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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 57
ANO DE 1944 9 DE MARÇO
III LEGISLATURA
SESSÃO N.º 54 DA ASSEMBLEA NACIONAL
Em 8 DE MARÇO
Presidente: Exmo. Sr. José Alberto dos Reis
Secretários: Exmos. Srs. José Manuel da Costa
Augusto Leite Mendes Moreira
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 4 minutos.
Antes da ordem do dia. - Aprovou-se o último Diário das Sessões.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Cândido Pamplona Forjaz, que se referiu à obra levada a cabo pela Organização Nacional Mocidade Portuguesa e lembrou a necessidade de se dotar a referida Organização com os meios necessários para poder levar a cabo a sua missão, e Albano do Magalhãis, que agradeceu à Assemblea a atitude que tomou referente à agressão de que foi vítima.
Ordem do dia. - Realizou-se nova sessão de estudo da proposta de lei relativa ao Estatuto da Assistência Social.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 16 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 55 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Acácio Mendes de Magalhãis Ramalho.
Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhais.
Alexandre de Quental Calheiros Veloso.
Alfredo Luiz Soares de Melo.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Amândio Rebelo de Figueiredo.
António de Almeida.
António Bartolomeu Gromicho.
António Cortês Lobão.
António Cristo.
António Rodrigues Cavalheiro.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur de Oliveira Ramos.
Artur Proença Duarte.
Artur Ribeiro Lopes.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto Leite Mendes Moreira.
Cândido Pamplona Forjaz.
Carlos Moura de Carvalho.
Fernando Augusto Borges Júnior.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Francisco da Silva Telo da Gama.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Jacinto Bicudo de Medeiros.
Jaime Amador e Pinho.
João Ameal.
João Antunes Guimarãis.
João Duarte Marques.
João de Espregueira da Rocha Paris.
João Luiz Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pires Andrade.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Mendes Arnaut Pombeiro.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Alberto dos Reis.
José Alçada Guimarãis.
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José Dias de Araújo Correia.
José Luiz da Silva Dias.
José Manuel da Costa.
José Maria Braga da Cruz.
José Ranito Baltasar.
José Rodrigues de Sá e Abreu.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Júlio César de Andrade Freire.
Luiz de Arriaga de Sá Linhares.
Luiz da Cunha Gonçalves.
Luiz Lopes Vieira de Castro.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Luiz Mendes de Matos.
Manuel da Cunha e Costa Marques Mano.
Manuel Joaquim da Conceição e Silva.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque.
Pedro Inácio Álvares Ribeiro.
Quirino dos Santos Mealha.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 63 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas e 4 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário da última sessão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Visto não haver reclamações considera-se aprovado.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Cândido Pamplona Forjaz.
O Sr. Cândido Pamplona Forjaz: - Sr. Presidente: devo começar por pedir desculpa à Assemblea de voltar a um assunto de que já falei na última sessão. Mas, sendo esta uma associação política, creio que se me desculpará a insistência pelas intenções que a ditam. Supondo-me com alguma razão, que mais não seja senão pelas palavras de apoio que então ouvi e recebi, não receio recordar o animal da fábula e afirmar que, pouco susceptível de desunimos, gritei, grito e gritarei, isto é, falei, falo e, se Deus quiser, falarei sôbre um tema que reputo de capital importância, já não digo para a defesa da situação, mas para a defesa do próprio e supremo interêsse nacional, aliás no presente caso com ela confundida.
Parece-me, com efeito, que, sendo esta, como disse e é sabido, uma associação política, nela se deviam tratar com mais insistência problemas políticos. O Govêrno tem necessidade de sentir apoio, de receber estímulo e até sugestões em matéria política. É preciso, por vezes, provocar certas correntes renovadoras e assegurar-lhes continuidade, até para contrabalançar entusiasmos que na fúria da realização relegam para último plano os princípios que devem estar sempre presentes. Por isso, antes de entrar abertamente no assunto que me propus tratar, me permito formular o voto de que a Assemblea Nacional, mantendo sempre bem presente o seu carácter político, seja cada vez mais nesse campo colaboradora atenta, entusiasta e cheia da juventude que o Estado Novo requero para seu permanente triunfo - por oposição ao espírito velho (egoísmo, burguesismo, interêsses criados ou ilegítimos), que porfiadamente teima não só em viver, mas em suplantar o espírito novo.
Sr. Presidente: o ano passado falei aqui do que se me afigurava necessidade de alargar com são critério um trabalho de divulgação da obra do Estado Novo nos mais diversos sectores da vida nacional, porquanto, acrescentava, se verificava lamentável ignorância dessa obra, ao mesmo tempo que, por outro lado, se divulgavam, com notável método, persistência ... e má-fé, boatos dos mais inverosímeis destinados a criar o descrédito da situação e dos homens que a servem. E referi-me sobretudo à ignorância que se notava entre a juventude. Ora, após um ano de ausência, venho encontrar uma situação que de modo nenhum se pode considerar mais favorável.
Eu sei, Sr. Presidente, que há abusos, imperfeições e erros a reclamar rápido e enérgico correctivo. Já aqui nesta sala têm soado reclamações e críticas honestas contra a falta de critério e desrespeito a princípios essenciais por parte de dirigentes dos mais diversos organismos públicos. E o sistema só pode lucrar com toda a crítica construtiva que a tudo isso se faça.
Mas é lícito preguntar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque razão, sendo o sistema capaz de bons resultados, como se tem documentado, porque razão se observam a cada passo falhas como as que referi?
E vou-me aproximando do assunto que inspirou estas palavras.
A resposta vem decerto tocar num dos aspectos mais delicados da vida nacional. E essa resposta é quási sempre a mesma: temos falta de homens, falta-nos gente preparada para a direcção da vida portuguesa. E como não há gente preparada, recorre-se com frequência ao bacharel e ao licenciado, onde abundam os desempregados, e ei-los por vezes arvorados a gerir assuntos que mal conhecem. Creio que todos nós sabemos de um caso destes e as consequências lógicas que de tal solução advêm, não obstante a frequente boa vontade dos indivíduos.
Mas o mais curioso é que, apesar dessa falta de homens (que faríamos se ela nos não afligisse?...), temos realizado uma obra no curto espaço de dez anos (pois me refiro apenas agora à obra da organização corporativa) que, a ser realizada noutro país por qualquer partido político instalado no Poder, já teria servido de tema para dezenas do dissertações, a provarem, com actos e factos, a excelência dessas realizações - democráticas.
Infelizmente, tudo se fez som votos, sem comícios, sem promessas à bôca da urna - mas tudo isso se fez.
E, Sr. Presidente, é isto que é preciso que se diga e se divulgue, honestamente mas persistentemente, como quem cumpre um dever.
Vai a União Nacional realizar o seu II Congresso. Com êle se antevê um período de saudável agitação da nossa vida política. Prepara já êste período a série notável de conferências pelo mesmo organismo levada a efeito.
Mas - perdoe-se-me a ousadia da sugestão - é mester ir mais longe e levar aos olhos e ao coração do povo de Portugal a prova provada do muito que se tem feito (apesar dos erros, das falhas, das deserções, do egoísmo de muitos) em comparação com o nada que se verificava quando se vivia em plena normalidade constitucional partidária. Poucas palavras, alguns números, umas fotografias do passado e do presente, uns documentos a atestar realizações incontestáveis e talvez se consiga fazer penetrar nos campos, nas oficinas e nas escolas (sobretudo nas escolas) uma lufada de ar fresco que mate o micróbio do hipercriticismo e da ânsia da perfeição (quási sempre a esconder impotência ou hostilidade), que combata o hábito da maledicência e da suspeição e que acabe finalmente por convencer toda essa
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legião de homens de boa-fé e boa vontade, aliás cuidadosamente amparada e aproveitada pela crítica destrutiva dos adversários, de que a par dos erros que se não negam há obras acertadas, que só esperam o concurso de todos os portugueses para atingirem a extensão que todos desejamos.
É certo, Sr. Presidente, que no Estado Novo se incrustaram elementos indesejáveis; é verdade que são manifestamente perniciosos aqueles que, para demonstrarem convicções, se desentranham em excesso de zêlo, cuja atenuação muito se agradeceria; é incontestável que os que mais prejudicam o bom nome da situação são aqueles que só olham a obra do Estado Novo pelo seu lado material, esquecendo-se de que, como disse Salazar, cada pedra que se coloca corresponde à realização de um princípio doutrinário; não é menos verdade que se torna difícil modificar mentalidades e hábitos inveterados em indivíduos nascidos e criados à sombra da chamada frondosa árvore da liberdade, debaixo da qual também prosperou êsse lamentável espírito burguês que, julgando-se tam amigo, afinal tam hostil nos é.
Mas há um factor positivo incontestàvelmente tam verdadeiro como todos os factores negativos que acabo de citar (e chego, emfim, ao assunto): há a juventude de Portugal. E é preciso, é justo que se preste a devida e calorosa homenagem a êsses poucos mas infatigáveis pioneiros que, sob a direcção de um chefe que o sabe ser - o comissário nacional -, por todo o Império procuram fazer da Mocidade Portuguesa exactamente aquilo que todos nós ambicionamos, isto é, uma organização que seja portuguesa no nome, nos processos de trabalho e na alta finalidade a atingir.
Não devemos, contudo, perder de vista que se a Mocidade é generosa, entusiasta, construtiva, cheia de fé - nós temos de carinhosamente cultivar essas virtudes. Temos de a convencer de que os nossos princípios não são para ser apregoados apenas, mas, sobretudo, para serem vividos, e que, portanto, para justa defesa da Nação, é necessário ir afastando prudentemente quantos, gesto largo e palavras eloquentes, a cada passo demonstram, com não menor eloquência, serem desmentido vivo das suas falas.
Temos de dar confiança à Mocidade: confiança na doutrina, demonstrando-lhe como ela é verdadeira; confiança nos homens pela firme selecção dos valores morais chamados aos postos de maior responsabilidade. E temos de convencer a Mocidade de que já pode pensar por si e que o nosso anticomunismo não é cobardia burguesa, antes vontade inabalável de realizar a justiça social, que ninguém ousará dizer ser o mesmo que justiça bolchevista.
Da educação que dermos à Mocidade dependerá, sem dúvida, a nossa vitória. E não hesito em perfilhar quási em absoluto o pensamento de Wendel Wilkie no seu livro recente e curioso a vários respeitos, e até pela pitoresca informação que nos dá sôbre o emprêgo do verbo liquidar na Rússia de hoje. Diz êle: «A melhor resposta a dar ao comunismo é uma democracia activa, vibrante, corajosa, económica, social e política. Só temos uma cousa a fazer: permanecer de pé e trabalhar de acôrdo com os ideais que apregoamos. Estes ideais não terão então nada que recear.
E êle acrescenta êste aviso, que, com a necessária alteração de dois vocábulos, se pode com igual oportunidade aplicar a Portugal: «Êste receio (da Rússia) é fraqueza... Isto é (e eis uma cousa em que devemos pensar), a não ser que as nossas instituições democráticas e a nossa economia livre degenerem em consequência de abusos e faltas, ao ponto de nos tornarem fracos e vulneráveis.».
A defesa moral da Nação exige uma acção muito cuidada na educação da mocidade, ou, antes, da nossa juventude. É um exército de paz que temos o dever de
formar, para ficarmos com um escol apto a enfrentar as rudes batalhas que se adivinham. Essa tarefa caberá sem dúvida às escolas, mas caberá principalmente à organização da Mocidade Portuguesa. Pobre de recursos mas rica de boas vontades, ela prossegue a sua obra benemérita no meio da hostilidade de não poucos e da indiferença de muitos. Só o Estado não pode desampará-la. E eis o ponto a que queria chegar: apelar para quem de direito a fim de que se proporcionem à Mocidade Portuguesa todos os recursos materiais de que ela necessita para levar avante a sua obra de capitalíssima importância para a vida e prestígio nacionais, nos momentos difíceis que vivemos.
