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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 154
ANO DE 1948 30 DE ABRIL
ASSEMBLEIA NACIONAL
IV LEGISLATURA
SECÇÃO N.º 154, EM 29 DE ABRIL
Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
Secretários: Exmos. Srs.
Manuel José Ribeiro Ferreira
Manuel Marques Teixeira
SUMÁRIO:-O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 55 minutos.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Deputado Pinto Basto requereu várias informações sobre a orquestra sinfónica da Emissora Nacional.
Ordem do dia. - Continuou a discussão do artigo 13.º do parecer da Câmara Corporativa acerca do projecto de lei do Sr. Deputado Sá Carneiro.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Mendes do Amaral, Antunes Guimarães, Querubim Guimarães, ALbano de Magalhães, Sá Carneiro e Bustorff da Silva.
O Sr. Presidente encerrou u sessão às 13 horas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 10 horas e 40 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhães.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Finto dos Reis Júnior.
Alexandre Ferreira Pinto Basto.
André Francisco? Navarro.
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
Manuel José Ribeiro Ferreira Manuel Marques Teixeira
António Maria do Couto Zagalo Júnior.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Belchior Cardoso da Costa.
Diogo Pacheco de Amorim.
Enrico Pires de Morais Carrapatoso.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique de Almeida.
Henrique Carlos Malta Galvão.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
João Antunes Guimarães.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Alçada Guimarães.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Luís da Silva Dias.
José Maria Braga da Cruz.
José Soares da Fonseca..
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Luís António de Carvalho Viegas.
Luís Cincinato Cabral da Costa.
Luís da Cunha Gonçalves.
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Luís Lopes Vieira de Castro.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Mendes de Matos.
Luís Teotónio Pereira.
Manuel Colares Pereira.
Manuel França Yigon.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Marques Teixeira.
D. Maria Luisa de Saldanha da Gama Van Zeller.
Mário Borges.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Mário de Figueiredo.
Querubim do Vale Guimarães.
Ricardo Spratley.
Rui de Andrade.
D. Virgínia Faria Gersão.
O Sr. Presidente:-Estão presentes 57 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 10 horas e 55 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Pinto Basto: - Sr. Presidente: mando para a Mesa o seguinte:
Requerimento
"Requero que me sejam fornecidos pela direcção da Emissora Nacional os seguintes elementos e informações:
Detalhes relativos à composição o organização da orquestra sinfónica da Emissora Nacional, discriminando o número de elementos, condições de trabalho, todas e quaisquer remunerações pagas a qualquer título, por indivíduo, incluindo o director da mesma orquestra sinfónica, encargos individuais de assistência e previdência pagáveis ou que tenham sido pagos em qualquer tempo, garantias de reforma, assistência e providência de que porventura beneficiem, nota das despesas de deslocação e quaisquer outros informes que possam contribuir ao esclarecimento das condições em que colaboram nesta orquestra todos é quaisquer artistas que a compõem, e bem assim indicações sobro se algum ou todos pertencem a qualquer sindicato e se para tal organismo contribui a dita Emissora de qualquer forma".
O Sr. Presidente:-Vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente:-Continua em discussão o artigo 13.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa, com as propostas de alteração que lhe dizem respeito, entre elas as bases A e B propostas pela comissão eventual.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes do Amaral.
O Sr. Mendes do Amaral: -Sr. Presidente: pedi a palavra para solicitar de V. Ex.ª que consulte a Assembleia sobre se consente que eu retiro a proposta- que apresentei quando da discussão na generalidade.
E se V. Ex.ª me permite desejo elucidar a Assembleia dos motivos por que o faço.
Quando apresentei essa proposta declarei com toda a lealdade que propunha um aumento dos rendimentos colectáveis inscritos nas matrizes, respectivamente de 420 por cento para os prédios destinados à habitação e de 40 por cento para os prédios destinados ao exercício do comércio, indústria ou outras actividades, com um sentido de reparação a dar aos senhorios pelo facto de terem estado desde há cerca de dez anos a receber uma renda inferior àquela que o Estado tinha reputado como normal para efeitos de tributação.
Considerei essa situação uma situação iníqua e desajustada com o sentido geral de actualização que tem vindo a observar-se na vida portuguesa em face do que já hoje oficialmente se reconhece ter sido a desvalorização do escudo e embora sentindo que era um agravamento do problema para uma grande parte dos inquilinos, no entanto convencido de que era uma distribuição de justiça entre inquilinos e senhorios.
Depois, porém, que troquei algumas impressões com . os membros da comissão eventual nomeada para estudar esta questão e depois que tomei conhecimento da solução proposta pela mesma comissão, não tenho dúvidas em retirar a minha proposta, embora mantenha o ponto de vista de que as rendas devidas pelos arrendatários de prédios ou parte de prédios destinados ao comércio, indústria ou outras actividades devem ser aumentadas.
E já agora, Sr. Presidente, para não cansar novamente a atenção da Assembleia, quero emitir a minha opinião sobre a resolução proposta pela comissão eventual, fazendo algumas observações ligeiras, que certamente vão ter explicações de parte da mesma comissão. Não compreendo muito bem por que é que na base À, para os arrendamentos de habitação, se estabelece um regime diferente entre Lisboa, o Porto e o resto do País; e não compreendo por que, conforme já aqui ouvi dizer, e conforme tenho também conhecimento pessoal, na maior parte do País, isto é, fora de Lisboa e Porto, as diferenças entre as rendas que actualmente se pagam e os rendimentos que estão inscritos nas matrizes são mínimas. Quer dizer que a mecânica que se adopta para Lisboa e Porto, proposta pela comissão eventual, posta a funcionar, deve trabalhar sem dificuldades, visto que, logo no primeiro aumento de 20 por cento sobre a renda actual se deve atingir ou ultrapassar os rendimentos colectáveis que estão inscritos na matriz.
Ainda ontem o Sr. Deputado Mário de Figueiredo esclareceu a Assembleia que, em relação a Coimbra, havia apenas oitenta casos em que as rendas que se pagavam eram ligeiramente inferiores aos rendimentos colectáveis inscritos na matriz.
O Sr. Mário de Figueiredo: -Fora de Lisboa e Porto, Coimbra é a cidade que oferece maior número de arrendatários nessas condições.
O Orador: - Por outro lado, Sr. Presidente, estabelece-se, por exclusão de partes para Lisboa e Porto, que a actualização, isto é, o ajustamento da renda actual com o rendimento colectável inscrito na matriz, seja feita por sucessivos aumentos de 20 por cento.
Ora se, como acabo de dizer, as diferenças entre as rendas actuais e os rendimentos colectáveis, em quase todo o País, são mínimas, não há razão para que, no regime destinado ao País, se ponha a restrição da alínea c) da base A da comissão eventual, que diz:
c) Se, em razão da diferença entre a renda inicial e o duodécimo do rendimento ilíquido, a actualização prescrita nas alíneas anteriores demorar mais de seis semestres, o aumento em cada semestre será igual à sexta parte dessa diferença.
Quando a inscrição do prédio na matriz for posterior a 1 de Janeiro de 1938 atender-se-á ao rendimento ilíquido inscrito inicialmente.
Parece-me que a hipótese aqui formulada pela comissão eventual não tem cabimento.
O Sr. Sá Carneiro: -V. Ex.ª dá-me licença?... A comissão eventual não inovou; limitou-se a reproduzir o que está na proposta do Governo.
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O Orador: - Na proposta do Governo há referência ao regime geral do País, mas aqui refere-se ao regime especial para fora de Lisboa.
O Sr. Sá Carneiro: - Apenas perfilhamos o que o Governo propôs.
O Orador:-Vejo aqui no n.º 2 da base A que os arrendamentos dos senhorios podem corrigir-se, seja o encargo superior ou inferior à renda anual paga. Desejo que a comissão me explique quando é que pode acontecer que a renda anual presentemente paga é superior ao rendimento ilíquido inscrito na matriz.
O Sr. Mário de Figueiredo:-V. Ex.ª está a raciocinar na base do rendimento inscrito em 1948 e nós referimo-nos ao rendimento inscrito em 1938. Há, portanto, uma diferença de dez anos.
O Orador:-De forma que, Sr. Presidente, se as minhas considerações têm alguma procedência, parece-me que será desnecessário incluir a base B da comissão eventual, que é aquela que estabelece o regime a seguir para Lisboa e Porto.
Finalmente, Sr. Presidente, no n.º 2 da base  C e diz-se:
2. Nos arrendamentos feitos a pessoas morais que não tenham fins humanitários ou de beneficência, assistência ou educação e nos arrendamentos destinados a comércio, indústria ou exercício de profissões liberais cumprir-se-á o disposto na base A, com a seguinte modificação: a partir de 1 de Janeiro de 1949 o aumento será em cada semestre igual a um terço da diferença entre a renda actualizada nos termos da alínea a) do n.º 1 da base A e o duodécimo do rendimento ilíquido, salvo se esse terço for inferior a 20 por cento da renda existente ao tempo da publicação desta lei, porcino neste caso aplicar-se-á na íntegra o regime da alínea li) do mesmo n.º 1 da base A.
Quer dizer que no caso de haver diferença entre a renda actual e a renda para que deve ser feita a actualização, se o terço dessa diferença for inferior a 20 por cento da renda actual dá-se a actualização nos termos da alínea b) do n.º 1. Também me parece que esta disposição é superabundante, porque uma vez que o terço da diferença entre á renda actual e aquela para que se caminha é inferior a 20 por cento da primeira, em dois aumentos semestrais logo se atinge essa diferença.
São estas as observações que tinha a fazer à proposta da comissão eventual, a qual me parece que, no meio desta perturbação natural causada pela gravidade do problema, é a que melhor corresponde à ética que informa a proposta do Governo e portanto às suas intenções, não deixando, porém, de afirmar que me parecia de elementar justiça que, não se querendo aumentar o sacrifício imposto a alguns dos inquilinos para habitação, que não estão em condições de o fazer, poderia muito bem, por um sentimento de justiça, aumentarem-se desde já as rendas a pagar pelos inquilinos de comércio e indústria e profissões liberais.
Posto isto, Sr. Presidente, peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sobre se consente que eu retire a proposta que apresentei quando da discussão na generalidade.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Vou consultar a Câmara sobre se autoriza o Sr. Deputado Mendes do Amaral a retirar a sua proposta de substituição do artigo 13.º do parecer da Câmara Corporativa, apresentada em tempo oportuno.
Consultada a Assembleia, foi autorizado.
Essa proposta é a seguinte:
Os rendimentos colectáveis de prédios ou partes de prédios urbanos que não tenham tido alteração posteriormente a 1 de Janeiro de 1943 serão aumentados a partir da vigência da presente lei, de 20 por cento se se destinam a habitação e de 40 por cento se destinam a comércio ou indústria, e as respectivas rendas actuais serão actualizadas nos termos seguintes:
a) No semestre a partir do 1 de Julho de 1948 sofrerão um aumento equivalente à diferença entre a renda mensal e o duodécimo do rendimento colectável ilíquido, modificado nos termos do corpo desta base, aumento esse não superior a 20 por cento da importância da renda actual;
b) Em cada um dos semestres seguintes e até se atingir em cada caso a importância do rendimento colectável modificado, as rendas terão um novo aumento de 20 por cento da importância da renda actual;
c) Só mm razão da diferença entre a renda inicial e o duodécimo do rendimento colectável, modificado, o processo de actualização atrás prescrito demorar mais de seis semestres, o aumento em cada semestre será igual à sexta parte dessa diferença.
O Sr. Antunes Guimarães: -Sr. Presidente: o anseio do meu espírito por formas simples e práticas, justas mas viáveis, adequadas às realidades presentes mas garantindo insofismavelmente o futuro, capazes de restabelecer a confiança para estímulo da iniciativa privada, que é a maior garantia de conservação do património nacional e do seu desenvolvimento ao ritmo marcado pela evolução demográfica e exigências sociais: aquele anseio que traduz as determinações do meu espírito, se encontrara nos diplomas em discussão e nos discursos aqui proferidos notas eruditas e alvitres engenhosos, não logrou aquela  calma que invariavelmente se segue às soluções que se harmonizam com o nosso pensamento.
Notei que, de uma maneira geral, se reconhece a justiça da actualização das rendas, a necessidade de defesa do enorme património constituído pelas moradias actuais e de se estimular a construção de novos prédios, mas tendo-se sempre em atenção as dificuldades do momento, no que estou absolutamente de acordo.
Sugerem-se, porém, dualidades de critérios, inquéritos e devassas à vida das famílias, bases afastadas das realidades e, duma maneira geral, abandona-se o princípio constitucional de nos limitarmos à apreciação das bases gerais dos regimes jurídicos, para nos embrenharmos em pormenores regulamentares mais da competência do Governo e que complicam e dificultam a discussão em que estamos empenhados.
Na proposta de substituição de todo o capítulo IV do primeiro parecer, assinada pelo nosso ilustre colega r. Dr. Mário de Figueiredo como intérprete da comissão eventual, aparece um princípio original que eu não lera nos diplomas em discussão.
O País é dividido em dois - duma parte Lisboa e Porto, da outra o restante território - para se estabelecer que o critério da avaliação (único capaz de iniludívelmente garantir a justiça) vigorará imediatamente na segunda parte, deixando-se Lisboa e Porto para quando for possível.
Sr.  Presidente: eu discordo desta dualidade de critérios, a qual, contribuindo para agravar a disparidade que, sob variados aspectos, já distancia aquelas cidades do resto do País, não deixará de contribuir para fomentar o urbanismo que à política do Estado Novo cumpre contrariar pelas suas consequências nocivas, tanto de ordem económica como social, e para esmorecer a confiança
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estimuladora de iniciativas privadas que devem constituir o alicerce principal da vastíssima obra de conservação e melhoria dos prédios existentes e de construção dos que vierem a ser precisos.
A garantia de que, enquanto na província as rendas subirão para o valor real, nas cidades de Lisboa e Torto terão de cristalizar em valores íntimos de rendimentos colectáveis calculados quando o valor da moeda e a procura de casas eram outros,, concorrerá para atrair e lixar a população naqueles burgos que seria urgente e vantajoso descongestionar.
Mas, por mais que pense neste caso singularissimo, não atinjo os inconvenientes de se tornar extensiva, desde já, a Lisboa e Porto a faculdade de avaliação, aliás, reconhecida, com sobejas razões, para as restantes cidades o aldeias.
Da avaliação outra coisa não resulta que a verdade, base essencial de justiça.
Ela é vantajosa, para os proprietários, como afirmação de que os valores constituídos por imóveis em que colocaram suas economias não serão injustamente exceptuados do movimento no sentido da alta determinado por circunstâncias que ninguém ignora e que se reflectiram em todos os outros sectores económicos.
Contribuirá também para o restabelecimento da confiança, que havia sido fortemente abalada por disposições ofensivas do direito de propriedade em cuja estabilidade se havia acreditado,.
E será vantajosa para os inquilinos porque as rendas, mercê das avaliações, não deixarão de tender para constituírem função do valor real dos prédios, pondo-se assim termo a muitas explorações; e do seu concurso para o renascimento da abalada confiança resultará, necessariamente, fartura de prédios, com a inevitável repercussão nas rendas, que não deixarão de baixar, e no conforto, que terá de melhorar.
Vantajosa, finalmente, para o Estado e para as câmaras, cujos réditos subirão consideravelmente, permitindo-lhes ir melhorando a situação financeira do funcionalismo e dos pensionistas, como é da maior justiça.
Sr. Presidente: sim, só vantagens vejo em que se façam avaliações para inquirir do estado actual dos prédios e do seu valor real.
O que importa, sim, é cercar essas avaliações de todas as cautelas para que delas resulte a verdade.
Para isso lá está a base K, que ordena aos Ministérios da Justiça e das Finanças a fixação das normas reguladoras da avaliação dos prédios e organização, dos respectivos recursos, prevendo-se a hipótese de virem a ser. presididas por magistrados judiciais.
E cumpre registar que de tais avaliações, feitas geralmente a. requerimento dos interessados, não virão a resultar encargos para o Estado, o que não é indiferente.
Sr. Presidente: a circunstância de se efectuarem as avaliações não implicaria a imediata actualização das rendas.
Este sim, constitui o ponto melindroso do problema, pois importa ter absolutamente em consideração as dificuldades do momento grave que a sociedade atravessa.
A actualização terá de fazer-se suavemente, por forma a não perturbar a economia das famílias, mas força, é que se faça.
O direito de habitação é sagrado, tem-se proclamado com toda a razão.
Mas também o é o direito à alimentação, ao vestuário, à assistência médica e correspondentes medicamentos e a tantas outras exigências que a vida não dispensa.
Nem por isso o respectivo custo tem deixado de ir subindo conforme as oscilações dos preços.
Mas, repito, a indispensável actualização de rendas deverá fazer-se com a suavidade exigida pelas circunstâncias.
Pelo que respeita a casas de habitação, numa primeira fase, que poderia durar três anos, as rendas efectivas inferiores ao valor colectável deveriam atingi-lo; nos três anos imediatos todas as rendas se elevariam ao indicado pela avaliação.
Os pormenores são matéria regulamentar, e por isso não tomo mais tempo à Assembleia com a sua apreciação.
Entendo, ainda, que a Assembleia deveria fixar o princípio de que, quando a crise de habitações esteja debelada, se restabeleça a liberdade contratual relativamente à fixação de rendas, de prazos e à garantia de o proprietário poder dispor do seu prédio uma vez findo o arrendamento.
Sr. Presidente: alvitrou-se o inquérito, uma espécie de devassa à situação económica das famílias, para determinação não só dos prazos da respectiva actualização de rendas, mas até do montante das mesmas rendas.
Também discordo deste alvitre.
Tal critério não presidiu no que respeita aos direitos a que venho de aludir, isto é, o da alimentação, vestuário e muitos outros, e não vejo razão para que a situação económica das famílias possa afectar os interesses legítimos dos proprietários, quer relativamente a prazos de actualização das rendas, quer na fixação do respectivo montante.
Não pode legitimamente lançar-se sobre determinadas pessoas um pesado encargo que deve constituir responsabilidade exclusiva da colectividade e, portanto, do Estado.
Além disso é preciso ter na devida consideração a susceptibilidade muito respeitável das classes mais directamente alvejadas por tais disposições, isto é, as classes médias.
Claro é que não estariam em causa a generalidade das classes operárias, cujos salários lhes garantem actualmente um nível de vida aceitável.
A exemplo do que se verifica quando se trata de descobrir casos de famílias necessitadas, que preferem, quantas vezes, a fome, a terem de contrariar aquele pudor tão íntimo em que a economia dos lares se encerra, estou certo de que em grande número de casos de notória insuficiência para uma rápida elevação das rendas se registaria preferirem os embaraços de uma tal exigência a terem de desvendar a sua carência de recursos, que os obriga á passar muitas vezes sem o indispensável à vida.
Tudo preferem à devassa que os exporia a um público que não respeita a pobreza, nem mesmo a mediania.
Eis, Sr. Presidente, por que discordo de todas as fórmulas que envolvem devassa à intimidade económica das famílias.
Lembro o que se passa nas declarações do imposto complementar, em que se verifica que a maioria prefere, pagar a quase incomportável taxa de 12 por cento sobre os rendimentos de certos títulos ao portador, quando se os depositasse em estabelecimento de crédito e os incluísse na respectiva relação de valores poderia pagar a terça ou a quarta parte.
Entendo devermos atender às realidades e à psicologia das pessoas que vão ficar na alçada das leis.
Sr. Presidente: evidentemente que as considerações que venho de fazer respeitam ao inquilinato de habitação e às casas de construção anterior à publicação desta lei.
Outros preceitos deverão regular o inquilinato comercial e industrial, e o caso dos prédios construídos ou consideravelmente melhorados de futuro, em que deve garantir-se liberdade de fixação de rendas e preços e a faculdade de dispor deles após o arrendamento.
Sr. Presidente: duma maneira geral, eu dou preferência à redacção do primeiro parecer da Câmara Corporativa.
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É, porém, possível que, depois de ouvir as considerações que outros colegas façam nesta tribuna sobre tão momentoso assunto, se não surgirem alvitres que melhor satisfaçam as exigências do meu espírito, eu envie para a Mesa uma proposta que corresponda às considerações agora feitas.
Disse.
Vozes: - Muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Querubim Guimarães: -Sr. Presidente: queria apenas fazer umas ligeiras considerações sobre a proposta em debate.
Em primeiro lugar, Sr. Presidente, quero aqui desta tribuna afirmar que não pode de maneira nenhuma subsistir no espírito público a ideia errónea que aos meus ouvidos tem chegado de que esta Câmara é uma Câmara de capitalistas e proprietários, que não se esforçará, portanto, por atender à situação dos inquilinos.
Eu acho que a opinião publica tem aqui, pelo contrário, no que se tem passado com a discussão deste problema, a confirmação do que se procura chegar a uma solução em que sejam atendidos os legítimos interesses das duas. classes. Elegeu-se de entre os membros desta Assembleia uma comissão eventual, que trabalhou cuidadosamente, afanosamente, durante largo tempo, e trouxe à Câmara as conclusões a que chegou no seu estudo. Foram-lhe fornecidos todos os elementos necessários ao estudo do problema - oficiais e particulares. Tudo compulsou, tudo analisou, e portanto está suficientemente habilitada a apresentar-nos a melhor solução possível.
O problema é, como só sabe e se tem dito, muito complexo.
Não vim a esta tribuna quando da discussão na generalidade justamente porque se me afigurava no momento pouco oportuno, pelo menos no aspecto político da questão, num momento em que o desequilíbrio económico é manifesto e nada de definitivo se pode fazer em tal matéria.
Mas, já que aqui veio este problema, trazido pelo nosso ilustre colega Sá Carneiro, tinha de se lhe dar uma solução, e ainda mais quando o próprio Governo ampliou o problema, propondo-se tratar de questões conexas com o (Já habitação.
Arramadas estas questões nas bases já aprovadas, apresenta-se-nos a questão do inquilinato, com os seus aspectos complicados. Entre eles o mais importante é o de que agora nos ocupamos.
Para isso deparamos com o seguinte: o projecto do Sr. Deputado Sá Carneiro, o parecer respectivo que está em discussão, a proposta do Governo, o parecer da Câmara Corporativa sobre esta proposta e ainda a da comissão eventual.
Sr. Presidente, em parêntesis quero significar a V. Ex.ª a conveniência que nós temos, para estudar com consciência os assuntos das propostas de emendas das comissões respectivas, de que estas venham ao nosso conhecimento com tempo suficiente, para não nos pronunciarmos sobre elas de afogadilho e termos tempo de reflectir sobre as mesmas, sobretudo em matéria tão complexa como esta.
Acabou de dizer há pouco o Sr. Deputado Antunes Guimarães que se lhe afigurava que o texto do projecto da Câmara Corporativa é preferível ao da comissão eventual.
A comissão eventual quis sem dúvida nenhuma melhorar, mas há alguns pontos em que me parece não ter conseguido esse fim. Talvez tenha razão o Sr. Dr. Antunes Guimarães.
Há, por exemplo, na alínea b) do n.º 1 da base A da proposta da comissão a designação de um aumento que vai a mais de 10 por cento do que está no parecer da Câmara Corporativa, o que vai molestar mais o inquilino na actualização da renda.
Porque não fica o aumento que está no parecer da Câmara Corporativa? Porque não aceita a comissão eventual o ponto de vista da Câmara Corporativa?
Outro ponto: na alínea c) da proposta da comissão eventual declara-se que, se em razão da diferença entre a renda inicial e o duodécimo do rendimento ilíquido a actualização prescrita nas alíneas anteriores demorar mais de seis semestres, o aumento em cada semestre será igual à sexta parte dessa diferença, quando no parecer da Câmara Corporativa se estabelecia a décima parte.
O Sr. Mário de Figueiredo:-V.Exa. dá-me licença?
Apesar do que V.Exa. acaba de dizer, a alteração só é exacta no quadro em que V. Ex.ª a põe, porque V. Ex.ª esquece-se de que a comissão eventual eliminou os primeiros 20 por cento que propunha a Câmara Corporativa.
V. Ex.ª esquece-se, em segundo lugar, de que esse regime dos seis semestres foi estatuído para fora de Lisboa e Porto, onde, naturalmente, mesmo com os 10 por cento, os seis semestres não se esgotariam, e que para Lisboa e Porto se adoptou um regime bastante diferente, em que o aumento nunca se circunscreve a seis semestres, porque as percentagens se mantêm as mesmas até atingir o limite, sem dependência de prazo.
De sorte que eu posso com tranquilidade afirmar a V. Ex.ª que a solução da comissão eventual é, de um modo geral, mais favorável ao inquilino do que qualquer das soluções da Câmara Corporativa.
O Orador:-Folgo muito em ouvir essas declarações de V. Ex.ª, visto que a comissão teve tempo suficiente para compulsar todos os elementos de informação necessários para apresentar o seu parecer, estando, portanto, em melhores condições do que qualquer de nós para apreciar a questão.
O Sr. Mário de Figueiredo: - Não eram precisos elementos alguns, fora dos do próprio texto, para ver que a comissão eliminou os 20 por cento iniciais.
O Orador: - Digo, porém, a V. Ex.ª que continuo com algumas dúvidas.
Há um outro ponto, o n.º 2 da mesma base, para que desejava o esclarecimento da comissão e a atenção de V. Ex.ªs
Diz-se aí que nos arrendamentos a que se refere o n.º 1 o senhorio pode requerer avaliação fiscal destinada a corrigir o rendimento ilíquido, seja este superior ou inferior à renda anual presentemente paga.
Ora poderá admitir-se que o senhorio recorra à avaliação fiscal quando a renda que recebe é superior ao rendimento ilíquido ?
Que conveniência tem ele nisso ? Conta-se com a sua magnanimidade a favor do inquilino?
Pondo-se diante de nós objectivamente o problema, verifica-se -o que não é novidade para ninguém nem representa ofensa afirmar- que o senhorio tem uma psicologia diferente da do inquilino, por serem divergentes os seus interesses. O inquilino quer pagar o menos possível e o senhorio receber o mais que possa. Salvo, é claro, as excepções, que são sempre de marcar e louvar. A regra, porém, é outra.
Justamente desse critério geral do senhorio, aproveitando-se da escassez das casas que começou a dar-se após a primeira guerra mundial, é que veio o regime de restrições à liberdade contratual, que em toda a parte se acentuou e numa progressão alarmante, dando. lugar nalguns países a reprimir os abusos dos senhorios sujeitando-os a penalidades pelo crime de especulação. Tudo
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em consequência dos abusos da parte dos senhorios, aproveitando a situação anormal para exigirem dos inquilinos rendas que iam além do que era legítimo exigir-lhes como compensação razoável do uso do prédio.
A gravidade do problema atingiu, desde então para cá, cada vez maior relevo, e se houve países onde a falta de habitações muito se fez sentir foi a França um dos que, por mais sofrer com a guerra, ocuparam primeiros lugares.
E foi ela, creio eu, a primeira a considerar como crime de especulação o excesso de rendas exigido pelo senhorio.
As prescrições da lei de emergência publicada nesse país eram severas, sobretudo um diploma, salvo erro, de Janeiro ou Fevereiro de 1919. E as sanções estabelecidas pelos tribunais eram com correspondente severidade aplicadas.
O Ministério da Justiça expediu circulares aos prefeitos para serem rigorosos no cumprimento da lei, a fim de acabarem os abusos. É curioso notar como nalguns países se resolveu o problema de os inquilinos não poderem pagar as rendas justas, que é assunto que nos preocupa também no momento.
Na Suíça assinalou-se o facto e deu-se-lhe solução diferente da nossa e de outros países. O senhorio tinha o direito de receber um rendimento para o prédio arrendado que não podia ir além de 5 por cento. Mas o inquilino não podia pagar isso. E então o que é que se fez nesse país modelar, tanto na sua organização social como política ? A comuna é que devia pagar a diferença. Era, portanto, um encargo distribuído por todos os contribuintes.
Aqui não se fez assim.
Os inquilinos passaram a ser assistidos pelos senhorios.
Ora a assistência é, na verdade, função do Estado, dever geral da colectividade.
Mas, Sr. Presidente, por associação de ideias, distraí-me do ponto concreto que estava abordando, e volto ao problema.
Gostava que a comissão eventual, representada aqui tão brilhantemente, me respondesse à seguinte pergunta: . Quando é que o senhorio irá requerer uma avaliação fiscal sendo a renda superior ao rendimento ilíquido inscrito na matriz?
O Sr. Sá Carneiro: - Parece-me ser de admitir a hipótese de quando a renda seja superior ao rendimento ilíquido haver uma avaliação. Pode esse rendimento subir relativamente à renda paga, e já o senhorio lucra.
O Orador: -Porque é que não se mantém o princípio que estava no parecer tia Câmara Corporativa, e até no projecto de V. Ex.ª, de dar ao inquilino a mesma faculdade de requerer a avaliação quando se sinta realmente prejudicado?
Assim fica sempre sujeito a ter de pagar uma renda - o inquilino  pobre sobretudo - que é superior ao que, pelo critério adoptado, é justo: o rendimento líquido.
O Sr. Mário de Figueiredo: -As considerações de V. Ex.ª são a favor ou contra manter-se na legislação o princípio da livre fixação da renda nos arrendamentos novos?
O Orador: - Para os arrendamentos novos, livre fixação da renda.
O Sr. Mário de Figueiredo: -Então para aqueles arrendamentos para os quais não haja possibilidade de fixação, qual o critério? É o da avaliação?
Mas, se isto aparece como correcção proveniente de ao senhorio ter sido retirada a possibilidade de fazer extinguir o contrato no fim do prazo do arrendamento, em benefício do inquilino, como é que se há-de bulir no regime contratual relativamente ao inquilino no sentido de diminuir as responsabilidades que ele próprio assumiu, se a grande vantagem do inquilino resulta precisamente da renovação automática e legal do contrato?
O Orador: - Eu já ontem disse que há casas na minha região em que a renda está actualizada mesmo para além do rendimento ilíquido da propriedade.
O Sr. Sá Carneiro: -Peço a V. Ex.ª o favor de ver o que se consigna na base E.
O Orador: - Já vou falar nessa base. Por agora direi que na hipótese que apresentei, e que de facto existe em muitos casos que conheço - de rendas superiores ao rendimento ilíquido -, pode dar-se a circunstância de o inquilino se sentir na necessidade de fazer baixar a renda até àquele rendimento, e não o conseguirá.
O Sr. Sá Carneiro:-V Exa. dá-me licença?
Se for convencionada renda excessiva, pode ser corrigida.
O Orador: - Mas é preciso não esquecer esta circunstancia. Pela base E é o Estado que pode oficiosamente promover a avaliação dos prédios arrendados para habitação, para fazer baixar as rendas até limites que não possam considerar-se de especulação.
Mas não é o inquilino que provoca essa, avaliação.
Simples faculdade para o Estado.
O Sr. Sá Carneiro: - É contra o fisco e a favor do inquilino...
O Orador: - Eu não sei se será esse o pensamento de V. Ex.ª!
O Sr. Sá Carneiro:-É sim.
O Orador: - Com esta base procura-se realmente corrigir as faltas, neste ponto de vista, da comissão eventual ao repudiar o direito de o inquilino requerer a avaliação, mas não satisfaz, porque deixa apenas dependente de uma faculdade do Estado a solução de um problema do maior interesse para o inquilino.
Na solicitude do Estado para atender a situações desta natureza, Sr. Deputado, não há muito que confiar.
O Estado pode ser inerte, não se importar com uma questão que para ele é de pouco interesse. De ordinário, nas avaliações fiscais que o Estado oficiosamente ordena há um apenas a lucrar - é ele próprio...
O Estado pode querer mandar avaliar o prédio, para reduzir a renda a limites que não se possam considerar de especulação, mas o que é preciso antes é determinar o que seja esse delito.
Ò que é especulação? Até onde é justo ir a exigência da renda? Um juro de 5 por cento para o capital investido no prédio? Mais? Menos?
Quer dizer: pertence ao Estado determinar o que é especulação.
Eram estas as considerações que ligeiramente eu queria fazer, pois se me afigura que a disposição que está no parecer da Câmara Corporativa dando também ao inquilino a permissão de requerer a avaliação é, para a posição de muitos, alguma coisa de importante.
Concluo esta parte das minhas considerações renovando aquilo que de princípio afirmei, isto é, a impossibilidade de legislarmos com carácter definitivo num assunto tão complicado.
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Há, pois, necessidade de dar à solução do problema maior amplitude e eficiência no que diz respeito a soluções anómalas.
Foi apresentada uma proposta que, mais ou menos, está redigida com esse intuito e que o Governo, assim julgando, poderá aproveitar como sugestão aceitável.
É da iniciativa do Sr. Deputado Bustorff da Silva e a ela aderiram vários membros desta Assembleia, assinando-a também. Eu também a assinei.
O Sr. Deputado Bustorft da Silva trouxe hoje à nossa consideração e de muitos colegas que a assinaram uma proposta em que traduz o seu pensamento, ontem aqui esboçado simplesmente, mas sem particularidades que possam prejudicar a execução desta proposta de lei.
O que aí se consigna fica para o futuro, não há dúvida, mas é mais uma sugestão para que o Governo se resolva a tomar uma posição no caso, de modo que, com os elementos que pode coordenar, se ocupe devidamente deste assunto, acabando com situações de flagrante injustiça que a generalidade de um diploma legal não comporta.
Não vejo que a aprovação desta proposta prejudique ou afecte a execução da nova lei que preparamos. Não representa mais que uma aspiração necessária, e" que o Governo deverá aceitar, para ir ao encontro duma situação que pode bem afirmar-se ser de extrema gravidade em muitos casos.
O que sair daqui não representará senão uma modalidade tendente a equilibrar a posição dos senhorios e inquilinos, mas, a meu ver, não satisfará nem a uns nem a outros.
Parece-me preferível que o Governo estude convenientemente o problema, com a competência de que é capaz, apressando-se a adoptar as soluções mais convenientes para casos anómalos que só dão e se darão, enquanto não regressarmos à normalidade da oferta e procura de casas, e sobre os quais a lei não pode providenciar capazmente.
Afigura se me que o parecer da Câmara Corporativa merece sor adoptado de preferência à proposta da comissão eventual, mas, se me convencer tio contrário, votarei esta proposta.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Albano de Magalhães: -Sr. Presidente: a proposta da comissão eventual vem estabelecer um duplo regime para o País no tocante ao processo de se efectivar o aumento de rendas. Repugna-me, em princípio, a adopção de medidas que possam determinar protecções díspares para interesses iguais ou pelo menos tão semelhantes que mal se chega a notar a distinção.
O ilustre Deputado Dr. Mário de Figueiredo apenas na generalidade aludiu a este duplo sistema, afirmando, se não estou em erro, que o problema do inquilinato assume uma acuidade especial na cidade de Lisboa quanto à elevação de rendas, e também no Porto, mas nesta cidade duma forma muito atenuada.
Sendo assim, não consigo aperceber-me das consequências que possam resultar da aplicação dos mesmos princípios de excepção em duas cidades em que os factos não revestem a mesma configuração social nem assumem a mesma gravidade.
Este duplo regime suscita-me dúvidas na resolução de problemas vários que hão-de necessariamente surgir em centros urbanos.
Assim, a cidade de Lisboa, como a cidade do Porto, estão muito longe de se poderem confinar às suas fronteiras meramente administrativas.
Tanto uma como outra são dois aglomerados urbanos que se estendem para os concelhos limítrofes, em cujas sedes se levantam, com os mesmos fundamentos, questões sobre inquilinato.
No Porto não vejo possibilidade de distinguir, para poder devidamente apreciar as consequências desta dualidade de regime, as razões por que se irão aplicar diferentes princípios a casos aparentemente iguais que se verifiquem ora na cidade do Porto, ora em Vila Nova de Gaia, ora em Matosinhos.
Para os portuenses que não andem amarrados a preconceitos de ordem administrativa, a cidade do Porto é um aglomerado urbano em que a sede de Vila Nova de Gaia e a vila de Matosinhos fazem parte integrante da mesma cidade.
Posso até dizer que parte da sede de Vila Nova de Gaia tem mais carácter de cidade do que a própria Foz do Douro.
Como, pois, Sr. Presidente, se pode estabelecer regimes diferentes para terras que se confundem?
Será justo verem-se senhorios ou inquilinos no mesmo tribunal a invocar amanhã direitos diferentes, a verificarem a desigualdade de protecção dos mesmos interesses, por não viverem na mesma, rua duma terra que é, afina.!, a mesma cidade?!
Que soma de injustiças pode provocar esta. desigualdade de tratamento?
A comissão eventual, seguramente, para poder chegar a esta conclusão e apresentar uma proposta com tal aparência de injustiça, baseou-se em elementos que nós, infelizmente, ainda não possuímos.
E como, pelas razões que aponto, receio muito a aplicação de um duplo regime, quanto à elevação das remias, conforme as casas estão ou não situadas nas cidades de Lisboa e Porto ou no resto do País, também não consigo compreender, por falta de elementos esclarecedores, que, a instituir-se duplo regime, não seja um para todos os aglomerados urbanos e outro para as zonas rurais.
De facto,, não alcanço por que se não há-de adoptar igual critério ao que se adopta para Lisboa e Porto em outras cidades, como Coimbra, Braga, Viseu, Aveiro, Viana do Castelo, Funchal, Setúbal, etc.
A dificuldade que eu vejo em encontrar o limite de protecção dos mesmos interesses é que me faz suspeitar da eficiência justa de um duplo regime, que eu espero ver suficientemente esclarecido.
Estimaria também, para poder, tanto quanto me fosso permitido, tomar pulso às propostas da comissão eventual, que fossem apresentados exemplos tipos ou razões justificativas das alterações introduzidas ao parecer da Câmara Corporativa e proposta do Governo, para neste mare magnum de propostas e sugestões determinar a nossa vontade com possível rectidão e boa consciência.
Infelizmente, neste momento, tenho de o confessar, sinto-me verdadeiramente confuso no meio de tantas sugestões que pretendem resolver um problema de magnitude excepcional e com larga repercussão de ordem social, económica e política.
Com estes elementos todos teríamos a lucrar: a comissão eventual verificaria que a nossa atitude era designadamente de compreensão, aderíamos ou não às suas sugestões praticando um acto de inteligência e não de confiança, e nós estávamos com outra tranquilidade para chegar à conclusão que uma sã consciência determina.
É apanágio desta Assembleia a liberdade de resolver, liberdade de que não podemos renunciar.
Tenho dito.
O Sr. Sá Carneiro: -Sr. Presidente: embora entenda que a discussão a que procedemos não se faz com o relógio na mão, porque as soluções foram maduramente ponderadas, também não .desejo voltar à discussão na generalidade.
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Começarei por responder ao Sr. Dr. Albano de Magalhães, na parte em que desejava exemplos tipos.
E desde já confesso não atingir bem o que seja um exemplo tipo.
Em matéria de rendas, há tão grande variedade de hipóteses que a tipicidade não se caracteriza.
Se o ilustre Deputado queria referir-se aos casos correntes, posso afirmar que o efeito da aplicação da lei será muito mais sensível em Lisboa do que no Porto.
Percorri os bairros fiscais desta última cidade, tendo verificado que, de um modo geral, as rendas são superiores ao rendimento ilíquido dos respectivos prédios.
O número total de prédios inscritos actualmente nas matrizes das freguesias das sedes dos bairros da dita cidade é de 46:967.
O número total de arrendatários anteriores a 31 de Dezembro de 1942 que compartilham na contribuição predial, isto é, que pagam renda inferior ao rendimento colectável, é apenas de 5:487 - menos de 10 por cento dos prédios; mas em cada prédio pode haver muitos arrendatários.
A importância total da contribuição a pagar em 1948 por esses arrendatários é apenas de 1.286.690$.
E o aumento de renda por força da nova lei, se não houvesse avaliações quanto aos comerciais ou industriais, seria de 10.119.600$.
Se atendermos a que no relatório da comissão que em 1927 esboçou a reforma tributária se computava em mais de 400:000 contos a importância das rendas atribuídas aos prédios,  com a aprovação dos factores do projecto, há-de concluir-se quão ínfima é aquela importância relativa à segunda cidade do País.
O Sr. Mário de Figueiredo: -V. Ex.ª dá-me licença?
Esse é o limite a que se é conduzido pela aplicação da proposta da comissão eventual, mas é um limite a atingir no tempo e muito gradualmente, porque os seis semestres não funcionam na proposta da comissão como limites para a actualização em Lisboa e Porto.
O Sr. Botelho Moniz: - Quer dizer: esse limite pode chegar a ser atingido quando a lei já não estiver em vigor.
O Sr. Mário de Figueiredo: - Exactamente.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Isso só prova a brandura do sistema.
O Orador: - No relatório do distinto advogado Sr. Dr. Tito Arantes a que aqui se tem feito referência frisa-se que, se não fora o limite, uma renda que decuplicasse levaria vinte e cinco anos a ser actualizada.
As contas que o Sr. Deputado Manuel Lourinho ontem aqui apresentou não podem estar certas, pela razão decisiva de que pelas alíneas a) e 6) do n.º 1 da base A - únicas aplicáveis a Lisboa e Porto - em cada semestre o arrendatário aumenta apenas 20 por cento da renda actual.
O Sr. Manuel Lourinho: - As minhas contas foram feitas exactamente dentro dessas percentagens.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu:-V.Exa. fez incidir os escalões sobre, a primitiva renda?
O Sr. Manuel Lourinho: - Não fiz assim.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: -Portanto, não está exacto. Os escalões incidem sempre sobre a renda actual.
O Sr. Botelho Moniz: -V. Ex.ª, Sr. Dr. Sá Carneiro, esteve a citar números colhidos num bairro do Porto.
O Orador: - Não foi num bairro. Esses números representam o total dos bairros fiscais daquela cidade.
O Sr. Botelho Moniz: - Mas citou números globais, referentes, portanto, ao somatório de todos os números, e o que acontece é que a citação desses números, que são globais, pois não são casos especiais, não mostra as injustiças de arbitrariedade das avaliações. Este é que é o caso.
O Orador:-V. Ex.ª está confundido visto que eu estava falando do Porto e não me referia à hipótese do avaliações, que aí não se farão para o inquilinato de habitação.
O Sr. Botelho Moniz:-Não existem avaliações, mas há o rendimento ilíquido. Como é que este foi estabelecido?
O Sr. Mário de Figueiredo: -V Exas. dão-me licença ?
Há aqui um equívoco da parte do Sr. Deputado Botelho Moniz, visto que no novo regime não há avaliações em Lisboa e Porto.
O Orador: - É isso mesmo. No projecto n.º 104 estabelecia-se o princípio de que o arrendatário só pagava se pudesse, recebendo o senhorio se o fundo tivesse verbas, o que não era de prever.
Esse regime era muito favorável para os arrendatários, mas nem por isso eu reclamei o cognome de pai doa pobres, pois jamais cultivei a popularidade.
Reconheci, porém, que o sistema era impraticável e por isso o abandonei.
O Sr. Deputado Botelho Moniz é menos generoso para com os arrendatários, pois lhes faz correr o risco de despejo quando venham a decair na pugna referente às suas possibilidades económicas.
O ilustre Deputado propõe, uma coisa que só por milagre poderia operar-se, estabelecendo um sistema complicado de averiguações dos proventos do arrendatário, mas determinando que as novas rendas entrarão em vigor em 1 de Julho de 1948.
O Sr. Botelho Moniz:-Eu estabelecia as percentagens de 20 ou 40 por cento; mas V. Ex.ª realizava então um outro milagre, que era o de que o inquilino na província podia pagar, mas o de Lisboa não podia.
O Orador: - Nós estabelecemos esses dois regimes porque somos realistas.
Apoiados.
A Assembleia não pode descer a pormenores, que melhor cabimento terão em futura regulamentação que o Governo faça, na qual se prevejam casos especiais.
Temos de delinear um sistema geral.
O Sr. Botelho Moniz: -Geral... para Lisboa e Porto e outro geral... para a província. Quer dizer: são dois sistemas.
O Orador: - Precisamente por as circunstâncias de Lisboa e Porto e as do resto do País serem diversas.
No futuro Código da Locação bem poderá acentuar-se a diferença do regime de arrendamento consoante se trate daquelas cidades ou de outras localidades.
Há mais de trinta anos que em Portugal se reclama essa dualidade de legislação.
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O Sr. Botelho Moniz: - O que V. Ex.ª preconiza vem agravar as dificuldades de obtenção de casas em Lisboa e no Porto.
Desde que as rendas nestas duas cidades sejam mais baratas do que na província, veja V. Ex.ª o que pode acontecer.
O Orador: - Não podemos confundir as casas actualmente arrendadas com as que venham a sê-lo de futuro.
Relativamente a estas, as rendas hão-de ser sempre superiores naquelas duas cidades.
O Sr. Deputado Albano de Magalhães aludiu ao que deve entender-se por Lisboa e Porto.
Não me repugna que se alarguem as áreas das duas cidades a alguns concelhos limítrofes ou que se amplie o regime da base B a todas as capitais de distrito.
Sr. Presidente: quanto às avaliações fiscais ouvimos aqui as coisas mais díspares. Enquanto o Sr. Deputado Botelho Moniz as considera injustas, o Sr. Deputado Antunes Guimarães considera-as boas, desejáveis até, mesmo para Lisboa, e Porto, embora elas, nas duas cidades, para nada servissem de momento quanto ao inquilinato de habitação.
As avaliações vão ocupar centenas de pessoas, quer para os prédios de Lisboa e Porto que não sejam de habitação, quer para as casas das restantes partes do País, seja qual for o seu destino.
Facultá-las desde já nas duas principais cidades quanto ao inquilinato de habitação seria perfeitamente inútil.
E as vantagens de que o Sr. Dr. Antunes Guimarães fala não existiriam para ninguém, a não ser para o fisco.
Mas quem pagaria o aumento da contribuição?
O senhorio, que não podia cobrar renda superior ao rendimento colectável de 1938?
O arrendatário, que pode sofrer desde já aumento de renda ?
Ao considerar-se este problema do acréscimo das rendas há que ter presente um facto capital.
Presentemente temos duas ordens de rendas: as não contratuais e as contratuais.
O Sr. Deputado Botelho Moniz viu essa realidade e a sua proposta baseia-se nela. Em grande parte dos prédios arrendados antes de 1928 as rendas foram substituídas pelas resultantes dos coeficientes do decreto n.º 15:289. O Sr. Deputado Botelho Moniz incorporava o aumento da contribuição na própria renda, o que não está bem, porque essa. contribuição, embora seja paga pelo arrendatário, é-o a título anómalo e transitório...
O Sr. Botelho Moniz: -V. Ex.ª dá-me licença? A lei actual tem também de ser uma lei anómala e transitória...
O Orador: - Mas o menos possível. Não podemos incorporar na renda a parte da contribuição que, logo que o aumento esteja feito, tem de ser paga pelo senhorio.
Ora se há rendas não contratuais e outras contratuais, tudo indica a conveniência de estabelecer rendas novas uniformes e não a de lançar percentagens sobre quantias heterogéneas.
Há oradores que defendem devassa e outros que a condenam. Por minha, parte, mudei de ideias e sou agora contra a devassa.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sapientis est mutare concilium...
O Sr. Botelho Moniz: - Eu substituí-me a V. Ex.ª, apesar de V. Ex.ª ter sido o autor dela.
O Orador: -O Sr. Dr. Bustorff da Silva apresentou algumas sugestões interessantes, que constam agora duma proposta. Em teoria, o sistema é sedutor e poderá ser aproveitado como simples sugestão ao Governo.
Mas, se fôssemos agora atender ao valor real do imóvel, para onde iriam as rendas? Iriam para um limite comportável? Suponho que não.
O Sr. Deputado Mendes Correia, na sua proposta de base nova, fazia reverter para o fundo especial parte dos aumentos de renda concedidos a proprietários que tivessem adquirido os seus prédios por acto inter vivos posteriormente a 17 de Abril de 1919.
O Sr. Mendes Correia: - Metade.
O Orador: - Resta saber se, quando o indivíduo comprou o prédio, não se atendeu já à esperança de mudança de lei.
O problema, realmente, não é novo e também na Ordem dos Advogados foi posto, sugerindo-se que os antigos proprietários recebessem parte do aumento das rendas. Não se estranhe até que eu, advogado, tanto fale da Ordem a que pertenço a propósito desta matéria de inquilinato.
É que, independentemente do carinho que voto à minha Ordem, não posso deixar de reconhecer que, sem o Instituto da Conferência que nela funciona, porventura o projecto não teria sido apresentado.
No Instituto da Conferência do Porto discutiram-se largamente quase todos os problemas que o projecto visou a resolver e o estudo do mesmo projecto no Instituto da Conferência de Lisboa constituiu valioso auxilio para os trabalhos da comissão eventual.
O Sr. Mendes Correia:-Eu reivindico para mini a originalidade. Ela foi-me inspirada pela sugestão do Sr. Dr. Tito Arantes na Ordem dos Advogados e fundava-se no seguinte: é que, aumentando rendas de prédios que tinham sido comprados na abaixa", esquecia-se o facto de muitos senhorios terem sido obrigados, por necessidade, a vender os seus prédios, indo, com a legislação agora estabelecida, dar uma compensação tão grande a quem tinha feito jogo na "alta".
O Orador: - A isso respondo que aqueles que venderam o prédio não quiseram correr o risco de ficarem muitos anos no mesmo sistema, enquanto os que compraram correram tal risco.
O Sr. Mendes Correia: - A situação de algumas pessoas tornou-se realmente angustiosa e tiveram de vender as suas propriedades.
O Orador: - Se as venderam, transmitiram todos os direitos que tinham sobre elas.
O Sr., Botelho Moniz:-Nesse ponto estou inteiramente de acordo com V. Ex.ª, porque já disse que aqueles que faziam os prédios tinham a esperança de uma nova lei, e assim verifica-se que nos prédios de renda, antiga o juro era de 2 e 3 por cento quando eram vendidos, enquanto nos prédios de renda moderna se alcançam juros que vão de 7 a 10 por cento.
O Orador: - Sr. Presidente: vou pôr termo às minhas considerações, embora tivesse usado da palavra, mais para esclarecer o meu pensamento, porque em nome da comissão falará quem tem autoridade para isso.
O Sr. Mário de Figueiredo:-V. Ex.ª tem toda a autoridade.
O Orador: - Muito obrigado a V. Ex.ª
Entendo que as bases que propusemos em plena liberdade, apenas com a autolimitação das nossas consciências, são de aprovar.
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Os efeitos delas - legislar é experimentar - vão ser sentidos durante meses ou durante anos, e haverá então tempo para o Governo, ponderando as consequências da nova lei, estabelecer outra porventura mais perfeita e mais justa.
Tento dito.
Vozes:-Muito bem, muito bem!
O Sr. Bustorff da Silva: -Sr. Presidente: pedi a palavra apenas para rápidas explicações.
Na sessão de ontem, depois de ter esboçado as linhas gerais de um sistema que se me afigurava mais equitativo e humano e menos rígido do que o consignado nas bases da nossa comissão eventual, terminei fazendo a declaração de que, se não fosse possível dar efectivação imediata a essa sugestão, a gravidade do assunto e a necessidade de o arrumarmos rapidamente me levaria a votar incondicionalmente as bases da comissão.
Mas a noite traz bom conselho, e daí resultou a apresentação, que há pouco fiz a V. Ex.ª, de uma proposta que consubstancia aquilo que poderia ou deveria vir a ser o regime futuro em matéria de fixação de rendas.
É como passo a ler a proposta que tive a honra de depositar na Mesa:
BASE L
O Governo promoverá o necessário para que, quando as circunstâncias o permitam, o regime constante das precedentes bases A a K seja substituído por outro, orientado nas bases seguintes:
1.º Faculdade conferida aos senhorios de requererem a avaliação, dos prédios de modo a que esta corresponda ao valor real de venda do imóvel no momento da avaliação.
2.º Fixação pelo Governo da taxa que deva incidir sobre o valor apurado, de molde a cobrir o juro razoável e amortização do capital investido no imóvel, acrescido dos encargos tributários e despesas de conservação.
3.º Distribuição da quantia correspondente pelos inquilinos do prédio, feita tendo em consideração as possibilidades de cada inquilino em
relação aos seus proventos e aos encargos do agregado familiar a que pertença, a área do prédio que ocupe e o destino do arrendamento.
A avaliação prevista no n.º 1.º far-se-á pelas comissões de avaliação existentes; a distribuição do encargo a que alude o n.º 3.º competirá a comissões arbitrais constituídas por um representante designado pelos inquilinos e outro pelos senhorios e presididas por uma entidade a designar pelo Governo (conservador do registo predial ou registo civil? Delegados do Ministério Público?).
Os poderes das comissões serão regulamentados pelo Governo, devendo prever-se a hipótese de o prédio ser habitado na sua totalidade por inquilinos cujas condições económicas não permitam qualquer elevação de renda.
Das decisões das comissões caberá recurso para o juiz de Direito, que decidirá sucinta e definitivamente.
O regime sugerido pela comissão eventual vigoraria, portanto, como que transitoriamente, enquanto não fosse possível transitarmos para aquele que acabo de definir nas suas linhas gerais.
E não há que ter receio de exageros na respectiva aplicação prática.
Por afirmações que aqui ouvi produzir, houve quem calculasse que, aplicado o sistema, as rendas teriam uma elevação de mais de 100 por cento. O engano é completo e absoluto.
Dei-me ao trabalho de fazer contas sobre elementos tão seguros quanto possível e verifiquei que a elevação em nenhuma hipótese ascendia a mais de 45 a 00 por cento as rendas actuais.
O Sr. Botelho Moniz: - Num arrendamento anterior a 1918 o que se dava?
O Orador: -V.Exa. têm de considerar que a taxa de juro de 1912, 1920 ou 1930 era incomparavelmente superior à taxa de juro de hoje.
O Sr. Botelho de Moniz: - Por isso é que subia a 45 por cento.
O Orador:-Em 1920 nenhum capitalista aplicava o seu capital em títulos ou prédios com rendimento inferior a 10 por cento; hoje qualquer pessoa que tenha interesse em fixar capitais acha-se largamente remunerada quando consegue um juro de 3 por cento. Esta é que é a situação. Enfrentando tal realidade é que o problema foi examinado.
É claro que não ignoro que o documento por mim apresentado tem mais a natureza de moção que de proposta.
Antecipo-me desde já, correndo ao encontro da objecção.
Mas, seja como for, nada obsta a que a Assembleia Nacional delibere imediatamente acerca das medidas que reputa convenientes para neste momento regular o problema da habitação em casas arrendadas a preços baixos e ao mesmo tempo indique ao Governo a solução que se irá transformando em definitiva à medida que as circunstâncias permitirem e aconselharem.
Podem contrapor-me que, agindo assim, invadimos os poderes do Executivo, reivindicando para nós as agruras de uma iniciativa que decerto originará queixumes.
Mas responderei que, se é certo ter o Governo poderes para legislar sobre a matéria, tal consideração está longe de me convencer, porque a esta Assembleia Nacional, que representa a Nação, cumpre aceitar na íntegra as responsabilidades políticas que devem cair sobre os seus ombros e não relegá-las comodamente para terceiros.
Apoiados.
Tenho dito.
O Sr. Botelho Moniz:-V. Ex.ª dá-me licença, antes de terminar as suas considerações?
É para dizer a V. Ex.ª que essa sua proposta, que constitui um ideal a atingir, tanto pode aplicar-se ao estudo da comissão eventual como ao estudo que eu propus.
Quer dizer que lhe dou inteiramente o meu voto. Ela até pode, em determinados casos, substituir aquelas alíneas da minha proposta que determinavam as avaliações pelo senhorio ou pelo inquilino. Compreendo perfeitamente que deve ser votada como uma base e não como uma moção.
O Sr. Presidente: - Suspendo a sessão por alguns momentos.
Eram 12 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 12 horas e 58 minutos.
O Sr. Presidente:-Porque a comissão eventual tem necessidade de aproveitar o intervalo entre esta sessão da manhã e a sessão da tarde a fim de examinar as
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diversas propostas ultimamente mandadas para a Mesa, vou encerrar esta sessão. A próxima será logo à tarde, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 13 Horas.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Alberto Cruz.
Álvaro Eugênio Neves da Fontoura.
António Maria Pinheiro Torres.
António de Sousa Madeira Finto.
Artur Augusto Figueiroa Rego.
Artur Proença Duarte.
Camilo de Morais Bernardes Pereira.
Carlos de Azevedo Mendes.
Ernesto Amaro Lopes Subtil.
Indalêncio Froilano de Melo.
João Garcia Nunes Mexia.
Jorge Botelho Moniz.
José Esquivei.
José Maria de Sacadura Botte.
José Martins de Mira Galvão.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
José Nunes de Figueiredo.
José Penalva Franco Frazão.
José Pereira dos Santos Cabral.
Luís da Câmara Pinto Coelho.
Manuel da Cunha e Costa Marques Mano.
Manuel Hennenegildo Lourinho.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Malhou Durão.
Salvador Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Teotónio Machado Pires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Sn. Deputados que faltaram à sessão:
Albano da Câmara Pimentel Homem de Melo.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Fernão Couceiro da Costa.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Horácio José de Sá Viana Rebelo.
Jacinto Bicudo de Medeiros.
João Ameal.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Dias de Araújo Correia.
José de Sampaio e Castro Pereira da Cunha da Silveira.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Beja Corte-Real.
Mário Lampreia de Gusmão Madeira.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Rafael da Silva Neves Duque.
O REDACTOR - Leopoldo Nunes.
IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA