de 19 de Setembro de 1939, ao Ministério do Comércio e Indústria nos termos seguintes:

«Temendo que, em face do conflito que se desencadeou entre algumas nações da Europa, o Governo do País se veja forçado a restringir e a racionar a distribuição cie óleos e gasolina, o que será para o Automóvel Clube de Portugal de uma grandíssima importância, como organismo oficial que é, representante do automobilismo particular português, tomo a liberdade de vir rogar a V. Ex.ª que o organismo a que tenho a honra de presidir não deixe de fazer parte de qualquer comissão quo V. Ex.ª entenda dever nomear para estudar a solução adequada e pô-la em execução.
O previdente aviso não conseguiu lograr efeito. Assim, somente depois de volvidos dois anos, e justamente quando todos se capacitavam de que o abastecimento do País estava assegurado, é que surge no Diário do Governo, em 23 de Agosto de 1941, um decreto ordenando restrições urgentes na circulação de automóveis.
O referido decreto criou uma comissão, em que não figura representante do Automóvel Clube de Portugal, pura estabelecer o racionamento (mandato em que se gastaria perto de meio ano para dar conta do recado), e limitava-se a proibir o trânsito de automóveis aos domingos, segundas e quinta-feiras, com grave prejuízo das praias e termas, justamente no período de maior animação, e, sobretudo, da lavoura, condenando os proprietários de quintas que vivem nas cidades a forçado absentismo na época de vindimas e de outras colheitas, precisamente quando se reformam contratos, se deliberam obras de reparação de muros e valas e se ordenam os preparativos para as sementeiras de trigo, centeio, e outros cereais e plantação de batatas, isto é, de alimentos fundamentais.
Nas terras onde não era possível o recurso a autos de aluguel viram-se as populações rurais em sérias dificuldades para conseguirem assistência clínica (pois nem todos os médicos dispõem de automóvel próprio) e também para preenchimento de formalidades inadiáveis.
Essa proibição de trânsito foi depois alterada com repetidas excepções, em benefício de um ou outro concelho, mas nem sempre precedidas dos indispensáveis anúncios, para que todos os interessados as pudessem aproveitar, e dos necessários avisos, para que os agentes de policiamento as conhecessem, de forma que muitos viajantes tiveram de suspender viagens e sujeitar-se a

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muitos, apreensão de livretes e outros vexames inerentes à intervenção da polícia.
Também é de registar a desconexão que, mais uma vez, se verificou entre as diferentes corporações policiais, cada uma delas obedecendo exclusivamente aos respectivos superiores, por falta da imprescindível coordenação de que resultaria unidade de actuação para a eficácia dos serviços, prestígio dos respectivos organismos e da autoridade, e, sobretudo, para não expor o público a sensaborias e prejuízos, de que importa defendê-lo inflexivelmente.
Também a fórmula então proposta para a distribuição de pneumáticos merece registo no Diária das Sessões, pelo estranho critério que ditou os coeficientes nela contidos:

4 para automóveis de serviços públicos;
3 para automóveis da indústria de transportes;
1 para automóveis particulares.

Ora, como dos 57:000 automóveis que, aproximadamente, circulam em Portugal são utilizados 43:500 em serviço particular, 9:500 na indústria de transportes e cerca de 4:000 em serviços públicos, resultava que da aplicação daquela curiosíssima fórmula cabiam aos serviços públicos 75 por cento, aos da indústria de transportes 28 por cento e cerca de 2 por cento para os da lavoura, da indústria, comércio e restantes actividades que vão com seu trabalho enchendo o erário.
Ignoro se tal fórmula chegou a vigorar; mas, infelizmente, é notória a falta de pneumáticos, particularmente de certas medidas, dizendo-se que, se não fará o critério que orientou a sua importação, e que estorvou algumas firmas do se abastecerem convenientemente, não estariam parados bastantes veículos por falta daquele indispensável, artigo.
Sr. Presidente: quando em Dezembro último foi discutida nesta Assemblea a lei de meios, em que muito oportunamente se fixa a política de redução de despesas, emiti a opinião de que no vastíssimo e importante capítulo dos transportes automóveis destinados a serviços públicos estavam indicadas bastantes restrições (Apoiados); hoje, às razões que então me levaram a exprimir aquele voto juntam-se as do agravamento da crise de combustíveis, de pneus e outros acessórios do automobilismo, que aconselham urgentes e largas restrições na utilização desses veículos pelos serviços públicos.
Mas deixemos a história pregressa, para apreciar a fórmula de condicionamento que, após quási cinco meses de gestação, entrou em vigor com o novo ano.
1.º Ao realizar o inquérito sobre a utilização dos veículos automóveis deveria ter-se publicado a relação das diferentes categorias a que corresponderiam variadas quantidades de gasolina, para que as respostas fossem precisas. Gomo não houve um critério orientador, cada proprietário respondeu como lhe foi possível, de forma que se verificam agora desigualdades flagrantes na distribuição de gasolina.
Contudo, se da parte das pessoas encarregadas desse serviço tivesse havido o cuidado que a gravidade do problema exigia, desde logo teriam sido atendidos numeroso» casos, que agora provocam protestos, em que os interessados exprimiam claramente destinarem-se os seus automóveis a visitas às propriedades agrícolas, a viagens comerciais e outros fins iniludivelmente de carácter económico e que, assim, cabiam na designação de (utilitários», por deverem ser incluídos em alguma das categorias assim classificadas na lista mais tarde publicada. Agora exigem-lhes um requerimento em papel selado, com variados esclarecimentos, quando o que deveria fazer-se, dentro do respeito devido aos cidadãos, era ordenar a imediata rectificação do que tam iniquamente se fizera, procurando adaptar as respostas dos interessados aos dizeres da referida tabela.
Apoiados.

2.º Adoptou-se para base de classificação a força registada nos livretes de circulação, aliás calculada sob critérios que têm variado desde a instalação das comissões técnicas de automobilismo, quando estava indicado repetir-se agora o respectivo cálculo com um só critério para todos os motores.

3.º Não se atendeu à lotação dos veículos, chegando-se ao despropósito de atribuir a motos de uma só pessoa tanta gasolina como a automóveis para seis ou sete passageiros.

4.º O preço dos livretes de racionamento é de 15$, independentemente da quantidade de gasolina, de forma que se paga tanto pelo livrete de um pequeno "carro que recebe 30 litros mensalmente como pelo de um camião a que couberem 600 litros. No primeiro caso representa o encargo d« $16(6) por litro de gasolina, o que é manifestamente pesado, emquanto no segundo baixa para a vigésima parte. O preço dos livretes deveria ser deminuído de uma maneira geral e proporcional aos litros de gasolina.
Apoiados.

5.º Exige-se que os livretes de racionamento acompanhem sempre os respectivos automóveis, sendo assim 03 proprietários obrigados a confiá-los aos chauffeurs. Contudo, se este sujar ou inutilizar os talões, tem o proprietário de pagar a multa de 10$ por cada litro registado naqueles talões, o que pode subir a alguns contos. Ora bastaria que o livrete fosse apresentado quando houvesse de comprar-se gasolina.

6.º No caso de extravio de livretes, os trabalhos, despesas e várias formalidades, tais como anúncios dispendiosos nos jornais, requerimentos, investigações, termos de responsabilidade e outras exigências, são absolutamente desproporcionados com a. importância do caso. Tudo isto se evitaria se tivesse havido o cuidado de inscrever o número do automóvel em cada folha do respectivo livrete de racionamento.

7.º É previsto, para o fornecimento de gasolina sem a exigência- da presença do veículo, o caso de esgotamento de combustível na estrada. Deveria esta concessão tornar-se extensiva aos casos de automóveis sem gasolina nas garages ou locais de recolha.
Outros reparos têm sido feitos, mas a escassez de tempo imposta pelo nosso Regimento força-me a referir apenas os que se me afiguram mais importantes, na esperança de que serão remediados, sem novos incómodos nem despesas para os interessados.
Apoiados.

De resto, todos reconhecem que às dificuldades de abastecimento têm de corresponder restrições na devida proporção, e aos serviços de racionamento ninguém pede milagres, mas unicamente «equidade» na distribuição e desembaraço na solução dos diferentes casos submetidos a sua apreciação.
Certas demoras no deferimento de reclamações de proprietários de automóveis que deles carecem para ganhar a vida não se explicam em serviços que no presente orçamento foram dotados com 2:456 contos e que, além disso, convencido estou de que poderão contar, e já o fizeram com geral louvor, com a colaboração do Automóvel Clube de Portugal.
Apoiados.
Antes de passar a outro assunto, entendo, dentro do problema de transportes, referir-me aos transtornos resultantes para estudantes, funcionários e outros interessados que ficaram sem comboios compatíveis com as suas obrigações, como se verifica no Porto, porque os horários a que as empresas foram obrigadas, por falta de combustíveis, não estão organizados por forma a

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atendê-los convenientemente. Todos reconhecem as dificuldades que assoberbam as administrações daquelas empresas, mas é possível que da urgente coordenação dos diferentes meios de transporte resulte uma fórmula mais adaptável à multiplicidade dos interesses em jôgo.
Sr. Presidente: referi-me, há instantes, à actuação desconexa das diversas corporações policiais competentes para o policiamento do trânsito, como numa das últimas sessões já acentuara a necessidade de as coordenar, pura que se evitem duplicações caríssimas e desnecessárias e o mesmo critério as oriente, a fim de que a sua acção disciplinadora frutifique e o público as aprecie por eficaz assistência recebida, e não pelo montante astronómico das multas que, pelas mais insignificantes transgressões, é forçado a pagar.
Da criação da polícia de viação e trânsito cabe-me a maior responsabilidade, porque data da. publicação do Código da Estrada, proposto por mim ao Conselho de Ministros há doze anos, isto é, em 1930. 1 Fará lhe garantir uma acção conexa com os outros organismos de policiamento submetera-a eu ao Conselho Superior de Viação, em que havia elementos da Junta Autónoma de Estradas, do Automóvel Clube de Portugal, da Inspecção de Tropas de Comunicação, da Intendência Geral de Segurança, das câmaras municipais, da polícia de segurança pública e do. comércio e indústria ligados ao automobilismo. Ë que no relatório daquele Código figuram as seguintes palavras, por mim escritas: «Impõe-se que a unificação em assuntos relativos ao trânsito nas vias públicas não seja contrariada por diversidade de critérios, tanto na sua regulamentação como no correspondente policiamento, para o que importa confiar a respectiva e necessária coordenação a organismos com representação das entidades mais directamente interessadas em disciplinar e facilitar & circulação nas estradas. Aquele corpo de polícia passou depois a depender da Direcção Geral dos Serviços de Viação, fundada anos depois.
Recentemente li na imprensa alguns números extraídos do relatório publicado por aquela Direcção Geral, relativos ao ano de 1940, e foi tal a minha impressão que fui estudá-lo a uma repartição pública, porque, contrariamente ao que se verifica com outros serviços do (Estado, que enviam aos Deputados os seus relatórios, aquele, cuja consulta me interessava, não me fora remetido.
Vou citar alguns números:

A polícia de viação e trânsito custou em 1940 3:737.158$25.
Continuou a verificar-se a maré enchente de autos levantados e de multas cobradas por transgressões dos preceitos do trânsito.
Em 1933 houve 9:206 autos e cobraram-se 327.626$ de multas.
Em 1934 sobem aqueles números para 12:162 e 894.812$.
Em 1935 continuam a trepar piara 17:560 e 1:295, 404$.
Em 1936 dão um pulo para 31:001 e 1:406.143$.
Em 1937 outro pulo para 36:595 e 1:824.381$.
Em 1938 pulo maior para 45:703 e 1:893.463$.
Em 1939 ainda maior para 53:210 e 2:138.459$.
Em 1940 atingem proporções deploráveis: 59:806 e 3:007.103$49.

Ficar-se-ia com a impressão de que o trânsito está cada vez mais indisciplinado se não soubéssemos que se verifica justamente o contrário, salvo no que respeita à reincidência lamentável de alguns condutores, sobretudo da camionagem, que dificultam as ultrapassagens, atingem velocidades excessivas para veículos pesados e não deminuem a intensidade das luzes ao cruzar com outros, veículos.
Todos sabem que o policiamento das cidades está quási exclusivamente confiado à polícia de segurança pública, e que nas estradas, além da polícia de viação e trânsito, compete esse serviço também aos cantoneiros e à guarda nacional republicana.
Pois, a contrastar com perto de 60:000 autos levantados pela polícia de viação e trânsito, a polícia de segurança pública cabem apenas 540 em Lisboa, 162 no Porto, 115 em Coimbra e 188 nas restantes localidades do País; a guarda nacional republicana interveio unicamente em 159 autos, e outras entidades policiais em Resumo: a polícia de viação e trânsito levantou autos cinquenta vezes mais numerosos que todos os outros corpos de policiamento. Para isso teve de multar milhares e milhares de carros de lavoura, por falta de chapas das câmaras municipais, falhas de iluminação e cousas equivalentes.
Eu entendo que a acção da polícia deve ser disciplinadora, avisando, advertindo e explicando; julgo aconselhável reservar-se a aplicação de multas para as reincidências ou transgressões de certa gravidade. A subida rápida e constante do gráfico das multas não corresponde no benéfico reflexo da política disciplinadora do Estado Novo, tanto nos espíritos como nas fábricas, nas ruas e, apesar dos alarmantes números registados no citado relatório, nas próprias estradas.
Apoiados.
Vê-se no citado relatório que a polícia de viação e trânsito utiliza vinte e dois automóveis ligeiros e outros tantos motociclos, cujos percursos somaram em 1940 1.000:132 quilómetros, em que se consumiram torrentes de gasolina e pilhas de pneumáticos.
Na minha opinião deveria deminuir-se o número de carros automóveis, conservar os motociclos e recorrer; em certos casos, como faz acertadamente a guarda nacional republicana, a bicicletas, com vantagens para a economia e sem inconvenientes para a fiscalização.
Vai aumentando o número de postos fixos, com prejuízo da fiscalização móvel, sendo certo que esta nova orientação resulta caríssima, por exigir a construção de prédios para a instalação dos respectivos serviços.
Na circunvalação da cidade do Porto construíram-se vários desses edifícios mesmo em frente de outros pertencentes à Câmara Municipal, sendo certo que estes últimos deverão ser desocupados, de acordo com o Código Administrativo, que ordena a supressão do imposto de barreiras ali cobrado.
Queixam-se os automobilistas da frequência com que a polícia de viação e trânsito os manda parar para demorado inquérito aos documentos e outros requisitos, quando tais demoras são manifestamente prejudiciais para quem é forçado a recorrer, geralmente em circunstâncias de urgência, ao transporte automóvel, de preço sempre elevado. E se for o caso de alguma transgressão (que geralmente apenas justificaria uma advertência para logo ser remediada) segue-se, por via de regra, o levantamento do auto, que demora um quarto de hora e mais, tara grande como desnecessária é a série de elementos que o condutor tem de fornecer para o preenchimento dos impressos que o agente carece de remeter às repartições e de entregar ao autuado. Ora, no caso de levantamento de autos (que melhor seria, como já afirmei, reduzir ao indispensável), bastaria tomar nota dos números do livrete e da licença, pois dos arquivos da Direcção Geral dos Serviços de Viação constam todos os elementos, citar o artigo transgredido e indicar a multa aplicada. Tudo isso se poderá conseguir em um ou dois minutos, não forçando, como actualmente se faz, os passageiros a demoras excessivas, muitas vezes de consequências graves.
Apoiados.

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Levar-me-ia longe a crítica dos serviços de viação e trânsito, mas a obediência que devo às disposições do nosso Regimento leva-me a deixar, por hoje, tam importante tema.

Sr. Presidente: agradecerei a concessão de mais alguns minutos para me referir a outro assunto urgente, relacionado também com o automobilismo. No Diário das Sessões de l de Maio de 1937, 5,° suplemento ao n.° 127, lê-se que a Assemblea Nacional, ao discutir a proposta de lei em que fora convertido o decreto-lei n.° 27:392, aprovou a seguinte proposta sobre a substituição dos números dos automóveis: «E facultativa a substituição dos números do antigo registo por outros nos termos desta lei, excepto quando os veículos mudem de proprietário e não se justifique a continuação-daqueles.

Pois no 2.° suplemento ao Diário do Governo de 22 de Novembro passado, isto é, publicado na antevéspera da abertura dos trabalhos desta Assemblea, apareceu o de-creto-lei n.° 31:676, com um artigo em que se revoga, sem qualquer explicação, o que fora deliberado por esta Assemblea após longo debate. Trata-se do artigo 4.°, com o texto seguinte: «È tornada obrigatória, a partir de l de Julho de 1942, a adopção do sistema de numeração do registo de veículos automóveis estabelecido pelo artigo 9.° da lei n.° 1:955, de 17 de Maio de 1937.

Ora desta revogação do que tam fundamentadamente fora votado por esta Assemblea resultarão despesas e trabalhos para alguns milhares de proprietários de automóveis. Um par de placas numeradas custa entre 50$ a 100$, a que terá de.juntar-se o requerimento em papel selado, a alteração de outros tantos milhares de apólices de seguros, de livretes de circulação e de livretes de consumo de gasolina, várias idas a diversas repartições e o custo da substituição das placas, com. os indispensáveis retoques na pintura, sempre demorados e caros.

Mas àS despesas e trabalhos que o cumprimento daquela determinação exige aos proprietários de automóveis há que juntar a perturbação que ela não deixará de causar no mercado de chapas metálicas, actualmente com poucas disponibilidades, aliás bem precisas para a laboração de actividades importantes, cujo funcionamento tem mais defesa do que a da substituição que o aludido decreto-lei pretende agora impor.

E certo que o artigo 109.° da Constituição autoriza o Governo a fazer decretos-leis, mas somente cem casos de urgência e necessidade pública.

Sr. Presidente: .se aquele diploma tivesse de ser submetido à nossa, ratificação, eu negar-lha-ia.

Disse.

Vozes:— Muito bem, muito bem!

O Sr. Joaquim Saldanha: —Sr. Presidente: publicaram os jornais da semana passada a informação de que o Ministro das Obras Públicas dotara com 10:000 contos; a despender no corrente ano, a obra da construção dos edifícios prisionais.

O plano aprovado em 8 de Maio do ano findo havia fixado a cifra de 7:930 contos.

Houve portanto um aumento de mais de 2:000 contos.

Dignou-se, assim, S. Ex.ª atender ao que lhe apresentei na sessão desta Assemblea de 12 de Dezembro fiado, no sentido de compensar durante 1942 o que deixou de se aproveitar em 1941. Cumpre-me por isso agradecer daqui a S. Ex.ª a consideração que lhe mereceu o meu pedido e salientar que S. Ex.ª nunca deixa de tomar na devida consideração todas as petições que reclamam medidas necessárias e justas.

E permita-me S. Ex.ª que mais uma vez insista pela sua interferência no sentido de que as dotações concedidas sejam inteiramente aproveitados no ano a que respeitam.
Esta diligência deve assumir um carácter imperativo quando se trata de obras que os necessidades prementes reclamam aflitivamente.
Estão neste caso, entre aquelas que são indicadas para êste ano, a cadeia para presos de difícil correcção e a cadeia-escola do Leiria, para menores de vinte e um anos. Ambas estas prisões descongestionarão, em parte, as cadeias civis de Lisboa, que estão a abarrotar e não podem com maior excesso.
Mas como, por maior celeridade que seja dada-às obras, não ó natural que estejam prontas a receber reclusos nestes dois anos mais chegados e as actuais cadeias civis não podem receber mais presos, não deixe o Sr. Ministro das Obras Públicas de considerar a necessidade de algumas ampliações, ou construção de pavilhões de carácter provisório, para alojar o excesso que vai chegando destes anos próximos, incluindo o corrente, e também umas construções simples, mas adequadas, para os actos de culto das cadeias de Monsanto e de Caxias, onde não há disponível recinto apropriado, para evitar que haja reclusos que desejem assistir aos actos religiosos e não o possam fazer por falta de lugar.
Igualmente chamo a atenção de S. Ex.ª para as instalações destinadas a substituir a parte a demolir no edifício do Limoeiro, já dotada com 100 contos, demolição que se não pode realizar einquanto não houver onde arrumar o que contém essa parte a demolir.
Disse.

Vozes: — Muito bem!

O Sr. Camarate de Campos: — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Govêrno para o novo horário dos caminhos de ferro que entrou ontem em vigor.
É evidente que se há necessidade de reduzir o número de comboios, e certamente há, ele se reduza.
Se as necessidades públicas exigirem que sejam suprimidos mais alguns, entendo mesmo que não deve haver a mais leve hesitação em se satisfazer essa exigência.
Porém, o novo horário, certamente devido à pressa com que foi elaborado, trouxe verdadeiras anomalias.
Com efeito, na linha do Sul e Sueste, e refiro-me a esta porque é aquela que melhor conheço, há casos que precisam de remédio pronto, imediato, quer no interesse público, quer no interesse da própria Companhia.
Na chamada linha de Vila Viçosa há um comboio ascendente e outro descendente.
Está bem. Porém, o passageiro que se destinar a Lisboa, vindo de Vila Viçosa, Estremoz ou Évora, para só me referir às principais localidades, estará na estação de Casa Branca, sem a mais leve comodidade, desde AS vinte e duas horas até às cinco horas do dia seguinte, isto é, sete horas, a aguardar o comboio do Algarve, que chega a Lisboa às oito e meia.
De Évora a Lisboa levam-se onze horas, estando-se na indicada estação de Casa Branca sete.
Há a acrescentar que de Évora à Casa Branca se leva meia hora, pois são poucos quilómetros.
Mas há mais.
Os passageiros de Reguengos e Mora chegam a Évora às nove horas da manhã, tendo saldo das referidas vilas às seis. Estão em Évora todo o dia, e à noite, às vinte e uma e quarenta, tomam o comboio para Lisboa, ficando, como os primeiros, depositados - é o termo — na estação de Casa Branca as referidas sete horas.
Estes passageiros perdem no trajecto vinte e seis horas.

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Perante isto é evidente que ninguém pode utilizar tais comboios. É um horário verdadeiramente impeditivo.
Há prejuízo para o público e há prejuízo para a Companhia; para aquele, porque não pode servir-se de tal transporte; para esta,- porque perde o correspondente rendimento.
É fácil, com vantagem para todos, público e Companhia, ajustar o assunto.
Basta uma modificação nas horas das partidas dos comboios a que fiz alusão. Como isso é fácil e pode fazer-se sem prejuízo para ninguém, para o caso chamo a atenção de quem de direito, pedindo que o caso seja solucionado rapidamente. Disse.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Melo Machado para realizar o seu aviso prévio.

O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente e Srs. Deputados:, muitas cousas se tom modificado neste Pais durante os últimos dezasseis ou dezassete anos. Apesar disso, Sr. Presidente, quero fazer uma declaração provia, e ela é a seguinte: hão conheço, nem de vista, qualquer funcionário da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola;, não tenho nenhuma propriedade incluída no plano das obras da mesma Junta, nem eu, nem parentes, nem aderentes. Estou, por consequência, em circunstancias de absoluta independência para tratar dêste assunto.
Novamente criticas - dirão V. Ex.ªs Sim, Sr. Presidente, novamente criticas, porque as duas funções primaciais desta Câmara são precisamente criticar e fiscalizar, e delas não nos podemos dispensar se porventura queremos que está Assemblea tenha, na verdade, uma função útil. Se até para fazer um santo é preciso um cardeal diabo, não me parece que seja demais a critica de algumas dezenas de Deputados para bem se administrar um país.
Desde que tive-a consciência e o interesse pela terra, este jeito de olhar mais longe pelo interesse do País, os problemas de hidráulica agrícola mereceram sempre o meu maior cuidado.
Efectivamente, qual será o lavrador dó centro e sul do Pais que perante um inverno rigoroso e perante uma primavera extremamente saca e ventosa, ao ver á sua seara queimada por falta de um idade, não tenha pensado no benefício que lhe traria uma gota de água?
É evidente, pois, que todos os proprietários, todas as pessoas conscientes que estudam a economia deste Pais teriam no seu espirito esta ambição: ver resolvido ou, pelo menos; posto em equação este problema tam interessante e cheio de belas consequências - o problema da hidráulica agrícola.
Podem, pois, V. Ex.ª calcular qual foi o meu entusiasmo ao ver aparecer nesta Assemblea em 1937 a lei de hidráulica agrícola. Li-a com alvoroço e com atenção.
À primeira vista parecia não haver nada a objectar; mas, porque nela se falava nos encargos dos proprietários que fossem beneficiados por essas obras, eu quis naturalmente saber o que seriam esses encargos.
Fui até à Repartição de Hidráulica Agrícola e ali, amavelmente, me forneceram o volume do relatório de 1935, que era o único até essa data publicado.
Compulsei-o, li-o com atenção, e devo dizer a V. Ex.ª, com aquela sinceridade que me caracteriza, que me caiu a alma aos pés.
Desde esse momento julguei absolutamente incomportáveis os encargos a que eram obrigados os proprietários. Disse-o aqui nesta Assemblea com toda a minúcia, com toda a franqueza, que muitas vezes pode ser rude, mas que procura sempre unicamente servir a verdade. E disse-o por tal forma que ainda, hoje não tenho de me arrepender de qualquer das palavras que aqui proferi. Tive o cuidado de mandar reimprimir e fazer distribuir por V. Ex.ªs o discurso que então. proferi. E não o fia por vaidade - não tinha de quê. Fi-lo simplesmente porquê me parecia que este documento era aquilo que justificava melhor a minha volta a esta tribuna paira tratar novamente do assunto da hidráulica agrícola.
As últimas frases dêsse discurso são as seguintes:

«Esta proposta de lei, muito interessante e louvável, como é, precisa de ser estudada por esta Assemblea com todo o cuidado e atenção, para não cairmos exactamente no contrário do que se deseja: em lugar de fomentar uma riqueza que se pretende seja benéfica para todos, ir transformá-la numa medida que arruine todos, obrigando depois o Estado a tomar as providências necessárias para contrariar os efeitos dessa ruína».

Infelizmente, Sr. Presidente, os factos parecem inteira e completa razão a este meu vaticínio.
Cada obra concluída sugere as mais veementes reclamações e a afirmação dos proprietários de que lhes é absolutamente impossível pagar, todas as contribuições que lhes são exigidas.
Mas porque o assunto é de excepcional importância, porque evidentemente não se pode abandonar a idea da hidráulica agrícola em Portugal, visto, que ela difunde os seus benefícios por muitos outros países que a aproveitam, parece-me que é preciso procurar onde está o mal e encontrar o remédio para que essa obra, possa prosseguir com utilidade para o País.
São estes os meus propósitos; é a isto que visa o meu aviso prévio.
Vou naturalmente ser longo, contra os meus propósitos. Tenho de fazer citações « ler números, sempre fastidiosos. Por isso peço desculpa à Assemblea de abusar da sua atenção e agradeço a sua costumada benevolência para com as minhas pobres palavras.
Sr. Presidente: em presença de todas estas reclamações, que não são Besta nem daquela obra, mas que são de todas as obras a cujos proprietários se. apresentaram já algumas contas para pagar, a primeira pregunta que se apresenta ao nosso espírito é esta:

Estarão equitativamente distribuídas os responsabilidades do Estado e dos proprietários?
Devo dizer a V. Ex.ª que, para ordenar as minhas considerações, vou seguir ponto por ponto as interrogações do meu aviso prévio, fazendo apenas na sua sequência uma alteração.
Parece ser evidente que a hidráulica agrícola não pode ter o objectivo estreito de aumentar a produção de quem amanha a terra. As suas consequências são muito mais largas, têm um âmbito muitíssimo maior; e que assim é di-lo o relatório que antecede a proposta de lei que nós aqui aprovámos em 1937 e que reza assim:

«A rega é considerada magno problema de interesse simultaneamente económico, social e militar, que, como nenhum outro, contribuo para a valorização do património nacional, para a criação de riqueza pública, para a absorção do nosso excesso demográfico e para o desenvolvimento do comércio interno e externo do País.
Poderemos ainda acrescentar, Sr. Presidente, que através dela resolverem os o desemprego rural e faremos

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o saneamento de algumas regiões; e, neste caso, surge naturalmente esta pregunta:
Então tudo isto, que evidentemente são problemas que interessam ao País em geral, há-de ser pago única e exclusivamente pelo homem que cava e lavra a terra?
Como V. Ex.ªs sabem, a nossa lei de hidráulica agrícola põe sobre os proprietários beneficiados com essas obras todas as responsabilidades. Têm de pagar tudo, desde os estudos à execução das obras - até aos últimos 5 réis. Têm de pagar até também a inexperiência e a aprendizagem dos técnicos.
Quando falo em inexperiência e aprendizagem dos técnicos não digo nada que para eles seja desprimoroso. Ninguém nasce ensinado. Por muita teoria e sabedoria que naja, elas precisam de ser aliadas à prática para resultarem eficientes.
Esta lei, julgava eu que seria uma lei de fomento, tal como eu compreendo una lei dessa natureza: uma lei em que o Estado, visto que as obras transcendiam as possibilidades dos particulares, colocava os seus capitais, esperando com alguma paciência que eles mais tarde se traduzissem em proveito para a Nação.
Parece, porém, que outra idea se formou e que foi afinal um empreendimento financeiro que se buscou fazer. E, em reforço desta minha opinião, vou ler a V. Ex.ª uma passagem do parecer da Câmara Corporativa, quando lhe foi presente o plano de obras de hidráulica agrícola. Essa passagem, estudando precisamente o aspecto financeiro da operação, diz o seguinte:

«A anuidade calculada no plano é de 45:352 contos e corresponde à amortização do mesmo capital de 1.120:000 contos em cinquenta anos, com uma taxa de juros sensivelmente igual a 3,22 por cento. Mas o Estado cobra, além daquela anuidade, um excesso de contribuição avaliado em 37:254 contos, de modo que a anuidade efectiva pode dizer-se que se eleva a 83:606 contos. Para o mesmo juro de 4 por cento esta anuidade corresponde ao capital de 1.774:557 contos, ou seja cerca de 1,58 vezes o capital despendido com estudos e obras.
À Câmara Corporativa insiste mais uma vez no carácter aleatório e grosso modo aproximado destes cálculos, aos quais se não pode atribuir outro valor senão o de mostrar que, mesmo financeiramente, o plano nada tem de aventuroso, antes se pode chamar empreendimento lucrativo».
Estas duas palavras a empreendimento lucrativo» estão sublinhadas no parecer da Câmara Corporativa. Por outras palavras, ou, melhor dizendo, por outras contas: o Estado viria a receber duas vezes e meia o capital investido nestas obras e ainda o juro de 3,22 por cento. E, se V. Ex.ª quiserem coutas mais simples, a verba da contribuição que corresponde ao juro de 3 por cento do capital inscrito.
Assim o Estado empregaria dinheiro a 6,22 por cento.
Não quero fazer mais afirmações sobre este aspecto do problema.
Mas pregunta-se: era só isto o que o Estudo recebia? E então os impostos indirectos? Quere dizer: desde que aumentava a produção, evidentemente que aumentava o trabalho das indústrias transformadoras, dos transportes, etc., e de tudo isso viria a receber mais dinheiro.
Subindo o valor das propriedades - como se vê das contas apresentadas pela Junta de Hidráulica Agrícola -, a quanto montaria a contribuição pelas transmissões da propriedade, e ainda o malfadado imposto sucessório, imposto a que eu um dia terei a satisfação de me referir, dizendo dele de triste memória?
Como V. Ex.ª vêem, tratava-se - ao que parece -, de uma operação financeira brilhante. Simplesmente parece que ela é economicamente irrealizável.
Como já acentuei, tudo era para pagar nas obras. Desde o primeiro lápis até à última folha de papel, tudo é lançado na conta das obras, e para que V. Ex.ª não fiquem com a suspeita de que eu sou porventura exagerado quando digo que até a aprendizagem dos técnicos era necessário pagar, vou ler uma passagem de um relatório publicado em 1935.
Trata-se do um ofício da hidráulica agrícola ao Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações, e diz assim:

«Num país onde AS obras de engenharia hidráulica com objectivo agrícola começam agora a aparecer ... crê a comissão executiva da Junta Autónoma dos. Obras de Hidráulica Agrícola ser chegado o momento de dar aos seus técnicos conhecimentos de ordem prática e de execução de trabalhos que habilitem a Junta a satisfazer aos fins nacionais para que foi criada. De entre tais conhecimentos de execução destacam-se, pela oportunidade e urgência de ensaio, os que se referem à técnica da construção de diques e barragens de terra... Julga por isso a comissão executiva da Junta ser seu dever apresentar a V. Ex.ª as considerações aqui feitas e pedir autorização para adquirir imediatamente, pela verba consignada a estudos, a maquinaria de que carece para a instrução e preparação dos seus técnicos, aproveitando-se para tal fim a oportunidade da construção de barragens, já aprovada, do paul de Magos».
Não quero dizer, pois disso não tenho a certeza, que as próprias máquinas fossem pagas pelos proprietários, mas escuso de reforçar a afirmação de que a inexperiência se traduz num aumento do custo da obra, e eu posso até sintetizar em números: a barragem do paul de Magos, que devia comportar 6.000:000 de metros cúbicos, comporta apenas pouco mais de um terço da sua capacidade, e isso porque, quando a começaram, a encher, tiveram de a despejar à pressa, por que vertia água por todos os lados.
Em consequência disto teve de ser refeito o canal principal, e tudo custou muito dinheiro é todas estas considerações servem, afinal, para quê?
Servem para demonstrar que, se chegamos à conclusão de que os proprietários não podem com a carga que lhes puseram em cima, mesmo que o Estado tenha de ceder alguma cousa, tem muito por onde ceder.
E esta a demonstração que eu queria fazer, e a resposta que dou à minha primeira pregunta é: não estão equitativamente distribuídos os encargos pelo Estado e pelos particulares, porque o alcance das obras de hidráulica agrícola excede em muito o âmbito da acção do proprietário que lavra e cava a terra, e, por consequência, há uma parte, de interesse geral, que o Estado pode e deve pagar; pode, porque tem margem para isso, e deve, porque é essa a sua função.
Posto isto, Sr. Presidente, passemos à segunda interrogação: haveria pouco cuidado na execução dos orçamentos, visto que eles são sempre largamente excedidos?
Ora nós em 1937 já considerávamos excessivos os números que então vinham nesses relatórios, e que eram, em média, de 10.000$ por hectare.
Mas o que é que sucedeu depois?
Devo dizer a V. Ex.ª que jamais lhes ditarei um número que não venha em qualquer relatório ou documento dimanado da Junta de Hidráulica Agrícola, pois não quero servir-me de outros numeras.
Para o paul de Magos foi feito um orçamento de 5:800.000$.
Foi este ò projecto que se apresentou ao Conselho Superior de Obras Públicas, que o rejeitou uma vez e que o aceitou depois, fazendo muitas reticências e dizendo até que não foi feliz a hidráulica agrícola com o primeiro trabalho.

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Mais tarde, quando se apresentou em 1938 à Câmara Corporativa o plano de obras hidráulicas, o orçamento da obra do paúl de Magos figurava com a verba de 8:689.00.0$ e veio afinal a custar 9:466.000$, dobrando afinal o custo da obra desde o seu início até à sua conclusão.
É claro que o preço por Hectare, que estava por 8.134$62, passou a 17.000$, números redondos.
A barragem estava calculada para irrigar 720 néctares e passou simplesmente a irrigar 535.
Passemos agora aos campos de Loures. Esta obra teve três preços: o primeiro, por estimativa de uma firma inglesa, Macdonald & Portners, orçado em 2:681.000$. Essa obra previa uma pequena barragem, quê, felizmente para os interessados, se não realizou.
Depois, a Junta apresentou um orçamento de 4:655.000$, quási o dobro, e vindo afinal a custar 9:200.000$, passando o preço por hectare de 6.649$ para 9.200$... A barragem não se construiu, mas, se se tivesse feito, o preço por hectare viria a sei muito mais caro. A obra do paul de Cela foi também orçada pelos mesmos engenheiros em 2:289 contos, pela Junta mais tarde em 3:653 contos, e diz-se nesta plaguette-reclamé que publica a Junta de Hidráulica Agrícola, que custar á 4:740 contos. E diz que custará, porque provavelmente ainda não ficará por aqui.
Finalmente o campo de Burgãis, orçado em 1935 em 1:458 contos, mais tarde em 3:720 contos, deverá custar, diz a mesma plaquette, 4:030 contos.
Sobre a obra de Alvega poucas informações tenho, pois não fui capaz de entender as contas que foram apresentadas e1 por mais comparações que quisesse fazer não as consegui compreender. Mas para não deixar nada em claro direi que o que estava orçado em 2:550 contos passou para 2:860.
Ora, se estas obras foram feitas antes do período da guerra, por que razão haverá tam graúdo disparidade entre os orçamentos apresentados? E então fica no meu espírito uma preocupação maior: como V. Ex.ª sabem, há duas obras que estão em construção, uma a do vale do Sado e outra a da campina da Idanha. A primeira estava orçada em 116:000 contos e, segundo informações que tenho e estas não são da Junta, o custo dessa obra já está em 150:000 contos, o preço por hectare já está em 20 contos e a obra não estará concluída senão daqui a três ou quatro anos. Vejam V. Ex.ª a que preço, vai ficar, apanhando em cheio o factor, guerra.
Sôbre energia eléctrica, não sei dizer absolutamente nada simplesmente me preocupa a idea de que há-de ser d associação de regantes, que naturalmente será for fixada por pequenos agricultores, muito especialmente na Idanha, que terá de cuidar do assunto. Só sei dizer que é uma cousa que desejo ver realizada, pata destruir no meu espírito a convicção absoluta que tenho de que isso se traduzirá num insucesso completo, porquanto reputo esses regantes com a mais crassa incompetência para efectuarem negócios desta natureza. E agora, Sr.ª Presidente, vou passar a Outro ponto dó meu aviso prévio.
Será provável que a taxa de conservação, iguale ou exceda a taxa de beneficiação?
Já vimos, Sr. Presidente, a quanto subiram os encargos do custo da obra. Todavia ainda não vimos tildo.
A taxa de conservação, calculada em limites razoáveis, atingiu números verdadeiramente fantásticos. Eu passo a ler a V. Ex.ª os que encontrar.
Obra de Magos. A despesa de conservação custou, em 1938, 252$ por hectare em 1939, 501$ è, em 1940, 996Ç97. A despesa da beneficiação foi de 708$. .Pregunta-se: neste crescendo onde é que isto vai parar.

Obra de Cela. - A conservação deste paul estava calculada em 53.000$, mas veio a custar, em 1940,380.000$, números redondos?

Obra de Loures. - Estava prevista a importância de 70.000$ para a esta conservação. Em 1939, porém, gastaram-se 326.000$ e «m 1940 despenderam-se 535.000$.

Obra de Burgãis. - A verba prevista era de 36.200$, mas gastaram-se, em 1938, 45.000.$, depois, em 1939, 44.000$ e, em 1940, 55.787$.

Obra de Alvega. - Tinha sido prevista a quantia de 60.000$ para conservação. Porém, em 1939 gastaram-se 56.692$ e em 1940 despenderam-se 372.000$.
V. Ex.ªs compreendem facilmente que tam avultadas verbas de conservação alteram por completo todos os cálculos da Junta. E para não estar a aborrecer V. Ex.ªs continuamente com números, direi apenas o seguinte:

Tomemos por exemplo Cela, em cujas contas a hidráulica agrícola esperava, depois da obra feita, um lucro de 179.000$. Gomo a verba de conservação passou de 53.000$ para 380.000$, isto é mais 327.000$ do que o que estava calculado, torna-se evidente que p tal lucro líquido de 179.000$ se transforma num prejuízo de 148.000$.
São contas de uma simplicidade tal. que qualquer pessoa as pode fazer.
Eu podia continuar a citar números semelhantes para cada uma das obras realizadas. Mas não vale a pena, visto que as verbas são de tal forma chocantes que elas certamente impressionam V. Ex.ª tanto quanto ê necessário.
E, pôsto isto, Sr. Presidente, vamos a outra pregunta do meu aviso prévio: «Será conveniente que o Estado, sem esperar que os regantes se refaçam do abalo económico resultante da passagem da cultura de sequeiro para a de regadio, exija imediatamente quantiosos aumentos de contribuições?».
Parece que seria já suficiente para desanimar os proprietários interessados, nestas obras o excessivo custo da sua conservação, os espantosos aumentos nas obras de conservação, e, todavia, ainda não tinham atingido o cimo da sua tragédia.
Como V. Ex.ª sabem, a passagem da cultura de sequeiro para a de regadio implica um aumento de despesa, que se calcula em quatro ou cinco, vezes. E não é muito difícil compreender porquê. Uma terra irrigada tem muito mais trabalho, carece de muito maiores adubações, e é essa a explicação por que custa b seu trabalho quatro a cinco vezes o que se gastava quando estava de sequeiro. E então V. Ex.ª compreendem que os proprietários sofrem um abalo económico enorme com esse aumento.
Pois, sem se esperar que o proprietário se restabeleça deste abalo, supondo que basta chegar a água à terra para transmudar em riqueza a penúria do proprietário, o Estado cai em cima destes proprietários com exigências de contribuições verdadeiramente formidáveis. No último congresso de hidráulica agrícola em Espanha, realizado em Valladolid em 1934, o Sr. Leopoldo Ridmejo, que é uma pessoa de categoria, em Espanha, neste capitulo, disse o seguinte:

«Ao proprietário põe-se-lhe hoje a água numa vala principal por 50 por cento do seu custo e ainda o Estado lhe adianta a sua parte para pagar em vinte e cinco anus, com o juro de 1 1/2 por cento. Se com esta ajuda ao proprietário capitalista se lhe exige completar ò regadio e a. colonização implícita, a falência é certa, e o mesmo sucede se intenta fazê-lo por sua livre vontade.

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Nas povoações recém-formadas suo bem conhecidas as famílias arruinadas pela rega. O principal labor do Estado será o de conservar e fomentar o estímulo individual dos proprietários regantes, mas os que não quiserem ou não puderem realizar a transformação necessária devem ser expropriados imediatamente pelo preço de sequeiro.
O regadio não é um conjunto de obras hidráulicas. Todos os nossos .congressos o têm confirmado ao dizer que a rega é antes de tudo um problema económico e social».
Como V. Ex.ª vêem, em Espanha, nação vizinha, com afinidades de terra e de clima connosco, que tem feito uma larguíssima obra de hidráulica agrícola, não se supõe que tal obra baste para transformar a terra em ouro, antes se afirma que há muitas famílias arruinadas por motivo das obras de hidráulica agrícola. E, todavia, V. Ex.ª puderam ver, por esta citação que fiz, que as condições não são em Espanha piores do que aqui e que o Estado tomou à sua responsabilidade 50 por cento do custo da obra e ainda facilita o dinheiro aos proprietários, para pagarem a sua parte, a 1 1/2 por cento de juro.
Isto quere dizer que o proprietário, quando se faz uma obra de hidráulica agrícola, precisa de ser auxiliado, e não esmagado com exigências de toda a ordem.
E eu não quero deixar de ler a V. Ex.ª o que são as exigências tributárias em cima das outras exigências que já citei.
Essas exigências são as seguintes:

As contribuições em Magos passam de õ2$94 por hectare para 199$25, em Loures de 11.600$ para 116.480$ e em Cela de 12.903$ para 120.771$».
Chamo a atenção de V. Ex.ª para uma cousa curiosa: é que nas obras que são exclusivamente de enxugo, como as de Loures e de Cela, estas contos são multiplicadas por 10.
Devo dizer a V. Ex.ªs que Burgãis é um caso mais que imante no meio destas obras. Burgãis teve um parecer do Conselho Superior de Obras Públicas que quási a condenava em Absoluto, começando por dizer que era estranho que se fizesse uma barragem de 24 metros de altura para armazenar 330:000 metros cúbicos de água. Dizia-se que ainda assim essa albufeira não ficava em condições técnicas satisfatórias e, finalmente, duvidava-se do êxito económico da empresa, porquanto, no fim desse estudo, se dizia o seguinte: aumento de rendimento para o proprietário, 82 por cento; aumento das contribuições para o Estado, 377 por cento.
Estes números definem, quanto a mini, uma orientação - já o disse em 1937 e repito hoje que não pode ser conducente à produtividade destas obras.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Melo Machado, V. Ex.ª quere utilizar ainda os quinze minutos suplementares que o Regimento me permite conceder?

O Orador: - Se V. Ex.ª me aperta tanto o tempo, terei de ficar em meio. Este é um assunto de tal transcendência que não poderei em tam pouco tempo abordá-lo. Eu pedia a V. Ex.ª consultasse a Câmara sobre se permite a concessão de mais algum tempo...

O Sr. Presidente: - Bem, V. Ex.ª tem ainda os quinze minutos regimentais; no fim ver-se-á.

O Orador: - Como dizia a V. Ex.ª, Burgãis oferece neste capítulo aspectos curiosos. Em vista das percentagens que citei, passaram as contribuições de 32.580$ para 155.600$.
V. Ex.ª compreendem que se a taxa de conservação, por si só, já altera todos estes estudos económicos, transmudando em prejuízos os benefícios que se calcularam) parece evidente que êste aumento de contribuições não é de aceitar. E era por isso que disse no principio das minhas considerações que, se o Estado quiser acudir à situação económica em que se encontram as pessoas lesadas com estas obras de hidráulica agrícola, tem muito ainda por onde as beneficiar, sem criar para elas ou para si situações de prejuízo ou dificuldades.
Não compreendo que em obras de fomento desta natureza o Estado não possa suportar até certos prejuízos, que seriam mais tarde compensados com o desenvolvimento da economia nacional.
E passo a outra interrogação do meu aviso prévio: - Não haverá optimismo excessivo nos estudos económicos?
Devo dizer com franqueza, como é meu costume, e sem desprimor para ninguém, nem mesmo para a Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, porque respeito o trabalho de todas as pessoas, que estes estudos económicos me dão a impressão de serem feitos como os romances policiais: do fim para o principio.
Sabem V. Ex.ªs que não tem havido nenhum controle para estes estudos económicos, e assim nos aparecem como os quiseram fazer, sem que tivessem podido sofrer contestação.
São de tal natureza estes estudos económicos que, por exemplo - como sucede com o paul de Magos -, se aumentou para o dobro o custo da obra e se aumentou em mais 40 por cento do que o custo da obra o custo da conservação, que nem sequer tinha sido previsto no estudo da obra, censura que lhe fez o Conselho Superior das Obras Públicas.
Deminuiu a capacidade da albufeira para quási um terço, deminuia o número de hectares irrigados, que passou de 720 para 535, e no entanto o estudo económico resistiu a todas estas calamidades.
Todos sabem como ó precária e contingente a vida de lavrador. Um golpe de sol mais forte, umas chuvadas . mais abundantes são o suficiente para transmudar em prejuízo o lucro tam ansiosamente esperado. Assim, não é sem espanto que se pode ver que os estudos económicos resistam a tudo isto.
No caso de Loures dá-se exactamente o mesmo, e até i aqui sucede uma cousa para a qual desejo chamar a atenção de V. Ex.ª.
Diz a plaquette que a Junta de Hidráulica Agrícola distribuiu que a produção anterior às obras em de 149.000)$, mas mais adiante lê-se:

«O ano de 1939 foi, pois, o primeiro da exploração da obra de fomento agrícola de Loures, e é altamente consolador dizer que a área total beneficiada, situada a dois passos de Lisboa, constituída por terras ricas e de grande potencial, condenadas a não darem mais do que amas tantas carroçadas de palha-carga e uma miserável pastagem, transformadas de inverno e primavera em verdadeiros pântanos, só de utilidade para a caça às narcejas, entrou, praticamente, em plena cultora logo no primeiro ano da exploração. E os resultados na verdade são consoladores, como indicam os números que seguem sobre a produção:

E vem a seguir nina série de números, chegando-se ao volume de 1:939.000$, nos quais avultam hortas no valor de 1:318.000$.
Simplesmente, afirmam os proprietários dessa região que não há em Loures nem mais um metro quadrado de horta do que havia anteriormente às obras, e portanto é absolutamente impossível que tivesse transformado 149.000$, mesmo que estes fossem provenientes só de hortas, em 1:318.0000

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De resto Sr. Presidente, esta cultura hortícola, como qualquer dos Srs. Deputados pode verificar, é exercida por pequenos proprietários, que ao mesmo tempo fazem o seu transporte e vem fazer a venda às praças de Lisboa, vivendo numa economia precária.
Sabem V. Ex.ªs, Srs. Deputados, que é enorme a concorrência de hortaliças no mercado de Lisboa, e, se Loures passasse da produção de 149.000$ para a de 1:318.000$, teria havido um verdadeiro cataclismo nos preços das hortaliças.
Poderia citar outros casos: Cela, Alcobaça, Nazaré, etc., fazem parte de uma das regiões do País onde a hortaliça é mais barata. Como é possível, pois, chegar ao rendimento em hortas de 3:500.000£, como quere a Junta?
Se passarmos ainda para os estudos não executados completamente, como, por exemplo, o Vale do Sado; Idanha e Algarve, vemos que a principal verba no aumento da produção é, pelo menos para a Idanha, a das laranjas, nada menos de 1:250:000$. O proprietário tem de pagar no primeiro ano da obra concluída uma importância considerável...

O. Sr. Carlos Borges (interrompendo): - E as condições climatéricas para cultivar laranjais?

O Orador: - Dado mesmo que haja essas condições, é preciso esperar uma dúzia de anos para se produzirem laranjas, sendo preciso ainda saber onde estão os mercados consumidores e qual o prego ido transporte. Incluindo os planos respeitantes ao Sado e ao Algarve, chegou-se a uma produção de 5:000.000$ de laranjas.
Este problema tem os seus aspectos graves e sérios. Há manifestamente uma crise mundial de citrinas. As citrinas estão em crise na vizinha Espanha, na América, no Brasil, na África do Sul e até nas nossas próprias polónias.
Afigura-se-me, pois, uma utopia, firmar esperanças económicas numa larga produção de citrinas.
Nós vamos com este plano de obra de hidráulica agrícola aumentar enormemente a produção do País. Conta-se com isso; e, se não espero que esse facto se realize naquele larguíssimo plano a que deita contas a Junta da Hidráulica Agrícola, não há dúvida de que a água é sempre um elemento de aumento de produção. E, nesta conformidade, abstraindo do momento actual, que é de excepção e nestes casos deve trabalhar-se para o tempo normal e não para a excepção -, devo dizer a V. Ex.ª o que se passou em Espanha.
Lá, onde há uma obra de hidráulica agrícola desenvolvidissima, no congresso ali realizado em 1934 p que se discutiu com mais cuidado foram as culturas possíveis. Assim, pediu-se ao Estado a protecção para a cultura de tabaco, de algodão e de beterraba para fabrico de açúcar. E ainda houve teses em que se considerou à necessidade da cultura de plantas medicinais e para perfumes!
Quando se encaram como remédio estas culturas já sabemos que a economia está periclitante. Sr. Presidente: pregunto: que vamos nós, portugueses, produzir, ao aumentar a nossa produção nestas grandes quantidades?
Vamos plantar mais arroz? Todos V. Ex.ªs sabem que em arroz já atingimos auto-suficiência, que a sua produção já está condicionada.

O Sr. Carlos Borges: - Mas as terras de arroz esgotam-se com facilidade.

O Orador: - Mas não podemos aumentar muito essa produção, para não haver excesso.
O que é que nos fica? Os cereais e as carnes.
Quanto aos cereais, parece-me ainda hoje ideal a rega do trigo. V. Ex.ªs que são lavradores sabem que quando chega a primavera muitas searas estão lindas, mas começa a falta de chuvas e o inverno excessivo não deixou ser suficiente o desenvolvimento radicular, e ás searas que estavam prometedoras passam a dar uma produção escassa, de algumas sementes apenas.
Por consequência, seria interessante regar o trigo, mas parece, Sr. Presidente, que, dizem os técnicos, ainda não está apurado se é conveniente ou não regá-lo. Para mim continuo na convicção de que seria conveniente, mas não posso afirmar de certeza. E então, se não podemos regar o trigo, fica-nos a produção da carne. Uma das razões por que falta a carne é porque o sen preço está abaixo das possibilidades económicas, falta a carne porque ninguém está disposto, a trabalhar e produzir para perder. Quem trabalha quere ter lucro.
Sr. Presidente, quando encaramos este problema da Hidráulica agrícola, temos de encará-lo também sob o ponto de vista da colocação dos produtos...
Evidentemente não, vamos amanhã por todos os lavradores á produzir em grande quantidade, para se verem há impossibilidade de colocar a produção.

O Sr. Presidente: - Quanto tempo calcula V. Ex.ª precisar para concluir o seu discurso?

O Orador: - Falta pouco.

O Sr. Presidente: - E. reconheço a boa vontade de V. Ex.ª e tanto eu como a Assemblea reconhecemos que V. Ex.ª fez uma exposição modelar, cingindo-se rigorosamente ao assunto.
Não há portanto, observação alguma a fazer, mas legem habemus...
Quanto tempo, pois, calcula precisar?

O Orador: - Quinze minutos apenas.

O Sr. Presidente: - Têm V. Ex.ª quinze minutos para concluir.

O Orador: - Diz-se ha memória descritiva do paul dê Magos o seguinte:

«É de facto necessário ir ao encontro da natural desconfiança dos futuros, beneficiários. Dai a necessidade de evitar, com o maior dos carinhos, qualquer deficiência de estudo que possa trazer o descrédito á uma campanha utilíssima».
A propósito de carinho, quero dar à Camará conhecimento de uma nota que em encontrei num relatório impresso da Companhia das Lezírias. Esta pediu uma cópia da planta elaborada na parte que lhe interessava. A Junta respondeu-lhe que o preço dessa cópia era de 21.380$. Sabido que plantas, estudos e obras, tudo é pago pelos beneficiários, é na verdade uma manifestação de carinho!
Ainda outro caso: um proprietário pediu licença para decalcar uma parto da planta, ou seja aquela que lhe interessava. Foi-lhe recusado.
Mas pregunta-se: 40 que vai fazer o Estado? Vai executar esses proprietários, vai apropriar-se das terras que lhes pertenciam?
Irá o Estado ficar com essas: terras pelos preços que a Junta Autónoma lhes atribuiu depois da obra?
Se o Estado vai por em praça essas propriedades o se não aparece ninguém que dê a importância que foi atribuída, pregunto se será possível, dentro do espirito da justiça, que a esses proprietários se vá exigir, que paguem com outras propriedades além das beneficiadas, seria a confirmação absoluta de todas as reclamações que tem feito.
Mas vamos à melhor hipótese: o Estado fica com essas terras para si pelo preço que a Junta da Hidráu-

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lica Agrícola estabeleceu. O que vai fazer? Vai estabelecer A colonização? Mas por que preços? á Se os primeiros proprietários não puderam com os encargos, que irão fazer os segundos, tendo ainda por cima de pagar a sua instalação?
Pregunto se há alguém que tenha a coragem de afirmar que esses colonos podem pagar todas essas taxas.
Ainda surge um outro óbice: a propriedade em Burgãis e em Cela está muito pulverizada. Naquelas zonas a propriedade anda por 1:000 a 2:000 metros quadrados. £0 Estado vai tirar essas terras a esses pobres homens, para as dar a. outros ? O problema tem uma acuidade e uma angústia que se tem de encarecer.
Razão tinha o parecer, da Câmara Corporativa para dizer que os números apresentados pela Janta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola deviam ser acolhidos com prudente reserva.
Vou passar agora ao último ponto do meu aviso prévio : Ter-se-á respeitado integralmente o disposto no artigo 55.º do decreto n.º 28:652?
O artigo 55.º diz:

«O valor actual das anuidades a pagar não poderá exceder a mais valia resultante das obras efectuadas.
§ único. O valor actual das anuidades por hectare, calculado nos termos da base vi da lei 1:949, de 15 de Fevereiro de 1937, é igual ao casto da obra pela mesma unidade de superfície; a mais valia por hectare ficará fixada com base no valor inicial da terra e no aumento resultante do beneficio.
Sr. Presidente: parecia que dentro deste artigo da lei estava a defesa do proprietário, mas a forma excessivamente vaga por que ele se encontra descrito impediu que actuasse como devia.
Quando em 1937 a lei foi aqui discutida, apresentei uma proposta que foi rejeitada. Essa minha proposta visava a que, quando um proprietário, em presença do estado económico, não julgasse satisfatória a sua situação, o Estado ficaria com a propriedade pelo seu valor antes da execução da obra, fazendo dela depois o que entendesse.
Assim se evitariam as fantasias burocráticas e o Estado recomendaria aos seus funcionários que tivessem cuidado com o custo das obras.
Simplesmente, esta proposta não pôde ser aprovada porque disse-se era contra a Constituição, por representar um aumento de despesa.
Eu' pensava que, quando estas obras se apresentavam com tam fulgurantes resultados, não era de um aumento de despesa, mas de receita, de lucros e de riqueza que se tratava.
Verdade seja que muitos artigos da lei não se têm executado.
O parecer da Câmara Corporativa afirma o seguinte:

Prevê a Junta que só no custo da rega, que hoje sobe em alguns sítios a mais de 1.400$ por hectare, a redução possa atingir 50 por cento.
Simplesmente, esta quantia de 1.400$ é absolutamente exagerada.
Posso afirmar com conhecimento directo da questão, pelas afirmações de muitos proprietários e até por números que encontrei no Ministério da Agricultura, que pelo menos no Ribatejo o preço da rega andava, quando muito, â roda de 7000.
Pois bem: se V. Ex.ªs considerarem, por exemplo, o paul de Magos, incluídas todas as taxas e ainda o aumento das contribuições, essa rega custa, não já os modestos 700$, não já os 1.400$ a que se referia com um certo desprezo a Junta Autónoma, mas 1.900 f, ficando-se assim muito longe da tal aspiração de reduzir n taxa de 50 por cento, porque o que sucedeu foi aumentá-la.
Sr. Presidente: eu presto as minhas homenagens às intenções do Govêrno, que foram patrióticas, como sempre, e aos proprietários agrícolas, que têm vivido horas amaríssimas, em vez de estarem jubilosos.
Quando um proprietário oferece desfazer-se da sua propriedade é porque tocou o extremo limito das suas possibilidades. O amor e o carinho do lavrador português pela terra que amanha merecem respeito.
Mas todos nós confiamos no espirito de justiça do Govêrno, e por isso são de inteira e completa confiança as últimas palavras que profiro nesta tribuna.
As obras de hidráulica agrícola hão-de ser porque é mester que o sejam elemento de riqueza, de prosperidade, ou, pelo menos, de honrada e tranquila mediania.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. António Augusto Aires: - Roqueiro a generalização do debate.

O Sr. Presidente: - Está deferido.
Em face do § 2.º do artigo 45.º do Regimento, finda a efectivação do aviso prévio, o Presidente poderá dar ao Deputado as explicações colhidas por via oficial.
Efectivamente, chegaram à Presidência informações transmitidas por via oficial, mas dessas informações já V. Ex.ª tem conhecimento porque eu fi-las publicar em suplemento ao Diário das Sessões. Pareceu-me êsse o meio mais útil de V. Ex.ª tomarem conhecimento delas, dada a complexidade de tais informações e a documentação de que elas vinham acompanhadas. Portanto, dispenso-me de as ler.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra u Sr. Deputado António Augusto Aires.

O Sr. António Augusto Aires: - Sr. Presidente: cumprimento o ilustre Deputado Sr. Melo Machado pela forma serena e inteligente como fez a exposição do seu aviso prévio.
Eu vou dar também a minha contribuição a êste debate.
A leitura de alguns artigos publicados na imprensa da capital, criticando os resultados da política de fomento hidro-agrícola que está sendo realizada pelo Estado Novo, impressionou-me sobremaneira.
Do que nestes se dizia era-se levado a concluir que os aproveitamentos hidro-agricolas já em exploração causavam prejuízos, em vez de benefícios.
O custo das obras, principalmente, era apontado como incomportável pela economia daqueles quo haviam de pagá-las.
Donde lá ser dizia eu que os aproveitamentos hidro-agricolas sejam causa de ruína no meu País, quando nos outros são cansa de riqueza!?
A verdade porém - diziam-me - é que há queixas e reclamações.
Ora eu, Sr. Presidente, tinha votado nesta Câmara a lei n.º 1:949, que é o regime jurídico das obras de fomento hidro-agrícolas, e conhecia a letra do decreto n.º 28:652, que regulamenta a lei. Sabia, portanto, que os interesses dos proprietários das terras sujeitas às obras de rega e enxugo eram por esta inteiramente assegurados.
Efectivamente o reembolso ao Estado, pelos proprietários, de todas as despesas efectuadas com estudos, projectos e execução das obras é feito de harmonia com

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a letra da base VI da lei n.º 1:949 e dos artigos 55.º e 56.º do decreto n.º 28:652, verificada que seja a mais valia.
Quere dizer: se se verifica a mais valia, a obra resultou e a propriedade está em condições de suportar os encargos; se não se verifica, o interessado ou interessados fazem as suas reclamações, sendo estas conduzidas conforme o estabelecido no artigo 33.º do decreto n.º 28:652.
Mas ... havia reclamações e queixas - diziam-me.
Se há reclamações e queixas é porque a lei não está a ser cumprida, ou está- a sê-lo mal.
Esta foi a razão por que em 5 de Dezembro pedi aos Ministérios das Obras Públicas e Comunicações e da Economia os esclarecimentos constantes do meu requerimento.
De posse hoje dêsses esclarecimentos, vou dar conta à Assemblea Nacional do estudo minha contribuição neste debate que deles fiz.
Para melhor compreensão ordenarei as minhas considerações referidas, é claro, ao plano da hidráulica agrícola apreciado pela Câmara Corporativa e aprovado pelo Governo, tratando primeiro do custo das obras em exploração, em seguida do sen resultado económico e por fim, depois de uma referencia ao custo das obras de
hidráulica agrícola na Argélia, considerarei a sugestão feita pela Junta ao decreto n.º 28:652.
O custo das obras em exploração, incluindo o encargo, de estudos e projectos, com as obras complementares que foram feitas nos termos do decreto-lei n.º 28:290, por serem justificados e pedidos pelos interessados com as despesas efectuadas de expropriações para passagem de valas e canais pelas terras beneficiadas, cujo valor foi pago aos beneficiários, com os encargos da organização do cadastro feito por força da própria lei n.º 1:949 (artigo 21.º do seu decreto regulamentar n.º 28:652), foi por hectare beneficiado o seguinte:

Paúl de Magos.......... 17.691$59
Paúl de Cela .......... 11.036$87
Campos de Loures........ 8.995$93
Campos de Burgãis ......23.988$10
Campos de Alvega ....... 6.793$34

As obras de Cela, de Loures, de Burgãis e de Alvega foram feitas a pedido dos interessados; da de Magos não há na Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, onde me informei, documentação que esclareça a matéria.
Os números apresentados sito realmente grandes para Magos e Burgãis e causam justificada impressão em quem os observe isolados e fora do problema económico e social a que dizem respeito. De facto, sob este aspecto, o Estado pode ter receios, mas os proprietários não. Estes jamais têm a perder, seja o que for, desde que a lei n.º 1:949 seja escrupulosamente aplicada, pois o beneficiário só paga os encargos das taxas correspondentes aos números que acabo de mencionar quando haja real mais valia. Não a havendo, é o Estado que perde o reembolso do capital que abonou, dando-se por satisfeito em colher os benefícios indirectos que as obras de rega levam consigo a toda a parte.
Este é, me parece o problema. E, do que se conhece; tal problema só ainda foi considerado para uma único, obra - o paúl de Magos.
Nenhuma, outra teve até hoje notificação para pagamento do reembolso ao Estado das quantias abonadas para estudos, projectos e obras. Magos, sim, já teve. Magos reclamou, e Magos foi atendido naqueles casos que foram considerados justos. Dos cinco beneficiários, quatro foram atendidos, um não. E não porque o julgamento feito nos (termos do artigo 29.º do decreto n.º 28:652 pela Junta, onde a- Procuradoria Geral da República e a lavoura têm assento e voto, provou a existência de mais valia nas terras do beneficiário, dono de mais de 84 por cento da área total: a Companhia das Lezírias o Tejo e Sado.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª dá-me licença, se não incomodo?

O Orador: - Não me incómoda nada.

O Sr. Melo Machado: - E para dizer a V. Ex.ª quê nesse caso do paúl de Magos a Companhia das Lezírias já regava muitos hectares, e eu pregunto a V. Ex.ª se é justo que quem já regava pague tanto como quem nada regava.

O Orador: - Quem podo responder a V. Ex.ª não sou eu, mas a lei. Ela gira em volta da maior valia. Se o proprietário beneficiado tem mais valia, paga; se não tem mais valia, não paga.
Passo agora a referir os resultados económicos das obras em exploração, que são:

Obra de Magos. - Área beneficiada, 534ha,5000.

Valor da produção, em coutos:

a) Antes das obras ........................ 724
b) Previsto no cadastro ................. 2:592
c) Realidade em 1940 .................... 2:603

Obra de Cela. - Área beneficiada, 454ha,8000.

Valor da produção, em contos:

a) Antes das obras ............. 167
b) Previsto no cadastro ...... 1:510

c) Realidade:

Em 1939, em .................. 271
Em 1940, em 275há, 7000....... 533

Em 1940, somente em cerça de 60 por cento da área total o valor da produção, que nesta era de 167.000$ antes da obra, subiu para 533.000$ tendo por isso o aumento de quási 220 por cento.
O aumento, como se vê, é grande, e para surpreender não é que venha a ser maior logo que se constitua a associação de regantes e esta tenha ao seu dispor o auxílio de crédito previsto na base XVI da lei n.º 1:949, regulada pelos artigos 35.º, 36.º e 37.º do decreto n.º 28:653.

O Sr. Carlos Borges: - Como foram feitos, números?

O Orador: - Estes números são oficiais. Foram-me fornecidos pelo Ministério das Obras Públicas e Comunicações. Eu sei que a Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola manda brigadas de técnicos, regentes agrícolas chefiados por um agrónomo, a avaliar a produção.

O Sr. Carlos Borges: - E essas brigadas avaliam também as searas?

O Orador: - Devem ter avaliado.
Mas eu continuo a ler a V. Ex.ªs os resultados dos obras em exploração.

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Obra de Loures. - Área beneficiada, 736ha, 5000.
Valor da produção, em contos:

a) Antes das obras....................... 145
b) Previsto no cadastro ................1:456
c) Realidade em 1940, ainda sem todo o sistema de defesa e enxugo ter atingido o seu completo objectivo. ............... 1:214

Obra de Burgãis. - Área beneficiada, 168ha,4000.

Valor da produção, em contos:

a) Antes das obras ................. 407
b) Previsto no cadastro .......... 1:946
c) Realidade em 1940, em 70 ha, 7000
em exploração ...................... 526

Isto é: em 42 por cento da área abrangida pela beneficiação o valor da produção excedeu o valor total de antes da obra.

Obra de Alvega. - Área beneficiada, 421ha, 7000.

Valor da produção, em contos:

a) Antes, das obras ................. 693
b) Previsto no cadastro ........... 1:967
c) Realidade em 1940, só em 293ha em
exploração............... ..........1:132

Quere dizer: em 69,5 por cento da área abrangida pelo melhoramento o valor da produção subiu de 698 contos, que tinha antes da obra, para 1:132 contos, isto é, teve um aumento superior a 62 por cento.
Os numeras mencionados dizem a todos que analisem o problema da hidráulica agrícola que a política do fomento hidro-agrícola do Estado Novo tem sido acertada e que o departamento da hidráulica agrícola a tem servido escrupulosamente.
Há, sem dúvida, quem objecte: mas os cálculos das previsões de antes das obras para a produção são baixos e, ao contrário, os de depois das obras são altos, e daí a excelência dos resultados.
A tal objecção observarei: quanto às previsões para depois das obras, os resultados reais confirmam-nas, excedendo-as mesmo, e isto é o que fundamentalmente interessa. Pelo que diz respeito aos valores de antes das obras, há que atender que estão subscritos por agrónomos de cuja probidade não é lícito duvidar.
Entre eles pedimos licença para destacar o considerado professor de agricultura geral do Instituto Superior de Agronomia, o Dr. Helbling.
As obras de hidráulica agrícola não são caras só em Portugal, mas sim em todas as partes do mundo.
Um exemplo: as obras feitas recentemente pelo governo francês na Argélia, que abrangem 100:000 hectares, tanto como quási todo o plano da hidráulica agrícola em Portugal, importam em 15.000$ por hectare, respeitando este custo somente as obras das albufeiras « dos condutores gerais; quere dizer: as despesas a fazer com a adaptação dos terrenos ao regadio, com os sistemas de defesa contra as cheias e com as obras da rede de canais distribuidores secundários e terciários não foram consideradas no cálculo.
A quanto montará, finalmente,- o custo por hectare do» aproveitamentos hidro-agrícolas na Argélia?
O Sr. M. R. Martin, director das obras de irrigação na Argélia, não o diz na publicação da sua autoria Les Grands Barrages, que li há dois dias.
Sr. Presidente: vou terminar as minhas considerações perfilhando uma sugestão da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola.
Diz ela, com o saber de experiência feito, que algumas disposições do decreto n.º 28:652 se devem ajustar às necessidades da lavoura, no sentido de se observar um período transitório entre a conclusão das obras e a efectivação do pagamento das taxas de exploração e conservação.
De facto, nos primeiros dois a três anos a seguir ao acabamento das obras, e emquanto estas não adquirem a consolidação dos aterros de valas e canais, os encargos de conservação e exploração são bastante grandes.
Acresce a isto que ás despesas de amanhos e culturais, que o regadio intensivo impõe na passagem do regime de sequeiro ao de rega, tem p sen ponto culminante nos primeiros anos. Há que reconhecer a necessidade de ser estabelecido um período transitório durante o. qual as despesas da taxa de exploração e conservação sejam levadas à conta de encargos de primeiro estabelecimento, reembolsáveis com as taxas de rega e de beneficiação em cinquenta anuidades.
No desejo de ser útil à lavoura do meu País, exprimo este voto ao Governo, pedindo-lhe que o atenda.
Antes, ainda, de concluir quero agradecer ao Sr. Ministro das Obras Públicas a atenção de ter satisfeito o meu pedido de informações, e a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o ter ordenado a sua publicação no Diário das Sessões, porque, realmente, os esclarecimentos pedidos interessam não só a mim mas a toda a Câmara.
Ao Governo dirijo as minhas felicitações, nas pessoas dos Srs. Presidente do Conselho e Ministro das Obras Públicas, pela grandiosa obra de fomento hidro-agrícola que vem realizando no País.
Disse.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Sr. Belfort Cerqueira: - Sr. Presidente: devo começar por me solidarizar com o orador antecedente nos cumprimentos que apresentou ao Sr. Deputado Melo Machado, pelo brilho da sua exposição, pela oportunidade do assunto que nos trouxe e pela nobreza da sua intenção de bem servir, demonstrada pela iniciativa do seu aviso prévio.
Recebi, Sr. Presidente, as informações que V. Ex.ª tam louvavelmente fez o obséquio de mandar imprimir para nosso conhecimento; e lendo-as, embora rapidamente, considero relevante a apresentação de dois argumentos com que se pretende justificar a propriedade das obras da hidráulica agrícola: o primeiro interessa ao valor social do empreendimento, e o segundo às consequências que dêle derivam para a electrificação nacional, pela realização simultânea de aproveitamentos hidro-eléctricos.
O conhecimento destas duas razoes tornou imperativo que eu viesse a esta tribuna para dizer duas palavras, dado que a sua consideração condiciona a minha posição, que preciso esclarecer, na votação possível de qualquer moção que seja apresentada.
Eu entendo ser incompreensível, por ser uma função natural do Estado a execução de obras públicas de interêsse social, que elas se realizem sem a sua participação financeira.
Por outro lado, procura-se na informação comparar o custo da energia eléctrica obtida ou não em conjugação com o empreendimento hidro-agrícola e admite-se em qualquer dos casos a taxa de 2 por cento relativa à amortização e renovação de material, o que corresponde a um período de cinquenta anos.
Ora não há nenhum material de instalação eléctrica que possa durar semelhante tempo.

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No entanto, e mesmo admitindo a exactidão do baixo custo obtido da energia eléctrica, poderia preguntar-se por que forma a associação de regantes faria beneficiar dessa vantagem a generalidade dos consumidores.
Desde que a associação de regantes facultasse as tarifas derivadas do baixo custo aos outros consumidores, isso seria fazê-los beneficiar de uma vantagem para a qual nada teriam concorrido.
No caso contrário inutilizava-se o argumento da vantagem proveniente da realização simultânea dos aproveitamentos hidro-agricolas e hidro-eléctricos.
Foi fundamentado um pouco nesta razão que, quando, e n 3 de Fevereiro de 1939, apresentei nesta Assemblea um projecto de lei sobre electrificação rural, propus na base 23.ª o seguinte:

«A exploração de todos os aproveitamentos hidro-eléctricos derivados das obras de hidráulica agrícola em projecto ou já em construção e de todas as linhas ou redes que lhes digam respeito será adjudicada por arrendamento às uniões municipais electro-agrárias ou às suas federações, tais como são definidas neste projecto de lei».
Quere dizer: haveria uma comparticipação generalizada de todos os consumidores na exploração e financiamento desses empreendimentos eléctricos.
É por isso, Sr. Presidente, que eu não podia deixar de vir a esta tribuna para afirmar que julgo aconselhável em qualquer moção que seja votada que os encargos da parte hidro-agrícola dos empreendimentos sejam repartidos entre o Estado e Os regantes e que se atribua a exploração hidro-eléctrica e a liquidação dos encargos correspondentes aos organismos da fornia que considerei, com participação de. todos os consumidores.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - O debate continuará na sessão de amanhã.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 17 minutos.

O REDACTOR - Luiz de Avilez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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