Com sacrifício da Nação armou se o exército, temos armas, carros, aviões, tudo o que é preciso para bem se destruir, já que a maldade ou a insânia dos homens a tal obrigam. Pois creio que com o preço de duas ou três batarias anti-aéreas e com um plano de acção tam largamente traçado quanto a gravidade do momento o requero nós conseguiremos armar os homens de amanhã com o verdadeiro espírito português, capaz de todos os sacrifícios, de todos os heroísmos, de todo o desinteresse para triunfar de tudo e de todos - e até de si próprio.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Albano de Magalhãis: - Sr. Presidente: quero que sejam para V. Ex.ª, Sr. Presidente, e para V. Ex.ª, Srs. Deputados, as minhas primeiras palavras de profundo reconhecimento pela sentida e calorosa manifestação de solidariedade com que entenderam acompanhar-me num incidente bem triste, bem desagradável e bem doloroso para a minha sensibilidade moral.
O Deputado não agradece; congratula-se com verificar que, da parte desta Assemblea, houve um clamoroso protesto contra a quebra do respeito devido às mais altas funções de representação nacional, contra uma violação feita por quem tinha o estrito dever, invocado para cumprir um regulamento, de dar exemplo no reconhecimento imediato das imunidades parlamentares. Poucas ou muitas, as que temos, quando invocadas, devem ser imediatamente respeitadas, para não estarmos na perigosa contingência de em sua defesa ou por causa delas sofrermos um dissabor ou até um enxovalho.
O Deputado não agradece, mas agradeço eu penhoradíssimo, tanta prova de estima e tam generosa manifestação de amizade.
Há quem pretenda deturpar os factos, apesar da responsabilidade inerente à sua inteligência e à posição que ocupa, para melhor servir determinados fins ou determinada política.
Por bem fazer mal haver! Não espero nem quero recompensas; apenas procuro os interêsses que são legítimos, e desejaria que o executor da lei a aplicasse com todo o senso e medida, com a mais absoluta compreensão da realidade e dos fins que a determinam.
Malsinem à vontade! A especulação e a mentira foram sempre, e continuam a ser, as mais tenebrosas armas dos nossos inimigos.
Para os vencer e quebrar, o Exército e nós, nesse longínquo dia, labareda de entusiasmo, fizemos o 28 de Maio.
O Exército colocou nas nossas mãos a Revolução para a integrarmos na Nação e salvá-la, dando-lhe permanência de vida e glória, com os princípios de validade eterna e justiça inflexível.
O mesmo Exército continua em guarda da nossa posição; honra lhe seja feita.
A êle pertence - não é favor, é indeclinável imperativo nosso pensar assim - exercer a justiça sôbre quem, dentro do seu seio, faltou ao sagrado dever - o maior de todos porque vai golpear a própria Nação - de não se
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manter firme nessa nossa guarda que lhe tinha sido entregue.
A Assemblea, tomando a atitude que tomou, mostrou-se digna do mandato da defesa dos princípios da Revolução. Com a serenidade de quem só exprime a verdade, que devo sempre a mim próprio e ao respeito que me merece esta Assemblea, com a consciência do dever cumprido, espero a justiça, expressão da dignidade humana e política e que será sempre justiça de Portugal.
Vozes:- Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - A Assemblea passa a funcionar em sessão de estudo da proposta de lei sôbre o Estatuto da Assistência Social.
A ordem do dia da sessão de amanhã continua a ser a mesma.
Está encerrada a sessão.
Eram 16 horas e 25 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
José Clemente Fernandes.
José Pereira dos Santos Cabral.
Juvenal Henriques de Araújo.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Querubim do Vale Guimarãis.
Rui Pereira da Cunha.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Cruz.
Ângelo César Machado.
António Carlos Borges.
António Hintze Ribeiro.
João Garcia Nunes Mexia.
Joaquim Saldanha.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
José Soares da Fonseca.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz José de Pina Guimarãis.
O REDACTOR - Luiz de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA