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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 36

ANO DE 1950 24 DE MARÇO

V LEGISLATURA

SESSÃO N.º 36 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 23 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Sr. Gastão Carlos de Deus Figueira
José Guilherme de Melo e Castro

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 5 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
O Sr. presidente anunciou estarem na mesa os elementos pedidos por alguns Srs. deputados a diversos serviços oficiais.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Miguel Bastos, acerca da assistência hospitalar a doentes com guia passada pelas Câmaras dos concelhos respectivos; Manuel Domingues basto, para fazer considerações sobre problemas da lavoura do Minho; Elísio Pimenta, na mesma ordem de ideias; Antunes Guimarães, sobre problemas ligados à radiodifusão em Portugal, e novamente Miguel Bastos, para explicações.

Ordem do dia. - Continuou o debate, na generalidade, sobre a proposta de lei que cria o Fundo de teatro.
Usaram da palavra os Srs. deputados Águedo de Oliveira e Délio Santos.
O Sr. Presidente encerrou a sessão ás 18 horas e 25 minutos.

CÂMARA CORPORATIVA. - Acórdãos da Comissão de Verificação de Poderes n.ºs 9/V e 10/V.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Abel Maria Castro de Lacerda.
Adriano Duarte Silva.
Afonso Eurico Ribeiro Cazaes.
Alberto Cruz.
Albino Soares Finto dos Reis Júnior.
Alexandre Alberto de Sousa Pinto.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Abrantes Tavares.
António de Almeida.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calheiros Lopes.
António Carlos Borges.
António Cortês Lobão.
António Jacinto Ferreira.
António Joaquim Simões Crespo.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria da Silva.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Raul Galiano Tavares.
António dos Santos Carreto.
António Sobral Mendes de Magalhães Ramalho.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Avelino de Sousa Campos.
Caetano Maria de Abreu Beirão.
Carlos Alberto Lopes Moreira.

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Carlos de Azevedo Mendes.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Carlos Vasco Michon de Oliveira Mourão.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Délio Nobre Santos.
Domingos Alves de Araújo.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Frederico Maria de Magalhães e Meneses Vilas Boas Vilar.
Gaspar Inácio Ferreira.
Gastão Carlos de Deus Figueira.
Henrique Linhares de Lima.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Herculano Amorim Ferreira.
Horácio José de Sá Viana Rebelo.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Alpoim Borges do Canto.
João Ameal.
João Antunes Guimarães.
João Cerveira Pinto.
João Luís Augusto das Neves.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Joaquim de Oliveira Calem.
Joaquim de Pinho Brandão.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Cardoso de Matos.
José Dias de Araújo Correia.
José Diogo de Mascarenhas Gaivão.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Soares da Fonseca.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Domingues Basto.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Maria Vaz.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Meneses.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
D. Maria Baptista dos Santos Guardiola.
Mário Correia Teles de Araújo e Albuquerque
Mário de Figueiredo.
Miguel Rodrigues Bastos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Ricardo Vaz Monteiro.
Salvador. Nunes Teixeira.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco de Campos.
Vasco Lopes Alves.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 94 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 5 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Vai dar-se conta do

Expediente

Exposição

«Sr. Presidente da Assembleia Nacional - Excelência. - O Sindicato Nacional dos Engenheiros Auxiliares, Agentes Técnicos de Engenharia e Condutores, representando os diplomados com os cursos médios de Engenharia professados nos institutos industriais, vem mui respeitosamente junto de V. Ex.ª expor o que se segue:
O projecto de lei n.º 502, referente à reorganização das escolas de belas-artes, sobre o qual já foi dado o parecer da digníssima Câmara Corporativa e que vai ser submetido à apreciação da douta Assembleia da mui digna presidência, de V. Ex.ª, na sua base II diz que:

Para ingresso no curso superior de Arquitectura seja exigida a aprovação nas disciplinas do 3.º ciclo liceal indicadas na alínea h] do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 36:507, de 17 de Setembro de 1947, e no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 36:863, de 10 de Maio de 1948; e aos que possuam a habilitação a que se refere o artigo 94.º do Estatuto ido Ensino Profissional Industrial e Comercial (Decreto n.º 37:029, de 25 de Agosto de 1948) seja facultada a matrícula nas disciplinas acima referidas do 3.º ciclo liceal para efeito de prosseguimento de estudos no curso de Arquitectura.

Não se fazendo na base II do projecto de lei em aprovação a menor referência aos diplomados pelos institutos industriais, nem aos seus alunos, que desde sempre tiveram ingresso nas escolas de belas-artes, parece poder deduzir-se não ser permitido por aquele decreto a sua admissão ao curso de Arquitectura, ou, sendo-o, ficarem postos em igualdade de condições, muito embora possuindo um curso médio de Engenharia, com os indivíduos que possuem os cursos do ensino profissional industrial e comercial a que se refere o Decreto n.º 37:029, de 25 de Agosto de 1948, para o qual podem ser admitidos, como professores adjuntos, os diplomados por aqueles institutos.
Tal omissão não parece lógica nem justa.
Porquanto:
Desde sempre os indivíduos possuidores de algumas cadeiras professadas no curso geral dos institutos industriais tiveram ingresso no curso de Arquitectura, para o que lhes era apenas exigido exame de habilitação artística.
Na própria história do curso de Arquitectura em Portugal, a que se faz referência no parecer da digníssima Câmara Corporativa, na parte respeitante à apreciação na generalidade do projecto de lei em questão, se mostra que até à data da aprovação da actual orgânica das escolas de belas-artes (Decretos n.ºs 19:760, de 20 de Maio de 1931, e 21:662, de 12 de Setembro de 1932) metade do «curso de Arquitectura era professada no Instituto Comercial e Industrial de Lisboa.
Mais se diz ainda, que só a partir de 1931 foram integradas naquele curso as disciplinas técnicas que até então se professavam no Instituto Industrial, ainda que com designação diferente.
Os artigos 12.º e 22.º, respectivamente, dos Decretos-leis n.ºs 19:760, de 20 de maio de 1931, e 21:662, de 12 de Setembro de 1932, que regulam presentemente as escolas de belas-artes, determinam:

São dispensados da prestação de provas de carácter literário e científico os «candidatos que possuí-

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rem diploma do exame de saída, do áureo geral dos liceus ou certidão dos exames das cadeiras que constituem os cursos gerais dos institutos industriais.

Isto, só por si, constitui razão anais do que suficiente para se pedir a revisão da base II do projecto de lei que vai ser submetido à apreciação da douta Assembleia Nacional, a fim de nela serem considerados os alunos e, por mais forte razão, os diplomados pelos institutos industriais.
Mas há mais:
Os artigos 8.º e 11.º do Decreto-Lei n.º 20:553, de 28 de Novembro de 1931, dão aos indivíduos que possuam determinadas cadeiras dos dois primeiros anos dos cursos professados nos institutos industriais, para efeitos de admissão à primeira matrícula no Instituto Superior Técnico ou cadeiras análogas da Faculdade de Ciências da universidade do porto e para efeitos de admissão a lugares de administração pública, equiparação ao curso complementar dos liceus.
Acresce ainda que pelo Decreto-Lei n.º 37:029, de 25 de Agosto de 1948, que estatui o ensino profissional industrial e comercial, são postos em igualdade de circunstâncias, para o exercício do lugar de professor adjunto das escolas onde é ministrado aquele ensino, os diplomados pelos cursos de Construções Civis e Minas dos institutos industriais com os possuidores do curso especial de Arquitectura das escolas de belas-artes (artigo 228.º do decreto acima referido).
Assim, e sendo certo que nos indivíduos possuidores do curso geral dos institutos industriais, lhes é facultada a admissão aos cursos superiores de Engenharia professados no Instituto Superior Técnico e Faculdades de Ciências de Lisboa e porto, parece dever manter-se esta regalia quando se refere á admissão ao curso superior de Arquitectura e que, como atrás se disse, há muito usufruem.
É lógico, pois, que tratando-se de cursos médio, não parece justo, nem conveniente para os interessados das Nação, que se criem dificuldades no que respeita à admissão a cursos superiores.
Pelas razões expostas, apelamos para a esclarecida atenção de V. Ex.ª a fim de promover que seja alterada a base II do decreto-lei que vai ser submetido à aprovação da douta Assembleia a que V. Ex.ª mui inteligente e dignamente preside no sentido de ser respeitado o direito de, como até agora desde sempre está estatuído, ponderem os indivíduos possuidores do curso geral dos institutos industriais, e consequentemente os seus diplomas, ingressar no curso superior de Arquitectura, exigindo-se-lhes, como também está determinado, exame de admissão, no programa do qual se poderão incluir provar de história e filosofia, se tanto for julgado necessário pela douta Assembleia nacional.
E certos de que razão assiste na pretensão que temos a honra de depor nas mãos de V. Ex.ª, esperamos, confiados no elevado critério e espírito de justiça da douta Assembleia nacional, que seja determinada a modificação da base II do projecto de lei n.º 502 nos termos em que se pretende.

Lisboa, 18 de março de 1950. - O Presidente da Direcção, Manuel Lopes Peixoto».

O Sr. Presidente: - Está na Mesa a cópia autêntica do oficio da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, enviada pela Presidência do Conselho, relativa 90 requerimento que o Sr. Deputado Pinto Barriga apresentou na sessão de 2 do corrente.
Também estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Marinha em satisfação de um requerimento apresentado pelo mesmo Sr. Deputado. A referida cópia e os elementos citados vão ser entregues ao Sr. Deputado requerente.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Miguel Bastos.

O Sr. Miguel Bastos: - Sr. Presidente: na sessão de 14 de Dezembro do ano findo requeri ao Governo diversas informações ligadas ao problema suscitado pela recusa de assistência médica e hospitalar, por parte dos Hospitais Civis de Lisboa, aos doentes pobres que naqueles Hospitais se apresentavam com guias passadas por certas câmaras municipais.
Recebi em 14 de Janeiro próximo passado a resposta às informações solicitadas e dispunha-me a fazer sobre o assunto uma intervenção nesta Assembleia quando fui informado, por pessoa responsável, que o Governo estudava, com o maior interesse, solução para o problema por mim posto através das perguntas formuladas e a que acabo de me referir.
Julguei, em face desta informação, ser preferível aguardar, na esperança de que rapidamente e pela via competente o assunto viesse a ter satisfatória solução.
Infelizmente vão decorridos três meses sem que a situação tivesse sido esclarecida e, pior do que isso, mantém-se a atitude dos Hospitais Civis de recusa de assistência a doentes vindos de determinadas câmaras, o que, de certo modo, representa a inutilização, por parte daqueles Hospitais, do cumprimento da obrigação legal que incumbe ias câmaras de prestarem assistência aos doentes pobres dos seus concelhos.
Torna-se, por isso, urgente intervir nesta mataria, chamando para a sua gravidade a atenção do Governo.
Muitos aspectos comporta este problema.
Rapidamente tratarei agora «penas de um, que me parece ser o mais grave - o da falta de assistência hospitalar ao doente pobre residente na área de certos concelhos do País. Segundo a nota que me deram, são agora setenta os concelhos atingidos.
Tem-se entendido - e a meu ver muito bem - que ao doente pobre sem ascendentes ou descendentes em posição económica de lhe assistir deve o Estado prestar a assistência médica e hospitalar de que necessitar.
Neste dever do Estado comparticipam largamente as câmaras municipais. O Estado subsidia largamente a assistência hospitalar em todo o País, promove, através da Comissão das Construções Hospitalares, um real melhoramento das actuais instalações, adquire novo apetrechamento e mantém em muitos pontos serviços próprios de combate à doença, e de assistência aos enfermos.
Sobre as câmaras municipais recai, no entanto, ainda um pesado e volumoso encargo obrigatório, qual seja o das despesas com o tratamento e o transporte dos doentes pobres residentes na área da sua jurisdição admitidos nos Hospitais Civis de Lisboa, nos Hospitais da Universidade de Coimbra, no Hospital Escolar, na Maternidade Dr. Alfredo da Costa, no instituto português de Oncologia, no Instituto Português de Oncologia, no Instituto de Oftalmologia Dr. Gama Pinto e no hospital de Santo António, no Porto.
Não posso discutir agora o problema de saber se deste encargo era ou não justo que o estado libertasse as câmaras. É um problema vasto, que não posso, no tempo de que disponho, tratar.

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serviços, quer em instalações, quer em pessoal, e raro é que não o faça sem que obrigue as câmaras a comparticipar largamente nas despesas resultantes destas medidas. Cita-se como exemplo o caso dos novos edifícios escolares para o ensino primário, cujos encargos muitas câmaras já com grande dificuldade suportam.
Para ocorrer a estes encargos as possibilidades de obter receitas são bem diferentes.
O Estado promove anualmente o necessário reajustamento entre as fontes de receita e as despesas que precisa realizar. E avalia as possibilidades daquelas pelo mo vim unto económico que, com actualidade, vai verificando de ano para ano. E certos da inteligência com que tem sabido aplicar, nestes últimos anos de administração pública, as autorizações concedidas, sempre tem encontrado em todos nós confiante voto de concordância e aplauso. E como pensamos que toda a firme obra económica e social só é possível em regime ide boas finanças, não criticamos o voto dado nem nos arrependemos da parcela que nele, porventura, tenhamos tomado.
O que é certo, porém, é que o regime financeiro dos municípios não vive no mesmo quadro.
O nível das receitas situa-se em previsões de 1940, com pequenas alterações em Julho de 1941. E dentro das autorizações concedidas nestas datas se continuam a manter todas as receitas municipais. A autonomia da administração local em matéria tributária é inexistente. De 1940-1941 para cá não se fez qualquer reajustamento, e tem sido dentro dos limites fixados naquelas datas que os pobres municípios têm correspondido a todos os aumentos de despesas com o pessoal, com o custo dos materiais, com a satisfação das normais necessidades das populações, que se desenvolvem e cujo nível de vida progressivamente vai aumentando e, consequentemente, novas exigências vai criando.
Os próprios Hospitais Civis ainda há pouco foram autorizados a aumentar as suas diárias.
Pareço, na verdade, uma situação difícil, que se pode tornar de um momento para o outro insustentável.
É um problema grave, que certamente o Governo há-de estudar e considerar.
Mas regressemos ao nosso problema inicial.
As câmaras têm, pois, de pagar o tratamento dos doentes pobres residentes no seu concelho. Não interessa agora considerar senão esta obrigação social devida à pessoa que, sem meios económicos, precisa de ser socorrida e amparada na doença.
E surge a gravidade do assunto.
A Câmara envia o doente aos Hospitais Civis de Lisboa e estes dizem: a câmara donde vem deve mais de 50.000$, o doente não pode entrar. Regresse ao seu domicílio. Observa, medica, acarinha, auxilia? Não. A câmara deve. O doente não pode ser tratado.
Quer dizer: esta obrigação que nasce como dever imoral por todos aceite e que está consignada expressamente na própria lei é inutilizada, revogada, esquecida por um orgão secundário da Administração - os Hospitais Civis de Lisboa, que decretam que, em relação aos concelhos cujas câmaras devam ma is de 50.000$, este princípio não se deve aplicar e os doentes residentes na área daquelas câmaras podem perfeitamente morrer sem assistência.

O Sr. Melo Machado: - É aquilo a que chamaremos, com propriedade, desumanidade.

O Orador: - Este o ponto grave que urge esclarecer devidamente.

O Sr. Amaral Neto: - V. Ex.ª está ao corrente do facto de haver uma câmara privilegiada, da qual os seus doentes beneficiam de mais de 80 por cento da capacidade de tratamento dos Hospitais Civis « que, todavia, quase nada despende?

O Orador: - V. Ex.ª refere-se ao caso da Carneira Municipal de Lisboa. E um problema muito interessante, mas que não posso agora considerar.
Prosseguindo, porém: terão os Hospitais Civis algum fundamento sério para a sua decisão? Entendo que não.
Realmente o problema nem sequer se situa entre as câmaras e os Hospitais Civis, mas verdadeiramente entre o Estado e as câmaras.
Eu esclareço já o meu pensamento.
Pela leitura atenta dos documentos que me foram fornecidos verifica-se que o Estado tem concorrido generosamente com um subsídio para suprir as deficiências das normais fontes de receita dos Hospitais Civis.
Assim, em 1947 concedeu-lhes um subsídio de 51:180.778$55, em 1948 um subsídio de 53:181.155$40 e em 1949 o subsídio elevou-se a 55:639.645$.
Com estes avultadas subsídios puderam os Hospitais Civis fechar as suas contas: em 1947 com um saldo de 307.139^91 e em 1948 com o saldo de 1:952.396$70!
Quer dizer, se as câmaras têm pago as suas dívidas, é certo que o Estado poderia ter reduzido cansideràvelmente o seu subsídio, mas o que me parece indiscutível é que os Hospitais Civis nada sofreram com a falta daquele pagamento, pois o Estado - e muito bem - supriu totalmente a falta daquela verba, garantindo com a sua contribuição que se mantivesse a função primordial dos Hospitais Civis: a de assistir a todos aqueles que numa hora sombria da sua vida a eles recorrem, numa justa esperança de auxílio, amparo e conforto.
Eu não digo que não se regularize o problema das dívidas das câmaras aos Hospitais Civis, mas o que afirmo é a falta de qualquer direito por parte dos Hospitais Civis que legitime a atitude que assumem de recusar a entrada de doentes pobres, vindos de certas câmaras, só com a alegação de que estas lhes devam quantias superiores a 50.000$.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª dá-me licença?
E que é tão manifesta a incapacidade das câmaras para pagar que há anos elas deviam 20:000 contos, agora devem 32:000 contos, e se o Estado imagina que há-de receber os 32:000 cantos das câmaras, que, voltadas do avesso, nada deitam, isso é um sonho das mil e uma noites que nunca se realizará, e eu não acredito que por isso a assistência hospitalar vá acabar.

O Orador: - A questão que V. Ex.ª põe constitui outro aspecto do problema que estou estudando, mas, como disse há pouco, são muitos os aspectos deste problema e hoje só um posso considerar.

O Sr. Melo e Castro: - E uma questão de se encararem as coisas com realismo e de se cancelarem as dívidas das câmaras aos Hospitais Civis.

O Orador: - É uma das hipóteses a considerar. Mas reatando as minhas considerações: a recusa de tratamento dos doentes a que me referi é que constitui o meu ponto de discordância, porque ela revela uma injustiça, porque ela revela um desvio do sentimento social e humano que informa a nossa doutrina e a nossa Revolução. E mais, porque esta atitude atraiçoa o próprio pensamento do Estado quando generosamente cobre as deficiências verificadas nas normais receitas dos Hospitais Civis.
Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª desculpa de me ter alongado mais do que desejava, mas vou já terminar.
Antes desejava apenas acrescentar uma nota estritamente política que me parece deve ser considerada.

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Por essa província além, a maior parte da gente pobre e humilde só conhece e sabe verdadeiramente do Governo através dos presidentes das câmaras. Eles o representam e neles se reflecte toda a acção do Poder Central.
Neste problema, de que estamos tratando o povo não compreende nem entende desta coisa de dívidas das câmara municipais aos Hospitais Civis, de máximos de descontos de 20 por cento das contribuições directas cobradas pelo Estado para os municípios, de administração autónoma dos Hospitais Civis, de subsídios avultados que aos referidos Hospitais Civis o Estado concede; o que ele sabe é que o presidente da câmara lhe passou um documento, que assinou, e com o qual lhe garantiu que ia ser tratado, e vê que, chegado a Lisboa, se riem dessa sua confiança e lhe declaram que de nada lhe serve aquele documento e que deve voltar à sua terra, com a sua miséria física e as suas dores morais.

O Sr. Melo e Castro: - E ainda mais impolítico se torna quando esses doentes, que vêm com guias das câmaras e a quem os hospitais recusam a entrada, acabam por encontrar em Lisboa pessoas influentes que conseguem a sua entrada nos hospitais pela simpática via da «cunha».
Digo-o por experiência, própria, porque frequentemente me batem à porta muitas pessoas de um concelho do distrito de Setúbal, para quem eu consigo a entrada nos hospitais à custa de muitos esforços, apesar de infelizmente,

O Orador: - Pergunto, Sr. Presidente, se haverá, na verdade, razão para colocar os delegados do Governo na triste situação que acabo de expor: E mais pergunto se o próprio Governo deseja que por essa terra fora os doentes que são pobres continuem a pensar, na sua ignorância, que é o próprio governo que não providencia para que continue a ser-lhes prestada a assistência médica e hospitalar de que necessitam?
Termino as minhas considerações solicitando do Governo providências, para que o País saiba que por determinação sua se continuam a receber nos Hospitais Civis de Lisboa todos os doentes pobres que ali se apresentem com guias passadas pelas câmaras municipais.
Impõe-se este esclarecimento por um dever de consciência, por amor à verdade dos reais sentimentos do Governo e ainda para matar certa especulação que ao redor da determinação do Sr. Enfermeiro-Mor dos Hospitais Civis de 4 de Agosto de 1949 já alguns espíritos malévolos vão construindo e espalhando.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Manuel Domingues Basto: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: razões de força maior e motivos de gravidade e urgência obrigaram-me a deixar a cidade de Lisboa durante alguns dias o a partir, inesperadamente, para o Minho, faltando assim, contra a minha vontade e meu costume, aos trabalhos desta Assembleia na sexta-feira passada, dia 17 do corrente. Ausente desta Casa nesse dia, eu não tive a felicidade nem senti o prazer espiritual de ouvir ler na Mesa da Presidência os esclarecimentos que os funcionários do Instituto Nacional de Estatística a esta Câmara apresentaram para que, por intermédio do Diário das Sessões, deles tivessem conhecimento o Governo e a própria nação portuguesa.
Foi, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando me encontrava lá no Minho, carregado com trabalho duro e absorvido por grandes preocupações, que um amigo me chamou a atenção para a notícia de um jornal de Lisboa que ao público anunciava os esclarecimentos prestados a esta Assembleia. Sinto-me feliz porque esses esclarecimentos tenham sido apresentados, mas julgo-me no dever de aos esclarecimentos apresentados juntar também os meus. Faço-o no duplo intuito de prestar homenagem ao cuidado e à inteligência com que são feitos os serviços do Instituto Nacional de Estatística - que não quis atacar - e ao mesmo tempo para afirmar que mantenho absolutamente as ligeiríssimas referências que, na parte agrícola, fiz aos serviços desse Instituto.
Ensinaram-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando era menino e moço e frequentava as aulas de Filosofia, que, para se chegar à descoberta da verdade, da verdade que é o único património capaz de satisfazer a nossa inteligência, feita para a verdade, ensinaram-me que para a conquista da verdade era necessário distinguir pura se chegar a concordar.
Foi talvez porque na minha intervenção do dia 2 de Março deste ano não precisei, não distingui bastante, e porque no mesmo erro caíram os Srs. Deputados Águedo de Oliveira e Soares da Fonseca, que então me interromperam, foi devido a essa falta de distinção e precisão de parte a parte que se gerou ura equívoco que quero destruir inteiramente, porque sempre me norteou, nas minhas acções, o amor da verdade e o princípio da justiça.
O equívoco é este: os dois ilustres Deputados que me interromperam parece que supuseram que eu fazia um ataque ao trabalho maciço do Instituto Nacional de Estatística, quando isso não estava nas minhas palavras, e portanto não podia estar nas minhas intenções.

O Sr. Soares da Fonseca: - V. Ex.ª dá-me licença?
Quero ter o prazer do afirmar a V. Ex.ª que entendi as suas palavras na sessão de 2 de Março sem ver nelas a intenção de qualquer ataque maciço aos serviços da estatística e que, portanto, as entendi no sentido que delas naturalmente decorria. Mas, exactamente por isso, devo dizer também que continuo a considerar justos os meus apartes a V. Ex.ª naquela sessão.

O Orador: - Agradeço os esclarecimentos, que me satisfazem inteiramente, mas V. Ex.ª compreenderá que os apartes não eram justos se se considerar que não era sequer uma apreciação dos serviços do Instituto Nacional de Estatística que eu fazia, mas apenas uma ligeira referência, sintetizada na frase literária de Eça de Queirós: «Sobre a nudez forte da verdade, o manto diáfano da fantasia».
Isto é tão ligeiro que não chega sequer a ser uma crítica aos serviços daquele Instituto. Quero prestar a minha homenagem, à maneira como são feitos os serviços do Instituto Nacional de Estatística, em que, de ano para ano, se nota a perfeição. Tenho o prazer de afirmar que, em confronto com os serviços de outras nações, não ficam mal colocados os serviços desse Instituto.
Mas toda a bela tem o seu senão, e exactamente porque a perfeição com que se publicam os números daquele Instituto é de pôr em relevo, se estranha que à sua folha agrária, que é publicada todos os meses, se não possam fazer iguais referências.
Prestando a minha homenagem aos serviços do Instituto Nacional do Estatística, mantenho as referências que fiz quanto à folha agrícola, pois aí é que, por vezes, se nota um pouco de optimismo, colocando-se um manto diáfano da fantasia sobre a nudez forte da verdade.
É muito difícil estar-se no Terreiro do Paço, num ambiente de burocracia, longe do Minho, e poder fazer-se uma ideia exacta das necessidades das povoações e do estado económico das famílias do Minho.
Ainda há dias um ilustre Subsecretário de Estado do actual Governo, que antes de estar no cargo que ocupa

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percorreu muito o Minho e as terras do Minho, me dizia: «Em Lisboa o Minho é muito desconhecido».
Estar numa repartição pública onde nada falta, instalado comodamente, ter inclusivamente a possibilidade de, sentindo-se um pouco do sedo, chamar um contínuo para trazer um copo do água, não é certamente o melhor ambiente para. apreciar com exactidão as necessidades das populações rurais de Entre Douro e Minho.
Esse Sr. Subsecretário de Estado dizia-me ainda mais:
«O Minho tem uma desconfiança e um medo enorme dos técnicos e dos funcionários, porque, se eles lhe tem aparecido poucas vezes para o beneficiar e proteger, em compensação têm-lhe aparecido muitas vezes para lhe lançar encargos. Assim não é possível que eles possam ganhar inteiramente a confiança e o coração das populações».
Todas estas circunstâncias devem ser ponderadas para se distinguir e precisar, ou, distinguindo e precisando, pôr a questão nos seus devidos termos, porque, se pôr mal uma questão é resolvê-la mal, pôr bem uma questão é resolvê-la com êxito.
Era necessário que tudo isto se dissesse, para que não estejamos aqui a perder tempo e a gastar palavras com o que em linguagem de escola se chama ignorância do elenco ou deslocamento do estado da questão.
Até aqui o que em linguagem parlamentar podemos chamar a discussão geral do caso ou a discussão do caso na sua generalidade.
Agora pergunto: onde haverá mais objectividade, onde haverá mais subjectivismo, nas estimativas dos funcionários que de longe falam do Minho ou nos factos que trago a esta Câmara, andando eu no meio do povo do Minho e sentindo as suas necessidades?

O Sr. André Navarro: - O Instituto Nacional de Estatística, quando presta essas informações, apoia-se sobre dados concretos que lhe são fornecidos pela estação agrária de Braga, a qual fica em pleno coração do Minho.

O Orador: - Se V. Ex.ª não tivesse pressa demais ouviria a resposta a esse seu aparte, porque eu vou provar, se V. Ex.ª, Sr. Presidente, me der licença, que as folhas agrícolas do Instituto Nacional de Estatística estão por vezes em contradição com as informações mensais que vêm do Posto Agrário de Braga.
É mais fácil haver subjectivismo, dizia eu, nas estimativas dos funcionários do que nos factos que eu trouxe a esta Câmara, com o intuito de informar conscienciosamente o Governo e no desejo de bem servir no exercício do meu cargo de Deputado, defendendo as populações rurais do Minho.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para sentir assim com o povo não preciso sequer de dizer-me democrático da democracia política, porque me basta apenas dizer-me partidário do Evangelho e sacerdote que procura pôr o Evangelho em prática.
Se nada daquilo que diz respeito ao homem pode ser indiferente a quem é verdadeiramente humano, nada daquilo que é sofrimento das populações rurais e de qualquer alma pode ser indiferente ao sacerdote que cumpre o seu dever e sabe qual é a sua missão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Creio que talvez se evitassem estes pequenos inconvenientes se, como disse há pouco - sem querer negar o merecimento à maneira como se elaboram os boletins do Instituto Nacional de Estatística -, os funcionários que têm maior responsabilidade neste serviço fizessem o que fez no Marrocos francês o marechal Lyautey, que todos os dias, durante duas horas, saia da sua repartição, deixava o ambiente burocrático dela e ia ouvir o homem do povo, verificando como estava a funcionar a máquina que montara.
Apreciado o assunto na sua generalidade, eu peço licença a VV. Ex.ªs, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para analisar propriamente os pontos mais importantes dos elementos apresentados pelos funcionários do Instituto Nacional de Estatística.
Referem-se eles à parte objectiva e à parte subjectiva. Limito-me a perguntar qual é a parte subjectiva. É a deles ou é a minha? Quem quiser que julgue.
Depois dizem eles que não dispõem de todos os elementos de informação.
Ora se assim é, em vez de terem a sensibilidade à flor da pele, a ponto de nem com uma flor se lhes poder tocar, era natural que agradecessem a colaboração que lhes trago, para acrescentar mais alguns elementos àqueles que conseguiram com tanto trabalho e com tanto cuidado.
Afirmam ainda os funcionários do Instituto Nacional de Estatística que as estatísticas são provisórias. Se são provisórias, para que se possam tornar definitivas devem agradecer-se todos os elementos que esclareçam a verdade.
Nos esclarecimentos apresentados a esta Câmara diz-se ainda que duas são as bases sobre que os serviços do Instituto Nacional de Estatística fazem a folha agrícola mensal: as informações dos técnicos espalhados pelas diferentes regiões agrícolas do País e a indicação dada pelo Instituto Internacional de Agricultura.
Assim fazem uma previsão do que poderão vir a ser as colheitas e os preços se nada se passar de anormal. É portanto uma previsão o que nos dão as folhas agrícolas mensais. Mas como de posse ad esse non valet ilatio, (eu explico em português, porque, embora os membros desta Câmara já não frequentem o liceu, onde o latim foi banido em homenagem à frivolidade dos nossos dias, talvez a explicação seja necessária). A frase latina em português quer dizer que das previsões às realidades vai uma distância enorme, e que por isso não é de estranhar que as previsões das folhas agrícolas que mensalmente se publicam exijam muita correcção para se chegar à realidade.
Além disso, diz-se nos esclarecimentos apresentados a esta Câmara que as informações apresentadas se referem a todo o País e não a qualquer região.
Sr. Presidente: permito-me, com o respeito que me merecem os funcionários do Instituto Nacional de Estatística, fazer um pedido, e é que corrijam aquele critério. Em matéria de agricultura o Sul e o Norte são muito diferentes. Em matéria de clima o Sul e o Norte não são iguais. Se o boletim meteorológico dá as previsões para o Norte, Centro e Sul do País - e a agricultura não pode prescindir do factor tempo e do tempo dependem as colheitas, a pecuária e os preços -, deve haver nas folhas agrícolas estimativas ao menos para o Norte, Centro e Sul do País. O Minho também é Portugal, e tão Portugal que de lá partiu a Revolução que restituiu Portugal à ordem e trouxe a ordem a Portugal.
Finalmente, Sr. Presidente, e para terminar, quero analisar, com o critério mais objectivo que possa, os dados que os elementos do Instituto Nacional de Estatística apresentaram a esta Câmara, pondo em confronto os dizeres das folhas agrícolas de cada mês e as informações do Posto Agrário de Braga. Não quero ser desagradável para ninguém, mas devo dizer que em alguns meses a folha agrária dos serviços de estatística está em contradição com a informação do Posto Agrário de Braga.

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O Sr. André Navarro:-V. Ex.ª dá-me licença?

V. Ex.ª está a insistir num ponto em que continua a estar num campo errado. As informações não são dadas exclusivamente pelo Posto Agrário de Braga, mas pelos técnicos espalhados pelo Minho, motivo por que sucede as médias das informações não estarem de harmonia com as do Posto Agrário.

O Orador: - Os esclarecimentos dos serviços de estatística dizem que as informações respeitantes à I região agrícola, que coincide aproximadamente com a província do Minho, são dadas pelo Posto Agrário de Braga. Dizem ainda que as informações das folhas são provisórias. Se são provisórias, quer dizer que se fazem com os elementos que têm e que não excluem correcções que as tornem definitivas.
Mas porque na última parte desses esclarecimentos os serviços do Instituto Nacional de Estatística fazem finca-pé no confronto da folha agrícola com as informações do Posto Agrário de Braga, eu vou resumidamente fazer a VV. Ex.ªs esse confronto, para verem que nem sempre elas estão de acordo.
Em Outubro o Posto Agrário de Braga dizia:

Os preços dos produtos agrícolas não sofreram alteração; apenas os preços do gado bovino e do milho aumentaram ligeiramente.

A folha agrícola dizia:

Os preços subiram ligeiramente... quanto aos gados, pelo que as tareias da época e a exuberância dos pastos e promessa dos montados de azinho justificam.

Neste mês concordam. Simplesmente o que se refere aos gados é informação do Sul, porque no Norte não há montados de azinho.
Na informação de Novembro o mesmo Posto Agrário dizia:

O gado bovino aumentou sensivelmente.

e a folha agrícola informa:

ÀS feiras tem concorrido bastante gado. Os preços continuam mostrando tendência para subir, sobretudo os dos gados, devido à abundância de pastos, tendo nalgumas regiões do Norte havido subidas notáveis, com grande e imediata repercussão nos preços das carnes.

Ora isto não é assim, porque sucede até que, quando o gado aumenta e se oferece em maior quantidade nas feiras, o preço vai para baixo.
Ora, se em Novembro o Posto Agrário informava que o gado bovino aumentara sensivelmente, como se compreende que a folha agrária dissesse o que acabo de ler?
Isto é que não corresponde à realidade.

O Sr. André Navarro: - O Norte não é o Norte Litoral.

O Orador: - Eu continuo no critério de estranhar que se dê ao Governo a ilusão de que as populações do Norte tem um preço compensador para os seus gados, quando é certo que os preços andam ao desbarato e mesmo assim não há comprador para o gado.
Acho que a perfeição que os funcionários do Instituto Nacional de Estatística põem nos seus serviços ainda deve ser melhorada.
Finalmente, no mês de Dezembro - e é propriamente este o caso em questão, porque foi a ele que me referi na minha intervenção de 2 deste mês-- o Posto Agrário de Braga diz:

Os prados, que se mostravam muito prometedores, mercê das últimas e intensas geadas sofreram bastante. As cotações dos outros produtos não sofreram alterações sensíveis.

Reparem VV. Ex.ªs: os prados, que até aqui estavam prometedores, com as geadas sofreram muito, e, assim, os lavradores, que não tinham com que alimentar o gado, viram-se, por isso, forçados a vendê-lo mesmo por preços muito baixos.
Mas querem VV. Ex.ªs ver o que diz a folha agrícola?
Diz isto:

Os preços dos gados mantêm-se na alta, com regular procura, em consequência das apontadas excepcionais condições da alimentação em que a pecuária hoje se encontra. Apenas o gado gordo - de montanheira - encontra dificuldades na sua colocação, o que a lavoura atribui a manobras dos actuais compradores.

Ora isto é inteiramente a expressão do contrário da realidade.
Vou terminar: primeiro, prestando homenagem, mais uma vez, ao cuidado com que são feitos os serviços do Instituto Nacional de Estatística, que eu não quis atacar em conjunto; segundo, pedindo ao Governo que lembre àqueles serviços a conveniência, e a necessidade até, de dar as informações de cada mês da folha agrícola distinguindo bem as regiões, porque muitas vezes está-se em boas condições no Sul e em más condições no Norte; por último, felicitando-me porque, com a minha intervenção de 2 de Março, Arejo que os serviços do Instituto Nacional de Estatística já não adoptam o critério de afirmar que boas pastagens e gado gordo significam sempre preço alto, mas reconhecem neste último Boletim, publicado em Março, mas que se refere a Fevereiro, que as pastagens são boas no Norte, confessando, no entanto, que o gado baixa de preço. Era isto que no fim do ano passado se devia informar e que, por não ter sido assim, motivou os meus reparos.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Elísio Pimenta: - Sr. Presidente: na sessão de 11 de Janeiro findo tive a honra de falar nesta Assembleia sobre determinados problemas da lavoura do Minho e afirmei, entre outras coisas que por agora não interessam, que o gado bovino, embora aparecesse nas feiras com abundância, não encontrava comprador e que o lavrador não vendia esse gado pelo prego que reputava justo para satisfazer as suas necessidades.
As minhas palavras foram apoiadas pelo Sr. Deputado Manuel Domingues Basto, profundíssimo conhecedor de todos os problemas agrícolas da nossa região, que aqui tem tratado e continua a tratar com todo o entusiasmo, brilhantismo e proveito.
Há, no entanto, singulares coincidências, que, pelo respeito que me merece a obra do Instituto Nacional de Estatística em outros domínios que não o da estatística agrícola, quero atribuir apenas, e só apenas, ao acaso, a esse acaso que por vezes nos perturba e nos faz cometer o feio pecado do mau juízo alheio.
É que precisamente no dia imediato àquele em que essas palavras foram proferidas publicavam os jornais da tarde, com grande relevo, e no dia a seguir os jornais da manhã, com destacados títulos, o Boletim mensal da estatística agrícola, no qual, em contradição com as afir-

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mações feitas nesta Assembleia, se informava o público de que «os preços dos gados mantêm-se na alta, com regular procura...».

Isto é, embora o Boletim não tivesse distinguido a espécie de gado a que se releria nem a região do País onde tal alta se verificava, nos termos gerais em que prestou a informação pública desmentia o que havia sido dito na véspera por um Deputado e que os jornais reproduziram até com relevo.
Aguardei serenamente a obra da providência.
Tinha motivos para confiar...
Hoje é o próprio Instituto Nacional de Estatística, através do esclarecimento que quis dar inoportunamente à Assembleia a propósito de umas inocentes considerações do Sr. Deputado Domingues Basto, nas quais o alto organismo do Estado não foi posto em causa, que vem dizer que na sua folha n.º 12 de 1949 prestara informação que não estava de acordo com o informador - o Posto Agrário de Braga.
O facto já foi suficientemente esclarecido e comentado por aquele ilustre Deputado.
No entanto, voltemos a analisar o que diz o esclarecimento publicado no Diário das Sessões de 17 do corrente, na parte que interessa.
Informação do Posto Agrário de Braga fornecida ao Instituto Nacional de Estatística:

Os prados, que se mostravam muito prometedores, mercê das últimas e intensas gradas sofreram bastante.

Informação tornada pública pelo Instituto Nacional de Estatística:

Os preços dos gados mantêm-se na alta, com regular procura, em consequência das apontadas condições da alimentação em que a pecuária hoje se encontra.

A conclusão está à vista e são dispensáveis outras considerações.
Só me resta fazer votos para que o ilustre director do Instituto saiba exigir responsabilidades a quem tão mal serviu a estatística nacional.
Posto isto, e já que estou no uso da palavra que V. Ex.ª quis ter a amabilidade de me conceder, peço licença para tratar de outro assunto que interessa a muitos centenares, talvez milhares, de pessoas de determinadas freguesias raianas do Norte do País.
Não quero falar agora da necessidade da reabertura das fronteiras de Peso (Melgaço) e de S. Gregório, que tantos benefícios poderá trazer ao concelho mais setentrional de Portugal, pois estou convencido de que tal reabertura não deve demorar muito tempo.
Por parte das autoridades espanholas, segundo elas próprias me informaram, há o maior desejo de que isso aconteça, e creio que falta apenas do nosso lado a conclusão de uns edifícios que o Estado mandou construir para a instalação da alfândega e da Polícia Internacional em S. Gregório e que honram o nosso país.
Os estrangeiros que dentro em breve atravessarem a ponte internacional, vindos do Norte e Nordeste de Espanha, encontrarão no seu primeiro contacto com Portugal a amabilidade dos agentes, a perfeita organização dos serviços de fronteira e a ideia nítida da ordem e do bom gosto, próprios de um país civilizado.
E nesse aspecto turístico tem-se caminhado muito bem em Portugal.
Há, porém, uma situação, criada a partir da guerra de libertação da Espanha, que necessita de ser solucionada, pois afecta os interesses legítimos de muitos portugueses que possuem terras no país vizinho.
Talvez V. Ex.ª, Sr. Presidente, não saiba que numa extensão de cerca do duas dezenas de quilómetros, e com pequenas soluções do continuidade, ambos os lados da fronteira, marcada pelo pequeno rio Trancoso, afluente do Minho, se não são de Portugal, porque só um deles politicamente o pode ser, pertencem a portugueses.
Muitos terrenos de cultivo e do mato da província de Orense, frente às freguesias de Fiães, Lamas de Mouro e Castro Laboreiro, desde há séculos, talvez desde a fundação, que são de portugueses, habitantes dessas freguesias, que os vêm transmitindo, patriòticamente, de pais a filhos.
E esta influência portuguesa fez-se sempre sentir de tal maneira que, ainda não há cinquenta anos, muitos espanhóis da querida Galiza - que tão próxima está sempre de todos nós, habitantes de lugares raianos - vinham baptizar os filhos e enterrar os mortos a Portugal.
Nesses bons tempos não havia entraves à passagem da raia para os que cultivavam os seus terrenos na outra margem do Trancoso, levando sementes, estrumes, gados e alfaias agrícolas, e regressando a Portugal com os frutos da terra.
Bastava atravessar o rio pelos pontoes ou até a vau ou a seco.
A certa altura, embora o trânsito de pessoas continuasse a ser livre, sujeitou-se o do gado a guias passadas pela Guarda Fiscal em S. Gregório e visadas pelos carabineiros em Puente Barjas, que tinham a duração de seis meses.
Em 1936, com o início da guerra de Espanha, todas as facilidades desapareceram, e se as restrições se justificaram durante os anos de luta armada contra o comunismo, em que tão valentemente se bateram os nossos vizinhos, não vejo hoje razão para que se não regresse à situação anterior, e muito menos quando à tradicional amizade entre os povos corresponde o melhor entendimento entre os Governos.
Isto é, aquilo que se fazia quando vivíamos de costas voltadas, não se faz hoje, que nos abraçamos sem desconfiança.
Os lavradores portugueses vêem-se em dificuldades para cultivarem os seus terrenos situados em Espanha, e se o fazem ainda, embora à custa de imensos sacrifícios materiais, isso se deve principalmente à boa vontade das autoridades espanholas.
E diga-se, é certo apenas como nota à parte, que essa boa compreensão se manifesta em outro trecho da fronteira do Norte, ao consentirem que os rebanhos dos portugueses vão a apascentar ao seu território, suprindo assim as dificuldades injustificadamente levantadas aos povos pelos serviços florestais e que, apesar dos reparos feitos nesta Assembleia, não se procuraram diminuir.
Creio que o que acabo de expor relativamente aos portugueses que possuem terrenos em Espanha é já do conhecimento dos ilustres Ministros do Interior o dos Negócios Estrangeiros.
Faço votos, portanto, e confio em absoluto na solução, para que, do acordo com o Governo Espanhol, Governo amigo, o problema seja resolvido satisfatoriamente.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Comunico à Câmara que chegaram neste momento à Mesa os elementos requeridos pelo Sr. Deputado Armando Cândido de Medeiros. Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.

Pausa.

O Sr. Antunes Guimarães: - Sr. Presidente: assumiu foros de grande acontecimento o novo plano de distri-

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bulcão de ondas médias concertado em Copenhaga por acordo entre a maioria dos países.
A antiga fórmula, combinada, vai para vinte anos, em Lucerna e depois modificada em Montreux, nas reuniões ali efectuadas e a que assistiu o representante português por mim nomeado, quando Ministro do Comércio e Comunicações, apesar de volvido tanto tempo, ainda hoje poderia prestar serviços aceitáveis aos vastíssimos e fundamentais interesses públicos e privados inerentes à radiodifusão se não se registassem infracções às respectivas cláusulas, das quais resultavam interferências desagradabilíssimas e inibitórias de boas audições.
Assim se vinha prejudicando a influência notória e decisiva da rádio, que, segundo se lê no notável parecer da Câmara Corporativa sobre a proposta de lei, agora em discussão, que visa a criação do Fundo de teatro, da autoria do consagrado escritor e eminente académico Dr. Júlio Dantas, «levou a música e a literatura aos domicílios e fixou as famílias no lar...».
É-me, portanto, muito grato registar que não foi da parte de Portugal que tais transgressões se verificaram.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao novo plano de Copenhaga deu a imprensa condigno relevo, correspondendo assim à sua possível influência na melhoria da radiodifusão e interpretando as preocupações dos muitos milhares de radiófilos sobre a capacidade dos seus aparelhos para a utilização das novas ondas, sua localização nos respectivos mostradores e apreciação das vantagens dai resultantes para uma sintonização que todos desejam sem ruídos ou distorções e correspondendo fielmente à incomensurável gama de sons emitidos.
Preocupações que são de toda a gente, sem excepção de classes ou categorias e abrangendo citadinos e aldeãos, porque, sendo muitos os que dispõem de receptores próprios, aos restantes raro falece a garantia de audições, mercê de aparelhos que funcionam em associações, casas de comércio e outros recintos, e ainda numerosos alto-falantes que atroam os ares com relatos de futebol e doutras competições, notícias palpitantes e ensinamentos muitas vezes úteis, de mistura com tal profusão de anúncios e reclamos que acontece ser precisa a intervenção da autoridade para coibir abusos.
Hoje já não se conceberia a vida sem o assíduo e generalizado concurso da radiodifusão.
Sr. Presidente: já nos primórdios desta maravilhosa descoberta os Governos do Estado Novo previram a sua considerável projecção em todos os sectores da vida e das actividades (apoiados), desde as que constituem homenagem do Estado à multiplicidade de situações privadas, indo até à intimidade dos lares.
Pouco, ou praticamente nada, se registava então classificável de providências úteis dimanadas do Estado em prol do conveniente aproveitamento de um tão prometedor elemento educativo e do qual a publicidade em todos os seus domínios tanto viria a aproveitar.
Não houvera o cuidado da indispensável defesa da atribuição de ondas radiofónicas para uso das nossas futuras emissoras; nada se havia legislado para assegurar ao Estado os direitos de que não poderia largar mão em matéria de tamanha envergadura; registavam-se pretensões inadmissíveis de exclusivos para a emissão de anúncios, e até pairava a ideia da concessão de um monopólio privado em matéria de radiodifusão.
Entre os particulares registavam-se iniciativas inteligentes, tenazes e até frutuosas, sendo-me grato referir, entre outros que a minha memória já não permite concretizar, as que tiveram como valorosos pioneiros Abílio Nunes dos Santos, na CT1AA, e o nosso muito distinto e simpático colega Jorge Botelho Moniz, no Rádio Clube Português, então conhecido por Rádio Parede, isto no que respeita à capital.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: o Governo a que eu pertencera no triénio Julho de 1929-1932 desde logo muito se interessou pelo momentoso problema da rádio.
Que me lembre, negaram-se ou anularam-se todas as pretensões monopolistas de carácter privado.
Enviou-se, como já disse, às reuniões realizadas no estrangeiro, se bem me lembro primeiramente em Bruxelas e Genebra, para cuidar do momentoso problema, o engenheiro David de Sousa Pires, tendo-se ali obtido quatro ondas, e mais tarde em Montreux, onde se conseguiu uma onda exclusiva para Portugal.
Publicou-se em 29 de Janeiro de 1930 o Decreto n.º 17:899, de 27 do referido mês, que é o diploma fundamental do problema da radiodifusão, sendo ali definida a política que o Governo deliberara seguir no desenvolvimento de tão importante assunto.
Assim, determinava-se que os serviços de radiotelegrafia, radiotelefonia, radiodifusão, radiotelevisão e outros que venham a ser descobertos e que se relacionem com a radioelectricidade são monopólio do Estado em todo o território da República.
Estipulava-se, porém, que o Ministério do Comércio e Comunicações poderia conceder licenças para o estabelecimento e exploração de estações emissoras experimentais ou para estudos científicos.
A instalação e exploração de estações radioeléctricas receptoras eram isentas do pagamento de quaisquer contribuições ou taxas.
Seriam ordenadas providências indispensáveis para evitar interferências prejudiciais.
Autorizava-se o Ministério do Comércio e Comunicações a abrir concurso para a aquisição de material e instalação de duas estações emissoras e uma retransmissora, podendo para isso ser aproveitados terrenos e edifícios pertencentes ao Estado, bem como os circuitos telefónicos da Administração-Geral dos Correios e Telégrafos.
E foi criado o Conselho de Radioelectricidade.
Em linhas muito gerais, e salientando apenas aquilo que a minha já cansada memória conseguiu reter da obra realizada no triénio 1929-1932 pelo Governo a que eu pertencera, vê-se que:
Se evitara que a radiodifusão, em todo o seu conjunto ou no que respeita à emissão de anúncios, fosse explorada com fins retintamente mercantis por determinadas entidades privadas;
Constituiu-se um monopólio do Estado, mas sem prejuízo de iniciativas privadas, o que tem permitido o funcionamento de postos particulares, de incontestável utilidade para a Nação;
Obteve-se uma interessante gama de ondas radiofónicas;
E criou-se a Emissora Nacional.
Sr. Presidente: perdoe V. Ex.ª esta rápida espevitadela de memória, a relembrar factos que, na sua maioria, o Diário do Governo regista ou se arquivam nas repartições respectivas.
Mas é que nem por isso se consultam, para evitar lamentáveis demonstrações de amnésia, como a que se verifica no órgão da Emissora Nacional, que se publica com o título de Rádio Nacional, e que no seu número de 30 de Julho de 1949, dedicado à comemoração daquela Emissora, fez desfilar uma série de nomes, publica uma galeria de retratos e cita datas e outros elementos que não permitem aos leitores fazer ideia exacta da realidade dos factos.
De resto, mais não se trata do que da reedição do que se fizera com a Exposição das Obras Públicas, realizada recentemente no Instituto Superior Técnico, e na qual,

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em grandes parangonas, se proclamara ao País que ali se patenteava a obra dos últimos catorze anos, esquecendo-se lamentavelmente que o Estado Novo raiou no dia histórico de 28 de Maio de 1926!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas... adiante.
Sr. Presidente: eu verifiquei, pelo relatório da Convenção Europeia de Radiodifusão, de onde saiu o plano de Copenhaga, a que venho referindo-me, que os nossos delegados não ficaram tranquilos sobre as consequências da sua aplicação a Portugal e fizeram os seguintes reparos e declarações:

1. La délégation portugaise rapelle que les demandes de son pays ont toujours été basées ser les besoins minima de la radiodiffusion portugaise en Europe et que, dans un esprit de sacrifice et de collaboration internationale, le Portugal a róduit, au cours de cette Conférence, sés demandes doudes exclusives à une seule onde, qui ne lui a même pás été allouée. Cependant le Portugal ne renonce nullement à la fréquence exclusive qui lui avait été allouée par le Plan de Montreux, en échange de Ponde longue quil avait à Lucerne, pour l'émetteur «Lisboa-Nacional».
Le Portugal se réserve formellement le droit do répandre sa demande d'une onde exclusive lors d'une prochaine Conférence.
2. La délégation portugaise regrette vivement la précipitation avec laquelle il a été procédé à la révision de variantes successives du Plan de Copenhague présentées trop tardivement à la Conférence; elle regrette aussi que plusieurs de ces remarques dûment fondées n'aient pas été satisfaites et elle exprime des doutes en ce qui concerne la protection des fréquences allouées au Portugal, protection qu'elle considere insuffisante soit dans le cas de certains partages, soit surtout par rapport au cannaux adjacents.
3. La délégation portuguaise constate, en outre, que les fréquences attribuées aux emmeteurs portugais les plus importants sont exagérément raprochées d'autres fréquences utilisées en ce moment par l'Espagne et quil est impossible de prévoir qu'elle será 1attitude de ce pays en face dun plan de répartition de fréquences ser lesquelles il na pas donné son opinion, ni jusqu'à quel point il pourra ou voudra modifier ses fréquences.
4. Pour les raisons indiquées dans les alinéas 2 et 3 ci-dessous, la délégation portugaise declare que le Gouvernement du Portugal se reserve formellement le droit de iprendre toutes les mesures qui savéreront nécessaires pour assurer une qualité satisfaisante à son service national de radiodiffusion en s'efforçant de ne pas brouiller les servioes nationaux de radiodiffusion dautres pays. Le Grouvernement du Portugal s'engage à ne donner, en aucun cas, aux stations partagées et ou placées sur les cannaux voisins des protections intérieures au iminima établis par le Plan de Copenhague daprès les emplacements des stations et puissances indiquées dans le Plan.
En foi de quoi, les plenipotentiaines des Gouvernements sous-indiqués ont signé le présent Protocole final en un exemplaire dans chacune des langues anglaise, française et russe, le texte français faisant foi en cas de contestation.
Cet exemplaire restera déposé dans les arohives du Gouvernement du Danemark et une copie sera remise à chaque Gouvernement signataire et au secrétaire général de l'Union.

Sr. Presidente: das ondas médias que nos foram atribuídas no plano de Copenhaga, quatro destinam-se à cidade do Porto, isto é, ao Norte, que assim tem probabilidades de ser, finalmente, bem servido.
Das quatro destinadas à região nortenha vai caber a de 1:562 kc/s ao Portuense Rádio Clube, constituído por distintos radiófilos, aos quais a radiodifusão já muito deve, visto tratar-se de autênticos «carolas» de incontestáveis merecimentos e credores do apreço e reconhecimento gerais.
Desejam eles corresponder à distinção com que foram alvejados pondo todo o seu esforço intelectual, técnico e financeiro para a máxima valorização do poderoso factor económico-social e até político que acaba de lhes ser confiado, tendo-me enviado, a solicitar esta minha intervenção na Assembleia Nacional, a exposição que peço licença de ler à Assembleia Nacional:

Data de 27 de Janeiro de 1930 o Decreto n.º 17:899 - o primeiro decreto que em Portugal se publicou sobre assuntos de radiodifusão, radiocomunicações e televisão.
Pretendeu-se com este decreto acautelar interesses nacionais, prevendo-se com profunda clarividência o grande desenvolvimento que viria a ter esta maravilha do nosso século.
Já nessa data os primeiros entusiastas, dominados pelos atractivos de tão sugestiva ciência, efectuavam no nosso país as primeiras experiências.
E saliente-se aqui a bem da verdade dos factos que foi e continua a ser devido ao entusiasmo destes a carolas» que se obtiveram em todo o Mundo os grandes progressos e consequentes maravilhas que hoje nos oferece a rádio nos seus múltiplos aspectos.
Portugal teve ocasião de avaliar durante o ciclone de 1941 o valor incalculável destes entusiastas. Isolado o País diurna ponta à outra, foi devido aos emissores amadores que se organizou imediatamente uma rede de emergência, que assegurou as comunicações em todo o continente. Na América - onde os amadores gozam de plena liberdade para as suas experiências e comunicações - os resultados tem sido magníficos.
Só de amadores emissores, operadores magníficos, completos sabre todos os aspectos, dispõe a América de 300:000 oficialmente registados. Em Portugal devemos possuir presentemente 300 emissores amadores, espalhados por todo o País, lançando o nome de Portugal através de todo o Mundo.
Deste pequeno exército de entusiastas tem saído os nossos melhores técnicos, como aliás, em todo o Mundo. Ainda recentemente o Governo de Sua Majestade Britânica condecorou um destes entusiastas por uma importante descoberta feita no campo da televisão - cúpula suprema desta ciência de sonho.
No Norte do País o entusiasmo por estas questões da rádio tem sido grande, embora nunca compreendido, como se justifica com a falta de auxílio que se tem notado.
No campo das radiocomunicações basta afirmar-se que foi do Porto que nasceu a iniciativa de se assegurarem as comunicações quando em- Fevereiro de 1941 o País ficou isolado; no campo dia radiodifusão foi também do Porto que surgiram as primeiras estações emissoras, à sombra dum entusiasmo muito próprio da gente do Norte.
Mas com o rolar dos tempos estas iniciativas foram atrofiadas.
Com efeito, são passados anos e só há pouco, mercê dum despacho de S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho, se forneceram às estações de radiodifusão particulares condições de vida compatíveis com as suas importantes e forçadas despesas.

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E durante este espaço de tempo todo o Norte do País esteve privado duma radiodifusão nacional, pronta a cumprir o seu principal papel, educativo e recreativo.
Ainda hoje em grande parte do, região nortenha, precisamente onde a densidade da população é maior, os ouvintes estão privados de escutar as estações nacionais e recorrem às estações estrangeiras, nomeadamente Rádio Andorra, estações francesas e espanholas e de onda curta da BBC.
Com a entrada em vigor do plano de Copenhaga pretendeu-se resolver de vez este importante problema. A solução encontrada deve satisfazer por completo as necessidades nortenhas.
Num bloco foram agrupadas as estações particulares, constituindo uma sociedade comercial sob a designação de Emissores do Norte Reunidos, e u quem foi atribuída a frequência internacional de 1:602 kc/s; noutro campo fica a Rádio Renascença, com as suas funções e características próprias e também com frequência própria; finalmente, a Portuense Rádio Clube - a estação que mais Be tem distinguido no Norte - foi dada uma posição idêntica à de Rádio Clube Português, usando a frequência privativa de 1:562 kc/s.
As duas primeiras estações vão trabalhar com 1 kW de potência irradiada, tendo a encomenda já sido efectuada a uma importante firma americana.
Portuense Rádio Clube tem já um emissor de 1 kW na Alfândega do Porto; adquiriu uma importante parcela de terrenos no alto do Monte da Virgem e encontra-se já em construção o edifício para onde vai a nova estação emissora.
Este plano, criteriosamente estudado e posto em prática pela Direcção dos Serviços Radioeléctricos, tem merecido os maiores elogios de todos os que conhecem estes assuntos.
O Norte vai, finalmente, ter boas estações.
A obra esboçada e a caminho da realização é digna dos maiores elogios.
No que diz respeito aos Emissores do Norte Reunidos, agrupando firmas comerciais, dispondo do produto da publicidade, embora se reconheça que as despesas são muito avultadas - a instalação completa orço, por cerca de 600 contos, não incluindo a aparelhagem dos diferentes estúdios -, espera-se que resolvam as dificuldades inerentes a tão importante empresa.
No que diz respeito ao Portuense Rádio Clube - emissor servido por um conjunto de homens prontos a dotar a cidade e o Norte com uma grande obra profundamente nacional - o problema merece estudo cuidadoso.
O seu emissor de 1 kW já se encontra na Alfândega do Porto. Sucedeu, porém, que o barco onde foi transportado de Barcelona para o Porto apanhou um tremendo temporal no Mediterrâneo, tendo chegado um pouco deteriorado. A importante firma suíça Brown Boveri, num gesto digno de salientar, podendo proceder cá em Portugal a pequenas reparações, resolveu mandar vir outro, para que o emissor dê o maior rendimento, dentro de um orgulho muito legítimo de pretender lançar os seus produtos em Portugal. E embora não tivesse emissor daquela categoria construído, informou os interessados, de que forneceria outro melhor e pelo mesmo preço.
A montagem completa desta instalação orça por cerca de 1:000 contos, fora os estúdios, sendo imposta ao Portuense Rádio Clube a compra de outro emissor, com a potência de 5 kW, no prazo de dois anos, para justificar a frequência privativa.
ponderados os factos, atendendo a que teria de vir novo emissor da Suíça, dada a avaria do que chegou recentemente ao Porto, e sabendo-se que aquela importante firma estava disposta a fornecer um emissor de 10 kW pelo preço de um de 5 kW, com grandes facilidades de pagamento, resolveu a direcção do Portuense tomar a importante deliberação de mandar vir o de 10 kW. A instalação completa de tão importante emissor orça por cerca de 2:000 contos.
Portuense Rádio Clube não tem qualquer fim comercial; é uma colectividade do Porto, para servir o Porto.
Portuense Rádio Clube é a única emissora do Norte que tem os. seus estatutos aprovados pelo governador civil do Porto, tem as suas assembleias gerais ordinárias e extraordinárias, obriga-se a dar todos os anos conta aos seus associados das despesas e receitas, e isso significa que da sua tesouraria não pode sair a mais insignificante verba que se não destine à técnica, à produção ou à, sua função recreativa e cultural. Anote-se ainda que os estatutos de Portuense Rádio Clube prevêem uma importante parte dos seus bens para fins beneficentes. Simplesmente, até agora, ainda, a estação tem deficits, que lhe não têm permitido o cumprimento dessa cláusula.
Fundada com esse único fim, vai adquirir projecção nacional e internacional. As suas importantes instalações vão-lhe permitir a cobertura de todo o território nacional, Espanha e mesmo parte da Europa.
Da parte desta boa gente do Porto, sempre pronta a auxiliar as obras boas, tem o Portuense Rádio Clube recebido todo o apoio ,moral; mas isso não basta. De certas entidades oficiais, mesmo nomeadamente da Direcção dos Serviços Radioeléctricos e das Câmaras Municipais de Gaia e do Porto, tem promessas que vão ser concretizadas. Da Câmara Municipal de Gaia espera-se conseguir precisamente o fornecimento da energia; da do Porto conta-se também com valioso auxílio, em intercâmbio de programas culturais.
Em conclusão: o Porto vai finalmente possuir uma grande organização pronta a levar a sua cultura, o valor dos seus homens e das suas instituições através do País e mesmo fora das suas fronteiras.
Com muito pouco contam os homens que se abalançaram a tão importante obra. O produto da publicidade não chega para cobrir tão importantes despesas e resta ainda pensar na produção, isto é, na organização dos programas.
Numa organização de radiodifusão o principal são bons emissores. A produção está portanto subordinada à técnica.
De nada valem bons programas transmitidos por emissores fracos. A obra principiada, precisa de ter continuidade, necessita de auxílio. E preciso aproveitar o entusiasmo de alguns jovens, sem o qual nada se pode fazer.
Estas coisas de rádio necessitam duma psicologia própria, apta a servida.
Em síntese: Portuense Rádio Clube, autorizado pelo Sr. Ministro das Comunicações a trabalhar como estação independente, com frequência internacional privativa nos 1:562 kc/s, poderá durante dois anos funcionar com um emissor de 1 kW, mas findo aquele prazo terá de irradiar com um emissor de, pelo menos, 5 kW.

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E porque aos dirigentes daquela estação se lhes afigura uma. acção de ordem pouco económica adquirir mu emissor de 1 kW para trabalhar dois anos, julgam, e muito bem, ser de aconselhar a aquisição da estação de 5 kW, que afinal será fornecida num requinte de gentileza e com importantes facilidades de pagamento.
Simplesmente a obra exige uma importante verba, que Portuense Rádio Clube não possui. O equipamento já encomendado e destinado a servir a nova estação de 10 kW é do mais moderno que se conhece. Dentro de dias é esperado mo Porto o equipamento de baixa frequência, antena horizontal, sintonizador de antena, atenuadores de linha, etc. Obra de grane envergadura, e de extraordinário interesse para o Norte e para o País, merece não só o apoio material das autarquias locais como do próprio Governo.
Como acima se disse, o custo geral será de cerca, de 2:O00 contos, não contando com os estúdios - em bom esteja, incluído o material de baixa frequência - nem mesmo com o custo elevadíssimo tia futura programação.
Sr. Presidente: é bem de ver que dou todo o apoio a tudo quanto represente II valorização, não só daquela onda atribuída ao Portuense Rádio Clube, mas à que se destina aos Emissores do Norte Reunidos, e também à de Rádio Renascença e da filial no Porto da Emissora Nacional.
De nada serviria a boa vontade da obtenção daquelas quatro ondas para o Norte se não viessem a ser utilizadas por bons postos, com potência bastante para levar as respectivas emissões não só aos ouvintes nacionais, mas aos estrangeiros, a fim de que, além de boa música, excelente literatura o acertados ensinamentos, estejam a par do alto critério que orienta a nossa política e aprendam os princípios sãos que nos orientam.
Os nortenhos, conforme a sua antiga e nobre tradição, tudo farão para conseguir aquele patriótico escopo.
Mas, porque excede as suas possibilidades o muito que será necessário realizar, justo é que o Estado os auxilie, na certeza de que, fazendo-o, concorrerá para uma obra do maior alcance nacional.
Dou, por isso, como Deputado pelo círculo do Porto, todo o apoio às aspirações dos meus ilustres conterrâneos, e desta Assembleia dirijo um apelo ao Governo para que os atenda.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Miguel Bastos (para explicações): - Sr. Presidente : por amável comunicação de V. Ex.ª, tomei conhecimento de que o Sr. Enfermeiro-Mor dos Hospitais Civis de Lisboa, por seu despacho de 20 do corrente mês, acaba de revogar, em parte, o seu outro despacho de 4 de Agosto do ano findo, que há momentos vivamente critiquei na minha intervenção.
Na verdade, por este último despacho diz o Sr. Enfermeiro-Mor dos Hospitais Civis de Lisboa que é autorizado o tratamento em consulta externa, bem como as análises clínicas e os exames radiológicos e outros, aos doentes abrangidos pelo referido despacho de 4 de Agosto de 1949 quando portadores de guia de responsabilidade da câmara do seu concelho.
Não sendo tudo, é já uma parte importante, razão por que me apressei a pedir a palavra para agradecer ao Sr. Enfermeiro-Mor a rapidez da informação, louvar-me da justiça do que venho pedindo e, pela prova dada, continuar a confiar que o assunto será totalmente resolvido, incluindo-se na autorização agora dada o direito ao internamento hospitalar.
Como disse há dias aqui o nosso ilustre colega Sr. Deputado Melo Machado, vale sempre a pena lutarmos por tudo o que é verdadeiramente justo.
Renovo os meus agradecimentos ao Sr. Enfermeiro-Mor dos Hospitais Civis de Lisboa pela prontidão da sua informação e presto-lhe as minhas homenagens pelo interesse que lhe está merecendo este assunto, que, certamente, em breve ficará totalmente esclarecido.
Tenho dito.

Vozes : - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente:-Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em debate, na generalidade, a proposta de lei que criou ,o Fundo de teatro. Tem a palavra o Sr. Deputado Águedo de Oliveira.

O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: sempre houve crises, mas... as crises de teatro não são novidade, mas há novidade nesta que hoje ventilamos parlamentarmente.
Plínio, o Moço, fala da geração do seu tempo, tão enjoada do gosto do teatro que os favores das multidões dirigiam-se, predominantemente, para os grandes espectáculos do circo.
As obras de Plauto e Terêncio não chamavam ninguém, mas corria-se em tropel para os jogos o mortandades observados nas arenas do Circo Máximo.
Depois disso houve períodos de abandono ria vida teatral, houve crises ...
E no tempo do Romantismo Garrett e Herculano se queixaram da preversão e desamparo a que chegara o teatro português, praticamente nas mãos monopolistas dum senhor empresário de nome esquisito.
Como estas crises, viram-se muitas, mus, repito, não havendo novidades nas crises teatrais, esta última, que agora estamos discutindo, apresenta a sua novidade, como vamos ver.
Sr. Presidente: ao focar as precárias circunstâncias a que se encontra reduzido o teatro português nos últimos tempos, convém ao entendimento do assunto que comece por duas afirmações - um princípio de fundo que orientará toda a matéria e uma verificação sobre M qual se pode depositar a esperança necessária para uma política resolutiva.
Um princípio de fundo: pretendemos que a comunidade portuguesa possua condições de emprego total, para que todos possam aplicar remuneradamente a sua capacidade de trabalho.
Essa é hoje a primeira das preocupações dos governantes actuais - que todos tenham um emprego útil e remunerado, como direito público subjectivo. O artigo 35.º da Constituição de 1933 e o artigo 21.º do Estudo do Trabalho Nacional, após uma leitura compreensiva dos textos, confirmam esta tendência da doutrina contemporânea.
E não basta que na comunidade portuguesa se tenha reduzido a percentagem irremovível do fenómeno do desemprego e o trabalho a todos tique assegurado; o humano há-de suplantar o técnico no espírito da mesma constituição; a máquina ajudará apenas o homem que labuta e o homem não será de forma nenhuma vinculado à máquina.
E uma verificação: quanto mais ampla e pormenorizadamente se realizar a chamada lei da divisão do trabalho nacional neste país, quanto mais perfeita seja a distri-

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buição das funções profissionais, maior dimensão económica mostrará a comunidade o mais activamente há-de circular a linfa da riqueza pública nas suas artérias.
Sr. Presidente: este assunto hoje está fora das minhas preocupações e da minha «regedoria», mas pareceu-me bem que devia chamar a atenção de V. Ex.ª, Sr. Presidente, para a delicada responsabilidade que impendia sobre o Governo Português e que agora foi transferida para todos nós.
Temos de acudir à crise do teatro - o isto será fàcilmente reconhecido pelos Srs. Deputados que passaram da última legislatura para esta.
Seria injusto que, tendo começado por valer ao cinema nacional, ainda balbuciante, que está apenas perto da adolescência, o qual não estava em crise, pondo-o a coberto da concorrência estranha e facilitando-lhe as iniciativas, quando se diria ele dispensar protecção no nosso tempo, abandonássemos o herdeiro de Gil Vicente ao triste fadário da ribalta.
Começámos pelo cinema, chegou a vez ao teatro; mas a este assiste, ao que me parece, superior legitimidade.
O facto de o primeiro ter assegurado um triunfo esplêndido e de o segundo parar, alquebrado, na sua marcha só acentua a justa pretensão deste último.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: a crise teatral atinge aspectos mais relevantes e imponentes do que pensa a Câmara Corporativa, aliás num maravilhoso parecer, de surpreendente academismo e elevação, em todos os aspectos. O Sr. Dr. Júlio Dantas consagrou se como descendente directo dos helenos entre nós e será dos raros apenas que, recebendo a sua herança, poderá ainda reacender o lume do seu palpitante espírito, tão harmónico como pleno de beleza.
A crise das orquestras, dos palcos, de certas diversões públicas vem sendo estudada há alguns anos o não possui novidade para a literatura económica. Focou-se nos seus primeiros sintomas, previu-se até às últimas consequências.
A crise do teatro é apenas o chômage tecnológico e nada mais. O teatro foi atacado, batido e vencido pelas novas técnicas industriais que surpreenderam o público, conquistaram-no pela novidade, enlearam-no por desconhecidos encantos e apossaram-se dele quase completamente pela força poderosa, mas estranha, de uma perfeita adaptação às condições da vida contemporânea. Os inimigos do teatro possuem a maior actualidade. O teatro foi atacado e batido pela grafonola, pelo cinema, pela rádio, pelas diversões desportivas, e vai ainda ser de novo combatido pela televisão.
Na lição do mundo moderno pergunto: que inimigos mais poderosos poderia ter?
Não quererá isto dizer que foi atacado pela grande organização, pelo empreendimento, pela primeira potência industrial?
Como resistir? Para que resistir?
Pode o teatro sobreviver, depois de cumprir o seu destino, ao lado dos jovens colossos que se erguem à sua volta?
Acaso se pretende salvar o que não pode ser salvo, remover o que é irromovível? Estas dúvidas assaltam-nos ao estudar o problema, mesmo na posse de desejos e critérios construtivos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para fazermos ideia das posições relativas e das raízes que a velha árvore mergulha no subsolo, quando os novos astros se elevam no horizonte, limito-me a dar uns apontamentos, cuja simples leitura conterá insubstituível eloquência:
Teatro de Dionysos (VI século antes de Cristo) - tragédia, comédia, drama satírico, perto de Acrópole, em Atenas!
Odeon de Herodes Alticus (cento e sessenta e um anos antes de Cristo) - concertos o representações dramáticas, também perto de Acrópole!
Estádio de Delfos, do mesmo Herodes Alticus - jogos atléticos!
E agora, dois mil anos volvidos:
1877 - Edison inventa o fonógrafo!
1882 - Câmara cinematográfica!
1889 - Primeira máquina de filmar!
1893 - Primeiros filmes!
1920 - Rádio broad-casting!
1927 - Televisão!
1929 - Morte da arte do cinema mudo. Advento do fonofilme!
Uma arte tão vigorosa, tão nova, tão imaginativa, tão subtil, tão arrojada, como o cinema mudo, durou apenas tanto quanto os estatísticos diziam durar uma geração - trinta e seis anos apenas!
Estas simples notas possuem, pois, a eloquência precisa.
Dizem, nos seus termos, o bastante do conflito entre o passado e o presente; melhor, entre o passado e o futuro; entre o convencional ideado por Enrípedes e o quase real focado pela lente Zeiss; entre a ficção artificiosa e desajustada e a realidade tirada de todos os ângulos ; entre a literatura pura e o negócio da diversão; entre o prazer público e os interesses gigantescos nele investidos; entre o clássico e a última palavra; entre a tradição e a voga do nosso tempo!
O teatro continua enfronhado e constrito nos seus moldes ortodoxos e não têm sido felizes as tentativas revolucionárias e de libertação.
O teatro, tecnicamente, não pode dar a magnificência, o rigor de reconstituição, o gosto de aventura, que dá o cinema, que até na fantasia o suplanta, por vezes, e fala mais do que elo aos arrebatamentos da imaginação.
Mas o cinema escaldou as imaginações, facilitou a criação literária, mas, facilitando, levantou também algumas aves rasteiras, na ilusão de que podiam voar mais alto.
Poetas desajeitados, criadores do velhas descobertas, cultivadores do esquisito e do aberrante, pequenos Zolas das misérias ínfimas, sentiram-se levados para a literatura e para a ficção, no contacto do romance do celulóide, e mostraram logo a quimera dos seus intentos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assim a crise da arte cénica como criação, realização e produção pública é uma crise resultante do progresso o da técnica que a imaginação do homem incansavelmente alçou, sobrepondo-se aos semideuses, crise que as próprias actividades contrárias estão cavando para favorecer na descida.
Sr. Presidente: sabemos como essa crise se manifesta entre nós. Os melhores teatros de Lisboa e Porto foram desanexados da exploração teatral e afectados à exibição cinematográfica.
Pouca ou nenhuma atracção exerce a carreira dramática, sendo mínima, ao que se de em O Século, a frequência de jovens no Conservatório. Companhias e actores dispersos e alguns perdidos para o elenco ou expatriados, sem remissão.
Desapareceram quase a comédia e a opereta. A Rose Marie nunca foi levada em Portugal.
Não se constróem teatros, mas levantam-se belos e majestosos cinemas.

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O público parece indiferente, distante, apático ou hostil mesmo quanto às coisas de teatro.
As dificuldades e apertos - a crise, enfim - não atingem apenas a vida das empresas teatrais, começam nas peças, na sua base literária, na sua estrutura irremovível, nos seus intuitos renovadores, no seu mandato de cultura nacional, nos ganhos obtidos para a arte, para a literatura e para o País, e terminam nas contas dos empresários, ingénuos ou apaixonados, que não encontram lucros e contabilizaram mal as perdas.
Sr. Presidente: o processo de crise teatral compreendia, pois, o processo tecnológico da novidade.
Novos bens, novos instrumentos, para deleite do consumidor, foram criados, acudindo a velhas e novas necessidades, estabelecendo novo e mais complexo estalão de satisfações.
Criaram emprego tecnológico.
Mas forçaram também, nas actividades concorrentes, a desemprego tecnológico.
Foi a invenção humana na sua idade de ouro, no seu mais amplo império, que arrumou o teatro, embora enriquecesse, fabulosamente, em satisfações o homem contemporâneo.
Democratizou, difundiu, levou longe, familiarizou, a diversão e o espectáculo, introduziu-os no lar. Roubou o teatro para dar, às mãos cheias e prodigamente, o mesmo teatro.
Como desconhecê-lo?
Mas, no ponto de vista português, não devemos esquecer que o teatro interno foi derrotado pela maravilha mecânica da onda hertziana, do disco, da fita, que nos chegam do estrangeiro.
Portanto, prejuízo da actividade nacional, dos réditos nacionais, em benefício da organização e da mão-de-obra estrangeira!
Portanto, novo caudal de divisas que todos os dias tomam o rumo dos mercados e indústrias estranhos!
E depressão na actividade nacional, que se tornava necessário incrementar e proteger.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas uma análise posterior levará a considerar a chamada compensação da desocupação.
Se o gosto das diversões se desenvolve pela acção de empreendimentos concorrentes; se alguns dos que trabalham se deslocam para as novas formas de actividade; se outros acabam por trabalhar também no estrangeiro, por meio de flutuações e ajustamentos, a desocupação forçada, em princípio, encontrar-se-á compensada, de algum modo, depois.
E assim se explica que a crise da arte cénica não tivesse apresentado maior amplitude nem houvesse conduzido a ruínas mais gravosas do que as que vemos na nossa frente.
Sr. Presidente: compulsando as estatísticas oficiais, estas mostram que, em quatro anos recentes, o público frequentador de cinemas aumentou; o de teatro diminuiu; e o das touradas mostra agora inesperado atractivo. Porém, não esqueçamos que a classe de gente nova atingiu cifras imprevistas.

Espectadores

(Em milhares)

[Ver Quadro na imagem]

Se, porém, analisarmos a estatística fiscal de 1942 a 1948, inclusive, seremos surpreendidos pelo aumento das receitas fiscais do futebol, que passaram de uma para mais de seis vezes; das touradas, que triplicaram; do cinema, que foram bastante para além do dobro, o mesmo acontecendo com o teatro.
Em todo o caso, este, embora produzisse receita avultada, foi o que aumentou menos no conjunto.

Imposto sobre espectáculos ou divertimentos públicos (liquidado)

(Em contos)

[Ver Quadro na imagem]

Sr. Presidente: deveríamos estar habilitados com inquéritos e estudos, que ainda não foram feitos, ou com elementos que os substituíssem, fornecidos pela Inspecção-Geral dos Espectáculos.
Quem confronta o que se passa nas nossas grandes cidades com o que se passa nas grandes capitais vê-se assaltado de dúvidas que não podem ser resolvidas prontamente.
Porque são tão elevados os preços, em relação com o padrão de rendimentos e vida portuguesa?
Como podem viver pequenas casas de espectáculo e cinema no centro de Paris e Londres?
Porque não se dão sessões permanentes, como em todas as grandes capitais? - mas baixando os mesmos preços e acabando com o congestionamento dos transportes.
Porque se sobem tão facilmente os preços, mas não se descem nas reposições?
Porque se queixam os empresários e os financiadores e capitalistas?
Acaso existe monopólio na distribuição? O negócio da diversão é normal ou leonino?
Tudo isto deve ser estudado e esclarecido, porque ainda o não foi.
Também se deve um reparo sobre a utilização do Fundo de cinema.
A lei que nós votámos, os fundos que aqui foram autorizados, ainda não trouxeram o que se esperava em matéria de propaganda e gosto pela nossa vida colonial.
Só por acaso a tela, subsidiada ou não, nos dá qualquer coisa sobre as belezas, pujança, perspectivas e deslumbramentos de Moçambique e de S. Tomé e Príncipe - filmes aliás encantadores mas defeituosos. Diz-se que é isso função da Agência-Geral das Colónias e assim vamos vivendo...
Antes da guerra mundial Londres dava constantemente nas suas sessões pequenos documentários sobre viagens, costumes, caçadas, episódios da vida colonial, que cultivavam no homem da rua o atractivo e a ambição da vida colonial.
Porque esperamos?
O que há, indubitavelmente, é pouco e não está à altura da magnitude das nossas províncias do ultramar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Claro que devemos louvar também as empresas nacionais. Sem estarem presas a dobragens

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discutíveis, dão o que há de melhor e dão-no prontamente.
As casas de diversão são belas, grandiosas e cómodas na sua maioria, e tanto Lisboa como o Porto não perdem na confrontação com as capitais do Ocidente.
Porém, o cinema pode levantar preços, subir o nível de remuneração dos outros capitais; parece que não lhe será permitido arruinar o teatro, subtrair-lhe os palcos, competir em vários campos, canalizar o público, manter uma publicidade clamorosa, sem contribuir para que aquele se mantenha de pé, ao menos.
E parece-me que toda a discriminação e a falta dum critério uniforme representarão uma liquidação fiscal imperfeita e destituída de igualdade jurídica.
Há um princípio de justiça em que uma actividade em condições de vida esplendorosa, provocadoras de dificuldades e desemprego, pague para ajudar os que infelicitou, mercê da sua aliada poderosa - a máquina.

O Sr. Délio Santos: - Muito bem!

O Orador: - Muitos dos que aqui estão foram educados e ensinados no reconhecimento de alguns princípios clássicos de organização orçamental, os quais, presidindo à confecção do orçamento, dominam depois, praticamente, toda a vida financeira.
Estes princípios, que não eram imperativos absolutos, tinham o seu valor jurídico, pois sem eles a noção de orçamento e a noção de imposto perdiam grande parte do sen valor e eficiência, além de que a sua violação representava uma baixa no estado saudável em que o País vivia.
Não podiam contestar-se estas regras orçamentais clássicas - eram cinco - que muitos mestres ensinam ainda. E se alguns parecem desconhecê-las ou ignorá-las é porque a invasão do campo financeiro pelos factores monetários e económicos tornou a política financeira em cantão preferido dos cálculos económicos dos professores e dos estadistas.
Estas regras, que não são absolutas, mas saudávelmente imperativas, obtiveram êxito e consagração clamorosa nas reformas de 1928-1931, com as quais o Presidente do Conselho trouxe os destroços do mar profundo à superfície e pôde conduzir a barcaça do Estado ao estaleiro de reparação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora um desses princípios ou cânones fundamentais da vida financeira era o da não afectação das receitas públicas, o qual, podendo representar um desenvolvimento do princípio fundamental da unidade orçamental, afirma que as receitas devem acudir à totalidade dos serviços e não a serviços designados.
Esse princípio é infringido nos artigos 2.º e 10.º da proposta, multo embora, louvavelmente, o artigo 13.º prescreva que fica sujeito à disciplina orçamental.
Como homem público e como representante da Nação não posso deixar de justificar que se trabalhe pelo pleno emprego e não me preocupa excessivamente que se afectem receitas públicas a designados fins.
Mas como financeiro, dada a multiplicidade de fundos, alguns extraorçamentais e que não prestam contas, e a hipertrofia que vem notando-se no capítulo viu das receitas do Estado, devo pedir ao Governo que ponha um travão à maré enchente de fundos e consignações, que criam uma espécie de vida extraorçamental, ameaçam a saúde das finanças e dispersam os esforços do contribuinte.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A Câmara certamente me dispensa que eu exponha as razões do princípio e as questões suscitadas por este e outros casos, que tom mais razão de ser na Lei de Moios.
Há a favor de fundos e afectações de receita argumentos morais e argumentos económicos, mas existem em contrário fortes razões fiscais e de ordem técnica.
De resto, os problemas encadeiam-se, e assim esta questão levanta, pelo menos, dois - o da natureza jurídica das taxas derivadas e o da delegação corporativa do imposto.
Se é possível basear-se em razões de classicismo financeiro, peço, pois, ao Governo que ponha, senão um dique, pelo monos um freio retardador aos fundos especiais e às consignações de receitas públicas, que se notam já avultadas e numerosas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assim como o cinema e o sem fios não suplantarão o verdadeiro violino, talvez a tela nunca possa dar uma impressão tão forte como a que recebia o espectador ao ouvir Ferreira da Silva no feroz desespero do Pai, de Strindberg.
Portanto, podem as novas tecnologias combater, derrotar, substituir, avassalar o público, mas não poderão matar para a cultura e para a civilização a arte do teatro como literatura e representação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Só os marxistas - e mesmo esses não serão todos - acreditam que a técnica vence tudo, até o espirito.
Tem aqui lugar a definição ática do Sr. Dr. Júlio Dantas - o teatro é substancialmente uma arte, uma literatura, uma língua, uma alma.
A arte é a arte.
E não devemos deixar que ela soçobre nas águas sempre invasoras da técnica.
Acreditando nos valores do espírito e da estética, erguendo-os bem alto na hierarquia da pessoa, nós entendemos que a novidade, longe de derrotar o primado da arte e da literatura, dará mais motivos e estímulos para que se ergam de novo as asas já afeitas a voar.
Ao passo que os governantes do Leste vivem submetidos, direi melhor, escravizados, às consequências da técnica, os governantes do Oeste sabem que lhes é dado lutar contra as fatalidades mecânicas do nosso tempo.
Como as forças da Natureza, a máquina tem de ser posta ao serviço do homem, mas não contra ele.
Eu interpreto o esforço de iniciativa do Governo - consignado na proposta - não como a solução ambiciosa da crise do teatro, no que me parece insuperável, mas como uma tentativa de reeducação geral pelo gosto da arte cénica.
Se este novo Fundo for capazmente utilizado, se produzir resultados úteis - como todos desejamos -, se for curvada a tendência irresistível para outras diversões, o teatro português, como o Horácio da Ode I, poderá prometer ao seu Mecenas que, subindo aos céus, tocará com a fronte nas estrelas.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Délio Santos: - Sr. Presidente e meus senhores: é com algumas apreensões que subo hoje a esta tribuna. A transcendência do problema e a sua importância para o País fazem-me olhar a, proposta de lei que se discute nesta Assembleia, como um tema do mais alto

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valor e ao mesmo tempo cheio de dificuldades, para cuja apreciação receio não estar ainda completamente habilitado.
E isto acontece, embora tenha podido ponderar um parecer que pode classificar-se, sem favor, como uma peça modelo no seu género. Na verdade ele revela não só o mestre da língua que o relatou - o escritor Júlio Dantas - mas ainda o esclarecidíssimo técnico das coisas do teatro e da sua história, que há bem pouco tempo recebeu justa e condigna homenagem a propósito do seu jubileu como autor teatral representado.
Além disso, Sr. Presidente e meus senhores, sou professor de Psicologia e não desconheço, por esse motivo, que um estímulo quando repetido com frequência, perde quase sempre muito da sua eficácia. Ora, eu tenho falado ultimamente várias vexes nesta Assembleia e, sinceramente, temo que V. Ex.ª e os meus ilustres colegas comecem a fatigar-se de ouvir-me. Quero, no entanto, tranquilizar todos desde já. Serei tão breve quanto possível nas minhas considerações.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Délio Santos: digo, como toda a sinceridade, que as palavras de V. Ex.ª nunca me fatigaram. V. Ex.ª tem à sua disposição o tempo regimental normal e ainda o de possível tolerância.

O Orador: - Muito obrigado a V. Ex.ª
Depois é muito difícil falar em seguida ao ilustre Deputado que me precedeu. É uma tarefa superior às minhas forças, dada a forma elevada como abordou nesta tribuna o mesmo assunto.
Um elementar sentido das proporções obriga-nos a repudiar a ideia de que a proposta de lei em discussão corresponda a um estatuto do teatro, como limito bem se observa no parecer da Câmara Corporativa. Falta-lhe a amplitude necessária e não pretende uma solução definitiva do problema do teatro em Portugal. Mas é indiscutível que ela é de uma flagrante oportunidade e as medidas propostas correspondem a soluções de problemas sem as quais o tal estatuto do teatro, que todas as pessoas cultas em Portugal desejariam ver surgir, não poderá tornar-se realidade.
As medidas «gora apresentadas constituem, portanto, um primeiro passo, indispensável ao início de uma marcha ascendente da arte do teatro em Portugal.
Os homens, levados pelo dinamismo da técnica e pela fisionomia mecânica da vida moderna, projectaram o seu ser para o exterior e perderam-se nas teias cerradas de uma vida constantemente variada, mas superficial. O que deste modo ganharam em extensão, por uma experiência sensorial larga, uras fugidia, perderam em intensidade, e profundeza, e todas as formas de arte se ressentiram deve facto. Devido à diminuição de intensidade da vida interior dos povos, o nível de cultura baixou extraordinariamente. Veja-se o que aconteceu com o livro e a leitura. É um paradigma: nunca se leu tanto na história da Humanidade e, no entanto, nunca se leu tão mal. A recomendação de Seneca acerca do «homem de um só livro» nunca teve tanta actualidade como em nossos dias.
A crise do teatro filia-se, em parte, nesta atitude do homem moderno, que precisa de ser reeducado de modo a poder descobrir, além do mundo das formas e das cores, que o cerca e o encanta, a existência do riquíssimo mundo interior das emoções e sentimentos, não menos valioso.
O teatro, no domínio da arte cénica, corresponde a uma visão da vida em profundidade e é por isso que ele faz parte integrante, como elemento principal, da verdadeira cultura. Os antigos atribuíam-lhe, e a meu ver com razão, uma origem divina.
Ora, penso eu: não pode haver bom teatro «em público. E não podemos, por esse motivo, perder de vista, na redacção da forma definitiva da lei que se discute, esse aspecto do problema. Temos de realizar um esforço enérgico para quebrar o círculo vicioso que impede entre aios a plena expressão de uma das manifestações mais belas da alma de um povo: não se fazer bom teatro por falta de público que o aprecie devidamente; e faltar o público nas casas de espectáculo à míngua de boas peças e bons actores nos palcos. Quando penso no bom teatro não me refiro apenas ao alto teatro. Englobo no meu pensamento o teatro ligeiro, quando de nível elevado.
Os dados do problema são, pois, estes: público, artistas, casas de espectáculo e empresas e, por fim, autores.
Em relação ao público, o despertar nele do bom gosto é trabalho difícil e lento, que deve ser realizado por muitos organismos culturais e educativos simultaneamente, através de espectáculos, conferências e publicações, as mais variadas.
Pelo que se refere aos artistas, precisamos de melhorar o seu nível técnico, sem dúvida, mas precisamos igualmente de não estancar uma das principais fontes que durante muito tempo alimentaram com tão grande êxito os nossos palcos. Quero referir-me ao aproveitamento dos amadores, por vezes tão útil à arte, como no caso de Chaby Pinheiro e Adelina Abranehes, que cito só a título de exemplo. Neste ponto estamos ainda muito longe de ter alcançado o objectivo desejado e deveríamos, talvez, tomar por modelo o que se passa na Inglaterra, indiscutivelmente um país de bom teatro, ou o que se passou na Alemanha com a iniciativa dos teatros municipais.
Ao Estado compete, portanto, fomentar o aparecimento de grupos de actores teatrais amadores, venham elas das escolas universitárias ou de simples sociedades de recreio.
Às empresas é necessário oferecer condições de êxito comercial, impedindo, porém, a exploração injusta dos artistas pelos trunfo ou a falta de cumprimento de outras obrigações instituídas pela lei. Ao referir estas cautelas tenho em mente o típico caso Piero Benardon.
O trust dos teatros foi exercido em Portugal por esse empresário italiano, que reteve nas suas mãos, durante um longo período, os Teatros Variedades, Avenida e Apoio, de Lisboa, e o Sá da Bandeira, do Porto.
Esse monopólio só foi possível porque as autoridades responsáveis consentiram, com uma complacência ilegal, que aquele empresário acumulasse todo o género de dívidas que as leis proíbem: aos seus artistas, coristas e demais contratados; aos autores; à Fazenda Pública. As cauções que as leis estabelecem foram completamente descuradas, e quando soou a hora da escandalosa falência nada existia para cobrir esses débitos senão uma reduzida massa falida. Dívidas que as lei não consentem, em vez das cauções que as leis impõem; foi este o quadro.
Não pretendemos, por agora, acusar, mas esclarecer, para que semelhantes anomalias, imprevidências e desprezo das leis não voltem a repetir-se.
É nossa convicção que tais factos não se teriam dado se a Inspecção dos Espectáculos fizesse parte, como deveria ser, do Ministério da Educação Nacional e tivesse colaborado mais intimamente com os organismos encarregados de defender os direitos dos trabalhadores teatrais e dos autores.
A falência do empresário Piero explica também que, apesar da crise de palcos, se encontrassem durante algum tempo encerradas em Lisboa e no Porto algumas casas de espectáculos.
Eis porque não posso deixar de aplaudir com todo o entusiasmo a sugestão feita no parecer da Câmara Cor-

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porativa para que seja criada uma Direcção-Geral de Belas-Artes no Ministério da Educação Nacional, da qual faça parte a Inspecção dos Espectáculos e pela qual seja possível coordenar e reunir o que anula na realidade disperso e desarticulado.

Vozes: — Muito bem!

O Orador: — Outra condição de bom êxito das empresas consiste em desfazer o equívoco originado pela criação do Sindicato Nacional dos Artistas de Teatro. Há formas de actividade profissional que, pela sua própria natureza, não podem ser sindicadas sem que o Sindicato destrua a sua própria razão de ser. Imaginemos o caso das coristas e bailarinas. Pela natureza da sua função só o podem ser durante um espaço de tempo relativamente curto da vida. Qualquer solução que se traduza pela manutenção em actividade de pessoas que já ultrapassaram a idade própria só serve para fazer depreciar a arte e para criar dificuldades económicas insuperáveis ao Sindicato que defende os interesses desses artistas.
A solução tem de ser achada de modo a permitir uma constante renovação dos quadros e ao mesmo tempo permitir aos que perderam as condições óptimas para o exercício das profissões que vimos considerando que encontrem possibilidades de empregar a sua actividade em condições de completa eficiência e independência.
Quanto aos autores, é absolutamente indispensável que o direito de propriedade intelectual, tão justa e cuidadosamente defendido pela Sociedade de Escritores e Compositores Teatrais Portugueses, seja um estímulo capaz de provocar o aparecimento de novos escritores cheios de talento e de espírito inovador. Neste ponto afigura-se-me que o parecer da Ex.ma Câmara Corporativa, também apresenta, doutrina certa quando propõe em substituição do conselho teatral apenas um conselho administrativo, constituído pelo secretário nacional da Informação, pelo inspector dos Espectáculos, por dois representantes da Junta Nacional da Educação, por um representante do Grémio Nacional das Empresas Teatrais, por um representante do Sindicato Nacional dos Artistas Teatrais, por um autor dramático escolhido pelo Governo de uma lista tríplice apresentada pela Sociedade de Escritores e Compositores Teatrais Portugueses e pelo chefe da 3.ª Secção da 3.a Repartição do Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo.

O Sr. Mário de Figueiredo: — Há-de (haver, na economia da proposta, quem julgue de elencos e quem julgue de repertórios, e eu pergunto: é aceitável que julgue de elencos e julgue de repertórios um conselho administrativo?

O Orador:— V. Ex.ª dê-lhe o nome que entender.

O Sr. Mário de Figueiredo:— Há uma orgânica que diz: conselho administrativo e conselho teatral ou conselho dramático, suponhamos, pouco me interessam os nomes. Ora, deve haver um conselho administrativo e um conselho de teatro ou devem fundir-se num conselho único o conselho administrativo e o conselho de teatro, ficando naquele conselho entidades que, pela natureza das suas funções, não devem estar afectadas à administração e entidades com capacidade para julgar de elencos e de repertórios?

O Orador:— Concordo com V. Ex.ª (Simplesmente não me queria referir a esse problema, mas à própria constituição deste conselho administrativo.

O Sr. Mário de Figueiredo:— Mas há entidades nesse conselho administrativo, tal como é formado pela Câmara Corporativa, que não se compreende como devam estar num conselho administrativo. Compreender-se-ia, sim, que estivessem num conselho de teatro, num conselho teatral, mas para julgarem de elencos e repertórios.

O Orador: — V. Ex.ª entende que devem existir dois organismos, qualquer que seja o nome que se lhes dê: um destinado a uma função e outro destinado a função diferente. A minha, relutância em lhe chamar conselho teatral resulta da mesma, relutância que também teve a Câmara Corporativa em lhe chamar assim, porque existe uma tradição de um organismo com esse nome no teatro português que deve ter por missão algo de muito mais elevado. Por consequência, concordo com V. Ex.ª que deve haver dois organismos, mas simplesmente não concordo que se lhes deva chamar conselho teatral, devido à tradição que já referi.
Pelo que respeita a «escolha de autor de reconhecida competência», devo dizer que entendo que os interesses dos autores ficam legitimamente defendidos se o autor for escolhido de uma lista apresentada por um organismo que represente devidamente o interesse dos autores...

O Sr. Mário de Figueiredo: — Isso é um pormenor de especialidade. O problema que eu estava a por era este: deve ou não existir, além de um conselho administrativo, um outro conselho que seja qualificado para julgar isso?

O Orador: — Parece-me que talvez haja vantagem em separar os dois organismos. Simplesmente julgo que os elementos que devem fazer parte desse organismo têm de oferecer todas as garantias de imparcialidade.
Mas reatando:
Só assim, com essa escolha, poderão ficar acautelados devidamente os interesses de todas as pessoas ligadas à actividade teatral, não esquecendo os escritores, sem os quais, por muito que se queira, não há nem pode haver bom teatro.
Para mim, é claro que o conselho teatral, instituído, como bem lembra a Câmara Corporativa, por Almeida Garrett e renovado por Hintze Ribeiro, deve ressurgir um dia para tratar da alta política do teatro, não só em função da cultura histórica e literária do nosso país, mas em função de uma das mais importantes missões do teatro a que se refere também aquele parecer: defesa da unidade prosódica da língua portuguesa através todas as partes do Império e instrumento da sua expansão universal.
Deveriam promover-se, pelo fundo a estabelecer, visitas frequentes de companhias com bons repertórios aos teatros das províncias, no continente e no ultramar, e mesmo do Brasil, para levar até lá os benefícios estéticos do bom teatro português e contribuir deste modo para uma certa uniformização prosódica da língua, que importa defender e contribuir para o gosto pela arte da dicção.
É evidente que mesmo em Portugal continental há diferenças de linguagem: por exemplo, de província para província; mas há um padrão médio que é necessário defender. E essa necessidade ainda surge com mais vigor quando consideramos não simplesmente a metrópole, mas o Império.
Devido às comunicações hoje extremamente fáceis ao intercâmbio das populações e da cultura, assistimos a uma tendência para regressar a um padrão uniforme, e devemos aproveitar esta circunstância para expan-

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dirmos a língua portuguesa na sua forma mais pura e elevada. Por isso dizia eu: não basta defender a língua escrita por uma política hábil e perseverantemente seguida. Impõe-se também a defesa da língua falada, mantendo sempre vivo o padrão normal. Medite-se no que os Franceses conseguiram para a sua língua através da Comedir e os Ingleses com o seu extraordinário culto pelo teatro.
Resumindo as minhas considerações, devo dizer que o objectivo da lei em discussão, expresso no artigo 1.º, não deve deixar de fazer referência à necessidade de elevação do nível artístico do nosso teatro, em conformidade com a proposta do Governo, e ao teatro como instrumento de cultura, e padrão da Língua, em harmonia com o parecer da Câmara Corporativa. O sentido geral da lei deve ser, pois, a resultante de uma equilibraria combinação da proposta do Governo e da proposta da Câmara Corporativa.
A nova redacção da lei tal como nos é apresentada no parecer daquela Câmara corresponde, de uma maneira anais satisfatória, às necessidades de ordem prática do nosso teatro. Exceptua-se talvez a limitação indicada no corpo do artigo 8.º, e que se refere apenas às obras dramáticas portuguesas em três ou mais actos. Precisa-mos, na verdade, de tornar possível também a representação de peças de menor envergadura, mas de alto nível.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Mas isso foi uma coisa que me impressionou. O que observou o Sr. Coronel Durão impressionou-me, repito, mas nada está estabelecido a esse respeito; nada impede que essas pequenas peças se representem. O que não são é contadas no contingente.

O Sr. Ricardo Durão: - Mas a empresa é que não as leva.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Não entram no contingente, mas nada impede que se representem peças em um acto.
Essas peças não estão em cena quinze noites; de quando em quando haverá conveniência em pôr uma peça em um acto. Numa noite de sarau poderá a empresa ter conveniência em pôr duas ou três peças em um acto.
Nada há que impeça isto; simplesmente, não se contam no contingente.

O Sr. Botelho Moniz: - Mas o caso da Câmara Corporativa parece-me que foi u-ma modéstia exagerada do relator, porque as melhores peças são exactamente as de um acto.

O Orador: - Para finalizar as minhas considerações, farei apenas referência ao problema da receita do Fundo de teatro, relativa à alínea a) do artigo 2.º
Dada a função diferente e relativa do teatro e do cinema, em face dos interesses espirituais e económicos do País, pergunto a mini próprio: porque onerar especialmente as empresas que exploram cine-teatros, nos termos previstos por este diploma? Afigura-se-me perfeitamente legítimo que todo o cinema, que nunca poderá ser uma arte nacional no mesmo grau do teatro, contribua econòmicamente para a solução do problema do teatro português.

O Sr. Manuel Múrias: - Não percebo porque não poderá ser uma arte nacional nas mesmas condições do teatro.

O Orador: - Se não houvesse outros motivos, haveria o da tradição histórica.
O teatro é para nós uma arte mais nacional do que a do cinema. Porque no aspecto técnico nunca poderemos igualar os outros países, como a América, quanto ao cinema; quanto ao teatro, podemos dispor das mesmas possibilidades dos outros. Reconheço aspectos superiores no cinema, como a possibilidade de expressar melhor certos aspectos da vida nacional do que o tem feito ato hoje, mas o teatro tem tradições históricas, que não devemos esquecer.

O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª dá-me licença? E simplesmente para dizer que o cinema paga de imposto único uma taxa muito superior à dos teatros. Portanto a contribuição para o Estado é muito maior e é o Estado quem dá o Fundo de teatro. Enquanto a taxa dos cinemas é de 7 por cento, a dos teatros está estabelecida em 5 por cento sobre dois terços da lotação.

O Orador: - V. Ex.ª pode ter razão. Mas esses aspectos do problema não me interessam, porque não estou muito familiarizado com eles.
Mas, voltando às minhas considerações, eu penso que deste modo evitava-se uma possível inconsequência da lei, já aqui discutida, quanto as empresas concessionárias por período ilimitado e criava-se uma base económica mais sólida para realizar a tão almejada reforma do teatro. Não vejo mesmo onde estaria o inconveniente de juntar o Fundo de teatro e o Fundo de cinema para se conseguir um resultado mais positivo para uma solução satisfatória e completa do problema da arte cénica entre nós. Proponho esta sugestão ao alto critério de VV. Ex.ªs
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Antes de encerrar a sessão vou mandar ler as propostas enviadas para a Mesa e que ainda não foram lidas à Assembleia.
Trata-se de uma terceira proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz e de algumas propostas que o Sr. Deputado Manuel Lourinho ontem apresentou.

Foram lidas. São as seguintes:

Proponho a supressão do § 1.º do artigo 12.º da proposta de lei n.º 60 (§ único do artigo 12.º da Câmara Corporativa).
Ou, se a Assembleia não aprovar aquela supressão, a nova redacção seguinte para o parágrafo citado:

Não são de admitir contratos futuros de exploração em que haja bilhetes cativos vendáveis a favor do proprietário ou arrendatário, ou mais do que um camarote, frisa ou cinco lugares de plateia para sua utilização gratuita.

O Deputado Jorge Botelho Moniz.

Proposta de substituição:

Que a alínea a) do artigo 3.º da proposta do Governo tenha a seguinte redacção:

d) A concessão de subsídios a empresas singulares e colectivas que explorem espectáculos de teatro declamado e musicado.

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Proposta de aditamento:

Que à alínea d) do artigo 5.º da proposta do Governo se acrescentem as seguintes palavras:

... outro do Sindicato Nacional dos Músicos.

Proposta de eliminação:

Que seja eliminada a alínea e) do artigo 7.º da proposta do Governo.

Proposta de substituição:

Que o artigo 8.º da proposta do Governo tenha a seguinte redacção:

Ao conselho teatral é reservado o direito de exigir das empresas que forem subsidiadas a representação, em cada época, de um mínimo de 50 por cento de obras de autores portugueses.

Proposta de eliminação:

Que seja eliminado o artigo 12.º da proposta do Governo.

Sala da Assembleia Nacional, 23 de Março de 1950.- O Deputado Manuel Hermenegildo Lourinho.

O Sr. Presidente: - O debate continuará na sessão de amanhã.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto Henriques de Araújo.
Américo Cortês Pinto.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António de Matos Taquenho.
Jorge Botelho Moniz.
José Luís da Silva Dias.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
José Pereira dos Santos Cabral.
Ricardo Malhou Durão.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

António de Sousa da Câmara.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Carlos Mantero Belard.
Daniel Maria Vieira Barbosa.
Diogo Pacheco de Amorim.
Jaime Joaquim Pimenta Prezado.
João Carlos de Assis Pereira de Melo.
José Gualberto de Sá Carneiro.
José Afaria Braga da Cruz.
José Pinto Meneres.
José dos Santos Bessa.
Luís Filipe da Fonseca Morais Alçada.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
D. Maria Leonor Correia Botelho.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

Propostas enviadas para a Mesa durante o decorrer da sessão sobre a proposta de lei relativa ao Fundo de teatro:

Proposta de substituição do artigo 1.º:

Artigo 1.º É criado o Fundo de teatro, destinado a assegurar protecção ao teatro como expressão e instrumento de cultura e padrão da língua.

Proposta de substituição da alínea a) do artigo 2.º e de eliminação da alínea f) do mesmo artigo:

a) As taxas a cobrar do empresas que explorem cine-teatros, nos termos previstos por este diploma, que não hajam de ser atribuídas nos termos do § 3.º do artigo 10.º ou cuja atribuição caduque.

Proposta de substituição do artigo 3.º:

Artigo 3.º As disponibilidades do Fundo de teatro serão aplicadas à concessão de subsídios:
a) A empresas singulares ou colectivas que explorem espectáculos de teatro declamado e, excepcionalmente, comédia musicada e opereta;
b) Eventualmente, a companhias itinerantes, devidamente organizadas, que se proponham difundir no País e fora dele a literatura dramática nacional;
c) Quando as circunstancias o permitam, a pequenas companhias de teatro experimental, destinadas a dar satisfação a correntes de renovação estética.
§ único. A parte do Fundo que não for aplicada poderá ser aproveitada para a construção, ou respectiva comparticipação, de casas em que se explorem os espectáculos de teatro a que se refere a alínea a) deste artigo.

Proposta de substituição do artigo 4.º:

Artigo 4.º O Fundo de teatro será gerido por um conselho administrativo constituído pelo secretário nacional da Informação, que presidirá, pelo inspector dos Espectáculos e por um dos vogais do conselho de teatro referido na alínea b) do artigo 5.º, designado pelo Ministro da Educação Nacional.

Proposta de substituição do artigo 5.º:

Artigo 5.º O conselho de teatro funcionará no Secretariado Nacional da Informação e será constituído:
a) Pelo secretário nacional da Informação, que presidirá ;
b) Por um representante da Junta Nacional da Educação, outro do Conservatório Nacional e outro do conselho de leitura do Teatro Nacional D. Maria II, designados «pelo Ministro da Educação Nacional;
c) Pelo inspector dos Espectáculos;
d) Por um representante do Grémio Nacional das Empresas Teatrais e outro do Sindicato Nacional dos Artistas Teatrais;
e) Por um autor dramático ou crítico do teatro, designado pelo Governo;
f) Pelo chefe da 3.º Secção da 3.ª Repartição Etnografia, Teatro e Música) do Secretariado Nacional da Informação, que exercerá as funções de secretário.
§ único. Por cada sessão a que assistirem terão direito a uma senha de presença de 100$ os vogais a que se referem as alíneas b), d) e c), a satisfazer pelo Fundo.

Proposta de substituição do artigo 6.º:

Artigo 6.º A concessão dos subsídios a que alude a alínea a) do artigo 3.º, ou a simples cessão das casas de espectáculos a que se refere o § 1.º do artigo 10.º, dependem de decisão do Governo, sob parecer do conselho

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de teatro. Os respectivos pedidos serão apresentados em cada ano, até 31 de Maio, em concurso aberto pelo prazo de trinta dias, perante o Secretariado Nacional da Informação.
§ único. A concessão dos subsídios eventuais descritos nas alíneas b) e c) dependerá da iniciativa do conselho de teatro, quando para isso haja disponibilidades, e nunca, com prejuízo dos subsídios da alínea a), destinados a explorações teatrais de carácter estável, regular e permanente.

Proposta de substituição do artigo 7.º:

Artigo 7.º As entidades que se constituírem candidatas aos subsídios a que «e refere a alínea a) do artigo 3.º deverão instruir os seus requerimentos com a seguinte documentação:
a) Escritura pública de constituição de sociedade, sempre que se trate de uma empresa colectiva;
b) Título de propriedade da casa de espectáculos em que pretenda fazer a exploração, ou documento do qual constem as condições em que essa casa se encontra à sua disposição, ou, quando os não tiver, o pedido de cessão de uma casa de espectáculos;
c) Repertório e plano geral dos espectáculos da época;
d) Declaração expressa das obrigações assumidas quanto à representação de originais portugueses, em harmonia com o disposto no artigo 8.º deste diploma;
e) Relação do elenco artístico, incluindo o director da companhia e o ensaiador;
f) Certificado, passado pela Inspecção dos Espectáculos, comprovativo, para as empresas já inscritas, de terem liquidado todos os compromissos resultantes de explorações anteriores e, para as novas empresas, de serem consideradas idóneas, de acordo com o preceito do artigo 92.º do Decreto n.º 13:564, de 6 de Maio do 1927;
g) Documento demonstrativo de se encontrarem inscritas no Grémio Nacional das Empresas Teatrais e de haverem integralmente satisfeito as obrigações emergentes dessa inscrição.
§ único. O pedido de simples cessão de uma casa de espectáculos será instruído nos mesmos termos que o pedido de subsídio.

Proposta de substituição do artigo 8.º:

Artigo 8.º As empresas que se apresentarem a concurso para a concessão de subsídios pelo Fundo de teatro deverão assumir o compromisso de fazer representar em cada época, pelo menos, 25 por cento de obras dramáticas portuguesas em três ou mais actos, inéditas ou em reposição.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 23 de Março de 1900. - Alexandre Alberto de Sousa Pinto, João Ameal, Caetano Beirão, António dos Santos Carreto e Manuel Lopes de Almeida.

CÂMARA CORPORATIVA

Acórdãos da Comissão de Verificação de Poderes

Acórdão n.º 9/V

A Comissão de Verificação de Poderes da Câmara Corporativa, eleita na sessão preparatória de 25 de Novembro de 1949, no uso da competência atribuída pelo artigo 106.º da Constituição Política e tendo em vista o disposto no Decreto-Lei n.º 29:111 e no Decreto n.º 29:112, ambos de 12 de Novembro de 1938, e bem assim o disposto no artigo 7.º e seus parágrafos do Regimento desta Câmara, reconhece e valida os poderes do Digno Procurador engenheiro Ricardo Esquivei Teixeira Duarte, na qualidade de presidente do conselho directivo da Ordem dos Engenheiros, cargo para que foi eleito, e confirmado, em substituição do anterior representante, Sr. Engenheiro José de Mascarenhas Pedroso Belard da Fonseca (documentos n.ºs 32 a 34).

Palácio de S. Bento e Sala das Sessões da Comissão de Verificação de Poderes da Câmara Corporativa, 23 de Março de 1950.

José Gabriel Pinto Coelho.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Adolfo Alves Pereira de Andrade.
Higino de Matos Queirós.
Manuel Duarte Gomes da Silva.
Tomás de Aquino da Silva.
Virgílio da Fonseca.

Acórdão n.º 10/V

A Comissão de Verificação de Poderes da Câmara Corporativa, eleita na sessão preparatória de 25 de Novembro de 1949, no uso da competência atribuída pelo artigo 106.º da Constituição Política e tendo em vista o disposto no Decreto-Lei n.º 29:111 e no Decreto n.º 29:112, ambos de 12 do Novembro de 1938, e bem assim o disposto no artigo 7.º e seus parágrafos do Regimento desta Câmara, reconhece e valida os poderes do Digno Procurador médico Dr. Luís Figueira, na qualidade de representante da Ordem dos Médicos, nos termos do § único do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 29:171, em substituição do anterior representante, Sr. Dr. Emílio de Meneses Ferreira de Tovar Faro (documentos n.ºs 35 a 39).

Palácio de S. Bento e Sala das Sessões da Comissão de Verificação de Poderes da Câmara Corporativa, 23 de Março de 1950.

José Gabriel Pinto Coelho.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Adolfo Alves Pereira de Andrade.
Iligino de Matos Queirós.
Manuel Duarte Gomes da Silva.
Tomás de Aquino da Silva.
Virgílio da Fonseca.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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