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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 141

ANO DE 1948 2 DE ABRIL

IV LEGISLATURA

SESSÃO N.º 141 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 1 DE ABRIL.

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmo. Srs.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Marques Teixeira.

Nota. - Foi publicado um suplemento ao Diário das Sessões n.º 139, que inseria o parecer n.º 28 da Câmara Corporativa, sobre o projecto de lei n.º 501 (protecção e conservação dos valores monumentais e artísticos dou concelhos de Portugal).

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas.

Antes da ontem do dia. - Usou da palavra o Sr. Deputado Botelho Moniz, que fez largou considerações sobre a presente situação internacional.
Foi posto à votação o parecer sobre a situação parlamentar do Sr. Deputado Abranches Martins, tendo sobre o assunto usado da palavra o Sr. Deputado Mário de Figueiredo.
A Assembleia pronunciou-se pela perda de mandato.

Ordem do dia. - Continuou a discussão, na generalidade, do parecer sobre as Contas Gerais do Estado relativas ao ano de 1946.
Usaram da palavra, os Srs. Deputados José Esquivel e António de Almeida.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 45 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Eurico Ribeiro Cazaes.
Albano da Câmara Pimentel Homem de Melo.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Ferreira Pinto Basto.
Álvaro Eugénio Neves da Fontoura.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
André Francisco Navarro.
António de Almeida.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Maria do Couto Zagalo Júnior.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo de Morais Bernardes Pereira
Carlos de Azevedo Mendes.
Ernesto Amaro Lopes Subtil.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique Linhares de Lima.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
Jorge Botelho Moniz.
José Alçada Guimarães.
José Dias de Araújo Correia.
José Esquivel.

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José Luís da Silva Dias.
José Maria de Sacadura Botte.
José Martins de Mira Galvão.
José de Sampaio e Castro Pereira da Cunha da Silveira.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Luís António de Carvalho Viegas.
Luís da Câmara Pinto Coelho.
Luís Cincinato Cabral da Costa.
Luís da Cunha Gonçalves.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Mendes de Matos.
Luís Teotónio Pereira.
Manuel Colares Pereira.
Manuel da Cunha e Costa Marques Mano.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
D. Maria Luísa de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Spratley.
Rui de Andrade.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
D. Virgínia Faria Gersão.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 62 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Botelho Moniz.

O Sr. Botelho Moniz: - Passa hoje o 9.º aniversário da terminação da guerra de Espanha, cruzada da civilização ocidental contra o comunismo moscovita.
Conceda-me V. Ex.ª, Sr. Presidente, algumas palavras de comemoração.
Todos sabem que louvo publicamente o Governo ou o censuro não menos publicamente, conforme os seus actos ou propostas. No entanto, designadamente em matéria de política internacional, nunca me arrependi das sinceras e entusiásticas afirmações que fiz em sessão do Teatro Nacional, ao apresentar a minha candidatura de Deputado perante o eleitorado de Lisboa.
Não foi necessário o notabilíssimo discurso do Chefe do Governo de 25 de Novembro de 1947 para me convencer. Pertencem-lhe estas palavras lapidares, que exprimem a situação internacional por forma puramente objectiva: «A Europa sofre miséria e tem medo. Medo de quê? Medo da Rússia, medo do comunismo».
Não resisto a comentá-las perante esta Assembleia. Julgo ser tempo de que a par dos nossos problemas internos, aqui discutidos com tanto carinho e pormenor, algo se diga sobre a política externa portuguesa.
O Mundo atravessa crise gravíssima. A ameaça comunista não se limita à Europa: abrange a índia, a China, a Mancharia e todas as demais nações asiáticas. Por sobre os gelos polares e as ilhas ou águas do Pacífico e do Atlântico, dirige-se, veloz, contra a América.
A própria África, tão próxima das zonas europeias directamente visadas, não escapa aos riscos do imperialismo de Moscovo, servido urbi et orbi por «quintas colunas» de traidores. Eis o resultado da rendição sem
condições. Eis a realidade insofismável, magnificamente descrita por Salazar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Perante ela ocorre-nos esta pergunta: quem previu ontem, com segurança, espírito objectivo e estudo desapaixonado, a situação de hoje?
Quem errou gravemente, concorrendo com os seus actos para que o perigo fosse sucessivamente agravado em vez de diminuído ou anulado?
Sr. Presidente: a resposta é simples e precisa de ser dada, embora cá e lá afecte a sensibilidade de uns e o orgulho de outros. Na plêiade de estadistas que orientam ou desejam orientar o Mundo só existe um homem que, após tantos anos de Governo, não tenha tido que arrepender-se ou retratar-se de palavras ditas ou actos praticados em matéria de política externa: esse homem soube prever, porque nunca se deixou enganar pelas aparências.
Apoiados.
Chama-se António de Oliveira Salazar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É português. Mas a directriz da sua política externa já hoje não é apenas lusitana. Passou a ser europeia e está prestes a chegar a mundial.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Rasgaram-se as trevas, revelaram-se os embustes, caíram todas as cortinas políticas - menos, por enquanto, a cortina de ferro. E os povos repetem agora, desenganados e entristecidos, as palavras de Madame Roland perante a guilhotina:
«Ai! Liberdade, liberdade, quantos crimes se cometem em teu nome!».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sob o disfarce irrisório da democracia, a Rússia colocou sucessivamente na órbita do seu império a Polónia, a Estónia, a Letónia, a Lituânia, a zona oriental da Alemanha, a Bulgária, a Roménia, a Jugoslávia, a Albânia, a Hungria e a Checoslováquia.
Mutilou a nobilíssima Finlândia e prepara-se para reduzi-la à escravidão. Invadiu a Grécia com guerrilheiros armados a seu mando, e só não ganhou a cartada graças à intervenção oportuna da Grã-Bretanha e da América do Norte. Ameaça a Turquia e a Pérsia. Intriga e conspira por toda a parte, às vezes com tal eficácia que no caso grego a própria opinião pública inglesa levou meses a convencer-se das boas razões do Governo Britânico.
Mas onde começou a Rússia a urdir a teia que havia de enredar o Mundo? A oriente da Europa? Não. Quase no seu extremo ocidental, na nossa vizinha Espanha, em 1936.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nesse momento, também em nome da liberdade e da democracia, a Espanha foi invadida e retalhada em dois campos. Mas a opinião mundial não compreendeu que começara então a tragédia comunista. Portugal deu, primeiro que ninguém, o brado de alerta.
Quantas censuras sofremos! Quantas pugnas diplomáticas travou Salazar, em nome do pequeno Portugal, ao defender uma atitude vital, lógica e inevitável!
O estrangeiro não queria compreender-nos. E quanto menos o estrangeiro nos compreendia, mais nós admirávamos Salazar!

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A nove anos de distância, recordo a frase do Presidente do Conselho, ao celebrar a derrota vermelha em 1 de Abril de 1939: «Vencemos. Mas não temos factura a apresentar!».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Isto significava que a Espanha, com o seu sacrifício, defendera Portugal, defendera o Mundo, defendera a civilização ocidental. Era credora, não devedora.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Realmente os portugueses nem como graduados militares cobraram soldo do exército espanhol, nem como vizinhos, amigos, aliados ou irmãos pediram materialmente fosse o que fosse em troca.
Seguiram a tradição do bravo Afonso IV no Salado. E, em vez de aceitarem remuneração, nunca perderam ocasiões de colaborarem na justa defesa internacional da Espanha.
Subsiste por esse Mundo fora muito orgulho e muita teimosia política. Apesar da evidência, ainda há quem não queira reconhecer nem os erros do passado nem as inoportunidades de certas atitudes presentes. Seria impiedoso relembrar uns e outras se as suas consequências não persistissem.
Que triste paradoxo diplomático é o isolamento da Espanha, primeiro baluarte anticomunista, mantido por nações ontem iludidas e transigentes, mas já hoje reunidas contra o perigo oriental! As circunstâncias provam que o réu condenado pela UNO não merece sómente absolvição: merece louvor!
Já pensaram os nossos opositores no que teria sucedido às Nações Unidas se o Governo Espanhol de 1939 fosse comunista ou afim? Na primeira fase da guerra, em que Hitler e Estaline foram cúmplices e aliados, a Espanha comunizante atacaria a França ou, pelo menos, ajudaria a Alemanha.
O partido comunista francos, que por ordem da Rússia era então resistente contra a própria França, teria aquém-Pirenéus magnífico campo de operações.
Na segunda fase da guerra Hitler e Estaline entraram em conflito de apetites. Logo, a Espanha vermelha teria sido invadida pela Alemanha, Gibraltar cairia ou ficaria militarmente neutralizado e, com o Norte de África nas mãos de alemães e italianos, o Mediterrâneo tornar-se-ia inacessível às Nações Unidas.
Em vez disso, que poderia representar a derrota dos verdadeiros franceses e dos anglo-saxões, ou uma paz de compromisso, que sucedeu?
Por força do pacto de amizade e não agressão luso-espanhol e da constituição do bloco peninsular, conjugados com a aliança luso-britânica, foi possível neutralizar, a Península ou, com mais justeza de dizeres, equilibrar ou evitar as fortes pressões de alemães e italianos sobre a Espanha.
- O Mediterrâneo continuou mar britânico, a África do Norte constituiu a base de partida para o ataque anglo-americano e a vitória, que a partir de então foi esmagadora, rápida e decisiva, pertenceu às Nações Unidas.
Ainda a guerra não terminara e já alguns estadistas norte-americanos tinham tido a coragem de enunciar estas verdades. Foram então os precursores da atitude actual da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos da América do Norte. E a atmosfera mundial chegou quase a ser de gratidão para a Espanha. Ao chegar essa ilusão chamada paz, tudo mudou subitamente. Porquê?
Porque a Rússia, os países satélites e as «quintas colunas» soviéticas em muitas nações começaram tremenda campanha contra o Governo nacionalista espanhol, classificando-o de último reduto do fascismo e do nazismo.
O Mundo, ou, mais propriamente, as Nações Unidas, estavam animados de grande transigência com a Rússia. Julgavam aplacar o urso dando-lhe mais» alguma coisa a comer.
Em nome da liberdade, da democracia, da Carta do Atlântico e do direito que os povos têm de decidir dos seus destinos - disse-se à Espanha que ou mudava de regime ou seria excluída do convívio internacional.
O grande Churchill, que não tem papas na língua, verificou o erro e censurou-o asperamente. Soube prever. Estão na memória de todos as eloquentes manifestações espontâneas do povo espanhol contra a intervenção estrangeira. A reacção atingiu o delírio patriótico e aquilo que políticos imprevidentes julgavam ser um golpe contra Franco consolidou internamente o Governo nacionalista espanhol.
Um emigrado, adversário irredutível de Franco, mas mais arguto que os outros, por melhor conhecedor da sua própria raça, disse a alguém, logo que apareceu o primeiro relato telegráfico da UNO: «Ahora lo estropearan todo!»
Foi errada a táctica dos inimigos políticos de Franco. Nem acalmaram a Rússia, nem conseguiram modificar o regime espanhol.
Entretanto, vejamos se foi justa. Em resposta àqueles que classificam a Espanha de reduto fascista ou nazista, eu, que conheço intimamente o pais irmão, posso dizer que isso nunca foi nem poderia ser verdade.
Em primeiro lugar, a Espanha é profundamente católica; portanto, abomina os regimes totalitários. Em segundo lugar, a Espanha é altivamente patriota; por consequência, não aceitou, nem aceitaria nunca, comandos de países ou de doutrinas estrangeiras. Em terceiro lugar, os espanhóis distinguem-se de tantos outros povos pela sua inteligência subtil e viva; reconheceram que, ao invés de Portugal, havia duas nações que, apesar de terem chegado tarde e de terem jogado pela certa, pretendiam apresentar facturas. E os preços estavam sobrecarregados com juros exorbitantes.
A frase de Salazar encerrava um exemplo precioso que essas duas nações não souberam seguir. Teve o condão de pôr em confronto as atitudes do pequeno amigo e dos grandes amigos da Espanha.
Não existe dúvida de que havia espanhóis simpatizantes com a causa alemã ou italiana. Mas ninguém nega que a Espanha soube manter-se neutral, apesar da incómoda vizinhança alemã; e a sua política externa foi a que veio a ter expressão no bloco peninsular. A existência duma forte corrente Ítalo-alemã não pode constituir motivo de censura contra o Governo nacionalista espanhol; pelo contrário, torna ainda mais meritória a sua acção em prol da neutralidade.
E, mesmo quando a vitória parecia sorrir a Hitler e Mussolini, esse Governo manteve-se fiel ao tratado de amizade feito com Portugal. Porque o desejara? Precisamente para não se deixar envolver na aventura duma nova guerra internacional. Já lhe bastava ter sido teatro do ensino geral...
Sr. Presidente: vou terminar objectivamente, isto é, pelo relato de um facto que pouca gente conhece.
Depois do que direi: quem quiser entrar no subjectivo, tire as ilações possíveis:
Terminada a guerra, no dia da grande parada da vitória em Madrid, os portugueses, cuja designação de «Viriatos» simbolizava a defesa da Península Ibérica contra toda a invasão estrangeira, desfilaram com o pavilhão militar verde-rubro flutuando ao vento! Foi a única bandeira estrangeira admitida no destile, é essa excepção gloriosa parece o prenúncio da escolha da Espanha e da política que o bloco ibérico manteria durante a grande guerra mundial.

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Sr. Presidente: o ilustre Ministro dos Negócios Estrangeiros, Prof. Caeiro da Mata, chefe da delegação portuguesa à Conferência dos 16, propôs que a Espanha fosse convidada a colaborar na reconstrução e defesa da Europa. Sem ela, nem militar nem económicamente é possível ou fácil a tarefa.
Congratulo-me com tão justa, desassombrada e oportuna proposta, que honra, mais uma vez, o Governo de Portugal.
A sua política exterior, recta e cristalina, revela o sentimento das realidades e indica ao Mundo o caminho inevitável do futuro. Ninguém suponha que estas congratulações são filhas do meu amor por Espanha.
A presença do país irmão na assembleia internacional não constituirá beneficio principalmente dele. Será, sim, mais um serviço inestimável, imprescindível, cedo ou tarde requerido pela UNO, a prestar pela Espanha à civilização cristã, ou seja à grande causa da verdadeira liberdade e do verdadeiro progresso, não só da Europa mas do Mundo inteiro.
E, como muito bem disse o intemerato Presidente Truman, há momentos em que mais vale agir do que hesitar.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Como ontem preveni a Assembleia, deve ser hoje apreciado o parecer da Comissão de Legislação e Redacção sobre a situação parlamentar do Sr. Deputado Abranches Martins.
O parecer, já publicado no Diário das Sessões n.º 139, conclui pela perda de mandato do referido Sr. Deputado, por este ter aceitado o cargo de juiz conselheiro do Tribunal de Contas.
Está em discussão.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Tenho a dizer a V. Ex.ª que, ao ser dactilografado o parecer da Comissão de Legislação e Redacção, caiu um período e nenhum de nós deu conta disso.
Quero, por isso, referir qual o período que caiu e dizer ao mesmo tempo que o facto de ele não constar do parecer não altera em nada nem a doutrina nem as conclusões do parecer da Comissão de Legislação e Redacção.
É um período que aparecia a seguir ao primeiro ponto final da página 392, em que se diz assim:

Hoje, porém, estão equiparados aos juizes do Supremo Tribunal de Justiça, por força do artigo 1.º do decreto lei n.º 36:395, de 4 de Julho de 1947.

Essencialmente, este esclarecimento é preciso para significar que hoje os juízos conselheiros do Tribunal de Contas não tom direito à gratificação de presença de 150$ por cada sessão. É essencialmente isto que no período que caiu se dizia.
No entanto, Sr. Presidente, como disso a V. Ex.ª, isso não altera em nada nem a doutrina nem as conclusões do parecer.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Visto que mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai proceder-se à votação por escrutínio secreto, nos termos do Regimento.
Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Convido para, escrutinadores os Srs. Deputados Magalhães Pessoa e Ernesto Subtil.
Procedeu-se ao escrutínio.

O Sr. Presidente: - Está concluído o escrutínio, cujo resultado foi o seguinte: entraram na primeira uma 50 esferas pretas o 16 esferas brancas. Está, portanto, votado que o Sr. Deputado Abranches Martins perdeu o mandato.
Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão as Contas Gerais do Estado relativas ao ano de 1946. Tem a palavra o Sr. Deputado José Esquivei.

O Sr. José Esquivel: - Sr. Presidente: ao intervir no debate sobre as Contas Gerais do Estado de 1946 não desejo senão tratar de um capítulo especial das mesmas Contas, ou seja o nosso comércio externo e as suas repercussões na economia metropolitana.
Cautelosamente me vou encostar ao interessantíssimo relatório do nosso ilustre colega Sr. engenheiro Araújo Correia, e para ele, antes de tudo, envio as minhas felicitações.
O balanço do ano de 1946, no seu comércio externo, acusa um saldo desfavorável de 2.273:000 coutos, diferença entre o montante das importações, no valor de 6.859:000 contos, e o das exportações, de 4.586:000 contos. O deficit verificado indica um grave desnível da nossa balança comercial, para o qual é absolutamente necessário fixar a atenção, visto que ele se acentua muitíssimo mais do que no ano de 1947. Com efeito, dos elementos colhidos pelo Instituto Nacional de Estatística, que, embora não com carácter definitivo, no entanto não devem sofrer grande alteração, verifica-se que as importações montaram a 9.185:452 contos e as exportações a 4.244:000 contos, números redondos, o quo, para o ano de 1947, dá um deficit na balança comercial de 4.941:452 contos, números redondos, ou seja aproximadamente 5 milhões de contos.
A soma dos saldos desfavoráveis dos dois anos referidos dá a elevadíssima cifra de 7.214:000 contos, que, embora não corresponda a igual desnível na balança de pagamentos, nem por isso deixa de ser uma importantíssima sangria nas nossas disponibilidades cambiais.
Certamente era previsível, logo após a guerra, uma volumosa importação destinada não só a refazer os nossos stocks como a renovar e modernizar o nosso equipamento comercial, industrial e agrícola. Mas a verdade é que grande parte desta importância foi absorvida em artigos cuja necessidade não era premente.
Vários factores concorreram para tão grande desequilíbrio; uns de natureza mais ou menos temporária, outros de natureza permanente, mas uns e outros, no meu modo de ver, de possível correcção.
Vou abordar os factores que considero de maior importância. Em primeiro lugar, a nossa manifesta insuficiência de força motriz disponível, depois a acentuada insuficiência na produção agrícola e pecuária, a necessidade de reequipamento económico, volumosa importação de artigos supérfluos ou considerados de segunda necessidade e o continuo e sempre crescente aumento demográfico.
Vou, portanto, fazer uma pequena referência a cada um destes pontos:
Insuficiência de força motriz disponível. - Enquanto os trabalhos actualmente em curso para aproveitamento hidroeléctrico não estiverem concluídos não se pode contar com uma redução apreciável na importação de combustíveis, embora, num futuro não muito remoto, se possa vir a contar com uma considerável diminuição neste ponto.

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Insuficiência na produção agrícola e pecuária. - É a nossa lavoura quem mais fortemente contribui para a nossa exportação - cerca de 60 por cento.
Mas nem por isso deixa de ser grandemente deficitária em muitos produtos necessários à nossa alimentação.
Vimos reduzidas consideràvelmente não só a produção agrícola, como também a nossa riqueza pecuária, e, Sr. Presidente, as consequências fizeram-se sentir em consideráveis quantidades de carnes e gorduras que tivemos de importar, quando era problema que não existia antes da guerra de 1939.
A melhoria do ano agrícola de 1947 e do actual tem permitido, embora lentamente, a reconstituição das nossas possibilidades pecuárias.
Notam-se, Sr. Presidente, é certo, algumas desconexões que convirá corrigir. Citarei uma das que me ocorrem.
Em 1947, nos meses de Março e Abril, importaram-se quantidades apreciáveis de batata para consumo. Nos primeiros meses deste ano, na verdade, verificou-se um excesso de batata para consumo, e que, por não se poder exportar, se perdeu, sem proveito para ninguém.
Apetrechamento económico. - É uma necessidade premente, que não consente delongas. Será do rápido apetrechamento económico que deve resultar melhoria considerável na nossa balança comercial.
Volumosa importação de artigos supérfluos ou considerados de segunda necessidade. - A liberdade quase absoluta que temos desfrutado em matéria cambial é a culpada dos gastos excessivos e da prodigalidade com que desbaratamos as reservas de divisas tão laboriosamente acumuladas.
Nem faz sentido que numa Europa miserável e carecida do indispensável se ostente uma vida de luxo e de prazer, que só os lucros excepcionais da guerra - quem sabe, menos legítimos - permitem.
E não se pode dizer que o nível médio do nosso povo tenha subido. Todos os que vivem de remunerações certas tem de restringir as suas despesas e suportar dificuldades cada vez maiores na sua vida doméstica. Será neste particular que se terá de procurar remédio imediato, quer dividindo em classes as mercadorias importadas, colocando-as por ordem de necessidade e exercendo acção restritiva sobre as últimas, quer ainda dominando os câmbios, dificultando ou proibindo a concessão de divisas à importação de mercadorias menos necessárias.
Aumento demográfico. - A população da metrópole subiu em cerca de 3 milhões de almas nestes últimos cinquenta anos. Este aumento tornou-se mais acentuado nas últimas décadas, já porque aumentaram as dificuldades na emigração para o Brasil e Argentina, já pelo ritmo, sempre crescente, desse acréscimo.
É evidente que a sua consequência imediata é o aumento de consumo interno., que absorve não só parte da produção disponível, como vai pesar de maneira notável na importação.
Como o aumento de população desde 1900 anda à volta de 50 por cento, examinando o mapa n.º 2 do relatório do Sr. engenheiro Araújo Correia verifica-se também que nas importações a diferença em peso entre 1900 e 1946 é para mais, em 1946, de 50 por cento. Posso estabelecer que o aumento da importação correspondeu sensivelmente ao aumento da população.
Mas, em compensação, na comparação das exportações, dentro do mesmo período, verifico que houve um ligeiro acréscimo, aproximadamente de 170:000 toneladas.
Destas considerações pretendo concluir que, sendo a nossa balança comercial tradicionalmente deficitária, o esforço da Nação tem sido grande para suportar o pesado encargo* deste aumento populacional.
É incontestavelmente um factor que concorre, de maneira permanente, para o desequilíbrio da nossa balança comercial.
Verifico ainda pelo quadro n.º 1 do citado relatório, referido a milhares de escudos-ouro, em valores comparáveis, como a balança comercial tem sido sistematicamente deficitária, excepção feita aos anos de 1941, 1942 e 1943, beneficiados pelas exportações de matérias-primas necessárias às indústrias de guerra.
A nossa situação económica seria insustentável se não tivéssemos outras fontes, principalmente as economias de quantos portugueses se encontram espalhados por
esse Mundo, que alimentam as coberturas necessárias à nossa importação.
Assim temos vivido com uma balança de pagamentos equilibrada e com um desafogo cambial que bem atesta a importância daqueles recursos.
Chegou o momento de estar alerta e tomar as devidas precauções para que não sejamos surpreendidos pelos acontecimentos.
Em face da situação do nosso comércio externo, duas soluções se apresentam: ou subir as exportações até muito próximo do nível das importações, ou baixar as importações aproximadamente ao nível daquelas.
A primeira hipótese, que seria a solução ideal, à simples vista se verifica não ser de realização imediata. Basta atentar nos números publicados no suplemento de 1947 para reconhecer que a exportação relativa a 1947 baixou em tonelagem e valor respectivamente de 68:737 toneladas e 352:000 contos, números redondos.
De resto compreende-se que, a não ser a aparição de anos agrícolas excepcionalmente bons, isso não será possível senão quando o reapetrechamento económico estiver em execução.
Na segunda hipótese residirá a solução do momento.
Uma intervenção imediata nas importações e na concessão de cambiais em tudo que for considerado dispensável dará unia segurança e liberdade de acção que permitirá estudar com vagar a posição, actual.
Outros meios subsequentes visariam à adopção de métodos mais racionais de cultura, à intervenção técnica na adaptação dos terrenos às culturas mais apropriadas, reconstituição da riqueza pecuária e aproveitamento integral dos nossos recursos em força motriz.
Já hoje se fez aqui referência ao discurso do Sr. Presidente do Conselho de 25 de Novembro próximo passado.
A ele recorrerei para citar uma passagem que se refere à posição do continente africano em relação à Europa. Ocidental.
Na sua clarividente interpretação dos fenómenos económicos S. Ex.ª diz:
Uma política concertada de defesa e de valorização económica porá à disposição do Ocidente produtos e riquezas que aumentarão de maneira assombrosa as suas possibilidades de vida e a sua contribuição para o intercâmbio mundial. A África é uma base suficiente para a política que se deseje fazer. Efectivamente é grato constatar que as relações entre a metrópole e o seu império têm melhorado bastante nos dois últimos anos. Mas isso não é o suficiente para nos considerarmos ao abrigo de possíveis surpresas internacionais, que se reflectirão no nosso comércio de exportação.
No que se refere à importação, Angola e Moçambique estão em condições excepcionais para cobrir o nosso deficit de produtos alimentares.
O ponto é que se dotem com os meios necessários à remessa dos produtos em boas condições económicas.
Ainda o nosso Império reveste especial importância no que se refere ao problema demográfico. Dada a tendência do nosso povo para emigrar, é muito natural que,- mais tarde ou mais cedo, as correntes do emigração se orientem para aquelas duas grandes colónias. Mas não é de esperar que adquiram ritmo regular sem que, previamente, se tenha criado ambiente propicio.

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As várias tentativas de colonização oficial, que já vêm de longa data, embora não tenham correspondido à expectativa de quem as provocou, nem por isso deixaram de dar os seus frutos. Só assim se explica o forte arcaboiço que já hoje possuem, que não é mais do que o esqueleto de futuras nacionalidades.
A vida em África é rude e combativa, exigindo uma preparação cuidada e experiência do meio. Uma e outra custam dinheiro, que é pago pelo próprio colono, se trabalha por sua conta, ou por terceiro, se trabalha por conta de outrem. Isto é tão verdadeiro para funcionários como para particulares, qualquer que seja a sua categoria.
Não é dê admirar, portanto, que no balanço dado a uma determinada experiência de colonização se encontre um saldo negativo avultado, que à primeira vista é considerado em pura perda. Nestas contas não costumam considerar a experiência e a adaptação do colono, que esse saldo a maior das vezes representa, sendo indiscutível que o nosso colono tem qualidades excepcionais de adaptação.
Quando em 1929 se desencadeou a crise mundial dos preços encontrava-me em Angola dirigindo um dos grandes organismos económicos daquela colónia, e por isso tive ocasião de apreciar os efeitos dessa crise tanto na nossa colónia como nas colónias vizinhas.
Enquanto no Congo Belga e no Congo Francês a colonização espectaculosa, montada à base de grandes empresas, ruía estrondosamente e provocava a debandada em massa para as respectivas metrópoles, o português de Angola, que trabalhava por sua conta, fosse no comércio ou na agricultura, agarrou-se desesperadamente ao seu cantinho, sujeitou-se a todas as privações, mas não arredou pó donde estava.
Isto foi um alto exemplo de coragem, de tenacidade e de patriotismo, patriotismo que inconscientemente os faz vibrar na posse do lugar que ocupam. E aqui está o milagre da nossa colonização: o apego à luta e a coragem com que enfrentamos .as mais difíceis situações.
E, agora que me referi às gentes de Angola, não quero perder esta oportunidade sem testemunhar o meu apreço aos meus antigos companheiros de trabalho nessas terras e prestar-lhes a homenagem a que tem incontestável direito, pelo muito que tem contribuído pára o engrandecimento da nossa Pátria.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. António de Almeida: - Sr. Presidente: é indubitável que em cada ano o exaustivo parecer sobre as Contas Gerais do Estado, da autoria do nosso ilustre colega e eminente economista Sr. engenheiro Araújo Correia, constitui um documento notável, com enorme interesse político, financeiro e económico, que todos os portugueses cultos deviam ler e meditar; o exame das Contas dá o conhecimento perfeito da maneira como são aplicados os dinheiros .da Nação, do rendimento dos serviços públicos, da evolução dos múltiplos aspectos da vida administrativa.
Tal labor equivale a uma verdadeira devassa às engrenagens da colossal máquina do Estado, tudo tendente a fiscalizar e a emitir opinião no sentido de melhorar, quer pronunciando-se a favor do aceleramento da resolução de problemas tidos por mais instantes e da correcção das deficiências existentes, quer lembrando a necessidade de aumentar determinadas verbas insuficientes, quer ainda manifestando-se contra o que entende traduzir exagerado dispêndio de capital «em obras de natureza sumptuária, de puro gozo ou prazer, enquanto não forem estabelecidas as condições que permitam um muito maior acréscimo no rendimento nacional».
E um dos poucos departamentos públicos mais severamente atingidos por essas intenções restritivas é o Instituto para a Alta Cultura. Mas poderá o Instituto ser classificado entre as obras supérfluas ou de menor importância para Portugal? Serão as suas dotações orçamentais - 4:203 contos - que irão obstar à satisfação do preceito constitucional do equilíbrio das receitas e das despesas?
Muito nobremente, em todos os seus relatórios o Sr. engenheiro Araújo Correia afirma não ter o intuito de formular conceitos definitivos sobre os assuntos apreciados; no actual parecer, vincando melhor este ponto de vista, proclama-se:

Deseja apenas emitir o juízo, sujeito a correcção se for demonstrada a sua necessidade, de que o capital despendido por intermédio do Instituto para a Alta Cultura, no que se refere à formação de pessoal docente para as escolas e aperfeiçoamento do técnicos, não teve o rendimento que poderia e devia ter tido.

Sr. Presidente: velho bolseiro da Junta de Educação Nacional e do seu sucessor, Instituto para a Alta Cultura, que pensa alguma coisa saber das actividades deste proficiente organismo cultural e científico, vou tentar corresponder aos desejos do ilustre relator das Contas.
Porém, julgo necessário desde já afirmar que, consoante o artigo 22.º do decreto-lei n.º 26:611, de 19 de Maio de 1936, «ao Instituto para a Alta Cultura compete promover o aumento do património espiritual da Nação e a expansão da cultura portuguesa, como mais elevada expressão da finalidade educativa do Estado ...», objectivos que realiza por intermédio das suas subsecções de investigação científica e de relações culturais.
No entanto, e embora, como se vê, os fins do Instituto não visem, expressa e directamente ao incremento dos estudos económicos, estes nunca foram descurados, como passo a demonstrar.
Os elementos oficiosos de que vou servir-me obtive-os na secretaria do Instituto para à Alta Cultura, onde os colhi por esforço próprio, consultando os ficheiros e o arquivo - já que, mercê da escassez do pessoal administrativo (que trabalha devotada e incessantemente de dia e de noite, e até aos domingos, sem remuneração por serviços extraordinários), de outra maneira os não reuniria; eis, talvez, o motivo único por que o douto relator, deficientemente informado, foi induzido a produzir comentários bem pouco lisonjeiros para o Instituto.
Comecemos pela repartição das bolsas de estudo fora do País (desde a fundação do Instituto para a Alta Cultura), facto que tanto impressionou o Sr. engenheiro Araújo Correia; para ser mais explícita, a nossa arrumação difere um pouco da do autor do parecer.
O Instituto para a Alta Cultura concedeu 30 bolsas sobre os seguintes estudos agronómicos: 4, de genética vegetal, na Alemanha, Inglaterra e Suécia; 2, de química agrícola, na França; 2, de enologia e viticultura, na França e Alemanha; 3, de engenharia hidráulica, na França, Bélgica, Holanda e Alemanha; 3, de física do solo, na Inglaterra; 1, de mecânica do solo, na Inglaterra; 2, de microbiologia do solo, na Inglaterra e Estados Unidos da América; 1, de microbiologia agrícola, na Alemanha; 2, de fitopatologia, na Inglaterra; 1, de fisiologia vegetal, na Inglaterra; 1, de fitogeogra: fia e fito-sociologia florestais, nos Estados Unidos da América; 1, de agronomia e melhoramento de plantas, na Inglaterra; 1, de cultura de arroz, na Itália; 1, de sericicultura, na Itália e Estados Unidos da América; 1, de fabricação de papel, na Espanha; 1, de entomologia económica, na Espanha; 1, de estatística agronómica, na Inglaterra; 1, de aquicultura e piscicultura, na França; e 1, de silvicultura, nos Estados Unidos da América.

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O número de bolsas de estudo sobre matérias de engenharia foi de 19, assim distribuídas: 2, de resistência de materiais, na Bélgica e Estados Unidos da América; 1, de electricidade, na Inglaterra; 1, de radioelectricidade, na França; 1, de engenharia electrotécnica, na França, Bélgica, Alemanha e Suíça; 1, de sensitometria e electroacústica, na Espanha; 1, de metalurgia e electro-metria, na Alemanha; 1, de metalurgia e mineração, nos Estados Unidos da América; 1, de construção de motores e turbinas, na Suíça; 1, de construção de motores de explosão, na Inglaterra; 1, de materiais refractários, na Alemanha; 1, de engenharia mecânica, na Suíça; 1, de desenho de máquinas, na Espanha; 2, de engenharia aeronáutica, na Alemanha; 1, de técnica de sondagens, na Roménia: 2, de engenharia civil, na Suíça, França e Estados Unidos da América.
Foram dadas 8 bolsas de estudo sobre questões de interesse veterinário: 1, de avicultura, na Inglaterra: 1, de higiene do leite e técnica de lacticínios, na Inglaterra; 1, de profilaxia da tuberculose bovina, nos Estados Unidos da América; 3, de medicina veterinária, na Suíça, Itália e Alemanha; 1, de bacteriologia veterinária, na Inglaterra, e 1, de fecundação artificial, na Itália.
Concederam-se 4 bolsas de estatística matemática, na Inglaterra, e às ciências político-económicas e económicas propriamente ditas deram-se 3 bolsas na Inglaterra, Itália, França e Bélgica; para estudos de corporativismo distribuíram-se 2 bolsas e 2 para técnica actuarial aplicada à previdência social.
Elevou-se a 53 o número de bolsas compreendidas na rubrica Ciências: zoologia, botânica, física, electroquímica, química orgânica, mineralogia, geologia, geodesia, astronomia, meteorologia, geofísica, geografia física, geografia humana, antropologia e ciências naturais; 12 bolsas ocuparam-se de estudos matemáticos.
Subiu a 108 o número de bolsas destinadas a estudos de medicina: anatomia, anatomia artística, histologia, embriologia, química fisiológica, bioquímica, fisiologia, físico-química aplicada à medicina, anatomia patológica, anatomia patológica do sistema nervoso, inicrobiologia, bacteriologia, farmacplogia, análises clínicas, radiologia, anestesia, cirurgia, cirurgia de urgência, neurocirurgia, cirurgia experimental, cirurgia torácica, ortopedia, traumatologia, neurologia, psiquiatria, psiquiatria infantil, oftalmologia, urologia e venereologia, dermatologia, ginecologia e obstetrícia, tisiologia, cancerologia, cardiologia, micologia, malariologia, medicina experimental, estoma-tologia, vitaminologia, doenças da nutrição, epidemiologia, higiene racional e biologia da hereditariedade, problema das hormonas na sexualidade, medicina legal, antropologia criminal, ergoterapia, radiofisioterapia, transfusão do sangue, instalações hospitalares, etc.
Para educação física reservaram-se 11 bolsas, 1 para enfermagem e 1 para assistência social.
Concederam-se 5 bolsas de estudo de farmácia - estudos de farmacognosia (3 bolsas de farmacologia ficaram abrangidas pela rubrica medicina).
Aos estudos de direito couberam 9 bolsas: história do direito, processo civil, direito civil, direito privado, direito público, direito internacional, direito penal, e direito comercial, marítimo e aéreo; 2 bolseiros estudaram direito canónico.
Na rubrica das letras houve 86: 12 bolsas de filologia românica, 6 de filologia clássica, 19 de filologia germânica, 2 de árabe, 1 de bibliografia filológica, 1 de estudos de dialectologia, 4 de fonética, 1 de literatura comparada, 1 de bibliotecnia, 3 de filosofia, 14 de história, 3 de arqueologia, 1 de numismática e 18 de pedagogia - das quais 3 pertenceram ao ensino técnico profissional, 1 à organização do ensino agrícola e as demais visaram à especialização em psicologia experimental, reeducação de anormais, reorganização do ensino primário, etc.
Finalmente, aos estudos de urbanismo couberam 6 bolsas.
Sr. Presidente: se adicionarmos o número de bolsas de estudo incluídas nas várias divisões mencionadas, obteremos a totalidade de 361.
Para mais fácil elucidação, salientemos as percentagens equivalentes a cada uma das principais rubricas estabelecidas. Se reunirmos a agronomia, engenharia o veterinária no grupo das ciências aplicadas de feição económica, verificamos que as respectivas bolsas de estudo perfazem o número de 57, ou seja 15,78 por cento da totalidade (se àquele número juntássemos as 11 bolsas de estudos estatísticos, de ciências económicas, do corporativismo e de técnica actuarial aplicada à previdência social, obter-se-ia o montante de 68, circunstância que faria elevar a percentagem para 18,83). A percentagem dos bolseiros de medicina ascendeu a 28,53 e a de ciências e das letras, respectivamente, a 18 e 18,83 (ou 22,99, se nesta percentagem se incluírem as bolsas de pedagogia - subtraídas as 3 bolsas que se destinaram ao aperfeiçoamento do ensino técnico, agrícola e industrial); as percentagens correspondentes às restantes rubricas não as trago para aqui, por se mostrarem pequenas ou destituídas de valor para as considerações que estou a explanar.
Uma informação importante quero transmitir à Câmara: das 23 bolsas de estudo fora do País a conceder no ano corrente, 6 (cerca de 25 por cento) destinam-se a estudos genuinamente económicos: amostragem estatística, cito-genética dos trigos, engenharia (tecnologia, tecelagem, fiação e tinturaria), mecânica dos solos, métodos pedagógicos de ensino médio e engenharia metalúrgica.
Em face destes dados estatísticos, fica inteiramente provado que o Instituto para a Alta Cultura, dentro das suas possibilidades financeiras, não menosprezou os estudos dos problemas agrícolas e industriais da Nação, antes, pelo contrário, os estimulou, não obstante outros departamentos públicos (nomeadamente os dos Ministérios da Economia, Obras Públicas e Comunicações), frequentemente, terem enviado funcionários seus aos centros científicos estrangeiros a especializar-se e engrandecer o seu apetrechamento técnico e profissional.
Sr. Presidente: para que não se suponha que me esqueço das bolsas de estudo dentro do País, a estas desejo fazer breves alusões: trata se de pequenos subsídios mensais, concedidos a investigadores tirocinantes ou estagiários dos centros de estudo do Instituto para a Alta Cultura ou por este patrocinados com o objectivo de aqueles realizarem trabalhos novos ou concluírem os que iniciaram no estrangeiro, ou ainda, sob a orientação de mestres idóneos, se industriarem nos métodos ou técnicas laboratoriais, que hão-de tomá-los activos, probos e entusiásticos cultores das ciências puras e aplicadas, alçapremando-se às cátedras universitárias ou à ocupação de outros cargos importantes do País.
Igualmente os elementos estatísticos referentes às bolsas dentro do Pais evidenciam que o Instituto para a Alta Cultura teve em grande consideração o estudo das questões económicas ao conceder bolsas dentro do País. O número deste género de subsídios distribuídos, desde a fundação do Instituto, foi de 270, assim designados: 43 de assuntos económicos (8 de agronomia, 5 de veterinária, 13 de economia propriamente dita, 15 de engenharia e 2 do estatística matemática, 91 de ciências, 10 de matemática, 57 de medicina, 2 de direito e 67 de letras.
Se tirarmos as percentagens respectivas, obteremos: 15,92 para estudos económicos, 33,7 para ciências, 3,7 para matemática, 21,11 para medicina, 0,74 para direito e 24,81 para letras.
Chegou a ocasião, Sr. Presidente, de dar resposta conveniente às cinco graves perguntas que o ilustre

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relator das contas pòe a p. 97 do seu excelente parecer. Inquire ele: «Que eleitos práticos para o desenvolvimento cultural e económico do País tem a actividade dos bolseiros? Em que circunstancias e sob que aspectos vieram ou vêm exercer a sua acção em Portugal os indivíduos que estudaram ou praticaram em escolas, Universidades e laboratórios estrangeiros? Como foram aproveitadas pelo interesse nacional as verbas despendidas através do Instituto para a Alta Cultura? Melhorou apreciavelmente o ensino elementar, o dos liceus e outras escolas médias e o superior? Espalharam-se pela indústria ou agricultura os beneficiários das bolsas concedidas?».
Sr. Presidente: salvo para. os cientistas acreditados, por sobejamente haverem revelado as suas qualidades, nenhuma bolsa é dada sem que o interessado não seja candidatado por pessoa ou entidade pública ou privada, com quem ou onde o requerente trabalhe ou preste serviço e tenha patenteado atributos de inteligência ou propensão para a investigação científica. Quer dizer: o peticionário adquire a bolsa por direito de conquista que os méritos próprios lhe proporcionaram.
Eis porque, ao regressar ao País, raros são os bolseiros que não têm onde exercer a sua actividade, de harmonia com a sua especialização, dado que uma grande parte pertencia aos quadros docentes do ensino superior ou aspirava semelhante honra, ou desempenhava funções em serviços técnicos, agrícolas, industriais e de outra índole, públicos ou particulares.
Aliás, o Instituto para a Alta Cultura, ao anunciar o concurso para a concessão de bolsas de estudo no estrangeiro, declara taxativamente que «promoverá o melhor aproveitamento dos seus bolseiros, quer encaminhando-os para centros de ensino ou de estudo existentes no País, quer indicando-os ao Governo para os cargos ou serviços onde melhor possa exercer-se a competência por eles adquirida, mas o Instituto para a Alta Cultura não pode tomar qualquer compromisso de emprego futuro dos bolseiros»; nem esta é nem podia ser a sua missão!
Um breve exame do quadro professoral das nossas escolas superiores denuncia rapidamente que entre o escol dos seus mestres e assistentes se encontram numerosos antigos bolseiros do Instituto para a Alta Cultura, os quais, depois de melhorarem os seus conhecimentos no estrangeiro ou em centro de estudo nacionais, animados do mesmo fogo sagrado, prosseguem na elaboração dos trabalhos, na difusão de ensinamentos e formação das novas gerações, para honra sua e proveito espiritual e material da Nação.
No seio do Governo, nesta Assembleia, nos postos de comando da administração política e económica da Nação, no exército e na armada, nos mais altos sectores da ciência portuguesa, contam-se sempre os bolseiros do Instituto para a Alta Cultura!
Sem esta douta e benemérita instituição a nossa Pátria não haveria alcançado tão cedo o grau cultural e científico que hoje desfruta e causa a consciente admiração dos povos cultos; actualmente alguns dos nossos cientistas gozam de tamanha consideração internacional que, amiúde, são chamados a preleccionar cursos em Universidades e outros centros de investigação da Europa e da América.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Primum vivere deinde philosophare! Mas nem só de pão vive o homem! Duas verdades incontestáveis e que se completam; porém, para promover e consolidar o bem-estar financeiro e económico, que o ilustre Deputado Sr. engenheiro Araújo Correia tão patriòticamente reclama para o povo português, torna-se indispensável que entro nós tanto a cultura e a ciência
pura como a aplicada se desenvolvam em igual ritmo e incansavelmente. É preciso que o Instituto para a Alta Cultura continuo infatigavelmente a irradiar a sua profícua e salutar influência intelectual, de modo a impregnar todos os sectores da vida nacional, de aquém e de além-mar.
Tal desiderato só se conseguirá com o aumento das dotações deste douto organismo.
Se, na vizinha Espanha, o Conselho Superior de Investigação Científica - organismo similar do Instituto para a Alta Cultura-, em cada ano, aumenta as suas dotações de quantia igual à totalidade das verbas anuais do nosso Instituto!
Por tão brilhante e utilmente vir trabalhando, o Instituto para a Alta Cultura, uma das melhores realizações do Estado Novo, merece o respeito desta Câmara, de todos os portugueses e, especialmente, do Governo, que em cada ano, muito louvavelmente, amplia as verbas que lhe distribui.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Creio, Sr. Presidente, ter informado suficientemente a Assembleia sobre muitos dos benefícios resultantes da política do espírito adoptada pelo Instituto para a Alta Cultura; sob o ponto de vista económico, quero lembrar ainda o magnífico labor da Estação Agronómica Nacional, Laboratório de Patologia Vegetal Veríssimo de Almeida, Laboratório Ferreira Lapa, Estação Agrária Central, Laboratório de Tecnologia Florestal, Estação de Melhoramento de Plantas de Elvas, Estação Agrícola do Norte, Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, Direcções Gerais dos Serviços Hidráulicos, Agrícolas e Florestais e Aquícolas, etc., departamentos do Estado onde trabalham antigos ou actuais bolseiros do Instituto para a Alta Cultura.
As maravilhosas e arrojadas obras de engenharia civil e agronómica, executadas pelo Estado Novo com técnicos nacionais, nunca teriam sido uma realidade se muitos dos seus obreiros não houvessem recebido ensinamentos no estrangeiro, subsidiados pelo Instituto para a Alta Cultura, ou por intermédio de professores ou de orientadores que, como bolseiros, a escolas ou serviços estranhos foram buscar bagagem especializada e moderna.
Pena é, Sr. Presidente, que o Orçamento Geral do Estado não possa por enquanto dispor de fundos para se atingir o nível que requerem a nossa investigação científica pura e aplicada e a cultura nacional, de modo que aos bolseiros venham a ser dadas todas às condições laboratoriais e de experimentação que permitam o aproveitamento e valorização das suas aptidões profissionais ou pedagógicas.
No entanto, apesar dos obstáculos com que lutam, os nossos estudiosos não esmorecem em sen nobre labor; causa admiração ver como, por exemplo, no Hospital de Santa Marta um douto professor de cardiologia e os seus zelosos colaboradores fazem investigação científica, a mais actual e complexa, sobre tão difícil especialidade módica! Ali se têm realizado transcendentes experiências, cujo merecimento é encomiado pelas maiores figuras da medicina mundial.
Pelo fervor destes clínicos, graciosamente oferecido; pelo valor dos trabalhos científicos produzidos; pela presente necessidade de intensificar o estudo das doenças cardiovasculares - tamanho é o número de óbitos causados por estas enfermidades entre nós, cerca de duas e meia dezenas de milhares em cada ano - e até para bem do prestígio da Nação, impõe-se a criação de um centro ou instituto de cardiologia em Lisboa.
Sr. Presidente: temos um Instituto de Oncologia e um Instituto Nacional de Assistência aos Tuberculosos, que o Estado Novo vem subsidiando com merecido carinho

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e solicitude. Porque não existe ainda um serviço de assistência especializada para os cardíacos, um centro ou instituto de cardiologia nesta grande cidade? Morre-se, porventura, em Portugal, menos de doenças do coração do que de cancro e do tuberculose? O último Anuário Demográfico dá respostas cabais a estas perguntas.
Em 1946 faleceram de tuberculose pulmonar e de outras localizações 12:905 pessoas, de cancro 3:697 e de doenças do coração 13:817.
Se na rubrica «doenças do coração» incluirmos, como é lógico, os falecimentos por «outras doenças do aparelho circulatório» (1:807) e por. outras doenças arteriais - «hemorragia embólica ou trombose cerebral» (9:208)-, teremos achado uma totalidade de 24:832 óbitos por doenças cardiovasculares, cifra quase dupla da dos casos de morte por todas as formas de tuberculose S
Ora o doente cardiovascular carece de maior vigilância, tanto durante a sua hospitalização como nas consultas e em casa. Precisa ainda de ser estudado por meios especiais; se muitas cardiopatías são de origem infecciosa (sífilis, reumatismo, escarlatina, etc.), no grande contingente - hipertensão, arteriosclerose - é desconhecida ainda a causa basilar, e isto constitui um dos problemas fundamentais da medicina.
A doença coronária - um dos males mais importantes que afectam o homem - habitualmente é de origem arteriosclerótica. A arteriosclerose não aparece sómente no velho, é frequente no jovem, e a doença coronária mostra-se, bastas vezes, entre os 40 e 60 anos.
Como estudar o seu mecanismo e os meios de impedir o seu desenvolvimento? Só em centros especiais, onde haja aparelhagem e laboratórios especializados.
Se considerarmos agora outra forma de doenças cardiovasculares - as endocardites -, diremos que têm de ser vigiadas durante o período de cura e de acalmia, porque de um momento para o outro surge a forma recorrente ou a forma septicémica subaguda que mata, tantas vezes, sem que a sintomatologia chame a atenção do próprio doente. A profilaxia dessas complicações tem de se fazer em centros especiais.
Por outro lado, há doenças congénitas do coração e da aorta que vitimam sempre adentro de um determinado prazo; desde há quatro anos que se operam por cirurgiões especializados e se curam essas doenças quando diagnosticadas e tratadas. São necessários métodos especiais de diagnóstico e uma equipe de clínicos, da qual faz parte o radiologista, o electrocardiologista e o cirurgião.
E preciso atacar o problema (o estudo e o tratamento das cardiopatias) por várias facetas, compreendendo os enfermos hospitalizados e os ambulatórios, a profilaxia dos doentes cardiovasculares, o ensino especializado, a criação de especialistas, investigação clínica e o serviço social em benefício do cardíaco pobre.
Fizeram-no a Aústria, com o Instituto de Cardiologia de Viena, a Alemanha, com o Instituto de Cardiologia de Bade Mauheim, a Trança, com a Clínica de Cardiologia de Paris, a Argentina, o Brasil, o Chile, o México (com o melhor instituto de cardiologia do Mundo) e os numerosos departamentos de cardiologia dos Estadas Unidos da América do Norte e do Canadá.
Em Portugal, que eu saiba, só em Coimbra existe um centro de cardiologia médico-social, de carácter particular, mas vinculado à Faculdade de Medicina e instalado nos Hospitais da Universidade. Embora enfrentando bastantes dificuldades financeiras (vive graças, principalmente, ao generoso auxílio do (Subsecretariado de Estado da Assistência Social e ao da consulta externa hospitalar), esta instituição tem já uma obra notável, tanto no que respeita à investigação - patenteiam-no os estudos insertos em Coimbra Médica, muito apreciados pelos especialistas -nacionais e estrangeiros- e à
difusão de ensinamentos - testemunham-mo exuberantemente os temas das conferências do ciclo deste ano -, como no referente à actividade social que vem desenvolvendo.
Segundo o seu ilustre director, o Centro de Cardiologia Médico-Social de Coimbra propõe-se executar, no centro do País, o seguinte e cristianíssimo programa de medicina social: «auxiliar económicamente o cardíaco para que ele consiga fazer o tratamento devido; atender, quando tal convenha, o padecente no domicílio, de modo que ele, aí, possa seguir facilmente a terapêutica prescrita; melhorar as condições higiénicas da sua habitação ou as condições materiais do seu trabalho; promover a orientação vocacional dos cardíacos jovens, aconselhando-lhes o tipo de profissão mais compatível com as suas possibilidades físicas; reeducar profissionalmente os cardíacos adultos, orientando-os para mister mais suave, de forma a poderem, bastar-se a si próprios sem prejuízo da sua saúde; e, finalmente, amparar aqueles que tenham atingido os extremos de invalidez». Tão sedutoras aspirações só poderão tomar-se realidade com uma maior contribuição pecuniária do Estado, que, decerto, lha não regateará.
Sr. Presidente: como uma grande percentagem das cardiopatias (30 a 40 por cento) é de origem reumática (pericardites, miocardites, endocardites) e como a endocardite reumática (98 por cento das endocardites) -que constitui a avalancha de doentes que frequentam os hospitais e enchem as enfermarias- mata quase sempre por uma recorrência do processo reumático (endocardite recorrente), há a necessidade de criar num instituto de cardiologia um departamento ou secção de reumatologia, com 03 seguintes objectivos:
(1.º Investigação científica do reumatismo como processo alérgico determinante de doenças de diferentes órgãos (vasos, vísceras e serosas);
2.º Estudo das causas do reumatismo (factores extrínsecos a factores intrínsecos - infecções focais) e estabelecimento da sua profilaxia;
3.º Estudo do reumatismo cardíaco e tentativas para impedir a sua evolução;
4.º Estudo da endocardite recorrente reumática e processos de a evitar.
O departamento de reumatologia abrangeria a um tempo secções de investigação científica experimental, de clínica das diferentes formas agudas e crónicas do reumatismo e de medicina social do reumatismo e das cardiopatias reumáticas.
A profilaxia das doenças cardiovasculares assenta, além de outros de menor importância, em dois pilares fundamentais: a profilaxia da arteriosclerose e n- profilaxia do reumatismo.
Por estes dias vai abrir uma consulta de cardiologia no Hospital de- Santa Marta, que ambiciona ser o embrião de um futuro centro ou instituto de cardiologia e de reumatologia da capital do Império. O serviço que uma dúzia de clínicos especializados ali vai prestar é completamente gratuito e a aparelhagem de que se servem foi adquirida a expensas da algibeira do seu ilustre director! Creio, Sr. Presidente, que o Subsecretário de Estado da Assistência Social e o Instituto para a Alta Cultura se esforçarão por ajudar a criar, a viver e a progredir o referido organismo, tamanha é a sua utilidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: permita-me V. Ex.ª que, a seguir, foque outro passo do substancioso relatório das contas, que, sem exagero, reputo de sombrias consequências para a Nação; refiro-me à redução, a menos de metade, do número dos alunos da Escola Superior Colonial,

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que em 1940-1941 foi de 257 e em 1945-1946 desceu a 124, ou seja de 51,8 por cento.
«Com efeito, semelhante facto, que causou profunda surpresa em toda a gente «estranha a este estabelecimento de ensino, desde há anos traz apreensivos não só as pessoas que ali preleccionam zelosa e patriòticamente, mas também aqueles que, directa ou indirectamente, têm responsabilidades na administração e progresso material e espiritual das parcelas do nosso imenso Império de além-mar.
Quando, a partir do ano lectivo de 1940-1941, em todas as escolas universitárias do País (com excepção da Universidade Clássica de Lisboa, que, de 3:703 alunos em 1940-1941, passou a ter 3:640 em 1945-1946) cresceu o número dos seus frequentadores em proporções consideráveis (a Universidade de Coimbra aumentou 61,3 por cento, a do Porto 34,2 por cento e a Técnica 45,4 por cento), a Escola - Superior Colonial, a escola de formação intelectual e «moral dos futuros servidores do ultramar, em 1945-1946 viu diminuir o montante dos seus alunos em mais de metade.
Quais serão os factores fundamentais de tão alarmante situação? Julgo de meu dever salientar alguns dos obstáculos que considero responsáveis por esta tão grave e aflitiva posição escolar, a fim de o Governo poder removê-los o mais depressa e apropriadamente.
A instituição do curso colonial português já em 1878, fora aprovada calorosamente em sessão pública da Sociedade de Geografia, exactamente na época em que os problemas da África começavam a atrair a atenção das grandes potências europeias, e na Inglaterra, Holanda, França, Alemanha e em outros Estados se haviam instituído estabelecimentos de ensino superior ultramarino.
Quisera contribuir-se, para evitar o conhecido e triste desfecho da Conferência de Berlim de 1885, mas, mau grado nosso, o ambiente político e social do último quartel do século XIX não era propício a traduzir em realidade objectiva a oportuníssima sugestão da Sociedade de Geografia; apesar disso, poucos anos depois II proposta, agora mais ampla e actual, foi renovada com a apresentação à mesma instituição do magnífico plano do Instituto Oriental e Ultramarino Português.
Pois, não obstante a gravidade das circunstâncias, só decorridos cinco anos depois da realização do I Congresso Nacional Colonial (1901) é que viria a fundar-se 11 Escola Colonial - curso com dois anos de duração e oito cadeiras, destinado a preparar funcionários para o ultramar e Ministério das Colónias, o qual podia ser frequentado por indivíduos com o curso geral dos liceus, por diplomados com cursos universitários ou das escolas militares e por funcionários do Ministério das Colónias.
Sr. Presidente: o exame de um mapa que transcrevo dá ideia perfeita da evolução da frequência da Escola Colonial, desde a sua fundação até aos nossos dias:

1906-1907 (fundação).......... 14
1907-1908 .................... 15
19U8-1909 .................... 27
1909-1910 .................... 28
1910-1911 .................... 23
1911-1912 .................... 27
1912-1913 .................... 92
1913-1914 .................... 87
1914-1915 .................... 57
1910-1916 .................... 24
1916-1917 .................... 11
1917-1918 .................... 12
1918-1919 .................... 9

1919-1920 (1.ª reorganização)... 16
1920-1921 .................... 25
1921-1922 .................... 22
1922-1^23 .................... 38
1923-1924 .................... 40
1924-1925 .................... 51
1925-1926 .................... 51

1926-1927 (2.ª reorganização) .. 63
1927-1928 .................... 57
1928-1929 .................... 59
1929-1930 .................... 78
1930-1931 ....................104
1931-1932 ....................106
1932-1933 ....................135
1933-1934 ....................141
1934-1935 ....................118
1935-1936 ....................168
1936-1937 ....................170
1937-1938 ....................179
1938-1939 ....................182
1939-1940 ....................192
1940-1941 ....................257
1941-1942 ....................350
1942-1943 (exame de admissão) ..223
1943-1944 ....................186
1944-1945 ....................163
1945-1046 ....................124

1940-1947 (3.ª reorganização) .. 78
1947-1948 ................(a) 135

(a) Curso superior colonial ............. 48
Curso de administração colonial.......... 35
Curso de altos estudos coloniais ........ 52

Em 1919, a Escola foi reformada e considerada superior, passando a ter três anos de extensão e doze cadeiras e a exigir o 7.º ano dos liceus ou habilitações equivalentes aos seus alunos; a média dos estudantes, que era de 31,22 até àquela data, na vigência da nova organização atingiu 34,71.
Com o advento do Estado Novo a Escola sofreu nova reorganização, que vigorará até 1945-1946; ficou a denominar-se Escola Superior Colonial, o curso tinha quatro anos e dezasseis cadeiras, o plano de estudos tornou-se mais complexo e trabalhoso, continuando a ser frequentado por candidatos às carreiras coloniais, civis ou militares.
O número de alunos da Escola aumentou consideràvelmente: de 63 em 1926-1927, ascende a 350 em 1941-1942; a frequência média entre os dois anos lectivos limites de vigência da 2.º reorganização (1926-1927 e 1945-1946) elevou-se a 103,15.
Em 1942 cria-se o exame de admissão à Escola, nos moldes universitários, e, como era de esperar, a sua frequência diminuiu: 223 em 1942-1943 e 124 em 1945-1946; no entanto, a média de estudantes entre 1926-1927 e 1941-1942, que foi de 85,47, duplicou no período decorrente até 1945-1946, apesar de com o exame de admissão, a cifra de alunos baixar sensível e progressivamente (de 127 em 1942-1943; de 37 em 1943-1944; de 23 em 1944-1945, e de 39 em 1945-1946), por virtude de naturalmente, haver diminuído o número de candidatos à matrícula no 1.º ano.
Em 1946 a Escola Superior Colonial foi reorganizada pela terceira vez; manteve-se a exigência da aprovação no 7.º ano dos liceus ou habilitações equivalentes, exame de aptidão, o curso superior colonial é substituído pelo curso de administração colonial - com três anos de extensão, destinado a preparar funcionários do quadro administrativo ultramarino e do Ministério das

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Colónias - e criou-se o curso de altos estudos coloniais, para ser frequentado por indivíduos diplomados com um curso universitário ou com longa permanência ultramarina, o qual se pretende venha a ser a escola de governadores e de outros altos cargos do Império.
No 1.º ano lectivo da vigência desta reforma a Escola assiste à queda de quase metade da sua frequência: de 124 no amo lectivo precedente, passa a 78!
Presentemente, nos cursos superior colonial e de administração colonial estão matriculados 83 alunos (28 no 1.º ano, 7 no 2.º, 19 no 3.º e 29 no 4.º), e 52 no curso de altos estudos coloniais (inaugurado no ano lectivo corrente), cifras que, somadas, alçam a frequência da Escola a 135 - frequência teórica, aliás, porquanto, com as desistências observadas nos três cursos, o número de alunos nesta altura do ano encontra-se já reduzido a 114.
O Sr. Henrique Galvão: - V. Ex.ª dá-me licença.?
Há, portanto, uma coincidência entre o princípio da vigência da reforma e essa redução que V. Ex.ª apontou.

O Orador: - Se V. Ex.ª quiser esperar alguns minutos, obterá a devida resposta.
Sr. Presidente: apresentados os documentos estatísticos, tentemos explicar as mutações sofridas pela frequência da Escola Colonial. Até 1915 o número dos alunos medrou lenta anãs progressivamente, sobretudo no ano de 1913, com a matrícula de ex-seminaristas provenientes de Cernache do Bonjardim.
De 1916 a 1919 a frequência da Escola desceu enormemente; eram os efeitos da Grande Guerra, em que comparticipáramos e para onde haviam partido alguns dos seus alunos, oficiais milicianos e do activo (estes últimos tinham licença e regalias, especiais quando cursassem a Escola Colonial). Também, nos diplomas legais, aos civis não faltavam preferências de nomeação para os cargos ultramarinos, prerrogativas, todavia, amiúde menosprezadas!
A partir de 1920 o - número de alunos volta a subir, embora hesitantemente; é que não só regressavam à Escola muitos dos - seus antigos alunos, mas igualmente se inscreveram! novos estudantes, oficiais do exército e da armada (para quem se estabeleceram mais privilégios) e civis, que, graças ao interesse público e privado pelas questões coloniais, suscitado pela Conferência de Versalhes, se sentiam atraídos para o ultramar, onde abundavam funções a exercer.
Evidentemente, o montante de alunos da Escola estava ainda muito longe de ser proporcional às necessidades da nossa administração ultramarina; muitos jovens deixavam de se matricular, tão certos estavam de que o favoritismo político supriria a ausência de preparação intelectual, que bem trabalhosamente teriam de adquirir na Escola Colonial!
É depois da reorganização de 1926 que o aumento da frequência da Escola Superior Colonial alcança proporções até então inigualadas.
A publicação de múltiplos e importantes diplomas de carácter colonial agitou a opinião pública, impressionou o espírito da nossa juventude; os oficiais das forças armadas, desfrutando das garantias mencionadas, inscreveram-se em maior número; a categoria da Escola levou a cursá-la advogados, médicos, engenheiros, professores do liceu, etc.; a legislação contém novas disposições favoráveis ou proclama a observância integral dos privilégios existentes para os diplomados pela Escola (a quem pertencem 50 por cento das vagas anuais do quadro administrativo colonial, admissão nas secretarias municipais do ultramar e nos serviços do Ministério das Colónias, das alfândegas coloniais e do Instituto Nacional de Estatística), e autoriza muitos funcionários ultramarinos a cursar a Escola em circunstâncias excepcionalmente benéficas.
Sr. Presidente: vários motivos têm ajudado a diminuir a frequência da Escola Superior Colonial antes e depois da reforma de 1946. O primeiro, na ordem cronológica, corresponde à ausência de oficiais do exército e da armada, por não lhes ser dada licença para estudo depois de 1932; este inconveniente, afectando a população escolar do estabelecimento, tem impedido a especialização de muitas e prestantes individualidades de que o Império tanto carece.
Segue-se a instituição do exame de admissão, solicitada pelo conselho escolar, não tanto por acreditar nas virtudes seleccionadoras da prova, como principalmente pela impossibilidade material e pedagógica que havia de preleccionar a mais de três centenas e meia de estudantes.
Está claro que o exame de admissão concorreu bastante para reduzir o número de alunos da Escola, se bem que o montante (entre 40 e 50) de candidatos ao exame nos dois primeiros anos e o dos funcionários vindos das colónias (aspirantes, chefes de posto e secretários de circunscrição) permitisse que anualmente se diplomassem 25 ou 30 indivíduos - a cifra aproximada de unidades que em cada ano o quadro administrativo ultramarino pede à Escola Colonial.
Em 1944 um despacho ministerial suspendeu a inscrição de funcionários coloniais. A falta, destes alunos sentiu-se grandemente, quer pelo número e qualidade, quer pela ambiência característica ultramarina, que auxiliavam a estimular e a robustecer; o não cumprimento desta prerrogativa legal obsta a que muitos, modestos mas prestimosos servidores de além-mar, conquistem os postos superiores da administração, que só por esse motivo atingiriam.
Os diplomados da Escola sómente muitos meses após a terminação do curso são nomeados chefes de posto estagiários, e nas colónias frequentemente deixam de ser promovidos a secretários de circunscrição ao fim de um ano de estágio - conforme determinação legal - e, pior ainda, por necessidade de serviço, em vez de os colocarem em apropriadas circunscrições administrativas para se familiarizarem com as questões práticas locais, enviavam-nos para afastados lugares, longe de quem os guie segura e humanamente aios seus primeiros contactos com as realidades do interior.
Estes últimos inconvenientes, unidos à desesperança de poderem ostentar um título académico - ainda que nas condições de admissão e de matrícula, no número de anos e de cadeiras, em obrigações pedagógicas e ao nível do ensino e complexidade das matérias a Escola Superior Colonial se equiparasse aos cursos da Faculdade de Ciências e do Instituto de Ciências Económicas e Financeiras -, têm contribuído eficazmente para que a juventude lusitana se afaste da Escola Superior Colonial.
Actualmente, Sr. Presidente, aos impedimentos mencionados outros se juntaram para anais comprometer a frequência escolar: proibição da matrícula a pessoas do sexo feminino; fixação de limite máximo de idade para a inscrição; sujeição a rigoroso exame médico antes da matrícula; falta de período transitório para antigos alunos; existência de múltiplas e difíceis obrigações escolares; e, por fim, o óbice maior de todos - a não concessão de títulos académicos.
A presença de alunas na Escola jamais prejudicou a sua disciplina; das que frequentaram o curso superior colonial quase todas casaram com antigos condiscípulos é embarcaram para o ultramar, e as que ficaram na metrópole encontram-se a desempenhar funções no Ministério das Colónias ou em suas dependências,

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dignamente e a contento de seus superiores hierárquicos.
Se a Alemanha, sem colónias, e a Itália não só autorizavam as raparigas a frequentar os numerosos cursos coloniais que possuíam, mas até para elas criaram escolas especiais de preparação ultramarina!
Não se descortinam sólidos argumentos para condenar a matrícula de alunas no curso de administração colonial, tanto mais que elas estão impedidas por lei de ocupar cargos administrativos coloniais; pelo contrário, a sua inscrição acha-se interessante e extremamente útil, visto que, além de ser necessário ampliar-se cada vez mais a mentalidade imperial portuguesa - e ninguém melhor do que as mulheres cultas o poderão conseguir-, esposas conhecedoras das coisas coloniais são companheiras insubstituíveis de quem vai servir a Nação em paragens longínquas, tantas vezes desprovidas de conforto e bem-estar!
Fixou-se em 25 anos o limite máximo da idade para a inscrição de alunos no curso de administração colonial. Ora é do conhecimento geral que a lei nega a qualquer indivíduo a faculdade de ingressar nos quadros administrativos de além-mar com mais de 30 anos e nos serviços públicos da metrópole com idade superior a 35; por consequência, todas as pessoas a quem estas garantias não aproveitem, ao tirarem o referido curso, pensam em alargar a sua bagagem cultural, por diletantismo ou com o propósito de dela se servirem para se colocarem em empresas particulares ultramarinas, tudo, enfim, resultando a bem dos interessados e da expansão dos conhecimentos sobre as possessões coloniais portuguesas.
Replicar-me-ão que há disciplinas, como a Educação Física e o Campismo, que não podem ser frequentadas por raparigas nem por pessoas de idade algo adiantada; a primeira objecção rebate-se com o exemplo do Instituto Superior Técnico, curso onde as alunas são dispensadas de comparência nesta aula, e a segunda desfaz-se dizendo que os estudantes com idades avançadas, por nunca virem a tomar posse de cargos públicos ultramarinos, naturalmente devem subtrair-se a essa obrigação escolar.
Sujeitam-se os candidatos à matrícula no curso de administração colonial a minucioso exame médico, realizado pela Junta de Saúde das Colónias. Trata-se de medida absolutamente dispensável, porquanto os alunos dispõem de assistência médica na Escola, e, principalmente, porque antes de se ausentarem para as colónias os funcionários haverão de ser de novo observados por aquela entidade sanitária; evitar-se-á uma duplicação de serviços, e se há jovens sem a robustez física aconselhável para o exercício de funções públicas no ultramar, isso de modo algum quer significar que eles não sejam dotados de constituição corporal compatível com o desempenho de cargos em organismos dependentes do Ministério das Colónias, no Instituto Nacional de Estatística e em outros serviços do Estado ou particulares para que se exija o diploma de um curso universitário não especificado.

O Sr. Henrique Galvão: - Estou absolutamente de acordo com todas as considerações de V. Ex.ª, excepto nessa parte que diz respeito à preparação física. Acho bem todas as exigências que se façam em matéria de aptidão e preparação física, mas o que acho mal é o desenvolvimento que o curso tem e que excede as necessidades da função.

O Orador: - Eu concordo inteiramente com a existência das disciplinas de Educação Física e Campismo na Escola Superior Colonial; todavia, penso que tal preparação devia reservar-se para os alunos que se destinem
aos quadros públicos coloniais e não para quem vá frequentar o curso de administração colonial apenas com o objectivo de ampliar a sua cultura - como são aqueles indivíduos que, pela sua idade, já não podem vir a exercer cargos que a lei guarda para os diplomados com o referido curso.

O Sr. Henrique Galvão: - Essa selecção devia fazer-se antes e não depois de entrarem para a Escola.

O Orador: - Aceito que haja uma inspecção médica mais benévola, da índole da que se faz no Instituto Superior Técnico, mas sómente para os estudantes que se inscreverem com idade inferior a 30 anos, porque são estes os únicos que podem concorrer às carreiras ultramarinas ou vir a colocar-se no Ministério das Colónias. Essa inspecção podia ser realizada, perfeitamente, pelo médico escolar - tal qual ocorre no Instituto Superior Técnico-, a quem cabe, segundo disposição legal, prestar assistência e vigiar a actividade desportiva dos alunos da Escola Superior Colonial.
Os estudantes com idade superior a 80 anos não seriam submetidos ao exame médico.
Dir-se-á que as pessoas nestas condições podem matricular-se no curso de altos estudos coloniais, em que não há inspecção módica nem ginástica. Isso será possível apenas se eles forem diplomados com um curso superior ou hajam permanecido, pelo menos, cinco anos em território colonial.

O Sr. Mendes Correia: - V. Ex.ª dá-me licença? V. Ex.ª admitiria uma categoria especial de alunos nessas condições?

O Orador: - Exactamente.
Mas, Sr. Presidente, ainda há outros males a pôr em evidência.
Proibiu-se a conclusão do curso superior colonial - que termina em 1948-1949 - a dezenas de alunos que, por motivos vários, houveram de interromper, os estudos, quando era justo admitir um período transitório sem limite, como sucede nos cursos universitários.
O regime pedagógico a que os alunos do curso de administração-colonial estão submetidos, mercê da sua severidade, não é de molde a captar o interesse dos novos: 8 disciplinas no 1.º ano, 7 no 2.º e 7 no 3.º, respectivamente com 25, 23 e 24 tempos de aulas semanais, teóricas e práticas, todas obrigatórias; aquisição de prática em um posto meteorológico durante um mês ou mais; encargos com a aprendizagem de natação, condução de automóveis, compra de farda, estágio gratuito no Ministério das Colónias e disciplina comparável à das escolas de preparação militar.
É certo, Sr. Presidente, que só indivíduos fortes física e moralmente e com sólida formação moral possuirão os requisitos necessários a quem pretende abraçar a carreira administrativa colonial; ali a vida é muito dura, cheia de contrariedades de toda a ordem, bem diferente da que levam os funcionários da metrópole. Por isso mesmo, para não escassearem os alunos no curso de administração colonial, tratem-se os jovens obreiros do ultramar como eles merecem; e se não é possível, como sucede em França, subsidiar os alunos deste curso (na Escola Nacional da França do Ultramar cada estudante tem vencimento certo, aumentado com o seu casamento), ao menos acarinhemo-los - tão grave e espinhosa é a missão que lhes incumbe: veicular a nossa cultura e civilização nas portuguesíssimas terras de além-mar.
Façamos-lhes justiça, dignifiquemo-los, concedendo-lhes o direito de usar um título académico! Eis, Sr. Presidente, o segredo mágico que, quando considerado, fará acorrer à Escola os numerosos e qualificados estudantes,

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à semelhança do que acontece nas nossas restantes escolas superiores! A reunião dos cursos na Universidade Técnica foi um dos poderosos factores do acréscimo da frequência que hoje tem.
Porque se não deu ainda à Escola Superior Colonial a faculdade de conceder graus académicos, se, agora, em tudo o mais o seu plano de estudos é análogo ou superior aos da maioria dos cursos universitários portugueses? Análogo ou superior, repito, no número de anos e em altura cientifica, pois que, quanto a dificuldades e obrigações - di-lo o Prof. Mendes Correia, Mestre insigne, com mais de três dezenas e meio de anos de exercício docente na Universidade do Porto -, não há nenhuma carreira universitária que ultrapasse a da Escola Superior Colonial!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, como já dissemos, antes da reorganização de 1946 o curso superior colonial - 4 anos de extensão, 16 cadeiras e 48 tempos de aulas semanais - equivalia aos das Faculdades de Ciências e do Instituto de Ciências Económicas e Financeiras; actualmente, a Escola compreende dois cursos: o de administração colonial, com 3 anos de duração, 22 disciplinas e 72 tempos de aulas semanais, e o de altos estudos coloniais, com 2 anos, 8 cadeiras e 24 tempos de aulas em cada semana; os dois cursos, completando-se (o segundo constitui a cúpula natural do primeiro), não desmerecem, sob qualquer aspecto, dos das Faculdades de Direito, Agronomia, Farmácia e Medicina Veterinária, cada um com õ anos de extensão e, decerto, com menor número de cadeiras - em regra, em cada ano destas escolas universitárias não há mais de 4 ou 5 cadeiras ou cursos semestrais.
Sr. Presidente: desde há longos anos que as escolas superiores coloniais ou não, universitárias ou independentes, das maiores nações dão graus académicos aos seus diplomados; sucedia isto em muitas escolas e Faculdades da Alemanha e da Itália e verifica-se, modernamente, na Holanda, Inglaterra, na França e, recentemente, na Bélgica - povo com a terça parte da extensão territorial do nosso Pais e bom menores responsabilidades colonizadoras -, onde há a Universidade Colonial de Antuérpia e dois cursos ultramarinos na Universidade Católica de Lovaina, que concedem licenciaturas e doutoramentos.
Converta-se a Escola Superior Colonial em Faculdade de Ciências Coloniais, já que ainda não quisemos criar a Universidade Colonial Portuguesa! E vem a propósito perguntar: porque não possuímos uma Universidade Colonial, tanta vez solicitada pelos maiores colonialistas portugueses de todos os credos políticos? Se temos a Escola Superior Colonial, com o seu Instituto de Línguas Africanas e Orientais, o Instituto de Medicina Tropical, o Jardim e Museu Agrícola Colonial, o Arquivo Histórico Colonial e outros sectores culturais dependentes do Ministério das Colónias, com os futuros museu e biblioteca do Império, quão fácil seria reuni-los a todos, articulá-los num único organismo - a Universidade Colonial Portuguesa. Com encargos financeiros modestos, em cada ano edificaríamos essa esplendorosa obra, cujos reflexos espirituais e políticos muito brevemente se fariam apreciar internacionalmente.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Era a nossa quinta Universidade? Que importava? Quantas Universidades possui a Suíça, para só aludir a um país muito mais pequeno, continentalmente, do que o nosso? Sete.
Uma Universidade é sempre fonte viva de ciência e de cultura e pelo seu número se aquilata o grau de adiantamento civilizador de uma nação. E entre nós há clima apropriado à criação do uma Universidade Colonial - reclamada pelo nosso brio patriótico de povo colonizador por excelência, imposta pelos nossos quinhentos anos de actividade ultramarina, reconhecida pelas grandes potências coloniais do Mundo. A cada passo, dos Ministérios coloniais e das Universidades inglesas, belgas, francesas e holandesas chega correspondência à Escola Superior Colonial, endereçada ao director da Universidade Colonial!
Parece que os estrangeiros ilustres e conhecedores da nossa portentosa tarefa ultramarina não concebem a não existência em Portugal de tão alto centro de investigação e de ensino das ciências de aplicação colonial!
Sr. Presidente: estou absolutamente convencido de que se não for oportuna a fundação da Universidade Colonial Portuguesa, ao menos, a Escola Superior Colonial - o estabelecimento de ensino mais nacionalista do País - irá merecer a atenção do Governo, no sentido de serem revistos, brevemente, alguns dos passos da actual reorganização e de se introduzirem disposições que satisfaçam as legítimas aspirações dos seus alunos e diplomados, de que eu julgo ter sido, nesta tribuna, fiel porta-voz; só então, apesar dos indispensáveis sacrifícios e exigências do plano de estudos, a frequência dos alunos do curso de administração colonial se elevará suficientemente, para que todos os departamentos ultramarinos recrutem funcionários aptos e em número bastante para acudir às suas crescentes necessidades.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É, sobretudo, de diplomados por este curso que as nossas possessões carecem urgentemente.
O curso de altos estudos coloniais continuará a ver aumentar o montante de seus alunos, constituído pelos diplomados com um curso universitário ou das escolas militares, por funcionários superiores ultramarinos e, preponderantemente, pelos filhos espirituais da Escola - que, já portadores de uma boa folha de serviços, regressarão para actualizar a sua cultura, evidenciar os frutos da sua experiência e conquistar o ansiado título académico e a possibilidade de ascenderem aos mais altos lugares da governação do Império!
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. O debate sobre as Contas Gerais do Estado, para o qual ainda estão inscritos alguns oradores, deve terminar amanhã com a intervenção do Sr. Deputado Araújo Correia, relator do respectivo parecer.
A ordem do dia da sessão de amanhã será a mesma da sessão de hoje: discussão das Contas Gerais do Estado e das contas da Junta do Crédito Público.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Júdice Bustorff da Silva.
Henrique Carlos Malta Galvão.
João Ameal.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Pereira dos Santos Cabral.
Manuel França Vigon.

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Manuel Maria Múrias Júnior.
Querubim do Vale Guimarães.
Ricardo Malhou Durão.
Teotónio Machado Pires.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhães.
Alberto Cruz.
António Maria Pinheiro Torres.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Augusto Figueiroa Rego.
Artur Proença Duarte.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Diogo Pacheco de Amorim.
Eurico Pires de Morais Carrapatoso.
Fernão Couceiro da Costa.
Gaspar Inácio Ferreira.
Henrique de Almeida.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Horácio José de Sá Viana Rebelo.
Indalêncio Froilano de Melo.
Jacinto Bicudo de Medeiros.
João Antunes Guimarães.
João Carlos de Sá Alves.
João Garcia Nunes Mexia.
Joaquim de Moura Relvas.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Maria Braga da Cruz.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
José Nunes de Figueiredo.
José Penalva Franco Frazão.
José Soares da Fonseca.
Luís Lopes Vieira de Castro.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel de Abranches Martins.
Manuel Beja Corte-Real.
Manuel Marques Teixeira.
Mário Borges.
Mário Lampreia de Gusmão Madeira.
Rafael da Silva Neves Duque.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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