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REPUBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 95
ANO DE 1947 3 DE MARÇO
IV LEGISLATURA
SESSÃO N.° 95 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 1 DE MARÇO
Presidente: Ex.mo Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Ex.mos Srs. Manuel José Ribeiro
Manuel Marques Teixeira
SUMARIO:- O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 50 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Froilano de Melo, que se referiu ao tricentenário do nascimento do beato português João de Brito; Nunes Mexia, que chamou a atenção para a necessidade de serem tomadas medidas que garantam uma eficiente defesa da propriedade; Cancela de Abreu, que, a propósito do coiso prévio que apresentam há dias, se referiu a um folheto anónimo distribuído entre os Srs. Deputados, e Carlos Borges, que se congratulou com as providenciais decretadas pelo Governo em defesa dos campos inundados do Ribatejo.
Ordem do dia. - Prosseguiu o debate na generalidade sobre o aviso prévio acerca da política monetária, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Águedo de Oliveira e Araújo Correia, e foi lida na Mesa uma moção do Sr. Deputado Botelho Moniz sobre o assunto em debate.
O Sr. Presidente encerrou a reunião às 18 horas e l5 minutos.
O Sr. Presidente:- Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 35 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Álvaro Eugénio Neves da Fontoura.
André Francisco Navarro.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria do Couto Zagalo Júnior.
António de Sousa Madeira Pinto.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Augusto Figueiroa Rego.
Carlos de Azevedo Mendes.
Diogo Pacheco de Amorim.
Ernesto Amaro Lopes Subtil.
Eurico Pires de Morais Carrapatoso.
Fernão Couceiro da Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique Carlos Malta Galvão.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Indalêncio Froilano de Melo.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Garcia Nunes Mexia.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Alçada Guimarães.
José Dias de Araújo Correia.
José Esquivei.
José Gualberto de Sá Carneiro.
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José Luís da Silva Dias.
José Maria Braga da Cruz.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
José Penalva Franco Frazão.
José Pereira dos Santos Cabral.
José Soares da Fonseca.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Luís António de Carvalho Viegas.
Luís da Cunha Gonçalves.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Mendes de Matos.
Luís Teotónio Pereira.
Manuel de Abranches Martins.
Manuel Beja Corte-Real.
Manuel Colares Pereira.
Manuel da Cunha e Costa Marques Mano.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Marques Teixeira.
D. Maria Luísa de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Malhou Durão.
Rui de Andrade.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Teotónio Machado Pires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
O Sr. Presidente: -Estão presentes 65 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 50 minutos.
Antes da ordem do dia
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Oficio
Da Câmara Municipal de Braga, em que comunica ter o conselho municipal, em sua sessão de 14 de Fevereiro, resolvido apoiar o aviso prévio do Sr. Deputado Rocha Paris na defesa dos interesses dos municípios.
Petição
De António José Alves da Cunha, da freguesia de S. João da Ribeira, concelho de Ponte de Lima, em que reclama providências contra a falta de géneros de consumo no distrito de Viana do Castelo e a carestia daqueles que aparecem à venda.
Representação
Da direcção da Associação Comercial de Lisboa (Câmara do Comércio), em que, a propósito do projecto de lei do Sr. Deputado Sá Carneiro sobre o inquilinato, formula as seguintes conclusões:
1.ª Do projecto de lei devem ser banidas todas as disposições que ameaçam ou na sua execução podem ameaçar a estabilidade comercial das firmas nos seus estabelecimentos e salvaguardadas as regalias do comércio na continuidade dos seus arrendamentos e introduzidas disposições que as garantam;
2.ª Devem ser exceptuados do disposto no artigo 3.° do projecto de lei os arrendamentos de prédios ou parte de prédios para estabelecimentos comerciais, mantendo-se a sua continuidade ao termo do usufruto ou da administração, salvo demonstração de que no contrato vigente existo abuso ou fraude contra o legítimo direito do proprietário. Somente se permitiria, sem prejuízo da continuidade do contrato, uma elevação de renda em coeficiente sobre o valor dela, tendo-se em consideração exclusivamente o local e não o património comercial da firma arrendatária;
3.ª Deve ser rejeitado todo o disposto do artigo 4.° do projecto do lei, substituindo-se por disposição em que claramente se declare a comunicabilidade do arrendamento ao cônjuge do arrendatário e a sua transmissão aos filhos maiores e menores, e revogando-se o disposto no artigo 1.°, § 1.°, n.° 3.°, da lei n.° 1:662, de 4 de Setembro de 1924;
4.ª A elevação da renda tendo como limite-base o duodécimo do rendimento colectável ilíquido do prédio, permitida no artigo 5.° do projecto de lei e agravada pela autorização dada ao senhorio no artigo 7.° de reclamar ainda renda superior àquele, é injustificável, visto que tal gravame pode levar inadmissivelmente à exigência de rendas incomportáveis;
5.ª Todo o sistema processual adoptado no projecto do lei, do qual faz parte a constituição do fundo estabelecido na segunda parte do § 5.° do artigo 5.°, que nos parece inexequível, deve ser revisto, por confuso e ineficiente, gerador de conflitos e pleitos, sem garantias para arrendatários nem senhorios, devendo notar-se que a multa torna praticamente proibitivo o recurso a juízo;
6.ª Em matéria de traspasse devem ser introduzidas no projecto de lei disposições estabelecendo que o senhorio não pode requerer a avaliação fazendo intervir nesta a seu favor a valorização comercial do estabelecimento, porque tal faculdade não é mais do que um processo de promover o aumento das rondas e, por consequência, de provocar despejos.
Deve ser restabelecido o regime de liberdade contratual do traspasse, consignado nos artigos 33.°, § 4.°, do decreto de 12 de Novembro de 1910 e 55.° do decreto n.º 5:411.
A avaliação para o efeito da fixação de renda somente deve ser permitida em casos litigados em juízo, nunca devendo ser tomada como factor ou base para a elevação da renda;
7.ª O direito de opção concedido a favor dos senhorios dos prédios no artigo 9.° da lei n.° 1:662, de 4 de Setembro de 1924, deve ser regulado em nova disposição a introduzir no projecto de lei, na qual, mantendo-se o mesmo direito, se declare que a opção se exerce unicamente sobre a totalidade da operação do traspasse;
8.ª Deve, em disposição especial do projecto de lei, ser declarado que a taxa de 5 por cento de imposto do selo nos contratos de traspasse incide somente sobre o valor do local do estabelecimento, e não sobre o da propriedade deste, isto é, do património comercial das firmas.
O Sr. Presidente: - Informo a Assembleia de que está na Mesa o parecer da Câmara Corporativa sobre o projecto de lei de inquilinato do Sr. Deputado Sá Carneiro. Esse parecer já foi distribuído pêlos Srs. Deputados e chamo para ele a atenção das Comissões de Legislação e de Economia, às quais vai baixar imediatamente e que desde já ficam convocadas para esse efeito.
Tem a palavra, antes da ordem do dia, o Sr. Deputado Froilano de Melo.
O Sr. Froilano de Melo: -Sr. Presidente, Srs. Deputados : passa hoje o tricentenário do nascimento do santo português João de Brito e o meu espírito, errando dos areais de Maduro, que o seu sangue de mártir santificou, às planuras de Goa, onde, em sarcófago de ouro e de fé, dorme o grande S. Francisco Xavier, foi, em piedosa romagem aos Jerónimos de Belém, pedir à imagem do santo uma mensagem que nestes tempos revoltos servisse de lema à sua terra e a sua grei.
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Levava no meu manto de peregrino o delicado cântico de João do Ameal e no mesmo manto levava também a lírica em prosa que Maria Osswald, a dona portuguesa, entoou no altar do imolado. E nos meus ouvidos ressoavam as homílias do jovem Luís Moreira, que na curta trajectória da sua vida soube fazer vibrar em peitos de portugueses a devoção e o amor por esse grande arauto da expansão universalista da alma nacional, que a luz da igreja católica vai elevar à santidade dos altares. Porque a cultura cristã abrange mundos de sonho e de ideal, que transcendem os limites das fronteiras nacionais. E quando um povo, pêlos feitos dos seus heróis, inscreve no fito dos seus objectivos o ideal de aspirações tão super-humanas relega a um canto obscuro as suas realizações terrenas para viver na eternidade das gerações dos povos que teve a glória de contactar, de amar e de iluminar.
E na contemplação da estátua desse pagem macerado, que trocou as delícias da Corte pela auréola de martírio que o exalta para a eternidade, a mensagem de João de Brito jorrou luminosa na minha alma de pecador.
Sr. Presidente: João de Brito é a criação genuína da alma indómita do povo português, que em avatares variados cintila de quando em quando, em refulgências que fazem o espanto do Mundo. É a alma da Pátria que, em permanente ebulição criadora, com fulgores que lhe são próprios, com métodos que são exclusivamente seus, ressurge vezes sem conta no curso da história! Guarnece-a de quinas Afonso Henriques, tece-a de flores Santa Isabel, unge-a de bênçãos o Santo Condestável e arroja-a para o largo ignoto e insondado o Infante de Sagres. E, levada nas asas da fama, ela é a alma aventureira das conquistas e descobertas e ela é a alma amorável e sonhadora da cristianização do Mundo.
Portugueses de aquém e de além-mar que me ouvis, essa cristianização, que foi o fito máximo a que se devotaram, pela qual morreram os vossos avós em mares ignotos, em plagas inóspitas de um mundo até aí ignorado, quer dizer a irmanação, a fraternidade das almas humanas: é este o primeiro cântico da mensagem de João de Brito aos filhos da sua terra.
A grandeza de Portugal reside na universalidade da sua expansão espiritual. Quem não quiser seguir essa trajectória que lhe marcou a estrutura da sua alma rasga a história do seu País e viola e criminosamente trai a consciência da sua Nação!
Ao meu espírito de indiano que está impregnado da prece dos seus ascetas, que murmuram: «Senhor, dai-me, como dádiva suprema, aquela parcela de riqueza que desdenha todas as riquezas do Mundo», não me deslumbram os feitos dos guerreiros que avassalam os mundos; seduzem-me, porém, as epopeias de amor que conquistam os corações dos povos.
Fui encontrá-las nas ruínas de Baçaim; fui encontrá-las no esplendor espiritual do Padroado, de que materialmente nos não restam hoje mais do que uns pobres farrapos esparsos; fui encontrá-las nesse jardim encantado que é a ilha de Ceilão, onde a obra do missionarismo português foi continuada por um conterrâneo meu, o beato padre José Vaz, que as cristandades de Goa anseiam por ver elevado à santidade do altar.
E ireis vê-las no Extremo-Oriente - Malaca, Singapura, ilhas da Oceania, terras da China, costas do Japão - resistindo aos vaivéns do destino, numa floração fecunda de amor e de fé, porque em terras do Oriente, onde os arautos das quinas foram encontrar povos estabilizados na grandeza de civilizações por vezes de requintada opulência, a imagem de Portugal não imprimiu às terras descobertas nem a riqueza da língua nem o esplendor do seu fausto externo, mas muito particularmente a pureza da espiritualidade da doutrina dos seus missionários.
É necessário que o povo de Portugal saiba compreender esta faceta psicológica da alma oriental: em terras do Oriente que foram nossas, em terras do Oriente que ainda hoje nossas são, o traço princeps que as liga a Portugal nem sempre é Luís de Camões, é porém uma mutação diversa da alma portuguesa, é S. Francisco Xavier!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: -Vi milhares de hindus, desde o ária alourado do Kashmir às tribos drávidas do Sul, ciosos das suas crenças, acotovelando-se na peregrinação sagrada aos tanques de Hardwar; vi as correntes de romeiros que, de sandálias nos pés e o corpo adornado de pinturas sacras, vão mergulhar as cinzas dos seus mortos no Ganges, que banha a cidade de Benares. E vi a vaga de piedade que na velha cidade de Goa reúne a infinita mole dos seres humanos à volta do corpo mirrado de S. Francisco, que as minhas funções oficiais me obrigavam a ser um dos primeiros a contemplar na paz serena do seu sarcófago venerado.
E -oh milagre de amor e de fé, soberana, dominadora, universal!- foi somente à roda desse túmulo que eu vi hindus, cristãos, parses e mouros, homens de todas as crenças, sectários de todas as religiões, irmanados no mesmo sentimento de convicção da sua insignificância, implorando em soluços em volta desse corpo mirrado uma graça para as suas almas tocadas pela dor e prestes a sucumbir ao peso do infortúnio!
Nearest to the great when we are great in humility, disse-o Tagore! Este milagre de fraternidade universal, do nivelamento de grandes e pequenos perante a grandeza do Infinito, foi o Portugal missionário quem o soube realizar em terras do Oriente!
S. Francisco Xavier é o símbolo desta primeira fase da evangelização lusitana. Tinha algo de insólito, como insólitas eram as durindanas dos guerreiros lusos. A sua doutrina continha transcendências luminosas de uma fé monoteísta que se foi espalhando pelas vastas costas do Oriente como a chama que ateia o incêndio nas searas secas.
Mas a gloriosa ascensão do nosso poder temporal ia declinando! O cativeiro filipino ia-nos despojando da maior parte das nossas conquistas de além-mar. E a palavra santa dos evangelizadores já não tinha a escorá-la o brilho da espada, que tanta vez lhe serviu de esteio.
Foi nessa quadra da história portuguesa que a alma, de Portugal concebeu uma nova fase de expansão, procurando elevar-se pêlos confins do Imaterial e estender a influência espiritual de Portugal a cumes não sonhados pela conquista da Espada.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - É a esta segunda fase de evangelização que pertence o Santo João de Brito.
Findou o século das descobertas; está velada com unia névoa de infortúnio a fase luminosa das conquistas heróicas. Mas a alma de Portugal não pode confinar-se às barreiras do Atlântico e o novo avatar da sua expansão é esse anseio de missionarismo para levar a mensagem da fraternidade em Cristo às terras de além-mar.
Na índia, na China, nas Celebes, nas Molucas, os missionários portugueses, abraçando as directrizes do padre Nobile, adaptando-se inteligentemente aos hábitos da terra, envergando trajes locais, usando a indumentária do respectivo país, construindo templos cristãos em estilo local, eliminando por completo qualquer traço de aparência externa que os possa diferenciar das populações nativas, com cujos ascetas e sanyassis procuram irmanar-se para melhormente apelar à alma dos povos,
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os missionários portugueses, dizia, realizam o milagre dessa perfeita irmandade de sentimentos que leva os crentes que frequentam a casa portuguesa a considerá-la casa sua, numa afinidade espiritual que ainda hoje admiramos nas missões que são nossas, nas missões que foram nossas, e que nenhum povo conseguiu realizar em tão alto grau.
O hábito de monge hindu que reveste o corpo do Santo João de Brito não é mais que o travesti externo de uma vida de asceta, humilde e sóbrio e puro como os sanyassis da índia, no anseio de penetrar melhor a alma das massas e de tornar mais perdurável a infiltração da aluía de Portugal nas almas dos povos que lhe foi dado catequizar.
Nestes tempos revoltos de barreiras étnicas e de antagonismo das raças, que produziram a mais hedionda das guerras que nos foi dado presenciar, é esta a segunda página da mensagem que João de Brito lega à grei portuguesa.
Eu não choro o martírio de João de Brito, porque, filho de um país em que se ensina que a privação e o sacrifício são as armas purificadoras que nos conduzirão ao seio do Imortal, sei que esse sacrifício se transmutou para o mártir e para o seu povo em fonte de perpétua alegria. O sangue dos mártires é como o sândalo, que perfuma o machado que o corta, e o sangue de João de Brito foi desde logo a luz de Saulo iluminando a própria alma dos seus verdugos.
Pertenço a um povo que encara a morte como uma página de vida. Mas quando essa morte é voluntária, ao serviço de um ideal, de ânimo alegre e compassivo, a bendizer o sofrimento e a desafiar os espasmos de agonia que torturam o corpo, curvo-me reverente, como me curvaria perante a imolação voluntária do tantos iluminados que, cheios de fé, repousam no Além, enquanto os crentes na terra cantam nos lares que as suas almas abandonaram: o seu espirito foi para a casa de Deus e Deus entrou no nosso lar.
Que o espírito de João do Brito ilumine com a luz de Deus a terra portuguesa.
Glória a Portugal missionário!
Glória ao Santo João de Brito!
Tenho dito.
Vozes:- Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Nunes Mexia: - Sr. Presidente: associando-me ao que nesta Assembleia foi já exposto, direi algumas palavras apenas, que serão antes de tudo de homenagem aqueles patrões e trabalhadores que na terra portuguesa, ao longo dos seus rios caudalosos, e sobretudo nas regiões inundadas, arriscam anualmente os seus haveres o por vezes a própria vida, numa faina que nem sempre é devidamente compreendida.
Acham-se os campos submetidos a um rigoroso inverno, que acarretou a perda de inúmeras culturas e provocará transtornos dos mais sérios na maioria das casas agrícolas.
Tomou o País conhecimento das prontas diligências efectuadas por membros do Governo e para eles apela no sentido de se prosseguir ininterrupta e metodicamente na obra de defesa e de segurança da propriedade, do trabalho rural e da produção agrícola.
Importa estudar um conjunto de medidas, que para melhor apreciação dividirei em três capítulos:
1.° Defesa e segurança da propriedade:
Urge, à semelhança do que se está fazendo em relação à lezíria de Vila Franca, possibilitar ao máximo a criação de associações do proprietários o lavradores exercendo a actividade agrícola em prédios confinantes com linhas de água de diversas categorias.
O Estado, sempre que o interesso geral, directa ou indirectamente, o justifique, deverá comparticipar técnica e financeiramente nestes empreendimentos, muito embora procure deixar à iniciativa particular a efectivação dos trabalhos.
Importa prosseguir na execução de obras que melhorem as condições de segurança das propriedades existentes nas regiões, periodicamente ameaçadas pela cheia, como sejam valados de protecção, estradas de acesso o de descongestionamento, viadutos, etc.
Estão neste caso as seguintes obras, que considero de inadiável urgência:
a) Alteamento do troço da estrada na extremidade da Lezíria Grande de ligação à ponte sobre o Sorraia, por ser essa a única via por onde se poderão salvar os milhares de cabeças de gado que normalmente se encontram na Lezíria, no valor de muitas dezenas de milhares de contos.
6) Reparação e empedramento, em regime de comparticipação por parte do Estado, Câmara Municipal e dos particulares, da estrada que no sentido longitudinal condicionava, noutros tempos, não só a segurança das pessoas e dos gados, como também a drenagem dos produtos da parte da Lezíria Grande a norte da estrada do Cabo, e construção, para idênticos fins, do troço correspondente a sul da referida estrada.
2.° Defesa e segurança do trabalho rural:
Dada a periodicidade previsível das cheias, importa não só dispor de estudos e de entendimentos prévios que permitam abrir nessas regiões trabalhos de interesse geral, como inclusivamente estudar a possível transferência de trabalhadores rurais das regiões inundadas para outras não muito distantes, organizando-se, se necessário, um mecanismo de compensação de salários.
Finalmente, há que melhorar o dispositivo de segurança do pessoal agrícola nessas regiões, criando os necessários postos de socorro e dotando-os de embarcações de pequeno calado e outro material adequado.
3.° Defesa e segurança da produção:
Há que conjugar sem perda de tempo a acção do Estado e a dos particulares no sentido de atenuar ao máximo a quebra de produção, que se antevê como apreciável se prontas soluções não forem adoptadas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Assim urge preparar: sementes de trigos das variedades serôdias; adubos azotados e assistência técnica na respectiva aplicação; uma campanha convenientemente orientada no sentido da intensificação das culturas de primavera; uma criteriosa política de salários, acudindo no momento presente e de uma maneira eficiente aos trabalhadores das regiões inundadas e evitando os exageros de salários resultantes da posterior acumulação de serviços, e, finalmente, uma política de preços e sua fixação oportuna, que, sem esquecer o consumidor, confira todavia aos produtos nacionais valores que não sejam inferiores àqueles por que se estão comprando idênticos artigos no estrangeiro.
Vozes: - Muito bem !
O Orador:- Acudindo, segundo as diversas directrizes apontadas, ter-se-á feito o possível para diminuir os estragos e sobretudo para rodear de alguma segurança
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a actividade agrícola, expressa no nível de produção, na vida e nos haveres dos que em tais regiões labutam.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu:- Sr. Presidente: apenas algumas palavras.
Recebi e sei que foi enviado a alguns ilustres Deputados um documento individual intitulado Desafronta, originado no aviso prévio que há dias realizei sobre as reformas da justiça. Lamento, lamento sinceramente, que os termos em que este documento está redigido me impossibilitem de apreciá-lo.
Só o respeito que devo à Assembleia e a mim próprio e a conveniência de evitar especulações me forçaram a ocupar-me do assunto. E tão-sòmente para prestar um esclarecimento e fazer uma afirmação.
O documento em referência, ao criticar os números estatísticos que indiquei, conclui com esta apreciação: «O resto é pelo menos fantasia». E isto poderia levar a supor que iludi a Assembleia. Ora, devo declarar que os números de que me utilizei são oficiais, respeitam, como disse, a sete meses; foram solicitados por mim ao Sr. Ministro da Justiça em 31 de Julho de 1946, e recebi-os por intermédio da Mesa, como consta do Diário das Sessões n.° 58, p. 4.
Mantenho pela magistratura portuguesa e reafirmo o inalterável respeito que, explícita e implicitamente, resulta do texto exacto e completo de cada passo do meu discurso e do pensamento que o inspirou; e não há funcionário de justiça que o mereça a quem eu o recuse, seja qual for a sua categoria.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:- Filho de um homem cujo nome ficou gravado em bronze nos anais da magistratura, eu não devia pensar nem proceder de outro modo.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, também magistrado digno e ilustre, e a Assembleia dir-me-ão só no meu discurso traí este pensamento.
Vozes:- Não! Não senhor!
O Orador:- E mais não digo, porque mais não quero dizer, na fundada esperança ti e não ter de voltar ao assunto.
Vozes:- Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente:- O Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu invoca o meu testemunho sobre se, no discurso que proferiu no aviso prévio sobre as reformas da justiça, houve quebra de respeito, que sempre professou e a que a sua própria tradição de família o obriga, pela magistratura judicial e pêlos seus membros.
Esta Assembleia nunca se esqueceu, em nenhum momento, do respeito que deve à independência e ao prestigio do Poder Judicial; e até mesmo nas questões ventiladas nesta Câmara sob o seu aspecto político, e que, porventura, pendessem dos tribunais, tem havido todo o cuidado em não tocar por forma alguma o prestígio da função de julgar e dos magistrados que a exercem.
O Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu não carece do meu testemunho sobre a sua correcção parlamentar, mas, uma vez que o pediu, direi que no discurso em referência não se afastou dessa norma de proceder da Assembleia, nem eu, se ele o tivesse feito, deixaria o facto sem reparo.
Vozes:- Muito bem, muito bem!
O Sr. Carlos Borges:- Sr. Presidente: eu sei que ó muito precioso o tempo desta Assembleia, e, assim, não o desperdiçarei com palavras inúteis.
Antes de me referir ao assunto que me determinou a pedir a palavra, quero significar ao Sr. Deputado Cancela de Abreu a minha estreita solidariedade de advogado que há quarenta e cinco anos exerce a sua profissão nos tribunais do País, que conhece o Sr. Cancela de Abreu e tem o maior respeito e veneração pelo nome de que ele é portador: o de um dos maiores magistrados que honram a magistratura portuguesa.
O Sr. Deputado Cancela de Abreu não precisa da minha solidariedade, mas é-me particularmente grato, sendo, seguramente, o advogado mais velho que tem assento nesta Câmara, afirmar-lhe a minha muita consideração e o meu apoio moral.
E agora, que cumpri aquilo que tenho por uma súbita imposição da consciência, desejo chamar a atenção da Assembleia Nacional para o facto de o Governo ter atendido na justa medida as palavras do nosso ilustre colega Sr. Dr. Artur Proença Duarte, porque as minhas são tão débeis (não apoiados) que seguramente não têm eco nas salas e gabinetes do Terreiro do Paço.
Mas as palavras do Sr. Deputado Proença Duarte foram escutadas pelo Governo, e, decerto pela sua intervenção, notamos com prazer, e eu noto com louvor, que o Sr. Ministro do Interior mandou distribuir um subsídio para acudir às necessidades dos trabalhadores rurais das zonas inundadas do Ribatejo, a fim de minorar a sua precária situação pela falta de trabalho.
E noto também, Sr. Presidente, que foi hoje publicada nos jornais uma nota oficiosa do Ministério das Obras Públicas em que se diz o seguinte:
1.° Não se verificou qualquer percalço nas obras da defesa dos serviços hidráulicos, as quais, sob vigilância constante, funcionaram sempre com absoluta normalidade. Ás avarias registadas ocorreram em obras particulares, apesar do todos os esforços do pessoal daqueles serviços no sentido de as evitar.
É certo, Sr. Presidente, que há que louvar os serviços pela dedicação com que procuraram evitar, dentro do possível, os estragos provenientes da inundação que infelizmente ainda está flagelando o Ribatejo. É de louvar e acentuar que as obras hidráulicas mais importantes resistiram ao embato dessas águas, devendo notar-se o célebre dique entre a Chamusca e a Golegã - o dique dos Vinte -, feito e refeito não sei quantas vezes, mas que só agora, depois de mandado reconstruir pelo Estado Novo, ficou em condições de não soçobrar, como tinha acontecido anteriormente.
Diz mais a nota oficiosa:
2.° Concluídos vastos trabalhos de campo e colhidos elementos indispensáveis, vai iniciar-se o estudo geral do problema do rio Tejo, por ser já oportuno fazê-lo, uma vez que as soluções a adoptar se podem agora apoiar com segurança no efeito regularizador das albufeiras dos aproveitamentos hidráulicos dos rios Ponsul (Idanha), Ocreza (Pracana) c Zêzere (Castelo de Bode), cuja capacidade total de armazenamento atinge 1:200 milhões de metros cúbicos.
3.° Entretanto, porque o estudo completo referido no número anterior será, dada a grandeza e complexidade do problema, forçosamente demorado, vai rever-se, desde já, o esquema geral das obras e vias de comunicação existentes na zona inundável e acelerar-se a realização de um conjunto de medidas tendentes a melhorar rapidamente, dentro do possível, as actuais condições de defesa da mesma zona.
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Isto, Sr. Presidente, não vem positivamente afastar todos os perigos e todos os receios, mas, neste momento, em que as chuvas podem ter consequências catastróficas se durarem muito tempo, tenho a certeza de que esta nota oficiosa vem dar alento, vem minorar muito a tristeza de grande número de lavradores das zonas inundadas, pela esperança de que as obras inadiáveis vão ser realizadas e que nos campos do Almonda, do Alviela e do Tejo vão ser enfim reparados com o cuidado devido aqueles diques e aquelas obras que são indispensáveis para conservar o que está, senão com a eficácia absoluta, pelo menos atenuando consideravelmente os perigos das inundações, que são um mal inevitável e cíclico, para não dizer de todos os anos, e às vezes mais de uma vez por ano.
Não posso deixar de registar esta atitude do Governo e de reconhecer que ele ouviu as justas reclamações que da Assembleia Nacional lhe foram dirigidas, e só faço votos para que as obras prometidas sejam executadas com a possível rapidez.
Tenho a certeza de que essas obras se hão-de realizar, porque no Estado Novo, nesta situação, não se fazem promessas vãs, e quando se fazem é com a certeza de as efectivar.
Por último apelarei para o Governo para que tome as medidas e adopte as precauções necessárias para que não faltem as sementes e o crédito aos lavradores que foram mais castigados com a cheia, que infelizmente está a causar gravíssimos danos na região ribatejana.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos pedidos ao Ministério da Educação Nacional pelo Sr. Deputado Mira Galvão.
Vão ser entregues a S. Ex.ª estes elementos.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua em discussão o aviso prévio do Sr. Deputado Bustorff da Silva sobre o problema monetário. Tem a palavra o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.
O Sr. Águedo de Oliveira: -Sr. Presidente: não vou repetir-me.
Não vou ressuscitar questões mortas, como a do acordo com a Inglaterra, a chamada sobreavaliação da moeda estrangeira, que de outro modo tornaria as exportações proibitivas.
Vou voltar-me para o futuro, porque é assim que encaro politicamente o sentido deste aviso prévio.
Parece-me impossível exceder o brilho, a veemência, o empolgante da locução do Dr. Bustorff - quer quando mostrou a crónica do escudo irrisório e envilecido, quer quando o viu restituído à grandeza nacional e ao crédito universal, pelo dedo do gigante, quer quando serviu de cabouco à obra indiscutível do Estado Novo, quer, finalmente, quando projecta no horizonte o seu perfil de reapetrechamento e bem-estar.
Desde esse momento o interesse de uma crítica e revisão retrospectiva perdeu-se para mim.
Mesmo este interesse retrospectivo estava perdido por uma simples consideração. Não basta contrapor um sistema a outro sistema, ter uma política a contrapor a outra política; carecia-se de demonstrar que se teria
feito melhor; e mais -que se colheriam, hoje e amanhã, melhores frutos. Digo até - esta Câmara, usando de reservas, embora, usando de fórmulas prudentes, discutindo cautelas, não contrapôs a uma política outra muito afastada da seguida.
Por isso, sendo difícil proclamar que se teria feito melhor e faltando a demonstração de que se poderia fazer melhor, com melhores resultados, leva-se o aviso prévio - no meu entender - a uma vista para a frente. Interessa sobretudo doravante! Portanto parece-me que não há que votar nenhum bill de indemnidade, nem louvar o que foi louvado, nem, tão-pouco criticar o que foi criticado.
Não há que fazer o exame das demais responsabilidades e das alheias.
O que interessa agora são os aspectos (prospectivos c o futuro da moeda portuguesa, e por isso louvo o Dr. Ulisses Cortês e os outros oradores que no debate e na discussão da lei de meios têm feito as suas propostas e antecipações relativamente a dias futuros.
E se eu, pois, falar ainda do que se passou no aspecto geral da política monetária e em especial da política dos preços, é porque a Câmara encontrará aí alguma noção para os tempos que se seguem. O que passou, o que depende da análise retrospectiva será tomado apenas como permissa para uma conclusão, voltada para a nossa frente.
Mas pressagiar, em matéria monetária, é tarefa inglória - «e nós o temos visto».
O meu colega Dr. Bustorff resolveu transformar em batalha campal a escaramuça travada em volta do problema da moeda quando foi da discussão da lei de meios.
Somente o seu comprovado talento, derrubador de obstáculos, e o seu não desmentido ardor combativo poderiam empenhar-se neste negócio, sempre tido por demasiadamente arriscado. O célebre padre Mariana, aos 73 anos, foi acusado do crime de lesa-ma esta de condenado, malhou com os ossos numa cadeia, só por ter discutido a moeda divisionária ou de bilhão, com quebra do profundo respeito que devia a Sua Majestade, como foi dito.
Limitara-se a afirmar que a pior das usuras era a quebra de moeda e que o Príncipe não era senhor dos bens dos súbditos, ao ponto de poder entregar por mais aquilo que valia menos.
O Dr. Bustorff não quis discutir moeda miúda e trouxe para aqui o fulgor das toneladas do rei da Frigia, que bastava tocar numa coisa para a converter no mais (precioso dos metais.
Mas abriu a porta à mais grave das controvérsias.
O Prof. Robertson, depois de profligar a verdadeira orgia de debater contemporâneos, sobre as flutuações monetárias, e mostrar que tais questões começam no vocabulário, se estendem à teoria e à prática, deformam o raciocínio e a expressão e acabam por conduzir às mais variadas políticas, vitupera essa nuvem de controvérsias que não tem fim.
E aventa mesmo que a barafunda das questões monetárias se assemelha a uma reunião de arúspices romanos, disputando e querelando sobre o significado das entranhas do ganso imolado a Júpiter.
Fui, pois, conduzido a examinar a ave sagrada, posta em cima da ara representativa, e devo desde já dizer que os meus presságios não se mostram graves, antes os auspícios parecem favoráveis à economia portuguesa. E vejo que o Dr. Pacheco de Amorim também põe de banda quaisquer presságios, embora tocando sempre o seu sinal de alarme.
Mas devo algumas palavras de admiração ao relatório do Ministro das Finanças.
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Não foi certamente sem motivo que a leitura do relatório do Ministro das Finanças se assimilou no meu espírito aos belos trabalhos do Prof. Rist - como eles, claro, objectivo, analítico, imparcial.
No último volume, sobre Mecanismos económicos elementares, onde predominam as descrições monetárias, Rist arvora o seguinte dístico: «não proponho nada, não suponho nada, exponho simplesmente».
Esta atitude cientificamente ortodoxa vivifica, por igual, o relatório. Ele ascende a esclarecimento completo, escrito desaipaixonadamemte; nem por um momento pretendeu avançar até uma apologética, contraditória de outras orientações, nem se consumiu numa defesa de ideias próprias. O relatório espõe magnificamente o que se passou.
Não teoriza, não presume, facilita e esclarece o trabalho da Câmara, a quem pertencia a palavra.
Só por apressada crítica se notará a falta de uma teoria monetária, destas que abrem caminho a discussões. Mas até essa existe - a do rendimento.
Muitos portugueses se comprazem no sonho que o poeta oriental comparou na beleza às rosas frescas desmaiando sobre uma taça de ouro.
Deixo aos portugueses que, como o Dr. Bustorff, estremecem e se revêem na imagem desvanecida dos seus filhos a visão empolgante de um Portugal maior e melhor que a geração actual transmitirá como herança sagrada. Deixo-os entregues ao seu sonho.
Mas dirijo-me à consciência dos outros portugueses.
Proponho que balancem de um lado os custos sociais da inflação dos anos que passaram, dos sacrifícios, maçadas, inquietações, aborrecimentos, e prejuízos mesmo, e do outro as vantagens que no ponto de vista de nação representam largas disponibilidades sobre todas as praças e fábricas do Mundo.
Pesem as agruras resultantes da alta dos preços, mas pesem também as possibilidades de aquisição de navios, máquinas, turbinas, engenhos, abastecimentos mesmo, que nos fornecem as actuais disponibilidades.
Tem graça e não ofende que alguns críticos da política monetária, pouco iniciados nos mistérios cambiais, relatem ter comido barato na Itália e na Bélgica e ter auferido grandes diversões em cidades francesas.
Pergunto: se estivéssemos na posição anterior à guerra - Deus me livre de invocar o quadro vizinho da reforma financeira de 1928-1931 e aqui pintado com algumas fortes pinceladas -, não seria com dificuldade, por conta-gotas e morosamente que obteríamos o apetrechamento que o País requer? Quanto custa um só paquete? Acaso os sacrifícios teriam sido vãos?
Valeu a pena?
Deixo estas dúvidas à consciência de muitos.
Se saíssemos da guerra como entrámos, havíamos de comprar material ferroviário, navios, turbinas, máquinas a crédito -ou duas ou três coisas a pronto- em condições onerosas, sem poder discutir com o fornecedor, e talvez, quando chegasse a hora de liquidar, houvesse câmbios desfavoráveis a multiplicar os encargos. Entre os custos actuais e passados e os benefícios à vista ou futuros é preciso dar um balanço como pórtico de toda esta questão. As agulhas e o quadrante da política monetária são-nos dados pela estatística. Através dela podemos tomar conta dos movimentos económicos e seguir como funciona o circuito - mercadorias, serviços, moeda, ganhos e salários.
Se queremos distribuir, regular, dar corda, dirigir, saber onde estamos - saber para onde nos encaminhamos - temos de consultar o relógio monetário pelo seu mostrador; e as agulhas e números são-nos dados pela estatística.
Já no tempo de D. Pedro V se liam por aqui números e séries. Agora - note V. Ex.ª, Sr. Presidente - quase não podemos dar um passo sem eles. Mas eu, na medida do possível, desejo poupar a Câmara a esta exibição.
Não aqui.
Que nos dizem os ponteiros da relojoaria monetária sobre o poder comprador interno da moeda portuguesa há poucos anos a esta parte?
Quanto ao exterior, já sabemos que o relógio parece que parou em todos os quadrantes o meridianos. O escudo manté-se direito nas praças do Mundo e a sua sombra toma o rumo norte, direito também.
Internamente?
Parece que Fisher tem agora aqui regimento, em vez de alguns soldados. Irving Fisher, o qual não perdeu de moda nem é quantitativista puro -pois que na sua fórmula cabem inúmeros factores e até os psicológicos- mostra como o poder comprador da moeda e o nível dos preços são funções recíprocas, ainda que esta reciprocidade não seja perfeitamente algébrica.
Se o nível geral doa preços, dado pêlos múmeros-indices, sobe, a moeda e os cheques aumentaram ou andam mais velozes. Se desce, a quantidade da moeda pura e escriturai desce ou perde velocidade.
Justificam-no, primeiramente, nada menos de 2:000 anos de experiências monetárias.
Justificam-no as várias inflações do nosso tempo . . .
A técnica dos nossos índices, enquanto não caminhar para maior homogeneidade de dados, causa-nos grandes perplexidades e pode conduzir a demonstrações indesejáveis.
Citarei só este facto fundamental: entre os preços por atacado e de retalho não há a homogeneidade precisa para um confronto, nem são as mesmas as mercadorias iniciais, nem os anos básicos. Quer dizer: estamos quase inibidos de saber que entre o produto vendido pela empresa, negociado pelo armazém e adquirido pelo consumidor há tais e tais diferenças. Vejam como é quase impossível saber o peso enorme dos intermediários, a não ser que nos contentemos com algumas percentagens oficiais.
Claro que não é preciso chegar ao refreamento, preconizado por Bowley, de eliminar dos índices as mercadorias sujeitas a causas ou variações especiais. Por isso sou forçado a tomar somente alguns números de 1939 a esta parte para evidenciar os fenómenos por ele acusados.
Se pegar nos números fornecidos pelo Boletim Mensal do Instituto Nacional de Estatística, que agora publica magníficas sínteses comparativas, relativas a notas em circulação, e os alinhar com os índices simples do conjunto dos produtos alimentares, que começam em 1939, posso ver como eles se desenvolvem sob uma acção comum e a moeda parece repuxar o custo da vida e levá-lo na sua esteira consigo, para cima, tendo por vezes paralelismo de movimentos. Mas os preços apresentam a compreensível resistência em acompanhá-la, o que resulta do predomínio dos preços oficiais nos índices.
Também a estatística nos mostra que o credor hipotecário, que em 1938 colocava os seus haveres à taxa de 7,04 por cento, em 1945 obtinha apenas 6,44 por cento de remuneração.
O portador da dívida pública, que em 1938 auferia um interesse real de 3,79 por cento, em 1945 obtinha apenas 2,84 por cento. Falo só no aspecto dos rendimentos e poupo à Câmara a verificação das descapitalizações.
O obrigacionista, que em 1938 obtinha 6,17 por cento, encontrava-se em 1945 com 4,04 por cento apenas.
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O segundo-ofícial, que ganhava 1.200$ mensais em 1938, encontrava-se no período de Outubro a Dezembro de 1946 com 1.800$.
Um olival típico que oscilasse na sua produção sincrònicamente com o rendimento nacional dar-nos-ia em Janeiro de 1938, pela venda em Lisboa da sua colheita de 3:710 litros, 23.970$, em 1945, por 3:150, 34.335$ - a 7$ e a 10$90.
Com o vinho já sucedia coisa diferente, pois que, na área da Junta, o preço ppr pipa, na campanha de 1937-1938, estava em 303$, e em 1945-1946 ascendia até 1.143$50, e o valor recebido pela vinicultura, que na primeira campanha se limitava ao índice de 237, estava em 1945-1940 no índice de 1:563.
A nossa banca realizava com o seu pessoal um contrato colectivo de trabalho em Dezembro de 1938, qua fixava como rendimento médio 995$, e em 1946 este último estava em 1.714$.
Os salários médios em Beja, que estavam em 1930 nos 7$60, encontramo-los em 1945 em 12$60; mas os de imantarem, que andavam por 7$80 na primeira data, chegam em 1945 a 22$25.
Podia multiplicar as técnicas, os exemplos e as demonstrações, variá-las até. O mostrador do relógio monetário dir-nos-á que se verificava fatal, incisivo, irresistível, o movimento da inflação, no que ela reveste de mais actual, segundo a literatura da especialidade.
O que é a inflação?
Não é apenas o excesso de moeda em relação ao conjunto da vida económica.
É outra coisa hoje.
É a perda de poder de compra que mostram os rendimentos atrasados em relação à subida geral dos preços e que os encontra, ainda inadaptados, na maioria dos casos, na velocidade de apanhar a alta. Repito - retardamento! inadaptação!
Fenómeno esmagador da maioria, pois uma maioria, há que ganha, lucra, aumenta o seu poder comprador obtém margens vantajosas nas transacções. A deflação que se diz ir começar é o inverso, no sentido da, valorização da unidade monetária, é capaz de aumentar certos rendimentos, mas levará á liquidação de existências, importa queda da procura e irá contrair a saída de bens e dinheiros.
Desenganemo-nos, porém. Pelo jogo complexo do circuito dos capitais, a deflação é uma crise mais brusca e perigosa do que a inflação.
Ela não repara todas as injustiças, não recompõe todas as situações, não restitui todas as perdas.
E, assim, inflação e deflação fazem a justificação teórica e prática de uma estabilidade saudável. Não falo em estabilização - note-se.
Qual é, pois, o futuro?
O futuro é que - se não houver vigilância, fiscalização, ajustamentos e nivelamento- a uma ordem injusta, de alturas e pode sobrepor uma outra que nunca será, como muita gente supõe, compensatória. Funcionou e vai funcionar um novo circuito de capitais.
Haverá capitalizações e descapitalizações, ganhos e perdas marginais - uns que consolidam o que ganharam e outros que pretendem em vão salvar do naufrágio a tábua do que já perderam.
Porque, na inflação como na deflação, a maioria dos que perdem, perdem irremediavelmente.
Posso acreditar, pois, na deflação natural, mas não creio nas suas virtudes!
Os grandes números da circulação fiduciária, dos cheques, das liquidações e transacções haverão criado em muitos espíritos a ideia de que é simples e esquemático o relógio financeiro, onde se contam as horas e os minutos da política monetária.
Puro engano!
Essa máquina é complexa, obedece a, movimentos que não são simples, desempenha, tarefas que não se limitam a saber «às quantas andamos». Há, primeiramente, uma força de propulsão, que faz andar toda a maquinaria monetária.
Temos depois um escapo, que regula, e coordena quase automaticamente os movimentos.
Temos depois um volante, pelo qual só dirige; e orienta toda a marcha.
Há por fim, como dissemos, um quadrante, onde as agulhas nos permitem apreciar a velocidade e fiscalizar o andamento e direcção.
Propulsão no primeiro caso, escape no segundo, volante no terceiro, quadrante por fim - e temos a relojoaria monetária esquematizada.
Vamos traduzir este esquema em dados de facto.
A propulsão é dada pela emissão e pela contracção de notas, cheques, ordens de pagamento e liquidação.
O escape encontra-se na cobertura das notas, ouro em reserva, letras e descontos.
O volante pode ser visto através de tudo o que se segue:
Emissão de dinheiro - Danço de Portugal e Ministério das Finanças.
Política de preços - Ministério da Economia, organização corporativa, Intendência, outras autoridades e Ministério das Colónias.
Política de salários - Subsecretariado de Estado das Corporações.
Política fiscal - Assembleia Nacional e Ministério das Finanças.
Política de financiamento - Banca oficial, banca privada, Ministério das Obras Públicas, Comissariado do Desemprego e câmaras municipais.
Refluxo e reabsorção do dinheiro - Banco de Portugal.
Portanto, estamos longe dos tempos em que a política monetária se abandonava ao critério do banco emissor e que se regulava através do simples toque na taxa do desconto, tendente a contrair ou a expandir o crédito.
A dispersão pêlos cantões administrativos é imposta pela divisão de tarefas, mas torna ingrata e dificílima, a função do Ministério das Finanças, que o vulgo julga sozinho em causa. Sobretudo é decisiva a política de adaptação de salários e ganhos que parecem retardados ou exíguos, em relação às declinações da unidade monetária.
Somente uma política de unidade ou encorporação absurda e até uma posição de supremacia dó Ministério das Finanças, que a ordem política não comporta, permitiriam atingir o grau e o carácter correspondentes a consideração de que a economia nacional é um só organismo.
Para resistir à força ascensional do preço dos produtos, resultante dos aumentos sucessivos da quantidade de moeda e do factor transacção, o Governo Português apelou para os produtores e trabalhadores no sentido de um ulterior esforço, estimulou-os por vezes, fixou preços e quantidades, pôs uma grande parte da orgânica corporativa ao serviço da direcção económica, restringiu, proibiu, importou mesmo, regulou o abastecimento e racionou.
Porque não segurou inteiramente a marcha ascensional dos preços?
Porque não barrou as tentativas altistas?
Porque o Ministério das Finanças, o guardião avisado do poder comprador da moeda, não conseguiu aqui dentro o milagre obtido lá fora - de uma moeda estável?
Não vou versar o problema, mas vou fazer um apontamento apenas.
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Primeiramente tomos arrastados no torvelinho da guerra - o relatório do Ministro das Finanças é nítido e definitivo a este respeito: as matérias-primas que sobem, os materiais e os produtos que não sabemos nem podemos produzir e que entram com maiores preços, as saídas de produtos nacionais que o estrangeiro romunera pelo seu nível e que introduzem aqui quantidades novas e enormes de meios de pagamento, tudo isso foi alavanca.
Em seguida, por uma circunstância que sòmente os comunistas poderão censurar, o Governo pretendeu salvar uma parte da grande herança de liberdade económica, para manter a elasticidade do sistema, para não apoquentar o português, recalcitrante sempre perante regulamentações, e porque entre o sistema «que estava» e o que as necessidades impunham havia que prestar alguma confiança ao «que estava».
Também culpa de nós todos -a formação social do português, a sua têmpera, a sua disciplina não o fadaram para a organização completa nem para o racionamento. A crítica ao sistema e ao funcionamento entre nós estava antecipadamente feita - já o escrevi.
Não me venham apontar o que se conseguiu na Alemanha, na Inglaterra, nos Estados Unidos-nós somos nós, orgulhosamente nós, com virtudes castiças, mas com proverbiais defeitos.
Por um lado a táctica de combate à declinação do poder de compra somente poderia obter-se por uma política altamente empenhada em tal fim. E a política económica, por demasiadamente complexa, decerto que não pôde escravizar-se a este fim singular. Tolhido mesmo entre intuitos antagónicos, como era acalorar o produtor e aliviar o consumidor, tinha de lutar com vários braços e, em diferentes lados, desempenhar-se de tarefas que ao mesmo tempo se excluíam. Mas a verdade é que se havia escassez de certos produtos alimentícios era necessário recorrer a terras menos férteis, tentar culturas e indústrias não muito recomendáveis economicamente - e assim os preços haviam de ser estimulantes o bastante, e nem sempre o foram; e deviam encontrar-se formulados com antecedência precisa sobre a respectiva campanha económica, o que nem sempre se fez.
E ainda no aspecto técnico da político de preços: Nós temos regimes gerais de fracções mínimas e condicionamentos: cito o regime dos concelhos fronteiriços, dos hotéis e das pastelarias.
Temos regimes complexivos no açúcar, no pão, nas conservas e nas carnes - este último deve requerer meses de aprendizagem às autoridades económicas para poderem fazer exame e passar.
Temos preços firmes - nas ervilhas, arroz, etc. Temos preços tabelados de venda ao público - no sal, figos, conservas, marmelada e queijos...
Temos preços marcados de atacado e de retalho - nos legumes, massas, sabões e - até nos preços.
Temos preços tabelados na produção e no comércio do azeite, batatas e bacalhau -repare-se como andam juntinhos até na regulamentação!- e nos óleos... Temos preços máximos - na farinha de trigo em rama, no milho e no centeio, na sardinha, no milho colonial, na lenha e toros...
Temos preços acompanhados; de pesos específicos no trigo...
Temos preços mínimos também.
Temos preços que variam nos centros urbanos e fabris.
Temos intervenções laterais que alteram a mecânica dos preços - os subsídios aos produtores, as intervenções na venda de peles do rebanho nacional. Temos reservas de produtos.
Temos guias, quer para transporte, quer para abastecimento.
E agora intervém um raciocínio económico - para vigiar e reprimir a acção do poder de compra nos mercados era necessário responder com uma política - unitária de preços que, sobretudo, os segurasse por cimos. Era preciso obter limites superiores justos, mas inultrapassáveis.
Isto não se fez; decerto não pôde ser feito.
Mas há mais: as transacções com o mercado internacional, que haviam de completar a política interna, estavam, sujeitas a tendências dispersivas e fragmentárias. Vejamos:
Licença do Ministério do Comércio e Indústria, através do Conselho Técnico Corporativo;
Licenças simples do Ministério da Economia;
Licenças passadas pelo Instituto Nacional do Pão, pela Junta Nacional dos Produtos Pecuários e pela Junta Nacional dos Lacticínios da Madeira;
Licenças passadas pelas Junta Nacional do Azeite, Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau, Comissão Reguladora do Comércio de Arroz, Comissão Reguladora do Comércio de Algodão em Rama, Comissão Reguladora do Comércio de Carvão, Comissão Reguladora do Comércio de Metais, Comissão Reguladora das Oleaginosas e Óleos Vegetais, Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos, Federação Nacional dos Industriais de Lanifícios, Junta de Exportação do Café Colonial e Junta Nacional do Vinho.
Vi várias vezes importadores disporem de farinha, massas alimentícias carregadas em Nova-Iorque c a descarregar em Lisboa, quando o País se debatia com falta de ambas, impossibilitados de fornecer o consumo interno por não estarem previamente inscritos num Grémio.
É certo que, para evitar movimentos desnorteados mas transacções, as alturas teriam de ser relativas, proporcionadas aos custos, vias devia ter-se nivelado melhor.
Quer ver-se ?
De 1939 a Outubro de 1946 os preços dos géneros agrícolas flutuaram assim: legumes, de 116 para 644; produtos de origem animal, de 93 para 240; batatas, de 140 para 643; milho, de 98 para, 237; azeite, de 100 para 216; vinho, de 93 para 380; trigo, de 105 para 189.
Acrescento agora um produto que entra em 34 por cento da despesa com a alimentação em Portugal:
Peixe (conjunto), de 107 para 557 (Setembro de 1946).
Portanto, todos os preços subiram no conjunto, o que corresponde a fatal declinação do poder comprador da moeda, mas, ao passo que alguns duplicam apenas, como o azeite ou o trigo, que ainda fica aquém, outros, como a batata, quase quintuplicaram, e outros, como OM legumes, andam próximos do multiplicador 6.
A força, da própria economia natural, as alterações do gosto do consumidor e a dispersão dos preços mostravam que não fora possível segurar a declinação do poder de compra por igual; somente uma economia de guerra de completa mobilização ou um regime totalitário disporiam de tão mágico poder!
Somente uma política espantosamente repressiva, dos preços, pelo Ministério da Economia, e uma política despótica dos salários, pelo Subsecretariado das Corporações, teriam o condão de se opor à ascensão do custo da vida. Ela não podia ser tentada; se o fosse haveria uma grande revolução; direi mais: haveria, pelo menos, tantas como de 14 de Maio ao 28 do mesmo! Mas, discutindo-se a política do Ministério das Finanças, este capítulo encontra-se fora do âmbito do aviso prévio.
Os que viveram na paz e sossego, além das graças que devem ao Altíssimo, não podem raciocinar como se tivessem passado por baixo da metralha.
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Logo ao dar os primeiros passos temos de arredar um obstáculo posto no nosso caminho, que, não obstante, se diz desimpedido: concepção austríaca do dinheiro «neutral».
A escola de Viena, o grande reduto do neo-liberalismo, continua proclamando que a moeda tem uma posição de indiferença no curso dos fenómenos económicos. Ou, se não tem, devia ter, de maneira que estivesse longe dos conflitos e mantivesse a sua função de denominador comum dos valores, para além dos movimentos dos bens e serviços.
Quer dizer: a moeda não pode ser amiga nem inimiga, nem mesmo aliada - há-de ser, terá de ser, neutra.
Daqui se tiram consequências de lógica pura: os homens do Governo não hão-de intervir nos domínios da moeda. Intervirão apenas no sector das mercadorias, se quiserem manter a sanidade monetária e a elasticidade do crédito.
Concepção de origem liberal, de estrutura liberal, servida de estudos exactos, ela não se acomoda às realidades de hoje nem às aspirações actuais. Não podemos ficar nas aparências lógicas das análises puras.
Digam os que padecem com a perda do poder comprador da moeda se o dinheiro, em vez de neutral, não parece, às vezes, inimigo.
Digam os que acastelaram sobrelucros e fizeram guindes cabedais em todas as guerras se o dinheiro não foi seu amigo e aliado, se não foi mesmo o seu instrumento de combate e vitória.
E digam os que lutaram com rendimentos cada vez mais insuficientes se foi apenas a escassez dos mercados o seu grande adversário. O dinheiro não é neutro!
Quando o director de um banco central manda para a circulação uma nota recém-estampada, fresquinha de tinta, sabe ao certo que, para além de um limite, ela irá beneficiar uns e prejudicar outros.
Sabe que o seu mágico poder nos mercados pode subir e descer, fazendo-o quebrar a solidariedade nacional, em proveito de alguns mais felizes.
Talvez próximo das concepções austríacas, vemos agora posta a ideia de que nos bate à porta um movimento de deflação. Esta é o movimento antagónico de inflação, e tanto pode significar descida do nível geral de preços como simples contracção monetária. Alguns preços desceram, como outro dias dissemos.
A procura de meios para pagamentos no mercado internacional, derivada de repatriações de capitais, de investimentos e de importações maciças em larga escala, também se faz notar.
Pode haver mudança de tendência no nível da taxa de desconto.
Parece que alguns bancos, no sentido de confirmar a baixa, restringiram a oferta de crédito.
Diga-se de passagem que não louvo esta última táctica. Se forem atingidas empresas em reconversão, se forem apostas dificuldades às iniciativas criadoras, se não estiverem restauradas as existências, a banca, que está pletórica e é demasiadamente prudente, pode ter seguido caminho cauteloso, mas errado.
Lembremo-nos de que o major Douglas mostrou como os bancos podem agravar os desregramentos económicos. Se criam créditos nas quadras prósperas, agravam sem necessidade a crise próxima. Se o restringem no momento em que se tornava necessário fornecê-lo, iniciam a mesma crise.
Mas voltando ao assunto:
A deflação natural é formulada muito cautelosamente no lúcido relatório do Banco de Portugal, nos seguintes termos:
A medida que se forem abrandando ou suprimindo os rígidos condicionamentos da economia de guerra, há pouco terminada, os preços hão-de procurar o seu nível económico, o qual denunciará iniludìvelmente a evolução da economia de paz em cada país.
Enquanto a produção não retomar o seu ritmo normal e enquanto o comércio internacional se não intensificar, será muito difícil contrariar a alta de preços ou estabilizá-los, mesmo que se adoptem as mais severas medidas financeiras e monetárias (relatório do conselho de administração do Banco de Portugal, gerência de 1945, p. 12).
Tenho a impressão de que o relatório apresentado pelo Ministro das Finanças reduz a hipótese da deflação natural às suas relativas proporções.
As reservas monetárias do País, constituídas e mobilizadas durante a guerra, serão, em parte, consumidas no mercado internacional - em compras de bens de capital e apetrechamentos; em suprimentos aos nossos abastecimentos deficientes.
Caberão aqui as repatriações de capitais estrangeiros p o êxodo provável dalguns nossos.
Não devemos, realmente, confiar muito hoje no «deus-dará». Já na outra guerra a economia tinha perdido o seu belo e tradicional carácter de auto-regulamentação.
Direi ainda que não só a economia se não mostra auto-regulamentadora como não será auto-reparadora de agravos, estragos e sacrifícios verificados.
Eu ponho assim a questão: a deflação, mesmo quando verificável em plenitude, não é capaz de nos dar a reposição das situações anteriores.
Quem perdeu . . . perdeu! Quem sofreu . . . não esquecerá facilmente os seus males! Os sedentos de justiça não verão inteiramente compensadas as suas injustiças!
Quer dizer: a deflação natural não será senão um capítulo e é incapaz de restituir o que se perdeu ou ir cobrar o que alguns obtiveram em demasia. Por concepção, estudo, reflexões, não creio na virtude da deflação natural e inclino-me a crer que ela deve ser seguida, vigiada, fiscalizada...
Canalizada, até!
A concepção do dinheiro «neutral» enferma de um grande defeito: conduz logicamente a que se assista no desenvolver de uma crise, de braços cruzados, e tudo se lhe afigura estranho, a não ser a imagem da própria inércia.
A grande função da banca consiste em canalizar a poupança para o investimento, aumentando assim o rendimento nacional e tornando a vida melhor aos milhões de portugueses.
Será caso único no Mundo imaginar-se que ser banqueiro consiste em guardar ciosamente a porta do cofre, amontoando milhões e não emprestando aos iniciadores e criadores da riqueza nacional ou aos intermediários da função útil.
Sei, Sr. Presidente, que o banqueiro não ê um acrobata operando prodígios, mas também não é, afirmo, um amador, sempre colado às tábuas, com medo do que vem.
O banqueiro é mais alguma coisa do que claviculário. Já me referi ao reparo feito pelo major Douglas. Qualquer de nós, dispondo de terras inexploradas ou de utilização rudimentar, não se limitará a guardar ciosamente os seus capitais; irá aplicá-los ali, investi-los utilmente. As grandes disponibilidades da banca hão-de ser dirigidas para os recursos inexplorados e para as terras do ultramar.
Não é preciso medidas drásticas - tente-se uma mobilização amigável dos capitais depositados, assentando em planos bem estudados e tecnicamente rigorosos.
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O falecido Lord Keynes v os seus adeptos, que são imensos em todos os países, combatem a poupança preguiçosa, o depósito ocioso, que estão, sem dar por isso, na origem do desemprego, da baixa do nível de vida e da luta social.
Portanto, ao banqueiro não absolve apenas o ser cauteloso, guardar e distribuir precavidamente o crédito. Deve encaminhar, suavemente, para as aplicações de interesse nacional. A poupança tem tomado rumos desagradáveis, no ponto d« vista nacional, nestes últimos tempos.
Frutas da Califórnia, compotas britânicas, pastelarias ricas, estabelecimentos de grande luxo, prédios do rendas incomportáveis, importações maciças de supérfluo e luxo. A banca portuguesa deve - talvez já o esteja fazendo - considerar estes amadores de custos elevados para que ocupem a sua actividade mais em harmonia com o bem comum.
Continuo a reclamar que ao Ministério das Finanças sejam atribuídos poderes para ordenar e hierarquizar as importações.
Os que no sector bancário, usando de persuasão e orientando o meio dos negócios, fizeram afirmações de tranquilidade para os accionistas, depositantes e para o público em geral mostraram compreensão elevada da função que a economia moderna lhes atribui. As questões da moeda dependem da persuasão e não devem fechar os seus segredos.
É preciso operar uma fusão saudável aos nossos princípios financeiros com as novas ideias da política anticiclo.
Os próximos anos vão esclarecer-nos sobre a nossa resistência e impermeabilidade ao fluxo das noivas concepções monetárias, que vejo alastrando, sem obstáculo, na doutrina e nos factos. As ideias austríacas vão dando lugar a novos princípios formulados pela chamada escola de Estocolmo.
Tem-se evidenciado que a política monetária não se confina na pura neutralidade ou só possa marchar até à quase passividade de regular o juro.
Não, não é isso o que importa!
O que importa é o desenvolvimento dos preços em geral.
O que importa é mitigar as flutuações da alta e da baixa conjuntura, do ciclo alternado de depressão e prosperidade.
O que importa é estabilizar toda a vida económica, não num certo ponto mínimo, mas numa altura de grande incremento de transacções.
O que importa é canalizar a poupança para o investimento, protegendo este.
O que importa é que não haja depósitos preguiçosos à espera de importações desarrazoadas ou de operações meramente especulativas.
O que importa é a distinção entre o orçamento de simples expediente e um orçamento humano, capitalizador de pré-financiamentos.
O que importa é um sistema fiscal que não seja amontoado de enxertos, mas um todo baseado no real da vida e com garras capazes de prender o enriquecimento fortuito e não ganho.
O que importa é que a vigilância e estabilidade dos preços se não deixe apenas a uma comissão bancária.
O que importa é que se não agrave a redistribuição injusta do poder de compra.
O que importa é que as autoridades monetárias formulem previsões cuidadosas para orientação do público e por meio de uma governação criteriosa.
Em suma: não há uma política única, à parte ou mesmo indiferente.
A vigilância dos preços tem de ser constante.
As autoridades financeiras não podem tentar valorizar enquanto outros estarão desvalorizando.
Portanto, foram as ideias financeiras de 1928-1931 que nos salvaram, que nos resgataram, que nos abriram os alicerces e, ao mesmo tempo, forneceram os materiais para a obra formidável que está desafiando as críticas actuais, mas que desafiará o tempo, que nos colocou ultimamente numa situação de predomínio no mercado internacional.
Estas ideias e a prática seguida não nos contrapõem às novas teorias. Antes pelo contrário: a organização do nosso orçamento, sem perder a rigidez indispensável e a unidade fundamental aproxima-se já de uma nova corrente.
Não há, pois, debate ou conflito mo horizonte.
Mas existe uma tarefa posta à política actual.
Devemos lançar mais alguns olhares para a frente.
O que está nas aspirações da geração actual é uma economia de abundância de largos e elevados consumos.
Alimentação apropriada, vestuário asseado, casa higiénica, algum conforto e diversões - isto para todos, sem excepção.
Esta economia implica aproveitamento ao máximo dos recursos - naturais - que não são folgados - e exploração das terras novas ultramarinas; além disso, pretende atingir-se o mais alto nível de emprego.
Um facto me parece indiscutível e a ele nada se poderá opor: a política monetária seguida até hoje e que tem, como mais recente acto, o grande empréstimo a Moçambique, poderá não estar isenta de defeitos, mas revela-se a mais adequada no sentido de apetrechar o País com elementos que nunca poderiam ser produzidos aqui - explorar o ultramar com capitais de que não dispúnhamos até certa altura.
Vou concluir, depois de ter examinado, por minha vez, as entranhas do ganso.
Havemos de continuar introduzindo nivelamento o justiça nos preços e reditas, sem confiar muito no poder de compensação da ordem natural das coisas.
Se o Mundo for para a reintegração do padrão-ouro, já estaremos habilitados capazmente.
Se formos todos para o simples estalão-ouro principal, estaremos prontos.
Se vier a deflação, continuaremos vigilantes.
Se continuarem subindo alguns preços, se o Mundo for para níveis ainda mais altos, o que nos obrigará, pela força dos vasos comunicantes, a elevar, resistiremos na medida necessária.
Se vier uma vaga optimista de expansão, seremos cautos, porque de remediados não chegaremos a ricos.
Se vier nova depressão, estaremos habilitados com instrumentos políticos anticíclicos.
Se os acordos de Bretton Woods entrarem em franca execução, cooperaremos facilmente.
Se o Mundo reclamar emprego completo, seguiremos e melhoraremos os nossos métodos.
Se a nossa balança de pagamentos se desequilibrar, manobraremos no sentido devido.
Se quisermos elevar o imposto sobre doações e sucessões às alturas de tributação do enriquecimento, seremos capazes também.
Mais uma vez, em matéria financeira, devemos contar connosco, sobretudo connosco.
Disse.
Vozes:- Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Araújo Correia: - Sr. Presidente: limitarei as minhas considerações a trazer ao debate um pequeno contributo baseado em certo número de elementos que
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me parecem de relevo, sem a intenção, contudo, de fixar doutrina nem apontar soluções explícitas para questão que é muito delicada e grave.
Julgo que a crise de agora não se originou apenas nas vicissitudes da guerra. Não é apenas o reflexo das actividades desordenadas que se desenvolveram entre nós nesse período, pelo menos na parte relativa a certos produtos.
Era inevitável, em face das circunstâncias, haver sobressaltos económicos e fortes impulsos tendentes a enfraquecer o valor intrínseco da moeda em relação ao custo da vida. Se porém, houvessem sido tomadas medidas mais eficazes e enérgicas no sentido de atenuar os seus efeitos, talvez fosse possível evitar que o índice de preços subisse tão alto e, dadas as características da nossa vida social, talvez não fosse impraticável trazê-lo, gradualmente, até quase à paridade, ou muito próximo dela, nos anos que se seguissem ao conflito.
Para esclarecer o que acabo de expor, em fornia tão elementar quanto seja permitido pela complexidade de assunto que envolve tantas variáveis, alguma» de natureza psicológica, desfiarei o rosário dos principais factos de ordem financeira e económica que caracterizaram a vida portuguesa nos últimos tempos, porque, em meu fraco entendimento, eles estão encadeados com a situação actual.
E fá-lo-ei sem intento de criticar ou de louvar, numa forma desapaixonada e imparcial, como convém a matéria difícil e delicada. O próprio comentador pode bem interpretar os factos em sentido que não seja o mais perfeito.
Suponho que a terrível situação financeira herdada pelo Estado Novo se encontrava debelada por voltas de 1934 ou 1935. Nessa altura já estava em progressão crescente e acentuada a posição cambial, e portanto eram positivos os saldos da balança de pagamentos Havia sido benéfica a resolução tomada de ingressar na área do esterlino e o escudo mantinha facilmente a paridade com a libra, que dominava essa área, O nível de preços adquiria, pouco a pouco, posição estável depois dos abalos da crise de 1929-1931 e a época de parcimónia, clarividência e de vigoroso pulso em matéria financeira encetada em 1928-1929 criara condições de estabilidade e confiança.
Era minha opinião nessa altura, expressa aliás em documentos oficiais e públicos, como um contraprojecto apresentado a esta Assembleia sobre reconstituição económica, que, uma vez neutralizada a crise financeira, o primeiro passo a dar deveria tender ao desenvolvimento dos recursos materiais do País. Diversas razões aconselhavam o desvio de todas ou quase todas as disponibilidades financeiras para esse objectivo e não vaie a pena enumerar agora aquilo que por mim e por outras pessoas foi dito e escrito sobre o nível de vida e os recursos internos.
Mas, além da necessidade de coordenar e desenvolvei a produção, havia ainda outro aspecto importante a considerar, que era o do meio circulante.
Das causas mais influentes na inflação de preços sobressaem, como é sabido, balança de pagamentos positiva, insuficiência de produtividade económica em relação aos meios monetários a circular ou, o que é o mesmo, desequilíbrio entre o meio circulante e a produção, e, finalmente, saldos negativos orçamentais liquidados por valores fiduciários sob a forma de crédito ou moeda. Há outras causas, mas as duas primeiras que acabo de citar, visto a última ter sido felizmente eliminada, tiveram grande influência nos acontecimentos do nosso País nos últimos dez anos; e, para simplicidade e boa compreensão, é a elas que me referirei mais vezes neste pequeno e singelo golpe de vista sobre a vida nacional.
Era sólida a posição cambial da última década, com balança de pagamentos quase sempre positiva, e o orçamento apresentava saldos importantes. O Governo havia transferido para o público uma parte do numerário imobilizado na dívida flutuante - liquidara-a a dinheiro. Aumentara assim o potencial circulante, que ainda se desenvolvera mais por ser fácil o crédito depois da crise bancária de alguns anos antes. Haviam, por consequência, sido criadas algumas condições propícias à inflação. E como se faziam esforços, e bem, no sentido da baixa na taxa de juro, mais se reforçavam as tendências para a abundância do meio circulante.
Tudo indicava, por isso, o começo nessa data de um período intenso de produção económica -uni desvio dos quantitativos disponíveis das receitas para despesas reprodutivas- para despesas que, absorvendo os excessos de meios monetários, criassem os instrumentos de fomento que viessem servir de contrapartida à abundância do meio circulante derivado da balança de pagamentos positiva, de crédito fácil e de outras causas.
Lançar no mercado grossas somas de dinheiro para obras públicas sem reprodutividade afigurava-se-me então perigoso, porque, além de outros motivos, ia anuviar ainda mais os presságios já sombrios de uma possibilidade inflatória por ir criar ou auxiliar o desenvolvimento de poder de compra sem contrapartida apreciável em bens de consumo no presente ou em futuro próximo.
A mão-de-obra disponível, geradora desse poder de compra, deveria ser, em meu entender, usada essencialmente em planos de fomento reprodutivos, e seria até vantajoso iniciar aqueles que dentro do mais curto espaço de tempo produzissem efeitos.
Julgo que o programa de obras públicas -e não discuto agora a utilidade, mas refiro-me apenas à sua produtividade-, acentuado grandemente nos últimos anos da última década, desenvolveu de maneira apreciável as tendências para a inflação que já existiam. O índice de preços ia subindo, apesar das grandes colheitas de trigo que até levaram a exportar cereal em 1936. Supunha-se haver subida nesse índice apenas por virtude do reflexo de fenómenos estrangeiros -da guerra de Espanha, que aliás também nela influiu, assim como os presságios de uma guerra que vieram a confirmar-se anos depois-, mas o factor despesas improdutivas teve nele influência sensível, e muito maior haveria tido se não fora o recurso à importação.
E, com efeito, em 1938 a posição cambial foi deficitária, sinal das grandes importações que, na verdade, tiveram lugar.
No princípio da guerra pairava sobre o País o espectro da inflação de preços; ela já existia de facto, como mostra o índice, por grosso, e era apenas ofuscada ou mascarada em suas maiores consequências pela facilidade de contrabalançar com importações a pressão exercida pêlos excessos de meios monetários, derivados de crédito fácil, de forte posição cambial e, em escala perceptível, de poder de compra estéril que resultava de quantias gastas em obras e outras despesas adiáveis, sem contrapartida na produtividade do País.
Sr. Presidente: o exame da situação económico-financeira de 1939-1940 e anos seguintes mostra que a teoria quantitativa, com todas as suas limitações ou reservas, podia explicar sintomas de próxima e grave inflação. Intensificava-se o período de despesas improdutivas e acentuava-se em escala larga o saldo da balança de pagamentos. Para liquidar os excessos de cambiais que afluíam ao Piais, o banco emissor emitia notas, que entravam logo na circulação ou iam avolumar os depósitos, e parte das receitas absorvidas pelo Estado por meio de impostos revertia para a circulação sob a forma
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de obras públicas e outras despesas. A produtividade do País mantinha-se ou começava a definhar nos seus aspectos mais interessantes, por falta de matérias-primas, de energia, de combustíveis e de outros elementos. E, assim, logo que a América entrou na guerra desapareceu a válvula de segurança que, pela importação, ajuda se opunha a maior subida de preços. O País, com tendência acentuada para mais- alto índice, vergado apenas pelas importações, com meio» fiduciários em excesso sob a forma de crédito ou depósitos à vista, com importantes meios monetários a avolumar o poder de compra, transferidos sob a forma de pagamento de obras do Estado para a circulação, viu-se quase subitamente sem possibilidades de neutralizar maior inflação de preços; passou a viver dobrado sobre si mesmo.
Esta data - a entrada da América na guerra - foi o ponto crítico, nevrálgico: excesso de circulação ou crédito potencial, afluência de cambiais, impossibilidade de importar, definhamento na produtividade interna.
A inflação que já existia e a que estava latente e derivava do excesso de despesas sem contrapartida na produção - do Estado e até de particulares - encontrava meio extremamente propício para Se desenvolver, em todo o seu esplendor diabólico, com o cortejo de misérias e desgraças que tal fenómeno deixa sempre atrás de si.
Quais as medidas a tomar então - e ainda era tempo para enfraquecer alguns dos seus efeitos, já que se não podiam extinguir de todo? Elas são clássicas e foram apontadas no parecer de 1941, em discursos nesta Assembleia e no relatório do Sr. Ministro das Finanças: racionamento enérgico e organizado; transferências de mercadorias - ou exportações - liquidadas com produtos, ou cambiais não convertíveis em escudos; empréstimos, a curto prazo e juro baixo, que fixassem os depósitos ou meio circulante, que envenenavam o munido das transacções; muito forte tributação do excesso de lucros; menores gastos em despesas não reprodutivas.
Mas ao mesmo tempo um outro e poderoso elemento poderia aliviar a grave situação que se projectava no horizonte da vida portuguesa: era o da estreita, firme, enérgicas e completa coordenação dos sectores públicos que têm influência nos abastecimentos e na economia nacional: os Ministérios das Finanças, Economia, Obras Públicas e Comunicações; os da Marinha, na parte relativa aos transportes marítimos; das Colónias, na parte relativa às relações económicos com o ultramar, e, finalmente, dos Negócios Estrangeiros, no que se refere às negociações tanto em matéria financeira como de importação e exportação.
Se aí por voltas da entrada da América na guerra tivesse sido. possível adoptar as medidas enunciadas, tendentes a restringir o meio circulante, a coordenar os negócios públicos e a melhor repartir as disponibilidades alimentares, a crise seria mais facilmente dominada. O País teria sofrido evidentemente faltas - como aliás as sofreu e sofre -, mas financeira e economicamente a situação seria hoje outra.
Apoiados.
Sr. Presidente: muita gente há-de possivelmente meditar sobre as causas que impediram a adopção, em tempo oportuno, das medidas que acabo de apontar e outras destinadas a enfraquecer os dois vícios fundamentais da inflação: o estímulo para consumo e a dificuldade em a travar, depois de ter atingido certa aceleração.
Temos, para as explicar, de não esquecer certo número de aspectos de ordem política e também hábitos e costumes do nosso povo, que os havia de ressentir duramente nessa altura.
Um dos factores mais importantes, que convém pôr a claro, é o que se relaciona com as graves preocupações que duas guerras quase contínuas trouxeram ao País: a de Espanha, em 1936, e a mundial, em 1939.
Segundo a análise que acabo de fazer, foi em 1910 que apareceram os primeiros sintomas do inflação potencial, já aparente na curva dos preços. Na base de 1934 = 100, entre Dezembro de 1935 e igual mês de 1937, o nível subiu 25,5 pontos, e entre aquele anos e 1939 subiu mais 9,4, não obstante as grandes importações de 1938. Ao todo, nos quatro anos que decorrem de Dezembro de 1935 a igual mês de 1939, a subida foi de cerca de 35 por cento.
A guerra de Espanha começou a absorver a profunda atenção do Chefe do Governo, e desde então até agora a sua actividade tem sido em grande parte dedicada, numa luta árdua e árida, à defesa da nossa tranquilidade.
Muito pouca gente tem ideia da energia, esforço intelectual e habilidade política que é preciso despendei1 e que certamente foram despendidos no combate para arredar Portugal do torvelinho doloroso e urrcpinnk1 que caiu como terrível catástrofe sobre a Europa dos nossos dias.
Vozes: - Muito bem !
O Orador: - Eu tive ocasião, por virtude de circunstancias fortuitas e excepcionais, alheias à vida do Estado, de seguir algumas das negociações de então e de surpreender e de ajudar com muito fraco valimento os ásperos e contínuos esforços feitos pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros no sentido da defesa da integridade moral e política do País. Posso assim avaliar a quase impossibilidade de preocupações de outra natureza em quem, dia e noite, corajosamente defendia os nossos interesses vitais, e já agora -devemos também dizê-lo- esta paz de relativa fartura que usufruímos até quase ao fim da guerra.
Apoiados.
Nem uma bomba caiu no nosso território. Numa época em que elas tombavam do céu aos milhares de toneladas, quase não fomos beliscados pela sombra de um avião. E quando por toda a parte, em redor e longe de nós, reinava a amargura e a dor, continuámos a ser amimados - na frase feliz de um amigo que muito prezo. E por sermos amimados fomos imprevidentes - é um velho defeito- da raça. Quando veio o tempo du carência, faltou-nos a coragem para encarar os factos na sua crua realidade e para tomar as medidas que tornariam mais fácil a vida em comum.
Acaso em todas as classes, nas mais baixas e nas mais elevadas, se sentiu praticamente a necessidade de impor economia e parcimónia em suas mesas? Não continuam, ainda hoje, os desperdícios em grande número de casos, os desperdícios que, somados, poderiam minorar a vida de muita gente - e talvez, se bem aproveitados, revelar-se num passado razoável e são?
Sr. Presidente: seja como for, não puderam ser tomadas as medidas enérgicas que a nossa índole individualista haveria provavelmente de ressentir com acrimónia e que contudo constituiriam um bem para quase toda a gente.
A posição cambial atingiu 13 milhões de contos em 1943; os depósitos voluntários passaram para perto de 11 milhões; e o nível de preços, que era de 186,8 em fins de 1939, alcançou 252,4 em fins de 1943. Nos anos de 1941 e 1942 o acréscimo de cambiais foi de cerca de 8.300:000 coutos. E não cessou de aumentar desde então: 2.700:000 em 1943; perto disso (2.670:000 contos) em 1944; 1.851:000 em 1945; e apesar do enorme déficit da balança comercial em 1946, que atingiu
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- repare V. Ex.ª, Sr. Presidente- cerca de 2.168:000 contos, cifra nunca vista nos anais da história económica portuguesa, ainda a posição cambial parece ter subido bastante.
Era em 30 de Junho de 1946 mais de 19 milhões de contos e no fim do ano, sem os soldos do Estado nem os das ilhas, mais de 17.500:000. Poder-se-á talvez fixar, em 31 de Dezembro último, em IS milhões de contos.
É evidente que os depósitos não poderiam manter-se perante este afluxo crescente e inaudito de cambiais, e por isso seguiram-lhe na esteira. Os depósitos voluntários, líquidos de sobreposições, vieram de 5.400:000 contos em 1940 para mais de 17 milhões em fins de 1946, sempre na progressão crescente de aumentos que variam anualmente entre um mínimo de 1.670:000 em 1943 e um máximo de 3.150:000 em 1944. O aumento líquido de depósitos em 1946 ainda anda à roda de 1.600:000 contos.
Aqui temos, pois, algumas das grandes causas da inflação, em que sobressai a balança de pagamentos positiva, apesar do tremendo déficit da balança comercial em 1946. Isso levou e leva à expansão do crédito, no seu termo genérico, que, por sua vez, conduz ao aumento no consumo. E o aumento no consumo, sem contrapartida na produção, empurra os preços, leva à sua inflação.
A agravar os males derivados das causas que acabo de apontar vem o aumento do poder de compra, resultante de grandes gastos do Estado em obras públicas. As contas mostram a despesa no respectivo Ministério, em 1945, de 736:000 contos - a maior de que há memória. E a organização corporativa, que também se desenvolveu muito de 1940 para cá, deve ter consumido em 1944 para cima de 400 mil contos de receitas ordinárias. E ainda temos de ter em conta os abastecimentos e outras despesas que resultaram da mobilização militar, indispensável na grave emergência que atravessámos.
Todos estes tremendos factos, reais, palpáveis, dolorosos, ricos de ensinamentos, estão na curva ascensional dos preços: o peso das despesas improdutivas e adiáveis, a balança de pagamentos fortemente positiva, a mobilização, os gastos elevados da organização corporativa numa época em que convinha restringir o poder de compra, as dificuldades na produção interna, o egoísmo de muita gente, sobretudo das classes mais remediadas, que constituem a baixa e alta burguesia, a indiferença de muitos perante as dificuldades que assoberbam o Mundo, que os leva a exigir mesa torta - uma série de factores, cada um com o seu peso, que exigem pulso rijo, mão forte a comprimir pouco a pouco até fazer entrar nos seus respectivos lugares as forças poderosas, conhecidas, que perturbaram a vida dos preços, que é também o sossego e a vida da grande maioria.
Apoiados.
Sr. Presidente: qual a posição no momento presente? Ela decorre do que disse há pouco.
Balança comercial com déficit de 2.160:000 contos, desmedido para as possibilidades do País no futuro. Mas, apesar disso, a balança económica é, ou parece ser, sensivelmente positiva.
Depósitos líquidos voluntários de mais de 17 milhões de contos, dos quais apenas l milhão a prazo.
Imobilização de 80 milhões de libras, ou 8 milhões de contos, garantidos por um dos mais poderosos e ricos impérios do globo, mas que agora se debate em crise aguda derivada da guerra.
Meio circulatório em notas do banco emissor de cerca de 8.716:000 de contos - quase inteiramente cobertos só pelo crédito já mencionado, o qual é equivalente a ouro ao câmbio de 100$.
O Sr. Mário de Figueiredo:- V. Ex.ª dá-me licença? V. Ex.ª disse «convertível em ouro ao câmbio de 100$»?
O Orador: -Sim.
O Sr. Mário de Figueiredo: -Mas isso é seguro? Só se eu li mal essa parte do relatório do Sr. Ministro das Finanças! O que é convertível em ouro ao câmbio de 100$ são os 500:000 contos; o resto tem garantia-ouro.
O Orador: - ... Que talvez possa supor-se ser equivalente o ouro ao câmbio de 100$.
Nível de preços por grosso à roda de 252 em Dezembro de 1946; racionamento imperfeito e barulhento, psicologia rebelde, fraca produtividade, atraso nas grandes obras produtivas, elevadas despesas em obras públicas, muitas das quais podem ser adiadas por uns anos, organização económica cara, que não produziu ainda os efeitos que se esperavam e que pode produzir.
E deve acrescentar-se - com muita razão - o estabelecimento de nível de salários em desarmonia, ou, pelo menos, em desequilíbrio com a produtividade, que auxilia o poder de compra, sem contudo auxiliar a produção, e, por consequência, factor importante na inflação de preços.
Estes são os elementos do problema. E agora pode fazer-se a pergunta: forçar a deflação quer dizer impor a redução dos preços?
Proceder ao alinhamento, como se diz, da moeria com o nível dos preços?
A questão aqui levantada - a questão da moeda - tem dois aspectos, que conviria esclarecer em pormenor. Eu lamento muito faltar-me o tempo e a competência para entrar neles a fundo.
Um é o dos abastecimentos, outro é propriamente o doe preços - e este último, como aliais o primeiro, está ligado a problema muito mais complexo, que é, em última análise, o da nossa vida económica nas suas relações com os mercados externos, e essencialmente, na parte relativa à produção interna.
Tentemos iluminar um pouco o aspecto dos abastecimentos. Com os dados de que dispomos agora, parece estar em vias de resolução, ou, pelo menos, de grande melhoria no Mundo, a questão dos abastecimentos. E as possibilidades dessa melhoria, para nós, aumentarão muito se se justificarem no nosso País os prenúncios de ano agrícola razoável, que venha suprir pelo menos algumas das deficiências dos anos anteriores.
Julgo, nesta matéria, que a curva das dificuldades tende a descer - os recursos alimentares, no Mundo, para aqueles que os possam pagar, devem aumentar sensivelmente durante o ano corrente.
Ora nós temos meios de o fazer - como aliás se provou já com as importações no ano passado e se está provando com os carregamentos de géneros alimentícios que chegam agora a portos portugueses. Passou, se não são erradas as previsões, o período de maior acuidade, e o nível de vida, em tempo próximo, há-de reflectir, internamente, o próprio custo da aquisição dos produtos nos mercados exportadores.
O Sr. Mário de Figueiredo: - Quer dizer, baixar?!
O Orador: -Sim, baixar.
O outro aspecto mais lato e de maior alcance é o dos preços e este liga-se directamente à moeda.
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Mas ele não depende -se eu vejo correctamente a questão- da simples vontade de um pequeno número de homens do meio político ou do meio bancário. É possível forçar a descida do nível de preços, amanhã, se isso constituir resolução do Governo ou do conjunto dos estabelecimentos que distribuem o crédito - mas parece-me que seria ilusório o efeito de tal medida, se ela não viesse acompanhada de outras que se encontram mais desenvolvidamente explanadas nas considerações que acabei de fazer há pouco.
Tenho a impressão de que nunca, como hoje, se tornou mais necessária e urgente uma política de planificação, bem entendida e fundamentada, de todos os meios que, de perto ou de longe, se relacionem com a nossa viria político-económica, e que, no caso particular de agora, também teria como objectivo o nível dos preços, em relação ao poder de compra.
O que interessa a todos e ao País não é que os preços tenham, como expressão de medida, muitos ou poucos escudos. O que interessa é que o poder de compra se ajuste ao seu nível. E é neste simples ajustamento da repartição do poder de compra que reside todo o problema económico português, ao qual -ponhamos claramente a afirmação- está subordinado, hoje, o problema político, na sua forma construtiva e real.
Ora o ajustamento em termos duradouros e suaves do poder de compra aos preços não se faz pelo acto de simples paragem ou redução no crédito, ou deflação, que teria de ser feita rapidamente, tal a sua gravidade, nem pela singela medida de alinhar o nível de preços com o da moeda.
No primeiro caso iriam ferir-se interesses nacionais e criar-se repentinamente .dificuldades quase insuperáveis em matéria de salários e outras, e no segundo caso não se teria em conta o valor intrínseco da moeda em reservas de ouro e em créditos, que todos supomos ser sólidos.
A questão, tal qual eu a compreendo, agora, é outra- e essa não a tenho visto encarar com a energia que me parece ser indispensável neste momento. Ela é de natureza essencialmente económica, ela é de natureza produtiva.
O Sr. Nunes Mexia: -Muito bem!
O Orador: - Mas não demos às palavras significado que não têm, nem nos deixemos embriagar por elas, e isso costuma ser um mal nosso. Quando digo questão económica, digo produção e repartição em bases económicas e sociais. Temos de considerar nela tudo; o preço do custo, o salário adequado, a desconcentração dos rendimentos, a qualidade da produção, a prioridade das obras, o ensino técnico, a prioridade nas importações, o crédito, toda uma gama de factores que, no final, levam à harmonia entre as classes, ao bem comum, de que muita gente fala, mas cujo sentido poucos parecem compreender.
Sr. Presidente: o que acabo de dizer não oferece remédio imediato. Eu havia dito já que não pretendia apresentar soluções para a situação actual - para a atenuar, pelo menos, visto ninguém poder ter a veleidade de a resolver em definitivo.
O Sr. Bustorff da Silva: - Apoiado!
O Orador: - Nem eu possuo todos os elementos de ordem política e económica que permitam tal fazer.
Contudo julgo ser necessário tomar certo número de medidas e entendo que muitas delas estão contidas nas despretensiosas considerações que tive a honra de formular perante V. Ex.ª, Sr. Presidente, e perante V. Ex.ª, Srs. Deputados.
Tenho dito.
Vozes:- Muito bem, muito bem!
O orador foi muito
O Sr. Presidente: - Vai ser lida, para conhecimento, desde já, da Assembleia, uma moção que foi enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Botelho Moniz.
Foi lida. É a seguinte:
«Terminado o debate sobre política monetária, a Assembleia Nacional verifica :
a) Que a situação financeira do Estado e a garantia em ouro e cambiais da circulação fiduciária são perfeitamente sólidas, permitem encarar o futuro com tranquilidade e revelam posição nítida de desafogo internacional ;
b) Que a inflação actual, por ter contrapartida de valores, é o oposto da que existiu por efeito da primeira Grande Guerra;
c) Que as disponibilidades do País permitem a execução do plano previsto de renovação económica;
d) Que o crédito de 80 milhões de libras concedido por Portugal à Inglaterra correspondeu às necessidades da aliança luso-britânica e assegurou os legítimos interesses portugueses, quer quanto ao seu valor ouro, quer relativamente à sua liquidação integral.
E por tudo isto, a Assembleia Nacional entende que o Governo merece o louvor e agradecimento dos representantes eleitos da Nação e confia em que ele acautelará quaisquer excessos inflacionistas ou deflacionistas, seguirá uma política conducente ao melhoramento das condições de vida de todos os portugueses de aquém e além-mar e defenderá as reservas monetárias do País de utilizações puramente sumptuárias ou que não correspondam a necessidades efectivas da produção, apressando quanto possível a realização dos planos de renovação agrícola, industrial e comercial já aprovados.
1 de Março de 1947. - O Deputado Jorge Botelho Moniz».
O Sr. Presidente:- Dado o adiantado da hora, vou encerrar a sessão, marcando a próxima para o dia 4 de Março, com a seguinte ordem do dia:
Continuação do debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Bustorff da Silva e início do debate sobre o aviso prévio a respeito das lãs, apresentado pelo Sr. Deputado Figueiroa Rego.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados que entraram, durante a sessão:
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jorge Botelho Moniz.
José Martins de Mira Galvão.
Luís da Câmara Pinto Coelho.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sonsa.
Querubim do Vale Guimarães.
Ricardo Spratley.
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Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhães.
Alberto Cruz.
Alexandre Ferreira Pinto Basto.
António Maria Pinheiro Torres.
Artur Proença Duarte.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo de Morais Bernardas Pereira.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Henrique de Almeida.
Horácio José de Sá Viana Rebelo.
Jacinto Bicudo de Medeiros.
João Ameal.
João Antunes Guimarães.
João de Espregueira da Rocha Pária.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim Saldanha.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Maria de Sacadora Botté.
José Nunes de Figueiredo.
José de Sampaio e Castro Pereira da Cunha da Silveira.
Luís Cincinato Cabral da Costa.
Luís Lopes Vieira de Castro.
Luís Maria da Silva Lima Fuleiro.
Luís Pastor de Macedo.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Mário Borges.
Mário Lampreia de Gusmão Madeira.
Rafael da Silva Neves Duque.
D. Virgínia Faria Gersão.
O REDACTOR - Luís de Avillez.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA