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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 46
ANO DE 1943 15 DE DEZEMBRO
III LEGISLATURA
SESSÃO N.º 43 DA ASSEMBLEA NACIONAL
EM 14 DE DEZEMBRO
Presidente: Exmo. Sr. José Alberto dos Reis
Secretários: Exmos. Srs. José Manuel da Gosta
Augusto Leite Mendes Moreira
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 53 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário da última sessão.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Proença Duarte e Hintze Ribeiro, que evocaram a memória de Sidónio Pais, e Antunes Guimarãis, que aludiu à forma como são distribuídas determinadas publicações oficiais e versou algumas questões de carácter económico.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão na generalidade da proposta de lei de autorização de receitas e despesas para o ano de 1944, usando da palavra os Srs. Deputados Ulisses Cortês, Marques Mano e Bartolomeu Gromicho.
O Sr. Presidente declarou encerrada a sessão às 17 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 45 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhãis.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre de Quental Gaiteiros Veloso.
Álvaro Salvação Barreto.
Amândio Rebêlo de Figueiredo.
António de Almeida.
António Bartolomeu Gromicho.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Hintze Ribeiro.
António Rodrigues Cavalheiro.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto Leite Mendes Moreira.
Carlos Moura de Carvalho.
Fernando Augusto Borges Júnior.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Henrique Linhares de Lima.
Jaime Amador e Pinho.
João Ameal.
João Antunes Guimarãis.
João Duarte Marques.
João Garcia Nunes Mexia.
João Luiz Augusto das Neves.
Joaquim Mendes do Amaral.
João Pires Andrade.
João Xavier Camarate de Campos.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Saldanha.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Alberto dos Reis.
José Clemente Fernandes.
José Dias de Araújo Correia.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Luiz da Silva Dias.
José Manuel da Costa.
José Maria Braga da Cruz.
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José Pereira dos Santos Cabral.
José Ranito Baltasar.
José Rodrigues de Sá e Abreu.
José Soares da Fonseca.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Júlio César de Andrade Freire.
Juvenal Henriques de Araújo.
Luiz de Arriaga de Sá Linhares.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Lopes Vieira de Castro.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Luiz Mendes de Matos.
Manuel da Cunha e Costa Marques Mano.
Manuel Joaquim da Conceição e Silva.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Pedro Inácio Álvares Ribeiro.
Quirino dos Santos Mealha.
Rui Pereira da Cunha.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 64 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 53 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: Está em reclamação o Diário da última sessão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Visto que não há reclamações sobre o Diário, considero-o aprovado.
Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Artur Proença Duarte.
O Sr. Artur Proença Duarte: - Sr. Presidente: a obra que com ingente esforço em Portugal agora se realiza, na qual aqui colaboramos - da instauração da ordem social cristã, como escreveu o grande semeador da mais pura semente do nacionalismo português António Sardinha -, só se tornou possível à custa do sacrifício de muitos, que, impulsionados pela alma da Nação, em nome dela e por ela travaram luta de morte contra as ideas e práticas dissolventes das virtudes e dignidade do povo português.
Nessa luta perderam a vida alguns, não poucos e dos melhores, já combatendo denodada e lealmente de armas na mão, já varados pelas balas traiçoeiras disparadas das trevas em quê se acoitavam o ódio e o desespero de situações e de interesses perdidos, que nada tinham que ver com o interesse nacional e antes lhe eram profundamente repugnantes.
A revolução que a despeito de tudo vimos realizando mergulha raízes no esforço dos que assim lutaram e no sangue derramado dos que por ela morreram abnegadamente.
Não o podemos esquecer.
É para relembrar um dos que morreram, faz hoje vinte e cinco anos, para lembrar a beleza e generosa grandiosidade da sua idea governativa, de que a nossa revolução mais não é do que um superior e ordenado desenvolvimento, que me encontro no uso da palavra para pedir à Câmara que considere este relembrar como justa e devida homenagem à memória de Sidónio Pais e como afirmação de que ele morreu servindo com acerto os mais altos interesses da Nação.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. António Hintze Ribeiro: - Sr. Presidente: pedi a palavra para me associar à homenagem que o ilustre Deputado Sr. Proença Duarte acaba de prestar à saudosa memória do falecido Presidente Dr. Sidónio Pais.
O Sr. Antunes Guimarãis: - Sr. Presidente: apesar de a leitura do Diário do Govêrno não ser das mais amenas e atraentes, confesso que nunca deixo de passar os olhos pelos números da l.ª série que vou recebendo na minha qualidade de Deputado. Se as outras séries nos fossem também enviadas, como, aliás, já aqui fôra proposto pelo ilustre Deputado Sr. Dr. Braga da Cruz (julgo que na I Legislatura), eu não deixaria de me socorrer da fartura de elementos que elas coleccionam, os quais, constituindo indicadores preciosos para se aquilatar dos negócios do Estado e das múltiplas actividades que traduzem a vida nacional, seriam de consulta muito vantajosa para os que exercem as funções de representantes da Nação.
Apoiados.
Não logrou resultado aquela proposta. Por isso, recebendo apenas a l.ª série do Diário do Govêrno, continuamos privados das lições que poderíamos colher nas outras séries. E não é fora de propósito referir o caso estranho de ficarem os Deputados, por vezes, esquecidos na distribuição de publicações dimanadas de variadas direcções gerais e doutros organismos do Estado, sendo de registar que, de tantas que dignamente ilustraram o memorável ciclo das comemorações centenárias (Apoiados), e, por isso mesmo e com razão, largamente distribuídas a nacionais e estrangeiros, poucas receberam os endereços dos 90 deputados que compõem esta Assemblea Nacional. Não acredito que tivesse sido por temor do ligeiríssimo agravamento que daí resultaria para um orçamento que no capítulo das despesas se cifrara em bastantes dezenas de milhares de contos.
Mas, Sr. Presidente, vinha eu dizendo que cultivo a leitura da folha oficial, que dia a dia me vai pondo em contacto com a orientação do Govêrno. E não esconderei que presto particular atenção aos números publicados nas vésperas da abertura desta Assemblea Nacional, porque me elucidam acerca dos assuntos em que a nossa colaboração é dispensada, uma vez que os diplomas publicados antes de 25 de Novembro não carecem da nossa ratificação para se manterem em vigor.
Não são volumosos como noutros anos os Diários e respectivos suplementos publicados em Novembro último. Contudo, entre os diplomas neles publicados alguns seriam dignos de glosa, pelo seu grande alcance e consequências de manifesto relevo. Ainda ontem o nosso ilustre colega Sr. capitão João Duarte Marques aludiu com louvor ao que concede aos servidores do Estado um suplemento de 20 por cento sobre os vencimentos, ordenados, salários e outras remunerações, sendo apenas de lamentar que circunstâncias que o Govêrno com certeza ponderou não tivessem permitido desde já alargar aqueles benefícios por agora atribuídos aos funcionários na actividade de serviço aos que figuram na situação da reserva, reforma e equivalentes.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Largos comentários mereceria também outro diploma, publicado no suplemento de 24 de No-
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vembro - o decreto-lei n.º 33:278 -, que autoriza a construção pelo Govêrno e câmaras municipais de 5:000 moradias económicas, das quais 1:000 desmontáveis.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não o consente o escasso tempo estabelecido no Regimento da Assemblea Nacional para as considerações antes da ordem do dia; por isso limitar-me-ei, por agora, a apreciar uma resolução do Govêrno, expressa numa dúzia definhas, e muito modestamente encadernada em simples despacho, com data de 23 de Novembro último e publicada no Diário de 26 do mesmo mês.
Refere-se às pequenas indústrias e tem o seguinte teor:
«A falta de regulamentação de algumas indústrias, prevista na base IV da lei n.º 1:956, levanta o problema de saber como deve encarar-se o funcionamento do respectivo trabalho caseiro, que essa regulamentação deveria condicionar, nos termos expressos naquela base. Nestas condições, e emquanto se não publicarem esses regulamentos, deverá aceitar-se a existência da indústria caseira como está definida no artigo único do decreto n.º 23:630, de 5 de Março de 1934, considerando-se legalizadas, para efeito do condicionamento industrial, as instalações que estejam abrangidas por aquela definição e procedendo-se nos termos legais contra as restantes.
Desta forma são condenadas a desaparecer muitas oficinas de trabalho, isto com o indispensável cortejo de processos, multas, desemprego, etc. Sr. Presidente: a orientação assim mareada em tam breve mas gravíssimo despacho tem de ser apreciada em face da grande revolução económica em que o mundo se debate para se defender das crises, de consequências funestas, que, periodicamente e num crescendo catastrófico, vêm atirando milhões de operários para o desemprego,, lançando-os na miséria e provocando revoltas; impondo-se também considerá-la em- relação à oportuníssima política do Ministério da Economia sob o lema «Produzir e poupar», logo completada por Salazar com as vozes de comando «Organizar e distribuir a, política que teve o condão de logo galvanizar todas as actividades, que se desentranharam na arroteia de extensas áreas incultas, no aproveitamento de factores esquecidos, na instalação de numerosas oficinas, tanto «nos serviços públicos como nos privados, em casa e na rua, na vida individual e familiar» - demonstração eloquente de que a idea fora «bem compreendida, espontaneamente abraçada e seguida com entusiasmo e carinho», como Salazar afirmou em notável discurso sobre defesa económica em Junho de 1942.
Apoiados.
Sr. Presidente: já em 1931 o Govêrno reconhecera grandes vantagens nas pequenas indústrias, entre as quais certo grau de aconselhável descentralização económica que, após larguíssimo período de concentração, tinha, finalmente, viabilidade, mercê da melhoria dos transportes, facilidade de comunicações e de distribuição de fôrça motriz, tudo isso valorizado pelas novas fórmulas de organização do trabalho que permitem evitar os inconvenientes da dispersão por uma coordenação equilibrada e justa.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Além de com a descentralização se conseguir uma boa distribuição demográfica para defesa contra o urbanismo, cada vez mais condenável, e grandes concentrações industriais que hoje não se justificariam, as pequenas indústrias virão a constituir embriões de empreendimentos de maior vulto e desempenharão a função de escolas do patronato e de comando, contribuindo vantajosamente para a formação dos futuros chefes adestrados, que actividades económicas nunca poderão dispensar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, quando em 1931 se legislou sobre condicionamento industrial, se estabeleceu no § único do decreto n.º 19:409, de 4 de Março, que eram exceptuados das restrições resultantes do condicionamento aos estabelecimentos industriais que empregassem até cinco operários ou utilizassem até cinco cavalos de fôrça, e, ainda, todas as indústrias caseiras».
Tratava-se de limitações de carácter transitório, porquanto se aguardavam os resultados do inquérito industrial para ajustar aqueles preceitos às necessidades de ceada modalidade industrial.
Infelizmente, em 27 de Julho do 1932 aquele parágrafo foi revogado e substituído pelo seguinte:
«Exceptuam-se destas disposições as industrias caseiras».
Dois anos volvidos, em 5 de Maio de 1934, o Diário do Govêrno poblicava o decreto n.º 23:630, definindo assim as indústrias caseiras:
«Para efeito do disposto no § 1.º do decreto n.º 19:409, de 4 de Março de 1931, modificado pelo artigo 1.º do decreto n.º 21:515, de 27 de Julho de 1932, é considerada como indústria caseira a que se exerce no próprio domicílio, habitualmente por pessoas de uma mesma família ou a cargo do chefe da família, que tanto num caso como noutro com este cohabitem, e ainda a que por despacho ministerial, sob parecer do Conselho Superior Técnico das Indústrias, como tal fôr considerada.
Com tais restrições o pensamento que me orientava ao redigir, três anos antes a lei de condicionamento industrial era completamente prejudicado, apesar de a nossa Constituição, reconhecendo iniludivelmente, no n.º 4.º do artigo 34.º, o seu beneficio social, ordenar toda a protecção às pequenas indústrias domésticas.
Por seu lado, esta Assemblea Nacional, que já repetidas vezes apreciara com louvor a grande função económica e social das pequenas indústrias, ao apreciar a proposta de condicionamento industrial, na sessão legislativa de 1937, após demorados debates em que, mais uma vez, se reconheceu o valor daquelas iniciativas na génese da prosperidade económico-social e como factor de valiosa ruralização, deliberou:
Não poderem ser sujeitas a condicionamento as indústrias complementares da exploração agrícola que se destinem à preparação e transformação dos produtos do próprio lavrador.
Nas regras do aplicação do condicionamento, ter-se-á em vista, sempre que seja caso disso, a defesa e liberdade do trabalho caseiro e familiar, autónomo, estabelecendo-se os justos limites em que este deve ser protegido.
A base II da mesma proposta ficou redigida por forma a, no que respeita ao número de operários, ficarem sujeitas a condicionamento apenas as indústrias que empreguem pessoal numeroso, mas em risco de redução brusca e importante, como consequência de próxima e provável mecanização.
E a base IV manda que só condicionamento de determinada indústria ou modalidade industrial se faça por decreto regulamentar, no qual serão explicitamente indicadas as exigências e limitações, de entre as previstas nas alíneas da base anterior, que devem ser observadas».
Ora, Sr. Presidente, após meia dúzia de anos daquela deliberação desta Assemblea Nacional, verifica-se, como
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aliás se diz no despacho que estou a apreciar, que ela não foi cumprida em relação a algumas indústrias.
Entretanto a vida não parou com suas múltiplas e inadiáveis exigências, as iniciativas não deixaram, felizmente, de brotar em cérebros portugueses, as necessidades do consumo agravaram-se notoriamente com os acontecimentos internacionais e oportunamente soou o memorável pregão - «Produzir e poupar», «Organizar e distribuir».
Logo as charruas ofereceram novos campos às culturas, quilhas de numerosos barcos de pesca sulcaram os mares e unidades fabris sem conta animaram, com sua laboração alegre e vitalizadora, todos os recantos do País.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador : - E o Govêrno premiou com palavras de justo louvor todas aquelas manifestações do trabalho nacional!
Não compreendo, Sr. Presidente, como o mesmo Govêrno manda agora, pelo citado despacho, proceder contra muitas daquelas actividades.
Apoiados.
O Sr. Ministro da Economia, no discurso notável com que anteontem, na sessão inaugural do I Congresso de Ciências Agrárias, honrou a lavoura nacional, afirmou, como aliás já fora anunciado pelo Sr. Presidente do Conselho, que brevemente se publicariam os princípios e planos à sombra dos quais se pretende levar tam longe quanto possível a industrialização do País. Não seria preferível aguardar para então a difícil tarefa de seleccionar, de entre o muito que devemos à iniciativa e esforço dos empreendedores portugueses, o que será digno de enquadrar-se no plano anunciado?
Êsse diploma deveria ser submetido a esta Assemblea Nacional, que, estou disso certo, de bom grado daria a sua melhor colaboração.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Contudo, pelo exposto, julgo poder concluir que o vasto e fundamental distrito económicosocial tem sido orientado por critérios que, por vezes, parecem antagónicos. E já não é de agora, pois todos se recordam das ofensivas teimosas contra moinhos e azenhas, carros de bois, desnatadeiras, alambiques, lagares de azeite, pequenas instalações hidroeléctricas e muitas outras.
Apoiados.
Sr. Presidente: permita que termine com a exclamação ouvida há poucas horas, de um lavrador cultíssimo, quando lhe disse que tencionava apreciar o despacho em questão, já dele conhecido: «Bem haja. Veja se a Assemblea Nacional consegue evitar essa inoportuníssima degola de inocentes».
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente : - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei de autorização de receitas e despesas para o ano de 1944.
Tem a palavra o Sr. Deputado Ulisses Cortês.
O Sr. Ulisses Cortês: - Sr. Presidente: as finanças do Estado não constituem compartimento estanque, sector independente da infraestrutura social e económica.
São tam estreitas as suas conexões com os vários departamentos da vida nacional, é tam íntima a solidariedade entre todos, que o orçamento não reflecte apenas as condições gerais do País, a repartição das suas riquezas, a prosperidade ou depressão das suas actividades, mas influe também activamente sobre elas como instrumento, que lhe cumpre ser, de direcção da vida económica e de realização da justiça social.
Na actual emergência o panorama da vida do País revelava - como a traços fortes o acentuou o último relatório do Banco de Portugal - a existência de dois problemas fundamentais, que demandavam a atenção do Govêrno: o problema dos preços e o do alinhamento dos vencimentos.
Êste último foi resolvido recentemente pelo decreto-lei n.° 33:272, a cujas disposições o artigo 9.° da proposta da lei de meios procura dar efectivação orçamental, e é sobre ele que incidirão essencialmente as considerações que hoje me proponho produzir.
Sr. Presidente: ninguém ignora que em obediência a um critério severo de compressão das despesas e à orientação de não elevar o poder de compra sem elevação correspondente do volume dos bens disponíveis se manteve através da marcha ascensional dos preços e do encarecimento do custo de vida o quantitativo dos vencimentos no nível anterior à guerra.
As realidades, porém, que podem mais que a vontade dos governantes, levavam a sucessivas transigências, traduzidas primeiro na supressão do imposto de salvação (pública e depois na instituição do abono de família, fórmula indirecta que, correspondendo embora a um princípio de aplicação permanente, teve também o intuito de minorar as dificuldades daqueles sobre quem recaía, em maior extensão, o peso dos sacrifícios.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mas era tam profundo o desequilíbrio operado nas condições de vida da população, em consequência da situação anormal criada pela guerra, que o problema da actualização dos vencimentos, dia a dia agravado, atingira uma acuidade que se não compadecia com dilações e exigia imperiosamente uma solução imediata.
Todas as conflagrações, quando assumem a extensão da actual e envolvem nas suas malhas os grandes países produtores, originam graves perturbações da economia: deminuição, pela mobilização de grandes massas de homens, da quantidade e qualidade do trabalho produtivo, desvio das actividades para fins directamente relacionados com a guerra, dificuldades da circulação de produtos, carência e maior risco dos transportes, formalidades e demoras dos bloqueios, tudo contribuindo, numa convergência inexorável, para operar a rarefacção dos bens de consumo normal e provocar portanto o seu encarecimento.
Estas causas afectaram de uma maneira geral todos os países - beligerantes ou neutros - e reflectiram-se nos respectivos índices do custo da vida, como pode ver-se dos seguintes números extraídos do Boletim da Sociedade das Nações:
índices do custo da vida
[Ver Índices na Imagem]
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A tendência ascensional que estes números exprimem manteve-se ou agravou-se nos meses já decorridos do presente ano e revela-se também nos índices dos preços por grosso, dos quais me utilizarei, por ser os que melhor ilustram o desenvolvimento da conjuntura económica:
Índice dos preços por grosso
[Ver Índice na Imagem]
No nosso País às causas gerais já apontadas vieram juntar-se factores específicos, de entre os quais cumpre destacar, pela sua influência decisiva nos índices do custo de vida e dos preços, o aumento do volume da circulação monetária.
Provocada inicialmente pela alta universal dos preços e constituindo assim na frase de Baudin um fenómeno de pura elasticidade, o aumento do meio circulante precipitou-se, a partir de determinado momento, em ritmo célere e atingiu proporções que perturbaram profundamente o equilíbrio económico geral, e a que foi necessário ocorrer por meios adequados.
Contribuíram para esse aumento essencialmente o afluxo de ouro e de divisas proveniente dos acontecimentos internacionais de 1940 e a inversão do movimento da balança comercial, transformada, a partir da guerra, em fortemente credora, por virtude principalmente da extraordinária valorização das nossas exportações.
Assim é que, emquanto em 1938 a circulação era de 2.278:000 contos, em 27 de Outubro deste ano ela atingia 6.541:268, o que equivale a uma elevação de cerca de 300 por cento, aliás acompanhada do fortalecimento da situação do banco emissor e do aumento mais do que proporcional das respectivas reservas.
No mesmo período as responsabilidades à vista do Banco de Portugal, que constituem circulação em potência, ascendiam de 1.070:900 contos a 7.555:133.
O excesso de disponibilidades que assim se criou não pode ser absorvido por novos investimentos produtivos, em virtude da restrição das exportações, nem foi inteiramente imobilizado pelo sistema bancário, a despeito do considerável aumento dos depósitos particulares.
À política tributária e a emissão de empréstimos, destinados a actuar como punção sobre a circulação, não puderam também neutralizar por completo a alta de rendimentos e evitar os seus efeitos perturbadores.
Formou-se assim um poder de compra que, generalizado a várias camadas sociais, algumas delas vivendo habitualmente em sub-consumo, se traduziu em acréscimo de procura de produtos e, portanto, dada a carência ou inextensibilidade do mercado, em agravamento dos preços.
O fenómeno é conhecido dos economistas.
Analisa-o com penetração e serena objectividade o Sr. Ministro das Finanças na sua Economia de guerra; estudam-no também os escritores que se têm ocupado dos problemas monetários, em especial Weber, Mises e Nogaro; esclarece-o ainda o economista espanhol H. Aguilaz, no seu belo livro Un nuevo orden económico, ao acentuar, a p. 199, que a estabilidade dos preços exige, entre outras condições, a ausência de deflação e de inflação, isto é, a invariabilidade da quantidade
da moeda nas suas relações com o volume das mercadorias.
Os efeitos desta elevação progressiva dos meios de pagamento fizeram-se sentir com marcada evidência, e em conjunção com outras determinantes, no nível dos preços e do custo da vida, como pode verificar-se dos números que em seguida se alinham, embora os considere sujeitos a canção:
Índice ponderado do custo da alimentação e de outros produtos do consumo doméstico em Lisboa
(Do Instituto Nacional do Estatística)
[Ver Índice na Imagem]
Alta idêntica se nota no índice dos preços por grosso, cuja evolução, a partir de 1939, resulta com nitidez do seguinte quadro:
[Ver Quadro na Imagem]
Em face da alteração de circunstancias traduzidas nestes números, não era possível manter os vencimentos dos servidores do Estado no quantitativo anterior ao início da actual conflagração, sob pena de se fazer perdurar, contra todas as exigências da justiça social e contra o mais elementar senso político, uma situação do sacrifício que se tornara incomportável.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mas o problema não podia ser resolvido isoladamente, tinha de enquadrar-se no conjunto económico geral, de modo que a sua solução não provocasse incidências mais perturbadoras do que a permanência do mal que pretendia corrigir-se.
Não podia evidentemente o Govêrno, dadas as circunstâncias presentes, pensar em elevar os vencimentos por forma a restabelecer aos seus funcionários o teor da vida de épocas normais.
Proceder assim apenas agravaria o desequilíbrio já existente entre a capacidade aquisitiva e o montante dos bens de consumo, equivaleria a estabelecer uma corrida de velocidade entre o poder de compra e o preço das mercadorias e a inaugurar um círculo vicioso, cujo termo seria o caos.
O Govêrno teve em conta todas estas circunstâncias no recente diploma destinado a melhorar a situação do funcionalismo; concedendo embora aos seus servidores um suplemento de vencimento, fê-lo por forma a garantir a todos o mínimo exigido pelas suas necessidades incompreensíveis sem os dispensar no entanto da partilha de sacrifícios, que é imperativo desta hora de angústias e de dificuldades.
Vozes: - Muito bem!
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O Orador: - Mas os benefícios concedidos serão efémeros e a questão voltará em breve a pôr-se em toda a sua agudeza, se não se seguir uma política de preços, orientada por critério firme e tendo como objectivo, senão a sua deflação, que reputo ainda praticável, pelo menos a sua estabilização no nível a que ascenderam.
A tarefa será difícil.
Charles Gide, que estudou o problema em face dos princípios económicos e da experiência da outra guerra, salienta a complexidade e delicadeza da acção a desenvolver em tam melindrosa matéria e afirma que não basta actuar pelo tabelamento, de resto inoperante quando em contradição com as leis económicas naturais, mas que é necessário agir principalmente sobre os múltiplos factores que intervêm na formação dos preços e de que estes constituem a resultante.
Os processos preconizados pelo malogrado economista correspondem a uma técnica de intervenção que as modernas experiências de economia dirigida têm aperfeiçoado e de que Lescure nos dá conta no seu excelente volume Étude sociale comparte dês regimes de liberte et des régimes autoritaires.
Para a estabilização dos preços, além dos subsídios do Estado para fomentar a produção e estabelecer preços políticos e do uso de preços diferenciais e de complicados métodos de compensação, parte-se fundamentalmente da teoria clássica da oferta e da procura.
Intervém-se sobre a oferta, desenvolvendo as forças produtivas e deminuindo os custos de produção, para o que se utilizam principalmente os progressos técnicos, a racionalização das empresas e a estandardização; actua-se igualmente sobre a procura por processos que vão desde o racionamento à limitação do poder de compra, designadamente pela estabilização dos salários, pelos empréstimos obrigatórios, pelo imposto, pela regulamentação dos novos investimentos, pela imobilização de uma parte dos réditos e por outros meios engenhosos destinados a privar o consumidor do exercício de uma parte da sua capacidade de aquisição.
Mas, Sr. Presidente, as dificuldades que a simples enumeração destes métodos patenteia sobem de pronto se à delicadeza normal do problema se vem juntar, como sucede entre nós, fenómenos monetários, em consequência dos quais a moeda deixa de ser um instrumento passivo, um simples intermediário das trocas para desempenhar um papel activo no movimento dos preços.
Sei bem que no nosso País a alta resulta também de factores externos, que correspondem a forças difíceis de dominar e que, oriundas de além-fronteiras, transcendem as possibilidades da acção dos nossos governantes.
Estão neste caso o aumento dos custos de importação provenientes de encarecimentos na origem, da elevação de fretes e de seguros e, algumas vezes, das taxas de câmbio que nos são impostas para liquidação de operações e se traduzem no pagamento a preços de guerra de matérias primas, combustíveis e outros produtos, de que somos tributários do estrangeiro e de que a nossa economia absolutamente carece.
Mas a estas causas da elevação dos preços, que aliás não seria impossível eliminar por um sistema de compensação das mais valias, acrescem no nosso País outras, relacionadas com o excesso dos instrumentos monetários e com as deficiências de abastecimento, as quais cabem na nossa esfera de actuação e que podem remover-se ou, pelo menos, atenuar-se.
Não vou discutir a política de exportações seguida, nem a orientação monetária, que é corolário dela, pois se me afigura que uma e outra podem justificar-se, quer pela natureza dos produtos exportados e pela sua desnecessidade para a nossa economia, quer pela conveniência de manter certos princípios informadores do nosso mercado monetário e a que, por adesão de consciência, devemos continuar fiéis, quer finalmente pelo poder de compra externo que nos permite acumular e que, finda a guerra nos habilitará a encarar a possibilidade dos maiores empreendimentos no plano do apetrechamento nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não ignoro que o futuro nos pode reservar surpresas. É na verdade de recear que a orientação comercial da paz possa tender a lançar sobre os neutros uma parte dos encargos da guerra e é igualmente legítimo que, por virtude da expansão da circulação monetária e do desenvolvimento da dívida pública nos países beligerantes, se nutram apreensões sobre a estabilidade do valor das moedas em que é constituída uma parte importante das nossas reservas.
Basta dizer, em abono destas apreensões, que na Inglaterra a circulação passou de 554,6 milhões de libras, em 1939, para 986,5, em 1942, tendo-se a dívida pública interna elevado de 7:783 para 17:173; nos Estados Unidos os números são ainda mais impressionantes: no mesmo período a circulação ascendeu de 7:594 milhões de dólares para 18:818, ao mesmo tempo que a dívida pública interna subiu de 41:942 para 161:000.
Estas cifras mostram bem significativamente as contingências inerentes à política que temos praticado. Mas como a elas sobrelevam as vantagens já enumeradas, parece poder concluir-se sem constrangimento da verdade que se justificam amplamente as directivas seguidas nesta matéria e que nenhuma alteração fundamental importa introduzir-lhes.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Contudo, no interesse da manutenção dos preços, cumpre redobrar de vigilância relativamente ao ulterior desenvolvimento da circulação e insistir, talvez com maior vigor ainda, nos meios empregados para a reabsorver.
Além do prosseguimento da política de crédito público e, porventura, do reforço da pressão fiscal sobre as actividades mais favorecidas pela conjuntura, parece aconselhável - ou até absolutamente necessário - recorrer a certos métodos de capitalização forçada, usados noutros países e que entre nós seriam, não só exequíveis mas de assinalada utilidade.
Refiro-me à limitação de lucros e à obrigatoriedade, para as sociedades e empresas, da constituição de reservas destinadas a futuras renovações de equipamento, com vista ao desenvolvimento e melhoria da produção e principalmente à imobilização de parte do produto das exportações, através da conversão das divisas em títulos da dívida pública consolidada ou só negociáveis decorrido determinado prazo, de forma a obter-se, pelo menos, o diferimento do poder de compra neles representado ou a sua amputação pêlos encargos do desconto, no caso de negociação antecipada.
Outro processo a ensaiar, e a que as circunstâncias internacionais começam a dar oportunidade, é o da criação de novas empresas produtivas, para as quais poderia canalizar-se uma parte apreciável da pletora de capitais existentes.
Seria talvez agora o momento de se encarar a solução do problema da electrificação do País, que está na base do plano de industrialização e que constitue sem dúvida o elemento fundamental do nosso futuro económico.
Vozes: - Muito bem!
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O Orador: - Pela nossa insignificante produção, que foi em 1938 apenas de 428 milhões, de kw, correspondendo a 60 kw por habitante, estamos muito abaixo da média da Europa, que é de 550 kw, e figuramos em lugar inferior ao da própria Espanha, que, com os seus 200 kw por habitante, ocupa o lugar imediato ao nosso entre os países de mais baixa capitação.
Carecemos, para substituir a energia termo-eléctrica, de electrificar os caminhos desferro e dar execução a um plano de industrialização, adaptado às mais instantes exigências do País, de elevar aquela produção anual em cerca de 1:600 milhões de kw.
A rêde hidrográfica de que dispomos permite-nos encarar, sem reservas, a possibilidade de se obter uma produção total de 5:000 a 6:000 milhões de kw permanentes e 2:000 a 3:000 milhões temporários.
A elaboração do plano destes aproveitamentos e a constituição de empresas destinadas a dar-lhes realização, permitiria não só ir acelerando a transformação económica do País, na medida compatível com as dificuldades da situação internacional, mas contribuiria também, pela fixação de consideráveis disponibilidades, para a regularização e descongestionamento do nosso mercado de capitais.
Mas, Sr. Presidente, se o traço fundamental da nossa situação económica consiste, como autorizadamente se tem afirmado, no abastecimento restrito do País em face de um acréscimo da procura, que o aumento dos rendimentos da exportação torna cada vez mais intensa, a defesa dos preços, para ser eficaz, não pode limitar-se à neutralização, através dos processos apontados, do excesso do poder de compra. Tem de recorrer a meios mais directos de comprimir o consumo, como o racionamento, e de incidir também sobre a oferta dos produtos, procurando elevar a um nível suficiente a sua quantidade disponível.
O problema português é, pois, essencialmente um problema de abastecimento e, como este depende sobretudo do nosso próprio esforço, ele reduz-se em grande parte, como há um ano acentuei nesta tribuna, a um problema de produção interna.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - No que respeita a subsistências - e apenas deste problema, por ser o mais candente, me ocuparei agora - temos uma produção deficitária, não obstante o carácter acentuadamente agrícola da nossa economia.
A que deverá atribuir-se o facto?
A pobreza do solo, à irregularidade do clima, ao atraso dos nossos processos de cultura, à adversidade de outros elementos naturais?
Sem dúvida. Mas há porventura outras razões?
O grande economista que foi Anselmo de Andrade, no seu Portugal Económico, notava com pesar a baixa produtividade da nossa agricultura e afirmava que o País possuía condições que, bem aproveitadas, lhe permitiriam alimentar 15 milhões de pessoas.
Mais modernamente o Prof. Wagemann, autor ilustre da Estratégia Económica, atribue à Península Ibérica capacidade para assegurar o abastecimento em subsistências de 60 milhões de habitantes, ou seja cerca do dobro da sua população.
O Prof. Oliveira Salazar, num estudo que sobre este problema publicou em 1917, e onde revela já na profundidade da análise e na lucidez da visão a sua excepcional envergadura de homem de Estado, pronuncia-se em sentido semelhante.
A própria natureza, com aquela eloquência que caiu a voz dos cépticos, encarregou-se de demonstrar a verdade desta tese proporcionando-nos, em anos ainda recentes, produções excedentárias em géneros que, como o trigo, foram sempre dos que mais pesaram na nossa balança de importações.
Mas se a suficiência alimentar coustitue em face das actuais possibilidades da técnica um ideal realizável, aliás já conseguido com carácter permanente nalguns sectores, como relativamente, por exemplo, ao arroz, o demonstrou o Sr. Ministro da Economia na sua proficiente conferência «As subsistências e a população», que: medidas urge tomar para que se lhe dê efectividade ou, pelo menos, para que dele nos aproximemos?
Lamento que a tirania regimental e a índole necessariamente esquemática deste trabalho não me permitam fazer mais do que um sucinto e superficial apontamento.
Enumerarei, pois, apenas os trabalhos que se impõem dentro de um plano bem ordenado, de hidráulica agrícola, de defesa das nossas regiões mais ricas contra a assolação das correntes, de correcção e regularização de caudais, de arroteio de incultos, de colonização interna, de aumento de produtividade unitária através da selecção de. sementes, do emprego científico de fertilizantes, do aperfeiçoamento da técnica e da racionalização do trabalho, emfim toda uma extensa gama de providências onde a iniciativa privada tem um largo campo de acção, mas em que ao Estado cumpre também uma tarefa de gigantescas dimensões.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - É este o sentido em que temos de trabalhar, pois que, ao contrário do que muitos pensam, julgo que a remoção dos escombros da guerra, a readaptação da produção mundial às necessidades da paz e a normalização do sistema de transportes não surgirão automaticamente com o fim das hostilidades, mas levarão anos, porventura largos, a efectivar.
Mas, emquanto não é possível lançar-nos decididamente no caminho indicado, o que exige um complexo de estudos e planos de demorada elaboração, parece-nos que alguma cousa é possível tentar desde já no sentido de nos libertar em certa medida da dependência do estrangeiro e de atenuar, em grande parte, as nossas dificuldades.
Para isso torna-se indispensável estimular e não desencorajar a produção, protegê-la e não estiolá-la, exigir-lhe esforços e sacrifícios, mias não lhe -regatear também as compensações ia que tem direito.
Vozes : - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Reconheço sem esforço o labor criterioso que neste sentido tem sido realizado, mas julgo que no ponto a que chegámos talvez conviesse generalizar soluções já parcialmente praticadas entre nós e que noutros países constituem as linhas mestras de todo o sistema de acção económica.
Aludirei especialmente à instituição de prémios de produção e de suplementos de preço, pagos directamente ao produtor e que não se reflitam sôbre a massa consumidora, para o que os respectivos encargos poderiam ser satisfeitos pelas mais valias dos produtos hipervalorizados e, no caso de insuficiência delas, pelas receitas do próprio Estado.
Parece que numa política realista se não deve contar somente com os factores morais, aliás importantes, para a criação de uma mística da produção.
Não pode - suponho - abstrair-se de que os preços são a afinal o grande volante da vida económica.
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Disse-o alguém ao escrever um dia estas palavras, cujo sentido profundo seria útil que meditássemos: produz-se por interêsse e não apenas por patriotismo ou filantropia.
Tenho dito.
O Sr. Nunes Mexia: - V. Ex.ª dá-me licença? Referiu-se V. Ex.ª à necessidade por parte da lavoura de intensificar ao máximo a sua produção.
Desejo afirmar a V. Ex.ª que a lavoura acorreu a desempenhar com consciência o papel que, na hora presente, lhe fora distribuído, mas lamenta que constantes e descabidas dificuldades lhe continuam tolhendo os movimentos.
Assim, no que respeita ao arroz, fixado o seu preço em fins de Setembro, vários foram os lavradores que se viram impossibilitados de requerer autorização para novas lavras, porquanto o prazo havia terminado também em fins de Setembro. Pois bem: só ultimamente esta estranha restrição foi abolida, e ainda hoje o facto é desconhecido de grande número de lavradores, a despeito de boas vontades o de criteriosas actuações que conheço e a que presto aqui justiça.
Quanto ao azeite, o atraso do tabelamento impediu o aproveitamento dos «restelos». Alguma azeitona foi arrastada pelas primeiras águas ou comida pelos gados. O preço que existia então para o azeite não permitiu o aproveitamento integral dos primeiros frutos caídos.
A lavoura desejaria corresponder em absoluto, mas, com frequência, não lhe dão os meios de o poder fazer. É bom que se saiba como a acção da lavoura é por vezes dificultada pelos seguintes factores: preços, faltas de coordenação e de sentido de oportunidade.
O Orador: - Estou em parte de acordo com V. Ex.ª, e é esse o sentido da minha intervenção. Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Marques Mano: - Sr. Presidente: apresento a V. Ex.ª as minhas mais altas homenagens e peco-lhe licença para apresentar os meus cumprimentos aos Srs. Deputados com quem com tanto prazer colaboro nesta Assemblea.
Adensam-se prenúncios de paz, de paz que decerto traz às populações do mundo uma esperança do desopressão grande; mas não uma esperança de desopressão absoluta.
Na verdade a guerra é uma seleccionadora de realidades, das quais umas desaparecem porque delas restava só uma existência por inércia, outras se revelam porque existiam latentes; e a paz é a reorganização do mundo em face das realidades que se demonstrarem como realidades vivas depois da guerra.
Se alguma cousa do mundo velho tem de morrer é preciso que alguma cousa morra em nós, porque é em nós que ele vive; e é possível que das cousas que têm de morrer, algumas sejam aquelas a que nós mais queremos; por isso, se é justa a alegria, também é justa a ansiedade que os anúncios de paz provocam no mundo.
Em que sentido se faz a selecção de realidades que se processa na guerra? Defini-lo é cousa essencial para os pequenos países, porque entre as potências gigantescas que se revelaram no mundo e não supúnhamos tam grandes, os pequenos países hão podem impor as suas aspirações, e só podem conduzir os seus destinos mediante a profunda consciência que possuam das realidades.
Apresento uma pequena contribuição, duma natureza muito especialmente pessoal, para a busca desse sentido; não penso que a possa levar mais longe do que cabe à definição do plano económico da nossa Revolução perante a paz, e expressão dele nesta lei de meios, entendida na sua maior generalidade, e isso ainda tam resumidamente quanto, sobre um problema tam vasto, o tempo de que disponho mo impõe.
Se eu vou proferir - e creio que devo fazer esta prevenção hoje que anda tam acesa a contenda entre os campeões do espírito e os campeões da matéria - se eu vou proferir, repito, a anotação dos fenómenos sociais sob o aspecto económico, isso não representa um prejuízo de escola.
Eu julgo que os fenómenos sociais têm diversos aspectos, cada um com a sua notação própria. As notações de cada aspecto hão-de ser harmónicas entre si. Não se podem contradizer, pois que o seu conjunto há-de expressar a unidade do facto. Umas não excluem a legitimidade das outras. Se porventura uma é averiguadamente certa, e as outras se não harmonizam com ela, é porque estão erradas, em parte pelo menos, e hão-de ser corrigidas para com ela se harmonizarem. O plano económico das cousas é susceptível, a meu ver, de uma observação mais concreta, uma maior segurança de relação e de um desenvolvimento mais seguro no tempo.
As rebeliões nacionais, que foram, uma epidemia no mundo, neste último quarto de século, têm no plano económico uma razão de ser profundamente humana: a livre concorrência industrial, automaticamente progressiva, absorvia as economias nacionais até uma medida incompatível com a vida das suas populações.
Na proletarização interna há uma solidariedade humana entre os administradores e os auxiliares de produção que suaviza as relações.
A proletarização externa porém é implacável; esta exerce-se pela totalidade das classes de um país sobre a totalidade das classes dos outros países; os países industriais que a exercem estão distantes dos países clientes que a sofrem; êles não conhecem, não podem saber, nem podem sentir, os males que provocam e que, de resto, não poderiam evitar.
Não devemos recriminar ninguém, nem países, nem classes, nem pessoas. O mal resulta necessariamente do funcionamento do sistema.
Se os países se rebelaram contra os excessos da concorrência, fizeram-no em legítima defesa para defender a própria vida dos seus habitantes dos excessos da proletarização externa. Essas rebeliões foram profundamente humanas, absolutamente justas, inadiáveis. Não lhes faltou um apoio unânime interno que agora parece esquecer-se, nem lhes faltou o consentimento externo; constituíam uma questão vital, e se isso se não reconhecia pelo menos se pressentia.
Não lucravam de resto nada os países industriais em reprimir essas rebeliões, porque da repressão não podia resultar o agravamento da proletarização, que atingira os seus últimos extremos, como a rebelião comprovava.
Para sermos coerentes, devemos concluir paralelamente pela ilegitimidade das rebeliões de conquista. Se o sistema era insuficiente na sua totalidade, não é uma diferente distribuição de bens que o torna suficiente.
Nós não excedemos as causas humanas da nossa Revolução, pois que a mantivemos apenas nos limites de um movimento defensivo da nossa própria vida; a nossa Revolução é, pois, humanamente indiscutível.
Ela só seria discutível no sen plano económico quando se verificasse no sistema das relações económicas universais uma solução para a insuficiência que justifica nesse plano as revoluções nacionais.
Desenha-se no mundo, porventura, algum movimento nesse sentido?
Parece que sim e que esse movimento se produz independentemente de vontades, de doutrinas e de movimentos políticos. Dir-se-ia que ele se gera nas miríades de actos individuais que, levados pelos seus interêsses
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imediatos, deslocam insensivelmente os planos de relação, que por fim se reconhece haverem sido substituídos.
Formam-se no mundo centros ciclópicos de transformação que suprimem gradualmente os concorrentes industriais e por isso, na mesma medida, o automatismo forçado da proletarização externa. A livre concorrência industrial tende deste modo para uma polarização que conduz à conversão do sistema em sistema orgânico, orgânico não por doutrina mas por evolução natural das cousas.
Os centros transformadores exigem, porém, uma área imensa ao seu serviço: é preciso quo o custo das construções ciclópicas se reparta por um volume de mercadorias tam grande que a taxa de transformação sobre cada unidade concorra decisivamente com a taxa de transformação das indústrias que substituo; é portanto inviável a formação de um centro transformador num pequeno país, em que seria absolutamente impossível pagar pelo consumo a grandeza das empresas.
Quere dizer: perante a potência dos novos centros transformadores um país pequeno não pode defender-se recorrendo ao mesmo processo, e portanto a um conceito de autarquia económica do seu território, que conduziria à insuficiência.
Terminada a guerra, o plano das novas relações económicas universais encontrar-se-á com o plano económico das rebeliões nacionais, numa clara posição. A guerra, desenvolvendo extraordinariamente os centros transformadores, adiantou energicamente o processo.
Não devemos, por isso, supor que o problema revista um aspecto de urgência que nos não permita a acção necessária para nos prevenirmos.
O processo da paz será longo e contraditório. Colocamos, para reflectir, os dados do problema na sua notação extrema, mas devemos considerar que as conclusões são apenas tendenciais.
Em face do poder ascensional dos centros transformadores, o País compreenderá o que se passa no plano económico do mundo e os responsáveis pela administração desses centros o que se passa no plano económico das nações. Nós não nos excluímos do concerto do mundo; apenas procuramos nele a melhor posição para nós, que é, de resto, a melhor forma de contribuição para o rendimento humano desse concêrto.
A dificuldade de construir uma melhor posição está em que teremos, por um lado, de propor a nossa economia num plano tanto quanto possível de concorrência, e, por outro, de conservá-la como economia tanto quanto possível nacionalizada. Só podemos projectar com segurança num plano de concorrência. Só seremos uma nação viva na medida em que a nossa economia for organicamente completa, e não seremos na medida em que ela for organicamente dependente de unia economia, externa. O sistema de circulação dos nossos valores, se abrisse inteiramente as suas veios para um sistema mais forte, passaria em breve a fazer parte dele. com prejuízo e perda final da nossa própria personalidade.
A solução é, portanto, difícil. Ela exige um esforço enérgico, mesmo heróico, no desenvolvimento das condições gerais da nossa produção, na exploração profunda dos nossos recursos, na disseminação da energia motriz, muitas vezes economizadora de bens, sempre economizadora de trabalho destinado à produção de outros bens, e, em qualquer caso, multiplicadora do homem como elemento de produção, para conseguirmos conservar uma economia essencialmente nacional dentro das condições de concorrência universal.
Exige, portanto, os recursos, a consciência e a autoridade do Estado. Não podemos abandonar empresa tam grave à livre anarquia das actividades individuais. E isto quere dizer que a Revolução tem de continuar.
Da sua completa execução dependerá a vida do País por muitíssimas gerações. O nosso povo, inquieto mas compreensivo, acompanhá-la-á, por isso, com o empenho que a empresa merece, e a confiança, a disciplina e o respeito que são devidos ao seu ilustre condutor.
O Estado reuniu, de resto, para o processo da paz as condições morais e materiais que era possível reunir. A nossa Revolução conservou sempre uma face humaníssima; ela nunca se separou do mundo, mas manteve com ele uma comunicabilidade moral perfeita. Cultivou a solidariedade dos povos que se reúnem à volta do Atlântico e conta nêles consanguinidades fiéis, alianças antigas, relações de segura boa vontade. A aliança peninsular fornece à vontade das duas nações disponibilidades que hão-de ser de uma importância essencial no processo do mundo futuro. A unidade interna garante a força e continuidade da missão; não há nenhum povo, nenhum regime e nenhum homem cujo procedimento não suscite adversativas; contudo, adversativas que não atingem senão o contingente não esperam para o reconhecer senão que êle seja declarado como tal.
Mas também condições materiais. Quando verificamos que a Europa está arruinada, hipotecada, condenada ao trabalho de muitos anos para reparar dos males de guerra aqueles que são remediáveis, e observamos que essa catástrofe nos foi poupada e mantemos por isso intactos os nossos recursos, não podemos deixar de bem dizer hoje o esforço que no-los conservou e de admirar amanhã o benefício que representam, e que ainda não podemos hoje avaliar sequer aproximadamente. A ordem financeira tam rigorosamente mantida que atingiu a perfeição inverosímil de manter sensivelmente igual o uivei das despesas públicas durante tam extraordinária crise, assegura a livre iniciativa do Estado na solução dos problemas económicos da paz. E por fim a obra económica feita, que por esta lei de meios se continua, representa um extenso caminho andado, no sentido da nossa posição no mundo novo.
Temos em frente de nós um empresa portentosa, mas reunimos muito generosamente os meios, a consciência e a vontade de a realizar, para que não tenhamos merecido a honra de a levar a bom termo.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. António Bartolomeu Gromicho: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: a V. Ex.ª, Sr. Presidente, renovo as minhas homenagens.
A V. Ex.ªs, Srs. Deputados, os meus cumprimentos.
Ao entrar pela primeira vez nesta tribuna, miradouro e reduto dos altos interesses nacionais, senti que nunca tam poucos degraus me foram tam penosos de subir.
É que é tremendo o peso das responsabilidades que impendem sobre os ombros de quem deste lugar se propõe erguer a voz perante esta ilustre Câmara, e mais, perante o País, que nos observa e escuta atentamente.
E a voz da Assemblea Nacional, pautada apenas pelo diapasão dos mais altos interesses nacionais, tem de ter o timbre da dignidade e do prestígio, que a Nação, que em nós confiou, de nós legitimamente exige.
É esta certeza axiomática que nos embaraça os movimentos e nos perturba a dicção, a mim especialmente, que reconheço ser o mais obscuro membro desta ilustre Assemblea Nacional.
Sr. Presidente: encontrando-me no uso da palavra pela primeira vez nesta 2.ª sessão legislativa, não seguiria os ditames da minha consciência se não aproveitasse o ensejo pura agradecer ao Govêrno, que felizmente nos rege, e em especial ao preclaro Ministro da Educação Nacional, a solução completa que foi dada ao problema das escolas
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do magistério primário no continente português e ilhas adjacentes.
O projecto de lei que tive a honra de apresentar nesta Assemblea em 1 de Março, relativo à criação de uma escola do magistério primário em Évora, não pode por aqui singrar, por motivos constitucionais que são de sobejo conhecidos.
Em 8 de Abril, termo da sessão anterior, do meu modesto lugar de Deputado lancei a esperança de que o problema genérico das escolas do magistério primário seria logicamente resolvido pelo Govêrno, que, para coroar a obra grandiosa encetada, quanto ao ensino primário, iria certamente abrir escolas do magistério onde o interesse do País claramente exigisse.
De facto, o decreto-lei n.° 33:019, de 1 de Setembro pretérito, criou as escolas do Funchal e de Ponta Delgada e autorizou o Ministro da Educação Nacional a criar mais cinco escolas do magistério no continente.
Foram, assim, estabelecidas imediatamente a de Évora e a de Viseu. É consolador verificar que a acção desta Assemblea não foi de todo inútil.
É consolador verificar que o meu projecto de lei assentava em bases de justiça, que encontraram eco nas deliberações do Govêrno.
Resta abrir mais três escolas. Assim no orçamento, cujas bases estão em discussão, possa ser prevista verba para a abertura das três escolas restantes, e oxalá que Castelo Branco venha a possuir uma dessas escolas, como homenagem pelo largo contributo que essa região do País deu ao professorado primário, pois que a região de Castelo Branco foi sempre o mais rico alfôbre dêsses grandes pioneiros do ensino.
Sr. Presidente: a leitura, mesmo perfunctória, das contas das gerências anteriores, dá-nos a expressão numérica da obra grandiosa que o Govêrno do Estado Novo tem realizado no campo do ensino secundário. Têm surgido, como por encanto, magníficos edifícios liceais e outros que estão em via de acabamento, que só por si, isto é, mesmo isolados da formidável obra de reconstrução nacional em tantos sectores, seriam o padrão e o orgulho de uma geração.
Vozes: - Muito bem, muito bom!
O Orador: - Quem, como ou, percorreu alguns países da Europa com a preocupação de observar a sua estrutura escolar, não pode deixar de concluir que Portugal fica a possuir a mais completa e grandiosa rede de edifícios escolares liceais.
De desejar é que na estrutura propriamente técnica do ensino os liceus continuem a ser alvo de algumas modificações, que se impõem, para que a sua acção instrutiva e educativa corresponda ao alto desígnio que presidiu a tam vastas e úteis edificações.
Muito de louvar foi o desdobramento do 3.° ciclo em letras e ciências.
Não menos valiosas foram as alterações introduzidas pelo decreto-lei n.° 33:018 no aumento de uma hora nas disciplinas de ciências físico-químicas do 2.° ciclo e matemática do 6.° ano.
Outras medidas se impõem quanto ao ensino do francês, do inglês, do alemão e das ciências naturais, especialmente no 7.° ano.
Estou convencido de que estas alterações, como as anteriores, não trariam sensíveis aumentos da despesa orçamental.
Bastava certo equilíbrio do horas lectivas no conjunto dos ciclos.
Mas, Sr. Presidente, desta tribuna, que é realmente, como disse, miradouro e reduto dos altos interesses nacionais, não devemos lançar as nossas vistas deslumbradas apenas para os sectores da vida pública onde a luz se lança a jorros.
Há que penetrar, também, julgo eu, afoitamente nos recantos penumbrosos dos serviços públicos, que reclamam as atenções desta Câmara e do Govêrno para, em estreita, leal e dedicada colaboração, se descortinarem as soluções que as circunstâncias ditem. Detesto, é preciso ter presente que a Nação nos observa e responsabiliza também pela nossa actuação ou ausência de actuação em relação aos grandes problemas nacionais.
Quero referir-me ao estado, não direi caótico, mas confuso, do ensino técnico elementar e médio.
Sabido como é que todos os Govêrnos procuram, mesmo nesta fase tormentosa e aturdidora da guerra, prever e traçar os caminhos penosos da paz; sabido como é que os destinos de Portugal estão assegurados pela essência da nossa própria história e pela condução de um Chefe sem par, urge pôr a Casa portuguesa totalmente em ordem, para com maior segurança enfrentar e resolver os problemas tremendos que a guerra suscitou ou agravou.
O ensino técnico, em particular o elementar e médio, necessita de uma revisão urgente.
Eu sei que não se tem estado inactivo neste sector. Existe uma comissão revisora do magno problema.
Anos, porém, têm decorrido sem se terem alcançado as soluções práticas.
E por esta indecisão não tem sido possível inscrever no orçamento do Estado a verba global necessária para o início do programa dos novos edifícios, que estão também a cargo da Junta de Construções para o Ensino Técnico e Liceal.
É de justiça louvar, nesta altura, o esforço e o zêlo dessa Junta no desempenho da sua árdua missão, quanto a edifícios liceais.
Estou certo de que, logo que lhe forem fornecidos os elementos, saberá levar a cabo, com o mesmo carinho e proficiência, essa obra utilíssima, que receio não possa ainda encetar-se no próximo ano económico.
Na base destas construções está, porém, a remodelação da estrutura do próprio ensino técnico.
Faço votos por que essa almejada reforma surja brevemente, luminosa e profícua, como é de esperar da demonstrada clarividência governamental.
Sr. Presidente: era tempo de terminar, se não me impusesse o dever de focar outro aspecto das despesas públicas previsíveis para o orçamento futuro.
Trata-se de um problema delicado, que eu tenho a honra de apresentar a esta Assemblea, exclusivamente impulsionado pelo que julgo o meu dever de Deputado da Nação, sem perder de vista o respeito e o espírito de colaboração que todo o bom português deve ao Govêrno de Salazar.
Em feliz hora e por superior inspiração foi há mais de um ano decretado o abono de família e há quási um ano foi esse justo benefício extensivo aos funcionários e servidores do Estado.
Todos os louvores são poucos para o Govêrno, que assim corporizou o auxílio à família, protecção essa sabiamente prevista na Constituição Portuguesa e nos mais elementares deveres cristãos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Previa-se, para esse efeito, uma verba de 30:000 contos, mas em breve se verificou que a importância ascenderia a mais do dobro.
Abençoada verba, se ela se destinasse exclusivamente a ir levar aos lares, abalados pela crise da guerra, um pouco do amparo o do conforto que o Estado, dentro dos seus recursos, lhes pudesse proporcionar.
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E assim é em grande parte, e assim seria totalmente, se o inquérito ordenado pelo decreto-lei n.° 32:411, através do Instituto Nacional de Estatística, tivesse sido orientado nos precisos termos do artigo 1.°, que diz: «O Instituto Nacional de Estatística procederá, nos termos deste decreto, a um inquérito estatístico sobre as condições de vida do funcionalismo, que abrangerá todos os funcionários e empregados do Estado, de nomeação vitalícia, contratados ou assalariados de carácter permanente».
Ora, esse inquérito-base, em vez de inquirir das «condições de vida do funcionalismo», limitou a sua pesquisa à situação dos servidores do Estado em relação aos próprios vencimentos, acumulações oficiais ou oficiosas e ao possível exercício de profissões liberais ou de qualquer outra actividade lucrativa.
Salvo o devido respeito, o inquérito, para execução do artigo 1.°, deveria ter ido mais longe e só assim se poderia chegar ao resultado de conhecer a situação económica de cada funcionário integrado na família.
Desta aparentemente simples omissão derivou que alguns milhares de servidores do Estado, por não necessitarem do abono de família, auferiram um bónus desnecessário e nada justo, e não um abono ou auxílio, de que, de facto, não necessitavam.
Donde se conclue que, ou deminuiria a verba orçamental, ou não a querendo reduzir, poderia a diferença reverter a favor dos lares necessitados por aumento do subsídio ou por alargamento das regalias, quanto à idade dos filhos, especialmente das filhas, que na chamada classe média, não encontram fácil emprego após os catorze anos, não estudantes, ou os dezoito, terminando os estudos com o curso liceal ou equivalentes. Não se puniriam os pais, retirando o abono por falta de aproveitamento dos filhos menos diligentes ou infelizes nos estudos.
Dir-se-á que a largueza na concessão teve ao menos a virtude de um aumento indirecto de vencimentos numa altura em que estes se mantinham inalteráveis.
Escusado pretender demonstrar que abono de família e aumento de vencimentos são dois problemas absolutamente distintos.
Êste, como remuneração de trabalho, nada tem que ver com a situação económica privada de quem o presta.
Aquele só deve ser concedido às famílias que vivem exclusivamente do vencimento singular do chefe, e com maior amplitude aos chefes de famílias numerosas.
Tudo que fossem acumulações de cargos, exercício de profissões liberais, ou quaisquer outras actividades lucrativas legalmente autorizadas, ou posse de património privado, deveria ser motivo de exclusão de um abono, que é, de facto, um benefício, um amparo do Estado às famílias, e são aos milhares, que vivem exclusivamente do vencimento singular e por vezes deminuto do seu chefe.
Era fácil de apurar a verdade através e com a responsabilidade dos chefes de serviços respectivos e ter-se-ia, assim, o abono integrado na sua verdadeira e cristã social função, sem sobrecarga escusada para o orçamento do Estado.
E demais, seria nesta feliz altura em que o Estado se propõe elevar, com o aplauso seguro desta Assemblea, os vencimentos de todos os funcionários na medida compatível com os seus actuais recursos, como se preceitua no artigo 9.° da proposta de lei n.° 21.
Também seria de justiça que os benefícios do abono de família e aumento de vencimentos fossem extensivos aos funcionários inactivos e aos reformados, que durante longos anos prestaram os seus serviços ao Estado.
Não podem esses antigos, e muitos deles distintos, servidores ser condenados pelo crime de terem envelhecido ao serviço da Nação.
Apoiados.
Também os professores agregados dos liceus, que pertencem a um quadro, deveriam usufruir os benefícios do abono de família.
Termino, Sr. Presidente, com a afirmação de que o novo orçamento virá certamente trazer a continuidade administrativa, que tantos benefícios tem produzido para a Nação e não é demais encerrar as minhas já longas digressões com a adaptação aos egrégios Govêrnos, sob a égide do Salazar, da conhecida frase lapidar atribuída a Mr. Churchill, quando, em 1940, quis exprimir a sua gratidão aos aviadores que então salvaram a Inglaterra:
Também em Portugal e no campo da paz «Nunca tantos deveram tanto a tam poucos».
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O orador f ai muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - O debate continuará na sessão de amanhã.
Vou designar os Srs. Deputados que hão-de constituir a sessão de estudo da proposta de lei sobre concessões de terrenos no ultramar.
São os seguintes:
António de Almeida, Madeira Pinto, Ribeiro Lopes, Moura de Carvalho, Bicudo de Medeiros, João Luiz das Neves, Alçada Guimarãis, Soares da Fonseca, Cunha Gonçalves e Marques Mano.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Artur de Oliveira Ramos.
Herculano Amorim Ferreira.
Joaquim Mendes Arnaut Pombeiro.
José Alçada Guimarãis.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Alberto Cruz.
Alfredo Luiz Soares de Melo.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Angelo César Machado.
António Cristo.
Artur Ribeiro Lopes.
Cândido Pamplona Forjaz.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco da Silva Telo da Gama.
Jacinto Bicudo de Medeiros.
João de Espregueira da Rocha Paris.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
Luiz José de Pina Guimarãis.
Querubim do Vale Guimarãis.
O REDACTOR - M. Ortigão Burnay.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA