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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 7

ANO DE 1945 8 DE DEZEMBRO

ASSEMBLEA NACIONAL

IV LEGISLATURA

SESSÃO N.° 79 EM 7 DE DEZEMBRO

Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mos Srs. Manuel José Ribeiro Ferreira

Manuel Abranches Martins

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 40 minutos.

Leu-se o expediente.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o Diário das Sessões da sessão do dia 5, depois de sobre ele ter falado o Sr. Deputado Mário de Figueiredo.

O Sr. Deputado Marques Teixeira mandou para a Mesa um requerimento para que lhe sejam fornecidos elementos sobre a criação de estações teléfono-postais.

O Sr. Deputado Craveiro Lopes congratulou-se com a criação da Companhia dos Transportes Aéreos e com a assinatura do acordo de aeronáutica civil luso-británico.

O Sr. Deputado Mário Madeira ocupou-se do problema da habitação das famílias pobres.

O Sr. Deputado Camarate de Campos apontou a necessidade de se construírem habitações capazes para os professores primários.

Foi eleita a Comissão de Finanças.

Ordem do dia. - Concluiu-se a discussão e votação do projecto de alterações ao Regimento, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Botelho Moniz e Mário de Figueiredo.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 15 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 30 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Afonso Eurico Ribeiro Casais.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Ferreira Pinto Basto.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
André Francisco Navarro.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria do Couto Zagalo.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Augusto Figueiroa Rego.
Artur Proença Duarte.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos de Azevedo Mendes.
Eurico Pires de Morais Carrapatoso.
Fernão Couceiro da Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Henrique de Almeida.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Horácio José de Sá Viana Rebelo.
João Ameal.
João Cerveira Pinto.
João Garcia Nunes Mexia.
João Luiz Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Saldanha.

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Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Alçada Guimarãis.
José Dias de Araújo Correia.
José Esquível.
José Luiz da Silva Dias.
José Martins de Mira Galvão.
José Nunes de Figueiredo.
José Penalva Franco Frazão.
José de Sampaio e Castro Pereira Cunha da Silveira.
José Soares da Fonseca.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Luiz Cincinato Cabral da Costa.
Luiz Maria da Câmara Pina.
Luiz Maria Lopes da Fonseca.
Luiz Pastor de Macedo.
Luiz Teotónio Pereira.
Manuel de Abranches Martins.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Marques Teixeira.
D. Maria Luíza de Saldanha da Gama van Zeller
Mário Borges.
Mário de Figueiredo.
Mário Lampreia de Gusmão Madeira.
Rafael da Silva Neves Duque.
Ricardo Malhou Durão.
Ricardo Spratley.
Rui de Andrade.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
D. Virgínia Faria Gersão.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 70 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram l5 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamarão o Diário da penúltima sessão.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: eu não revi as provas de que disse na penúltima sessão. Estive a ler agora o que me é atribuído e verifiquei que era impossível mandar para a Mesa qualquer emenda ou rectificação porque, de um modo geral, o que era indispensável era substituir, não digo tudo, porque há bocados que são verdadeira fotografia de que disse, mas a maior parte do que disse. Nestas condições, a única cousa que pretendo é que no Diário das Sessões de hoje fique exarado o que acabo de afirmar e quero, na mesma ordem de ideas, pedir a V. Ex.ªs para, de alguma maneira, se conseguir uma organização tal dos serviços que reclamações como a que estou a fazer hoje se tornem completamente desnecessárias.

Não sei qual é o caminho, mas sei, Sr. Presidente, que há no Regimento uma disposição que não permite que os Deputados leiam, o que quero dizer que o que se diz é em linguagem falada que deve ser dito, e não em linguagem traduzida em falado do que antes se escreveu, que há-de ficar exarado no Diário.

Já uma vez sustentei junto de um dos Srs. redactores desta Assemblea que a função do Deputado é dizer conteúdos de pensamentos que sejam completamente
apreendidos por toda a Assemblea, e a do redactor dar-lhes forma.

Não digo que seja eminentemente claro, mas creio que na Assemblea me consideram suficientemente claro. O que pretendo é que, através do relato do Diário das Sessões, se dê a idea do pensamento que exprimi quando falei. Desafio quem quer que seja que não estivesse presente nessa sessão a reconstituir o meu pensamento através do Diário das Sessões.

O Deputado - sustentava eu para um dos Srs. redactores - tem de exprimir conteúdos de pensamentos, e é função do redactor dar forma àqueles pensamentos.

Eu não revi as notas; ninguém me apresentou as provas; e aconteceu aquilo que afirmei.

Peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, para isto se evitar, que os serviços se organizem por maneira a tornar dispensáveis reclamações como esta.

O Sr. Presidente: - Tomo na devida consideração as palavras do Sr. Deputado Mário de Figueiredo e procurarei evitar que se repitam os factos que S. Ex.ª acaba de apontar.

Continua em reclamação o Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como mais ninguém quere usar da palavra sobre o Diário, considero-o aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Um telegrama da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho pedindo que na reforma judiciária seja considerada a restauração daquela comarca.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Marques Teixeira.

O Sr. Manuel Marques Teixeira: - Pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte requerimento:

"Requeiro que me sejam fornecidos pela Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones os seguintes elementos:

a) Qual o critério que presidiu à criação das estações teléfono-postais classificadas de regionais, sua rede de distribuição e qual a conclusão do estudo feito sobre a eficiência dos seus serviços;

b) Em que condições se realiza o recrutamento do pessoal que nelas trabalha e qual o grau mínimo de habilitações que lhe é exigido;

c) Se a natureza e a latitude dos serviços públicos por elas prestados e pelas estações teléfono-postais de 4.ª classe são ou não diferentes e, sendo-o, em que medida;

d) Quais os vencimentos a perceber por quem exerce a sua actividade em cada uma das estações teléfono-postais das categorias antes referidas".

Sr. Presidente: aproveito o ensejo que se me depara para cumprir um dever, que é simultaneamente um grande e sentido prazer, de manifestar a V. Ex.ª a expressão viva dos meus melhores sentimentos de grande admiração e subido apreço pelas nobres virtudes de carácter, fulgor de inteligência e irradiante bondade do coração do V. Ex.ª. Isto tenho aqui ouvido, repetidamente, num preito de alta justiça aos predicados espirituais, morais, intelectuais e políticos que exornam e dão relevo à personalidade marcada, distinta, de V. Ex.ª

A este côro unisono de vozes junto sinceramente a humildade da minha voz que tem também a franqueza

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que é timbre e brasão do espírito também leal e aberto da gente da Beira, de que sou oriundo, e a marca da sinceridade que é comum, naturalmente comum, a quem tenha força de carácter.

Renovo, pois, a V. Ex.ª a expressão sentida da minha maior consideração e do meu mais profundo respeito.

Aos Srs. Deputados, eu caloiro nas lides parlamentares, dirijo os meus melhores cumprimentos de viva saudação, e faço solenemente a garantia da minha lealdade absoluta em tudo e por tudo, e também quero acrescentar que com os Srs. Deputados colaborarei adentro do extremo limite das minhas forças, que não são muitas, em ordem a que esta Câmara seja e continue a ser, como efectivamente tem sido após o advento do Estado Novo, um instrumento eficiente de trabalho útil a bem da Nação, não só na efectivação de um direito que não se enjeita, mas também no reconhecimento de um dever que não se renega.

A V. Ex.ª, Sr. Presidente, e a V. Ex.ªs, Srs. Deputados, e sem qualquer desprimor para quem quer que seja, quero dizer que o meu coração exige que distinga, embora não pronuncie o nome, alguém que foi meu mestre querido e muito estimado.

A V. Ex.ª todos rendo as minhas sinceras, calorosas e sentidas saudações.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Craveiro Lopes: - Sr. Presidente: a V. Ex.ªs dirijo as primeiras palavras para apresentar os meus cumprimentos pela escolha do nome de V. Ex.ª para presidir aos trabalhos desta Assemblea.

Declaro que farei quanto em mim caiba para não tornar ainda mais espinhosa a missão de V. Ex.ª, mantendo uma atitude disciplinada no cumprimento dos meus deveres de Deputado, o que não quero dizer que me dispense de proceder com aquela independência de julgamento, sem a qual não seria digno de passar os umbrais daquelas portas.

Para os Srs. Deputados, meus ilustres colegas, vão as minhas mais calorosas saudações e a afirmação de que poderão sempre contar com a melhor camaradagem, lealdade, compreensão e vontade de colaborar, indispensáveis para que o nosso labor resulte útil e fecundo.

Sr. Presidente: dois factos de transcendente importância acabam de ocorrer que não podem deixar de ser notados nesta Casa. Refiro-me por ordem cronológica, à inauguração das actividades da Companhia de Transportes Aéreos, levada a efeito no último domingo, com a presença de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, e ao acordo ontem assinado entre os Governos Português e Britânico, sobre aeronáutica civil.

Tais acontecimentos, Sr. Presidente, representam realidades que vêm atestar o cuidado que nos últimos anos o Governo tem dedicado aos problemas relativos aos transportes aéreos, numa visão clara de não deixar perder oportunidades que os últimos acontecimentos mundiais fizeram surgir.

Parece que, finalmente, foi bem compreendido neste País que o aproveitamento dos aéreos nas nossas linhas de comunicações imperiais podem e devem contribuir enormemente para o progresso económico do Nação.

Ao manifestar o nosso apreço aos dirigentes da Companhia que acaba de se formar, não seríamos justos se não englobássemos também a já velha empresa Aero-Portuguesa que durante anos de trabalho e através de dificuldades sem número, manteve, os seus serviços em condições de prestigiar as cores nacionais estampadas nos lemes dos seus aviões.

No que respeita propriamente aos acordos agora assinados, e nos quais interveio um dos mais ilustres membros desta Assemblea, não será necessário mais dizer, para avaliar da sua transcendência, que registar as declarações do chefe da missão britânica de que o aeroporto de Lisboa era a porta de entrada do continente europeu e que os direitos que daí lhe advém foram devidamente reconhecidos.

Não seria possível, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que acontecimentos desta natureza pudessem ter lugar neste País se nele não houvesse ordem e não se tivesse alcançado aquele prestígio que gera a confiança indispensável ao estabelecimento de acordos de tamanha importância.

Como homem do ar, daqui saúdo o Governo e todos aqueles que à causa, do desenvolvimento das nossas comunicações aéreas vêm dando há já longos anos o melhor da sua inteligência, do seu saber e da sua fé.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Mário Madeira: - Sr. Presidente: não posso nem quero deixar de dirigir a V. Ex.ª os meus cumprimentos, juntando a minha voz modesta à dos oradores ilustres que já usaram da palavra nesta Câmara; e faço-o também com a certeza absoluta de me ligar à unanimidade daqueles que, como eu ainda não tinham tido ocasião de o fazer.

Prometo, desde já, a V. Ex.ªs que vou ocupar o menos tempo possível, e assim farei de futuro, também, as poucas vezes que tenha de falar nesta Assemblea.

Não uso a costumada imagem literária das "duas palavras apenas" porque detesto as hipérboles que a si mesmas se negam, visto que porá dizer "duas palavras apenas" é preciso pronunciar três, mas garanto que tomarei poucos minutos a V. Ex.ªs.

Se não houvesse esta razão de ordem pessoal para ser muito breve, havia ainda a de que o assunto de que vou tratar é de uma tal importância e transcendência que seria quási insultuoso para V. Ex.ªs estar a perder tempo para lhes mostrar como ele é importante.

Refiro-me ao problema da habitação em Portugal.

Não desconhecem V. Ex.ªs que o Governo, desde há muito, está procurando resolver este problema sob três aspectos e por três processos. O primeiro é o dos bairros das casas económicas, feitas pelo Ministério das Obras Públicas e depois entregues ao Instituto Nacional do Trabalho para proceder a sua distribuição. É a fórmula perfeita, é aquela em que a casa é entregue já sob o sistema da propriedade resolúvel; mas, como tem de ser sobrecarregada com várias taxas de seguro, etc., o que já torna a renda bastante elevada e muitas vezes pouco eficiente para o fim em vista, o Governo encarou mais duas formas de resolver o problema. Uma é a necessidade de fazer bairros rapidamente, onde se hão-de colocar as famílias em condições de miséria, visto não poderem ficar na rua, enquanto se construam novos bairros, aqueles que ocupavam o terreno onde é preciso reconstruir as velhas casas.

Há ainda a atender que foi com este objectivo que se encarou a fórmula hoje em execução e que é a da construção de casas de renda económica, nos termos do decreto-lei n.º 34:486, de 6 de Abril deste ano.

Nós temos sempre, tendência para encarar como especial qualquer caso que melhor conhecemos, e é por isso que quero referir-me ao caso particular da cidade de Setúbal.

Ninguém terá o direito de supor que somente para ter amanhã referência nos jornais me ocupo em pri-

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meiro lugar, nesta Câmara, de um caso que diz respeito a cidade pela qual tive a honra de ser eleito e a cuja população devo a maior das gratidões; é que estes problemas ganham muito em ser sentidos e vividos antes do estudados. e eu senti-o como ninguém durante os dois anos e meio em que fui governador civil de Setúbal.

E quero aqui confessar que nada fiz, absolutamente nada, enquanto lá estive, que me permitisse solucionar o problema que tanto desejava. E, se falo no problema de Setúbal, é ainda porque, precisamente neste momento, S. Ex.ª o Sub-Secretário das Corporações está a estudar com a Direcção do Instituto Português de Conservas de Peixe, a construção de um grupo de casas económicas, destinadas aos operários conserveiros daquela cidade.

S. Ex.ª o Sub-Secretário de Estado das Obras Públicas, que tive a honra de acompanhar para ver a miséria que se passa naquele distrito, sei que está a encarar o problema, bem merecedor de todo o carinho do quem governa e do apoio absolutamente indispensável de V. Ex.ª.

Setúbal é uma cidade que tem hoje - e vejam V. Ex.ªs quanto é baixo ali o nível de vida - uma população pouco inferior em número às populações das cidades de Coimbra e Braga juntas. São cerca de 50:000, contra 30:000 habitantes em cada uma daquelas grandes cidades.

Neste número há muito menos de 50 por cento de famílias que tenham residência própria, e não quero dizer com isto que se trate de famílias que possuam casa absolutamente sua, mas sim uma casa onde viva um só aglomerado familiar em economia autónoma.

Se é infelizmente certo que 50 por cento dos portugueses que habitam as grandes cidades têm de se juntar em duas ou três famílias para poderem ter um teto onde se abriguem, este número é pavorosamente, excedido em Setúbal.

O problema tem um perigo. Muita gente supõe, quando se fala num melhoramento, numa ponte, numa estrada, que por ali vá e passar todos e que vai servir os interesses da região e a economia nacional; mas, quando se fala em habitação, vem logo a idea de que a habitação é feita para ser ocupada por determinadas pessoas. Ora não é assim. É uma família que se salva, é todo o capital humano que urge salvar, porque esse é o mais valioso capital, mesmo usando uma expressão que em toda a sua frieza económica me repugna.

Trata-se de salvar a família portuguesa, de evitar todo o sacrifício de uma geração.

É um problema que seria inconcebível ignorar, mas que é antipatriótico adiar na sua urgente e indispensável solução. (Muitos apoiados).

Ouvi com prazer os aplausos da Câmara, e isso basta para me orgulhar. A minha voz isolada já por si só representava o cumprimento de um indeclinável dever. Fiel ao que prometi, terminei.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Camarate de Campos: - O importante jornal, o grande órgão da imprensa. O Século, num dos seus últimos números, em artigo de fundo, ocupou-se de um problema, pôs um assunto para o qual ouso também, e tomo a liberdade, de chamar a atenção do Governo. Fazendo-o por intermédio de V. Ex.ª, Sr. Presidente, aproveito o ensejo para lhe apresentar os meus mais carinhosos e enternecidos cumprimentos.

Trata-se da habitação, da casa dos professores de ensino primário. É certo, inteiramente certo, que em obediência a um plano previamente estudado, estabelecido, profundado e legislado, se estão construindo pelo País fora muitos edifícios escolares, com água, com luz, com higiene . . . numa palavra, saudáveis.

Mas acontece que na maior parte dos lugares onde se estão edificando tais escolas não há habitação digna para os professores. Vivem eles, Sr. Presidente, em casas verdadeiramente miseráveis, impróprias, indesejáveis. Ora é preciso que os professores tenham habitação com água, luz e higiene, saudáveis como as escolas que só estão construindo. Dessa forma se constituiria um todo único das habitações para os professores e das escolas para os alunos. É que, Sr. Presidente, isto, além do mais, tem a vantagem de permitir a indispensável estabilidade dos professores nessas escolas. Quando elas não têm um bom ambiente ou não possuem uma boa habitação os professores procuram deixá-las e conseguir outras melhores, onde tenham casa razoável.

Não há ensino com rendimento útil sem haver estabilidade no professorado. Por conseguinte, Sr. Presidente, entendo que deve acompanhar a construção de escolas a edificação de residências para os professores de ensino primário. Dou a minha inteira concordância ao artigo de O Século, a que me referi no início das minhas considerações, e faço votos para que o Governo ouça O Século e as minhas palavras.

Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Ontem aprovou-se o projecto de modificação do Regimento até ao artigo 27.° Já está aprovado o artigo que trata das comissões permanentes da Câmara, e há urgência, como ontem disse a V. Ex.ªs, de que se constituam, pelo menos, duas dessas comissões: a de Finanças e a do Legislação e Redacção. A primeira terá imediatamente de entrar no estudo da proposta de lei de autorização de receitas e despesas e a segunda no da situação dos Srs. Deputados Mendes Correia e Madeira Pinto, que aguardam urgentemente o seu parecer.

Por este motivo, e porque a parte já votada das alterações ao Regimento constitue lei para a Assemblea, vou interromper o período de "antes da ordem do dia" para a organização das listas e eleição das Comissões de Finanças e de Legislação e Redacção.

Está interrompida a sessão.

Eram 16 horas e 12 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 58 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à eleição da Comissão de Finanças.

Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Está concluída a votação; vai proceder-se ao escrutínio.

Convido para escrutinadores os Srs. Deputados Alçada Guimarãis e Nunes Mexia.

Procedeu-se ao escrutínio.

O Sr. Presidente: - O resultado da eleição foi o seguinte:

Listas entradas, 75.

Os Srs. Deputados Águedo de Oliveira, Pacheco de Amorim, João das Neves, Joaquim Mendes do Amaral, Araújo Correia, Braga da Cruz, Luiz da Câmara Pina, Nunes Mexia e Ulisses Cortês obtiveram 75 votos; o Sr. Deputado Luiz Pastor de Macedo, 74 votos; e o Sr. Deputado Mário Borges, 73 votos.

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Considero, portanto, eleitos para constituírem a Comissão de Finanças estes Srs. Deputados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Comunico à Assemblea que estão na Mesa propostas de alteração a disposições do Regimento que não foram tocadas pelo projecto em discussão. Dentro do critério fixado ontem, a discussão dessas propostas não pode ser inserida na ordem do dia de hoje, e oportunamente, portanto, serão tais propostas submetidas à apreciação da Assemblea.

Quero ainda comunicar à Câmara que não se procedeu à eleição da Comissão de Legislação e de Redacção por falta do tempo.

Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 26.° do projecto de alteração ao Regimento. Se a Assemblea não vê inconveniente nisso, ponho simultaneamente à discussão os artigos 26.°, 27.°, 28.°, 29.º e 30.º Ao artigo 28.° propõe a Comissão do Regimento o aditamento de um § único, assim concebido:

"O modo de trabalho e composição da sessão conjunta serão regulados pelo regimento das respectivas comissões ou por acordo dos seus presidentes".

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vou pôr à votação, visto ninguém ter pedido a palavra sobre eles, os artigos 26.° e 27.º e o corpo do artigo 28.°

Consultada a Assemblea, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação da Câmara o § único do artigo 28.°, com o aditamento apresentado pelo Sr. Dr. Mário de Figueiredo.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença? É apenas para uma explicação. Vejo que V. Ex.ª vai pôr à votação este § único com o meu aditamento. Não sei se abre debate sobre a matéria ...

O Sr. Presidente: - Agora estamos já na votação. Mas se V. Ex.ª quero dar à Câmara umas breves explicações ...

O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu pensava realmente em dar umas explicações sobre a razão de ser do aditamento. Era uma afirmação de consideração pela Câmara. A Comissão do Regimento propõe um aditamento e naturalmente explica porquê.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai, portanto, pôr-se à votação o § único do artigo 28.° com o aditamento proposto pelo Sr. Dr. Mário do Figueiredo.

Consultada a Assemblea, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vou pôr à votação os artigos 29.º e 30.º

Consultada a Assemblea, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 31.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vou submetê-lo à votação.

Consultada a Assemblea, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 33.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

Consultada a Assemblea, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 34.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Sra. Deputados deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

Consultada a Assemblea, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 35.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente : - Está em discussão o artigo 37.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 38.º

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: não é porque tenha de alongar-me muito que subi a esta tribuna. Preferiria falar do meu lugar na Câmara, se infelizmente, conforme todos temos tido ocasião de verificar, as condições acústica da sala não fossem péssimas, de maneira a impedir que muitas vezes nos façamos ouvir e compreender. E aproveito esta oportunidade para dizer, perante a Câmara, aquilo que tive ocasião de afirmar a V. Ex.ª: que se tornam necessárias providências urgentes, e que eu reputo muito fáceis - um pouco de conhecimento de causa por motivos que V. Ex.ªs compreendem - que reputo muito fáceis, repito, no sentido de serem modificadas as condições acústicas desta Câmara, até de forma bastante económica, porque eu não quereria, nem V. Ex.ªs querem por forma alguma, que amanhã possa dizer-se, até por ironia fácil, que o Deputado é um ser que nunca consegue fazer-se ouvir.

Se peço agora a palavra acerca do artigo 38.º, antes 34.º, é apenas por dever de coerência com aquilo que eu e um grupo de Deputados dissemos acerca de um caso semelhante, em que fomos vencidos pelo critério da Câmara. Mas permita-se-me que eu aproveite esta oportunidade para explicar melhor quer o princípio quer as razões por que neste caso esse princípio ainda me parece mais forte.

Vou mandar para a Mesa uma proposta de alteração ao § 2.º do artigo 38.º, antes 34.º, que diz o seguinte:

Leu.

Conforme V. Ex.ªs verificam, cotejando os dois textos, o que suprimi aqui foi apenas a necessidade de, na discussão na especialidade, as propostas serem apresentadas por um grupo de cinco Deputados.

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Neste caso não se diz grupo, mas diz-se apenas cinco Deputados.

Sei, Sr. Presidente, que milita a favor da anterior redacção do Regimento uma circunstância: evitar frequentes apresentações de propostas e que realmente é mais difícil apresentar-se uma proposta subscrita por cinco Deputados do que apenas por um.

Mas recordo a V. Ex.ªs que, na generalidade, pode fazer-se a apresentação de alterações apenas por um Deputado e na especialidade isso não é considerado; e, porque não é considerado, evita-se que a Assemblea não seja surpreendida com a apresentação de uma alteração de última hora.

Vamos a ver se êste critério é um critério exacto.

Quando venho para esta Câmara, venho com sincero desejo de entrar na discussão e peço explicações às pessoas que julgo capazes de mas darem, isto é, não venho com ideas preconcebidas.

Dou a mão à palmatória quando é necessário dar, e é por isso que podem surgir, na discussão na generalidade de um qualquer projecto, ideas novas que não tenham aparecido nem ao autor do projecto nem a qualquer dos outros Srs. Deputados e que rapidamente podem traduzir-se numa proposta que a Mesa e a Assemblea têm o direito de admitir ou não, emquanto que se eu tiver necessidade de andar buscando assinaturas, perco tempo e, principalmente, deixo de dar atenção àquilo que os oradores estão dizendo.

Eu sei que - e ainda li há dias um ilustre Sr. Deputado me fazia essa observação - a Mesa pode mandar suspender a sessão para elaboração de uma proposta nova e para que haja tempo de ser assinada por cinco Srs. Deputados.

Mas então cairíamos precisamente no inverso daquilo que se pretende atingir. Com a exigência da assinatura de cinco Srs. Deputados obriga-se a suspender a sessão, e já sabemos que quando ela é suspensa por cinco minutos se arrasta por muito mais tempo; por necessidade até de os Srs. Deputados poderem redigir melhor ou pior essa proposta.

Estas são as razões a favor e as razões contra a idea, digamos, prática ou objectiva.

Mas como há dias, ao referir-me à necessidade dos tais cinco Deputados para apresentação de emendas à Mesa, declarei que isso me parecia, até certo ponto, o regresso ao regime de partidos, o ilustre Deputado Sr. Mário de Figueiredo respondeu que não podia haver tal confusão, porque o partido é de sua essência, ou de seu carácter, uma cousa permanente, e êste grupo era um grupo eventual. Numa interrupção que tive ocasião de fazer, e que S. Ex.ª me permitiu, disse-lhe que em meu entender o partido era tudo quanto há de menos permanente e que nós até sabemos, por experiência própria, que os partidos são de sua natureza eventuais.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Por experiência própria, não! Eu nunca mudei de partido.

O Orador: - Quando digo por experiência própria refiro-me a Portugal e também nos podemos referir ao estrangeiro.

Admiro-me que, quando um ilustre Deputado diz - numa Câmara constituída como esta - que um partido é, na sua essência, de natureza permanente, não tivesse havido um jornalista que em qualquer desta cousa que se chama o mundo não tivesse dito, salvo o devido respeito pela pessoa que pronunciou essas palavras, que no Parlamento português finalmente se fazia o elogio dos partidos.

Chamar, realmente, permanente a um partido é, na verdade, fazer um elogio. Vou explicar porquê.

Se eu tivesse pronunciado essas palavras e se a oposição alguma cousa dissesse a meu respeito - é claro que êsses senhores da oposição têm, como todos nós sabemos, o monopólio dos intelectuais, como declararam em manifesto - como posso à vontade errar conceitos filosóficos e políticos, diriam: "Falou um militar; não admira". Isto da mesma forma simplista porque numa escola de oficiais milicianos, quando um professor que vai reger o seu curso não sabe fazer o movimento com as armas, o cabo, que já está há muito tempo na tropa, diz: "Não admira; não sabe nada, porque é um paisano".

Eu podia, por consequência, dizer uma cousa como essa, mas a minha inexperiência parlamentar ainda não me permite distinguir em todos a presente situação de todo o seu passado; e todos nós sabemos que o Sr. Dr. Mário de Figueiredo é mestre que temos obrigação de respeitar; digo-o com a mais absoluta sinceridade, porque fiquei emocionado com os altos conceitos filosóficos e políticos que nesta sala já ouvi a S. Ex.ª e que são verdadeiramente admiráveis.

Habituado, nesta minha inexperiência, a não conseguir desligar o presente do passado, pregunto a mim próprio se esta classificação de grupos e de partidos é uma afirmação que possa ficar nesta Câmara sem ser refutada e sem se permitir ao Sr. Dr. Mário de Figueiredo a oportunidade, que para nós não interessa e que talvez lá para fora fosse necessária, de dizer que não quero chamar ao partido cousa de carácter permanente.

Eu, que não sou nada mais do que um sincero adepto do Estado Novo, que não se tem batido no campo político, mas apenas no campo militar, tenho uma noção: é de que esta idea de permanência só pode ligar-se às cousas verdadeiramente grandes, às cousas verdadeiramente nacionais e incompatíveis; são essas que nós aceitamos como cousas permanentes; é a idea de Pátria, como disse o Sr. Presidente do Conselho; é o respeito pela religião, nossa ou de outrem; é o respeito pela autoridade; é o respeito pela família; é o respeito pela legalidade. Êsses sim, são princípios permanentes fundamentais. Agora, nos partidos, o que há de permanente: Há esta cousa: grupos eventuais em relação aos homens; e digo que o são porque os homens estão constantemente a mudar, umas vezes por efeito da lei inexorável da vida e da morte, outras vexes pelos seus benefícios pessoais e outras ainda por discordâncias doutrinárias ou de oportunismo.

Portanto, eventuais quanto aos homens, eventuais quanto às doutrinas, porque nós todos estamos habituados a verificar que os partidos, por uma qualquer conveniência momentânea, oportunista, abdicam das suas próprias doutrinas, não em nome do interesse nacional, mas em nome do interesse partidário, muitas vezes para se ligarem aos seus piores inimigos.

Isto dava o guchix político de que Portugal e outros países foram vítimas, porque não se fazia essa união para defender os interesses nacionais, mas sim para defesa dos interêsses partidários.

Porque verdadeiramente nos partidos - tem V. Ex.ª razão, Sr. Dr. Mário de Figueiredo - há qualquer cousa de permanente, mas o que há de permanente é o vício de origem, o espírito partidário. Mas esse vício de origem, efectivamente permanente, êsse interesse partidário, de que os partidos são escravos, essa disciplina partidária, que obriga a seguir cegamente, sem discussão, os chefes políticos ou os leaders parlamentares, transformam-se muitas vezes na razão de ser da morte, dêsses mesmos partidos, porque nós já tivemos ocasião de verificar que ainda há poucos dias, em França, o velho partido radical e radical-socialista quando se amarrou demasiadamente aos seus velhos princípios, morreu, e verificámos também que o partido democrático, aqui em Portugal, amarrado a uma disciplina par-

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tidária, cega perante todos os problemas nacionais, cioso apenas do Poder, morreu, em virtude de não saber que o interesse nacional deve dominar o interêsse partidário.

Portanto, a única cousa permanente, o tal vício, é quási sempre a razão da morte desses partidos.

E agora vamos ao meu exemplo pessoal. Aproveito a oportunidade para o tratar porque, se V. Ex.ª não conhece por experiência própria o que é um partido, eu, infelizmente, sei muito bem o que isso é.

Devo até lembrar a V. Ex.ª que, pouco antes da eleição desta Câmara, num jornal de Lisboa, a mim e - em muito boa companhia - ao Sr. Presidente da Assemblea um, creio, antigo correligionário dizia: "O Sr. Botelho Moniz, candidato a Deputado pela União Nacional, já pertenceu à União Liberal Republicana, partido do Sr. Cunha Leal".

Tive ocasião de responder, também num jornal, que aquilo pesava, não por excesso, mas por omissão, e que eu não pertencera ao partido do Sr. Cunha Leal, mas sim ao Partido Centrista, do Sr. Dr. Egas Moniz, e ao Partido Nacionalista, presidido pelo Sr. Dr. Júlio Dantas.

Entrei na política aos 19 anos pela mão do grande Presidente Sidónio Pais.

Por efeito de uma lei eleitoral que dava aos cidadãos providos de um curso superior o direito de serem eleitores e elegíveis aos 19 anos fui feito Deputado. Não tinha culpa da minha pouca idade, mas a circunstância de haver um partido que apoiava essa situação forçou-me a filiar-me nesse partido.

Depois, porque o Centro Sidónio Pais passava para o Partido Nacionalista, ai vou eu do Centro Sidónio Pais para o Partido Nacionalista. Depois, porque não concordava com este Partido, aí vou eu para a União Liberal Republicana. Porquê? Porque eu tinha de escolher entre a acção militar que V. Ex.ªs sabem que algumas vezes realizei, revolucionária, a única que nos permitiam realizar, ou a acção política. E como eu nestas cousas de escolha sou muito difícil de satisfazer, tal como o burro de Buridan, escolhi as duas cousas e simultaneamente estava na acção política e na militar, para ver onde vencia primeiro.

Mas a minha vida tem sido, desde 5 de Dezembro de 1917 até ao dia de hoje, perfeitamente lógica, perfeitamente recta. Não sou eu que tenho de modificar-me: não é o Sr. Presidente da Assemblea que se tem modificado. As nossas vidas foram comuns, rectas; seguiram sempre as mesmas doutrinas. Quem andou em ziguezagues foram os partidos, os tais grupos que não são permanentes, precisamente porque andam aos ziguezagues. Encontro-me eu e os partidos, geometricamente, no que pode chamar-se três pontos de intercepção. Eu fiquei sempre com a minha doutrina; os partidos variaram segundo as conveniências do momento. Tenho sido sempre, e com a agradável companhia de todos V. Ex.ªs, a mesma cousa há muitos anos, por vontade própria e com muito prazer. Os outros, os homens, as doutrinas, é que variaram, é que foram eventuais. Creio que o Sr. Dr. Egas Moniz está hoje na oposição. Creio que o Sr. Dr. Júlio Dantas está hoje numa posição política a que podemos chamar de neutralidade colaborante, e que o Sr. Cunha Leal com aquele espírito combativo que todos conhecemos, está em duas oposições: à situação e ao MUD. Eu estou sempre na minha linha e espero morrer dentro dela.

Tenho dito.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: depois de uma palavra do agradecimento ao Sr. Deputado Botelho Moniz pelas simpáticas palavras que quis ter a amabilidade do dizer a meu respeito, quero prestar este esclarecimento: quando disse que partidos são organizações permanentes não quis significar que eram organizações eternas e insusceptíveis de se modificarem, quer na sua composição, quer na sua ideologia. Quis apenas significar, quando empreguei a palavra "permanentes", que eram apenas o contrário de agrupamentos eventuais; quis significar apenas isto, e nisto está contido o seguinte: é que é da essência do partido o estar permanentemente "por" ou permanentemente "contra"; permanentemente "por", em defesa deste mesmo o da sua situação se está no Poder; permanentemente "contra", o partido que está no Poder, quando ele mesmo não está no Poder.

Esclareço melhor: a oposição do partido não é uma, porque a medida é uma oposição sistemática a outro partido, porque, por definição, cada partido tem a concepção de que ele é o único o legítimo representante do interesse nacional. Portanto, quando outro está no Poder, seja qual fôr a medida que dele venha, é preciso contrariar a medida, só porque é preciso evitar que o autor da medida na emergência continue no Poder.

De sorte que fica assim a cousa - suponho - perfeitamente esclarecida: quando afirmei que os partidos são organizações permanentes quis apenas significar que eram o contrário de organizações eventuais; quis significar que a organização eventual ou o agrupamento eventual se podiam constituir a propósito de certas medidas.

O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª dá-me licença?... Afinal verifico que estamos ambos de acordo, e nisso tenho muito prazer. .

O Orador: - Eu já tinha verificado isso.

O Sr. Botelho Moniz: - Eu sabia-o de antemão, e podemos assim fazer esta afirmação, que não sei se será muito própria de direito constitucional: partidos, às vezes, têm uma maior permanência, outras têm menor permanência, conforme os casos.

Julgo que a definição exacta seria esta: nesta grande casa nacional a que todos pertencemos os partidos, afinal, são uns "quartos do pouca permanência"...

O Orador: - Está esclarecido, portanto, o meu pensamento; mas, se porventura quiserem a exactidão da fórmula, pode dizer-se que é da essência dos partidos serem organizações de carácter permanente, em vez de grupos que têm carácter eventual, e que se constituem relativamente a determinadas medidas, que só aceitam ou não.

Posto isto, vou discutir a proposta de alteração apresentada pelo Sr. Deputado Botelho Moniz.

Antes quero preguntar a S. Ex.ª, mas com a maior simplicidade, e apenas para me inteirar, se S. Ex.ª terá exposto aqui o seu pensamento profundo.

O Sr. Botelho Moniz: - Eu às vezes não sei escrever, mas ...

O Orador: - Em literatura está perfeito.

V. Ex.ª, segundo esta proposta, não admite a apresentação de propostas durante a discussão na especialidade.

É isto o que V. Ex.ª quere?

O Sr. Botelho Moniz: - Perdão! Então talvez eu tivesse redigido mal.

O Orador: - Se é assim, é a demonstração de que tenho razão quando pretendo que as propostas sejam subscritas por cinco Deputados.

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Segundo a proposta de V. Ex.ª, demonstra-se que não só podem apresentar propostas de alteração durante n discussão na especialidade.

Era isto o que V. Ex.ª pretendia?

O Sr. Botelho Moniz: - Não, evidentemente.

O Orador: - É então a primeira prova que deduzo no sentido de que V. Ex.ª não tem razão quando pretende que as propostas na especialidade possam ser subscritas apenas por um Sr. Deputado.

O Sr. Botelho Moniz: - Eu segui mais ou menos o texto que V. Ex.ªs subscreveram e limitei-me a suprimir a frase "serem assinadas, pelo menos, por cinco Deputados".

O Orador: - V. Ex.ª está equivocado.

O Sr. Botelho Moniz: - Eu creio que me expliquei bem; o que talvez não tivesse foi escrito bem.

O Orador: - É que realmente a proposta de V. Ex.ª veio fornecer-me um argumento enorme em defesa do meu critério.

O Sr. Botelho Moniz: - Mas eu não digo que não possam ser apresentadas propostas na discussão da especialidade.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu posso provar a V. Ex.ª o contrário com o que está escrito na sua proposta.

O Sr. Botelho Moniz: - Tem V. Ex.ª razão; basta cortar, aí, a palavra "sómente".

O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu não precisava de outra demonstração; mas vou dizer as outras razões em que pode fundar-se a exigência de cinco Deputados para serem apresentadas propostas de alteração na especialidade, e não só pode prescindir delas. A Comissão pensou nisso, mas reconheceu que isso às vezes podia perturbar e adiar muito a discussão.

A Comissão do Regimento, ao considerar a disposição em discussão, pensou nisto: não devem admitir-se propostas de alteração na discussão na especialidade ou, de um modo geral, propostas do alteração relativamente às quais não houvesse um prazo para serem consideradas, a fim de se não ser surpreendido pelo movimento vivo de uma proposta de alteração com qualquer cousa que deslumbro e que às vezes é um êrro grave que atinge a economia do projecto ou proposta de lei que se está a discutir. Eu sei que V. Ex.ªs me dão a honra de acreditar no que eu digo; mas posso chamar, em socorro daquilo que estou a dizer, o depoimento dos membros da Comissão de Redacção. V. Ex.ªs não fazem idea do que é estar a redigir um texto relativamente ao qual foram apresentadas propostas de alteração a alguns artigos e não o foram a outros quando, aprovados os primeiros, se era levado à alteração dos segundos.

E nós temos uma espécie de contradição interna dentro do próprio diploma, precisamente porque a nossa função é redigir e não criar a matéria da redacção quo foi votada. Vemo nos embaraçadíssimos, assegurando eu a V. Ex.ª que uma ou outra vez temos redigido disposições cujas soluções, em princípio, são opostas no mesmo diploma legislativo.

Isto não envolve nenhuma redução na competência do Deputado. O Deputado pode apresentar todas as propostas de alteração que entender até final da discussão na generalidade só com uma assinatura e a tempo de serem analisadas para depois serem discutidas. Contudo, não devo poder apresentar propostas de alteração completamente à sua vontade, pois assim seríamos conduzidos à situação que acabei de pôr diante dos olhos de V. Ex.ªs

O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª acaba do fazer a demonstração precisamente contrária. Eu apresentei uma proposta assinada por cinco Srs. Deputados, e ela afinal de contas não estava bem redigida. É que muitas cabeças não se entendem.

Se fosse sozinho, talvez não tivesse posto o "somente" a mais.

O Orador: - Tem razão. O argumento que eu produzi inicialmente não tem valor nenhum, porque não tinha reparado que a proposta estava assinada por cinco Srs. Deputados.

O Sr. Botelho Moniz: - Agora diz que não tem valor, mas a princípio tinha valor. Assim não vale ...

O Orador: - Agora imaginem V. Ex.ªs o que se passaria mesmo com os cinco Deputados.

Nesta ordem de ideas, não seriam de admitir propostas de alteração na discussão na especialidade.

É que todas as considerações conduzem a isto, o que é inadmissível, pois podemos nesse momento ser surpreendidos por quaisquer ideas melhores do que aquelas que estão exaradas em quaisquer das propostas existentes e mesmo que se verifique que há um erro no texto ou nas propostas existentes.

As minhas considerações conduziam a que não se pudessem apresentar propostas ou, se se apresentassem, que o fossem numa sessão ulterior.

Mas V. Ex.ªs reconhecerão que sempre pode haver necessidade de corrigir qualquer proposta que só então se reconheceu estar menos bem.

Foi por isso que se foi para a solução que está contida na proposta do alteração da vossa Comissão do Regimento.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª, Sr. Deputado Botelho Moniz, quere emendar a sua proposta?

O Sr. Botelho Moniz: - Eu até mesmo a retirarei, se os meus colegas estiverem de acordo. Só o que tenho "atravessado" é a questão dos cinco Deputados...

O Sr. Mário de Figueiredo: - É só para V. Ex.ª, Sr. Presidente, fixar jurisprudência. Eu não sei agora, ao certo, qual tem sido a jurisprudência desta Assemblea, e por isso desejava que V. Ex.ª a fixasse. Retirar uma proposta apresentada não sei se pode ser feito sem autorização da Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª razão. A praxe é consultar a Assemblea.

O Sr. Mário de Figueiredo: - O facto é este: é que eu posso não ter apresentado outra proposta exactamente porque sei que está outra na Mesa.

O Sr. Presidente: - Consulto a Assemblea sobre se autoriza o Sr. Deputado Botelho Moniz a retirar a sua proposta.

Consultada a Assemblea, foi concedida autorização.

O Sr. Presidente: - Vou pôr, portanto, à votação o artigo 38.° e seus parágrafos.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 38.º

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8 DE DEZEMBRO DE 1945

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 39.° e seus parágrafos.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 39.°

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 42.° e seus parágrafos.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 42.º

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 43.°

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 43.º

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 44.°

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar se, visto ninguém pedir a palavra.

Consultada a Assemblea, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 45.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se, visto ninguém pedir a palavra.

Consultada a Assemblea, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 47.°

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se.

Consultada a Assemblea, foi aprovado.

Está em discussão o artigo 49.°

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se.

Consultada a Assembleia, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está concluída a discussão e votação do projecto do modificação do Regimento apresentado à Câmara pela Comissão constituída na sessão de 29 do mês findo.

Sabem V. Ex.ªs que os Srs. Deputados Botelho Moniz e Mário do Figueiredo pretenderam apresentar durante a discussão do projecto propostas de alteração a disposições do Regimento que não tinham sido tocadas no projecto da Comissão e eu entendi que as não devia inserir na ordem do dia por desde o início esta ter sido indicada como constituída sómente pelo projecto apresentado pela Comissão. Mas tais propostas, uma vez apresentadas na devida oportunidade regimental, seriam dadas para ordem do dia logo que o pudessem ser.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença? Há ainda uma proposta dessas que falta apresentar. Digo desde já o conteúdo dela. É uma alteração ao artigo 48.º do Regimento.

É sobre a última parte, "não serão admitidas declarações de voto", que a Comissão do Regimento tenciona apresentar a seguinte proposta:

Artigo 52.° (antes 48.°) Não podem eximir-se a votar os Deputados presentes à sessão. Só serão admissíveis declarações de voto quando a votação fôr nominal, e neste caso serão feitas por escrito e dirigidas à Mesa, que as fará inserir no Diário das Sessões.

Pretende-se que sejam admitidas declarações de voto exclusivamente nas votações nominais e que essas declarações de voto sejam feitas por escrito na Mesa; não têm influência nenhuma sobre o voto; manifestam simplesmente uma opinião e ficam a constar do Diário das Sessões para que só saibam quais as razões que determinaram o Deputado a votar num sentido ou noutro.

O Sr. Presidente: - A Câmara conhece já as propostas do Sr. Deputado Mário do Figueiredo. A do Sr. Deputado Botelho Moniz é a seguinte:

Artigo 14.º Aos Deputados será fornecido um bilhete do identidade do qual constarão as suas imunidades. - Ricardo Malhou Durão - Jorge Botelho Moniz - José Esquível - António Cortês Lobão - Ribeiro Casais - Manuel Colares Pereira.

A outra proposta da Comissão do Regimento é a seguinte :

1) Aditamento a alínea d) do artigo 22.°:

... ou de esclarecimentos prestados espontaneamente pelo Governo sobre matérias tratadas antes da ordem do dia;

2) Aditamento ao § 1.º do artigo 24.°:

... ou dar ensejo a que se elabore alguma proposta de alteração sobre a matéria em discussão.

3) Disposição final:

O Presidente mandará publicar em volume o Regimento, que será facultado aos Deputados.

O Sr. Presidente: - Como V. Ex.ªs vêem, trata-se de propostas de grande simplicidade. Poderemos, portanto, inseri-las na ordem do dia da próxima sessão, tanto mais que a Comissão da Reforma do Regimento, pelo estudo que deste fez, está habilitada a esclarecer o debate que se abrir.

A próxima sessão será na terça-feira, 11, não havendo sessão amanhã nem na segunda-feira, porque a Comissão de Finanças tem necessidade do tempo livre para estudar a proposta do lei e respectivo parecer da Câmara Corporativa relativos a autorização de receitas e despesas para o ano do 1946. Aquela Comissão conta estar apta a acompanhar a discussão no referido dia 11, segundo me informaram os seus membros presentes.

A próxima sessão será, repito, na terça feira, tendo como ordem do dia, além da apreciação das propostas de alteração ao Regimento já anunciadas, a discussão, na generalidade, da lei de autorização das receitas e despesas.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e l5 minutos.

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Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Ernesto Amaro Lopes Subtil.
João de Eepregueira da Bocha Paris.
José dos Santos Bessa.
Luiz da Câmara Pinto Coelho.
Luiz Mendes de Matos.
Manuel Colares Pereira.
Manuel de Magalhãis Pessoa.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Paulo Cancela de Abreu.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhãis.
Alberto Cruz.
António Maria Pinheiro Torres.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Camilo de Moraie Bernardes Pereira.
Diogo Pacheco de Amorim.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gabriel Maurício Teixeira.
Gaspar Inácio Ferreira.
João Antunes Guimarãis.
João Carlos de Sá Alves.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Maria Braga da Cruz.
José Maria de Sacadura Botte.
José Nosolini Pinto Osório da -Silva Leão.
José Pereira dos Santos Cabral.
Luiz Lopes Vieira de Castro.
Luiz Maria da Silva Lima Faleiro.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Querubim do Vale Guimarãis.
Teotónio Machado Pires.

O REDACTOR — Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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