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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 156

ANO DE 1948 1 DE MAIO

IV LEGISLATURA

SESSÃO Nº.156 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 30 DE ABRIL

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.
Manuel José Ribeiro Ferreira
Manuel Marques Teixeira

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 11 horas e 5 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 150 e 151 do Diário das Sessões.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Pacheco de Amorim, para chamar a atenção das entidades competentes da necessidade de ser distribuída aos sanatórios a estreptomicina suficiente para ser aplicada aos doentes, Melo Machado, que enviou para a Mesa um requerimento, e Cancela de Abreu.

Ordem do dia. - Continuou a discussão, na especialidade, do projecto de lei n.º 104, da autoria do Sr. Deputado Sá Carneiro, relativo ao inquilinato.
A discussão fez-se sobre o primeiro parecer da Câmara Corporativa relativo ao projecto.
Usaram da palavra numerosos oradores.
Foram discutidos os artigos 21.º a 25.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa, que, com emendas e aditamentos propostos por diversos Srs. Deputados, foram aprovados.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 13 horas e 32 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 10 horas e 53 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhães.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Eugênio Neves da Fontoura.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
André Francisco Navarro.
Manuel José Ribeiro Ferreira Manuel Marques Teixeira
António de Almeida.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Maria do Couto Zagalo Júnior.
António Maria Pinheiro Torres.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo de Morais Bernardes Pereira.
Carlos de Azevedo Mendes.
Diogo Pacheco de Amorim.
Henrico Pires de Morais Carrapatoso.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique de Almeida.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Indalêncio Froilano de Melo.
João Antunes Guimarães.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Alçada Guimarães.
José Esquível.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Luís da Silva Dias.
José Maria Braga da Cruz.

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José Martins de Mira Galvão.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
José Nunes de Figueiredo.
José de Sampaio e Castro Pereira da Cunha da Silveira.
José Soares da Fonseca.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Luís António de Carvalho Viegas.
Luís Cincinato Cabral da Costa.
Luís da Cunha Gonçalves.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Colares Pereira.
Manuel França Vigon.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Marques Teixeira.
D. Maria Luísa de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário Borges.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Querubim do Vale Guimarães.
Ricardo Spratley.
Rui de Andrade.
Salvador Nunes Teixeira.
Teotónio Machado Pires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
D. Virgínia Faria Gersão.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 64 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 11 horas e 5 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 150 e 151 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto que nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer qualquer reclamação, considero-os aprovados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Pacheco de Amorim.

O Sr. Pacheco de Amorim: - Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Governo para um caso, uma circunstância, que reputo grave.
Consta-me que nos sanatórios, mesmo em casos de absoluta necessidade e urgência, os médicos não podem receitar estreptomicina para os doentes pobres.
Parece-me que estando o Governo a despender tão avultadas verbas com a assistência, é uma lacuna digna de ser reparada esta a que me acabo de referir.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa um requerimento solicitando elementos relativos a importações pelo Ministério da Economia.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: não tive antes e não temos hoje tempo para ocupar-nos desenvolvidamente do assunto a que vou referir-me. Por isto têm de ser forçosamente resumidas as minhas considerações. Trata-se dos planos de urbanização de que já se ocupou há mais de um ano o ilustre Deputado Albano de Magalhães.
Em primeiro lugar quero agradecer ao ilustre Ministro das Obras Públicas a brevidade na remessa dos elementos de informação que solicitei há duas escassas semanas e a deferência de os subscrever.
E nesta oportunidade é de elementar justiça saudar e aplaudir o Sr. engenheiro José Ulrich pela notabilíssima obra que se continua a empreender pela sua pasta. Basta referir o que se passa em estradas e nos melhoramentos rurais e o notável plano bienal a efectivar em todos os concelhos, elaborado depois da sua utilíssima digressão através do País.
Se outros exemplos fossem necessários para demonstrar o que tem sido a obra do Ministério das Obras Públicas, eles estavam no que se passou agora.
Em dois dias, inauguração de dois grandes liceus e de centenas de edifícios de escolas primárias, a adjudicação da ponte sobre o Tejo em Vila Franca de Xira e outros melhoramentos importantes!
Tenho para mim, Sr. Presidente, que de todas as homenagens prestadas agora a Salazar esta foi a mais significativa por ser mais uma expressão real, efectiva, da extraordinária relevância dos seus vinte anos de governo. Tão grande o significado que a própria imprensa inglesa o assinalou ontem.
Mas vamos aos planos de urbanização. As demoras na elaboração destes planos estão a retardar muitos empreendimentos em numerosos concelhos do País e a fazer esmorecer as suas energias criadoras. Cito como exemplo o distrito de Aveiro, para o qual foram mandados elaborar 15 planos de urbanização e apenas um definitivo foi entregue até à presente ocasião. E apenas 6 aguardam a planta topográfica.
De 259 planos adjudicados, apenas 27 foram aprovados e 37 estão em apreciação. Os restantes encontram-se há muito tempo em poder dos arquitectos urbanistas, e é limitado a 44 o número dos que aguardam as plantas topográficas.
Diz a informação que os técnicos são poucos e o seu trabalho muito. Por isto, os há que além das outras ocupações têm a seu cargo 10, 15 e mais planos e nada ou pouco têm feito!
Acresce que o decreto de 1944, regulador do assunto, diploma sem dúvida notável, contém exigências que a técnica recomenda, mas têm colocado as câmaras municipais em grandes apuros, nomeadamente quando se trata de responder aos questionários que ele impõe. Daí serviços do Ministério terem-se visto na necessidade de acudir em seu auxílio.
Aquelas, estas e outras apontadas pelo Sr. Ministro, a que se procura dar remédio, suo as causas primeiras da demora que está prejudicando os municípios e os munícipes.
A falta dos planos de urbanização paralisou inúmeros empreendimentos locais, transacções sobre prédios, construções, etc., o que tudo está dificultando o progresso das vilas e a solução do seu problema da habitação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas não é só isto.
Na província, como em Lisboa, muitos terrenos e edifícios estão como que congelados por expropriação iminente ou resolvida que não se executa, ou sob ameaça ou receio dela, que não se efectivam. Disto resultam prejuízos incalculáveis, provenientes de como disse, não se poder construir prédios nem ampliá-los ou transformá-los, nem vender, como tantas vezes é indispensável e urgente por motivo de necessidade económica dos proprietários ou para fins de partilha inadiável, etc. E a sua

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desvalorização é manifesta, em consequência da incerteza do seu destino.
Apoiados.
Confio em que o Sr. Ministro das Obras Públicas continuará a envidar os seus bons esforços no sentido de os planos de urbanização serem ultimados com a maior brevidade possível, forçando a tal os culpados.
Uma intervenção imediata e enérgica é necessária.
Apoiados.
Bastaria para impô-la a circunstancia de muitas câmaras terem já desembolsado dezenas e dezenas de contos, e, em muitos casos, sem o mínimo proveito até hoje.
A situação não se remedeia com pequenas soluções parciais que, com intervenções do Ministério, se tom adoptado num ou noutro caso mais urgente.
O que se está passando com os planos de urbanização não pode continuar. E estou persuadido de que não continua, porque está à frente do Ministério das Obras Públicas o engenheiro José Ulrich, a quem renovo as minhas homenagens.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão, na especialidade, o projecto de lei n.º 104, da autoria do Sr. Deputado Sá Carneiro, relativo ao inquilinato.
Como a Assembleia sabe, a discussão está a fazer-se sobre o parecer da Câmara Corporativa (primeiro parecer) relativo ao assunto.

O Sr. Neves da Fontoura: - Sr. Presidente: estamos seguindo o primeiro parecer da Câmara Corporativa. Se não estou em erro, há algumas bases da proposta do Governo que não têm correspondência no primeiro parecer da Câmara Corporativa. Por isso desejava que V. Ex.ª me informasse se as bases nessas condições serão postas à votação posteriormente à análise do parecer.

O Sr. Presidente: - A discussão, por decisão da Câmara, está a correr tendo por base o primeiro parecer da Câmara Corporativa. Portanto as bases da proposta do Governo que não tenham correspondência naquele parecer não são objecto de votação. Só por meio de alguma proposta que qualquer Sr. Deputado faça perfilhando tais bases, se procederá assim.

