O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES
SUPLEMENTO AO N.° 140
ANO DE 1945
17 DE FEVEREIRO
ASSEMBLEA NACIONAL
III LEGISLATURA
CONTAS GERAIS DO ESTADO DE 1943
Parecer da comissão encarregada de apreciar as contas públicas
(Artigo 91.° da Constituïção)
INTRODUÇÃO
CONSIDERAÇÕES GERAIS
1. Foi possível êste ano manter a despesa dentro de limites que ainda asseguram estabilidade orçamental, com saldo que, embora menor do que o de anos passados, continua a ser apreciável; e desviar das receitas ordinárias quantias importantes para liquidação das despesas extraordinárias, quási todas provenientes do rearmamento e outros gastos necessários ao exército.
Vamo-nos, porém, aproximando a passos largos do têrmo das hostilidades. A guerra seguiu o seu curso nos últimos cinco anos e, para muitos, a sua trajectória durante êste longo período de duras e trágicas lutas não constituiu surprêsa.
Houve tempos em que as fôrças materiais desempenhavam, no decurso das guerras, um factor secundário. A bravura, a ciência estratégica e o entusiasmo constituíam quási o único alicerce em que assentavam os conflitos entre nações.
O homem há-de continuar a ser nervo da guerra, mas as fôrças materiais postas ao seu dispor para a fazer consideram-se, hoje, como elemento quási decisivo da vitória.
Já isso fora provado há vinte e cinco anos. Os resultados dos combates de agora vieram acentuar ainda mais que o poder material tem na vida dos povos uma influência tam grande que até pode decidir da sua própria independência.
Os problemas económicos no após-guerra
2. O têrmo da guerra vai suscitar na Europa a resolução de tremendos problemas. Uns, de ordem material, hão-de levantar complicadas questões relativas a mil cousas relacionadas com a reconstrução de vastas cidades e de áreas desvastadas por bombardeamentos, com-

Página 2

344-(2)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
bates e incêndios. Outros, mais difíceis de resolver, por fazerem parte da própria natureza do homem, hão-de porventura levar a lutas esporádicas, dentro dos diversos países, em volta de ideologias e palavras — ecos de um passado que arrastou o mundo até à catástrofe.
Os problemas que se hão-de erguer diante da Europa na segunda metade do século XX também nos tocarão de perto. Êles são conseqüência do progresso industrial e agrícola, iniciado há cento e cinqüenta anos com a aplicação à tecnologia de grandes descobertas científicas e exigido pelo desenvolvimento demográfico de zonas susceptíveis de alimentar grandes populações.
A primeira grande guerra acentuou êsse progresso; a segunda tem sido, por assim dizer, a materialização destrutiva dos formidáveis resultados da investigação técnica no período que medeou entre as duas.
Os reflexos, na vida política dos povos, desta evolução, que devia tender apenas ao domínio e aproveitamento das forças e recursos da natureza para fins úteis, tiveram como conseqüência uma série de abalos sociais dispersos e confusos que em pouco concorreram para o bem-estar do homem.
O problema, de vasta transcendência social, que se põe ao mundo, neste angustioso início de uma era nova, consiste no aproveitamento ordenado, a favor da comunidade, das vastas possibilidades de produção que o homem tem hoje ao seu dispor.
Êle vai além, sob muitos aspectos, de tudo o que no passado foi possível fazer no sentido de melhorar as condições da vida humana. Mas a capacidade de trabalho e de produção demonstrada pela violência e carácter anárquico da guerra veio assegurar que é praticável em poucos anos um grande progresso nas condições da vida social dos povos do ocidente.
As questões sociais
3. Os benefícios susceptíveis de ser transferidos para a comunidade são directamente proporcionais à eficiência dos instrumentos da produção. Quanto maior fôr essa eficiência maior será o rendimento económico e, por conseguinte, melhores os resultados da exploração.
Assim, o primeiro dever dos orientadores de uma sociedade organizada é o de procurarem desenvolver a capacidade de produção dentro dos melhores princípios de eficiência, com o objectivo de aumentar os rendimentos totais e promover a distribuïção equitativa dêsses rendimentos, de modo a reduzir a miséria e a melhorar as condições de vida e prosperidade do País.
A experiência tem demonstrado que o melhor antídoto contra convulsões, sociais é o estabelecimento de medidas que tendam a combater a penúria e a promover a gradual elevação das condições de vida pelo aumento do poder de compra. A melhoria do salário, em relação ao nivel de preços, e a dignificação e defesa da família pela instituïção de salário familiar e demais benefícios, as pensões na invalidez, o combate ao desemprêgo, o auxílio na doença e nos acidentes do trabalho, as reformas na velhice e outros meios de atender às necessidades humanas suo preciosos elementos de combate contra ideas revolucionárias, baseadas em reivindicações sociais que, em última análise, pela sua virulência e natureza anárquica, só trazem desilusões e misérias aos que as seguem.
4. Qualquer programa de reforma social não quere apenas significar que nela se incluem os trabalhadores assalariados, ou apenas aqueles que, por virtude da incerteza de trabalho ou de saúde, estejam em circunstâncias de terem de recorrer, periòdicamente, a auxílios de natureza social.
Há muitas classes que, não pertencendo ao que vulgarmente se designa por classes trabalhadoras, vivem em circunstâncias de incerteza e possuem rendimentos tam baixos como aquelas. O seu nivel de vida é precário. Dependem muitas vezes de condições fortuitas — do tempo, das colheitas, do grau de prosperidade de determinada região. São tanto ou mais proletários, na acepção que se dá ao têrmo, do que os trabalhadores da cidade ou os operários da fábrica.
Além daqueles que, pela sua incerta condição de assalariados, requerem o estabelecimento de auxílios nas épocas de falta de recursos, existe também baixo nivel de vida em grande parte da população. Não é, em muitos casos, feliz a mediania na própria subsistência. As necessidades modernas impõem o estabelecimento de certo número de condições de sanidade e cultura, de higiene e bem-estar, que têm, em alguns casos, no ponto de vista social, tanta importância como o próprio auxílio contra a destituição, a penúria ou a miséria.
As comunicações rápidas entre povos e dentro dos países tendem a nivelar os costumes, os desejos e as exigências humanas. Desvanecem-se, pouco a pouco, os velhos preconceitos — e os povos reclamam cada vez mais aquilo que outrora lhes pareciam perigosas innovações. Até aos mais recônditos lugares do mundo vão chegando, inexoràvelmente, os tentáculos poderosos e fascinantes do chamado progresso material — umas vezes para bem, tantas outras para mal. O equilíbrio harmonioso de sociedades regionais, afastadas do bulício da agitada vida citadina, dissipa-se gradualmente com os ecos das innovações que imperceptìvelmente se insinuam no âmago do modo de viver local. Os povos são como as crianças — desejam beber no cálix da amargura, que é a vida material moderna — e exigem, uma vez saboreado o terrível elixir, que êle passe a ser um prato habitual na rusticidade da sua mesa familiar.
Tudo isto pressupõe aumento considerável nos rendimentos de cada um — do proprietário, do lavrador, do comerciante, do industrial, do funcionário, do trabalhador — e de todos os que nas suas variadas esferas constituem a Nação.
E as exigências do mundo actual só podem ser satisfeitas de um modo. Não se encontrou até hoje outro que permita o progresso imposto por melhorias no regime de vida. O único meio de destruir os fundamentos em que podem assentar as convulsões de carácter social é aumentar consideràvelmente, dentro de estritas normas de eficiência, os rendimentos nacionais. E isso só pode realizar-se pelo acréscimo da produção interna.
O aumento de produção
5. Mas o aumento da produção interna requere meticulosa organização. Foi preciso em muitos países adoptar enérgicas medidas, tendentes a destruir veleidades de gostos ou ambições individuais, de modo a dobrar resistências ou atitudes que se não harmonizavam com o império do bem comum.
Tirando questões de ordem ética que reclamam a protecção dos mais desprotegidos, as necessidades do melhor aproveitamento dos recursos materiais em proveito da comunidade impõem hoje, em toda a parte, o cerceamento de prorrogativas que ainda há duas dezenas de anos se consideravam inerentes à iniciativa individual. O Estado, neutro, indiferente e incolor, passou a tomar parte activa na vida da nação. A economia era considerada dentro de limites, como uma actividade especial, que podia ser dirigida e orientada, indisciplinadamente e em exclusivo, pelo indivíduo, sem que os seus actos ou iniciativas pudessem ser vergados por qualquer interferência que não fôsse a das próprias fôrças

Página 3

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(3)
desencadeadas por seus efeitos. O Estado, mudo espectador, assistia, por vezes, a derrocadas de actividades úteis para a sociedade, podia tomar conhecimento de desperdícios que minavam os recursos do património nacional e ainda presidir, sem ter meios que a isso obstassem, à exploração, por poderosos interêsses, de actividades que altamente poderiam influir no bem comum. O conceito da necessidade de maior interferência do Estado na vida social e económica das sociedades modernas é relativamente recente e é também resultado do enorme progresso da técnica e da ciência. Já não é possível, hoje, a realização de grandes obras de fomento, que assegurem baixo preço de custo e benefícios a largas regiões, na magnitude precisa, sem que o Estado nelas intervenha.
Essa intervenção poderá ter dois objectivos: o primeiro tende a impor o aproveitamento mais rendoso doa recursos em vista, pela aplicação dos melhores processos técnicos e pela adopção dos projectos Ou esquemas que assegurem o maior número de resultados; o segundo deriva, até certo ponto, da grandeza da obra e da magnitude dos capitais necessários à sua rápida e completa execução.
A melhoria dos rendimentos nacionais
6. Todas estas considerações, que não têm novidade, porque representam, hoje, doutrina aceite e assente em quási toda a parte, mostram que os planos ou projectos de reforma social duradoura só podem assentar na intensificação, em elevado grau, do desenvolvimento dos recursos nacionais.
O acréscimo da produção interna, nos seus diversos aspectos, é o seu fundamento. Sem êle tudo o que fôr feito é precário, aleatório, depende de contingências, de épocas de crise interna ou externa. A origem dos recursos que hão-de manter as obras sociais, aumentá-las e promover o gradual bem-estar, nos campos e nas cidades, só pode advir das melhorias económicas, e estas têm como base fundamental o desenvolvimento da produção. A eficiência na vida económica é o mais sólido factor do progresso. E considerados, na sua generalidade, os nossos métodos de trabalho, ela é ainda muito baixa entre nós.
O operário necessita de produzir mais por unidade de tempo; a terra precisa de dar maiores colheitas por unidade de superfície; a cultura dos terrenos tem de ser feita com sementes ou plantas que a êles melhor se adaptem; grandes riquezas, considerada a relatividade do meio, que ainda não foram exploradas, precisam de ser convenientemente reconhecidas; e as condições que lhes asseguram a exploração remuneradora, como os transportes e outras, necessitam de ser investigadas. E, sobretudo, deverá ser dado ao ensino profissional um carácter mais objectivo e prático, desde os seus graus mais elementares, de modo a formar homens que nas oficinas possam arcar com as múltiplas responsabilidades derivadas de maior intensidade na vida económica. A administração e direcção, o trabalho, o capital, a intervenção do Estado no sentido de orientar e disciplinar os diversos processos técnicos e administrativos de exploração, e tudo o que se relaciona com o maior rendimento da actividade nacional, requerem forte acção coordenadora, orientadora e educativa. Sem ela, e sem a sua incessante vigilância, nunca será possível obter do trabalho nacional o rendimento que há direito a exigir dêle.
Há mais de uma dúzia de anos que, por iniciativa do Estado, se vão multiplicando pelo País organismos sociais, tendentes a defender, dentro das possibilidades dos rendimentos, a sorte das classes trabalhadoras.
Tem sido altamente benéfica, em muitos aspectos, a actuação dêsses organismos, que, desde os sindicatos até às Casas do Povo e dos Pescadores, procuram estabelecer a verdadeira solidariedade, tantas vezes prometida e que agora, gradualmente, se vai transformando num facto.
Pouco a pouco, aqui e além, com o sentido sempre de melhorar a sorte dos mais sujeitos aos abalos da vida e às contingências dos tempos, tem sido alargada a rêde de instituïções de previdência social. O trabalhador procura quási sempre compreender e integrar-se no novo espírito que anima a legislação — e a classe patronal não tem fugido às responsabilidades que a solidariedade humana, o bem comum e os seus próprios interêsses aconselham.
Com mais freqüência do que em outros tempos, e com mais nítida compreensão dos deveres sociais, muitos organismos procuram, no âmbito dos seus recursos, tomar a seu cargo uma parte do fardo que pesadamente cai sôbre a família dos que dêles dependem.
E já não é raro ver as escolas-cantinas, as enfermarias privadas, a assistência médica gratuita, a distribuïção de remédios e outros meios de acudir à pouquidão de salários, às desventuras dos tempos e a tantas imprevidências de chefes de família.
O interêsse revelado nos últimos anos pela habitação económica, embora ainda longe daquilo que poderia ser, mostra que vai acordando, por todo o País, a consciência das dificuldades da vida de muita gente e a necessidade de opor sãos remédios e antídotos contra perigos graves que ameaçam a estabilidade das sociedades modernas.
Mas tudo isto é pouco. E não é possível realizar muito mais emquanto não forem aumentados os rendimentos internos. O Estado, por intermédio do orçamento, tem distribuído verbas aqui e além. Mas elas são sempre limitadas, e não podem ser muito maiores porque as receitas não aumentam na proporção das necessidades. E as receitas nunca poderão ir além de certos limites, dados pela capacidade tributária, se não forem apreciàvelmente melhorados os rendimentos nacionais, que são conseqüência do aumento da produção.
Possibilidades económicas nacionais
7. A insistência com que nestes pareceres são preconizadas obras tendentes a revelar a riqueza do País, de modo a poderem ser adoptadas medidas no sentido de a utilizar, resultou sempre, e ainda resulta hoje, da imperiosa necessidade de melhorar o nivel de vida do nosso povo.
Qualquer reforma social tem de ser baseada no desenvolvimento dos recursos nacionais. O poder de compra da população não pode ser alargado sem o aumento dos rendimentos de cada um. Nem os salários, nem, por conseguinte, as condições de vida, no ponto de vista de moradia, de higiene, de alimentação, de cultura, são susceptíveis de grandes progressos sem que o País, no conjunto, melhore a exploração dos seus recursos e dêles extraia rendimentos muito superiores aos que hoje usufrue.
Já se não pretende, pelo menos nas próximas gerações, atingir nivel de vida semelhante até ao que antes da guerra gozavam certos povos europeus.
O atraso das nossas condições nas cidades e nos campos, a pobreza na alimentação, o desconfôrto no lar, a incultura, a insuficiência e fraca produção, a higiene, os índices da mortalidade, os métodos de trabalho, a fôrça destrutiva de certas doenças, susceptível de ser atenuada, o índice geral da vida nos seus diversos

Página 4

344-(4)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
aspectos apontam no sentido de um grande esfôrço que tenda a remover muitas deficiências patentes a todos. Há necessidade, por isso, a par de orgânica mais produtiva e de administração que aproveite todos os valores humanos, de um grande trabalho de reconstrução económica, tendente a aumentar, tanto quanto fôr possível, o rendimento dos diversos recursos nacionais.
8. Durante muitos anos espalhou-se a crença de que o País era pobre. Pouco a pouco, à medida que foram sendo aperfeiçoados os instrumentos de investigação industrial e agronómica, apareceram novas fontes de riqueza, que é o mesmo que dizer novas fontes de actividade.
Tornou-se conhecido, pelo plano hidroagrícola, que era possível pela irrigação dobrar, num mínimo, os rendimentos de 400:000 hectares de terrenos, e iniciou-se a obra da rega, que infelizmente tem caminhado devagar. E essa área pode, sem dúvida, ser muito alargada.
Veio depois o estudo dos rios e, com o tempo, pessoas bem informadas foram demonstrando serem muito grandes os recursos hidroeléctricos que dêles se poderiam desviar para a nossa actividade industrial e agrícola. E à medida que o problema ia sendo debatido e analisado, nas suas variadas facêtas, foi subindo até à superfície da evidência real, quási palpável, a certeza de que os grandes rios portugueses, se regularizados, poderiam oferecer transportes baratos, águas para rega, nateiramentos benéficos, e ainda melhorar, pelo domínio das suas turbulentas e impetuosas correntes, as colheitas de terrenos periòdicamente assoreados e evitar prejuízos totais em avultadas e dispendiosas sementeiras.
Mas a via navegável trouxe logo a seguir a certeza da possibilidade de exploração de recursos mineiros que há muitos anos se sabia existirem, mas que, talvez por sua inacessibilidade, longe dos centros urbanos, ou por uma vaga suspeita de se caracterizarem por composição física e química impróprias, se consideravam de impossível safra.
O reconhecimento geológico e mineiro de alguns dêsses jazigos mostrou, porém, que êles podem ser utilizados; e a possibilidade de poder transportar por largo rio, na direcção da corrente, produtos de valor muito sensível, numa distância bem pequena, comparada com outras de alguns países, abre novo e vasto campo de actividade ao nosso pobre e acanhado meio económico.
E se alguém reflectir um pouco sôbre as variadas aplicações da energia obtida de rios tornados navegáveis, entrando até no mistério de um futuro que pode não ser longínquo, e pensar a sério na água a elevar e a distribuir por apreciáveis áreas, hoje meio improdutivas ou de muito fraco rendimento agrícola, há-de certamente convir que a Providência não foi avara na distribuïção de benesses para com êste País.
Apontaram-se apenas algumas possibilidades económicas. Nem sequer se tocou nas actividades que resultam do trabalho no mar, que foi sempre, desde o alvorecer da nacionalidade, a grande e imensa arena onde lutaram, para vencer, grandes e fortes energias da gente lusa.
E também nem ao de leve se tocou nas imensas possibilidades da indústria agrícola, que tem sido até agora o principal esteio da alimentação nacional e que, mercê das novas tendências do consumo, se pode converter numa rendosa e útil fonte de maiores benefícios, sobretudo se fôr encaminhada no sentido de produzir mais frutas de qualidade. A Espanha já exportou, antes da guerra, para cima de um milhão de contos só em citrinos; e a Palestina, com solos pobres e extrema falta de água, atingiu em 1937-1938 a produção de cêrca de 13 milhões de caixas.
As recentes investigações sôbre dietas e regime alimentar indicam cada vez maior consumo de fruta, e poucos países na Europa estarão em circunstâncias de a produzir como Portugal.
A coordenação e organização da economia nacional
9. Poder-se-ia ainda aludir a outras fontes de receitas que viessem a custear as grandes despesas que a renovação social impõe, mas que, mercê de circunstâncias várias, têm permanecido inexploradas ou em exploração precária. Basta, porém, enumerar algumas. Só a investigação cuidadosa dos recursos agrícolas e industriais, na verdade, revelará até que limites se poderá ir na exploração económica de muitos dos recursos portugueses. Uma cousa parece certa: é que a actual organização dos serviços de fomento e de investigação não é a que melhor se adapta ao desenvolvimento económico dos nossos recursos. Nós temos, às vezes, a tratar de determinado assunto diversos organismos, e com freqüência êles pertencem a Ministérios diferentes. Até dentro do mesmo Ministério quantas vezes se confundem as atribuïções, ou porque não estão bem definidas nos estatutos reguladores dos diversos departamentos, ou ainda pelo natural e humano desejo de valorização do próprio serviço.
Por outro lado, certos recursos potenciais, como se ilustra claramente com o caso dos rios, podem ser aproveitados com fins produtivos diferentes: a energia, a rega, o transporte, as cheias. O plano geral da regularização dos rios, isto é, o plano que permitirá a sua utilização integral, tem de ser um só — aquele que consinta o maior proveito possível do todo, nos seus variados aspectos. Há por isso necessidade de íntima cooperação dos serviços, e ainda de estreita colaboração com outros que nessa actividade possam influir, como, por exemplo, os serviços florestais, na parte relativa ao revestimento de serras ou terrenos susceptíveis de erosão, ou no povoamento piscatório. Além de que tornar navegável um rio, como o Douro ou o Tejo, pode perturbar toda a economia do sistema ferroviário que lhe seja paralelo, e que hoje drene as mercadorias das regiões servidas também pelo transporte fluvial. Parece, e tudo o indica neste caso, que a exploração fluvial deverá, um dia, ser exercida pelo organismo que tiver a seu cargo a exploração ferroviária.
São estes pequenos exemplos que salientam a necessidade de melhor coordenação entre os órgãos orientadores da nossa vida económica, de modo a extrair dêles o maior rendimento possível e obter do trabalho e inteligência dos seus dirigentes e colaboradores o máximo e melhor aproveitamento. A devoção patriótica e o innato e veemente ardor — e é prazer verificar isso — que muitos dos servidores do Estado, nas respectivas esferas de acção, põem no desempenho do seu dever esbarram muitas vezes com incompreensões e obstáculos que nem as vontades mais fortes conseguem afastar. Todo o esfôrço, por mais longo e penoso que seja, redunda em nada. É trabalho perdido, são ilusões desfeitas, anos de meritórios estudos inutilizados.
A cooperação estreita e leal, a melhor coordenação dos esforços de tantos que se dedicam ao bem de todos, a reforma dos serviços, de modo a que os planos de renovamento económico possam ser considerados e ajustados na base do conjunto de todas as utilizações, e não parcelarmente, são ainda hoje em Portugal uma aspiração e uma grande necessidade.
10. Há um campo vastíssimo para, nas próximas décadas, alargar a potência económica do País. Sem isso

Página 5

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(5)
a nossa renovação social não pode atingir o nivel que as circunstâncias do mundo e da nossa terra impõem. O trabalho a realizar só pode ter o rendimento preciso se fôr obra coordenada de muitos.
Quando, em 1935, foi proposta a criação de uma junta central de economia, muitos espíritos viram na idea princípios que ela não continha. Era novo o organismo. Pensou-se até que êle se poderia sobrepor às funções do Poder Executivo. A justificá-lo escreveu-se então o seguinte(1):
«É sabido, e já atrás se aludiu a isso, que um dos grandes males da administração pública portuguesa reside na dispersão de funções por diversos serviços do Estado. A sobreposição de competências, aliada à defesa de cada serviço pelos componentes, a falta de colaboração e ligação que se nota nas soluções de muitas cousas que dizem respeito a dois ou três departamentos públicos, toda uma série de pequenos nadas que causam demoras, atrasos e discussões na resolução de assuntos urgentes e essenciais concorrem para a confusão que se nota no bom andamento da cousa pública.
Prevê-se no projecto de lei a constituïção de uma junta de economia destinada a centralizar a elaboração dos planos em que serão gastas as receitas disponíveis nos próximos quinze anos.
Necessita de ligeiro comentário esta innovação em Portugal — ela é, sob diversos nomes, uma realidade em muitos países.
Com efeito, não se trata apenas de planos parciais — construir uma estrada ou um caminho de ferro, aplicar um esquema de irrigação ou regularizar caudais de um rio. É mais complexo o problema porque visa desenvolver recursos económicos, em conjunto e simultâneamente, que dizem respeito a actividades de diversos Ministérios e bem podem influenciar grandemente a vida económica da Nação e seu Império. Há necessidade, por conseqüência, de encarar a questão no todo, e não em parte ou partes, e coordenar as soluções, nos seus diversas aspectos, de modo que não haja amanhã largo desenvolvimento numa forma de actividade em detrimento de outra, ou, o que seria ainda mais grave, não venha a verificar-se depois que se despendeu inùtilmente dinheiro em qualquer melhoramento que não é requerido pelas necessidades imediatas ou próximas da economia nacional ou em avanço de outras.
Um plano de soluções engloba, além disso, aspectos diversos: o financeiro, o económico, o técnico, o industrial ou agrícola ou comercial, e mesmo o progresso das ciências aplicadas.
Não tem a actual organização do Poder Executivo meios de fazer estudar convenientemente planos necessàriamente complexos, em que devem colaborar especialistas em vários ramos das ciências, que requerem muitas vezes inquéritos cuidadosos, e por isso se prevê a criação de um elemento orientador e prático — a Junta Central de Economia».
Depois do que então se escreveu, o mundo suportou muitas convulsões.
As ideas ao tempo prevalecentes em quási todos os países ruíram perante a guerra — e os instrumentos produtores criados ou aperfeiçoados durante os últimos cinco anos hão-de exigir em toda a parte a planificação de uma economia que já em período anterior era interdependente.
Muitos dos organismos criados nos países beligerantes com o objectivo de planificar os diferentes ramos da sua economia hão-de manter-se depois. As necessidades da guerra vieram claramente demonstrar o enorme desperdício que existia na exploração agrícola e industrial e as possibilidades de melhorar os instrumentos produtores pela disciplina das suas actividades. Os povos que esquecerem os ensinamentos dos últimos cinco anos e não tentarem coordenar as suas formas de actividade no sentido de obter delas maiores rendimentos estão condenados ao retrocesso. Nunca poderão atingir nivel de vida social que se aproxime do de outros países.

(1) Ver separata do Diário das Sessões de 8 de Fevereiro de 1935, pp. 98 e 99.

Página 6

344-(6)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
RECEITAS
1. Foi atingido êste ano o mais alto quantitativo das receitas ordinárias desde o início da reorganização financeira. O progresso tem sido gradual. As medidas tomadas no sentido de amparar os impostos indirectos impediram a descida que neles se poderia prever por virtude da deminuïção nas importações.
Hão-de secar logo a seguir ao fim da guerra algumas das fontes que nos dois últimos anos mantiveram a afluência de receitas. E, apesar da natural subida que se há-de verificar nas importações, e por conseqüência no aumento dos impostos indirectos, não parece ser possível manter o ritmo dos últimos anos no acréscimo das receitas.
O desenvolvimento da massa tributária, e por conseguinte da receita, de modo duradouro só pode provir de mais intensa produção que conduza a melhorias nos rendimentos tributáveis.
O problema das receitas reduz-se por isso a um problema económico, que se resume no aproveitamento gradual, mas seguro, dos recursos materiais de que dispõe o País, tanto no aspecto industrial como no agrícola.
O exame superficial dos diversos capítulos das receitas públicas mostra que os impostos directos mais do que dobraram desde 1928929. Hão-de ver-se adiante as razões dêste apreciável aumento, que se acentuou depois de 1938, visto que neste ano pouco passaram de 700:000 contos. Pode contudo dizer-se agora que as causas fundamentais do acréscimo, nos últimos anos, à parte melhor aproveitamento da matéria tributável para efeitos de imposto, resultaram de motivos que também hão-de desaparecer em grande parte no fim da guerra.
Tudo indica a necessidade de vigiar cuidadosamente o vasto capítulo das receitas ordinárias, porque o bem-estar e a situação financeira do País, no futuro, dependem dêle.
As receitas foram as seguintes:
Contos
Receitas ordinárias... 3.268:629
Receitas extraordinárias... 779:110
Total... 4.047:739
Pela primeira vez a cifra total das receitas públicas ultrapassou 4.000:000 de contos.
As despesas extraordinárias, que, por virtude de necessidades da guerra, alcançaram êste ano uma elevada soma, como adiante se verá, exigiram maior recurso ao empréstimo do que nos anos anteriores.
Receitas orçamentadas
2. As receitas orçamentadas constam do quadro que segue, em contos:
[Ver diário original]
No exame do orçamento notam-se quási todos os anos duas preocupações dominantes: uma é a da segurança na avaliação das receitas ordinárias, que, depois de cobradas, atingem sempre cifras muito maiores do que as que haviam sido orçamentadas; e a segunda é a das estimativas das receitas extraordinárias. Raras vezes se gasta o que para isso foi orçamentado.
Os números seguintes definem as receitas ordinárias orçamentadas e cobradas nos últimos anos. Na última coluna inscrevem-se os aumentos e deminuïções do que se cobrou em relação ao que foi orçamentado e nota-se que em todos os anos, com excepção de 1930-1931, houve apreciáveis maiores valias, que atingiram em 1943 mais de 780:000 contos.

Página 7

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(7)
Receitas ordinárias orçamentadas e cobradas
[Ver diário original]
3. A origem das receitas foi a seguinte:
[Ver diário original]
O recurso ao empréstimo foi bastante maior êste ano do que nos anos anteriores, porque, como adiante se há-de ver, quási tudo o que figura no capítulo das receitas extraordinárias provém da venda de títulos.
O fundo dos saldos de anos económicos findos não foi alterado. Supôs-se ser mais vantajoso contabilizar verbas provenientes de empréstimos do que deminuir o quantitativo daquele fundo.
O grande excesso das receitas sôbre as despesas ordinárias impediu maior recurso ao crédito, visto as últimas terem atingido uma grande cifra, que foi compensada pelas melhorias das receitas ordinárias.
Se se excluírem destas receitas os juros de títulos na posse da Fazenda Pública e das receitas extraordinárias os empréstimos, obtêm-se os números que constam do quadro seguinte:
[Ver diário original]
RECEITAS ORDINÁRIAS
4. O aumento das receitas ordinárias, em relação a 1942, foi conforme as contas, de 300:000 contos, números redondos.
Há, porém, necessidade de introduzir correcções e, se se entrar em linha de conta com os juros de títulos na posse da Fazenda Pública, o aumento reduz-se para 291:000. Não se pode dizer que êste seja o verdadeiro acréscimo, porque haveria que considerar também receitas que apareceram êste ano e não mais se repetem. Assim, por exemplo, os correios e telégrafos entregaram, para amortização do seu débito ao Estado, 57:655 contos, que pesam no capítulo «Reembolsos e reposições», e esta como outras receitas excepcionais ainda vêm deminuir a diferença entre os dois anos.
A melhoria nas receitas foi contudo apreciável. Ela deu-se em quási todos os capítulos orçamentais e nalguns menos produtivos houve na verdade acréscimos importantes, como nos «Reembolsos e reposições», nas «Consignações de receitas» e «Domínio privado e participações nos lucros», além das taxas, que, só por si, acusaram aumento superior a 50:000 contos.
Isto leva a crer que não podem ser fundadas grandes esperanças em futuras melhorias nas receitas e que se torna necessário olhar o assunto com grandes cuidados,

Página 8

344-(8)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
porque cada vez é mais premente o desenvolvimento de muitas despesas.
As receitas ordinárias, desde 1930-1931, têm evoluído do modo seguinte:
[Ver diário original]
Tem interêsse o exame dêste quadro. Nota-se logo que o maior aumento se deu nos impostos directos, que já duplicaram quando comparados com os que se cobraram em 1930-1931. A maior valia relativa a 1939 também é apreciável.
Mas quási todos os outros capítulos orçamentais acusam grandes acréscimos, embora os seus reflexos nas contas não sejam tam visíveis como os dois primeiros, que somaram, em 1943, quási 2:273 contos, cêrca de 70 por cento do total.
5. A influência dos impostos directos e indirectos nas contas pode verificar-se no quadro seguinte:
[Ver diário original]
Para avaliar das alterações sofridas desde 1930-1931, relativamente a aumentos ou deminuïções nas receitas, publicam-se a seguir os números referidos a cada capítulo orçamental.
[Ver diário original]
6. São melancólicas as conclusões que se podem extrair dos números. Não valerá talvez a pena fazer agora largas considerações sôbre o significado das cifras, porque elas ressumam do que se tem escrito em vários pontos de outros e dêste parecer. Se reduzíssemos as cifras que exprimem as receitas de 1943 a poder de compra idêntico ao de 1930-1931, fàcilmente verificaríamos que elas mostram uma aproximação muito maior da que é dada pelos números.
Nos treze anos que mediaram entre as duas datas deve ter-se desenvolvido a riqueza interna e, por conseqüência, a matéria tributável. As receitas deviam mostrar, lògicamente, maior diferença, ou então é menor o desenvolvimento económico interno do que o previsto. Esta questão das receitas públicas pode vir a ter influência grande nos próximos anos — nos anos que se seguirem à guerra. E se não forem tomadas providências no sentido de as manter não será possível melhorar o orçamento das despesas. E isso representa hoje uma exigência da vida.

Página 9

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(9)
I
IMPOSTOS DIRECTOS
7. Na comparação dos impostos directos com os de anos anteriores verifica-se um aumento bastante apreciável nas duas contribuïções — predial e industrial — e em 1943 uma acentuada deminuïção no imposto sôbre sucessões e doações e sisa.
Os números, para os últimos anos, são os seguintes:
[Ver diário original]
A contribuïção predial, que tinha deminuído de 1:700 contos em 1942, recuperou em 1943 parte da perda sofrida naquele ano.
Os aumentos nas contribuïções predial e industrial, no imposto profissional e no imposto complementar totalizaram cêrca de 23:500 contos e não compensaram as deminuïções sensíveis nas sucessões e doações, no imposto de salvação pública e, sobretudo, na sisa, que acusou a baixa considerável de 18:000 contos. A firmeza neste capítulo deve-se aos lucros excessivos.
As variações entre os rendimentos dos diversos impostos directos podem estabelecer-se assim:
[Ver diário original]
Êste quadro mostra que mais de metade do aumento, em relação a 1939, derivou do imposto sôbre lucros excepcionais de guerra, que em 1943 representou mais de 20 por cento dos impostos directos. As contribuïções predial e industrial e o imposto complementar contribuíram para o total com perto de 100:000 contos, o que é pouco.
O imposto sôbre lucros excepcionais auxiliou as despesas resultantes do estado de guerra, que foram muito grandes nas fôrças armadas, como adiante se verificará.
Rendeu 421:102 contos em 1942 e 1943. A justiça do seu lançamento não pode ser posta em dúvida e o quantitativo que produziu não atingiu as suas possibilidades.
O processo de lançamento tem dado, porém, lugar a protestos e a injustiças e conviria fazer a sua revisão.
Em geral, o contribuinte não se recusa ao pagamento do imposto e compreende a sua necessidade, demais numa época em que as condições de vida impõem sacrifícios e todos têm o dever de os fazer. Mas há necessidade de tomar medidas no sentido de repartir equitativamente a carga fiscal. Cada um deve pagar o que lhe compete em relação a outros, e não mais.
O sentimento de injustiça na liquidação do imposto verificado por comparação com vizinhos ou contribuintes de actividades similares, deve ser neutralizado na medida do possível.
O nosso sistema tributário precisa de ser revisto. As tentativas de ocultar lucros foram sempre um feio pecado da parte de alguns contribuintes. Se não forem envidados todos os esforços no sentido de proteger os que honestamente acusam a matéria tributável e, por conseqüência, liquidam o que é devido ao Estado, as práticas tendentes a evitar o imposto alargar-se-ão, em detrimento da moral e dos interêsses nacionais.
Castigar com energia aqueles que fogem ao fisco e se evadem ao pagamento de impostos e proteger aqueles que cumprem a lei, declarando os resultados do ano, é uma necessidade fundamental.
Os lucros de guerra parecem ter sido a prova real da existência de duas grandes classes de contribuintes.

Página 10

344-(10)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Torna-se urgente trazer ao bom caminho os que dele fugiram e aliviar os que nêle se mantêm com integridade. Deram-se duas apreciáveis reduções nos impostos de transmissão — mais na sisa do que nas sucessões e doações. A sisa voltou ao nivel de 1941 (100:678 contos). O ano de 1942 produziu negócios de compra e venda fora do normal, com valores de inflação. Muita gente, assustada, comprou e vendeu, e daí o elevado número de transacções de prédios por altos preços. Parece que 1943 iniciou o regresso à normalidade neste aspecto da vida do País e, como resultado, a sisa deminuíu apreciàvelmente.
É natural que se mantenha na proximidade das cifras dêste ano.
CONTRIBUÏÇÃO PREDIAL
8. Embora as contas não dêem a discriminação das contribuïções prediais — rústica e urbana —, é possível, com ajuda dos elementos colhidos pelo Instituto Nacional de Estatística, fazer a destrinça. Os números que seguem dão as liquidações de uma e de outra para 1943 e podem comparar-se com os do último ano antes da guerra, em contos:
[Ver diário original]
A contribuïção predial rústica sofreu um pequeno aumento — cêrca de 5:000 contos desde o início do conflito —, mas o aumento na predial urbana foi maior — passou de 97:724 contos para 119:915. Há-de ver-se adiante em que localidades isso aconteceu.
Não parece ser muito elevado êste aumento na contribuïção predial rústica se se tomarem em conta as condições em que se debate o mundo. As exigências da guerra obrigam a maiores receitas para contrabalançar os encargos que dela resultam. Contudo, sôbre os géneros agrícolas recaem hoje encargos diversos sob a forma de taxas para organismos corporativos e outros fins que, juntamente com adicionais e imposições de outra natureza, elevam na verdade a carga fiscal sôbre o proprietário rústico até limites que algumas vezes se tornam quási incomportáveis. Mas o que fere acima de tudo é a desigualdade em muitos casos.
O aumento na contribuïção predial urbana é ainda devido a avaliações e reflectiu-se sobretudo nas principais cidades.
Rendimento colectável
a) Propriedade rústica
9. E muito proveitoso o estudo do rendimento colectável na propriedade rústica. Quando se examina a sua evolução, por distritos, verifica-se logo serem muito baixas as variações. Os números seguintes dão os rendimentos colectáveis em todos os distritos do País e a capitação por habitante e contribuinte, assim como a média por hectare.
[Ver diário original]
O rendimento total colectável em 1941 foi de 995:136 contos e em 1943 de 991:153, tendo deminuído nos dois anos cêrca de 4:000 contos. Em 1940 havia sido de 976:764 contos.
Esta pequena variação resultou em parte de reavaliações e de arranjos na matriz, que levaram à exclusão de prédios, omissões ou a números repetidos.
Num certo número de distritos o rendimento colectável deminuíu, como em Braga, Bragança, Lisboa, Portalegre, Santarém e Viana do Castelo; noutros aumentou, embora ligeiramente, como Aveiro, Castelo Branco, Faro e Leiria, e nos restantes mantém-se em nivel idêntico ao de 1941.
A capitação mínima, por habitante, encontra-se em Lisboa e Pôrto, como é natural, dada a população das duas cidades, e a máxima existe nos distritos de Évora (310$), Portalegre (281$) e Santarém (225$). A maior capitação por contribuinte dá-se em Évora, seguida por Portalegre, Setúbal e Beja. Coimbra, Aveiro e Castelo Branco têm muito baixa capitação por contribuinte.
O rendimento colectável, por hectare, é muito reduzido em Beja (52$), Bragança (55$), Castelo Branco (57$) e Setúbal (60$), mas atinge o valor de 238$ em Braga, 229$ no Pôrto e 270$ em Ponta Delgada.
Os números dão-nos idea aproximada dos rendimentos dos diversos distritos, embora sejam apenas médias, assim como da influência da população e da divisão da propriedade, que é máxima nos distritos do norte, principalmente em Braga e Pôrto, e nos Açôres.
Já foi iniciado no concelho de Mafra o lançamento da contribuïção predial rústica com base no cadastro geométrico e em breve se estenderá a outras zonas do País, onde prosseguem ou se encontram em vias de conclusão os trabalhos geométricos, como Beja, Cuba, Mogadouro, Vidigueira, Lamego, Sintra e outros concelhos. Depois

Página 11

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(11)
de concluídos os trabalhos, a distribuïção da carga fiscal sôbre a propriedade rústica será bastante mais equitativa e é natural que suba a receita. A contribuïção predial rústica tem aumentado gradualmente. Ela é conseqüência do rendimento colectável e varia de distrito para distrito, conforme o valor dêste. Em 1943 a contribuïção predial liquidada nos diversos distritos foi a seguinte:
[Ver diário original]
O total da contribuïção predial rústica, incluindo adicionais, foi de 214:391 contos. Os distritos que pagaram mais foram os de Lisboa, Santarém e Viseu. No primeiro a verba dos adicionais é bastante maior do que a da contribuïção predial.
A capitação por contribuinte e habitante é superior, como era de prever, nos distritos do sul — em Évora, Portalegre e Setúbal, que são regiões de grande propriedade. Atinge o mínimo em Leiria, Faro e Aveiro, se se excluir Lisboa e Pôrto.
b) Propriedade urbana
10. O rendimento colectável da propriedade urbana foi de 1.118:137 contos, distribuídos do modo que segue:
[Ver diário original]
Verifica-se que Lisboa tem muito menos prédios do que o Pôrto, o que na verdade mostra a tendência para a habitação familiar, muito mais acentuada no Pôrto, do que na capital.
Por distritos, o rendimento colectável da propriedade urbana dividiu-se do modo seguinte:
[Ver diário original]
Como era de prever, Lisboa e Pôrto são as duas cidades em que a capitação é maior, seguidas por Setúbal, Évora e Funchal.
A contribuïção predial urbana liquidada (verba principal) em 1943 foi de 119:915 contos e superior em cêrca de 15:000 contos em relação a 1940.

Página 12

344-(12)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.° 140
CONTRIBUÏÇÃO INDUSTRIAL
11. A contribuïção industrial cobrada é dada pelas cifras que seguem, relativas a três anos:
[Ver diário original]
O acréscimo, desde o princípio da guerra, deu-se especialmente no grupo C, onde atingiu mais de 42:000 contos.
O número de colectas também aumentou muito e foi de 336:922, assim divididas:
[Ver diário original]
A base da tributação cifrou-se nos números seguintes:
[Ver diário original]
É de notar que o capital tributável deminuíu e que os rendimentos tributados no grupo C aumentaram muito. Isto explica as diferenças sensíveis que se notaram nos rendimentos da contribuïção industrial, acima transcritos.
Não seria muito elevado o aumento desta contribuïção no espaço de cinco anos, dada sobretudo a situação do País, se no mesmo espaço de tempo não tivesse recaído grande acréscimo de encargos sôbre os instrumentos produtores. Só depois de conhecido o exacto valor dêsses encargos se poderá ajuïzar da influência do desenvolvimento da contribuïção industrial.
Seria por isso de grande vantagem que anualmente se publicassem em conjunto e discriminadas as contas dos diversos organismos, corporativos.
II
IMPOSTOS INDIRECTOS
12. Ainda subiu a cêrca de 30:000 contos o aumento dos impostos indirectos em relação a 1942, não obstante a deminuïção de perto de 15:500 contos sofrida nos direitos da importação de cereais.
E êste aumento, resultante das melhorias notadas nos direitos alfandegários pela importação de vários géneros e mercadorias do estrangeiro e das colónias, auxiliou muito o equilíbrio das receitas.
Na verdade, previu-se logo no começo da guerra a descida que veio a dar-se na importação. Durante muitos anos êsses direitos contribuíram com bastante mais de metade para o total dos impostos indirectos. Foi por isso necessário reforçar outras rubricas e criar novas receitas para manter em nivel parecido com o anterior a receita dêste capítulo. O quadro que segue exprime, em contos, a evolução dos impostos indirectos:
[Ver diário original]
A exportação sôbre que recaem direitos compreende o vinho e vários géneros e mercadorias, avultando entre êles os cereais. O vinho produziu 1:406 contos e os vários géneros e mercadorias passaram além de 359:433 contos. Na importação originária das colónias cobraram-se 593 contos em cereais e 66:265 contos em vários géneros e mercadorias. Do estrangeiro importou-se o restante; no tabaco em rama foram cobrados 135:709 contos e no manufacturado 13:643; os vários géneros e mercadorias renderam 214:150 contos.
O imposto do sêlo e as receitas obtidas por meio de estampilhas fiscais têm aumentado quási todos os anos e em 1943 produziram 218:605 contos, mais cêrca de 15:000 contos do que no ano anterior.

Página 13

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(13)
Importação e exportação
13. Todos os anos se tem feito nestes pareceres uma ligeira resenha do valor e tonelagem do nosso comércio externo. Não é fácil comparar as exportações nos demais anos, porquanto diversos factores a isso se opõem, sobretudo no período anterior à guerra.
Os valores que aparecem na estatística são os obtidos por declaração e aceites pela alfândega. Usaram-se diversos processos de os tornar tam reais quanto possível, e o Instituto Nacional de Estatística tem procurado encontrar o melhor meio de solucionar o problema, que é, na verdade, de importância, porque influe na determinação dos resultados finais da balança de pagamentos.
Para períodos anteriores a 1936 foi calculado um coeficiente de correcção. Contudo, entre êsse ano e 1939, os valores da exportação, sem serem corrigidos, não representam ainda a realidade. Mas já em 1940 o Instituto conseguiu obter informações a respeito da maior parte das principais mercadorias, abrangendo uma forte percentagem total das exportações. O valor indicado para os principais produtos exportados aproxima-se por isso da verdade. Em 1941 e 1942, segundo o Instituto, já foram em número reduzido as alterações que houve de introduzir.
Isto mostra que não são fáceis as comparações nos números constantes das nossas estatísticas indicativos da exportação. Para dar melhor idea do que podem ser, inserem-se a seguir os valores, tal qual resultam da estatística e depois de sofrerem a necessária correcção(1).
[Ver diário original]
Se está certo o coeficiente aplicado, as cifras mostram que o deficit da balança comercial é bastante menor do que o que indica a estatística.
14. A importação durante o ano de 1943 subiu em pêso e valor relativamente a 1942, mas ainda fica muito aquém de 1938 na tonelagem. Neste ano importaram-se 2.300:000 contos de mercadorias, emquanto que em 1943 o total não passou de 1.458:400, no valor de 3.323:000 contos, se se excluir ouro e prata.
O valor por tonelada aumentou, por isso, consideràvelmente, visto ter andado, no último ano da guerra, à volta de 1.000$, ao passo que em 1943 atingiu 2.280$.
A deminuïção deu-se nos carvões, que passaram de 1.177:000 toneladas para 537:000 em 1943; na gasolina, que veio de 73:000 para 31:000; no ferro e aço, que baixou de 106:000 para 31:000. Nalguns produtos essenciais à agricultura, como as fosforites e o sulfato de amónio, o decréscimo foi muito grande. No primeiro caso de 60:000 toneladas, ou metade do normal, e no segundo apenas se importaram em 1943 cêrca de 16:000 toneladas, contra 69:000 antes da guerra.
O problema das importações pesou por isso grandemente sôbre o País durante o ano de 1943 e influíu também nos valores totais. O valor médio do carvão passou de 165$ para 582$ em 1943, o da gasolina aumentou de 448,8 por cento, o do petróleo 568,8 por cento, o do sulfato de amónio de 221 por cento, e assim sucessivamente.
O quadro seguinte dá a importação e exportação nos últimos anos. Os números relativos à importação, relacionados com os do ano anterior à guerra, são os seguintes:
[Ver diário original]

Página 14

344-(14)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Exportações
15. As exportações em 1943 desceram muito em tonelagem, mas aumentaram bastante em valor. Alguns dos produtos que, pelo seu volume, como as pirites e madeiras, empregavam apreciáveis quantidades de mão de obra quási desapareceram. Os números respeitantes aos anos de 1938 a 1943 são os que seguem:
[Ver diário original]
O exame dêste quadro dá logo idea dos efeitos da guerra na economia nacional em matéria de exportações. A actividade deminuíu grandemente. A tonelagem baixou de cêrca de 1.500:000 toneladas exportadas para um pouco menos de 500:000. Houve assim um deficit na exportação de perto de 1.000:000 de toneladas. A diferença para menos deu-se quási toda nas matérias primas, e foram de origem mineral, essencialmente pirites, as que sofreram maior depreciação. Mas o fenómeno também se estendeu às de origem vegetal, que passaram de 389:000 toneladas em 1938 para 170:000 em 1943.
A questão tem sua importância, sobretudo no desemprêgo, porque a baixa no volume das exportações provocou-o, naturalmente, nas regiões em que as matérias primas se produziam.
Em valor, as exportações atingiram, em contos, o maior nivel conseguido até hoje. Mas isso não deve ser motivo de exagerado regozijo. Não houve intensificação ou melhoria no fabrico, ou até no trabalho interno, mas antes uma valorização fictícia que há-de cessar no fim da guerra. Se fôsse possível canalizar para o aperfeiçoamento da actividade industrial ou agrícola uma parte importante dos excessos de lucros que resultaram dessa valorização, os efeitos da guerra poderiam ser neutralizados no período que se lhe há-de seguir. Mas isso exigiria trabalho de conjunto, ordenado e persistente. E pode haver dúvidas, tendo em conta o passado, sôbre as tendências no emprêgo dos capitais disponíveis nessa útil aplicação.
Neste aumento de valor das exportações devem ter-se em conta os resultados da inflação da moeda — da relatividade de seus poderes de compra em 1938 e 1943. Não é fácil, evidentemente, estabelecer essa relação. Em todo o caso podem dar-se os valores das exportações referidas a ouro para aqueles anos.
O quadro seguinte para as importações e exportações, relacionadas ao ouro, é bastante elucidativo:
[Ver diário original]
Referidas ao ouro, numa única rubrica — matérias primas —, foram as importações de 1943 superiores às de 1930. As matérias primas custaram cêrca de 37:000 contos em 1930, contra 43:000 em 1943. No caso das exportações, as matérias primas (37:129 contos) acusam muito mais valor do que em 1930 (11:131 contos).
16. O que acaba de se dizer, relativamente a importações e exportações, mostra que, na verdade, foi necessário reforçar os impostos indirectos, e o meio mais simples, e até certo ponto mais justo, foi o do direito alfandegário sôbre mercadorias exportadas — sobretudo o volfrâmio e o estanho.
As receitas dos impostos indirectos mantiveram-se e até aumentaram.
Foram as seguintes:
[Ver diário original]
Apesar da grande, deminuïção na receita dos direitos aduaneiros das importações, ainda houve o aumento de mais de 170:000 contos nos impostos, em relação a 1938, que provieram na sua totalidade dos direitos aplicados às exportações.

Página 15

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(15)
Quási todos êles hão-de deminuir logo após o fim da guerra e até mesmo antes do seu fim.
Em 1944, por virtude da proïbição de exportar volfrâmio, hão-de decrescer consideràvelmente.
O imposto do sêlo e as receitas obtidas por meio de estampilhas fiscais aumentaram de cêrca de 7:000 contos cada um, e largamente compensaram a baixa nas taxas de salvação nacional, que deminuíram por virtude de menores importações.
O capítulo dos impostos indirectos é dos mais importantes das receitas públicas. Para um total de receitas ordinárias de 3.268:628 contos cobrados, êles contribuíram, em 1943, com 1.112:983, ou mais de um têrço. Qualquer variação a perturbá-los, indirectamente se reflecte, com certo relêvo, nas receitas.
Já no próximo ano de 1944 se há-de notar baixa nos direitos de exportação, e essa baixa há-de certamente acentuar-se bastante logo no fim da guerra, no caso de se voltar à política de proteger tanto quanto possível a exportação. É natural que os direitos relativos a grandes importações venham a compensar as falhas nestes impostos. Dar-se-á o inverso do que se deu há dois anos.
III
INDÚSTRIAS EM REGIME ESPECIAL
17. Continuam a aumentar em proporção sempre crescente as receitas, dêste capítulo, tendo atingido
186:000 contos em 1943, mais do que o dobro de 1930-1931. As cifras são as que seguem:
[Ver diário original]
Todas as indústrias sujeitas a regime especial de imposto pagaram ao Estado mais do que anteriormente, excepto a de minas e a de camionagem. A diferença na última foi pequena, mas nas minas atingiu mais de 4:800 contos.
Tanto em relação a 1939 como a 1930-1931 o aumento nas receitas foi muito grande.
A indústria de cerveja entregou ao Estado em 1943 perto de 4:300 contos, mais cêrca de 1:000 contos do que em 1930-1931. A dos seguros quintuplicou a sua comparticipação. O desenvolvimento desta receita deu--se sobretudo a partir de 1939.
A pesca atingiu em 1943 meia centena de milhares de contos, o que representa mais de três vezes o que rendeu em 1939. A exportação de conservas de sardinha, consumindo elevadas quantidades de peixe, constitue o motivo dêste considerável acréscimo. Também há razões de outra ordem que explicam êste aumento.
E natural que com o fim da guerra deminua bastante, embora o País tenha condições para alargar muito a sua indústria de pesca, não só para consumo interno, como para enviar para fora.
A exportação de conservas de sardinha nos últimos anos, em relação a 1938, é a seguinte:
[Ver diário original]
Exceptuando os dois anos de 1939 e 1941, a exportação de conservas de sardinha não atingiu 40:000 toneladas.
Em 1934 fora de 34:401 toneladas, mais do que em 1942, e em 1943 ficou aquém de 1937.
Em quantitativo, a indústria não se desenvolveu muito. O índice, na base de 1926 = 100, acusa para 1943 a percentagem de 112,9, o que é muito pouco para sardinha em azeite ou molhos. Os índices de 1938 e 1942 são inferiores aos de 1926. Mas em valor o aumento foi muito grande. Em 1943 atingiu 585,1 por cento na mesma base e em 1942 passou de 251,5 por cento.
A razão do desenvolvimento da receita de pesca derivou, por isso, mais da valorização do peixe do que de maior pesca. É êste um ponto a reter, porque, na verdade, diz respeito ao futuro de uma das indústrias que tem possibilidades de se expandir, dada a riqueza dos mares vizinhos e as tradições dos pescadores portugueses.
O tabaco concorreu para as receitas dêste capítulo com mais de cêrca de 32:000 contos do que em 1930-1931 e ainda aumentou, em relação a 1939, em aproximadamente 23:000 contos. As importações têm vindo a aumentar e os rendimentos da indústria também.
O acréscimo no imposto ferroviário é conseqüência do aumento no tráfego, visto ser uma percentagem dêste. As receitas das emprêsas desenvolveram-se muito nos últimos anos. Quando se tratar do Fundo especial de caminhos de ferro, será êste assunto tratado com maior minúcia.
As receitas do jôgo também aumentaram, não tanto como deveriam. O jôgo é um vício que necessita de ser

Página 16

344-(16)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.° 140
corrigido. Se é impossível dominá-lo, pode ao menos ser atenuado.
Houve maiores valias, embora mais reduzidas, nas receitas de alcool e aguardente (622 contos), nos seguros (1:432 contos) e nos impostos sôbre espectáculos públicos (1:344 contos).
Durante a guerra foram transferidas para emprêsas nacionais muitas apólices de seguros que, normalmente, eram colocadas em mercados externos. Desde o início do conflito o imposto sôbre prémios de seguros mais do que dobrou, pois rendera 4:866 contos em 1939, contra 10:904 em 1943. A indústria de seguros vai gradualmente nacionalizando um negócio que durante muito tempo enviava para o estrangeiro, sob a forma de prémios, apreciáveis quantias.
O imposto sôbre espectáculos reflecte a maior concorrência do público a divertimentos, notada nos últimos anos, sobretudo a animatógrafos.
O exame da estatística mostra um considerável aumento nessa concorrência, que, até certo ponto, não é fácil de explicar.
18. A deminuïção nas receitas das minas foi grande, por virtude de medidas tomadas em relação aos preços que haviam atingido certos minérios. A exportação em 1943 foi a seguinte:
Exportação de minérios (toneladas)
[Ver diário original]
Valores (contos)
[Ver diário original]
Em grande parte a receita das minas, nos últimos anos, resultou do volfrâmio e estanho e proveio do aumento de preços. A guerra mostrou que, além dêstes minérios, existem no País outros jazigos susceptíveis de serem econòmicamente explorados, como o ferro. O chumbo, o antimónio, o bário e outros podem ser objecto de interessantes indústrias químicas ou até metalúrgicas, como no caso do chumbo. Não são susceptíveis de criar, possìvelmente, grandes explorações, mas devem auxiliar, porventura em escala apreciável, a balança de pagamentos.
Os recursos mineiros estão a ser agora investigados por um serviço especial que, todos os anos, por fôrça das receitas extraordinárias, tem gasto verbas importantes. É natural que dêste esfôrço e dispêndio resultem algumas descobertas de interêsse comercial. Mas nunca a indústria mineira poderá contribuir com largas quantias para o erário público. A sua influência na vida nacional é de outra ordem, talvez mais profícua. Esta indústria emprega, em geral, grande número de pessoas e auxilia muito o desenvolvimento económico das zonas em que está situada. Constitue, por isso, um importante meio de desenvolver regiões de zonas atrasadas.

Página 17

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(17)
IV
TAXAS
19. Ainda aumentou o produto das taxas cobradas durante 1943, em relação ao ano anterior. As cifras,
discriminadas para os diversos serviços que as cobram, são as que seguem, em contos:
[Ver diário original]
O maior incremento deu-se nas taxas dos serviços administrativos (29:913 contos) e nas multas (3:777).
As principais taxas dos serviços administrativos renderam o seguinte:
Contos
Percentagens nas quantias cobradas nas alfândegas por conta de organismos corporativos... 3:118
Percentagens nas custas de execuções fiscais... 3:755
Receitas que pertenciam aos organismos encorporados no Montepio dos Servidores do Estado... 1:377
Remição de foros e venda de bens nacionais... 1:500
Venda de géneros apreendidos... 1:950
Emolumentos dos governos civis... 1:117
Imposto de licença de uso e porte de arma... 1:601
Percentagem sôbre as cobranças de corpos administrativos e pessoas colectivas de utilidade pública... 5:760
Percentagens sôbre juntas de turismo... 1:420
Taxas adicionais sôbre as de licenças cobradas pelas câmaras municipais... 7:331
Receita do Código da Estrada... 2:607
Diversas receitas não especificadas... 32:655
Nos serviços alfandegários — a verba mais importante diz respeito a emolumentos, que atingiram em 1943 cêrca de 25:310 contos. As taxas do tráfego renderam 3:768 contos.
Nos serviços de fomento — o que mais pesa são as taxas e as receitas dos departamentos, capitanias e delegações, com 3:844 contos; as dos serviços hidráulicos, com 6:016 contos; as do racionamento da gasolina, com 2:186 contos; o reconhecimento e a demarcação de minas, com 2:087 contos; a conta de particulares dos serviços industriais, com 2:577 contos; e, finalmente, as receitas da Inspecção Geral das Indústrias e Comércio Agrícolas, com 1:348 contos.
Nos serviços de instrução — as receitas dos estabelecimentos de ensino produziram 13:544 contos.
Nos serviços jurisdicionais e de menores — o que mais interessa são o imposto de justiça cível (14:561 contos) e o imposto de justiça crime e multas criminais (5:832 contos).
Nos serviços militares — as taxas renderam 11:462 contos, predominando o Fundo de instrução do exército (3:626 contos) e as receitas a satisfazer pelos estabelecimentos dependentes do Ministério da Guerra (4:825 contos). A taxa de licenciamento produziu 1:330 contos e a taxa militar 1:019.
As multas têm vindo a aumentar e atingiram em 1943 cêrca de 22:200 contos, que se comparam com 18:444 em 1942 e 6:032 em 1930-1931.
20. Mereciam um exame mais minucioso as receitas que constituem êste capítulo. Elas subiram de maneira considerável nos últimos quinze anos. Partindo de 90:144 contos em 1930-1931, alcançaram a cifra de 213:585 em 1943. Em poucos casos se deu tam grande aumento. É notável a ascensão das taxas dos serviços administrativos e já atrás se indicaram as principais rubricas em que ela se deu. As taxas de licenças e diversas outras percentagens estão todas em aumento.
No caso das multas que também fazem parte dêstes serviços, embora se mencionem em separado no quadro acima transcrito, o acréscimo foi muito grande. O total andava à roda de 6:000 contos em 1930, e foi depois gradualmente crescendo. Mas em 1939 atingia ainda 10:000 contos. Depois, durante a guerra, a subida foi rápida, 3 a 4 e 6:000 contos por ano. A razão deve provir da fiscalização dos preços. E é natural que o ano de 1944 acuse ainda maior valia no produto das multas.
Para ser eficaz a multa deve ser aplicada sem esquecer a interpretação sensata dos regulamentos e leis. Aplicá-la indiscriminadamente, às vezes por pequenas faltas, que podem ser resultantes de inconsciência ou até incompreensão, constitue êrro que deve ser evitado. Produz efeitos contraproducentes. Chama-se a atenção do Govêrno para os abusos que podem dar-se em casos de aplicação de multas.

Página 18

344-(18)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
V
DOMÍNIO PRIVADO E PARTICIPAÇÃO DE LUCROS
21. As receitas insertas neste capítulo elevaram-se em 1943 a 247:154 contos, mais 53:625 do que em 1942 e bastante mais do dôbro de 1930-1931. Os números foram os seguintes:
[Ver diário original]
Os principais aumentos deram-se nas entregas da Comissão Reguladora do Comércio de Metais (74:624 contos), nas das lotarias (39:946 contos) e nas do pôrto de Lisboa (47:139 contos). Quanto ao pôrto de Lisboa, ver-se-á na secção respectiva que o aumento na receita não tem grande significado no ponto de vista orçamental, não só porque as receitas são consumidas, mas até porque nelas se encontram as extraordinárias.
As entregas da Comissão Reguladora do Comércio de Metais provêm das suas transacções com preços legais de volfrâmio e estanho. É receita transitória, que já deminuíu bastante em 1944, até se extinguir completamente.
As outras verbas importantes dizem respeito aos órgãos do Estado que, com autonomia financeira, ou sem ela, estão mais ou menos industrializados.
A situação das explorações dêsses organismos pode exprimir-se em 1943 pelo quadro que segue:
[Ver diário original]
Estas cifras não exprimem os saldos de exploração dos respectivos organismos, visto não trabalharem em regime de autonomia.
A Casa da Moeda comprou em 1943 cêrca de 13:030 contos de matérias primas e produtos acabados para usos industriais e laboratórios e gastou 3:322 contos em móveis, devendo tudo ser abatido ao total da despesa. Quando fôr cunhada a moeda, há-de aparecer o lucro. As contas dêste departamento público devem ser, por conseqüência, examinadas em períodos de anos, para ter idea do funcionamento e da conta de ganhos e perdas.
Adiante se fará maior referência à conta da Imprensa Nacional que, vistas as cousas, sofre, na verdade, deficit menor do que o que é indicado no quadro acima transcrito.
Os correios, telégrafos e telefones entregaram o produto da sua renda, ou seja 2:723 contos, que foi muito menor do que em 1942.
Os serviços florestais e aqüícolas concorreram êste, ano com menos cêrca de 4:500 contos do que no ano passado. Disso resultou a diferença entre as receitas e despesas de 654 contos. Não se incluíram nem as receitas nem as despesas extraordinárias.
A Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, que todos os anos transfere para o Estado 80 por cento dos seus lucros, comparticipou êste ano nas receitas do capítulo com menos 6:564 contos do que no ano anterior. Os lucros desta instituïção tendem a deminuir e, por conseqüência, a participação do Estado há-de ser menor nos anos próximos.
Também deve desaparecer em breve a receita dos Caminhos de Ferro do Estado, por virtude das medidas recentemente tomadas relativas às linhas que lhes pertencem.
Só as lotarias têm tendência para aumentar ou, pelo menos, manter os quantitativos dêste ano, além da possível melhoria que porventura possa resultar da inten-

Página 19

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(19)
sificação do tráfego aéreo. O Aeroporto de Lisboa rendeu êste ano 1:959 contos e o contrato com a Pan American Airways 86 contos.
Não houve qualquer receita da Sacor.
Apesar do aumento das receitas dêste capítulo, pode dizer-se que não há lugar para optimismos. Viu-se no que acaba de se expor que as tendências marcadas nas rubricas mais importantes são no sentido da descida.
VI
RENDIMENTO DE CAPITAIS
22. Deve atribuir-se a deminuïção apreciável neste capítulo à transferência para os reembolsos e reposições dos juros das importâncias levantadas dos cofres do Estado pelos correios, telégrafos e telefones e que somaram nos últimos dois anos, respectivamente, 2:342 e 3:158 contos.
O decréscimo foi em parte compensado pelos rendimentos de títulos-acções e obrigações, que constituem a carteira de valores de entidades particulares pertencentes ao Estado.
Para 1943 as receitas foram as seguintes, em contos:
[Ver diário original]
VII
REEMBOLSOS E REPOSIÇÕES
23. O aumento sofrido pelos reembolsos e reposições resultou do início da amortização dos empréstimos concedidos à Administração Geral dos Correios para a execução do seu plano de renovamento. Entraram êste ano 57:655 contos, que estão incluídos na rubrica «Vários empréstimos» do quadro seguinte:
[Ver diário original]
Estão liquidando as garantias de juro ao Estado os Caminhos de Ferro da Beira Baixa, que pagaram 387 contos; o de Mormugão, 3:334; o de Vale do Vouga, 62; o de Foz-Tua a Mirandela, 23, e o de Santa Comba-Viseu, 16.
Os aumentos ou deminuïções mais importantes no capítulo dos reembolsos resultaram das seguintes verbas:
[Ver diário original]
As melhorias verificadas não têm grande significado.
Contudo, podem vir a influir nas contas. Êste ano o reembôlso dos empréstimos dos correios, telégrafos e telefones pesa já sensìvelmente nas receitas e não se repetirá nos anos próximos.
A verba das reparações não tem qualquer significado financeiro, por equivaler a despesa inscrita nas respectivas dependências — tanto no caso do Alfeite, como em diversos Ministérios, nomeadamente o da Economia (Sub-Secretariado da Agricultura). O reembôlso relativo ao Fundo especial de caminhos de ferro diz respeito à anuïdade liquidada no serviço do empréstimo destinado aos Caminhos de Ferro do Estado. De todas as verbas inscritas, neste capítulo, a que mais pesa refere-se a reposições não abatidas a pagamentos (35:630 contos).

Página 20

344-(20)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.° 140
VIII
CONSIGNAÇÕES DE RECEITAS
24. O aumento de mais de 45:000 contos neste capítulo resultou principalmente da grande melhoria nas receitas do Fundo especial de caminhos de ferro e dos portos. Os números são os que seguem:
[Ver diário original]
25. Nas receitas de assistência incluem-se diversas verbas. As de maior relêvo são as seguintes:
Contos
Assistência aos funcionários civis tuberculosos... 2:354
Assistência aos desempregados inválidos... 5:000
Serviços anti-sezonáticos... 1:479
Serviços jurisdicionais de menores... 4:626
Serviços prisionais... 2:334
Receitas diversas... 5:812
A cifra mais avultada, a da assistência aos desempregados inválidos, era antigamente distribuída pelo Fundo de Desemprêgo. Passou depois a ser inscrita na Direcção Geral de Assistência como despesa, e por lá é gasta.
As outras resultam de diversas disposições legais.
Nas despesas com funcionalismo a verba mais importante é a que deriva da venda de impressos nas tesourarias da Fazenda Pública e que, lògicamente, devia fazer parte das receitas da Imprensa Nacional. Subiu a 180 contos em 1943.
Os fundos especiais de fomento são variados. Os de maior importância dizem respeito a:
Contos
Fundo do cadastro... 2:618
Serviços agrícolas... 1:423
Estabelecimentos zootécnicos... 1:664
Patologia veterinária... 496
Diversas receitas dos serviços pecuários... 2:192
Quási todas estas receitas se mantiveram no nivel de 1942, com, relativamente, ligeiras melhorias nalgumas.
O Fundo especial de caminhos de ferro aumentou ainda êste ano de 40:218 contos para 66:669, o que representa o máximo até hoje atingido. Como êste Fundo resulta de percentagem aplicada às receitas brutas, o aumento provém de maior tráfego ferroviário. Na secção respectiva será a sua aplicação examinada com mais pormenor; agora apenas se mencionará a sua origem, que foi a seguinte:
Contos
Caminhos de Ferro Portugueses... 44:932
Beira Alta... 2:342
Estoril... 1:827
Diversas... 3:129
52:230
26. Os fundos de títulos da dívida pública incluem o que o Tesouro recebe de papéis de crédito (títulos do Estado) em seu poder.
Cobraram-se êste ano:
Contos
Dívida interna consolidada... 11:436
Dívida interna amortizável... 3
11:439
27. Os portos renderam bastante mais do que o ano passado, como pode ler-se no quadro que segue, em contos:
[Ver diário original]
Quási todos os portos tiveram maiores receitas, mas onde mais se acentuou o aumento foi nos de Setúbal, de Portimão e da Madeira.
Nos dois primeiros a causa deve ter sido devida, essencialmente, a maior movimento na indústria de conservas.
No entanto, e apesar de as receitas terem subido nos últimos anos, não é brilhante a situação dos portos.
Os grandes capitais neles despendidos nos últimos tempos ainda não começaram a ser amortizados nem tem sido possível cobrar os encargos de juros. E é natural que isso nunca possa acontecer, visto as receitas serem consumidas pelas despesas, como se verificará quando adiante se tratar, no Ministério respectivo, dos serviços dos portos.

Página 21

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(21)
DESPESAS ORDINÁRIAS
1. As despesas ordinárias e extraordinárias continuam a subir e atingiram, em 1943, o total de 3.984:597 contos, distribuídos do modo que segue:
[Ver diário original]
De 1941 para 1942 o aumento fôra de 77:086 contos nas despesas ordinárias e de 57:247 nas extraordinárias. Vê-se, pelos números acima transcritos, que de 1942 para 1943 o aumento foi consideràvelmente maior, tanto nas ordinárias como nas extraordinárias.
A causa dêsse aumento foi, em parte, o abono de família, mas esta subvenção consumiu pouco mais de 30:000 contos. Ainda resta o acréscimo de quantia superior a 200:000.
Não é êste o momento para avaliar com mais largueza a origem dêste fenómeno, de constante aumento das despesas ordinárias. Há, na verdade, razões a justificá-lo. Mas, dada a situação que o próximo fim de guerra parece vir a trazer às receitas, o estudo cuidadoso das despesas impõe-se. Já noutro lugar se exprimiu a opinião sôbre o funcionalismo e a possibilidade de reduzir os quadros para melhor organização e melhor eficiência no trabalho. Para isso deve fazer-se um estudo cuidadoso e pormenorizado, que tenha como objectivo simplificar tanto quanto possível os serviços.
Nos últimos três anos os excessos da despesa somaram 1.562:012 contos.
As receitas empregadas na liquidação das despesas de 1943 provieram do seguinte:
Contos
Receitas ordinárias... 3.268:629
Empréstimos... 777:113
Outros... 1:996
4.047:738
Nelas está compreendido o saldo de gerência de 63:143 contos.
Dos números se verifica que grande parte das receitas ordinárias serviu para pagar despesas extraordinárias, não sendo por isso necessário recorrer ao fundo de saldos de anos económicos findos, e só uma parte dos empréstimos emitidos se utilizou nesse fim.
Houve, por conseqüência, um avultado saldo entre as receitas e despesas ordinárias, como se vê dos números que seguem:
[Ver diário original]
Estes dois grandes saldos permitiram o pagamento das avultadas despesas feitas com o rearmamento do exército, além de outras que resultaram do estado de guerra. O recurso ao empréstimo para êste e outros fins limitou-se êste ano a menos de 400:000 contos, como se verá adiante.
Pode pôr-se a questão seguinte: será justo e razoável que despesas realizadas por motivos de fôrça maior sejam em grande parte liquidadas por fôrça de receitas ordinárias? Será de vantagem sobrecarregar a capacidade tributária do País nesta conjuntura, e não valeria mais recorrer em maior vulto ao empréstimo?
Parece que, tanto em 1942 como em 1943, o caminho seguido foi o melhor.
O tributo é um método eficaz de reduzir o meio circulante — e até certo ponto muitas das despesas de guerra não foram gastas em Portugal, porque serviram para liquidar armamentos e outras cousas importadas.
É de crer que as despesas deminuam logo que cessem as circunstâncias excepcionais que as produziram e se ajustem, por sua vez, às circunstâncias difíceis que o fim da guerra há-de trazer.
2. A diferença entre o que se orçamentou e pagou é dada pelas cifras do quadro que segue:
[Ver diário original]
Uma das colunas exprime o que foi pago, mas já haviam sido expedidas autorizações de pagamento para verbas que se não acham contabilizadas no quadro acima transcrito. Os números mostram que no total há uma diferença para menos de 196:921 contos entre o que se orçamentou e pagou. Tinham sido, porém, autorizados 2.269:152 contos e anulados 1:504. De modo que a diferença não foi exactamente aquela.
Quási todos os Ministérios pagaram menos do que é permitido pela lei orçamental, e continuam a ser os da Guerra e das Obras Públicas e Comunicações aqueles em que há maior diferença.

Página 22

344-(22)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
3. Os reforços durante o ano elevaram-se a 172:639 contos.
A evolução das despesas e sua relatividade com 1930-1931 podem ver-se no quadro que segue, em contos:
[Ver diário original]
Não é fácil a comparação entre os dois anos expressos senão nas verbas totais, por ter havido dentro de cada Ministério alterações grandes, que modificaram o significado das cifras. Neste longo período as despesas ordinárias aumentaram de cêrca de 600:000 contos, se fôr corrigida a importância de 412:284 contos em 1930-1931 relativa à dívida de guerra. O maior saldo na diferença deu-se de 1942 para 1943. No resto o aumento foi gradual.
Um exame sumário dos números mostra que grande parte do aumento, entre 1942 e 1943, foi devido ao refôrço das verbas relativas aos Ministérios da Guerra e da Marinha e aos encargos da dívida pública. Tanto num caso como no outro foi a guerra o motivo principal do aumento, que se elevou a 235:800 contos.
As cifras hão-de ser corrigidas adiante na parte relativa à dívida, visto ser um pouco menor a despesa efectiva do que a que se mostra.
Para melhor compreensão, reuniram-se os números em grandes agrupamentos, de modo a verificar-se a influência que cada um dêles tem no total. O quadro seguinte assim o exprime.
[Ver diário original]
4. Convém ainda determinar as variações em cada um dos departamentos, depois de corrigida a dívida pública para o seu valor efectivo. Nos números que seguem vêem-se fàcilmente as diferenças para mais e para menos nas despesas dos diversos Ministérios e outras dependências do Estado.
[Ver diário original]

Página 23

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(23)
ENCARGOS GERAIS DA NAÇÃO
5. Os encargos gerais da Nação incluem a dívida pública, representação nacional e as reformas e pensões
das classes inactivas. Somaram 565:847 contos em 1943, mais 48:579 do que em 1942. Foram assim distribuídos:
[Ver diário original]
DÍVIDA PÚBLICA
6. Continuam a subir apreciàvelmente os encargos da dívida pública, que atingiram êste ano 364:221 contos, mas reduzem-se para 352:782 depois de deduzidos os juros de títulos na posse da Fazenda Nacional.
O aumento dos encargos da dívida foi de mais de 34:000 contos e resultou das novas emissões realizadas durante o ano. O estado da dívida em 31 de Dezembro de 1943 era o seguinte, em milhares de contos:
[Ver diário original]
Parece, ter havido, assim, um acréscimo grande no valor nominal da dívida, que passou de 8:190,9 mil contos para 8:760,4 mil, mais 569,5 mil contos.
Em relação ao período anterior à guerra o capital nominal da dívida também aumentou apreciàvelmente.
Da s emissões efectuadas em 1943 ficou em carteira uma parte importante, para gradualmente ser lançada no mercado. O ano de 1943 foi de pletora de capitais, e houve necessidade de, por intermédio da venda de títulos do Estado, retirar da circulação o máximo possível.
O produto da venda de títulos aumentou bastante as disponibilidades de tesouraria, visto não ter sido usado no pagamento de despesas orçamentais.
Pode dizer-se que o numerário resultante das sucessivas emissões veio engrossar inteiramente essas disponibilidades.
Pouco se desviou para outros fins.
7. O verdadeiro estado da dívida, depois de deduzidos os saldos credores, pode ser dado no quadro seguinte, no qual se abatem os juros de títulos na posse da Fazenda e saldos credores:
[Ver diário original]
Os números indicam:
1) O grande aumento da dívida nominal representada por títulos;
2) As amortizações anuais efectuadas na Caixa Geral de Depósitos e no Banco de Portugal;
3) A grande elevação no quantitativo de títulos na posse da Fazenda Pública, à espera de serem lançados no mercado;
4) O acréscimo apreciável nos saldos credores, que, sendo apenas de cêrca de 594:000 contos em 1940, passaram para 2.414:500 em 31 de Dezembro de 1943.
A dívida efectiva subiu ligeiramente em relação ao ano anterior, visto ter passado de 6.062:797 contos para 6.345:936, ou mais 283:100 contos, que têm a sua contrapartida nas receitas.

Página 24

344-(24)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
O que mais sobressai dos dois grandes capítulos que dão o movimento do capital da dívida é o número de títulos em carteira.
Os quadros podem ser retinidos nos números seguintes:
Contos
Dívida nominal... 9.934:444
Dívida efectiva... 8.760:470
Títulos na posse da Fazenda Pública... 1.173:974
O volume das emissões foi muito grande e refere-se aos consolidados de 3 por cento e 2 3/4 por cento e às obrigações do Tesouro de 2 1/2 por cento.
Foram efectuadas conversões dos consolidados de 5 1/2 por cento e 4 1/2 por cento, nas condições conhecidas e que não vale a pena agora relatar.
Ao todo venderam-se em 1943 cêrca de 888:000 contos de títulos.
Mais de metade (499:000 contos) pertenciam ao consolidado de 3 por cento de 1942; o restante já se referia ao consolidado de 2 3/4 por cento de 1943 (341:800 contos) e às obrigações do Tesouro de 2 1/2 por cento de 1942 (47:400 contos).
Dos 888:000 contos vendidos em 1943 uma parte (325:000) foi aplicada a reembolsos do 4 1/2 por cento de 1912) do 4 1/2 por cento e do 5 1/2 por cento de 1933. Para obras de fomento destinaram-se 95:000 contos, e 342:000 contos gastaram-se no rearmamento do exército.
O saldo (126:000 contos) foi creditado nas disponibilidades da tesouraria.
Há-de verificar-se adiante que as despesas extraordinárias, neste ano de 1943, foram muito grandes, em conseqüência da intensificação do rearmamento do exército. Para êsse fim apenas se desviou de empréstimos a quantia atrás mencionada. Foi possível atender a essa despesa com o excesso das receitas ordinárias.
Havia por vender, em fins de 1943, 1.144:883 contos, assim distribuídos:
Contos
Consolidado de 3 por cento... 251:619
Consolidado de 2 3/4 por cento... 643:264
Obrigações do Tesouro de 2 1/2 por cento... 250:000
1.144:883
O aumento apreciável no capital nominal da dívida pública, que não corresponde ao seu aumento efectivo em virtude das elevadas somas na conta de saldos credores, tem na verdade importância. Há-de ser possível, logo que as circunstâncias se normalizem, converter alguns dos empréstimos emitidos e fazer recuar o capital para cifra que melhor corresponda à realidade.
Constituïção da dívida
8. Os números acima indicados dão idea dos totais nas modificações sofridas pela dívida pública no ano de 1943. Em síntese mostram os aumentos nas diversas rubricas.
A dívida pública nacional tem suportado grandes modificações nos últimos quinze anos que alteraram sensìvelmente o seu aspecto. Desapareceu em primeiro lugar a dívida flutuante, que fôra durante muitos anos um dos motivos de ansiedade de quási todos os Govêrnos, e que ia gradualmente a aumentar na medida das necessidades do erário público. Houve depois uma série de conversões, reembolsos e pagamentos de diversas natureza, todos com o objectivo de a simplificar a poucos tipos de empréstimos e a reduzir tanto quanto possível os seus encargos.
Todas as operações tiveram como resultado a redução do capital nominal, embora com entradas de dinheiro fresco, utilizado em diversas aplicações. Os encargos não foram sensìvelmente aumentados. Convém por isso dar em maior minúcia as cifras que exprimem a constituïção da dívida em 31 de Dezembro de 1943.
9. O quadro seguinte mostra, em contos, como se distribuem, pelos diversos títulos, as importâncias de que o Estado é devedor. Mostra a dívida efectiva, depois de deduzidos os saldos credores.
[Ver diário original]

Página 25

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-{25).
Quando se comparam com anos anteriores as características dos títulos, verifica-se, de ano para ano, o desaparecimento dos de taxas mais altas. Em relação ao ano de 1941, já deixaram de circular em 1943 os consolidados de 3 3/4 por cento de 1936, o 5 1/2 por cento e o 4 1/2 por cento de 1933.
Dentro em pouco as taxas da dívida nacional pouco ultrapassarão os 3 por cento, a não ser nos Centenários de 4 por cento, 1940.
A dívida é quási toda nacional, e talvez que a maior parte dos títulos da dívida externa, ainda em circulação, esteja nacionalizada.
O quadro que segue exprime o estado da dívida a êste respeito.
Contos
Interna:
Consolidada... 5.937:945
Amortizável... 755:389
Banco de Portugal... 1.025:415
Outras... 178:922
Externa:
Amortizável... 862:799
Total... 8.760:470
Até 31 de Dezembro de 1943 haviam sido convertidas 985:992 obrigações da dívida externa, que representavam o capital de 1.968:940.250$, ou £ 19.689:402-10-00. O capital do 4 por cento (Centenários), que resultou da conversão, elevou-se a 1.478:988.000$, representado por 739:494 obrigações.
Os encargos anuais do capital convertido eram de £ 590:326-19-05, ou 59:033 contos. Os encargos do capital que resultou da conversão elevam-se a 59:159 contos.
A operação teve como conseqüência o decréscimo, em circulação, de 246:498 obrigações, que equivaliam a 489:952 contos de capital. O encargo ficou sensìvelmente o mesmo. Na despesa efectiva houve o ligeiro aumento de 422 contos.
Ainda não está terminada a conversão; entre 1942 e 1943 houve o decréscimo na dívida total externa de 12:310 contos. Passou de 867:132 contos para 854:822.
A conversão da dívida externa, no momento oportuno, representa um êxito financeiro de primeira grandeza, apesar de ainda restarem em circulação oito centenas e meia de milhares de contos. O Govêrno foi assim auxiliado pelas circunstâncias, internacionais e pelo prestígio que gradualmente vem adquirindo a moeda nacional nos mercados externos. O que resta já não é de molde a causar embaraços, até na circunstância, que não deve mais repetir-se, de dificuldades do Tesouro semelhantes às que prevaleciam no início da reforma financeira, em 1928.
Encargos da dívida
10. Já se escreveu acima que da emissão de novos empréstimos tem resultado, nos últimos anos, o agravamento do custo da dívida. Deve contudo notar-se que uma parte dos empréstimos emitidos ùltimamente se encontram na posse do Estado. Constituem por isso pêso morto. Representam o sacrifício de uma dezena de milhares de contos.
Êsse agravamento seria bastante maior se parte dessas emissões não tivesse sido destinada ao reembôlso de empréstimos a taxas mais elevadas.
Nas últimas gerências o custo da dívida é representado pelos números que seguem:
[Ver diário original]
Houve, como mostram as cifras, um apreciável aumento, tanto em relação a 1930-1931 como ao último ano. Os números que seguem, em contos, indicam onde se deu a maior valia.
[Ver diário original]
O aumento foi grande: 47:265 contos em relação a 1942 e 61:005 relativamente a 1936.
O quadro mostra que a maior valia provém dos juros pagos na dívida fundada e diversos empréstimos, no Fundo de amortização, na renda perpétua, na remição diferida e nas despesas de emissões, quando se compara 1943 com 1936.
Em relação a 1942 o aumento de 47:265 contos teve origem nos juros da dívida fundada. Só êles absorveram 43:415 contos. Os restantes 4:000 contos resultaram de amortização na mesma dívida, que passou de 24:833 contos em 1942 para 28:410 em 31 de Dezembro de 1943.
Êste gradual acréscimo no custo efectivo da dívida necessita de ser vigiado. Êle representa menos de 10 por cento da média das receitas ordinárias.
O não haver dívida flutuante dá à dívida nacional aspecto de solidez digno de registo, mas há necessidade de reduzir ainda os seus encargos.
Como se disse, grande parte do aumento do custo da dívida é proveniente dos capitais que o Estado tem retirado do mercado por meio de emissões, e que se acham

Página 26

344-(26)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
depositados no Banco de Portugal, ou em contas de tesouraria. Não vencem por isso juros.
Nos números que constam do quadro, que atrás se transcreve, relativo aos encargos da dívida, não se levaram em conta os juros de títulos na posse da Fazenda Pública, que foram êste ano elevados. Se isso se fizesse, os encargos efectivos subiriam a 352:782 contos, que se comparam com 315:308 e 277:620, respectivamente, em 1942 e 1936. Houve, por conseguinte, agravamento nesses encargos.
E o aumento real reduz-se por isso a cêrca de 37:474 contos em relação ao ano anterior e a 75:162 contos relativamente a 1936.
As contas mostram que os juros dos capitais na posse do Estado, sem aplicação — cêrca de 2,5 milhões de contos —, custam perto de 75:000 contos por ano.
Tal é, por emquanto, o preço das tentativas feitas para debelar a inflação que prevaleceu no ano agora em revista, embora êste processo não tivesse sido suficientemente eficaz.
Foi sugerido, em pareceres anteriores, o recurso ao empréstimo a curto prazo para atenuar alguns dos efeitos da inflação. Era seu fundamento o menor preço do dinheiro. Talvez pudesse ter sido feita a economia de mais de uma dezena de milhares de contos por ano, por virtude de menor taxa de juro.
Por motivos certamente ponderosos, um dos quais resultaria da necessidade de modificações constitucionais, não foi aceite a sugestão.
O caminho que as cousas levam indica que as condições que prevaleciam em 1942 e 1943 começam a perder muito da sua fôrça, e dentro de pouco tempo hão-de ser totalmente anuladas.
É até possível, com as necessidades de fundos que se hão-de seguir à guerra, que o mercado de capitais se torne mais firme e que se desenvolva a sua procura e se dê o descongestionamento dos depósitos bancários, que continuaram a aumentar até fins de 1943.
CLASSES INACTIVAS
11. O Estado reforçou em 1943 o subsídio à Caixa Geral de Aposentações com 1:337 contos, que se acham distribuídos pelas diversas rubricas.
O encargo do Tesouro Público com as classes inactivas e as na reserva foram, nos últimos anos, os seguintes:
[Ver diário original]
A diferença para mais não é grande e não afectou, pode dizer-se, os reformados. Teve lugar quási exclusivamente nas entregas dos correios, telégrafos e telefones.
A despesa com o pessoal na reserva dos Ministérios da Guerra e da Marinha foi de 49:461 contos, mais 422 contos do que em 1942.
A importância de 179:394 contos gasta pelo Estado em pensões com o funcionalismo civil e militar, exceptuando o dos correios, discrimina-se do modo que segue:
Contos
Subsídio à Caixa Geral de Aposentações... 159:146
Subsídio ao Montepio dos Servidores do Estado... 3:000
Subsídio ao Instituto Ultramarino... 1:150
Outras pensões... 14:593
Empregados reformados do Ministério das Finanças... 1:128
Diversos... 377
Total... 179:394
O subsídio à Caixa Geral de Aposentações, no total de 159:146 contos, teve diversos fins. Foram êles os seguintes:
Contos
Funcionalismo civil... 74:105
Guarda fiscal... 7:700
Exército (Ministério da Guerra)... 52:079
Guarda nacional republicana... 10:700
Marinha.............. 14:562
Total...... 159:146
Do exame das cifras que acabam de ser transcritas e da sua comparação com as de anos anteriores verifica-se não haver grandes diferenças. O Estado entrega anualmente o suplemento do que se considera necessário para liquidar as reformas do ano. O subsídio entregue, junto aos rendimentos dos fundos da Caixa Geral de Aposentações, representam a verba total gasta com as classes inactivas a cargo desta instituïção.
Lògicamente, deveria adicionar-se ao total o que o Estado paga aos funcionários que esperam reforma fora do serviço e que representa verba muito apreciável que não pode ser computada com facilidade.
Não há vantagem em manter êste estado de cousas, porque, em certos casos, como, por exemplo, no professorado primário, o preenchimento das vagas deixadas pelos funcionários que esperam reforma é uma necessidade inadiável — e talvez valesse mais a pena reforçar o subsídio da Caixa, a fim de evitar as faltas no serviço.
Noutros casos, devido naturalmente a excessos no quadro, o não preencher as vagas representa economia para o Estado.
Além das receitas provenientes dos subsídios mencionados, há as receitas próprias da Caixa Geral de Aposentações, resultantes de cotas dos subscritores e de rendimentos dos seus fundos de reserva. Somou tudo 35:386 contos em 1943.
12. O total gasto pela Caixa Geral de Aposentações foi o seguinte:
[Ver diário original]

Página 27

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(27)
[Ver diário original]
Estes números são sensìvelmente idênticos aos do ano passado.
O número de funcionários aposentados, em 31 de Dezembro de 1943, era o que segue:
[Ver diário original]
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO
13. O aumento da despesa na Presidência do Conselho, que se nota em quási todos os anos, resulta do desenvolvimento dos serviços do Sub-Secretariado das Corporações e Previdência Social, que subiu de 3:894 contos em 1939 para 5:949 em 1943. As verbas são as seguintes para as várias dependências:
[Ver diário original]
Conselho Nacional do Ar
14. A aviação civil está sujeita à orientação do Conselho Nacional do Ar, que é um organismo que entre nós estabelece as regras do vôo e dá parecer sôbre os assuntos relacionados com transportes aéreos.
Por diversas vezes nestes pareceres se patenteou a necessidade de reformar os serviços de modo a estabelecer uma entidade oficial, executiva, que superintendesse em todos os assuntos que respeitassem a transportes aéreos.
Além da importância que hão-de certamente revestir os transportes aéreos dentro do País e das suas naturais e directas repercussões sôbre outros sistemas de transportes, a nossa posição geográfica na Europa e a das ilhas do Atlântico, além das que ocupam os domínios coloniais, tornam os transportes aéreos na actualidade um problema de primeira grandeza.
Já em 1944 se atendeu à organização dos serviços. Parece que o novo organismo criado satisfaz as necessidades do momento e espera-se que da sua actuação resultem benefícios para a política aérea, que convém desenvolver de modo a valorizar as vantagens das posições estratégicas de Portugal e do ultramar.
15. A despesa do Secretariado da Propaganda Nacional foi mais ou menos a do ano anterior, pois gastou menos 92 contos do que nesse período. O total fixou-se há já alguns anos à roda de 7:000 contos, contra 5:516 em 1939.
As diferenças para mais, em relação ao primeiro ano de guerra, tiveram lugar em duas verbas — a das despesas que não são pormenorizadas nas contas, que passaram de 2:800 contos para 4:250 e que têm vindo em contínuo aumento, e a do turismo, que transitou do Ministério do Interior para êste departamento público.
Estas diferenças consumiram outras despesas menores, como as de filmes, que deminuíram 1:060 contos.
O Secretariado da Propaganda Nacional sofreu já em 1944 uma remodelação grande, sendo nêle integradas actividades, como a Inspecção Geral dos Espectáculos, que dependiam de outros Ministérios e que ao mesmo tempo foram alargar a sua esfera de acção.
O fim da guerra há-de possìvelmente levantar um certo número de problemas relativos ao turismo. Já nos últimos anos da década passada esta indústria exercia influência sôbre a balança de pagamentos, porque as quantias que dela resultavam eram apreciáveis.
A paz e ordem internas têm feito conhecer o País no mundo. Há hoje muito maior interêsse por Portugal do que há dez anos.
Se forem aproveitadas todas as circunstâncias no sentido de canalizar uma parte do movimento turístico do norte e sul da América — o que não é difícil — os benefícios para a economia interna serão muito grandes.
A questão do alojamento hoteleiro é muito importante. E neste aspecto devem ser considerados dois pontos. O primeiro é, sem dúvida, o da construção de novos hotéis, com os indispensáveis requisitos modernos de confôrto e higiene; e o segundo, tam importante como aquele, e a manutenção do próprio hotel — as obras de reparação e limpeza e os naturais cuidados que dêem

Página 28

344-(28)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
ao hóspede, pelo menos, a sensação de que é tratado não apenas como motivo de lucro.
Olhar pelos quartos e salas de modo a que desapareçam as manchas nas paredes e nos tapêtes, as deficiências nas instalações sanitárias e os desgastes do uso, e pequemos nadas que denotam asseio e cuidados, deve ser uni dos principais objectivos de qualquer fiscalização inteligente.
Ora acontece bastas vezes, entre nós, que o hotel depois de construído — até quando em óptimas condições — deixa de sofrer os cuidados que os mínimos requisitos de turismo impõem — e não é raro verificar que anos depois da construção começam a aparecer aqui e além provas de desleixo e incúria, que convém evitar. Se os donos ou a gerência, depois de avisados, não tomassem as providências requeridas, haveria necessidade de impor as obras ou reparações essenciais — ou então o Estado tem a obrigação de tomar medidas para que ao estabelecimento hoteleiro seja retirada a categoria de hotel, ou deminuído de classe se isso fôr de aconselhar.
Êste assunto tem maior importância do que se julga. Um hotel muitas vezes vale, não pelo luxo ou até pelo confôrto, mas pelos cuidados e pela atmosfera de que são rodeados os hóspedes.
Aqueles que tiverem de alojar estrangeiros necessitam ainda de maiores cuidados, porque a despesa feita pesa na balança de pagamentos.
E o fim da guerra há-de exigir o concurso de todos os possíveis elementos para a manter credora.
O Secretariado da Propaganda pode prestar êsse serviço, económico, real, se conseguir fiscalizar os hotéis, não apenas pelo lado artístico da aparência exterior, mas pela atmosfera de bem-estar que devem oferecer aos visitantes.
Um dos segredos do turismo reside nisso.
Êste imponderável de natureza psicológica pesa tanto ou mais do que o luxo das instalações, sobretudo quando estas não merecem os cuidados e constante vigilância que exigem estes estabelecimentos.
Sub-Secretariado das Corporações e Previdência Social
16. Aumentaram ainda em 1943 as despesas dêste departamento público. Atingiram 5:949 contos, contra 4:562 em 1942, ou mais 1:387 contos. Os números mais salientes são os seguintes:
[Ver diário original]
O aumento teve lugar de mais destaque nos serviços próprios do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência e nos tribunais do trabalho. Resultou naturalmente do acréscimo no serviço. A criação de caixas de previdência, novos sindicatos e outros organismos torna êste Sub-Secretariado cada vez mais importante na vida económica e social do País e assume por isso responsabilidades de ordem nacional que convém nunca perder de vista.
Dependeram da sua orientação ou fiscalização, em fins de 1942, numerosos organismos. Cada um dêles tem suas receitas próprias destinadas a fundos de previdência e outros. Essas receitas são obtidas ou por deduções nos salários dos associados ou directamente pagas pelas entidades patronais. E como são diversos os fins a que se destinam, também são diferentes as percentagens que recaem sobra as quantias sujeitas a deduções.
O método seguido para cobrança das receitas, dada a variedade de organismos e os diversos objectivos a que são destinadas, é bastante complicado, a ponto de ser necessário preencher mensalmente mais de uma dezena de documentos com numerosas cifras extraídas de livros de escrita, sempre sujeitas a erros e que, por isso, exigem trabalho cuidadoso.
Há firmas de relativamente pequeno movimento e que empregam pessoal pouco numeroso que preenchem dezóito documentos por mês.
A variedade de descontos a fazer sôbre as fôlhas torna ainda mais complicado o sistema de cobrança. Um exemplo mostra com mais clareza as dificuldades que hoje se levantam na contabilidade de firmas comerciais e industriais.
A fôlha de férias sofre a dedução de 1,5 por cento para o Fundo de Desemprêgo, 5 por cento para a caixa sindical, 0,5 por cento para doença, 1 por cento para abono de família e a cota do sindicato. São cinco operações a efectuar sôbre a féria, que, se fôr de 156$, correspondente a 26$ diários, sofre a dedução de 2$35, mais 7$80, mais $78, mais 1$55 e, finalmente, mais $50 e se fixa em 143$. O trabalho perdido em todas estas operações e o depósito na Caixa a diversas horas obriga a despesas que é mester evitar.
Não será possível a dedução de uma verba única, que seria depois distribuída por diversas aplicações?
Por outro lado, o sistema de pagamento por guias na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência obriga a perdas de tempo nesta instituïção, a qual, em virtude da afluência de depositantes, só difìcilmente pode atender a todos. Se se mantiver o actual sistema, êste estabelecimento de crédito do Estado terá de criar um novo serviço de tesouraria e de contabilidade ùnicamente destinado a receber as cotizações ou outros pagamentos dos organismos dependentes do Sub-Secretariado das Corporações e Previdência Social.
E êsse serviço terá de ser independente dos que lhe estão afectos se desejar manter a posição que hoje ocupa, dadas as inevitáveis demoras resultantes da afluência de pagamentos.
O problema já está a ser discutido há um ano e parece não ter solução — e tudo indica que ela se encontre com urgência, até pela necessidade de evitar desprestígio para o Sub-Secretariado e para a Caixa.
Mas sob outro aspecto se deve encarar também a questão. O sistema vigente obriga as firmas comerciais e industriais a despesas escusadas, a contratempos que podem ser evitados e a desgostos e dissabores. O público ressente-se de tudo e já têm sido levantados protestos na imprensa contra a actuação de entidades oficiais.
Não há razões para que êles não sejam atendidos. Bem servir o público deve ser norma dos órgãos do Estado. Neste caso isso pode alcançar-se por caminho diferente do que agora é seguido.
O Sub-Secretariado das Corporações e Previdência Social tem prestado importantes serviços às classes ope-

Página 29

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(29)
rárias e há-de continuar certamente a prestá-los. Com o tempo tudo indica que a sua acção se acentue ainda mais e que certos serviços do Estado, como por exemplo a assistência pública, que não deve confundir-se com assistência social, venham a fazer parte da sua organização. Na verdade, já hoje muitos sindicatos e outros organismos desempenham funções de assistência. A sua orientação neste aspecto compete ao Sub-Secretariado da Assistência. Mas parece que nunca poderá haver coordenação rendosa e frutífera emquanto não houver uma única superintendência em todas as suas modalidades.
A dispersão de serviços e de funções foi sempre característica da vida pública nacional e já nestes pareceres, relativamente a outros serviços, isso tem sido apontado.
No capítulo da assistência pública e social há um vasto campo para entendimento, e dêsse entendimento só podem resultar altos benefícios para um dos capítulos da vida da Nação que necessita de cuidados especiais e que, por sua delicadeza, muito pode afectar o País no seu prestígio político, na sua vida económica e até na miséria e dor das classes menos afortunadas e que mais necessitam de protecção.
MINISTÉRIO DAS FINANÇAS
17. A despesa total dos serviços próprios do Ministério em 1943 somou 179:191 contos, mais 6:574 contos do que no ano anterior. Os números para as diversas dependências são os seguintes:
[Ver diário original]
O aumento deu-se sobretudo na Direcção Geral das Contribuições e Impostos e em menor grau em outros
serviços. Hão-de ver-se adiante as causas das variações na despesa de cada dependência.

Página 30

344-(30)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Direcção Geral da Fazenda Pública
18. Os gastos da Fazenda Pública nos dois últimos anos foram, respectivamente, para 1942 e 1943, de 33:236 e 26:636 contos, ou uma diferença para menos de 6:600 contos.
Êste decréscimo é explicado em grande parte por diversas verbas, que todos os anos são inscritas nesta Direcção Geral.
As cifras mais importantes de «Outros encargos» são as seguintes:
[Ver diário original]
As restantes despesas desta Direcção Geral foram sensìvelmente idênticas às de anos anteriores. A deminuïção de cêrca de 6:600 contos em 1943, relativamente a 1942, foi quási toda devida à rubrica «Outros encargos».
A administração dos próprios da Fazenda compreende a conservação dos palácios nacionais, incluindo os da Ajuda, Queluz, e o Palácio e Biblioteca Nacional de Mafra, as propriedades dos sanatórios da Madeira e do concelho da Ponta do Sol e outros bens pertencentes ao Estado.
Pelo orçamento de 1943 foram gastas verbas em pequenas reparações, pinturas nos palácios e amanho de propriedades anexas. Na rubrica «Serviços privativos» inclue-se o Arquivo Histórico do Ministério das Finanças, para o qual se orçamentaram 131 contos em 1942, e o serviço telefónico do Ministério, que custa 78 contos por ano, números redondos. Finalmente, as tesourarias dos concelhos compreendem a remuneração a 311 tesoureiros, sendo 11 em Lisboa, 30 nos concelhos de 1.ª classe, 71 nos concelhos de 2.ª classe e os restantes em concelhos de 3.ª classe.
Direcção Geral das Contribuïções e Impostos
19. Os serviços desta Direcção Geral gozam de grande importância, que resulta não apenas da própria função, mas também das relações que o seu funcionalismo tem com os contribuintes.
Nas zonas rurais a delicadeza das suas funções é manifesta e há necessidade de interpretar as leis de modo a que o contribuinte não sofra escusadas perdas de tempo ou inconvenientes de outra ordem.
Muitas vezes a sede do concelho dista mais de uma dezena de quilómetros das freguesias. A ida à repartição pode representar prejuízo no salário superior ao que é devido ao Estado. Há casos em que seria possível, sem gravame para o fisco, facilitar o pagamento de contribuïções ou impostos ou de efectuar declarações sem necessidade de deslocação, que, além de longas caminhadas, tem como conseqüência a perda de um ou dois dias de trabalho. Neste, como noutros aspectos, há possibilidade de aperfeiçoamento nos serviços. Será talvez necessário revogar ou adoçar certas disposições legais, mas parece que a comodidade do público que disso pode advir é de natureza a promover a revisão de certos preceitos legais, de modo a evitar contrariedades, transtornos e queixas contra os serviços, que, afinal de contas e em muitos casos, apenas cumprem os regulamentos.
A despesa total das contribuïções e impostos atingiu êste ano 51:095 contos, quási o dôbro de 1930-1931 e mais 8:093 contos do que em 1942.
Os gastos totais podem discriminar-se do modo que segue:
[Ver diário original]
O aumento, de cêrca de 8:000 contos, deu-se nos serviços centrais e refere-se a rubricas que nada têm que ver com os próprios serviços. As restituições elevaram-se êste ano a 3:449 contos, contra 4:268 em 1942, e o pagamento de títulos de anulação, nos termos do decreto n.º 17:968, passou de 7:000 para 15:500 contos. Nenhuma destas verbas influe nos gastos normais da Direcção Geral.
As despesas com avaliações foram de 1:768 contos, menos cêrca de 1:000 contos do que em 1942. Para os últimos anos os números são:
Contos
1938... 3:215
1940... 1:972
1941... 2:029
1942... 2:701
1943... 1:768
As avaliações de prédios rústicos somaram 1:366 contos e as de prédios urbanos 401.
Os trabalhos para o cadastro da propriedade neste ano estão em vias de prosseguir com maior intensidade. O lançamento de contribuïções no concelho de Mafra vai ser feito na base do cadastro geométrico e dentro em breve o mesmo acontecerá com outros concelhos, como os de Beja, Vidigueira e Cuba.
Há actualmente discrepância entre valores de propriedades de rendimento idêntico. Umas vezes isso é devido a variação de critérios nas avaliações, noutras, e estas são a grande maioria, o facto resulta de terem sido actualizados os valores de umas, emquanto que se mantiveram no mesmo nivel os de outras.
As anomalias e injustiças, que não é raro encontrar, devem ser reduzidas ao mínimo, tanto quanto o possam ser. É evidente que nunca poderá ser perfeita a base do lançamento e que só o cadastro pode obviar a muitos erros das matrizes, mas é ainda possível, emquanto não se completar o trabalho cadastral, evitar os mais patentes.

Página 31

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(31)
Direcção Geral das Alfândegas
20. Os serviços alfandegários são responsáveis pela cobrança de grandes receitas que pesam no capítulo dos impostos indirectos. Gastaram em 1943 cêrca de 23:700 contos, menos 800 que em 1942. A deminuïção é mais aparente do que real, porquanto a quantia depositada na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência em conta da Federação Nacional dos Produtores de Trigo foi apenas de 108 contos, emquanto que no ano anterior atingira 3:204. O que êste ano se depositou veio saldar a conta do prejuízo na exportação do trigo.
Assim, os gastos próprios da Direcção Geral aumentaram. Na verdade, os serviços tiveram de ser melhor dotados, devido a insuficiências nos quadros, até certo ponto obviadas pela última reforma, e ainda como resultado do considerável acréscimo de trabalho e complicações resultantes da interferência dos organismos corporativos na importação e exportação.
As relações entre estes organismos e as alfândegas necessitam de ser cuidadosamente revistas e simplificadas. A aglomeração de papéis, que hoje provém de despachos com guias e declarações em duplicado e triplicado, causa embaraços e transtornos de diversa ordem, sem grandes vantagens.
Talvez que a nomeação de um grupo de representantes das alfândegas e dêsses serviços pudesse estabelecer regras que simplificassem o expediente no sentido de deminuir a complicação que hoje embaraça muitas operações.
Dos outros serviços dependentes dêste Ministério, a guarda fiscal gastou mais de 2:131 contos e a Casa dá Moeda menos 3:244 contos do que no ano anterior. Um e outro não têm grande significação nas contas.
21. Na Casa da Moeda a diferença para menos, em contos, resulta do quadro que segue:
[Ver diário original]
A diferença para menos resulta de menores aquisições de matérias primas. Esta diferença ainda pôde cobrir maiores gastos no pessoal e em móveis.
As despesas extraordinárias do Ministério das Finanças foram as seguintes em 1943:
[Ver diário original]
Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência
22. Os depósitos neste estabelecimento de crédito do Estado continuaram a aumentar, tendo atingido a maior cifra registada até hoje.
Paralelamente, o mesmo aconteceu com os estabelecimentos bancários particulares.
O agregado dos depósitos, com exclusão dos do Estado no Banco de Portugal e os obrigatórios na Caixa Geral de Depósitos, elevava-se a 10:940 milhares de contos.
Na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência o total dos depósitos, incluindo os obrigatórios, atingia em 31 de Dezembro de 1943 a importância de 5.325:968 contos.
Os acréscimos deram-se, sobretudo, na conta dos depósitos voluntários à vista e nos obrigatórios.
Esta avalanche de disponibilidades nos bancos e estabelecimentos bancários resultou essencialmente do considerável desenvolvimento de algumas exportações. Deve deminuir de maneira apreciável quando cessarem as causas que a originaram. Há-de haver redução das disponibilidades monetárias logo que seja possível reconstituir as reservas de matérias primas em fábricas e satisfazer a outras necessidades da actividade nacional, que durante os últimos anos tem vivido em grande parte dos recursos internos.
O grande aumento de depósitos na Caixa, como adiante se verá, teve como imediata conseqüência a deminuïção nos lucros.
A abundância de dinheiro na praça e no Tesouro enfraqueceu bastante o recurso ao crédito, apesar de taxas mais reduzidas e que atingiram nivel nunca visto no meio financeiro português.
23. Convém fixar ainda êste ano a gradual ascensão das disponibilidades monetárias sob a forma de depósitos. Para isso, como em períodos anteriores, foi calculado o quadro adiante transcrito.
As cifras são tam aproximadas quanto possível. Apenas se não consideram as repetições quando se trata de depósitos de estabelecimentos bancários noutros bancos, mas o êrro deve ser deminuto, dada a grandeza das cifras.
Milhares de contos
Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência (excluindo bancos e depósitos obrigatórios)... 3:267
Banco de Portugal (excluindo depósitos do Tesouro, Junta do Crédito Público e bancos)... 274
Entidades que exercem o comércio bancário (com exclusão do Banco de Portugal)... 6:902
Caixas económicas... 497
Total... 10:940
Entre 1942 e 1943 houve, como se verifica dos números, o aumento nas disponibilidades, por depósitos, de 1.661:000 contos, excluindo as reservas do Estado e dos depósitos obrigatórios e outros da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência.
Êste aumento representa uma cifra que se pode considerar exacta para todos os efeitos práticos, visto apenas ser deminuída de pequenos depósitos bancários.
O quadro seguinte, em milhares de contos, mostra, melhor do que palavras, a gradual ascensão das dispo-

Página 32

344-(32)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
nibilidades à ordem de particulares nos bancos e estabelecimentos bancários desde 1940. Nêle se indica
onde e quando se acentuou o aumento que atingiu o seu valor máximo de 1941 para 1942.
[Ver diário original]
As disponibilidades de particulares aumentaram desde 31 de Dezembro de 1940 até 31 de Dezembro de 1943 de cêrca de 5.500:000 contos.
É à luz dos ensinamentos dados por esta cifra que tem de ser vista a situação económico-financeira neste período. Do mesmo modo, quem quiser ponderar as condições do futuro, no ponto de vista das possibilidades de desenvolvimento económico, terá de ter em conta os recursos disponíveis em moeda nacional por depósitos à vista.
A primeira conclusão que se tira é a de não serem tam elevadas as disponibilidades, como, em geral, supõe muita gente. Ela deriva do próprio exame das cifras.
O maior aumento deu-se nos depósitos de bancos comerciais — um pouco mais do que três vezes os das caixas económicas. Isto resulta indubitàvelmente da considerável redução nas reservas de matérias primas e produtos nos estabelecimentos comerciais e industriais. É hoje bem conhecido o facto de que a maior parte, ou a quási totalidade, do comércio e da indústria vive, em matéria de abastecimento de matérias primas e produtos, do dia a dia.
Tem havido e continua a haver casos em que fábricas fecham durante certos períodos na semana por falta de matérias primas ou até de combustíveis, e que os géneros ou mercadorias à venda se têm reduzido gradualmente.
Disso resulta a desmobilização de capitais nelas invertidos, que, somados em grande número de emprêsas, produziram vastas somas, que tiveram de ser acumuladas nos estabelecimentos de crédito.
Geralmente as emprêsas canalizaram, como era lógico, êsses capitais para os bancos com quem mantinham transacções. Daí o apreciável afluxo de depósitos, em grande parte comerciais ou pertencentes a entidades comerciais, que acharam caminho para os estabelecimentos bancários.
Parte importante dêsse dinheiro tem o seu destino marcado. Há-de voltar a ser transformado em produtos e mercadorias logo que se normalizem as trocas internacionais.
O problema reveste aspectos sérios, que necessitam de ser cuidadosamente ponderados.
Estes depósitos estão em grande parte representados por cambiais. Êles resultaram de deficiências de importações — por conseqüência da falta de procura de cambiais —, e do desenvolvimento de exportações — e portanto, da abundância de cambiais. As primeiras hão-de intensificar-se logo que termine a guerra e haja possibilidades de adquirir os produtos que faltam agora nos mercados externos; e as segundas não se julga poderem voltar ao nivel que atingiram logo a seguir à guerra.
Os números parece que contrariam a esperança que reside no espírito de muita gente de ser possível, com os recursos existentes, inverter vastas somas em obras, e antes mostram a necessidade de vigiar cuidadosamente, no período que se há-de seguir à guerra, a norma das importações, dando prioridade àquelas que tragam maiores benefícios para o País.
O estado a que chegaram as cousas financeiras no mundo, resultante da destruïção de vastas somas de capitais, acumulados em longos anos de trabalho e invertidos em obras e empreendimentos de toda a ordem, há-de ter, naturalmente, como corolário, anos difíceis em quási todos os países europeus e até asiáticos. Neles as restrições cambiais hão-de constituir, pelo menos nos primeiros tempos, a dominante preocupação na sua política financeira, e em certos produtos há-de haver a tendência para exportação intensiva, de modo a poderem liquidar as tremendas necessidades de outros indispensáveis, que só podem ser obtidos do exterior. Os arranjos internacionais de Bretton Woods e a U.N.R.R. devem concorrer em elevada escala para adoçar a vida dos tempos que hão-de vir, mas, em qualquer caso, estas instituïções e outras que porventura venham a ser constituídas nunca poderão desbastar todas as arestas.
A pressão sôbre as disponibilidades cambiais há-de fazer-se sentir nos países que delas dispõem — até no caso de se não levarem em conta as dificuldades próprias no reembôlso de créditos acumulados durante a guerra. Estas e outras razões parecem indicar que, no futuro, apesar das aparentes reservas de depósitos e cambiais, terá de ser exercida constante vigilância sôbre o seu emprêgo, com o objectivo de os encaminhar para os fins mais úteis ao bem da Nação.
24. Os depósitos da Caixa continuaram a aumentar em 1943 e atingiram em 31 de Dezembro 5.325:968 contos, assim divididos:
[Ver diário original]

Página 33

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(33)
O aumento de 133:375 contos, em relação a 1942, reflecte até certo ponto a proporção do desenvolvimento nas pequenas economias, que se torna clara quando se examinam os cofres onde teve lugar. Relativamente a 1928-1929, o acréscimo de mais de 3 milhões de contos nos depósitos à vista mostra a considerável influencie que a Caixa vem adquirindo no mercado financeiro.
O desenvolvimento dos depósitos obrigatórios resulta da série de disposições legais relacionadas principalmente com a organização corporativa, sobretudo na parte respeitante a caixas de previdência, abono de família e outras.
O total dos depósitos feitos na Caixa Económica Portuguesa desde 1891 consta do quadro que segue, em contos:
[Ver diário original]
É evidente que os números não dão idea exacta da ordem de grandeza dos depósitos. Seria indispensável reduzi-los a um padrão fixo, visto o escudo ter sofrido variações consideráveis desde a primeira das datas mencionadas.
Emprêgo de fundos
25. Pelas razões já expostas, o emprêgo de fundos não correspondeu ao desenvolvimento das disponibilidades.
A afluência de depósitos à Caixa e aos restantes estabelecimentos bancários foi acompanhada de grande deminuïção no emprêgo de fundos, não obstante o contínuo decréscimo nas taxas de juros. Êste ano os empréstimos administrativos, ao Estado e às colónias, deminuíram por virtude de não haver compensação suficiente para as amortizações por novos empréstimos. As maiores valias notadas no crédito hipotecário, em operações financeiras e nos empréstimos a organismos corporativos equilibraram as baixas notadas na deminuïção da conta corrente com a Caixa Nacional de Crédito, que atingiu perto de 47:000 contos, em virtude de menores necessidades de crédito na indústria e na agricultura, e do reembôlso de empréstimos resultantes de falta de matérias primas. A guerra influíu assim, em elevado grau, na actividade da Caixa e foi causa da redução nos seus lucros, que, como adiante se verificará, hão-de continuar a decrescer emquanto não se normalizar a situação.
As actuais disponibilidades da Caixa são bastante grandes e podem servir para auxiliar a economia nacional logo que termine o conflito.
Embora em certas rubricas se notem melhorias em relação a anos anteriores, e nalguns casos acentuadamente, como nos organismos corporativos, continua o retraïmento no crédito, e isso repercute-se de maneira apreciável na conta de ganhos e perdas.
Os números, em contos, para 1943 são, para as principais aplicações, os seguintes:
[Ver diário original]
26. Durante os últimos anos tem havido redução nas taxas de juro de empréstimos, que não é compensada por idêntica redução nas taxas aplicadas a depósitos. E, por isso, apesar de alguns aumentos no capital emprestado, houve deminuïção nos rendimentos, como pode verificar-se no quadro que a seguir se transcreve:
[Ver diário original]

Página 34

344-(34)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Por outro lado, as despesas aumentaram em conseqüência de acréscimo de encargos administrativos e de recentes disposições sôbre pessoal, como se deduz dos números seguintes, em contos:
[Ver diário original]
O que mais avulta é a verba de encargos que diz respeito a juros de depósitos. Em 1943 liquidaram-se por esta rubrica as somas seguintes:
Contos
Depósitos à vista... 31:595
Caixa Económica Postal... 1:304
Depósitos a prazo... 7:808
Depósitos obrigatórios... 3:921
44:623
Os resultados da exploração ressentiram-se dos factos atrás apontados e alcançaram 108:985 contos em lucros brutos e 34:436 contos em lucros líquidos.
Nos dois últimos anos, em comparação com 1928-1929, os resultados foram os que seguem:
[Ver diário original]
Fundos de reserva
27. Em instituto de crédito do tipo da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, um dos objectivos deverá ser a constituïção de sólidos fundos de reserva que enfrentem qualquer contingência. Ascendiam êles a 221:738 contos em 31 de Dezembro de 1943. Se se juntarem os da Caixa Nacional de Crédito, os fundos totais sobem a perto de 330:000 contos.
Os fundos acham-se distribuídos por diversas rubricas, a mais importante das quais diz respeito a títulos. Podem discriminar-se do modo que segue, em contos:
[Ver diário original]
Caixa Nacional de Crédito
28. Pela primeira vez desde a fundação da Caixa Nacional de Crédito, em 1929, se deu decréscimo em todas as rubricas do capital mutuado, relativamente aos anos anteriores. E o total, que subira a 720:092 contos em 1940, reduzia-se para 519:871 em fins de 1943.
As deminuïções no activo deram-se êste ano, essencialmente, no crédito agrícola mútuo, no fomento colonial e no crédito industrial, mas pode dizer-se que atingiram apreciàvelmente as outras modalidades do crédito. Os números são os que seguem, em contos:
[Ver diário original]
Já se explicaram atrás as causas principais da deminuïção no capital mutuado. Ela teria sido maior se não fôssem alguns importantes financiamentos concedidos para obras de fomento em regime de conta-corrente, e que são mobilizados na medida da execução das obras.
Os lucros líquidos, que acrescem aos fundos de reserva e, portanto, à formação de capitais próprios da instituïção, somaram êste ano 5:715 contos, tendo sido levado a amortização de móveis uma pequena verba.
Desde o início da Caixa Nacional de Crédito, os fundos de reserva têm vindo a aumentar, atingindo

Página 35

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(35)
107:321 contos no fim do ano de 1943. As restantes verbas do passivo são, em contos:
[Ver diário original]
A rubrica «Obrigações» diz respeito ao Banco de Angola. A Caixa Nacional de Crédito possue 33:690 contos de acções do Banco de Angola, num capital de 60:000 contos.
Estas acções foram liquidadas por obrigações de 7 por cento, que vêm sendo amortizadas por sorteio. O seu valor inicial, de 33:690 contos, foi já amortizado e encontrava-se reduzido a 27:441 contos em 31 de Dezembro de 1943. O peso do elevado juro destas obrigações recaiu sôbre os rendimentos da Caixa Nacional de Crédito.
A taxa elevada de 7 por cento em obrigações avalizadas pelo Estado, com garantia acessória do activo da Caixa Nacional de Crédito, representa hoje um paradoxo. Parece ser absolutamente necessário converter essas obrigações em outras de taxa equivalente à que actualmente se aplica aos títulos emitidos pelo Estado, tanto mais que já passou largo espaço de tempo sôbre a sua emissão, e pode ser feita a respectiva conversão sem maior inconveniente.
Distribuïção do crédito
29. O mapa seguinte dá uma idea da distribuïção das diversas modalidades de crédito pelos distritos do País.
[Ver diário original]
Caixa Nacional de Previdência
30. Os serviços desta instituïção continuam a desenvolver-se. Em 1943 o número de aposentados no funcionalismo civil alcançou a cifra de 16:026; e o relativo ao militar era de 14:647. A despesa com os primeiro foi de 117:855 contos, mais de 3:851 do que no ano anterior; e a que diz respeito aos segundos atingiu 92:730 contos.
As receitas que liquidam estas despesas provêm de cotas dos funcionários e, sobretudo, de subsídios do Estado.
Em 1943 foram as seguintes para o funcionalismo militar:
[Ver diário original]
E para o funcionalismo civil a origem da receita foi a que segue:
[Ver diário original]
Se fôr tomado em conta o que os correios, telégrafos e telefones entregam à Caixa Geral de Aposentações, a percentagem dos subsídios do Estado sobe para 71,28 por cento.
Os fundos de reserva desta instituïção vão crescendo. Foram em 31 de Dezembro de 1943 os que seguem:
Fundo permanente:
Contos
Funcionalismo civil... 1:140
Funcionalismo militar... 630
Clero paroquial... 399
2:169
Fundo de reserva:
Contos
Funcionalismo civil... 57:394
Funcionalismo militar... 12:099
Clero paroquial... 3:133
72:626
31. As receitas do Montepio dos Servidores do Estado são formadas de subsídios do próprio Montepio, das cotas dos contribuintes, das receitas que advêm de títulos e dos rendimentos do fundo de maneio. Há-de ainda levar tempo a tornar o Montepio independente da vida financeira do Estado e talvez que isso nunca possa vir a ser uma realidade.

Página 36

344-(36)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
As receitas elevavam-se a 23:458 contos, assim divididos:
[Ver diário original]
Os fundos de reserva do Montepio subiram a 89:397 contos, mais 2:721 do que no final do ano anterior.
A despesa do Montepio tem aumentado progressivamente. Nos últimos anos foi a que segue:
Contos
1936... 21:979
1938... 19:898
1940... 21:780
1941... 22:980
1942... 24:052
1943... 25:727
MINISTÉRIO DO INTERIOR
32. A despesa dêste Ministério no ano de 1943 subiu apreciàvelmente, pelas razões que mais adiante serão discutidas em maior minúcia. Foram as seguintes, em contos:
[Ver diário original]
Houve aumentos em quási todos os serviços, mas onde êles mais se fizeram sentir foi na assistência pública, segurança pública (guarda nacional republicana e polícia) e no subsídio à Legião Portuguesa, que passou de 3:650 contos para 4:500.
O aumento total é ainda maior do que assinalam as contas, porque se não inscreveu nem gastou em 1943 qualquer verba de representação, e em 1942 a despesa nesse objectivo fora de 1:672 contos, como no relatório dêsse ano se explicou.
Segurança pública
33. A guarda nacional republicana e polícia gastaram 103:095 contos, assim divididos:
[Ver diário original]
O maior aumento deu-se na guarda nacional republicana e teve lugar em diversas rubricas, entre as quais as relativas a pessoal e material.
Na polícia foi bastante inferior o aumento. Nos dois últimos anos as verbas gastas podem dividir-se do modo que segue:
[Ver diário original]
Saúde pública
34. A defesa da saúde deve ser uma das mais importantes preocupações dos serviços públicos.
Além das verbas gastas no sentido de a defender, é mester, tanto nos centros urbanos como nos rurais, impor os preceitos de higiene indispensáveis à sua defesa.
Ainda hoje não é raro encontrar estrumeiras, ou currais, ou palheiros habitados, perto de reservatórios de águas ou de nascentes. Até depois de construídas novas fontes, por comparticipações do Estado, se mantêm focos de infecção nas vizinhanças. Deveria ser estabelecida uma zona de protecção, onde não pudesse ser

Página 37

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(37)
consentida a existência de tudo o que possa servir para neutralizar os esforços feitos no saneamento. De outro modo as melhorias dos últimos anos de pouco servem.
A despesa da saúde pública tem subido muito lentamente. E durante o último ano apenas se gastaram mais 574 contos do que no ano anterior, como se verifica do quadro seguinte:
[Ver diário original]
Deram-se duas alterações que podem ter algum significado: a primeira foi o aumento de 366 contos nos serviços anti-sezonáticos, o qual, junto ao do ano anterior, soma 670 contos; a segunda foi o refôrço de 650 para 1:200 contos nos fundos destinados à Organização Nacional Defesa da Família.
Dada a situação sanitária de muitas zonas do País, resultante da cultura do arroz, e o aumento considerável no preço do quinino, o acréscimo de despesa de menos de 400 contos não corresponde às necessidades.
Torna-se urgente estudar com cuidado a questão da malária e adoptar as medidas que atenuem os seus efeitos. As migrações dos trabalhadores empregados nos arrozais levam esta doença a zonas indemnes até Lá poucos anos.
Têm sido apontados periòdicamente os inconvenientes de um estado de cousas que não pode continuar como agora.
O sezonismo exerce sôbre as populações uma acção grave, que as debilita, e é causa de muitos males físicos que podiam ser evitados. Já foram objecto de estudo, até experimentalmente, métodos de cultura de arroz que podem impedir o desenvolvimento do mal.
Devem ser dadas a esta Direcção Geral poderes e meios necessários para atenuar um problema que já é grave e que com o andar do tempo há-de ainda trazer conseqüências mais funestas à saúde e vigor da população. Não é apenas pelo uso de quinino que êle se resolve. Tem de ter soluções que englobem a cooperação do Ministério da Economia, pelo Sub-Secretariado da Agricultura, e de outros departamentos públicos.
O mais precioso bem do indivíduo é a saúde e um País para ser forte necessita de população sadia. Não é muito fácil entre nós adquirir a consciência nítida desta verdade. Se fôsse possível compilar estatísticas que mostrassem o custo de doenças que poderiam ser evitadas por melhor higiene, ver-se-ia com facilidade que o dinheiro gasto na defesa da saúde seria largamente compensado pelas economias feitas em dispendiosos tratamentos, até em instituïções subsidiadas ou totalmente pagas pelo Estado. Isto sem contar com as graves conseqüências de ordem moral e física e os prejuízos no estrito ponto de vista económico que sofre o País em horas e em rendimento no trabalho.
35. Em todos os pareceres tem sido vincada a necessidade de dotar melhor os serviços de saúde pública, que devem receber a possível colaboração de outros departamentos do Estado, dos municípios e de todas as entidades particulares. Quando se pensa que muitos outros países conseguiram em poucos anos, apesar de circunstâncias adversas, debelar graves epidemias e manter em grandes cidades um estado sanitário razoável, vê-se logo que a tarefa de o melhorar apreciàvelmente entre nós pode ser realizada com a certeza de que produzirá bons frutos em, relativamente, pouco tempo.
Com as verbas hoje atribuídas não é praticável a reforma das condições actuais.
Apesar do apreciável alargamento do corpo clínico rural e dos auxílios prestados por dispensários e postos locais, ainda há um campo vasto para melhorias, sobretudo na maternidade. A cifra da mortalidade infantil não decresceu muito. Ela é devida em grande parte a deficiências na casa e na alimentação, muitas das quais podem contudo ser corrigidas sem grande dispêndio por propaganda prática, acompanhada de auxílios, sem os quais não haverá o rendimento necessário a quaisquer esforços feitos no sentido de resolver uma questão que pesa fundo na vida nacional e que é uma das causas do retrocesso demográfico dos últimos anos.
A mortalidade infantil atinge ainda entre nós a cifra de 6 por mil, emquanto que na maior parte dos países europeus em 1939 alcançava taxas que não iam além de 2 por mil, e quando muito 3, com cifras inferiores ou ligeiramente superiores a 1 por mil, nomeadamente na Suíça e na Holanda.
Dado o grave decréscimo de nascimentos, manter êste estado de cousas é impedir ou retardar o aumento da população.
Êste é um dos grandes problemas da actualidade, que envolve também questões de ordem moral. Mas há o dever de tentar resolvê-lo, pelo menos, na parte que estiver ao alcance da interferência das autoridades.
36. As taxas da mortalidade deminuíram ligeiramente na década que precedeu a guerra. Já em 1940 se nota ligeira subida, que, contudo, ainda não foi grande. Se a compararmos, porém, com as taxas de outros países do ocidente europeu, verificamos que, apesar das circunstâncias favoráveis, elas estão muito além do que deviam ser.
Foram as seguintes para o continente e ilhas desde 1900:
[Ver diário original]
O exame das cifras mostra que houve a melhoria de cêrca de 4 por mil no espaço de tempo de quarenta e três

Página 38

344-(38)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
anos. Mas nesse período a natalidade decresceu muito, como pode ler-se nos números que seguem:
[Ver diário original]
Emquanto que a mortalidade apenas deminuíu 4,2 por mil, a natalidade passou de 30,5 por mil no continente e ilhas pára 23,8 por mil, uma baixa de 6,7 por mil.
A tendência na descida acentuou-se depois de 1937. Em 1936 ainda a natalidade atingia mais de 28 por mil, mas logo em 1938 passou para 20,5.
Os efeitos na população são graves.
O exame das cifras por distritos mostra celtas coincidências dignas de registo.
Em primeiro lugar verifica-se deminuïção de nascimentos em todos os distritos, menos nos de Bragança, Braga, Angra do Heroísmo e, de um modo geral, nas ilhas. Onde se deu á maior descida, tirando Lisboa, foi em Faro. A natalidade neste distrito desceu de 28,8 por mil em 1928 para 20,6 por mil em 1940. Cifra idêntica a esta encontra-se em Coimbra, com uma taxa ligeiramente superior a 20 por mil em 1940. Lisboa, que em 1928 ainda podia indicar a taxa de 24,7 por mil, já muito inferior à de outros distritos, desceu em 1910 para um pouco menos de 16 por mil.
As cidades de Lisboa e Pôrto, com taxas de 22,5 e 28,5 por mil respectivamente, não passaram de 13,3 e 20,8 por mil em 1940. No mesmo ano as mortalidades foram 17,03 e 19,8 por mil. Há deficit na cidade de Lisboa e a sua população sofreria um pequeno decréscimo, se na verdade não houvesse imigração.
O fenómeno é geral — estende-se a toda a Europa e até à América. Em Portugal, porém, o decrescimento da mortalidade não compensa nem de muito longe o decrescimento da natalidade. O País está condenado a pequenos acréscimos de população, se se não modificarem as condições de vida social e não forem atalhadas outras causas que se opõem à natalidade.
A mortalidade infantil
37. A mortalidade infantil tem decrescido muito ligeiramente. O número de óbitos até aos cinco anos passou de 46:488 em 1929 para 39:042 em 1940, o que representa 230,4 para 207,8 por cada 1:000 nados vivos, ou apenas a deminuïção de 22,6 por mil no espaço de doze anos. As cifras correspondentes a 1:000 habitantes são as seguintes no continente e ilhas:
[Ver diário original]
Se fôsse possível reduzir a mortalidade infantil à da Dinamarca (1,1 por mil), ou Holanda (1,2 por mil), ou Suíça (0,56 por mil) ou até da Bélgica (2,5 por mil), respectivamente, nos anos de 1937, 1939, 1939 e 1938, os efeitos na natalidade seriam parcialmente compensados.
Êste assunto já foi apontado à consideração de quem de direito no parecer de 1940. Os números dos anos que se seguiram, embora sujeitos às naturais conseqüências derivadas da guerra, confirmaram as previsões atrás feitas.
O interêsse do País exige que se encontrem meios de evitar a gradual deminuïção dos saldos fisiológicos, que passaram de 88:895 em 1931 para 67:406 em 1940 e 60:972 em 1942, não obstante haver ainda a favor do primeiro ano um saldo em relação ao segundo nos emigrantes retornados.
As comparações com outros países nem sempre mostram a realidade das cousas que prevalecem em cada um e as relações entre elas. Em todo o caso dão idea da eficiência dos serviços de saúde e de outras causas que entram nas probabilidades da vida e da morte.
O último ano da primeira Grande Guerra, comparado com 1900, dá para diversos países a seguinte relação:
[Ver diário original]
A natalidade deminuíu consideràvelmente em todos os países enumerados. É fenómeno geral. Atingiu proporções catastróficas em França (passou de 21,4 por mil para 14,6), na Alemanha (veio de 35,6 para 20,4 por mil, depois de ter passado por 17,6) e na Inglaterra (desceu de 28,7 por mil para 14,9). A taxa da mortalidade melhorou apreciàvelmente em quási todos os países. Muito mais nos outros do que no nosso.
Na Alemanha desceu cêrca de 10; na Bélgica, 5,5; nos Estados Unidos, 7,0; na França, 6,6; em Inglaterra, 6,1; na Itália, 8,6; na Suíça, 7,5; em Espanha, 10,9, e, finalmente, em Portugal, apenas 5,0 por mil. Esta pequena deminuïção na mortalidade entre períodos tam afastados é até certo ponto compensada pela taxa da natalidade, que no mesmo período deminuíu 4,3 por mil, emquanto que em outros países alcançou cifras muito maiores, como, por exemplo, no país vizinho, onde teve o decréscimo de 17,7 por mil, e na Alemanha, 15,2 por mil.
A mortalidade entre nós poderia ser apreciàvelmente reduzida se houvesse deminuïção na mortalidade infantil.
As cifras relativas à mortalidade não dizem tudo a respeito da saúde no nosso País. Os índices dos apuramentos nas inspecções militares contam-nos a história penosa da compleição física do povo português. É extremamente impróprio o nosso regime alimentar: umas vezes por falta de calorias, outras por abundância delas. O equilíbrio nutritivo é muito precário também. Não há em geral qualquer preocupação que tenda a fornecer

Página 39

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(39)
os elementos protectores! Há sub-alimentação ou insuficiência de calorias e má nutrição ou desequilíbrio alimentar. É absolutamente indispensável olhar para êste estado de cousas.
O problema toma aspectos graves em certas regiões do País e merecia ser visto com cuidado, porque os defeitos físicos que hoje se reconhecem em muitas zonas resultam de insuficiência de certos alimentos e de desequilíbrio nas dietas.
A influência das vitaminas e de elementos minerais na saúde ainda não foi até hoje estudada entre nós, apesar dos meritórios esforços feitos por uma pléiade de clínicos que tem procurado chamar a atenção para o assunto.
As causas da má nutrição provêm em geral da insuficiência de salários, de parcos meios de vida. A pobreza, a miséria e a ignorância são a raiz de muitos males relacionados com a má alimentação. O pequeno consumo de leite, fruta e vegetais em muitas zonas do País, sobretudo nas principais cidades, são a causa de numerosas doenças e levam ao enfraquecimento do organismo e a pequeno rendimento no trabalho. A ciência da nutrição mostrou já que o homem precisa de dieta muito variada é os métodos aplicados durante a guerra em certos países beligerantes provaram que é possível manter o nivel da saúde pela instituïção de uma dieta racional. Vieram também mostrar que há vasto campo para consumo de produtos agrícolas em virtude dos elementos protectores que possuem, principalmente vitaminas. A questão dos alimentos energéticos e protectores necessita de ser melhor esclarecida entre nós. O País tem admiráveis condições para produzir o necessário para uma dieta saüdável, relativamente económica, em que se possa firmar a alimentação de um povo sadio, enérgico e forte.
As medidas a adoptar devem ter início no fornecimento de leite às crianças, visto, ser o alimento de maior valor e mais equilibrado.
Assistência pública
38. Não são fáceis as comparações das despesas da assistência pública neste ano com as de anos anteriores, por virtude das razões já apontadas noutros pareceres. Apenas se podem dar agora as verbas globais para as diversas modalidades de assistência. São as seguintes:
[Ver diário original]
O aumento em relação a 1942 foi bastante grande, até quando se deduz a verba de 5:673 contos que antes se distribuía directamente pelo Fundo de Desemprêgo.
Os estabelecimentos hospitalares compreendem os Hospitais Civis de Lisboa, os da Universidade de Coimbra, o da Misericórdia do Pôrto, o das Caldas da Rainha e diversos outros subsídios às Misericórdias.
Nas maternidades inclue-se a do Dr. Alfredo da Costa, em Lisboa, e Júlio Diniz, no Pôrto. Na assistência a estudantes encontram-se as Casas Pias.
Na luta contra a tuberculose está incluída a verba de 6:500 contos, destinada aos funcionários civis tuberculosos. A razão do aumento na assistência a alienados resultou da abertura do Hospital Dr. Júlio de Matos.
Imprensa Nacional
39. Na Imprensa Nacional o deficit entre as receitas e despesas acusado pelas contas necessita de ser corrigido. O exame dos resultados de exploração relativo a 1943 mostra que as receitas liquidadas se elevaram a 9:947 contos, embora se cobrassem apenas 8:599. Há um certo número de verbas não reembolsáveis que constituem pêso morto na laboração e se referem a benefícios ao pessoal, ao custeio da biblioteca, a capilhas para as bibliotecas, a impressos fornecidos ao Comissariado do Desemprêgo e outros. Segundo notas fornecidas pelos serviços, somaram 1:290 contos. Parte das importâncias incluídas nas designações acima mencionadas não constituem despesa de exploração. Há que ter em conta, além disso, as modificações patrimoniais, que mostram em 1943 o acréscimo total de 1:907 contos, incluindo 196 de impressos fornecidos às tesourarias da Fazenda Pública e 495 no armazém de materiais.

Página 40

344-(40)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
40. Aumentaram apreciàvelmente as despesas dêste Ministério no ano de 1943, pois passaram de 52:365 contos em 1942 para 58:335. Os acréscimos deram-se nos serviços prisionais e no abono de família, e nos primeiros êle foi devido à Colónia Penitenciária de Alcoentre e às cadeias e penitenciárias, por virtude de maiores despesas com vestuário e alimentação. Os números são os que seguem, em contos:
[Ver diário original]
Serviços da justiça
41. A despesa da Direcção Geral da Justiça tem-se mantido nas proximidades da cifra dos 17:000 contos e foi êste ano quási idêntica à do ano passado. Compreende os conselhos e serviços de inspecção.
Dada a importância dêstes serviços e a vasta engrenagem que os forma, espalhada por todo o País, não se pode dizer ser alto o que com ela se gasta, tanto mais que ainda há que considerar certos subsídios de relativa importância que nada têm com esta dependência do Ministério, como adiante se verificará.
Nos serviços de justiça inclue-se o Conselho Superior Judiciário e o Conselho Superior dos Serviços Criminais. Com o primeiro despenderam-se 2:412 contos e com o segundo cêrca de 50 contos em pessoal.
Na despesa do Conselho Superior Judiciário inscreveram-se 1:395 contos para subsídios a cofres ou organizações metropolitanas, coloniais e estrangeiras, menos 18 contos do que no ano passado. Representa compensações ao serviço do registo civil.
O total das despesas dos Conselhos Superiores, Relações, juízes de 1.ª instância, Ministério Público e polícia de investigação em Lisboa, Pôrto e Coimbra subiu êste ano a 17:702 contos, menos alguns do que em 1943. Não houve apreciáveis modificações nas verbas, como pode ver-se no quadro que segue, em contos:
[Ver diário original]
As polícias de investigação necessitam de sofrer grandes modificações, pelo menos no que toca a vencimentos e ao edifício onde se acham instaladas. A de Lisboa está alojada em condições péssimas e só difìcilmente pode exercer a função que lhe incumbe. Precisa de ser dotada de meios mais eficientes de investigação criminal e o recrutamento dos agentes, que recebem remunerações inadequadas, é um ponto que requere atenção.
As taxas da justiça melhoraram um pouco relativamente ao ano anterior. Foram as que seguem, em contos, para o imposto de justiça cível e de justiça crime:
[Ver diário original]
A justiça é muito cara em Portugal. Já êste assunto foi tratado em pareceres anteriores. A medida que os anos passam acentuam-se os queixumes.
O caso dos processos orfanológicos necessita de ser cuidadosamente revisto, porque há casos verdadeiramente anómalos, nos quais desaparece quási por completo o espólio por virtude das custas. A justiça, neste caso, actua exactamente em sentido inverso ao da sua missão.
Serviços prisionais
42. É nesta Direcção Geral que mais se tem acentuado o aumento de despesa. Em 1932-1933 esta foi de 10:835 contos e subiu para 26:222. O exame das contas relativas aos dois últimos anos mostra que os acréscimos tiveram lugar em quási todas as dependências, como se verifica dos números seguintes:
[Ver diário original]

Página 41

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(41)
O desenvolvimento da despesa em relação a 1942 deu-se em virtude de ter começado a funcionar a Colónia Penitenciária de Alcoentre e por motivo de maior custo do vestuário e alimentação nas cadeias penitenciárias. Os números são os que seguem:
[Ver diário original]
Só em vestuário e alimentação o aumento de despesas foi superior a 4:500 contos.
Serviços jurisdicionais de menores
43. A despesa total dêstes serviços mantêm-se dentro dos limites da do ano passado, como pode ler-se nos números adiante mencionados:
[Ver diário original]
Serviços médico-legais
44. Os serviços médico-legais dêste Ministério compreendem os Institutos de Medicina Legal de Lisboa, Pôrto e Coimbra, os Arquivos de Identificação e o Arquivo Geral do Registo Criminal e Policial.
As despesas em 1943 para cada um dêles foram as seguintes:
Contos
Instituto de Medicina Legal de Lisboa... 614
Instituto de Medicina Legal do Pôrto... 307
Instituto de Medicina Legal de Coimbra... 217
Conselhos médico-legais... 4
Arquivo de Identificação... 331
Secção do Pôrto... 25
Secção de Coimbra... 25
Arquivo Geral do Registo Criminal e Policial... 793
Total... 2:316
45. Estão agora em maior actividade as obras das novas instalações prisionais, sobretudo cadeias comarcãs. Na secção respectiva do Ministério das Obras Públicas e Comunicações dão-se as verbas já gastas nalgumas delas.
Urge também acelerar os projectos das novas instalações para os tribunais, sobretudo os de Lisboa. Embora a época não vá propícia para obras dêste género; por virtude das dificuldades de mão de obra e falta de materiais, pode ser aproveitada a oportunidade para a execução do projecto, que é difícil e há-de ser demorado, dada a importância da obra.
Ainda houve neste ano o suplemento de despesa para abono de família aos funcionários do Ministério da Justiça, no total de 1:643 contos.

Página 42

344-(42)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
MINISTÉRIO DA GUERRA
46. A guerra tem-se reflectido nas despesas do orçamento português, sobretudo nos Ministérios da Guerra e da Marinha, mas principalmente no primeiro.
Houve grandes gastos nos últimos quatro anos. Em 1940 subiam já a 649:956 contos e resultaram em parte do rearmamento. E nos três anos seguintes foram:
[Ver diário original]
Ao todo, em quatro anos, despenderam-se com o rearmamento e despesas de guerra 4.095:000 contos, incluindo as despesas ordinárias, no total de um pouco mais de 1:076:000 contos.
Não tem sido necessário recorrer a empréstimos. Apenas em 1943 se desviaram do crédito para efeitos de rearmamento as quantias que vão apontadas noutro lugar dêste relatório.
Mas esta política, que certamente é corrente emquanto possível, no ponto de vista financeiro, há-de ser difícil manter logo que se acentue uma deminuïção de receitas, como tudo leva a supor que se deve dar em breve.
A despesa ordinária neste ano somou 338:687 contos e dividiu-se como segue:
[Ver diário original]
O aumento de 40:100 contos nas despesas ordinárias vem em grande parte de maiores dotações na aeronáutica, subsistências, instrução e serviços de saúde, além do abono de família.

Página 43

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(43)
MINISTÉRIO DA MARINHA
47. Também aumentaram apreciàvelmente as despesas ordinárias do Ministério da Marinha, que atingiram 207:961 contos, contra 178:915 contos em 1942, mais 29:046 contos.
À semelhança do que tem sido feito nos últimos anos, e com o fim de tornar mais claras as despesas, dão-se a seguir os números para cada um dos departamentos mais importantes do Ministério da Marinha:
[Ver diário original]
48. Os maiores aumentos deram-se nos gastos das praças da armada, nos depósitos da marinha e nos de material de guerra, além do abono de família. Algumas verbas, que anteriormente se liquidavam através da Superintendência dos Serviços da Armada, passaram a ser agora pagas por fôrça de despesas extraordinárias.
Nos últimos dois anos, as importâncias relativas a material foram as seguintes, em contos:
[Ver diário original]
As despesas extraordinárias atingiram 74:656 contos, como pode ver-se na tabela da coluna seguinte.
[Ver diário original]
O aumento deu-se em quási todas as rubricas por virtude das circunstâncias do momento presente.
As verbas totais gastas por êste Ministério elevaram-se a 282:617 contos, que se comparam no quadro que segue com os anos anteriores:
[Ver diário original]

Página 44

344-(44)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.° 140
MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS
49. As despesas ordinárias dêste Ministério deminuíram 1:862 contos, que é a diferença entre 35:628 e
33:766 contos gastos, respectivamente em 1942 e 1943. Os números, em contos, assumem a forma seguinte:
[Ver diário original]
O decréscimo na despesa resultou quási todo de menores gastos com legações e embaixadas. Emquanto que no ano passado se despenderam cêrca de 3:446 contos na compra de edifícios e mobiliário, a verba para idêntico fim deminuíu êste ano para 1:582. Destes, 1:267 foram utilizados na aquisição de mobiliário para a Legação de Berlim e 315 para o mesmo efeito na Embaixada de Madrid. A diferença para menos foi de 1:864 contos, que é quási igual à diferença total das despesas ordinárias do Ministério (1:862 contos).
Os números para pessoal, material e outros encargos constam do quadro que segue, em contos:
[Ver diário original]
A actividade política e diplomática dêste Ministério no período da guerra, e sobretudo nos dois anos de 1942 e 1943, tem sido muito grande. A posição de Portugal no meio de um conflito que gradualmente foi abarcando quási todas as nações do mundo tornou-se com o decorrer dos anos cada vez mais delicada. E foram precisos esforços contínuos e vigilantes, desenvolvidos interna e externamente, para manter o País no campo que era, e é, o que mais convém aos seus destinos, sem faltar a compromissos assumidos há longos séculos e que constituem ainda hoje um dos fulcros da nossa política internacional.
Foi isso possível até hoje. E tudo indica que se há-de manter até ao fim da guerra a política que melhor convenha aos interêsses da nacionalidade, que podem não coincidir, e só as circunstâncias o poderão determinar, com a estrita neutralidade mantida no passado.
Ninguém poderá avaliar pelo estudo das contas dêste Ministério, relativas ao delicado período que vimos atravessando, dos cuidados e trabalhos despendidos na orientação da nossa política externa. Tirando uma ou duas verbas de menor importância, as somas reflectem a feição serena e equilibrada que presidiu a essa política. Os resultados, no futuro, hão-de certamente justificá-la.
MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS E COMUNICAÇÕES
Considerações gerais
50. No ano passado tratou-se, no parecer das contas, do grande problema da instalação dos serviços públicos, mormente nas cidades mais importantes, sobretudo em Lisboa. Viu-se então que muitas repartições do Estado se achavam dispersas pela cidade, algumas vezes em edifícios habitados, e que dependências de um Ministério, estreitamente ligadas nas suas actividades, se encontravam em sítios distantes alguns quilómetros umas das outras.
Os inconvenientes dêste estado de cousas são óbvios, tento para os serviços como para o público.
Sabe-se a indiferença com que entre nós se olha muitas vezes a perda de tempo. Na maioria dos casos a questão das horas gastas em formalidades, algumas sem grande importância, pouco pesa na disposição legal que as exige, e a escolha da localização dos serviços faz-se quási sempre sem olhar às vantagens do público que dêles se serve. Depende da existência de alojamento, e em alguns casos pode até depender de outras razões. Se fôssem computadas as horas perdidas sem proveito, e avaliadas as receitas correspondentes, por virtude da localização de instalações públicas, chegar-se-ia a uma soma muito alta. No ano passado indicaram-se, em cifras globais, as rendas pagas pelo Estado pelo aluguer

Página 45

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(45)
dos edifícios que albergam os serviços públicos em Lisboa e Pôrto, Mencionaram-se os inconvenientes para a eficiência e fiscalização dêsses serviços e indicaram-se os estorvos para o público da sua dispersão.
Mas há-de ser muito difícil, se não impossível, calcular em horas de trabalho perdidas e, por conseqüência, em prejuízos, as suas desvantagens.
Com recentes disposições em matéria de legislação social têm-se acentuado os inconvenientes, e neste caso êles atingem não apenas o público mas os próprios serviços que tem de dar cumprimento a essas disposições. Isto refere-se, especialmente, aos casos de liquidação das taxas do abono de família, cotas das caixas de previdência e outros pagamentos.
Todos estes assuntos possuem uma importância que convém reter. Êles significam transtornos por um lado e por outro obrigam a longas horas de espera que poderiam ser evitadas, e por isso se sugeriu já o estudo meticuloso do problema das instalações públicas e se indicou ao mesmo tempo um meio de a êles obviar, logo que seja resolvida, como foi proposto nestes pareceres, a construção das obras da 1.ª secção do pôrto de Lisboa e o aproveitamento utilitário dos terrenos.
Seria possível dêste modo instalar no centro administrativo do País, perto do Terreiro do Paço, uma grande parte dos serviços que agora se acham dispersos pela cidade e ao mesmo tempo urbanizar condignamente uma zona que carece disso em elevado grau.
Esta obra reprodutiva reflectir-se-ia no aformoseamento da capital. Teria a utilidade imediata de criar os terrenos necessários para a concentração dos serviços públicos espalhados hoje por uma vasta área, longe da superintendência dos chefes, em casas ou andares que só com adaptações difíceis e precárias se amoldam ao fim em vista.
Transportes
51. A par dêste problema delicado da instalação dos serviços públicos um outro aparece, já há anos, no horizonte da vida da capital. É o dos transportes citadinos, das comunicações entre as diversas zonas.
O Estado tem contribuído com quantias elevadas para a urbanização de Lisboa. Construíram-se alguns bairros de casas económicas em diversos pontos da cidade e pelo Fundo de Desemprêgo dotaram-se as mais variadas obras, desde o calcetamento de ruas e avenidas até à construção de miradouros e outros melhoramentos. O Estado tem vindo a intervir financeiramente na vida municipal com auxílios grandes. Algumas vezes o subsídio é directo, pela entrega de somas, em outras reveste o carácter de serviços, e a Junta Autónoma de Estradas, o pôrto de Lisboa e ainda outras dependências do Estado já contribuíram também com grandes auxílios — como as obras da 3.ª secção, que tendem a melhorar as vias de comunicação internas.
O problema que agora surge, com acuïdade cada vez maior, diz respeito aos transportes.
É sabido de todos que a questão de transportes na cidade de Lisboa vai atingindo, pouco a pouco, um grau de saturação, acima do qual não haverá possibilidade de trabalho eficiente e ordenado. As dificuldades de movimentos em algumas horas do dia são conhecidas. Entre certas zonas da cidade são extremamente morosas as viagens e perde-se tempo precioso à espera de meio de transporte.
O problema é relativamente novo, porque antes da guerra o sistema actual funcionava de modo a satisfazer as necessidades diárias. Parece que a guerra trouxe o gosto da utilização do carro e talvez também o das viagens, porque o número de passageiros apontado pelas mais recentes estatísticas acusa um considerável acréscimo em relação ao período anterior à guerra.
O congestionamento em Lisboa atinge em certas horas do dia o ponto crítico.
Convém por isso procurar fazer o estudo das modificações que é mester introduzir no sistema de transportes da capital.
Qualquer projecto futuro terá de requerer o acôrdo e o auxílio do Estado. Êste problema, como tantos outros, é daqueles que necessitam de ser considerados em conjunto. Num futuro sistema de transportes da zona da capital há que ter em conta o que existe em matéria de linhas férreas e eléctricas, o que pode ser introduzido pelo emprêgo de veículos automóveis e, finalmente, as possibilidades da viação subterrânea pôr túneis ou trincheiras cobertas.
Já na Assemblea Nacional(1) foi sugerida a abertura de um túnel que descongestionaria a parte baixa da cidade, e daria vazão ao tráfego de oeste para leste e vice versa. Nesse tempo, muito anterior ao início da guerra, o tráfego aumentava lentamente. A obra podia ter sido executada em condições económicas muito razoáveis, numa época de estabilidade de preços e de abundância de materiais. Ainda hoje, mais de meia dúzia de anos volvidos, a sua utilidade persiste. E, logo que se inicie a tarefa de concluir a 1.ª secção do pôrto, ela há-de porventura ser o seu lógico corolário.
Mas o túnel a que então se aludiu, e outro que viria a ligar o centro de Lisboa com a parte oriental da cidade, serão apenas partes de um projecto que urge delinear e que também compreenderá toda a linha de cintura, o prolongamento do caminho de ferro do Estoril através dos terrenos conquistados ao mar pelas obras da 1.ª secção, possìvelmente em trincheira coberta; e que poderá com facilidade ligar toda a zona marginal do oeste com o leste da cidade até para lá do Poço do Bispo.
Além da utilização e melhoria das linhas existentes e do sistema de comunicações internas, há que pensar na possibilidade de uma linha subterrânea em cruz, possìvelmente na direcção norte-sul é outra no sentido leste-oeste, que, entroncando no centro da cidade, que coincide com a zona de maior movimento comercial, possa descongestionar o actual sistema de transportes.
A topografia de Lisboa, edificada sôbre montes de grande inclinação, em certos casos, e apertados vales, não permite tráfego cómodo de transportes mecânicos colectivos. Hão-de ser sempre fracas, se forem criadas, as correntes de tráfego que utilizem pesados veículos a subir por íngremes encostas. O exame destas condições dá logo a idea de que o único modo de resolver êste problema é o da tracção por túneis, com elevadores que transportem os passageiros para êsses montes, ou a utilização restrita nessas zonas de um sistema de electrificação, como o que existe especialmente adaptado a êsse fim.
A descentralização da cidade, o seu carácter errático, as extensas filas de casas construídas ao longo de estradas, sem que tivesse havido até há poucos anos sérios obstáculos a um êrro grave de urbanismo, também complicaram o problema do transporte. E a recente iniciativa de construir grandes bairros económicos, sem cuidar prèviamente das suas comunicações, dificultaram ainda mais a questão.
Há hoje larga experiência em matéria de congestionamento de tráfego nas grandes cidades europeias e americanas, e já se conhecem os resultados práticos dos vários sistemas usados no sentido de atender aos seus efeitos.
Um dos maiores males é a dispersão do sistema de transportes nas grandes metrópoles. Um recente exemplo numa das maiores capitais europeias prova que só a concentração em organismo único de todas as linhas

(1) Diário das Sessões de 11 de Dezembro de 1936.

Página 46

344-(46)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
de tráfego é capaz de enfrentar os inconvenientes do aumento cada vez maior do número de passageiros. O estabelecimento de um único sistema coordenado, que compreenda todas as correntes do tráfego e todos os sistemas existentes, provou ser, tanto no ponto de vista financeiro como comercial, o método eficiente de resolver os múltiplos problemas que se levantaram e que tantos inconvenientes traziam à vida da cidade e de seus arredores.
Embora nem de longe se possa comparar o problema de Lisboa e arredores com o de Londres, que acaba de mencionar-se, parece ser de vantagem estudar, desde já, o meio de evitar dificuldades que nascem dia a dia e se acumulam com o tempo. Pode ser que os alvitres agora sugeridos não satisfaçam todas as necessidades ou que seja impossível harmonizar todas as opiniões e interêsses ligados a êste problema, porque infelizmente é muito difícil congraçar, entre nós, opiniões e interêsses aparentemente antagónicos, mas que só têm a ganhar com acôrdo e harmonia. O problema terá, porém, de ser resolvido mais cedo ou mais tarde, e é sempre de grande vantagem estudar, prèviamente e com tempo, os problemas e assentar com ponderação nas melhores soluções. Há cousas de ordem jurídica, financeira e até política que conviria aclarar e harmonizar, e por isso talvez valesse a pena nomear um grupo de pessoas idóneas encarregadas de colher os elementos e aprofundar os diversos aspectos da questão.
52. As despesas totais do Ministério das Obras Públicas atingiram êste ano a cifra de quási meio milhão de contos, e distribuem-se como segue:
[Ver diário original]
Gastaram-se em despesas ordinárias 325:392 contos, e nas extraordinárias 165:774. O total subiu a 491:166 contos. Em relação a 1942 o aumento nas despesas ordinárias foi muito grande, superior a 52:400 contos. Mais de metade dêste acréscimo deu-se no Fundo especial de caminhos de ferro.
Quási todas as dependências utilizaram em 1943 mais dinheiro do que no ano anterior. A única excepção deu-se no pôrto de Leixões, mas ainda houve despesas extraordinárias. Os edifícios e monumentos nacionais, os serviços hidráulicos e o pôrto de Lisboa acusam gastos que vão além de alguns milhares de contos. Hão-de verificar-se adiante as razões dêste agravamento considerável na despesa.
Não pode com facilidade determinar-se exactamente o quantitativo de trabalho realizado com as verbas. Dada a carência de materiais que neste ano se acentuou, não deve ter sido muito maior êsse quantitativo se acaso o foi, a não ser que os empreiteiros sofressem grandes prejuízos.
Tiveram de parar certas obras por falta de arrematantes, e em alguns casos houve que recorrer à sua execução por administração directa.
A guerra influíu apreciàvelmente na maior despesa acusada pelas contas.
Além das verbas inscritas nas Contas Gerais do Estado, e acima indicadas, também pelo Ministério das Obras Públicas e Comunicações se distribuem, em regime de comparticipação de variados trabalhos, quantias importantes que provêm do Fundo de Desemprêgo.
Já se acentuou em pareceres anteriores a conveniência de trazer às contas as receitas e despesas dêsse Fundo.
Na verdade, êle constitue uma receita criada por lei que tem seu orçamento.
O que se inclue no quadro atrás transcrito refere-se às despesas ordinárias apenas. Mas pelo Ministério das Obras Públicas e Comunicações gastaram-se em 1943 cêrca de 165:774 contos em despesas extraordinárias, que adiante serão esmiuçadas e comentadas com certo pormenor. As mais importantes dizem respeito à Junta Autónoma de Hidráulica Agrícola, que consumiu mais de 30:000 contos neste ano; aos portos, que gastaram 22:224; aos correios, telégrafos e telefones, que despenderam 18:400 contos; a edifícios escolares, onde se gastaram 11:837, dos quais 7:000 em liceus; aos edifícios para o Hospital Escolar de Lisboa, para o qual se desviaram 9:700 contos; à Cidade Universitária de Coimbra, a que se atribue êste ano mais de 10:000 contos, e outras obras de menos importância no ponto de vista de verbas gastas.
Na secretaria geral gastaram-se êste ano 1:676 contos, sensìvelmente a mesma verba que o ano passado. E distribuíram-se pelas rubricas seguintes:
Contos
Secretaria geral... 363
Conselho Superior de Obras Públicas... 643
Direcção das Obras Públicas do Distrito da Horta... 219
Pagadorias das obras públicas... 420
8.ª Repartição da Contabilidade Pública... 31
1:676

Página 47

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(47)
Edifícios e monumentos nacionais
53. Têm andado à roda de um pouco mais de 100:000 contos as despesas dêstes serviços, não contando com o que gastam diversas comissões especiais que executam várias obras que não vêm discriminadas nas contas, embora estejam orçamentadas.
O total contabilizado nos edifícios e monumentos nacionais em 1943 foi de 107:095 contos, mais cêrca de 3:000 do que em 1942. As cifras que lhes dizem respeito são as seguintes:
[Ver diário original]
É evidente que o trabalho executado em 1943 foi menor do que o dos anos anteriores, por virtude da alta dos preços, tanto de materiais como de mão de obra.
Algumas das obras iniciadas há anos estão em acabamento, como a Base Naval de Lisboa, o Estádio de Lisboa e outras ainda do programa dos centenários. Em compensação nasceram mais que ainda hão-de consumir largas somas e, entre elas, convém citar a Cidade Universitária de Coimbra e o Instituto Nacional de Educação Física.
A actividade construtora do Estado nos últimos tempos tem sido muito grande e realizaram-se algumas obras de utilidade, embora muitas outras pudessem esperar dias melhores.
As despesas ordinárias elevaram-se a 46:067 contos, mais 4:571 do que no ano anterior. A sua discriminação pode ler-se no quadro seguinte:
[Ver diário original]
54. Seguindo o plano traçado e pôsto em prática noutros pareceres, de dar o maior número possível de pormenores sôbre o gasto das verbas por êste serviço, menciona-se adiante o que corresponde a cada rubrica orçamental.
A) Estudos e projectos:
55. As principais quantias despendidas em 1943 foram as que seguem:
[Ver diário original]
B) Novas construções:
56. Nas novas construções, algumas que já vinham de anos anteriores, despenderam-se 7:486 contos, assim discriminados:
[Ver diário original]
Os 237 contos gastos com edifícios da guarda fiscal dizem respeito a obras no pôsto de Monte da Aldeia (98 contos), caseta em Fial (20), pôsto de S. Leonardo (47), administração e fiscalização (41) e despesas gerais com estudos (31).
Nas obras da guarda nacional republicana as verbas mais importantes são: pôsto da guarda no Palácio das Necessidades, 24 contos, e administração e fiscalização e despesas gerais, 48 contos.
No Sanatório D. Manuel II, em Vila Nova de Gaia, gastaram-se 1:925 contos.
Os edifícios das alfândegas compreendem obras em Setúbal (367 contos), Ficalho (187 contos), Vila Real de Santo António (6 contos) e administração, fiscalização e estudos (96 contos).
As obras do Ministério da Marinha incluem as de S. Jacinto (473 contos), Escola de Artilharia Naval no Alfeite (220 contos), Escola de Vila Franca (798

Página 48

344-(48)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
contos), pôsto de rádio-sinalização (120 contos), secção de minas de Azinheira (150 contos) e administração e fiscalização (20 contos), além do transporte de materiais (3 contos).
Outras construções englobam um auditorium na Tapada da Ajuda (335 contos) e o edifício para as obras públicas de Coimbra (52), Instituto de Medicina Tropical (90 contos), Faculdade de Medicina do Pôrto (46) e zona de protecção do Govêrno Civil de Vila Real (47 contos).
57. As importâncias gastas em edifícios construídos por fôrça de verbas especiais relativas aos correios, telégrafos e telefones, pôrto de Lisboa e Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência mencionam-se a seguir:
[Ver diário original]
Quanto aos correios, as verbas vêm discriminadas na parte dêste relatório que diz respeito àqueles serviços. Referem-se a algumas dezenas de obras dispersas pelo País, e em grande parte das quais se gastaram pequenas quantias.
A maior, de 765 contos, refere-se à Central Telefónica de Lisboa.
As verbas para as construções têm duas origens: ou são obtidas de receitas da Administração Geral (1:846 contos) ou provêm de empréstimos (3:088 contos).
No total das obras dos correios, telégrafos e telefones estão incluídas as despesas de administração e fiscalização, que se elevaram, em 1943, a 573 contos, assim distribuídos:
[Ver diário original]
O exame dêstes números mostra ser bastante elevada a verba de administração e fiscalização (mais de 10 por cento). Ela compreende as despesas na sede da comissão de obras, pessoal, luz, expediente e outras cousas.
No pôrto de Lisboa gastaram-se 2:992 contos, que se discriminam no mapa seguinte:
[Ver diário original]
São muito pequenas as despesas de administração e fiscalização, visto tratar-se de obras planeadas e executadas pela Direcção Geral. Apenas se contabilizaram os custos de projectos para as estações marítimas como o indicado em relatórios anteriores. Não houve despesas de instalação, visto tudo ser feito na sede dos serviços. É êste o primeiro ano em que funciona a comissão criada para construir os edifícios da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência. As importâncias despendidas foram as que seguem:
Contos
Chaves... 42
Bragança... 95
Figueira da Foz... 183
Horta... 203
Peso da Régua... 103
Aquisição de materiais... 1:000
Administração e fiscalização e estudos... 203
1:834
Aqui, como atrás se explicou, houve necessidade de instalar os serviços, para o que foi arrendada a respectiva sede. Parece que, à semelhança do pôrto de Lisboa, poderiam aqueles ser concentrados na Direcção Geral. A economia seria grande na última verba das que acima se mencionaram.
Se se entrar em linha de conta com o trabalho e despesas de outras comissões e delegações espalhadas pela cidade, vê-se logo ser necessário rever o problema das construções de edifícios públicos.
Dá-se hoje êste facto: se estiverem a ser construídos, em determinada localidade da província, ao mesmo tempo, um edifício para a Caixa, outro para os correios, uma cadeia e um liceu, além de uma obra de reparação da Direcção Geral, no govêrno civil ou em qualquer outro edifício público, haverá cinco entidades oficiais independentes a fiscalizar e dirigir obras que são custeadas por fundos públicos.
O aumento de despesa há-de ser, necessàriamente, em ajudas de custo, deslocações, fiscalização, não contando com os gastos nas sedes das diversas comissões, muito grande.
Estas simples notas mostram a necessidade de rever todo o problema e justificam a concentração dos serviços. Já se emitiu êste parecer em anos anteriores e agora se reforça com os números a importância e urgência do assunto, sobretudo quando se torna indispensável a compressão de despesas.
C) Conservação e reparações:
58. Merecem especial referência as obras em edifícios e instalações seguintes:
Contos
Ministério da Guerra... 2:985
Ministério da Marinha... 558
Guarda fiscal... 265
Guarda nacional republicana... 300
Alfândegas... 179
Construções prisionais... 65
Hospitais Civis... 785
Paços do Duque de Bragança... 400
Universidade de Coimbra... 200
Palácio Foz... 945
Palácios Nacionais... 700
Liceus... 867
Outros edifícios públicos... 7:183
Correios, telégrafos e telefones... 591
Pôrto de Lisboa... 196
Misericórdia de Lisboa... 400
Fundo especial de caminhos de ferro... 600
Total... 17:219

Página 49

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(49)
Das verbas mais salientes podem mencionar-se as obras no Teatro D. Maria II, que custaram 1:036 contos. As outras são constituídas por importâncias menores e referem-se a grande número de edifícios.
Em despesas extraordinárias incluem-se as que se relacionam com diversas construções. Dividiram-se assim:
Contos
Liceus... 7:000
Escolas de ensino profissional... 25
Escolas primárias... 4:812
Edifícios públicos (Imóveis)... 2:849
Edifícios públicos (Mobiliário)... 3:366
Construções prisionais... 4:931
Castelos (incluindo S. Jorge)... 1:100
Mosteiro dos Jerónimos... 550
Monumento a D. João IV... 96
Total... 24:729
Na verba das escolas primárias, 1:696 contos representam obras e 3:116 compra de materiais.
Em edifícios públicos, inclue-se o anexo do Museu de Arte Antiga (701 contos), a ala oriental do Terreiro do Paço (877 contos), a Colónia Agrícola de Alienados de Coimbra (1:000 contos) e o novo Manicómio de Lisboa (216 contos). Do mobiliário fazem parte 920 contos para êste Manicómio, 608 contos para a Colónia Agrícola de Alienados de Coimbra, 841 contos para a Estação Agronómica Nacional e 996 contos para outros edifícios.
Nas construções prisionais gastaram-se 4:930 contos, que dizem respeito aos trabalhos seguintes:
Cadeias:
Contos
Beja... 35
Cantanhede... 256
Estarreja... 303
Felgueiras... 202
Fronteira... 200
Fundão... 39
Melgaço... 7
Montemor-o-Novo... 159
Moura... 100
Olhão... 389
Portimão... 171
A transportar... 1:861
Transporte... 1:861
Santa Cruz do Bispo... 600
Silves... 250
Campo de Trabalho de Pinheiro da Cruz... 219
Colónia Agrícola de Alcoentre... 70
Prisão-Escola de Leiria... 1:112
Materiais... 58
Administração e fiscalização e estudos... 760
Total... 4:930
Aplica-se neste caso o que atrás foi descrito sôbre as despesas de administração e fiscalização.
59. O custo dos diversos edifícios, incluindo as verbas gastas em 1943 até ao fim dêste ano, foi o seguinte:
[Ver diário original]
Além destas obras, algumas em via de conclusão, como o Estádio e o Manicómio de Lisboa, há outras em andamento, como o Palácio Foz, a que se fará maior referência no parecer do próximo ano.
Nos Paços do Duque de Bragança gastaram-se 2:720 contos até fins de 1943. Não se compreende bem a razão desta obra, que significa pràticamente a construção de um palácio novo, reprodução hipotética de outro no estilo da época.
A soma de 2:720 contos e o que ainda há que despender poderiam certamente ser aplicados em fim mais útil.
Junta Autónoma de Estradas
60. As dificuldades resultantes da guerra afectaram muito a acção dêste departamento e disso se ressentiu a conservação das vias públicas. Foram de duas ordens essas dificuldades. Em primeiro lugar a falta da importação de matérias de revestimento, resultante da carência de transportes, impediu a conservação normal das estradas. Em segundo lugar as incertezas no mercado dos preços e da mão de obra, além da falta de materiais e ferramentas, dificultou também a concorrência às empreitadas.
No parecer das contas relativo a 1942 já foram apontados os inconvenientes e então se sugeriu a necessidade de um esfôrço no sentido de debelar as causas.
Uma delas, a que diz respeito a impedimentos na importação de materiais asfálticos, não dependia exclusivamente da Junta: era devida à falta de transportes marítimos. A segunda poderia, até certo ponto, ser aliviada, porque provinha de causas internas.
Criou-se, por virtude da intensa actividade nos trabalhos de estradas desde há uma dúzia de anos, certo número de emprêsas especializadas na grande reparação e construção de estradas, e algumas dispõem já hoje de material necessário a trabalho eficiente. Por virtude de contratos realizados em épocas mais estáveis, houve prejuízos que poderiam ter sido atendidos, pelo menos em parte, logo que começou a desenhar-se a crise da alta de preços. Isso, até certa medida, teria evitado a paralisação de algumas obras urgentes e impedido maiores deteriorações, que neste género de trabalhos são cumulativas.

Página 50

344-(50)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Em 1942 as despesas ordinárias, orçamentadas e pagas foram as seguintes, em contos:
[Ver diário original]
Porém não foram inteiramente gastas as quantias recebidas do Tesouro. Os números que exprimem o que realmente foi pago são os seguintes, em contos:
[Ver diário original]
Houve, como se nota, um ligeiro aumento de pouco mais de 5:000 contos em relação ao ano anterior. Isso não significa, porém, grandes diferenças, visto ter tido lugar essencialmente na construção e grande reparação, a qual ainda não pode manter o ritmo de anos anteriores pelas razões apontadas e que se discriminam mais adiante.
As verbas relativas às despesas ordinárias podem discriminar-se do modo que segue:
[Ver diário original]
As diferenças para menos acentuaram-se sobretudo na construção e grande reparação. Atingiram, somadas as diversas utilizações, cêrca de 24:000 contos.
Os males desta grande baixa na despesa derivam do que se gastou na grande reparação, menos 19:000 contos em 1943 do que em 1941. Mas o fenómeno repetiu-se tanto na construção de estradas como nas pontes.
Embora as baixas sejam bastante menores — 2:800 e 2:325 contos —, elas têm repercussão na actividade normal da Junta.
Despesas extraordinárias
61. As despesas extraordinárias também foram menores. A Junta cobrou 5:000 contos para despesas de urbanização, menos 5:297 contos do que em 1942. E pagou, por fôrça daquela verba e de saldos de anos anteriores, as quantias seguintes, que representam trabalhos realizados durante o ano:
Contos
Estrada marginal... 1:772
Auto-estrada... 612
Viaduto de Alcântara... 2:194
Construções e percursos de turismo... 1:752
Construções e percursos de turismo... 1:675
Trabalhos em Vila Viçosa... 466
8:471
Correspondem, como indicam os números, 1:772 contos à estrada marginal e 2:806 à auto-estrada incluindo o viaduto.
Na estrada marginal continuaram os trabalhos de acabamento e liquidaram-se ainda despesas de expropriações. Os números são os que seguem:
Despesa em 1943
Expropriações... 168
Trabalho por administração... 1:502
Outras despesas... 102
1:772
Na auto-estrada a verba que avulta mais é a do viaduto, onde se gastaram durante o ano 2:194 contos. No conjunto, a despesa na auto-estrada em 1943 foi:
Contos
Trabalhos de empreitada... 2:166
Trabalhos de administração directa... 535
Outras despesas... 105
2:806
Aparecem repetidas, no quadro acima transcrito, verbas para percursos de turismo. A razão é a da origem dessas verbas. Uma proveio de inscrição especial de 10:000 contos, como prescrita pelo decreto-lei n.º 30:765; outra resultou de fundos especiais votados para atender a crises. Couberam êste ano à Junta 1:675 contos.
Até 1943, por fôrça das três rubricas mencionadas, a Junta recebeu as quantias que seguem:
[Ver diário original]
Como no ano anterior, a Junta recebeu parte da importância de 4:384 contos, destinada a compensar prejuízos de empreiteiros nos trabalhos das estradas a que se aludiu atrás.
Mas, como é evidente, a parte que lhe compete não é bastante para as compensações necessárias e há-de ser preciso estudar o assunto com a boa vontade de o atender na medida do possível.

Página 51

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(51)
Aquela verba ainda não se encontra totalmente gasta. Por conta dela despenderam-se, até 1943, as quantias seguintes:
[Ver diário original]
Até agora as duas obras mais importantes realizadas nos últimos tempos — a auto-estrada e viaduto e a estrada marginal, sôbre as quais se emitiu parecer em gerências passadas — importaram nas quantias seguintes:
[Ver diário original]
Estas verbas ainda não indicam o custo total das duas obras mencionadas.
Melhoramentos rurais
62. Todos os anos tem sido dado certo relêvo a estes serviços. O motivo não provém da importância das verbas despendidas, mas da influência que as obras a seu cargo podem exercer na vida dos pequenos aglomerados rurais.
Uma das reclamações insistentemente formuladas — a da concentração de verbas do Fundo de Desemprêgo e melhoramentos rurais e do pessoal disperso — foi atendida há pouco com a criação de um novo serviço, que é, no fim de contas, a soma dos que já existiam e representa um progresso digno de registo.
Há outros pontos que necessitam de ser considerados com urgência. O primeiro, e talvez o mais importante, diz respeito às demoras na execução de um caminho vicinal. Passam algumas vezes muitos anos até ser dado por acabado. O sistema de dotações por conta-gotas para pequenos troços traz inconvenientes e prejuízos, que precisam de ser evitados. O assunto já foi também debatido em pareceres de anos anteriores.
Por fim, convém relembrar a situação dos municípios mais pobres. A percentagem de comparticipações não pode, evidentemente, ser a mesma. Há zonas que, por sua pobreza, continuam sem comunicações, nem esgotos, nem água. As receitas dos municípios são de tal modo baixas que mal chegam para pagar os encargos permanentes, que estão em constante aumento. Vivem em regime de atraso. E quando acontece haver concelho vizinho com maiores receitas ou sem necessidade de executar obras que já existem, a transição entre elas parece mostrar imprevidência ou desgoverno, quando afinal o que existe é pobreza.
Por outro lado, torna-se necessária mais estreita coordenação entre os serviços que têm a seu cargo os caminhos vicinais e os das estradas. A conservação a cargo dos municípios é precária em muitos aspectos e conviria talvez que fôsse orientada pelo serviço público especializado.
Já também foi sugerido num dos últimos pareceres a interferência do Estado na habitação rural.
Em muitas regiões do País grande parte das moradias são rudimentares. Poderiam ser consideràvelmente melhoradas com rebocos e outras obras além de ligeiras alterações que permitissem a entrada de mais ar e de luz. O problema que se propõe não é o de construir casas novas, mas o de aproveitar as que existem.
O método de auxiliar a vida local neste aspecto não é fácil. O que na maior parte das vezes falta são os materiais: a cal e outras cousas.
A mão de obra poderia ser fornecida pelos habitantes das casas a melhorar. Talvez a inclusão de uma verba anual no orçamento, a título de experiência, a distribuir em comparticipações pelas autarquias locais ou comissões de melhoramentos, destinada a compra de materiais para efeitos de melhoria de habitações, pudesse produzir os resultados desejados.
O outro problema instante, tantas vezes mencionado, é o da higiene.
Têm sido mandados executar planos de urbanização em muitas localidades. E, entretanto, são proïbidas obras ou construções até definitiva aprovação dos mesmos planos. Mas estes levam anos a executar-se. E em terras importantes cessa a actividade construtora, ou reduz-se apreciàvelmente, por falta dos planos gerais.
Há necessidade de encontrar uma solução para êste estado de cousas e evitar transtornos vários.
O problema da urbanização tem sua dificuldade e precisa de ser bem ponderado. Em muitos casos, os seus efeitos hão-de reflectir-se depois. Êles dão carácter às povoações, asseguram o seu confôrto e higiene, são o fundamento da vida futura, em muitos aspectos. Não podem ser executados apressadamente. Mas parece ser possível evitar a paragem completa de obras numa cidade pela execução de planos parcelares, já que se torna impossível em pouco tempo a execução de planos gerais. Evitar-se-ão assim muitos inconvenientes e reclamações.
Êste assunto necessita de ser convenientemente revisto, sobretudo agora que novo organismo concentra todos os poderes e responsabilidades de uma obra extremamente interessante e que pode ser muito valiosa para o futuro das populações rurais.
As importâncias gastas por estes serviços, nos últimos anos, foram:
[Ver diário original]

Página 52

344-(52)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.° 140
As verbas das obras empregaram-se do modo que segue, em contos:
[Ver diário original]
Além disso, gastaram-se 6 contos em obras diversas, liquidadas por fôrça da verba votada para ocorrer a prejuízos do ciclone de Fevereiro.
A importância gasta anualmente não corresponde à dotação, que é de 10:000 contos por ano, além do que se desvia pelo Fundo de Desemprêgo para fins de melhoramentos rurais. Há actualmente saldo apreciável entre o que se recebeu e pagou.
[Ver diário original]
Serviços hidráulicos e eléctricos
63. A despesa ordinária nestes serviços foi em 1943 de 41:327 contos, mais 7:795 do que no ano anterior. Os números comparados são os seguintes:
[Ver diário original]
Os aumentos deram-se em despesas que têm compensação nas receitas: nos subsídios a juntas autónomas de portos e nas que têm contrapartida em receitas de particulares. Os dois somam 6:680 contos. O acréscimo real na despesa foi por êste motivo de cêrca de 1:000 contos. A verba de pessoal acusou um aumento de perto de 690 contos.
Despesas de material
64. A verba de estudos, que atingiu 2:095 contos, gastou-se do modo que segue:
[Ver diário original]
Nos estudos das bacias hidrográficas despenderam-se 1:168 contos, sendo 884 em serviços centrais e o restante nas bacias hidráulicas do Douro, Tejo, Mondego e Guadiana. Foram instalados limnígrafos em Ródão, Abrantes, Chamusca, Santarém e Muge, no Tejo, e na Régua e Escaramão, no Douro, e ainda no Lima e Cávado.
Também continuou a montagem de udógrafos em diversos pontos do País. Outros estudos incluem vários anteprojectos de esquemas hidráulicos e de regularização de rios e ribeiras, como o Lis, a Alpreada e outros. Os trabalhos das brigadas topográficas intensificaram-se êste ano.
Os gastos com as estradas submersíveis compreendem trabalhos efectuados em Gondarém (39 contos), no rio Soure (68 contos), na estrada-dique dos Vinte (36 contos), e ainda outros.
Nas obras marítimas e fluviais avultam o subsídio à Câmara Municipal do Pôrto para obras no colector geral de saneamento (198 contos) e um outro à Junta Autónoma de Estradas, com fim à execução de trabalhos no cais entre a Ponte de D. Luiz e Campanhã, na estrada marginal (515 contos).
Gastaram-se verbas em coberturas de ribeiras e vários trabalhos em diversos pontos do País, como ribeira da Portela, rios Mondego e Vouga, ribeiras do Livramento, Alenquer, Garvão, Cadoiço e S. Braz e nos barrancos da Bica, da Fábrica e do Carvoeiro.

Página 53

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(53)
Juntas autónomas dos portos
65. Os subsídios às juntas autónomas elevaram-se êste ano a 13:193 contos, divididos pelos diversos portos, nos quais, além disso, os serviços efectuaram certas obras à parte. O quadro que segue dá a despesa das juntas autónomas, assim como as respectivas receitas, em contos:
[Ver diário original]
Além do que se inscreve acima, foram gastas várias quantias em obras de menor importância. Entre elas podem citar-se a estacada de Seixas do Minho, a conclusão da doca de Caminha, o empedrado de Moledo do Minho, trabalhos na estrada marginal do Douro (65 contos), pôrto fluvial de Campanhã (75 contos), Alfândega Velha, praia de Carcavelos (70 contos), Costa do Sol (30 contos), esplanada de Monte Gordo (102 contos), estacada de Alcoutim (200 contos) e outras.
Despesas extraordinárias
66. O total das despesas extraordinárias feitas por êste organismo sobe a 28:114 contos e inclue, além dos portos, obras destinadas a aproveitamentos hidráulicos. Divide-se como se indica na coluna seguinte.
Portos... 22:225
Regularização de rios e defesa de campos marginais... 1:381
Aproveitamentos hidroeléctricos da bacia hidrográfica do Tejo... 4:508
28:114
A importância relativa a portos tem a aplicação seguinte:
1.ª fase:
Contos
Ponta Delgada... 646
Leixões... 756
Leixões... 1:463
Leixões (subsídio)... 1:338
Póvoa de Varzim... 1:385
Póvoa de Varzim... 1:200
2.ª fase:
Diversas obras e trabalhos... 72
Compras de guindastes e outra aparelhagem... 14:573
De todas estas verbas a mais importante refere-se a Leixões.
Até 1942 haviam sido gastos nas obras do pôrto de Leixões 244:786 contos. No fim de 1943 os números são os que seguem:
Até 1942... 244:786
Em 1943... 5:235
250:021
67. Nos aproveitamentos hidroeléctricos despenderam-se 4:508 contos, sendo 1:205 contos nos serviços centrais, 2:000 contos num subsídio à Junta Autónoma para construir uma estrada para Castelo do Bode desde Constância, e, finalmente, 1:303 contos para outra estrada de acesso ao mesmo local.
Das contas deduz-se o propósito de continuação das obras em portos secundários, que constituem a 2.ª fase do plano geral. Parece que podiam ter sido adiadas estas obras, necessàriamente caras, dadas. as, circunstâncias difíceis do momento presente, sobretudo no que diz respeito à aquisição de materiais. Além disso, as receitas necessitam de ser poupadas e já foram agravados certos impostos com o fim de avolumar receitas.
Ainda é tempo de retardar o plano geral da 2.ª fase dos portos até melhor oportunidade.
Quanto a aproveitamentos hidráulicos, nota-se que a parte mais importante da verba de 4:508 contos foi utilizada na construção de estradas de acesso, a Castelo do Bode (3:303 contos). Isto dá a impressão de estar definitivamente resolvida a execução imediata do aproveitamento do Castelo do Bode. O assunto é tratado com maior largueza no apêndice a êste parecer.
Caminhos de ferro
68. Continuam a aumentar as receitas do Fundo especial de caminhos de ferro em virtude do desenvolvimento considerável do tráfego. Êste ano, porém, além das receitas provenientes do Fundo, venderam-se materiais no valor de 14:455 contos, e que consistiam em máquinas, carris e outras cousas.
O total das receitas foi, por conseqüência, o que se lê no quadro da página seguinte.

Página 54

344-(54)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
[Ver diário original]
A subida do imposto ferroviário entre 1941 e 1942 fora de 11:304 contos e entre 1942 e 1943 foi de 13:588 contos. Juntando as diferenças nas vendas de materiais, encontra-se o aumento total, em relação a 1942, de 28:043 contos.
A evolução do imposto ferroviário desde 1937 é dada pelos números que seguem, em contos:
[Ver diário original]
Há-de notar-se ser menor a verba liquidada do que a cobrada. Isso provém do facto de terem sido recebidas em 1943 importantes receitas relativas ao ano de 1942.
As despesas a cargo do Fundo especial de caminhos de ferro, incluídas as da Direcção Geral e os encargos financeiros da sua responsabilidade, totalizaram 1943 as verbas do quadro da coluna seguinte.
[Ver diário original]
A diferença da despesa, ou 664 contos, para a receita total, foi entregue ao Estado.
A primeira conclusão que se tira do exame das cifras é a do grande acréscimo na verba de «Pagamento de serviços e diversos encargos», equivalente a 20:716 contos. As despesas de material também aumentaram apreciàvelmente em relação aos dois anos anteriores.
69. Vejamos em primeiro lugar como se gastou a verba de material. As aplicações foram as seguintes:
Contos
Estudos... 18
Construções... 82
Material circulante... 20:626
Materiais em depósito... 276
Oficinas do Barreiro... 102
Obras complementares... 7:055
Subsídios... 3
28:162
O que falta para perfazer 28:903 contos diz respeito às despesas privativas da Direcção Geral de Caminhos de Ferro.
Os trabalhos de construção encontram-se paralisados. Onde se deu aumento de despesa foi em material circulante. Adquiriram-se 500 vagões para os Caminhos de Ferro do Estado, dos quais se pagaram 300 pelas verbas do Fundo especial. Importaram em 20:488 contos.
A outra verba de certa importância diz respeito às obras complementares, que custaram 7:055 contos, assim divididos:
Contos
Balastragens e outras melhorias... 2:406
Pontes e aquedutos... 821
Estações... 3:161
Diversos... 667
Total... 7:055
A conservação e manutenção da via nos caminhos de ferro, que constituem encargo do Estado, já consumiram o produto de empréstimos elevados, como se referiu em outros pareceres. O que se realizou, embora seja bastante e represente apreciável esfôrço, está ainda longe do que é mester fazer, dadas as deficiências na construção e a necessidade de as remediar. Há ainda troços de linhas com material que precisa de ser substituído ou reparado, além da balastragem indispensável, em certas regiões. Para manter as linhas em estado de eficiência e segurança torna-se necessário gastar elevadas somas, que hão-de recair sôbre as receitas do Fundo.
A guerra tem atrasado os trabalhos de conservação na via e no material. Conviria, por isso, formular um plano de acção a pôr em prática nos anos próximos.
As despesas nas obras complementares mais importantes tiveram lugar na linha de cintura do Pôrto, nas linhas do Douro (1:466 contos), Minho (1:237 contos), Évora (1:984 contos) e sul (1:952 contos). O resto é constituído por pequenas verbas em diversos ramais e linhas.
O quadro que segue mostra o que, em resumo, se gastou em material:
[Ver diário original]
Encargos de empréstimos e garantias de juros
70. O desafôgo do Fundo determinado pela venda de materiais e aumento de receitas permitiu anular o pêso de certos empréstimos. Parece ter sido boa política esta, dadas as dificuldades do presente.
Foram liquidados alguns empréstimos na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência e no Tesouro Público.
As quantias amortizadas foram as que seguem:
Contos
Resgate de empréstimos ao Tesouro... 7:447
Resgate à Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência... 13:223
20:670

Página 55

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(55)
Com estas modificações, a conta «Encargos de empréstimos e garantias de juros» pode estabelecer-se como se lê na tabela da página seguinte.
[Ver diário original]
A economia derivou do reembôlso de capitais em débito, no total de 20:670 contos, que ainda se não fez sentir em cheio êste ano, visto êle ter sido efectuado quando se verificou o aumento das receitas e de terem, por conseguinte, sido pagos juros. Há despesas já em maior quantitativo nos anos futuros.
O Fundo especial de caminhos de ferro ainda continua a ter a seu cargo os empréstimos seguintes:
1) Câmara Municipal de Tomar;
2) Empréstimo de 100:000 contos para obras complementares, já parcialmente amortizado;
3) Empréstimo dos Caminhos de Ferro do Estado.
V.
A soma dos encargos foi reduzida em virtude dos pagamentos efectuados êste ano. Se houver grande deminuïção no tráfego depois da guerra, regressar-se-á à posição do período anterior a ela, visto a quási totalidade das receitas do Fundo ser constituída pelo imposto ferroviário.
Acentuou-se no ano passado a importância dos transportes na economia interna. As dificuldades do período da guerra mostraram essa importância. Se forem levadas a efeito a electrificação do País e a reorganização das indústrias e tantos outros melhoramentos tendentes a valorizar os nossos recursos e possibilidades agrícolas, a função dos caminhos de ferro há-de ser vincada pela intensificação dos transportes que de tudo resultará.
Comunicações rápidas e eficientes constituem uma das bases do renovamento económico, sem as quais nunca obras reprodutivas poderão produzir os frutos exigidos pelo progresso da vida social.
Administração Geral do Pôrto de Lisboa
Receitas
70. As receitas do pôrto de Lisboa subiram em 1943 por virtude de muito maior trabalho das oficinas. No restante os rendimentos deminuíram em quási todas as rubricas.
E até certo ponto isso não é de surpreender. O ano de 1943 foi um dos mais críticos da guerra, sobretudo no teatro europeu, e operações de envergadura no norte do Atlântico e Mediterrâneo dificultaram, mais do que em outra qualquer ocasião, as rotas marítimas. A actividade do pôrto de Lisboa ressentiu-se assim, apreciàvelmente, dos acontecimentos externos.
Milagre é que as repercussões não fôssem muito maiores. Manter as receitas durante a guerra em nivel mais elevado do que o anterior período significa que há um certo tipo de tráfego que é compelido pelas circunstâncias a procurar o único pôrto neutral seguro. E isso teve influência na sua vida financeira e permitiu certo número de despesas que, de outro modo, não poderiam ser realizadas.
As receitas ordinárias atingiram 44:170 contos e as extraordinárias alcançaram 2:966, sem contar com o empréstimo que, ao abrigo do decreto n.º 32:901, foi contraído para obras do aeroporto marítimo. Adiante se estudará com maior minúcia a utilidade actual dessas obras.
Os entrepostos e cais são ainda hoje a fonte de quási metade do total das receitas ordinárias e mantiveram-se apesar da crise de transportes.
A origem das receitas ordinárias consta do quadro que segue, em contos:
[Ver diário original]
O exame dos números demonstra que toda a melhoria foi obtida por fôrça do contrato de arrendamento das oficinas navais. Produziu êste ano 8:871 contos, que é o máximo obtido desde o início — mais 4:072 contos do que em 1942. Isto revela uma grande intensificação de trabalho, visto a renda das oficinas influir em alta percentagem nas receitas.
Houve acréscimo apreciável nas receitas dos rebocadores, que no ano de 1942 tiveram grande quebra. Tirando os entrepostos, que êste ano produziram 14:809 contos, mais 981 contos do que o ano passado, o resto deminuíu apreciàvelmente.

Página 56

344-(56)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Algumas das receitas englobam-se sob a rubrica de «Diversos». As verbas mais importantes são:
Contos
Fornecimento de água... 193
Embarque e desembarque de passageiros... 507
Baldeação e outras... 1:049
Dragagens... 13
Aluguer de muralhas e pontes... 347
Taxas diversas do pôrto... 708
Cábreas... 273
A considerável deminuïção notada teve lugar especialmente nas receitas de baldeação, que deminuíram de cêrca de 900 contos.
As receitas extraordinárias em 1943 alcançaram 2:966 contos. Não têm qualquer significado financeiro, visto que transitaram do saldo entre receitas e despesas ordinárias.
A sua distribuïção foi feita do modo seguinte:
Contos
Fundo de melhoramentos... 1:000
Fundo de seguros... 1:787
Fundo de assistência e desemprêgo... 133
Diversos... 41
Representam mais 1:000 contos do que o ano passado e foram utilizadas como adiante se verá.
Despesas
71. As despesas aumentaram muito e as maiores valias tiveram lugar em todas as rubricas orçamentais. Os números são os seguintes:
[Ver diário original]
No pessoal o acréscimo foi de 746 contos e deve-se a contingências da guerra.
No material o aumento atingiu quási 2:000 contos. Se se considerar a carência dos materiais e da mão de obra e a natureza das verbas que se inscrevem nesta rubrica, não há-de parecer exagerado êste desenvolvimento de despesa.
Os números são os seguintes:
[Ver diário original]
Como as cifras indicam, o acréscimo de 1:899 contos distribuiu-se por edifícios (aproximadamente 1:000 contos) e por carvão, que absorveu o resto, além de outras sobras de certa importância.
Realmente o combustível tem atingido preços que explicam bem os aumentos,
Nos edifícios há também a considerar a compra de ferro destinado às obras em curso, como estações marítimas e armazéns.
A verba dos edifícios, no total de 2:993 contos, decompõe-se assim:
Contos
Estações marítimas... 996
Compra de ferro... 1:502
Armazéns... 481
Diversos... 14
2:993
Como já foi largamento descrito em pareceres anteriores, construíram-se no pôrto de Lisboa duas estações marítimas: a de Alcântara e a da Rocha Conde de Óbidos. A primeira está concluída e já foi inaugurada e a segunda prossegue.
Foram estes pareceres de opinião que o pôrto de Lisboa não necessitava de duas estações marítimas, pelo menos no momento em que foram iniciadas.
As obras da 1.ª secção, a que já se aludiu por diversas vezes, terão de ser realizadas mais cedo ou mais tarde e delas hão-de resultar cêrca de 100:000 metros quadrados de bons terrenos.
Houve já quem sugerisse a idea de construir perto do Tejo a estação central de passageiros de Lisboa de modo a concentrar os diversos tráfegos.
A construção isolada de várias estações anulou porventura a exeqüibilidade desta idea, que merecia estudo consciencioso, porque poderia ajudar econòmicamente um problema interessante e que de idêntica maneira foi resolvido em diversas cidades marítimas.
As importâncias gastas em obras e edifícios por intermédio da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais subiram a 3:138 contos. Difere em 51 contos das cifras apresentadas pelo pôrto. Repartiram-se nos vários anos como se indica no quadro seguinte:
[Ver diário original]
As verbas mais importantes que constituem os diversos encargos e pagamento de serviços são as seguintes:
[Ver diário original]

Página 57

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(57)
Empréstimos
72. Tem vindo a subir a dívida do pôrto de Lisboa. Ela resulta de obras novas, que não podem ser liquidadas por conta das receitas.
Com efeito, estas obras são de natureza diferente, consideradas as circunstâncias em que são pagas. Umas liquidam-se por fôrça do excesso de receitas ordinárias sôbre as extraordinárias, isto é, por fôrça de saldos, e outras por meio de empréstimos contraídos no Tesouro Público por intermédio de uma conta corrente. As estações marítimas, os armazéns novos, que não correspondem ainda às necessidades do pôrto, e pequenas reparações constituem o primeiro grupo; as obras da 3.ª Secção e agora as obras do aeroporto marítimo são pagas por quantias adiantadas pelo Tesouro.
Para liquidação dos encargos dêstes empréstimos entrega a Administração do Pôrto, anualmente, certas verbas, que têm aumentado de ano para ano e que aparecem no capítulo das receitas no Orçamento Geral do Estado.
Às obras da 3.ª Secção corresponde, na conta de empréstimo, o débito de 68:929 contos, não se registando verbas gastas em 1943. Não está ainda pronta a obra, antes parece que foi suspensa.
Julga-se que é ocasião para começar o serviço regular do empréstimo adiantado pelo Tesouro para êste fim. Até 1943 transferiram-se para a conta do Tesouro com êsse destino 18:500 contos, uma grande parte dos quais deve ter sido absorvida por juros. Convinha, porém, fazer com a possível brevidade a discriminação dos encargos.
Algumas das obras que foram custeadas por empréstimos estão prontas; outras em via de conclusão. Há, para as contas do pôrto, vantagem em determinar qual a anuïdade precisa para fazer a liquidação do seu débito ao Estado e de esmiuçar que parte do total gasto lhe compete no rateio que naturalmente deverá ser feito entre a Câmara Municipal, o Estado e o próprio pôrto.
A dívida total do pôrto de Lisboa atingiu em 31 de Dezembro de 1943 o total de 86:741 contos. Houve, por conseguinte, o aumento de 6:539 contos em relação ao ano anterior, conforme se pode ver no quadro que segue, na coluna seguinte, em contos.
[Ver diário original]
Fizeram-se as amortizações contratuais nos empréstimos da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência e Junta do Crédito Público, mas houve que contrair novos encargos em virtude das obras do aeroporto marítimo que virá substituir o que existe actualmente. Gastaram-se assim 6:946 contos. As obras neste aeródromo fazem parte da regularização da margem do Tejo desde Santa Apolónia e constituem a 3.ª Secção.
73. A continuação das obras para além da Matinha, que parece estar projectada, não se justifica agora, porque as disponibilidades do pôrto não são infinitas.
A maior parte do tráfego aéreo, sobretudo o tráfego intercontinental, tem sido feito através do pequeno aeródromo de Cabo Ruivo. Os progressos do avião de rodas nos últimos tempos e a experiência da guerra parece tenderem a demonstrar que vai ser muito menor o tráfego por hidroaviões depois das hostilidades. Há quem afirme que estes serão suplantados por aqueles.
Já hoje se estão a construir aviões de rodas capazes de fazer a travessia directa em vôo comercial de Nova York a Lisboa e o prolongamento das pistas do aeródromo da Portela em vias de execução tende a satisfazer as necessidades dos voos transcontinentais. A utilidade de pistas mais compridas, aparente há já anos, até antes de se concluir aquele aeródromo, foi emfim reconhecida.
Construir no momento presente um aeródromo marítimo com o objectivo de servir o tráfego que tende a desaparecer ou, pelo menos, a reduzir-se consideràvelmente, parece não ser lógico nem económico.
O que existe, embora modesto, tem satisfeito as necessidades de um período de tráfego intenso — mais intenso do que aquele que porventura há-de seguir-se depois da guerra.
O momento actual não parece ser o melhor para encetar a construção de um largo aeródromo marítimo. As obras poderiam ser adiadas para ocasião mais oportuna. Conviria esperar os resultados da experiência depois da guerra e então se veria se se justificava ou não, no ponto de vista comercial, o dispêndio de largas somas na construção de um aeródromo que virá a ter muito pequeno movimento comercial caso venha a provar-se em definitivo as vantagens do avião de rodas. E, entretanto, o que está, com pequenos arranjos, se precisos, poderia continuar a responder às necessidades presentes.
Mas outra razão justifica esta política. As condições financeiras do pôrto não podem considerar-se más. Tem um débito de 86:000 contos e todos os anos vai liquidando os seus encargos com pontualidade. Há, porém, um grande número de despesas a levar a efeito para o transformar no que deve ser: um pôrto com condições para descarregar e carregar ràpidamente o tráfego e com a precisa capacidade para armazenar as mercadorias que a êle acorrem.
Se o pôrto não tomar as medidas necessárias para atingir êste fim, as suas receitas hão-de certamente deminuir.
Há que renovar grande parte da aparelhagem existente, comprar outra e construir mais armazéns. Tudo isto há-de trazer depois da guerra um aumento apreciável de despesas de primeiro estabelecimento, que só podem ser obtidas por meio de empréstimos.
Por outro lado as obras da 1.ª Secção preconizadas nestes pareceres e que têm carácter reprodutivo hão-de consumir mais de uma centena de milhares de contos.
A Administração do Pôrto ver-se-á então em frente de empréstimos elevados, com encargos que só com dificuldades podem ser liquidados por seus saldos. Não convém aumentar êsses encargos e quando, como no caso da construção do aeródromo, há vantagens até no adiamento das obras, impõe-se, financeiramente e no ponto de vista administrativo, êsse adiamento.

Página 58

344-(58)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
De contrário, o pôrto de Lisboa, que até agora tem conseguido com suas próprias receitas suportar as despesas, apesar de ter comparticipado em melhoramentos que o não atingem e em obras que não auxiliam as suas receitas, ver-se-á na contingência de pedir o auxílio do Tesouro para liquidação de seus encargos ou deixará de executar obras de maior importância e que estão no programa da sua Administração.
Aqui, como em outros serviços públicos, e já muitas vezes tem sido aconselhado nestes pareceres, impõe-se a execução de plano que aproveite todas as possibilidades do pôrto dentro dos modestos recursos de que dispomos, incluindo apenas obras com carácter estritamente utilitário e reprodutivo. Êsse plano tem de ter em conta as receitas da exploração, os saldos, os empréstimos, os encargos, tudo em face do movimento do pôrto, que nunca poderá atingir as cifras que tantas vezes têm sido visionadas, para serem, ano após ano, desmentidas pelas realidades.
Obras que não interessem directamente ao pôrto, embora feitas sem seu consentimento ou auxílio, devem ser liquidadas por verbas orçamentais independentes.
Os seus encargos não devem pesar sôbre as receitas do pôrto, porque lhe não dizem respeito. Aliás as exigências dos serviços impõem o gasto de elevadas somas em obras reprodutivas.
Consideradas as dificuldades, pode dizer-se que a Administração tem procurado melhorar os serviços — mas é necessário que não lhe sejam cerceadas as receitas indispensáveis para a continuação dessas melhorias.
Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones
As receitas
74. Há-de parecer à primeira vista que houve agravamento na vida financeira dos correios e telégrafos quando adiante forem lidos os resultados da exploração, que apenas acusam o saldo de 128 contos. Ião é, porém, assim, porque durante o ano de 1943 as receitas ainda subiram sem correspondente aumento das despesas.
A razão da aparente anomalia provém dos reembolsos por antecipação de empréstimos contraídos pelos correios e telégrafos, que foram liquidados por conta das receitas ordinárias.
Os correios, telégrafos e telefones têm desempenhado uma alta função política durante a guerra. Têm sido o intermediário entre os países beligerantes, e através dêles estabeleceram-se comunicações que aliviaram a sorte de muitas centenas de milhares de prisioneiros nos dois campos em luta.
E isto tem sido benefício mútuo e como tal imparcialmente reconhecido.
As receitas ordinárias dêstes serviços, nos últimos anos, têm vindo sempre a crescer, como poderá verificar-se, em contos, no quadro seguinte.
[Ver diário original]
É até certo ponto consolador êste estado de cousas nos correios e telégrafos, sobretudo nos tempos difíceis que o mundo atravessa.
O aumento de receitas, que começou a acentuar-se sensìvelmente desde o começo da guerra, deve-se a causas transitórias em sua maior parte, sobretudo naquelas que resultam do trânsito por Lisboa de correspondência de diversa natureza para a Europa. Contudo, é natural que, acabado o conflito, uma parte do tráfego postal se estabilize e que o desenvolvimento de carreiras aéreas através de aeródromos nacionais tenha suas repercussões na vida dos correios e telégrafos.
Êste aumento de receitas permitiu consolidar a situação financeira dêste departamento do Estado. Por fôrça delas se liquidaram obras e melhorias de muita importância, as quais, se não fôra assim, haveriam de constituir pêso morto durante largos anos. Mas repete-se ainda êste ano que não há lugar para grandes optimismos, porquanto as receitas hão-de descer para nivel bastante inferior ao actual, embora tudo indique se mantenham em nivel superior ao de antes da guerra.
Nos aumentos de receitas os serviços postais ocupam um lugar de relêvo, pois atingiram cêrca de 37:600 contos em relação a 1938, o último período anterior à guerra, e 7:000 contos relativamente a 1942.

Página 59

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(59)
Os números são os seguintes para os últimos anos:
[Ver diário original]
No que toca à relatividade dos acréscimos de receitas referentes a diversos serviços vê-se que, se não fôra o dos serviços postais, teria havido redução nas receitas em virtude de a deminuïção na telegrafia internacional ser da ordem dos 9:400 contos. Também neste caso, o decréscimo é mais aparente do que real, porque êle resultou do atraso nas liquidações de contas com países estrangeiros que utilizam os nossos serviços telegráficos. A receita devida no ano de 1943 deve entrar nos cofres da Administração em 1944.
Os telefones da rêde do Estado continuam a mostrar melhorias anuais. Ainda êste ano produziram mais 2:051 contos do que o ano passado, o qual já acusava receitas superiores em 13:600 contos, relativamente a 1940.
Pode dizer-se, sem favor, que na parte relativa a receitas o ano de 1943 foi bom, atingindo nêle os correios e telégrafos até agora o cimo de uma curva que vem subindo cada vez mais desde 1936; a partir dêste ano houve o acréscimo total de perto de 78:000 contos.
Dos 179:943 contos de receitas, mais de metade pertencem aos serviços postais.
O resto reparte-se pelos outros serviços nas proporções a seguir calculadas:
[Ver diário original]
Em relação a anos anteriores nota-se melhoria na percentagem das receitas dos telefones, que passou de 19,21 por cento em 1941 para 23,76 por cento em 1943, e deminuïção na telegrafia, que desceu de 22,25 por cento para 18,08 por cento. Foram já apontados os motivos.
As despesas
75. As despesas acompanham as receitas, porque, como adiante se há-de verificar mais minuciosamente, delas fazem parte amortizações, fundos diversos, além das da exploração. Foram as seguintes nos últimos anos:
[Ver diário original]
O grande aumento, em relação ao ano anterior, deu-se ainda na verba do pessoal, que atingiu o gasto de 72:710 contos, contra 68:479 em 1942.
Em parte êste acréscimo resulta da guerra, do excesso de trabalho que derivou de maior tráfego postal. Mas também é devido às melhorias de diversa natureza. Contudo, esta questão necessita de ser vigiada constantemente, porque, se amanhã vier a dar-se, como se prevê, redução nas receitas dêsses serviços, há-de ser bastante mais difícil obter correspondente ou proporcional deminuïção nos encargos.
Os números para as despesas de 1943 são os seguintes, em contos:
Contos
Pessoal... 72:710
Material... 7:646
Pagamento de serviços e diversos encargos... 98:501
Anos económicos findos... 958
179:815
Chega a surpreender que não tivesse havido maior aumento na despesa de material, dada a carestia dos preços. Há-de ver-se, quando adiante fôr estudada a aplicação de empréstimos, que também se mantiveram as verbas na ordem de grandeza do ano anterior, mas aqui, certamente, devido a falta de material.
Pagamento de serviços e diversos encargos
76. Nesta matéria houve êste ano consideráveis modificações, que resultaram essencialmente da liquidação antecipada do empréstimo ao Tesouro Público. Em vez de lançar o excesso de receitas no Fundo de reserva, que vinha a subir com o desvio para êsse efeito de elevadas quantias desde o começo da guerra, foi atribuída à liquidação e juros de empréstimos a soma de 45:000 contos — mais 41:842 contos do que no ano anterior.

Página 60

344-(60)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
O total gasto por pagamento de serviços e diversos encargos consta do quadro seguinte, em contos:
[Ver diário original]
O Tesouro foi reembolsado de 55:000 contos. Destes saíram das receitas ordinárias 42:345 contos, provindo os restantes 12:655 contos das disponibilidades do Fundo de reserva.
Pode dizer-se que uma grande parte dos resultados de 1943 e de outros anos serviram para liquidar as obras e extensões nos serviços, materializados em linhas, aparelhagem e edifícios.
Adiante se verificará a situação dos empréstimos dos correios e telégrafos, o seu total e o saldo em débito.
Nas outras verbas há que salientar o aumento contínuo nas despesas de comunicações que resultam do aumento do tráfego e acusam êste ano mais 5:969 contos do que o ano passado e o agravamento na despesa dos reformados. As quantias entregues à Caixa Geral de Aposentações passam de 8:772 contos para 10:044 contos.
O abono de família consumiu cêrca de 2:700 contos.
Da política de reembôlso de empréstimos resultou, por um lado, menor integração no Fundo de reserva, que aliás já soma 154:414 contos, e do mesmo modo menor transferência para o Fundo de primeiro estabelecimento.
Exploração
77. Os resultados da exploração foram êste ano de 128 contos, muito menos do que nos anos anteriores.
Não quere isto significar, porém, que os resultados do ano tivessem piorado. Na conta de exploração incluíu-se a amortização das instalações e durante o ano de 1943 pagaram-se, como se notou atrás, 55:000 contos de encargos, antecipando amortizações. A maior parte recaiu sôbre os serviços telefónicos, que consumiram a quási totalidade dos capitais adiantados sob a forma de empréstimos pelo Tesouro. Na verdade, o deficit de 12:996 contos apresentado na conta dos serviços telefónicos não corresponde à realidade. Estes serviços dão apreciável lucro — que se há-de acentuar com o tempo à medida que forem desaparecendo os encargos de primeiro estabelecimento.
Apesar dos fortes reembolsos de empréstimos, a conta da exploração ainda fechou com o saldo positivo de 128 contos.
Os resultados da exploração, nos últimos anos, constam do quadro que segue, em contos:
Resultados de exploração
[Ver diário original]

Página 61

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(61)
Fundos de reserva
78. Os Fundos de reserva e de primeiro estabelecimento, constituídos em obediência à lei, não sofreram êste ano acréscimo apreciável pelas razões atrás expostas. O seu movimento, nos últimos anos, foi o seguinte:
[Ver diário original]
Em 1941, 1942 e 1943 b Fundo de reserva atingiu as quantias de 83:294, 140:695 e 154:415 contos, respectivamente.
Apesar dêste gradual aumento nas reservas, tem sido paga a renda anual de 3:000 contos ao Estado e amortizadas grandes verbas na conta de empréstimos.
O Fundo de reserva em 31 de Dezembro de 1943 era representado por materiais, depósitos e numerário, do modo seguinte:
Contos
Material em armazém... 30:366
Títulos de crédito... 99:137
Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência... 4:157
Conta corrente com o Tesouro... 6:477
Amortização de empréstimos... 12:655
Caixa... 1:623
Total... 154:415
Empréstimos
79. No início da reorganização dos correios e telégrafos, depois da reforma de 1937, foi estabelecido que os fundos necessários seriam fornecidos pelo Estado. E, a partir desta data, a conta de empréstimos tem vindo a aumentar até atingir 118:319 contos em 1943. Os números, repartidos por vários anos, são os seguintes:
[Ver diário original]
Como se verifica do quadro que acaba de se transcrever, a maior parte dos empréstimos foi destinada a instalações telegráficas e telefónicas, sobretudo às últimas, cabendo cêrca de um têrço do total a edifícios.
Em 1943, em virtude da abundância de receitas e da soma já desviada para fundos de reserva, que, como se viu, totalizavam 154:415 contos, foi resolvida a amortização parcial dos empréstimos da 1.ª série, que somavam 100:000 contos, tendo sido antecipada neste ano a liquidação de metade e fixado o máximo de 319:300 contos à 2.ª série, com um período de dez anos de conta corrente.
Instalações
80. Durante o ano de 1943 gastaram-se 17:314 contos em novas instalações, sendo 14:370 contos em linhas telegráficas e telefónicas, 2:944 contos em edifícios e 1:005 contos em outras utilizações.
O custo dos edifícios dos correios, completados em 1943, e as quantias despendidas no mesmo ano constara do quadro que segue, em contos, que também dá o total, corrigido, gasto pela comissão dos novos edifícios dos correios e telégrafos:
Importâncias despendidas pela Comissão dos Novos Edifícios para os CTT, em execução da lei n.º 1:959
[Ver diário original]

Página 62

344-(62)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
[Ver diário original]

Página 63

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(63)
MINISTÉRIO DAS COLÓNIAS
81. Pelas razões que adiante serão expostas, o total das despesas dêste Ministério acusa um aumento de 1:389 contos, mais 600 contos que não foram gastos, por não se terem realizado as despesas de viagens a que se aludiu no parecer do ano passado.
Os números para todo o Ministério são:
[Ver diário original]
No Gabinete do Ministro estão incluídos 691 contos para despesas de correios e telégrafos. As comunicações com o ultramar fazem-se hoje quási exclusivamente pelo telégrafo em virtude da situação anormal que atravessamos. Além do pessoal, a verba mais saliente diz respeito a vencimentos, que importaram em 87 contos.
Administração Política e Civil
82. Os gastos dêste departamento podem decompor-se do modo que segue, em contos:
[Ver diário original]
Os subsídios referem-se a missões religiosas nas diversas províncias africanas e ao Instituto Ultramarino.
Fomento colonial
83. As despesas desta Direcção Geral subiram a 8:426 contos, assim distribuídos:
[Ver diário original]
As verbas de pessoal e material mantiveram-se. Em pagamento de serviços e diversos encargos inscreveram--se várias despesas, que merecem menção especial.
São as seguintes:
[Ver diário original]
As garantias de juros dizem respeito aos caminhos de ferro de Mormugão, na Índia, que, segundo o orçamento, são de £ 39:000, ou 3:919 contos, e ao caminho de ferro de Amboim, que correspondem a 2:130 contos.
Os encargos de soberania incluem a despesa com as picadas na fronteira de Angola, ou 100 contos, e as despesas com as brigadas da Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais. Foram orçamentados para estas últimas 1:715 contos, tendo sido gastos 1:630.
As verbas destinaram-se a missões de fronteiras, missão hidrográfica de Angola e missões científicas diversas.
Tem sido possível, apesar de as verbas não serem por aí além, fazer obra muito útil, tanto em Angola, como em Moçambique; e já foi aprovado o plano tendente a executar as investigações e trabalhos necessários à valorização dos territórios de além-mar.
Agora que muito se fala na utilização de vastos recursos que se supõem existirem no continente africano, os trabalhos realizados já e outros que urge executar hão-de permitir esclarecer as possibilidades dos dois domínios portugueses mais importantes.
A triangulação de Moçambique está hoje bastante adiantada e já se iniciou a de Angola. Talvez fôsse de vantagem reforçar as verbas de modo a tornar possível levantamentos mais rápidos e económicos, como é corrente na Europa e até em colónias. Pelo processo actual levará muitos anos e custará muito mais cara a execução da carta de Angola.
Também se organizaram, ou estão em vias de organização, missões para outros fins — como o estudo da fauna e da flora, da zoologia e etnografia, e é bom que

Página 64

344-(64)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
as verbas para êste efeito não sejam restritas até ao ponto de impedir o trabalho útil que sempre, mas sobretudo no momento actual, representa a ocupação científica do nosso império ultramarino.
As colónias têm nos anos recentes comparticipado nesta cruzada e espera-se que continuem a envidar esforços no sentido de tornar mais e melhor conhecidas, no ponto de vista económico e científico, as terras portuguesas de África.
Direcção Gera] de Fazenda das Colónias
84. As despesas desta Direcção Geral pesam pouco no orçamento da Metrópole. Foram as seguintes em 1943:
[Ver diário original]
Em pagamento de serviços e diversos encargos inscreveram-se, e por esta rubrica se pagaram, encargos de Timor na metrópole, no total de 904 contos. Foi esta verba que avolumou a despesa êste ano.
As outras despesas do Ministério das Colónias foram as seguintes:
[Ver diário original]
Há, diversos estabelecimentos dependentes do Ministério, mas pagos pelo orçamento da metrópole só há dois: o Arquivo Histórico Colonial e a Escola Superior Colonial.
O Arquivo Superior Colonial gastou 161 contos em 1943, dos quais 146 contos em pessoal, 10 contos em material e 5 contos em diversos encargos.
A despesa de material parece, na verdade, ser bastante limitada. É sua missão classificar documentos, que constituem um dos mais valiosos subsídios para o estudo do nosso passado histórico. Perdeu-se com os anos preciosa documentação e ainda hoje se encontram dispersos pelo País, e às vezes em péssimas condições de conservação, manuscritos que necessitam de ser cuidadosamente arquivados. Nesta matéria há ainda muito que fazer e seria de grande vantagem aproveitar as boas vontades que já hoje se manifestam no sentido de, com esfôrço financeiro de maior importância do que o actual, pôr mais ràpidamente em ordem e bom recato toda a valiosa documentação dispersa. As contas do Arquivo Histórico Colonial mostram sobretudo pobreza nas verbas de material e pagamento de serviços, sobretudo na parte relativa a publicidade. Embora tenham sido ùltimamente editados alguns importantes estudos sôbre o Império, há certamente matéria neste Arquivo que merece publicação.
Escola Superior Colonial
85. Outro estabelecimento dependente do Ministério que necessita de mais cuidado é a Escola Superior Colonial. Como todas ou quási todas as escolas de ensino superior, a que se refere às colónias precisa de ser adaptada às realidades do momento presente.
Já antes da guerra o interêsse pela África da parte de certo número de países europeus era um facto que se não limitava apenas à exploração das suas possibilidades económicas, embora isso constituísse um grande incentivo para estudos da mais variada natureza.
No estágio actual da vida das colónias portuguesas torna-se urgente o envio de funcionários e colonos altamente especializados nos diversos aspectos da sua vida política, económica e social. Lidar com populações incultas e semi-civilizadas, apreender os desejos e necessidades, adaptar o seu grau de entendimento e concepção da vida às realidades da nossa civilização, tudo isto impõe conhecimento primário das colónias e dos povos que as habitam. E êsses conhecimentos só podem ser adquiridos numa escola convenientemente dotada e apetrechada, que consiga pela experiência e doutrina inocular nos alunos a vontade e desejo de adaptação e progresso, que são absolutamente essenciais a quem queira produzir trabalho sério no ultramar.
Ainda não existe em Lisboa, na capital do Império, um instrumento prático de educação colonial que em conjunto e acôrdo com a Escola Superior Colonial ofereça os meios experimentais de criar a mentalidade dos que vão servir o Império longe da metrópole.
Se fôsse possível fundar em Lisboa um instituto imperial à semelhança do que existe no primeiro império do mundo, com mostruários permanentes das possibilidades económicas das colónias, que são muitas e variadas, provido de meios que mostrassem os costumes e hábitos das diversas raças que as habitam, e documentação actualizada da etnografia, antropologia, fauna, flora, clima e tantos outros ramos do saber, mais fàcilmente se conseguiria inocular no espírito do português europeu a mentalidade imperial que, sendo na verdade, como é, hoje, um sentimento, quási uma intuïção do povo, poderia ser aproveitada para canalizar para África muitas energias que estiolam improdutivamente na metrópole.
O interêsse despertado nos últimos tempos, até nas camadas populares, por manifestações coloniais de diversa natureza, prova as possibilidades da criação de um organismo educativo imperial, mixto de exposição, propaganda, estudo e investigação, a trabalhar em acôrdo com, por exemplo, a Universidade de Lisboa, onde uma Escola Colonial, reorganizada, tivesse o seu lugar.
86. A despesa da Escola Superior Colonial, em 1943, foi de 465 contos, assim divididos:
Contos
Pessoal... 385
Material... 7
Pagamento de serviços e diversos encargos... 73
465
A freqüência nos últimos anos andou à roda de 200 alunos, chegando a atingir já 350 em 1941-1942. 7 contos para despesas de material é, evidentemente, muito pouco. E em diversos encargos a renda da casa pesa com 60 contos.
A qualidade do trabalho de um instituto desta natureza que em despesas de material apenas consome 7 contos, não pode naturalmente produzir os frutos que são exigidos pela nossa situação de potência colonial de primeira categoria.
Em diversos pareceres, ao serem analisadas as despesas do Ministério da Educação Nacional, se manifestou a opinião da necessidade de grande reforma nos estabelecimentos universitários que dessem maior relêvo ao ensino experimental. Se porventura vier a fazer-se essa reforma, não deve ser esquecida a Escola Superior Colonial, que pode desempenhar, se convenientemente

Página 65

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(65)
apetrechada e orientada, um lugar de primeira grandeza no desenvolvimento económico e cultural do Império Português.
87. As despesas totais dêste Ministério foram:
Contos
Despesas ordinárias... 19:194
Despesas extraordinárias... —
Farolagem e balisagem da carta de Angola... 1:520
20:714
Despesas a cargo das Colónias
88. Além das despesas do Ministério contabilizadas no orçamento da metrópole, os govêrnos das diversas dependências do ultramar contribuem com subsídios ou cota parte para a manutenção de serviços que interessam a todos.
Os organismos seguintes receberam em 1943 as verbas adiante indicadas:
Contos
Conselho do Império Colonial... 501
Instituto de Medicina Tropical... 501
Hospital Colonial... 374
Depósito Militar Colonial... 443
Jardim Colonial... 318
Agência Geral das Colónias... 2:553
A verba maior — a da Agência Geral das Colónias — destina-se aos gastos da Agência (foram orçamentados 1:751 contos) e a despesas com a publicação de separatas de legislação colonial.
Cada um dos territórios do ultramar concorre proporcionalmente com uma percentagem do custeio dos organismos acima mencionados. Êles, na verdade, fazem parte integrante da administração colonial e desempenham, sobretudo os três primeiros, uma função muito importante que conviria desenvolver, tanto no Instituto de Medicina Tropical como no Hospital Colonial.
As colónias inscreveram no seu orçamento e pagaram as verbas seguintes:
Contos
Cabo Verde... 89
Guiné... 120
S. Tomé e Príncipe... 43
Angola... 1:071
Moçambique... 1:983
Índia... 205
Macau... 198
Os subsídios concedidos por conta das colónias foram destinados à secretaria (49 contos), à associação de socorros mútuos dos funcionários (25 contos), ao Jardim Zoológico (476 contos), ao Instituto Ultramarino (33 contos), aos militares tuberculosos (133 contos), à Sociedade de Geografia (60 contos), a intercâmbio escolar (14 contos), ao Colégio de Missões de Tomar (5 contos), aos padres seculares portugueses (60 contos), a franciscanos (80 contos), à corporação missionária de padres seculares (50 contos) às irmãs franciscanas (120 contos), aos beneditinos (50 contos) e às Irmãs Hospitaleiras Portuguesas (150 contos).
As missões estão desempenhando nas colónias uma tarefa altamente civilizadora e patriótica.
Os subsídios que lhe são destinados, embora pequenos, representam o reconhecimento da obra executada.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO NACIONAL
89. As despesas do Ministério da Educação Nacional aumentaram em 1943 cêrca de 12:000 contos em relação a 1942.
Desde 1930-1931 o acréscimo foi de perto de 60:000 contos.
O desenvolvimento da despesa tem sido gradual.
O maior salto, porém, deu-se em 1943 e teve lugar em quási todas as rubricas, embora no ensino técnico se dêsse deminuïção de 5:378 contos por motivos que adiante serão explicados.
Os números para as diversas dependências do Ministério são os seguintes, em contos:
[Ver diário original]
A subida de 11:732 contos, notada no ensino superior e artístico, diz respeito em grande parte ao facto de ter sido inscrito êste ano, neste capítulo, o ensino superior técnico.
Nos anos anteriores fazia êle parte da rubrica «Ensino técnico», que, por êsse motivo, acusa a deminuïção de 5:378 contos. Adiante se farão maiores referências ao assunto.

Página 66

344-(66)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Secretaria Geral
90. A despesa dos serviços que fazem parte da Secretaria Geral, e dos subsídios por êles concedidos, aumentou 600 contos, perfazendo o total de 10:913 contos. Os números discriminados, relativamente a subsídios, são os seguintes:
[Ver diário original]
A obra da Mocidade Portuguesa tem produzido bons resultados, e por isso se recomenda o refôrço da verba se fôr preciso.
Os aumentos deram-se na rubrica «Subsídios e outros encargos» e em o Diversos», e nestes foi devido essencialmente ao acréscimo de 300 contos no subsídio concedido à secção masculina da Mocidade Portuguesa e de 500 contos ao que recebe a Obra das Mãis. Seria também de vantagem reforçar a verba das cantinas escolares.
91. Das outras quantias importantes merecem menção o Instituto António Aurélio da Costa Ferreira, que gastou 473 contos, contra 469 em 1942, e o Instituto para a Alta Cultura com a importância de perto de 2:500 contos. Neste último as verbas tiveram o destino seguinte:
Contos
Pessoal... 100
Material... 12
Encargos... 2:366
2:478
Nos encargos inclue-se:
Bolsas de estudo:
Contos
Fora do País... 500
Dentro do País... 315
Subsídios a centros de estudos... 270
Serviço de educação artística... 175
Subsídios para expansões culturais... 570
Total... 1:830
Além destas verbas, há outras de menor importância, todas relativas à nossa expansão cultural.
Ensino superior e artístico
92. Inscreve-se êste ano, pela primeira vez, na secção do ensino superior, a parte correspondente ao ensino superior técnico, que inclue o Instituto Superior Técnico, o Instituto Superior de Agronomia, a Escola de Medicina Veterinária e o Instituto de Ciências Económicas e Financeiras.
As comparações a fazer com os anos anteriores devem ter em vista êste facto.
O total da despesa do capítulo é de 50:015 contos. Se forem excluídos os gastos das escolas mencionadas acima, ou 8:254 contos, a diferença representa a quantia comparável com a do ano anterior, ou seja de 41:761 contos em 1943 e 38:282 contos em 1942. O aumento foi assim de 3:479 contos.
Quando se pretender fazer a comparação das verbas dos dois anos, devem levar-se em conta estas diferenças.
O quadro seguinte exprime com minúcia a discriminação das diversas verbas.
[Ver diário original]

Página 67

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(67)
[Ver diário original]
Estes números não incluem a despesa feita com as escolas de ensino técnico superior, que, como se viu, se inscreve êste ano neste capítulo.
Ensino universitário
93. A despesa de cada uma das Universidades, depois de excluídos, na de Lisboa, o Hospital Escolar e o Instituto Bacteriológico Câmara Pestana, foi a seguinte:
[Ver diário original]
O maior aumento deu-se entre 1941 e 1942 e foi devido à remodelação dos vencimentos do professorado universitário.
O exame das cifras mostra que as poucas modificações sensíveis que se deram entre 1942 e 1943 referem-se ao Hospital Escolar de Lisboa. Os seus gastos subiram de 6:201 contos para 7:480, e êste aumento é perfeitamente explicável pelo acréscimo no custo de produtos farmacêuticos. O diverso material não especificado passou de 1:590 contos em 1942 para 2:065; e a alimentação, vestuário e calçado dos doentes passou de 1:650 contos para 2:300. E estes reforços nas verbas não devem ter trazido grande desafôgo à vida precária do Hospital. Também se deu uma pequena diferença para mais na despesa do Instituto Bacteriológico Câmara Pestana por motivos idênticos.
Quási tudo o que a mais gastou a Universidade de Coimbra pertenceu também à Faculdade de Medicina, provàvelmente por motivos idênticos.
A comparação do gasto total do ensino superior, nos dois anos de 1942 e 1943, mostra não ter havido sensível reforço de verbas, além das que foram exigidas pelas próprias circunstâncias que resultaram da carestia da vida, como nos hospitais e certos institutos de investigação.
Por diversas vezes êste assunto tem sido tocado nos pareceres e espera-se que numa possível remodelação do ensino superior se encontre meio de dotar melhor os instrumentos de trabalho experimental.
A instrução artística despendeu mais 855 contos do que no ano anterior e isso teve origem em maiores gastos no Teatro Nacional D. Maria II e no Teatro de S. Carlos. A maior parte da verba foi absorvida por êste último. A instrução artística despendeu, nos últimos anos, as quantias seguintes:
[Ver diário original]

Página 68

344-(68)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Ensino técnico
94. No ensino técnico incluem-se as escolas comerciais, industriais e agrícolas. Êle importou, não contando com o ensino superior, que êste ano passou a fazer parte do capítulo que trata do ensino universitário, em 24:923 contos, sem as despesas privativas da Direcção Geral, no total de 337 contos. Os números aproximam-se dos da gerência anterior.
As mesmas escolas haviam gasto o ano passado 22:361 contos. Houve, por conseqüência, melhoria nas dotações, que teve lugar em grande parte no Instituto Industrial de Lisboa, como há-de ver-se adiante. Trata-se da compra do edifício onde se achava instalado o Instituto, na Rua Buenos Aires. A verba de imóveis foi reforçada para 1:800 contos, em vez de 4 em 1942. Tirando esta importância, que por si só quási absorve o aumento total, restam apenas cêrca de 700 contos, que se distribuem pelas variadas escolas que fazem parte desta Direcção Geral.
Os números são os seguintes:
[Ver diário original]
Para dar melhor idea da distribuïção das verbas, juntaram-se as que pertencem ao mesmo grau de ensino. Em comparação com os dois últimos anos, as cifras seguintes exprimem os aumentos relativamente a cada um dêsses graus.
Se fôr exceptuado o aumento de 1:792 contos no Instituto Industrial de Lisboa, todo absorvido pela compra do imóvel onde se encontra instalado, a única variação digna de nota teve lugar nas despesas com diversas escolas e resultou da verba de material.
Os dois institutos industriais de Lisboa e Pôrto gastaram, em 1943, as verbas seguintes:
[Ver diário original]
As importâncias relativas a trabalhos práticos são muito pequenas. As das matérias primas e produtos acabados, ou meio acabados, para usos industriais foram de 11 contos, no de Lisboa, e 18 no do Pôrto; e a despesa de fôrça motriz foi de, respectivamente, 3.500$ e 3.000$. E se há necessidade de oficinas e laboratórios bem apetrechados e de constante actividade em trabalhos práticos em qualquer grau de ensino técnico, o médio industrial é certamente um dêles.
95. Nas escolas industriais e comerciais gastaram-se as verbas seguintes:
[Ver diário original]
As matérias primas e produtos acabados, ou semi-acabados, para usos industriais e a fôrça motriz importaram, respectivamente, em 257 e 51 contos para todas as escolas industriais, industriais-comerciais e comerciais do País.
O ensino médio agrícola custou, em 1943, 2:939 contos e inclue as Escolas de Regentes Agrícolas de Coimbra, Santarém e Évora. A despesa dividiu-se como segue:
Contos
Coimbra... 982
Santarém... 976
Évora... 981
2:939
Estas escolas têm internato e as despesas com a alimentação, em cada uma delas, anda à roda de 250 contos.
Em todas a grande despesa é a de pessoal, que subiu a 479 contos em Coimbra, 486 em Santarém e 467 em Évora.
Ensino elementar agrícola só é oferecido na Escola Prática de Agricultura de Santo Tirso e na de Alcobaça.
Existem, na verdade, postos agrícolas e diversas estações agrárias espalhadas pelo País, em Dois Portos, Mirandela e em outras regiões, mas é problemática, com a possível excepção de um ou dois, a sua influência na vida agrícola do País. E, contudo, êles podiam exercer uma acção bastante interessante e suprir as faltas que ainda se notam no ensino agrícola.

Página 69

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(69)
Ensino liceal
96. A despesa do ensino secundário nos liceus atingiu êste ano 20:046 contos, mais 307 do que em 1942 e mais 2:440 do que em 1931-1932. Não se pode dizer que seja bem dotado êste grau de ensino, dada a grande freqüência de muitos liceus. Logo que estejam em uso os novos edifícios, há-de ser necessário reforçar as dotações.
Os novos liceus são na maior parte edifícios ricos, onde se utilizaram materiais caros, como mármores e outros. Hão-de requerer despesa de conservação elevada, dado por demais o fim a que se destinam. Talvez tivesse podido haver maiores economias quando se delinearam os planos. Em geral o arquitecto tende para uso de materiais caros, sobretudo quando há possibilidades financeiras de os usar. E daí resulta que, nos últimos tempos, em obras do Estado, se utilizaram materiais que poderiam ser substituídos por outros mais económicos e que desempenhariam certamente fim idêntico.
Tem de se construir com solidez para o futuro. As obras agora realizadas para fins educativos hão-de durar muitos anos e tudo o que fôr feito no sentido de amplidão e requisitos pedagógicos que venham de encontro ao progresso deve ser feito.
Outro ponto, que convém também acentuar, é o das modificações nos projectos uma vez encetados. Quando essas modificações são leves, não haverá porventura grandes prejuízos; quando, porém, elas até certa medida alteram o traçado primitivo, a questão pode ser mais grave.
A despesa do ensino liceal discrimina-se do modo que segue:
[Ver diário original]
O que se destina a material para todos os liceus anda à roda de 900 contos e pode dividir-se do modo que segue: aquisições de utilização permanente 249; conservação de imóveis e móveis 329; material de consumo 325.
Ensino primário
97. Analisaram-se, no parecer das contas relativo a 1942, alguns números do censo de 1940 que dizem respeito às taxas de analfabetismo e verificou-se então que para o continente e ilhas adjacentes a taxa era naquele ano de 49 por cento. Havia deminuído 12,8 por cento nos dez anos que decorreram entre 1930 e 1940.
O Estado vem procurando reduzir essa taxa e tem dotado quási todos os pequenos núcleos habitacionais do País com postos escolares, além das escolas primárias que se mantêm nas sedes de freguesia e ainda em outros lugares importantes. E é natural que o próximo censo de 1950 acuse uma deminuïção mais pronunciada.
O exame das contas mostra que o despesa tem aumentado, talvez não tanto como seria de desejar e o grande atraso neste aspecto da vida nacional impõe, mas, em todo o caso, de 1930-1931 a 1941, o aumento na despesa do ensino primário indica uma maior valia de 22:500 contos, não incluindo o magistério primário, nem a inspecção nem os serviços centrais.
Por outro lado está a fazer-se um esfôrço digno de nota no sentido de construir casas próprias para o ensino e vão acabando pouco a pouco instalações que, por falta de outras, deviam há muito ser postas de parte.
Notam-se ainda meios insuficientes de atender ao ensino de adultos e até em Lisboa há campo vasto para o estabelecimento de cursos nocturnos que venham suprir falhas que não deviam existir.
Sabe-se, e o exame das cifras o confirma, que a alta taxa no analfabetismo é devida em grande parte ao número de analfabetos de idades superiores a 20 ou 30 anos e nos grandes centros muitos dêles, e talvez a sua grande maioria, de bom grado seguiriam um curso nocturno se fôssem oferecidas facilidades e incentivos.
Uma vez reduzida a taxa correspondente a essas idades, o problema seria simplificado. Já o ano passado se insistiu no princípio de que a questão do analfabetismo não pode ser resolvida apenas pelo Estado.
Todos os problemas humanos são, complexos e graves. O homem pode ser encaminhado para a escola nocturna se lhe forem mostradas claramente as vantagens de saber ler. Os pais enviariam os seus filhos às escolas se lhes fôssem dadas facilidades para isso.
Já vão rareando, até nos lugares mais longínquos aqueles que preferem extrair rendimento da actividade dos filhos em idade escolar em vez de os mandar à escola. E, se fôr feita propaganda persistente nos locais pelos professores e, sobretudo, por pessoas gradas da terra, será fácil convencê-los da necessidade de instruir os filhos.
O problema do analfabetismo é daqueles que não podem ser resolvidos apenas pela criação das escolas e pelo seu funcionamento. Há necessidade de obrigar à sua freqüência regular, e não esporàdicamente, como muitas vezes acontece.
O País inteiro tem de colaborar nesta cruzada em prol da educação elementar, para que cada um possua a arma mais poderosa até hoje conhecida para o triunfo na vida e para que atenue de vez, nas estatísticas e referências internacionais, a cifra do analfabetismo português, que, ao lado de realizações do ingente esfôrço da Nação noutros aspectos da vida, representa uma terrível mancha negra. Todos, desde os mais humildes aos mais poderosos, devem comparticipar no esfôrço de dominar a cifra do analfabetismo, porque nesse pequeno esfôrço que lhe é pedido há vantagem para a Nação no presente e no futuro. Com a elevada percentagem de analfabetos de agora nunca o País atingirá o grau de progresso social necessário.

Página 70

344-(70)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
As verbas relativas ao ensino primário, nos últimos anos, foram as seguintes:
[Ver diário original]
A única alteração digna de nota diz respeito às escolas para o magistério primário.
A despesa total foi sensìvelmente a mesma que em 1942.
MINISTÉRIO DA ECONOMIA
98. Continuamos a afirmar que a questão fundamental para a melhoria das condições de vida social no País é a intensificação do desenvolvimento dos seus recursos potenciais. Não se trata apenas de criar novas fontes de actividade, mas, de aperfeiçoar o que existe.
Quási todos os anos, e em muitas passagens dêstes pareceres, se acentua a necessidade de coordenação. As actividades nacionais vivem dispersas, em compartimentos separados e estanques, e muitas vezes um espírito desapaixonado, e fora das complicações da vida burocrática, sente êste isolamento dos diversos organismos do Estado, quer pertençam a um ou a mais Ministérios. Pode acontecer, e isso na verdade sucede bastas vezes, que o trabalho realizado por um organismo seja profícuo e susceptível de produzir resultados económicos de importância, mas, como a economia num país constitue hoje, mais do que ontem, um todo, uma vasta engrenagem em que cada peça precisa de jogar em harmonia com outras, perdem-se esforços meritórios, que poderiam auxiliar grandemente na resolução de problemas que necessitam de soluções urgentes.
A gradual transformação operada na economia nacional e as medidas tomadas para evitar a concorrência desenfreada e anárquica, que tam graves efeitos produziu em tempos passados, trouxeram graves dificuldades e levaram a abusos que deveriam ter sido evitados.
Parece não haver a noção exacta do que seja organização corporativa em muitos sectores da vida interna. Muita gente parece ter interpretado o preceito constitucional num sentido que se não coaduna com o bem comum. E certas actividades encerraram-se dentro da tôrre de marfim de interêsses que não coincidem com o interêsse geral. O funcionamento de uma organização, que é, sem sombra de dúvida, no momento actual, o melhor sistema de organização capaz de levar a bom têrmo o barco da nossa economia nos tempos difíceis que ainda estão para vir, necessita de sofrer mais profundas alterações e precisa sobretudo de ser melhor coordenado.
Deu-se o aumento de cêrca de 11:000 contos nas despesas dêste Ministério. Pode isso verificar-se dos números que constam do quadro que segue:
[Ver diário original]

Página 71

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(7l)
O acréscimo nas despesas não foi inteiramente devido aos serviços. Começou a funcionar êste ano a Intendência Geral dos Abastecimentos e começou a ser pago o abono de família. A primeira despendeu 2:662 contos e o segundo 1:123. Se deduzirmos estas somas ao total de 72:144 contos restam 69:359, que é a cifra comparável à de 1942. O aumento foi de 8:000 contos, números redondos.
Êste aumento distribui-se por grande número de aplicações, mas as principais foram: na Secretaria Geral, mais de 1:000 contos; nos serviços agrícolas, cêrca de 2:000; nos serviços pecuários, de 1:200; nos serviços florestais, de 1:000; na Direcção Geral do Comércio, de 500; no Instituto Português de Combustíveis, de 400, e no Instituto Geográfico e Cadastral, de 800.
Foram ainda os serviços dependentes do antigo Ministério da Agricultura que mais alargaram a sua despesa.
Secretaria Geral
99. Pouco se gastou na Secretaria, além da verba das anuïdades das reparações que não tem significado maior, por ser contrapartida de idêntica verba inscrita nas receitas. O quadro que segue dá essas verbas.
[Ver diário original]
Deve ainda acrescentar-se a despesa da 11.ª Repartição da Contabilidade Pública, que gastou 143 contos em 1943. Também foi inscrita êste ano uma verba de 1:000 contos destinada à aquisição de mercadorias e outros dispêndios que interessam ao abastecimento do País. Deve ser recuperável, pelo menos, em parte.
Serviços agrícolas
100. A despesa de pessoal continua a aumentar. É sensìvelmente 950 contos mais elevada do que em 1939 e cêrca de 350 a mais do que no ano passado.
Esta Direcção Geral aumentou em perto de 4:000 contos a despesa desde 1939, como pode ler-se nos números que seguem:
[Ver diário original]
O aumento total de 1942, em relação a 1941, fora de 1:271 contos e tivera lugar nas três rubricas: pessoal, material e encargos. Êste ano aconteceu o mesmo, mas nos diversos encargos o aumento foi muito maior.
Dos números mencionados atrás nota-se que a verba do pessoal dos quadros se manteve idêntica à de anos anteriores. Deram-se pequenas variações nas rubricas do pessoal assalariado.
As despesas de material pouco aumentaram em 1943. Elas são constituídas, essencialmente, por despesas de conservação de imóveis e dizem respeito a diversas propriedades que dependem desta Direcção Geral e que formam os postos e estações agrárias.
Convém por isso compará-las nos dois últimos anos:
[Ver diário original]
O resto é constituído por compra de matérias primas e produtos acabados, por produtos químicos e de laboratório e diverso material de expediente e embalagem.
As verbas não são grandes e pouco representativas do trabalho realizado pelas diversas dependências da Direcção Geral.
101. Nas despesas relativas a pagamento de serviços e diversos encargos as importâncias que mais avultam são:
Contos
Participações em cobranças ou receitas... 1:422
Rendas de casas ou propriedades... 344
Transportes... 162
Publicidade e propaganda... 118
Fiscalização da cultura do arroz e plantio de vinha... 1:052
Combate ao escaravelho... 763
Subsídios diversos... 978
Despesas com instalações de estações agrárias... 111
Levantamento de cartas agrológicas... 516
A verba mais importante referente a participações em cobranças e receitas tem contrapartida nas consignações de receitas.
As outras são idênticas às do ano passado, a não ser a de subsídios diversos, que aumentou de 550 para 978 contos, e a de levantamento, de cartas agrológicas, que passou de 390 para 516 contos.
Embora se reconheça ser difícil, em face da rotina agrícola, a obtenção de resultados que mostrem a influência progressiva dos serviços do Estado, parece que poderiam ter sido mais eficazes os efeitos do despêndio das verbas gastas por esta Direcção Geral. A agricultura portuguesa necessita de ser consideràvelmente melhorada e de obter mais e melhores produtos por unidade de superfície, de modo a poderem ser aumentados os rendimentos nacionais.
Algumas estações ou postos agrários têm procurado auxiliar os agricultores e até feito a necessária propaganda de novos métodos de cultura, mas a acção de outros têm sido nula. Conviria rever toda a organização de brigadas, postos e estações agrícolas, de modo a estabelecer anualmente o balanço prático de suas actividades e dos benefícios que delas têm resultado para a região onde deveriam exercer influência benéfica. Não valerá a pena mantê-las se se provar ser de nenhum efeito a sua actuação.
Convém, periòdicamente, estudar a influência dos agentes fomentadores do Estado nas diversas regiões e, dado o fim da guerra, que se aproxima, parece ser agora oportuna a ocasião para fazer um inquérito ao labor de todos os novos instrumentos agrícolas, de modo a adaptá-los às necessidades futuras, que hão-de ser grandes.
Serviços florestais e aqüícolas
102. As despesas e receitas dêste departamento do Ministério da Economia, nos últimos anos, incluindo as extraordinárias, foram as que se inscrevem na página seguinte

Página 72

344-(72)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
[Ver diário original]
Desde 1939 até 1943 arborizaram-se 10:937 hectares de terrenos e construíram-se 84 quilómetros de estradas na 1.ª Circunscrição Florestal. A maior parte das sementeiras foram feitas nas serras da Padrela e da Cabreira, em Mondim de Basto e serra do Marão e Meia Via, na serra do Gerez e Terras do Bouro e em menor escala nas de Montezinho, Nogueira e Monte Morais.
Nas dunas de Vagos semearam-se 741 hectares. Na serra da Nogueira procedeu-se à regeneração de 120 hectares de carvalhal.
Na 2.ª Circunscrição Florestal foram semeados 14:122 hectares no mesmo período. Destes, cêrca de 4:500 constituem dunas, em Mira e em Cantanhede, e os restantes distribuíram-se pelas serras da Lousã, Penela, Castanheira, Estrêla, Gardunha, Caramulo e outras. Construíram-se também cêrca de 64 quilómetros de estradas florestais.
Estes trabalhos foram executados por fôrça das verbas inscritas nas receitas extraordinárias, ao abrigo da lei que aprovou o plano florestal e que prevê o revestimento de serras e dunas até 1968. O total das receitas extraordinárias, no qüinqüénio a que se referem os números acima mencionados, eleva-se a 61:247 contos, e compreende as plantações, sementeiras, viveiros, pastagens, dunas e estradas. Corresponde à arborização de 25:000 hectares, números redondos, e a cêrca de 143 quilómetros de estradas florestais, além de umas centenas de milhares de árvores plantadas em alinhamentos nas clareiras de pinhais e até dentro das áreas semeadas.
Os trabalhos desta Direcção Geral devem reflectir-se num futuro próximo, no regime de cheias de alguns dos nossos rios.
Quando se discutiu a proposta de lei, que serve de base ao trabalho agora realizado pelos serviços florestais, foi sugerido, que se procurasse fazer o estudo de um plano geral que incluísse o dos baldios, de modo a determinar as possibilidades de serem, total ou parcialmente, arborizados; a conveniência de transferir por venda as parcelas reconhecidas como próprias para outras culturas; a arborização das restantes parcelas disponíveis dos baldios, tendo em conta o regime das chuvas e o clima, o carácter torrencial dos rios, as possibilidades económicas das essências florestais; e também foi alvitrado o alargamento do estudo até terrenos pertencentes a particulares, impróprios para outras culturas, e situados em zonas que necessitem de melhorias no que respeita a chuvas, clima ou regime de rios e que permitam maior densidade populacional, por virtude da influência exercida pelas florestas(1).
As reclamações e sugestões então feitas têm hoje muito maior urgência. O plano de electrificação exige a regularização de caudais; o plano de reorganização industrial há-de necessitar de grandes quantidades de combustível sob a forma de lenha e de carvão de madeira, e, finalmente, os tremendos efeitos da erosão, nas encostas, estão transportando para os rios enormes quantidades de detritos que os vão assoreando, a ponto de transformar em poucos anos troços importantes em baixios que dificultam a navegação.
Êste problema é daqueles que hoje necessitam de estudos muito sérios e de medidas urgentes, porque o arroteamento de encostas, nos últimos tempos, se tem intensificado a ponto de, a pouco e pouco, as terras serem levadas para os rios, deixando atrás rochas nuas.
O problema da erosão é de tal modo importante para o futuro do País que bem merecia que o Govêrno nomeasse uma comissão com o fim de o estudar em toda à sua largueza e apresentar em seguida um plano de trabalhos que englobasse os baldios e terrenos particulares e tratasse o problema em conjunto, e não apenas parcelarmente.
103. As despesas ordinárias, relativas a 1943, dividiram-se do modo que segue, em contos:
[Ver diário original]
As despesas com o pessoal mantiveram-se.
O acréscimo deu-se na rubrica de material, e por isso convém decompô-la. Comparando os dois últimos anos, encontram-se as verbas inscritas adiante.
[Ver diário original]
Foi nas despesas de ordenamento das florestas que se deu o maior aumento, resultante da alta de salários.
As despesas extraordinárias, efectuadas pelos serviços florestais, no povoamento de serras e dunas, atingiu êste ano, como se viu atrás, 13:881 contos. O total gasto foi o seguinte:
Contos
Despesas ordinárias... 9:247
Despesas extraordinárias:
Estudos de projectos, levantamentos topográficos e outras... 586
Execução de projectos... 13:295
Total... 23:128
Serviços pecuários
104. Deve ter sofrido grandes progressos a actividade desta Direcção Geral, por quanto o aumento de despesas tem sido realmente muito grande na última década. Os serviços pecuários atingiram em 1943 a verba de 13:702 contos, um acréscimo de cêrca de 1:200 em relação a 1942 e aproximadamente quatro vezes mais do que em 1930-1931.
As despesas, repartidas pelas diversas dependências, foram as que constam do primeiro quadro da página seguinte, em contos.

(1) Ver Diário das Sessões de 22 de Abril de 1938.

Página 73

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(73)
[Ver diário original]
Houve na verdade um aumento grande, que se elevou êste ano a 1:200 contos, e nota-se que onde realmente mais se fez notar foi na Estação Zootécnica, por virtude talvez de maiores despesas com alimentação de gados.
Os números, acima transcritos, podem ser apresentados de modo a poder dar a idea de como foi distribuída a despesa. Assim, o conjunto dá as seguintes verbas para as diversas rubricas orçamentais:
[Ver diário original]
O aumento deu-se em todas as rubricas, sinal do desenvolvimento dos serviços. Onde mais se acentuou foi em material e diversos encargos e pagamento de serviços, e por isso convém verificar quais as despesas que tiveram êsse destino.
Os serviços centrais consumiram as verbas seguintes:
Contos
Pessoal... 2:515
Material... 279
Diversos encargos... 3:774
Total... 6:56.8
ou cêrca de metade do total das despesas. Avulta dentre ela o pessoal dos quadros, com 2:045 contos; as participações em cobranças ou receitas, que são receitas consignadas, no total de 2:183 contos; as campanhas profiláticas contra a tuberculose, mormo, carbúnculo, etc., no total de 1:000 contos; despesas com instalação e apetrechamento de estabelecimentos pecuários, com 150 contos; subsídios diversos, 250 contos; e outras.
105. Nos estabelecimentos zootécnicos as despesas foram as seguintes:
Contos
Pessoal... 1:160
Material... 2:033
Pagamento de serviços... 1:841
Total... 5:034
As verbas de maior importância são: pessoal assalariado, num total de 1:019 contos; aquisição de semoventes e móveis, que soma 267 contos; conservação a aproveitamento de material, 1:548 contos, e a participação em receitas, que produziu 1:662 contos.
As delegações e intendências da pecuária, o Parque de Material Sanitário e os laboratórios de patologia veterinária gastaram o que segue:
Pessoal... 322
Material... 240
Diversos encargos... 325
Total... 887
E, finalmente, o Laboratório Central de Patologia que também tem receitas próprias utilizou as que se vêem na coluna seguinte.
Contos
Pessoal... 343
Material... 322
Diversos encargos... 549
Total... 1:214
dos quais 484 respeitam a participações em cobranças. As receitas cobradas em 1943 pelos serviços pecuários, e inscritas no capítulo das consignações de receitas, foram as seguintes:
Contos
Estabelecimentos zootécnicos... 1:664
Laboratório Central de Patologia... 496
Diversas receitas... 2:192
Total... 4:352
O ano passado as participações em cobranças foram ligeiramente superiores a 4:000 contos (4:004).
Junta de Colonização Interna
106. A Junta de Colonização Interna tem dois orçamentos: o das despesas ordinárias e o das extraordinárias. A sua função tem incidido essencialmente sôbre o estudo das possibilidades dos aproveitamentos dos baldios. Publicou em 1939 o tombo dos baldios, que consiste numa série de reconhecimentos feitos no sentido de os definir, e tem procurado saber a melhor forma de os aproveitar. Para isso foi elaborado o plano geral.
A área de baldios, reconhecida, avalia-se em 407:540 hectares, quási toda situada no norte. Mais de 80 por cento é susceptível de aproveitamento florestal, menos de 18 por cento pode ser usado no aproveitamento agrícola e o restante poderá ser adstrito a fins sociais.
O plano geral do aproveitamento de baldios reservados compreende uma área de 286:700 hectares, nos quais se incluem 96:100 hectares de propriedade particular. Para ser orientado pelo Estado, reservaram-se 104:000 hectares, destinados a colonização interna.
Destes últimos, aproximadamente 30:520 têm aptidão agrícola e 73:504 têm aptidão florestal. O plano de colonização dos baldios, com parecer da Câmara Corporativa, constitue o primeiro plano no caminho da colonização interna.
Do exame dos números verifica-se que grande parte da área total dos baldios tem aptidões florestais (332:369 hectares) e que só uma pequena parte (37:882 hectares)

Página 74

344-(74)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
não é colonizável. A área agrícola colonizável é de pouco mais de 37:152 hectares.
A área de baldios que mereceu estudo está na sua maior parte situada nos distritos de Vila Real (157:223 hectares), Viana do Castelo (70:225 hectares), Viseu (11:819 hectares), Guarda (9:129 hectares), Coimbra (2:492 hectares) e Aveiro (2:191 hectares). As restantes áreas encontram-se nos distritos de Évora e Faro, e são muito menores do que as mencionadas.
Para efectivar estudos vem a Junta de Colonização Interna despendendo verbas pelo orçamento das despesas e receitas ordinárias. Os números são os seguintes para os últimos anos:
[Ver diário original]
Assim, desde 1937, a Junta de Colonização Interna, por fôrça de receitas ordinárias e extraordinárias, despendeu um pouco mais de 14:000 contos. O seu trabalho tem incidido quási todo sôbre estudo de baldios. Os terrenos irrigados, depois de efectivadas as obras a pôr em progresso sôbre a direcção da Junta Autónoma da Hidráulica Agrícola, serão orientados depois por esta Junta.
Parece ser de vantagem rever a actuação dos dois organismos de modo a verificar, em face da experiência dos últimos sete anos, se conviria modificar a sua orgânica, de modo a tornar mais estreitas as suas relações, e a reduzir ao mínimo o seu custo.
Torna-se necessário entrar no campo das realizações práticas e efectivar os projectos que elas mereçam.
A falta de elementos e a insuficiência de tempo para estudo do trabalho realizado nos últimos anos não permite ainda formar um juízo definitivo sôbre êste organismo.
As somas gastas já são avultadas.
Dadas as dificuldades que se hão-de levantar a seguir à guerra, no tocante a muitas, parece que seria de vantagem procurar concentrar serviços de modo a reduzir a despesa.
Direcção Geral da Indústria
107. As despesas desta Direcção Geral têm aumentado bastante. Foram as seguintes desde 1938:
Contos
1938... 4:585
1939... 5149
1940... 5:471
1941... 5:921
1942... 6:692
1943... 6:533
Em cinco anos houve o acréscimo de cêrca de 2:000 contos.
As diversas rubricas orçamentais são as seguintes para 1940, 1942 e 1943:
[Ver diário original]
O aumento provém de pessoal, de trabalhos realizados em conta de particulares e de despesas feitas com inquéritos industriais, nas quais se gastaram em 1943 cêrca de 312 contos, e 562 em 1941.
Já foi formulada a opinião, em pareceres de anos anteriores, de que a organização da Direcção Geral da Indústria necessita de profundas reformas.
Qualquer proposta de reorganização industrial para ser aplicada necessita de basear-se em organismo que oriente a indústria nacional no sentido de franco progresso. Houve a esperança de que a proposta de lei de condicionamento viria exercer grande influência no aperfeiçoamento da indústria portuguesa, mas os anos passados vieram provar que essas esperanças se tinham convertido, em grande parte, em desilusões.
Já existem hoje muitos elementos arquivados na Direcção Geral da Indústria que, conjuntamente com outros a colher, podem servir de base a um inquérito industrial que dê a medida aproximada das necessidades do País nessa matéria e da correlação que existe entre as diversas fontes de actividade nacionais.
Com a actual organização da Direcção Geral da Indústria não é possível êsse inquérito, que, na opinião do relator dêstes pareceres, já expressa há quási uma dezena de anos, é a base de qualquer plano de renovação económica do País e que com os elementos existentes pode ser realizado em, relativamente, pouco tempo.
Direcção Geral do Comércio
108. A despesa nos últimos anos desta Direcção Geral foi a seguinte:
Contos
1938... 1:657
1939... 1:000
1940... 1:001
1941... 970
1942... 975
1943... 1:464
Houve, como se deduz dos números, um grande acréscimo em 1943, que resultou das despesas realizadas com o serviço de racionamento, que importaram em 440 contos.
Deste organismo fazem parte as Bôlsas de Mercadorias de Lisboa e Pôrto.
O seu custo foi:
Contos
Bôlsa de Mercadorias de Lisboa... 169
Bôlsa de Mercadorias do Pôrto... 168
Os armazéns gerais despenderam 81 contos, dos quais 74 são de pessoal.

Página 75

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(75)
Parece haver vantagem em rever a legislação relativa aos armazéns industriais, tanto no que diz respeito ao seu funcionamento como às suas atribuïções. Os armazéns gerais podem desempenhar uma função bem mais importante do que aquela que actualmente desempenham, mas para isso convém modificar a sua constituïção de modo a torná-los mais úteis e proveitosos. O assunto necessita de ser revisto com atenção.
Instituto Português de Combustíveis
109. Já o ano passado se fizeram algumas considerações sôbre o trabalho dêste Instituto. O período de guerra, as suas incertezas e dificuldades, deram-lhe atribuïções que inicialmente nêle não cabiam. Logo que o conflito termine hão-de modificar-se as circunstâncias, e espera-se que a tarefa de investigação industrial e técnica surta os efeitos precisos.
As despesas do Instituto Português de Combustíveis somaram 2:955 contos em 1943, que se comparam com 2:589 contos, mais 366 contos.
Os números, para os últimos anos, foram:
Contos
1938... 615
1939... 671
1940... 670
1941... 969
1942... 2:589
1943... 2:956
As causas do aumento da despesa observam-se fàcilmente no quadro da coluna seguinte.
[Ver diário original]
Vê-se que o serviço de racionamento da gasolina é a causa do excessivo aumento e que êste se deu em grande parte na despesa de pessoal, que passou de 49 contos para 1:356 contos.
Direcção Geral de Minas e Serviços Geológicos
110. O ano de 1943 foi ainda de grande actividade mineira, sobretudo de minérios de volfrâmio e estanho, que, por virtude de circunstâncias derivadas da guerra, tiveram larga procura. Já atrás, no capítulo das receitas, relativo às indústrias em regime especial, se deu nota das exportações dos minérios e metais explorados no País.
Anexo à Direcção Geral de Minas vem funcionando há alguns anos o serviço de fomento mineiro, que tem dois objectivos: o reconhecimento das minas de combustíveis nacionais de modo a determinar com suficiente aproximação as reservas carboníferas ou outras existentes em Portugal e a pesquisar tanto quanto possível o reconhecimento de jazigos minerais.
As receitas que serviram para custear os trabalhos de pesquisa e reconhecimento tiveram a origem seguinte:
[Ver diário original]
As quantias gastas permitiram o estudo de grande número de afloramentos de minérios, ou de trabalhos antigos, e custearam sondagens em minas de carvão existentes.
Incluíram-se no plano de trabalhos realizados até hoje possibilidades relativas a ouro, cobre, chumbo, crómio, ferro, níquel, antimónio, mercúrio, enxôfre e outros.
Ainda não há conclusões sôbre a maior parte dos trabalhos, mas espera-se que depois de terminados estes se chegue a uma idea sôbre as riquezas minerais do País no que toca a, afloramentos já conhecidos.
Os resultados parece não serem animadores em muitos dos afloramentos e são francamente maus na parte relativa a carvões, visto serem baixas as reservas até agora provadas.
111. As despesas da Direcção Geral, que teve de arcar nestes dois anos de guerra com um trabalho resultante de grande número de registos e pedidos de concessão, não aumentaram muito, como pode verificar-se dos números que seguem, em contos:
[Ver diário original]
Houve que reforçar as verbas de pessoal por virtude do excesso de trabalho; nas de material deminuíu a verba que anteriormente se incluía para as Caldas do Monchique. Na rubrica «Pagamento de serviços e diversos encargos» aumentaram as despesas feitas por conta das verbas cobradas de particulares para paga-

Página 76

344-(76)
DIÁRIO DÁS SESSÕES — N.º 140
mento de serviços por êle reclamados e de serviços oficiais. Êsse aumento, que, contudo, não foi por aí além, visto não ter ultrapassado cêrca de 60 contos, justifica em parte o maior gasto.
Êste ano as despesas extraordinárias acusam a utilização de 2:877 contos em pesquisas e reconhecimentos para a produção de combustíveis (desenvolvimento de minas de carvão) e 3:320 contos nos trabalhos de pesquisas e fomento da produção mineira, incluindo ensaios de tratamento de minérios e estudos diversos. Parte foram liquidadas por fôrça do excesso de receitas ordinárias e o restante por fôrça de empréstimos.
Despesas totais
112. As despesas totais do Ministério da Economia, incluindo as ordinárias e extraordinárias, foram as seguintes:
[Ver diário original]
Houve o aumento de cêrca de 11:460 contos, que se deu quási exclusivamente nas despesas ordinárias.
As extraordinárias, que somaram 21:178 contos, mais ou menos a soma das do ano passado, dizem respeito a trabalhos em andamento, a que se aludirá mais adiante.
Presume-se que só uma pequena parcela do que foi gasto até hoje será recuperada, visto não terem tido o êxito previsto alguns dos trabalhos relativos a investigações de carvão e ainda outros combustíveis.

Página 77

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(77)
RECEITAS E DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS
Receitas extraordinárias cobradas e orçamentadas
1. As despesas extraordinárias atingiram êste ano uma soma bastante elevada, que foi sobretudo conseqüência de fortes gastos no rearmamento do exército. Já isso fora previsto no início do ano económico, em virtude das circunstâncias anormais da Europa, e, se não tivesse havido o grande excesso de receitas ordinárias, o problema das finanças nacionais ter-se-ia complicado. Haveria que recorrer em muito maior escala ao empréstimo.
A questão das receitas deverá ter certa acuïdade se se prolongar o estado de guerra. E se se mantiverem circunstâncias que imponham maiores despesas com as forças armadas, há-de ser necessário, nos próximos anos, o recurso ao crédito em maior volume.
A previsão orçamental e o que se cobrou, por fôrça do capítulo das receitas extraordinárias, subiram a, respectivamente, 1.947:858 e 779:110 contos e tiveram a origem seguinte:
[Ver diário original]
Foi muito grande a diferença entre a estimativa orçamental e o que se cobrou. Por isso houve a possibilidade de liquidar no fim do ano grande parte das despesas extraordinárias por fôrça do excesso das receitas, como adiante se verá com mais minúcia.
Despesas extraordinárias orçamentadas e cobradas
2. As despesas extraordinárias atingiram em 1943 cêrca de 1.716:948 contos, o mais alto nivel alcançado até hoje, e foram conseqüência do reembôlso de empréstimos e do rearmamento do exército.
Os números que mostram o que se orçamentou e cobrou são os seguintes:
[Ver diário original]
O motivo de não se ter gasto tudo o que a estimativa orçamental previa, àparte os 6:294 contos de despesas que foram anuladas, foi devido a não ter sido possível ou necessário utilizar o que se inscrevera nos Ministérios da Guerra e da Marinha, além da diferença para menos de 72:000 contos no valor das obras a efectuar pelo Ministério das Obras Públicas e Comunicações. Neste último caso, o facto deve ter sido conseqüência das dificuldades da hora presente; e no primeiro derivou naturalmente de não se poder calcular quais seriam as despesas das forças armadas.
Como resultado da anormalidade da actual situação mundial houve que despender grandes somas no rearmamento e outras despesas relacionadas com a guerra. E por essa razão foi necessário utilizar empréstimos, em muito maior escala do que anteriormente.
A origem das receitas que liquidaram as despesas extraordinárias foi a seguinte:
[Ver diário original]
Desviou-se quási um milhão de contos (937:838 contos) do excesso das receitas ordinárias para liquidação de despesas extraordinárias, o que até certo ponto representa grande esfôrço. Para isso houve a necessidade de conter as despesas ordinárias dentro de limites que porventura trouxeram sacrifícios a muita gente, visto haver vantagens no seu aumento em certos capítulos.
Apesar, porém, do grande excesso das receitas ordinárias ainda se tornou indispensável maior recurso ao crédito e desviar parte dos empréstimos para fins que anteriormente eram liquidados de outro modo.
3. Os empréstimos renderam 777:114 contos e tiveram a seguinte aplicação:
Contos
Rearmamento... 342:274
Pôrto de Douro e Leixões... 2:678
Outros portos... 22:225
Hidráulica agrícola... 29:998
Rêde telegráfica e telefónica... 18:320
Liceus... 7:000
Povoamento florestal... 13:881
Colonização interna... 1:100
Estradas na Madeira... 2:250
Estradas nos Açores... 4:000
Construções prisionais... 4:931
Fomento mineiro... 3:320
Amortização de empréstimos... 325:137
777:114
Os números e as aplicações que acabam de ser mencionados referem-se ao total das despesas extraordinárias que foram liquidadas por conta de empréstimos, os

Página 78

344-(78)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
quais, segundo o preceito constitucional, têm de se circunscrever apenas a obras de fomento ou casos de fôrça maior, entre os quais avulta a guerra. Além dêstes casos, nas contas dêste ano incluíram-se 51;488 contos, que foram utilizados no reembôlso do empréstimo de 4 1/2 por cento, ouro, de 1912, em obediência ao saneamento da dívida pública, que vem sendo feito de acôrdo com o programa traçado há já bastante tempo.
4. Segundo o princípio estabelecido, dá-se a seguir o destino dos empréstimos por suas diversas aplicações, referido a 31 de Dezembro de 1943:
[Ver diário original]
Merece referência especial a rubrica «Obras de Fomento», porque, até certo ponto, ela mostra o esfôrço feito, nos últimos tempos, pelo País no seu desenvolvimento material, incluindo aumentos no património, como edifícios e outras cousas:
Contos
Hidráulica agrícola... 123:014
Portos... 222:683
Caminhos de Ferro do Estado... 118:215
Edifícios do Estado... 96:752
A transportar... 560:664
Contos
Transporte... 560:664
Estradas... 30:750
Arborização... 48:335
Estradas florestais... 3:204
Rede telegráfica e telefónica... 118:320
Pesquisas mineiras no País... 5:462
Urbanização... 60
Ampliação das obras do Arsenal... 27
Colonização interna... 2:841
Total... 769:663
5. As receitas extraordinárias cobradas até fins de 1943 atingiram a soma de 3.089:600 e tiveram a seguinte origem:
[Ver diário original]
Verifica-se que a quási totalidade das receitas extraordinárias, não incluindo o que para elas foi desviado dos saldos de anos económicos findos, provém de empréstimos.
O que se engloba sob o título de Banco de Portugal foi conseqüência do contrato celebrado em 1931. A única rubrica que poderá ter certa importância, mas apenas intermitentemente, é a da amoedação.
Despesas extraordinárias
6. Êste ano as despesas extraordinárias atingiram a cifra de 1.716:948 contos, ou cêrca de 43 por cento da despesa total. Tam grande percentagem resultou de gastos anormais, que se espera não se hão-de repetir. Nem por isso deixa contudo de ter significação. O quadro da página seguinte exprime, em resumo, a distribuïção das despesas extraordinárias pelos diversos Ministérios.
[Ver diário original]

Página 79

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(79)
O aumento das despesas extraordinárias, em relação ao ano anterior, alcançou a importância de 800:000 contos, dos quais 325:187 se devem atribuir a reembôlso de empréstimos, deixando o saldo líquido de 469:000 contos, números redondos.
Esta diferença correspondeu quási integralmente às despesas nos Ministérios da Guerra e da Marinha.
As receitas que liquidaram todas estas despesas tiveram, como já foi dito, origens diversas.
Convém determinar o quantitativo que diz respeito a cada uma, tanto em valor absoluto como em percentagem. Os números são os seguintes:
[Ver diário original]
Vê-se que as percentagens se alteraram grandemente. Mas se ao total de 1943 fôr deduzido o que foi usado em reembôlso de empréstimos, como aliás já se mencionou atrás, as percentagens aproximar-se-ão mais das do ano passado. Quere dizer: sôbre um total de 1.391:813 contos, gasto em rearmamento e outros fins, 937:838 provieram de receitas ordinárias. As despesas de rearmamento foram liquidadas, parte por fôrça de receitas ordinárias, cêrca de 663:000 contos, e parte por empréstimos, aproximadamente 452:000 contos.
As percentagens relativas às receitas, nos últimos anos, são as seguintes:
[Ver diário original]
7. Resta neste aspecto das despesas determinar qual o critério seguido na classificação das extraordinárias.
Houve umas que foram pagas por conta de empréstimos e outros por fôrça de excessos de receitas ordinárias.
Estas últimas são as que indica o quadro que segue:
[Ver diário original]
Parece que as obras sumptuárias e as que não são reprodutivas, no estrito significado que é costume dar ao têrmo, são liquidadas por fôrça de receitas ordinárias. Os exemplos da cidade universitária de Coimbra, das obras da Praça do Império e de mais algumas têm cabido todos os anos nos excedentes de receitas ordinárias. Outras que não serão porventura recuperáveis, como as pesquisas mineiras, as indemnizações a empreiteiros, etc., também são nelas lançadas.
Êste ano o total dos excessos das receitas ordinárias não chegou para satisfazer integralmente as despesas de rearmamento ou utensilhagem da Marinha de Guerra e por isso foi necessário utilizar o crédito.
Em virtude das grandes somas despendidas nesta última aplicação, certas despesas que anteriormente se liquidavam por fôrça de receitas ordinárias também couberam êste ano aos empréstimos, como se pode ver no quadro que segue:
[Ver diário original]
Certas obras que em 1942 foram pagas por meio de empréstimos, liquidaram-se êste ano por fôrça de receitas ordinárias, como as construções prisionais.
Parece não existir critério definido, além do que foi mencionado atrás.
O assunto não tem muita importância, porque a despesa tem de ser paga. Se grande parte fôr liquidada por fôrça das receitas ordinárias, a ponto de as esgotar, não haverá saldos, e estes, se existirem, irão engrossar um fundo que irá depois custear despesas extraordinárias.
Pode dizer-se, em abono da vida financeira e do País, que, apesar do grande esfôrço que o rearmamento e despesas extraordinárias de guerra representaram em 1943, foi possível reduzir a umas parcas centenas de milhares de contos o recurso ao crédito. A carga tributária tem grandemente auxiliado a passagem difícil que, na verdade, representa para todos os países o actual conflito.

Página 80

344-(80)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Distribuïção das despesas extraordinárias
8. O agrupamento das despesas extraordinárias permite ter melhor idea dos objectivos a que foram aplicadas as receitas. O quadro que segue mostra o que coube a cada um dêsses agrupamentos:
[Ver diário original]
A comparação das cifras relativas aos últimos dois anos indica que em certas rubricas não houve grandes variações. Contudo, o trabalho realizado foi muito menor em virtude de ter deminuído bastante o poder de aquisição da moeda.
9. Para os três últimos anos, pode estabelecer-se o quadro que segue:
[Ver diário original]
Os números mostram que os gastos na defesa nacional em todos os anos desde 1940 por muito sobrelevam os outras despesas extraordinárias e têm vindo em constante subida.
Foi êste o ano de despesas extraordinárias que quási atingiram um milhão e meio de contos — cifra semelhante ao total das despesas ordinárias no início da reorganização financeira. E evidente que as finanças públicas não poderão suportar por mais alguns anos esta pesada carga, sobretudo quando se considerar que ela recaiu quási toda sôbre as receitas ordinárias, e é constituída na sua maior parte (mais de um milhão e duzentos mil contos) por despesas improdutivas. É o reflexo, da guerra nas finanças nacionais, porque quási tudo foi gasto pelo Ministério da Guerra em rearmamento e despesas excepcionais resultantes do conflito.
As demais rubricas deminuíram sensìvelmente.
ANÁLISE DAS DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS
1. O exame das cifras das despesas extraordinárias põe em relêvo que as transformações da dívida pública consumiram cêrca de 1.300:000 contos. A despesa nos Ministérios da Guerra e da Marinha com as forças armadas aproxima-se da cifra de 4.000:000 de contos, num total de 3.850:000.
As duas grandes rubricas, nos últimos anos, dizem respeito à dívida e defesa nacional. A percentagem que lhes cabe no conjunto das despesas extraordinárias anda à roda de 71 por cento.
Estes números demonstram que, se se mantiverem condições idênticas, a capacidade financeira do País pode arcar nos anos que se seguirem à guerra com as despesas de renovação económica que há necessidade de realizar com urgência. Os consumos das forças armadas hão-de certamente abrandar até se reduzirem a verbas que não pesarão muito no orçamento das despesas extraordinárias. A dívida está hoje saneada e já atingiu taxas que difìcilmente poderão ser melhoradas no futuro. Parece, por conseguinte, estarem estabelecidas condições, no ponto de vista financeiro, que permitem a execução de um vasto plano de melhoramentos, o qual parece que sem a intervenção do Estado nunca poderá produzir os efeitos precisos.
As despesas extraordinárias desde 1929-1930 foram parcialmente liquidadas por empréstimos. Em que proporções?
Venderam-se 5.372:621 contos de títulos nos anos que decorreram desde 1929-1930 a 1943, dos quais se transferiram para despesas orçamentais 2.177:823 contos.

Página 81

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(81)
O resto, ou 3.194:798 contos, acha-se depositado em contas de tesouraria.
Do total, o que foi usado em diversas aplicações, ou 2:177:823 contos, teve o destino seguinte:
Contos
Rearmamento... 342:274
Hidráulica Agrícola... 123:014
Portos... 222:683
Caminhos de Ferro do Estado... 118:215
Compra de acções ou depósitos em bancos... 45:000
Edifícios... 96:752
Estradas... 30:750
Conversão de empréstimos... 101:274
Pagamento de dívidas... 8:891
Pesquisas mineiras... 5:462
Resgate do empréstimo de portos de 6 3/4 por cento... 100:000
Caminhos de ferro... 79:445
Amortização do empréstimo de 6 1/2 por cento, consolidado... 406:140
Povoamento florestal... 51:538
Correios e telégrafos... 118:320
Colonização interna... 2:841
Diversos... 87
A transportar... 1.852:686
Contos
Transporte... 1.852:686
Recolha e amortização dos empréstimos 4 1/2 por cento e 5 1/2 por cento, consolidado, e 4 1/2 por cento, ouro... 325:137
2.177:823
2. Desta soma, 1.020:887 contos serviram para liquidar empréstimos e os 1.156:936 contos foram usados, na sua grande maioria, em obras que deverão ser reprodutivas, algumas realizadas por organismos que pagam ao Tesouro anualmente os encargos, como os correios e telégrafos e o pôrto de Lisboa.
O Fundo especial de caminhos de ferro e os correios, telégrafos e telefones já liquidaram parte do débito contraído no erário público e o pôrto de Lisboa entrega anualmente ao Tesouro verbas destinadas à liquidação de encargos de levantamentos feitos na conta corrente e destinados a custear as obras realizadas nos últimos anos.
Deve acrescentar-se que algumas das verbas mencionadas atrás não são directamente recuperáveis. Talvez tivesse valido mais a pena lançá-las na conta das receitas ordinárias que serviram para pagar despesas extraordinárias.
É de louvar a política seguida, que procura satisfazer as despesas excepcionais resultantes da guerra e também as do rearmamento por fôrça das receitas ordinárias. Só no ano de 1943 se recorreu a empréstimos em virtude do grande volume dessas despesas.

Página 82

344-(82)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
SALDOS DE CONTAS
O saldo êste ano foi pequeno, se se comparar com os dos outros anos, visto não ser superior a 63:142 contos.
O quadro que segue mostra as variações e o total dos saldos desde 1928-1929 e as quantias gastas por sua conta nos diversos anos:
[Ver diário original]
Os saldos desde 1928-1929 atingiram mais de dois milhões e meio de contos, que é uma verba considerável nos acanhados limites em que se movimentam as nossas disponibilidades orçamentais. Representa bastante mais do que o total das despesas ordinárias em cada ano.
O de 1943 foi de 63:142 contos e poderia ter sido muito maior se não houvesse o critério de liquidar por fôrça das receitas ordinárias grande parte das despesas extraordinárias, algumas das quais caberiam legìtimamente dentro de empréstimos.
Os números do quadro atrás mencionado indicam que o fundo disponível dos saldos de anos económicos findos é hoje de 655:870 contos e que já foram gastos por conta da soma dos saldos anuais 1.869:882 contos.
Não se recorreu a êsses saldos nem no ano de 1942 nem no de 1943, e por conseqüência a sua aplicação é a que consta das cifras dadas nas contas de 1941 e que, para maior clareza, se repetem agora, embora sob nova forma.
Emprêgo dos saldos de anos económicos findos
[Ver diário original]

Página 83

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(83)
Ainda para melhor avaliar o critério seguido na aplicação dos saldos convém decompor as verbas e incluí-las em aplicações afins. Os números que seguem dão uma idea nítida do destino dêsses saldos:
[Ver diário original]

Página 84

344-(84)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
CONCLUSÕES
A comissão nomeada para efeitos de apreciar as Contas Gerais do Estado, ao abrigo do artigo 91.°, n.º 3.°, da Constituïção, ponderou as considerações expostas pelo relator do parecer relativo às contas de 1943; e reconhecendo:
1) Que não houve desvio dos princípios constitucionais orientadores da vida financeira do Estado durante o ano de 1943;
2) Que o País continuou a manter-se dentro da rigorosa neutralidade declarada no início da guerra e que essa neutralidade continua a ser a atitude que mais convém aos interêsses superiores da Nação;
3) Que o próximo fim do conflito torna ainda mais urgente a necessidade de concluir planos de fomento a pôr em execução logo que as circunstâncias o permitam;
4) Que é indispensável tomar todas as medidas, por mais enérgicas que sejam, no sentido de fazer recuar ou, pelo menos, manter o nivel dos índices do custo de vida, de modo a equilibrá-lo com o nivel dos ordenados, salários e rendimentos;
5) Que as receitas ordinárias em 1943 atingiram 3.268:629 contos, mais 300:805 contos do que em 1942;
6) Que as despesas ordinárias no mesmo ano se elevaram a 2.267:647 contos e ultrapassaram em 235:837 contos as de 1942;
7) Que a diferença entre as receitas e despesas ordinárias foi de 1.000:982 contos;
8) Que as receitas e despesas extraordinárias foram, respectivamente, 779:110 e 1.716:949 contos;
9) Que para pagamento de despesas extraordinárias se desviaram 937:838 contos das receitas ordinárias;
10) Que ainda êste ano se não recorreu ao Fundo de saldos de anos económicos findos;
11) Que as despesas, de rearmamento e outras relacionadas com a guerra se elevaram, em 1943, a 1.189:894 contos, cobertos em parte por empréstimos e no restante por fôrça de excessos de receitas ordinárias;
12) Que se contraíram empréstimos no valor total de 777:114 contos, ao abrigo dos preceitos constitucionais, sendo 325:137 contos destinados a reembôlso ou conversão de outros empréstimos;
13) Que o saldo da gerência de 1943 se elevou a 63:142 contos:
Tem a honra de submeter à apreciação da Assemblea Nacional as seguintes bases de resolução:
A) A cobrança das receitas públicas durante a gerência compreendida entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro de 1943 adaptou-se, na medida do possível, às condições económicas da Nação e foi realizada conforme os termos votados na Assemblea Nacional e mais preceitos legais;
B) As despesas públicas, ordinárias e extraordinárias, efectuaram-se de conformidade com o disposto na lei;
C) Teve a aplicação estatuída nos preceitos constitucionais o produto de empréstimos contraídos durante êste período de tempo;
D) O saldo de 63:142 contos apresentado nas contas de 1943 é verdadeiro e legítimo;
E) Merecem, pois, aprovação as contas gerais do Estado do ano de 1943.
Sala das Sessões, 25 de Janeiro de 1945.
Henrique Linhares de Lima.
José Maria Braga da Cruz.
Juvenal Henriques de Araújo.
Salvador Nunes Teixeira.
José Dias de Araújo Correia, relator.

Página 85

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(85)
APÊNDICE
OS RIOS PORTUGUESES
I
CONSIDERAÇÕES GERAIS
1. Foi já escrito noutro lugar: «talvez que o problema fundamental da Nação esteja no estudo e cuidadoso aproveitamento das vastas disponibilidades de água com que a natureza prodigamente a dotou»(1).
Compreendem-se nelas os mananciais de origem subterrânea resultantes de infiltrações pluviométricas e, embora êsses reservatórios ainda constituam hoje, por muito, a maior fonte de águas para rega, é contudo pelos rios que passam os maiores recursos aquíferos do País e é, por conseguinte, dêles que hão-de vir os maiores benefícios para o nosso progresso material.
De diversos modos os rios influem na vida económica e um ligeiro estudo mostra que a sua influência poderá vir a ser muito grande no desenvolvimento do País.
Sem demasiados optimismos, há quem calcule as disponibilidades de energia hidroeléctrica permanente nos rios portugueses em mais de 9:000.000:000 de kWh, uma grande parte da qual no norte do País, e a navegação no Douro, até Barca de Alva, e no Tejo, até à fronteira, pode ser conseqüência directa do seu aproveitamento. As duas utilizações dos cursos de água nacionais, como fonte de energia e via de comunicação, são perfeitamente concordantes.
Em certos rios, como o Vouga, o Mondego, o Guadiana e os que constituem a bacia hidrográfica do Tejo, sobretudo o Zêzere e o Ocresa, as obras hidráulicas têm estreito contacto com a produção de energia e com o domínio de cheias, além de criarem condições que podem satisfazer em larga escala as necessidades da rega de vastas áreas.
Muitos dos rios portugueses estão em circunstâncias de fornecer água para rega e energia para a indústria e poderão ser transformados ao mesmo tempo, sobretudo o Douro e o Tejo, em excelentes vias de comunicação susceptíveis de assegurar transportes baratos de zonas mineiras e agrícolas até aos dois mais importantes aglomerados urbanos do País. Uma parte apreciável dos recursos nacionais nunca será convenientemente explorada sem a sua regularização.
Dada a magnitude do problema e a influência verdadeiramente revolucionária que o aproveitamento dos rios pode exercer na actividade e bem estar do nosso povo, convém fazer o seu estudo com o meticuloso cuidado que deve merecer um dos mais delicados e fascinantes problemas portugueses.
E, uma vez terminados êsses estudos, que não são caros, nem morosos, nem profundos, haveria conveniência em traçar um plano de conjunto, a realizar por fases, em uma, duas ou mais gerações, que tivesse em conta todas as modalidades do problema e oferecesse soluções para as incógnitas que ainda hoje obscurecem certos aspectos da vida económica nacional.
2. Em contrário do que acontece com a riqueza hidrográfica de muitos países, a nossa, representada pelos seus rios, é susceptível, na opinião de autorizadas pessoas que cuidadosamente se têm dedicado a estes assuntos, de ser aproveitada com benefício tríplice: o da produção de energia, o da navegação, o da rega e, em alguns casos, o do domínio de torrentes, e por conseqüência da defesa dos terrenos de jusante.
Êste último pode representar para certas zonas um grande benefício.
O capital despendido nos aproveitamentos é recompensado por três modos, e até por quatro, e, se proporcionalmente fôr dividido em acôrdo com os fins económicos assegurados pelas obras que o utilizam, sem dúvida que, cada uma delas, considerada à parte, será executada com despesa muito inferior àquela que teria de ser feita se não concorresse também para outras utilizações.
É à luz dêste critério utilitário que deve ser encarado o estudo e o aproveitamento dos rios nacionais. Qualquer outro embaraçaria a questão. Torná-la-ia mais confusa e até poderia trazer prejuízos graves no futuro económico e social do País.
A importância dos principais sistemas hidrográficos portugueses
3. Um ilustre economista e escritor do país vizinho parece ter calculado que cêrca de 52 por cento da água que se escoa da Península Ibérica passa através de Portugal. Não é fácil verificar esta estimativa.
Em todo o caso, alguns elementos se podem obter do exame das bacias hidrográficas dos principais rios espanhóis, luso-espanhóis e portugueses. Os números que seguem exprimem as mais importantes características no que diz respeito a superfícies das bacias hidrográficas peninsulares(2):
Área da bacia hidrográfica
(Km2)
Minho:
Espanha...17:014
Portugal... 824
17:838

(1) Diário das Sessões de 8 de Fevereiro de 1935.
(2) Anuário Estatístico de Espanha, ano XVIII, 1932-1933.

Página 86

344-(86)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
Área da bacia hidrográfica
(Km2)
Lima:
Espanha... 1:511
Portugal... 1:083
2:594
Douro:
Espanha... 79:326
Portugal... 19:049
98:375
Tejo:
Espanha... 56:749
Portugal... 24:198
80:947
Guadiana:
Espanha... 55:422
Portugal... 12:420
67:842
Rios portugueses:
Mira... 1:541
Mondego... 6:843
Arade... 982
Sado... 6:668
Outros... 14:891
30:925
Na Península, a área total das bacias hidrográficas é de 583:500 quilómetros quadrados, dos quais 30:925 pertencem a rios exclusivamente portugueses, 284:979 a rios exclusivamente espanhóis, 210:022 a rios luso--espanhóis em Espanha, e 57:574, a rios luso-espanhóis em Portugal. Assim, a água dos rios que provém de uma bacia hidrográfica de 298:521 quilómetros quadrados — mais de metade do total das bacias hidrográficas da Península — encontra o seu escoamento através de Portugal.
Isto não quere evidentemente significar que mais de metade da água que cai na Península, e até no país vizinho, se escoe pelos rios portugueses, porque a altura das chuvas varia de maneira considerável de região para região. Com efeito, em Espanha as zonas mais chuvosas são as do norte e as pirinaicas da bacia do Ebro.
Nas do norte uma parte das chuvas encontra o seu caminho para o mar através do Douro.
4. As cifras que acabam de ser transcritas mostram duas cousas: a primeira diz respeito ao domínio dos rios e à regularidade de seus caudais. Não é problema, exclusivamente português que possa ser resolvido satisfatória e definitivamente em Portugal. Grande parte da água que se dirige para o mar através de rios nacionais provém de chuvas que caem no país vizinho. A segunda é que as disponibilidades aqüíferas portuguesas são vastas e derivam de bacias hidrográficas de regime quási torrencial em muitas zonas semi-áridas, sobretudo nos cursos do Tejo e Guadiana.
Se a abundância de águas originárias do país vizinho é vantajosa, o seu regime de escoamento traz manifestos prejuízos à economia nacional — que, até na hipótese de se não aproveitarem, leva a gastos enormes na defesa de ricas terras de jusante — ou então, como até agora tem acontecido, a perdas consideráveis resultantes de inundações, que se repetem em períodos que variam quási todos os anos, sobretudo no baixo Tejo.
O problema que se põe é, por conseguinte, na parte que diz respeito a Portugal, atenuar na medida do possível a influência que as precipitações pluviométricas em áreas portuguesas possam ter no regime de caudais do rio — e isso só pode ser feito pela retenção de águas próprias e de seus afluentes nas épocas em que se dão as cheias de proveniência espanhola. Não se resolve assim inteiramente o problema, mas alivia-se até certos limites a pressão das cheias caudalosas, quando há coincidência de chuvas nos dois países.
A regularização dos principais rios portugueses pode por outro lado ser muito melhorada por obras executadas em Espanha no sentido de se aproveitarem as possibilidades hidroeléctricas e outras que êles possuem em território espanhol — e os exemplos de Ricobayo e de diversas albufeiras de menor importância já influíram bastante no regime do Douro. Êste rio e o Tejo são indubitàvelmente os dois mais importantes cursos de, água do País, aqueles que maior influência podem exercer no nosso futuro económico.
No Tejo a regularização dos caudais é difícil, se se considerar apenas o território nacional. Não é fácil armazenar no próprio leito do rio a quantidade de água suficiente para debelar ou, pelo menos, enfraquecer consideràvelmente o regime das cheias que em períodos incertos e imprevisíveis assolam as regiões do Ribatejo.
Contudo, a influência dos dois tributários Zêzere e Ocresa, além do Ponsul, pode melhorar êsse regime.
No troço internacional do Tejo — desde o Sever ou proximidades até ao Erges, numa distância de cêrca de 47 quilómetros — há possibilidades de efectuar obras hidráulicas muito importantes. A construção de uma barragem a montante do pôrto do Tejo, em Ródão, antes da confluência do Sever, formaria um lago de grande extensão, que poderia armazenar uma grande quantidade de água. Êste depósito, se possível, exerceria sôbre os caudais do Tejo influência semelhante à que o do Ricobayo já exerce nos caudais do Douro. Seria um poderoso meio de os regularizar. Ajudaria a navegação e formaria uma reserva importante de água, lançada ao rio durante o verão, que poderia até aproveitar-se em regas no Baixo Tejo.
As barragens no Zêzere, no Ocresa, no Tejo nacional e no Tejo internacional constituem o único remédio hidráulico susceptível de melhorar a sua curva de vazão e, pode dizer-se, que contribuïria para o equilíbrio do regime torrencial de um dos maiores rios portugueses, o qual, por êsse motivo, seria navegável para barcos de 1:000 toneladas até à fronteira, com menos de meia dúzia de comportas, depois de efectuadas algumas obras no seu tramo inferior.
Êste problema não pode ser por agora explanado com o desenvolvimento que merece, porque por um lado não há ainda estudos suficientemente avançados que permitam chegar a conclusões definitivas e por outro a sua viabilidade depende também de acôrdo com o país vizinho, de interêsse para ambos, sôbre o melhor meio de aproveitar as possibilidades hidroeléctricas e as de navegação no Tejo internacional. Talvez fôsse fácil, dadas as vantagens, levar a cabo negociações entre a Espanha e Portugal. Se há interêsse para o nosso País no aproveitamento do trôço inferior, talvez que, pelas razões expostas, haja para a Espanha maior interêsse no aproveitamento do troço superior, não só como fonte de energia, como também pelo barato e eficiente meio de comunicações numa zona que delas muito carece. Aliás, a questão do aproveitamento racional dos rios luso--espanhóis necessita de ser estudada. Uma política hidráulica comum, tanto no Tejo como no Guadiana e outros cursos de água, pode levar a resultados altamente benéficos para os dois países.

Página 87

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(87)
As condições físicas dos principais rios nacionais
5. O que acaba de se escrever mostra que as disponibilidades aquíferas de Portugal são grandes.
Conhecem-se os desníveis aproximados dos rios portugueses desde a fronteira, ou desde a origem até ao mar, e nalguns dêles, como no Douro, sobretudo no troço internacional, são muito sensíveis. Êsses desnivéis resultam essencialmente da configuração orográfica da Península, com um vasto planalto no interior, que ràpidamente se esbate na direcção do mar, já dentro do País ou em suas fronteiras.
Como a fôrça hidráulica dos rios resulta da quantidade de água que por êles passa e do desnivel dos vales por onde corre, segue-se que as condições físicas das correntes portuguesas são propícias à produção de grandes quantidades de energia permanente — se fôr possível compensar no estio o que é susceptível de ser produzido no inverno — ou, digamos, no período de seis meses.
Os vales através dos quais se escoam as águas dos principais rios são em geral estreitos e escarpados e em muitos lugares permitem a construção de barragens de média altura. Os homens destruíram um pouco estas condições naturais. As três linhas férreas — a do Douro, em menor escala, a da Beira Alta, e a da Beira Baixa — limitaram apreciàvelmente as possibilidades de armazenamento no Douro, no Mondego e no Tejo. Mas tanto a primeira como a última das linhas de água citadas têm afluentes onde podem ser construídos reservatórios apropriados à retenção de muitas centenas de milhões de metros cúbicos, que viriam a influir na sua utilidade económica.
O problema do domínio dos rios portugueses em território nacional pode ser tentado, através da regularização dos seus afluentes, de dois modos: pelo povoamento florestal das encostas mais sujeitas à erosão e pela retenção por meio de açudes do excesso de águas em épocas de cheias.
Não pode já hoje haver dúvidas de que um dos motivos do tremendo desequilíbrio de caudais existente em rios nacionais provém da nudez em vegetação de parte das suas bacias hidrográficas, sobretudo daquelas que se encontram nas cabeceiras dos afluentes.
O excessivo uso dos solos de encostas, que tem como resultado a erosão contínua, a ponto de as transformar em largas manchas, com afloramentos à vista, em poucos anos, é um dos grandes males de certas zonas do País e concorre em elevado grau para o problema das torrentes e o assoreamento dos rios.
Não se conhece ainda hoje de maneira precisa o valor das florestas na regularização de cheias, mas está definitivamente esclarecido que o povoamento florestal nas cabeceiras e encostas dos afluentes torna muito mais regulares os seus caudais. As fôlhas e outros resíduos vegetativos dão propriedades aos solos. E uma parte da água das chuvas em vez de correr pelas encostas para os vales, encontra o seu caminho para o subsolo e reaparece tempos depois sob a forma de nascentes. A matéria orgânica no solo das florestas tem a propriedade de absorver água na proporção de umas poucas de vezes o seu volume.
E assim possível transformar muitos rios ou ribeiras intermitentes, que, por meio de povoamento florestal adequado, passam a rios ou ribeiras de caudal permanente. Evita-se também por êste modo o transporte de vastas quantidades de detritos do solo das encostas, que nos rios torrenciais são transportados para os terrenos de jusante.
Há vantagens em estabelecer na maior parte das bacias hidrográficas nacionais um plano de correcção de cheias por meio de povoamentos florestais, que têm de englobar terras pertencentes ao Estado (baldios) e a particulares, e o estudo e aplicação de métodos de cultura adaptados às encostas mais íngremes é hoje uma grande necessidade em certas zonas do País.
Qualquer plano de arborização tem de atender, pelo que acaba de se expor, ao regime de rios. Tem de cuidar da correcção das torrentes, de modo a arborizar as zonas que maior influência podem ter no seu carácter torrencial. As essências florestais necessitam de ser escolhidas também, tendo em conta a sua capacidade de absorpção de água, porque é sabido existirem algumas que, quando plantadas nas encostas dos rios, possuem efeitos negativos — deminuem o caudal de estiagem, em vez de o normalizar, aumentando-o, de modo a poderem ser fornecidas quantidades importantes de energia estival (seis meses) e muitas dezenas de milhões de metros cúbicos de água, para rega, no Tejo.
A segunda conclusão, tam interessante como a primeira, é a de que se torna possível o aproveitamento na época da seca, nos dois grandes rios, das águas já regularizadas, nos afluentes ou em Espanha, pela construção de barragens de altura média, às quais se poderão adaptar meios de elevação de barcos de fundo chato, capazes de transportar cargas, que poderão aproximar-se de um milhar de toneladas, tanto no sentido ascendente como descendente. E isto constituïria grande auxílio no desenvolvimento económico de regiões atrasadas.
II UTILIZAÇÃO DOS RIOS
6. Os quatro grandes aspectos da actividade nacional ligados à utilização dos rios são, talvez, por ordem de sua grandeza:
a) A rega;
b) A produção de energia;
c) Os transportes fluviais;
d) O domínio das cheias.
Colocou-se em primeiro lugar a rega, porque há muitas e boas terras no País susceptíveis de serem irrigadas — e sem umidade elas nunca poderão produzir, por unidade de superfície, os rendimentos necessários à vida de uma população suficientemente densa.
Mas, embora pela grandeza de sua importância a rega talvez constitua o primeiro problema ligado aos rios, principalmente às bacias hidrográficas do Tejo, Guadiana, Mondego, Vouga, Sado e outras de menor influência, nunca poderá desligar-se o problema da rega do da energia. Completam-se, porque não poderá haver rega em largas áreas, econòmicamente remuneradora, sem energia a preços extremamente baixos. E esta só pode ser obtida na sua forma temporária nos rios de grandes caudais, como o Douro, o Tejo e ainda outros.
A irrigação parece ser um dos sólidos fundamentos do futuro desenvolvimento agrícola do País, mas nunca poderá ser alargada, como merece, sem concomitante abastecimento de energia muito barata, em virtude da necessidade de elevação de água. A rega está, por isso, ìntimamente ligada à produção de energia. O que acaba de dizer-se refere-se tanto à água desviada de rios como

Página 88

344-(88)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
à que é susceptível de ser elevada de lençóis subterrâneos.
No que diz respeito à navegação o problema é mais simples, porque resulta da regularidade dos rios — e é principalmente no Douro e no Tejo onde poderá ter maior influência nacional.
A ordem dos aproveitamentos
7. É conhecida a regra elementar da formação de capitais e não vale a pena expor agora largamente os problemas que ela suscita. Sabe-se também, apesar da impressão em contrário, que parece existir no espírito de muita gente que se considera bem informada não serem ilimitadas as actuais disponibilidades do capital português e conhece-se a relutância que muitos dos seus detentores opõem ao seu emprêgo em obras de vulto, sobretudo em obras que levam anos a completar-se e só podem ser remuneradoras depois de mais anos ainda na criação de mercados. Considerado no conjunto, o problema hidráulico português requere em primeiro lugar a execução dos projectos mais reprodutivos — aqueles que tragam maior número de benefícios económicos à vida nacional.
Antes, por conseqüência, de iniciar qualquer emprêsa hidráulica, manda o bom senso que se avaliem os recursos disponíveis, incluindo o capital e a técnica, e se determinem, com a possível aproximação, os resultados económicos do dispêndio de avultadas somas em país onde não abunda o capital.
Foi sempre assim em todos os países progressivos — e de erros que porventura venham a cometer-se nesta quadra da vida do mundo e da Nação portuguesa podem resultar atrasos, e até retrocessos, no bem-estar e no progresso social das gerações vindouras.
Tudo indica, pois, que o factor custo, na rega, no transporte e na energia, deva ter o maior pêso. Não pode nem deve haver românticos entusiasmos perante a formação de grandes lagos, ou orgulhos patriotas em frente de altas barragens. Os problemas económicos neste aspecto reduzem-se a fórmulas simples, que no final de contas nos dão os rendimentos no presente e no futuro, baseados nas realidades actuais e nas possibilidades dos tempos que hão-de vir.
Cabe ao Estado, como árbitro e regulador do bem-estar social, o dever de impor as melhores soluções. E neste momento é a êle que compete determinar a prioridade na execução da obra de fomento hidráulico exigida pelos supremos interêsses do País.
Não há preocupações dogmáticas no que vai ler-se. Sôbre um aspecto da vida económica nacional dos mais importantes, e talvez dos mais graves de todos, não pode haver opinião definitiva. Só depois de analisados todos os factores à clara luz do bom senso se devem estabelecer, as melhores soluções. Elas são conseqüência lógica de um conjunto de estudos e raciocínios, e o exame cuidadoso de todos os factores que as podem afectar deve ser feito pelo maior número possível de entidades especializadas nos diversos aspectos políticos, sociais, económicos e técnicos que contém.
Dos elementos que até agora vieram a lume, da sua análise cuidadosa e das opiniões de diversas pessoas autorizadas resulta, até prova em contrário, que os dois rios que devem ser estudados e regularizados em primeiro lugar são o Douro e o Tejo. O Douro nacional parece dever ter primazia sôbre o Douro internacional e, no Tejo, as barragens do Zêzere e Ocresa, além das duas ou três no Alto Tejo, podem ser incluídas numa 1.ª fase, com o objectivo de produzirem energia permanente.
As obras nestas bacias hidrográficas atendem à produção de energia, à navegação fluvial, à rega e ao domínio de cheias. Umas impõem-se, como a navegação do Douro, por virtude da possibilidade de explorar recursos mineiros importantes; outras comparticipam e facilitam o plano de regas e o domínio de cheias, como as obras no Tejo e afluentes; outras, ainda, além de produzirem energia, facilitam transportes baratos e consentem a elevação de vastas quantidades de água, que num futuro próximo podem alargar consideràvelmente o valor económico de regiões susceptíveis de melhores culturas agrícolas e concorrer para o estreitamento de relações políticas e económicas com o país vizinho.
A rega
8. A rega não faz parte pròpriamente do objectivo dêste trabalho. É um assunto complicado que requere minuciosas observações e pormenorizados estudos agronómicos, topográficos, geológicos, demográficos e outros.
O que se pretende apenas evidenciar é a sua utilidade e função económica.
Os principais benefícios da rega seriam no sul do Tejo, se fôsse possível derivar para lá grandes quantidades de água que hoje se escoam para o mar sem qualquer espécie de utilidade. Essas quantidades de água existem no Tejo, no Guadiana e em outros rios de menor importância. Por outro lado, não se pode dizer que as precipitações pluviométricas no Alentejo sejam baixas. Quem examinar a carta das chuvas e fizer o estudo dos elementos pluviométricos que periòdicamente e com regularidade se publicam em Portugal verificará que as médias de muitos postos udométricos alentejanos não são baixas, até em comparação com outros países europeus. Há zonas em que as médias são altas.
O que na verdade existe é uma extrema irregularidade nas precipitações, que não são corrigidas por águas de superfície ou de origem subterrânea. O efeito de povoamentos florestais e dos trabalhos de irrigação que porventura pudessem ser executados compensaria as falhas do regime de chuvas.
O problema que se põe, em sua simplicidade, resume-se, pois, em saber se é possível desviar dos rios de maiores caudais, no período de abundância de águas, uma parte delas para grandes reservatórios situados nas cabeceiras das linhas de água ou ribeiras alentejanas, com o objectivo de as utilizar no verão em rega de zonas vizinhas. É êsse o problema. E êste problema, na parte norte do Alentejo, só parece poder vir a ter uma solução: elevar a água do Tejo para largos reservatórios e distribuí-la no verão nas regas. Para isso é mester energia barata, muito barata, porque naturalmente a altura da elevação é grande e só poderá ser efectivada num espaço de tempo restrito, na época dos grandes caudais no Tejo. Quere dizer, se fôsse possível construir reservatórios no Alto Alentejo com capacidade suficientemente grande, êles receberiam, além da água recolhida das chuvas, os caudais elevados do Tejo por uma ou mais estações elevatórias, que poderiam ser construídas no local onde se produziria á energia, e utilizar esta ou outra de várias centrais. A energia incerta não tem valor. As bombas poderiam até ser ligadas directamente a turbinas que utilizassem energia sobrante ou temporária, se a houvesse, nas épocas mais propícias. Como essas bombas não consumiam energia permanente, mas apenas aquela que se dissiparia, perdida, se não houvesse outro meio de a aproveitar durante o pouco tempo em que pode ser produzida, o custo da elevação reduzir-se-ia quási só ao correspondente à amortização da maquinaria acessória, turbinas e bombas, e ao canal mestre por onde corre à água para os reservatórios.
9. O caso do Tejo, que é rio de grandes caudais, seria sem dúvida um dos que devia merecer maior estudo.

Página 89

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(89)
Não há evidentemente receios de falta de água. Já hoje se conhecem com certa aproximação as quantidades de água que por êle passam há muitas dezenas de anos. Essas quantidades atingem cifras compreendidas entre cêrca de 5:000.000:000 e 20:000.000:000 de metros cúbicos, respectivamente nos anos mais secos e úmidos, se se tomar como base a escala do pôrto do Tejo em Ródão, quási no começo do troço nacional. Estes números mostram na verdade as enormes disponibilidades susceptíveis de serem desviadas para o Alentejo, para os reservatórios que porventura ali posam ser construídos.
Por outro lado, deve atentar-se que em qualquer cálculo tendente a obter o custo da energia hidroeléctrica há que ter sempre em conta os anos muito secos. Nunca pode ser considerada como energia permanente aquela que por lapsos de tempo não existe.
Os períodos de anos em que isso acontece variam — e nos outros há sempre margem de produção de energia, que se perde em parte ou totalmente. É o aproveitamento dessa energia e da água disponível que serviria de base a uma larga obra de irrigação, que transformaria no futuro vastas regiões, secas e até desoladas ainda hoje, e fixaria nelas as populações das zonas super-povoadas. A colonização interna sem água é um mito. O elemento fundamental para a levar a efeito é o da presença de água, e esta só pode ser obtida dos rios nacionais ou de lençóis subterrâneos. Para o problema ser resolvido será necessária a utilização de uma ou outra destas fontes.
Há a acrescentar que nem toda a energia consumida na elevação de água é perdida. Parte pode ser recuperada no acto da rega, no verão, exactamente quando é maior o seu valor. Haveria, se fôsse possível — e no caso do Tejo isso parece, na verdade, ser um facto —, o consumo de energia temporário na elevação das águas durante o inverno, energia que seria totalmente perdida se não fôsse aproveitada a água, e a sua parcial recuperação no estio, durante as operações da rega, à medida que fôsse sendo utilizada. E ainda, para maior interessa, haveria que contar com aquela que poderia ser obtida pela retenção da água das chuvas na bacia hidrográfica do reservatório.
Ora o preço da energia na época estival é muito maior do que no período de abundância de águas. Em alguns casos, a experiência de países que largamente usam hoje êste sistema de irrigação — a energia recuperada é superior a um quarto da energia consumida na elevação das águas. Esta tem muito fraco valor, ainda que seja transmitida. Nunca será porventura superior, em preço, a $04, visto êsse preço ser constituído quási só pela amortização das máquinas acessórias e pouco mais.
No caso de recuperação de apreciáveis quantidades de energia, vê-se logo que o seu custo é de pouca importância.
A questão tem pois grande interêsse e merece um estudo profundo e cuidadoso. Os factores que nêle podem influir, no caso do Alto Alentejo, são: o caudal do Tejo durante o inverno; a energia temporária disponível; a possibilidade de fazer a elevação das águas nas proximidades da central produtora de energia; o custo da transmissão, se fôr necessária; a técnica e economia de uma estação de bombas de grande capacidade; à possibilidade da construção de um canal que levasse as águas até um reservatório de largas dimensões, situado na cabeceira de uma ribeira ou rio que permitisse a construção de barragem ou barragens de média ou grande altura; e, finalmente, a topografia do terreno e sua geologia, suas características agronómicas e a área suficientemente grande que permitisse a amortização em prazo largo das obras e instalações necessárias.
E nunca deve ser esquecido que durante o estudo de todo o projecto não é indiferente a possibilidade de recuperar parte da energia consumida na central elevatória.
Mas a rega também é praticável, em circunstâncias que não serão porventura muito onerosas, noutros pontos do País, como, por exemplo, nos 10:000 ou 15:000 hectares da Cova da Beira, por água desviada do Alto Zêzere e do Alto Mondego, regularizada nas cabeceiras dêstes rios, com uma central, aliás já prevista, nas proximidades de Valhelhas; em largas áreas de terrenos da Beira Litoral, com água do Vouga e do Mondego; nas regiões do Baixo Alentejo, com águas provenientes do Guadiana, e ainda em outras zonas importantes do País.
Em todos, ou quási todos os casos, será sempre a existência de energia barata, temporária, que decidirá das possibilidades da rega.
Vê-se, pois, que os dois grandes problemas — o da irrigação e o da energia — estão ìntimamente ligados, devem ser vistos em conjunto, completam-se. Se forem considerados em separado não poderão produzir os resultados económicos que dêles se podem extrair.
A produção de energia
10. Há quem afirme isto: o País não necessita de importar um quilograma de hulha para a produção de energia destinada a fôrça motriz, a consumo doméstico em luz e outros fins. O único combustível a importar seria o destinado a raros processos industriais que dele necessitam para a produção de vapor essencial a certas indústrias, a transportes mecânicos, navegação e alguns caminhos de ferro e pouco mais. As pequenas reservas de carvões nacionais poderiam ser utilizadas noutros fins.
Os rios portugueses têm condições físicas para poder produzir toda a energia permanente (de verão e de inverno), a preços suficientemente baixos, necessária ao desenvolvimento progressivo das indústrias e outros consumos durante largo espaço de tempo. Não há necessidade de centrais termoeléctricas de reserva destinadas a suprir as falhas de estiagem, desde que se considere em conjunto o sistema hidrográfico português e se execute um plano racional que tenha êsse objectivo: subtrair o abastecimento de fôrça motriz das contingências da importação de carvões e de centrais termoeléctricas de reserva.
A afirmação é grave e muito importante. Ela significa que a combinação das possibilidades hidráulicas dos diversos rios portugueses pode suprir inconvenientes conhecidos de todos em caso de guerra e evitar a construção de vastas centrais termoeléctricas dependentes do consumo de carvões nacionais ou importados, de natureza também contingente, e trabalhando em condições pouco económicas. Neste último caso, a contingência das centrais de socorro resulta da impossibilidade de fixar prèviamente qual a sua capacidade, que, na hipótese das centrais consumindo carvões nacionais inferiores, está ligada à própria capacidade de produção das minas. Uma estiagem prolongada ou maior do que a prevista exigiria o fornecimento de maiores quantidades de energia e, por conseqüência, maior produção de carvão em mina que poderia ter sido apetrechada para produções menores.
Se fôsse possível combinar as capacidades de produção dos rios nacionais de modo a tornar independente de combustíveis o abastecimento de fôrça motriz às fábricas e serviços públicos e domésticos, alcançar-se-ia solução ideal para um dos mais importantes problemas portugueses — senão o mais importante.

Página 90

344-(90)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
A simples afirmação merece, por conseqüência, um estudo demorado e sério, que deve ser feito pelo Estado, auxiliado por todos aqueles que directa ou indirectamente tenham um grau de responsabilidade no desenvolvimento da vida económica nacional.
A luz dos elementos que foram fornecidos por vários especialistas e como resultado de diversos inquéritos, mencionam-se a seguir alguns dos fundamentos em que assentam as importantes conclusões que acima se transcrevem.
Quantidade de energia
11. O primeiro ponto que convém definir, quando se trata de energia hidroeléctrica, é êste: em que base se devem calcular as quantidades de energia susceptíveis de ser produzidas nos rios portugueses? Tomar em conta os anos de chuvas médias? Considerar a média de anos secos, médios e abundantes de chuvas? Ou considerar apenas os anos muito secos?
As quantidades de energia susceptíveis de ser produzidas pelos rios e que, por conseqüência, poderão servir de base a planos de reorganização industrial; o preço de cada unidade; as indústrias que podem ser instaladas com carácter de trabalho contínuo durante todo o ano e em todos os anos e as que o podem ser apenas com carácter intermitente, usando energia temporária, quando a houver; e ainda outros problemas de ordem industrial, agrícola e até social, dependem evidentemente de resposta à pregunta já formulada e que agora se repete: em que base se devem calcular as quantidades de energia derivada de rios portugueses ou susceptíveis de ser produzidas depois de regularizações dentro e fora do território nacional?
Os elementos em que se firma êste estudo assentam sôbre as possibilidades de produção de energia nos anos muito secos.
Parece ser esta a única base que pode ser tomada no caso português, porque é a única que evita nesses anos a falta de energia. Ela assegura energia permanente, que permite o trabalho regular nas indústrias, dispensa a construção de grandes centrais de socorro que consumam carvões importados ou nacionais. E ainda é ela que evita a construção de enormes barragens e a criação de vastas albufeiras destinadas a armazenar grandes quantidades de água.
E, se fôr tam baixo o preço do custo que indique o desenvolvimento dos rios nesse sentido, é naturalmente nessa base que todo o problema deve ser visto.
A energia temporária que porventura resulte pode ter aplicações que demandam preços muito baixos, como as que já foram apontadas para rega. Ajudaria a resolver problemas importantes, até basilares, sem ferir, afinal de contas, o objectivo fundamental, que é o de obter de rios nacionais energia permanente a preços que possam competir com idênticos no estrangeiro e remuneradores do capital empregado.
Convém, em primeiro lugar, determinar quais as disponibilidades energéticas dos principais rios portugueses e destrinçar a que é permanente e temporária, tanto de verão como de inverno.
O critério seguido, como se esplanou atrás, foi o de considerar a energia certa nos anos muito secos e computar também a energia incerta — aquela que pode ser produzida nos anos úmidos e médios, à qual contudo se não atribue valor.
Para mais clara compreensão do assunto dividiram-se as principais fontes de energia hidroeléctrica em sistemas, de modo a ser compensado o excesso de energia temporária no inverno por energia estival, a fim de aumentar o total de energia permanente por meio da transformação da temporária, e a reduzir o preço médio.
Podem considerar-se, na opinião de diversos especialistas, os principais sistemas, que seguem:
a) Cávado-Rabagão;
b) Douro nacional-Zêzere-Mondego-Vouga (tramos inferiores);
c) Douro internacional, afluentes do Douro, Alto Zêzere e Alto Mondego;
d) Tejo nacional-Ocresa-Tejo internacional.
Não se entrou em linha de conta nem com o Lima, que, depois de regularizado em Espanha, pode produzir umas centenas de milhões de unidades, nem com o Guadiana e outros cursos do sul do Tejo, ainda pouco estudados mas susceptíveis de fornecer energia para rega.
Os números que adiante se transcrevem devem ser tomados com a natural reserva que costuma fazer-se em estimativas desta natureza. Êles representam simplesmente uma aproximação.
Apenas querem significar que há, na verdade, vastas quantidades de energia no País e que, se fôr coordenada a sua produção, as diversas fontes dessa energia se podem compensar de modo a tornar desnecessária a instalação de grandes centrais termoeléctricas.
Os números gerais são:
Energia permanente e incerta
[Ver diário original]
Observações: 1. A energia estival pode ser obtida no Zêzere, Mondego e talvez Vouga. 2. A energia estival pode ser obtida no Alto Zêzere, Alto Mondego e afluentes do Douro. 3. Energia estival do Ocresa, e possìvelmente Tejo internacional.
Estes números hão-de parecer muito altos. Contudo pecam por defeito quanto ao Tejo se se tiverem em conta as possibilidades do troço internacional.
As cifras referem-se ao aproveitamento integral doa rios mencionados, usando o método racional de os considerar em conjunto e não esquecendo as compensações hidráulicas a que podem dar lugar.

Página 91

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(91)
III
O DOURO NACIONAL
12. No Douro (desde Pé de Moura até ao Pocinho) podem construir-se cinco ou seis barragens, com quedas úteis de 4 metros nas duas primeiras ou uma de 8 metros (Pé de Moura e Entre Rios). As restantes seriam a de Sinfãis (Carrapatelo), de 34/28 metros; a da Régua, de 17/10 metros; a de Pinhão, de 17/10 metros; a da Farradosa, de 19/12 metros, e finalmente a do Pocinho, de 16/9 metros. Supondo os caudais úteis de 120 metros cúbicos por segundo durante todo o ano e mais 90, 150 e 200 metros cúbicos, respectivamente, durante sete, cinco e três meses, os números dão 795.000:000 de kWh de energia permanente, 500.000:000 de kWh de energia de sete e cinco meses, convertível em grande parte em permanente por virtude da energia estival do Zêzere, e finalmente 210.000:000 de kWh de energia de três meses. As duas primeiras centrais de Pé de Moura e (Entre Rios de 4 metros cada uma ou, simplesmente, uma de 8 metros forneceriam cêrca de 30.000:000 de kWh de energia estival (seis meses).
O que acaba de dizer-se revela as enormes possibilidades do Douro nacional, até na hipótese de não terem sido regularizados os seus afluentes, que são o Sabor, o Tua, o Távora, o Tâmega, o Varosa e o Paiva, para só falar nos mais importantes, no ponto de vista energético.
O caudal de 120 metros cúbicos aproxima-se do actual, que se computa já em 115:000 litros por segundo, «em bem mais de 100 metros cúbicos por segundo nos dias de vasão mínima do Douro acima da confluência do Paiva».
Assim, numa primeira fase de realizações, o Douro nacional atinge produção de grande importância e, se fôr apoiado pela energia estival do aproveitamento do Zêzere, mais ainda se valoriza a sua posição.
Dos sistemas mencionados, no quadro atrás transcrito, os dois mais valiosos são indubitàvelmente os que incluem o Douro e o Tejo.
Já sucintamente se desenvolveram as razões da importância dêstes dois grandes rios. Repetem-se agora algumas e juntam-se outras.
O sistema Douro-Zêzere (tramo inferior), para não falar no Mondego e no Vouga, assegura duas cousas fundamentais para a economia nacional: a produção de grandes quantidades de energia permanente e temporária no Douro, a última da qual pode ser convertida em permanente, combinada com a estival do Zêzere, e a navegação de barcos de muitas centenas de toneladas até, pelo menos, ao Sabor. A navigabilidade do Douro nacional permite o desenvolvimento dos jazigos de ferro de Moncorvo e talvez Guadramil, no distrito de Bragança, os do Marão e os alabastros e mármores de Vimioso e possìvelmente melhorará as condições de exploração de crómio e outros metais em Trás-os-Montes.
Após as regularizações espanholas de Vilardiegua e Tormes, além da de Vilalcampo, em andamento, e das regularizações possíveis nos seus afluentes em território nacional, algumas das quais já foram estudadas, as possibilidades do Douro aumentam apreciàvelmente.
Na primeira fase as potências instaladas permanentes e temporárias são quási iguais. À medida que se alargarem as regularizações, a potência permanente torna-se muito maior, donde resulta que o preço da unidade de energia melhora bastante.
O problema mais importante no aproveitamento do Douro nacional durante a primeira fase e também, embora em menor grau, durante a segunda é, por conseqüência, valorizar a enorme quantidade de energia temporária cinco a sete meses que é susceptível de produzir.
Avaliam-na alguns especialistas em cêrca de 500.000:000 de unidades, das quais 225.000:000 durante sete meses e 275.000:000 durante cinco meses. É energia que provàvelmente se dissipará na sua maior parte no rio, por não ter utilização, sob a forma de água corrente. E não se contou ainda com a energia temporária incerta.
O grande problema que aparece, assim, no horizonte da economia das possibilidades do rio Douro na primeira fase do seu aproveitamento, reside na valorização da energia temporária. Se fôsse possível convertê-la em permanente, digamos, de 3:000 horas, as condições melhorariam de maneira considerável. Poder-se-ia dizer que o Douro, pelo simples aproveitamento do seu troço nacional, de Barca de Alva até Pé de Moura, com o actual débito (cerca de 120 metros cúbicos), é susceptível de produzir perto de 1:300.000:000 de kWh e ainda talvez sobrassem durante dois ou três meses 100.000:000 ou 200.000:000 de unidades de energia.
Se estão certas estas previsões, e todas elas se podem fàcilmente confirmar ou não, o tramo nacional do Douro adquire importância muito grande na vida económica, sob o ponto de vista energético. Por si só, pode fornecer quantidades de energia de ordem de grandeza realmente fora do vulgar.
Um outro aspecto toma também o aproveitamento dêste rio e já atrás a êle se aludiu. O Douro é a via natural de escoamento das disponibilidades metalíferas de uma zona que é rica em minérios de ferro e talvez outros. Trás-os-Montes, sobretudo o distrito de Bragança, hoje pobre e de acanhada vida social e económica, pode converter-se em uma região de actividade apreciável.
Os jazigos de ferro de Moncorvo e outros já se encontram em adiantado reconhecimento. E parece, pelos trabalhos efectuados, que as reservas de minérios de teor compreendido entre 45 e 55 por cento, ou talvez mais, são superiores a 150.000:000 de toneladas. As minas estão situadas a pequena distância do Douro.
Pode dizer-se que o minério será carregado um dia quási da mina para o barco que o transportará ao mar. E o transporte da mina far-se-á pela simples acção da gravidade. Não será preciso fôrça motriz para efectuar o transporte.
Quando se pensa um pouco sôbre a posição das minas de ferro de Trás-os-Montes relativamente ao Douro e se consideram as possibilidades de navegação dêste rio e as grandes quantidades de energia permanente que podem resultar do simples facto de o tornar navegável, vê-se logo a importância que êle há-de vir a ter na vida económica portuguesa e o seu grau de prioridade na execução de obras. Podem juntar-se ainda as vantagens da exploração das pedreiras de alabastro e mármores de Vimioso, das cromites do distrito de Bragança e, certamente, doutros produtos metalíferos que uma zona tam mineralizada venha ainda a revelar, além da possível intensificação agrícola.
Não se levaram em conta nesta leve resenha os produtos aqüícolas nem os florestais nem outros recursos susceptíveis com certeza de maior desenvolvimento da margem esquerda numa região longe de comunicações e com insuficiente rêde de estradas.
As possibilidades siderúrgicas dos minérios de Trás-os-Montes e sua utilização
13. Não é êste o lugar próprio, nem convém entrar agora na questão, para examinar, em pormenor, a metalurgia do ferro em Portugal. Muitas pessoas têm dis-

Página 92

344-(92)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
cutido o assunto e foram já consultados especialistas estrangeiros de diversas categorias que parece terem apresentado relatórios sôbre a parte mineira e metalúrgica do empreendimento. Há quem opine que as oficinas se situem nas proximidades dos jazigos e se empregue a electricidade como fonte de calor e carvão vegetal como redutor na fusão do minério.
Há outros que entendem dever o minério ser transportado para as proximidades do mar, porque seria menos onerosa a distribuïção dos produtos, mais fáceis os abastecimentos em coque, se porventura se reconhecesse ser necessário o seu uso, mais cómodo o fornecimento de calcáreo, e outras variadas cousas que uma emprêsa dêste género requere.
A questão não parece ser muito difícil de resolver. Convém apenas pesar cuidadosamente todos os factores que: nela influem, e de todos o mais importante é o transporte de minério, do calcáreo, do redutor, do combustível, dos produtos dos altos fornos, incluindo as escórias de utilidade em algumas aplicações, de um certo número de abastecimentos indispensáveis, da mão do obra especializada, das necessidades de importação e exportação, e outras.
Na opinião de experimentados especialistas «the location of a blast furnace plant is determined chiefly by the two factors of cost of assembling raw materiais and cost of marketing the product. Other factors occasionally influence location, but in the long run these two are all important and will have the deciding effect on the establishement of any considerable industry» (1).
14. Os principais jazigos de Trás-os-Montes estão situados quási à beira do Douro. Presume-se poder ser muito baixo o custo do transporte fluvial até ao mar. Isso deve naturalmente influenciar a localização de qualquer futura emprêsa siderúrgica, depois de atender a abastecimentos de minérios de outra origem, de reagentes, sucatas, de carvão, e aos mercados.
Quanto ao minério, pròpriamente de Moncorvo, parece ser relativamente fácil a sua exploração. As análises dão-lhe teor de ferro razoável, desde 56 por cento até 45 por cento. O teor de sílica é, porém, elevado; pode atingir 25 por cento. É por isso altamente silicioso, e nos fornos normais necessita de maior consumo de combustível. Com os modernos processos electrosiderúrgicos, embora não desapareçam totalmente os inconvenientes, atenuam-se muito.
As percentagens de enxôfre (0,03, 0,06 e 0,04) não são exageradas, embora altas, e as de fósforo, sendo também sensìvelmente altas (0,28, 0,39 e 0,54), não o desclassificam para certos processos siderúrgicos.
No estado actual do reconhecimento dos jazigos de ferro portugueses aqueles que apresentam maiores possibilidades de imediata utilização são talvez os de Moncorvo e Marão. O de Guadramil está situado a 70 quilómetros de Bragança, quási na fronteira, e contém razoáveis percentagens de ferro. Atingem, nalgumas amostras, mais de 60 por cento e é menos silicioso. Não há avaliação de reservas. O de Marão contém percentagens de ferro compreendidas entre 40 e quási 50 por cento, é muito silicioso e fica a 25 quilómetros de Vila Real. Está em reconhecimento. Os restantes, tirando o da Póvoa de Varzim, são no Alentejo.
Dos materiais precisos para a siderurgia ocupam os primeiros lugares o calcáreo e o carvão, ou coque.
Quanto ao último, êle pode ser utilizado como combustível e agente redutor. Há quem preconize o uso do carvão vegetal na siderurgia portuguesa, porventura na suposição de que existem «na metade norte do País florestas pràticamente inesgotáveis que podem fornecer grandes quantidades de carvão de madeira».
Esta afirmação não assenta em bases firmes e isso já o estão provando as dificuldades actuais resultantes da falta de importação de carvões estrangeiros. Parece deduzir-se delas que seria um êrro grave instalar uma grande oficina siderúrgica só na base de carvão vegetal, proveniente de florestas «praticamente inesgotáveis».
O exemplo do Brasil, em Minas Gerais, da Inglaterra, da Suécia e de outros países deve servir para aprofundar melhor êste assunto.
A actual instalação da Volta Redonda, que constituïrá dentro de alguns anos a maior oficina siderúrgica da América do Sul, assenta na base do carvão. Apesar das reservas florestais do Brasil, o local Volta Redonda, a 145 quilómetros do Rio e a 354 de S. Paulo, foi escolhido, tendo em conta a origem do minério de ferro e manganés, em Minas Gerais (João Ribeiro), a 400 quilómetros de distância; o calcáreo, que é transportado de S. Pedro do Sino, a 300 quilómetros, e finalmente o carvão, que virá por via marítima de Santa Catarina (900. quilómetros), e depois por caminho de ferro do Rio a Volta Redonda, no vale do rio Paraíba.
Não obstante estas distâncias, a produção no segundo ano de funcionamento atingirá, só em produtos de laminagem, cêrca de 250:000 toneladas. A produção de guza, no primeiro ano de marcha de um único forno de 1:000 toneladas, último modêlo norte-americano, será de 260:000 toneladas.
A experiência das instalações mais modernas no Canadá, índia, África do Sul e Austrália serviram de base à emprêsa de Volta Redonda, que engloba além disso os aperfeiçoamentos introduzidos na indústria durante a guerra pelos norte-americanos que a estão construindo.
No caso da África do Sul, já em plena produção, o minério de Thabazimbi (250:000 toneladas) vem de longe, e o de Pretória (85:000 toneladas) é explorado perto da oficina siderúrgica. O carvão é dos jazigos de Witbank e Natal, num total de 300:000 toneladas para uma produção de 180:000 toneladas de guza e o último percorre longas distâncias. O consumo de calcáreo anda à roda de 90:000 toneladas por ano.
Parece, por conseqüência, depreender-se, tanto no Brasil como na África do Sul, em instalações recentes, que na localização da indústria se devem considerar muitos factores, e que na verdade é razoável o parecer atrás citado, quando menciona o custo da reünião dos materiais e a comercialização dos produtos como os mais importantes. No Brasil, apesar de estar próxima a origem da energia hidroeléctrica (Ribeira das Lajes) e longe o carvão destinado ao coque, foi escolhido um ponto intermédio entre S. Paulo e Rio de Janeiro; na África do Sul, assentou-se na localização próximo de Pretória, não obstante a distância a que era preciso transportar parte do minério e do carvão. O custo dêstes dois transportes anda à roda de 28:000 contos por ano.
Em Portugal o transporte de minério pode ser feito por navegação fluvial, através de cêrca de 170 quilómetros, com a enorme facilidade de ser carregado directamente, ou quási, das minas para o barco.
Tudo parece aconselhar, portanto, que, à falta de outras razões, qualquer emprêsa siderúrgica, na base dos jazigos de Trás-os-Montes, seja localizada a jusante dos

(1) J. J. Portes, professor de metalurgia na Universidade de Cincinnati e engenheiro consultor de grande número de emprêsas siderúrgicas norte-americanas:
A localização de altos fornos é determinada principalmente por dois factores: o custo despendido na reünião das matérias primas e os custos, na comercialização dos produtos. Outros factores podem ocasionalmente influenciar a localização, mas de um modo geral estes têm toda a importância e decidem quando se pretende estabelecer uma indústria de certa importância.

Página 93

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(93)
depósitos, não longe do Pôrto, até na hipótese de electrosiderurgia, visto a energia poder ser obtida no Douro nacional a preços que não são muito superiores aos do Douro internacional.
15. Mas seja perto das minas ou perto do mar e do grande centro urbano do Pôrto, há um valioso instrumento que necessita ser utilizado — é o rio Douro. Utilizado para fornecimento de energia, que também é necessária ao centro metalúrgico; e utilizado, principalmente, para transportes, baratos. Aliás a exportação de minério, no futuro, só será possível na hipótese de haver navegação no Douro.
A importância do transporte por via fluvial no desenvolvimento de minérios pobres é bem ilustrada no caso da enorme indústria do ferro e do aço nos Estados Unidos.
Uma grande parte dos minérios de ferro ali utilizados provém de minas situadas a cêrca de 1:500 quilómetros do lugar onde êles são fundidos. A zona do lago Superior fornecia 86 por cento 1 do total de minério de ferro consumido em 1920 naquele país, e ainda hoje de lá vem cêrca de 75 por cento. Êsse minério tem de percorrer antes de chegar aos altos fornos distâncias em caminho de ferro que variam de 80 a 160 quilómetros, por lagos uma média de 1:280 quilómetros, e ainda em certos casos o percurso em caminho de ferro, desde o pôrto de descarga até aos fornos, atinge 160 quilómetros(1).
Deve acrescentar-se que os barcos que transportam o minério de ferro atravessam o canal de Sault, entre o lago Superior e Erie, construído entre pequenas lagoas e provido de comportas. Êsse canal existe numa distância aproximada de 77 quilómetros.
Pondo de lado a relatividade dos países, do tráfego, das minas, são ainda bem evidentes as grandes possibilidades em matéria de transporte que o rio Douro oferece a minérios de ferro e outros produtos baratos e volumosos e os benefícios que resultariam para a economia de toda a zona do norte e do País.
O problema da navegação do Douro parece, por conseqüência, ter importância excepcional porque permite a exploração económica de jazigos potenciais de ferro e outros. Assegura o seu transporte sempre no sentido descendente e cria condições para a produção de elevadas quantidades de energia, além de poder auxiliar a economia de uma zona que sofre de falta de comunicações, como é a da margem esquerda do rio.
A conversão da energia temporária do Douro em energia permanente
16. Viu-se atrás que o maior problema no horizonte da economia do rio Douro, na primeira fase do seu aproveitamento, consiste na utilização da energia temporária, da energia de cinco a sete meses, avaliada em cêrca de 500 milhões de kWh. Se fôsse possível valorizá-la numa primeira fase que resultaria do estabelecimento das condições de navegabilidade do rio, aconselhada pelas exigências de transportes fáceis e baratos, o total da energia permanente susceptível de ser produzida entre a Barca de Alva e Pé de Moura, com apoio estival do Zêzere, andaria à roda de bastante mais que um milhão de unidades.
Ora a conversão de energia temporária em energia permanente, de cêrca de 500 milhões de unidades, aumenta consideràvelmente o seu valor. Em quanto?
Aí está uma matéria que só as necessidades do consumo podem esclarecer. Só o desenvolvimento do País, tanto do lado agrícola e industrial como nas várias e numerosas aplicações da electricidade, pode indicar o grau de importância que é conseqüência da valorização da energia temporária em permanente. Mas é muito grande no estado actual da economia portuguesa.
Se fôsse possível combinar o regime de caudais do rio Douro com o que resulta da regularização de outros rios, ou até de seus próprios afluentes, poder-se-ia estabelecer a correspondência entre os respectivos regimes.
Esta correspondência obtém-se fàcilmente no Zêzere. Êste rio pode produzir, nos anos muito secos, energia estival, que, associada à temporária do Douro, converta esta em permanente.
Assim, enxertada nas possibilidades energéticas do Douro, está a questão das possibilidades do Zêzere. E se a energia dêste rio fôr considerada estival, isto é, utilizada no período em que desaparece a temporária (5 a 7 meses) do Douro, satisfazem-se outras condições que são próprias do regime do Zêzere e do Tejo, e que podem ser benéficas para êsses regimes. Além de que a média de um alto preço de custo (Zêzere) e de outro mais baixo (Douro), nivela o preço da energia.
A transformação da energia do Zêzere em estival obedece também às necessidades do regime do Tejo e pode ser benéfica para a economia do País. Por isso, parece ser vantajoso que o Zêzere forneça a energia estival necessária para transformar em permanente grande parte da energia temporária do Douro.
As possibilidades do Zêzere
17. Resta saber quais são as condições em que o Zêzere pode fornecer a energia estival necessária ao Douro.
Êste rio é valioso afluente do Tejo, com larga bacia hidrográfica, que drena as chuvas de uma região muito pluviosa (a serra da Estrêla) e possue condições físicas para grandes armazenamentos de água.
Há mais de vinte anos que se discute o seu aproveitamento, e tem aparecido sôbre êste rio as mais variadas opiniões. Fundamentalmente as soluções estudadas até agora para a utilização do Baixo Zêzere são três, uma das quais parece estar posta de parte:
a) A construção de uma grande barragem no Castelo de Bode;
b) Construção de uma grande barragem no Castelo de Bode, outra perto da Ponte da Bouça e, finalmente, uma terceira, também de grande altura, no Cabril;
c) A construção de uma grande barragem no Cabril seguida de outras de menos altura até perto de Constância e a construção de um açude na Ribeira da Isna, destinada a regularizar as águas desta Ribeira e as da Sertã, quere dizer: a maior parte das águas da bacia hidrográfica que não podem ser regularizadas nem pela grande barragem do Cabril nem pelas mais pequenas construídas a juzante.
A ordem de altura das barragens projectadas em Castelo de Bode e no Cabril é de 120 a 125 metros e a capacidade de armazenamento da primeira parece andar à roda de 1 bilião de metros cúbicos de água e da segunda de cêrca de 700 milhões.
Para decidir qual das alternativas conviria adoptar, têm de levar-se em linha de conta muitos factores. Entre êles merecem referência o consumo de capital, a quantidade de energia produzida e suas características, se permanente se temporária, o tempo levado a construir o empreendimento, a elasticidade de ajustamento ao progresso do consumo, a natureza geológica dos terrenos onde vão ser construídos os açudes, os materiais,

(1) The A. B. C. of Iron and Steel.

Página 94

344-(94)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
sua natureza e proximidades, o objectivo que se visa, isto é, se se tomam anos secos, muito secos, médios ou úmidos, e mil outros pormenores de natureza económica, financeira e técnica, que não podem ser agora discutidos, não só por haver falta de alguns elementos, como também por não ser êsse o objectivo dêste estudo. Não devem, porém, ser esquecidos.
A principal questão nesta matéria, que conviria aclarar e a que já se aludiu atrás, é a seguinte: quando se projecta uma emprêsa desta magnitude, que virá a consumir muitas centenas de milhares de contos, quais são as bases em que deve assentar no que respeita a caudais?
Projectar a capacidade das albufeiras para anos muito secos, secos, médios, úmidos ou muito úmidos?
Esta é, na verdade, uma questão fundamental, que necessita de ser convenientemente decidida antes de fixar a capacidade das albufeiras e, por conseqüência, a altura e o local da barragem ou barragens.
Parece, segundo elementos colhidos em diversas fontes, que um ano muito seco ou crítico é o que corresponde a precipitações médias na bacia do Zêzere, de um pouco menos de 750 e 700 milímetros, respectivamente, a montante da Ponte da Bouça e em Castelo de Bode.
Serão possìvelmente consideradas baixas estas cifras, visto uma e outra corresponderem a caudais anuais de 639 e 857 milhões de metros cúbicos.
Diversos factores apontam no sentido de evitar excessos de optimismo em matéria hidrológica, e o exemplo de duas emprêsas portuguesas em anos recentes e no actual, mostra os efeitos graves da tendência para a construção de albufeiras com capacidades excessivas em relação às chuvas em anos muito secos. Na prática repete-se mais vezes do que seria de desejar a falta de água, e ficam muito aquém das previsões as realidades hidrológicas.
Os anos críticos, ou anos muito secos, não têm um grau de freqüência muito grande, felizmente, mas repetem-se às vezes em séries de dois.
Quando aparecem, pode dar-se a paralização de muitas indústrias e serviços importantes, em virtude da falta de energia. E os próprios serviços oficiais são obrigados a impor então o rateio de fôrça motriz.
O excesso de capacidade, no caso do Zêzere, pode ter ou na verdade tem, por outro lado, algumas vantagens no domínio das cheias do Tejo ou em regularizações inter-anuais.
Justificará isso, só por si, um grande aumento na capacidade das albufeiras?
O custo da barragem, especialmente no caso de não serem favoráveis as condições geológicas, a impermeabilização do terreno, a evacuação de cheias, que podem atingir volumes muito grandes em curtos espaços de tempo, as expropriações e outros factores têm exigências muito dispendiosas. E os recursos financeiros nacionais não são excessivos nem ainda correspondem às actuais necessidades, embora haja em muitos espíritos, propensos a optimismos, a idea da existência de vastas disponibilidades monetárias.
Vejamos as duas mais importantes soluções do aproveitamento do Baixo Zêzere, visto a primeira parecer não ter viabilidade económica.
Solução Cabril-Isna-centrais em cascata até Constância
18. A idea tem por objectivo regularizar as águas do Zêzere por intermédio de vasta albufeira criada por uma barragem de cêrca de 125 metros de altura no sítio do Cabril, perto de Pedrógão, de regularizar as águas das bacias hidrográficas dos afluentes da margem esquerda por meio de um açude fácil de construir, de cêrca de 75 metros na ribeira de Isna, e, finalmente, aproveitar as águas regularizadas nas barragens do Cabril e Isna, numa série de barragens de comportas de altura média. São as seguintes: Pedrógão, 26 metros; Ponte da Bouça, 26 metros; Várzea, 21 metros; Rio Fundeiro, 18 metros; Castanheira e Cabeça Ruiva, 17 metros; Castelo de Bode, 17 metros, e, por último, foz do Nabão, 5 metros. O açude da Urgueira, na Ribeira de Isna, destinado a regularizar também as águas da ribeira da Sertã, por canal derivado a montante da vila, teria 75 metros de altura e criaria uma albufeira capaz de armazenar 220 milhões de metros cúbicos.
O projecto considera os anos muito secos e entra em linha de conta com precipitações médias na Ponte da Bouça de 744 milímetros e de 700 milímetros no Castelo de Bode.
Nos anos muito secos o caudal regularizado seria, por conseqüência, de 640 milhões na Ponte da Bouça e de 856 milhões no Castelo de Bode.
Na Isna a armazenagem seria de 220 milhões, mas nos anos muito secos o caudal das duas ribeiras, correspondente às duas bacias hidrográficas, não iria além de 90 milhões de metros cúbicos.
Como na Urgueira a capacidade da albufeira é bastante maior do que os caudais nos anos muito secos, o excesso de capacidade poderia ser utilizado em regularizações inter-anuais — até para govêrno de cheias. A capacidade total das duas albufeiras deve andar à roda de 850 milhões e foi com fundamento na regularização inter-anual e na suposição de haver anos críticos seguidos que se determinou o caudal da Isna.
Estes elementos fazem prever uma produção ligeiramente superior a 300 milhões de energia estival, mais cêrca de 60 milhões de kWh certos no inverno de 6 meses, e um quantitativo incerto, a que se não dá valor, nos anos úmidos, e que poderia atingir mais de uma centena de milhões de unidades.
A energia estival, digamos 310 milhões de unidades, seria destinada, como se viu atrás, a converter em permanente uma parte de energia temporária do Douro Nacional.
Foram presentes a quem escreve estimativas desta solução, na base de preços de antes da guerra. O total sobe a cêrca de 550:000 contos.
Na base destas estimativas, e supondo o capital constituído por metade em acções e metade em obrigações (encargos totais, 12,5 por cento), o preço de custo da energia estival nos anos muito secos (6 meses), nas centrais, subiria a cêrca de $22 e em Lisboa ou Pôrto aproximar-se-ia de $27. Não se deu valor à energia incerta dos anos úmidos.
Estes seriam os preços a combinar com os do Douro Nacional, de modo a ter o preço médio. Feitas as contas, o custo definitivo da energia andaria à roda de, respectivamente, $18(5) e $17(2) na zona de Lisboa ou Pôrto, e na primeira e segunda fase do aproveitamento do Douro, quando os preços neste rio, para energia permanente nos anos muito secos, variassem entre $10 e $07(5). Estas cifras representam apenas a ordem de grandeza dos custos e não pretendem ser rigorosos. Quando o esquema Douro Nacional estiver completo, poder-se-iam reduzir para $13.
Que dizer das vantagens ou inconvenientes desta solução?
Só um estudo pormenorizado pode aclará-los.
Ela tende a aproveitar um local extremamente propício, na unanimidade de opiniões, para a construção de um grande açude e de uma grande albufeira — que é o Cabril. Com efeito, o terreno é granítico e há abundância de materiais nas proximidades. As expropriações são incomparàvelmente inferiores quando compa-

Página 95

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(95)
radas com as de locais a juzante. O volume da obra em si não é exagerado, por virtude da secção do rio, e o escoamento de cheias parece ser mais fácil. Os transportes de certos materiais, como o cimento, devem ser um pouco maiores.
O sítio da Urgueira, na ribeira de Isna, é apertado e a construção da barragem não oferece dificuldades. Talvez que as expropriações tragam inconvenientes sociais aos povos vizinhos, em virtude da sua pobreza e da utilidade de pequenos nateiros à roda das ribeiras.
A capacidade de armazenagem permite regularizações entre anos, bastante substanciais, e auxilia, por isso, o domínio das cheias no Tejo.
Finalmente, o esquema é bastante elástico. Pode realizar-se na medida das necessidades de consumo, visto ser constituído por uma série de unidades independentes que aproveitam totalmente as águas regularizadas pelos dois depósitos.
Solução Castelo de Bode-Cabril-Bouçã
19. A outra solução do Zêzere consiste em duas grandes albufeiras, no Cabril e no Castelo de Bode, e entre elas, uma central, na Bouça, destinada a aproveitar a água regularizada dó Cabril.
É solução que utiliza os trabalhos já efectuados no estudo do projecto primitivo, pôsto de parte, de uma única central em Castelo de Bode. Pode tornar viável uma idea que financeiramente se não justificava.
A modificação representa, na verdade, melhoria apreciável na idea anterior quanto ao preço de custo da energia. Já foram gastas algumas centenas de contos em estudos e obras preparatórias, em grande parte tendentes a estabelecer as condições de viabilidade do açude e albufeira do Castelo de Bode. A ser adoptada, ela reduz o primitivo custo de produção de unidade de energia até nos anos muito secos, nos anos em que as centrais funcionarão em grande parte com água de anos médios ou úmidos.
A capacidade de armazenamento atinge a cifra de mais de 1 bilião e meio de metros cúbicos. O custo total deve ser superior a 1 milhão, de contos. A produção de energia estival será da ordem das 420 unidades de kWh nos anos muito secos e muitos milhões a mais de energia incerta nos anos úmidos. Os preços serão sensìvelmente superiores.
20. Qual das duas alternativas se deve preferir?
Em ambos os casos o custo da energia permanente, nos anos muito secos, será sem dúvida muito superior ao da energia obtida no Douro e outros aproveitamentos nos mercados de consumo em Lisboa e Pôrto e não há, para contrabalançar êste excesso de custo, as vantagens da navegação.
Por outro lado, as duas grandes albufeiras, no Cabril e Castelo de Bode ou no Cabril e na Isna, regularizam, integralmente, o Zêzere em certos anos e podem concorrer para o domínio das cheias do Tejo. É êste certamente o aspecto mais importante e talvez o único que pudesse justificar a sua construção. A regularização do Zêzere melhora, na verdade, o regime do Tejo, a juzante de Constância. Aumenta o seu caudal no verão, e quando houver coincidência nas cheias resultantes das torrentes do país vizinho e nas vindas de afluentes do Alto Tejo, a montante de Constância, as duas grandes albufeiras no Zêzere podem atenuá-las.
Mas serão necessárias as duas? A coincidência das pontas das cheias do Zêzere e Tejo produz-se freqüentemente?
Ou serão as inundações ribatejanas quási exclusivamente conseqüência das chuvas na bacia hidrográfica do Tejo a montante da foz do Zêzere? Evitar-se-ão as grandes cheias e as azielas com a construção de duas tara altas barragens?
A justificação do projecto Cabril-Castelo de Bode depende, em grande parte, da resposta às preguntas que acabam de se formular e há divergências em relatórios oficiais sôbre êste assunto(1). Não restam dúvidas de que o preço do custo de energia permanente nos anos muito secos será muito maior do que o do Douro, visto estar êste rio regularizado por obras que nada custaram. Não há, além disso, a justificá-las necessidades de navegação. Será a sua influência no domínio das cheias argumento decisivo para impor a sua construção antes de outras? Ou poderão as necessidades de rega influenciar na decisão?
A barragem do Cabril parece justificada, porque pode transformar em permanente parte importante da energia temporária do Douro, além de possuir uma grande capacidade, maior do que o total da água que passa pelo Zêzere num ano muito seco. Além disso, o perfil, a geologia, os materiais de construção, as expropriações são de molde a dar-lhe incontestáveis condições de prioridade. Pode ter influência apreciável no regime do Tejo e permite o aproveitamento a jusante dos caudais regularizados. Seria sem sombra de dúvida auxiliar importante na navegabilidade do Tejo.
Tudo indica pois que a obra a executar seja iniciada pela construção do Cabril, e depois de conhecidos melhor a curva de vasão do rio e os resultados sôbre as cheias das obras que estão ou vão ser construídas no Tejo, e possìvelmente em Espanha, se assentaria definitivamente sôbre a obra de Castelo de Bode, que se não deve por isso e por emquanto repudiar inteiramente. Apenas se adiaria para outra oportunidade. Depois de bem esclarecidas as incógnitas mencionadas, o projecto voltaria a ter a actualidade que hoje tem, ou para ser pôsto de parte na sua forma actual — altura de 120 metros — ou para ser executado com essa altura, ou ainda para ser substituído por outro de menores dimensões.
E, no entretanto, a albufeira do Cabril e Isna e, possìvelmente, uma ou duas das centrais a juzante que não invalidam o Castelo de Bode, satisfaria às condições de transformar em permanente a energia temporária do Douro e ajudariam a regularizar os caudais do Tejo.
Parece que só dêste modo se poderá encarar um problema que afecta o futuro económico do País.

(1) Vide p. 12, vol. I, 1939-1940, do relatório da J.A.H.A. e Anuário dos Serviços Hidráulicos.

Página 96

344-(96)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
IV
O TEJO
21. Estêvão Cabral, em 1790, ao iniciar a útil e erudita Memória sôbre os danos causados pelo Tejo nas suas ribanceiras, apresentada à Academia Real das Ciências de Lisboa, diz o seguinte: «É o Tejo rio real e rio perene; real porque conserva o nome até ao mar; perene como é notório». E mais abaixo classifica-o de «inundante». E acrescenta: «...que o Tejo seja dêstes últimos e o seja por necessidade, o dirá a grandeza das suas cheias, o mostrará o seu fundo, o declarará a sua largura, o manifestarão as suas margens».
E, na verdade, sob todos os aspectos, é um rio real, com a extensão de cêrca de 800 quilómetros. Drena para Portugal uma bacia hidrográfica de 80:947 quilómetros quadrados, dos quais 24:198 em Portugal(1), e corre por entre ásperos morros, através de vales estreitos e pedregosos, na sua maior extensão. O mínimo da quantidade de água que escoa para o mar, medido em Ródão, é de cêrca de 5 biliões de metros cúbicos, e o máximo muito próximo de 20 biliões(2).
Em território nacional os desníveis mais importantes são(3): de Ródão a Abrantes 37m,66, de Abrantes a Tancos 5m,06, de Tancos a Santarém 12m,68.
No troço internacional, desde a foz do Erges até à foz do Sever, numa extensão total de 43 quilómetros, o desnivel parece ser apreciável.
As suas cheias são proverbiais e não se passa uma década que não haja o espectáculo de vastas áreas alagadas, desde o Arripiado até para baixo de Santarém. Algumas atingem quási foros de catástrofe nacional: causam vítimas e prejuízos consideráveis. E como conseqüência delas o Estado acorre a reparar danos, a socorrer os que mais sofreram, a despender avultadas somas.
Depois tudo desaparece: o alarido, a dor e os protestos. E do primeiro entusiasmo de construir as obras definitivas que se oponham às cheias fica a vaga recordação de um sombrio acontecimento que passou. Nos documentos oficiais o facto é registado com números probativos à saciedade, e o relatório originado pelas inundações de 1935-1936, das maiores dos últimos anos, é um documento sério e cuidadoso, a atestar que os factos aconteceram e foram minuciosamente narrados. E nêle e noutros também há alvitres, esquecidos depois, como esquecidas foram as cheias e os seus inconvenientes até à próxima e certa repetição de um fenómeno, que tem as suas causas que ainda não foram debeladas. Hão-de as novas cheias trazer mais protestos e novos planos hão-de aparecer e mais despesas se efectuarão a reparar os diques arrombados, as estradas destruídas, as valas em ruínas e mil e um outros malefícios que resultam da indomável fôrça das águas e da enormidade dos caudais que em torrente se despenham da aridez de Castela-a-Velha ou da Estremadura espanhola sôbre as bucólicas lezírias do Ribatejo.
As características do Tejo
22. De todos os rios portugueses, o Tejo é, talvez, com sua bacia hidrográfica, o de maior importância no ponto de vista económico. E o que mais influência deveria exercer no desenvolvimento material do País. Só se lhe pode, até certo ponto, comparar o Douro. Mas emquanto que êste apenas fornece duas utilizações hidráulicas, se assim se lhes pode chamar, embora de alto valor — a produção de energia e a navegação —, o Tejo permite-as todas.
É susceptível de ser navegável até à fronteira e para além, depois de regularizado, por barcos de calado superior a 2 ou até 3 metros. A água que por êle corre pode ser útil para rega, tanto no baixo Tejo como até no Alto Alentejo; os seus afluentes, Zêzere, Ocreza e Ponsul e o próprio Tejo, além de poderem produzir elevadas quantidades de energia, dominados, asseguram um caudal uniforme e elevado em toda a zona de jusante. E, finalmente, o domínio das águas no alto Tejo, sobretudo no tramo internacional e nos afluentes, permite regular as cheias, de modo a impedir as «asielas», de tam maléficos efeitos nas sementeiras, ou na primavera. Consente, além disso, inundações de ennateiramento, como acontece no médio e baixo Nilo, por virtude da barragem da Assuam.
É, na verdade, um rio real, como em 1790 informava Estêvão Dias Cabral — um rio real por sua majestade, grandeza e até influência política, no estreitamento de relações com o país vizinho. Mas pode ser, além disso, nesta época de necessidades e exigências sociais, um rio produtivo, que, se fôsse convenientemente aproveitado, viria a exercer na acanhada vida económica de Portugal uma considerável transformação: como produtor de energia, como meio de transporte barato, como reservatório de água para regas, como regularizador de cheias — as quatro grande utilizações hidráulicas por excelência. E se ainda houvesse quem com estas utilizações se não contentasse, êle poderia ser um regular abastecedor de peixe para as populações ribeirinhas e até para Lisboa.
O Tejo e o Douro hão-de ser um dia os dois mais importantes propulsores do desenvolvimento económico nacional.
Se forem aproveitados racionalmente, segundo um inteligente e útil plano de conjunto, devem exercer na vida do País fecunda transformação. Através dêles ou de seus afluentes o País quási que se torna independente da importação de carvões estrangeiras para usos industriais; por êles podem ser transportados minérios pobres e produtos que só difìcilmente suportam o peso de tarifas ferroviárias. As águas de um dêles, ou de seus afluentes, podem ser usadas na irrigação de vastas zonas agrícolas, directamente ou depois de elevadas, com o dispêndio de energia produzida no próprio rio ou afluentes, e de natureza temporária que a torna inaproveitável em outros fins e que pode ser recuperada, em parte, na época estival. E, finalmente, ainda é possível utilizar as obras no domínio de cheias e em ennateiramentos anuais e benéficos.
A navegação no Tejo
23. O desenvolvimento da tracção mecânica, sobretudo dos caminhos de ferro, pareceu durante certo tempo que viria ofuscar definitivamente o esplendor da navegação por canais e rios. Mas a intensidade da circulação económica foi-se acentuando com o ajudar dos anos a ponto de se tornar quási impossível dar-lhe vazão sem o auxílio das vias navegáveis. Assistiu-se na actual guerra a um fenómeno, de rejuvenescimento dos rios e canais, que foi a conseqüência directa do que já vinha a acentuar-se desde a outra, e sobretudo a partir do fim da crise de 1929-1931.
O caminho de ferro não pode competir no transporte de produtos baratos com a via fluvial e encontra-se no

(1) Anuário Estatístico de Espanha, 1932-1933.
(2) Anuário dos Serviços Hidráulicos, 1936, p. 29.
(3) Anuário dos Serviços Hidráulicos, 1933, p. 5.

Página 97

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(97)
nosso, como em todos os outros países, num angustioso dilema.
É inimiga do caminho de ferro a camionagem, nos produtos caros, de altas tarifas. E quando essa carga para ela é desviada, em virtude da grande flexibilidade dêste meio de transporte, têm de ser levantadas as tarifas dos artigos pobres para cifras que são muitas vezes incomportáveis pelo seu valor. O caso dos minérios de Trás-os-Montes, dos alabastros de Vimioso e outros ilustra perfeitamente a insuficiência da linha do Douro. Pode, na verdade, transportar grandes quantidades de minério, mas em condições de preço tais que quási impedem a exploração de minas, até quando estas, como as de Moncorvo, se encontram a poucos quilómetros da linha férrea.
O problema não é apenas nacional, existe em quási todos os países. Mas nos de grande circulação económica, embora grave, não tem os aspectos que assume entre nós.
É evidente que só pode ser resolvido pela coordenação de todas as modalidades de transporte — o caminho de ferro, a camionagem e a navegação interior.
Ao canal ou via navegável há-de competir, como agora está acontecendo em muitos países, aquela volumosa carga que, pelo seu preço, não pode ser transportada em caminho de ferro, até com tarifas muito baixas.
O dilema que se põe agora entre nós é êste. Na impossibilidade de assegurar tarifas extremamente baixas, por virtude da insuficiência do tráfego, já dividido por caminho de ferro e camionagem, há-de ser impraticável explorar muitos recursos latentes e já conhecidos, a não ser que seja possível transformar alguns dos rios nacionais em agentes de transportes.
São estes os princípios que presidem aos esforços feitos por diversos especialistas nó sentido de convencer a opinião pública da necessidade de converter os mais importantes rios em vias navegáveis. E isso é fácil e possível com grande proveito para a economia nacional e para seu futuro desenvolvimento.
24. A idea da navigabilidade do Tejo vem de muito longe, já de períodos anteriores aos Filipes. Executaram-se para êsse efeito várias obras em diversas épocas e houve até carreiras regulares para passageiros e carga em seu troço inferior. Mas o caminho de ferro e o assoreamento do rio, mais êste do que aquele, mataram a navegação, que hoje se faz apenas em um ligeiro percurso, até Vila Franca ou um pouco mais além.
Contudo, o problema terá no futuro uma grande importância se vier a dar-se entre nós o progresso económico que os recursos do País aconselham e as circunstâncias da política social impõem e até exigem.
Não é êste o lugar para longamente debater as razões das necessidades do desassoreamento dos rios e das vantagens da navegação. Mas é bem sabido que nem o caminho de ferro nem o automóvel podem satisfazer as exigências de transporte de mercadorias pobres; e o exemplo, em toda a parte, até em regiões de grande densidade ferroviária e de grande tráfego, mostra, em elevada escala, o transporte por canais.
A navegabilidade do Tejo foi estudada repetidas vezes, e não é difícil, nem muito oneroso manter fundos até 2m,50 a 3 metros desde Lisboa até quási à fronteira que assegurem a navegação de barcos até 1:000 toneladas.
O calado no Reno é de 2m,30(1), e idêntico no Main. O calado mínimo no Oder é de 1m,30. O canal de Ems foi aprofundado para permitir o calado de 1m,85.
O rio Ohio, que é o rio canalizado mais extenso do mundo (1:578 quilómetros), consente calados de 2m,74(2). A profundidade mínima de 2m,20 permite no Elba a navegação de barcos de 1:000 toneladas, com o calado de 2 metros, completamente carregados(3).
Barcos da capacidade de 700 a 800 toneladas, com um calado de 1m,80, circulam no Danúbio(4).
Estes exemplos mostram claramente que são bem pequenos os fundos necessários para a circulação de barcos capazes de transportar grandes cargas, e que o Tejo, de Lisboa até ao Arripiado, com trabalhos preliminares nas valas da Azambuja e Alpiarça, pode adaptar-se a êsse transporte. Há a notar que o seu caudal, no verão, se forem executadas as obras previstas no Zêzere, no Ocreza, no Ponsul e em Espanha, e no próprio Tejo, poderá ser da ordem dos 200 a 300 metros cúbicos por segundo, o que facilita extraordinàriamente a navegação no seu tramo inferior.
Diversos especialistas se têm pronunciado sôbre as condições do leito do rio e as possibilidades de navegação do Tejo(5), e tem sido verberado, e com justiça, o abandono a que foram votadas as obras existentes.
O problema, no momento actua], é o seguinte: a navegação é possível, sem obstáculos, até Sacavém. Desta localidade, para montante, navega-se, à maré, até Vila Franca de Xira; quer pelo canal do norte, entre a margem direita do Tejo e o mouchão da Póvoa, quer pela Carreira das Barcas, vias estas susceptíveis de melhoramento e de conservação relativamente fácil por meio de dragagens apropriadas e oportunas.
De Vila Franca de Xira para cima sobem barcos de calado variando entre 1m,50 e 2 metros, e da Valada até Santarém sòmente fragatas demandando o máximo de 0m,80 a 0m,90 na estiagem. De Santarém à Chamusca, no verão, só podem ir barcos que não calem mais do que 0m,40 a 0m,50 e de 0m,30 a 0m,40 da Chamusca até Abrantes(5). E mais adiante o estudo que contém estas passagens acentua: «O problema de melhoramento das condições de navigabilidade dos nossos rios, e principalmente do Tejo, tem de ser estudado em conjunto com o da regularização de caudais, quer para produção de energia ou para facilitar água à agricultura, quer para impedir a acumulação simultânea de consideráveis quantidades de água em certas secções ou troços do rio.
A navegação do Tejo afigura-se-nos que poderia fazer-se, até a foz do canal de Azambuja, pelo leito ordinário do rio, depois de convenientemente melhorado, e dêste ponto para montante por intermédio de canais laterais, aproveitando-se para tal a existência da Vala de Azambuja e da Vala de Alpiarça. Por esta forma e com uma despesa relativamente pequena ficava assegurada a navegação até à Chamusca.
Pela acomodação de antigos leitos do Tejo ao fim em vista seria possível prolongar por meio de canal lateral as condições de navigabilidade do rio, pelo menos até ao Arripiado.
Desta localidade para montante, isto é, no alto Tejo, provàvelmente seria preciso acomodar à navegação o próprio leito do rio, que é mais estreito do que no Tejo médio e de carácter fixo.
Não só para evitar parcialmente as cheias ou, pelo menos, para eliminar os seus efeitos, como também para poder resolver por forma satisfatória o problema do melhoramento das condições de navigabilidade do Tejo — problema que pelos motivos expostos reputamos de actualidade para o desenvolvimento das possibilidades

(1) Vide Anais do XVI Congresso de Navegação Interior, Bruxelas, 1935.
(2) Vide Anais do Congresso de Navegação Interior, n.º 12.
(3) Vide Anais do Congresso de Navegação Interior, n.º 20.
(4) Vide Anais do Congresso de Navegação Interior, n.º 21.
(5) Vide Anuário dos Serviços Hidráulicos, 1930, p. 116.

Página 98

344-(98)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.° 140
agrícolas da região servida pelo rio —, afigura-se-nos que o estudo e a execução de obras tendentes a regularizar os caudais dos principais afluentes do Tejo e do próprio Tejo são dos mais importantes do conjunto de trabalhos que é indispensável executar pára modificar, melhorando-as, as presentes condições(1).
Neste curto trecho está todo o problema da navegação até à fronteira ou, pelo menos, até ao pôrto do Tejo em Ródão.
Estão projectadas barragens de comportas e eclusas de Alvega para cima, uma a jusante de Belver, outra a montante da foz do Ocreza — e será porventura possível, logo acima do Arripiado, elevar as águas do Tejo até ao Tramagal e daí até à barragem de Belver.
Estas obras, acompanhadas da regularização de caudais no Zêzere, Ocreza e Ponsul, além do que venha a realizar-se em Espanha, facilitam a circulação de barcos com cargas que podem atingir 1:000 toneladas.
E não seria difícil chegar a acôrdo com o Govêrno do país vizinho sôbre o aproveitamento do troço internacional, da foz do Sever até ao Erges, por uma barragem construída em território português a jusante do Sever, que, além de assegurar a armazenagem de uma vasta quantidade de água, permitiria a navegação para o interior de Espanha, de tam alto interêsse para êste país e com vantagens grandes para Portugal.
A rega na bacia hidrográfica do Tejo
25. Tanto quanto é possível deduzir dos elementos até agora conhecidos, um dos mais valiosos e extensos projectos de rega é o do Vale do Sorraia. Os açudes no Sor, Raia e outros afluentes podem armazenar algumas centenas de milhões de metros cúbicos de água a utilizar na rega.
O Sor tem origens nas vizinhanças de Alpalhão e Arez, perto de Nisa, e o início da sua bacia hidrográfica, no concelho de Gavião, fica apenas a alguns quilómetros do Tejo. Não será talvez ousado prever, no futuro a elevação de águas do Tejo para o Sor, embora, a altura seja grande.
Com efeito, estão projectadas barragens de comportas entre Alvega e Belver e entre Amieira e Fratel, além do aproveitamento integral da bacia hidrográfica do Ocreza. Se fôr executada a obra de transformação do Tejo em via fluvial, perfeitamente navegável até à fronteira, como tudo indica, as águas do regolfo de açudes e barragens permitirão fundos e acumularão vastas quantidades de água susceptíveis de serem desviadas no inverno para a bacia hidrográfica do Sor, ou de alguns dos seus afluentes, apesar da grande altura da elevação.
Hão-de haver assim possibilidades de construir uma ou mais estações elevatórias que porventura consintam o uso de grandes quantidades de água no refôrço das que se acumulem nas bacias hidrográficas, ou até na utilização mais para sul de caudais que possam melhorar as condições agrícolas de terrenos propícios a êsse fim.
O problema consiste na elevação de águas, com o emprêgo de energia temporária produzida no próprio Tejo, ou em outra parte, na época de abundância de água. Seriam precisas algumas dezenas de milhões de unidades de energia para elevar grandes quantidades de água. Parte desta energia, temporária, considerada quási sem valor, poderia ser recuperada no verão, na época em que a energia tem maior preço. Se fôsse factível instalar a estação de bombagem na central produtora de energia, o problema resumir-se-ia a acoplar directamente as bombas e turbinas, que trabalhariam apenas quando houvesse excesso de água. O custo do kWh, por êsse motivo, seria quási só a amortização das turbinas. A grande altura da elevação, que se avizinharia talvez de 200 metros, poderia ser assim compensada pelo custo extremamente baixo da fôrça motriz.
O transporte da água far-se-ia por largo canal até linhas de água que as levariam ao reservatório ou reservatórios que acumulariam além da que se eleva do Tejo, aquela que resultasse das suas bacias hidrográficas.
Já foi projectada no Sor uma barragem capaz de criar um reservatório para 130 milhões de metros cúbicos, a qual, com as da ribeira de Sêda e Terá, cria disponibilidades próximas de 400 milhões. O exame das condições topográficas da região, permite visionar a possibilidade de alargar a capacidade de retenção de águas em outros afluentes.
Pràticamente o uso das disponibilidades de água do Tejo é limitado apenas pela quantidade de energia temporária susceptível de ser produzida e pela capacidade e situação de possíveis reservatórios.
A par dêste projecto do Sorraia outros de maior ou menor importância se podem prever na bacia hidrográfica do Tejo. Um, o da Idanha, está em vias de andamento, outros, como o do Ribatejo, que parece regar 10:000 hectares, dizem também respeito a enxugo e defesa contra cheias.
E se foram cuidadosamente estudados os seus afluentes num plano de conjunto há-de verificar-se que no alto Zêzere, entre Belmonte e perto de Silvares, existe uma extensa zona susceptível de ser irrigada com águas aproveitadas pelos esquemas hidráulicos em projecto nas proximidades de Valhelhas.
Vê-se, assim, que o Tejo tem possibilidades de rega já reconhecidas, que, somadas, podem atingir muitas dezenas de milhares de hectares de bons terrenos.
Um estudo mais profundo e pormenorizado no futuro conduzirá certamente a mais extensos projectos, que viriam a ser conseqüência da utilização de águas, directamente elevadas do seu leito, com o emprêgo de energia temporária, na época de grandes caudais e também em outras.
A produção de energia
26. A produção de energia na bacia hidrográfica do Tejo, embora insuficientemente reconhecida, compreende a que resulta dos afluentes Zêzere, Ocreza e, em muito menor escala, do Ponsul, a utilizar esta na rega, e a que provém do próprio caudal do rio em açudes ou barragens, necessárias para a navegação, a construir, possìvelmente, perto de Tancos, do Tramagal, de Alvega, a montante da foz do Ocreza e, finalmente, acima de Ródão, não longe da foz do Sever.
As primeiras dizem respeito inteiramente ao troço nacional. Serão barragens de comportas, com as necessárias facilidades para elevar barcos. A última pressupõe a utilização do Tejo e Sever internacionais e o regôlfo, possìvelmente, atingirá o Erges. Só pode ser executada depois de acôrdo com a Espanha.
São variáveis as estimativas da quantidade de energia que pode ser obtida do Tejo. Há quem avalie a potência industrial em 280:000 C. V. permanentes, susceptíveis de produzir nos anos muito secos mais 600 milhões de unidades e muito mais do que isso nos anos úmidos, mas de natureza incerta, sem incluir parte do Zêzere.
Se fôr possível o aproveitamento do Tejo internacional por meio de vasta albufeira, a quantidade total de energia aumenta consideràvelmente.

(1) Anuário dos Serviços Hidráulicos, 1936, p. 117.

Página 99

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(99)
As bacias do Zêzere e Ocreza, e o próprio Tejo, incluindo o troço internacional, por estas razões, podem fornecer um mínimo de 1 bilião de unidades nos anos secos.
O domínio das cheias
27. As cheias do Tejo são a angústia dos povos, desde a Barquinha até quási Vila Franca.
Foram estudadas por diversos especialistas, e o relatório dos serviços hidráulicos, já atrás citado, relativo à cheia de 1935-1936, dá uma idea clara dos seus efeitos(1). É um trabalho bem documentado, com observações que convém reter, em que se faz a história circunstanciada de uma grande cheia. Já outros engenheiros as haviam anteriormente estudado e quási todos concordam na necessidade de tomar medidas que evitem a série de flagelos que, em períodos incertos, assolam os ricos campos do Ribatejo.
Trata-se de duas questões importantes: o domínio das grandes cheias e o desaparecimento de «asielas».
O Ribatejo para ser rico precisa das cheias do Tejo. Elas depositam vastas quantidades de matéria nutritiva, exercem uma acção semelhante à que é produzida pelas cheias do Nilo. A fertilidade proverbial do delta dêste rio e dos terrenos a jusante de Assuam deve-se quási exclusivamente à enorme quantidade de resíduos orgânicos e outros assimilados pelas terras.
A deposição faz-se, porém, com ordem e segundo regras técnicas e o enateiramento anual é o mais poderoso e efectivo elemento a fertilizar os solos.
No Baixo Tejo as cheias são impetuosas. Grandes massas de água alagam as terras, muitas vezes sob acção de fortes correntes. E, quando recuam, deixam atrás de si não só o depósito de finas matérias, que formam nateiros, como muitas vezes areias que destroem a fertilidade dos solos.
Essas cheias necessitam de ser dominadas, e tudo deve ser feito no sentido de as deminuir.
Em definitivo isso só pode realizar-se com a retenção das águas a montante do rio e seus afluentes, nas épocas de grande chuvas, auxiliada pela arborização metódica e científica das encostas que mais sofrem os tremendos efeitos da erosão.
Onde, porém, mais se pode fazer sentir o efeito do domínio das cheias, por albufeiras no próprio rio e seus afluentes, é na regularização das «asielas». São pequenas cheias do Outono e Primavera. Têm lugar exactamente quando se acabam de fazer as sementeiras ou em época em que, elas já não podem ser realizadas. Destroem as culturas muitas vezes sem remédio. As asielas, com mais facilidade do que as grandes cheias, podem ser dominadas pelas barragens a montante e por um programa de trabalhos que complete e melhore o que já existe, e tantas despesas ocasiona por não estar completo.
Quem extrair das contas do Estado o que anualmente se gasta em obras de consolidação, sem entrar, em linha de conta com o que despendem os particulares, avalia a necessidade de acudir a um problema, que está ìntimamente relacionado com a regularização do Alto Tejo e de seus afluentes. Não é possível evitar as cheias, nem isso seria vantajoso, mas devem dominar-se pela regularização dos caudais.
Pode dizer-se que sem êsse domínio a questão das cheias se torna insolúvel. E isso nunca poderá ser conseguido se não fôr executado um plano de conjunto.
Se fôssem feitos trabalhos nesse sentido e executado gradualmente um programa de obras, que teria por fim moderar a velocidade das correntes, em obediência a um plano de conjunto, maduramente reflectido, poder-se-ia pouco a pouco chegar a dois objectivos: o alteamento dos terrenos à medida que aumenta a cota do alvéo do rio e a deposição quási anual de sedimentos fertilizantes, como limos, e nateiros. As cheias seriam transformadas em um valioso instrumento de riqueza. São agora a angústia das populações ribeirinhas.
V
A ENERGIA
28. Qualquer plano de electrificação tem de atender às possibilidades do consumo. E é difícil avaliá-las sobretudo em meio insuficientemente industrializado. O consumo depende de muitos factores. Pode alargar-se a limites incomportáveis pela produção, em poucos anos. Pode ainda arrastar-se lentamente, com aumentos que, embora pareçam, em percentagens, satisfatórios, representam umas parcas dezenas de milhões de unidades por ano.
Para avaliar das possibilidades do alargamento de consumo há que ter em conta, em primeiro lugar, as condições económicas do País, o seu nivel social, o poder de compra da maioria da população, as disponibilidades monetárias que permitam o alargamento progressivo das linhas de transporte, a própria educação das classes populares, as condições da indústria e a viabilidade de um rápido desenvolvimento, o regime de propriedade e os métodos de cultura agrícola, mil e um factores de ordem psicológica e financeira que embaraçam o problema, e que têm de ser considerados cuidadosamente antes de se assentar em definitivo no programa de realizações hidroagrícolas ou hidroeléctricas.
Tem de existir sempre margem apreciável na capacidade de produção de energia. Mas se essa margem ultrapassar certos limites, o preço da energia pode ser excessivo e, por isso mesmo, impedir o desenvolvimento do consumo.
Costuma haver sempre a tendência para optimismo nas previsões. Umas vezes o preço de custo de energia aparece baixo e convidativo à execução de determinado projecto; outras vezes pressupõe-se a realização de empreendimentos que ainda não foram estudados em pormenor, e os quais, por virtude da sua grandeza, parece que podem vir a consumir grandes quantidades de energia.
Nunca deve ser esquecido que a electricidade para ter valor tem de ser utilizada. Se o não fôr, ela pode comparar-se à fôrça hidráulica que corre rio abaixo. Dissipa-se e perde-se. Mais vale deixá-la perder quando não é usada, do que transformá-la pelo emprêgo de avultados capitais, para no final de contas não ser utilizada.
As previsões optimistas nos consumos de energia podem levar a preços exagerados no custo da electricidade, porque a amortização das obras e das máquinas não cessa pelo facto simples de não haver consumo da energia a que dão lugar.
Estas simples considerações indicam, por isso, que há necessidade de lazer um estudo profundo de todas as possibilidades, nas décadas que se hão-de seguir à execução das obras, e de delinear, tam aproximadamente

(1) Ver Anuário dos Serviços Hidráulicos, 1936, pp. 11 a 128.

Página 100

344-(100)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
quanto se puder, o diagrama do consumo — sempre à luz de factos concretos.
Quando fôr possível, como acontece em Portugal, realizar esquemas com mais de uma finalidade económica, como no caso do Douro (energia e navegação) e do Tejo (energia, navegação, regas e cheias), e quando, além disso, os objectivos em vista se possam alcançar gradualmente, num programa flexível e elástico, a prioridade deve naturalmente recair sôbre êsses esquemas, tanto mais que parece estar averiguado que o preço de custo da energia é inferior à de outros, os quais, poderão ser executados em tempo oportuno, porque completam, acessoriamente, o plano integral.
O preço de custo da energia, tanto no Douro, já parcialmente regularizado em Espanha, como no Tejo, em vias disso num futuro próximo, melhora com as diversas utilizações das obras, executadas dentro do País; e, numa racional distribuïção de custo, é lógico supor que sejam atendidos os benefícios dessas obras. Êsses benefícios devem ser levados em conta na determinação do preço da energia, visto todos êles concorrerem para o bem geral. A rega, a energia, a navegação, tendem no conjunto para a melhoria das condições de vida e aumento de riqueza. São aplicações de capital grandemente reprodutivas.
Isto quanto à origem hidráulica da energia. No caso de ser indispensável, ou julgado indispensável o apoio térmico, o problema torna-se mais complexo.
Em geral, as centrais térmicas requerem menor custo de instalação por unidade instalada — o que significa menos dispêndio de capital inicial.
O custo da energia produzida pode, porém, tornar-se bastante maior em virtude de serem maiores as despesas de laboração e do seu carácter de trabalho intermitente. Quando os combustíveis tiverem de ser em grande parte importados, como no caso português, ou quando é fraco o seu poder calorífico, o problema torna-se mais complexo. Se fôr necessário o uso de centrais térmicas, parece que elas só deverão ser instaladas para alimentar as necessidades das pontas.
Esta questão do custo da energia térmica e hidroeléctrica é daquelas que há-de certamente sofrer discussões depois da guerra. Hão-de aparecer grandes surprêsas, sobretudo no capítulo de motores de combustão interna. E é natural que os progressos realizados se encaminhem no sentido da redução do custo da fôrça motriz.
No entanto, ninguém poderá dizer qual o custo de combustíveis de origem estrangeira em Portugal. Há falta de recursos nacionais conhecidos, de petróleo ou seus derivados. A certeza da existência de algumas pequenas reservas de carvões de fraco poder calorífico e elevada percentagem de cinzas pode tornar sempre alto, relativamente, o preço do custo de energia térmica, até na hipótese de grandes aperfeiçoamentos trazidos pela guerra. A existência de vastas disponibilidades hidráulicas, derivadas de rios portugueses, há-de ser sempre a base das indústrias nacionais.
Convém, por isso, que em qualquer programa de aproveitamentos se tenha em mira o baixo custo da energia.
Êsse baixo custo só pode resultar do uso das obras hidráulicas, necessàriamente caras, nas suas diversas e possíveis utilizações e na distribuïção dos custos dessas obras por todas elas.
O preço de custo
29. Certas ideas que do vez em quando se espalham sôbre assuntos fundamentais na vida dos povos podem levar a resultados funestos e irremediáveis se forem postas em prática apressadamente. O preço do custo é uma delas.
A energia neste aspecto pode equiparar-se a uma mercadoria. Vende-se a tanto a unidade. Pondo, por agora de lado as suas aplicações domésticas, que são bastante variadas, ela pode transformar-se na fôrça motriz em que assentam muitas formas de actividade. As indústrias instalam-se para fabricar os produtos, ou em sua forma definitiva, ou em sua forma intermediária, e nesta êles são como que a matéria prima a usar no processo manufactureiro final.
Como utilização acessória do processo económico, a energia eléctrica usa-se nas minas para transporte, compressão de ar, refrigeração, tratamento mecânico dos minérios e muitos outros fins.
Na tracção eléctrica a energia influe apreciàvelmente no custo do transporte. E o consumo na rega e nos campos, em operações agrícolas ou em usos domésticos, está condicionado ao seu preço. Uma das causas da pequena disseminação da electricidade em Portugal, até nas cidades é, evidentemente, por ser muito cara.
Há alguns produtos, como os azotados, em que o custo da energia decide quási só da viabilidade da fabricação. Se fôr além de certo nivel, a indústria torna-se impraticável.
Há outros, como a metalurgia, tanto na produção de guza como na de aços especiais, em que o preço da energia é fundamental.
Mas se se considerarem apenas as fabricações correntes, metalúrgicas, têxteis, electroquímicas, de cimento e outras, êsse preço representa em muitas delas o factor dominante.
Antes de emitir opiniões sôbre a sua importância, convém lançar uma vista de olhos ao comércio mundial. E quem o fizer, até superficialmente, sem entrar na profundeza dos processos industriais, verifica duas cousas de interêsse: uma é a tendência em toda a parte para a redução de preços de custo do fabrico para consumo interno e exportação, outra é o grande e imenso trabalho de investigação industrial e científica que no campo energético se está efectuando no sentido de aperfeiçoar ao máximo os agentes produtores de energia com o objectivo de reduzir a unidade do custo.
O problema é, na verdade, importante. Nos grandes países exportadores ou naqueles que, como os Estados Unidos, têm largas ambições em matéria de conquista de novos mercados, o custo do produto — do automóvel, do nitrato, do tecido, do ferro, do aço e de tantos outros — é, na maior parte das vezes, a causa do êxito ou insucesso da exportação.
A concorrência entre países, e entre industriais dentro dêles, está a aumentar com a multiplicação e o aperfeiçoamento dos instrumentos de trabalho. O custo é ainda, e há-de ser no futuro, a principal arma de defesa e ataque nas lutas pacíficas que se hão-de travar entre amigos ou entre amigos e inimigos da actual guerra.
E por isso se empregam esforços e se despendem grandes capitais no objectivo de o reduzir ao mínimo possível.
Dentro dos próprios países, no mercado interno, o custo dos produtos mede ainda hoje, em escala apreciável, o relativo nivel de bem estar de uma parte da população, sobretudo daquela que recebe baixos salários.
Esta é a evidência dos factos económicos que influenciam a vida social.
30. Ora espalhou-se entre nós, até em certas camadas sociais que podem, por seus méritos ou influência, actuar na vida nacional, a idea da subalternidade do preço do custo de energia. Subordina-se até, às vezes, a realidade do preço de custo à realidade da existência de energia. E assim, por êste critério simplista, interessa apenas a produção de energia, e para plano secundário relega-se com freqüência o seu custo. O fundamento

Página 101

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(101)
dêste estranho paradoxo, que pode trazer prejuízos consideráveis, é quási sempre a necessidade de energia e talvez em certos casos as contingências que aparecem ao determinar o respectivo preço.
É evidente que nunca será possível dizer com antecipação qual o custo exacto de uma cousa que só será produzida dentro de anos, após o início dos trabalhos. Depende, evidentemente, no caso da energia de certo número de factores e até de acontecimentos imprevisíveis. Mas seria impossível qualquer obra económica que não tivesse em conta, antecipadamente, os elementos fundamentais que podem influir no futuro rendimento económico da obra. E o preço de custo nas emprêsas bem planeadas costuma ser previsto com suficiente grau de aproximação.
No caso específico da energia hidroeléctrica, o problema que se põe é muito mais simples. Não se trata de saber, com todo o rigor, o custo da unidade de energia produzida nos diversos estágios do seu coeficiente de utilização. Pretende-se saber apenas se, em frente de dois empreendimentos — o Cávado, Rabagão e o Douro Nacional, ou êste e Zêzere ou ainda o Tejo e Douro Internacional ou qualquer outra alternativa, porque, felizmente para o País, é possível escolher — qual dos dois, em circunstâncias idênticas de mercado e tempo, é mais económico no ponto de vista nacional.
Qual dêles pode oferecer energia a melhores preços para consumo industrial, para uso nas regas, para utilizações domésticas? Que benefícios resultam, além disso, para outros aspectos da economia nacional: transportes baratos, água para regas e domínio de cheias? Que influência podem ter estes benefícios na redução do preço do custo da energia pelo facto de serem as obras utilizadas num fim (a energia) também aproveitadas em outro (a navegação)?
O problema que se põe não é, por isso, o de um preço de custo simples, mas sim o de um preço de custo relativo a dois ou mais empreendimentos comparáveis econòmicamente, podendo cada um dêles permitir várias utilizações rendosas.
31. O outro argumento é a necessidade de energia. Êsse tem pouco ou nenhum valor. O Douro Nacional, por exemplo, é um rio estudado, sobretudo na parte mais aliatória das previsões hidráulicas — o regime de seus caudais mínimos e máximos.
As suas barragens não são altas e, com excepção da do Carapatelo, as restantes podiam ser de comportas fáceis de construir e hoje correntes em quási todos os países. As obras do Douro Nacional podem ser iniciadas imediatamente, como as do Tejo Nacional, as do Ocreza ou as do Zêzere, ou as do Cávado-Rabagão. Conhecem-se as características mais importantes de cada uma dessas obras. Só resta escolher, no plano geral dos aproveitamentos, por onde se deve começar.
Ora para isso há necessidade de determinar imediatamente quais as que oferecem as melhores condições no que diz respeito a capital de 1.° estabelecimento, a custo de energia por unidade, permanente e temporária, a prazo na duração da obra, de modo a assegurar ao País, no mais curto espaço de tempo, o abastecimento de energia de que necessita. São estes três aspectos principais que têm de ser imediatamente considerados, e não parece difícil, nem impossível, resolver as três incógnitas do problema num espaço de tempo curto.
32. Um simples cálculo pode fàcilmente dar idea da influência do custo de energia. Supondo que em dois aproveitamentos se chega a preços da ordem dos $10,0 e $20,0 — e estes preços devem representar a realidade aproximada em dois casos portugueses, nos anos muito secos — para a produção de 500 milhões de unidades é de 50:000 contos a diferença em cada ano no custo da energia entre os dois.
Se nas tarifas se mantivesse essa diferença, e tudo leva a crer que assim será, os consumidores industriais ou agricultores, ou os usuários domésticos, teriam de pagar, a mais, 50:000 contos nos seus recibos de energia. Em última análise isso recairia sôbre o consumidor.
Aqui está um exemplo que ilustra bem a influência do preço do custo da energia e a gravidade do êrro cometido, se êsse custo não fôsse ponderado cuidadosamente antes de decisão final.
Seriam mais caros os produtos manufacturados, o bilhete do caminho de ferro, a elevação da água para regas, a iluminação para usos domésticos, os adubos agrícolas e tantas outras cousas.
Ou pondo a questão de outro modo também simples: a economia de 50:000 contos, por ano, no custo da produção de energia eléctrica, se acumulada durante dez ou vinte anos às taxas correntes, poderia produzir o capital suficiente para construir novas emprêsas hidroeléctricas que viessem suprir as falhas das existentes que, por virtude de desenvolvimento dos mercados, não pudessem já satisfazer a todas as necessidades.
Se fôsse possível a economia de 50:000 contos por ano no preço de custo da energia, o capital acumulado no fim de vinte anos à taxa de 4 por cento elevar-se-ia a 1.480:000 contos, o que representaria, em País de poucos recursos financeiros, uma soma respeitável.
Se a economia no preço de custo da energia, pelo facto de ter sido escolhido um aproveitamento em vez de outro, fôsse apenas de $02 em vez de $10, como acima se calculou, ainda anualmente se recuperariam 10:000 contos que, à taxa de 4 por cento e durante vinte anos, se transformariam em 297:780 contos.
Estes dois pequenos exemplos mostram claramente a influência dos custos de produção e os perigos que podem resultar para a comunidade de ideas ou teorias que os ignorem.
O programa da reorganização industrial
33. Num estudo das possibilidades da produção de energia há que atender aos consumos actuais e futuros, e estes últimos ainda se podem dividir nos que são deliberadamente planeados por iniciativa governamental, e nos que resultam do normal desenvolvimento económico e demográfico do País. Os primeiros podem determinar-se com certa antecedência, na hipótese de ter sido delineado um plano, a que se adira rigidamente nos anos futuros, o que em geral é negado, pela experiência, entre nós. Mas os segundos são incertos. Podem, resultar de factores vários e até da orientação e habilidade dos produtores de energia. Propaganda eficaz, persuasiva, constante; facilidades de crédito e demonstração experimental das vantagens da electricidade, levam a grandes aumentos de consumo em certos períodos. Mas há de ser sempre uma incógnita a percentagem do aumento.
Oficialmente, e por virtude de um deliberado plano de reorganização industrial, prevê-se o consumo de cêrca de 1 bilião e meio de unidades de energia permanente (1:050) e temporária (450) numa primeira fase.
Desta, perto de 900 milhões destinam-se a novas indústrias, nas quais avulta a metalurgia do ferro, com 400 milhões de unidades permanentes, e o sulfato de amónio com 340 milhões temporárias. E utilizações menores para outras indústrias.
Que dizer dêste programa, do qual depende, em grande parte, o êxito de um plano de electrificação em escala que permita a navigabilidade do Douro, a correc-

Página 102

344-(102)
DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 140
ção das cheias no Tejo e, até certo ponto, a rega em várias zonas do País?
Quanto à siderurgia, já atrás se verificou que algumas das mais recentes instalações no Brasil, na África do Sul e em outros pontos utilizam os processos térmicos para a redução dos minérios, embora, como no caso de Volta Redonda, haja necessidade de transportar o carvão de longas distâncias (900 quilómetros por via marítima e mais de uma centena por caminhos de ferro).
Ora o Brasil é um país muito rico em quedas de água. As possibilidades reconhecidas dão-lhe cêrca de 20 milhões de cavalos. Algumas, importantes, ficam exactamente situadas em Minas Gerais, que é o Estado mais rico em minério de ferro e quedas de água (5.828:000 C.V.). A instalação siderúrgica de Volta Redonda aspira a grandes produções (342:000 toneladas). Ela é orientada por especialistas norte-americanos, e sabe-se que os Estados Unidos têm feito nas últimas décadas consideráveis progressos na técnica metalúrgica. Será o preço de custo da energia, no Brasil, incomportável pelo processo metalúrgico?
Valerá a pena trazer o carvão de Santa Catarina, num longo percurso de 900 quilómetros (583 milhas) de Imbituba até ao Rio, e levá-lo do Rio até Volta Redonda (145 quilómetros) para depois ser transformado em coque?
A energia eléctrica para os fornos de aço vem da Ribeira das Lajes, apenas a 30 quilómetros do novo centro metalúrgico.
Também na África do Sul se optou pelo uso do coque, apesar da distância das minas de carvão (Natal-Pretória), em que grande parte dele se encontra.
Isto quere apenas significar que conviria um estudo profundo e cuidadoso do processo electro-metalúrgico que porventura se pretenda pôr em prática.
A decisão sôbre tara magno assunto não pode fundamentar-se em pequenos ensaios de laboratório ou a resultados de análises. Seria de vantagem investigar cuidadosamente todos os factores que possam influir no processo e saber das razões que levaram países progressivos e técnicos experimentados a preferir o uso de outros processos.
Podem, evidentemente, influir na escolha factores de importância, como a composição do minério, se muito ou pouco silicioso, a existência de impurezas difíceis de isolar, a capacidade da instalação, a necessidade dos subprodutos que resultam da distilação do carvão.
O estabelecimento de uma indústria desta natureza num país de fracos recursos monetários tem grande importância, que ainda é realçada pelo facto de poder servir ou não de base ao aproveitamento de rios e à construção de grandes barragens, com o objectivo de lhe fornecer energia.
Com efeito, na hipótese de não ser considerada de vantagem a electro-siderurgia, a quantidade de energia da primeira fase, avaliada em 1 bilião e meio de unidades, com folgas, arredondamentos e acréscimos do pequeno consumo, superiores a 200 milhões, reduzir-se-ia para bastante menos do que 1 bilião, dos quais para cima de 400 milhões representam energia temporária.
34. O que acaba de ser sucintamente relatado mostra a influência da electro-siderúrgica em qualquer plano hidroeléctrico. Indica outra cousa ainda de mais importância, que é talvez a de que o País não está suficientemente preparado, no ponto de vista industrial, para absorver grandes quantidades de energia.
Os anos que se seguirem à guerra, depois de satisfeitas as primeiras exigências de uma Europa faminta e desmantelada, hão-de ser de activa concorrência entre os países que hoje se uniram para um esfôrço comum.
E aqueles que saírem vencidos, ou exaustos, terão naturalmente de orientar a sua vida em uma base de trabalho intenso, imposto pela necessidade de refazer as suas reservas financeiras perdidas na voragem de anos seguidos de dissipação improdutiva.
Isto equivale a dizer que há-de ser indispensável extrair dos restos dos capitais que não forem consumidos o máximo de rendimento possível. As obras novas têm de ser executadas, tendo sempre em vista o máximo de empregos. E é feliz o país que ainda pode empregar as suas economias em emprêsas que permitam várias utilizações. É o caso de alguns rios nacionais.
Outro aspecto que a, análise dos recursos hidráulicos portugueses revela é sem dúvida êste: uma grande parte da energia temporária, susceptível de ser produzida, encontra natural saída para a rega. Pode subir a muitas centenas de milhões de unidades, como se viu atrás.
E a falta de água é o grito angustioso de milhares de proprietários no sul do País e até na sua zona central.
A indústria e a rega podem ser dois grandes consumidores. Emquanto que a indústria necessita do estabelecimento de condições que levam tempo a realizar-se, porque se não transforma de um dia para o outro a mentalidade de um país — a rega cai bem na índole do povo, é praticada desde tempos imemoriais, está nos hábitos, na própria personalidade económica do povo português.
Há uma experiência velha que pode ser melhorada se houver bom senso. E as terras podem aumentar de modo apreciável o rendimento e iniciar produções que agora lhes estão proïbidas.
Dá-se até um interessante fenómeno económico digno de ser meditado. À medida que fôr progredindo a industrialização do País pode ir decrescendo o custo da energia atribuída à rega, porque irá melhorando o coeficiente da sua utilização, que, como é sabido, influe muito no preço.
Porém, nada será econòmicamente realizável, nem na indústria nem na agricultura, se os preços de custo da energia ultrapassarem os limites da concorrência económica. E isto leva a cuidadosa investigação dos custos das obras e da energia, os quais devem constituir um dos mais sólidos fundamentos de qualquer plano de aproveitamento dos rios ou do desenvolvimento industrial do País.
CONCLUSÃO FINAL
35. Nos países mais ricos do mundo, com maiores disponibilidades de capitais, onde a técnica e a economia se acham mais desenvolvidas, é norma utilizar os recursos monetários nas emprêsas que possam oferecer maior remuneração ao capital empregado. Só por êste meio se torna possível a formação rápida de novos capitais e sua utilização em obras de interêsse comum.
Se isto assim acontece em países grandes e ricos, noutros, como Portugal, de pequenos recursos e fracos rendimentos, com um nivel de vida que necessita de ser muito melhorado, é quási paradoxo e certamente um êrro, que há-de repercutir-se no bem estar das gerações futuras, não obedecer ao mesmo princípio.
No caso da utilização de rios, verificou-se atrás ser possível aproveitá-los para diversos fins e indicou-se

Página 103

17 DE FEVEREIRO DE 1945
344-(103)
que há barragens susceptíveis de ser usadas para produção de energia, rega, navegação e domínio de cheias. O princípio que, nos Estados Unidos, da América do Norte, preside ao uso dos rios está expresso neste admirável trecho, extraído de uma publicação oficial:
«Houve tempo em que um açude era projectado só para o fim de rega; em que uma estrutura para a melhoria da navegação se construía apenas para êsse fim; em que uma barragem para fôrça motriz era isso e nada mais no ponto de vista de quem a usava. Êsse tempo passou, felizmente. Hoje as barragens exercem simultâneamente diversas funções. Dá-se a mais cuidadosa atenção à idea de obter o maior rendimento possível através da combinação de provisões que assegurem os muitos empregos possíveis actualmente em fins públicos» (1).
36. Se isto acontece em país de consideráveis recursos monetários que construiu nos anos mais recentes muitas dezenas de barragens para diferentes utilizações, porque se não há-de seguir política idêntica em Portugal, país de minguadas disponibilidades monetárias, e extrair delas o maior rendimento possível pelo emprêgo nas obras mais reprodutivas, que assegurem maior remuneração ao capital e à comunidade?
O Boulder Dam (217 metros), o Shasta (180 metros), o Grand Coulee (165 metros), o Fontana (135 metros), o Anderson Ranch (133 metros), o Hetch Hetchy (129 metros), completados na década que precedeu a guerra ou, como no caso do Shasta em vias de conclusão, foram projectados para dois ou três empregos simultâneos — o domínio de cheias, a irrigação e a fôrça motriz. E vários, como o Morris (80 metros), o Fort Peck (75 metros) e ainda mais, tiveram em vista a navegação, a fôrça motriz e o domínio das cheias.
Nos Estados Unidos «cerca de 58 por cento do custo de todos os esquemas em construção em 1 de Janeiro de 1942 serão liquidados por meio de receitas da fôrça motriz. Dos restantes custos, cêrca de 37 por cento serão pagos pela água usada na rega e 5 por cento serão liquidados pelos municípios por uso de água».
O domínio de cheias e a navegação vêm auxiliar quási sem custo a obra de reconstrução económica das vastas regiões servidas.
Esta política, acentuada a partir de 1930, tornou possível a utilização de vastas zonas no oeste americano, que de outro modo não seria económico aproveitar. Aumentou consideràvelmente a riqueza nacional.
37. Entre nós, os dois rios de maiores caudais, o Tejo e o Douro, podem ser usados para fins simultâneos e constituir valiosos propulsores da riqueza pública.
Um está parcialmente regularizado por obras executadas no país vizinho, que não custaram nada à economia interna: é o Douro. É susceptível de poder ser utilizado na fôrça motriz e na navegação.
O outro — o Tejo — tem uma larga bacia hidrográfica e grandes caudais que, depois de dominados, podem assegurar diversos usos — na rega, na navegação, na produção de energia e até em possíveis ennateiramentos —, além de impedir o assoreamento que resulta de suas impetuosas cheias em uma das mais ricas zonas do País.
São as bacias hidrográficas dêstes dois grandes rios nacionais que, por terem água, ou por estarem parcialmente regularizados, e ainda por assegurarem diversas utilizações, devem ser já aproveitadas.
Podem iniciar-se imediatamente as obras no Douro ou no Zêzere. O local da barragem no Carrapatelo já foi reconhecido pelos serviços oficiais, e não oferece dificuldades. O seu tipo de comportas torna fácil a construção logo que termine a guerra, visto ser construída de peças metálicas em grande parte. Apenas os trabalhos preliminares no rio poderiam oferecer demoras mais sensíveis.
Na bacia hidrográfica do Tejo, o melhor local no baixo Zêzere indicado para uma grande barragem é sem dúvida o Cabril. Há a êste respeito unanimidade de opiniões nos técnicos e nos que o não são. E pode ser imediatamente iniciada a sua construção, também no parecer de técnicos experimentados na matéria.
A obra hidráulica nestes dois rios, o Douro e Tejo, é urgente e não pode nem deve ser preterida ou adiada em favor de qualquer outra, ainda que estivesse provado — e não está — ser menor o custo de produção de energia, relativamente ao Douro Nacional, que deve ser preferido ao Douro Superior ou Internacional, apesar de ser possível neste último obter preços de custo que, sem dúvida, devem ser dos mais baixos de todo o sistema português.
A única alternativa que poderia opor-se ao adiamento das obras no Douro seria a do Cávado-Rabagão, situado nos confins do Minho e Trás-os-Montes. Êste sistema é susceptível de produzir largas quantidades de energia, talvez a preço de custo da ordem da do Douro, em 1.ª fase. Os inconvenientes resultam da longa linha de transmissão, sobretudo se parte da energia vier a ser consumida em Lisboa ou zonas próximas e de só ser possível uma utilização hidráulica. As razões que parecem defender esta solução imediata são a urgência de energia que resulta de estarem esgotadas todas as possibilidades de produção nas centrais existentes e a rapidez nas obras, constituídas, além da central, numa 1.ª fase, por um túnel de uns milhares de metros e por uma barragem bastante alta.
Esta solução vem indubitàvelmente contrariar as obras no Douro, bem mais interessantes no ponto de vista económico e nacional. E antes de ser resolvida a sua execução, devem ser cuidadosamente considerados os seus reflexos na economia daquele rio. Ainda não está provado, além disso, que seja possível construí-la em tempo mais curto do que a do Carrapatelo.
Se fôr tomada decisão sem prévio estudo da influência na obra do Douro, e se dessa decisão resultar o adiamento dos trabalhos neste rio por algumas dezenas de anos, será isso grave êrro económico e neste caso também político.

(1) «There was a time when a dam was designed for the purpose of irrigation only; when a structure for the improvement of navigation was designed with that single thought; when a power dam was a power dam and nothing more so far as the designer and the operator were concerned. Fortunalely, that day has passed. Today dams exercise several functions simultaneously. Careful attention is given to obtaining the highest efficiency through combining in the design provisions for the many uses of the present day public Work».
Imprensa Nacional de Lisboa

Página 104

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×