O Orador: - Nesse caso voa mandar para a Mesa uma proposta.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 21.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa.
Sobre este artigo há na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho.
Há também sobre o mesmo artigo uma proposta de substituição da comissão eventual, que é a base N.
Estão em discussão.

A proposta do Sr. Manuel Lourinho é a seguinte:

Proposta de substituição:

1. Caducando a sublocação, por extinção do arrendamento, o sublocatário poderá ficar na posição de arrendatário, em relação ao senhorio do prédio, por:
a) Se propor continuar a habitar a parte por ele ocupada, pagando segundo o disposto nesta lei para fixação e actualização de rendas;
b) Não estar incurso em qualquer das cláusulas que tenham determinado a extinção do arrendamento;
c) Ocupar, em relação ao senhorio, uma posição igual à dos arrendatários a que se referem os n.ºs 2 e 3 da base XLII do projecto de lei.
2. Os actuais sublocatários, com ou sem cláusula permissiva de sublocação por parte do senhorio, serão considerados como arrendatários, se assim o desejarem e o notificarem ao arrendatário e ao senhorio no prazo de quinze dias, após a entrada em vigor desta lei, ficando sujeitos a todas as disposições que nela dizem respeito a arrendatários e sublocadores.
3. Igual ao n.º 2 do projecto de lei.

O Sr. Manuel Lourinho: - Sr. Presidente: desde há muito tempo que estou habituado a marcar as atitudes que tomo exclusivamente pelo que de mim exige a consciência plena da minha personalidade.
Não há considerações, quer de ordem material, quer de qualquer outra, que me determinem a modificar uma linha de conduta quando esteja convencido da sua justiça, da sua oportunidade e do seu sentido moral.
Isso me tem trazido muitos prejuízos e poucos benefícios. Não importa.
Sr. Presidente: quando há tempos apresentei nesta Assembleia uma moção originada sobre motivos ligados ao problema que ora se discute, marquei nos considerandos que a precederam e nas alíneas que a definiram, com clareza e largamente, a minha posição mental a esse respeito.
Nada mais tenho que acrescentar ou diminuir ao que ali está. Mantenho ainda hoje a essência e a forma de tal moção.
Posto isto, Sr. Presidente, vamos ao caso em debate, reportando-me exclusivamente ao assunto. A doutrina que ficou inscrita na lei vai interessar em Lisboa um volume de pessoas que calculei primeiramente em 300:000. Em conversa com um Sr. Deputado dentro desta Assembleia, esse Sr. Deputado, muito ilustre e conhecedor da questão, informou-me de que o número não deveria ser tão grande como eu pensava, mas que andariam à volta de 200:000 os indivíduos que vivem em casa de outrem.
Parece-me, pois, Sr. Presidente, que deve haver o maior cuidado em evitar a existência na lei de qualquer disposição que possa determinar a perda ou instabilidade do lar a um tão elevado número de pessoas, e que a dar-se teria o aspecto de calamidade pública!

O Sr. Bustorff da Silva: - Se saírem 200:000 locatários, entram outros 200:000.

O Orador: - Ora aí está uma operação aritmética que não corresponde à verdade social!
A minha proposta tem como finalidade introduzir na lei nova as disposições necessárias que possam garantir a posição dos sublocatários que actualmente vivem tranquilamente nesse regime e que, pelas propostas apresentadas, desde o projecto n.º 104 até ao parecer da Câmara Corporativa, não se encontram ao abrigo do despejo. Não entra nela em linha de conta que esses sublocatários sejam obrigados a pagar mais. Não se trata lá de saber se podem ou não pagar! Isso não interessa agora.
O que interessa é a garantia do direito de habitação, de uma forma insofismável e plena, aos actuais sublocatários na cidade de Lisboa, onde o caso tem acuidade grave.

Uma voz: - Não exagere!

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O Orador: - Não exagero, Sr. Deputado! Ainda repito: se assim não for, será uma calamidade pública. E só quem desconhece absolutamente o assunto pode ter dúvidas sobre a minha afirmação.

O Sr. Marques de Carvalho: - Em que posição coloca V. Ex.ª o arrendatário?

O Orador: - Eu tenho aprendido muito nesta Casa!... E já sei responder a essa pergunta!... Saiba, Sr. Deputado, que isso é outro problema...
Risos.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Tem aprendido e continuará a aprender.

O Orador : - Certamente...

O Sr. Mário de Figueiredo: - E ainda está em boa idade e... tamanho para isso. Risos.

O Orador: - Eu ainda tenho alguma coisa para crescer...
Risos.
Sr. Presidente: a minha proposta é uma consequência do profundo conhecimento que tenho do que se passa, por observação objectiva e diária, em quase metade da cidade de Lisboa. Não desejaria com o meu silêncio ou com o meu voto prejudicar na continuidade e estabilidade do lar muitos milhares de pessoas às quais de começo me referi e que são das mais humildes das que vivem nesta capital.
Tenho dito.

O Sr. Sá Carneiro : - O princípio constante da base N já estava consignado no projecto, no primeiro parecer da Camará Corporativa, na proposta do Governo e no segundo parecer da Câmara Corporativa.
É um princípio que se afigura intuitivo, visto que a sublocação é um contrato secundário.
Se o contrato principal se extingue, naturalmente que o secundário não pode prevalecer.
Mas a comissão eventual ressalvou a responsabilidade do sublocador para com o sublocatário, quando aquele desse motivo ao despejo ou no caso de rescisão do arrendamento.
A situação de haver muitos sublocatários, sobretudo nas grandes cidades, não nos passou despercebida, e por isso no n.º 4 da base N se dá ao sublocatário, em certas circunstâncias, o direito de ficar como arrendatário directo, com um somatório de obrigações - as que o arrendatário tinha para com o senhorio e as que para com aquele contraíra o sublocatário.

O Sr. Manuel Lourinho: - V. Ex.ª dá-me licença?
É para perguntar se esse direito não era só atribuído ao senhorio.
Parece pelas palavras de V. Ex.ª que esse direito é atribuído ao sublocatário.

O Orador: - Os dois casos são diversos, embora se relacionem. A comissão eventual considerou necessário conferir ao sublocatário o direito de ficar arrendatário por esta consideração: é que desde que a proposta dava ao senhorio, no caso de sublocatário total, o direito de eliminar o arrendatário, este perdia o interesse em manter o arrendamento e poderia conluiar-se com o senhorio em detrimento do sublocatário.
Este preceito é, afinal, na disposição simétrica da base, o correspondente ao artigo 24.º do primeiro parecer.
A comissão eventual, inovando profundamente nesta matéria, reconheceu ao sublocatário o direito de em muitos casos ficar arrendatário directo.

O Sr. Manuel Lourinho: - É que na minha proposta de emenda foi apresentada a forma que exprimiria as emendas da comissão eventual.

O Orador: - Mas a comissão eventual não deixou de ponderar a proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho, procurando regulamentar o princípio, com o fim de evitar a multiplicação de despejos.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Quer dizer: a comissão eventual deu satisfação à aspiração do Sr. Deputado Manuel Lourinho.

O Orador: - Exactamente.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se em primeiro lugar a proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se a proposta de substituição ao artigo 21.º apresentada pela comissão eventual, que é a base N desta comissão.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 22.º Está na Mesa uma proposta da comissão eventual para substituir este artigo pela base L.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

Consultada a Assembleia, foi aprovada a base L proposta pela comissão eventual para substituir o artigo 22.º do texto do primeiro parecer da Câmara Corporativa.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 23.º Sobre este artigo há na Mesa uma proposta da comissão eventual: é a base M. Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

Consultada a Assembleia, foi aprovada a base M da comissão eventual para substituir o artigo 23.º

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 24.º Sobre este artigo há na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho e uma proposta da comissão eventual para substituição deste artigo pela sua base o.
Vai votar-se em primeiro lugar a proposta de substituição da comissão eventual, que constitui a sua base o. Depois votar-se-á a proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho, que S. Ex.ª classificou de proposta de substituição, mas que eu entendo ser uma proposta de aditamento.

Consultada a Assembleia, foi aprovada a base o da comissão eventual para substituição do artigo 24.º
Consultada a Assembleia, foi rejeitada a proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 25.º Sobre este artigo há na Mesa uma proposta da comissão eventual, que é a base P.

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O Sr. Bustorff da Silva: - Sr. Presidente: desejava ser esclarecido sobre uma passagem que há no final do n.º 2 desta base P, que é a seguinte:

2. Verificado o facto referido no número anterior, pode ilidir-se a presunção provando que se trata de hóspedes fora das condições do n.º 1, e em número não superior a três, quando houver prestação normal de alimentos ou de serviços por parte do arrendatário.

Não posso votar conscientemente enquanto não saiba se aquilo que na verdade se pretendeu escrever foi a copulativa «e», em vez da disjuntiva «ou», e vou explicar porquê:
Vv. Exas. não ignoram que um dos aspectos de maior importância no problema do inquilinato tem sido o que se refere à intervenção de locatários que pagam rendas ínfimas aos senhorios e seguidamente exploram sem piedade os sublocatários que lhes caem nas mãos.
Durante muito tempo as sublocações não autorizadas constituíram fácil fundamento para o despejo. Mas de há dois anos para cá começou a confundir-se hospedagem com sublocação, e cada vez que aparecia um locatário a articular que o sen sublocatário tinha participação nos serviços de cozinha ou beneficiava de certos serviços caseiros, imediatamente os tribunais se inclinavam para a orientação de que não se tratava de sublocação, mas sim de hospedagem, e a acção improcedia. O escândalo generalizou-se,
Tive ocasião de me referir a este aspecto do problema quando usei da palavra na generalidade. Se empregarmos a expressão «quando houver prestação normal de alimentos e de serviços por parte do arrendatário» não há dúvida de que nos integramos dentro da definição que de hospedagem nos dá o Código Civil vigente, mãe se adoptarmos a disjuntiva - «ou de serviços por parte do arrendatário» -, nada mais fácil do que produzir-se prova testemunhal de que o arrendatário faz ao sublocatário pequenos serviços de cozinha, arranjo de quartos, limpezas, etc., para imediatamente abrirmos a malha por onde se escaparão todos os abusos ou extorsões de que os sublocatários e os senhorios estão sendo vítimas.
Por estes fundamentos, proporia que se dissesse «quando houver prestação normal de alimentos e de serviços por parte do arrendatário», em vez da redacção adoptada na proposta.

O Sr. Sá Carneiro: - Nesta base não se trata de gralha tipográfica.
A disjuntiva foi aí colocada muito intencionalmente.
Entendeu-se que era justo manter a famílias com poucos meios o direito de terem até três hospedes, recebam ou não eles alimentação.
Quer no projecto, quer no texto referido no primeiro parecer, quer na proposta governamental, houve o intuito de evitar que se ocultasse a sublocação sob o disfarce de convivência familiar.
Daí as restrições adoptadas.
A distinção entre hospedagem e sublocação, de direito, não oferece dificuldades.
Se a pessoa ocupa certas dependências sem receber qualquer serviço do arrendatário, há sublocação. Quando o arrendatário presta serviços ao hóspede - alimentação ou arranjo do quarto, ou uma e outra coisa conjuntamente -, há hospedagem.
Quando o número de hóspedes excede três, haverá uso do prédio - arrendado para habitação - para indústria, o que constitui fundamento de despejo.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: desejo acrescentar às considerações que acaba de fazer o Sr. Deputado Sá Carneiro, e que esclarecem a Câmara sobre qual foi o pensamento da comissão, as razões por que a comissão eventual foi para esta solução, e essas razões mostram que não estava longe do seu pensamento o que acaba de exprimir o Sr. Deputado Bustorff da Silva ao dizer que esta disposição tal como está redigida pode ser uma fonte muito grande de fraudes. Redigir-se, porém, a disposição noutros termos punha um problema social muito agudo em Lisboa e Porto.
Apoiados.
Porque em Lisboa e Porto - sobretudo em Lisboa é o caso que a comissão conhece melhor o que acontece é que a generalidade, a massa destes hóspedes não recebe alimentação - a grande massa, digo, porque no seio da comissão apareceu na verdade um número que roçava por 250:000 pessoas, compreendendo geralmente gente humilde e estudantes, que poderiam de um momento para o outro ver-se sem habitação onde pudessem pernoitar.
De sorte que, sob a pressão das circunstâncias de facto, a comissão preferiu ir para esta solução, que pode ser motivo de fraudes graves, não há dúvida, praticadas contra o senhorio, a aceitar a outra, que conduziria a pôr um problema social grave, que não estou longe de reputar, usando as palavras de que há pouco usou o Sr. Dr. Manuel Lourinho, de calamidade pública.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ainda pensou a comissão em admitir o statu quo ante e para o futuro estabelecer um princípio diferente do que aqui está contido. Desistiu dessa ideia, pela consideração de que se trata de uma massa muito flutuante, e o facto de se instituir uma tal disposição, mesmo só para o futuro, reputou-o a comissão gravemente perturbador.
Aqui têm V. Ex.ª, Sr. Presidente, e VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, as razões de ordem social - a comissão também considerou o social, Sr. Deputado Pacheco de Amorim! - que determinaram a solução proposta.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vai passar-se à votação.

Submetida à votação a proposta da base P da comissão eventual para substituir o artigo 25.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está esgotada a votação sobre este texto do primeiro parecer da Câmara Corporativa. Mas há propostas novas referentes à matéria deste capítulo, propostas essas que vou submeter à apreciação da Assembleia.
Há uma proposta de base nova - Q - da comissão eventual, que diz respeito à cessão do arrendamento, e, para melhor elucidação de VV. Ex.ªs, vai ser lida na Mesa.
Foi lida.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Manuel Lourinho: - Eu tinha também apresentado uma proposta de emenda a este respeito, porque na proposta do Governo não havia qualquer referência às profissões liberais.
Mas, como na proposta da comissão eventual se alude a isso, peço a V. Ex.ª se digne consultar a Assembleia sobre se permite que eu retire a minha proposta, por a mesma ser desnecessária.

O Sr. Presidente: - Efectivamente V. Ex.ª tinha apresentado uma proposta, a qual eu tencionava submeter à Assembleia depois de votado o texto da base.

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Mas, como V. Ex.ª solicita autorização para retirar essa proposta, vou submeter o seu pedido à consideração da Assembleia.

Consultada a Assembleia, foi autorizado o Sr. Deputado Manuel Lourinho a retirar a sua proposta de emenda.

O Sr. Presidente: - Sobre esta matéria de cessão do direito ao arrendamento há também na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz, que vinha referenciada à base XLI-A do segundo parecer da Câmara Corporativa e que deve ser discutida conjuntamente com a base Q da comissão eventual, visto que a matéria é a mesma.
Há ainda uma proposta do Sr. Deputado Lima Faleiro e outros Srs. Deputados, que pode figurar-se como um aditamento a esta base Q e que vou mandar ler à Câmara.
Foi lida. É a seguinte:

Sobre matéria de sublocação propomos a seguinte nova base:

A cessão do direito ao arrendamento ou a do prédio, total ou parcial, gratuita ou onerosa, provisória ou definitiva, é, para todos os efeitos, equiparada à sublocação.
Esta disposição não se aplica aos processos pendentes.

Os Deputados: Luís Maria da Silva Lima Faleiro, João das Neves, Camarote de Campos, Luís Maria Lopes da Fonseca, Luís da Cunha Gonçalves, José Gualberto de Sá Carneiro.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Lima Faleiro: - Sr. Presidente: pedi a palavra para, numa ligeira síntese, sistematizar as razões justificativas do aditamento que, acompanhado por alguns Srs. Deputados, propus sobre matéria de sublocação.
Direi, antes de mais, que a doutrina que se contém no aditamento proposto não é nova no Direito positivo português; e não é nova porque se encontra consignada, posto que sob diversa e mais vaga redacção, no § único do artigo 31.º do decreto n.º 5:411.
Bem poderia sustentar-se a subsistência em vigor do preceito que se contém nesse parágrafo ainda depois da publicação da lei em discussão, pois é certo que no articulado desta se não providencia sobre o assunto; mas também poderia sustentar-se o contrário. Em qualquer caso, pareceu-nos vantajoso sugerir o aditamento em referência.
Penso que esta Assembleia Nacional deve, na medida do possível - e, evidentemente, sempre sem prejuízo da justiça que se reclama e aguarda nos casos pendentes -, esclarecer as dúvidas e aplanar as divergências que têm preocupado a doutrina e a jurisprudência e sido causa da diversidade, quando não do antagonismo, dos julgados.
A incerteza no decidir, a diversidade de decisões sobre a mesma matéria, a realidade, lamentável mas inegável, de julgados contraditórios, são prejuízos afrontosos da dignidade e autoridade da justiça.
De outra parte, creio que, seguindo semelhante orientação - esclarecendo dúvidas, resolvendo dificuldades que a cada passo perturbam a prática judiciária -, esta Assembleia interpreta precisamente o espírito da proposta do Governo sobre a matéria, pois é certo que da leitura cuidadosa que fiz dessa proposta colhi a impressão de que da parte do Governo houve também o louvável propósito de pôr termo a dúvidas e dificuldades sugeridas pela aplicação aos casos concretos dos preceitos das leis vigentes sobre a complexa matéria do inquilinato urbano.
Ora acontece que precisamente o preceito que se contém no § único do artigo 31.º do decreto n.º 5:411 é daqueles que mais se têm prestado a dúvidas, discussões e hesitações.
Dentro da forma vaga e imprecisa por que se mostra redigido esse parágrafo cabe um mundo de soluções e interpretações.
O legislador quis apenas equiparar à sublocação a cessão gratuita? Visou também a onerosa? Entender-se-ão compreendidas na equiparação a cessão total e a parcial? O preceito aplica-se à cessão provisória como à definitiva? E o comodato abusivo e ilícito que do prédio arrendado faça o inquilino não vale sublocação proibida?
Posto que a orientação dominante na jurisprudência seja a que interpreta latamente o conceito de cessar, que a lei equipara a sublocação, é certo todavia que, num ou noutro julgado, se tem decidido por forma a quase se inutilizar o espírito da lei e o objectivo de moralidade visado pelo legislador.
O aditamento proposto sub judice obvia a todas essas dificuldades e estabelece, em toda a sua pureza, a doutrina que melhor se harmoniza com a realização do escopo de equidade e justiça que se tem em vista.
Na verdade, Sr. Presidente, se é certo que os senhorios se encontram a sofrer limitações nos seus direitos de propriedade, necessárias, sem dúvida, mas odiosas e, sob certos aspectos, discutíveis, não é aceitável que eles sofram, impotentes, outras restrições, estas determinadas pelas habilidades, fraudes ou abusos dos inquilinos.
Quando se não equiparassem a cessão do direito de arrendamento e o simples comodato de prédio à sublocação, não faltariam inquilinos a mascarar de cessões gratuitas ou de empréstimos verdadeiras sublocações, precisamente para subtrair-se às consequências que a lei faz derivar destas, quando ilícitas, mas consentidas, abusivas portanto.
A redacção da nova base que propomos, consignando um amplo conceito de cessão do direito do arrendamento e equiparando à sublocação o simples comodato do prédio arrendado feito pelo arrendatário sem consentimento do senhorio, põe termo a todas as dúvidas e discussões e permite realizar um indiscutível objectivo de equidade e justiça.
Eis, Sr. Presidente, as breves explicações que eu considerava dever a esta Assembleia, com vista à proposta em discussão.
Disse.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: a comissão eventual não vê inconveniente em que se vote a proposta de aditamento do Sr. Deputado Lima Faleiro.
Essa proposta enquadra-se no pensamento que ditou a base P, já votada, que é o de facilitar a prova da sublocação.
Parece-me que o novo texto não inova, mas esclarece, a lei vigente.
Interpreta-a sem prejuízos da liberdade que o juiz tem de proceder como entender relativamente aos casos pendentes.
No decreto n.º 5:411 há o § único do artigo 31.º, que equipara à sublocação a cessão do direito ao arrendamento.
Cessão de direito será o mesmo que cedência do prédio?
A cessão terá, necessariamente, de ser onerosa?
E bastará que seja temporária?
Todas essas questões ficam solucionadas, de harmonia com a mais perfeita jurisprudência.
Julgo, portanto, que é de votar.

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Quanto à proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz, em parte ela consta já do n.º 1 da base L, com esta diferença: a comissão eventual, como a Câmara Corporativa, propõem que se exija o consentimento escrito do senhorio, que tanto pode ser dado no próprio contrato como no documento posterior.
O Br. Deputado Botelho Moniz não exige autorização escrita.
No n.º 2 da base XLI-A da Câmara Corporativa dizia-se também que a sublocação ilegal era motivo de despejo.
Mas a comissão entendeu que isso era pleonástico.
O n.º 3 é que tem mais dificuldade.
É do conhecimento geral que presentemente imo há traspasses de estabelecimentos que pertençam a sociedades, pois se fazem cessões de quinhões e de quotas e vendas de acções.
Essa fraude carece, sem dúvida, de ser evitada.
Mas a comissão não encontrou fórmula que a satisfizesse.
E entre o mal de deixar subsistir o estado do coisas existente e o de estabelecer uma norma injusta, optou por aquele, visto o considerar menor do que este.
O problema não se confina no âmbito das sociedades por quotas, pois abrange todas as formas de sociedade.
Considerar traspasse a cessão de 50 por cento das quotas é arbitrário.
O fisco exige o pagamento do imposto respectivo quando se fazem quaisquer modificações nas sociedades.
Em direito privado não pode ir-se tão longe.
A comissão entendeu que era conveniente deixar ao Governo a solução do problema, para o qual, repito, não encontrou fórmula satisfatória.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra, vai passar-se à votação.
Em primeiro lugar ponho à votação da Assembleia a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Botelho Moniz para a substituição da base XLI-A a que se refere a matéria em discussão.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se agora a base Q da comissão eventual, que regula a mesma matéria da cessão do direito de arrendamento.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se a proposta do Sr. Deputado Lima Faleiro e outros Srs. Deputados, ainda sobre a mesma matéria.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Passamos agora ao direito de preferência.
Está em discussão o artigo 26.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa.
Sobre este artigo há na Mesa uma proposta da comissão eventual e uma proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho para na essência se fazer a eliminação das palavras «total e parcialmente» constantes do n.º 3 do artigo 26.º, que é o 16.º do projecto do Sr. Deputado Sá Carneiro.

Vou mandar ler a proposta da comissão.

Foi lida. É a seguinte:

Propomos a seguinte base em substituição do artigo 26.º:

1. O principal locatário do prédio arrendado para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal tem direito de preferência na venda ou doação em pagamento de prédio, sendo esse direito graduado em último lugar na escala das preferências.
Se o principal arrendatário não quiser usar desse direito, compete o mesmo aos outros, por ordem decrescente das rendas. Não terá direito de preferência o arrendatário que não explore no prédio, há mais de um ano, comércio, indústria ou profissão liberal.
2. Não se verificando o caso do número anterior, a preferência caberá aos arrendatários de habitação nos mesmos termos desse número, não tendo, porém, tal direito o arrendatário que haja sublocado, total ou parcialmente, o prédio, ou nele não resida há mais de um ano, salvo se a não ocupação resultar de doença ou outro caso de força maior.
3. Na regulamentação da propriedade horizontal prever-se-á a preferência parcial no andar que cada arrendatário ocupe.
4. São aplicáveis às preferências prescritas neste artigo, na parte em que o puderem ser, as disposições do artigo 2309.º, §§ 4.º e 5.º, do Código Civil.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, João das Neves, Paulo Cancela de Abreu, José Alçada Guimarães, Luís Maria Lopes da Fonseca, Manuel Ribeiro Ferreira, José Cabral, Francisco de Melo Machado, José Gualberto de Sá Carneiro.

O Sr. Bustorff da Silva: - Não formulo proposta nenhuma, e limito-me a fazer breves considerações, para as quais peço a atenção da Câmara.
O n.º 2 da proposta da comissão eventual traz-nos uma inovação.
Até agora, quando se tratasse da venda de qualquer imóvel em que houvesse inquilinos com arrendamento para fins comerciais ou industriais, a lei facultava-lhes o direito de preferência ou opção. Agora, pelo n.º 2, amplia-se esse mesmo direito aos arrendatários apenas para habitação, desde que não tenham sublocado total ou parcialmente a casa arrendada.
Já tive oportunidade de chamar a atenção de VV. Ex.ªs para a gravíssima consequência que tinha em matéria de desvalorização da riqueza imobiliária da Nação toda a medida que conduza a afectar desnecessariamente o valor dos imóveis.
Ora este novo preceito cria-lhes uma nova afectação, e, essa, gravíssima.
Todos os que aqui se encontram têm da vida o conhecimento indispensável para saber que a existência do direito de opção afecta sempre o valor do imóvel sobre que recai.
No regime actual, quando se tratava da venda de imóvel no todo ou em parte ocupado por inquilinos com arrendamentos para fins comerciais ou industriais, as complicações já se faziam sentir, afectando o valor da transacção ou facilitando exigências e habilidades condenáveis.
Inúmeros pretendentes afastavam-se dó negócio porque, segundo alegavam, «não queriam estar a fazer preço para os outros».
Mas, enfim, foi e é lei do País; há já uma avultada soma de interesses orientada neste pendor.
Agora, porém, propõem-nos ampliar este regime ao inquilinato para habitação! Ainda se a proposta correspondesse a uma corrente de opinião, a uma aspiração largamente apregoada, ou a uma dessas psicoses a que aqui ouvi aludir; se tivessem chegado até esta Assembleia reclamações no sentido da criação de mais este

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novo direito de opção, ainda vá lá! Não me consta, porém, que se verifique qualquer dos casos que indico.
Vamos, portanto, desfalcar a propriedade urbana, sem que correspondamos a um movimento de opinião, a uma necessidade social ou económica imperativa.
Por mim, opor-me-ei com quanta força puder.
Começo, para tanto, por propor a eliminação pura e simples deste artigo, e cada um votará como entender.
Tenho dito.

O Sr. Sá Carneiro: - A comissão eventual perfilha a sugestão do projecto n.º 104, mas não faz questão fechada do assunto, como não a faz de qualquer outro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O argumento de que não houve apelo, usado pelo Sr. Deputado Bustorff da Silva, não me comove.
O que interessa é decidir se a preferência na compra do prédio arrendado deve ser concedida, como actualmente acontece, apenas ao arrendatário comercial ou industriai - e, por natural extensão, ao de profissão liberal -, ou também ao simples arrendatário de habitação.
Por minha parte, sustento convictamente que todos os arrendatários devem ter o direito de preferência.
Se considerarmos justa a disposição proposta, ela deve ser aceita, sem necessidade de virem cartas, telegramas ou representações de quem quer que seja.
Por minha parte, já há muitos anos sustento que há tantas ou mais razões para conceder o direito de preferência ao arrendatário da habitação do que ao arrendatário comercial ou industrial.
É certo que, em princípio, as preferências visam a acabar com propriedades imperfeitas.
Mas não é essa a justificação do direito de preferência conferido ao arrendatário, e que entre nós existe desde a lei n.º 1:662, de 4 de Setembro de 1924.
O legislador entendeu talvez que, podendo o estabelecimento ter aumentado o valor do prédio, seria natural permitir ao arrendatário tornar-se proprietário dele.
Se esta razão não colhe para o inquilinato de habitação, o certo é que outras existem, embora de índole mais espiritual que material.
Mas nem por isso devem deixar de ser consideradas.
Ao redigir o projecto tive presente o que se passa nó Porto, em que cada família vive numa casa independente, ao contrário do que se passa em Lisboa, em que está mais generalizado o sistema dos andares.
No entanto, também naquela cidade se vai estabelecendo o mesmo regime.
E o apego da família no seu andar, as recordações alegres e tristes que ele evoca, podem ser tão intensas como as que sentem os moradores de casas independentes.
Como vai ser regulamentada a propriedade por andares, prevê-se para todos os casos a preferência parcial, que actualmente não é consentida.
O receio das complicações na venda do prédio é um pouco exagerado, pois o senhorio pode evitar as notificações, obtendo a renúncia do arrendatário à preferência.
E o arrendatário não está no melhor campo, pois pela actual legislação fiscal nem é necessário pagar sisa relativamente ao preço simulado, pois tal imposto incide sobre o valor colectável do prédio com a actualização determinada na lei.
Ora as simulações de valor para evitar o exercício do direito de preferência são de todos os dias, o que faz correr aos arrendatários o risco de terem de renunciar ao exercício da preferência ou de fazerem valer esse por valor altíssimo, dando, assim, ao alienante e ao adquirente um lucro que por vezes é da ordem das centenas de contos.
Pessoalmente voto o que está no texto da comissão; esta como que se desinteressa do problema, embora alguns dos seus membros votem comigo. Julgo ter traduzido o pensamento da comissão eventual.

O Sr. Bustorff da Silva: - V. Ex.ª dá-me licença?
V. Ex.ª reconhece ou não que a aceitação desta determinação afecta mais uma vez o valor de venda do imobiliário?

O Orador: - A afectação do valor de venda é discutível, porque o senhorio não fica privado do direito de vender o prédio quando quiser e pelo melhor preço que obtenha.
A Câmara Corporativa pronunciou-se contra esta parte do projecto, dizendo até que mais valia suprimir a preferência concedida ao arrendatário comercial ou industrial do que conceder-se também aos da habitação.
Pelas razões que expus, não perfilho esse critério.
Tenho dito.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: as restrições à liberdade contratual foram estabelecidas a partir de 1914, especialmente tendo em vista a estabilidade na habitação, embora do beneficio tivessem aproveitado também as actividades económicas. Justifica-se até certo limite.
Mas não compreendo que, a pretexto da estabilidade, se tivesse exagerado a limitação nas rendas e, ainda por cima, se estabelecessem outras concessões ao comércio e à indústria de que o inquilino de habitação não desfruta.
Havia uma crise de falta de casas e não havia falta apreciável de locais para estabelecimentos; e as actividades económicas tinham a própria estabilidade, até certo ponto, assegurada com o direito a indemnização, no caso de despejo no fim do contrato.
Sem embargo, na estabilidade e na limitação da renda, a situação para eles é idêntica à da habitação, com pequena diferença no coeficiente dos aumentos que têm sido decretados.
O comércio e a indústria gozam, porém, de mais outra regalia. É o direito de preferência no caso de alienação do prédio que ocupam, conferido no artigo 11.º da lei n.º 1:662.
Os inquilinos são notificados, para declararem se pretendem usar do direito de preferência, e a sua renúncia consta da escritura, se não constar já de documento anterior.
Era o que estava naquela lei e na base se mantém de modo mais claro e aperfeiçoado.
É um bem? É um mal?
Eu creio que não é grande mal, porque nunca me provaram que, por motivo dela, prédios sujeitos a esta condição tenham sido vendidos por preço vil ou inferior ao seu valor real. E também não me consta que, pelo mesmo motivo, tenham faltado pretendentes, ou ficado desertas as praças.

O Sr. Sá Carneiro: - É preciso salientar que na proposta só se dá a preferência aos arrendatários da habitação se não houver arrendatários comerciais ou industriais.

O Orador: - É assim mesmo; e não haverá razões suficientes para não ser votado o que a comissão eventual propõe.

ão vejo deduzir argumentos que contrariem suficientemente o critério de igualdade que preconizamos.
Igualdade relativa, porque, na graduação do direito, colocamos em primeiro lugar o comércio e a indústria.
Inconvenientes?

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Pode havê-los; mas a prática, que eu saiba, não tem revelado que sejam frequentes. E não julgo que venham a ser, em geral, maiores no caso de prédios de habitação por motivo de serem por vezes numerosos os inquilinos a notificar. Muitos e muitos são também os prédios com numerosos inquilinos comerciantes ou industriais.
Como é óbvio, a preferência dá-se em igualdade de preço e condições.
- O proprietário recebe uma oferta que lhe convém; notifica os arrendatários pela ordem indicada na base para optarem ou não. Se eles não optam, realiza a transacção com o pretendente.
Resulta, deste mecanismo, prejuízo para o vendedor?

O Sr. Albano de Magalhães: - Resulta: afasta o comprador, por ter receio de ser preferido na oferta.

O Orador: - Pode suceder assim em certos casos. Não o contesto, embora a minha vida profissional ainda não me tivesse levado o conhecer qualquer exemplo marcante de venda por mau preço devido a essa razão.

O Sr. Carlos Borges: - Não é questão de baixo preço; é a de não se atingir o limite máximo do preço que o vendedor poderia obter.

O Orador: - VV. Ex.ªs têm algum argumento a opor...

O Sr. Bustorff da Silva: - E decisivo! Não vale a pena agravar o mal!

O Orador: - Eu peço a palavra...

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Câmara e peço ao Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu o favor de falar para a Mesa.

O Orador: - Eu vejo as coisas assim: desde que se mantenha a doutrina do artigo 11.º da lei n.º 1:662, devia ser votada a base proposta. Defendo a igualdade de direitos; e coloco o social acima do especulativo.
Não julgo defensável a disparidade, tanto mais que, antes de tudo, acima de tudo está a defesa do lar; e as actividades económicas têm a estabilidade mais garantida, com o direito a indemnização E têm também direito ao traspasse. Não me fica pesando o remorso de causar dano aos proprietários. Os danos derivam sim de rendas ridículas que ainda recebem de muitos estabelecimentos ricos onde se têm feito fortunas, muitas vezes completadas com traspasses por cifras astronómicas. Ainda os há nas melhores ruas da Baixa de Lisboa que pagam menos de 500$ de renda mensal!
Mas a Assembleia entende que o direito de opção é um mal? Então, suprima-o para todos.
Tenho dito.

O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente: o n.º 1 da proposta apresentada pela comissão eventual torna extensivo aos inquilinos de habitação o direito de preferência, que já está hoje consignado nas nossas leis para os inquilinos do comércio ou indústria.
Alarga-se, assim, um direito de preferência que, em meu entender e invocando o mesmo argumento que invocou o ilustre Deputado Sr. Cancela de Abreu, em face da experiência que me deram trinta anos de vida profissional, constitui um factor de desvalorização dos prédios. E, quantos mais são aqueles que têm o direito de preferência, quanto mais extensa se vai tornando essa hierarquia que tem de se estabelecer, tanto mais o prédio se desvaloriza.

O Sr. Bustorff da Silva: - E até com esta agravante: é que se trata de um direito de preferência concedido a pessoas abastadas e que podem comprar o prédio.

O Orador: - De forma que, Sr. Presidente, a verdade ou a realidade do que se passa, quando se trata de vender um prédio que está sujeito a este direito de preferência, é que há sempre imensos compradores que se retraem com o argumento de que não estão para fazer preços para outrem.
Apoiados.
Se nós tivermos estabelecido sobre um prédio vários direitos de preferência, quer por força de compropriedade, quer por força de inquilinato comercial ou de habitação, é evidente que se tem de andar a percorrer a via-sacra dos preferentes...
A maior parte das pessoas que desejam comprar desejam fazê-lo rapidamente; até mesmo desejam que se não divulgue o nome de comprador.
Se estamos a onerar por tal forma os prédios urbanos, vamos agravar a posição dos senhorios, que já não é nada lisonjeira.
Não há dúvida de que o direito de preferência conferido ao inquilino comercial ou industrial tem uma forte razão de ser.
Por vezes estão ligados ao prédio onde instalou a sua actividade todo o seu interesse, toda a sua vida económica. Pode até mesmo esse comerciante ou industrial querer aproveitar o resto do prédio para melhorar o seu comércio ou a sua indústria. Portanto há uma razão de ordem económica que explica o direito de preferência que lhe é concedido.
Para o inquilino de habitação já o caso assim não é, porque esse pode, quando muito, querer utilizar a parte que habita ou então especular para despejar os inquilinos e aumentar os seus proventos.
Portanto, não posso aceitar mais esta restrição ao direito de propriedade do senhorio impondo-lhe mais um direito de preferência.
Tenho dito.

O Sr. Pinto Coelho: - Sr. Presidente: associo-me inteiramente às considerações dos meus ilustres colegas Srs. Bustorff da Silva e Artur Proença Duarte.
Embora tenha uma experiência muito mais curta do que a do meu não menos ilustre colega Sr. Cancela de Abreu, essa experiência mostra-me que a atribuição de direitos de preferência importa por vezes uma considerável desvalorização dos imóveis.
Apoiados.
Pelas considerações por S. Ex.ª feitas pode justificar-se quando muito a abolição do direito de preferência já reconhecido ao comércio e à indústria, nunca a generalização a todos os prédios urbanos, como resultaria da aprovação da proposta. O proprietário fica cada vez menos proprietário. Tudo quanto seja limitar a liberdade contratual representa um obstáculo à construção de novos prédios.
Há uma grande massa de construtores que muitas vezes tom de contrair empréstimos para fazer os prédios e têm necessidade de os vender muitas vezes rapidamente para saldar os seus compromissos; portanto, o que agora se pretende representa uma força contrária à construção, necessária para debelar a crise da habitação.
Muitas vezes também há prédios com numerosos inquilinos; esse direito de preferência conferido a todos representa uma via-sacra, como se exprimiu o Sr. Deputado Proença Duarte, difícil de percorrer, exigindo tempo e até despesa.
Por tudo, eu daria o meu voto ao direito de preferência do arrendatário apenas quando se tratasse de

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venda judicial, mas nunca quanto à venda livremente convencionada.
Disse.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: parece-me que de duas uma. Ou não há preferência para ninguém (Não apoiados) ou há para todos (Não apoiados). VV. Ex.ªs ainda não ouviram as minhas razões e por isso acho intempestiva a discordância.

O Sr. Botelho Moniz: - Também V. Ex.ª não costuma ouvir as nossas; de forma que nós pagamos-lhe na mesma moeda.

O Orador: - Isso não é exacto.
Tenho ouvido V. Ex.ª com toda a atenção. E, se não votei as suas propostas, foi por as razões com que as justificou não me convenceram.
O Sr. Deputado Proença Duarte invocou a circunstância de o arrendatário comercial ter a sua vida inteiramente ligada ao prédio.
Todavia o inquilino de habitação também se encontra vinculado ao prédio por razões morais e afectivas, que não são para desprezar.

O Sr. Bustorff da Silva: - Ora, ora! Isso é retórica.

O Orador: - Engana-se V. Ex.ª; vivo num prédio onde nasceram meus filhos e penso quanto me custaria não o adquirir se o meu senhorio de outrora o vendesse a outrem.
Os dois casos são absolutamente idênticos. Num, há razões materiais a aconselhar a, preferência; noutro, razões morais.
Põe-se então o problema de saber se deve fazer-se a ampliação ou a eliminação da preferência.
Tirar esse direito aos arrendatários que actualmente o fruem parece-me injustificável, num momento em que, relativamente aos de Lisboa e Porto, agravamos a sua situação relativamente ao inquilinato habitacional.
O Sr. Deputado Pinto Coelho sugeriu que a preferência fosse concedida apenas no caso de venda judicial.
Mas esta é tão idêntica à particular que, havendo no projecto uma redacção que visava a eliminar as duvidas que surgiram quando da publicação da lei n.º 1:662, a Cornara Corporativa entendeu que perante o actual Código de Processo Civil isso era desnecessário.
Quanto à desvalorização da propriedade, salvo o devido respeito, parece-me que é mais uma frase feita do que uma realidade. O que a prática mostra é que continuam a vender-se prédios arrendados para o comércio e industria sem qualquer dificuldade e até com grande lucro dos contraentes, que, por vezes, obtêm do arrendatário que prefere lucro que dividem entre eles.
Tenho dito.

O Sr. Bustorff da Silva: - Sr. Presidente: não faz mal nenhum que, à medida que vamos avançando nas votações da especialidade da futura lei do inquilinato, nos mantenhamos em coerência com aquilo que votámos anteriormente.
Ora quem tiver esta mínima preocupação não admite, decerto, que se encontram em perfeita paridade de situações o arrendatário comercial ou industrial e o arrendatário para a sua habitação.
Votámos ontem que o arrendamento dos estabelecimentos comerciais e industriais tem de constar de escritura pública e dispensámos o título escrito para a prova do arrendamento para habitação.
Ora VV. Ex.ªs ponderem no embrechado que iremos criar: para o inquilino comercial e industrial não há dúvida de que o senhorio do prédio sabe quem deve
notificar, porque será aquele que tiver feito a escritura pública de arrendamento.

O Sr. Sá Carneiro: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Tenha paciência, mas deixe-me acabar o meu raciocínio
Com o inquilinato comercial e industrial acontece como já disse, mas para o inquilinato de habitação o contrato não carece de ser escrito, um simples recibo presume-o, o que pode dar origem a dificuldades na identificação dos inquilinos com arrendamento para habitação. Bastará esquecer um deles para que o contrato de venda do prédio enferme ipso facto de graves riscos.
Criaremos - posso anunciá-lo sem receio de me enganar - autênticos ninhos de questões.
E para quê, senhores, para quê?
Dizem que é frase feita a notificação; mas frase feita é o argumento que se lhe opõe.
O Sr. Dr. Sá Carneiro sabe que há infinitas transacções em que, sobretudo, domina a necessidade da urgência.

O Sr. Proença Duarte: - O segredo do negócio.

O Orador: - Isso mesmo, o segredo do negócio.
Trinta anos de experiência demonstram que há inúmeras transacções em que o pretendente impõe que o seu nome não apareça, porque não lhe convém ou porque prejudica à transacção que o seu nome seja conhecido antes do facto consumado: situações de família, situações de ordem moral, enfim, mil e uma hipóteses.
Repugna-me, por conseguinte, que se persista em criar uma situação inteiramente nova, e que ninguém reclama, como esta do direito de opção para o inquilinato para habitação.
Mais!
O exercício do direito de preferência encontra-se hoje regulado nos artigos 1511.º e seguintes do Código de Processo Civil.
Há que requerer uma notificação judicial, depositá-la na secretaria judicial, aguardar pelo prazo legal, lavrar termo ao preferente que declara querer usar do direito, aguardar vinte dias que ele celebre ou não a escritura; perder tempo e dinheiro se ele, afinal, se recusar; assistir a licitações quando o direito de preferência competir a várias pessoas simultaneamente - numa síntese: incorrer em despesas, perdas de tempo e complicações sem conto.
A simples efectivação da notificação, que parece coisa simples, pode arrastar-se ou protelar-se por dias, semanas...

O Sr. Sá Carneiro: - Se houver renúncia, não há notificação.

O Orador: - Vejam VV. Ex.ªs o argumento! Mas, se presumimos que haverá renúncia, parece que estamos a perder tempo concedendo o direito. E, depois da notificação feita, vejam VV. Ex.ªs o larguíssimo período que por lei está reservado ao arrendatário para usar do direito de opção.

O Sr. Madeira Pinto: - E se a própria notificação tiver que ser edital?

O Orador: - É evidente!
Depois deste argumento do Sr. Dr. Madeira Pinto, que é fundamental, nada mais tenho a dizer, limitando-me a requerer a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que a votação seja feita por números.
Tenho dito.

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O Sr. Belchior da Costa: - Sr. Presidente: a disposição que estamos discutindo é, para a minha sensibilidade, uma das mais sedutoras que contém esta proposta.
Penso que as razões essenciais que na lei n.º 1:662 ditaram o preceito que dá ao arrendatário comercial ou industrial o direito de opção na venda do prédio foram razões quase exclusivamente de ordem económica. E penso que as razões que nos impelem para a votação do preceito que está em discussão são para mira, e suponho que para todos nós, razões muito mais ponderáveis e importantes, porque são razões de ordem social e de ordem moral. A situação que existe coloca o arrendatário comercial e industrial numa situação de verdadeiro e manifesto privilégio e de favor em relação à situação do arrendatário para habitação. Não vejo, do ponto de vista dos interesses morais e sociais, razão bastante para continuar a manutenção desse privilégio. É um manifesto favor da lei.
Porque não havemos de ser nós, que tanto nos preocupamos com os interesses morais e sociais, a alargar o preceito até ao inquilinato de habitação, que é na província, por assim dizer, a regra? Porque, nas cidades, uma grande parte das casas que podem ser alugadas podem ser objecto do direito de preferência, porque nelas se exerce, em muito ou pouco, em pequena ou grande escala, o comércio ou a indústria, e assim, ao fim e ao cabo, nas grandes cidades, normalmente, na venda dos prédios, há possibilidades do exercício desse direito de opção. Esta situação torna-se de flagrante injustiça, comparando-a com o que se passa com referência aos prédios da província, em que normalmente essa situação não existe, ou pelo menos não existe em tanta densidade.
Sou por isso abertamente, de todo o coração, pela aprovação, tal e qual está, da base, concedendo ao arrendamento para habitação o direito de preferência tal e qual a comissão propõe.
E num assunto que eu verifico que despertou tanta discussão, em que os pontos de vista se manifestam tão dispares, eu, que sinto a província porque a vivo, não quis deixar de marcar a minha posição neste momento, abraçando, como digo, de todo o coração a disposição, que voto com a máxima e perfeita consciência.
Tenho dito.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: duas palavras apenas, porque, segundo creio, a questão deve considerar-se suficientemente esclarecida. Mas não queria deixar de sublinhar dois aspectos que me parece não foram abordados.
O Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu entende que o direito de preferência ou deve ser reconhecido tanto para o inquilinato comerciai como para o de habitação ou não deve ser reconhecido em nenhum dos casos. Acrescenta, porém, se bem entendi o pensamento de S. Exa., que, em princípio, desejaria não o ver admitido nem para um nem para o outro caso, embora o admita para ambos eles, atendendo a que já existe no inquilinato comercial.
Salvo melhor critério, S. Ex.ª podia, sem pecado contra a lógica, concluir deste outro modo: discordo do direito de preferência para ambos os casos; mas como já existe para um, resigno-me a suportar este mal e recuso-me a alargá-lo ao outro caso.
Independentemente desta consideração, parece-me que se pode aceitar sem dificuldade, contra o sustentado pelo Sr. Dr. Sá Carneiro, uma certa diferença entre as duas formas de inquilinato.
Falou S. Ex.ª na estabilidade do lar e equiparou-a à estabilidade da casa comercial ou industrial. Eu entendo que estas estabilidades são de natureza diferente e não devem, por isso, comparar-se. A estabilidade do lar não equivale a estabilidade da habitação da família e esta é que poderia sujeitar-se à equiparação com a estabilidade da casa comercial ou industrial.
Todavia, há ainda assim aspectos que podem, no problema em causa, não levar a concluir do mesmo modo para ambas as formas de inquilinato. Digo porquê:
Suponhamos que, por abundância de prédios novos ou devolutos, a curva das rendas é descendente. Um estabelecimento comercial, normalmente, nem por isso se transferirá para outra casa, sobretudo se estiver bem afreguesado e a transferência houver de ser para outro bairro ou até para outra rua menos convenientes.
Mas no inquilinato de habitação, por mais sólida que seja a estabilidade familiar, a transferência da habitação, desde que se verifique acentuada baixa de rendas, é mais sugestiva e verificar-se-á mais facilmente. Na verdade, acaso o bom senso do chefe da família hesitará entre ficar na antiga casa, por simples consideração de ordem moral, e alugar outra, sob o imperativo de um factor de ordem económica, que não é... imoral?
Isto quanto à estabilidade.
Alegou-se contra o alargamento do direito de preferência ao inquilino de habitação o desfalque a que ficaria sujeito o património nacional, a riqueza nacional. Aceito o argumento. E acrescento isto, que se me afigura de considerar: o inquilino comercial tem interesse directo na boa conservação e até no melhoramento do seu estabelecimento, da sua loja, até para chamariz da clientela.
Mas, se vier a dar-se o direito de preferência no inquilinato para habitação, aqui o problema pode apresentar-se ao invés. Será o inquilino a importar-se menos com a conservação da casa, a ter interesse até na sua má conservação e, portanto, na diminuição do seu valor, para, quando vier eventualmente a ser vendido, o adquirir mais barato.
Apoiados.
Finalmente, Sr. Presidente, se se invocam as exigências da lógica nesta discussão, sejamos lógicos até ao fim. E que diz a lógica? Diz isto:
Em matéria de rendas a economia do sistema aprovado pela Assembleia foi a seguinte: defender os legítimos direitos do senhorio na medida julgada possível; não obrigar os inquilinos a sacrifícios tidos por menos razoáveis. Nesta ordem de ideias, em Lisboa e Porto estabeleceram se fortes restrições aos direitos dos senhorios, em protecção dos inquilinos, e no resto da País desanuviaram-se aqueles direitos destas restrições.
Ora, sendo assim, eu compreenderia o direito de preferência para os inquilinos para fora de Lisboa e Porto.
Mas para Lisboa e Porto tenho como incoerência dizer-se que o inquilino não pode pagar mais de renda e poderá vir a comprar o prédio, e por menos o que se não tivesse direito de preferência.
Em resumo, no meio destas confusões de lógica, menos ilógico será eliminar-se o n.º 2 do artigo 26.º
Tenho dito.

O Sr. Querubim Guimarães: - Sr. Presidente: eu sou, como já manifestei ao tratar-se do capitulo das expropriações, um defensor acérrimo da propriedade; defendo assim a Constituição, que a garante, e defendo a boa ordem social, mas acho que há certas restrições que nós reconhecemos e temos reconhecido como necessárias.
Reconheço-o também agora, ao entrar-se no capítulo do direito de preferência, questão que tem delicadeza manifesta. Por um lado, há um problema de ordem económica e material de urgência para fazer um contrato, como afirmou o Sr. Deputado Bustorff da Silva, que se não coaduna com este direito de preferência, sujeito a formalidades processuais que podem prejudicar um negócio de urgência, isto no caso do inquilinato de habitação, que reputo diferente do de inquilinato comercial ou industrial ou de profissão liberal, do n.º 1 da

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670 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 156

base. Ao direito de habitação recuso a preferência que a base estabelece. Mas eu sigo a opinião do Sr. Dr. Belchior da Costa de que se deve garantir à família, na habitação, o mesmo direito de permanência no prédio, e agora como proprietário, que o direito de preferência lhe dará.
Um lar que durante muito tempo ocupe um prédio tem direitos respeitáveis, e mais respeitáveis até, no seu aspecto moral, que os de ordem económica e material do caso de inquilinato.
A casa onde morreram os pais e avós conviventes com o arrendatário, onde nasceram filhos e netos, é um prédio a que se quer sentimentalmente, com amor e carinho muito especiais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não posso compreender que numa época de renovação cristã e moral essa circunstância não seja de ponderar.
Os valores morais e espirituais têm de respeitar-se e situar-se, a meu ver, acima de quaisquer outros.
A minha consciência não repugna aceitar esse direito de preferência, no caso de venda do prédio, como vejo manifestarem alguns Srs. Deputados, por afectar o direito de propriedade.
Não julgo que haja diminuição notável do direito de propriedade dando esta preferência ao inquilino de habitação, tal como ao inquilino comercial e industrial.
À soma de interesses materiais a que neste caso se atende para admitir a preferência iguala-se pelo menos a soma dos valores morais a que me refiro.
Acho que estes valores morais, estes valores espirituais são indispensáveis para prestígio da família e não podem estar sujeitos a contingências, que podem ser graves para ela no caso de ser outro o proprietário do prédio.

O Sr. Proença Duarte: - V. Ex.ª considera mais respeitável esse direito de ordem moral do que o direito de plena propriedade?

O Sr. Belchior da Costa: - E V. Ex.ª considera de maior valor o argumento de ordem económica que dá ao arrendatário comercial ou industrial o direito de opção?

O Orador: - O argumento que apresentou o Sr. Deputado Proença Duarte não pode, a meu ver, invocar-se para procedência do ponto de vista que S. Ex.ª defende. O arrendatário continua a sê-lo com o prédio no domínio de outro.
O arrendatário continua a ser arrendatário, é um facto, e a estar de posse do prédio, mas a sua posição pode ser muito diferente, porque ele não sabe, ignora mesmo, quem é o novo proprietário, e pode realmente vir a tomar o domínio do prédio uma pessoa que crie à estabilidade do lar dificuldades, preocupações, às vexes de certa gravidade.
É sempre uma incógnita, uma interrogação, que preocupa o arrendatário e a respectiva família.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, eu, pela minha parte, não posso deixar de dar o meu assentimento à base da comissão eventual, votando-a logo na ocasião própria.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Visto não estar mais ninguém inscrito para usar da palavra sobre este artigo, vai passar-se à votação.

O Sr. Mendes do Amaral: - Sr. Presidente: requeiro a V. Ex.ª que a votação seja feita número por número.

O Sr. Presidente: - Devo informar V. Ex.ª de que a votação dessa maneira já tinha sido requerida.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sá Carneiro: V. Ex.ª declarou realmente que a comissão eventual se desinteressava desta proposta?

O Sr. Sá Carneiro: - O Sr. Deputado Mário de Figueiredo dirá.

O Sr. Mário de Figueiredo: - O Sr. Dr. Sá Carneiro fez essa declaração e, desde que S. Ex.ª a fez, não pode deixar de ser verdadeira.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sobre este artigo há na Mesa, como já informei a Assembleia, uma proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho para a eliminação das palavras «total ou parcialmente», que se lêem no n.º 3 do artigo 26.º Esta proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho não carece de votação especial.
Vai, portanto, votar-se a proposta de substituição da comissão eventual ao n.º 1 do artigo 26.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa.

Submetida à votação foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o n.º 2 da mesma proposta.

Submetido à votação, foi rejeitado.

O Sr. Querubim Guimarães: - Requeiro a contraprova.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à contraprova.

Procedeu-se à contraprova.

O Sr. Presidente: - Está rejeitado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Oferecem-se dúvidas se o n.º 3 deve considerar-se prejudicado pela votação anterior.

O Sr. Melo Machado: - Não posso concordar que o n.º 3 esteja prejudicado, porque pode em qualquer desses andares estar instalado um escritório comercial.
Deve, pois, ser nos termos do n.º 1, mas não pode ser considerado prejudicado.

O Sr. Presidente: - As considerações do Sr. Deputado Melo Machado conduzem a não considerar prejudicado o n.º 3 quanto às hipóteses previstas no n.º 10.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Desejo apenas que V. Ex.ª elucide a Câmara sobre as considerações que acaba de fazer de não considerar prejudicado o n.º 3.

O Sr. Presidente: - O meu pensamento é este: depois da rejeição do n.º 2, que implica a exclusão do direito de preferência no inquilinato de habitação, afigura-se-me que o n.º 3 só pode ter aplicação às hipóteses do n.º 1.

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O Sr. Mário de Figueiredo: - Se é assim que a Câmara vai votar, eu, que tenho particular responsabilidade neste caso, porque sou presidente da Comissão de Redacção, preciso de um esclarecimento. É que, salvo o devido respeito por V. Ex.ª, eu tenho a opinião de que o n.º 3 em questão não está prejudicado, nem em referência ao n.º 1 nem em referência ao n.º 2, porque uma coisa é dar direito de preferência a um inquilino que ocupa todo ou parte de um prédio sobre todo o prédio e outra é prever esse direito de preferência só para a parte do prédio ocupada pelo inquilino para quando se regulamente o instituto da chamada propriedade horizontal. São hipóteses diferentes, mas não me insurjo, de maneira nenhuma, contra a solução que V. Ex.ª dê à questão. O que eu pretendo é conhecer o sentido da votação, para amanhã, na Comissão de Redacção, saber como há-de redigir-se o pensamento votado.
Parece-me não poder, depois da votação do n.º 1, deixar de reconhecer-se a preferência instituída no n.º 3.
Agora outro problema: se é aprovado pura e simplesmente esse número, pode isso conduzir a interpretar-se como significando admitir-se o direito de preferência de um inquilino para. habitação relativamente a uma parte do prédio, quando se não admite relativamente a todo o prédio.
É por isso, Sr. Presidente, que eu suponho que a votação não deve fazer-se assim.
Parece-me que em primeiro lugar deve votar-se o n.º 3 em relação com o n.º 1, e depois fazer-se a votação do n.º 3 em relação com o n.º 2.

O Sr. Presidente: - Em virtude do adiantado da hora, vou encerrar a sessão.
A próxima sessão será hoje, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.

Eram 13 horas e 32 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
António Júdice Bustorff da Silva.
Artur Augusto Figueiroa Rego.
Artur Proença Duarte.
Ernesto Amaro Lopes Subtil.
Henrique Carlos Malta Galvão.
João Ameal.
João Carlos de Sá Alves.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Mendes do Amaral.
Jorge Botelho Moniz.
José Maria de Sacadura Botte.
José Penalva Franco Frazão.
Luís tia Câmara Pinto Coelho.
Luís Lopes Vieira de Castro.
Luís Mendes de Matos.
Luís Teotónio Pereira.
Manuel da Cunha e Costa Marques Mano.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Ricardo Malhou Durão.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Albano da Câmara Pimentel Homem de Melo.
Alexandre Ferreira Pinto Basto.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Fernão Couceiro da Costa.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Horácio José de Sá Viana Rebelo.
Jacinto Bicudo de Medeiros.
João Garcia Nunes Mexia.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Jorge Viterbo Ferreira.
José Dias de Araújo Correia.
José Pereira dos Santos Cabral.
Manuel Beja Corte-Real.
Mário Lampreia de Gusmão Madeira.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Rafael da Silva Neves Duque.
Sebastião Garcia Ramires.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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